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Marcus de Almeida Magalhães Gontijo

19 Marcelo Luide Pereira Gonçalves


Hyllo Baeta Marcel/o júnior

INVESTIGAÇÃO LABORATORIAL DAS


MICOSES SUPERFICIAIS E PROFUNDAS

As micoses podem ser definidas como infecções Segundo Ri ppon, essas infecções podem ser classifi-
provocadas por fungos. Estes normalmente apresentam cadas como superficiais, quando limitadas à superfície
como habitat natural o solo ou as plantas, podendo pa- da pele ou pêlos. ou como cutâneas, quando envolvem
rasitar o homem e outros animais. propriamente o tegumento e/ou seus anexos.
O parasitismo fúngico depende da produção de en- As infecções superficiais compreendem:
zimas e de mecanismos de escape contra as defesas na- • pitiríase versicolor: causada por leveduras do gê-
turais do hospedeiro. A patogenicidade provocada por nero Malassezia;
estes agentes está relacionada ao oportunismo oferecido • piedra branca: causada por leveduras do gênero
pelo hospedeiro. Trichosporon (Figuras 19.1 e 19.2);
Os fungos ra ramente são transmitidos por contato • piedra preta: causada pela levedura Piedraia
interpessoal. Apenas os dermatófitos, considerados pa- hortae;
rasitos obrigatórios, são transmitidos desta forma. • tinha nigra: causada pela levedura Hortaea
A infecção fúngica, superficial ou profunda, relacio- werneckii.
na-se pri ncipalmente a fatores do hospedeiro, ao gênero
do fungo envolvido, ao tamanho do inóculo e ao sítio de
inoculação. ..
Este capítulo abordará as principais micoses superfi-
ciais e profundas de interesse médico em nosso meio.

MICOSES SUPERFICIAIS

DERMATOMICOSE

São infecções fúngicas envolvendo o tegumento e/


ou seus anexos. Representam a maioria das infecções
cutâneas humanas diagnosticadas em serviços de Der-
.Jra 191 - P1edra branca (lOOX).
matologia.
imunológica. Em geral, pela própria localização superficial
desta infecção, não são observadas alterações celulares
no hospedeiro imunocompetente, porém, em pacientes
imunocomprometidos, as formas clínicas são mais graves,
mais generalizadas e atíptcas. Em alguns casos, reações
alérgicas denominadas mícides ou simplesmente "ides"
podem ocorrer. As mícides são defintdas como mantfesta-
ções cutâneas à distância de um foco infeccioso pri mário
em atividade e podem assumir aspectos clínicos os mais
variados. Geralmente, ocorrem nas mãos e chegam a uma
casuísttca de 21% nos pacientes com dermatofirose, se-
gundo o Prof. Carlos da Silva Lacaz.
A espécie do dermatófito é importante para o tipo de
mantfestação clínica do paciente e eles se diferem quan-
A tricomicose axilar ou rricomicose nodular pode ro à habilidade de interagir com hospedeiros distintos.
produzir nódulos que se confundem com a Piedra branca Do pomo de vista filogenético, parece provável que as
(rricosporonose). Ela é causada por bacrérias da espécie espécies que parasitam exclusiva ou preferencialmente o
Corynebacterium tenuis (antiga Nocardia tenuis). Atin- homem, chamados de anrropofílicos, representam a fase
ge os pêlos axilares e raramente os da região pubiana. É final de um ciclo evolutivo que seria iniciado com fungos
caracterizada pelo aparecimenro de nódulos ou concre- que utilizam a queratina no solo, denominados geofílicos,
ções aderidas aos cabelos. Constitui-se por bacilos cur- passando depois para aqueles associados a animais, os
ros, delicados e embebidos num material gelatinoso, que zoofílicos, para então terminarem nas espécies antropofí-
podem ser identificados pelo exame direro em hidróxi- licas. Corroborando esta hi pótese, têm-se alguns derma-
do de potássio (KOH) ou pelo Gram. A culrura é difícil. tófitos em aparente processo de adaptação, como, por
Existem três variedades de tricomicoses: a flava (amare- exemplo, Trichophyton terrestre, que é um geofílico que
la), a rubra (vermelha) e a nigra (preta). O tratamento é a causa dermacofirose em animais. Da mesma forma. tem-
raspagem dos pêlos e aplicação de álcool iodado. se o Microsporum nanum. um zoofílico encontrado no
As infecções cutâneas são causadas por fungos cerati- porco, que vem causando dermarofirose em humanos. O
nofílicos. denominados dermatóficos, e são referidas gene- M. gypseum é um geofílico que causa doença no homem,
ricamente por dermarofiroses. Além dos dermatófiros, ou- principalmente na região inguino-crural. onde só era en-
tros fungos filamenrosos e as leveduras do gênero Candida conrrado antigamente o anrropofílico Epidermophyton
também são capazes de causar dermatomicoses. floccosum. Alguns autores interpretam esse faro como
adaptação emergente dos dermatófitos ao tegumen-
to humano. Assim, diferentes graus de especificidade e
DERMATOFITOSE adaptação podem ser distinguidos entre os dermatófitos,
mas, de modo geral. esses microrganismos tendem a atin-
Os dermarófiros são classificados em três gêneros: gir equilíbrio com seu hospedeiro preferencial. Quanto
Trichophyton, Microsporum e Epidermophyton. maior a adaptação, menos agressivamente se comporta
Nem sempre o encontro de dermatófítos nos tecidos o fungo e menor é a resposta inflamatória evocada. Com
cerarinizados é traduzido por dermatofirose, podendo ser isto, é compreendida a existência de portadores assinto-
uma simples colonização que, quando há sintomatologia, máticos, infecções subclínicas, bem como aquelas de ca-
esta é resultante da reação do hospedeiro aos produtos ráter crónico e benigno. Portanto, a manifestação clínica
metabólicos do fungo e não devido a invasão de tecidos das dermarofitoses é função de características específicas
vivos pelo microrganismo. Deste ponto de vista, o tipo e a de cada fungo e de cada hospedeiro.
gravidade das manifestações clínicas dependeriam da sen- As dermarofiroses são referidas muitas vezes como
sibilidade individual do hospedeiro e de sua competência "tineas" ou "tinhas" (do latim, verme ou traça) em virtude

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do contorno geográfico das lesões ter sugerido, aos pes- as contaminadas associadas a piscinas (pisos adjacentes
quisadores da Ancigüidade, a presença de vermes adul- e vestiários comuns).
cos sobre uma superfície lisa ou, de acordo com Rippon, No que tange à distribuição geográfica de dermaco-
pelo faco de os romanos terem associado as lesões a inse- micoses e seus agentes causais. padrões vêm sendo de-
ws (tinha = larva). De qualquer forma. a nomenclatura é fin idos com base em numerosos relatos encontrados na
incorrera, mas permanece na literatura, consagrada pelo literatura. Enquamo as leveduroses cutâneas, pela carac-
uso. De acordo com a localização anatómica das lesões. terística endógena das infecções causadas por espécies de
são feiws diagnósticos clínicos de tinha capitis, unguium. Candida e Ma/assezia, têm ampla distribuição mundial. as
corporis, cruris, etc. dermarofiroses podem apresemar padrões de ocorrência
Alguns fungos micelianos, não dermatófims, podem bem definidos já que, se por um lado algumas espécies de
causar lesões muim semelhantes às dermamfimses. Es- dermatófiws são francamente cosmopolitas, por outro
ses fungos vêm ocorrendo mais freqüentemente em lado existem espécies que são restritas geograficamenre.
casos de onicomicoses, represemados por Scytalidium Correntes migratórias de diferentes naturezas têm altera-
dim idia tum, S.hyalinum e Scopulariopsis brevicaulis. do continuamente os padrões de distribuição geográfica
Além do tecido ungueal, outros sítios são acometidos,
dos dermatófiws, ocasionando às vezes o surgimento de
como o espaço imerdigiral e região plantar. Mais rara-
diferentes doenças em determinadas regiões. No entanto,
mente espécies de Aspergillus, Fusarium e Acremonium
variações na prevalência de diferentes espécies também
podem estar envolvidas em casos de onicomicoses.
vêm ocorrendo em função do tempo e, neste aspecto. o
Variações na prevalência de determinadas der maco-
achado mais notável diz respeiw ao aumento do núme-
micoses podem ser verificadas em função da faixa etária
ro de infecções causadas pelo Trichophyton rubrum em
dos paciemes. Assim. pelo fam da derme das crianças ser
todo o mundo. Outros fawres. como distribuição clíni-
menos cerarinizada que a do adulco, é pouco comum a
ca da lesão (localização anatómica), também devem ser
ocorrência de tinha pedis, cruris e unguium. De modo
considerados para maior prevalência de um ou de outro
inverso, a tinha capitis ocorre mais em criança do que no
agente de dermatofirose.
adulw, devido à ausência de ácidos graxas de cadeia mé-
dia (C8-C12) no couro cabeludo de indivíduos pré-pube-
res. Normalmeme, a tinha cap1tis em crianças é causada
FISIO PATOGENIA DAS DERMATOFITOSES
pelo M . cams devido ao maior conta to das crianças com
o solo e animais. Em adulto a tinha capitis por M. canis
é mais comum na mulher devido ao maior conrato com A queratinase é produzida por codo dermatófito e é
as crianças infectadas. ativa em pH alcalino. As colagenases e elastases atuam
As onicomicoses têm maior ocorrência em faixas em pH neutro. A intensidade dessas enzimas, principal-
etárias mais avançadas (55 a 60 anos). o que estaria rela- mente a elastase. reflete a intensidade da reação inflama-
cionado a traumatismos nas unhas. alterações do estado tória. Fungos zoofilícos produzem maior quantidade de
imunológico. avitaminoses, diabetes, entre outros. proteases que os antropofílicos e causam reação inflama-
A ocupação dos pacientes ta mbém é famr determi- tória mais intensa. o r interdigitale (amropofílico) tem
nante da ocorrência de diferentes micoses superficiais baixo grau de atividade da elastase. provocando menos
e de agentes etiológicos distintos. Assim, profissionais inflamação no hospedeiro quando comparado com o r
que têm contam com animais (veterinários. etc.) têm mentagrophytes, que é zoofilico. O r mentagrophytes
mais oportunidade de adquirir infecções por fu ngos produz menos elastases na pele humana do que em pele
zoofílicos. Atletas (maramnistas) apresentam maior de outros animais. Em todo fungo bem adaptado. esta
freq üência de tinha pedis que a população geral. Esta queda na produção de enzimas (reatividade) decresce
maior incidência é associada ao uso constante de cal- quando o hospedeiro é aquele a que ele está adaptado.
çados fechados (tênis), que aumentam a temperatura. Como a reação inflamatória ocorre na derme e os fungos
umidade e maceração de tecidos dos pés. Tin ha pedis estão na epiderme, sugere-se que estas enzimas proteolí-
também é muim comLm em nadadores devido às áre- ticas difundam-se nesta direção.

Investigação laboratorial das micoses su perflciais e profu ndas 187


Cada espécie de dermarófiw rem uma arividade Normalmente. os dermatófiws produzem pápulas,
queratolítica própria e a produção pode variar de cepa placas e máculas descamarivas, com bordas serpigino-
para cepa. Por exemplo. o T rubrum, ao contrário do T sas. Geralmente, as erupções são exfoliativas, sendo o
schoenleinii, produz pouca enzima capaz de fragmentar prurido o principal sintoma. Existe também a história de
o pêlo, sendo, portanto, de ocorrência rara neste anexo e contam com pessoas infectadas ou animais como gaw.
cem enzimas capazes de dissolver bem as unhas. cachorro, coelho, papagaio, etc.
Os ácidos graxas, principalmente o undecilênico. pro- A lesão típica da tinha corpons é anular. com bordas
duzidos principalmente pelas glândulas sebáceas e pouco descamativas, elevadas, reacionárias, de cor rosa com
pelas sudoríparas. além de baixarem o pH da pele. têm ação tendência ao clareamento central. Pode ser uma ou vá-
anrimicótica. O suor tem poucos ácidos graxas. portanto, rias lesões. Em pacientes com lesões crónicas. podem ser
rem pouca ação antimicórica, mas possui muitos aminoá- extensivas e não anular.
cidos importantes que favorecem o crescimento fúngico. O T mentagrophytes produz lesão úmida, do tipo vesi-
O T rubrum produz três tipos de querarinases: cular. com foliculite supurariva. O T rubrum produz lesão
• peso molecular 93.000; seca, escamosa, que se dissemina em forma de anel, fican-
• peso molecular 71.000; do o centro curado. Geralmente, as infecções por espécies
• peso molecular 27.000. antropofilicas são seguidas da auw-inoculação de outros
sítios de infecção no corpo. Os pacientes com tinha do
As duas primeiras querarinases têm forre ação quera- corpo não raro apresentam outras tinhas associadas.
wlírica quando em pH alcalino. A terceira queratinase foi O T tonsurans poupa as áreas da barba. pregas. pés
descoberta no órgão penetrante da hifa do T rubrum, a e mãos. O E. jloccosum tem preferência pelas dobras
partir da microscopia elerrónica. tendo ação queratolí- e pés, podendo atingi r un has (raro) e tronco. nunca o
tica fraca e agindo em pH ligeiramente ácido (pH=4.5), couro cabeludo.
semelhante à tripsina. Esta enzima tem relevante papel
na virulência do fungo porque é ela que age nas primei-
Diagnóstico diferencial
ras duas semanas de penetração. quando o pH da pele
está ligeiramente ácido. À medida que vai desdobrando • eczema numular: produz lesões em moeda. múl-
proteínas, vai liberando íons de amónio e o pH da pele tiplas. geralmente nas extremidades, sem embran-
vai se neutralizando, começando a agir as enzimas de pH queci menta central;
neutro (elastases e colagenases) para. finalmente. agirem • ptiríase rosada (ptiríase rósea de gilbert): man-
as enzimas de pH alcalino (queratinases). cha ovalada, rosada, inicialmente ún ica, de eleva-
Apesar dos dermatófitos serem queratinofílicos, eles ção mínima e auwlimitanre ao tronco. Aparece a
não dependem da queratina para crescer nos tecidos. A "mancha primitiva", que é a maior mancha, com 2
queratina funciona principalmente como barreira prote- a 6 cm. seguida por manchas ou lesões múltiplas
tora, isolando o fungo da ação de inibidores presentes no menores, que vão aparecendo no decurso da do-
soro do paciente. ença. após dias ou semanas do aparecimenw da
mancha primitiva ou "medalhão", segue-se a erup-
ção. Pode haver prurido;
TIPOS CLÍN ICOS DE DERMATOFITOSES • pitiríase alba: é uma alteração hipopigmentária
idiopática que se apresenta por manchas brancas
Ti nha corporis cobertas por escamas finas. afera geralmente me-
ninas de seis a 12 anos e é mais notável na raça
Os dermatófiws produzem resposta imunológica negra. É assintomárica, as bordas da mancha são
celular e podem curar-se espontaneamente. Nas lesões indefinidas, é comum no rosw. sendo que nas
da pele, onde a disseminação é centrífuga. o centro da mulheres jovens aparece mais na parte superior
lesão vai ficando curado por imunidade local e as bordas do braço. A repigmenração pode levar anos. sen-
ficam reacionárias. do que a cura pode ser espontânea;

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• pitiríase versicolor: apesar de ser uma infecção Quando o T interdigitale estiver atacando a virilha, o
superficial do extraw córneo (dermawmicose que é raro. suspeitar de concomitância com tinha pedis.
superficial), pode produzir descamação fina. Há
alceração pigmentária da epiderme. Não causa Diagnóstico diferencial
prurido porque não afeta fi letes nervosos, por ser
superficial. Ao exame direto em KO H, aparecem • candidose: intensamente eritematosa e brilhante,
hifas curtas e grossas, sem ram ificação e com blas- bordas pouco definidas com pápulas e púsrulas
coconídios em cachos, característica do gênero satélites e afeta o escroto;
Malassezia; • intertrigo: é dermatite irritativa ou rubor conges-
• psoríase: são placas mais grossas, mais descama- tivo, comum nas pessoas obesas, causada pelo
tivas e infiltradas. São de tonalidade prateada (es- acúm ulo de umidade, junto com o atrito. É erup-
tratificação); ção menos eritemarosa que a candidose e não
• impetigo: pode apresentar lesão anular. Geral- está tão limitada como a tinha cruris. São não-
mente presença de vesículas, pústulas e crostas escamosas nem marginadas e o centro da lesão
em lesões anulares levam a pensar em infecção é a prega inguinal. ao passo que a tinha cruris se
bacteriana, e não micótica; desenvolve abaixo dessa prega;
• eritema anular centrífugo e granuloma anular: • dermatite seborréica e a psoríase menos comu-
no eritema anular a escama se encontra dentro mente afetam a região inguinal;
da borda elevada e no granuloma a borda é mais • eritrasma raramente ocorre e pode ser diferencia-
indurada e não descama; do pela lâmpada de Wood, que mostra fluores-
• candidose: a candidose da pele aparece como cência vermelho-coral e o Gram revela bastonetes
zona eritemacosa rodeada por pápulas e pústulas Gram positivo (Corynebacterium minutissimum).
satélites. As hifas de Candida ativam o comple-
mento, ocasionando púsrulas e inflamação. Pro-
duz prurido intenso. A umidade predispõe e as Tinha pedis
áreas mais afetadas são as intertriginosas. O diag-
nóstico é feito pelo raspado e exame micológico São infecções micóticas que afetam 4% da população
direto com KOH, em que aparecem as leveduras e em geral.
pseudo-hifas. Em caso de pústulas. seu exsudado A tinha pedis pode se estender para as unhas dos pés,
possui alto índ ice de positividade. geralmente de maneira distal e ra ramente proximal. Um
pé é mais acometido que o outro e esta assimetria ajuda
a diferenciar da psoríase. Geralmente começa entre os
Tinha cruris dedos do pé, passando para a região plantar e sendo rara
no dorso.
Normalmente, pacientes com tinha cruns apresen- Os atletas, devido à maior perspiração nos pés. acu-
tam também tinha pedis porque a transpiração provo- mulam a umidade no local o que, aliado a traumatismos
cada pelo exercício é provavelmente o denominador mecânicos e geralmente à maior exposição a lugares con-
comum . Portanto, são erupções "desportivas". Normal- taminados, como piscinas e ginásios. fazem com que este
mente, é transmitida por meio de malhas contaminadas, grupo de pessoas fique mais susceptível à tinha pedis.
chão de banheiros. qua rtos de hotéis e freqüentemen- Pode aparecer de três formas clínicas diferentes:
te dissemina-se por auco-inoculação. Era chamada de • interdigital: aparece a maceração entre os dedos
"eczema de Hebra" ou eczema marginatum (descrito dos pés. Mais comum em pacientes com hiper-
por Hebra, em 1962) porque tinha coloração acentuada hidrose dos pés;
nas bordas. Não afeta o escroto. Seu principal agente é • descamativa plantar difusa: ocorre mais nos ido-
o E. floccosum, porém o T rubrum tem sido atualmente sos e é assintomática. A pele aparece seca, com
mais isolado no Brasil e em outros países. descamação difusa nas plantas dos pés até o cal-

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canhar. Normalmente vem acompanhada de afec- • dermacite de concato e eczema disidrórico: con-
ções das unhas; fundem-se com a forma vesículo-pusrulosa. sendo
• vesículo-pustulosa: é a forma menos comum e as vesículas menores e quase nunca dão púsculas;
normalmente se diagnostica erroneamente. As • psoríase pustulosa: é rara. A dúvida é tirada no
vesículas e púsculas aparecem na parte interna exame di rem com KOH;
dos pés. • ceratólise plantar: ocorre sob a forma de peque-
nas erosões ci rculares da camada córnea provoca-
Conforme a evolução clínica. a tinha pedis pode ser da por bactérias do gênero Corynebacterium;
classificada em: • eritrasma: causada pelo Corynebacterium
• tinha crônica dos pés: a pele é seca, hiperce- mmut1ssimum. Produz manchas eritematosas.
racótica. com incensa descamação e apresen- que depois se tornam pardacencas. com bordas
ta preenchimento pulverulenco dos sulcos da bem delimitadas e descamação. Geralmente
pele. Geralmente, é causada pelo T. rubrum. com localização interdigital.
Distribui-se preferencialmente na região plan-
tar e lateralmente, dando aspecto de "sapato
Mocasin"; Tinha manuum
• tinha aguda dos pés: aparecem erupções vesicu-
losas (1-2 mm) que podem se agrupar e formar É pouco freq üente. mas não rara. Geralmente aparece
bolhas (tinha bolhosa). Geralmente é unilateral. em paciente com tin ha pedis concomitantemente. Tipi-
pegando a planta e o cavum do pé. O agente mais camente aparece em uma das mãos. A descamação é di-
comum é o T mentagrophytes; fusa e parecida com a forma descamativa da tinha ped1s.
• tinha inflamada dos pés: geralmente é a evolução Tem as bordas bem delimitadas dentro da "munheca".
da tmha bolhosa e está associada à linfangite ou à O T rubrum pode causar tinha manuum un ilateral
celulite. Podem ocorrer no dorso do pé. junto com tinha pedis bilateral e recebe o nome de tinha
"1 mão 2 pés". Esta situação muitas vezes fala a favor de
Os indivíduos atópicos. por não terem reação celu- imunossu pressão e interessante é que esta forma de in-
lar, também não têm resposta inflamatória significativa. fecção não foi ainda explicada satisfatoriamente.
Normalmente, esses pacientes têm tinha pedis crônica Duas formas clínicas são observadas:
porque. somado ao fato de ter baixa resposta celular, • desidrose ou eczemarosa;
têm ainda a camada dérmica mais espessa que impede a • hiperqueratótica.
difusão dos fatores mibitónos séricos e também menor
quantidade de glândulas sebáceas secretando ácido un-
Diagnóstico diferencial
decilênico.
Em crianças. por terem pouca quantidade de quera- • dermame por contato irritatiVO crónico: chamada
tina nos pés. virilha e unhas. os dermatófitos são agentes de mãos dos "lava-pratos". Geralmeme ocorre nas
pouco comuns. Nos casos de tinha pedis em crianças. a duas mãos e sem bordas bem delimitadas;
espécie mais comum é o T. mentagrophytes, ao contrário • psoríase: são mais elevadas. bilaterais. mais erite-
do adulro. no qual predomina o T interdigitale. matosas. com lesões de psoríase em outras partes
do corpo. Fazer exame direro em caso de dúvida.
Diagnóstico diferencial

• maceração por hiper-hidrose dos pés: nestes Tinha faciale


casos o local se torna excelente condição para
crescimento secundário de fungos (geralmente É pouco comum. Ao exame físico aparece uma erup-
Candida), o que fica difícil diferenciar de tinha ção eritematosa na face, em geral ligeiramente assimétri-
pedis-interdigital; ca. Pode não ter a morfologia anular. mas normalmente

190 ( Medicina laboratorial para o clínico


tem as bordas bem delimitadas e serpiginosa. Pode haver Para estudar a ação dos fungos na unha, o prof. Ri-
púsrulas que dificukam o diagnóstico clínico. chardson, da Universidade de Glasgow do Reino Unido,
desenvolveu um modelo de 1nvasão da unha in vitro
por dermatófito, não-dermatófito e por leveduras. Ele
Diagnóstico diferencial
inoculou uma suspensão desses fungos na parte ven-
• dermatite seborréica: lesões simécricas e não são tral de fragmentos de un ha humana, que era incuba-
bem delimitadas; da a 28°( em placa de Petn esterilizadas. Por meio
• forodermatite: é simétrica e respeita as regiões de microscopia eleuônica. pôde-se observar que o T
protegidas pelo sol; mentagrophytes degrada completamente a lâm ina un-
• lúpus eritematoso: fazer raspado para descartar gueal. que a C albicans era capaz de se multiplicar-se
fungos. por brotamencos. mas era incapaz de invadir a lâmina
ungueal. O Fusarium formava canais através da matriz
ungueal. que permitia sua penetração na lâm ina un-
Tinha unguium - Onicomicose gueal. Asperglilus vers1color só conseguia chegar até a
camada intermediária da unha. Os fungos Acremonium
A invasão da unha causada por dermatófiros é de- sp. e Scopulariopsis brevicaulis não conseguiram invadir
nominada tinha ungwum em fungos não dermatófitos a unha nesse modelo. Chegou-se também à conclusão
de onicomicose. Porém, de modo geral. onicomicose se de que variações individuais de unha pod1am modular
refere a qualquer infecção da un ha. Geralmente, as infec- a patogenicidade do fungo adendo.
ções fúngicas da unha são secundárias à tinha dos pés. Existe consenso mundial que nas onicomicoses ela
Pode ser clinicamente classificada como: mão predominam as espécies de Candida e dos pés os
• superficial: denominada também de 1nvasão dermatófiros.
branca superficial ou leuconíquia uicofítica. por Normalmente, a infecção da tinha ungwum começa
formar ilhotas brancas por cima da unha. na queratina do hiponíquio e cai"T'inha para o leito un-
• subungueal: gueal e daí para a placa ungueal. A unha é sempre inva-
• distal-lateral; dida secundariamente a uma dermatofirose palmar ou
• proximal. plantar. Somente em crianças ocorre tinha ungwum sem
infecção da pele adjacente.
Quando wda unha está atingida. não se pode prever O T rubrum é comum na tin ha subungueal distal e
onde começou a infecção e denomina-se "onicomicose proximal das mãos. O T mentagrophytes tem mais po-
distrófica total". Tem-se como exemplo a invasão pelo der de invasão das unhas que o T rubrum, talvez por sua
Scytalld1um e a Cand1da. A onicomicose proximal é mais maior atividade enzimática.
rara e atinge planos mais profundos da unha. Melanoniquias causadas por fungos são ra ras e
Os dermatófiros podem causar todos os quatro tipos podem ser confundidas com melanon iquia longitu-
de invasão. O T mentagrophytes é o principal causador dinal causada por lesões melanocisticas, porém. o T
de onicomicose branca superficial. por invasão di reta em rubrum. e mais ra ramente o ScytalidJUm dim1diatum.
cima da unha através de enzimas cerarolíricas do órgão podem produzir também pigmenco preto difusível
perfurante. nas unhas.
Na tinha ungwum ocorrem h1perceratose. descola- Os fungos capazes de produzir melanoniquia são
mento do leito ungueal (onicólise). onicomadese. A uti- (modificado por Perrin e Baran):
lização da queratina pelos dermacófitos está clara, mas • Acrothecium mgrum;
por outros fungos hialinos ainda existem controversas. • Alternaria sp ;
As espécies de Fusarium e de Acremomum produ- • Cand1da sp;
zem invasão branca superficial clinicamente semelhante • Chaetomium kunze;
aos dermatófitos. já as outras espécies de fungo produ- • Fusanum oxysporum;
zem quase sempre invasão subungueal distal-lateral. • 1-/omodendrum e/atum;

Investigação labo ratorial das micoses superfi ciais e p rofu ndas 19 1


• Phyllostictina sydow; assimornaticarnente e ocorre em paciente com
• Scytalidium dimidiatum; pso ríase (10 a 50%). A psoríase afeta mais as
• Trichophyton soudanense; unhas das mãos que as dos pés, ao contrário
• T rubrum; das on icorn icoses. Podem estar com prome-
• Wangiel/a dermatitidis. tida todas ou algumas unhas. A o nicornicose
geralmente acomete uma única unha. As le-
Os princi pais fungos envolvidos nos casos de onico- sões mais caraccerísticas são pequenas fossetas
micose (não-dermatófiros) são: múltiplas pumiforrnes na rnarriz ungueal, pro-
• Scopulariopsis brevicaulis: é o único caso em que duzidas pela lesão psoriásica. No leito ungueal
se encontram con ídios no exame direw, por se en- aparece urna mancha pardacema semelhante à
contrarem dentro da placa ungueal, o que faz com mancha de azeire;
que a unha adqui ra cor de canela. O S. brevicaulis é • paroníquia: infecção da prega ungueal. A paro-
encontrado normalmente no solo, o que provoca níquia aguda geralmente é pelo Staphylococcus
onicomicose em un has dos pés de trabalhadores aureus e a crónica geralmente pela Ca ndida
que não usam sapaws; a/bicans. A Candida do complexo psilosis é ca-
• Scyta/idium dimidiatum confunde-se clinicamen- paz de utilizar a queratina como fonte de azow,
te com a infecção por T rubrum, porém causa podendo ser encontrada freqüentemente para-
comurnente paroníquia e onicólise intensa que, às sitando pele e un has, assumindo papel patogê-
vezes, podem causar rachadura transversal com nico. Na candidose ungueal, a unha não se torna
perda da lârn1na discai. quebradiça e não se observa massa ceratótica. A
onicomicose proximal pode aparecer secunda-
Qualquer ourro fungo hialino ou demáceo pode cau- ria mente à paroníquia por qualquer fungo, mas
sar onicornicose: Aspergillus (principal mente as espécies comumente é a Candida que faz esse caminho.
terreus e versicolor), Fusarium, Acremonium, Penicillium, Raramente a Candida provoca onicomicose su-
Pyrenochaeta ungwum hominis. perficial branca. Na paroníquia, as dobras periu n-
Para se provar que o achado desses fungos rem rela- gueais ficam com edema e erirematosas. com
ção com a infecção ungueal e não se rrata de coloniza- dor à pressão, podendo ou não sair pus (conta-
ção, é preciso isolá-lo repetidamente em cul wra e rer um minação por bacrérias);
exame direm positivo. O resultado da biópsia também é • traumati smo e envelhecimento ungueal.
importante, pois, geralmente, quando esses agentes co-
lonizadores passam a causar infecção, é sinal de que as
barreiras imunológicas estão alteradas ou alguma oucra Tinha capitis
doença está envolvida.
O diagnóstico das enfermidades da unha às vezes Como normalmente uma infecção do couro cabe-
pode ser rnuiw difícil, uma vez que urna mesma enfer- ludo se dissemina para os cabelos, a tin ha capitis ocorre
midade pode ap resentar quadros clínicos variados, assim junto com a tinha do pêlo do couro cabeludo e o termo
corno uma malformação pode simular várias doenças. A tinha capitis é utilizado muitas vezes para designar este
un ha pode ser afetada por várias doenças ou alterações acometimento.
fisiológicas, como: enfermidades cutâneas e sistêmicas, Os dermatófiws mais prevalemes são: M. canis, M.
rumores, infecções, problemas heredi tários, fatores físi- gypseum e Trichophyton tonsurans.
cos e aré drogas. Ao exame físico a tinha capitis pode apresentar-se de
rrês formas:
Diagnóstico diferencial • dermari te tipo seborréico;
• tin ha dos "pomos negros": tinha do pêlo endotrix;
• psoríase ungueal: ocorre hi perqueratinização • infecção grave com placas duras (querion), com
da matriz (engrossamento). Geralmente, cursa linfoadenopatia, pústulas e crostas cicatriciais.

192 ( Medicina laboratorial para o clínico ]1--- ----------------------------


Diagnóstico diferencial
pos graxas que aparecem no exame a fresco como
• alopecia areata (pelada): é idiopática, sem cicatri- "túneis", gotículas de gordura e bolhas de ar dentro
zação. Na periferia, os pêlos estão fraturados. com do pêlo. Ourros de rmatófitos podem também pro-
redução de pigmento e afinamento do talo. São duzir no couro cabeludo lesões semelhantes às cau-
chamados de pêlos "dignos de admiração". Aco- sadas pelo T. schoenleinii, como, por exemplo, o T.
mere o couro cabeludo em várias placas; Vlofaceum, T verrucosum, M. gypseum, porém esses
• dermatite seborréica (eczema seborréico): carac- fungos não invadem o bulbo.
teriza-se por lesões eritematosas e descamativas, As tinhas microspóricas (causadas por fungos do gê-
sendo as escamas tipicamente gordurosas e ama- nero Microsporum) e as tricofíticas (Trichophyton) são as
reladas. Sua aparição é concomitante ao acúmulo que têm a designação de "tinhas tonsurantes".
de atividade das glândulas sebáceas, com grau va- Variante da tinha tonsurante, o kerion cels1 é cons-
riável de prurido; tituído por uma lesão de tinha capitis que apresenta
• tricotilomania: é uma alopecia traumática auto- intensa reação inflamatória, com múltiplos abscessos
induzida. Ocorre o arrancamento ou fricção com- que drenam secreção purulenta. Pode provocar alopecia
pulsiva dos pêlos, por transtorno da personalidade. definitiva. Geralmente, tem como agente etiológico um
fungo geo ou zoofílico.
As tinhas ronsurantes tricofiticas geralmente dão alo-
Tinha dos pêlos o u tinea tonsurante pecias com placas irregulares, pequenas (da largura do
dedo mindinho), dispersas, com formação de crostas gor-
Corresponde, por tradição, à "tinha propriamente durosas e múltiplas. Já a tinha microspórica tem área de
dita". É a tinha responsável pela queda ou tonsura dos alopecia mais intensa, mais definida e mais regular, com
cabelos do couro cabeludo. No adulto, pode se esten- tendência ao acantoamento e geralmente placas únicas.
der ao pescoço e face. A invasão do pêlo começa no Sua superfície é geralmente descamativa não-inflamatória
hostium folicular. A hifa fúngica abandona o estratO (exceção M. canis) e tem evolução mais rápida que a tri-
córneo e progride descendentemente dentro do espa- cofitica. Às vezes pode aparecer a "placa mãe", com mais
ço virtual. formado entre a bainha externa e a interna do duas ou três lesões, raramente mais de quatro. Aqui cabe
pêlo em direção ao bulbo, retirando os seus nutrientes o auforismo: "pequenos esporos, grandes placas".
do canal folicu lar. Na tinha microspórica (ectotrix), o pêlo aparece ron-
Existem três tipos de tinhas do cabelo: tinha favosa, surado a 2 mm acima da implantação e tem descamação
tinhas ronsurantes microspórica e tricofítica. do couro cabeludo. Vão, portamo, aparecer "toquinhos"
A tinha favosa ou alopeciame ou crostosa é cau- de cabelo, podendo ser apanhados com os dedos e ar-
sada pelo T. schoenleinii e hoje é rara. Ela tem caráter rancados aos tufos.
intrafamiliar, progride pela idade adulta e geralmen- A tinha tricofítica (endotrix) produz o parasitismo
te ocorre por falta de higiene. Por ser uma infecção denominado de "pomos negros", porque cortam os ca-
crônica, ao chegar à 1dade adulta aparecem lesões belos na superfície, deixando as pontas dos cabelos que-
exofíticas com crostas que se agrupam conhecidas bradas por debaixo do couro cabeludo, por isso os pêlos
por javus (semelhante ao favo de mel), de aspecto parasitados não podem ser apanhados da placa de alo-
cerebriforme e odor característico de "urina de rato". pecia com uso de pinça e sim pelo escalpelo, para retirar
Produz sinal característico designado por godet, que é as raízes dos folículos, por raspagem. Muito raramente
devido à aglomeração de micélios fúngicos em volta podem causar alopecia permanente.
do orifício folicular, e tem o aspecw do "pires da xíca- A tinha microspórica só aparece em crianças, porque
ra". Na tinha favosa, o bulbo é atingido e o cabelo não a partir dos 13 anos ela é impedida pela ação fungicida
cresce mais, dando uma alopecia definitiva. Na tinha de cercos ácidos graxas de cadeia longa produzidos pelos
fávica, a hifa do fungo não se fragmenta, provocando hormônios gonadais. As causas mais comuns de queda
parasitismo filamentoso endotrix, que é exclusivo do de cabelos depois da puberdade é um foco inflamatório
favo. Quando as hifas envelhecem, dão origem a cor- no dente, sinusite, sífilis, etc.

Investigação laboraro rial das micoses superficiais e profundas 193


Os hormônios gonadais, mais especificamente os an- e por isso os filamentos são dificilmente vistos e apare-
drógenos, controlam não só as glândulas sebáceas, mas cem só os conídios ao exame microscópico.
também a unidade piosebácea. O tamanho e a atividade O M. canis produz parasitismo do tipo ectotrix cor-
secretora das glândulas sebáceas no recém-nasCidos estão ta ndo o cabelo a 2 mm do couro cabeludo, dando flu-
aumentados devido à influência dos hormônios maternos, orescência verde claro brilhante quando irradiadas com
porém com poucos meses red uzem de Eamanho. Depois, lâmpada de Wood. A fluorescência é devida ao meta-
voltam a hipertrofiar-se na pré-adolescência. por ação de bolismo do fungo. Ocorre produção de "pter1dina" que
andrógenos supra-renais, e alcançam seu tamanho defini- fluoresce, e não o fungo em si. A tinha cricofícica, por ser
tivo na puberdade por ação de andrógenos gonadais. endotrix, não fluoresce e geralmente dá reação inflama-
Não confundir tinha tonsurante com a "pelada" (alo- tória, as placas de ronsura são encobertas por escamas
pecia areata), que não é micótica nem contagiosa e ataca esbranq uiçados aderentes que, quando retiradas, apare-
os indivíduos em todas as idades. Nesta o couro cabelu- ce o eritema; e é de evolução longa, podendo a inflama-
do é nu e lim po, sem cabelos e sem alteração da epider- ção. em certos casos, evoluir para o kerion ce/si.
me. Na tinha microspórica, há escamas que permitem O T rubrum é antropofílico e raro no cabelo, atacan-
reconhecerem-se as placas à distância. Tocando com os do mais o couro cabeludo.
dedos, há a sensação dos pêlos de uma escova, pela pre-
sença de pêlos partidos.
Geralmente, até os seis anos predomina o M. cams. IDENTIFICAÇÃO
A tinha microspórica cura-se até 14 anos e a tricofiti- LABORATORIAL DOS DERMATÓFITOS
ca prolonga-se um pouco mais, até os 17 anos.
O parasitismo da tinha microspórica é ectotrix (fora do Para identificar os dermacófitos, usa-se a pesquisa di-
pêlo). As hifas imrafoliculares, ao atingirem a zona cerato- reta em KOH e cultura.
gênea do pêlo, emergem para a superfície da haste pilosa.
fragmentando-se em aruoconídios que envolvem o pêlo
formando uma "bainha de conídios", parecendo "areia fina". Pesquisa direta
Os cabelos, quando examinados sobre fundo escuro, mos-
tram uma capa branca acinzentada na posição inferior, até O exame direta é feito entre lâmina e lamínu la com
03-04 mm acima do couro cabeludo. Este aspecto, quando KO H a 20%. A potassa cem por final idade a desagrega-
imenso, pode ser visto na própria cabeça. daí ser a placa ção das células e a dissociação da queratina, funcionan-
microspórica esbranquiçada. Portamo, o tipo de placa e de do como clarificador. A parede celular dos fungos resiste
tonsura permite o diagnóstico de tinha microspórica. à potassa. cujo tem po de ação varia com a natureza do
Na tin ha tricofítica, o parasitismo é endotrix (dentro material. Nos cabelos deve-se deixar mais ou menos 10
do pêlo). As hifas imrafoliculares não emergem na su- minutos; em escamas de pele e em raspados subungue-
perfície. fragmentando-se em aruoconídios dentro do ais, em torno de 15 minutos até várias horas ou de um
pêlo. Sabouraud descreveu como "sacos cheios de no- dia para o outro, em câmara úmida, no caso de fragmen-
zes". Aparecem no cabelo "filamentos", ou seja, rosários to de unha (Figura 19.3).
paralelos de esporos grandes, enchendo todo o interior Na tinha fávica, na qual se observam bolhas de ar
do cabelo, sem passar para a cutícula. Os esporos com com túneis ocupando os espaços vazios deixados pelos
cadeia de células quadrangulares, em bora maiores que micélios desa parecidos (são vestígios do fungo), não se
a microspórica, são idênticos na forma e no volume e deve deixar a potassa agindo muito tempo para depois
ordinariamente contíguos. examinar, mesmo porque os fragmentas dificultam a
O pêlo é sempre invadido igualmente, tanto na forma observação. Deve-se olhar quase de imediato.
endotrix como na ectouix, só que na ecrorrix o fungo No exame direto deve-se ter cuidado para não con-
torna a sair e na endotrix não. Nas duas formas, as hifas fu ndir hifas com artefatos, principalmente os formados
imernas se degeneram com o crescimento do cabelo. O pelo cimento intercelular da epiderme quando dão cris-
cabelo se quebra acima da zona de esporulação primária tais de colesterol.

194 [ Med icina laboratorial pa ra o c línico )1-- -- - - -- - - - - - - - - - - - - - - -- - -- - -- -


Para se examinar entre lâmina e lamín ula a micro- qual o pH é neutro (6,9) e a glicose está em menor con-
morfologia do crescimenco miceliano, usa-se o lactofe- centração (2%). Este meio é mais favorável ao desenvol-
nol azul de algodão, que tem a propriedade de corar a vimento de certos fu ngos, embora tenha menos ação
hifa. O ácido lático preserva as estruturas que são mor- inibidora sobre as bactérias. Para corrigir este problema,
tas pelo fenol e coradas pelo azul de algodão, podendo- Emmons acrescentou cloranfen icol ao meio. Para evitar
contaminação por fungos saprófitos, usa-se para cultu-
ra de dermatóficos o meio de Sabouraud acresCido de
cicloheximida (actidione) a 400 mg/dl, além de cloran-
fen icol a 50 mg/dl e glicose a 1% e pH neutro. Esse meio
pode ser encontrado já pronto, pelo nome comercial de
Micosel® ou Micobiotic@
Existe também o mero de DTM (dermatophytes test
medium) que, em síntese. é o micosel acrescido do ind r-
cador vermelho de feno l. O dermatófito, ao crescer, alca-
liniza o meio, virando o indicador para vermelho. O DTM
possui pepcona, ága r, glicose, antibióticos e indicador de
pH, porém os antibióticos são gentamicina e tetraciclina.
É importante que o DTM seja lido até uma semana
Fr ura 1 3 A Escamas dérmrcas de unha clarificadas com KOH ou após ser observado o primeiro crescimento, por-
20%. Hifas sepcadas e arcoconídros (400X).
que muitos "não-dermatófitos" podem eventualmen-
te crescer e produzir a cor vermelha. O DTM serve,
portamo, de rriagem e não de meio de identificação
dos der matófitos. Deve-se sempre lançar mão das ca-
racterísticas microscópicas da colônia. já que alguns
fungos saprófi tas podem crescer e produzir viragem
do indicador no DTM numa incubação mais pro lon-
gada (Aspergillus, Alternaria, Acremonium, Fusarium,
Scopulariopsis, VertiCJIIium, T terrestre, T fische ri e al-
guns Chrysosporium). Como esta medida é feita de
praxe na identificação do dermatófico, não se trata de
um rrabalho a mais.
Dispõem-se de poucas provas bioquímicas para iden-
tificação dos dermatófitos, porém a marona das espécies
b Escamas dérmrcas de unha clanficadas com KOH
dispensa seu uso. Ao examinar uma placa de cultura, de-
20%. I frfas sepradas e arroconídros (400X). Ve1 póg111a 195
ve-se procurar colônias brancas algodonosas e pigmen-
tação. Ainda se pode usar: penetração em cabelo, o ágar
Cultura
vitaminado para Trichophyton e o cultivo em lâmina.

Os dermácofitos são identificados pelas caracterís-


ticas macro e microscópicas das colônias. O meio de MICOSES SUBCUTÂNEAS E PROFUNDAS
cultura padrão para crescimento desses fungos é o ágar
Sabouraud dexrrose, que possui o pH ácido (5,6) e alto MICETOMA
teor de glicose (4%). Estes dois fatores, pH baixo e alta
tensão superficial devido à concentração da glicose, im- Apesar do termo micetoma ter sido criado por Van-
pedem o crescimento de bactérias. Atualmeme, o cul- dyke Carter em 1860 significando "tumor causado por
tivo é feito em Sabouraud modificado por Emmons. no fungo", ele tam bém pode ser provocado por bactérias

Investigação laboratorial das micoses superficiais e profundas 195


PATOGENIA
filamenrosas (acrinomicecos). Quando causado por fun-
gos (eumicecos) hialínos ou demáceos. provoca o mi-
cecoma verdade1ro ou eumicecoma. Quando o agente Geralmente, o fungo é implantado por traumatismo
é uma bactéria aeróbica do grupo dos actinomiceros e não é transmitido 1nter-humanos. É quase constante
(Nocardia, Streptomyces. Actinomadura), recebe o nome a formação da tríade: rumefação (nódulos). fístula com
de aninom1ceroma. Tanro as bacrérias como os fungos drenagem seropur ulenra ou serossanguinolenta e pre-
causadores de micetama são organismos que vivem no sença de grãos. que são microcolônias do agente infec-
solo e nos vegetais. cioso e podem ser pigmentados.
Infecção bacteriana endógena causada por uma bac-
téria anaeróbia do gênero Actinomyces (actinobacteriose
anaeróbia), saprófita da cavidade oral em humanos (A ClÍNICA
tsrae/11) e do gado (A bovis), recebe o nome inapropriado
de actinomicose devido à sua semelhança com os fun- É uma doença crónica, subcutânea, podendo atingir
gos. Ela produz grão e pode ocasionalmente fisrulizar os ossos. O eumiceroma é mais podal e unilateral, ocor-
semelhantemente aos micetomas. rendo em 80% dos casos nos pés; já o actinomicewma
A borriomicose é clinicamente muito semelhante pode atingir qualquer localização do corpo, sendo o tó-
ao micetoma, só podendo se diferenciar por exames rax o mais comum. A radiografia pode revelar sinais de
laboratoriais, que esclarecem o ripo de agente micro- osreomielire. sendo que o acrinomiceroma atinge mais
biológico envolvido. A borriomicose é causada prin- os ossos com lesões destrutivas (osteólise) e o eumice-
Cipalmente pelo Staphylococcus aureus, Escherichia roma faz apenas uma invasão focal. As lesões em ambos
coli e Pseudomonas aeruginosa. Ocorre mais comu- os casos podem se estender aos músculos, articulações e
mente no animal após a castração e mais raramente tendões. As lesões sofrem, com a evolução do processo.
no homem. uma rumefação deformante e endurecem.
Winslow classificou os micetomas e a borriomico- Normalmente, o processo bacteriano (actlnomiceto-
se como "infecções granulares", por serem produtoras ma) é mais inflamatório e supurativo, com secreção mais
de grãos. abundante que o processo micórico (eumicetoma), que
produz mais fibrose e menos secreção serossanguinolenta.

EPIDEMIOLOGIA
DIAGNÓSTICO LABORATORIAL
O eum1ceroma ocorre em pacientes que v1vem na
zona tropical e temperada, onde o cl ima é quente, É muito difícil diferenciar clinicamente eumiceroma,
com índices altos de pluviosidade ou quente e seco accinomiceroma e a bocriomicose. só sendo possível pe-
tipo desértico. O acrinomicetoma, entretanto, é cos- los exames laboratoriais.
mopolita. Material usado é a secreção drenada da fiscula e a
No eumiceroma, vános fungos estão envolvidos. biópsia do nódulo. O exame anaromoparológico (hema-
respeitando-se a incidência fúngica regional. No Brasil. toxilina e eosina - HE) dos eumiceromas revela presença
o actinomicetoma é predominante, sendo raro o eu- de hifas fúngicas rodeadas pelo fenômeno de Splendore-
micecoma. Hoeppil e também de grãos.
Raramente ocorre micetoma em crianças e ido- A coloração de Gram cora os grãos de accinomicecos
sos, sendo mais comum na faixa de 20 aos 50 anos e com suas estruturas fi lamentosas.
principalmente em homens (cinco homens para uma No exame direto, pode-se pesquisar canto a existência
mulher). de hifas como de grãos. que podem variar de coloração
Os principais agemes causadores de eumicetomas são: branca. rosa-amarelada, vermelha. preto-amarronzado.
Madurei/a micetomatis, Madurei/a gnsea. Acremomum Como regra geral. os fungos pretos produzem grãos
spp., Scedosponum apiospermum. entre outros. pretos e os fungos brancos grãos brancos; já as bactérias

196 [ Medicina laborarorial para o clínico


podem produzir grãos brancos. amarelos e vermelhos. A como veículo, não se multiplicando neles. Existem tam-
idencificação do ageme é feita por meio da cultura. bém em fezes de batráquios, camaleão e largatos.
Os agentes etiológicos são relativos às formas clínicas:
• forma subcutânea: Basidiobolus ranarum;
TRATAMENTO • forma cemrofacial: Conidiobolus coronata;
• forma visceral: ConidJobolus inconcruns.
No caso dos eumicetomas, o tratamento geralmente
é insatisfatório. respondendo muiro mal aos antifúngi-
cos. Os corticóides associados promovem sensível me- CLÍNICA
lhora clínica.
Os actinomicetomas respondem bem à terapia com Geralmente, acomete pacientes imunocompeten-
sulfa. A associação sulfameroxazol-uimetropim com tes. A forma subcutânea é comum em crianças e rara
amicacina tem obtido ótimos resultados. em adulros, sendo o sexo masculino mais acometido.
A ressecção de tecidos é de grande auxilio, com re- Causam um cumor mixemaroso que se inicia com nó-
sultados compensadores. Não raro a amputação se faz dulos subcutâneos bem aderidos a planos profundos,
necessária. levando à deformação qualquer parte do corpo. Os nó-
dulos são quentes e dolorosos, mas raramente causam
febre e adenopatias.
ZIGOMICOSE A forma centrofacial ou rinoficomicose começa
por inalação do esporo fúngico ou por implantação
Os fungos asseptados (cenocíticos) de interesse clíni- direta na mucosa por traumatismo. Forma uma mas-
co pertencem a duas ordens: sa indolor de tecido nasal, que pode se desenvolver e
• mucorales: causadores de mucormicose; desfigurar toda a face. Não atinge criança, sendo quase
• ento moftorales: causadores de entomofroro- exclusiva de adulto. Podem ocorrer rinite e epistaxe e se
micose. propagar ao palato e seios faciais. O tratamento é com
azólicos, principalmente cetoconazol, sulfametoxazol-
Na clínica médica, a entomofroromicose é mais rara, trimetropin e iodeto de potássio, podendo haver cura
sendo a mucormicose a entidade clínica mais comum e espontânea. Quando se têm lesões isoladas. pode-se
usada como sinónimo das doenças causadas pelos mu- fazer a exérese cirúrgica.
corales. Em 1976, Ajello et ai. sugeriram a mudança do A forma visceral acomete tanto crianças como adul-
termo mucormicose para zigomicose. tos. Produz náusea, vômiros. dor abdominal e diarréia
Os mucorales são patógenos respiratórios e dissemi- mucossanguinolenta. porém é uma doença rara.
nam-se; os entomoftorales são causadores de infecção
subcutânea e raramente se disseminam.
Os fungos pertencentes à ordem mucorales se encon- DIAGNÓSTICO LABORATORIAL
tram na pele, nas mucosas do homem e no meio ambiente,
causando decomposição de matéria orgânica. Já os da clas- O exame anaromoparológico apresenta caracteris-
se emomoftorales encontram-se relacionados com maté- ticamente hifas cenocíticas (asseptadas) geralmente cir-
ria orgânica em decomposição ou em fezes de répteis. cundadas por colar eosinofílico (fenômeno de Splendore-
Hoeppli). O exame histológico deve ser sempre seguido
pelo exame micológico para afastar possível dúvida de
ENTOMOFTOROMICOSE contaminação ambiental. Na cultura, o Basidiobolus
exibe balisrosporos, que são ejetados violentamente e
A parogenia dessa doença não está bem esclarecida possuem esporangiosporos globosos. Os de Coniobolus
quanto ao modo de infecção e parogenicidade do fungo. também são ejetados, porém têm conídios grandes com
O fungo habita insetos coprófagos. utilizando-os apenas papilas basais arredondadas.

Investigação laboratorial da s micoses superficiais e profundas 197


ZIGOMICOSE · MUCORMICOSE
queimaduras e contaminação de ceraroses oclusivas.
Produzem nódulos necróticos, úlceras preras ou placa s
Causada p or fungos da ordem mucorales, cem com bordas vermelhas.
como pnncipal espécie o Rh1zopus arrhizus, que A forma ri nocerebral é a que mais ocorre e também
ocorre em 60% de rodos os casos. São fungos opor- é a m a1s dramática das infecções fúngiCas. sendo geral-
tunistas cujos gêneros principaissão: Rhizopus. Mucor mente facal. O principal ageme é o R. oryzae em 90% dos
e Absidia. Acomete p acienres com queda imunoló- casos. A lesão se in1cia na cavidade nasal. seguida da inva-
gica e rem como fawres pred isponentes a gravidez. são retro-orbirária, chegando ao cérebro com produção
uremia. desnutrição. rransplanres. leucemias. AIDS. de um exudaro negro. O corre em casos de cetoacidose
diabetes meliro complicada, uso de corcicóides e que- diabética ou mais raramente em doenças crônicas com
lances do ferro, em que o fungo utiliza o ferro ligad o acidose mecabólica.
a ele ou qualquer outro faror que leve a um quadro Os princ1pais agentes na forma sistêmica são: R.
neurrop ên ico. São as infecções fúngicas de evolução microsporus, Rh1zomucor pusslius, R. oryzae e Saksenae
mais fulm1nanre entre wdas. vesljorm1s. A penetração do fungo é principalmenre
pela 1nalação, porém pode ocorrer ingestão ou
penetração direra na pele. Ocorre em pacienres com
EPIDEMIOLOGIA granulocitopenia. Afeta pulmão. aparelho digestivo e
outros órgãos. No pulmão causa hemoptise e pode levar
Os mucorales são fungos que vivem em estado sa- à morre por ruprura de uma ve1a ma1or. Normalmente,
profítico no organismo humano. no meio ambiente, no é necessária a biópsia pulmonar. A infecção secundána
ar. no solo, nos alimentos e materiais orgânicos. cerebral é d1ferenre da forma rinocerebral. pois aparecem
m últ iplos focos no coração e geralmenre o paciente
morre de infarto.
PATOGENIA

Os mucorales produzem esporos que causam infec- DIAGNÓSTICO LABORATORIAL


ção respiratória. Devido à incompetência ou diminuição
dos neutrófilos. ocorre Significativa mulnplicação das Geralmenre. usam-se a pesquisa h1sroparológica eo
hifas onundas dos esporos. causando uma invasão de exame micológico do exsudado ou da bióps1a. A colera
grand e propensão dos vasos sanguíneos. com conse- do material deve ser realizada na borda da lesão.
qüente trombose. isquem ia. infarto e hem orragia devida O exame direro aJuda a descartar uma possível sus-
à t rombociropenia. Geralmente, produzem um exudato peita de contaminação, na qual o fungo aparece com
negro e lesões necróticas com grande resistência aos an- hifas grossas, assepradas, geralmenre em ângulos próxi-
tifúngicos e alta mortalidade. mo de 90°. Porém. no caso do escarro, o exame d1 reto
e a cultura são geralmente negativos e deve-se fazer a
lavagem broncoalveolar. Em pacientes com mfilrrado
CLÍNICA pulmonar e febre com lavado brônquico positivo. não se
deve pensar em conraminação e, se for negatiVO, deve-se
Três formas clínicas podem ser observadas: fazer uma pesquisa mais invasiva.
• cutânea; No exame histológico corado com hematoxilina-eo-
• rinocerebral; sina aparece o fenômeno de Splendore-Hoeppli. Porém,
• sistêmica ou visceral. os melhores resultados se con segue com colorações ar-
gênricas que coram a parede do fungo.
A forma cutânea como infecção primária é rara. Ge- A culrura pode ser feira no Sabouraud. sem ciclohexi-
ralmente, ocorre por traumat ismo, contaminação cirúr- m ida. A temperarura ótima é 3o·c. com crescimento em
gica. contaminação de ulcerações, picadas de insetos, torno de quatro dias. Não mascerar o material para não

198 ( Medicina laboraroria l para o clínico


romper as hifas que são asseptadas. podendo escoar seu
moplasma e morrer.
O fungo consegue crescer a 3rC. o que favorece a se-
paração de o urros fungos pacogênicos. O R. rhizopodiformls
(15% dos casos de mucormicose) cresce bem a 50°C. Ou-
tros fungos com clín1ca parecida são: Asperg1llus, Fusarium,
Pseudallescheria boyd1i.

TRATAMENTO

Os azólicos são ineficazes na mucormicose. Usa-se a


anfotericina-8 junco com a correção da doença de base Figura 19.4 - Phialophora verrucosa. Ver prcmcl1a cofo11da
e exérese drástica. O rratamemo com oxigênio hiperbá-
rico pode ter ação fungistática e tem grande potencial EPIDEMIOLOGIA
como rratamenco adjumo.

É uma doença de distribuição mundial, sendo mais


CROMOBLASTOMICOSE comum nos países tropicais e subtropicais.
No Brasil, 97% dos casos são causados pela espécie F.
É uma micose crônica da pele e do tecido subcutâ- pedrosi (Amazônia, Rio Grande do Sul, São Paulo, Rio de
neo causada por cinco espécies de fungos dematiáceos janeiro e Minas Gerais) e, na Venezuela, Cuba e Austrália,
saprófitas do solo. São eles: pela C carrionii. É uma doença rural, cujo contágio ocor-
• Fonsecaea pedroso/; re por traumatismo com madeira ou vegetais. Não exis-
• Fonsecaea compacta; te, até o momemo, relaco de comágio inter-humano.
• Phialophora verrucosa (Figura 19.4);
• Cladophialophora carrionii;
• Rhinocladiella aquaspersa. PATOGENIA

A denominação de cromomicose foi adocada em O fungo, após inoculado na pele, propaga-se por via
1935, sugerida por Moore e Almeida. O primeiro caso linfática e rarameme por via sanguínea, por conseguinte,
descrico com as características clínicas da doença foi em é rara a dissem inação para outros órgãos, a não ser em
1914, em Minas Gerais, na cidade Estrela do Sul, pelo mé- casos de paciemes imunodeprimidos ou portadores de
dico alemão Max Rudolph, que trabalhava numa com- doenças graves. A partir do pomo de inoculação, vão
panhia de m1neração. aparecendo as lesões características da doença.
A doença se confunde com feohifomicose, que tam- A evolução é lema, produzindo fibrose tecidual e
bém é causada por fungos negros, porém. no tecido se prejuízo da circulação linfática, provocando elefancíase,
encontram hifas de cor castanho escuro e não "corpos geralmeme nas pernas, o que pode levar a confundir
muriformes" característicos da cromoblascomicose. Os com a filariose.
corpos muriformes (denominação dada em 1984 por
Matsumoco et a/.) eram chamados incorretameme de
"corpos fumagóides" ou corpos escleróticos. São estru- CLÍNICA
turas acastanhadas em forma de moeda, com diâmetro
de 5 a 12 e representam a forma dimorfa da hifa no As lesões são mais comuns nos membros inferiores,
tecido parasitado, onde sofrem septação celular em mais principalmente nos pés, onde o traumatismo por espi-
de um plano. nhos e gravecos é mais comum.

Investigação laboratorial das micoses superficiais e profundas 199


Os achados clínicos podem ser muico diversificados, gigantes. Deve-se usar a coloração de HE e ácido peri-
podendo ocorrer as seguintes formas clínicas: ódico de Schiff- PAS, pois no Grocott o fu ngo perde a
• placas: é a forma mais comum, sendo lesões pla- característica acastanhada.
nas e eritemaro-escamosas, podendo produzir A cultura e o exame histológico devem sempre nor-
secreção serossangu inolema, confundindo-se, às tear o processo de cura.
vezes. com as formas verrucosas da esporocricose
e leishmaniose;
• nodular: são nódulos violáceos, macios, lisos, es- TRATAMENTO
camado ou verrucoso, que vão crescendo lema-
mente; O tratamento é difícil e prolongado, com possibili-
• tumoral: nódulos são papilomacosos ou lobu- dade de recorrência. Normalmente, faz-se assocração de
lados, cobercos por crostas e escamas, dando o amifúngicos. HoJe o itraconazol passou a ser o amifúngi-
aspecm de couve-flor. Pode confundir com para- co de primeira escolha.
coccidiodomicose; Pode-se fazer a crioterapia ou excisão cirúrgica no
• verrucoso: geralmente hiperceratótico; caso de lesões pequenas.
• cicatricial: as placas vão se curando no centro, le-
vando a uma cicatriz arrófica ou hipemófica, que
lembra a sífilis terciária. FEOHIFOMICOSE

As formas queloidianas são mais raras. Feohifomicose pode ser considerada mais como uma
As diferences formas clínicas podem estar presentes entidade patogénica do que uma doença com caracte-
ao mesmo tem po em um paciente. rísticas clínicas próprias e produzida por uma espéc1e
de fungo definida. In icialmente. foi proposta esta deno-
minação para englobar de maneira mais fáci l a grande
DIAGNÓSTICO LABORATORIAL quantidade de fungos negros causando a doença.
Segundo Sampaio (1974), é uma doença cutânea ou
O diagnóstico clínico pode ser confirmado pelo acha- subcutânea raramente sistémica, causada por vários fun-
do dos corpos muriformes no exame a fresco com KOH gos dematiáceos que se apresentam no tecido em for-
20% ou na biópsia. onde o material é mais representativo ma de hifa septada acastanhada. células leveduriformes,
por ser mais profundo. Na hora de colher o raspado da pseudo-hifas. podendo ou não aparecer os corpos mun-
lesão. deve-se procurar os pomos precos. que são micro- formes. Ajello. também em 1974, definiu feohifomicose
hemorragias chamados de pomos de "pimenta caiana" e nesses termos e em 1983 McGinn is ampliou o conceito
é onde se encontram mais corpos muriformes que são incluindo em feohifomicose todas as doenças causadas
aí drenados anavés de microfíswlas (eliminação transe- por fungos negros. inclusive as micoses ma1s superficiais
pitelial do fungo). como Piedra negra e tinha negra; as cutâneas: ceratite
O cultivo micológico poderá esclarecer a etiologia micótica, onicomicose, dermatomicose e tam bém as
da espécie fúngica envolvida. Os fungos causadores da sistém icas com quadros septicêmicos. Porém. este au-
cromomicose têm a característica de não serem inibidos ror sugere que denominações consagradas como, por
pela cicloheximida usada para inibir fu ngos saprófitas exemplo, tinha negra e P1edra negra, sejam consideradas
nos meios de culwra, diferentemente dos fungos causa- variedades de feohifomicose. Portanto, feohifomicose
dores de feohifomicose. Para classificar a espécie de de- fica quase que restrita aos cistos feohifomicóticos subcu-
mateáceo, é sempre necessário fazer o microcultivo para tâneos. Em 1991, o subcomitê de nomenclaw ra de mi-
escudo micromorfologico, devido à grande semelhança coses da Sociedade Internacional de Micoses Humanas
macromorfológica enrre eles. e Animais definiu como qualquer infecção humana ou
O exame hisrológico mostra reação granulomatosa animal causada por fungos dematiáceos, com exceção
e presença de corpos muriformes no interior de células da cromoblasrom1cose.

200 ( Medicina laboratorial para o clínico


EPIDEMIOLOGIA
mente, o microcultivo deverá ser feiro para identificação
da espécie.
É uma doença que ocorre em rodo o continente, Nos exames hisrológicos, HE e PAS são indicados, de-
com predominância nas regiões tro picais. Ocorre mais vendo-se evitar a coloração de Gomori-Grocott porque
em homem do campo na idade de trabalho ativo. esconde a cor acastanhada da hifa.

PATOGENIA TRATAMENTO

Tendo como foco o cisto feohifom icótico, vai Varia com a localização, quadro clínico e tipo de fun-
ocorrer por inoculação do fungo, que é geralmente go envolvido. A exérese cirúrgica é usada para nódulos
saprófita do solo, através de traumatismo com frag- e abscessos, podendo curar o paciente. O cecoconazol
mentos de vegetais ou outro instrumento de traba- tem sido considerado uma boa droga de escolha nesses
lho qualquer. casos. Para lesões extensas e formas sistêmicas, usa-se a
anforericina B. Para uso prolongado, o itraconazol está
sendo pesquisado.
CLÍNICA

Pode haver quadros agudos e crónicos, porém o ESPOROTRICOSE


cisto é geralmente crónico. Os cistos subcutâneos são
geralmente únicos, unilaterais, moles, flutuantes, sem Das micoses de localização subcutânea, a esporo-
reação inflamatória, não produzem adenite e gomas, tricose é a única que possui só um agente etiológico
porém, podem ulcerar e drenar uma secreção purulen- específico: o Sporothrix schenckii. t um fungo dimór-
ta contendo hifas demáceas. Não raro aparecem lesões fico e na natureza se apresenta como filamento e no
tipo abscesso ou em placas. A evolução pode durar paciente como levedura em forma de charuto. Causa
anos. A imunodepressão pode ser um fator predispo- infecção subaguda ou crónica com lesões nodulares e
nente. A forma sistêmica geralmente tem como porta úlceras na via linfática da pele e raramente nos órgãos
de entrada o pulmão, sendo fígado, baço e pâncreas internos.
normalmente atingidos e a maioria dos casos ocorre
em im unodeprimido. O Cladosporium batianum, fu n-
go negro saprófita do solo, tem muita afinidade pelo EPIDEMIOLOGIA
sistema nervoso central. principalmente pelas menin-
ges e os hemisférios cerebrais. O Sporothrix pode ser encontrado no meio am-
biente em todo o mundo, sendo muito comum nas
Américas, principalmente no Brasil. Foi muito comum
DIAGNÓSTICO LABORATORIAL na Europa, hoje raro. Vive saprofiticamente no solo e
nas vegetações. É encontrado nas cascas das árvores,
Pode ser feico pelo exame micológico e hiscológico. espinhos, na terra e em todo lugar que tenha decom-
No exame direco aparecem hifas escuras com aspecco posição de matéria orgânica. É uma doença de cunho
torulóide. A cultura é feita com Sabouraud simples e ocupacional, ocorrendo em jardineiro, trabalhadores
acrescida de cicloheximida que, apesar de ser inibidor rurais, madeireiros, etc. Animais que se alimentam de
de fungos dematiáceos, quando permite o crescimento fr utas e se agarram nas árvores para subir podem ad-
de alguma espécie, serve como meio de identificação. O quirir e transmitir a esporotricose quando arranham o
Cladosporium batianum, por ser termorresistente, pode homem ou outro animal. Aves da família dos psirací-
ser criado colocando-se a cultura em 42°C. Como roda deos (araras, papagaio, etc.) podem tam bém transmitir
cultura de fungos demáceos se parece macroscopica- a doença pelas bicadas.

Investigação laboratorial das micoses superficia is e profunda s 201


PATOGENIA
primária, ou pelo traro gascrinrestinal por ingestão do
fungo, que depois ganha a via sanguínea. A hemocultu-
Produz na pele lesões piogênicas e granulomawsas. ra é positiva. As lesões cutâneas são variadas e de d ifícil
Após a inoculação do fungo, rem período de incubação diagnóstico, lembrando sífilis, tuberculose cutânea ou
de sere a 90 dias, numa média de crês semanas. Às vezes, outras doenças infecto-contagiosas. As lesões cutâ-
dependendo do tipo de craumatismo ou da reação do neas disseminadas são assimomáticas, porém, a forma
organismo, pode se estender até seis meses. A exposição exrracutânea é geralmente fatal devido à demora no
contínua e/ou freq üente ao agente pode produzir infec- diagnóstico cl ínico.
ções subclínicas e o aparecimento de sensibilidade tardia.

DIAGNÓSTICO LABORATORIAL
CLÍNICA
A pesquisa direta a partir da biópsia normalmente
A espororricose pode causar crês tipos de quadros não demonstra o fungo, porém, raramente podem ser
clínicos: encomradas leveduras em forma de charuto ou disfor-
• forma cutânea localizada; mes. Quanto à cultura, é de fácil recuperação do fungo
• linfangire crônica (Figura 19.5); e pode ser feira em raspado profundo, ou melhor, ainda
• dissemi nada. do tecido biopsiado. O fungo tem esrerigmas e hifas finas
semelhantes aos fios de cabelo, o que deu origem ao seu
Forma cutânea localizada: ocorre em 40% dos casos nome (trichum = pêlo). O Sporothrix cresce em torno de
de esporocricose. Forma uma lesão cutânea única no lo- quatro dias e a cicloheximida não inibe seu crescimento.
cal da inoculação, sem nódulos na via linfática. A lesão A colônia é aderente ao meio de cultura, com aspecto
clínica é wtalmeme inusitada, podendo ter lesão pápulo- coreáceo e vai se cornando marrom e depois preta com
nodular. úlcero-vegerame e verrucosa, placas escamosas, o envelhecimento.
lesão abscedada e outros tipos clínicos, confundindo-se, No exame histopacológico corado com hemaroxilina-
às vezes, com doenças de várias etiologias e levando a eosina aparecem os corpos asteróides que são caracterís-
um diagnóstico diferencial muico difícil. ticos, porém não parognomônicos da esporotricose.
Linfangite crônica: ocorre em 60% dos casos. A Dos restes imunológicos, a soroaglurinação do látex
parcir da lesão inicial onde se forma o cancro de ino- é o de primeira escolha, por ser de realização fácil, rápido
culação, vão se formando nódulos firmes seguindo o e muiro sensível e específico.
rrajeto linfático. que normalmente formam canais para
drenagem da linfa e do pus e se cronificando. Haverá
formação de uma cadeia de nódulos e gomas ascen- TRATAMEN TO
dentes. À medida que os nódulos ficam com a epider-
me fina e cheios de pus, pode-se aspirá-lo com seringa Após um século de uso, o iodeco de potássio conti-
para fazer os exames micológicos. nua sendo o mais usado para as formas cutâneas locali-
Disseminada: é muico rara, ocorrendo em menos zada e de linfangire. Em caso de esporotricose dissemi-
de 1% dos pacientes. Geralmente são imunodeprimidos nada (cutânea ou outro orgão), usa-se o itraconazol ou
ou possuem facores facilitadores do ripo: diabetes, alco- a anfotericina B.
olismo, etc. Pode atingir qualquer órgão, mas geralmen-
te é a pele a mais acometida e depois os ossos. Quando
atinge a pele, é chamada de "cutânea disseminada"; e PARACO CCIDIODOMICOSE
quando envolve outro órgão, é chamada de "extracu-
rânea". A porta de entrada não está bem estabelecida, A paracoccidiodomicose (antiga blasromicose sul-
sendo mais aceita a disseminação hematogênica após americana) é causada pela inalação de propágulos infec-
a inoculação traumática, e aí não se descobre a lesão tantes do solo.

202 [ Medicina laboratorial para o clínico ]1--- - - - - - - - - - - -- - - - -- - - -- - - - -- - - -


O fungo. ao ser descoberw pelo médico Adolpho Lutz,
em São Paulo, foi confundido com Coccidioides immitis e a
moléstia recebeu o nome de "micose pseudococcidioica",
sem classificar o fungo. Em 1930, o m édico Floriano de Al-
meida criou a denominação: Paracoccidioides brasil1ensis.
Éum fungo dimórfico, sendo inalado na forma de micro-
conídios (formadas na fase miceliana) e converte-se em
leveduras no pulmão com formação de granuloma. Caso
o organismo não consiga desrruí-la, pode haver dissemi-
nação, via linfáCica ou hematogênica ou por continuidade,
das leveduras carregadas pelos macrófagos, causando le-
sões polimórficas, em qualquer orgão.

PATOGENIA

Os microconíd ios, ao se converterem em levedu-


ras, provocam pneumonite devido à tentativa de eli-
minar o fungo auavés da ação dos macrófagos e do
sistema imunitário celular. Esta resposta do organismo
vai levar à formação de granuloma ou a uma resposta
fagocitária piogênica.
Na parede celular do fungo encontra-se a a - 1- 3
à virulência. Possui tam -
glucana, que é relacionada
bém antígenos com uns ao Blastomyces dermat1t1s e
Lacazia /obo1.
A ação inibitória do 13-estradiol (hormômo escro-
gênico) impede a conversão do conídio em levedu -
ra, fazendo com q ue essa m icose se torne rara em
mulheres. A doença pode se disseminar e atingir a
pele, mucosas, linfonodos. pulmões. adrenais e siste-
ma nervoso.

EPIDEMIOLOGIA

O P. brasiliensis é um fungo rural. que vive no solo


de regiões quentes e com alcos índices pluviomécricos
(1.000 a 4.000 mm por ano). É endêmico no Brasil (60%
dos casos mundiais), Venezuela e Colômbia. No Brasil
ocorre mais nas regiões de cultivo de café, sendo raro no
N ordeste. Apesar de ocorrer em a coda A mérica Latina,
é raro nas Antilhas e no Chile.
Os tatus servem como reservatórios naturais se in-
feccionando ao escavarem o solo.
Figura 19.5- Esporotricose linfocutânea. Ver prancha color1da

Investigação laboratorial das micoses superficiais e profundas 203


Os casos disseminados da doença são mais raros e A forma subaguda parece com a tuberculose, doença
normalmente ocorrem nos adolescentes e imunodepri- com a qual não raro coexiste.
midos. Não é muito comum em pacientes com AIOS, A forma crônica ou adulta que acomete indivíduos
por ser uma doença de origem mais urbana, porém, acima de 25 anos é a mais comum. O paciente, tendo
quando ocorre, é de progressão rápida e com apareci- imunocompetência levemente diminuída, produz sinais
mento de lesões cutâneas. menores de inflamação e as lesões são mais localizadas,
porém, com maior número de granulomas e seqüelas fi-
bróticas. Nessa fase, o pulmão está fortemente compro-
CLÍNICA metido e sempre aparecem lesões simultâneas na boca,
com erosão e pontilhado hemorrágico, aspecro denomi-
Raramente a infecção primária é diagnosticada de- nado por Aguiar Pupo de estOmatite moriforme. Essas
vido à ausência de manifestação clínica. Normalmente lesões progridem e se tornam úlceras vegetantes, o que
não evolui para doença, sendo autolimitada, porém caracteriza a fase. O paciente não tem febre e a hepato-
pode permanece em latência em um nódulo por tem- megalia pode ser dolorosa.
po variável. Quando surgem os primeiros sinais clínicos, A radiografia do tórax apresenta infiltrado retículo-
iniciando-se a fase da doença, pode regredir espontanea- nodular bilateral, simétrico, basal (2/3 inferiores), com
mente, e é denominada "forma regressiva", ou pode evo- conformação de "asa de borboleta". Pequenas cavitações
luir gradativamente. Outra maneira de surgir a doença é também podem ser observadas. Apesar da tuberculo-
por reativação endógena de um foco calcificado. se ter padrão radiográfico parecido, nunca é basal. Mais
Atualmente, considerando-se o grande espectro de raramente, pode ocorrer na forma adulta, paciente com
quadros clínicos, imunológicos e hitológicos da doença, maior depressão celular e comprometimento multi focal.
tem-se usado uma classificação semelhante à da Han- sendo vários órgãos atingidos.
seníase, em que a doença é classificada em pólos mais
benignos ou malignos.
Clinicamente pode-se ter as formas: DIAGNÓSTICO LABORATORIAL
• forma aguda ou subaguda de intensidade mode-
rada ou grave; Atualmente, nos laboratórios clínicos o diagnósti-
• forma crônica de intensidade moderada ou grave. co micológico (direto e cultura) e histopatológico (HE,
Grocott, PAS) (Figura 19.6) são mais comuns que o so-
Forma aguda ou juvenil ocorre em pacientes com ida- rológico, apesar do exame sorológico ser mais sensível
de inferior a 30 anos - pode ter acometimento brando ou e mais rápido. Isto se deve ao fato de ser difícil a ob-
grave. A forma aguda difere da subaguda pela evolução tenção de antígenos específicos de gp43 (protease de
mais rápida (poucas semanas). A doença se inicia com 43 Kda), uma vez que os antígenos puros dão muita
escarro purulento, dispnéia e adenopatia cervical típica, reação cruzada.
que pode fistulizar com a evolução da enfermidade (fato O Paracoccidioides é um fungo de fácil observação e
que ocorre também na tuberculose escrofulácea). Geral- bem caracterizado, tornando o exame direto bastante es-
mente, o comprometimento dos linfonodos mediastinais pecífico. É um dos maiores fungos encontrados na clínica
ocorre primeiro que os cervicais. Porém, a radiografia e médica (5-40 com parede de duplo contorno, conten-
clínica pulmonar são normais. Nesta fase, o paciente tem do vesículas de lipídeos no citoplasma e formando figuras
acentuada depressão da imunidade celular, com grande sui generis como de "anel olímpico", "Mickey mouse", "roda
domínio do fungo, dando lesões nodulares nos lifonodos, de leme", etc. O granuloma apresenta-se rico em células
orofaringe, intestino, pele e fígado (adenomegalia genera- epitelióides e gigantócitos, podendo albergar o parasito.
lizada), seguidos por necroses e supurações. Ao lado do granuloma aparecem células que dão o aspec-
Pode ser encontrado quadro clínico característico da to supurado. Para estudos epidemiológicos e diagnóstico
síndrome de Addison: astenia, hipotensão e pigmentação, da fase primária da doença, usa-se a paracoccidioidina em
quando atinge a supra-renal. testes de hipersensibilidade tardia. Para diagnóstico soro-

204 ( Medicina labor atorial para o clínico ]f-- - - - - - - - - -- -- - - -- - - - - - - - - - -- -


lógico e controle de cura da paracocciodioidomicose, hoje conseguem atingir o pulmão, onde são fagocitados
se usa mais a imunodifusão dupla e menos a reação de pelos histiócicos, mantendo-se intracelularmente. Seu
fixação de complemento devido à sua baixa especificidade descobridor, Samuel Taylor Darling (1906), por encontrar
e difícil padronização. os histiócicos parasitados apresentando um halo claro em
volta da levedura, suspeiwu tratar-se de uma cápsula e lhe
denominou Histoplasmo capsulatum. Hoje, a microscopia
elecrônica já confirmou a inexistência de cápsula. A imagem
vista por Darling sugeria ser um novo tipo de prowzoário
semelhante à Leishmania, porém, em 1912, o pawlogista
brasileiro Rocha Lima, na Alemanha, relawu este organismo
como fungo com presença de macro e microconídio.

EPIDEMIO LOGIA

É uma doença mais urbana, cujo fu ngo fica deposi-


tado em ambientes ricos em nitrogénio presemes em
Figura 19.6 - Grocott (400X). Ver prancha colonda fezes de aves, pássaros e morcegos, sendo mais comum
TRATAMENTO
nos galinheiros, celeiros, cavernas, sótãos. jardins aban-
donados e ocos de árvores. A hiscoplasmose não passa
de pessoa a pessoa e se conhecem raríssimos casos de
O icraconazol em doses diárias de 100 mg por seis me- transmissão incer-humana.
ses tem proporcionado sucesso em 93% dos pacientes. Comum na região dos lagos nos EUA e no Brasil,
Quando o paciente tem persistência da queda imu- pode ser encontrada em codo o país. No Rio de Janeiro.
nológica. deve ser seguido com provas sorológicas para existem áreas com alw índice de infecção, podendo ser
finalizar o tratamento. consideradas endémicas.
Em pacientes HIV positivo com doença muito avan-
çada, dar anfotericina Baté a estabilização e continuar o
tratamento com itraconazol. PATOGENIA
O óbito pode ocorrer em 3% dos casos.
Após a inalação dos microconídios presentes no solo,
eles se convertem em leveduras no pulmão, causando
HISTOPLASMOSE pneumonite. O fungo. por tropismo, migra para os focos
secundários, que são órgãos do sistema retículo-endote-
É uma micose muico importante hoje. por ser de lial e nódulos linfáticos (linfonodo mediastinal) que, por
cunho oportunístico. afetando pacientes com AIDS, via linfática, levam o fungo a outros órgãos (baço, fígado,
cransplamados, leucêmicos ou qualquer sicuação com imestino, medula óssea, supra-renal).
drogas que leve à imunossupressão (anciblásticos. altas Após 10 a 18 dias. entra em combate o sistema imu-
doses de corticóides). Pode evoluir rapidamente e ser fatal nológico através da ação dos linfócicos T e, principal-
e pode ser causadora de grandes surws epidemiológicos. mente, macrófagos. Vai haver seqüencialmente: forma-
Causada pelo fungo dimórfico Histoplasma capsulatum ção de granuloma, necrose caseosa. fibrose, calcificação,
var. capsulatum, que se apresenta como levedura à que vão caracterizar as lesões. Os granulomas se formam
tem peratura de 37"C (parasiw humano) e como fungo também nos linfonodos, baço, medula óssea, intestino,
m1celiano com micro e macroconídias à tem peracura supra-renal e fígado.
ambiente. Seus microconídios. por serem muicos Quanto mais alw o número de conídios, mais gra-
pequenos (2 a 4 11m), ficam suspensos no ar e, por inalação, nulomas são formados. por isso. exposição ao fungo.

Investigação laboratorial das micoses superficiais e profundas 205


quando em áreas endémicas, leva a quadros clínicos mais número mínimo de pacientes rem a evolução da doença
ncos. Também é maior a possibilidade de um paciente começando na fase aguda. Esta fa se pode também ser
com AIOS, quando de área endêmica, ter rea tivação da denominada de fase aguda pulmonar primária e geral-
doença partindo de um foco comendo fungo viável. mente é aucolimitada. A sua gravidade vai depender da
Após a formação dos granulomas, a infecção fica do- idade do paciente, reação do sistema imunológico e da
minada a esse nível nos paciemes híg1dos ou pode cons- carga de inóculo.
tituir uma forma crônica restrita ao pulmão. Porém, nos Os principais sintomas são semelhantes à febre
imunossuprimidos, em que há queda de linfócico T, a do- influenzae (gripe): febre alta, cefaléia, arrralgia. aste-
ença pode se cornar progressiva e a disseminação incon- nia, muito raramente pa rece eritema nodoso e são de
trolada e, se não tratada, pode levar o paciente a óbico. curta duração. O exame radiológico mostra áreas de
pneumonite com ou sem adenopatia hilar. A maioria
dos infiltrados é resolvida. porém, às vezes, eles endu-
CLÍNICA recem e ficam como infecções residuais, verificando-
se, ao exame radiológico, a forma de "moeda" carac-
Apesar de grande parte dos casos de histoplasmose terística.
primárias ser assimomática e autolimitada, dependendo A linfoadenomegalia hilar serve para diferenciar de
da carga parasitária inoculada e das condições imunoló- processos bacterianos e viróticos em que ela não existe.
gicas do hospedeiro, eventualmente podem evoluir para Pode ter nódulos solitários e mú ltiplos, que sofrem ne-
quadros clínicos variados. Todo paciente após ser infec- crose e calcificação após cinco anos ou mais. Quando
tado tem disseminação hematológica do fungo, que nor- esses nódulos não se calcificam, podem ser confundi-
malmente vai ser dommada após 14 dias, pela resposta dos com carcinoma broncogênico. especialmente se o
imunológica específica. de1xando pequenos granulomas paciente é fuma me crônico. Pode ocorrer também uma
calcificados como seqüela. forma de hiscoplasmose aguda com infiltrado mihar mi-
As formas mais graves da doença são comuns em cronodular bilateral difuso, que ocorre normalmente
crianças com menos de dois anos e adultos com mais quando a infecção é muito grande como em am bientes
de 55 anos. fechados e cavernas. Essa forma pode ser confundida
As formas clínicas da histoplasmose podem ser clas- com a tuberculose e deve ser feito o exame de BAAR
sificadas, quanco ao sítio. em três tipos: para descartá-la.
• pulmonar assimomática; Os nódulos primários tendem à cura e podem se cal-
• pulmonar aguda; cificar após anos e albergar formas viáveis no seu interior,
• extrapulmonar ou disseminada. causadoras de reativação da doença. Quando há excesso
de depósito de cálcio nos nódulos por estímulo anrigêni-
As formas assimomática e aguda ocorrem em pa- co normal, forma-se o hisroplasmoma.
Cientes 1munocompetentes. A forma disseminada pode No exame di reto do escarro, podem ser v1suahzados
ocorrer em pacientes com ou sem imunossupressão. macrófagos alveolares com histoplasmas inrracelulares.
A fa se assintomática da histoplasmose começa no Normalmente, a hiscoplasmose aguda regride após
pulmão, por inalação de propágulos infectantes. Logo 15 dias do aparecimento clínico da doença. podendo. às
a seguir, há conversão do microconídio em leveduras vezes. persistir por três meses. Pode também evolwr para
e uma pneumonite é desenvolvida no local. A grande hiscoplasmose pulmonar crônica.
maioria dos pacientes (>95%) é assimomárica ou tem A hisroplasmose disseminada ou extrapulmonar
Sintomas leves que passam despercebidos. Talvez em ocorre por disseminação linfática do histoplasma. Va1
pacientes que adquirem um inóculo pesado de micro- ocorrer disseminação numa incidência de um em 50.000
conídios possam ser notados alguns sintomas. A viragem casos de infecção pulmonar. A mortalidade ocorre numa
do reste da hisroplasmina para positivo ind1ca infecção faixa de 90%.
primána. A partir do 14° dia, com ação do sistema Imu- Goodwin, em 1980. segundo o curso da doença. que
ne, a doença normalmente está dominada. Porém. um depende do grau de parasitismo dos macrófagos e de

206 [ Medicina laboratorial para o clínico }-


disseminação da doença. descreveu rrês ripas de qua- A fase disseminada crónica aringe adulros com ma1s
dros clínicos de hiscoplasmose disseminada causados em de 40 anos. Normalmente, ocorre em pacientes com
pacientes imunocomperentes relativos à idade: imunossupressào aparentemente normal. Esses pacien-
• agudo; tes começam a rer pequeno déficit imunológico devido
• subagudo; às conseqüências terapêuticas ou à própria doença. com
• cróniCo. 10 a 20 anos de curso. Às vezes a ulceração orofaríngea
que ocorre em cerca de 70% dos casos é a única manifes-
Um quarto r1po de histoplasmose disseminada é a tação clínica do doente.
oporruníst1ca ou progressiva que ocorre em pacientes O paciente tem doença suave, com febre baixa e in-
com dim1nu1ção da resposta imunocelular. termitente, perda de peso e fadiga. Pode ter lesões focais
A forma disseminada aguda é tam bém denominada com episódios de endocardite, meningite. insuriciência
de ripo infantil e ocorre mais freqüentemente em crian- adrenal. nódulos subcutâneos e lesões da pele. Heparo-
ças com menos de dois anos de idade. Normalmente. é megalia ocorre em 50% dos casos e acometimento es-
precedida de um quadro de hisroplasmose aguda com plênlco e pulmonar raramente se verifica.
febre, náusea. vôm1tos e diarréia e mais tarde com rosse Hemoculrura e esfregaço sanguíneo raramente são
seca e respiração ofegame. A neutropenia pode resultar positivos e a biópsia de sítios afetados é a melhor ten-
em sepse secundária e a trombociropenia pode estar tativa. A pesquisa de polissacarídeo na urina e no soro
associada à hemorragia (hematêmese. melena, sangra- geralmente é positiva.
menta da mucosa oral). Ocorre heparomegalia, que nas A fase disseminada progressiva ou oportunística
crianças com menos de um ano vem acompanhada de ocorre em pacientes imunodepri midos e está associada
ascite importante e icter"cia. à doença de Hodgk1n, lmfosarcoma. leucemia, lúpus eri-
Radiologicamente, assemelha-se à hisroplasmose tematoso sistêmico. transplantes. psoríase (altas doses de
aguda. Tem evolução rápida e fata l (duas a cinco sema- metotrexate) e pnnc1palmente AIDS, que vem liderando
nas) quando não tratada. o rankmg dessa doença.
Hemoculrura e esfregaço periférico podem ser po- A infecção pode originar-se pela reativação de his-
sitivos. Polissacarídeos podem ser encontrados na unna toplasmas v1áve1s de nódulos calcificados ou por fome
(90%) e no soro (50%). O tratamento é feiro com anfo- exógena.
tericina 8 e coberto com hidrocortisona para evitar uma O paciente tem feb re progressiva. Embora o pulmão
crise addisoniana. esteja acometido. os sintomas e sinais são mínimos. Ra-
A fase disseminada subaguda ou tipo juvenil are- diologicamente, tem infi ltrado intersncial difuso e linfo-
ta mais pacientes adultos até 40 anos. adultos jovens e nodomegalia hilar.
raramente crianças e adolescentes. O curso da doença Outros órgãos podem ser atingidos com a evolução
dura vários meses. com Febre moderada e intermitente, da doença. Um subgrupo pequeno de pacientes pode
perda de peso e fraqueza. Na maioria das vezes produz morrer de choque séptico devido à coagulação vascular
infecções focais. geralmente envolvendo o craro gastrin- disseminada e conseqüente falência múltipla dos órgãos.
testinal. que pode ocasionalmente perfurar-se. o sistema A hemoculrura, esfregaço sanguíneo e medular e soro-
nervoso central. supra-renal e endocárdio. A ulceração logia são positivos.
orofaríngea é comum e característica da fase. É uma forma indolente de evolução da forma pulmo-
A heparomegalia está quase sempre presente e os exa- nar aguda é chamada hisroplasmose crônica pulmonar
mes laboratoriais de função hepátiCa são úteis no diagnós- (atinge homens de mais de 30 anos). Tem a denomina-
tico juntamente com a contagem de hemácias (pacientes ção de crônica porque há evolução de um em cerca de
com fosfatase alcalina normal não devem ser biopsiados). 2.000 casos de hisroplasmose aguda devido a defeitos
Hemoculturas e esfregaços sangüíneos são pOSitivos em anatômicos do pulmão, levando à doença pulmonar
50% dos casos. A biópsia do fígado, em 80% das vezes. e a obstrutiva crônica (DPOC), principalmente em fu mantes
biópsia da úlcera orofaríngea quase sempre são positivas. inveterados de áreas endêmicas ou em casos de pacien-
Sorolog1a na urina e soro é de boa positividade. tes enfisematosos. Esta doença é própria dos pulmões

Investigação laboratorial das mi coses superficiais e profundas 207


e atinge geralmente os lóbulos superiores, lembrando a usada, devido a seu baixo custO, facilidade de realização,
tuberculose. Não raro podem estar também associadas. raptdez e boa reprodutibilidade.
A doença tem por característica a cavttação pulmo- Arualmente, a técnica de Western blot tem sido usa-
nar, mas casos sem caviração semelhantes à sarcoidose da devido à sua alta sensibilidade (100%).
podem acontecer. Quando evolui para insuficiência res-
piratória, ela se corna faral. No quadro 19.1 encomram-se
as apresentações clínicas da histoplasmose. TRATAMENTO

Quadro 19.1 - Apresemações clínicas da htsroplasmose Geralmente, é indicado nos casos progressivos da
doença em que a anforericina B é sempre usada como
Pulmona r terapia primária durante 6-12 meses. Nos casos sem
Assrntomótico comprometimento geral e sem disseminação sistémica
Pacientes imunocompetentes ou de manutenção prolongada, é usado o itraconazol.
Agudo
com eficácia de 90%. Nos episódios em que não pos-
Disseminado sa ser administrado o itraconazol. por ser oral. ou nas
Agudo
formas disseminadas crónicas. usa-se a anfotericna B por
1-2 semanas e, após esse período, faz-se a manutenção
Subagudo Pacientes imunocompetentes com irraconazol.
Crónico Nas formas pulmonares agudas, a droga de escolha é
a anfmericina B na dose de 0,6 a 1,0 mg/Kg/dia até 250
Opor tunrsto Pacientes com comprometimento rmunológrco
a SOO mg/Kg, dias alternados durante sers semanas. Hi-
drocortisona venosa é sempre prudente para evitar crise
addisoniana.
D IAGNÓSTI CO LABORATO RIAL Nas formas disseminadas - anfotericina B intravenosa
0,6 a 1,0 mg/Kg em dias alternados por seis meses (cumu-
lativo de 30 a 40 mg/Kg). Em pacientes sem meningite ou
Raros casos de hiswplasmose têm sido diagnosti- endocardtte, fazer cobenura com corttcóide. Pacientes
cados pelo lavado broncoalveolar e escarro. Apesar da com menrngtte e tntolerame à anfmenctna B. usar itraco-
pesqursa de antígenos polissacarídeos no soro e na urina nazol (100 a 200 mg/dia) por seis a 12 meses nas formas
ser útil. a punção medular com pesquisa direta do fun- agudas e subagudas. Na forma crónica. usar 200 a 400
go corado é sempre feira, seguida pela mielocultura para mg/Kg divididas em duas doses por dia por 12 meses.
confirmação diagnóstica. O hisroplasma pode ser tam-
bém encontrado no sangue periférico corado pelo May
Grunwald. A hemocultura é pouco útil. porque, apesar CRIPTOCOCOSE
de positiva na maioria dos casos, é muiro demorada (no
mínimo 3-5 dias). O Cryptococcus neoformans é o único fungo encap-
Para estudo epidemiológico e nos casos de infecção sulado capaz de causar infecção humana. A criptococo-
assimomática, usa-se reste de sensibilidade tardia, com se ocorre pela resistência capsular à fagocirose e princi-
hisroplasmina. palmente pela queda de linfócitos T. o que é comum na
No exame histopawlógico, usa-se coloração de Grocott. síndrome da AIDS.
HE(células aparecem pequenas devido à rerração) e o PAS, O Cryptococcus neoformans apresenta cinco soroti-
que ajuda a diferenciar de Letshmama. pos: A, B, C De AD. Os sororipos A. De AD pertencem
Exames imunológicos como o látex, reação de fixa- à variedade neoformans e os sororipos Be C à variedade
ção de complemento e imunodifusão (adsorvidas com gattl. Recentemente, as variedades foram promovidas
pronase) são muiro úteis para diferenciar doença ativa à espécie, sendo denominadas então de Cryptococcus
e inariva e para o prognóstico. A imunodifusão é a mais neoformans e Cryptococcus gattii

208 ( Medicina laboratorial para o clínico


EPIDEMIOLOGIA
e com predominância de macrófagos. O C. gatti ao exame
radiológico demonstra grande lesão pulmonar.
O Cryptococcus pode ser encontrado colonizando
a orofaringe e outras partes do corpo. Encontra-se em
rodo o mundo, saprofiticamente na natureza. sendo DIAGNÓSTICO lABORATORIAl
muiro comum nas fezes dos pombos e aves.
Arualmente, trabalhos científicos relatam a matéria Deve-se realizar o exame de rotina do LCR nos casos
em decomposição em ocos de árvores tropicais, princi- de suspeita do acometi mento do sistema nervoso central.
palmente no Norte do país, como novo hab1tat. A espé- Geralmente. ocorre baixa celularidade (< 200 células/mm3)
cie neoformans é a mais encontrada nas fezes de pombos com predomínio de mononucleados, exceto nos casos de
e pássaros, sendo geralmente urbana, e a espéc1e gattii é infecção pela espécie gatti. em que há predomíniOde poli-
ma1s encontrada nas madeiras em decomposição (euca- morfon ucleares e hipercelularidade. A tuberculose sempre
lipro) de narureza rural no Norte do Brasil. deve ser afastada.
No Brasil, 80% dos casos de criptococose são devidos O diagnóstico micológico pode ser feiro por exa-
à espécie neojormans. A espécie neoformans é mais co- me a fresco com nanquim (Figura 19.7) e pela cultura.
mum nos imunossuprimidos e a gattii em pacientes sem O método da tinta nanquim ressalta a cápsula no exa-
supressão imunológica. me direro e se presta mais para pesquisa no líquor do
que no escarro ou lavado broncoalveolar. O criptococo
cresce bem em Sabouroud sem cicloheximida em tem-
CLÍNICA peraturas até 29•e, levando três a quatro dias para seu
crescimento. Em temperaturas mais altas ele não sobre-
A cnptococose adquirida por inalação causa uma Infec- vive. Em amostras comaminadas. como escarro. lavado
ção pulmonar primária muitas vezes imperceptível. Com bronqueoalveolar, urina. etc., o meio de STAIB que usa
a evolução da infecção, pode haver quadro pulmonar de alpiste niger (Guizotia abyssimca) tem melhores resulta-
criptococose progressiva e corresponde a 10% dos casos. dos. A levedura pode também ser VISta ao exame ana-
A disseminação hematológica extrapulmonar é o tomopatológlco a partir da coloração do PAS e Grocott.
quadro mais comum (90%), tendo grande tropismo para que evidencia a parede celular do fungo. A coloração de
o sistema nervoso central. devido à dopamina; também mucicarmim de Mayer cora a cápsula de vermelho. mas
podem migrar para a pele, pulmão e qualquer outro ór- não a levedura, tendo o cuidado de afastar a existência
gão ou sistema. Nos casos de criprococose disseminada, de muco brônqUICO, que também cora positivamente
o microrganismo freqüentemente é isolado na urina. Ela com mucicarmim. Podem ser visualizados isoladameme
ocorre quando o CD4 está abaixo de 200 células/dL. ou no cito plasma dos macrófagos.
Os sintomas, inicialmente, são inespecíficos como qual-
quer infecção pulmonar crôn1ca. Geralmente, a febre é per-
sistente por vá nas semanas ames de começarem os sintomas
de meningite. O C. gatt1 produz mais encefalite que meningi-
te, explicando a latência prolongada de alguns casos.
O quadro radiológico também é inespecíftco, podendo
apresentar pequenos nódulos periféricos nos brônquios até
uma densa massa sugerindo neoplasia, que vai comprimin-
do o parênquima pulmonar. Geralmente. os achados são
bilaterais envolvendo a base, sendo a cav1tação e a calcifi-
cação muito raras. lesão gelatinosa (devido à cápsula
da levedura) e muito raramente granulomatosa ou tuber-
culólde e não produz derrame pleural. uma Infiltração
Figura 19.7 - Cryptococcus em tinta da China.Ver págma 209
geralmente interstiCial, com pouco infiltrado inflamatório

Investigação laboratorial das micoses superficiais e profundas 209


Como mécodo sorológico. usam-se partículas de lá- conídio muiw pequeno (3 muito hidrófi lo. ficando
tex para detecção de antígenos capsulares de xilomana- faci lmente suspenso no ar, atingindo os brônquios e o
nas (glucoronoxilomanana = 90% da cápsula) presentes espaço aéreo alveolar pela aspiração. Está muito presen-
no líquor. Essas partículas podem ser aglutinadas em 10% te em ambientes de construções. nos tubos e filtros do
dos casos de pacientes com fatar reumatóide positivo, aparelho de ar-refrigerado e nos dejeros ricos em matéria
faror este que pode ser absorvido pela enzima pronase. orgânica. O A terreus. por ser resisceme à anfotericina
Pacientes com sorologia negativa não devem afastar B. merece mais cuidados, porém, felizmente é discutida
cripcococose e pacientes com títulos pequenos devem sua ação patogénica no pulmão. Tem grande predileção
ser considerados evidência presuntiva de criptococose. pelo sistema nervoso central e é o mais isolado nas oni-
Para monitorização de cura e em casos de fator reuma- comicoses por Aspergíllus. A espécie A. jlavus produz
tóide positivo, pode-se lançar mão da titulação por meio uma micocoxina denominada aflatoxina que. quando
do méwdo de enzima imunoensaio. ac um ulada. pode causar problemas hepáticos. Nos seios
paranasais, é a espécie mais isolada. causando obstrução
e podendo chegar à erosão do palato. O A mger possui
TRATAMENTO conídios grandes, com destacada predileção pelo ouvi-
do. predominando nas otomicoses e sendo encontrado
• pulmonar: fluconazolpor wda a vida aos pacien- no pulmão e cavidade nasal. causando aspergiloma. É a
tes com HIV e de seis a 12 meses em pacientes espécie mais verificada no solo tropical.
imunocompetentes;
• sistema nervoso central (SNC): anfotericina B por
duas semanas. seguido de fluconazo l por no mí- PATOGENICIDADE
nimo 10 semanas. sempre se observando a con-
tagem de linfócitos T CD4+. Tem sido usada a as- A ação parogênica do fungo é devida à produção de
sociação anfotericina B + fluconazol em pacientes metabólitos tóxicos ou por suas propriedades histolíti-
imunodeprimidos. cas. Um fator importante de patogenicidade é a expo-
sição do indivíduo por tempo prolongado em ambiente
contendo grande qua ntidade de conídios. O Aspergíllus
ASPERG ILOSE tem grande tropismo pelos vasos sanguíneos. onde se
desenvolve rapidamente formando um tampão capilar.
Devido ao seu alw índice de ocorrência e ter sua de- Vai ocorrer obstrução. infarto e necrose tissular. A paw-
nominação clínica já consagrada na prática médica. esta genicidade do fungo vai depender também do estado
hialohifomicose permanece ainda com a denominação imunológico do paciente.
de "aspergilose" (infecções causadas por fungos do gê- Normalmente, a fagociwse feita pelos neutrófilos e
nero Aspergíllus). macrófagos inibe hifas e esporos fúngicos, já as leveduras
são inibidas principalmente pela ação dos linfócicos-T.
Portanto, neutropênicos são invadidos por fungos mi-
EPIDEMIOLOGIA celianos e pacientes com AIDS por leveduras e fungos
dimórficos. que formam leveduras quando a 37"C. A as-
Causada geralmente pela forma assexuada e rara- pergilose invasiva só ocorre em 0.1 a O.S% dos pacientes
mente pela forma sexuada do Aspergíllus. podendo com AI DS. Estes não têm aspergilose no início da doen-
variar quanto às espécies. Das muitas espécies existen- ça. pois os neutrófilos e macrófagos estão íntegros. Com
tes, em corno de 190, somente quatro têm relevância o avanço da doença ocorre queda dos granulócitos de-
clínica, por serem as mais encontradas nos casos de as- vido à toxidade da terapia anriviral (<50 células/dL) e in-
pergilose: A fumígatus. A jlavus, A níger. A terreus em vasão por fu ngos micelianos. A corticoterapia inibe mais
ordem decrescente de ocorrência. O A fumígatus é o o linfócito-T que os neutrófilos e macrófagos. o que dá
mais encontrado em solo de clima tem perado e tem um mais chance às leveduras de invadirem. inclusive as dos

210 ( M edicina laborawrial para o clínico )1-- - - - - - - -- - -- -- -- - - - - - - -- - - - - - -


fungos dimórficos, como ocorre nos rransplanres, excero Sacadura. em 1968, descreveu o primeiro caso de asper-
nos de medula óssea. gilose alérgica entre nós. Ela é mais comum em crian-
Assim como codo fungo, geralmente ames de causar ças e adolescentes asmáticos crônicos ou portadores de
doença é preciso que ele tenha condições de colon izar fi brose cística, causando febre, eosinofilia (1.000 célula s/
o hospedeiro. Os tecidos mais externos estão mais ex- ml) com nível de lgE aumenrado levando a broncoes-
poscos à colonização, como os olhos, ouvidos e nariz. pasmo (reação ripo 1). O exame radiológico mostra infil-
Porém, devido à aspiração dos conídios, as vias aéreas trado no lobo superior e adenopatia hilar com sinais de
são as mais colonizadas. Pacientes com facores facili tató- bronquiectasia. Devido à formação de muco, o paciente
rios como doenças pulmonares crônicas tipo enfisema, expectora um tampão mucoso marrom escuro. N em
sinusite, fibrose cística e obstrução crônica pulmonar sempre a cultura resulta positiva. O tra tamento é com
(DPOC) são mais susceptíveis à colonização. corticóide para supri m ir a resposta imunológica. O uso
prolongado de corticoterapia pode levar a um quadro
de aspergilose invasiva, sendo o uso concomitante do
CLÍNICA itraconazol bastante benéfico.
Outro tipo de aspergilose com mecanismo alérgico
A colonização broncopu lmonar em si não causa do- é a "alveolite extrínseca alérgica", que ocorre em t raba-
ença e não precisa de tratamento, sendo raramente diag- lhadores que manipulam forragens ou trabalham em
nosticada em vida. Devido à grande variedade de quadros ambientes mofados ricos em conídios de Aspergi/Jus ou
clínicos provocados pela aspergilose, Rippon, em 1974, outro tipo de fungo. Nos EUA é comum em agricultO-
descreveu a aspergilose como um espectro de doenças. res que esrocam malte devido ao Aspergi/Jus clavatus.
A aspergilose pode ser de cunho alérgico ou tóxico, ter Após oiro horas, desenvolvem quadro de dispnéia, febre.
lesões primárias e invasivas. O fungo, uma vez colonizan - mialgia e rosse seca. O diagnóstico é sorológico e o tra-
do o indivíduo 1munocompetente ou não, pode evoluir tam ento é feiro com cort icóide sistêmico e geralmente
para um quadro alérgico ou para invasão desse tecido. melhora em três a quatro dias.
Nos indivíduos imunocompetences, a aspergilose rara- A traqueobronquire invasiva ocorre com formação
mente é invasiva, porém, muito ocasionalmente pode de placas pseudomembranosas que causam obsuução
invadir primariamente a pele de paciente queimado, ou- e ulceração. O paciente tem rosse. hemoptise e expec-
VIdo, nariz, brônquio, etc. Nesses indivíduos imunoat ivos, cora cilindros brônquicos contendo Aspergi/Jus que dão
o mais comum é ocorrer inoculação de conídios a partir exame a fresco e cultura positiva. O diagnóstico pode
de t raumatismo, corpo estranho ou nosocomialmente ser feiro pela broncoscopia. Apesar de ser mais comum
causando ceratite, peritonite pós-diálise, endocardite por nos pacientes com AIOS, pode similarmente ocorrer nos
próteses valvares e aspergiloma sinusal ou pulmonar de- t ransplantados de pulmão.
vido a um defe1to na estrutura tecidual tipo cavidades. Em se tratando de indivíduos imunodeprimidos. as
No indivíduo imunocompetenre, a aspergilose invasiva é infecções aspergílicas invasivas que recebem o nome de
rara devido à ação fagocítica dos macrófagos e neutrófi- "aspergilose invasiva" são quase exclusivas e vão ter mui-
los. O macrófago não deixa o conídio se transformar em ta importância clínica quando o paciente é neucropêni-
h1fa. impedindo sua maturação e, quando algum escapa, co devido pri ncipalmente à falta do macrófago alveolar.
ele é preso pelo neutrófilo que o elim ina. Portamo, q uando se diz "aspergilose invasiva". normal-
O paciente imunologicamente ativo após a coloniza- mente esrá-se implicitamente referindo a um paciente
ção da árvore brônquica pode evoluir para um quadro neurropênico, apesar dela poder ocorrer em pacientes
alérgico devido a um estado reacionário de hipersen- imunoativos. Pacientes com menos de SOO célu las/mm 3
sibilidade denominado "pneumonia broncopulmonar de granulóciros fatalmente vão a óbiro. Aqueles com as-
alérgica" ou por "h ipersensibilidade" ou evoluir para um pergilose invasiva têm alco risco quando têm medula ós-
quadro invasivo denominado "traqueobronquite invasi- sea transplantada, indo 60 a 80% a óbito. O s portadores
va aguda", que é rara em pacientes hígidos e neutropê- de anemia aplástica, leucemias e neoplasias, cujo sistema
nicos e curiosamente com um nos pacientes com A IOS. m ielóide ou linfóide não funciona devido ao uso de dro-

Investigação laboratorial das micoses superficiais e profundas 211


gas motóxicas, são os que mais são levados a transplante nar, porém sem invasão de vasos sanguíneos. levando ao
de medula óssea. quadro de fibrose e dilatação brônquica, que muitas vezes
Na aspergilose invasiva pulmonar dos transplanta- facilita a formação de bolas fúngicas devido à formação de
dos, o fungo é adquirido nosocomialmente e o paciente caviração. A febre é pouco elevada e causa emagrecimento
só vai manifestar a doença depois de três meses, quando notório. O exame direco e a cultura para fungo raramente
já rerornou para casa. são posicivos e o cracamemo é com icraconazol. Além da
E uma doença aguda e fulminante, principalmente aspergilose de localização pulmonar, o paciente imunode-
pelo d1fícil diagnóstico clínico-laborarorial, o que atrasa a primido pode rer raramente de maneira primária lesões não
terapêutiCa e leva 95% dos pacientes a óbito. Parologica- pulmonares como no sistema nervoso central. sino-orbital.
mente, pode-se resumir a evolução da doença em: pele e outras localizações, como a já comentada invasão
brônquica causando uaqueobronqu1te 1nvasiva.
angio-invosão trombose infarto = necrose; o que se Quando a infecção fúngica atinge apenas um órgão,
traduz clinicamente em : dor pleurítico hemorragia
geralmente o pulmão, do paciente 1munodeprimido ou
pulmonar = hemoptise covitoção.
não, ela é mvasiva, porém, quando m1gra para outros ór-
gãos. na grande maioria das vezes em neucropên ico ela é
Esse quadro não é específico do Aspergillus e pode classificada como "forma disseminada" e geralmente leva
ocorrer com outros fungos oportunistas. A clínica pare- a óbiro em rorno de três semanas por falência múltipla
ce de embolia, porém com hemoptise. dos órgãos. No Quadro 19.2 enconcra-se o resumo dos
Arualmente se segue uma padronização para estabe- aspecros clínicos das aspergiloses.
lecer o nível de infecção da aspergilose invasiva. levando-
se em coma: farores de risco inerentes ao paciente, ma-
nifestações clínicas, resultados de exames micológicos TRATAMENTO
que colocam a doença em três estágios d1agnóst1COS :
1- definitiva, 2- provável. 3- possível. Normalmente se usa em primeiro tempo a anfote-
Os pacientes com câncer podem ter hemoptise de ricina B ou o voriconazol por ter formulação parenteral.
duas mane1ras: Após a melhora clínica, pode-se trocar para um antifún-
1) Invasão de vasos levando ao infarro. quando o pa- gico oral. sendo geralmente o iuaconazol ou vonconazol
ciente está neutropênico. os mais indicados. O voriconazol se mostrou mais efi-
2) O paciente está em recuperação da granulopen1a e caz que a anforericina B, rornando-se o antifúngico de
os neutrófilos invadem a parede dos vasos, resultando em primeira linha para a aspergilose. As equinocandinas, a
destruição da camada elástica e formação de um aneurisma partir da caspofung1na, podem ser usadas em caso de in-
micórico com ruptura e hemoprise levando-o à morre. rolerância à terapêutica convencional. Têm a vantagem
Paciente neurropênico com febre persistente ou re- de ser fungicidas contra todas as espécies de Candida.
corrente, infiltrado pulmonar lembrando pneumon1a bac-
teriana, porém, não respondendo à rerap1a ant1bacreriana.
deve-se entrar com tratamento antifúngico. Às vezes a to- DIAGNÓSTICO LABORATORIAL
mografia computadorizada pode revelar mais precocemen-
te as lesões cavitárias. O lavado broncoalveolar geralmente é Os Aspergillus, diferentemente do Fusanum. raramen-
negativo para fungos. Quando a aspergilose é parenqulma- te causam fungem1a e, quando isolados de hemoculturas,
tosa, o diagnóstico é mais difícil e faz-se biópsia rransbrôn· deve ser descartada possível contaminação, pois apenas
qu1ca e transtoráxica por aspiração. Outra forma pulmonar 10% dos isolamenros são significativos. A cultura positiva
de aspergilose menos comum e semi-invasiva é a "aspergi- para Aspergillus no escarro é acrescida de valor diagnósti-
Jose crônica necronzante". É uma forma indolente descrita co quando o exame direro também é positivo. O exame
em paoentes com doença pulmonar obstrutiva crônica. histológico mostra lesões necróticas supurativas e granu-
pneumoconiose, fibrose císrica. sarcoidose (rara). tubercu- lomas. As características culturais das principais espécies
lose inariva. Há destruição crônica do parênquima pulmo- pacogênicas de Aspergillus resumidamente são:

212 [ Medici na laborarorial para o clínico ]1----------- - - - - - - - - - - - - - - - - - - -


Quadro 19.2 - Quadro clíntco das aspergiloses

Indivíduos imunocomponentes Indivíduos com comprometimento imunológico

Invasão

Inoculação - Para um órgão superficial: cutõnea primário, stno orb,tal.


- Toxicose: ingestão de micotoxinos - Poro um órgão profundo: sistema nervoso cenlral
- Nosocomiol : colocação de próteses, diálise peritoneal. Pulmonar invastva: traqueobronquite invasivo, ospergilose pulmonar
- Inoculação de corpo estranho: cerotite invasivo.
- Dono tissulor· quetmoduros, ospergilomo - Pulmonar agudo ou primário
- Pulmonar crónico: ospergilose pulmonar crônico necrottzonte
- Poro mais de um órgão: disseminado
Colonização

- Manifestação olérgtco asma s.nusi'e alérgico. rin te


olérgtco olveal,te extrínseco alérgico osoerg lose bror-
copulmonor o érg co pneumol'1io por h.persens·b,l:caoe
Invasão

- Poro um orgão superficial: rintle, sinusite, olomicose,


troaueabronquite agudo
- Poro um orgão profundo: troqueabronquite agudo,
ospergilose pulmonar tnvosiva.
- Poro mais de um órgão· disseminado.

Aspergillus clavatus
No exame direw do escarro pode-se encomrar eOSI-
Macromorfologia: cresomemo rápido da colônia nofdia e cristais de Charcor-Leyden.
que tntoalmeme é branca e vai se wrnando esverdeada
com o tempo.
Aspergillus jwmgat us
Micro morfologia: sua vesícula parece com um cow-
nere. Tem as fiálides unissenadas. Macromorfologia:colónias verde-azuladas ou c1nzas.
Crescem bem a 4s·c o que faohra seu 1solamemo. Algu-
Aspergillus Jlavus mas cepas podem suportar tempera curas de até 6s·c.
Micromorfologia: suas ftáhdes têm disposição colu-
Macromorfologia: colônia verde amarelada com o nar e nascem do meio para cima das vesículas com for-
reverso branco ou róseo. Pode crescer a 37°C. O aparecl- mação un1sseriada. Possuem coníd1os pequenos (3 J.lm).
menro de gotículas acastanhadas na superfíoe da coló-
nia geralmeme coincide com a presença de esclerómos.
Aspergillus 111get
Micromorfologia: seu micélio é f1no, mas de rexcura
densa. Tem predominância de fiálides radiadas, porém al- Macromorfologia: sua colônia rem a superfície da
gumas podem ser colunares, semelhame ao A.jum1gatus. cor de carvão e o reverso é branco (não é demáceo).
Fiáltdes un1 e b1ssenadas podem ocorrer stmulcaneamen- Micromorfologia: rem a cabeça de forma radiada,
re. Seu con1d1óforo é longo e rugoso (parede espessa). podendo ter fiálides uni ou bisseriada. Seus conídios são
com alguns coníd1os que vão se wrnando rugosos com grandes (5.5 a 8,0 J.lm) e alguns podem ser rugosos.
o envelheomemo. A vesícula, quando jovem, rem forma No exame direro do escarro. podem-se encomrar
de cabaça ou btlha. assim como o A jumigatus. porém cristais de oxalaw de cáloo (produz áodo oxáhco). prin-
quando maduras são globosas. Seus conídios são grandes cipalmeme quando o pacieme é d1abér1co e faz aodose
(média de 4 J.Jm). metabólica.

Investigação laboratorial das micoses superficiais e profundas 213


Aspergi/Jus terreus
pele humana e de animars. Outras espécres de Cand1da
Macromorfologia: colôntas pregueadas de cor de podem ser saprófitas e parasitárias e podem ser encon-
areia ou amarelo-claro ou canela. Possui pregas radiadas tradas na natureza e na pele.
originadas do cemro.
Micromorfologia: possui rodas as estruturas pe-
quenas. vesícula e fia loconídios, sendo o menor de w - ETIOLOGIA
das as espécies de Aspergtllus. A suas fiá lides são blsse-
riadas, tendo aspecco de leque sobre sua vesícula. As Nos casos de endocardite, depois da C. albicans a
fiálides proximais (profiálides ou merula) tipicamente mais comum é a Candida do complexo psilosis que, por
são mais curtas que as secundárias. Em corte de tecido ser um comensal da pele humana. rem um mecantsmo
e em microculcivos a partir de hifas submersas, pode de uansm1ssão exógeno, sendo muito relacionada com o
aparecer um conídio secundário (aleuroconídios) de uso prolongado de cateter e nutrição parenteral. T1·ata-se
6 a 7 !Jm, que nasce ao lado da hifa ou às vezes de de uma levedura de baixa pacogenicidade e mortalidade.
pequenas projeções de hifa que são pacognomônicas A C. troptca!Js é sempre de origem endógena e rem alto
do A. terreus. poder de invasão, levando normalmente a uma candi-
dose invasora. principalmente em recepcores de medula
óssea ou em paciemes com enfermidade hematológica.
CANDIDOSE A variante sacarose negativa é muico encontrada nos ca-
sos de candidose disseminada.
São infecções oportunistas e endógenas causadas
por leveduras do gênero Candida. quase sempre asso-
Ciada a alguma alteração do organtsmo, podendo ser PATOGENIA
cutâneo-mucosa ou ststêmica (candidemta). Apesar da
destgnação "candidíase" ser usada correntemente, o ter- A maioria das infecções por Candida ocorre princi-
mo "candidose" está sendo mais empregado. palmente em pacientes hospitalizados. As infecções no-
socomiais são devidas ao aumento de fatores de nsco
nesses paCientes. que podem estar isolados ou associa-
EPIDEMIOLOGIA dos. Os fatores de riscos podem ser devidos àqueles que
produzem imunossupressão no paciente ou a facores
A Candida albtcans é a grande causado ra de candido- que facilitam a entrada do fungo como cateter, queima-
se (60%), seguida pela C. tropicalis e Candida do complexo duras. internação prolo ngada, etc.
pstlosts. Outras espécies potencialmente patogênicas são Para o desenvolvtmemo das candidoses, além dos
a C. glabrata, C. kruset, C. gwlliermond11, C. kefyr (amiga facores de riscos que estão ligados ao hospedeiro, são
C. pseudotroptcalts), C. lusJtamae. Por ser de cunho opor- 11nportanres também os facores de virulência inerentes
tunista, teoricamente qualquer espécie das 196 conheci- a cada cepa do fungo.
das pode causar infecção. Algumas dessas leveduras são A candidose é a ún1ca micose em que os do1s ttpos
intrinsecamente resistentes a certos amift:mgicos e estão de defesa do organismo- a fagocicose e imunidade celu-
sendo selecionadas. torna ndo-se emergentes, como é o lar - têm a mesma importância. A fagocitose (neutrófilo
caso da C. kruset e C. glabra ta, resistentes ao fluconazol, C. e macrófago) age diretamente nas hifas fúngicas impe-
lusttamae à anfotenona-Be a C. rugosa à nistatina. dindo sua invasão e os linfócitos-T agem nas leveduras
A C. a/bicans está l1gada à mucosa do homem e de impedindo sua fixação na mucosa.
quase todos os animais, apesar de nunca ter sido isolada A Candida causa mfecção em dois passos, pnme1ro
de anfíbios. A mucosa digestiva é seu pnncipal habitat se adere à célula epitelial ou à mucosa. o que é possí-
e é só através das fezes que ela pode ser encontrada na vel devido à existência de receptores de manana na sua
natureza, pois, apesar de ser saprófita, não v1ve no meio parede celular, que vão se ligar à fibronecti na da célula
amb1eme, assim como também não é encontrada na recepcora (faror de aderência da célula).

214 [ Medicina laboratorial para o clínico


Na fase de aderência, são os linfóciros-T que vão agir A candidose mucocutânea pode se cronificar, afetan-
remando combater as leveduras e, na falta destes, vai do ao mesmo tempo a boca, pele e unhas. Geralmente,
haver disseminação da infecção, como ocorre na AIDS ocorre em crianças e muito raramente nos adultos. Na
com o aparecimento da candidose mucocutânea. Uma infância, geralmente é de causa hereditána (autossômica
vez aderida, a levedura começa a produzir hifas que, na recessiva ou dominante) ou devida a doenças endócrinas
sua extremidade, secretam enzimas proteolíticas, come- como hi poparatireoidismo associado ao hipoadrenalis-
çando a invadir a mucosa ou pele e esta fase misceliana mo ou devido ao hipotireoidismo. No adulto, pode estar
vai ser combatida pela fagocicose. O paciente com AIOS associada ao timoma ou ao lúpus eritemaroso sistêmico.
com a levedura já aderida começa a ter depressão dos A candidose mucocutânea crónica produz lesões crôni-
neutrófilos numa fase mais avançada da doença, devido cas orais do tipo pseudomembranoso ou em placas, na
à ação tóxica dos antivirais, podendo levar à penetração pele dá lesões crostosas formando o "granuloma candi-
das hifas com conseqüente candidemia. diásico" e as unhas ficam intensamente distróficas.
As mananas da parede celular das leveduras de C
albicans são capazes de reduzir a blascogênese de lin-
fócico-T. funcionando como mecanismo de escape da DIAGNÓSTICO LABORATORIAL
defesa imunológica do organismo.
Normalmente são feitos o exame a fresco e a cultu-
ra. Para identificar a espécie de Cand1da. é preciso fazer
CLÍNICA o auxonograma e o zimograma, sendo o microcultivo
muito útil.
A clínica da candidose apresenta um leque de ma- Na candidose sistêmica, pode-se fazer detecção de
nifestações que variam conforme seja uma infecção ou antígenos ou de anticorpos circulames, detecção de me-
uma reação alérgica. tabólicos ou de componentes da parede celular da le-
As candidoses infewosas podem ser divididas, con- vedura.
forme sua localização, em superficiais e sistêmicas.
A cand1dose superficial cutâneo-mucosa ocorre REFERÊNCIAS
em locais onde a Candida vive saprofiticamente como
1. Gontt)O MAM. PrevalênCia de Agentes de Dermawmt-
microbima normal, sendo mais comum a mucosa oral,
coses em Pactentes Atendidos em 1994 - 19995 na Fa-
vaginal e intes(lnal. A candidose vulvovag1nal excepCIO- culdade de Medtctna e Hospital das Clín icas da UFMG
nalmente prema de um fator predisponente para que [dissertação]. Belo Horizonte: Untverstdade Federal de
ela ocorra contrariamente ao que ocorre em outras Mtnas Gerats; 1997.
2. Lacaz CS, Porco E. Mamns JEC. Vaccan EMH. Melo NT. Tra-
candidoses. A candidose oral (sapinho) é a mais comum
tado de M1colog1a Médica, 9' ed. São Paulo: Sarvier; 2002.
das candidoses superficiais, ocorrendo geralmente em 3. Rippon JW. Medical Mycology - The Parhogenic fu ngt
crianças, 1dosos e imunodeprimidos. Pode se apresen- and parhogen1c actnomycetes. 3' ed. Ph iladelph1a: W. B.
tar de vários tipos, como: pseudomembranosa (aguda e Saunders; 1988.
crónica), eritematosa (aguda e crónica), quedite angular, 4. S1dnm JJC. Rocha MFG. Mtcologta Médtca à Luz de Au-
tores Contemporâneos. Rto de jane1 ro: Guanabara Koo-
em placas crôn1ca ou nodular crónica, quando tem as- gan; 2004.
pecto granulado. Ma1s raramente pode causar glossite
de evolução crônica chamada de "glossite mediana rom-
bóide", que parece ser uma seqüela da candidose pseu-
domembranosa aguda. A forma pseudomembranosa é
muito comum na AIOS. A candidose eritematosa aguda
é também chamada de "candidose aguda oral atrófica" e.
como a eritematosa crônica, é encontrada nos usuários
de dentadura. A candidose oral pode, em alguns pacien-
tes graves, afetar a língua, faringe e esôfago.

Investigação laboratorial das micoses su perficiais e profundas 21 5

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