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DIREITO DAS
OBRIGAÇÕES
TURMAS 1 E 2
PRÁTICA - 1.º SEMESTRE
BRUNA MARIANA - COM COLABORAÇÃO DE
ANA MARGARIDA
FACULDADE DE DIREITO DA UNIVERSIDADE DO PORTO
2022/2023
Faculdade de Direito da Universidade do Porto 2022/23
Nota Introdutória
Bom estudo!
Índice
1) Convencionam que o preço será pago cinco dias depois e que o carro será entregue na
mesma altura.
2) O carro é entregue de imediato. Convencionam que o preço será pago em 10 prestações
de 1.200 € cada.
O contrato que está aqui em causa é um contrato de compra e venda. As partes que
constituem este contrato são: o vendedor (C) e o comprador (N).
Classificação do contrato:
⚫ Negócio jurídico bilateral;
⚫ Contrato bilateral: contrato que gera obrigações para ambas as partes sendo que as
obrigações geradas estão ligadas por um nexo do sinalágma;
⚫ Contrato nominado: foi lhe atribuído um nomen iuris, neste caso o nomem iuris é
contrato de compra e venda;
⚫ Contrato legalmente tipificado: o contrato de compra e venda está tipificado na lei,
tendo um regime previsto para ele nos artigos 875º e ss do CC;
O nexo do sinalagma é muito importante geneticamente e funcionalmente, porque
enquanto N não pagar o preço, se não houver prazos distintos para o cumprimento, C
pode não entregar a coisa.
Como se denomina este meio de defesa? Exceção do não cumprimento (artigo 428º
CC).
⚫ Contrato oneroso: gera sacrifícios patrimoniais para ambas as partes, o que significa
que ambas as partes suportam sacrifícios patrimoniais que estas perspetivam como
equivalentes;
⚫ Contrato consensual: não é um contrato real real quanto à constituição - aquele
em que a celebração do contrato não depende apenas do mútuo consentimento,
carecendo ainda de um ato material ou simbólico de entrega da coisa;
⚫ Contrato consensual/não formal (artigo 219º do CC): não é exigido uma forma
especial para a emissão das declarações negociais vigorando um princípio da
liberdade de forma (artigo 219º CC). A entrega da coisa não é um elemento
formativo do contrato, é sim objeto de uma obrigação que pressupõe que o contrato
já esteja celebrado.
⚫ Contrato real quanto aos efeitos (artigo 879º do CC): para além dos efeitos
obrigacionais das alíneas b) e c) o contrato de compra e venda também gera efeitos
reais – transferência do direito de propriedade. Este efeito de transferência do direito
de propriedade opera-se nos termos do artigo 408º nº1 CC, isto é, por mero efeito
do contrato.
Classificação das obrigações principais:
A obrigação principal que nasce para o vendedor é a obrigação de entregar a coisa
vendida.
⚫ Prestação de coisa: é uma prestação de coisa porque o objeto mediato é uma coisa
(sendo esta uma coisa presente);
⚫ Obrigação instantânea: pois cumpre-se de uma só vez;
⚫ Prestação de entregar: porque quando o C entrega ao N o carro não se transmite o
direito real sob o carro pois este já se transmitiu por força do artigo 408º nº1.
Resposta à pergunta 1:
⚫ Prestação instantânea: o pagamento do preço é efetuado de uma só vez passados 5
dias.
Resposta à pergunta 2:
⚫ Prestação instantânea fracionada: o preço é pago em 10 prestações. O tempo não
influi no quantum devido.
Este aspeto é importante porque ao celebrar o contrato a 11 de Outubro e o carro for
destruído por facto não imputável a nenhuma das partes em dezembro o comprador tem
que continuar a pagar o preço até perfazer os 12 mil euros, sendo o risco da
responsabilidade do comprador.
Imaginemos que há uma causa que permite resolver este contrato em janeiro e o
automóvel tem um defeito e o comprador tem uma justificação suficiente para resolver o
contrato, sendo a resolução uma forma de extinção do contrato com efeitos retroativos -
artigo 434º CC.
Nos contratos duradouros a resolução não abrange as prestações já efetuadas, exceto
se entre estas e a causa de resolução existir um vínculo que legitime a resolução de todas
elas, mas a resolução, em princípio, não tem efeitos retroativos.Um contrato de compra e
venda não é um contrato duradouro, o que significa que o vendedor vai ter que devolver
a parte do preço que já recebeu e o comprador vai ter de entregar a coisa vendida, ou seja,
a sua resolução tem efeitos retroativos.
Classificação do contrato:
⚫ Contrato bilateral: gera obrigações para ambas as partes que estão ligadas por um
nexo de sinalagma. Deste contrato nascem várias obrigações, para o locatário - artigo
1038º CC – e para o locador - artigo 1031º;
⚫ Contrato nominado;
⚫ Contrato legalmente tipificado: o contrato de locação está regulado nos artigos
1022º e ss. CC e o contrato de arrendamento urbano nos artigos 1064º e ss. CC. E
quando o arrendamento é destinado à habitação ainda está sujeito a regras especiais
que estão contidas nos artigos 1092º e ss. CC. Este recebe um tratamento jurídico
específico em função não só do objeto arrendado (bem imóvel, mais especificamente
um prédio urbano) mas também porque se destina à habitação, sendo este tratamento
mais protecionista do arrendatário;
⚫ Contrato oneroso: gera sacrifícios para ambas as partes que se perspetivam como
equivalentes. O sacrifício patrimonial para o locatário é pagar a renda (equivale ao
valor do gozo da coisa) já para o locador é ceder a coisa.
⚫ Contrato consensual: não é necessária a entrega da coisa para que o contrato se
forme, formando-se sim pelo mútuo consenso.
⚫ Contrato formal: não está sujeito à liberdade de forma (artigo 219º do CC), tendo
que ser celebrado por escrito nos termos do artigo 1069º do CC.
⚫ Contrato meramente obrigacional: não é um contrato real quanto aos efeitos, : na
medida em que o contrato de arrendamento não produz efeitos reais.
NOTA: Durante algum tempo Menezes Cordeiro entendeu que a posição jurídica do
locatário não era puramente obrigacional (porque o adquirente do direito com base no
qual foi celebrado o contrato sucede nos direitos e obrigações do locador, mantendo-se o
contrato de arrendamento mesmo que a pessoa do locador mude pois o direito do locatário
é oponível ao novo adquirente do bem – característica de sequela), antes entendeu que
participava de natureza real.
Hoje não temos nenhuma doutrina que se destaque e que defenda que este é um contrato
real.
A obrigação principal que nasce para o senhorio é assegurar o gozo da coisa locada.
⚫ Prestação de facto: Esta obrigação traduz-se em várias ações (p.e. obras e atos de
conservação), mas sobretudo omissões (o senhorio vai ter que tolerar que o inquilino
goze da casa), ora é uma obrigação que tem por objeto uma prestação de facto, de
natureza vária fundamentalmente negativa mas que também pode ter componentes
positivas.
⚫ Prestação duradoura de execução continuada: na medida que ele vai assegurar o
gozo da coisa durante todo o tempo.
Importante:
Imagine-se que o contrato foi celebrado no final de Agosto para se iniciar a sua vigência
em Setembro, sendo que se previu uma vigência de 3 anos. Se no final de Dezembro uma
trovoada muito intensa faz com que o edifício seja atingido por um raio e a fração
autónoma seja destruída então o contrato de arrendamento extingue-se porque a
obrigação de proporcionar o gozo da coisa torna-se objetivamente impossível por causa
não imputável a nenhuma das partes (artigo790º CC). Sendo que a obrigação de entregar
os 400 euros por mês também se extingue porque a extensão daquilo que é devido
depende do decurso do tempo (a renda relativa ao período de janeiro está dependente do
gozo durante o mês de janeiro).
Classificação do contrato:
⚫ Contrato bilateral: gera obrigações para ambas as partes, que estão ligadas pelo
nexo de sinalagma;
⚫ Contrato nominado;
⚫ Contrato legalmente típico: o seu regime está previsto nos artigos 1152º e 1153º e
no Código do Trabalho.
⚫ Contrato oneroso: gera vantagens e desvantagens patrimoniais para ambas as partes,
perspetivadas por estas como equivalentes. Quais são as desvantagens patrimoniais?
Para o trabalhador é dedicar o seu tempo, energia e capacidades no desenvolvimento
da atividade, já para o empregador é ter de pagar a retribuição.
⚫ Contrato consensual: não é um contrato real quanto à constituição.
⚫ Contrato consensual/ não formal: não exige, como regra geral, forma especial –
artigo 110º CT. No entanto, há inúmeras exceções.
⚫ Contrato meramente obrigacional: gera obrigações para ambas as partes e não
produz efeitos reais. Não é real quanto aos efeitos nem quanto à constituição
Classificação do contrato:
⚫ Contrato bilateral: gera obrigações para ambas as partes que estão ligadas por um
nexo do sinalagma, na medida em que E obriga-se a vender e R obriga-se a comprar.
⚫ Contrato nominado;
⚫ Contrato legalmente típico: previsto no artigo 410º e ss do CC.
⚫ Contrato oneroso: Um contrato é oneroso quando gera desvantagens patrimoniais
para ambas as partes, sendo que a obrigação de emitir uma declaração negocial tem
valor económico, pois a pessoa vincula-se a um comportamento que tem um
determinado valor económico. Logo, podemos considerar que é um contrato
oneroso, porém é uma questão muito discutida, porque tem a ver com saber se a
obrigação de emitir uma declaração negocial representa uma desvantagem
patrimonial
⚫ Contrato formal: O contrato-promessa, em princípio, é consensual no sentido de
não exigir forma especial. As regras da forma são uma das exceções do princípio de
equiparação – artigo 410º nº1 CC (“À convenção pela qual alguém se obriga a
celebrar certo contrato são aplicáveis as disposições legais relativas ao contrato
prometido, excetuadas as relativas à forma e as que, por sua razão de ser, não se
devam considerar extensivas ao contrato-promessa”). Logo, não aplicamos o
artigo 875º do CC ao contrato-promessa de compra e venda. Em princípio, vigora a
regra geral quanto à forma – liberdade de forma (artigo 219º CC).
No entanto, como neste caso como o contrato prometido/contrato definitivo é um contrato
para o qual a lei exige ser reduzido a escrito num documento, então ao contrato-promessa
vai ser exigida forma escrita (documento assinado por ambas as partes) – artigo 410º nº2
(“Porém, a promessa respeitante à celebração de contrato para o qual a lei exija
documento, quer autêntico, quer particular, só vale se constar de documento assinado pela
parte que se vincula ou por ambas, consoante o contrato-promessa seja unilateral ou
bilateral”). Logo, quanto a este sentido e neste caso específico, não é consensual pois é
um contrato formal por força do artigo 410º nº2 CC, conjugado com o que é exigido pelo
artigo 875º CC.
⚫ Contrato consensual: não é um contrato real quanto à constituição, na medida
em que não é necessário a entrega da coisa para que o contrato se forme, basta o
encontro das duas declarações negociais,
⚫ Contrato meramente obrigacional: não é um contrato real quanto aos efeitos. Em
geral, os contratos-promessa têm eficácia meramente obrigacional, no entanto às
vezes são dotados de eficácia real (artigo 413º do CC).
e) No dia 1 de Setembro, F entrega ao vizinho S, a sua gata, para que este a guarde durante
a sua quinzena de férias, e lha devolva quando ela regressar.
O contrato que aqui está em causa é um contrato de depósito, que é uma espécie do
contrato de prestação de serviços – artigos 1154º e 1155º CC. Depósito é o contrato pelo
qual uma das partes entrega à outra uma coisa, móvel ou imóvel, para que a guarde, e a
restitua quando for exigida.
As partes que constituem este contrato são o depositante (F) e o depositário (S).
Classificação do contrato:
⚫ Contrato Unilateral: só gera obrigações ab initio para uma das partes, mais
concretamente para o depositário (pessoa que tem que guardar a coisa)
⚫ Contrato nominado;
⚫ Contrato legalmente tipificado: (o seu regime está previsto no artigo 1185º e ss do
CC;
⚫ Contrato Gratuito: só gera desvantagens patrimoniais para uma das partes, F não
se obriga a pagar qualquer valor como contrapartida pela guarda da coisa. As
características da unilateralidade e gratuitidade estão associadas- Artigo 1186º do
CC (que remete para o artigo 1158º) e 1158º do CC (“O mandato presume-se
gratuito, exceto se tiver por objeto atos que o mandatário pratique por profissão; neste
caso, presume-se oneroso”);
⚫ Contrato consensual/ não formal: não existe nenhuma exigência formal.
⚫ Contrato real quanto à constituição: a entrega da coisa depositada é um elemento
formativo do contrato e para a formação do contrato não basta a emissão das
declarações negociais – artigo 1185º do CC.
Classificação do contrato:
⚫ Contrato unilateral: só gera obrigações para o mutuário (O), já para o mutuante não
nasce nenhuma obrigação (nem sequer a entrega da coisa mutuada). A entrega da
quantia mutuada é um facto formativo do contrato.
⚫ Contrato nominado:
⚫ Contrato legalmente típico: o seu regime está previsto nos artigos 1142 e ss do
CC;
⚫ Contrato oneroso: gera desvantagens patrimoniais para ambas as partes, que elas
perspetivam como equivalentes (para O a desvantagem patrimonial é o pagamento
de juros à taxa de 5%, já para o Z é a cedência do gozo daquela quantia mutuada ao
mutuário durante um certo período de tempo)
⚫ Contrato real quanto à constituição: para a sua formação não basta o mútuo
consenso, é necessário a entrega da coisa;
⚫ Contrato real quanto aos efeitos: Enquanto que no contrato de comodato a coisa
continua a ser da titularidade do proprietário, já no contrato de mútuo a coisa mutuada
passa a ser da titularidade do mutuário, sendo que o O vai ter de entregar uma quantia
equivalente no fim do contrato. – Artigo 1144º CC (“As coisas mutuadas tornam-se
propriedade do mutuário pelo facto da entrega”)
⚫ Contrato formal: este contrato exige quanto à forma um documento assinado pelo
mutuário - artigo 1143º CC. No entanto, pode ser consensual se a quantia mutuada
for inferior a 2500 euros.
B pretende obter de C uma indemnização pelos danos que sofreu. Terá razão?
No que diz respeito ao valor da indemnização devida por A em regra, esta equivale aos
danos/prejuízos causados, visando eliminar o dano e reconstituir a situação (hipotética)
que existiria se não se tivesse verificado o facto que gera a responsabilidade. Nesta vão
ser abrangidos danos emergentes e lucros cessantes- artigo 562º do CC (“Quem estiver
obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse
verificado o evento que obriga à reparação”). Em princípio, indemnização equivale ao
montante dos danos e calcula-se pela chamada teoria da diferença como vemos no
artigo 566º nº2 do CC -“A indemnização em dinheiro tem como medida a diferença
entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo
tribunal, e a que teria nessa data se não existissem danos”.
O lesado tem em regra que demonstrar que sofreu danos e que estes se ligam causalmente
ao incumprimento obrigacional ou seja, o lesado tem o ónus de provar que sofreu danos
provocados pelo incumprimento obrigacional.
Se não se provar o dano não vai haver lugar à indemnização porque nós não estamos
perante a responsabilidade penal, onde se pretende reafirmar a norma na sociedade. A
responsabilidade civil serve o propósito de satisfazer o interesse do lesado, eliminando os
danos que ele sofreu.
Neste caso não vai ser necessário calcular a indemnização nem provar o dano porque foi
fixada uma cláusula penal, nos termos do artigo 810º do CC. Uma das grandes
vantagens da cláusula penal para o credor, para além de compelir ao cumprimento, é o
facto de ele não ter que provar que sofreu danos, ou seja, o montante indemnizatório é
fixado em abstrato, ao contrário do que sucede no cálculo normal da indemnização, que
é feito em concreto.
Pelo o que foi exposto já sabemos que B pode exigir a A os 10500€, mas a questão que
se coloca no caso era se o B pode exigir a C uma indemnização pelos danos por ele
causados. Ora saber se C pode indemnizar B pelos danos que lhe causou leva-nos então
à problemática da eficácia externa das obrigações. Esta problemática trata de saber se
um terceiro que contribua com o seu comportamento para que a obrigação seja
incumprida pode ser responsabilizado pelo seu ato que concorre para a violação do
direito de crédito. Este comportamento de terceiro pode traduzir-se num ataque ao
próprio crédito ou num ataque ao substrato do crédito. No caso em análise, há um
ataque ao próprio crédito porque o terceiro colabora com o devedor celebrando um
contrato incompatível com o cumprimento da obrigação.
Eles não negam que a estrutura interna da obrigação é relativa, não negam que o único
sujeito ao qual pode ser exigido o cumprimento é o devedor (neste caso, em concreto, o
A), o que entendem é que ao lado da eficácia interna da obrigação existe uma eficácia
externa, que permite que o terceiro possa vir a ser responsabilizado pelos os seus atos que
traduzam uma violação do direito de crédito. Esta responsabilização fundar-se-á no artigo
483º do CC. Ora segundo a doutrina que defende a eficácia externa das obrigações, para
que o terceiro possa ser responsabilizado, é necessário que se verifique cumulativamente
os requisitos constantes do artigo 483º do CC.
1. O ato - tem que haver um ato que pode ser positivo ou negativo;
2. A ilicitude - violar ilicitamente o ato;
3. A culpa - com dolo ou mera culpa;
4. O dano - tem que ser produzidos danos;
5. O nexo causal - tem que haver um nexo de causalidade entre o ato e o dano.
⚫ Estes autores sublinham também que a tese por eles defendida não conduz a um
excesso de responsabilização oferecendo em vez disso uma proteção adequada
porque a responsabilidade de terceiro pressuporá a verificação cumulativa dos
pressupostos previstos no artigo 483º.
Devido a estas razões esta parte da doutrina recusa a eficácia externa das obrigações.
Contudo, estes autores admitem que os terceiros possam ser responsabilizados pelos seus
comportamentos que contribuam para a violação do direito de crédito, convocando para
isso o instituto do abuso de direito.
Ora se um terceiro ultrapassar os limites do artigo 334º do CC º ele atua em abuso do
direito e a atuação em abuso de direito é uma atuação ilícita, que convoca a aplicação do
artigo 483º do CC.
Enquanto que os autores que acolhem a eficácia externa das obrigações aplicam
diretamente o artigo 483º, os que a rejeitam quando aceitam que o terceiro possa ser
responsabilizado, para chegar ao artigo 483º tem de passar pelo artigo 334º. Isto é, têm
de afirmar que há um exercício abusivo do direito para que possa afirmar a ilicitude e
consequentemente aplicar o artigo 483º. A responsabilização do terceiro pressupõe a
verificação dos pressupostos do artigo 483º.
É certo que B terá que responder perante a morte de A (violação de um direito absoluto)
estando preenchidos todos os requisitos do artigo 483º do CC, respondendo
nomeadamente quanto aos herdeiros e quanto a certas pessoas que estão previstas no
artigo 496º do CC. Mas a questão que aqui se coloca é a de saber se B, terá que responder
também perante a sociedade titular do clube onde A prestava a sua atividade, estando
assim convocada a problemática da eficácia externa das obrigações.
Já sabemos que face a este problemática temos duas correntes doutrinais e por isso: a
parte da doutrina que acolhe a eficácia externa das obrigações entende que aqui se aplica
o artigo 483º para a violação do direito de crédito; já a doutrina maioritária que rejeita a
eficácia externa das obrigações defende que o artigo 483º não se aplica à violação dos
direitos de crédito, admitindo apenas que o terceiro poderá ser responsabilizado se
estivermos perante situações que convoquem o abuso de direito (artigo 334º do CC).
1. Para quem acolhe a eficácia externa das obrigações aceita que B seja
responsabilizado pela morte de A, caso estejam verificados os pressupostos do artigo
483º do CC. Acontece que neste casos nem todos os pressupostos estão verificados,
porque B não conhecia o direito de crédito da sociedade, ou seja não está aqui
verificado o requisito da culpa. Então a sociedade detentora do clube em que A
jogava não pode exigir a responsabilização de B nem uma indemnização a este.
2. Quanto aos que rejeitam a eficácia externa das obrigações, estes afirmam que além
de não haver eficácia externa das obrigações, aqui também não se convoca o artigo
334º do CC, na medida em que B não exerce nenhum direito ou faculdade abusiva.
Assim neste caso não estão verificados os pressupostos de que depende a
responsabilização do terceiro, por isso não há responsabilização do terceiro.
b) E C, filho de A, poderá demandar B pela perda de 350 € mensais que o pai lhe prestava
em cumprimento da obrigação de alimentos que sobre ele impendia em conformidade
com a decisão judicial relativa à regulação do exercício das responsabilidades parentais?
Nesta alínea vemos que há uma obrigação de A de pagar alimentos a C, seu filho por
decisão do tribunal. Neste caso o que está em causa é um ataque ao substrato de crédito,
da pessoa do devedor.
Classificação do contrato:
⚫ Contrato típico;
⚫ Contrato oneroso;
⚫ Contrato bilateral;
⚫ Contrato meramente obrigacional;
⚫ Contrato real quanto aos efeitos;
⚫ Contrato consensual.
Obrigações principais:
⚫ Obrigação de entregar a coisa vendida: prestação de coisa instantânea;
⚫ Obrigação de pagar o preço: prestação de coisa pois a obrigação tem por objeto
dinheiro como meio de pagamento; instantânea e fracionada na medida em que o
pagamento foi fracionado em 12 prestações. Não estamos perante uma prestação
duradoura porque o tempo não tem influência no montante legal que é devido, o
tempo apenas se repercute no modo de pagamento.
Ora vimos que nos termos do artigo 934º do CC haveria perda do benefício do prazo,
contudo nos termos do mesmo artigo o devedor poderia resolver o contrato. Nesta
hipótese, B se quisesse pôr fim ao contrato com base na falta de pagamento do preço, aqui
não se aplicava o limite do artigo 886º, uma vez que as partes convencionaram uma
cláusula de reserva de propriedade (artigo 409º), e por isso o direito real não se
transmitiu, este só se iria transmitir com o pagamento integral do preço. Se pelo contrário,
tivesse havido tanto a transferência do direito real como a entrega da coisa (requisitos
cumulativos) o vendedor não poderia resolver o contrato podendo apenas exigir o
pagamento do preço e uma indemnização pelos danos moratórios.
Assim havendo a estipulação de uma cláusula de reserva de propriedade prevista no
artigo 409º afasta a aplicação da regra prevista no artigo 408º nº1.
requisitos preenchidos para haver lugar à resolução do contrato era necessário que o
devedor faltasse ao pagamento de uma prestação e que essa excedesse a oitava parte
do preço ou se faltasse ao pagamento de mais do que uma prestação (ou seja de duas
ou mais prestações).
Acresce que para o vendedor resolver o contrato é necessário que estejam verificados os
pressupostos gerais da resolução (artigo 801º).
O não cumprimento está regulado nos artigos 790º e ss e neste âmbito o legislador fez a
seguinte sistematização: não cumprimento não imputável ao devedor (artigo 790º a
artigo 797º CC) e incumprimento for imputável ao devedor ( artigo 798º e ss. CC).
Dentro do incumprimento que não é imputável ao devedor, o legislador distinguiu o
mero atraso (“impossibilidade temporária”) da situação de incumprimento definitivo
(“impossibilidade definitiva”), já no que diz respeito ao incumprimento imputável ao
devedor distinguiu o mero atraso (“mora”) do incumprimento definitivo ( previsto
no artigo 801º).
No âmbito contratual, vigora uma presunção de culpa prevista no artigo 799º, em que
segundo ela é o devedor que tem o dever de provar que a falta de cumprimento da
obrigação não foi culpa sua. Assim o ónus da prova recai sobre o devedor.
Em suma: ainda que o artigo 934º, neste caso, permita a resolução, esta só é possível se
estiverem verificados os requisitos gerais do artigo 801º. Assim o vendedor (B) para
resolver o contrato de compra e venda terá de transformar a mora em incumprimento
definitivo através da interpelação cominatória e se este resolver o contrato sem o devedor
estar em incumprimento definitivo, então a resolução é inválida.
A resolução neste caso tem efeitos retroativos, como vemos no artigo 434º, o que quer
dizer que as prestações realizadas têm de ser restituídas. Assim sendo, o comprador tem
que devolver o carro e o vendedor tem que devolver a parte do preço que já tinha recebido,
isto sem prejuízo deste o direito a uma indemnização – artigo 801º nº2.
Contrato de arrendamento
Classificação do contrato:
⚫ Contrato legalmente típico;
⚫ Contrato bilateral;
⚫ Contrato oneroso;
⚫ Contrato formal
⚫ Contrato meramente obrigacional.
Obrigações principais:
⚫ Obrigação de pagar a renda- prestação de coisa; prestação duradoura reiterada
periódica.
⚫ Obrigação da entrega da coisa locada- prestação instantânea.
Face a esta situação o que o senhorio poderia fazer é que para além de poder exigir a
renda em falta, pode também exigir uma nos termos do artigo 1041º nº1 indemnização
moratória (que corresponde a 20% do que foi devido). A indemnização pelos danos
moratórios é calculada em termos abstratos porque é calculada por aplicação de uma
percentagem.
Neste sentido A deve a B 20% do que é devido, logo B pode exigir uma renda
corresponde a 1000€ mais os 200€ da indemnização.
b) Suponha agora que A vende o automóvel a C, acordando que o automóvel devia ser
entregue a este último no início de março - altura em que o A receberia o seu novo veículo
- e que o preço deveria ser pago no início do mês de julho. Considerando que A descobre,
em finais de fevereiro, que a situação económica de C se deteriorou consideravelmente
em virtude de um endividamento excessivo, pode aquele recusar-se a
entregar-lhe o automóvel? (hipótese independente).
Neste caso o A vende o seu automóvel a C e estes acordam que A deve entregar o
automóvel no início de março e que o preço só deve ser pago no início do mês de julho.
Acontece que A não quer entregar o automóvel a C por receio deste não pagar o preço.
A tem de entregar o carro?
Convoca-se neste caso a figura da exceção de não cumprimento (artigo 428º) (ver
definição da exceção do n cumprimento nas teóricas).
Está aqui em causa aferir saber se o A pode recusar cumprir a obrigação enquanto a
contraparte não cumprir a sua estando ambas ligadas pelo vínculo do sinalagma
(obrigação de entregar a coisa e obrigação de pagar o preço).
Ora o problema que aqui se coloca advém do facto dos prazos para o cumprimento das
obrigações serem diferentes. As partes afastaram a regra supletiva prevista no artigo
885º CC que nos diz que o pagamento do preço faz-se no momento da entrega da coisa.
Assim aplicando-se a regra supletiva há simultaneidade das prestações.
Neste caso, como o desencontro temporal advém do acordo entre as partes, não podemos
aplicar o artigo 428º e temos que por isso de atentar no disposto no artigo 429º. Segundo
este artigo aquele que ainda esteja obrigado a cumprir em primeiro lugar, tem a
faculdade de recusar a respetiva prestação se posteriormente ao contrato se verificar
alguma das circunstâncias que importam a perda do benefício do prazo- estas
circunstâncias estão previstas no artigo 780º do CC e são:
⚫ Situação de insolvência ainda que não judicialmente declarada;
⚫ Diminuição das garantias de crédito por causa imputável ao devedor;
⚫ Não prestação das garantias por causa imputável ao devedor.
Não se verificando nenhuma destas situações não haverá perda do benefício do prazo nem
haverá lugar consequentemente à exceção do não cumprimento.
Face à interpretação do artigo 429º a doutrina diverge:
➢ Segundo parte da doutrina, ancorada na letra e na história do artigo, só pode aplicar-
se a exceção de não cumprimento no âmbito do artigo 429º quando se verificar uma
causa da perda do benefício do prazo nos termos do artigo 780º – o que quer dizer
que se não se verificar uma das situações do artigo 780º, mesmo que a situação
Caso Prático nº 5
A dirige-se com a sua filha, B, ao estabelecimento comercial de C para encomendar
um smoking para vestir no casamento do seu filho, D, que se realizaria daí a um mês.
Enquanto A consultava os mostruários da loja, B escorrega e cai numa esfregona que
F, empregada de limpeza de C, tinha descuidadamente deixado para trás aquando da
limpeza, fraturando uma perna.
Em consequência do acidente, B sofre várias escoriações no braço esquerdo e parte a
perna direita. Os tratamentos prolongam-se durante algumas semanas e o seu custo
ascende a várias 1.500 euros.
Perante o acidente sofrido B poderá exigir uma indemnização pelos danos sofridos, tendo
por base a responsabilidade civil extracontratual e responsabilidade civil contratual.
Para o lesado ser indemnizado cabe-lhe fazer prova dos factos constitutivos, ou seja é
sobre ele que recai então o ónus da prova.
Além de F, também C teria que responder. Ora C na qualidade de comitente, mesmo que
não tenha culpa, teria que responder ao abrigo do artigo 500º do CC pelos danos que a
sua comissária (F) causou no exercício das funções que lhe foram confiadas, se estiverem
verificados cumulativamente os pressupostos do mesmo artigo:
◼ Tem que haver uma comissão;
◼ Os danos têm que ter sido produzidos no exercício das funções da comissária;
◼ Tem de se verificar responsabilidade por parte da comissária, ou seja sobre ela
tem que recair um dever de indemnizar (artigo 483º do CC).
de deveres acessórios de conduta ou deveres laterais e existem mesmo sem que existam
deveres principais, ou seja, são independentes da sua existência.
Na nossa hipótese prática, as partes do contrato eram A e C, mas quem se tinha esquecido
da esfregona tinha sido F o que originou o acidente de B. Com o esquecimento da
esfregona por parte de F foram violados deveres de proteção, deveres esses que visam
cumprir uma função essencialmente negativa, evitando danos na pessoa ou no património
das partes. Aqui a pessoa lesada era a filha daquele que seria uma das partes do contrato
a celebrar.
Os deveres acessórios de conduta (que emergem da boa-fé) estendem a sua eficácia
protetiva a terceiros, mas não a todos os terceiros. Estes deveres estendem-se aos
terceiros que as partes possam esperar uma proteção equivalente à sua, àquelas em
que à luz do princípio da boa-fé devem ser abrangidas nesta eficácia de proteção, sendo,
em regra, pessoas ligadas proximamente às partes ou ao objeto da prestação. Estamos
então perante um contrato com eficácia de proteção em relação a terceiros, o que se
manifesta desde logo na fase pré-contratual (artigo 227º do CC) o que significa que B
estaria protegida ao abrigo destes deveres.
Estes dois caminhos são cumulativos? Estando aqui em causa a aplicação dos dois
regimes, coloca-se a problemática do concurso de títulos de responsabilidade civil.
Perante este problema a doutrina não é unânime e por isso têm sid apresentadas várias
posições:
a) Na data acordada, F não entrega o automóvel, mas exige o pagamento dos 24.000 €.
Quid iuris?
Nesta situação as partes acordaram a data em que o carro deveria ser entregue ( carro
devia ser entregue passado 5 dias) porém não convencionaram quando é que o preço
deveria ser pago, logo aplica-se a regra supletiva do artigo 885º do CC (o preço deve ser
pago no momento e no lugar da entrega da coisa vendida).
Estamos perante um contrato bilateral de onde nascem duas obrigações principais ligadas
pelo nexo do sinalagma: a obrigação de entregar a coisa (automóvel) e a obrigação de
pagar o preço. Ora como constatamos anteriormente, as partes nada convencionaram
quanto à entrega do preço, por isso não havendo prazos diferentes G pode recorrer à
exceção do não cumprimento prevista no artigo 428º do CC. Recorrendo G a este
mecanismo pode recusar-se a pagar o preço enquanto o automóvel não for entregue.
A obrigação de entrega do livrete não é uma obrigação principal, mas sim um dever
secundário acessório da prestação principal. Acontece que sem o cumprimento destes
deveres acessórios o cumprimento do dever principal não satisfaz o interesse do credor,
isto é a entrega do carro sem o livrete não satisfaz o interesse do credor porque sem este
o carro não pode circular. Estes deveres acessórios da obrigação principal estão incluídos
no sinalagma , o que quer dizer que o G pode lançar mão dos vários mecanismos que
dele decorrem:
1. Exceção do não cumprimento (artigo 428º do CC): o comprador pode recusar-se
a pagar o preço enquanto o vendedor não lhe entregar o livrete.
2. O comprador pode exigir judicialmente o cumprimento, acrescido de uma
indemnização pelos danos causados pelo atraso da entrega do livrete (danos
moratórios) nos termos do artigo 804º do CC.
3. O comprador pode ainda resolver o contrato por falta da entrega do livrete através da
resolução, mas para isso é necessário converter a mora em incumprimento
definitivo através da interpelação cominatória, acrescendo ainda uma
indemnização (artigo 801 nº2 do CC).
Ora no caso da resolução esta tem efeitos retroativos logo se G opta-se por esta via as
obrigações que tinha sido cumpridas teriam que ser restituídas.
Aqui a obrigação principal foi cumprida, porém além desta estamos perante um dever
lateral acessório de conduta que emerge do princípio da boa-fé. Estes deveres visam
visam garantir o cumprimento do interesse contratual que é mais abrangente que o mero
interesse na prestação. Neste caso estamos perante um dever de informação ou
esclarecimento, dever esse que se estende à fase pós-contratual, não estando em regra
incluído no sinalagma.
Assim sendo, perante esta situação convoca-se o regime da violação contratual positiva,
o que quer dizer que o G tem o direito a ser indemnizado nos termos do artigo 798º do
CC (“O devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se
responsável pelo prejuízo que causa ao credor”).
d) Na noite anterior à data acordada para a entrega do automóvel, F usa-o para se deslocar
a uma festa de aniversário de um amigo. No regresso a casa, conduzindo em excesso de
velocidade e com um nível de álcool muito elevado no sangue, não consegue
travar atempadamente num sinal vermelho, indo embater num outro veículo. Em virtude
deste acidente, o automóvel fica totalmente destruído. Quid iuris?
Esta indemnização vai colocar o sujeito na situação que ele estaria se tivesse havido o
cumprimento do contrato, ora o carro não podendo ser entregue então a indemnização
visa substituir a prestação que se tornou impossível.
Caso Prático nº 7
A vende a B, com entrega imediata, uma máquina corta-relva, tendo-se acordado que
o preço deveria ser pago, passados dois meses sobre essa data. A 2 de agosto, B revende
a máquina a C.
a) Quais são os meios de defesa ao dispor de A, no caso de B não pagar o preço na data
acordada?
No que diz respeito ao tempo, uma obrigação de pagar o preço numa determinada data é
uma obrigação a prazo, o que quer dizer que se não houver pagamento na data
marcada, o devedor entra em mora (artigo 805º - Momento da constituição da mora:
“O devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente
interpelado para cumprir. Há, porém, mora do devedor, independentemente de
interpelação: se a obrigação tiver prazo certo; se a obrigação provier de facto ilícito; se
o próprio devedor impedir a interpelação, considerando-se interpelado, neste caso, na
data em que normalmente o teria sido” - presumindo-se a culpa deste).
Ora a consequência da mora é a obrigação de indemnização por danos moratórios –
artigo 804º CC (“A simples mora constitui o devedor na obrigação de reparar os danos
causados ao credor.”).
Como é que se repara os danos moratórios numa situação desta espécie? O credor
vai ter que provar que não causou danos moratórios?
A obrigação que está a ser devida é uma obrigação pecuniária (o objeto é causa é
dinheiro) e neste caso a reparação dos danos moratórios nos termos do artigo 806º do
CC corresponde aos juros a contar do dia da constituição em mora (pagamento de juros
moratórios). Assim vencendo-se uma obrigação pecuniária, entrando o devedor em mora
a consequência da mora é o vencimento de juros moratórios que não se prevendo coisa
diversa são juros legais.
O A devido ao facto de B não pagar o preço atempadamente pode exigir o preço
mais os juros indemnizatórios, calculados nos termos do artigo 806º nº2 (“Os juros
devidos são os juros legais, salvo se antes da mora for devido um juro mais elevado ou
as partes houverem estipulado um juro moratório diferente do legal”). E pode exigir
extrajudicialmente a chamada ação para cumprimento, que é uma ação creditória que
tem 2 componentes:
⚫ Componente de ação declarativa condenatória
⚫ Componente executiva (sendo que se tiver um título executivo pode lançar mão
imediatamente deste).
Aqui o caso muda de figura pois se se apôs uma cláusula de reserva de propriedade,
nos termos do artigo 409º nº1 (“Nos contratos de alienação é lícito ao alienante reservar
para si a propriedade da coisa até ao cumprimento total ou parcial das obrigações da
outra parte ou até à verificação de qualquer outro contrato”), o efeito real associado à
compra e venda não se produziu por mero efeito do mútuo consenso, logo direito real
só se transferirá no momento posterior de uma forma deferida, no momento do
pagamento do preço.
Neste caso, isto significa que apesar de ter sido feita a entrega da coisa, convertida a
mora em incumprimento definitivo através da interpelação cominatória, o vendedor
A poderá resolver o contrato por falta do pagamento do preço nos termos do artigo
801º. (“Tornando-se impossível a prestação por causa imputável ao devedor, é este
responsável como se faltasse culposamente ao cumprimento da obrigação”; “Tendo a
obrigação por fonte um contrato bilateral, o credor, independentemente do direito à
indemnização, pode resolver o contrato e, se já tiver realizado a sua prestação, exigir a
restituição dela por inteiro”). Ora foi aposta uma cláusula de reserva de propriedade
que impediu a transferência do direito real, ou seja não se aplica a regra do artigo 408º e
direito de regresso contra aquele que culposamente deu causa ao prejuízo”), sendo que
esta é uma norma que visa proteger aquele que comprou a comerciante, é uma norma
de proteção do consumidor.
O que resulta deste artigo?
Neste caso o A para exigir a C a entrega do corta-relvas tem de pagar a C o preço que o
este (C) pagou a B pela coisa tendo que estar verificados os seguintes requisitos:
⚫ O terceiro esteja de boa-fé,
⚫ O terceiro tenha comprado a coisa a comerciante que negoceie em coisa do mesmo
ou semelhante género.
Assim estando verificados determinados requisitos de aplicação A continua neste caso a
exigir a entrega da coisa, só que neste a entrega fica depende do pagamento do preço que
o C deu ao B.
Claro que o A aqui não fica desprotegido, pois este pode exigir a B aquilo que pagou a
C.
Contrato- Promessa
◼ Temos que estar perante uma coisa imóvel ou móvel sujeito a registo- no
nosso caso estamos perante uma coisa imóvel (prédio).
◼ Tem de haver uma declaração expressa de atribuição de eficácia real- no
enunciado não temos indicação que se atribui eficácia real.
◼ Tem que haver inscrição no registo- não houve inscrição do registo.
◼ Tem que haver cumprimento de exigências formais previstas no nº2 do
413º- estas exigências formais não foram cumpridas.
⚫ Contrato-promessa de compra e venda subsumível ao artigo 410º nº3 uma vez que
este contrato de compra e venda é relativo à compra e venda de um edifício. Ora isto
é importante porque tratando-se de um contrato-promessa relativo à alienação de um
edifício construido, em construção ou a construir ou de fração autónoma dele, o
contrato reconduz-se à norma do artigo 410º nº3 que vai ter impacto em vários
pontos do regime (o documento deve conter o reconhecimento presencial das
assinaturas do promitente ou prominentes e a certificação da existência da
respetiva licença de utilização ou construção).
Para além disso, porque se trata de uma situação subsumível ao artigo 410º nº3 estando
aqui em causa um contrato de promessa de alienação onerosa de um edifício é
necessário que haja exigências adicionais:
⚫ É preciso que haja o reconhecimento presencial das assinaturas.
⚫ Certificação notarial da existência da licença de utilização ou de construção.
Estas exigências do artigo 410º nº3 não foram observadas e por isso o contrato-
promessa é nulo, por vício de forma nos termos do artigo 220º.
Em princípio à nulidade aplica-se o regime do artigo 286º e segundo este artigo a
nulidade pode ser declarada oficiosamente pelo tribunal e pode ser invocada por um
terceiro interessado.
Será que o banco é um terceiro interessado? Qual é o interesse do banco que seja
declarada a nulidade deste contrato-promessa em que ele não é parte?
O banco é titular de uma hipoteca que é um direito real de garantia, o registo aqui é
constitutivo e deu-se em junho de 2021 antes da celebração do contrato de promessa que
só ocorreu em setembro. Ora o banco é titular de uma hipoteca sobre este edifício.
entregar a coisa retida, tem a faculdade de a executar, nos mesmos termos em que o pode
fazer o credor hipotecário, e de ser pago com preferência aos demais credores do
devedor”; “O direito de retenção prevalece neste caso sobre a hipoteca, ainda que esta
tenha sido registada anteriormente”.
Há muitos autores que criticam esta solução que em termos de interesses esta protege
fortemente o promitente-adquirente em detrimento dos interesses bancários.
E mesmo o banco sendo um terceiro interessado, este pode invocar a nulidade deste
contrato? Em princípio, à luz do artigo 286º, poderia, no entanto a nulidade decorrente
da violação do artigo 410º nº3 é uma nulidade atípica, e por isso há 2 assentos que
valem como acórdãos uniformizadores de jurisprudência que traduzem esta
atipicidade.
O assento de 28 de junho de 1924, vem dizer-nos que esta nulidade do artigo 410º nº3
não pode ser invocada por terceiros interessados já o assento de 1 de fevereiro de
1925 vem dizer que esta nulidade não pode ser declarada oficiosamente pelo
tribunal.
Estes assentos hoje valem como acórdãos de uniformização de jurisprudência.
Estamos aqui aplicar aqui o 442º nº2 e que para ser aplicado pressupõe que o contrato de
promessa seja sinalizado, e a possibilidade por optar pela indemnização exige que para
além do contrato ser sinalizado haja tradição da coisa, o que quer dizer que se fosse
sinalizado mas não houvesse tradição da coisa só se podia exigir o dobro do sinal o que
quer dizer que se houvesse tradição da coisa se não fosse sinalizado não podíamos aplicar
o artigo 442º nº2.
Obviamente que C que pode exigir 100 mil ou 130 mil vai exigir os 130 mil, mas esta é
uma alternativa que lhe compete a ele. Se o promitente adquirente optar pela resolução
do contrato e optar por uma destas indemnizações, o direito de retenção (artigo 755º do
CC) garante o seu direito de crédito indemnizatório, mas para haver direito de retenção
é necessário: que o contrato de promessa seja sinalizado; que tenha havido tradição
da coisa e que se tenha optado pela via resolutória indemnizatória. Este direito de
retenção prevalece sobre as hipotecas mesmo que constituídas anteriormente, ora no caso
do imóvel ser vendido ele vai servir em primeiro lugar para pagar ao C o banco só vai
receber se sobrar dinheiro.
bem mas vai adquiri-lo onerado com a hipoteca – a hipoteca acompanha o bem. Nos
termos do artigo 830º nº4 o promitente pode requerer que o A seja condenado a pagar a
ele – C - a quantia necessária para expurgar a hipoteca. Portanto o promitente adquirente
está mais protegido pela via resolutória e indemnizatória pois se ele recorrer à execução
específica vai adquirir o bem onerado, pode é exigir que o tribunal condene o promitente
alienante a pagar ao promitente adquirente a quantia necessária para expurgar a hipoteca.
Como nos é dito no enunciado o contrato é reduzido a escrito num documento que apenas
foi assinado por A. No que diz respeito à forma ao contrato-promessa aplica-se, em
princípio, o regime do contrato prometido- princípio da equiparação. Acontece que este
princípio tem desvios, sendo um deles relativo à forma como vemos no artigo 410º nº1-
“À convenção pela qual alguém se obriga a celebrar certo contrato são aplicáveis as
disposições gerais relativas ao contrato prometido, excetuadas as relativas à forma e as
que, por sua razão de ser, não se devam considerar extensivas ao contrato-promessa”.
Ora ao contrato-promessa não se aplica a forma exigida para o contrato prometido
vigorando em princípio a liberdade de forma (artigo 219º do CC) , no entanto neste
caso há uma exigência formal que tem de ser observada que está prevista no artigo 410º
nº2 do CC. Resulta deste artigo que “a promessa respeitante à celebração de contrato
para qual a lei exija documento, quer autentico, quer particular, só vale se constar de
documento assinado pela parte que se vincula ou por ambas, consoante o contrato-
promessa seja unilateral ou bilateral”, no nosso caso a forma exigida para a compra e
venda do prédio rústico está prevista no artigo 875º do CC, sendo exigida escritura
pública ou em certos casos documento autenticado, logo respeitando o artigo 410º nº2
o contra-promessa teria que ser reduzido a escrito e deveria assinado, neste caso, pelas
duas partes porque ambas se vinculam a celebrar o contrato definitivo.
No caso em análise, o documento só foi assinado por A, não tendo sido assinado por B,
logo a exigência formal do artigo 410º nº2 do CC não foi observada e, portanto, o
contrato-promessa é nulo, aplicando-se a esta nulidade o regime geral do artigo 286º do
CC.
No que diz respeito à nulidade de contratos-promessa, a nossa doutrina e jurisprudência
entendem que estes podem ser aproveitados, através dos regimes da redução ou da
conversão, havendo neste sentido um assento sobre essa matéria – Assento de 29 de
novembro de 1999 (“O contrato-promessa de compra e venda de imóvel exarado em
documento assinado por apenas um dos contraentes é nulo mas pode considerar-se
válido como contrato-promessa unilateral, desde que esta tivesse sido a vontade das
partes”). Ainda que segundo o assento o contrato possa ser aproveitado, este naquilo que
decide é muito pouco claro e por isso parte da doutrina continua a defender que, à luz dele
se aplica o regime da redução enquanto outra parte da doutrina defende que se aplica o
regime da conversão. Acresce que o próprio assento parece que nem se reporta
exatamente aos requisitos da conversão.
aproveitado através deste mecanismo do artigo 293º (“O negócio nulo ou anulado
pode converter-se num negócio de tipo ou conteúdo diferente, do qual contenha os
requisitos essenciais de substância e de forma, quando o fim prosseguido pelas
partes permita supor que elas o teriam querido, se tivessem previsto a invalidade”).
Ora o negócio é totalmente nulo mas pode converter-se num negócio diferente se se
demonstrarem os requisitos deste artigo. No que concerne ao ónus da prova, este
recaí sobre parte interessada na conversão, a parte interessada em que o contrato-
promessa bilateral se converta em contrato-promessa unilateral, tendo que provar que
as partes tinham querido celebrar este negócio – contrato-promessa unilateral - se
tivessem previsto a invalidade do negócio celebrado. Em regra, o ónus da prova é do
promitente-adquirente, no nosso caso, B.
A doutrina divide-se:
Parte que defende a redução:
1. Os autores que defendem a redução que defendem que estamos perante uma nulidade
meramente parcial, e vêm destacar que o carácter sinalagmático do contrato-promessa
não vale autonomamente, vale como um instrumento do carácter sinalagmático do
contrato definitivo, o que quer dizer que se a parte que não se considera vinculada pelo
contrato-promessa quer celebrar o contrato definitivo a falta de vinculação dela não
impede o resultado final pretendido com o contrato-promessa bilateral.
2. Os autores destacam que este tese de invalidade parcial favorece mais o promitente
comprador sendo a parte este mais fraca porque, em regra, é a pessoa que não assinou
o documento e que tem vontade de celebrar o contrato definitivo.
Normalmente, quando é que se recorre ao contrato-promessa? É muitas vezes celebrado
como um instrumento que vai conduzir à celebração de um contrato de compra e venda
de casa de habitação. O que quer dizer e é isso que explica muito a posição de muita
doutrina e jurisprudência é que se olha para este contrato numa perspetiva de defender a
parte mais vulnerável/fraca, que em regra é o promitente adquirente.
Concluindo, na redução o promitente-adquirente (B) nada tem que fazer, sendo que o
negócio vai valer como contrato-promessa unilateral por mera produção ope legis. À luz
da conversão, o negócio é em principio totalmente inválido e o ónus da prova dos factos
que depende a conversão cabe ao promitente-adquirente.
Ora se o negócio tivesse sido apenas assinado por A, ele seria nulo por vício de forma,
porém este poderia valer como contrato-promessa unilateral, consoante se optasse pela
redução ou pela conversão.
Acontece que A não compareceu no cartório notarial, sendo esta um contrato-promessa
unilateral que vincula A este entrou em incumprimento.
b) Suponha, agora, que o contrato foi assinado por ambas as partes e que B não entregou
qualquer quantia A. Poderia B, de imediato, exigir a A uma indemnização calculada ao
abrigo da parte final do n.º 2 do artigo 442.º, sendo esse crédito tutelado por uma garantia?
Responda, analisando a posição jurídica de B.
Pacto de Preferência
Caso Prático nº10
A, por contrato com B, concede-lhe o direito de preferência na venda de um imóvel seu,
sito em Gaia. Pretendendo vender esse bem, A informa B que está interessado em aliená-
lo por 100.000 €, a serem pagos a pronto. Este último diz-lhe que esse preço é, nesse
momento, demasiado elevado para as suas possibilidades, ficando assim A descansado
para, decorrido um ano, celebrar um contrato-promessa de compra e venda desse prédio
com C, e lho vender, no mês a seguir, por 100.000 €.
Pergunta-se:
Neste caso prático estamos perante um pacto de preferência, que não se confunde com
o contrato-promessa unilateral, pois neste último uma das partes obriga-se a celebrar o
negócio definitivo, coisa que não acontece no pacto de preferência. Aqui A não se obriga
a vender a B, obriga-se sim a dar preferência a B caso decida vender o bem , ou seja, antes
de o vender e caso o decida fazer deve dar preferência a B para que ele compre nas
mesmas condições em que A fosse vender o bem a outra pessoa. Ora obrigando-se A a
dar preferência B e sendo este o titular desse direito, vemos aqui que A é o obrigado a
preferência e B o preferente.
Assim sendo, estamos perante um negócio jurídico bilateral, pois temos duas partes,
mas estamos perante um contrato unilateral porque só gera obrigações para uma das
partes, para o obrigado à preferência é ainda um pacto preferência convencional, com
eficácia meramente obrigacional (para ter eficácia real era necessário que estivessem
verificados os requisitos do artigo 421º do CC e o enunciado nada nos diz acerca da
verificação desses requisitos).
A obrigação principal aqui em causa é a venda de A a B nas condições em que decidi-se
vender a terceiro.
Para A vender a um terceiro (C) deve além de acertado com ele os termos do negócio a
celebrar, tem que fazer uma notificação para preferência a B, tendo esta que obedecer a
certas características.
Quando A informa B que está interessado em alienar o bem imóvel por 100 mil euros a
serem pagos a pronto, consideramos esta informação de A uma notificação para
preferência? NÃO, isto é uma comunicação da intenção de vender. Ora a alienação do
imóvel está sujeita a requisitos de forma, portanto não basta aqui mera aceitação para a
sua celebração. No caso que estamos a analisar, estamos perante um mero convite a
contratar pois nem os elementos essenciais estão todos definidos nem está revestida a
forma exigida para a declaração negocial. Portanto, não é a uma notificação para
preferência nem sequer uma proposta contratual.
O que é que se tinha que verificar para termos uma notificação para preferência?
⚫ Era preciso que o A decidisse a celebrar o negócio a que a obrigação respeita.
⚫ Era necessário que já tivesse acertado os termos desse negócio com terceiro. Quando
ele comunica já tinha os termos acertados com terceiro? Não.
⚫ É preciso ainda que lhe comunique um conjunto de informações.
Nos termos do artigo 416º do CC (esta norma fica aquém na sua letra de tudo o que,
segundo o entendimento do momento presente, tem-se que comunicar): O obrigado à
preferência tem de comunicar o projeto de venda, as cláusulas do respetivo contrato,
No nosso caso não foi feita uma notificação para preferência, o que quer dizer que A,
passado um 1 ano, decidisse vender o imóvel e tivesse um negócio acertado com terceiro
tinha que fazer a notificação para preferência. E mesmo que tivesse feito uma notificação
para preferência válida e eficaz ab initio, se algum termo negocial mudasse, teria de ser
feita uma nova notificação.
Exemplo: A notifica hoje B para preferência, dizendo-lhe que vai celebrar o negócio com
terceiro daí a um mês mas este negócio com terceiro acaba por se celebrar apenas um ano
e meio depois. Mesmo que o A tenha feito uma notificação para preferência válida e
eficaz terá que fazer uma nova notificação para preferência.
Acontece que a mudança de qualquer elemento essencial (qualquer elemento que de
acordo com a boa-fé possa determinar a vontade das partes) implica uma nova
notificação para preferência. Qualquer alteração circunstancial que possa envolver a
mudança de um elemento decisivo para a celebração do negócio importa que se repita a
notificação para a preferência.
Nesta hipótese a solução já seria diferente, pois estamos perante um direito de preferência
que resulta da lei- artigo 1091º do CC- “O arrendatário tem direito de preferência na
compra e venda ou dação em cumprimento do local arrendado há mais de dois anos, sem
prejuízo do previsto nos números seguintes”.
Aqui aplica-se tudo o que foi dito anteriormente, a única diferença tem a ver com os
mecanismos de reação em caso de incumprimento.
Perante um incumprimento de um direito legal de preferência, o que é que o B pode
fazer, para além de pedir uma indemnização?
Aqui B poderia intentar uma ação de preferência nos termos do artigo 1410º do CC
(este está previsto para a compropriedade, mas aplica-se às demais situações de
preferência legal ou convencional com eficácia real).
Estamos assim perante um contrato a favor de terceiro sendo impreterível neste tipo
contratual que o terceiro adquira o direito por mero efeito do contrato.
Este encontra-se previsto nos artigos 443º do CC (“Por meio de contrato, pode uma das
partes assumir perante outra, que tenha na promessa um interesse digno de proteção
legal, a obrigação de efetuar uma prestação a favor de terceiro, estranho ao negócio.
etc…”; “Por contrato a favor de terceiro, têm as partes ainda a possibilidade de remitir
dívidas ou ceder créditos, e bem assim de constituir, modificar, transmitir ou extinguir
direitos reais”), e 444 nº1 do CC (“O terceiro a favor de quem for convencionada a
promessa adquire direito à prestação, independentemente de aceitação”). É
precisamente no artigo 444º nº1 que está o caráter distintivo do contrato a favor de terceiro
porque este adquire o direito independentemente da sua aceitação, ou seja, adquire
por mero efeito do contrato. No entanto, a aceitação é importante porque torna a
promessa irrevogável – artigo 448º do CC (“Salvo estipulação em contrário, a promessa
é revogável enquanto o terceiro não manifestar a sua adesão, ou enquanto o promissário
for vivo, quando se trate de promessa que haja de ser cumprida depois da morte deste”).
Um contrato a favor de terceiro é um contrato pelo qual uma das partes (o promitente)
se obriga perante a outra parte (promissário) a realizar uma prestação a terceiro -
terceiro beneficiário ou adquirente, que adquire o direito a essa prestação por mero
efeito do contrato.
No nosso caso o promitente (sujeito que se obriga a realizar a prestação a terceiro) é B
sendo que a prestação que se obriga a prestar é a entrega dos 250000 €; o promissário
(sujeito a quem a promessa é feita) é G; e o terceiro beneficiário é F.
No âmbito deste contrato a favor de terceiro temos de distinguir três espécies de relação:
1. Relação de cobertura/de provisão: É a relação entre o promissário e promitente,
respetivamente, sendo esta relação que dá cobertura à prestação do promitente perante
terceiro. Porque é que o promitente vai dar 25 mil euros ao F? Porque recebeu o
automóvel, portanto é a relação de cobertura porque ela alimenta a prestação que o
promitente vai fazer a terceiro. No nosso caso a relação de cobertura verifica-se entre G
e B.
2. Relação de valuta: É a relação entre o promissário e o terceiro, ou seja é a relação
entre G e F. O direito é atribuído a terceiro por uma causa, porque o promissário lhe quer
fazer uma doação/liberalidade. Esta relação pode ser:
A) Causa donandi
B) Causa solvendi
C) Causa credendi
3. Relação de execução: É a relação promitente e o terceiro, no nosso caso entre B e F e
é nesta relação que se vai executar a atribuição que se quer fazer a terceiro.
Para o tratamento deste caso vai ser decisiva a relação de cobertura nos termos do artigo
449º do CC (“São oponíveis ao terceiro, por parte do promitente, todos os meios de
defesa derivados do contrato, mas não aqueles que advenham de outra relação entre
promitente e promissário”), ora o promitente pode opor ao terceiro os meios de defesa
que resultam da relação de cobertura.
O problema que reside neste caso é que B se recusa a e entregar os 25000 mil euros a F,
porque o carro padece de um grave defeito. O contrato de compra e venda do carro é um
contrato de compra e venda bilateral, isto é gera obrigações para ambas as partes, que
estão ligadas por um nexo do sinalagma:
⚫ Obrigação de entregar a coisa vendida;
⚫ Obrigação de pagar o preço.
Ora tendo neste caso o carro um defeito muito grave, estamos aqui perante um
incumprimento defeituoso (porque G efetivamente cumpre pois entrega o automóvel,
mas entrega-o com defeito) e neste segmento é possível recorrer a instrumentos que
decorrem do sinalagma. Como não havia prazos diferentes para o cumprimento, aplica-
Nota: No contrato a favor de terceiro, o terceiro, mesmo quando aceita o direito, nunca
se torna parte do contrato. A aceitação do terceiro só é importante para tornar irrevogável
a promessa que lhe foi feita. O que quer dizer que o direito aos 25 mil euros já não pode
ser revogado.
d) Considerando que o carro é entregue a B nas condições estipuladas, mas que ele
não paga o preço. O contrato pode ser - e, se, por quem - resolvido?
Neste caso a situação é diferente pois G entrega o carro (em perfeitas condições) a B e
este não paga o preço sem razão justificativa para isso, por esse motivo B entra em mora.
Aqui aplicava-se o artigo 885º do CC (“O preço deve ser pago no momento e no lugar
da entrega da coisa vendida”), ou seja“B” devia pagar o preço no momento da entrega
do carro, mas não o faz.
Pode ser resolvido o contrato de compra e venda? Quem pode resolver o contrato
por falta de pagamento do preço? Quem poderia resolver o contrato seria o
promissário (G) na medida em que este é parte contratual, o terceiro (F) não é parte do
contrato por isso nunca poderia resolver o contrato. O direito de resolução é um
mecanismo, que se estiver disponível, só pode ser usado pelas partes contratuais, no nosso
por G.
Mas se o terceiro já tiver aceitado o direito, a promessa torna-se irrevogável e por isso o
promissário só pode resolver o contrato se o terceiro autorizar porque a resolução do
contrato vai atingir o seu direito.
Se o terceiro autorizar, o “G” pode resolver o contrato. A resolução dá direito a uma
indemnização e salvo convenção em contrário a indemnização vai caber, em princípio, a
terceiro porque a indemnização é substitutiva da prestação principal.
Em suma, estamos perante uma figura que não merece a qualificação de contrato a
favor de terceiro, para haver um contrato a favor de terceiro não basta que o devedor se
obrigue a realizar a prestação perante terceiro, não basta que o devedor se obrigue a
realizar a prestação na casa de terceiro, é preciso que do contrato resulte a atribuição
a terceiro do direito à prestação, o terceiro tem de adquirir o direito à prestação.
Do enunciado não resulta que se atribua o direito à namorada. O que quer dizer que o
credor da entrega das flores é o A e só o A pode exigir o cumprimento.
a) Quid iuris?
A matéria convocada no caso prático é a do contrato para pessoa a nomear, sendo que
este não é verdadeiramente uma espécie contratual distinta das demais.
O contrato para pessoa a nomear está previsto no artigo 452º do CC (“Ao celebrar o
contrato, pode uma das partes reservar o direito de nomear um terceiro que adquira os
direitos e assuma as obrigações provenientes desse contrato”; “A reserva de nomeação
não é possível nos casos em que não é admitida a representação ou é indispensável a
determinação dos contraentes”) e prende-se com a possibilidade de ser aposta uma
cláusula que permite que uma das partes se possa fazer substituir por outrem mediante
nomeação, tendo que estar verificados certos e determinados requisitos.
Para que a nomeação seja válida e eficaz têm de estar preenchidos os vários requisitos
constantes dos artigos 453º e 454º do CC. Temos requisitos de tempo e de forma.
⚫ Quanto à forma é necessário que a nomeação seja feita por escrito, sendo ainda
necessário que a nomeação seja acompanhada ou de instrumento de ratificação
ou de procuração anterior à celebração do ato.
Quanto à forma vemos que a forma escrita foi observada (A comunicou por escrito a
nomeação de C), mas a nomeação não foi acompanhada nem de instrumento de
ratificação nem de procuração anterior à celebração do ato. Ora a nomeação de A a C tem
que ser realizada por escrito mas não basta isso, é preciso também uma manifestação de
vontade por parte de C, logo no nosso caso a nomeação não é válida e eficaz.
O legislador prevê uma forma particular para a ratificação, esta no mínimo tem de revestir
a forma escrita, mas se o contrato tiver sido celebrado por meio de documento de maior
força probatória a ratificação necessita de revestir igual forma. Mas no mínimo é preciso
que a ratificação ocorra por escrito, mesmo que se trate de uma coisa móvel, em que não
é normalmente exigida forma para o contrato de compra e venda que tenha essa coisa
móvel por objeto. Esta exigência formal é um pouco criticada.
Para a procuração a forma exigida é aquela do negócio que o procurador deva realizar –
artigo 262º/2 do CC.
No nosso caso estamos perante um contrato de compra e venda de um móvel, que regra
geral não carece de forma de forma, ou seja para a procuração não é exigida forma,
mas o mesmo não vale para a ratificação pois o legislador exige para este efeito (para a
nomeação ser eficaz) que esta conste de documento escrito.
Neste caso, nem foi acompanhada de procuração anterior ao ato nem foi acompanhada de
ratificação. Assim sendo, a nomeação não é eficaz (não produz efeitos), o que quer dizer
que o contraente continua a ser o contraente originário, o A.
⚫ Quanto ao tempo, nos termos do artigo 453º nº1 do CC a nomeação deve ser feita
no prazo convencionado ou na falta dele dentro dos 5 dias posteriores à celebração
do contrato.
Ora no caso em apreço, não havido sido convencionado prazo a nomeação teria de
ocorrer dentro dos 5 dias posteriores à celebração do contrato, o que se verificou no
nosso caso já que esta ocorreu três dias depois da celebração do contrato.
Aqui C quer comprar um imóvel a B, mas não quer aparecer no contrato nem quer que o
A, que vai atuar por conta dele, reserve a faculdade de nomear o terceiro, ou seja,
queremos o mesmo resultado que o contrato a pessoa a nomear produz mas não queremos
uma cláusula para pessoa a nomear.
Que contrato se pode celebrar por forma a que o A adquira o imóvel para C?
O contrato a celebrar seria o de mandato, sendo este um contrato de prestação de
serviços– artigo 1154º do CC (“Contrato de prestação de serviço é aquele em que uma
das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual
ou manual, com ou sem retribuição”) e artigo1155º CC. Um contrato de prestação de
serviços está a parede meias de um contrato de trabalho, só que no primeiro obriga-se a
prestar um resultado e não uma atividade.
Aqui terá de ser celebrado um mandato sem representação pelo qual A se obriga a
praticar o ato jurídico por conta de C, neste caso a celebração de um contrato de compra
e venda relativo ao imóvel de B, mas em seu próprio nome (de A) com intenção de que
os efeitos dos seus atos se produzam na esfera jurídica de C – mandante.
Assim A não vai atuar representativamente, ele vai celebrar o contrato em nome de ele
próprio, o que quer dizer que perante B aparece o “A” porque quem vai contratar com B
é A.
Gestão de negócios
Neste caso é convocada a matéria da gestão de negócios. Ora este trata-se de um caso
que chegou ao STJ e que suscitou uma anotação do Dr. Batista Machado estando em
causa um acidente sofrido por A e B dono do pronto socorro adota um conjunto de
medidas.
3. Ausência de autorização
Neste caso falta a autorização pois A sofreu o acidente não prestando consentimento de
nada. Se houvesse autorização estaríamos já perante a celebração de um contrato de
prestação de serviços.
Neste caso, estão verificados todos os pressupostos da gestão de negócios, o que quer
dizer que B atua como gestor e A como dona do negócio. O gestor fica investido numa
série de deveres, sendo que o dono do negócio também pode ficar.
O que é que era decisivo para saber que efeitos retirámos da gestão de negócios?
Estando no âmbito das relações entre o gestor e o dono do negócio é essencial averiguar
se o dono do negócio aprovou a gestão (aprovar é diferente de ratificar).
A aprovação é diferente da ratificação de certos atos jurídicos que sejam praticados pelo
gestor, sendo a aprovação um juízo global/genérico sobre a atividade do gestor.
Quanto aos seus efeitos, estes estão previstos no artigo 469º do CC (“A aprovação da
gestão implica a renúncia ao direito de indemnização pelos danos devidos a culpa do
gestor e vale como reconhecimento dos direitos que a este são conferidos no nº1 do
artigo anterior”). Ora temos como direitos previstos no artigo 468º do CC:
⚫ Obrigação de reembolsar o gestor das despesas que ele fundadamente tenha
considerado indispensáveis, com juros legais a contar do momento em que foram
feitas;
⚫ Obrigação de indemnização do prejuízo sofrido.
Assim sendo, se a dona do negócio aprovasse a gestão renunciava ao direito de ser
indemnizada e reconhecia ao gestor os direitos previstos no artigo 468º do CC,
nomeadamente o direito de este ser reembolsado pelas despesas que fundadamente
considerou indispensáveis.
A aprovação não está sujeita a forma vigorando o princípio de liberdade de forma previsto
no artigo 219º CC, sendo que essa pode ser expressa ou tácita.
Ora se a gestão for regular os efeitos são os mesmos da aprovação, isto é se o gestor
conseguir provar que a gestão foi regular vão-lhe ser reconhecidos os direitos do artigo
468º nº1 CC e não vai ter que indemnizar.
Contrariamente, se ele não conseguir demonstrar a regularidade da gestão, aplica-se
o artigo 468 nº2 e o dono do negócio só responde nos termos do enriquecimento sem
causa.
Quanto à guarda do carro, a gestão foi considerada irregular, o que significa que a dona
do negócio só teria que restituir com base no enriquecimento sem causa e o gestor só
teria que indemnizar.
No que diz respeito ao ato A consegue provar o ato de B (no caso da quebra do guindaste
ela consegue provar que lhe levantaram o carro naquele dia e que o guindaste rompeu; e
quanto à guarda dos objetos ela também consegue provar que ele trouxe o carro para a
garagem dele e que não o guardou porque houve furto de objetos).
Quanto à ilicitude do ato traduz-se na violação do direito de propriedade, sobre o
automóvel e sobre os acessórios que estavam dentro dele.
Quanto aos danos é de fácil prova porque houve muitos danos, desde logo patrimoniais.
Ora a dificuldade de prova está no pressuposto da culpa.
O prof. Batista Machado traz ainda mais argumentos quanto a esta problemática:
⚫ Imagine-se que A estava capaz e tivesse contratado os serviços de B. Se tivesse sido
celebrado negócio jurídico, qual era o regime que aplicávamos? O da
responsabilidade obrigacional.
O prof. Batista Machado diz que nós não podemos oferecer ao gestor um regime mais
favorável do que aquele que ele teria se tivesse celebrado o negócio jurídico.
⚫ Quando se inicia uma atividade gestória, o gestor tem de ponderar se tem os meios
para tal e se decide iniciar uma atividade gestória o gestor assume deveres especiais
e o ónus da prova recai sobre ele – artigo 799º CC.
⚫ Para além disso, o gestor é profissional da área (tem uma empresa na matéria) e,
portanto, ele deve suportar os riscos da empresa.
Em suma, entende-se que aqui se aplica a presunção de culpa do artigo 799º do CC.
Assim gestão considerada irregular não só quanto à guarda do carro mas também quanto
à recolha do carro da ravina.
Mais uma vez nesta hipótese prática estamos perante uma gestão de negócios.
Esta figura está regulada no artigo artigo 464º e ss do CC (“Dá-se a gestão de negócios,
quando uma pessoa assume a direção de negócio alheio no interesse e por conta do
respetivo dono, sem para tal estar autorizado”). Para afirmarmos com certeza que
estamos perante uma gestão de negócios é necessário verificar se estão preenchidos os
seus pressupostos. Pressupostos da gestão de negócios:
1. Assunção de direção de negócio alheio: A assume a direção de negócio alheio, que
vai comportar a prática de atos materiais e de atos jurídicos (desde logo a compra da
escultura).
produzem os efeitos do artigo 469º CC, a menos que o gestor prove a regularidade da
gestão.
Passando agora para a questão da estátua, A sabia que B gostava da estátua e apesar deste
não ter aprovado a gestão, ficou muito satisfeito com o negócio. Quanto a este questão
estamos no âmbito de um relação com um terceiro, e portanto temos de saber se ele
atuou em nome próprio ainda que por conta do dono do negócio ou se atuou em nome
do dono.
⚫ Se o gestor tiver atuado em nome próprio (ainda que em conta do dono) iria
aplicar-se o regime do mandato sem representação nos termos do artigo 471º 2º
parte. O mandato sem representação está previsto no artigo 1180º e ss o que quer
dizer que ao aplicar o regime do mandato sem representação, o mandatário (o gestor)
está obrigado a transmitir os direitos adquiridos (nomeadamente o direito de
propriedade sobre a escultura) e o dono do negócio está obrigado a assumir as
obrigações, ou seja, B teria de pagar o preço.
⚫ Se o gestor tiver comprado em nome do dono (B) nos termos do artigo 471º 1º
parte aplicámos o regime do artigo 268º, regime da representação sem poderes
pois se ele atuou em nome de B. Ora quando há representação sem poderes, o dono
do negócio (B) pode ratificar o negócio.
O dono do negócio pode ratificar o negócio celebrado pelo gestor sem aprovar a
gestão? Sim.
A aprovação da gestão é um ato diferente da ratificação do negócio, portanto ele não
aprovou a gestão mas pode ratificar o negócio.
A ratificação está sujeita aos requisitos da forma do artigo 268º nº2 CC, que remete
para o artigo 262º nº2 CC.
No nosso caso prático estamos perante um compra e venda de uma escultura (bem móvel
não sujeito a registo), logo a compra não está sujeita a forma o que quer dizer que a
ratificação também não está.
⚫ Podíamos convocar a gestão de negócios, uma vez que ele dirige o negócio mas
pensa que é próprio? - artigo 472º nº1 CC (“Se alguém gerir negócio alheio,
convencido de que ele lhe pertence, só é aplicável o disposto nesta secção se houver
aprovação da gestão; em quaisquer outras circunstâncias, são aplicáveis à gestão
as regras do enriquecimento sem causa, sem prejuízo de outras que ao caso
couberem”)
Não, só é aplicável o regime da gestão de negócios se houver aprovação da gestão e neste
caso não houve aprovação, logo não se aplica este regime. Imagine-se que B nem
estava a pensar destinar o seu terreno a esse efeito mas ficou satisfeito com a instalação
dos painéis, aí sim havia aprovação e aplicava-se o regime da gestão de negócios.
Assim sendo, neste caso vamos tratar e aplicar o regime do enriquecimento sem causa
que é um regime subsidiário como vemos no artigo 472º nº1 parte final. Acontece que
se pudéssemos aplicar o regime da responsabilidade civil ou da gestão de negócios e esse
cobrisse toda a deslocação patrimonial indevida não tínhamos que chamar à colação o
regime do enriquecimento sem causa.
Os pressupostos deste regime estão previstos no artigo 473º do CC (“Aquele que, sem
causa justificativa, enriquecer à custa de outrem é obrigado a restituir aquilo com que
injustamente se locupletou”) e artigo 474º que preve um requisito negativo (“Não há
lugar à restituição por enriquecimento, quando a lei facultar ao empobrecido outro meio
de ser indemnizado ou restituído, negar o direito à restituição ou atribuir outros efeitos
ao enriquecimento”).
1. Tem de haver enriquecimento: Aqui o enriquecimento traduz-se nos 1000 euros que
A vai receber, havendo um aumento do seu património. O enriquecimento
patrimonial também se pode traduzir na poupança de despesas.
4. Natureza subsidiária (artigo 474º do CC): não pode haver outro instituto jurídico
para ressarcir/corrigir a deslocação patrimonial indevida/sem causa.
terreno, mas se houvesses danos no terreno eram esses danos que eram contabilizados
neste valor.
Segundo esta teoria, que retiramos do artigo 479º CC, o montante a restituir vai ser
igual ao menor dos dois valores, neste caso zero. Ou seja, esta teoria levava-nos a
concluir de que quando houvesse uma ingerência de bens alheios em que o proprietário
não estivesse disposto a praticar os atos não havia nada a restituir, o que permitia uma
espécie de expropriação privada, levando a que esta teoria fosse abandonada.
2. Teoria do duplo limite corrigido: esta teoria vem dizer que os dois limites devem ser
o enriquecimento patrimonial e o empobrecimento real (o empobrecimento real
corresponde ao valor objetivo/de mercado da deslocação patrimonial ocorrida). Neste
caso o empobrecimento real equivale a 900 euros, continuando o enriquecimento
patrimonial a ser de 1000 euros. O valor a restituir é o menor dos dois, ou seja, os 900
euros.
Responsabilidade Civil
Há um ato ilícito?
É importante ter em conta que ilícito é diferente de ilegal (isto é, desconforme à lei), não
bastando que o ato seja desconforme à lei para ser um ato ilícito. Um ato pode ser ilícito
por:
◼ Violação de um direito (absoluto) de outrem;
◼ Violação de uma norma de proteção (“disposição legal destinada a proteger
interesses alheios”);
◼ Abuso do direito .
Estas consubstanciam as formas gerais de ilicitude, mas também existem formas
especiais de ilicitude previstas pelo legislador:
◼ Ofensa do crédito ou do bom nome- artigo 484º do CC;
◼ Conselhos, recomendações ou informações- artigo 485º do CC;
◼ Omissões- artigo 486º do CC.
Se o bom pai de família tivesse caído no erro, o erro seria desculpável, mas se o bom pai
de família não tivesse caído no erro, o erro não seria desculpável.
O enunciado do caso não nos permite tirar uma conclusão.
Imagine-se agora que o B e o C estavam trajados, havia uma multidão de alunos, era em
frente à faculdade, era de dia etc, neste exemplo havia um conjunto de elementos para
que um bom pai de família pudesse concluir que não era uma agressão e, portanto, o
erro não era desculpável.
Mas agora imagine-se que era num beco da rua de Cedofeita, em que só estavam presentes
B e C, que nem sequer estavam trajados, neste segundo exemplo o bom pai de família
podia cair no erro e, portanto, o erro sobre os pressupostos da legítima defesa era
desculpável.
Assim se houvesse um conjunto de elementos que permitissem ao sujeito
medianamente atento, medianamente prudente, perceber que se tratava de um ato
de praxe, o bom pai de família teria percebido que era um ato de praxe e não teria
caído no erro e, portanto, o erro não seria desculpável. No entanto, se se verificassem
outras características (p.e. local escuro, sem sinais ostensivos de praxe, num local
conhecido por assaltos) o erro seria desculpável porque o bom pai de família naquelas
circunstâncias teria caído no mesmo erro.
Já aferimos se estavam preenchidos os primeiros dois requisitos, agora temos que ver se
estavam preenchidos também os pressupostos do dano e do nexo causal.
NOTA importante: O pressuposto da culpa estará na desculpabilidade ou não da
erroneidade dos pressupostos. Se o erro fosse desculpável não havia culpa e por isso nós
não responsabilizaríamos por falta do pressuposto da culpa.
Existem danos?
Sim, neste caso verificam-se:
⚫ Danos de natureza não patrimonial (danos físicos, no entanto estes também podem
gerar consequências patrimoniais, p.e. quando a pessoa é modelo e devido ao dano
físico sofrido não vai puder participar numa série de campanhas, sofrendo assim
repercussões patrimoniais)
⚫ Danos patrimoniais (p.e. a pessoa teve que ir ao médico e à farmácia e teve gastos
nesse âmbito).
◼ Danos emergentes
◼ Lucros cessantes, isto é, aquilo que a pessoa deixou de receber e que
receberia em circunstâncias normais
Como é que se calcula a compensação por dano não patrimonial? Qual é o critério
que o legislador dá?
Este está previsto no artigo 496º nº4 CC (“O montante da indemnização é fixado
equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias
referidas no artigo 494º; no caso de morte, podem ser atendidos não só os danos não
patrimoniais sofridos pela vítima, como os sofridos pelas pessoas com direito a
indemnização…”) em conjugação com o artigo 494º CC – situação prevista para quando
o sujeito atua com mera culpa (quando não atua com dolo), onde pode haver uma redução
do montante da indemnização.
Então como é que se fixa a compensação por danos não patrimoniais?
Equitativamente, de acordo com os critérios do artigo 494º CC:
⚫ Grau de culpa, o que quer dizer que se o Alberto” tiver uma culpa mais intensa ele
vai pagar uma indemnização maior do que se tiver uma culpa mais leve;
⚫ Situação económica do lesante e do lesado, imagine-se que o Alberto é milionário
e o “B vive numa situação precária, então a compensação vai ser maior; agora se a
situação for a inversa então a compensação vai ser menor:
⚫ Demais circunstâncias do caso.
O juiz pode julgar segundo a equidade sempre? Não, só quando a lei o autoriza.
Para além dos danos, é preciso afirmar o nexo causal. Este desempenha uma função
especial porque vai ser o nexo causal que vai permitir delimitar os danos ressarcíveis. O
pressuposto do nexo causal não levanta grandes problemas, sendo ressarcidos os danos
que causalmente se ligam ao ato à luz da teoria da causalidade adequada.
A para não atropelar o inimputável, guina o volante do seu carro e embate na carrinha
de C. Há danos na carrinha de A e de C, o inimputável não sofreu danos. Assim vamos
ter que analisar os danos na carrinha de C e os danos no carro de A.
◼ Danos na carrinha de C
Estamos perante um caso de responsabilidade civil extracontratual em que C pretende ser
indemnizado, tendo que se dirigir desde logo a A.
Poderíamos aqui imputar a responsabilidade a A ao abrigo do artigo 503º do CC
,tratando-se de um caso de responsabilidade pelo risco, ou seja, que prescinde de culpa
(“Aquele que tiver a direção efetiva de qualquer veículo de circulação terrestre e o
utilizar no seu próprio interesse, ainda que por intermédio de comissário, responde pelos
danos provenientes dos riscos próprios do veículo, mesmo que este não encontre em
circulação”). No entanto A poderia excluir a responsabilidade por via do artigo 505º do
CC (“Sem prejuízo do disposto no artigo 570º, a responsabilidade fixada pelo nº1 do
artigo 503º só é excluída quando o acidente for imputável ao próprio lesado ou a terceiro,
ou quando resulte de causa de força maior estranha ao funcionamento do veículo”).
Assim se fosse de aplicar a responsabilidade pelo risco do artigo 503º CC a este caso
podíamos excluir a responsabilidade de A por força do artigo 505º CC porque o acidente
é imputável a B, apesar deste ser inimputável.
Nota: imputável para efeitos do artigo 505º CC significa atribuível, “causado por”
portanto, o terceiro mencionado no artigo pode ser inimputável.
Nota 2: para o artigo 505º do CC imputabilidade não é uma questão de censurabilidade
ou de culpa mas sim uma questão de causalidade.
Uma outra forma de A ser responsabilizado seria ao abrigo do artigo 483º nº1 do CC e
para que C tivesse sucesso na sua pretensão indemnizatória é necessário que estejam
verificados os requisitos constantes deste artigo.
Pressupostos:
1. Ato;
2. Ilicitude;
3. Culpa;
4. Dano;
5. Nexo causal entre o ato e o dano.
1. Ato: temos que estar perante um facto que seja controlável pela vontade. No caso em
apreço estamos perante um ato de A pois ele vira o volante intencionalmente.
2. Ilicitude: além de estarmos perante um ato, esse ato tem que ser ilícito. No nosso caso
podemos perspetivar o ato como um ato ilícito por violação de um direito absoluto de
C, a violação do seu direito de propriedade. É certo que a violação de um direito
absoluto pode desencadear a responsabilidade civil, mas temos que primeiro averiguar se
poderíamos aqui aplicar uma causa de exclusão de ilicitude: a atuação de A aqui poderia
reconduzir-se ao Estado de necessidade previsto no artigo 339º do CC (“É lícita a ação
daquele que destruir ou danificar coisa alheia com o fim de remover o perigo atual de
um dano manifestamente superior, quer do agente, quer de terceiro”; “O autor da
destruição ou do dano é, todavia, obrigado a indemnizar o lesado pelo prejuízo sofrido,
se o perigo for provocado por sua culpa exclusiva; em qualquer outro caso, o tribunal
pode fixar uma indemnização equitativa e condenar nela não só o agente, como aqueles
que tiraram proveito do ato ou contribuíram para o estado de necessidade”).
O Estado de necessidade é uma situação de constrangimento em que alguém sacrifica
coisa alheia com vista de afastar um perigo atual com um prejuízo manifestamente
superior. Para estamos perante esta causa de exclusão de ilicitude é necessário que se
verifiquem os seus pressupostos:
1) Tem que haver então uma situação de perigo para o próprio ou terceiro- neste
caso a situação de perigo é para terceiro;
2) O dano produzido tem-se de produzir na esfera de outra pessoa;
3) É preciso ainda que haja necessidade de atuação (o que é comum a todas as causas
de exclusão de ilicitude) ;
4) Tem de haver proporcionalidade, ou seja, o dano que se evita tem de ser
manifestamente superior- neste caso há proporcionalidade, porque estamos perante
uma contraposição entre a danificação de uma carrinha e um embate numa pessoa,
que pode ser mortal.
Neste caso os pressupostos estavam todos preenchidos, logo a atuação de A é lícita- ele
atua em estado de necessidade.
Assim o tribunal pode condenar o agente (A) ou quem tira proveito (B) ou quem
contribuiu para o estado de necessidade (B e quem tem o dever de vigilância sobre o
inimputável).
Neste caso, há estado de necessidade de A, que não é causado por culpa exclusiva dele.
Esta não é uma responsabilidade por factos ilícitos, é uma responsabilidade por factos
lícitos que não pressupõe um juízo de culpa. B não é suscetível de um juízo de culpa, mas
pode responder por factos lícitos porque a responsabilidade por factos lícitos não surge
como uma reação a um comportamento desvalioso. Esta surge como uma manifestação
da justiça comutativa ditada por um equilíbrio na composição dos interesses. No nosso
caso, C tinha a sua carrinha bem estacionada e viu-a a ser danificada porque um sujeito
virou o volante aquando do surgimento de uma criança na estrada e portanto, por razões
de justiça o C não é obrigado a suportar esses danos. O julgador na composição dos
interesses pode condenar o inimputável através da obrigação de pagamento de uma
indemnização por factos lícitos.
Não basta estarmos perante uma omissão, esta tem que ser ilícita, neste caso a ilicitude
traduz-se na violação de direitos absolutos de C.
Há danos? Há, pelo menos, danos patrimoniais sob a forma de danos emergentes, neste
caso danos na carrinha no valor de 1000€.
Quanto ao nexo causal não havia dificuldades.
◼ Danos no carro de A
Nesta situação A não pode responsabilizar B, pois este é um inimputável, não é capaz de
culpa e não é dotado da capacidade para entender. Como é inimputável falta aqui um dos
pressupostos da responsabilidade civil por factos ilícitos.
Há outro caminho possível que o prof. Antunes Varela aponta: é dizer que o A ao virar
o volante atua assumindo a direção de negócio alheio por conta e no interesse do dono do
negócio e sem para tal estar autorizado, ou seja, dizer que o A atua em gestão de negócios.
E mesmo que os vigilantes não aprovem a gestão, o gestor consegue provar a regularidade
da gestão e esta é regular quando é conforme ao interesse (isto é, conforme à satisfação
de uma necessidade; neste caso protege-se a vida do inimputável) e à vontade real ou
presumível do dono – artigo 468º nº1 CC. Se a gestão for regular o dono do negócio tem
que indemnizar o gestor pelos prejuízos que ele tenha sofrido.
Este não é o caminho mais fácil, sendo o caminho mais fácil a aplicação do artigo 483º,
486º e 491º CC porque há uma presunção de culpa.
a) Quid iuris?
1. Ato: temos que estar perante um facto que seja controlável pela vontade. Neste caso
qual é o ato de A que podemos identificar? Este não feriu a perna de B enquanto abria um
buraco. O facto voluntário pode revestir duas formas: uma ação ou uma omissão. Aqui o
que vamos imputar a A, é uma omissão, um facto negativo.
2. Ilicitude: no que diz respeito à ilicitude um ato pode ser ilícito por: violação de um
direito (absoluto) de outrem; violação de uma norma de proteção (“disposição legal
destinada a proteger interesses alheios”); abuso do direito . Para além destas formas
gerais de ilicitude, o legislador também previu formas especiais de ilicitude: ofensa do
crédito ou do bom nome (artigo 484º do CC); conselhos, recomendações ou
informações (artigo 485º do CC); omissões (artigo 486ºdo CC).
Entre estes casos especiais de ilicitude está a omissão que se traduz num ato que não foi
adotado mas deveria ter sido.
A omissão só funda uma obrigação de indemnizar se houver dever de agir – artigo 486º
CC (“As simples omissões dão lugar à obrigação de reparar os danos, quando
independentemente dos outros requisitos legais, havia, por força da lei ou do negócio
jurídico, o dever de praticar o ato omitido”), em conjugação com o artigo 483º CC.
Nota: O pressuposto previsto no artigo 486º CC acresce aos pressupostos presentes no
artigo 483º CC.
Como é que fundamos o dever de agir? Neste caso não é com base num negócio
jurídico, resta-nos, portanto, a lei.
No âmbito desta matéria ,fruto de um caminho desenvolvido pela jurisprudência e
doutrina alemã temos que destacar a teoria dos deveres de segurança no tráfego ou
deveres de prevenção do perigo. Entende-se que esta tem acolhimento no nosso
ordenamento jurídico no artigo 486º CC, estando incluída no termo “lei”.
Esta teoria defende que quem cria ou mantém uma fonte de perigo no tráfego
jurídico-negocial tem o dever de adotar todas as diligências necessárias para evitar
que o perigo se converta em dano, este tem que adotar todas as diligências para
prevenir o risco de dano. Tem então o dever de adotar aqueles comportamentos que são
necessários para evitar que terceiros sofram danos na fonte de perigo que criou. Esta teoria
foi acolhida e desenvolvida pelo prof. Menezes Cordeiro, para além de ter sido acolhida
pela nossa jurisprudência.
sejassem adequadas para que eles pudessem lidar responsavelmente com a fonte de
perigo.
Os deveres indiretos podem ser deveres de aviso. Os deveres indiretos têm que criar
uma situação de segurança equivalente à que se alcançaria com uma atuação direta
sob a fonte de perigo. Neste caso, a indicação feita por A aparenta não ser suficiente.
Diferentemente seria se tivesse colocado tapumes resistentes (isto é, uma
barreira de tábuas com que se fecha ou circunscreve uma porção de terreno), que
tapassem o buraco e impedissem o seu acesso e permitissem que o transeunte conseguisse
passar à volta.
Concluindo, tem que se criar uma situação de segurança que permita aos terceiros,
potenciais lesados, lidarem autorresponsavelmente com a fonte de perigo e isso deve
incluir a consideração de características particulares de certos setores da população,
nomeadamente crianças que ainda não sabem ler, pessoas invisuais, etc.
Há, portanto, um ato omissivo e um dever de agir. Se há um dever de agir que é
incumprido, então a omissão é ilícita, resultante da violação do dever de agir.
Quando o A cai no buraco e parte a perna, há aqui a lesão de vários direitos de
personalidade de A e, portanto, se a omissão já era ilícita, a verdade é que temos ainda a
este nível a ilicitude nestes resultados danosos.
4. Danos: neste caso há uma multiplicidade de danos desde logo danos patrimoniais,
quer sob a modalidade de danos emergentes (neste caso, 500€ em fármacos) quer sob
a modalidade de lucros cessantes (que ganhos é que ele tinha direito e deixou de obter?
O salário, que não recebeu, relativo a 2 meses, mais concretamente 1500€ – podemos
chamar a estes salários não recebidos salários cessantes).
5. nexo causal entre os danos e o ato: no que diz respeito à aferição do nexo causal o O
entendimento maioritário (defendido pela nossa lei) diz-nos que o critério é o da teoria
da causalidade adequada, que se retira do artigo 562º (“Quem estiver obrigado a
reparar um dano deve reconstituir a situação que existira, se não se tivesse verificado o
evento que obriga à reparação”) e 563º CC (“A obrigação de indemnização só existe em
relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”).
Esta teoria pressupõe que sejam operados 2 juízos cumulativos (segundo a ordem
adotada):
1. Em primeiro lugar, tem que se fazer operar um juízo em concreto de
condicionalidade, ou seja, o primeiro juízo vai fazer apelo à chamada teoria da
condição necessária (condictio sine qua non). Nesta importa averiguar se retirado
do encadeamento causal o ato fundador de responsabilidade, se o dano se
continuava a produzir ou não. Ora nós temos que ver que se retirado o ato
fundador de responsabilidade se o dano produzido continuaria a produzir-se ou
não. Se nós retirarmos do encadeamento causal esse ato e o dano deixar de se
produzir é porque o ato é condição necessária daquele dano, mas se o dano
se continuar a produzir é porque o ato não é condição necessária daquele
dano.
Neste caso, temos uma omissão do dever de agir, que implicava que se criasse
uma situação de segurança que impedisse este ano. Se nós retirássemos esta
omissão, ou seja, se houvesse a adoção do comportamento devido aquele concreto
dano da queda naquela vala não teria acontecido. E, portanto, o ato, no nosso caso
a omissão, é condição necessária deste dano.
Se se concluir que o ato não é condição necessária do dano não se prossegue,
ou seja, não há nexo causal. Se se concluir que aquele ato é condição
necessária daquele dano tem-se que avançar para o segundo juízo, sendo
estes cumulativos. Se nós aplicássemos só a teoria da condição necessária
chegaríamos a um resultado muito amplo e, por isso, é necessário um filtro (artigo
563º CC - “provavelmente”) através de um segundo juízo. O ato ser condição
necessária do dano é condição necessária mas não suficiente da afirmação do nexo
causal.
Aqui a questão prende-se com a transfusão de sangue, que era necessária para salvar a
vida de B e que foi realizada contra a sua vontade.
Nota: No passado os médicos atuavam de acordo com o que era medicamente adequado,
mesmo que não correspondesse à vontade do paciente. No séc. XX, havia então uma visão
paternalista da medicina. Desde a segunda metade do séc.XX, que se reconhece cada vez
mais autonomia/autodeterminação do doente. Imaginemos que era necessário praticar um
determinado ato para salvar a vida, o doente consciente (pensemos num adulto com
capacidade de querer e entender e lhe é fornecida a informação necessária) rejeita, aí os
médicos têm que obedecer à vontade do doente, ou seja, os médicos não podem impor
soluções que contrariem a vontade do paciente, mesmo que isso implique a sua morte.
Coisa diversa é o caso das crianças, que têm representantes legais. Imaginemos que os
representantes legais se opõem e isso pode implicar a morte da criança, nestas situações
há mecanismos expeditos de contacto ao tribunal de família, que rapidamente vai inibir o
exercício das responsabilidades parentais aos pais, nomeando um curador, sendo este a
autorizar o ato médico.
A atuação do médico sem consentimento do paciente, durante muito tempo, dizia-se que
violava apenas a integridade física do paciente, mas hoje defende-se que esta viola a
autodeterminação do doente, a liberdade do paciente.
Aqui à primeira vista parece que o ato dos médicos além de ilícito era também culposo,
pois bom pai de família nas circunstâncias do caso não atuaria contra a vontade.
Mas antes de passarmos à culpa, não haveria aqui outro mecanismo a recorrer? Sim,
a presunção de consentimento - artigo 340º nº3 CC (“Tem-se por consentida a lesão,
quando esta se deu no interesse do lesado e de acordo com a sua vontade presumível”).
Ora atuar no interesse do lesado significa adotar um comportamento que objetivamente
satisfaz uma necessidade da outra pessoa. Neste caso, se B não levasse uma transfusão
morria e, por isso, a atuação dos médicos satisfaz o interesse de B, dando-se no seu
interesse.
transfusão. Mas à partida, não havendo mais nenhuns dados, a vontade presumível é
coincidente com o interesse.
Assim há uma causa de exclusão de ilicitude, ou seja, o ato não é ilícito e os médicos
não respondem.
c) Suponha, agora, que apesar de aparentar ter apenas algumas escoriações, B sofrera
graves lesões cerebrais que só seriam detetadas por via de um exame de TAC que,
segundo leges artis da ciência médica, deve ser realizado em casos da espécie do que
acaba de ser descrito. B acaba por falecer no hospital, em virtude de os médicos que
o assistiram não terem efetuado o referido exame, apesar de saberem que o paciente
havia batido com a cabeça
Para além dos médicos temos de averiguar se o hospital (vamos considerar que é privado)
poderia responder.
Há dois caminhos:
Nos termos do artigo 500º CC (“Aquele que encarrega de outrem de qualquer comissão
responde, independentemente de culpa, pelos danos que o comissário causar, desde que
sobre este recaia também a obrigação de indemnizar”; “A responsabilidade do comitente
só existe se o facto danoso for praticado pelo comissário, ainda que intencionalmente ou
contra as instruções daquele, no exercício da função que lhe foi confiada”), o comitente
responde pelos atos do comissário se se verificarem 3 pressupostos:
▪ Tem que haver uma comissão, isto é, o desempenho de uma atividade por conta e
sob a direção do comitente. Neste caso os médicos têm que atuar por conta e sob
a direção do hospital;
▪ O dano tem que se produzir no exercício das funções;
▪ Sobre o comissário tem que recair o dever de indemnizar. Neste caso, recai? Sim,
sendo o comitente o hospital e os comissários os médicos.
Assim sendo, os médicos respondem por responsabilidade por factos ilícitos ao
abrigo do artigo 483º CC e o hospital responde ao abrigo do artigo 500º CC por
Neste caso é de todo indiferente? Não, a omissão (a não sinalização da fonte de perigo)
potenciou a morte e aumentou o risco daquele resultado (morte causada por um
traumatismo craniano decorrente da queda no buraco). Assim o A, segundo a formulação
negativa, responde ainda pela morte de B
Enquanto que na formulação positiva quebra-se o nexo causal e na formulação negativa
já não se quebra, ou seja, se aplicarmos a formulação positiva o A não responde pela
morte, enquanto se aplicarmos a formulação negativa o A ainda responde pela morte.
Qual das formulações aplicámos então?
A nossa jurisprudência dá preferência à formulação positiva. Já a doutrina vem
defender que tratando-se de responsabilidade por factos ilícitos, deve-se aplicar a
formulação negativa porque é mais ampla, abrange mais danos.
Nota: Tem-se que ter em atenção à expressão “atendendo à natureza geral” para não
confundirmos a formulação negativa com o juízo de condicionalidade em concreto.
Exemplo: Imaginemos que o que se passou foi que B recuperou muito bem, mas tinha
com ele aquando de toda esta situação um portátil que desapareceu. O A responde pelo
furto do portátil? Quanto ao juízo em concreto, o ato de A é condição necessária a esse
dano, o B não teria ido para o hospital se não tivesse caído, nem teria sido subtraído o
portátil deste no hospital. E em abstrato é adequado? Segundo a formulação positiva, não.
À luz da formulação negativa, não.
Caso Prático nº 20
A, criança de 7 anos, filho de B e C, contra as instruções dos pais vai jogar futebol
com os amigos no campo em frente a sua casa. Durante o jogo, um remate com
mais força de A vai embater, partindo, o vidro da montra de uma loja de sapatos.
Como já eram 19h00, o dono da loja só conseguiu reparar o vidro (que tem o valor
de 1.000 €) com fita autocolante. Durante a noite, a loja vem a ser assaltada, sendo
causados prejuízos no seu recheio no valor de 1.500 €. Quid iuris?
Há um ato dos pais? Neste caso estamos perante uma omissão dos pais (artigo 486º do
CC).
Onde é que fundamos o dever de agir? Fundamos nas responsabilidades parentais -
artigo 1878 do CCº.
Os pais disseram à criança para não ir jogar futebol para o campo em frente de sua casa
mas apenas o disseram o que nos leva a questionar se cumpriram o seu dever de vigilância.
É importante saber que o modo como deve ser exercida a vigilância não é sempre o
mesmo, varia de acordo com as caraterísticas do vigiado.
⚫ Ora uma coisa era dizê-lo a uma jovem ou a um adolescente e aí entendia-se que os
pais teriam exercido o seu dever, pois o vigiar tem de ser consentâneo com alguma
margem de liberdade, e autonomia do próprio vigiado.
⚫ Mas estando aqui em causa uma criança de 7 anos não nos pareces que o tribunal
fosse considerar que o dever de vigilância tivesse sido cumprido apenas pelo facto
dos pais dizerem à criança para não ir jogar.
Portanto, tendo isto em conta, dificilmente os pais de A poderiam provar que cumpriram
os deveres de vigilância.
Neste caso o nexo causal levanta alguns problemas. Ora não há duvidas que existe nexo
causal quanto ao dano da quebra do vidro, mais problemático é saber se existia no que
diz respeito ao que foi subtraído. Assim temos de aplicar a teoria da causalidade
adequada.
Há quem venha dizer que mesmo que na formulação negativa, quando a atuação de
terceiros é dolosa interrompe-se o nexo causal e portanto a criança e os pais não
responderão pelos objetos furtados.
Agora imaginemos que damos como provado o nexo causal, o que podemos dizer
quanto à conduta do dono da loja? Pode aqui haver lugar à culpa do lesado por não ter
adotado as diligencias necessárias para evitar o agravamento dos danos – artigo 570º CC.
Quais são as consequências? O tribunal pode excluir ou reduzir a indemnização quanto
à situação do furto.
Caso Prático nº 21
A, dono de um imóvel sito no Porto, contrata com B, empreiteiro, o arranjo e pintura da
fachada do edifício. Para o efeito, B monta um andaime em frente do mesmo para permitir
a realização dos trabalhos. Numa noite de vento cai um cilindro de ferro, mal seguro, que
fazia parte do andaime num automóvel que estava estacionado no outro lado da rua,
provocando uma lesão craniana a C que se encontrava lá dentro. Chamada a ambulância,
C é recolhido, mas acaba por morrer dos ferimentos pouco depois de chegar ao Hospital,
por falta da assistência atempada. De facto, a ambulância só aí chegou passadas duas
horas devido a um engarrafamento de trânsito onde tinha ficado retida.
Quid iuris?
Neste caso estamos perante um ato que se traduz num comportamento voluntário, isto é,
um ato controlável/dominável pela vontade humana. Este pode revestir duas modalidades:
ação e a omissão. Aqui temos uma omissão (artigo 486º do CC).
No que diz respeito à ilicitude, a omissão será ilícita quando havia o dever de praticar o
ato que foi omisso. Esta obrigação de agir pode resultar de fonte negocial ou de fonte
legal. Ao nível legal estão previstos no CC: o dever de vigilância (artigo 491º do CC);
danos causados por edifícios ou obras (artigo 492º do CC); danos causados por coisas,
animais ou objetos (artigo 493º do CC).
Nesta caso importa o artigo 492º do CC (“ o proprietário ou possuidor de edifício ou
outra obra que ruir, no todo ou em parte, por vício de construção ou pro defeito de
conservação, responde pelos danos causados, salvo se provar que não houve culpa da
sua parte ou que, mesmo com a diligência devida, se não teriam evitado os danos”), que
preve a responsabilidade pelos danos causados pela ruína total ou parcial de edifícios ou
obras devido a vícios de construção ou conservação. Ora temos que ver se a situação é
subsumível a este artigo, importando a noção de “outras obras”, sendo necessário
averiguar se o andaime cabe nesta expressão. Aqui o andaime cabe nesta expressão, pois
inclui-.se tudo o que tiver uma ligação fixa com o imóvel (um dos exemplos que é dado
pela doutrina é o dos andaimes).
Assim sobre o dono do imóvel iria recair a presunção de culpa, porém ele facilmente
demonstraria que o ferro caiu porque estava mal seguro, logo conseguiria provar que o
ferro não tinha caído por vício de construção ou conservação.
Neste caso prático o problema recaía especificamente sobre o nexo causal. De acordo
com o artigo 563º do CC o agente só responde em relação aos danos que o lesado
provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão.
Já sabemos que nestas situações aplicamos a teoria da condicionalidade adequada. Ora
aqui era fácil estabelecer um nexo causal entre o ato de B e a lesão de C, pois ao nível de
um juízo de condicionalidade em concreto a não diligência na montagem do andaime foi
condição necessária para provocar dano a C. No que diz respeito ao juízo abstrato o facto
também era adequado para a produção da lesão. Assim se B tivesse adotado diligências
devidas na montagem do andaime, o cilindro não teria caído e provavelmente não teriam
sido causados danos.
2. Juízo em abstrato:
Aqui temos que atender à formulação positiva e negativa:
⚫ Formulação positiva: segundo o decurso de acontecimentos a ambulância mesmo
que haja engarrafamento, sendo um veiculo prioritário, não ficaria presa logo, não se
atrasaria, o que quer dizer que aqui se interrompe o nexo causal.
⚫ Formulação negativa: segundo a formulação negativa o ato não é de todo
indiferente para a produção daquele dano atendendo à sua natureza geral, o trânsito
é uma vicissitude que pode acontecer numa cidade ou em qualquer sítio. A queda do
andaime que bateu na cabeça de C não foi de todo indiferente, tendo em conta a
natureza geral, para aquela morte.
Caso Prático nº 22
A, ao conduzir o seu veículo na cidade do Porto, em excesso de velocidade, vê D, com
pressa para apanhar o autocarro, surgir subitamente em corrida à frente do seu automóvel.
A, ao procurar evitar o atropelamento, o que não consegue, tem um despiste
e acaba por embater no automóvel de E que se encontrava estacionado. Do acidente
resulta a fractura da perna de D, a danificação do automóvel de E, bem como uma lesão
craniana de E. Este último ao ser conduzido ao hospital sofre uma fratura de um braço
num despiste da ambulância em virtude da condução pouco cuidadosa do condutor da
mesma. Quid iuris?
Neste caso vemos que há danos quanto a D, que parte uma perna e por outro lado temos
danos causados a E nomeadamente quanto ao seu automóvel e este ainda fratura o braço.
Face a esta situação poderíamos aqui pensar na presunção de atividade perigosa artigo
493º nº2 - mas não pode ser aplicada devido a um assento do STJ que nos diz que esta
presunção do artigo 493º nº2 não se aplica à atividade de condução automóvel.
Exemplo: o sujeito A vai a conduzir respeitando todas as regras, e por razões
desconhecidas o travão falhou, ora o sujeito queria travar e não conseguiu. Pode A
responder? Pode, porque há neste âmbito uma previsão de uma responsabilidade por
responsabilidade objetiva/pelo risco nos termos do artigo 503º nº1 do CC. O que STJ
veio dizer que o legislador para esta perigosidade previu responsabilidade objetiva, previu
um remédio mais forte, logo não se pode aplicar a presunção de culpa. À mesma
perigosidade, o ornamento jurídico não deve reagir com dois instrumentos, porque há
outras atividades perigosas para as quais não esta prevista a responsabilidade pelo risco e
não faz sentido para essas se aplique a presunção de culpa.
Nota: esta matéria será melhor desenvolvida no 2º semestre, a professora apenas deu
4. Danos: aqui há danos desde logo, danos de natureza não patrimonial, que são
ressarciveis pelo artigo 496º CC. Há repercussões patrimoniais? Provavelmente, apesar
de o enunciado não nos dizer nada.
5. Nexo causal: neste caso, tem que ser aferido nos termos gerais, ou seja tem que se
fazer o juízo em concreto de condicionalidade e o juízo em abstrato de adequação.
1. Juízo em concreto:
Se não tivesse sido o ato gerador da responsabilidade o D teria partido a perna? Não,
portanto retirado esse ato o dano deixava-se de produzir.
2. Juízo em abstrato:
Aqui temos que atender à formulação positiva e negativa:
⚫ Formulação positiva: alguém que vai em excesso de velocidade num normal
decurso de acontecimentos pode ou não pode bater num peão? Sim, ora aqui desde
logo com a formulação positiva conseguimos afirmar o nexo causal.
⚫ Formulação negativa: o facto não é atendendo à sua natureza geral indiferente, é
adequado, pois conduzir em excesso de velocidade numa via pública no centro de
uma cidade é adequado a atingir um peão e a partir-lhe uma perna.
Assim não haveria dúvidas o A responderia perante D.
Quanto aos danos em E. Quem é que pode responder perante E? Temos que fazer uma
separação entre os danos na coisa e os danos na pessoa.
Danos no carro.
Podemos convocar quer a responsabilidade de A quer a responsabilidade de D e podemos
quanto a ambos convocar a responsabilidade ao abrigo do artigo 483º CC, pois ambos
praticaram um ato ilícito, culposo, danoso e o nexo causal aqui não levantaria problemas.
A responsabilização do artigo 483º vale quer quanto ao carro quer quanto à pessoa de E,
mas quanto ao carro, podemos ainda convocar a atuação em estado de necessidade
(artigo 339º do CC) porque o condutor do veículo atuou em estado de necessidade, sendo
que esta figura abrange apenas os danos causados em coisa alheia, portanto este
raciocínio só se aplica aos danos produzidos no carro.
Primeiramente temos que ver se o agente que atuou em estado de necessidade é o causador
exclusivo da fonte de perigo. Neste caso ele é causador da fonte de perigo porém não é o
único logo temos que aplicar a 2º parte do artigo 339º nº2. Em abstrato, pode ser
responsabilizado o agente, os que beneficiaram e os que contribuíram para a
produção da situação de perigo, que neste caso seriam o A e o D.
Assim o tribunal por esta via quanto aos danos do carro podia responsabilizar A e D nos
termos do artigo 339 nº2. De qualquer modo eles também seriam responsabilizados ao
abrigo do artigo 483º CC.
Se respondem ambos, estamos perante uma responsabilidade solidária – artigos 490º e
497º CC - o que quer dizer que o E pode exigir a totalidade da indemnização a qualquer
um deles.
Fratura do braço
A questão da fratura no braço que ocorre no transporte para o hospital temos que a
resolver através do pressuposto do nexo causal. Ora aqui temos que fazer o juízo em
concreto e o juízo abstrato.
1. Juízo em concreto
Se retirássemos os comportamentos de A e do D este dano deixaria de se produzir?
Sim, porque o E não teria sofrido o traumatismo craniano, não estaria naquela ambulância.
2. Juízo em abstrato:
Aqui temos que atender à formulação positiva e negativa:
⚫ Formulação positiva:
Segundo a formulação positiva um facto é causa adequada de um dano quando esse facto
for apto a produzir esse dano de acordo com um decurso regular de acontecimento.
Num decurso regular de acontecimentos o condutor da ambulância conduz
negligentemente? Não, ora segundo um decurso regular de acontecimentos aquele ato não
é adequado a produzir aquele dano.
⚫ Formulação negativa:
Já na formulação negativa um facto só não é causa adequada de um dano quando
atendendo à sua natureza geral for de todo indiferente à produção daquela espécie de
danos.
Ora possibilidade de alguém que sofreu uma lesão e carece de cuidados hospitalares sofrer
um dano subsequente numa ambulância, não é de todo indiferente.
Portanto de acordo com a formulação negativa não se corta o nexo, esta é muito mais
ampla.