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OBJETO DE APRENDIZAGEM

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Cultura digital e escola


Alberto Tornaghi

Introdução condicionam o jeito de ser e de fazer de cada uma. forma mais eficiente o que já fazíamos sem elas.
O que é escola? O que é cultura? E cultura A essas redes, que contam com seres humanos Usando uma pá, sou capaz de cavar um buraco
digital, o que seria cultura digital? Escola é lugar misturados e conectados com aparatos tecnológi- mais fundo e mais rapidamente do que usando
de cultura? Ou só de educação? Existe educação cos, chamamos de redes sociotécnicas, seguindo apenas minhas mãos. Mas nenhum ser humano
sem cultura? E cultura sem educação, existe? o que dizem Latour (1997) e Pierre Lévy (2008). pode se comunicar de forma quase instantânea
Muitas perguntas para um texto só. Muitas per- Também abordo este tema em minha tese, na qual com alguém que está do outro lado do mundo sem
guntas para uma escola só. Mas, afinal, escola é discuto diretamente como uma escola se transfor- fazer uso de alguma tecnologia.
ou não é lugar para perguntas? Bem, se não era, mou em função de integração das tecnologias ao Foi pensando nisso, nas novas formas de pen-
é bom que passe a ser, porque este é um tempo seu cotidiano (TORNAGHI, 2007). sar, de fazer e de se comunicar tendo as tecno-
mais de perguntas do que de respostas. E, sabe- Esta série não traz respostas definitivas a qual- logias digitais como parceiras, que concebemos
mos bem, aprende-se mais com as perguntas do quer pergunta. Ao contrário, o que pretendemos essa série. Nela vamos discutir questões cruciais
que com as respostas. É para escolas assim, que é estimular as escolas – essas redes compostas para quem pretende tirar proveito das parcerias
valorizam a dúvida e o erro como caminhos para a por educadores, estudantes, pais, computadores, que se tornam possíveis com a imensa rede com-
construção do conhecimento, que dirigimos todas televisões – a debater as questões levantadas e posta por seres humanos e máquinas, que nos
essas questões e mais outras tantas que surgirão a construir coletivamente, em cada uma e em permite, hoje, produzir com parceiros que jamais
ao longo desta série. parceria com outras, as suas respostas a outras veremos frente a frente.
Falamos aqui de muitas escolas. Falamos perguntas. Perguntas que ajudem a criar
aqui de, para e com muitas escolas. São escolas caminhos próprios para ampliar as parcerias com Redes sociotécnicas
diversas, em cada canto, com seu jeito de ser, de as tecnologias digitais em seu trabalho. Sim, falo Como foi dito acima, as redes de produção e
fazer, de ensinar e de aprender. Cada qual com seu de parceria porque tecnologias não são apenas de comunicação que conhecemos hoje são redes
jeito de compreender e assimilar o que o entorno instrumentos que nos ajudam a fazer melhor o que que reúnem seres humanos e aparatos tecnoló-
lhes traz. Cada qual com seu jeito bem próprio de já fazíamos antes. Cada nova tecnologia traz novos gicos, por isso são chamadas de redes sociotéc-
fazer parte desta enorme rede de conhecimen- fazeres, novas produções, novas formas de pensar nicas. Os seres humanos, a “parte sócio”, assim
tos e produções em que estamos todos imersos. e agir. Fazemos coisas que não fazíamos, antes como os aparatos, a “parte técnica”, são ambos
Cada qual, em si mesma, uma rede que reúne de ter acesso a elas. Por isso, entendemos que necessários para estabelecer as conexões que
educadores, aprendizes, equipamentos, prédios, são mais do que ferramentas. Ferramentas são viabilizam a produção e a comunicação de bens.
regimentos, pais e tantos outros elementos que instrumentos que nos permitem fazer melhor e de Elas são essenciais para a produção em rede da

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forma que produzimos hoje. Elas condicionam mais importância no que a escola faz do que os Ainda é assim na maioria destes meios.
tanto a forma de produzir como o que produzi- aparatos que lá chegam. A escola de educação Mas por pouco tempo, bem pouco.
mos. Uso aqui “condicionar” no sentido que lhe básica é entendida, frequentemente, como o
dá Lévy em Cibercultura (2008, p. 25), quando espaço de comunicação (de ensino) do que já O que a cibercultura muda
discute se a tecnologia é condicionante ou deter- foi produzido pela humanidade. É um espaço A cultura digital, a cibercultura, muda isso
minante. A tecnologia condiciona o fazer, traz e de reprodução do conhecimento produzido fora de forma profunda, radical (indo à raiz da ques-
impõe algumas condições, mas não determina o dela, pelas ciências, pelas artes, pelos valores... tão, como bem lembrava o mestre Paulo Freire).
fazer. Não é a tecnologia por si que faz uma nova Enfim, espaço de preservação e transmissão da Diferente das TVs, rádios e jornais, o computador
escola, bem sabemos. A TV não mudou a escola, cultura. Isso cabe, sim, à escola. Isso cabe, sim, é um equipamento de produzir bens. Computado-
o mimeógrafo não mudou a escola. Mas todos, TV, na escola. Mas há ainda mais a fazer. res ligados em rede são equipamentos de produzir
mimeógrafo, computadores e redes como Uma das inovações radicais da cibercultura, e de comunicar. E, mais do que isso, são equipa-
a Internet trazem novas condicionantes para o da cultura que decorre da popularização dos mentos de produzir junto, muitas pessoas e coisas
fazer escolar. Podemos agora, usando computa- aparatos digitais, é que esses são aparatos de contribuindo para uma mesma produção, produ-
dores conectados em rede, levar às nossas salas produção e de comunicação de bens. A televisão, ção em rede. Ora, isso pode trazer para a escola
de aula debates com pessoas que se encontram tal como a conhecíamos até pouco tempo, fazia algo que muitos de nós procurávamos há tempos:
muito longe delas, podemos convidar nossos alu- parte de uma rede, de um sistema de comuni- ambientes e instrumentos que viabilizem fazer o
nos a assistir e a produzir programas em vídeo ou cação de informações, valores e conhecimen- processo educativo centrado no aluno, na ação do
peças de áudio. Podemos convidá-los a conver- tos. Era uma comunicação hierarquizada, de aprendiz mais do que na do professor. Entendemos
sar com outros jovens do Brasil ou do exterior... poucos para muitos. Nas estações produtoras que o aprendiz é o construtor de seu conhecimen-
Podemos nós, educadores, conversar com nossos de programas, criam-se programas que são to, ele constrói seu conhecimento e a inteligência
pares que vivem e trabalham em outros locais, transmitidos e assistidos por muitos. É o que em interação com seu entorno. O que verificamos,
vivendo uma realidade que tem semelhanças e chamamos de comunicação de um para mui- mais recentemente, é que esta construção se dá
diferenças, ambas importantes, com aquela em tos: um faz, muitos recebem. O mesmo modelo de forma ainda mais consistente e sólida quando o
que vivemos. São muitas as novas possibilidades descreve o que fazem os jornais, as editoras com aprendiz produz bens reais.
condicionadas pela tecnologia digital. seus livros, as rádios e tantos outros sistemas
Ao entender a escola como uma rede que de comunicação e espraiamento de informação Fonte: https://cdnbi.tvescola.org.br/contents/document/
produz, estamos trazendo uma inovação que tem e cultura que conhecemos até recentemente. publicationsSeries/13431810-Culturadigitaleescola.pdf

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