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MICOSES PROFUNDAS OU SISTÊMICAS – PARACOCCIDIOIDOMICOSE E

HISTOPLASMOSE

INTRODUÇÃO

De um modo geral, os patógenos causadores das micoses profundas são fungos dimórficos que existem na

natureza, no solo ou em alguns animais e apresentam distribuição geográfica variada. A porta de entrada para

esses agentes é por inalação, podendo ocasionar infecção pulmonar e disseminação para outras áreas do

organismo. Não há evidência de transmissão entre seres humanos ou animais e os patógenos acometem

indivíduos hígidos, ou seja, não depende do estado imunológico destes. Portanto, são infecções cuja

manifestação depende da quantidade de inóculo que conseguiu adentrar ao organismo do hospedeiro.

Os fungos dimórficos são aqueles que apresentam uma morfologia a 37° (forma de levedura) e outra morfologia

a temperatura ambiente (forma filamentosa). A forma filamentosa é a forma de disseminação dos fungos

dimórficos, que quando nesse aspecto, apresentam diversas estruturas. Uma dessas estruturas são os conídios.

Quanto menores forem os conídeos, maior será a probabilidade de o fungo conseguir adentrar aos alvéolos

pulmonares e se desenvolver, causando doenças. Além disso, neste dimorfismo térmico predominam diversos

tipos de ligações químicas dentre as estruturas. Por exemplo, na forma de levedura temos ligações a-1-3

glicana (+) e B-1-3-glicana (-), enquanto na forma filamentosa predominam as ligações B-1-3 glicana e quitina.

Essa característica biomolecular é importante quando fazemos testes na busca de antígenos de superfície

circulantes em cada infecção.

O fato de o fungo dimórfico ser capaz de se transformar em levedura quando adentra no nosso organismo é o

seu principal fator de virulência. Isso acontece porque nosso corpo é capaz de destruir, principalmente através

das enzimas salivares, os conídeos. No entanto, quando estes se transformam em levedura, nosso corpo precisa

mobilizar uma resposta imunológica contra o fungo, o que leva um certo tempo e permite que o vírus se

multiplique. Portanto, normalmente, o que acontece é que na transição dimórfica ocorre a expressão de genes

específicos para virulência e patogenicidade.

As micoses sistêmicas, também consideradas micoses verdades, são micoses endêmicas em determinadas

regiões do nosso país. Na nossa região, os dois tipos de micoses endêmicas mais comuns são a

paracoccidiodomicose (blastomicose sul americana) e a histoplasmose.

PARACOCCIDIODOMICOSE

A paracoccidioidomicose (PCM) é a principal micose sistêmica no Brasil. Essa doença representa uma das dez

principais causas de morte por doenças infecciosas e parasitárias, crônicas e recorrentes, no país. É uma doença

infecciosa de evolução aguda, subaguda ou crônica (dependem do inóculo, sexo e condições gerais do
paciente). Os agentes causais são do complexo Paracoccidioides, principalmente Paracoccidioides brasiliensis e

paracoccidioides lutzii. Morfologicamente essas espécies são idênticas (crípticas) e para identificá-las é

necessário que seja feito sequenciamento genético.

Os fungos causadores dessa doença encontram-se predominantemente presentes no solo e em vegetações. É

por isso que trabalhadores rurais são os afetados por essa doença. Ainda, diversos animais, como o tatu,

cavalo, gato e cachorro, podem servir como reservatórios para esses patógenos. Os casos dessa micose

predominam nas regiões sudeste, sul e centro-oeste. Trata-se de uma micose emergente em áreas de

colonização mais recente, submetidas ao desmatamento da amazônica, como Maranhão, Tocantins, Pará, Mato

Grosso, Rondônia, Acre e Amazonas.

A paracoccidioidomicose é mais frequente em homens, uma vez que as mulheres em idade fértil possuem a

proteção fornecida pelo 17-B-estradiol, que inibe o principal fator de virulência do fungo, que é a transformação

de conídio (forma filamentosa) em levedura. No entanto, em situações específicas, como durante a gravidez

ou quando a mulher apresenta déficit hormonal, é possível sim que ela contraia a doença e venha a ter

complicações a partir disso. Outros fatores de virulência que também merecem destaque são: inóculos

pequenos, que ficam alojados nos pulmões e não se disseminam, mas continuam se replicando por ali, a

glicoproteína 43, que é um antígeno de superfície que se liga aos linfócitos T e B, portanto sendo importante

no diagnóstico. No entanto, a glicoproteína 43 é bastante característica na forma braziliensis da doença, e, por

conta disso, pode dificultar o diagnóstico da forma lutzii.

As manifestações clínicas da paracoccidioidomicose são diversas. Nos casos em que ocorre apenas a infecção,

nos quais o inóculo não é suficientemente potente para causar a doença, não existem sintomas e o que pode

ser observado é apenas uma cicatriz radiológica. Já nos casos em que ocorre o desenvolvimento da doença,

ela pode se manifestar na forma aguda – principalmente em jovens – e atingir o trato gastrointestinal, o que

não possui, geralmente, um bom prognóstico. Já a forma crônica da doença se manifesta principalmente em

adultos e apresenta melhor prognostico, caso o paciente não seja imunossuprimido. Ainda, a doença pode se
apresentar em formas residuais ou sequelares, como enfisema pulmonar e estenose de laringe/traqueia. O

caso mais grave de paracoccidioidomicose, no entanto, está sempre associado à imunossupressão, e se

manifesta de forma disseminada.

A confirmação diagnóstica exige a visualização e o reconhecimento do agente de forma irrefutável, através do

diagnóstico laboratorial. Os espécimes clínicos que podem ser utilizados são raspado de lesão, secreção

brônquica, pus aspirado, líquor, líquido ascético, líquido sinovial, derrame pleural e outros fluidos. Esse material

pode ser observado no exame micológico direto, no qual observar as estruturas em forma de leveduras bastante

características. Espécimes muito contaminados com outros microrganismos, como bactérias, devem

preferencialmente ser analisados no exame micológico direto, porque a cultura destes materiais é complicada,

tendo em vista o predomínio dos outros microrganismos perante o fungo. O exame

citopatológico/histopatológico e a sorologia também são duas técnicas possíveis de serem realizadas.

A paracoccidioidomicose não possui medidas profiláticas e também não se tem descrito contágio inter-humano.

Não requer notificação, ou seja, a notificação dos casos é feita de maneira voluntária. O tratamento é feito com

base em antifúngicos como sulfonamidas, itraconazol, fluconazol e anfoterecina B.

HISTOPLASMOSE

A histoplasmose, também conhecida como “doença das cavernas” e “doença de Darling” é uma infecção

sistêmica causada pela inalação de esporos do fungo dimórfico, saprófita do solo, o Histoplasma capsulatum.
Esse fungo se alimenta de matéria orgânica em decomposição, como excrementos de aves e morcegos que

habitam grutas e cavernas, galinheiros e pombais, ocos de árvore, poleiros, telhados ou construções antigas,

por exemplo. Tem predileção por solos úmidos, ricos em nitrogênio e clima temperado ou tropical. Apesar de

ter sido descoberta primordialmente em cavernas, a infecção não está restrita a grutas e cavernas. Agricultores,

paisagistas, jardineiros, pessoas que trabalham na construção civil, com a criação de aves e controle de pragas

também estão expostos ao risco de serem infectados e desenvolver a doença.

As áreas endêmicas de infecção no continente americano são regioes centro-oeste e sudeste dos EUA e em

vários paises da América Latina. Também há relatos de infecção em nações da África e da Ásia. Portanto,

atuamente a histoplasmose é considerada uma doença de distribuição universal.

A histoplasmose é especialmente preocupante em bebês, adultos com mais de 55 anos e as pessoas com

ssitema imunológico debilitado, como portadores do HIV, de neoplasias, os transplantados e os que fazem uso

de corticoides ou quimioterapia. Além disso, pode se apresentar como um quadro infeccioso de evolução

assintomática ou sintomática (aguda ou crônica).

▪ Histoplasmose pulmonar aguda (caso isolado) ou epidêmica: em geral de curso benigno,

autolimitado e de regressão espontânea. Quando provoca sintomas, são inespecíficos e confundidos

com os de infecções virais leves, de gripe ou de pneumonia.

▪ Histoplasmos epulmonar cavitária crônica: acomete especialmente os tabagistas, com mais de 50

anos e portadores de lesoes pulmonares que favorecem a proliferação do fungo. Os sinais da doença

são, muitas vezes, confundidos com os sintomas da tuberculose pulmonar.

▪ Histoplasmose disseminada progressiva: é a forma mais grave do processo infeccioso, que se

difunde pelas vias linfática e sanguínea e pode afetar todo o sistema reticulo endotelial, do qual é

possível retirar material para análise laboratorial (fígado, baço, medula óssea, glândulas adrenais, pele,

mucosas e etc). Pode produzir complicações pulmonares, cardíacas, nas glândulas adrenais e nas

meninges, que põem em risco a vida dos doentes.

Os fatores de virulência do fungo causador da Histoplasmose são bastante parecidos com os fatores de

virulência do fungo causador da paracoccidioidomicose. O principal fator é capacidade de se transformar em

levedura, seguido pelo crescimento dentro de macrófagos (que depende de ferro e que modula o pH do

fagolisossomo) e pela termotolerância. Existem evidências de que o gene Híbrido Histidina Kinase (DRK1) seja
um regulador global responsável pelo dimorfismo e virulência de H. capsulatum. Ele atuaria como um

modulador requerido para a fase de transição do fungo – fase não patogênica para a fase patogênica, exercendo

influência na expressão de genes de virulência e na patogenicidade in vivo.

O diagnóstico microbiológico pode ser feito a partir de material clínico coletado através de biópsia, aspirado,

lavado brônquico, amostra de sangue ou punção de medula. Esse material é então submetido ao exame

micológico direto e, predominantemente, é feita a cultura por conta de levedura não apresentar um aspecto

característico que permite confirmação diagnóstica a partir do exame micológico direto. A sorologia também é

um método possível, apesar de não ser realizada no Brasil.

O tratamento da Histoplasmose geralmente envolve antifúngicos, como o itraconazol e a anfotericina B, além

da possível retirada cirúrgica de lesões pulmonares.

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