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FLORA NORMAL E AGENTES PATOGÊNICOS

INTRODUÇÃO
COMPOSIÇÃO DO FLUXO VAGINAL: secreções vulvares, transudato vaginal, descamação celular,
secreção cervical (muco), líquidos endometriais/tubários/peritoneais, bactérias e seus produtos.

CARACTERÍSTICAS DO CONTEÚDO VAGINAL FISIOLÓGICO: aspecto branco ou transparente,


volume entre 3 a 4 g/dia, pH entre 3,8 – 4,5, sem associação com sintomas urinários, irritação vulvar,
dispaneuria ou dor abdominal. Existem variações conforme idade, estado emocional, excitação sexual, fase do
ciclo menstrual e gravidez (há uma estreita relação com os hormônios sexuais).

TESTE DE WHIFF: consiste em pingar KOH 10% em uma amostra de conteúdo vaginal. Se houver uma
grande quantidade aminas na amostra, o que acontece quando os bacilos são substituídos por bactérias
anaeróbicas, elas serão volatilizadas, liberando odor de peixe (putricina e cadaverina). Portanto, em um
conteúdo vaginal normal, espera-se que o teste de Whiff seja negativo.

BACTERIOSCOPIA/MICROSCOPIA VAGINAL: pode ser feita a fresco ou corada por gram (BACVAG).
Consiste em coletar uma amostra do conteúdo vaginal e analisá-la através do microscópio. É possível qualificar
o conteúdo em:

 Flora Vaginal Tipo I: 80% de LB


 Flora Vaginal Tipo II: situação intermediária de LB (20% e 80% dos morfotipos encontrados)
 Flora Vaginal Tipo III: ausência ou redução de LB (< 20% dos morfotipos encontrados, com o
predomínio de outras bactérias).

O diagnóstico de vaginose bacteriana, por exemplo, pode ser dado pelo critério de Nugent (>7), feito com base
na análise microbiológica que identifica a morfologia das bactérias no conteúdo vaginal e, a partir disso,
distribui um score. Já no diagnóstico de AMSEL (3 critérios positivos em 4 critérios) se analisa aspectos
clínicos, como corrimento acinzentado com finas bolhas, pH > 4,5, teste das aminas positivo e clue cells em
microscopia a fresco.
VAGINITES

São corrimentos que provocam ou estão associados a processos inflamatórios. As vaginites mais prevalentes
são a candidíase (Candida albicans) e a tricomoníase (Trichomonas vaginalis). A principal diferença entre essas
duas vaginites é que a candidíase não é uma DST, mas a tricomoníase sim. Portanto, o Trichomonas não faz
parte da flora genital normal como é o caso da Candida, que é um fungo comensal.

A candidíase geralmente causa prurido, vulvite e o corrimento é parecido com “leite coalhado”, podendo estar
acompanhado de disúria e dispareunia. A tricomoníase, por sua vez, apresenta um corrimento vaginal profuso,
mais líquido e bolhosos. Também pode haver disúria e dispareunia, mas um aspecto característico da
tricomoníase é o colo uterino em “framboesa”.

VAGINOSES

Ao contrário das vaginites, nas vaginoses não esperamos encontrar processos inflamatórios importantes nem
destruição tecidual intensa de mucosa. A vaginose bacteriana é o corrimento mais comum em mulheres não
grávidas. Em geral, são pacientes que não apresentam queixas vulvares (a vulva está normal), mas possuem um
corrimento acinzentado leve bolhoso que possui mal odor (principalmente quando está menstruada ou após
relação sexual). Também não há coceiras nem ardor. O diagnóstico é feito por Amsel e Nugent.

A vaginose citolítica, por sua vez, está relacionadas a determinadas patologias do ciclo grávido-puerperal. O
corrimento é branco, acompanhado de prurido e ardor, mas sem aspectos tão inflamatórios quanto os da
candidíase. Não há fungos, as células encontram-se rotas com núcleos dispersos no ambiente. Há uma grande
quantidade de LB. É um dos diagnósticos diferenciais mais importantes da candidíase vulvovaginal.

BARTHOLINITES
Bartholinites são situações extremamente comuns na prática diária. Ocorre quando há trauma na região das
glândulas de Bartholin, durante atividade física, atividade sexual, calça apertada e etc. Devido a obstrução do
ducto de escoamento glandular, a glândula começa a aumentar, o que propicia a contaminação pelas bactérias
que rodeiam aquela área genital. Outra possibilidade é a infecção dessas glândulas por bactérias, como
Clamídia, Tricomonas e Neisseria. Nesse caso, essa patologia passa a ser uma DST. Quando há uma reação
inflamatória muito importante, com edema, pus e celulite, devemos desconfiar que há a presença de um
patógeno sexualmente transmissível.

DOENÇA INFLAMATÓRIA PÉLVICA

Doença Inflamatória Pélvica (DIP) constitui-se em um conjunto de sinais e sintomas secundário à infecção
ascendente de microrganismos provenientes da vagina e/ou da endocervice, podendo causar endometrite,
salpingite, ooforite, abscesso tubo-ovariano e/ou peritonite pélvica. São diagnosticados atualmente 770 mil
casos por ano nos EUA.

A maioria dos casos são assintomáticos, mas em alguns casos, principalmente naqueles em que há abcesso
túbulo-ovariano ou nos que não houve melhora com medicação, a internação é necessária. As DIP, devido ao
atraso no diagnóstico e no tratamento, podem ocasionar morte em mulheres jovens.

Neisseria gonorrheae e Chlamydia trachomatis foram identificados como os principais agentes causadores de
DIP. Porém, Gardnerella vaginalis, anaeróbios e outros organismos comumente encontrados na vagina também
estão implicado na etiologia desta. Assim como na bartholinite, a DIP também pode ter componentes
sexualmente transmissíveis, ser puramente uma DST ou não ter nenhum componente de doença sexualmente
transmissível. Como existe modificação de microbiota vaginal, é comum que a DIP esteja associada a vaginose
bacteriana, principalmente em casos de recorrência. Por isso, além da Neisseria e da Chlamydia, outros
patógenos podem estar associados a DIP, como: GV, H. Influenza, S agalactiae, bastonetes entéricas gram
negativas e Streptococcus agalactiae.

FATORES DE RISCO: mulheres jovens (entre 15 e 25 anos), início precoce da vida sexual, ter mais de um
parceiro sexual, sexo desprotegido, infecções do trato genital inferior, manipulações uterinas recentes entre 4 a
6 semanas (inserção de DIU, histeroscopia, curetagem), disbioses (corrimentos de repetição), uso de ducha
higiênica.

QUADRO CLÍNICO: o espectro clínico da DIP é bastante variável. Cerca de 60% dos casos são
assintomáticos. Em 36% dos casos podem existir sinais e sintomas inespecíficos e não proporcionais à
gravidade. Por isso, as pacientes não procuram atendimento e a demora no diagnóstico leva às sequelas graves,
que são as piores consequências da DIP. Portanto, na prática, DIP é um diagnóstico clínico.

Nos casos sintomáticos, os sintomas mais comuns são:

 Dor abdominal baixa, que é tipicamente bilateral (mas pode se apresentar de caráter unilateral);
 Corrimento vaginal ou cervical anormal, na maioria das vezes de aspecto purulento;
 Dispareunia de profundidade;
 Sangramento vaginal anormal, incluindo sangramento pós-coito, sangramento intermenstural e menorragia;
 Dismenorreia secundária.

DIAGNÓSTICO: o diagnóstico de DIP é dado por 3 critérios maiores + 1 critério menor ou elaborado. São
critérios maiores a dor em abdome inferior, dor à mobilização do coloco e dor à palpação de regiões anexiais.
São critérios menores: temperatura axilar > 38,3 °C, conteúdo vaginal ou secreção endocervical anormal, massa
pélvica, >5 leucócitos por campo em secreção, leucocitose, proteína C reativa ou VHS elevada, documentação
da presença de NG, CT ou MG em conteúdo vaginal. Os critérios elaborados são exames complementares como
histopatologia com evidência de endometrite, USG de abcesso ou líquido livre em fundo de saco uterino e
laparoscopia com evidências de DIP.

DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS: gravidez ectópica, apendicite aguda, infecção do trato urinário,


complicações de um cisto ovariano (ruptura, torção), litíase ureteral. O diagnóstico diferencial é feito através
dos exames beta HCG, HMG, U1 e USTV.

ESTADIAMENTO DA DIP: é feito em 4 estádios. Apenas o estádio I permite que a paciente seja tratada em
casa. Todos os outros estádios exigem internação e acompanhamento hospitalar.

EI: salpingite e/ou endometrite sem peritonite.

EII: salpingite com peritonite, mas sem massas anexiais ou abscessos.

EIII: abscesso tubo-ovariano ou abscesso central de ovário.

EIV: abcesso roto com peritonite difusa e sinais de choque.

COMPLICAÇÕES: as principais complicações agudas são abscessos tubo-ovarianos, Síndrome de Fitz-Hugh-


Curtis (abscesso peri-hepático) e peritonite generalizada. Já as principais complicações crônicas são
infertilidade, gestação ectópica, dor pélvica crônica e Síndrome de Fitz-Hugh-Curtis com aderências peri-
hepáticas/cordas de violino.

CASOS CLÍNICOS

CASO 1: 25 anos. Queixa de corrimento branco grumoso com prurido e queimação vulvo-vaginal. Antecedente
de sinusite com antibioticoterapia por 2 semanas. Ao exame físico nota-se eritema vulvar. O exame citológico
da secreção vaginal demonstrou os achados abaixo.
Diagnóstico: vulvo-vaginite por Candida sp (em 90% dos casos trata-se de Candida albicans).

Fatores predisponentes: diabete descompensado, uso de corticóides e antibióticos, gravidez, uso de


anticoncepcional, imunossupressão e etc.

CASO 2: 31 anos. Paciente com lúpus apresentou pequenas vesículas e lesões ulceradas em região vulvar.
Foram realizadas a citologia e a biópsia, que identificaram os achados abaixo.

Diagnótisco: vulvite herpética. As pequenas vesículas se transformam em úlceras. Nota-se células epiteliais
degeneradas na borda da úlcera, com multinucleação e inclusão nuclear.

CASO 3: 60 anos. Queixa de queimação e prurido na região vulvar. Ao exame físico, nota-se a pele da região
vuvlar com placas esbranquiçadas, áreas de erosão e perda da elasticidade.
Diagnóstico: líque escleroso da vulva. De patogênese desconhecida (possivelmente auto-imune), leva à atrofia
vulvar. Possui associação com o desenvolvimento de carcinoma escamoso.

CASO 4: 28 anos, branca, doméstica, com queixa de corrimento (leucorreia). Ao exame especular, foram
observados ectrópios e cistos de Naboth no colo uterino. A citologia oncótica foi inflamatória (antiga classe II
de Papanicolau) e foi biopsiada uma área suspeita à colposcopia.

Diagnóstico: cervicite crônica inespecífica. Nota-se também metaplasia escamosa do epitélio endocervical com
cistos de Naboth.

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