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CORREDORES E SUBÁREAS - 1

ADILSON COSTA MACEDO

CORREDORES E SUBÁREAS
COMO ESTUDAR A FORMA E PROJETAR A CIDADE

SEGUNDA EDIÇÃO
2021
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EDITORA ANAP
Associação Amigos da Natureza da Alta Paulista
Pessoa de Direito Privado Sem Fins Lucrativos, fundada em 14 de setembro de 2003.
www.editoraanap.org.br
editora@amigosdanatureza.org.br

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propriedade material, imaterial, conteúdo, correções de língua portuguesa, normas de
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Ficha Catalográfica

Índice para catálogo sistemático


Brasil: Planejamento Urbano
CORREDORES E SUBÁREAS - 3

Conselho Editorial Interdisciplinar Permanente


_________________________________________________________________________

P Profa. Dra. Alba Regina Azevedo Arana – UNOESTE Prof. Dr. João Carlos Nucci – UFPR
Prof. Dr. Alessandro dos Santos Pin – UNICERRADO Prof. Dr. João Paulo Peres Bezerra – UFFS
Prof. Dr. Alexandre Carneiro da Silva – IFAC – AC Prof. Dr. Jose Mariano Caccia Gouveia – FCT/UNESP
Prof. Dr. Alexandre Gonçalves – Centro Univ. IMEPAC Profa. Dra. Josinês Barbosa Rabelo – ASCES – UNITA
Prof. Dr. Alexandre Sylvio Vieira da Costa – UFVJM Profa. Dra. Jovanka Baracuhy Cavalcanti – UFPB
Prof. Dr. Alfredo Z. Dominguez Gonzalez – UNEMAT Profa. Dra. Juliana de Oliveira Vicentini – USP – Piracicaba
Profa. Dra. Alzilene Ferreira da Silva – UFRN Profa. Dra. Juliana H. Pinê Américo-Pinheiro – Univ. Brasil
Profa. Dra. Ana Klaudia de A. Viana Perdigão – UFPA Profa. Dra. Karin Schwabe Meneguetti – UEM
Profa. Dra. Ana Paula Branco do Nascimento – USJT Prof. Dr. Kleso Silva Franco Junior
Profa. Dra. Ana Paula Novais Pires Koga – UFCAT Profa. Dra. Larissa Fernanda Vieira Martins
Profa. Dra. Andréa Ap. Zacharias – UNESP – Ourinhos Prof. Dr. Leandro Gaffo – UFSB
Profa. Dra. Andréa Holz Pfützenreuter – UFSC Profa. Dra. Leda Correia Pedro Miyazaki – UFU
Prof. Dr. Antonio Carlos Pries Devide – APTA/SP Profa. Dra. Leonice D. dos Santos C. Lima – Univ. Brasil
Prof. Dr. Antonio Cezar Leal – FCT/UNESP Profa. Dra. Ligiane Aparecida Florentino – UNIFENAS
Prof. Dr. Antonio Fábio Sabbá Guimarães Vieira – UFAM Profa. Dra. Luciane Lobato Sobral – UEPA
Prof. Dr. Antonio Pasqualetto – PUC – GO Prof. Dr. Luiz Fernando Gouvea e Silva – UFJ – GO
Prof. Dr. Antonio Soukef Júnior – UNIVAG Prof. Dr. Marcelo Campos – FCE/UNESP/Tupã
Prof. Dr. Arlete Maria Francisco – FCT/UNESP Prof. Dr. Marcelo Real Prado – UTFPR
Profa. Dra. Bruna Angela Branchi – PUC Campinas Prof. Dr. Márcio Rogério Pontes
Prof. Dr. Carlos Andrés Hernández Arriagada – UPM/SP Prof. Dr. Marcos de Oliveira Valin Jr – IFMT – Cuiabá
Prof. Dr. Carlos Eduardo Fortes Gonzalez – UTFPR Profa. Dra. Maria Ângela Dias – FAU/UFRJ
Profa. Dra. Cássia Maria Bonifácio – UEM Profa. Dra. Maria Augusta Justi Pisani – UPM – SP
Prof. Dr. Celso Maran de Oliveira – UFSCar Profa. Dra. Martha Priscila Bezerra Pereira – UFCG – PB
Prof. Dr. César Gustavo da R. Lima – UNESP – Ilha Solteira Profa. Dra. Nádia V. do Nascimento Martins – UEPA
Profa. Dra. Cibele Roberta Sugahara – PUC/Campinas Prof. Dr. Natalino Perovano Filho – UESB – BH
Prof. Dr. Claudiomir Silva Santos – IFSULDEMINAS Prof. Dr. Paulo Alves de Melo – UFPA
Prof. Dr. Daniel Richard Sant'Ana – UnB/ICC Prof. Dr. Paulo Cesar Rocha – FCT/UNESP
Profa. Dra. Daniela P. Traficante – FCA/UNESP/Botucatu Profa. Dra. Rachel Lopes Queiroz Chacur – UNIFESP
Profa. Dra. Danila F. Rodrigues Frias – Universidade Brasil Profa. Dra. Renata Franceschet Goettems – UFFS
Prof. Dr. Darllan C. da Cunha e Silva – UNESP – Sorocaba Profa. Dra. Renata Morandi Lóra
Profa. Dra. Dayse Marinho Martins – IEMA Profa. Dra. Renata R. de Araújo – FCT/UNESP
Profa. Dra. Edilene M. Murashita Takenaka – FATEC Prof. Dr. Ricardo de Sampaio Dagnino – UFRGS
Prof. Dr. Edson L. Ribeiro – Ministério do Desenvolv. Regional Prof. Dr. Ricardo Toshio Fujihara – UFSCar
Prof. Dr. Eduardo Salinas Chávez – UFMS – Três Lagoas Profa. Dra. Rita Denize de Oliveira – UFPA
Prof. Dr. Eduardo Vignoto Fernandes – UFG/GO Prof. Dr. Rodrigo Barchi – Univ. Ibirapuera – UNIB
Profa. Dra. Eleana Patta Flain – UFMS – Naviraí Prof. Dr. Ronald F. Albuquerque Vasconcelos – UFPE
Profa. Dra. Eliana Corrêa Aguirre de Mattos Profa. Dra. Roselene Maria Schneider – UFMT/Sinop
Profa. Dra. Eloisa Carvalho de Araújo – PPGAU/ EAU/UFF Profa. Dra. Rosío F. Baca Salcedo – UNESP – Bauru
Prof. Dr. Erich Kellner – UFSCar Prof. Dr. Salvador Carpi Junior – UNICAMP
Profa. Dra. Eva F. da Fonseca de Moura Barbosa – UEMS Prof. Profa. Dra. Sandra M. Alves da Silva Neves – UNEMAT
Dr. Fernando S. Okimoto – FCT/UNESP Prof. Dr. Sérgio Luís de Carvalho – UNESP – Ilha Solteira
Profa. Dra. Flavia Rebelo Mochel – UFMA Profa. Dra. Thais Guarda Prado Avancini
Prof. Dr. Frederico Braida – UFJF Profa. Dra. Vera L. Freitas Marinho – UEMS/ C. Grande
Prof. Dr. Frederico Yuri Hanai – UFSCar Prof. Dr. Vitor C. de Mattos Barretto – UNESP/Dracena
Prof. Dr. Gabriel L. Bonora Vidrih Ferreira – UEMS Prof. Dr. Wagner de Souza Rezende – UFG
Prof. Dr. Gilivã Antonio Fridrich – UNC Profa. Dra. Yanayne Benetti Barbosa
Prof. Dr. Joao Adalberto Campato Jr – Universidade Brasil
Prof. Dr. João Candido André da Silva Neto – UFAM
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Dedico este livro à minha esposa Ana Maria e


a meus filhos Alexandre, Andrea e Augusto
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Agradecimentos

À memória do meu pai, arquiteto, me motivou para a profissão e aprendi muito com ele!
À memória do amigo, arquiteto Joaquim Manoel Guedes Sobrinho; ele me ensinou a
repensar aquilo que se apresenta como óbvio. Foram momentos juntos, na graduação e na
pós, tempo em que na FAUUSP os alunos eram inspirados pela ‘escola paulista’.
Ao arquiteto-professor Gastão Santos Sales, pela amizade de nossas famílias! A troca de
ideias sobre planejamento e projeto urbano, parceria na busca de temas para trabalhos dos
alunos; seu auxílio para melhorar os diagramas que faço à mão e ele os enriquece aplicando
o seu talento através dos meios digitais.
À arquiteta-professora Maria Isabel Imbronito, por nossa amizade! Parceira na condução
de projetos, orientar grupos de pesquisa, nas visitas com alunos para conhecer trechos da
cidade e escrevermos juntos quando o assunto interessa aos dois.
Não dá para esquecer o amigo, arquiteto-professor Eugênio Fernandes Queiroga; ele nunca
me levou muito a sério e às vezes diz ‘você sempre aparece com alguma coisa diferente’.
Desde a PUCCAMP até hoje na FAUUSP admiro seu conhecimento e seriedade.
Foi importante compartilharmos aulas de urbanismo e me tornar amigo do arquiteto-
professor Fábio Mariz Gonçalves, grande desenhista, idealizador de espaços da cidade para
um dia se tornarem lugares.
Foi muito importante o estímulo recebido de tantos outros colegas, na Universidade de
Brasília; Universidade de São Paulo, na PUC-Campinas e Universidade São Judas Tadeu;
nesta, o carinho dos colegas do programa de pós-graduação.
Lembro da colaboração de profissionais, ainda estudantes, que apoiaram a ideia dos
corredores e subáreas; Paulo Eduardo B. Gonçalves, Adriana I. de Lima, Jéssica C. G.
Lorellay, Fernanda C. de Souza, Amanda Chyoshi e o Fábio C.N. Martins.
Agradeço o apoio da arquiteta-geógrafa e advogada Sandra Medina Benini, presidente da
ANAP que me estimulou e orientou para a produção deste livro.

Bem me recordo do convívio de escritório, aprender com os colegas, participar de


concursos, se encantar ao ver um projeto ser desenvolvido até os pormenores e depois
seguir para a obra; ser um arquiteto!
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SUMÁRIO

PRÓLOGO .......................................................................................................... 11

PREFÁCIO .......................................................................................................... 13

INTRODUÇÃO .................................................................................................... 19

CAPÍTULO 1
Espaço físico, o suporte das atividades humanas ............................................. 23

CAPÍTULO 2
Forma urbana: o conceito de corredor e subárea ............................................. 39

CAPÍTULO 3
Setores e subsetores da cidade ......................................................................... 61

CAPÍTULO 4
Quadras, lotes e edifícios .................................................................................. 87

CAPÍTULO 5
O traçado em retícula ....................................................................................... 115

CAPÍTULO 6
Os grandes conjuntos habitacionais e o declínio do Moderno ......................... 141

CAPÍTULO 7
A persistência da retícula ortogonal ................................................................. 153

CAPÍTULO 8
Brasil, São Paulo e as retículas ortogonais ........................................................ 163

CAPÍTULO 9
As quadras do Bairro Jardim em Santo André, SP ............................................. 167

CONCLUSÃO
Entenda a trama da cidade para projetar suas partes ...................................... 179

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................ 183


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PRÓLOGO

Para formular programas e fornecer um caminho para o projeto urbano em trabalhos dos
alunos do sétimo e oitavo semestre de Arquitetura e Urbanismo na Pontifícia Universidade
Católica de Campinas ao final dos anos 1990 e na Universidade São Judas Tadeu de 2010
em diante, chegamos ao procedimento dos corredores e subáreas. Foi o resultado de um
longo período de maturação pois, no entremeio desses trinta anos - agora estamos em
2020 - assumimos uma disciplina de projeto de arquitetura das edificações na Faculdade
de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, que junto aos demais
compromissos como profissional arquiteto, nos desviou do foco de projeto na escala da
cidade. Antes de 1990 foi essencial para nossa formação ter passado pelo Urban Design
Program da Graduate School of Architecture, Harvard University (1975-77) onde tratamos
de reunir a prática do urban design com conhecimentos de análise morfológica aplicada ao
estudo da forma da cidade e a seu projeto. Nos anos 1980, como aluno de doutorado da
Universidade de São Paulo e a bolsa de um ano para a Bartlett School of Architecture em
Londres, se abriu uma oportunidade para estudar os projetos de implantação das novas
universidades inglesas, fundadas e construídas nos anos 1960, naquela época com cerca de
vinte anos da sua inauguração. Elas foram em maioria implantadas junto a cidades novas
ou a cidades históricas; pensadas para fomentar a atração pelos sítios históricos e
aproveitar os alojamentos de estudantes, que poderiam ser alugados para turistas se
aproveitando do esvaziamento dos dormitórios na temporada de férias. Estes campi para
novas universidades foram projetados por escritórios ingleses de renome, e conhecê-los
foi muito importante para a minha tese de doutorado.
A lembrança desses acontecimentos destaca o quanto a experiência profissional e a
acadêmica se interligam para dar suporte a conceitos e processos relacionados à forma e
ao projeto da cidade. O procedimento dos corredores e subáreas ora apresentados, se por
um lado é bom para a análise da forma urbana pelo viés teórico que pode ser ampliado, de
outro, serve como um procedimento para trabalhos profissionais em arquitetura e
urbanismo. Para tanto se somou à minha experiência a opinião experimentada e o estímulo
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vindo de professores, de profissionais urbanistas e do dia a dia da discussão com os


estudantes sobre os seus projetos. Em 2019 concluímos três textos relatando uma maneira
para conceituar e de proceder em trabalhos relativos à análise da forma urbana que, ao
invés de assumirem o formato de artigos, passaram a fazer parte deste pequeno livro. Foi
como um projeto chegando devagar aos seus pormenores, dentro da lógica de estudar a
cidade por partes.

São Paulo, novembro 2020


CORREDORES E SUBÁREAS - 13

PREFÁCIO

Dentre as falas recorrentes do professor Adilson Macedo, escolhemos duas que nos
auxiliam nesta apresentação: “o arquiteto precisa andar a pé na cidade” e “o arquiteto é
aquele que projeta os espaços”.

Da primeira, poderíamos nos remeter ao prazer de explorar ruas e bairros, que vem aqui
acompanhado de uma postura investigativa. Em pequenos grupos de estudo, com mapas
na mão, percorrem-se calçadas e frentes públicas, moradias, fábricas e comércios,
conjuntos urbanos, favelas e condomínios, vielas e grandes avenidas. Diferentes tecidos
urbanos, com suas características espaciais, de vitalidade e de uso, proporcionam
diferentes experiências. Mas andar a pé, para o professor Macedo, além de descobrir
lugares, implica reconhecê-los e relacioná-los a procedimentos mentais de análise e
projeto, e recolher elementos da estruturação, da vivência e do caráter dos espaços para,
em seguida, acioná-los junto a propostas urbanas.

Isso nos leva à segunda recomendação: a atividade do arquiteto é o projeto. A posição


firme sobre o escopo profissional não é ingênua pois, enquanto delimita o campo
disciplinar ao reconhecer a aptidão do desenho, é acompanhada do entendimento da
interdisciplinaridade e do papel dos diferentes agentes que interagem na produção do
espaço urbano e que constroem sua viabilidade. Assim, o professor mostra uma posição
capaz de fortalecer a ação do arquiteto, munindo-o para o projeto enquanto modo de
pensar a cidade com base na troca de conhecimentos. A mesma fala indica também a
valorização de um nicho de atuação: o Desenho Urbano. Associado a planos de
transformação de grandes áreas mundo afora, este campo, enquanto dispositivo que gera
e transfere valor, encontra resistência. Contudo, a postura do professor Macedo remete às
referências assimiladas desde seu Mestrado no programa de Urban Design da Universidade
de Harvard, nos anos 1970. Em Harvard, o ateliê de projeto conduzido por William V.
Moltke e Michael Pittas envolvia uma parceria com a prefeitura de Cambridge, e as
participações de um coordenador do município, um consultor de implementação – que
dava assessoria para a prefeitura e para a Universidade - e de representantes de diferentes
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grupos da comunidade (hotelaria, patrimônio histórico, grupos de moradia, representantes


de bairro). O processo de trabalho no ateliê compreendia reuniões para discussão com os
diferentes atores envolvidos na produção do espaço, visando a viabilidade e a adequação
das propostas, a elaboração gráfica do projeto urbano e sua apresentação junto a estes
grupos. Deste modo, os agentes eram identificados e as hipóteses ensaiadas pelos
estudantes e levadas à comunidade.

Também é usual a posição do professor Adilson Macedo pelo aprofundamento do


programa de necessidades, condição fundamental para a sustentação dos projetos urbanos
que, segundo ele, não sobrevivem do desejo de estudantes e arquitetos por espaços livres
públicos, mas do entrosamento entre o espaço, as demandas (reais e propostas) e os meios
de implementação, incluindo o diálogo com o poder público. Se a clareza sobre a
importância do programa de necessidades aprofundou-se no Ateliê de Desenho Urbano
em Harvard, esteve também presente em pelo menos duas experiências profissionais: o
projeto para a Faculdade de Ciências da Saúde, Tecnologia e Medicina Tropical da
Universidade de Brasília, cujo financiamento do BID exigiu grande detalhamento dos
equipamentos, laboratórios e espaços do edifício, e nos trabalhos desenvolvidos com o
arquiteto Joaquim Guedes, reconhecido estudioso das minúcias do programa. Assim, o
professor Macedo aciona todo o tempo a sua experiência em projeto de edifícios e
transporta o projeto urbano para uma escala menos abstrata, baseada na necessidade de
desenhar espaços urbanos adequados em escala e propósitos, que não correspondam a
um urbanismo de prancheta e tampouco se restrinjam a um planejamento baseado em
números.

O pensamento do professor Adilson Macedo também incluiu, nas últimas décadas, temas
ligados à qualidade do ambiente construído e ao desenho voltado a um desenvolvimento
sustentável e equilibrado, cuja agenda foi por ele organicamente incorporada aos
processos de pensar o desenho urbano e que, hoje, se tornam parte fundamental das suas
preocupações.

Na base de todo este pensamento, contudo, o professor insiste no estudo dos elementos
urbanos como fundamento analítico para a compreensão das áreas de projeto. Com uma
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visão sistemática da forma, fornecida pela Morfologia Urbana, e na busca por compreender
relações subjacentes que fundamentem o projeto, o professor Adilson Macedo ampliou o
leque dos conceitos clássicos adotados pelos autores consagrados neste campo de
conhecimento (rua, quadra, lote, edifício, malha, traçado). O que se apresenta neste livro
resulta de longa reflexão sobre como se aproximar da problemática da forma urbana e
desvendar as estruturas que relacionam os elementos e as áreas urbanas entre si. Do
aprofundamento metodológico, aperfeiçoado em sala de aula da Graduação e em
pesquisas na Pós-Graduação, destaca-se a estratégia depurada pelo professor para
entendimento da forma urbana que chamou de Corredores e Subáreas.

Este livro, há tempos, existiu como um projeto, no qual o professor Macedo pretendia
expor essa contribuição ao pensamento sobre a cidade. Ele costuma dizer que primeiro
esboçou a abordagem dos Corredores e Subáreas no projeto para Barão Geraldo, em
Campinas, desenvolvido na década de 1990 em convênio entre a PUC-Campinas, a Unicamp
e a Prefeitura de Campinas. A área foi objeto dos estúdios de urbanismo no Curso de
Graduação da PUC-Campinas, enfrentada junto aos estudantes com a colaboração de
diversos colegas docentes. Portanto, na ocasião do desenvolvimento do plano para Barão
Geraldo, já havia certo conhecimento acumulado sobre a área devido aos inúmeros
trabalhos de campo. Foi durante este projeto que uma visão acerca da forma urbana,
subdividida por partes, tomou corpo: o percurso do projeto de Barão Geraldo traçou
também o método de Corredores e Subáreas.

Houve um tempo em que o professor Macedo questionava se o procedimento de análise


urbana por Corredores e Subáreas teria o estatuto de “método”. Pretendo, com as devidas
desculpas por adentrar um assunto que mereceria julgamento mais capacitado, me
aventurar na questão. A etimologia informa que método é o caminho que leva a
determinado fim. Relacionam-se, então, caminho e fim: o primeiro é a sequência
concatenada de procedimentos, ações, providências; o segundo coloca-se como um estado
ou condição a atingir que, vislumbrada de antemão, interage com a sucessão e
implementação de tais procedimentos.
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Podemos indagar inicialmente sobre a finalidade da abordagem por Corredores e Subáreas.


O que se pretende obter, ou como a análise por Corredores e Subáreas nos ajuda a
compreender a cidade?

Interações entre elementos naturais, construídos, atividades e pessoas constituem a


cidade, havendo de se considerar certo nível de reciprocidade entre o espaço construído e
as forças que o promovem, habitam, comercializam, transformam. Os limiares desta teia
dinâmica (de eventos, forças, fatos urbanos, pessoas, tempo) são impossíveis de definir. A
aplicação dos procedimentos de leitura através de Corredores e Subáreas permite delimitar
áreas ou setores de estudo e compreendê-los segundo algumas relações funcionais. O
método proposto pelo Professor Macedo é, de certa maneira, um ponto de partida a-
escalar, com base na função relativa dos elementos que interagem na cidade, para pensar
limites práticos de análise e projeto. A conveniência está em suplantar divisões
administrativas, métricas ou históricas e buscar uma constituição própria e orgânica dos
tecidos, segundo a qual as partes se diferenciam conforme sua participação no conjunto,
através da compreensão da organização dos vetores de movimentos e fluxos, e das áreas
que se disponibilizam em seus interstícios.

A denominação de cada parte analisada (Corredores, Subáreas e demais termos) é


entendida como um conceito, enquanto enunciado complexo, passível de definição e capaz
de ser manobrado de modo compacto pelo pensamento e pelo projeto.

Em Corredores e Subáreas, o papel relativo das partes do tecido urbano não é definido por
um aspecto isolado – o uso, o traçado, o arcabouço físico. Quanto aos Corredores, pesa-
lhes, em grande medida, um trajeto-base, elemento vital no espaço urbano que pode vir a
ser ou não uma via de fluxo. Contudo, este eixo-trajeto deve ser compreendido apenas
quando associado aos atributos que o constituem. A compreensão plena do conceito de
Corredor tem nuances: i) como parte de uma rede: que pontos conecta, que acessos e
fluxos permitem, que infraestruturas/elementos naturais carrega consigo, que tipo de
ligação e de barreira proporciona; ii) enquanto meio: como se comporta, como se utiliza,
quais suas oscilações; iii) enquanto espaço: como se caracteriza, que elementos o
compõem - calhas, infraestruturas, espaços livres, lotes e edifícios lindeiros, frentes
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públicas. O Corredor, assim compreendido, jamais se restringe à rua, é bem mais um


subsistema complexo, cuja existência é condicionada pelo todo: pelo espaço que ocupa,
por sua extensão, por sua condição de passagem e por tudo que agrega. O conceito de
Corredor fundamenta-se na própria ideia de que existem pontos longínquos, ao longo ou
ao fim de uma extensão, que se pretende conectar, alimentar, atravessar ou atingir.

As regiões que se formam entre os Corredores são as Subáreas. Estas são acessadas,
alimentadas e drenadas pelos Corredores, estabelecendo com eles uma relação
indissociável. Mas sua condição de não-passagem determina outros ritmos e vocações. O
entendimento da Subárea como um ente é um interessante recurso para pensar a
qualidade de vida nestas porções do território e para sugerir propostas de projetos urbanos
que busquem sua melhoria, manutenção ou transformação.

Assim, Corredores e Subáreas são subsistemas que ocorrem nas cidades e cuja existência
convém reconhecer, pois os mesmos podem ser reforçados ou desmantelados pela ação
de planejamento. Identificar estes elementos no tecido urbano ou, conforme as palavras
do professor, compreender a cidade por partes para a ação do projeto, é a finalidade deste
método.

Ainda na verificação do estatuto de método, o segundo ponto a responder é se os


procedimentos de análise através dos Corredores e Subáreas são claros e mesuráveis, o
que levaria a uma ampla aplicação de seus princípios. Com esta preocupação, o professor
Macedo desenvolveu pesquisas ao longo dos anos com estudantes de Graduação e Pós-
Graduação. Além de aprimorar a definição teórica dos elementos, percebe-se nas
pesquisas do Grupo de Pesquisa Arquitetura da Cidade (GPAC) a tentativa recorrente de
identificar e hierarquizar os tipos de Corredor (que atravessam, que distribuem) e as
Subáreas e de compreendê-los graficamente e quantitativamente, estabelecendo um
sistema de representações. Como bem explica o professor, o papel dos Corredores e
Subáreas altera-se em função do recorte e da escala enfrentados, de modo que o
procedimento permanece aberto a adequações para cada caso em que for aplicado, e
sujeito a interpretações e variações no tempo. Ao longo dos anos, o processo de leitura
urbana foi aplicado a diferentes áreas nos ateliês de Urbanismo na Graduação da
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Universidade São Judas Tadeu, tornando-se uma prática constante nos estudos realizados
nesta disciplina. Também na Pós-Graduação e em pesquisas de Iniciação Científica foram
enfrentadas diferentes áreas com o objetivo de verificar sua validação.

Além do entendimento e relação de partes da cidade, conforme o procedimento de


Corredores e Subáreas, outros elementos investigados pelo professor Macedo contribuem
para a leitura das áreas urbanas e estabelecem relação direta com o Desenho Urbano. São
eles: os traçados e malhas que pautam o desenvolvimento dos tecidos e o entendimento
da quadra enquanto unidade fundamental na escala do desenho urbano. O professor
dedica especial atenção ao aprofundamento das retículas ordenadoras dos tecidos urbanos
e às tipologias de quadras, temas abordados nos capítulos finais deste livro.

Assim, com empenho no campo da pesquisa e sempre visando uma aplicação prática em
projeto, o professor Adilson Macedo publica suas considerações sobre o método dos
Corredores e Subáreas e outros ensinamentos neste livro, e nos deixa sua valiosa
contribuição para o tema do projeto urbano e da leitura da cidade.

Maria Isabel Imbronito


Janeiro 2021
CORREDORES E SUBÁREAS - 19

INTRODUÇÃO

Do cotidiano de viver e observar como o espaço físico se comporta face ao modo como é
utilizado; de um procedimento sem apego a cientificidade no sentido de buscar apoio em
diversos autores; passamos a considerar como as vias que atravessam trechos grandes da
cidade delimitam setores, e, quando se somam a elas as faixas lindeiras de lotes, o sistema
como um todo constituirá um corredor. Corredores que se interceptam de uma maneira
orgânica, como células deixando um miolo, núcleo este que chamamos de subárea. Este
entendimento será ampliado e mais bem descrito no correr do texto como um processo
caracterizado por deduções sucessivas; ou, uma atitude investigativa aplicada sobre as vias,
quadras, lotes e edifícios - VQLE - que constituem os elementos primordiais do tecido
urbano.
Adotamos um setor para estudo localizado no distrito da Mooca, São Paulo; vizinho ao
Centro pelo quadrante Leste, típico das transformações que o tecido da cidade vem
sofrendo. E, para associar argumentos de reforço às nossas ideias sobre a forma urbana,
recorremos a informações bibliográficas no campo da morfologia e do projeto urbano.
Agora exposto de maneira sucinta, este será o assunto central da nossa investigação, na
procura de elucidar quais são os procedimentos para identificar um setor, caracterizar os
corredores, as subáreas e os elementos básicos que desenham a forma da cidade. Trata-se
igualmente da persistência histórica do traçado ortogonal das quadras e a sua relação com
a forma orgânica da cidade que cresce enfrentando declives e aclives, sujeita ao
parcelamento do solo e à vontade ou às possibilidades das pessoas, quanto a seus
interesses de proprietários da terra. A descoberta desse procedimento de análise da forma
nos motivou a tratar do ideário do espaço, da mobilidade e dos tipos construídos da cidade
como elementos físicos e daí vem uma aproximação com o campo da morfologia urbana.
Vivemos em um mundo onde o conhecimento tende a ser transdisciplinar, e residimos em
um país de desigualdades sociais, fato que se reflete na qualidade dos espaços urbanos.
Por justas razões se explica porque tantos colegas sensíveis a tais questões, se dedicam à
disciplina de planejamento urbano e regional, que tem a multidisciplinaridade como
característica fundamental, onde o arquiteto pode explorar sua sensibilidade e motivação
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quanto à questão socioeconômica, e optar por raciocínio transdisciplinar. Tendência que


destacamos por estar relacionada com as especificidades do vocabulário técnico não só do
arquiteto, mas, de profissionais de outras áreas de conhecimento afins com o urbanismo.
Desta maneira, decidimos iniciar com ponderações sobre as palavras ou expressões
utilizadas no dia a dia, que assumem um sentido próprio dependendo do campo disciplinar,
em particular neste trabalho restrito a configuração física dos espaços.
Sobre o estudo da cidade, existem mal-entendidos quanto a semântica de algumas
palavras, em decorrência de significados que elas têm para diferentes áreas de pesquisa.
Modo geral o interesse vai para as maneiras de utilizar os espaços, os acontecimentos que
ali se realizam, sua história e, não muito para o projeto da cidade como uma construção.
Pode- se dizer que determinado espaço foi projetado a partir de um programa prevendo
certa gama de atividades e quando construído passa a atender tais requisitos de maneira
satisfatória ou não. Quando inaugurado, o espaço poderá ser considerado um ‘lugar’
interessante, e isto se deve à maneira pela qual as pessoas o ocuparam e passaram a
interagir satisfatoriamente com ele. Neste sentido, o ‘espaço para as pessoas’ deve ser
estudado por determinado conjunto de disciplinas. Existem no Brasil espaços abaixo do
nível mínimo de habitabilidade que são chamados de ‘lugares’ devido a suas relações de
sociabilidade, por sua capacidade de coesão social. São estudados por determinado grupo
de disciplinas devido a emergência para a obtenção de um abrigo melhor, e se vislumbra
que estes espaços um dia, possam se desenvolver realmente como lugares de boa
qualidade ambiental.
Estas são nossas razões como arquiteto para investigar a cidade pelos seus elementos
físicos e deixar como pano de fundo as disciplinas que cercam os acontecimentos públicos,
o contexto cultural, socioeconômico e político. Daí o cuidado que passamos ter com o
emprego das palavras. Em razão dos significados a elas atribuídos - capítulo 1 - começamos
por elucidar sua semântica de uso corrente no estudo do espaço físico, entendido como o
suporte das atividades humanas. Em seguida referimo-nos a outras palavras, usuais no
universo interdisciplinar do projeto urbano, mas, cuidando quanto a possíveis
incompreensões ao serem aplicadas no estudo do espaço em si.
CORREDORES E SUBÁREAS - 21

O primeiro capítulo se inicia pelas palavras frequentes em nosso trabalho diário e utilizadas
para expressar os elementos componentes da forma urbana; por exemplo: corredor,
subárea, barreira, área protegida, além de outros familiares no campo do urbanismo. A
elucidação de algumas palavras ou expressões, por exemplo, ‘área protegida’, acontecerá
conforme o texto evoluir.
O capítulo 2 - conceito de corredor e de subárea - trata do estudo da forma da cidade pelo
referencial teórico e a experiência de observar os elementos urbanos: via-V; quadra-Q;
lote-L e edifício-E, como espaço físico. Aos elementos VQLE se acrescentam dois
componentes, o corredor - C e a subárea - S, cuja configuração física decorre dos quatro
outros.
No capítulo 3 são tratados os conceitos de setor e subsetor, como eles são considerados
neste modo proposto de estudar a cidade. Sua importância se refere à divisão que fazemos
da cidade por partes, por princípio não tendo que coincidir com os limites oficiais,
fornecidos pelo órgão de planejamento urbano municipal.
O capítulo 4 faz referência às vias locais, às quadras, aos lotes e edifícios. O conceito
adotado sobre os elementos urbanos é aplicado ao espaço do distrito da Mooca, um tecido
tradicional da cidade. A investigação se fez com apoio em três subsetores, selecionados
para explorar as características de cada elemento e nos levou a verificação que as quadras
e os lotes dos subsetores da malha tradicional são bastante flexíveis quanto a possibilidades
de rearranjo dos lotes e a substituição das edificações neles existentes por outras
contemporâneas, seja por intervenções parciais ou pela alteração de até uma quadra
inteira, no caso dos condomínios fechados.
Nos quatro capítulos iniciais se procura estabelecer os fundamentos da análise da cidade
através dos corredores e subáreas, aplicado a um setor de tecido tradicional, o distrito da
Mooca. Em paralelo se experimentou o procedimento ao selecionar temas para o trabalho
dos alunos, compatíveis com os pressupostos da pesquisa em andamento e no contexto do
programa de iniciação científica e de mestrado da Universidade São Judas Tadeu. Isto nos
deu a chance de estudar partes do tecido da cidade, junto com os alunos e colegas
parceiros, no desenvolvimento da disciplina de graduação. São oportunidades que vimos
tendo para conhecer a cidade e observar o tipo de quadra que chamamos de tradicional,
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em formato de polígono, com maior frequência retangulares e área em torno de um


hectare.
No capítulo 5, comentamos projetos que são referência, onde aparece material relativo ao
formato das quadras retangulares e sua história.
No capítulo 6, repassamos conceitos relativos ao Urbanismo Moderno. Os grandes
conjuntos habitacionais e o seu declínio. Continuamos no capítulo 6, explorando a
persistência da retícula ortogonal, em tecidos decorrentes de projetos cuja história é
recente, onde as preocupações com o patrimônio, o ambiente e a sustentabilidade se
colocam no primeiro lugar em discussões com a comunidade.
No capítulo 7 retornamos ao Brasil, São Paulo, à retícula ortogonal e a nossa história voltada
para o tema da quadra tradicional. Comentamos sobre a forma de algumas cidades, como
preparo para se desenvolver um estudo de caso sobre a quadra tradicional.
No capítulo 8, desenvolvemos abordagem pela leitura das vias que atravessam e das que
distribuem, sobre as quadras do Bairro Jardim, em Santo André, São Paulo. Mostrar como
acontece no tempo a ocupação de uma quadra típica; a lógica da transformação gradual de
uma quadra tradicional.
Na Conclusão reforçamos a importância da quadra nos traçados urbanos, como se faz o
apoio ao desenho de trechos da cidade, mesmo onde as partes planas são menores. Elas
se ajustam às pequenas declividades e a trechos íngremes, por partes, até onde é ainda
possível lotear. Este tipo de traçado atende a um leque muito grande de tendências
conceituais sobre o projeto da cidade, suas quadras, a dimensão dos lotes e suas
edificações; a complexidade volumétrica que espontaneamente emerge. Pela escrita
procuramos mostrar a vontade de levar o trabalho com a forma urbana a espaços cada vez
menores, desenvolver melhor o conceito de áreas protegidas, poder colaborar com
projetos urbanos participativos para áreas delimitadas em qualquer escala.
Na redação não utilizamos notas de rodapé ou fim. A bibliografia segue as normas e está
reunida ao final do texto. As figuras estão numeradas por um sistema binário que indica o
capítulo e o número da figura, por exemplo: 5-12, quer dizer capítulo 5, figura 12. Às duas
pequenas tabelas que aparecem no texto foram formatadas como figuras e assim
numeradas.
CORREDORES E SUBÁREAS - 23

CAPÍTULO 1 - Espaço físico, o suporte das atividades humanas

Refletir sobre o espaço natural e o transformado, o chão onde se vive e se convive no campo
e na cidade, onde se constroem os abrigos para atividades das pessoas e se erguem
monumentos, se faz necessário para explicar o procedimento de análise através dos
corredores e subáreas. Desenvolvem-se conceitos e a verificação deles amplia o
entendimento sobre o espaço físico, gera um referencial de tipos para o projeto urbano.
Na cidade existente acontece uma adição ou substituição de tipos construídos, mas, por
princípio se considera para estudo o espaço físico encontrado hoje. Eles resultaram da
paisagem natural, rural e urbana modificadas pela ação humana no decorrer do tempo. Nas
cidades se encontram incontáveis tipos de espaços estabelecidos para atender as
necessidades das pessoas, livres ou construídos, subdivididos e organizados por agentes
controladores como o testemunho de programas urbanísticos e arquitetônicos
representativos da história de cada lugar. A questão do controle influi nas opções para
novas demandas por espaços no tempo, sendo uma noção importante, bem definida pelo
arquiteto-professor N. J. Habraken, no livro The structure of the ordinary, publicado no ano
de 1998. São suas estas palavras traduzidas do idioma inglês:

Anteriormente, ao observar as configurações ativas e os níveis definidos


por elas, examinamos o comportamento das configurações sob controle
dos agentes, em vez de estudá-las diretamente. Ao observar o controle do
espaço, tentaremos limitar nossa observação a partes materiais que
representam os agentes que atuam sobre elas. O território será, portanto,
reconhecido como um espaço no qual somente determinados itens
podem entrar. A capacidade de mover coisas materiais através das
fronteiras é o teste final do controle territorial (HABRAKEN, 2000, p.127).

No texto do professor importa a ideia de considerar ‘as partes materiais que representam
os agentes que agem sobre elas’. O que vem de encontro ao estudo do espaço por partes
como fazemos, através do conhecimento do arcabouço físico de setores da cidade,
esperando assim contribuir para o elenco da multidisciplinaridade formada em conjunto
com os demais saberes interessados nos estudos de Urbanismo.
Nosso chão, natural ou urbanizado, o território, o espaço físico que tentamos compreender
se encontra no município de São Paulo e na sua região metropolitana. Aspecto que interage
24

com a compreensão dos tecidos urbanos e a tipologia, sendo referência a linha de pesquisa
inaugurada pelo geógrafo-professor Michael R.G. Conzen, que nos anos 1930 iniciou o
estudo de parcelas selecionadas do tecido urbano da cidade de Alnwick, na Inglaterra.
Desde então se formou um grupo de profissionais ingleses e alemães precursores do que
evoluiu sob o título de morfologia urbana. Conzen é a nossa referência histórica e hoje a
multidisciplinaridade aponta para outros campos do conhecimento a que também tratam
das cidades além da geografia e a história; como a cartografia, sociologia, economia,
política, engenharia, arqueologia, estatística, biologia, ecologia e psicologia, entre outras.
Elas cumprem os seus propósitos e ampliam os estudos urbanos materializados pela
arquitetura como a arte de construir, que gera a espacialidade para os universos multi e
transdisciplinar (CONZEN, 1969).
O pensar e o fazer em arquitetura são aqui direcionados para o estudo dos tipos de
elementos urbanos encontrados em contextos diversos. Destarte, junto às outras
disciplinas a contribuição da Arquitetura da Cidade está em estudar os tipos físicos de apoio
aos demais conhecimentos que completam o painel da dinâmica social. Segundo esta ótica,
a nossa investigação se utilizou desde o início de um repertório livre para nominar os
vocábulos empregados, mas, ao redigir se observou que nos confundimos com seus
significados e a força com que a semântica das palavras varia entre as áreas de
conhecimento. Assim, veio o interesse de especular sobre qual seria um vocabulário
adequado ao estudo do espaço através de sua forma física, decorrente de projetos
desenhados no passado e aqueles do tempo presente. Foram selecionadas algumas
palavras e se procurou o melhor sentido delas, o que melhor se adequasse ao estudo do
espaço físico e outras que poderiam ser evitadas, devido a possível má compreensão
quanto ao seu significado. Desta forma são apresentadas as palavras que se tornaram
usuais em nossos textos e algumas outras que procuramos evitar, apesar de serem
sugestivas e frequentes sobre questões afeitas ao urbanismo.
Para validar o significado de palavras ou expressões aqui adotadas apresentamos as que na
linguagem corrente se identificam com a análise da configuração física da cidade. Iniciamos
pelas já citadas - parágrafos acima - e se espera que as explicações facilitem o leitor, em
CORREDORES E SUBÁREAS - 25

particular quanto aos conceitos de via, corredor, subárea e suporte físico, no modo que
empregamos os vocábulos.

Palavras associadas a configuração física dos elementos urbanos

Inicialmente se definem as palavras associadas a conceitos que serão explorados no livro.


Espaço físico: Entende-se o espaço físico como a superfície da Terra recortada pelos fluxos
de pessoas e cargas que se acomodam ou perpassam os obstáculos da paisagem natural, o
relevo e os cursos de água. O espaço natural se transforma em decorrência do movimento
do planeta Terra e da ação humana, nosso assunto específico de interesse. Considera-se o
espaço físico natural uma dada superfície de cobertura das diferentes camadas de subsolo,
de onde resulta um relevo aproximadamente plano ou acidentado: planície, aclive, declive,
encosta, várzea e curso de água. Configuração de hoje que resultou de modificações
graduais desde muitos séculos.
O estudo do espaço físico natural ou modificado pelas pessoas é assunto do campo da
geografia física, segue para a geografia humana e avança para os estudos de planejamento
e arquitetura da paisagem e um rol de outros saberes científicos. A base de nosso trabalho
é o espaço natural alterado pelos humanos, como na geografia física, com atenção aos tipos
de segmentação por partes e os tipos de arranjo dos espaços e maneiras de construir
introduzidas pelas pessoas. Segmentações devidas ao ajuste às condições naturais, a ação
humana, de interesses ou de conquistas à força. Das reconfigurações decorrem os
elementos primordiais para a maneira de analisar que utilizamos.
Estrutura: O vocábulo ‘estrutura’ é aplicado para a forma física do tecido urbano, sistema
de transportes e redes de infraestrutura. Para buscar outros significados se destaca o livro
‘Usos e sentidos do termo estrutura’, onde o sociólogo - professor Roger Bastide comenta
o emprego do vocábulo em diversas disciplinas e suas variações dentro de um mesmo
grupo disciplinar. O professor considera que:

[...] nenhuma ciência conseguiu realizar progressos substanciais sem


dispor de um vocabulário técnico perfeito. E é a própria história das
diversas ciências que revela - como diz Guilbaud a respeito das
matemáticas – a passagem progressiva do uso dos termos de seu sentido
corrente ao jargão científico (BASTIDE, 1971, p. 109).
26

A expressão ‘estrutura urbana’ procuramos usar pouco em nossos escritos, pois é natural
entendê-la no sentido da tensão social, política e econômica relativa à ocupação do espaço
pelas pessoas e nosso propósito se prende às características em si dos espaços.
Via: As vias estão entre os principais elementos que contribuem para a análise do espaço
físico, rural e urbano. Sempre presentes e imbricadas aos elementos da paisagem são as
faixas por onde as pessoas e as cargas circulam na cidade e no campo. Para efeito de análise
da forma da cidade através dos corredores e subáreas e para sua aplicação nos projetos
urbanos classificamos as vias em três tipos: vias que atravessam, vias que distribuem e vias
locais. As vias que atravessam são as que perfazem grandes trajetos como as rodovias e as
vias que cortam setores da cidade. Elas têm características próprias em relação a
quantidade de faixas de rolamento (largura, tráfego de veículos, pavimentação), canteiros,
iluminação, vegetação, sinalização e tipos de veículos que por elas circulam; para
construção requerem uma engenharia especializada. As vias que distribuem como o nome
sugere, fazem as ligações dentro de um setor; modo geral ligam duas vias que atravessam
e quando se tratar de um setor pequeno, nesta escala poderão interagir como se fossem
vias que atravessam, para efeito de estudo. As vias locais saem das que distribuem e levam
aos pontos de interesse da vizinhança. Todas elas têm fortes requisitos técnicos e a
interdisciplinaridade de seus traçados afeta em especial a arquitetura da cidade e a
engenharia, resultantes das etapas anteriores dos trabalhos relativos a planejamento,
plano e projeto urbano.
Quadra: No dicionário Houaiss há diversos significados para a palavra quadra: ‘estrofe que
contém quatro versos’; ‘uma quadra em jogos de cartas’, ‘distância da calçada entre duas
esquinas’, ‘quadrado’ e outros. Expressões que levam a pensar em uma forma ortogonal,
sem citar a quadra no contexto da malha urbana. Abre-se assim a liberdade para nossa
definição: ‘a quadra é uma fração do tecido urbano ladeada por vias compondo um
polígono regular ou não, com sua forma ajustada ao relevo do terreno onde esteja assente’.
O perímetro da quadra é definido pelo alinhamento dos lotes que faceiam a calçada e por
onde normalmente se dá o acesso a ele. O tamanho das quadras varia conforme o
propósito do loteador - responsável pelo primeiro traçado - quanto à dimensão dos lotes,
em atenção a propósitos de comercialização ou institucionais de interesse público ou
CORREDORES E SUBÁREAS - 27

privado, respeitada a legislação vigente. A quadra pode ser caracterizada por um único lote
voltado para as calçadas que fazem seu entorno, destinado a uma edificação especial
pública, privada ou ser toda ela uma praça pública.
Lote: O lote como fração de um processo de loteamento responde ao objetivo do primeiro
loteador da quadra. Define-se o pequeno lote idealizado em geral para uso residencial e os
lotes maiores para instituições, indústrias e diferentes formas de uso misto ou não. Em São
Paulo, como apoio à moradia operária próximo a plantas industriais, se costumava oferecer
lotes de até três e meio por vinte metros como modulação para casas em fileira e lotes
maiores de esquina. Também usual e mais razoável eram os lotes de dez metros de largura,
com a alternativa de serem repartidos em dois, chegando às construções no alinhamento
frontal do lote e mais tarde, por lei, haver o recuo de cinco metros de frente. Abriu-se uma
oportunidade para haver um jardim na frente das casas dos bairros residenciais, mas, isto
levou estes espaços a serem o lugar para o carro e de coberturas leves, contrárias à
qualidade ambiental do cômodo de frente, modo geral a sala de estar.
Edifício: os edifícios são construções implantadas em lotes da cidade e respondem a
programas arquitetônicos cuja demanda se originou do interesse de pessoas. Pode ser
representativo de um indivíduo, uma família, uma comunidade ou outro grupo social. Isto
vem seguindo uma longa linha de tempo representada pela história das nações. Os edifícios
representam a sociedade, os costumes destes tempos que ficaram para trás e do que
acontece hoje. No Brasil esta história é curta, quinhentos anos apenas, contados a partir
dos colonizadores portugueses - sem considerar a cultura indígena - em uma experiência
que aos poucos adquiriu um sentido local. Construíram-se edifícios e os programas para
eles se diversificaram, participam de espaços urbanos e os sítios de alguns deles, hoje em
dia são anotados como patrimônio histórico.
O processo para edificar as cidades e os edifícios passaram a ter regulamentos oficiais e
este é um belo tema da história. Importante, do qual vamos utilizar apenas o que está
presente ou muito evidente na configuração dos trechos da cidade que estudamos. São
diretrizes para recuos, gabaritos, coeficiente de aproveitamento do lote e taxa de ocupação
do terreno, tendo por referência o município de São Paulo.
28

Corredor: O deslocamento de pedestres e veículos acontece em espaços ou faixas que são


as vias, se somando quando existem às faixas de domínio das linhas de infraestrutura. No
tecido da cidade estas faixas de espaço público associadas às vias que atravessam ou vias
que distribuem ocupam uma fração significativa do todo. No corredor, os lotes das quadras
voltados para a via que o identifica em geral se diferenciam, pelo uso, ocupação e valor dos
imóveis, daqueles voltados para a via de trás. Em nosso trabalho se considera que a via e o
eventual caminho paralelo de infraestrutura mais as faixas laterais de lotes formam um
corredor.
Nos espaços abertos, nas reservas verdes e de ocupação rural consideramos que os cursos
de água, linhas de eletrificadas, oleodutos e as estradas formam corredores cuja largura se
define em função das faixas de domínio estabelecidas para cada uma delas. Segundo o
DNIT, Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes:

define-se como faixa de domínio a base física sobre a qual assenta uma
rodovia, constituída pelas pistas de rolamento, canteiros, obras-de-arte,
acostamentos, sinalização e faixa lateral de segurança, até o alinhamento
das cercas que separam a estrada dos imóveis marginais (DNIT, 2009, p.
11).

Fora do perímetro de um aglomerado urbano considera-se o corredor apenas pela faixa de


domínio, mantida a hierarquia oficial de estradas principais e vicinais.
Subárea: Os corredores se interceptam e definem uma linha poligonal acompanhando os
fundos dos lotes. Esta linha forma o perímetro de um fragmento ou miolo do tecido urbano,
formado pelas vias, quadras, lotes e edificações situadas dentro deste perímetro. A fração
da cidade assim identificada se chama de subárea. Analisar os tecidos urbanos através dos
corredores e subáreas nos levou a desenvolver o conceito como um procedimento de
trabalho aplicado, o cerne da análise da forma urbana como aqui se propõe. Os conceitos
e procedimentos para a aplicação se faz de acordo com os elementos básicos do
parcelamento: via, quadra, lote e edifício.
Setor: Seja devido aos acidentes do espaço natural (cursos de água, relevo, reservas verdes)
ou dos caminhos abertos pelas pessoas, o espaço físico se apresenta entrecortado em
inúmeras partes. Nas cidades se utilizam maior número de subdivisões devido a
necessidade de ocupar frações menores, mescladas por dois tipos de domínio, o público e
CORREDORES E SUBÁREAS - 29

o privado. Na análise que fazemos do espaço físico se utilizam duas formas para se delimitar
um setor: pelo eixo das vias de contorno (sempre que existam) ou pelo alinhamento das
quadras em ambos os lados, deixando a via em separado. Considerar o sistema viário em
separado facilita o cálculo métrico da área das vias no setor e na cidade e permite aferir a
metragem efetiva das vias do setor em apreço. Facilita também para se aferir o quantitativo
de espaços públicos e privados dentro do quadro geral da distribuição de áreas por setor.
Na determinação dos setores importa se entender as vias que atravessam e as vias que
distribuem como o principal suporte da divisão da cidade em partes. Suporte no sentido
de organizar os corredores e subáreas até as menores partes. Suporte é nossa referência
para a explicação do traçado da cidade tradicional (São Paulo) por uma trama que gera os
corredores que atravessam e distribuem. As vias e mesmo os corredores a elas associados
criam um sistema de suportes. A ideia de suporte vem do professor Habraken que
recomenda aos projetistas de grandes conjuntos urbanos:

Ao projetar estruturas de suporte em um determinado padrão, ele pode


organizar a cidade como uma rede de planos de construção relacionados
entre si e estabelecer escala e extensão, determinar espaços fechados,
delinear áreas verdes, contextualizar edifícios independentes e chegar a
conclusões sobre principais linhas de desenvolvimento (HABRAKEN, 2011,
p.26).

O professor cita ‘linhas de desenvolvimento’ como o alinhamento das edificações assentes


em vias públicas ou caminhos principais para pedestres, de onde tiramos a referência para
considerar os corredores que atravessam e distribuem definidos como ‘suportes’ formando
a trama delimitadora dos setores na cidade. Outro aspecto pertinente é visualizar nos
setores a faixa lindeira às vias que atravessam e distribuem cujos lotes tendem a ter maior
valor devido seu potencial para oferecer atividades de uso misto. Por outro lado, seguindo
a ideia das faixas como suporte de características da urbanização, inspirado em Habraken,
são importantes os espaços controlados pelas diretrizes para o recuo de frente e de fundo
dos prédios, obrigatória por força das diretrizes urbanísticas quando estabelecidas pela
legislação municipal.
Área protegida: É uma expressão usada para identificar um setor que contenha uma ou
mais subáreas e tenha potencial para se desenvolver através de um projeto urbano.
Reportemo-nos às faixas formadas pelos corredores e neles o sistema de vias, depois a faixa
30

lindeira de lotes voltados para a via principal, a que define o corredor. Em seguida se
considera a faixa de lotes mais interna voltados para as vias que formam, ou têm potencial
para formar um anel de circulação interno. Ela tem a característica de ser uma via
aproximadamente paralela a via do corredor que forma um anel interno responsável pela
distribuição do fluxo motorizado para as vias locais. Entre a via do corredor e a distribuidora
interna existem as quadras que acompanham o anel, com a peculiaridade do renque de
lotes com frente para o corredor ter maior visibilidade pelos passantes, maior valorização
comercial e por isso procurados para atividades mistas em oposição ao outro voltado para
o anel interno onde o uso misto se houver, será mais rarefeito. A faixa de lotes internos em
setores centrais da cidade, pode ser atrativa tanto para comércio, serviços, residências ou
institucionais de porte menor que os do corredor e às vezes servir como entrada de serviço
para estacionamento dos estabelecimentos de grande porte instalados em um lote com
duas frentes (a do corredor e a da via traseira). Pode-se dizer que o anel de quadras
perimetrais do setor forma uma faixa de transição - buffer zone - protegendo o miolo, em
geral de predominância residencial: a ‘ilha de tranquilidade’ dita por alguns urbanistas. Este
tópico se relaciona ao potencial para desenvolvimento de lugares urbanos significativos e
será desenvolvido mais adiante.
Divisa: Disputas entre as nações, grupos sociais e indivíduos por territórios conduziram ao
estabelecimento de fronteiras separando os interesses dos agrupamentos humanos, ela
pode ser um rio ou outro elemento natural; pode ser um muro separando partes de um
país ou um país de outro e pode ser uma cerca entre dois lotes de moradia, em uma
tranquila área de vizinhança. Modo geral esta linha, a divisa. Decorre de tratados entre
nações e estados, nos municípios separa rural e urbano e nestes domínios a divisa é uma
linha que define espaços físicos com escrituras diferentes. A divisão entre propriedades é
descrita textualmente com base em levantamento planialtimétrico, e comprovada pela
escritura pública do lote que descreve as interfaces das parcelas contíguas. Para o
desdobramento dos estudos nos campos do urbanismo e da arquitetura se faz importante
o conceito de divisa como a linha que separa fisicamente dois espaços; elas demarcam
propriedades diferentes.
CORREDORES E SUBÁREAS - 31

No estudo da forma urbana a linha de divisa entre lotes, a divisa do lote com a via pública
e a divisa de fundo, são constantes que se manifestam para formar a quadra. Por outro
lado, existem linhas decorrentes de diretrizes urbanísticas devidas ao plano da cidade que
funcionam como divisas para novos projetos, como é o caso da obrigatoriedade de haver
cinco metros de recuo frontal para as construções em quase toda a cidade de São Paulo.
Ela define uma faixa de transição público-privado ou vice-versa assente em terreno privado
e influi na configuração da cidade. É o tipo mais elementar de uma divisa que não concerne
a propriedade do solo. Em São Paulo existem outras regulações como esta que não são
divisas de propriedades, mas regulam o projeto urbano.
Tipo: No estudo da cidade ao utilizar conceitos de análise da forma urbana, se mantém
como o objeto principal a configuração que o espaço adquire em cada momento da
história. Isto permite a identificação dos tipos físicos que pontuam fases possíveis de
resgatar até hoje; para o estudo dos elementos urbanos, dos setores da cidade e seus
edifícios. Assim, será possível gerar subsídios programáticos para os projetos urbanos e de
arquitetura contemporânea com respeito ao tecido tradicional. O estudo de tipos se detém
na configuração da cidade atual, mas, deve passar por aqueles elementos urbanos que
resistiram ao tempo e são referência para as proposições do urbanismo e da arquitetura
contemporânea. Segundo o arquiteto-professor Aldo Rossi, elementos urbanos pontuais
que deram origem a centralidades, hoje os chamamos de elementos primários; são os
monumentos ou pequenas partes do tecido com forte caráter de absorção do interesse da
população. Uma outra categoria são os trechos urbanizados, em geral áreas residenciais
configuradas pela repetição de tipos elementares que formam um tecido, ROSSI, 1966. Se
considerarmos a conceituação de Rossi como a visão de um intelectual europeu emitida há
cerca de cinquenta anos atrás e a compararmos com o que a arquiteta-professora Brenda
C. Scheer escreve no livro The evolution of urban form: typology for planners and architects,
podemos concluir pela atualidade de Rossi.

Esses europeus viam o projeto tipológico como um método para acabar


com a individualidade excessiva que perturba a continuidade das cidades.
Eles também o viam como um método de alinhar a arquitetura
contemporânea à natureza específica e única de diferentes culturas, que
naturalmente desenvolveram diferentes formas e tipos urbanos ao longo
do tempo (SCHEER, 2016, p.49).
32

A professora complementa, postulando sobre a atualidade quanto a explorar o critério


tipológico em projetos, recomendado pelos colegas europeus, como uma crítica direta ao
Moderno, o qual se transformou em uma expressão internacional estereotipada. Isto é
bem colocado e se pode dizer que a valorização dos tecidos tradicionais ainda passeia pelo
pensamento de muitos arquitetos, particularmente os que tratam de projetos urbanos
como urban design.
Substituição: É a ação de substituir; trocar; colocar algo ou alguém no lugar de outra coisa
ou pessoa, segundo o dicionário Houaiss. Em matemática se aplica quando da troca de
variáveis em uma função de variáveis múltiplas. Em arquitetura e urbanismo a ação de
substituir se relaciona a mudança das características de um espaço para outro como
consequência das necessidades das pessoas e consequente alteração do espaço físico e de
sua configuração volumétrica. Isto acontece pela ação de substituir por completo e com
frequência acontece pela demolição do imóvel pré-existente (replacement); anexar a
construção existente uma nova parte justaposta ou separada da parte principal ou
modificar as características de um imóvel sem alterar seu volume anterior (fazer uma
reforma como é usual em pequenas construções). No espaço físico da cidade a substituição
se refere a abertura de vias, alargamentos, prover espaços para o transporte público ou o
redesenho para acomodar ciclovias ou melhorar os espaços para pedestres e a substituição
de elementos da infraestrutura urbana ou predial por outra atualizada. Devido a este
conteúdo não utilizamos como alternativa para ‘substituição’ a palavra ‘transformação’,
pois isto pode confundir conceitos circunstanciados ao espaço físico, a outros de natureza
interdisciplinar, por exemplo, das ciências sociais cuja ênfase se direciona aos modos das
pessoas se apropriarem dos espaços. A realidade, o caminhar da vida levam ao processo de
retroalimentação efetivado pelo ato de idealizar espaços, construir, ocupar, estabelecer
necessidades e substituí-los.
Configuração física: Entende-se como a forma pela qual o espaço se apresenta hoje. Em
especial comparado a datas do passado, todas elas de interesse para a pesquisa. A
configuração de hoje resulta das mutações que ocorreram desde outras épocas, devido às
razões explicadas por disciplinas como a geografia (física e social), história, sociologia,
economia e outras.
CORREDORES E SUBÁREAS - 33

O espaço se modifica em tempo mais curto no caso de seu proprietário decidir renovar em
função de demandas atuais, ou se altera radicalmente por uma situação de catástrofe ou
demolição do imóvel para construir outro maior no mesmo terreno ou pela junção de vários
lotes. A pesquisa sobre a forma urbana se desenvolve com base no retrato atual das
mudanças de configuração dos espaços, atentos para as regulações urbanísticas que nele
influem e são provenientes da sociedade onde se desenvolvem.

Palavras associadas ao espaço apropriado pelas pessoas:

No tópico 1 para indicar a configuração espacial como uma entidade física foram
selecionadas doze palavras ou expressões. Para o tópico 2 foram selecionadas apenas cinco
palavras de uso corrente na literatura sobre as formas de apropriação do espaço ocupado
e controlado pelas pessoas. São frequentemente utilizadas nos relatos que envolvem o uso
social do espaço, que no Brasil envolve urbanistas, planejadores urbanos e arquitetos para
citar apenas as áreas afins. Há locais que podem abrigar mais coisas que pessoas, como os
setores para indústrias e serviços da cidade ou mesmo em áreas de uso misto, onde pode
se localizar um galpão para depósito contendo uma quantidade de coisas que demanda
uma área muito maior que aquela da administração. O exemplo do galpão pode não ser o
melhor, mas, ele serve como contraponto para outro, referente ao espaço da cidade para
as pessoas, que é o mote atual dos projetos urbanos e reflete acertadamente a
preocupação de Jan Gehl com a sociabilidade e a saúde da população (GEHL, 2013).
Fizemos a primeira menção ao lugar das coisas para referenciar o planejamento urbano
como a ferramenta do urbanismo que vai estar presente na organização das cidades e
abrange todos seus segmentos. Seja nos lugares da cidade ou em um edifício há um ciclo
que retroalimenta o uso e a ocupação dos espaços devido às necessidades humanas. É um
processo infinito gerador de transformações do que as pessoas pretendem frente aos
espaços existentes e a necessidade-vontade de construir elementos novos. As
transformações decorrentes do planejado pelas pessoas induzem a substituição do
existente por algo novo, uma reforma ou uma nova construção. Compreender as
substituições dos elementos urbanos de uma cidade com o passar do tempo, implica em
considerar os construtos como entidades independentes: o programa arquitetônico e o
34

projeto elaborado na sua época, por decisão de pessoas, em contraste com a decisão atual
para substituir os espaços antigos por novos.
O estudo do espaço em si, serve a intenção de ocuparmo-nos com os tipos físicos como
foco de pesquisa, conscientes de que quando os espaços foram ocupados, passado o tempo
(às vezes pouco tempo), virão novas necessidades e alterações dos elementos urbanos:
substituições, quando se tratar alterações físicas e transformações, ditas para o espaço
ocupado socialmente. Os estudos atuais decorrentes da justa preocupação com as pessoas
e o ambiente, o campo, a cidade e o verde, e, a sustentabilidade do ecossistema, sugerem
fortemente a temática de como as pessoas vivem na cidade. Atraem a atenção de
profissionais de diversos campos, pois este estudo além da importância tem alta
visibilidade. Com certeza nos envolve também e daí optarmos pelo entendimento de como
se delineia e constrói o espaço físico como o invólucro (enclosure) dos lugares urbanos
(chão, fachadas, volumes, tipos edificados) e o entendimento de como servem para
construir a cidade. O arquiteto-professor Carlos D. Coelho, diretor do Forma Urbis Lab da
Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa, deixa isto bem claro quando se refere
ao tecido urbano e o entendimento da forma,

A indissociabilidade de seus componentes remete a conceito de tecido


para a realidade concreta e tridimensional, cujo desmembramento em
qualquer sistema analítico e parcelar só pode ser realizado com o intuito
de identificar os seus diversos elementos ou facilitar a sua leitura
(COELHO, 2012, p.14).

Nossa disposição maior é para reforçar o conhecimento dos tipos de elementos urbanos e
entender a cidade através do estudo localizado de seus setores, cuja identidade é reforçada
pelos corredores onde se desenvolvem os fluxos e se implantam a maioria das edificações
responsáveis pela atração das atividades básicas de apoio às pessoas. Entre as palavras
empregadas para referenciar apenas o espaço físico e podem ser incompreendidas,
comentamos as que empregamos com maior frequência, como:
Território: O chão do planeta Terra está subdividido entre áreas de preservação e áreas
socialmente ocupadas, os territórios. Habitados ou não, isolados ou em conjunto, os
territórios formam superfícies de diferentes dimensões, caracterizadas por divisas precisas
que são controladas por alguma entidade de interesse coletivo ou por um indivíduo. Da
CORREDORES E SUBÁREAS - 35

região ao quarteirão na cidade, as subdivisões do espaço físico estão sujeitas a alguma


forma de controle. Agora ensaiamos nossa definição para território como: o espaço físico
subdividido em partes e socialmente ocupado. Com isto se subentende as formas de posse
pelas pessoas e o direito de propriedade, como mostra a história e se encaixa no conteúdo
do campo do planejamento urbano e regional. O Território possui tantos significados que
sua definição ocupou alguns parágrafos do livro escrito pelo geógrafo-professor Milton
Santos ‘A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção’ (SANTOS, 1996).
Por sua vez, o advogado-professor David Delaney (2005) no livro Territory a short
introduction, do qual traduzimos um pequeno trecho, mostra as nuances entre diferentes
maneiras de entender o território.

Como sugerem as breves observações que apresentei até agora, território


é um elemento extremamente complexo e muitas vezes altamente
ambíguo da vida social, relacionamentos e interações.
Consequentemente, a melhor maneira de esclarecer o funcionamento
prático da territorialidade é inicialmente dar complexidade ao nosso
entendimento do senso comum... Territórios são criações humanas de
cunho social (DELANEY, 2005 p.53).

O sistema de controle sobre o território se subdivide segundo a propriedade de cada parte


e para este assunto importa a classificação proposta pelos arquitetos-professores
Christopher Alexander e Serge Chermayeff, no livro ‘Community and privacy’, 1963. Eles
tratam da linha divisória entre domínios, o público e o privado. Entende-se por domínio o
poder de controle sobre a propriedade de determinado espaço, pode ser uma entidade,
um grupo de pessoas ou uma pessoa física. Utilizando o conceito de formas de controle
sobre os espaços da cidade os autores fazem uma classificação em seis categorias: urbano
-público, urbano-semipúblico, grupal-público, grupal-privado, familiar-privado e individual-
privado. As seis categorias definidas por Alexander e Chermayeff abrangem desde o espaço
aberto para todos como uma praça pública, até aquele bastante individual que é o quarto
de dormir (ALEXANDER et al, 1963).
Limite: Para os limites de glebas, seja na escala territorial ou na interurbana, se descreve
no cartório de registro de imóveis uma linha de divisa. Na escala de um território, por
exemplo, um município a linha oficial de divisa pode ser referenciado pelas pessoas
independentemente de seu registro, citando-a de modo informal como se fosse o curso de
36

um rio ou a cumeada de uma cadeia de montanhas. Torna-se comum dizer que “o


município, ou minha fazenda, se limita com o vizinho por tal rio”. Existem os limites entre
propriedades, limites para a subdivisão de um município em distritos e subdistritos, linha
que necessariamente não indica a subdivisão que a população utiliza para separar seu
bairro. Um bairro pode ter a indicação de seus limites por vias públicas e por outros
elementos urbanos, como atribuído pela população local, e, dependendo da descrição do
interlocutor o limite do bairro poderá variar. Existe o fato de que em uma via pública, seja
a rua estritamente de uso residencial ou mista as pessoas a atravessam para ir visitar uma
família amiga ou ir a um ponto comercial onde tomam um café, compram coisas, pagam
uma conta no banco, se familiarizam com os lugares e pessoas. Isto dificulta se estabelecer
o limite físico de um bairro e por isto a administração municipal se organiza na escala de
distritos que contornam fisicamente vários bairros, que são os ‘distritos.’
A literatura recente sobre o espaço para as pessoas trabalha com a ideia de limiar que fica
associada a transição de um espaço público para o privado. São os espaços de transição
entre os domínios, presentes nos edifícios e nas cidades. O arquiteto-professor Hermann
Hertzberger explica e mostra exemplos destas relações, no seu livro Lições de Arquitetura
(HERTZBERGER, 1996).
Na década atual a preocupação com a qualidade dos espaços para a convivência das
pessoas tomou força e o livro ‘A cidade ao nível dos olhos: lições para os plinths’, atesta
bem tal tendência (GLASER et al, 2015).
Lugar: O espaço físico vazio é algo à espera de gente para ocupá-lo, pessoas e coisas. Ele
encontrará a razão de existir quando as pessoas se apropriarem dele. Abrigando as pessoas,
o espaço poderá ser um lugar e corresponder a um caráter próprio, o genius loci. Christian
Norberg Schulz através de princípios fenomenológicos nos orienta:

De maneira geral, pode-se dizer que alguns fenômenos formam um


‘ambiente’ para outros. Um termo concreto para falar ambiente é ‘lugar’.
Na linguagem comum diz-se que que atos e acontecimentos ‘têm lugar’.
Na verdade, não faz o menor sentido imaginar um acontecimento sem
referência a uma localização. É evidente que o lugar faz parte da
existência. Então, o que se quer dizer com a palavra ‘lugar’? É claro que
nos referimos a algo mais do que uma localização abstrata (SCHULZ, 1976,
In NESBITT, 2006, p.454).
CORREDORES E SUBÁREAS - 37

Ao planejar e projetar, o urbanista e o arquiteto podem (deveriam) se imbuir da


responsabilidade e conceber espaços que facilitem acontecer a magia de se tornarem
lugares, os espaços para as pessoas.
Permanência: O passado tem força de persistência no presente, contribui com o legado de
experiências que nas cidades se demonstra pelo traçado, pelos monumentos e pela
configuração do tecido urbano que, mesmo alterado, demonstra sua origem. O
arquitetoprofessor Sérgio Barreiros Proença afirma:

Cada elemento urbano tem um traçado específico conformado por


múltiplas ações e acontecimentos no longo tempo de criação da cidade.
Assim, apesar de cada traçado corresponder a uma evolução morfológica
singular, é possível não só deduzir uma ordem existente em áreas da
cidade onde é aparentemente menos evidente, como também concluir
que a ordem existente é até bastante clara e baseada em códigos de
composição de fácil dedução. A possibilidade de permanecer confere ao
espaço a possibilidade de em época futura marcar um período do passado.
Ser objeto de referência histórica quando for incorporado a um novo
projeto em qualquer tempo futuro (PROENÇA, 2013, In COELHO 2013,
p.36).

Enquanto trabalhamos no campo de análise da forma das edificações e seu projeto, a


interdisciplinaridade flui na direção das engenharias e ao se falar das pessoas envolvidas,
os seus interesses permanecem centrados no significado para a comunidade que a
edificação deverá ter. No caso do estudo do espaço urbano a discussão se complica, na
medida que tantas outras expertises são solicitadas e as discussões passam a envolver um
leque de muitos atores: da arquitetura e engenharia até as ciências sociais, econômicas, da
ecologia e do ambiente.
No Brasil se deve considerar as dificuldades para o trabalho integrado entre o poder público
e os demais setores da comunidade que deveriam ser parceiros efetivos e isto não acontece
devido a centralidade de poder existente em nosso país e a falta de confiança entre um
lado e o outro, exacerbada pela desonestidade da maioria dos políticos. Isto leva a um
quadro de haver no Urbanismo ótimos trabalhos de planejamento, como o Estatuto das
Cidades e, para ficar neste exemplo, sua aplicação no município de São Paulo através dos
dispositivos sofisticados instituídos pelo plano diretor de desenvolvimento integrado de
2014. Na prática sobressaem os controles oficiais, particularmente a força do zoneamento
e a dificuldade de se realizarem planos parciais para áreas bem delimitadas e projetos
38

urbanos, com a participação em pé de igualdade entre os parceiros; onde as decisões e os


recursos financeiros deveriam ser equitativos para o sucesso do plano urbanístico.
Talvez pela dificuldade em São Paulo de se implementar projetos como urban design e, pelo
tipo da formação de arquiteto que guardamos, nossa linha de pesquisa na universidade se
situou no estudo dos elementos urbanos, pelo lado morfológico. Vem daí a escolha do
nome de nosso time de investigação, Grupo de Pesquisa Arquitetura da Cidade, GPAC, à luz
do aprendizado devido ao arquiteto-professor Aldo Rossi, através do seu livro A arquitetura
da cidade. Nele o ideário da ‘área-estudo’, de espaços que se repetem em relação a outros
diferenciados na trama urbana e o conceito de tipo, são ensinamentos básicos (ROSSI,
1966). Finalmente, outro aspecto importante da pesquisa sobre os elementos urbanos e
que resultou dela, foi a procura de uma linguagem própria, sem misturar termos que
desviassem o foco para além do estudo da forma urbana, assim garantindo a
independência deste estudo. Por atraente que fosse, up-to-date, trans e interdisciplinar,
nosso cuidado sempre foi para que não nos perdêssemos em significados que levassem a
pensar em que tivéssemos capacidade para invadir outras áreas de conhecimento.
CORREDORES E SUBÁREAS - 39

CAPÍTULO 2 - Forma urbana, conceito de corredor e de subárea

Apresentamos um modo de estudar a forma da cidade tendo por referência conhecimentos


teóricos e a experiência de observar o espaço dos elementos urbanos VQLE - via, quadra,
lote, edifício - como lugares onde as pessoas vivem e convivem. Procuramos entender os
espaços andando pela área de interesse para uma pesquisa ou projeto, fora os demais
recursos existentes nas atividades de escritório. O que contribuiu para se agregar aos
elementos básicos do estudo da morfologia urbana dois componentes, o corredor (C) e a
subárea (S), configurações que resultam deles e da pretensão de ampliar o estudo da forma
dos tecidos tradicionais. Desde a região até o setor urbano se aplica ao espaço físico a ideia
de corredor e subárea. Conceitos relacionados a uma organização física que cresce e se
subdivide em partes, seja por ações imediatas ou pela substituição dos construtos ao longo
do tempo. Para explicar a ideia evolutiva do todo através das partes se adota o formato
descritivo, quase didático, possível de ser utilizado em aulas de projeto urbano na
universidade ou em trabalhos profissionais.
Nossa investigação se desenvolve na região de São Paulo, onde são utilizados os critérios
relativos ao conhecimento do espaço físico por partes. Foram selecionados trechos do
tecido urbano para análise e aplicados procedimentos do estudo da arquitetura da cidade
segundo o arquiteto, ou seja, procurar base conceitual que permita com segurança se dar
o passo além quanto a invenção de novos tipos e diretrizes urbanísticas (MACEDO, 2016).
Influem nesta maneira de estudar a cidade os conceitos do arquiteto-professor Kevin Lynch
sobre a imageabilidade e legibilidade dos espaços (LYNCH, 1960); as críticas expressas de
modo inconteste pela jornalista-socióloga Jane Jacobs feitas ao urbanismo e arquitetura
moderna (JACOBS, 1961) e, a formulação conceitual, introduzida pelo matemático
arquiteto Christopher Alexander baseada em uma linguagem de padrões (ALEXANDER,
1977).
São também utilizados no estudo dos corredores e subáreas, conceitos da morfologia
urbana clássica, do geógrafo- pesquisador alemão Michael Robert. G. Conzen , radicado na
Inglaterra, que trabalha os aspectos morfológicos considerando o solo existente como o
elemento primário do suporte físico (CONZEN, 2005); dos arquitetos-professores, os
40

italianos Saverio Muratori e Paulo Caniggia do grupo italiano (CANIGGIA et al, 2001) e os
franceses Phillipe Panerai, Jean Castex e Jean Charles Depaule que trabalham com o
quarteto VQLE refletindo a experiência com o projeto de edificações oriunda de suas
profissões e do contexto urbano europeu (PANERAI, et al, 2013). É de interesse atual os
trabalhos dos pesquisadores da Universidade do Porto, Portugal, responsável pelo PNUM,
Portuguese Network on Urban Morphology, associado a congênere inglesa ISUF,
International Seminar on Urban Form (OLIVEIRA, 2016). Em Portugal se destaca devido à
sua contribuição maior para a morfologia urbana o grupo de pesquisa Forma Urbis Lab,
liderado pelo professor Carlos Dias Coelho da Universidade Técnica de Lisboa, cujo acervo
de experiência se difunde pela publicação de livros. Em particular o livro Os elementos
urbanos, coordenado pelo professor Coelho, cujos capítulos escritos por especialistas, tem
sido referência para os trabalhos do nosso grupo de pesquisa (COELHO, 2012).
A repercussão dos trabalhos dos autores citados e seus livros, são divulgados tanto na
universidade como no ambiente profissional do arquiteto-urbanista. Por esta razão parece
desnecessário pautar a todo instante cada trecho escrito sobre os corredores e subáreas
por justificativas procurando imbricar o resultado das investigações de campo - de onde
realmente emergem os resultados da nossa pesquisa - com citações de autores conhecidos.
Isto se faz quando a aproximação a determinado autor é indispensável para reforçar o
conceito que se procura fixar.
A cidade de São Paulo, doze milhões de habitantes em uma área metropolitana de vinte e
dois milhões evoca estudos de planejamento urbano e regional para determinar padrões
de infraestrutura e de desenvolvimento socioeconômico na escala regional. No extremo
oposto o planejamento referenciado a pequena escala leva a um urbanismo que trata de
aspectos locais, tendendo para o social e político, mas, gerador de subsídios importantes
para a análise do contexto físico local. Isto acontece através da captura das particularidades
que ocorrem em pequena escala e que podem ser agrupadas no contexto de um
determinado setor; organizados para alimentar programas de intervenção e projetos
urbanos. O conhecimento dos aspectos locais ‘andando a pé, olhando e escutando’,
fornece material para a escala local do planejamento e para as escalas maiores, sendo
indispensáveis para alimentar os programas de projeto dos setores da cidade. Pode-se
CORREDORES E SUBÁREAS - 41

somar a isto formas alternativas do urbanismo insurgente como o movimento Everyday


Urbanism, o Tactical Urbanism e outros, como formas de contribuir para o planejamento
do uso de espaços públicos através de programas que nascem de uma comunidade.
O projeto urbano pode resultar do planejamento através da linearidade plano e depois
projeto, ou, pode se originar da vontade da sociedade para transformar áreas menores,
de um bairro da cidade. Nas duas situações o bom projeto irá aflorar dos programas
aprovados pelas partes participantes e o seu envolvimento no processo de fazer.

Estudar o espaço como forma construída objetiva o conhecimento de tipos, serve para
fundamentar o programa, as proposições para um projeto urbano e alimentar seu processo
de implementação.

Conceitos básicos quanto a forma do espaço urbano

Seja na linguagem técnica ou coloquial é comum se falar ‘região do país’, ‘região


metropolitana’ ou ‘região norte, sul, leste ou oeste’ de um país, município ou cidade. Na
escala da cidade utiliza-se o nome setor para designar suas partes, definidas conforme o
objetivo do planejamento: setor censitário, educacional e outros. São objetivos
decorrentes do interesse específico de buscar informações que subsidiem trabalhos de
planejamento. Para a análise da forma da cidade e programa do projeto urbano, considera-
se o setor dimensionado de acordo com a abrangência apropriada ao tipo da investigação
requerida. A cidade é entendida como um setor urbano do município, dividida em bairros
pelos moradores e em distritos segundo os critérios da Prefeitura.
Para os procedimentos de estudo de corredores e subáreas a subdivisão de uma cidade é
feita pelos elementos físicos de permanência no tempo, difíceis de serem removidos: as
vias de transporte de pessoas e cargas, o caminho dos fluídos e da energia e os acidentes
geográficos, um morro ou o mar. Analisar o tecido urbano de traçado tradicional como o
da cidade de São Paulo, tendo foco nos tipos de corredores e subáreas, é facilitado pela
subdivisão do espaço em setores, através do sistema de vias principais. Deste modo são
definidos setores da trama urbana articulados para permitir o melhor conhecimento do
todo. Algumas das vias principais de hoje tempos atrás foram ligações construídas pelas
pessoas e assentes no território segundo a lógica do possível: pelo espigão, meia encosta
ou várzea de um curso de água. Ligavam cidades e passavam pelo centro, onde se situava
42

o mercado, a praça, os prédios públicos e as pessoas conviviam. Com o tempo, as cidades


e áreas rurais se institucionalizaram como municípios. Parte dos caminhos tornaram-se vias
interurbanas ligando cidades próximas e em alguns casos formaram uma região
metropolitana. Isto pode parecer elementar, mas, é para se recordar a maneira da
formação de cidades e para introduzir a ideia de corredores e subáreas, cuja origem está
na subdivisão do espaço em setores e subsetores na medida em que se aprofunda o estudo.
O conceito de região como utilizado pelo arquiteto- planejador Peter Calthorpe tem a ver
com os conceitos que utilizamos neste livro. Calthorpe estabelece quatro elementos
básicos para o planejamento regional, que são: centers, centros de cidades ou vilas;
districts, área com uma ocupação principal (universidade e entorno, por exemplo);
preserves, espaços abertos rurais e urbanos; corridors, linhas do sistema natural,
infraestrutura e transportes. A partir daí Calthorpe desenvolveu o método Transit Oriented
Development, T.O.D, cuja base é o transporte público ligando localidades com potencial
para desenvolvimento e que hoje é utilizado mundialmente (CALTHORPE et al, 2001).
Lembramos que a região sempre foi pensada para efeito de controle territorial político e
administrativo, sem ir muito as origens, observa-se que o mundo conviveu com (ainda
existem) principados, ducados e tais, nas américas tivemos ingleses, portugueses,
espanhóis, franceses ..., disputando a marcação de regiões. Pela maneira de hoje sobre o
planejamento regional e urbano, ao menos no contexto norte americano, houve a
influência dos profissionais que fundaram a Regional Planning Association of America,
RPAA, em 1923; foram arquitetos, geógrafos, biólogos e outros profissionais, com destaque
para Lewis Mumford, Clarence Stein e Benton MacKaye que serviram de inspiração para
professores e estudantes por muito tempo, trazendo ideias que correram em paralelo ao
movimento moderno de arquitetura e urbanismo, iniciado na Europa no alvorecer do
Século XX.
O traçado viário, a implantação dos espaços públicos e edificações que moldam a forma
urbana atual acompanharam a história das cidades, foram concebidas como resposta a
necessidades das pessoas e boa parte foi construída com arte. No texto Condições
Históricas do Urbanismo, G. C. Argan, afirma ‘será preciso considerar o conjunto das
exigências práticas como matéria realista que se constitui e organiza na forma artística e
CORREDORES E SUBÁREAS - 43

representa a condição da sua existência”, exaltando a questão de construir com arte desde
que se domine o programa de necessidades descrito para um projeto de arquitetura da
edificação ou da cidade (ARGAN, 1992).
A figura 2-1 mostra a ocupação de um território pela ilustração de três épocas. Em 2-1A, a
centralidade (cidade) que se forma no cruzamento de dois caminhos ou vias. Em 2-1B, o
início de uma rede de conexões. Em 2-1C, aparece a região metropolitana.
Figura 2-1: Cidade, município e região metropolitana.

Fonte: diagramas do autor

No entanto, nem todo tecido urbano é concebido com arte e ser antigo não é garantia de
qualidade. Há exemplos, nada satisfatórios como o loteamento da área no perímetro de
Paraisópolis em São Paulo, onde foi assente um traçado reticulado ortogonal sobre terreno
acidentado, que gerou e causa problemas até hoje devido a declividade acentuada e
44

irregular das vias em relação a configuração das quadras, lotes e infraestrutura. No entanto,
cumpre lembrar que atualmente existem no munícipio de São Paulo diretrizes para a
ordenação do território mais avançadas e compreensivas.
Para dar uma ideia geral do município onde se situam os trechos pequenos do tecido que
escolhemos para o estudo da forma e mostrar como poderiam ser desenvolvidos projetos
neste amplo contexto, apresentamos um diagrama, figura 2-2.
Figura 2-2: Rodoanel, um corredor que contorna a cidade de São Paulo

Fonte: diagrama do autor

São Paulo como outras cidades brasileiras expandiu-se a partir do centro por um sistema
de vias radiais aproveitando caminhos de cotas favoráveis, por cumeadas ou fundo de
vales, em retícula ortogonal ou deformada para acompanhar a declividade, sem deixar
pontos convenientes para drenagem ou vias principais se conectarem a loteamentos novos.
A superfície de cada anel foi dividida por setores demarcados pelas radiais que saem do
Centro Histórico (o menor anel) e se prolongam até o Anel Rodoviário. Na figura 2-2 a linha
CORREDORES E SUBÁREAS - 45

fina pontilhada representa o limite do município e em destaque aparece o corredor


associado ao anel viário. Segundo as diretrizes de desenvolvimento urbano do município
os equipamentos maiores de apoio ao município serão aí localizados e diversos deles são
objeto de estudo para a transferência; constituirão polos oferecendo a possibilidade de os
projetos abrangerem interessantes áreas urbanas ao seu redor, como projetos urbanos
localizados, os districts lembrando a nomenclatura de Calthorpe.
São informações de referência: Região Metropolitana: 7.946,84km², População:
21.242.939. Densidade demográfica 2.673,13 hab/km²; Município de São Paulo:
1.521,10km². População: 12.038.175. Densidade demográfica hab/km²: 7914,12, dados
censitários de 2.018.

O cruzamento das circulações principais em São Paulo mostra-se como local adequado para
as edificações de interesse coletivo, atestando uma localização que ocorre em outras
cidades. É representado pela praça, nó de articulação de veículos, espaço de passagem, de
permanência individual ou de encontro. As vias radiais cortam os anéis concêntricos,
desenhados em diferentes tempos, na expectativa de delimitar perímetros de expansão
urbana. Em outros lugares desta cidade grande a pressa do crescimento fez com que
tecidos urbanos antigos fossem cortados por vias destinadas para a circulação pesada,
resultando um traçado do tipo patchwork mal alinhavado.
Traçado viário

A via é um elemento de morfologia urbana, faz parte do quarteto clássico via, quadra, lote,
edifício, VQLE, que caracteriza o tecido urbano de uma cidade, como definido pelo
arquiteto-professor Carlos Dias Coelho:

‘o conceito de tecido urbano exprime a realidade da cidade construída,


matéria com existência real e temporal, que inclui indissociavelmente o
espaço e o edificado, o público e o privado, isto é, as ruas, as parcelas, os
edifícios, as infraestruturas, etc., isto é, toda a cidade física’ (COELHO,
2012, p.15).

Coelho diz serem indissociáveis os elementos que compõem o tecido conforme o tempo, a
cultura, e a forma de ocupação, como processo evolutivo próprio de cada território. Para o
autor as limitações que possam ocorrer ao se estudar o tecido urbano desmembrando-o
para analisar é justificado apenas para facilitar a leitura e reconstituir uma interpretação.
46

Para a análise de tecidos urbanos segundo os corredores e subáreas é suficiente a seguinte


classificação das vias de uma cidade:
• Vias que atravessam, são as que passam tangenciando o setor e o definem. Elas
fazem a ligação com outros pontos da cidade ou, são as vias que cortam o setor
dependendo da abrangência da análise. Como a cidade por definição é um setor do
município, nesta escala destacam-se as vias que atravessam. Na dimensão do bairro, o
setor pequeno se identifica por possuir limites determinados pelas vias que o atravessam
tangenciando, são vias que distribuem se consideradas na escala da cidade
• Vias que distribuem, são vias que fazem conexão com a principal e tem a finalidade
de distribuir o tráfego para as vias locais. Quando a via que atravessa for uma rodovia ou
via arterial importante em geral há uma via paralela para participar do conjunto como via
de distribuição e dela o tráfego se espraia para outras vias de distribuição ou diretamente
para as locais. Quando se tratar de uma via que atravessa de porte menor as vias de
distribuição saem delas diretamente, e fazem a ligação com as vias locais. Uma situação
que favorece as subáreas formadas por quadras de lotes pequenos e que tem resistido a
investidas de empreendedores especializados na construção de condomínios de porte
grande aparece quando há uma via de distribuição interna que acompanha o corredor em
um segmento extenso de determinado setor.
• Vias locais são as vias que formam a trama local articulada com as vias de
distribuição. Elas se localizam entre duas vias de distribuição, podem ser do tipo loop
saindo e voltando da mesma via, ou tipo cul-de-sac entrando e saindo pelo mesmo acesso
da via de distribuição.
Ao aplicar o procedimento de trabalho resultante destes conceitos é indispensável ter
presente a relatividade da nossa classificação de vias. Dividimos a cidade em setores, no
contexto urbanizado maior as subdivisões são feitas pelas vias que atravessam. Para a
identificação de subsetores pode ser utilizada uma via que distribui, o que é normal quando
se reparte o espaço da cidade em corredores e subáreas.

Corredores

O tecido urbano pode ser identificado pelas passagens de tráfego segundo sua importância:
a via expressa, a avenida, a rua principal, a rua secundária e a local. Elas recebem uma
CORREDORES E SUBÁREAS - 47

nomenclatura técnica pelo plano diretor da cidade e para os propósitos da engenharia de


tráfego. São eixos por onde fluem veículos e pedestres, com papéis diferenciados conforme
sua inserção na trama urbana, mas, para o nosso trabalho onde importam as vias e seus
invólucros, no sentido de considerar o que acontece nos lotes das faixas lindeiras das vias,
passamos a denominá-las de vias que atravessam, vias que distribuem e vias locais.
Destaca-se o tipo de elemento urbano que associa o espaço da via com as suas faixas
lindeiras de lotes edificados ou não; quadra a quadra, para formar a faixa denominada
corredor figura 2-3.
Figura 2-3: O corredor tipo

Fonte: diagrama do autor

Em conjunto coma via que define um corredor se pode somar outro elemento urbano
também linear: o canteiro central, um canal, uma linha de alta tensão, ou, uma ferrovia.
Tratando-se de um elemento relativamente estreito como o canteiro central da via, ou, o
canal estreito de um córrego, sua largura deve ficar incluída no corredor que contém as
faixas lindeiras de lotes. No caso de o elemento urbano ter sua largura avantajada, ser uma
via expressa ou um rio (com frequência aparecem lado a lado) e modo geral quando houver
a necessidade de uma ponte ou túnel para atravessá-los, se identifica a presença de uma
‘barreira’ separando dois setores da cidade, figura 2-4.
48

Uma situação inusitada para a caracterização de uma barreira é quando se encontra uma
faixa de lotes industriais, ou, de origem industrial, com os fundos para uma ferrovia e a
frente para uma via da cidade. Fato inerente à situação dos lotes nesta situação precisarem
do acesso pela via que pertence a trama regular da cidade, mas, necessitam ter contato
direto com a faixa de domínio ferroviária para a carga e descarga de mercadorias através
dos ramais diretamente no lote industrial.
Figura 2-4: Barreira física entre dois setores

Fonte: Diagrama do autor

Semelhante a este tipo, se pode classificar a situação de loteamentos residenciais que


possuem uma faixa de lotes com frente de acesso por uma via que atravessa ou distribui e
fundos para uma ferrovia, um morro um parque e às vezes a praia. Todos estes tipos são
utilizados no traçado a cidade para otimizar o uso das vias, sem muito apreço ao que
poderia ser explorado como uma boa área de uso coletivo no espaço posterior do corredor,
gerando espaços para pessoas, acessíveis e bem agradáveis. Normalmente ocorre que a
paisagem urbana fica relegada a uma última prioridade, sendo exemplos as vias laterais de
cemitérios, os renques de lotes que fazem fundos para um córrego ou para linhões de
distribuição de energia. Nas cidades há um sem-número de situações como estas que
poderiam ser valorizadas por uma boa aplicação dos princípios de projeto urbano como
urban design. Junto com generosas áreas livres poderiam aparecer trechos ocupados por
CORREDORES E SUBÁREAS - 49

habitação, comércio, serviços, instituições e até pequenas instalações industriais. Para


viabilizar tais projetos as proposições deveriam brotar das associações locais.

Na figura 2-5, da esquerda para direita aparecem as quadras, a via responsável pelo
corredor e a faixa de domínio da ferrovia; o diagrama mostra esta faixa interrompida logo
após a representação da ferrovia, pois modo geral ela é bem larga.

Figura 2-5: corredor com forte barreira.

Fonte: diagrama do autor

A demanda de fluxo no sistema viário pode impor a utilização de duas vias


aproximadamente paralelas formando um sistema duplo de corredores ou pode requerer
vias paralelas de mão única em sentidos opostos. No caso de vias separadas apenas por
uma quadra e a mão de direção do tráfego for única em sentidos opostos, elas formam um
binário, situação que acontece com frequência, nas cidades médias e grandes. O corredor
passa a conter os lotes das faixas fronteiriças laterais de cada via, geminadas pelos fundos
e assim o conjunto passa a ser um único sistema. Esta opção facilita a movimentação dos
veículos nas duas direções sem a necessidade de obras de alargamento da via, caso se
optasse apenas por uma delas, figura 2-6.

O sistema em binário pode utilizar mais de duas frentes de quadra e se alargar deixando
uma ou mais quadras entre as vias que formam o conjunto. Pode-se perceber que a
implantação do sistema de binário nas vias da cidade ou de um distrito possibilita o
aprimoramento de toda faixa a ser pensada como projeto urbano podendo se tirar partido
de peculiaridades do local, seja do ponto de vista da possibilidade de as calçadas serem
50

alargadas, ajustados os espaços para implantação de ciclovias, a criação de uma praça,


pocket park, um bom paisagismo, mobiliário urbano e sinalização.

Figura 2-6: Corredor composto

Fonte: desenho do autor

Os corredores apresentam níveis diferenciados de relacionamento com o tecido urbano,


desde os que atravessam a cidade e interligam setores até o corredor próximo a uma
tranquila vizinhança. A importância de um corredor que atravessa a cidade ou apenas um
setor, é acentuada conforme a diversidade de uso do solo que atrai, ela está relacionada
com a valorização comercial dos imóveis no percurso por inteiro, ou, segundo trechos que
aparecem diferenciados no mesmo percurso.
A largura do elemento de infraestrutura somado ao das vias, mais a profundidade dos lotes
das faixas lindeiras define a largura do corredor no corte transversal escolhido para a
medida, pois os corredores têm larguras variadas dependendo da profundidade dos lotes
das suas faixas lindeiras. Há lotes que têm frentes para mais do que uma via e para estes
deve valer a frente para a via do corredor. Nossa definição de corredor é diferente daquela
que se encontra no caderno de zoneamento do município, onde o corredor tem uma
largura pré-determinada por força de lei.
CORREDORES E SUBÁREAS - 51

Subáreas

Na cidade tradicional os corredores se entrelaçam de maneira orgânica resultando atrás


deles uma superfície poligonal cujo contorno é o fundo dos lotes que fazem frente para os
corredores. Esta superfície se chama subárea, para os fins de conceituação e de aplicação
dos nossos procedimentos de análise da forma urbana. A subárea poderá ser grande ou
pequena dependendo da distância relativa dos corredores, que é determinada pelo critério
de subdivisão do tecido urbano em setores. Isto dependerá da abrangência do estudo
desejado pois um setor grande poderá incluir vias que atravessam e um setor pequeno,
resultante de subdivisão de outro possuindo apenas vias de distribuição, poderá ser
subdividido mais uma vez por distribuidoras de ordem menor (MACEDO, 2002). A figura 27
ilustra o critério de subdividir por setores. Em 7A, o diagrama ilustrativo de uma subárea
grande, configurada por corredores que atravessam a cidade. Em 7B, mostra-se que a
subárea pode ser subdividida em três outras pelos corredores associados às duas vias de
distribuição existentes. Em 7C, demonstra-se que a subárea que contém os cursos de água
pode ser subdividida em três partes, chegando ao ponto de não interessar subdivisões
menores para estudo.

O processo analítico que leva a consideração de trechos cada vez menores da cidade serve
para contextualizar projetos pequenos, às vezes decorrentes de manifestação local, na
trama geral do distrito, sendo neste caso apropriado dizer ‘do bairro’. No capítulo 3
desenvolvemos os com mais detalhes o que se chamou de setores e subsetores da cidade
e no estudo do Setor 7 e Subsetores 7a, 7b e 7e vai se demonstrar como o pensar sobre
trechos pequenos da trama urbana se pode descobrir locais interessantes para se sugerir
projetos. Neste caso a vez passa a ser do arquiteto- desenhador na direção de propor ideias
fortes que emulem os interessados locais ou investidores para intervenções como projeto
urbano em escala do bairro. Por este viés se poderá ajudar a dar interpretação mais segura
para desejos de grupos pequenos ou indivíduos, com o interesse de participar em projetos
de amplitude que incorporem suas próprias aspirações. Na figura 2-7 aparecem três
maneiras de se subdividir um setor da cidade em porções menores de acordo com o critério
de se aprofundar no conhecimento da estrutura física e aproveitar o contato com os
lugares, às vezes apenas espaços onde as pessoas vivem e convivem. Em 2-7 pode-se
52

observar nos diagramas A, B e C que os espaços se tornam menores na medida da


identificação de acidentes físicos que os permitam separar, como as e os córregos.

Figura 2-7. A subárea e suas subdivisões

Fonte: diagramas do autor

Os corredores e as subáreas

Regra geral os lotes situados nos corredores possuem imóveis ocupados por atividades de
uso misto com predominância no térreo de uso comercial e serviços, intercalados por
residências, instituições, indústrias, praças e parques. Há corredores de caráter residencial
nos bairros e total predominância do tipo misto nas áreas centrais de cidades. O corredor
CORREDORES E SUBÁREAS - 53

pode ter um caráter particular, como aquele caracterizado por um tipo predominante de
comércio: a rua dos eletrônicos, das confecções ou das noivas. Nos corredores longos a
predominância de uso acontece por trechos, como se observa nas vias de grande extensão
da cidade de São Paulo.
A quadra que acompanha a via responsável pelo corredor, tem a faixa de lotes voltados
para o lado oposto em condição diferenciada daquela do corredor. No caso de ser uma
quadra da área central de uma cidade grande, o uso do solo na via de fundo se assemelha
ao do corredor em decorrência da pujança das atividades de comércio e serviços. No bairro
em transformação de industrial para residencial, comercial e serviços, as plantas industriais
maiores cedem lugar para grandes condomínios residenciais ou mistos, mas, ficam trechos
onde os lotes são de dimensão que não chega a atrair os empreendedores imobiliários,
resultando uma complexa e interessante mistura de tipos edificados.
A figura 2-8 apresenta imagens de áreas de transição, no primeiro plano, e centralidades
de uso e ocupação do solo ao fundo, em São Paulo. Em 8A, aparece o trecho de um bairro
onde a densidade de ocupação dos lotes aumenta na medida da aproximação com a área
central e em 8B, a frente dos lotes voltados para a via-corredor tem no pavimento térreo
uso misto de predominância comercial e serviços. Ela segue até encontrar o centro do
bairro onde o volume dos edifícios é maior.

Figura 2-8: Centralidade principal e a escala do bairro.

Fonte: fotos autor, acervo 2017

Em setores afastados da rede viária principal, pode haver vias eleitas como de distribuição
onde a predominância de uso seja residencial. Há situações em que a mudança de uso misto
do corredor para as vias internas da subárea é abrupta, destacando-se a situação da “rua
sem saída” ou vila, de acesso direto por uma via-corredor, onde uma parte das casas passa
54

a ser utilizada para atividades de serviços. Em outras situações as casas da vila passam a
ser comerciais. São Paulo mostra nos corredores de bairros significativa presença de
oficinas e pequenas indústrias misturadas ao comércio, residências, instituições públicas e
privadas. Os espaços verdes são modestos.
A figura 2-9, mostra a mudança de uso que frequentemente acontece nos corredores de
bairros. Em 9A aparece um trecho de corredor de origem industrial onde um condomínio
de grande porte se assentou no terreno onde existia uma indústria, os lotes de frente
estreita e pouca profundidade devido a existência de uma rua sem saída paralela ao
corredor, passaram a ter uso comercial e de serviços (foto, à direita). 9B mostra uma via
corredor com acentuado contraste do volume e uso dos espaços. 9C representa a via
corredor onde as casas, em lotes de frente estreita e pouca profundidade são mantidas,
com a mudança de uso, hoje constituindo exemplo de corredor que atravessa compatível
com a escala de uma vizinhança. A figura 9D representa uma vila em local de considerável
movimento, onde todas as casas se transformaram em lojas.
Figura 2-9: Mudança de uso em corredores de bairros

Fonte: fotos autor, acervo 2017


CORREDORES E SUBÁREAS - 55

Corredores e subáreas como objeto de estudo

Através da observação sobre diversas áreas da cidade de São Paulo - trabalho de campo,
análise de tipos e projetos - organizou-se um processo para estudar os elementos urbanos,
decorrente dos conceitos de corredor e subárea. Tem o objetivo de organizar o
demonstrativo da situação presente, analisar a forma urbana, gerar subsídios para
pesquisa, planejamento e projeto urbano.
Ao longo da história as vias de São Paulo foram implantadas em função dos aspectos
naturais de relevo e hidrografia, de acordo com a superfície a parcelar, tamanhos previstos
de lotes e diversidade oferecida para possíveis programas de edificações. O loteador das
partes a cada projeto foi e é dependente do programa e finalidade do parcelamento: da
grande gleba industrial até o lote da vila operária; do bairro-jardim até as residências em
fileira dos bairros menos nobres. O elemento estruturador sempre foi o sistema de
circulação.
Com o passar do tempo aconteceram alterações do traçado original da cidade, pela
implantação das grandes avenidas, alargamento de vias, canalização de cursos de água e
um grande esforço para responder às necessidades de espaços para o transporte público e
o individual. O tempo trouxe o conhecimento das questões técnicas relativas às vias da
cidade gerando uma classificação rigorosa de tipos que foram incluídos na legislação
urbanística do município desde 1950. O automóvel – simbolizando a modernidade –
sacrificou espaços dos pedestres, parte das calçadas deram lugar a ampliação das faixas de
rolamento. Calçadas que nunca foram de largura generosa na cidade de São Paulo, ficaram
ainda mais estreitas. Muitos dos poucos parques existentes foram retalhados por força de
obras viárias ou pela sua “disponibilidade” para a urgente implantação de edifícios
públicos.
São Paulo acompanha a atual valorização internacional para se circular em espaços abertos,
representada pela “caminhabilidade” ou capacidade para caminhar que é um neologismo,
tradução de walkability e pelo incentivo da bicicleta como meio de transporte. Isto
repercutiu no Plano Diretor Estratégico - 2014 - deste município, através de diretrizes para
diminuir o uso dos automóveis com a finalidade de conquistar parte dos espaços a ele
cedidos.
56

Tornou-se necessário abrir frente para o transporte de alta capacidade e isto vem sendo
feito gradativamente, apesar da estrutura viária desta cidade não facilitar tanto. A urgência
para acompanhar o padrão internacional está centrada no criar espaços para as pessoas –
pedestres e bicicletas - ainda que não possam ser contemplados os que fazem uso de
motocicleta para trabalhar (não há espaço, é impossível agora, dizem os técnicos), apesar
de os motociclistas serem hoje os responsáveis pelo maior número de acidentes fatais em
São Paulo. Estes objetivos redundam em propósitos de projeto reprimidos quanto às
possibilidades para realmente transformar os espaços da cidade, pois demandam grandes
e dispendiosas desapropriações. Sobre este assunto existe farta literatura disponível, que
melhor se situa no campo do planejamento e implementação de políticas públicas.

Estudo da forma urbana: distrito da Mooca, São Paulo

A parte da cidade escolhida para testar o procedimento de análise decorrente dos conceitos
de corredor e subárea é o distrito da Mooca, na cidade de São Paulo. Distrito, para usar a
denominação utilizada pelo poder público para efeito de planejamento e administração
municipal.
O distrito da Mooca é delimitado por vias principais, ele tem a superfície de 7,7km²,
população 75.724 (PMSP, 2010) e densidade demográfica de 9.834 habitantes por
quilômetro quadrado. A superfície deste distrito corresponde a 0,5% da área do município,
que é de 1521km². O perímetro oficial definido pelo sistema viário corresponde ao
interesse desta investigação quanto a subdividir o espaço em setores, tendo apoio nas vias
que atravessam e que distribuem. Dentre os noventa e seis distritos em que se subdivide o
município de São Paulo a Mooca ocupa posição a Leste da área central, sendo classificado
entre os distritos de menor superfície. Para efeito da análise da forma será utilizada a
superfície oficial do distrito (7,7km²). Sua contextualização como parte integrante da área
central da cidade está comentada no artigo Patchwork of commercial districts around São
Paulo Core Area, apresentado no SBE/2016, Sustainable Building Environment
(IMBRONITO, M.I. et al, 2016).
Quanto à compreensão de limites, os moradores mencionam três partes, usando a palavra
bairro: Hipódromo, Alto da Mooca e Parque da Mooca. Nomenclatura que melhor
aproxima as pessoas ao seu local de moradia. Observando a identificação popular foi
CORREDORES E SUBÁREAS - 57

organizado um diagrama da divisão da Mooca em oito partes, cinco além das três já citadas,
figura 2-10.

Figura 2-10: O município e o distrito da Mooca

Fonte: diagrama do autor sobre base PMSP, site oficial.

Em 10A, o diagrama destaca a Mooca dos demais distritos de São Paulo. Em 10B, segundo
uma classificação oficial, aparecem as localizações aproximadas que dão cunho de lugar ao
espaço físico. São oito partes: 1- Ana Neri; 2- Hipódromo; 3- Cassandoca; 4- Alberto Lyon;
5- Mooca; 6- Alto da Mooca; 7- Henry Ford; 8- Parque da Mooca. Como procedimento de
trabalho se recomenda fazer um passeio demorado pela área em estudo, para sentir o lugar
das pessoas, depois entrar na técnica analítica dos corredores e subáreas, levando em
conta as informações oficiais como uma importante fonte de referência.
Em nosso trabalho sobre os elementos via quadra, lote, edifício e seus componentes
corredor e subárea, a definição de cada um deles deve ser entendida pelo propósito
específico dos procedimentos delineados para se conhecer o tecido de modo geral e dar
suporte a projetos urbanos. Para quem pretenda se aprofundar nos estudos de tipologia se
recomenda recorrer ao Laboratório Quadro do Paisagismo da Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo da Universidade de São Paulo, o Lab QUAPÁ que tem produzido uma
‘cartografia temática’ sobre padrões morfológicos e espaços livres por quadra, para as
cidades da Região Metropolitana de São Paulo (QUEIROGA, 2016).
58

Corredores e subáreas do distrito da Mooca

Para o estudo da forma urbana o distrito foi subdividido em quinze setores, por vias que
atravessam ou distribuem. Os setores são de natureza física e sem preocupação de que
coincidam com as divisões oficiais, ou, com os limites imprecisos que o morador costuma
apontar para o seu ‘bairro’. Os setores foram identificados e numerados de um a quinze,
figura 2-11.
Figura 2-11: Distrito da Mooca, subdivisão em setores

Fonte: diagrama do autor

Observe-se que os setores de números 1, 12,13, 14 e 15 podem ter seus limites na via de
distribuição que delimita o distrito. No entanto, dependendo do objetivo pode não
interessar a delimitação oficial do distrito, como a nossa opção de estudar a cidade por
setores. Sobre este procedimento um exemplo de fácil visualização é o setor 12, onde o
CORREDORES E SUBÁREAS - 59

limite oficial do distrito se encontra muito próximo a via que atravessa. A subdivisão em
setores deve ser produto do conhecimento da área que o pesquisador adquire ao observar
o universo urbanizado e do bom senso para fazer o setor coincidir com uma via que
atravessa ou distribui. Estes setores ficam sujeitos a subdivisões ainda de dimensões
menores.
Considerações sobre o capítulo 2

A disposição para analisar o tecido da cidade expressa por este manuscrito vem tanto pelo
viés teórico como pela prática. Nesta o resultado positivo do projeto da forma urbana
depende do bom programa de necessidades, de sua interpretação somada ao talento e
suor de uma equipe interdisciplinar. Dela participa o arquiteto-desenhador e sua equipe,
que nem sempre são o mesmo ou a mesma em todo percurso do desenvolvimento de um
projeto. O arquiteto-desenhador trabalha para buscar resultados satisfatórios quanto aos
tipos e a forma da cidade, seu perfil é de clínico geral e inventor de espaços novos ou
transformados. Sua atividade liga-se a história do ambiente físico e a morfologia urbana na
fase de análise de tipos que alimentam o programa de necessidades e as proposições
conceituais; interage com a interdisciplinaridade, sendo o responsável pelas diretrizes
físicas do projeto de Arquitetura da Cidade até sua implantação. O que ele faz, em resumo
compreende a complementação do programa de necessidades inicial em termos
dimensionais, a adequação do programa ao sítio e aos propósitos dos empreendedores.
Mesclam-se no trabalho do arquiteto-desenhador comprometimentos externos à sua
especificidade: o contexto ‘inter’ e ‘transdisciplinar’ inerentes ao desenvolvimento de um
projeto. No entanto sua responsabilidade primeira, como urban designer, é dita com
propriedade por Ray Gindroz, principal do escritório americano Urban Design Associates,
UDA: “criar ruas bonitas e agradáveis, parques e praças nos quais o caráter dos edifícios
individuais fique em harmonia com os outros edifícios, com o tratamento à nível do chão e
com a escala do espaço por inteiro”, sem excluir a participação do urban designer nos
procedimentos para implementação do projeto (GINDROZ, 2.003, p. 7).
Do contexto diversificado do qual deve resultar o projeto urbano nascem diretrizes
urbanísticas a serem implantadas, umas de médio prazo e outras para construção imediata.
Estas com a finalidade de cobrir necessidades ou para incrementar um setor pequeno da
60

cidade, para se tornar embrião de outras intervenções como “acupuntura urbana” nos
moldes do plano para a cidade de Curitiba. São estratégias de planejamento onde o espaço
é tratado como entidade física, onde interessa a geometria de suas formas, sua adequada
inserção urbana e a viabilidade financeira (LERNER, 2003).
O estudo da forma da cidade através dos corredores e subáreas além do viés acadêmico
serve para a fundamentação das decisões preliminares do que fazer e para a configuração
dos espaços nas etapas subsequentes de um projeto urbano. É ferramenta indispensável
para o arquiteto-desenhador e a equipe de projeto urbano, pois auxilia na fundamentação
das propostas para serem submetidas à sociedade, em particular, aos empreendedores
privados e aos agentes públicos.
CORREDORES E SUBÁREAS - 61

CAPÍTULO 3 - Setores e subsetores da cidade

Trataremos da sistematização da ideia de corredor (C) e de subárea (S) definidos no capítulo


anterior, à luz dos elementos urbanos via (V), quadra (Q), lote (L) e edifício (E). A via como
o elemento de divisa entre dois setores urbanizados é entendida pela sua importância no
traçado, seu papel de organizar os fluxos de circulação e o formato das quadras. Por ser
responsável pela interligação entre vários setores a via é indissociável em relação a
representação da cidade, assim permanecendo em todos os estudos da forma urbana.
Utilizaremos apenas as iniciais VQLECS, quando forem citados os quatro elementos básicos
e os dois complementares, ou uma combinação de iniciais quando o interesse
momentâneo não abranger todos eles.
Pelo resultado dos estudos citados no capítulo 2 se concluiu por dividir o distrito da Mooca
(770 ha, população 75.724 hab.) em quinze setores. Prosseguindo, o estudo deverá
contemplar os setores e subsetores, segundo a ideia de conhecer a cidade por partes. Os
subsetores ou partes, mesmo as menores podem ser consideradas como suporte para
projetos urbanos localizados, dez hectares por referência, onde o programa da
requalificação dos espaços a ser empreendido brota de duas vertentes:
. Necessidades e aspirações locais através de programas bottom up, como os planejadores
urbanos que são sensíveis para as questões sociais sabem bem conduzir.
. Projetos para espaços multiusos incluindo ou não habitação social, portanto, voltados para
quaisquer das faixas de renda e desenvolvidos por iniciativa de empresa de urbanização
privada, de maneira independente ou em parceria com empresa pública, respeitado o aval
oficial relativo à compatibilização com o plano diretor do município. Estas maneiras de
atuar geram transformações na forma urbana e instigam o prosseguimento da análise dos
tecidos através dos corredores e subáreas como suporte para uma gama variada de
projetos.
As características físicas do corredor que atravessa um setor ou subsetor se expressam por:
. Largura da caixa da via (rolamento e calçadas) e seu comprimento;
. Largura da frente dos lotes e profundidade;
. Recuos exigidos de frente, fundo e laterais;
62

. Altura das edificações e sua superfície em projeção horizontal;


. Paisagismo, mobiliário urbano e sinalização.
Na qualificação de uma via, além das características funcionais relativas à engenharia de
tráfego, indispensáveis para facilitar o movimento dos veículos e segurança, há outro
elemento móvel importante que são as pessoas. Protagonistas indispensáveis para o
projeto de uma via, primeiro informando a análise, depois as proposições. Para o projeto
de uma via, saindo um pouco da análise da forma física, importam cinco atributos de
qualidade dos espaços: imageabilidade, invólucro, transparência, complexibilidade e escala
humana, segundo a conclusão da equipe de Reid Ewing, relativa à investigação quantitativa
junto às pessoas e realizada através de pesquisa de campo na América do Norte (EWING,
2013). A via em si pode ser analisada quanto a seus aspectos de eficiência técnica e
funcional, o que se faz correntemente. Quando se considera o invólucro, entra o elemento
tridimensional da qualidade dos espaços; vai se estudar as características do corredor e da
boa caminhabilidade das pessoas, que engloba todos os aspectos da análise, além da
morfológica que é o objeto presente de nosso estudo.
Como exemplo de aplicação dos procedimentos de corredores e subáreas, CS, se escolheu
o setor 7 e nele foram escolhidos três subsetores para estudo. A preferência por este setor
com área de 85,41ha foi decidida pela peculiaridade de seu tecido urbano estar assente no
centro do distrito, desde uma linha de espigão a nordeste e descer na direção sudoeste até
encontrar a ferrovia, passando por situações diferenciadas do tecido urbano. A declividade
que varia de 1 a 7% - em média 4% - facilitou na faixa do espigão, o traçado original das
quadras com o comprimento de 100 m, e neste trecho se encontra a via que atravessa A2.
Neste local era prevista a predominância de imóveis residenciais de padrão alto e médio-
alto; descendo a sudoeste uma faixa intermediária de residências de padrão médio,
comércio, serviços, instituições públicas e privadas, mescladas com ocupação industrial
de pequeno porte até chegar na área de várzea – terrenos planos- onde as ocupações de
tipo industrial de médio e grande porte, se somam a pequenas indústrias, moradias
operárias e serviços, nos terrenos mais próximos à ferrovia, figura 3-1.
A área relativa aos setores 2, 3, 4, 7 e 8 define o parque industrial beneficiado por ocupar
terras planas nos dois lados da ferrovia, a noroeste no setor 7 e a sudoeste nos setores 3 e
4. A faixa de domínio da ferrovia (tracejado) acompanha o eixo de um rio canalizado que é
CORREDORES E SUBÁREAS - 63

ladeado por vias que atravessam a cidade e assentes nas cotas mais baixas como mostra a
figura 3-1.
Figura 3-1: o distrito, seus setores, em destaque o setor 7

Fonte: diagrama do autor

No setor 7, pelo conhecimento dos fluxos utilizando sete vias que atravessam (traço grosso)
e três que distribuem (traço estreito) foi possível definir sete subsetores (do 7a até o 7g).
Este setor é uma porção do distrito da Mooca que contribui até hoje com a história das
transformações que vem ocorrendo no todo da cidade. O conhecido processo
socioeconômico de passagem da condição de cidade industrial para uma cidade
internacional de negócios e serviços.
Os três subsetores objeto do estudo são os identificados por 7a, 7b, 7e, conforme a figura
3-2 e iremos demonstrar como é possível se antever possibilidades de projetos para eles
que poderão enriquecer as relações de acesso público e privado valorizando os espaços
disponíveis, transformando-os em lugares para um bom convívio entre as pessoas, sendo
tratados como um ambiente gentil com a paisagem circundante. Para esta maneira de
64

pensar o projeto é fundamental o alinhamento das iniciativas privadas com as públicas,


com a garantia do maior investimento ser da responsabilidade do setor privado.

Figura 3- 2: setor 7, dividido em sete subsetores.

Fonte: diagrama do autor

Para os leitores que conhecem a cidade foram nomeados os logradouros. Quem não a
conhece pode prosseguir na leitura tranquilamente pensando sobre as vias que atravessam
e que distribuem, pois, a abstração contribuirá para classificar os tipos com maior
liberdade. Em quaisquer dos casos é indispensável conhecer o sítio através de visitas a pé.
Os indicadores físicos fortes que influem no traçado e em consequência na escolha que se
faz entre as vias que atravessam ou distribuem, são a largura, o comprimento e
observações sobre a atração de comércio e serviços no térreo e a ocorrência de unidades
residenciais e escritórios em cima. Atributos que servem de suporte à classificação utilizada
neste estudo para selecionar as vias que atravessam e as que distribuem.
Para o setor 7 apresenta-se a relação dos tipos das vias que atravessam e distribuem, com
a sua largura, comprimento e a área que elas ocupam. No desenvolvimento da investigação
a área ocupada pelas vias deverá ser cotejada com a área comprometida com os corredores
e a superfície remanescente das subáreas, figura 3-3. Na verdade, o quadro a seguir é uma
forma inicial de tabulação de dados que podem ser muito mais elaborados usando técnicas
avançadas de processamento de dados.
CORREDORES E SUBÁREAS - 65

Figura 3-3: Setor 7, Vias que atravessam e distribuem, em números.

Fonte: Autor, diagramação F. Martins.

O elemento urbano via (V), já foi objeto de considerações e continuará, pois, é o elemento
articulador dos demais. Agora, ênfase maior será dada para análise dos três outros
elementos da arquitetura da cidade, a quadra, o lote e o edifício (QLE), à luz de suas
relações com os componentes corredor (C) e subárea (S).
Os tópicos do trabalho incluem sequencialmente os assuntos primordiais da análise urbana:
as vias, as quadras, os lotes e os edifícios. As interfaces com os procedimentos dos
corredores e subáreas – CS - são destacadas com a finalidade de realçar os aspectos
decorrentes do uso do espaço que induzem substituições, nas e das construções atuais.
Devido ao comprimento dos corredores existem trechos com características específicas
que merecem atenção devido ao tipo de suas edificações e ao uso do solo atual. A análise
através dos corredores e subáreas torna possível identificar questões de interesse em
setores pequenos, cujo tecido urbano seja passível de reestruturação, pelos meios do
projeto urbano.
Ênfase é dado a análise através dos corredores e subáreas de modo tornar possível
identificar questões de interesse em setores pequenos, cujo tecido urbano seja passível de
reestruturação, pelos meios do projeto urbano. Busca-se nestes espaços a possibilidade de
66

o tecido urbano vir a ser o suporte para as pessoas se apropriarem dos espaços como um
lugar. Isto se manifesta em núcleos com variada formação do tecido, com uso de comércio,
serviços, pequenas indústrias ou moradia, em locais de patrimônio histórico ou ambiental
e em diversos casos em que o tipo do tecido tenha sido previsto para a finalidade precípua
de morar. Neste caso, o projeto de loteamento traçado para implantar lotes pequenos
destinados a residências (térreas e sobrados) é típico. Existem diversos trechos nos bairros
de São Paulo que vem resistindo ao ímpeto das incorporadoras devido à dificuldade de
negociar os imóveis pequenos e a ocupação não ser mais exclusivamente residencial como
de início (IMBRONITO; MACEDO, 2016).
No procedimento de estudo das partes da cidade há um momento de conclusão parcial de
determinada investigação, conforme as peculiaridades do contexto. Resultam elementos
de especulação teórica e programática possíveis de evoluírem como diretrizes de projeto.
Chega-se muito próximo a determinantes do projeto e ideias iniciais podem surgir. Mas,
guarda-se este assunto para os comentários posteriores.
As vias que atravessam são o palco das transformações mais frequentes que acontecem na
paisagem urbana devido ao atrativo locacional para todo tipo de uso do solo, como, morar
perto do transporte público, trabalhar em atividades de comércio, serviços e industriais,
estudar ou exercer atividades de lazer e convívio. Em consequência as frentes das quadras
voltadas para o corredor passam a ser disputadas para novas construções ou para
remodelações tendo em vista o potencial dos novos usos que nele se instalam. As
transformações são maiores em relação às que acontecem nas subáreas. Nos corredores,
vale observar a superfície dos espaços disponíveis em relação ao espaço das subáreas,
questão que sugeriu elaborarmos diagramas para cada um dos subsetores em estudo para
mostrar a proporção existente entre eles.

Os subsetores 7a, 7b e 7c

Como a divisão de um setor em subsetores determina espaços de menor superfície e com


frequência demarcados em todo seu perímetro por vias de distribuição, se utiliza esta
categoria de via para identificar os seus limites. O procedimento de análise admite que na
escala do subsetor a via de distribuição passe a categoria de via que atravessa, pois ela
tangencia o subsetor e serve para delimitar sua superfície. Isto direciona a mudança dos
CORREDORES E SUBÁREAS - 67

procedimentos da investigação para uma escala menor, ou seja, a escala do subsetor, de


relevância na sistemática de estudo.
A opção pelos subsetores 7a, 7b e 7c pertencentes ao setor 7, como exemplo de aplicação
dos procedimentos de análise da forma urbana pelos corredores e subáreas, deve-se à
influência da declividade no tipo de urbanização no sentido da várzea do rio. Condição
relacionada às diferenças de tipos entre QLE. A via A3 simboliza (ou simbolizava) tal
mudança de tipos, acusando o que se passa em cada uma das faixas (A2-A3 e A3-A5), ao se
caminhar para sudeste. A análise do tecido urbano pelo viés do suporte físico natural
contribui para contar a história das transformações em curso nos oitenta e cinco hectares
do subsetor 7.
No estudo dos três subsetores, dois deles os subsetores 7a e 7e, abrangem uma fatia
transversal e acompanham a via A1 (Rua da Mooca). O subsetor 7b se assenta desde a via
do espigão A2 (Avenida Paes de Barros) até a via intermediária A3 (Rua Canuto Saraiva).
Dele se pode entender o espaço edificado hoje - QLE - como consequência da história da
ocupação de lotes vazios, das transformações de moradias, galpões e demais
equipamentos de apoio, desde as cotas mais altas até a área de várzea, figura 3-4.
Observando a figura 3-4, nas quadras formadas por lotes de testada estreita aparecem
construções novas feitas pela junção de dois ou mais lotes. Espaços para edificações do tipo
comercial no térreo, com escritórios e residências nos pavimentos elevados. Este tipo de
edificação se repete nos bairros com a tendência de se situar nas esquinas. São prédios de
um, até quatro pavimentos (sem elevador) sendo a entrada estreita feita pela rua, dando
para um pequeno hall de acesso a escada. Neste tipo, o acesso estreito acontece para não
se perder frentes para as lojas. É um tipo de empreendimento que historicamente se
associa aos pequenos investidores do bairro e convive bem com as construções vizinhas de
menor gabarito ou com os novos edifícios em altura. Neste padrão do tecido urbano é
interessante que participem da construção os incorporadores privados de porte pequeno,
médio e grande. Eles promovem diversidade para o tecido da cidade e mostram a
flexibilidade do parcelamento das quadras em lotes pequenos e médios a favor dos
empreendedores menores, em contraste aos empreendedores dos grandes condomínios
como pode se observar na figura 3-4, desde a via A2 até a ferrovia.
68

Figura 3- 4: subsetores 7a, 7b e 7e, voo de pássaro

Fonte: Google Earth, diagrama do autor

As transformações dos bairros industriais no entorno do centro da cidade dando lugar a


usos e tipos de ocupação que se transformam em função da vocação da cidade para ser um
centro internacional de comércio e serviços, torna visível a presença de condomínios no
lugar das fábricas, como ilhas muradas onde os jardins estão sobre as lajes que cobrem as
garages. Também sofrendo transformações segue o tecido regular da cidade, em um
contexto em que a quantidade de áreas verdes públicas é pequena, condição explicável
para os bairros industriais de concepção antiga onde o verde não era um requisito
ambiental e muito menos era exigido oficialmente. Apresenta-se a seguir uma planta geral
onde se destacam os subsetores 7a, 7b e 7c sob análise. O setor 7 tem a superfície de 85,41
ha, os três subsetores somam 37,03 ha o que significa ter a área em estudo 43% do setor
CORREDORES E SUBÁREAS - 69

7. Situa-se este procedimento no conceito geral de estudar a cidade por partes: a


pequenina demonstrada pelo subsetor 7a, um trecho caracterizado por ocupação singular
como o subsetor 7b e uma parte do tecido que se encontra em acelerado processo de
transformação como o subsetor 7e, destacados na figura 3-5.

Figura 3-5: planta do setor 7, em destaque os subsetores 7a, 7b e 7e

Fonte: diagrama do autor

As construções desde as cotas altas do espigão até a várzea, tem uma diferenciação visível
do modo como os lotes são ocupados e dos tipos das edificações. Desde as quadras
traçadas originalmente para residências de classe média-alta no espigão (lotes de 600 a
1.500 m²) até a área de várzea onde se instalaram as plantas das indústrias de grande porte
é nítida a gradação dos espaços ocupados por moradia, comércio e serviços até a industrial.
Padrão este que vem sendo alterado pela saída das indústrias grandes e médias para dar
lugar a novos usos, que acarretam transformações significativas nos espaços existentes e
fazem nascer novos tipos de edificação.
O subsetor como fração a ser estudada se assemelha ao conceito de área-estudo conforme
foi definido por Aldo Rossi:

Introduzirei o conceito de área-estudo. Já que supomos existir uma


interrelação entre qualquer elemento urbano com um fato urbano de
natureza mais complexa, até a cidade que eles se manifestam, devemos
esclarecer a que entorno urbano nos referimos. Esse entorno mínimo é
considerado área-estudo, uma abstração relativamente ao espaço da
cidade; ela serve para definir melhor um determinado fenômeno. Por
exemplo, para compreender as características de determinado lote e sua
70

influência sobre um tipo de habitação, será necessário examinar os lotes


contíguos aqueles que precisamente constituem um certo entorno, para
ver se tal forma é de todo anormal ou se ela nasce de condições mais
gerais da cidade (ROSSI, 1966, p.23).

Na aplicação dos procedimentos dos corredores e subáreas a área-estudo se apresenta com


diversas variações de contorno e na prática de urbanismo ela deve ser configurada para
implantar um projeto urbano, com programa aceito pela sociedade, verba e prazos
definidos. No município de Nova Iorque, EUA, esta maneira de atuar fica associada a uma
área bem delimitada, o special district, conceituado pelo arquiteto-professor Jonathan
Barnett, quando foi responsável pelo grupo de urban design da prefeitura, nos anos 1960 -
70 (BARNETT, 1974).
Como sempre, se recomenda o entendimento detalhado do espaço em apreço, devendo os
subsetores 7a, 7b e 7c serem analisados segundo a sua inserção física no espaço maior do
setor, tendo atenção para:
. As características físicas das vias que o delimitam quanto ao fluxo de veículos, de pessoas,
do uso do solo, da sua largura e comprimento;
. As vias limítrofes enquanto responsáveis pelos corredores que definem as subáreas;
. As quadras que acompanham os corredores, suas dimensões e tipos de lotes;
. Os lotes, suas dimensões e quantidade por quadra;
. O tipo de edificação, a original e a adaptada para novo uso;
. O tipo da projeção horizontal do térreo da edificação em relação ao lote, recuos frontais
e laterais;
. O volume das edificações quando compõem um conjunto definido por um bloco vertical
sobre um embasamento maior que sua projeção horizontal;
. A quantidade de quadras, lotes e edificações classificadas por seus tipos.
Os diagramas ou plantas temáticas de cada subsetor, apresentadas de forma esquemática
por desenhos, devem mostrar:
. Sua posição em relação ao setor;
. Os corredores a eles associados (preenchidos em preto) e a subárea (sem preenchimento);
. As vias que fazem seus limites, adaptadas à nova situação no caso de distribuidoras que
passam a função de vias que atravessam;
CORREDORES E SUBÁREAS - 71

. As vias de distribuição do subsetor;


. Os espaços destinados às edificações principais, por quadra, já postas as restrições atuais
para os recuos obrigatórios;
. A projeção horizontal dos prédios (figure ground);
As imagens fotográficas do Google Earth e as tomadas pelo pesquisador, devem ter as
características seguintes:
. Aéreas do Google mostrando os setores em conjunto (distrito da Mooca) e em separado
cada setor e subsetor, com desenhos indicativos complementares quando oportuno;
. Aéreas do Google mostrando o espaço do corredor relativo a cada subsetor, com
indicação gráfica da posição das fotos com o observador situado o mais próximo do eixo da
via;
. Vista tipo voo de pássaro de cada subsetor, para mostrar sua inserção urbana.
. As fotografias do observador a nível do solo, além das outras ditas acima pelos eixos dos
corredores que atravessam e os que distribuem, devem mostrar os tipos básicos da relação
edifício lote para cada subsetor (seis tipos em relação aos recuos);
. Os dados quantitativos quando necessário devem aparecer individualmente ao longo do
texto, ou quando constituírem um grupo de informações serem formatados como tabelas.
A seguir serão tratados os corredores provenientes da subdivisão do território do setor 7
em subsetores. Destaca-se o fato de um corredor ser composto por duas faixas contínuas
assentes em setores vizinhos. Sua separação física é feita pelo eixo da via associada ao
corredor, que por definição o delimita. Esta composição híbrida faz do corredor ser uma
entidade autônoma, por explicação anterior, definido pela soma da largura da via, de
outros sistemas lineares paralelos quando existirem, mais as faixas opostas de lotes
lindeiros. Interceptando-se, os corredores deixam ‘miolos’, que são as subáreas, podendo
este conjunto ser entendido na cidade como um sistema celular. Para o estudo de um setor
isoladamente deve ser respeitada a linha de eixo das vias e se considerar as faixas dos
corredores dentro do setor somada a subárea por eles determinada.
Voltando aos três subsetores em estudo apresenta-se a superfície de cada uma das
subáreas, figura 3-6.
72

Figura 3-6: superfície das subáreas 7a, 7b e 7e.

Fonte: Autor. Diagramação: F. Martins

O subsetor 7a: VQLECS

O subsetor 7a, com área de 6,09 ha, é uma parte do setor 7. Seu perímetro foi representado
em planta na figura 3-1 por três vias que atravessam A1, A2 e A3 e uma que distribui, D1.
A via A1 corta o distrito no sentido Leste-Oeste sendo um antigo percurso desde a área das
grandes indústrias para localidades centrais da cidade; a via A2 seguindo o espigão tem o
caráter de servir as localizações a Nordeste e Sudoeste do distrito, marcada na paisagem
por ocupar a faixa de terrenos com cotas elevadas; a via A3, marca os níveis intermediários
do setor 7 e no trecho correspondente ao subsetor 7a ainda não acontece o processo de
verticalização; a via D1 de ligação entre A2 e A3 tem o aspecto de via distribuidora dos
fluxos para as vias locais e apresenta uso misto por transformação de casas térreas e
sobrados existentes, figura 3-7.
Observa-se na foto 3-7A, a via A1 - Rua da Mooca - uma via tradicional que atravessa o
distrito. Ela possui trechos com características diferentes do ponto de vista do uso e da
ocupação do solo. No trecho do subsetor 7a, entremeado com prédios baixos de térreo
comercial e superior residencial, hoje serviços, existem alguns prédios altos de até seis
pavimentos, são construções antigas.
Na foto 7B, a via A2, Avenida Paes de Barros, antigo traçado no sentido norte-sul,
transformação do residencial de padrão elevado para comércio e serviços; edifícios altos.
Na foto 7C, via D1, Rua Leocádia Cintra, seu papel é de distribuição.
Na foto 7D, via A3, Rua Canuto Saraiva / Orville Derby, via que atravessa cortando o setor
7 no sentido norte-sul.
CORREDORES E SUBÁREAS - 73

Figura 3-7: vista dos corredores

Fonte: fotos do autor 12.11.2018

Para efeito de estudo ao se destacar um subsetor do setor, quando o seu limite for marcado
por uma via de distribuição esta assumirá o papel de via que atravessa, procedimento
válido para o subsetor específico. O subsetor 7a para estudo em separado do setor 7 passa
a ter esta interpretação, figura 3-8.
Em 3-8A, é possível observar que a via D1 passa a ter o padrão de uma via que atravessa e
a via interna deveria ser classificada como via que distribui, por unir duas vias que
atravessam e tem apenas o comprimento de uma quadra. No entanto, ela adquiriu um
forte caráter local, pois não é atrativa para o tráfego de passagem, atende vizinhança
sobremaneira residencial e assim se contextualiza como uma via local. Em 3-8B, como
vislumbre para um projeto a via local interna foi nomeada como A2a, seja como
distribuidora ou local sugere tratar os seus espaços de acesso como portais de chegada
protegendo uma área. Isto pode ser marcado como diretriz para o desenho facilitar a esta
via ter caráter único, identificado pelos acessos (via e marcos de referência) a serem
tratados como arquitetura da cidade. Tudo que um bom projeto de arquitetura poderá
explorar através da construção de custo relativamente baixo, com modificações apenas na
caixa das vias, no paisagismo, mobiliário urbano e sinalização, figura 3-8.
74

Figura 3-8: subsetor 7a, vias que atravessam e distribuem

Fonte: diagrama do autor

As vias que atravessam A1, A2 e A3 de longo percurso fazem ligações entre bairros e
possuem um eficiente sistema de linhas de ônibus de longa distância. Elas definem
corredores que estão em processo de transformação do uso do solo com predominância
para comércio, serviços e de instituições privadas. Os corredores nesta situação são
ponteados por edificações com uso para escritórios e habitações nos pavimentos
superiores, espaços institucionais e industriais. No processo de análise destes elementos é
interessante considerar o balanço entre a área ocupada por corredores e aquela das
subáreas. Em São Paulo as subáreas apresentam uso misto, de menor intensidade
comparado aos corredores e, a menos de áreas centrais, a predominância é para o uso
residencial, o confirma a afirmativa de que o uso misto se se espalha por toda a cidade.
Reforçamos a observação de que visualmente os diagramas mostram que o percentual de
espaços públicos e privados comprometidos com os corredores é alto. São espaços
importantes para os deslocamentos maiores das pessoas, trabalhar, usufruir do comércio
e de vários tipos de serviços. Isto é, portanto, uma condição que favorece o contato entre
as pessoas e como a cidade toda, merecem ter o projeto dos espaços com boa qualidade.
A figura 3-9 apresenta os diagramas. Em 9A, encontra-se o diagrama dos corredores que
atravessam o subsetor 7a. Em 9B, como um exemplo de diagrama, aparece apenas a porção
dos corredores relativa ao subsetor 7a, com a intenção de acentuar pela observação
CORREDORES E SUBÁREAS - 75

empírica a diferença entre a área ocupada pela subárea e as faixas de corredores que
pertence ao setor 7A.
Figura 3-9: subsetor 7a, corredores que atravessam

Fonte: diagrama do autor

Na figura 3-9, o tipo de diagrama usado para a análise da forma urbana chama atenção para
o contraste entre a área ocupada pelos corredores com relação à superfície da subárea.
Procedimento este recomendado para ser utilizado nos estudos da forma urbana para
expressar com força a diferença entre os componentes CS do tecido da cidade. Vale lembrar
que o corredor é um elemento urbano que abrange os dois lados em relação ao eixo da via
entre setores contíguos e que para efeito de estimar dados quantitativos separados por
setor, se utiliza as porções internas ocupadas pelo corredor.
A dimensão pequena do subsetor 7a serviu de apoio para mostrar a relatividade da
classificação que se faz em vias que atravessam, distribuem e locais. Reporte-se a figura 6,
onde pela análise do diagrama 5B, a via A2a poderia ser classificada como via local ou de
distribuição. Por opção a preferência foi considerar esta via como local, devido às
características como largura e comprimento, edificações e arborização, além do fato de ela
ter o comprimento de apenas uma quadra. Os prédios altos nela existentes abrigam
condomínios residenciais em lotes grandes e de pouca profundidade obtidos a partir da
agregação de lotes de pouca largura acompanhando o alinhamento da rua. Condição que
sugere o potencial do logradouro para receber diretrizes que reforcem ainda mais seu
caráter de recinto residencial, figura 3-10.
76

Figura 3-10: via A2a - rua Olímpio Portugal.

Fonte: foto do autor 12.11.2018

Os corredores resultantes de vias que atravessam e das que distribuem são ambos
apresentados em diagramas conjugados, procedimento que será utilizado para os
subsetores 7b e 7e. No caso do subsetor 7a se a via interna – A2a – fosse considerada de
distribuição, estaria se prevendo o uso do solo por atividades mistas em todo o subsetor e
não de predominância residencial no miolo como foi tratado.

O subsetor 7b: corredores e subáreas

A área deste subsetor é 16,27 ha. Ele fica situado entre a via que atravessa de cota mais
alta (A2), a via A1, que desce no sentido da ferrovia, a via A3, em cota intermediária e a via
D1 que separa o subsetor 7b do vizinho subsetor 7a. As imagens a seguir retratam o padrão
construtivo destas vias, o tipo da ocupação dos espaços edificados e a arborização nela
existente, figura 3-11.
CORREDORES E SUBÁREAS - 77

figura 3-11: subsetor 7b, vista dos corredores que atravessam

Fonte: autor, 12.11.2018

Em 11A, aparece a via D1 (rua Leocádia Cintra) comentada na descrição do subsetor 7a, na
qual se acrescenta ter um bom potencial para requalificação, principalmente quanto à
largura e qualidade das calçadas. Em 11B, a via A2 (avenida Paes de Barros) em tempo de
verticalização. Em 11C, a via D2 (rua Curupacê), uma típica via de distribuição plena de
pontos de uso misto e transformação de casas para edifícios de meia altura, residenciais ou
mistos. Em 11D, a via A3 (rua Canuto Saraiva e continuidade para a rua Orville Derby), figura
3-11.
Considerado para estudo em separado, no âmbito de 7b as vias D1 e D2 atuam como vias
que o atravessam e no espaço interno do setor 7 funcionam como distribuidoras, vias D1a
e D2a,
Para a elaboração dos diagramas dos corredores utiliza-se procedimento semelhante ao do
subsetor 7a, figura 3-12. Em 12A, a planta do subsetor como parte do setor 7. Em 12B, o
78

setor como unidade autônoma para estudo, onde D1 e D2 fazem as vezes de vias que
atravessam.
As vias que atravessam o subsetor 7b no sentido noroeste-sudeste são parte do sistema de
ligação do setor 7 com a cidade e tem importância fundamental para a distribuição dos
transportes públicos do centro da cidade para a zona sul. As vias transversais de
distribuição, nordeste-sudeste, fecham o subsetor e servem ao tráfego de acesso local dos
transportes públicos. Deve-se observar a dimensão das subáreas com relação aos
corredores em ambos os casos e ponderar que em D1 e D2 o uso do solo comercial e de
serviços é para suprir as necessidades mais próximas dos moradores, figura 3-13.

Figura 3-12: Subsetor 7b, vias que atravessam e distribuem

Fonte: diagrama do autor

Figura 3-13: subsetor 7b, corredores que atravessam e distribuem

Fonte: diagrama autor


CORREDORES E SUBÁREAS - 79

Este setor tem uma forte vocação residencial, foi projetado em lotes pequenos, para
receber casas térreas e sobrados, verificando-se as construções em fileiras ou casas
geminadas aos pares. Na formação das quadras se utilizaram formas que reportam as
cidades jardins inglesas onde estão presentes organizações tipo cul-de-sac e loop. Este
traçado baseado em vias locais garante o caráter do setor como uma vizinhança residencial.

O subsetor 7e, corredores e subáreas

A área deste setor é de 14,67 ha. Fica compreendido entre as vias A1, A3 D3 e A5. Tem a
peculiaridade de ser cortado pela via que atravessa A4, que compõe um binário com a via
A5, que é uma das vias que delimita o subsetor. A via A1- Rua da Mooca – que levou o nome
do subdistrito resultou de traçado antigo e permanece como um extenso caminho de
ligação bairro - centro, sem ter havido alterações substanciais na sua largura de quinze
metros. As vias A3, A4 e A5, traçadas para a distribuição do movimento de caminhões tem
dezoito metros de largura e estão assentes na área das grandes indústrias. Na parte interna
do subsetor 7e, a via D3 foi responsável pela distribuição do tráfego para indústrias que
hoje já estão na maioria transferidas para outros locais, figura 3-14.
Figura 3-14: subsetor 7e, vista das vias que atravessam

Fonte: fotos do autor


80

Em 14A, na rua da Mooca aparece o processo lento de transformação da volumetria ao


longo do corredor, verificado pela presença de tipos desde a casa até o prédio de dezesseis
pavimentos.
Em 14B, a rua Orville Derby na parte menos verticalizada do corredor do qual faz parte.
Em 14C, a rua Guaratinguetá que mostra em primeiro plano a situação remanescente de
ocupação industrial e ao fundo a grande transformação devido a construção de
condomínios residenciais.
Em 14D, rua José Antônio de Oliveira no subsetor 7e, toda ocupada por condomínios
residenciais em um dos lados e do outro pelo padrão repetitivo das construções
tradicionais do distrito da Mooca.
As vias estão indicadas na figura 3-15. Em 15A, vias que delimitam o subsetor e definem o
seu perímetro. Em 15B, a subdivisão criada pela via A4 divide o espaço em dois subsetores
e observa-se que a via D3 distribui no trecho entre as vias que atravessam. Este caso é
semelhante ao que acontece no subsetor 7A, reforçado pela observação de que os terrenos
remanescentes de indústria tendem a ser ocupados por condomínios residenciais.
Figura 3-15: subsetor 7e, vias que atravessam e distribuem

Fonte: diagrama do autor

Na figura 3-16, aparecem os corredores, em 16A aqueles relacionados ao perímetro da área


e em 16B, onde se considera o binário. Em uma situação como esta, onde os lotes são
grandes, se pode verificar a desproporção das áreas entre as subáreas e os corredores e
isto demonstra o grande potencial para uso misto no subsetor 7A, figura 3-16.
CORREDORES E SUBÁREAS - 81

Figura 3-16: subsetor 7e, corredores que atravessam e distribuem

Fonte: diagrama do autor

As quadras. os lotes e os edifícios

Para se identificar um setor pequeno (área-estudo) seja para o planejamento na esfera dos
órgãos oficiais, seja como resposta a demanda de uma comunidade local, ou pelo interesse
de implantar um empreendimento privado, quanto menor for a parte estudada maior
poderá ser a acuidade no estudo dos tipos de construção relativos aos elementos urbanos;
matéria central de interesse neste manuscrito. No espaço menor, maior atenção poderá
ser dispensada às reivindicações por moradia, a qualidade de vida, gestão e aos requisitos
essenciais ao desenvolvimento de um projeto urbano baseado em um programa que
considere as características físicas do local, a disponibilidade financeira e a vontade de
empreender. Requisitos cuja resposta depende de como interpretar com realidade as
demandas e estar atento à capacidade de inventar arranjos de espaços adequados às
pessoas, na linha de uma linguagem de padrões como foi idealizada pelo matemático e
arquiteto-professor C. Alexander [5].
Tem-se o cuidado de não extrapolar o estudo da forma física - morfologia e análise urbana
para outras áreas do conhecimento, sem dúvidas importantes e com certeza urgentes do
campo do planejamento urbano; por isso nos preocupamos em ficar no campo dos
procedimentos de análise do espaço construído.
A atenção é voltada para a implantação das edificações em relação ao lote e a quadra com
a finalidade de identificar situações-tipo. Interessam em particular os casos da existência
82

ou não de recuos entre o alinhamento da edificação privada ou institucional, em relação a


calçada representativa do espaço público de acesso irrestrito. Interessa o afastamento das
edificações em relação às divisas laterais do lote como fator que individualiza os edifícios e
passa caracterizar o tipo de volume construído da quadra.
Os fundos de lotes representados pelo quintal das casas ou o recuo de fundo das
construções em altura, na sequência de lotes que formam a quadra são relegados a um
tratamento à parte de interesse menor. No tecido tradicional as elevações de frente, até
mesmo quando há exigência de recuos laterais, são pensadas para serem vistas como uma
extensa fachada da quadra, em ordem a caracterizar a forma vista desde o espaço público.
Desta maneira as fachadas podem ser entendidas como o invólucro (enclosure) do
logradouro. Este é um dos itens importantes da composição urbanística tradicional,
matéria constante nos dizeres de diversos autores. Da forma urbana tradicional decorre a
interação do espaço edificado e a rua, a entrada principal do imóvel, a configuração da
frente voltada para o logradouro no pavimento térreo como um elemento regulador
daquilo que interessa ou não mostrar no primeiro plano da edificação, seja privada,
condominial ou institucional.
Na integração do térreo de uma edificação com o espaço público são seis as possibilidades
de relacionamento, figura 3-17. Em 17A, 17B e 17C os diagramas mostram a projeção
horizontal de edificações construídas no alinhamento da via, comuns no urbanismo
tradicional e cujo regramento perdurou até os anos 1970 na cidade de São Paulo.
Possibilidade existente sem impedir aqueles que optam por recuo maior, como o caso de
prédios institucionais ou residenciais em terrenos grandes. Em 17D, 17E e 17F aparecem
diagramas de lotes onde as construções adotam recuo em relação à calçada, resultantes
das diretrizes urbanísticas para o município. Em São Paulo o recuo mínimo em geral é de
cinco metros e existem diretrizes que se aplicam aos lotes de esquina, para o caso de lotes
estreitos na quadra como um todo. É corrente o caso de edificações em fileira, construídas
por um único empreendedor. A legislação de 1972 se completa abrangendo recuos laterais
e de fundos e daí se identificam os seguintes mostrados no diagrama da figura 3-17
CORREDORES E SUBÁREAS - 83

Figura 3-17: As implantações típicas.

Fonte: diagrama do autor

Os tecidos urbanos se modificam ao longo dos anos dependendo dos espaços livres ainda
possíveis de serem ocupados, se transformam em construções e se ampliam com partes
anexas ou conjugadas, para receberem as atividades novas requeridas pela sociedade. Este
processo de crescimento acontece de modo simultâneo e o tópico seguinte, como uma
conclusão parcial desta pesquisa, ilustra o processo a partir das transformações do tecido
urbano que vem ocorrendo nos três subsetores em estudo.

Considerações sobre o capítulo 3

Os subsetores estudados se consolidaram ao longo de muitos anos, acompanhando o ritmo


de desenvolvimento de São Paulo. Decorreu do passar do tempo um aumento da
intensidade do fluxo de pessoas, de veículos e houve a evolução do sistema de transportes
públicos, como fatores consequentes do adensamento populacional. No distrito da Mooca,
isto as transformações se manifestam pelo processo gradual de transferência das indústrias
grandes para outros sítios, da resiliência das instalações industriais menores e oficinas, da
transformação de residências para outras atividades e pela chegada dos edifícios em altura
para habitação, comércio e serviços. Este processo também gerou o aumento do número
de construções para abrigar atividades institucionais, mas, sem expectativa de melhora
qualitativa do sistema de áreas verdes e da criação bons recintos públicos destinados às
pessoas.
Decorrente das transformações do tecido tradicional - em toda a cidade de São Paulo -
ressalta-se a ocupação das esquinas por prédios mistos de térreo comercial ou para
serviços, sendo comum nas quadras, seja residencial ou mista, se destacarem
configurações deste tipo, figura 3-18.
Em 18A, edifício comercial térreo construído com recuo para uma das vias que hoje serve
84

como área de estar, protegido por cobertura leve, versão simplificada de edifício de
esquina. Em 18B, comércio no térreo, residência ou escritórios em cima, um tipo que se
repete por toda a cidade. Em 18C, uma versão contemporânea de imóvel com três
pavimentos, cujo proprietário é um pequeno investidor, ele batizou a lanchonete do térreo
por ‘Deu Certo’, fazendo uma clara alusão ao sucesso de seu empreendimento. Em 18D,
esquina com cinco pavimentos, elevadores, o escritório de uma única empresa em
contraste com as edificações em fileira com dois pavimentos do restante da quadra. Os
tipos descritos em 16A e 16C são exemplos escolhidos de bairros de origem industrial fora
da Mooca e atestam a universalidade deste tipo de ocupação em lotes de esquina.
Figura 3-18, tipo de edifícios de esquina

Fonte: fotos autor, 2018

A ocupação das esquinas evolui para o processo de verticalização que se estende por toda
a quadra, testemunho da flexibilidade do parcelamento por lotes pequenos e da ação de
empreendedores de porte diferenciado. O uso misto comparece em toda a cidade de São
Paulo. Além de sua presença efetiva, nos corredores a mistura de usos aparece com
CORREDORES E SUBÁREAS - 85

frequência nas subáreas. Adapta-se nas casas térreas e sobrados, em galpões e informa
novos programas para projeto de edificações a serem construídas para tal finalidade.
Observa-se que em alguns distritos da cidade o zoneamento prescreve o uso estritamente
residencial, como é o caso dos bairros-jardim, mas, a realidade mostra a inevitabilidade de
vias que atravessam esses bairros se transformarem em corredores de uso misto,
particularmente para o segmento de serviços. Há pressão dos responsáveis por lojas e
escritórios, ocupando irregularmente residências para forçar o órgão municipal de
planejamento a propor modificações na lei de uso e ocupação do solo. Dando
prosseguimento a esta maneira de analisar o tecido urbano procede-se na pesquisa para o
trato mais pormenorizado dos tipos de edificações e seus padrões de agrupamento, tendo
como referência os seis tipos de relação de lote-edificação e sua influência na forma da
cidade.
86
CORREDORES E SUBÁREAS - 87

CAPÍTULO 4 - Quadras, lotes, edifícios

O procedimento para analisar a forma de tecidos urbanos através dos corredores e


subáreas vem sendo demonstrado por sua aplicação em um setor do distrito da Mooca.
Nos capítulos 2 e 3 foram estudados os espaços livres e os construídos, se conceituou a via
como definidora de setores e subsetores, o corredor como resultado da soma de lotes das
faixas lindeiras à via que atravessa ou distribui e, a subárea como o miolo cujo perímetro
fica definido pela linha de fundo dos lotes situados em corredores que se interceptam.
Dentre as vias, que atravessam, que distribuem e locais os dois primeiros tipos têm sido
objeto de atenção desde o capítulo 2, pois, elas constituem as ligações principais e definem
os perímetros dos setores e subsetores.
Para objeto específico de investigação foi escolhido o setor 7 da Mooca e três de seus sete
subsetores; conforme discutido no capítulo 3. No setor 7 foram nomeados as vias e os
subsetores. Para avançar no estudo das quadras, lotes e edifícios, QLE, a base da figura 34
será novamente utilizada para facilitar a visualização do conjunto e destacar os três
subsetores tomados como objeto de estudo na figura 4-1.

Figura 4-1, subsetores 7a, 7b e 7e.


88

Fonte: diagrama do autor


Neste capítulo será finalizado o estudo dos elementos VQLE: vias, quadras, lotes e edifícios,
incluindo o espaço das subáreas e os percursos locais. Deve-se distinguir as situações de
corredor e de subárea, com destaque para o fato de que o renque de lotes que integra o
corredor se assenta em dois setores ou subsetores opostos em relação a via. Em
consequência, para o cômputo de áreas e demais estudos relativos ao espaço de um setor
será necessário desmembrar as duas faixas de corredores, ficando o espaço relativo ao
sistema viário à parte, entendido como um espaço público que atende a setores opostos e
irá atender outros setores mais adiante. Em consequência a tabulação de áreas relativas ao
sistema de vias que atravessam e distribuem poderá ser elaborada quando do
levantamento do conjunto de setores por inteiro.
Neste quarto capítulo, serão tratados conceitos e os tipos de QLE, matéria de referência
seja para a pesquisa acadêmica como para a formulação de diretrizes de projeto urbano. O
resultado obtido deixa explícito que o maior conhecimento do lugar incentiva o avanço de
ideias e conceitos relativos à substituição dos elementos urbanos, impostos pelas
transformações requeridas pelas pessoas no andar do tempo. E, como a presente
investigação de base física sobre os elementos urbanos se desenvolve sob a
responsabilidade de um arquiteto-desenhador, não se poderia deixar escapar a
oportunidade de ir além da análise acadêmica, e indicar possíveis caminhos de partida para
o projeto, como um porvir dos espaços dos três subsetores. Arquiteto-desenhador, se
entende como o profissional que no desenvolvimento de um projeto tem a
responsabilidade de dar a forma física aos elementos urbanos programados por um grupo
de trabalho interdisciplinar.

As quadras

Com frequência nas cidades de tecido tradicional, em áreas de pouca declividade, as


quadras são retangulares ou quadradas. Em São Paulo, as quadras localizadas nos terrenos
com inclinação acentuada, tendem a ser desenhadas em forma de setores de círculo, com
vias radiais buscando centros distantes e isto independe do padrão social a que se
destinam. Lembrando as formulações do biólogo-matemático inglês D'Arcy Wentworth
Thompson (1917), pesquisador sobre a morfologia dos seres vivos e artefatos humanos,
CORREDORES E SUBÁREAS - 89

esta forma se assemelha a um retângulo deformado por uma força de origem no centro de
um segmento circular. Disto resulta a forma de trapézio arqueado que possibilita
regularidade na subdivisão da quadra e o parcelamento em lotes pequenos: em aclive a
partir da via de cotas mais baixas e em declive para os lotes com acesso pela via mais alta
(THOMPSON, 1917).
A literatura sobre o desenho de quadras, em maioria, tem atenção voltada para aquelas de
ocupação residencial. Certamente porque o tipo de organização das áreas de moradia e a
superfície necessária são elementos decisivos no projeto do espaço urbano e isto não foi
diferente em São Paulo. Elas influem na escolha da implantação dos demais espaços da
cidade, particularmente quando comparado ao posicionamento das indústrias. Nesta
cidade é fácil notar no entorno do centro tradicional como os ricos foram para os lugares
mais altos e a classe laboriosa pontuou as zonas industriais de terrenos planos das várzeas
dos rios, misturadas com as glebas adequadas para a implantação das indústrias de grande
porte. Localização compreensível para o tempo em que os empreendedores não se
preocupavam com a qualidade do ambiente urbano. Na apresentação do Setor 7 (capítulo
2) este assunto foi tratado, agora faz-se lembrar que junto ou muito próximo aos setores
industriais estão trechos loteados para as residências de trabalhadores. Como hoje em dia
os bairros industriais estão sendo reutilizados para abrigar o segmento de classes de renda
média e alta, e outros serviços da cidade global acompanhados de atividades para comércio
e serviços, elas se misturam com as locações existentes das indústrias de porte médio e de
oficinas. Além dos espaços residenciais, a ocupação atual requer localizações para
escritórios, lojas, galpões para manufaturados; exigindo áreas livres e verdes que no tempo
das grandes indústrias não se considerava necessário.
A acelerada transformação do uso e ocupação dos espaços em São Paulo, acontece sobre
um tecido do tipo tradicional, onde é difícil alterar o traçado, até mesmo para a
implantação das obras indispensáveis à trama de infraestrutura. Hoje em dia, junto a rede
de transportes públicos o plano diretor municipal estimula a previsão para áreas de
empreendimentos de uso misto de grande porte. São Paulo seguindo o modelo de outras
megacidades desponta para a construção de conjuntos híbridos, integrados aos modais de
transportes, com serviços, moradia e seus complementos. A diversidade destas
90

construções é gerada através de programas para prover abrigo para as pessoas segundo
novas circunstâncias. Processo que acaba por enriquecer e dar complexidade à forma
urbana, ao reparcelamento das quadras existentes, que são flexíveis o suficiente para
suportar transformações significativas em seu interior. Em algumas situações elas ficam
vizinhas e passam a dar continuidade a construções programadas para ocupar espaços
compartilhados com o das estações de transporte, trem, metrô e ônibus, associados a
habitação, comércio, serviços e seus espaços complementares, passam a formar os ditos
edifícios híbridos (ARPA et al, 2014).
O conhecimento detalhado do sistema de quadras, não se desvincula dos lotes e dos
edifícios, QLE, pois envolve interesses privados exigindo se analisar setor por setor da
cidade e os subsetores em separado. Para isto o caminho pode ser:
. Usar como ponto de partida os corredores, definidos pela soma da faixa lindeira de lotes
mais a largura da via e da faixa de superfície exigida para a infraestrutura de superfície,
quando houver.
. Destacar os corredores significa expor como objeto de trabalho o espaço ocupado por eles
com relação à subárea: equilibrar a relação entre os espaços privados e os públicos. Para
exemplo desta condição servem os subsetores 7a, 7b e 7e, cujo diagrama de corredores e
subáreas pode ser observado na figura 4-2.
. Tomar em consideração o perímetro do subsetor definido pelo alinhamento das quadras
que acompanham as vias limítrofes. Ter em mente que o corredor na maioria dos casos é
formado pela faixa ocupada pela via e outras faixas de domínio público. O limiar entre o
público e o privado se estabelece tendo em conta a linha de divisa que separa o lote da
‘rua’.
. Insistimos nesta questão pois a mídia internacional relativa as informações técnicas sobre
os benefícios de se projetar ‘espaços para as pessoas’, caminhar e incorporar as bicicletas
no cotidiano da cidade é excelente, mas, evoca padrões de relacionamento sociocultural-
econômico que em nosso país devagar será obtido; o que não nos impede de estudar a
forma dos tecidos urbanos, fazer planos e projetos para estimular estes acontecimentos.
. Ver o diagrama apresentado na figura 4.2 e sentir o potencial para projetos latente nos
corredores e nas subáreas na medida que sejam pensadas como ‘áreas protegidas’.
CORREDORES E SUBÁREAS - 91

Figura 4-2: diagrama de corredores, subsetores 7a, 7b e 7c.

Fonte: diagrama elaborado pelo autor

Pode-se estudar o subsetor como uma entidade independente e aí se considera apenas a


faixa de corredor dentro do subsetor a que ele pertence. A faixa de corredor formada pelo
renque de lotes, edifícios e espaços não construídos desta faixa é cortada quadra a quadra
pelas vias que adentram o subsetor. Deve-se considerar que a faixa de lotes voltada para a
via interna é um espaço intermediário entre a vias do contorno e a subárea, figura 4-3.
. Quando ocorre um binário o que acontece no Subsetor 7e, as faixas de corredores de cada
via se emendam e passam a representar mais espaços de corredor, reduzindo a dimensão
da subárea.
Estudar a configuração dos corredores e subáreas é uma maneira de segura de se entender
as escalas diferentes da estrutura física de uma cidade na medida em que facilita sua
92

compreensão por partes cada vez menores. Situa o trecho indicado empiricamente para
ser o desenvolvimento de um projeto no contexto do todo urbanizado, figura 4-3.
Figura 4-3: A faixa lindeira de lotes por subsetor

Fonte: diagrama elaborado pelo autor

Observamos que as vias (que atravessam, de distribuição e locais) e seus complementos


(canal, linha de energia, ...) devem ser considerados em separado no cálculo de áreas. Isto
porque interessa saber qual é o seu percentual de ocupação com relação ao total da cidade,
do distrito, do setor e subsetor, conforme o grau de abrangência da análise.

VQLE: aprendendo com o Subsetor 7a

O Subsetor 7a tem uma área de 5,7 ha e pode ser classificado no rol de pequena dimensão,
para o caso do desenvolvimento de um projeto urbano É cortado por uma única via, que
através de seus dois acessos, edifícios e arborização configuram um saudável ambiente
urbano entre as duas quadras de trezentos e cinco metros de comprimento que compõem
o subsetor. As ponderações relativas à quadra agora serão ampliadas para se explorar as
CORREDORES E SUBÁREAS - 93

peculiaridades do sistema VLQE. Na figura 3-7 do capítulo 3, a via que atravessa o setor 7a
aparece com a designação A2a como deveria ser do ponto de vista estritamente técnico.
No entanto, por razões da vizinhança se classificou esta via como local. Sua designação
oficial é Rua Olímpio Portugal, tem comprimento de 305 m, largura de 16 m (calçadas de 3
m e leito carroçável de 10 m), e ocupa no subsetor a área de 4.880 m². Isto corresponde a
8% da área total do subsetor, figura 4-4.

Figura 4-4: o subsetor 7a visto por cima

Fonte: Google Earth Pro, Abril 2019

A área de um subsetor é aquela referente ao perímetro determinado pelos alinhamentos


das quadras voltadas para as vias que o abraçam. Quanto ao corredor, é considerado
apenas a faixa interna ao subsetor, pois, já foi explicado que a área da via será contabilizada
para ela toda no elenco de espaços públicos e a outra parte do corredor pertence a outro
subsetor.
As características físicas do subsetor podem ser observadas na figura 7:
. A via central com largura de dezesseis metros com certeza resultou de um parcelamento
destinado a instalações industriais, pois esta não é uma solução usada para uma rua local
de vizinhança residencial;
. O parcelamento do solo nesta via central se caracteriza por lotes de dez metros de frente
e quarenta a cinquenta de fundos, que justapostos permitem a construção de galpões e
subdivididos a construção de casas geminadas.
94

. Na Rua Olímpio Portugal existe uma boa arborização pública.


. O uso do solo atual se caracteriza por um misto de galpões, onde funcionam oficinas,
entremeadas por residências e pequeno comércio. O Subsetor 7a está sendo invadido por
edifícios residenciais em altura, situação que demonstra a forte tendência para a
predominância residencial nesta via, figura 4-5.
A primeira lição aprendida pela análise deste subsetor foi sobre a classificação em vias que
atravessam, distribuem e locais. Ela não deve ser rígida, ou seja, é preciso ponderar sobre
atributos do espaço local. A via A2a, Olímpio Portugal pode ser um exemplo, talvez
extremo, da situação em que uma via que atravessa passa a ser local.

Figura 4-5: os edifícios altos e o ambiente da rua.

Fonte: foto do autor

A segunda lição se refere a como enfatizar o viés da Olímpio Portugal como via local, o que
induz uma postura projetual. Ou seja, marcar os acessos nas duas extremidades numa
extensão aproximada de 20 m, reduzindo nestes trechos a caixa da via para 6 m, portanto,
com as calçadas em cada trecho de acesso passando para 5 m. Resultam áreas de calçadas
de cinco por vinte metros boas para serem tratadas, mais as faixas de rolamento de seis
metros com uma pavimentação diferenciada, vegetação, mobiliário urbano e sinalização.

VQLE ou aprendendo com o Subsetor 7b

O subsetor tem área de 10,70 ha, representando boa dimensão para um projeto urbano. O
seu traçado foi feito para abrigar um programa de lotes residenciais. Ele possui vias de
distribuição e locais compatíveis com este programa que resultam da aplicação de tipos de
arranjos em loop e em cul-de-sac, usuais nos projetos das cidades jardins europeias e
CORREDORES E SUBÁREAS - 95

norteamericanas. Este subsetor tem a particularidade de ter sido projetado pelo


engenheiro civil - urbanista Jorge de Macedo Vieira na década de 1940, autor dos planos
para a cidade Maringá e de Águas de São Pedro e que se pautava na concepção das cidades
jardim (MENEGUETTI, 2009).
Esta forma de arranjo do tecido urbano aparece na vista aérea do subsetor 7b, apresentado
figura 4-6.
Figura 4-6: vista aérea do Subsetor 7b

Fonte: Google Earth Pro diagrama autor, abril 2019.

Assentes em lotes estreitos e de pouca profundidade as edificações residenciais variam


entre os tipos casa térrea ou casa assobradada construídas ou, na divisa frontal, muitas
apresentando recuos de frente e parte delas também com recuo lateral; trata-se de um
projeto para residências econômicas. Identificou-se por visitas ao local que cerca de setenta
por cento das edificações não apresenta recuos frontais, nem laterais, conferindo a quadra
uma fachada longitudinal de muros e frente de casas, onde as cores e texturas variadas das
paredes externas ressaltam os limites de cada propriedade, figura 4-7. Em 4-7A o exemplo
de cul-de-sac; em 4-7B o loop.
96

Figura 4-7: os tipos loop e cul-de-sac

Fonte: Google Earth Pro, Abril, 2019

Quanto ao loteamento tipo cidade-jardim projetado por Vieira, se observa que não existem
áreas verdes significativas para uso comum dentro dele, com certeza pelo fato de a área
ter sido programada apenas para oferecer um número previsto de lotes residenciais. Onde
há o recuo de cinco metros, este espaço que seria um jardim de transição da casa com a
rua passa a ser um piso impermeável destinado ao estacionamento do carro da família,
figura 4-8.

Jorge Vieira soube usar os princípios das cidades jardins para uma situação de área
residencial econômica e propôs acertos interessantes para ligar as casas com as vias locais,
protegendo-as do trânsito de passagem direta pelo bairro, as pessoas atravessam
tranquilamente a rua até a casa do vizinho nesta ‘área protegida’ do bairro da Mooca. Este
projeto é um exemplo de área protegida de bairro e na escala onde o uso dos espaços é
maior para o comércio e serviços temos o exemplo dos calçadões do Centro. Este conceito
pode se estender para os subcentros dos distritos e bairros da São Paulo, figura 4-8.
CORREDORES E SUBÁREAS - 97

Figura 4-8: subsetor 7b, o cul-de-sac e uma edificação em lote de esquina.

Fonte: fotos do autor, março 2019

A predominância de uso residencial é grande na subárea e elas comparecem em menor


percentual nos corredores, onde as atividades de comércio e serviços se mostram intensas.
Ainda nos corredores, existem edifícios em altura mistos com residencial e pequenos
prédios para comércio e serviços, à maneira de outros lugares em São Paulo.
O projeto de loteamento delimitado externamente por vias principais da cidade, tem a
peculiaridade, ou o projetista teve o cuidado, de implantar uma via interna que acompanha
aproximadamente as vias principais e forma um anel interno de transição para um miolo
de vizinhança que fica mais tranquilo, como se pode observar na figura 4-6.
Esta foi a boa lição aprendida pelo contato com o subsetor 7b, primeiro por constituir uma
área de vizinhança residencial projetada originalmente para um instituto de previdência,
mostrado pela homogeneidade de tipos construídos. Disto veio a comparação com outros
subsetores da cidade, cuja dimensão da parcela e a topografia do terreno levou a uma
forma de organização das quadras parecida com a que se estudava na Mooca, apesar da
diferenciação maior dos tipos de vias, a incidência de uso misto no interior e a variedade
dos tipos das edificações. Disto resultou o diagrama conceitual para uma área protegida,
ou um espaço em forma de um oásis que deixa de fora a circulação dos veículos de
passagem. Em princípio o desenho daria boa estrutura para uma gleba de até trinta
hectares, como mostra o diagrama onde o setor formado por vias que atravessam e
distribuem destaca os corredores (faixas pontilhadas) e existe um anel formado por uma
98

via interna a subárea que funciona como uma via de distribuição para as quadras envolvidas
e tem ligação com as vias dos corredores em poucos pontos (realçadas em preto).
O exemplo anterior do projeto de Jorge Vieira se refere apenas a habitação como foi
planejado, evocando os núcleos residenciais das cidades jardim inglesas, e, o desenho ora
proposto e chamado de ‘área protegida’ serve para o tecido tradicional de uso misto que
congrega moradores e pessoas de fora que exercem atividades diárias no local e voltam
com um grupo de amigos para confraternizar em uma pizzaria boa daquele lugar. Cruzam
com os moradores locais na pracinha ou procuram um culto religioso, traduz um modo de
vida, figura 4-9.
Figura 4-9: diagrama para uma Área Protegida

Fonte: diagrama do autor

Tivemos a oportunidade de observar em paralelo ao estudo na Mooca, como em outros


pontos da cidade aparecem situações que se aproximam do diagrama sugerido. Para citar
um exemplo, destaca-se uma área no distrito de Artur Alvim, próximo à estação ferroviária
e em situação central relativa a este ponto. Foi uma surpresa para nós achar uma situação
real tão parecida com o diagrama das vias que definem tal configuração, revelado pelo
destaque das vias desenhadas sobre a foto aérea, figura 4-10.
CORREDORES E SUBÁREAS - 99

Conclui-se deste tópico que o tecido urbano da cidade tradicional é rico em possibilidades
para se desenvolver projetos de setores pequenos com potencial para se tornarem áreas
protegidas. São oportunidades para elevar a identidade, o caráter latente expresso por um
lugar, como empreendimento participativo e de bom projeto urbano.
Figura 4-10: Exemplo de área protegida

Fonte: Autor, base Google Earth

VQLE: aprendendo com o Subsetor 7e

Este subsetor tem área de 13,80 ha. Delimitado pelas vias A1, Rua da Mooca, A3, Orville
Derby, A5, Borges de Figueiredo e D3, Rua Guaratinguetá, representa uma fração do tecido,
razoavelmente conhecida pela população da cidade, conforme as indicações dos tópicos a
seguir.
. A estação ferroviária da Mooca está situada no eixo da Rua Guaratinguetá. A Rua Borges
de Figueiredo é o local de diversos imóveis tombados pelo serviço de patrimônio histórico.
. Por existir uma sequência significativa de quadras onde o tombamento de fileiras de casas
construídas para operários (térreas ou dois pavimentos) foi definido no sentido de manter
os terrenos e sua volumetria de acordo com a situação original.
. Por haver interesse de instituições privadas virem a ocupar prédios antigos pelo sistema
de retrofit e aumento da área construída.
100

. Por haver o interesse de empreendedores imobiliários em construir condomínios


residenciais nos terrenos liberados pelas plantas industriais.
. Por ser a natureza do lugar rica de elementos que favorecem a ‘imageabilidade’ e sejam
capazes de absorver novas atividades, culturais, de lazer e convivência na escala da
vizinhança, da cidade, nacional e internacional.
. Observar que a rua Borges de Figueiredo, sigla A5, forma um binário com a rua Padre João
Antônio de Oliveira, sigla A4. No entanto, para definir o perímetro externo do subsetor se
utilizou a via A5.
. Considerar o plano para a Nova Estação da Mooca, que vai transferi-la para a confluência
da ferrovia com a Rua da Mooca, sigla A1. A atual ficará como ponto de referência histórica
e mais um atrativo para a Rua Borges de Figueiredo, figura 4-11.

Figura 4-11: vista aérea Setor 7e

Fonte: Google Earth, abril 2019

O Subsetor 7e, tem ocupação alta formada por prédios de condomínio residencial, em
terrenos grandes como demonstra a figura 11. Isto aponta para uma ocupação de forma
gradativa dos lotes menores com a saída de indústrias. Os galpões de oficinas são resilientes
CORREDORES E SUBÁREAS - 101

dado a boa localização para as atividades de serviços ou depósitos e fazem uma boa mistura
de uso com as residências existentes. Na figura 4-11, paralela aos trilhos, aparece a via A5,
Rua Borges de Figueiredo que auxilia a via A4 na distribuição dos fluxos até aos terrenos da
faixa lindeira da ferrovia.
Lotes e edifícios

Para os lotes e as edificações é fundamental a análise dos tipos de projeção do pavimento


térreo em relação às divisas de frente e laterais do lote. Quanto a divisa de fundo em geral
os proprietários deixam um recuo: o mínimo exigido, ou maior ou constroem uma edícula
cuja área, recuo em relação ao prédio principal e altura são regulamentados por lei. Para
mostrar os tipos de situação da superfície edificada em projeção horizontal e suas relações
com as divisas dos lotes laterais e a calçada foi elaborado o diagrama apresentado no
capítulo 3, figura 3- 17. Tratou-se naquele momento da relação do pavimento térreo com
a divisa de frente do lote. Agora serão consideradas as peculiaridades de cada tipo, que
dependem do volume construído acima do pavimento térreo e se faz a descrição dos tipos
presentes na citada figura do capítulo 3. São seis casos distintos que relacionam a planta
do térreo à sua proximidade com as divisas de frente e laterais do lote:
Quando não há recuo de frente são três:
- Edificação sem recuo de frente e sem recuos laterais;
- Edificação sem recuo de frente e recuo lateral em uma das divisas do lote;
- Edificação sem recuo de frente e recuo lateral nas duas divisas do lote; quando há recuo
de frente:
- Edificação com recuo de frente e sem recuos laterais;
- Edificação com recuo de frente e recuo lateral em uma das divisas do lote; - Edificação
com recuo de frente e recuo lateral nas divisas laterais do lote.
Sobre os seis tipos de embasamento, ocupando ou não toda a projeção horizontal, é
possível erigir um volume vertical ou um conjunto de edifícios desde que sejam respeitadas
as diretrizes municipais para o local. O volume vertical poderá ser igual a sua projeção em
planta – o prédio saindo do chão, uma torre como se diz e este é o caso de o embasamento
estar contido na projeção do edifício. O caso mais frequente é o do volume vertical, ficar
assente sobre um embasamento de maior área. Este piso é acessível nos terrenos grandes
102

dos condomínios e poderá ser tratado por jardins e equipamentos para lazer. Nos lotes
menores no espaço que resta sobre o embasamento é colocado um telhado ou laje tratada
por material impermeabilizante e térmico. Em São Paulo chama-se de sobressolo a laje que
cobre o embasamento. Nos condomínios residenciais o sobressolo é utilizado como um
espaço coberto nas projeções dos blocos verticais, espaço onde a visita se dirige para os
elevadores e os salões sociais. Na parte descoberta do sobressolo ficam os jardins e espaços
de convivência para crianças e adultos.
Salienta-se a tendência de os trabalhos de tipologia destinarem maior atenção aos tipos
residenciais ou de edifícios mistos para comércio e serviços no térreo; além de praças e
monumentos. Atribuímos o fato pela razão destes estudos em maioria serem devidos a
autores-professores europeus, onde a base de estudo são áreas consolidadas das cidades
de tecido histórico. A este respeito, no contexto norte-americano indo além da tipologia
clássica, vale lembrar os estudos da arquiteta-professora da Universidade de Utah, Brenda
Case Sheer no livro The evolution of urban form, typology for planners and architects
(SCHEER, 2010).
Em São Paulo, no distrito da Mooca e em outros de origem industrial situados no entorno
do Centro tradicional, verifica-se que o tipo galpão industrial, a começar pelos pequenos
destinados às oficinas ou depósitos, se multiplicam até as plantas industriais de médio e
grande porte. Devido a saída de boa parte das indústrias observa-se que o tecido urbano,
marcado pela diferenciação dos tamanhos de lotes, apresenta construções para diversos
usos: centros comerciais, postos de serviços e hipermercados, instituições públicas e
privadas, estacionamentos, venda de automóveis e outros; alguns apresentam uma forte
articulação com o transporte público e são chamados de ‘híbridos’. Para efeito de
classificação todos recaem no diagrama dos seis tipos de projeção horizontal.
Descreve-se a seguir as características dos tipos correntes das edificações na área estudada
e que se encontram em toda a cidade de São Paulo.

Os tipos de edificações

Na integração do térreo de uma edificação com o espaço público são seis as possibilidades
de relacionamento. Em São Paulo o recuo mínimo em geral é de cinco metros e existem
diretrizes que se aplicam aos lotes de esquina, para o caso de lotes estreitos e o caso de
CORREDORES E SUBÁREAS - 103

edificações em fileira. A legislação se completa abrangendo recuos laterais e de fundos.


Estas características relacionam os lotes com os edifícios e resultaram nas seis situações
típicas.
Tipo 01 – Edificação sem o recuo frontal e sem os recuos laterais.
A edificação é implantada com a testada do edifício seguindo o alinhamento da calçada,
passeio público, tendo as paredes laterais encostadas nas divisas do lote. Este tipo é
chamado na prática, de edificação em fileira ou prédio geminado. Percebe-se nesse caso
ausência de quesitos básicos quanto a normas de desempenho das edificações, como
insolação e ventilação. Quando diversas casas são construídas por um único empreendedor
é comum o emprego da parede de meia, ou seja, duas casas em sequência possuírem uma
única parede. Os imóveis construídos em fileira sejam para famílias de renda menor como
residências populares ou de classe média, são passíveis transformações no tempo devido a
folga nos rendimentos próprios ou em função da venda para terceiros com potencial e
gosto para reformar a casa, figura 4-12.
Refletindo ao olhar esta figura se percebe que a sequência de fachadas das casas em fileira
pode ser atrativa, como aquelas que as pessoas se empolgam quando passeiam em certas
cidades da Europa, ou em ruas de Nova Iorque na vizinhança do Central Parque e até em
certos logradouros do Rio de Janeiro, ou Maringá. Isto nos transporta para São Paulo onde
as calçadas são muito estreitas por princípio de projeto ou devido ao alargamento de faixas
de rolamento feito em um tempo em que os veículos motorizados passaram a ser os
senhores das ruas; era só arrancar as árvores que atrapalhavam e acertar a infraestrutura
e neste caso na calçada estreita ainda deveriam estar os postes para iluminação pública e
outras caixas de acesso para tubulações subterrâneas. As pessoas ainda poderiam circular,
ter paciência e cuidado para atravessar a rua, nos anos cinquenta e sessenta do século
passado os veículos motorizados não eram tantos e a poluição do ar era pequena. Isto levou
a cidade de São Paulo que temos hoje e onde precisamos realizar projetos para o bem-estar
das pessoas, desde o Centro até os bairros!
104

Figura 4.12: casas em fileira em uma rua de classe média, subsetor 7e, distrito da Mooca.

Fonte: fotos do Autor, março 2019

Tipo 02 – Edificação sem recuo frontal e com recuo de um lado.


Elas seguem o padrão da implantação em sequência sendo comum neste tipo de
configuração as casas serem construídas de duas em duas. Isto tem a haver com a
estratégia de alguns empreendedores que possui vários lotes vizinhos, onde, para
segmentar o empreendimento e capitalizar renda as vende aos pares antes do final da obra.
Desta maneira consegue recursos financeiros para construir mais duas e assim por diante.
Também é comum o empreendedor, proprietário de vários lotes, construir um conjunto de
casas geminadas, ficando as unidades situadas nas extremidades com o recuo lateral, de
acordo com os dispositivos da lei do município, figura 4-13.
CORREDORES E SUBÁREAS - 105

Figura 4-13: Exemplos do tipo 2

Fonte: fotos do autor, janeiro 2019

Tipo 03 – Edificação implantada sem recuo frontal e com recuos laterais dos dois lados. Não
foram encontradas edificações deste tipo no subsetor 7b. Este tipo tem presença
insignificante na cidade, ocorrendo pontualmente em projetos de galpões e de serviços de
pequeno porte, em bairros antigos ou periféricos do município. Poderia haver eventual
interesse para conjuntos edificados em lotes grandes de uma parte da cidade onde não
fosse exigido o recuo frontal.

Tipo 04 – Edificação com recuo frontal e sem recuos laterais


Repete-se como edificação o tipo 01, melhorada por ter sido introduzido o recuo de frente.
Em São Paulo foi possível construir sem o recuo de frente ou optar por um recuo a critério
do proprietário até a vigência da Lei de Zoneamento de 1972. Esta legislação passou a exigir
o recuo obrigatório de cinco metros, espaço entendido como a transição edifício-calçada.
Inicialmente imaginado para ser um jardim, em pouco tempo tornou-se local para
estacionar veículos. Com a desculpa de se construir uma proteção leve para o carro, logo
apareceram telhados completos. No subsetor pesquisado, há lotes de cinco metros de
frente, onde é possível estacionar dois veículos, eles ficam apertados pois a espessura dos
106

muros e a presença do quadro de medição de energia e água reduz o espaço. Há muitos


casos de construções em fileira, com lotes desde três metros e meio, com certeza
idealizados para sobrar internamente a largura útil de três metros para a sala e o quarto
principal. Neste caso a frente da casa pode conter um carro. O espaço para o jardim de
cinco metros de largura se mantém apenas no caso de terrenos maiores, existentes em
outros locais da cidade onde há espaço para abrigar veículos fora da faixa de recuo. Estas
observações servem de apoio a identificação de padrões de ocupação (tipos) e para o
desenho dos espaços, figura 4-14.

Figura 4-14: Exemplos do tipo 04

Fonte: foto do autor, agosto 2017

Para os corredores comerciais se ressalta a importância do recuo de cinco metros, exigido


pela legislação, como alternativa para estacionar automóveis e outros veículos de pequeno
porte usados para serviços além da eventual presença de espaços ajardinados, dispositivos
para vegetação alta na parte ajardinada e locais para os totens promocionais.
Tipo 05 – Edificação com recuo frontal e lateral de um dos lados. São as edificações que
pertencem ao grupo de construções mais novas, onde a presença dos recuos consolida uma
CORREDORES E SUBÁREAS - 107

tipologia ímpar, esse tipo possui quantidade mediana de unidades, totalizando apenas
trinta e duas. Atendem às diretrizes da legislação atual, figura 4-15.
Figura 4-15: Exemplos do tipo 05

Fonte: foto do autor, acervo 2018

Tipo 06 – Edificação implantada com recuo frontal e recuos laterais.


Representando este tipo encontram-se casas de alto padrão no corredor que atravessa o
subsetor 7b - Avenida Paes de Barros – e hoje em dia são poucas. Em sua maioria as
residências se tornaram empresas, como a do exemplo, ou, deram lugar a edifícios
residenciais ou de serviços, vistos no segundo plano da foto. Modo geral os recuos laterais
e os jardins destas casas, generosos como espaços abertos, se tornam áreas de
estacionamento figura 4-16.
O edifício alto atualmente é o tipo de grande interesse pois é marcante na forma da cidade.

Há o caso do edifício onde os pavimentos em altura têm a mesma dimensão do


embasamento, resultando um volume elevado no terreno, costumeiramente chamado de
torre única. Nos subsetores estudados da Mooca são poucos os casos que se enquadram
nestes tipos, mas, eles ocorrem pontualmente em outros em outros setores do distrito
108

Os grandes edifícios podem ser projetados assentes sobre uma base projeção horizontal
maior, de poucos pavimentos e sujeita às exigências oficiais correntes. O bloco superior em
altura deverá respeitar as diretrizes de zoneamento do município quanto a taxa de
ocupação do lote e o índice de aproveitamento do espaço, além dos requisitos sobre
iluminação natural e insolação. No caso de vários prédios altos em condomínio sobre o
embasamento compartilhado, que usualmente funciona para circulação e jardim, ele
representa uma plataforma cobrindo os pavimentos de garagem, os acessos (principal e de
serviço) e partes para atividades de esporte coberto e sociabilidade. As torres para
habitação, escritórios ou hotéis, normalmente ficam com o pavimento intermediário
assente na laje, o chamado sobressolo, com espaços livres de acesso às áreas descobertas
para lazer e esportes, figura 4.17.

Figura 4-16: casa de alto padrão, hoje escritório.

Fonte: foto do autor, outubro 2018


CORREDORES E SUBÁREAS - 109

Figura 4.17: Exemplo de construção em altura; trinta pavimentos.

Fonte: foto do autor, outubro 2018

Considerações sobre o capítulo 4

Cumpre ressaltar a validade dos critérios de classificação e procedimentos de análise da


forma urbana através dos corredores e subáreas, objeto dos três últimos capítulos. Nascido
de trabalhos profissionais, o procedimento se fortaleceu conceitualmente por matérias de
história e teoria relativas ao projeto, como a morfologia urbana. Procurou-se deixar claro
os conceitos e procedimentos para utilização prática, no entanto, em outras realidades que
não a de São Paulo, quando não parecer clara a maneira de aplicar os procedimentos, eles
poderão ser ajustados por quem os estiver utilizando, desde que respeitados os conceitos
110

básicos. O importante é haver consciência de que esta forma de trabalhar implica em


conhecer em profundidade os espaços por partes, visitar o sítio, é uma análise voltada para
a configuração da forma física do tecido e dos pequenos espaços da cidade, que se
enriquece pelo sentir onde vivem tantos grupos sociais, apesar do recorte voltado para o
espaço físico. A partir deste conhecimento, até caminhando em paralelo, se deve
prosseguir montando os mapas e a compilação de dados pelos processos digitais, que darão
riqueza de detalhes aos trabalhos de pesquisa e de projeto urbano.

Neste capítulo 4, onde se completa o estudo do quarteto VQLE, é possível refletir sobre a
flexibilidade que a quadra tradicional oferece quanto às opções para a geração de tipos de
lotes e edifícios, sempre pensando na substituição por novos construtos, para atender as
demandas de ordem social que se sucedem. Há também uma história para ser contada
sobre as diretrizes urbanísticas que influem nos aspectos físicos, que, em tempos passados
foi consequência de preocupações com a salubridade dos imóveis, o volume das
construções, para mais tarde se chegar na questão de como fazer os veículos motorizados
circularem e acharem estacionamento. Hoje se levanta a bandeira dos pedestres em
recintos públicos, a ‘cidade para as pessoas’ mesmo em cidades onde o transporte público
ainda não está bem resolvido. Neste processo se destaca o gradativo aumento da área
ocupada pelo sistema de circulação nas cidades, das áreas públicas. Em muitas cidades do
mundo há uma reserva razoável de espaços verdes, incluindo as praças públicas que se
sustentam bem quanto a nova onda no sentido de se valorizar a vida em espaços de uso
coletivo; sem contar com a tradição da facilidade do acesso público a recintos de
propriedade privada.
Na legislação urbana de São Paulo - 2014 - foram introduzidos tópicos para estimular ainda
mais a facilidade de acesso público a locais de controle privado. O que sugere tipos de
edificações já existentes nos locais centrais da cidade, onde a concentração de pessoas é
grande estimulando a ver as vitrines voltadas para calçadas, galerias comerciais ligando
duas ou mais vias, até o centro comercial ocupando uma quadra inteira. Com certeza são
princípios que mexem com os lotes e a maneira de construir novos ou substituir os edifícios
nas quadras. No processo de transformação as vias persistem, as faixas de rolamento de
CORREDORES E SUBÁREAS - 111

veículos motorizados são reduzidas a favor das bicicletas e dos pedestres e em geral afetam
pouco as quadras, sem modificar sua forma.
Ao longo do processo de conhecer a cidade por partes, seus elementos urbanos afloram e
às vezes se delineia uma área com potencial para ser desenvolvida como um special
district. Neste caso logo devem ser reunidas informações contundentes que justifiquem o
projeto urbano para serem apresentadas a sociedade. Vamos mostrar outro exemplo, além
dos relacionados com áreas protegidas que foram apresentados no início deste capítulo.
Trata-se do ‘Corredor Cultural da Mooca- CCM’, nome inventado para este projeto.
Originado da observação prospectiva sobre o espaço determinado pelo binário composto
pelas vias sequenciais Orville Derby- Canuto Saraiva (3) e a rua João Antônio de Oliveira
(A4) até a Rua Borges de Figueiredo (A5). A figura anterior 4-1 permite contextualizar o
espaço sugerido para o projeto urbano CCM. Suas qualidades foram valorizadas no tópico
deste capítulo ‘VQLE: aprendendo com o Subsetor 7e’.
Pode-se chegar a um portfólio completo do possível corredor cultural e motivar a sociedade
para participar deste empreendimento. Desde alterar o nome do projeto para algo mais
sugestivo do que o simulado para promover a implantação desta parte da Mooca como
uma ‘área protegida’. Em seguida deve ser criada uma empresa para tratar do
desenvolvimento local, promover o projeto urbano e ir atrás de parceiros novos para sua
implementação em um prazo determinado. A propósito deixamos a indagação: quem
detonaria este processo, para ser finalizado entre doze e quinze anos, como acontece nos
países mais ricos?
Trazemos esta questão sabendo das dificuldades que existe nas municipalidades brasileiras
sobre as parcerias público-privado, como a tendência da centralização das decisões para
diretrizes de projeto nas mãos de profissionais de carreira ou eventual participantes em
determinada gestão de um prefeito do município. Dificuldades advindas devido a
prepotência de saber que emana dos profissionais do órgão público, da centralidade das
decisões e das propostas nem sempre suficientemente maturadas e as vezes não muito
honestas (envolvendo também finanças) que veem pelo lado do segmento privado.
Fora as questões relacionadas a como desenvolver um empreendimento de projeto
urbano, voltamos ao projeto do ‘Corredor Cultural da Mooca- CCM’, viável de se ajustar
112

com o plano diretor estratégico do município quanto ao atendimento às suas diretrizes


urbanísticas. Apresentamos a ideia de como o espaço específico desta via pode ser
desenvolvido, se integrar com o entorno e se transformar em um lugar de interesse cultural
e turístico da cidade de São Paulo, conformando a área protegida definida pela linha
pontilhada na figura 4-18.
Figura 4-18: Projeto urbano Borges de Figueiredo

Fonte: Google Earth Pro. Diagrama do autor

A linha com tracejado forte representa a ferrovia. O diagrama acima é alto explicativo: as
vias que atravessam A3 e A4 ficariam responsáveis pelo tráfego maior de ônibus e demais
veículos. A via Borges de Figueiredo, A5, passaria ser a ‘via que atravessa’ no contexto do
CCM, de tráfego local, alimentada pelas transversais desde a via A4. A ideia central do
projeto é a Rua Borges de Figueiredo, A5, ser o palco dos acontecimentos significativos
ligando a diversidade de tipos de uso e formas de apropriação dos espaços já existentes e
outros que poderão ser programadas para este corredor. Oferecer seu trajeto para
transportes leves de âmbito local, se somando aos atributos de animação do corredor
cultural.
No segmento de cultura e sociabilidade a Borges tem que ir muito além de ser entendida
apenas como um local onde existem prédios históricos, uma universidade privada que se
instalou em um deles, vai ter uma nova estação ferroviária, a atual poderá ser tombada e
ser usada para eventos, tem a Rua Guaratinguetá para ser melhorada como ligação de
pedestres até a Igreja São Rafael. Portanto, tem tudo para ser valorizada como um recinto
onde há gente morando, trabalhando e passeando; paulistanos, brasileiros e turistas
estrangeiros, figura 4-19.
CORREDORES E SUBÁREAS - 113

Figura 4-19: Grafite inspirador para o Corredor Cultural da Mooca - CCM

Fonte: Foto do autor

A foto acima é um detalhe de um extenso grafite, painel desenhado no muro de acesso a


atual Estação da Mooca. Por este acesso se vislumbrando essa obra de arte pública desde
a Rua Borges de Figueiredo até a Estação serve para inspiração de um porvir desejado para
o Corredor Cultural da Mooca, CCM.
Nos capítulos seguintes vamos sair de São Paulo e dar um passeio pelo urbanismo de outros
tempos e lugares, movidos pela ideia de entender e se convencer de como a quadra
ortogonal persiste e se adapta a diversas formas de construir os espaços: são questões de
morfologia e do estudo de projetos urbanos. Enfatizar as três fases do Urbanismo, o
planejamento urbano, a organização de planos setoriais e o projeto urbano, como urban
design, ou seja, ter começo, meio e fim; pois deverá ter um processo de implementação
que faça a construção acontecer por volta de doze anos. Vamos começar com a questão
das quadras, ou a porção de espaço acessível por vias de circulação, ser subdividida
permitindo haver vários proprietários de lotes, ter apenas um dono ou ser inteirinha uma
praça pública.
114
CORREDORES E SUBÁREAS - 115

CAPÍTULO 5: O traçado em retícula

O projeto da cidade ou de setores urbanizados a partir do traçado de quadras em retícula


ortogonal existe desde tempos remotos. Mantém-se e se adapta a diversas situações com
o passar dos anos devido a flexibilidade quanto a variação das suas dimensões, das
alternativas para se acomodar a largura e a regularidade das vias e a liberdade quanto ao
tamanho dos lotes, a facilidade para se subdividir ou agrupar. Característica que
dependendo do plano geral possibilita diferentes combinações em um mesmo projeto de
parcelamento do solo. Portanto, os traçados desde há muito, projetados por um órgão
oficial de urbanismo, por um escritório privado ou por um técnico-agrônomo, têm utilizado
as diferentes opções oferecidas pela concepção em malha. As retículas facilitam o
lançamento das redes de infraestrutura urbana, os trabalhos de manutenção e seu
gerenciamento. Nos terrenos em desnível pelo sistema reticular é possível regrar a
curvatura das vias e das quadras, através do centro de circunferências, o que leva a
variações das dimensões do parcelamento. O critério de estabelecer eixos ordenadores dos
edifícios enfatizando visuais principais como uma diretriz para o projeto foi muito utilizado
por civilizações antigas, no projeto de extensos conjuntos monumentais e perdura até hoje.
Portanto, são muitos os atributos que demonstram a abertura a favor das formas de uso e
ocupação do solo possíveis de serem previstas pelo planejamento urbano, para
posteriormente serem desenvolvidas em detalhes à nível de projeto urbanístico.
O emprego da malha no plano geral da cidade tem por referência os traçados realizados na
Grécia antiga. A quadra retangular, para não dizer quadrada que é a mais usual, aparece
como tipo de elemento repetitivo para o projeto urbano, formalizada desde os planos para
diversas cidades da Grécia antiga. O traçado por retícula ortogonal utilizado no Ocidente
tem suas raízes no projeto destas cidades. O arquiteto Hipodamo, no século V AC foi o
responsável pelo traçado em malha do projeto da cidade de Mileto, onde ele vivia.
Idealizou este princípio para que a cidade pudesse expressar a ideia de ordem social
definida pelas três castas existentes: os ‘cidadãos’ (eupátridas), representados pelos
homens adultos a quem pertenciam os direitos políticos para participar da democracia. Os
‘metecos’, o conjunto de estrangeiros que habitavam as cidades principais, possuíam o
116

controle do comércio e serviços, sem ter direitos políticos e, os ‘escravos’, que constituíam
a maioria da população, em um contexto socioeconômico que chegou à relação de dezoito
escravos para cada cidadão adulto. Hipodamo, projetou as vias definidoras da retícula
constituindo três conjuntos de quadras, destinados conforme a categoria da casta social a
que se destinava. Como princípio foram destinados aos ‘cidadãos’ os lotes maiores, os
‘metecos’ ficaram com os lotes médios e pela discriminação social coube aos ‘escravos’ os
lotes menores. Como os escravos circulavam a pé, coube a eles a mancha menor dos
recortes da península onde se assentou a cidade. O centro administrativo e comercial ficou
na parte mais central do conjunto urbano projetado, figura 5-1 (MOHOLY-NAGY, 1968, p
81-87).

Figura 5-1: Mileto

Fonte: Commons Wikimedia

Hipodamo concretizou o que hoje se chama de zoneamento. Por seus princípios de


urbanismo e a racionalidade do desenho demonstrada, os conceitos introduzidos por
Hipodamo se aplicam em diferentes contextos e por isso muitos estudiosos atribuem a ele
ser o primeiro arquiteto-urbanista. Suas ideias sobre a organização física e social de uma
CORREDORES E SUBÁREAS - 117

cidade perduraram na Grécia. O tipo de distribuição ordenado pela malha ortogonal se


difundiu e três séculos depois Alexandre, o Grande e Dinocrates seu arquiteto, planejaram
a cidade de Alexandria tendo por referência o traçado ortogonal, sobre o qual o imperador
usando sua genialidade, pôs em prática algumas inovações quanto a ideia de uma cidade
capital. Na capital do império, a distância entre as ruas deixou de ser uniforme, se
introduziu o conceito das vias principais terem maior largura por razões funcionais, e
servirem para simbolizar o percurso para encontrar os lugares principais, como o porto, a
biblioteca (maior do mundo por muito tempo!) e outros. Nos grandes eixos foram dispostas
colunatas criando longos trechos no tipo de galeria coberta, um espaço contínuo servindo
como transição de acesso aos prédios, figura 5-2.
Na figura 5-2 aparece como ilustração um desenho da cidade clássica e o trecho de uma via
desenhada para atender seu objetivo funcional e ao mesmo tempo adequada para ser
palco dos momentos importantes para o império.
Em 5-2A, um detalhado desenho tipo bird’s eye mostra a traçado da cidade de Alexandria
antiga (sem data) publicado pelo National Geographic Magazine em julho de 2011. A
ilustração destaca o traçado em retícula no ordenamento das conexões com os lugares que
tem um caráter único, das quadras, dos lotes e a volumetria das edificações.
Em 5-2B, a foto de mostra uma via que atravessa a cidade na direção de espaços únicos,
pontos de referência principais nos extremos (pontos de referência principais, lembrando
a leitura de K. Lynch. As vias transversais ordenam as quadras levando a marcos de
referência, ao contato e as vistas abertas para o mar. A via principal ladeada de um lado
pela colunata de grande altura, e de outro pelas quadras da trama regular da cidade
entremeadas por densa vegetação cria uma perspectiva que testemunha como seria a
cidade no tempo de Cleópatra (51 AC - 30 AC).
Espaços como estes são importantes citar para a formação do atual projetista urbano
(arquiteto-desenhador). Visitar, percorrendo um roteiro turístico-arquitetônico que
necessariamente não implica em ir até a Grécia, mas, verificar a documentação existente
que oferece uma fonte de referência direta e básica. Importante, para aqueles que querem
estudar ‘a cidade como obra de arte’, no dizer de Giulio C. Argan. Uma lembrança que
118

evolui para a prática profissional no sentido de não ficarem esquecidos os fundamentos da


arquitetura da cidade, no campo do projeto urbano.

Figura 5.2: O traçado ortogonal e a vista pelo eixo de uma via que atravessa.

Fonte: Commons Wikimedia

Longe de pretender contar em detalhes a história dos tecidos em malha e apesar da sua
importância, tomamos a liberdade de avançar séculos adiante para pontuar outros
traçados que se tornaram icônicos.

Plano para o município de Savannah, estado da Geórgia, USA.

Fundada em 1733, Savannah se localiza na margem do Rio Savannah, distante trinta e dois
quilômetros do Oceano Atlântico, onde o rio deságua. Localização estratégica na época –
inclusive por razões de segurança - porque Savannah deveria se tornar um importante
porto da costa do Atlântico sul. O mapa datado de 1815 (oitenta e dois anos após a
CORREDORES E SUBÁREAS - 119

inauguração) mostra como a cidade foi implantada junto ao rio, em direção aproximada
Norte-Sul (figura 5-3A, a seguir)
A cidade de Savannah, última capital do império britânico na América do Norte foi
projetada pelo estadista e reformista inglês James Edward Oglethorpe, intelectual imbuído
dos ideais do Iluminismo, no século XVIII e simpatizante do movimento abolicionista norte-
americano (1830). O traçado para a cidade, situada em um espaço natural de 281,5
quilômetros quadrados, se baseou na procura do equilíbrio entre as atividades rurais e
como viver bem na cidade; sua população atual é de 145.862 (2018).
O traçado de Savannah foi pensado para haver um módulo, o ward (subdivisão, tendo
representatividade na cidade) com superfície de dois e meio hectares, uma porção de
espaço (‘superquadra’) que se repete como um padrão de ocupação territorial. O ward é
subdividido em quatro partes para residências (tythings) e cada parte possui uma viela
(lane) para acesso de serviços, separando duas carreiras de lotes. Um ‘tything’, do inglês
antigo, ou tithing, corresponde a uma pequena divisão administrativa, preservada até hoje
na Inglaterra e antigamente constituída por dez homens e suas famílias. Chamamos
atenção pelo modo como o desenho urbano resulta do programa de organização social.
Cada lote tem cerca de doze e meio metros de frente e dezoito de fundo. As alas ou grupos
de residenciais são nomeadas pela localização a Noroeste, Nordeste, Sudoeste e Sudeste
(Northwest, Northeast, Southwest e por Southeast Tything). Existem quatro quadras para
atividades institucionais (públicas ou privadas), separadas duas a duas e pela praça central
do ward, nomeadas por Northwest, Northeast, Southwest e por Southeast Trust Lot. Dois
a dois os yards são contornados por vias públicas, que contam com generosas calçadas e a
praça central com seus principais acessos de configuração axial, figura 5.3-B. Em 3A se
reproduz uma planta de 1815 (oitenta e dois anos desde a inauguração da cidade) e, em 3B
aparece o diagrama conceitual do ward conforme idealizado pela equipe de Oglethorpe.
A área central de Savannah faz parte de um plano regional (the Oglethorpe Plan) que previa
nos arredores da área central das cidades; parques, fazendas e vilas. Segundo se demonstra
pela história, a área urbanizada cresceu muito e transformou o equilíbrio urbano-rural
preconizado por James E. Oglethorpe, assunto tratado pelo historiador-professor Thomas
120

D. Wilson como uma questão da evolução do processo de urbanização (WILSON, 2012, p


163-172).
Pela planta da cidade de 1815 se pode ver a previsão das ocupações para as vilas agrícolas
e de pecuária junto a área urbanizada, favorecendo o caminhar a pé entre um possível local
de moradia na cidade e o trabalho rural, figura 3A.
Figura 5.3: o sistema de retículas de Savannah histórica.

Fonte: Commons Wikimedia

Na área da ocupação tradicional pelos wards destaca-se as vias que atravessam e as que
distribuem a circulação de veículos, o que reforça o conceito do traçado em retícula. Sobre
CORREDORES E SUBÁREAS - 121

a foto aérea observar as linhas finas e as grossas. Cumpre lembrar que naquele tempo não
existiam automóveis e o espaço das vias era para pedestres e veículos à tração animal. Por
reconhecimento em foto do Google (11.07.2020) se pode observar que para vinte e um
wards (84 ha) foi ocupada uma superfície de cento e cinquenta hectares. A diferença
ficando para as vias que atravessam, distribuem e demais áreas públicas, figura 5-4.

Figura 5-4: Distrito histórico, Savannah.

Fonte: Google Earth Pro, 31.07.2020; diagrama do autor


122

Na análise do plano geral deve ser considerado que os wards tem a dimensão de 2,5ha
(quadrado de 150 m de lado). A implantação da cidade a partir de 1830 começou com seis
wards, em seguida mais dois e as etapas prosseguiram em módulos de dois conjuntos de
quatro wards. Cada praça possui um marco de referência no centro, ponto focal para
enfatizar a composição paisagística clássica. De uma à outra praça o marco visual, pode ser
uma grande escultura ou um chafariz, que marca a centralidade reforçada pela clareira que
se forma ao redor e serve para orientar o caminho dos pedestres, entre um exuberante
entorno arborizado, figura 5-5.

Figura 5.5: Praça Lafayette

Fonte: foto do autor, julho 2016.

Nas quadras destinadas para as residências (tythings) observa-se que os lotes podem ser
subdivididos e na faixa de recuo, existente como diretriz para o alinhamento dos imóveis é
permitido serem instaladas escadas de acesso a residências no primeiro piso, ficando o
térreo como um porão visitável, o basement da edificação principal. Este tipo de arranjo
está representado pelas fotos. Para exemplificar, mostra-se um prédio de esquina
destinado a pessoas de renda mais alta que o citado antes, que em verdade são dois
imóveis: um com janelas marrom e o outro na cor preto. Nestes imóveis, o pavimento
CORREDORES E SUBÁREAS - 123

térreo funciona ou pode funcionar para locação em separado, figura 5.6. Em 6A, casas em
fileira e em 6B residências assobradadas e geminadas.
No distrito histórico de Savannah é grande variedade de tipos de edifícios, estilos e
dimensões dos imóveis, dado a liberdade que houve para construir residenciais e edifícios
institucionais. No Massie Heritage Center, um local destinado a história do urbanismo e
arquitetura de Savannah, existe uma sequência de painéis com uma classificação de tipos,
pelos estilos da arquitetura, desde os primórdios do município que supera a quantidade de
duas dezenas. Caso fosse possível cruzar esta informação sobre os estilos com o projeto
dos espaços físicos; como tipos de arranjos espaciais, o número de casos seria muito maior.

Figura 5-6: via, quadra, lote, edifício

Fonte: fotos do autor


124

O plano de Oglethorpe é exemplar para o estudo da evolução dos traçados urbanos em


malha. Serve de referência para o projeto conceitual proposto por Frank Lloyd Wright em
1935, que preconizava que cada família pudesse ter pelo menos um acre de terra (4.050
m²), ou seja, um espaço para plantar ou ter uma pequena criação junto a moradia.
Savannah é uma referência histórica para o conceito de superquadra e de área de
vizinhança do Movimento Moderno, particularmente, quanto ao conceito de superquadra
desenvolvido pelo arquiteto-urbanista Lúcio Costa para o plano piloto para Brasília nos
anos 1950.

As quadras da Ilha de Manhattan, New York, NY, 1811

Manhattan, um dos cinco burgos (distritos) do município de New York, como fruto do
desenvolvimento e da expectativa da população de ali se erguer uma grande cidade - em
particular de pessoas com visão comercial - com recursos privados foi desenvolvido em
1807 um plano diretor físico para toda a ilha (59,10 km²). O chamado The Commissioners’
Plan, foi objeto de grande polêmica na cidade onde as pessoas diziam que construir ruas
com dinheiro público para favorecer grupos comerciais que já estavam prontos para
investir em grandes edifícios não era justo, além de que o plano apresentado era uma
retícula ortogonal monótona. Resultou que sua oficialização pelo município foi acontecer
pouco mais de três anos depois, com a designação de The Commissioners’ Plan of 1811. As
quadras de Manhattan foram definidas em função de uma dimensão julgada adequada na
época, um retângulo de 50 a 70 m, por 150 a 200 m traçadas com a lateral maior no sentido
transversal da ilha. Isto levaria a configuração de um feixe de vias longitudinais paralelas
espaçadas de no máximo 200 m, largura boa para a distribuição das linhas de transporte
coletivo por vias principais, e, a largura das quadras máxima de 70 m, que ofereceria opções
favoráveis ao deslocamento transversal dos pedestres. Este padrão de quadras foi
considerado bom também para o parcelamento em lotes, quanto à comercialização e para
a construção de edifícios altos. Quando houvesse interesse o acesso poderia se fazer pelas
duas ruas distanciadas por oitenta metros. Também se admitia a junção de quadras para
formar uma superquadra onde as passagens internas seriam ajustadas pelo projeto e
responsabilidade do empreendedor; na atualidade um bom exemplo é o empreendimento
corporativo Rockefeller Center. Sobre as características do tecido da ilha deve se considerar
CORREDORES E SUBÁREAS - 125

a questão da ‘monotonia’ e a distribuição de espaços verdes onde se ressalta a luta da


comunidade por uma grande área verde: um parque como os da Europa, como diziam os
nova-iorquinos. Tais demandas resultaram na aquisição da gleba e em estudos desde 1836,
que se desenvolveram para a inauguração do Central Park, completo em 1873. O Central
Park de 341 ha foi projetado por uma equipe coordenada pelo arquiteto-botânico Frederick
Law Olmsted e se tornou uma referência internacional para o paisagismo de espaços
urbanos.
O parque central da cidade se situa como um elemento urbano importante para a quebra
da excessiva ortogonalidade do tecido da ilha. Soma-se a ele em Manhattan o pré-existente
bairro de Greenwich Village, preservado apesar do seu traçado transversal ao sentido da
grande retícula, figura 5-7. Em 7A, o plano aprovado em 1811 e em 7B uma foto aérea onde
pode ser visto um trecho das retículas do plano e o encontro com o tecido de Greenwich
Village.

Figura 5-7: The Commissioners Plan 1807/ 1811 e, quadras no Sudoeste de Manhattan

Fonte: Commons Wikimedia e Google Earth (12.08.2020)


126

A implantação dos edifícios na maior parte da ilha é variada quanto à altura, ao volume das
construções e à diversidade dos tipos construtivos. Percebe-se isto pela análise da foto
seguinte, que realça as diferenças de altura e da forma dos prédios. Para quem caminha
pelas calçadas largas, acompanhado pelo vai e vem dos veículos de um lado e de outro
pelas variadas fachadas, há um enquadramento dos visuais que oferece variedade para o
olhar de cada trecho que se percorre. Na foto, onde mostramos a parte Sul do Central Park
pode se observar esta característica, que é ainda mais forte nas avenidas retratadas em
portfólios para os turistas, figura 5-8.

Figura 5-8: quadras estreitas no sentido Leste-Oeste

Fonte: Google Earth (12.08.2020)

Como locais que amenizam o efeito da malha regular existem as praças públicas e os
pocket-parks da iniciativa privada, que constituem pontos atrativos entre os prédios.
Manhattan, personifica o dizer ‘The big apple’ (grande vigor) devido a força da sua
centralidade de interesse internacional e, para o que nos interessa - tecidos urbanos em
malha - utilizarmos a referência norte-americana para enfatizar a ideia de flexibilidade que
possuem as configurações deste tipo. As quadras relativamente pequenas e o tamanho de
lotes variado, são tipos que permitem diversidade no volume das construções, como
apontamos ao estudar o setor 7 do distrito da Mooca e se repete em São Paulo de modo
geral.
CORREDORES E SUBÁREAS - 127

O ‘ensanche’ de Barcelona

O projeto para a expansão da área urbana de Barcelona, objeto de concurso público nos
anos 1850 teve como resultado a proposta da equipe de responsabilidade do engenheiro
urbanista (e político) Ildefonso Cerdá. Foi um plano forte como ideia, abrangendo uma
área de expansão maior que cinco vezes o sítio da cidade existente, o ‘Ensanche’ chamado
pelos catalães. Baseava-se no lançamento de extensa malha constituída por vias com
largura de 20, 40 e 60 m e quadras de formato regular com 113 m de lado e com chanfros
a quarenta e cinco graus nas esquinas (aproximadamente 12.000 m²). Um sistema em
retícula interceptado por dois eixos transversais à maneira da Paris do Barão Haussmann,
articulados por uma praça central, a Plaça dels Paisos Catalans. A novidade do plano foi a
configuração das quadras, que eram associadas a tipos, conforme alternativas para a
implantação das edificações, bem apresentadas por diagramas e acompanhadas de
quantitativos desde a largura das vias, critérios para a definição da volumetria (em planta
e elevação), densidade demográfica e indicações para a engenharia de infraestrutura,
figura 5- 9.

Figura 5-9: Plano da cidade de Barcelona,1860

Fonte: Wikimedia Commons

Pelo plano geral destacam-se os critérios para a implantação, de volumes edificados no


alinhamento das vias insinuando um único empreendimento ou, de alguns poucos blocos
que faziam supor a participação de mais de um empreendedor na construção da quadra
128

toda. Os edifícios relativamente estreitos deveriam acompanhar o alinhamento das


calçadas podendo ter janelas para a rua ou para o pátio interno, deixando passagens de
acesso coletivo para o interior da quadra. Assim, para cada quadra, haveria um generoso
espaço livre e verde central de acesso coletivo. Os diagramas ilustrativos do plano mostram
exemplos, para articular percursos de pedestres de uma quadra com as outras. Este plano
pelo nível de encaminhamento das soluções propostas incluindo diretrizes para projetos,
quantificação de dados e critérios para implementação é exemplar como um trabalho nos
moldes de um projeto urbano; a menos da participação da comunidade nas decisões e em
aportes financeiros como hoje acontece nos empreendimentos urbanos (urban design). O
fato de as quadras terem cumprido apenas discretamente a ideia proposta do pátio verde
central, não tira a ideia de conjunto da parte da cidade projetada por Cerdá e equipe. Uma
das razões importantes para os desvios do plano arriscamos dizer foi a necessidade de
comercializar lotes com áreas pequenas e aumentar a profundidade das construções
geminadas para abrir poços de ventilação e insolação: procedimento comum nas cidades
de tecido tradicional.
Figura 5-10: observar a área central das quadras.

Fonte: Google Earth, 17.07.2020.


CORREDORES E SUBÁREAS - 129

Observar e as quadras ao lado esquerdo da figura e a direita a ruptura devido a implantação


do sistema viário diagonal junto à praça, figura 5-10.
No desenvolvimento da cidade de Barcelona por força da legislação e pelas qualidades do
plano urbanístico a configuração dos espaços urbanos previstos se manteve, apesar das
modificações impostas pela realidade desde muito tempo. Quando há oportunidade se
retomam os esquemas iniciais engendrados pela equipe do engenheiro-urbanista Cerdá. O
que se pode observar pela foto do bairro Poblenou, uma antiga área industrial onde no
final dos anos 1980 se desenvolveu a instalação da Vila Olímpica, figura a seguir.
A Vila ocupa uma faixa frente ao mar e outras quadras na parte de trás. O projeto urbano
e da arquitetura foi atribuído ao grupo de profissionais J. Mastorell, O. Bohigas, D. Mackay
e A. Puigdomenech, através de uma competição internacional de 1992. Em depoimento
dado para o blog do grupo Urban Networks, Oriol Bohigas apontou para os seis conceitos
principais que orientaram o desenvolvimento do plano da Vila Olímpica. Destes itens
destacamos dois por sua ligação direta com o assunto central das nossas ponderações
sobre a forma construída resultante das propostas apresentadas pelo plano da equipe
Cerdá. Segundo eles, no texto assinado por O. Bohigas consta o seguinte:

Continuar a morfologia urbana mais característica de Barcelona (o


Eixample) mas com uma revisão contemporânea (quarteirões quase
fechados e as ruas quase corredor);
Na morfologia tradicional, incorporar tipologias atualizadas com as
conquistas do Movimento Moderno, inclusive modificando a dimensão do
bloco, levando-o a ‘super unidades’ integradas (BOHIGAS, 2012, blog).

As cinco quadras voltadas para a avenida beira-mar são parte do perímetro destinado a Vila
Olímpica e foram projetadas com inspiração nos diagramas do plano de 1850. Uma
reverência, só possível porque a entidade paraestatal empreendedora dos jogos era a
gerenciadora de todo o sítio destinado ao centro olímpico e, não houve interesses
comerciais que exigissem o parcelamento das quadras em lotes ou impedissem o projeto
das ‘superunidades’ (como os urbanistas as designaram) com baixa taxa de ocupação do
solo. É interessante observar a força do significado do conceito de pátio interior proposto
por Cerdá como influiu na equipe de Bohigas ao desenhar as quadras defronte ao mar, na
130

medida que se preferiu replicar o esquema, a explorar a maior interação com o jardim
linear defronte e as vistas para a paisagem costeira, figura 5-11.

Figura 5-11: Vista da área planejada

Fonte: Google Earth, 26.07.2019

Pela observação das figuras 10 e 11 se demonstra que a ideia de inserir pátios verdes de
acesso público no interior da quadra, em maioria, não aconteceu com a largueza
preconizada pelo plano. Fato decorrente do seu processo de implementação que deveria
atender as diretrizes relativas ao desenho da rua, da quadra, do lote e dos edifícios, mas, a
realidade mostrou a necessidade de existir lotes de tamanho viável para os pequenos
empreendimentos, o que afetou a ideia do grande pátio verde em diversos locais da cidade
– com certeza os menos nobres. O emblemático projeto para Barcelona se desenvolveu
em um tempo - metade do século XIX - quando ainda não se pensava nas benesses dos
veículos motorizados.
Dando outro salto na história, chegaram os automóveis, os ônibus, os ônibus cada vez
maiores e os monotrilhos. Eles foram tomando os espaços das ruas, até a revolta contra
eles pela bandeira das cidades caminháveis, saudáveis e sustentáveis. Nesta evolução o
mundo passa pelos conceitos das cidades jardim, do urbanismo moderno, do novo
urbanismo e dos contemporâneos (top-down e bottom-up). O fato é que a circulação, ou
CORREDORES E SUBÁREAS - 131

mobilidade de veículos, motorizados, sem motor e de pedestres nas cidades passou a ser
de fundamental importância no planejamento, planos e projetos urbanos.

Brasília e as superquadras

As superquadras implantadas ao longo do eixo rodoviário de Brasília são o testemunho do


Urbanismo Moderno, onde a circulação veicular serve para dar uma forte estrutura no
desenho do conjunto. As superquadras de 240x240 m² (57.600 m² de área) se completam
por uma faixa non-aedificandi de 20 m de largura ocupada por vegetação de grande porte,
como uma moldura verde em todo o perímetro. Incluindo a faixa verde, as superquadras
perfazem 280x280 m totalizando a área de 78.400 m² (7,84 ha). Comparado com a quadra
de 100x100 m (1 ha) comum em São Paulo, o espaço físico da superquadra de Brasília
equivale a quase oito vezes a do tecido tradicional paulistano. Na primeira faixa lindeira ao
eixo rodoviário de Brasília todas as superquadras são construídas por blocos de seis
pavimentos sobre pilotis e garagem no subsolo o que obriga haver um correr com janelas
baixas para ventilação, elevando sensivelmente o pavimento térreo dos prédios em relação
ao nível do terreno ajardinado ao seu redor, figura 5-12.
Figura 5-12: superquadras Sul, na altura da SQS 107/108

Fonte: Google Earth, 21.08.2020


132

A superquadra do Urbanismo Moderno como concepção de espaço objetiva reunir uma


quantidade de famílias para habitar e compartilhar equipamentos que por natureza devem
estar junto às residências; fora aqueles para as atividades comerciais e de serviços previstos
em vias que distribuem, próximas, mas não juntas às habitações. Ao reunir um conjunto de
quatro superquadras, acompanhada por seus equipamentos de conveniência o
arquitetourbanista Lúcio Costa estabeleceu uma ‘unidade de vizinhança’ e junto a elas os
equipamentos (como o cinema, ou a escola secundária) de natureza setorial, mais acessível
por todos da cidade. Organização do espaço que corresponde ao conceito de unidade de
vizinhança típico das cidades-jardim, que juntas - três a cinco destas unidades-
complementadas por outras áreas de interesse comum, formam uma neighbourhood unit
(cerca de 64ha); configuração correspondente a um pequeno bairro no Brasil (FARR, 2008,
p.118).
O traçado da unidade de vizinhança do Urbanismo Moderno difere daquele das primeiras
cidades-jardim, em princípio por seu tipo de inserção urbana. Letchworth (1905) e Welwyn
Garden City (1920), as primeiras cidades-jardim inglesas foram concebidas para 30.000
habitantes no tempo em que havia nenhuma preocupação com o efeito negativo do
transporte motorizado: conviviam a carroça, a carruagem e os primeiros automóveis.
Brasília foi concebida para 700.000 habitantes (anos 1950) num tempo em que as calçadas
das cidades tradicionais começavam a se amesquinhar para dar lugar à circulação
motorizada. Neste sentido, Brasília foi contemporânea através de seu sistema de circulação
hierarquizado e das superquadras. Os conceitos de cul-de-sac e de loop, até então
encontrados nas cidades tradicionais e recriados pelas cidades-jardim, voltaram a ter
presença no plano urbanístico de Brasília. Nas superquadras a entrada se faz por um único
espaço de acesso e nos 5,76 ha de área, onde estão os blocos residenciais sobre pilotis, a
circulação é distribuída para grupos de prédios de forma independente usando o conceito
do viário local inspirado nas cidades-jardim.
A unidade de vizinhança foi produto de repartir os espaços urbanos conforme grupos de
atividades que as pessoas exercem na cidade. Isto caracterizou o ideário do Movimento
Moderno e os projetos nele baseados que contrariam em muito a cidade tradicional,
principalmente quanto à segregação de atividades. O que não impede a descoberta e
CORREDORES E SUBÁREAS - 133

permitir que nos tecidos tradicionais se criem aglomerados que, mesmo tendo seus
equipamentos de conveniência misturados, possam ter um ambiente enriquecedor de
convívio humano. Neste sentido lembramos que os wards projetados em 1733 para a
cidade de Savannah caracterizam um tipo de tecido urbano orientado por retícula
ortogonal, onde o ward (200x200 = 4 ha) pode ser considerado uma superquadra (equivale
a quatro quadras tradicionais de 100x100 m) com a característica de ser um espaço de uso
misto. Ainda a respeito de Savannah, chamamos atenção para que no traçado em retícula
ortogonal foram previstas vias de maior largura em função dos trajetos maiores, servindo
como organizadores do espaçamento entre grupos de wards; sua função era valorizar
visualmente as vias principais e não dar uma resposta ao volume de tráfego como fator
determinante, como hoje em dia se faz. Em Manhattan, de acordo com o plano de 1811, as
vias traçadas no sentido longitudinal da ilha foram projetadas mais largas devido aos
percursos serem mais longos e, em função da demanda por transporte coletivo já prevista
naquela época. No plano de Brasília a circulação entre as áreas setorizadas das atividades
urbanas; residencial, à administrativa do país e a do governo local, tomaram a forma de
avião: o eixo gregário residencial arqueada perpendicular ao eixo monumental.
Figura 5-13: o padrão para uma área de vizinhança

Fonte: CODEPLAN, 1991. Brasília, DF


134

As vias que atravessam e as que distribuem, particularmente no eixo residencial (ou


rodoviário, simbólico da ligação Norte-Sul do país) fazem o papel de delimitar duas fatias
da cidade: a porção Oeste e a Leste. Situação que facilitou a numeração das vias; de um
lado se usou a inicial W (Oeste), do outro a inicial L (leste): W1, W2, W3, ... L1, L2, L3, ...,
figura 5-13.
As superquadras SQS 308-307 e 108-107, simbolizam o conceito de Lucio Costa e foram as
escolhidas para o desenho divulgado pela CODEPLAN, Companhia de Planejamento do
Distrito Federal. Aparece a sequência de vias desde o Eixo Rodoviário Sul, ERS até a W3S. A
primeira paralela ao eixo rodoviário é W1- Sul, é uma ‘via que distribui’, pois, através das
vias de comércio local, faz a ligação com as vias W2 e W3-Sul. Ela é interrompida a cada
quatro superquadras. A via W2 é uma via de distribuição bloqueada em vários pontos para
servir de preferência a unidade de vizinhança e servir como apoio à via W3- Sul, que é uma
‘via que atravessa’ proporcionando uma extensa ligação viária. A faixa de lotes entre ela
e a W2 é ocupada por edificações de uso misto, forte atividade comercial à moda do que
acontece em uma cidade de tecido tradicional. Na figura 13B, foto do Google, procuramos
uma vista de toda a unidade de vizinhança. Brasília é representativa de um plano baseado
na contribuição da hierarquização do sistema de circulação, para garantir resguardo aos
locais de vizinhança. As questões relativas ao traçado viário e sua relação com as quadras
da cidade são fatores importantes para os procedimentos de análise da forma urbana
através dos corredores e subáreas, em particular nos traçados em retícula. As vias de
ligação nas duas escalas, a que atravessa e a que distribui, devem ser entendidas como
canais de movimento que tornam realidade o corredor no contexto urbano, de expansão
da cidade ou rural. Vimos como em Brasília acontece a sucessão do trânsito desde o eixo
rodoviário (via que atravessa) até a entrada da superquadra; que difere da quadra
tradicional por não ser parcelada, sendo considerado como ‘lote’ a projeção horizontal do
prédio.
Da superquadra, do seu ajuntamento com outras para formar a unidade de vizinhança, se
verifica a intenção de ligar o local de residência às vias de distribuição e de o separar vias
das que atravessam.
CORREDORES E SUBÁREAS - 135

Em Brasília o princípio do zoneamento é considerado importante ao ponto de haver um


local específico para o comércio local nas entre quadras. Localização que faz sentido na
medida que no plano da cidade são os trechos finais das vias que atravessam pelas
passagens inferiores o eixo rodoviário. A via comercial das entre quadras são alternadas na
sequência de superquadras das faixas de numeração 100 com as de numeração 300, o que
torna o traçado reticular mais complexo. Na figura 14A pode-se avaliar esta configuração
do sistema viário.
O entendimento da relação entre a quadra, que proporciona os locais de maior
permanência das pessoas, com as vias que permitem o acesso a elas, se modificou na
medida que o urbanismo evoluiu em função das novas soluções viárias. Isto aconteceu em
menor escala nas soluções provenientes dos conceitos de cidade-jardim, em consequência
de as vias de acesso possuírem largas faixas verdes laterais interligadas com vias de
distribuição. O que permite que se integrem de uma maneira orgânica com as áreas de
vizinhança, ajustando-se suavemente aos contornos do terreno natural.
Nos projetos desde as cartas do Movimento Moderno, passou a influir decisivamente no
urbanismo a racionalidade no traçado do sistema viário, plano e projeto, onde a separação
das vias por categorias passou a ser um elemento auxiliar no projeto de áreas a urbanizar
e isto foi importante. A investigação que desenvolvemos leva em conta como um dado da
realidade a classificação detalhada das vias, de responsabilidade do órgão municipal,
apesar da redução que se faz para os três tipos: atravessar, distribuir e chegar a uma trama
local. Devido à prevalência que o traçado viário assumiu desde o Moderno adotamos por
referência temporal em nosso estudo os meados dos anos 1930 (Carta de Atenas).
Primórdios de uma maneira de pensar em edifícios e cidades que iria influenciar os projetos
de arquitetura e urbanismo na Europa em outros países, o Brasil em particular, depois do
pós- segunda grande guerra (1945). A estabilidade política, social e econômica posterior à
guerra permitiu a retomada do desenvolvimento e de novos projetos. O Movimento
Moderno na arquitetura e no urbanismo se estabeleceu em definitivo, e agora existe uma
vasta literatura sobre o assunto. Afirmamos que na escala da cidade ele alcançou o apogeu
no continente americano, com a realização espetacular da cidade capital do Brasil,
inaugurada em 1960.
136

A experiência de Milton Keynes

A partir da década de sessenta os estudos na área de engenharia de tráfego se


aperfeiçoaram e houve a oportunidade de sua utilização no plano para a cidade de Milton
Keynes, na Inglaterra, fundada em 1967. Esta cidade foi a última do plano para
descentralizar as indústrias da vizinhança imediata de Londres, consequentemente,
contingentes de população. Esta cidade fica a oitenta quilômetros da capital e hoje tem
duzentos e trinta mil habitantes. O projeto traz como ideia o assentamento da área
urbanizada e seus arredores em uma retícula viária ortogonal de mil por mil metros,
recomendado pelos especialistas em tráfego como o melhor sistema para se organizar uma
cidade. A trama reticular engloba vários povoados (villages) que existiam na área e foi
escolhido um deles para ser o centro da nova cidade, por ser referência histórica e por ficar
em boa localização geográfica. A previsão inicial de projeto foi para 250.000 habitantes. O
reticulado ortogonal de aproximadamente mil por mil metros, é deformado para se ajustar
à declividade do terreno, que não é muito acentuada. São polígonos de aproximadamente
cem hectares, o equivalente a cem quadras da cidade tradicional. Este princípio de projeto
foi o mais contemporâneo na Inglaterra do final dos anos 1960. Anos em que foram
realizados projetos apoiados em conceitos teóricos de urbanismo; das cidades jardim
(Letchworth) às cidades compactas (Cumbernold). Em Milton Keynes, devido aos estudos
que caminhavam adiantados na área de engenharia de tráfego, foi utilizado o resultado
preconizado como o melhor daquele tempo, onde a distribuição da circulação que
atravessa o sítio de uma cidade deveria ser traçada em grelha.
No diagrama que representa o plano para Milton Keynes destacam-se as vias definidoras
da malha, a via Kristall , letra B na figura 5-14, onde se desenvolve uma longa faixa de terra
destinada a implantação de indústrias, e a Harrier Drive, letra C que segue paralela a
anterior e chega até outra área também para indústrias, mas, de formato compacto e
localizada ao Sul. figura 5-14.
CORREDORES E SUBÁREAS - 137

Figura 5-14: Milton Keynes, traçado em forma de malha no bairro Oldbrook.

Fonte: Diagrama do Urban Planning Office, M. K. Destaque em preto do autor. Commons Wikimedia.

No sentido Noroeste-Sudeste o polígono onde se encontra Oldbrook se completa pelas


paralelas Childs Way, letra D e a Chaffon Way, letra C. Estas quatro vias que atravessam
formam um polígono de oitenta e seis hectares que é a área aproximada da área de
vizinhança Oldbrook, ilustrada a seguir. Ainda na figura 5-4 indicamos com a letra A uma
rodovia principal que atravessa a Inglaterra chegando ao anel rodoviário de Londres Este
setor de vizinhança foi escolhido para exemplo por situar-se na vizinhança do Centro:
formado pelas quadras menores como se encontram no diagrama. As demais quadras que
constituem os conjuntos de vizinhança, destinadas a moradia e seus equipamentos se
situam nos espaços centrais, longe das rodovias e articuladas ao Centro. O centro da cidade
se caracteriza por sua retícula de dimensões menores obtida pelas vias que distribuem,
tributárias de vias que atravessam, figura 5-15.
O plano de Milton Keynes tomamos como uma referência importante para ilustrar o
conceito de vias que atravessam e distribuem, extrapolando o conceito de corredor
aplicado aos tecidos tradicionais. Diferentemente destes os corredores de Milton Keynes
são ladeados por generosas faixas verdes e o comércio e os serviços foram planejados de
138

maneira concentrada em locais estratégicos, fora dos entroncamentos viários. O diagrama


da figura 5-14, elaborado pela municipalidade - Urban Planning Office - mostra o sistema
completo em malha de forma sintética e é um bom exemplo de desenho para ser utilizado
em projetos urbanos, figura 5-14.
Sobre este sistema em reticulas se destaca na cor preto um setor que se chama Oldbrook,
o que para nós brasileiros poderia ser considerado um bairro, com aproximadamente
cinquenta hectares de área. Oldbrook localizado junto ao Centro, com suas quadras
pequenas, é delimitado por um contorno de vias e faixas verdes com os acessos por pontos
bem identificados e com dispositivos apropriados para a redução da velocidade dos
veículos nos espaços de acesso ao setor.
Destaca-se a preocupação de ‘proteger’ o lugar das casas, o setor definido pelas vias que
atravessam e são ladeadas por faixas de vegetação, os corredores verdes. O desenho das
quadras internas que compõe o setor segue a tradição das cidades jardim e isto interessa-
nos quando do estudo das quadras tradicionais em São Paulo, figura 5-15.
Lembramos da referência feita no capítulo três ao loteamento projetado por Jorge de
Macedo Vieira no bairro da Mooca, que delimitado por vias que atravessam e distribuem
assumiu a configuração de uma subárea onde o corredor de uso misto faz o papel de
transição em um contexto de densidade de ocupação alta.
Em 5-15A aparece o distrito como um todo, formado por bairros, onde se destacou em cor
clara na foto aérea, um dos tipos de espaços menores protegidos do trânsito de passagem.
Esta situação se compõe com outras semelhantes também protegidas (do trânsito) que se
associam a equipamentos públicos para formar o conjunto de ‘unidades de vizinhança’ e a
cidade como um sistema completo.
Em 5-15B, se destaca o setor da cidade, como algo equivalente a superquadra de Brasília,
protegida por vegetação. O plano da cidade de Milton Keynes foi desenhado com base no
repensar de uma cidade tradicional corrigindo a distribuição do tráfego pelo sistema de
grelha que propõe. Isto possibilitou se projetar a cidade por partes aplicando a ideia então
contemporânea das unidades de vizinhança trazida do conceito das cidades jardim de
Howard, mas, regrada pelo sistema em grelha. A organização do projeto pelas vias
CORREDORES E SUBÁREAS - 139

principais e áreas de vizinhança quase na mesma época foi usada no plano para Brasília,
onde o sistema reticular foi proposto por um tipo de traçado não tanto uniforme.
Figura 5-15: O bairro Oldbrook em Milton Keynes

Fonte: Google Earth, 13.09.2020


140
CORREDORES E SUBÁREAS - 141

CAPÍTULO 6 - Os grandes conjuntos habitacionais e o declínio do Moderno

Nosso estudo é sobre a forma dos tecidos e o projeto urbano, restrito ao contexto brasileiro
e a algum conhecimento estendido para a Europa e América do Norte. Nisto importa
considerar que desde o final dos anos 1950 a crítica ao Movimento Moderno começou a se
fazer forte, apontando para a sua falência. O descontentamento dos moradores de grandes
conjuntos habitacionais e os consequentes problemas sociais, levou a demolições de
grande porte. Algumas delas se referem a projetos elaborados por escritórios que são
referência internacional de Arquitetura e isto nos interessa quanto as decisões à nível
programático de realizá-los. No pós-guerra mundial enquanto se desenvolviam processos
de pré-fabricação, políticos e planejadores urbanos decidiam onde e como construir
habitações para todos. Chegou-se em muitos países a decisão de construir conjuntos
habitacionais de grande porte e foi a oportunidade para muitos bons arquitetos
trabalharem sob a égide modernista que vinha se aperfeiçoando desde os anos 1930,
através de diversos congressos internacionais.
Com as melhores intenções, apoiados na engenharia, na arquitetura e nos urbanistas,
diferentes países decidiram resolver o déficit habitacional através do conceito de construir
unidades residenciais com área útil pequena, mas, contrabalançadas por espaços
generosos ao ar livre generosos. Foi a influência do cânone modernista, explicado por
teorias contundentes. Construídos, bem divulgados pelos meios de comunicação, modelo
para estudantes e arquitetos, os grandes conjuntos habitacionais não se mostraram ser
bons lugares para a vida das pessoas e alguns foram demolidos. Chegou-se desta maneira
ao final Urbanismo Moderno (JENCKS 1985).
Referimo-nos aos grandes conjuntos para salientar que a maior razão deles terem vindo ao
chão, o terreno voltar a ficar vazio, caracteriza um processo de substituir construções cujo
programa de necessidades estava inadequado com a natureza do local. Nos dois casos
tomados como exemplo faltou a integração com o local no sentido de abrigar diferentes
tipos de uso do solo e abrir para a cidade tipos diversificados de áreas livres e verdes.
Selecionamos dois casos icônicos com o intuito de mostrar que, os terrenos grandes devem
ter suas construções programadas para serem parte de um ambiente urbano, ou seja, um
142

distrito especial inserido no contexto de um setor ou subsetor da cidade. Os conjuntos


habitacionais demolidos eram projetos de arquitetura para residências, com equipamentos
sociais exclusivos.
O conjunto Robin Hood Garden representa o caso de substituição ainda hoje em curso.
Localiza-se no bairro Poplar, parte leste de Londres (London E14). O projeto de arquitetura
foi de responsabilidade do escritório de Peter e Alison Smithson, e passou a ser uma
referência para os conceitos estabelecidos pelo Movimento Moderno. Influenciou
arquitetos -professores e por extensão
O conjunto ocupa uma quadra de três hectares em formato de trapézio e se caracteriza por
dois blocos e um espaço verde entre eles. O bloco maior acompanhava (foi demolido) a via
pelo lado Oeste com cerca de cento e quarenta metros de comprimento e dez pavimentos
de altura. O outro acompanha o alinhamento da via à Leste com cento e quinze metros de
comprimento e sete pavimentos, com prazo já estabelecido para ser demolido. Esta
configuração proporcionou um pátio interno grande, o paisagismo criando ondulações no
terreno gramado e bosquetes - pequenas áreas arborizadas - implantados de maneira
esparsa.
A figura a seguir mostra os principais elementos urbanos do sítio. Quadra (3 ha) em forma
de trapézio é formada por uma via que atravessa no sentido Oeste-Leste, e passa pela
aresta menor do trapézio (Poplar High Street); pela via que atravessa a quadra pelo lado
Oeste, a Preston Street; pela via de distribuição de 185 m de comprimento que forma a
base maior do trapézio; e, fechando o trapézio aparece a via local passando pelo lado Leste
da quadra, chamada Robin Hood Lane; ela é auxiliar da via maior que atravessa, figura 6.1.
Em 6.1A aparecem os dois blocos do projeto original em uma foto do Google Earth de 2009.
Em 6.1B aparece a situação atual com o bloco original voltado para a via local Robin Hood
Lane e os novos blocos projetados. Cumpre observar a via de distribuição interna que foi
introduzida entre a Poplar High Street e via existente que forma a base maior do trapézio.
Ela permite que os acessos aos prédios novos aconteçam por uma via local do tipo ‘lane’
com a vantagem de o jardim interno do projeto anterior ficar mais acessível e seguro para
os pedestres.
CORREDORES E SUBÁREAS - 143

Figura 6-1: Área do projeto Robin Hood Garden

Fonte: Google Earth Pro. 28.12.2020

O projeto dos Smithsons data do final dos anos 1960, foi inaugurado em 1972 e a demolição
do primeiro bloco aconteceu entre 2012 e 2017. O novo projeto para a quadra trapezoidal
está previsto ser implantado até 2021.
É importante assinalar que a renovação desta quadra, foi planejada desde os anos 1990,
como parte integrante de um projeto urbano chamado Blackwall Reach Development que
144

se estende para um trecho de doze hectares, como está indicado na figura 6-2. O estudo
de caso foi escolhido para ilustrar o que vimos argumentando no sentido do projeto urbano
ser parte da cidade, se integrarem ao tecido local e oferecerem variados tipos de habitação.
A área de doze hectares comparada a outros projetos permite dizer que facilita a interação
entre os participantes, facilita a implementação do projeto urbano, segundo o princípio de
se reduzir o aporte de dinheiro público.

Figura 6-2: Área do projeto urbano Blackwall Reach Redevelopment

Fonte: Google Earth Pro; diagrama do autor

Outra situação envolvendo a demolição de todo um conjunto habitacional moderno é o


caso de Pruitt Igoe nos EUA. Não vamos acrescentar nada na sua história tão bem contada,
mas, explorar os elementos gerais da inserção urbana com a pouca informação disponível
e o estado da arte quanto ao futuro da área desocupada a cerca de quarenta e cinco anos.
Nossas observações se apoiam no pano de fundo presente para nós: os sistemas de
ocupação dos espaços por atividades diversificadas, entender o espaço por setores urbanos
e a interrelação entre os parceiros para viabilizar um projeto urbano.
CORREDORES E SUBÁREAS - 145

Nos Estados Unidos da América a partir dos anos 1960 cresceu o descontentamento com
as obras viárias que comprometiam a integridade de bairros e de comunidades locais.
Situação estudada por vários autores de onde destacamos os movimentos do tipo advocacy
planning, característico das cidades maiores. Sobre esta matéria uma boa referência são os
escritos do arquiteto-professor Robert Goodman, MIT, Massachusetts Institute of
Technology e ativo participante de movimentos sociais urbanos nos Estados Unidos da
América (GOODMAN, 1972).
O que se destaca sobre a população ficar descontente com as decisões governamentais
sobre o sistema viário ou com a habitação social se relaciona com o exercício do
planejamento urbano centralizado, na ânsia para atingir números estabelecidos como
meta, como ocorre também no Brasil. Procedimento em que fica de lado o sentido
humanitário no trato com as pessoas. Esta fase expressa as sérias consequências do
movimento moderno de urbanismo e arquitetura na vida das famílias de baixa renda. Hoje
se analisa o impacto dos grandes conjuntos habitacionais à luz do que foi o entusiasmo para
este tipo de empreendimento e o insucesso devido a rejeição apresentada pelos moradores
em muitos locais. Nos EUA a resposta oficial foi rápida e logo passaram a ser demolidos
conjuntos mono funcionais projetados em altura, projetados por reconhecidos escritórios
de acordo com os princípios da Arquitetura e do Urbanismo Moderno. Como o nosso
trabalho tem foco na substituição dos espaços que resultam das necessidades das pessoas
ao caminhar do tempo, destacamos Pruitt-Igoe, nos EUA, temporalmente anterior ao
conjunto Robin Hood Garden, sendo os dois exemplos radicais da substituição de tipos de
espaços em consequência da falência do planejamento voltado para empreendimentos que
deveriam suprir necessidades prementes da sociedade.
Trataremos da demolição de um conjunto habitacional na cidade de Saint-Louis, localizada
no estado de Missouri (população 320.000 em 2019), ocorrida no período de 1972 a 1975,
ação referenciada por diversos autores como o fim do Urbanismo Moderno. Julgamos isto
ser uma atitude panfletária dos intelectuais, mas, foi o jeito encontrado para tratar a
matéria tão candente para o mundo inteiro. O projeto data de 1955, foi elaborado pelo
escritório do arquiteto Minoru Yamasaki (Yamasaki & Associates) e agraciado com um
146

prêmio do American Institute of Architects, AIA, pouco depois de sua inauguração ao final
dos anos cinquenta.
O nome Pruitt-Igoe vem da junção do nome de dois conjuntos habitacionais vizinhos, um
chamado Wendell Olliver Pruitt Homens e o outro William Leo Igoe Apartments, ocupando
uma parcela com a área aproximada de trinta e sete hectares. Pela imagem de 1968 é
possível observar a posição relativa dos conjuntos, alguns edifícios comunitários e o espaço
livre de reserva para equipamentos sociais e jardins.
Os prédios foram demolidos entre 1972 e 1976 e a literatura aponta para os trinta e três
prédios de onze pavimentos e dois mil oitocentos e setenta unidades residenciais, para
abrigar cerca de nove mil e quinhentos residentes, em uma área de trinta e sete hectares.
(257 hab/ha). A escolha da boa orientação solar, Leste- Oeste, também adequada quanto
aos ventos, levou ao projeto de prédios paralelos na parte maior do conjunto. Na porção
de área menor onde os apartamentos eram maiores, destinados para famílias em uma faixa
de renda mais alta, foi utilizado o esquema em Y que leva a diferentes direções para as
fachadas. Duas alternativas para implantação dos prédios, usuais por escritórios europeus
representativas do Urbanismo Moderno, que não conduzem a espaços de uso coletivo de
boa qualidade.
Após a demolição (1972-1976) o destino de Pruitt Igoe foi permanecer como um espaço
desocupado. As fotografias aéreas mostram que os setores Norte e Noroeste da cidade tem
um tipo de tecido caracterizado por quadras pequenas e de baixa ocupação. Neste contexto
a implantação dos prédios de onze pavimentos com população de nove mil e quinhentos
habitantes, em apartamentos pequenos formando uma ilha isolada foi um dos fatores
fortes que levou a ação de destruí-los. Há outras razões citadas como a indisponibilidade
financeira para a implantação de serviços de apoio e o agenciamento mal resolvido dos
espaços abertos, que se somam ao tipo de inserção urbana deste conjunto habitacional
(TRANCIK, R. 1986), figura 6-3.
CORREDORES E SUBÁREAS - 147

Figura 6-3: Conjunto residencial Pruitt-Igoe.

Fonte: US Geological Service, March 3, 1968, public domain. Wikimedia Commons.

A foto abaixo, não datada (provável ser por volta de 1980) foi tirada na direção Noroeste –
Sudeste e permite se considerar correta esta orientação, pela posição em que se encontra
o Gateway Arch construído em 1965 e localizado no Gateway Arch National Park, a menos
de três mil metros de distância de Pruitt-Igoe. O arco cujo projeto datado de 1947 é de
autoria do arquiteto finlandês Eero Saarinen, se distingue por seus cento e noventa e dois
metros de altura. Ele simboliza um portal de entrada para o Oeste norte americano e se
passaram dezoito anos até o início da sua construção (1965). Chamamos atenção para a
demora com que ocorre a disponibilidade financeira do município de Saint Louis para
grandes empreendimentos urbanos, e por pressuposto Pruitt Igoe foi uma exceção,
148

provavelmente se valendo da dotação de verbas especiais para o segmento de habitação.


Hoje estamos a quarenta e cinco anos da demolição e os trinta e sete hectares de Pruitt
Igoe se mantém vazio entre as quadras de baixa taxa de ocupação do setor Norte de Saint
Louis, figura 6-4.

Figura 6-4: A área dos conjuntos modernos após a demolição.

Fonte: Wikimedia Commons 18.09.2020

Como uma paródia hoje se poderia dizer que o arco simboliza à vontade para desenvolver
as porções Norte e Sul da cidade, onde a ocupação é rarefeita e de pouco interesse
imobiliário para curto prazo. Hoje (2020) se percebe a vontade do poder público de Saint
Louis para desenvolver a área onde se encontra Pruitt Igoe, não é mais através da decisão
pontual para resolver um déficit habitacional, e sim por um plano urbanístico abrangendo
o setor Norte da cidade. O urbanismo passa a ser feito percorrendo suas etapas
operacionais de planejamento urbano, plano e projeto.
Recentemente em Saint Louis o grupo oficial de planejamento e o Land Clearance for
Redevelopment Authority (Autoridade de Desobstrução de Terras para Reurbanização),
entidade criada para eliminar e prevenir a praga durante a reforma da comunidade, decidiu
negociar a área de Pruitt-Igoe com um grupo imobiliário privado. A empresa de origem no
próprio estado do Missouri, The Mckee Group especializada em estratégias para a
CORREDORES E SUBÁREAS - 149

implantação de empreendimentos imobiliários está interessada na negociação, segundo


mostra a jornalista de Saint-Louis Maria Altman que publicou:

O empreendedor Paul McKee garantiu por três anos a opção para comprar
por U$ 1 milhão a antiga gleba de Pruitt-Igoe, na cidade de St. Louis. Essa
garantia está para expirar no final deste mês. Mas, a Autoridade de
Liberação de Terras para Reestruturação da Cidade, estendeu a opção de
McKee pela segunda vez em três anos, durante uma reunião fechada
(ALTMAN, 2016).

As partes Norte e Sul da cidade são separadas por uma faixa de pujante desenvolvimento
urbano com a largura média de mil e seiscentos metros e que canaliza o movimento
veicular principal na direção leste-oeste, até à margem do rio Missouri. Esta faixa de
ocupação intensiva é marcada pela Market Street, uma designação recorrente nas cidades
americanas da via de comércio central. Em Saint Louis ela é do tipo boulevard e permite
visuais focadas no Gateway Arch. Esta área está destacada na cor lilás no diagrama, figura
6-5
Na parte Norte envolvendo as quadras onde os lotes são pequenos, ao redor da parcela
vazia do antigo conjunto habitacional Pruitt Igoe, despontam construções com um ou dois
pavimentos e a empresa The Mckee Group tem comprado lotes de maneira esparsa na
área. Assinalamos na foto da parte Norte da cidade os setores do entorno da área livre
deixada pela demolição e o espaço abrangido por setores vizinhos, conforme o
procedimento dos corredores e subáreas; em auxílio para a análise de tecidos urbanos por
partes. Um exercício para demonstrar o critério da subdivisão da cidade pelas vias que
atravessam, com base na foto do Google Earth e alguns percursos de verificação passeando
pelo Street View. Foram identificados seis setores e o de número 5 é a parcela Pruitt Igoe.
Apenas por pesquisas na Internet verificamos que o Grupo Mckee tem adquirido imóveis
esparsos na região e se interessam em adquirir o setor Pruitt Igoe ou estabelecer parceria
com a prefeitura de Saint Louis. Isto sinaliza a necessidade de haver um plano da área toda
(seis setores) e a identificação de partes como special districts que seriam pilotos para o
desenvolvimento estruturado do conjunto e a integração com a faixa central de Saint Louis,
e mais ao Sul com a parte já desenvolvida.
150

Figura 6-5: área Norte da cidade

Fonte: Google Earth Pro; diagrama do autor.

As publicações especializadas mostraram com ênfase as propostas para habitação popular


verticalizada entre os anos 1960 e 1970, onde se insere Pruitt Igoe e Robin Hood Garden.
Sobre as dificuldades da população de baixa renda viver e gerir grandes condomínios
verticalizados, o antropologista-professor Michael Richard Allen discute de modo realista o
caso de Pruitt Igoe no artigo Looking back at Gateway Village, ecology of absence (ALLEN,
2009).
Pelo nosso ponto de vista e por ser matéria para estar presente no estudo do espaço físico,
afirmamos que os espaços construídos segundo o projeto premiado de Pruitt Igoe não se
tornaram lugares devido à falta de um ambiente urbano completo, inserido em um bairro
CORREDORES E SUBÁREAS - 151

já estruturado. Nos EUA, nove mil e quinhentas pessoas distribuídas segundo um critério
de neighbourhood caberiam nos trinta e sete hectares, se houvesse abertura para o
desenvolvimento dos setores vizinhos, todos entendidos como parte de uma cidade. A
gleba remanescente da demolição com a visão do urbanismo sustentável, certamente
passará ser considerada como um projeto urbano formado por núcleos menores integrados
como um subsetor, a setores da cidade como um todo. Em nosso exemplo são seis setores
que deverão gerar subsetores criteriosamente associados a vias que distribuem (NEWMAN;
JENNINGS, 2008).
A experiência de estudar o caso de Pruitt Igoe faz lembrar a implantação dos grandes
conjuntos habitacionais mono funcionais em bairros afastados da zona Leste da cidade de
São Paulo nos anos sessenta, onde eles permaneceram por terem densidade de ocupação
relativamente baixa e pela pouca exigência dos moradores. Ainda m São Paulo temos o
caso do Edifício São Vito, uma proposta de verticalização para habitação subsidiada no
Centro de São Paulo que como os casos da Inglaterra e dos EUA mostrados neste capítulo,
progrediu para o insucesso e a demolição. Atualmente em São Paulo, dito em nova base de
organização condominial, voltou-se a projetar e construir habitação em prédios altos
152
CORREDORES E SUBÁREAS - 153

CAPÍTULO 7 - A persistência da retícula ortogonal e a sustentabilidade

Prosseguindo com nossa atenção para o traçado de cidades, onde a preocupação com o
desenho da quadra sempre toma lugar, vamos para um estágio de revisão do Moderno e
pautada nos tipos do Novo Urbanismo. Este movimento se propagou nos EUA e se
assemelha discretamente ao que vem sendo desenvolvido na Europa, por muitos
arquitetos, com vista aos parâmetros de sustentabilidade. De forma discreta, na medida
que as preocupações do Novo Urbanismo são oportunas, mas, se atêm a itens de
externalidade da sustentabilidade como o uso de carros elétricos, andar de bicicleta,
economia de água ou a aproximação com aspectos da paisagem natural. Esta seria a prática
convencional já ampliada pelos europeus. O arquiteto-professor Douglas Farr fornece um
alerta:

O desenvolvimento do urbanismo sustentável exige um nível de


coordenação de projeto e sofisticação de empreendimento que vai além
da prática convencional. Não é para medrosos. Apesar desses desafios,
pioneiros têm optado por buscar essa abordagem de projeto no mundo
inteiro. Estas narrativas de estudos de caso descrevem o ímpeto de
liderança por trás de cada projeto… Esses líderes podem ser prefeitos,
planejadores, empreendedores, ativistas ou qualquer combinação destes.
Nesse estágio inicial do movimento do urbanismo sustentável, com tantas
barreiras a serem superadas, visão e liderança são, sem dúvida, os ativos
mais importantes que tais projetos possuem (FARR, 2013, p.214).

A versão original do livro data de 2008 e isto importa para localizar o pensamento de
Douglas Farr no tempo. A questão da sustentabilidade é muito importante, mesmo que
levemente ela passe a influir nos novos projetos, é um fator que tem repercussão na
configuração do tecido urbano e, portanto, nos estudos de morfologia, objeto de nosso
trabalho.
O Novo Urbanismo eclodiu nos anos 1980 e após diversos congressos, seus propósitos
ficaram expressos pela Carta do Novo Urbanismo de 1996, cujo conteúdo envolve itens
desde a região até o quarteirão e de sustentabilidade associada ao contexto urbano e
regional (MACEDO, 2006).
154

Seaside, localidade ícone do Novo Urbanismo

O bairro de Seaside - município de Walton, Noroeste do estado da Flórida, projetado e com


sua construção iniciada em 1990, passou a ser um exemplo da urbanização preconizada
pelo grupo dos novos urbanistas e se tornou o marco referencial deste movimento. O
projeto desenvolvido pelo escritório Duany, Platter-Zyberk Architects, apresenta um
repertório de ideias com base na tradição das cidades-jardim e com tipos urbanos das
cidades de tecido tradicional. Aspectos que são de interesse para a nossa postura de
valorizar e aprender o que há de bom, em relação a repensar os tecidos tradicionais e
adicionar mais informações a nossos estudos de morfologia urbana. Quanto aos
parâmetros de sustentabilidade o Novo Urbanismo deu um passo nesta direção, Seaside,
apesar de ser um local voltado para turistas, população flutuante de classe média, teve a
concepção do seu masterplan baseada nas preocupações básicas com a sustentabilidade,
que posteriormente apoiaram a Carta de princípios do grupo dos novos urbanistas
(MACEDO, 2016b), figura7-1.

Figura 7-1: Seaside, plano geral

Fonte: Municipalidade de Walton, FL. Wikimedia Commons

Seaside é uma unincorporated master-planned community (local ainda sem jurisdição


oficial), tem a dimensão - 33ha - equivalente a bairro pequeno de cidade grande, com a
CORREDORES E SUBÁREAS - 155

população no entorno de oito mil e quinhentos, sendo uma parte de moradores


permanentes.
O padrão do tecido urbano em seus aspectos morfológicos se expressa pelos quatro
diagramas desenvolvidos pelo escritório dos arquitetos Duany, Plater-Zyberk, figura 7-2.
Em 2A o esquema da trama viária, onde se deve observar que a gleba de frente para o Golfo
se estende até a praia. Em 2B estão marcados os edifícios de acesso público, áreas de
acesso controlado como lotes dos prédios públicos e as passarelas de transposição das
dunas (são seis pontos). Em 2C, os espaços públicos e privados. Em 2D, a projeção dos
prédios (figure ground).

Figura 7-2: Morfologia urbana, diagramas.

Fonte: Duany & Plater-Zyberk, Architects

As ruas de Seaside foram projetadas para os pedestres, bicicletas (pedal e motor) e


pequenos veículos elétricos; os proprietários de carros de tamanho convencional são
estimulados a estacionar e utilizar os meios leves de locomoção. As quatro fotos da figura
7-3 ilustram aspectos de Seaside relativos à circulação e aos tipos de habitação. Estas
variam desde os bangalôs até as casas de alto custo - ‘pé na areia’ - e se observa a
recorrência das townhouses, algumas adaptadas para pousadas, tipo bed and breakfast.
Em 3A aparece um percurso que, desde a praia galga a duna pôr passarela, atravessa a
156

autoestrada e adentra Seaside. Em 3B aparece o prolongamento do percurso anterior


dentro do bairro; em 3C uma casa de porte médio (existem menores) e em 4D uma
townhouse como pousada.
De nosso ponto de vista esta village norte-americana esboça o que poderia haver de bom
para um ambiente de veraneio, com lições para o meio urbano quanto aos tipos de
quadras, a hierarquia das circulações. Julgamos haver um problema quanto ao acesso
direto para as quadras através da rodovia 30A, que com atual e o progressivo aumento do
volume de tráfego na rodovia e o sucesso do setor de comércio e serviços na frente da
praça principal gera sério desconforto para a circulação motorizada, para os pedestres e
bicicletas. Assunto comentado com mais detalhes no artigo Learning from Seaside’s master
plan, mencionado acima como referência.

Figura 7-3: Situações tipo de vias e residências

Fonte: fotos do autor, 09.07.2015


CORREDORES E SUBÁREAS - 157

Projetos sustentáveis na Suécia

Na Europa, certamente pelo rigor das guerras que os países passaram desde o início do
século XX, se reflete na arquitetura e no urbanismo um apego à economia, à racionalidade
dos sistemas de infraestrutura urbana e das construções. Isto é um dos fatores que
permitiu aos europeus a passagem com tranquilidade para a situação de maior atenção
como hoje se dá para as questões relativas à sustentabilidade. Uma importante iniciativa
foi o Conselho dos Arquitetos Europeu - Council of European Architects, CEA - promover a
elaboração de um manual para sustentabilidade em diferentes idiomas, The Green
Vitruvius, mantido o nome universal na versão portuguesa (CEA, 1999).
No plano internacional há bairros ou setores da cidade, neighborhoods, que foram
projetados como ambientes sustentáveis. São diversos projetos que assim poderiam ser
classificados, não apenas na Europa. Destacamos como país pioneiro a Suécia, onde, em
Estocolmo são de nosso interesse os bairros Hammarby Sjöstad e Järla Sjö, devido à
natureza de seus tecidos urbanos e o caminho que eles fornecem para valorizar a malha
ortogonal, o que reforça sua persistência em projetos para atender a objetivos
diferenciados, nas mais variadas culturas.
No plano diretor para Hammarby (1996) coordenado pela municipalidade de Estocolmo e
desenvolvido por um grupo multidisciplinar de urban design, foi previsto o traçado em
retícula ortogonal, direcionada por setores, assentadas na leve inclinação do sítio e
recortadas acompanhando a forma ditada pela margem irregular do lago, figura 7-4.
158

Figura 7-4: plano geral do bairro Hammarby Sjöstad

Fonte: Wikimedia, Stockholm City Planning Council

As quadras são pequenas (2.500 m²), médias (7.500 m²) e grandes (12.500 m²) e as
edificações nas quadras seguem os alinhamentos das vias deixando pátios chegando
próximo e abertos à vista para o lago. No conjunto do traçado interessa observar a
acomodação que é feita com o terreno, deixando sempre vias locais de topo com a margem
do lago para facilitar a drenagem. Estas são diretrizes (guidelines) que se percebe por uma
análise rápida do traçado deste projeto, figura 7-5.
As vias locais, em duas mãos de direção, chegam próximo ao lago e observa-se que a
vegetação está plantada em pontos marcados no leito da via, deixando espaço para dois
automóveis estacionarem entre elas. Desta forma as calçadas ficam com sua faixa
pavimentada livre para os pedestres. As edificações alinhadas com as calçadas seguem o
gabarito de altura do tipo térreo mais três pavimentos e uso misto. O bairro tem vocação
para atividades industriais, além da residencial, de comércio e serviços, com localizações
distribuídas, mas, implantadas de preferência em um setor de centralidade localizado ao
Sul de Hammarby, com ligação por uma via que atravessa o bairro e chega até a rodovia.
CORREDORES E SUBÁREAS - 159

Figura 7-5: Via local Babordsgaten

Fonte: Google Streetview 20.09.2020

Järla Sjö

A municipalidade de Nacka, distrito de Estocolmo, no início dos anos 1970 encomendou um


projeto para reurbanizar o bairro Järla Sjö sob sua jurisdição (área de 27ha e população
prevista de 25.000). A proposição escolhida por concurso foi de cunho modernista e previa
grandes edifícios articulados entre si. Discutido, o plano foi rechaçado pela comunidade
após longo período de discussões. Disto resultou a preservação dos galpões industriais
antigos e de um pequeno edifício institucional; associada à implantação de quadras que
possibilitasse a construção de edifícios em lotes de tamanho médio (térreo e no máximo
mais três pavimentos). Para coordenação e detalhamento do novo plano abrangendo
requisitos de sustentabilidade, foi selecionado o escritório dos arquitetos Vernon Gracie e
Håkan Jersenius. A ilustração a seguir, figura 7-6, mostra um banner explicativo deste
processo de seleção, que demorou até a comunidade de Järla sentir a real possibilidade
para sua implementação (MACEDO, 2008).
160

Figura 7-6: Banner de divulgação para a comunidade.

Fonte: Wikimedia Commons, 03.07.2018

Na escala local Järla Sjö possui uma escola para ensino elementar e médio, creches, lojas,
restaurantes, facilidades para esportes e serviços. De amplitude regional se destaca o
centro de comércio e serviços, resultante do aproveitamento de galpões industriais com a
adição em sua continuidade de novos espaços comerciais e um deck de madeira na borda
do lago fazendo a ligação entre as duas partes do bairro, figura 7-7.
CORREDORES E SUBÁREAS - 161

Figura 7-7: Vista do bairro Järla Sjö

Fonte: Google Earth, 18.09.2020

A planta industrial remanescente é datada de 1860, uma fábrica de turbinas desativada nos
anos sessenta do século XX. Passou por cuidadoso trabalho de restauro para fazer parte do
centro comercial que se instalava e hoje o conjunto vem a ser um marco de referência para
Estocolmo.
A polêmica movida em torno do plano desde 1970, teve como fundamento a discussão não
favorável para o enfoque Moderno e o passar do tempo fez com que se consolidasse a
escolha do plano de parcelamento do solo em quadras retangulares ou irregulares se
acomodando a topografia local. As desavenças que privilegiaram a proposta respeitosa com
a cultura do lugar e pautada em critérios de sustentabilidade prevaleceu e, como na época
se procurava determinar um local para o primeiro encontro sobre o Novo Urbanismo
Europeu, por estes motivos a escolha foi pelo bairro Järla Sjö, situado a 8 km do centro de
Estocolmo (MACEDO, 2009).
Järla Sjö, projetada como uma cidade-jardim, tem quadras pequenas retangulares, a menor
50x70 m, e diversas quadras irregulares abertas, sem muita padronização. Entre as
162

edificações de até quatro pavimentos, se destacam as localizadas na beira do Lago Nacka,


figura 7-8.
Figura 7-8: Elementos do tecido urbano de Järla Sjö

Fonte: fotos do autor, 12.07.2011


CORREDORES E SUBÁREAS - 163

CAPÍTULO 8: Brasil, São Paulo e as retículas ortogonais

No Brasil, o traçado ortogonal veio com a colonização portuguesa e este assunto é


apresentado e desenvolvido teoricamente pelo arquiteto-professor Manoel C. Teixeira no
livro A forma da cidade de origem portuguesa. Este autor mostra que a forma da cidade de
origem portuguesa, particularmente, no caso dos modelos geométricos justifica-se por três
razões: a preocupação de inscrever os traçados urbanos em uma ordem universal expressa
pelo rigor da geometria; a associação que se estabelecia entre a regularidade, a beleza da
cidade e um bom governo; e o pragmatismo associado à opção por uma estrutura mais
regular, mais fácil de implantar, de construir e de gerir (TEIXEIRA, 2012, p. 55).
Em muitas cidades localizadas próximo ao oceano ou na várzea de rios, onde a declividade
é amena, o sistema de implantação por retículas ortogonais foi empregado. Quando
conveniente, o formato quadrado é modificado para quadras alongadas, como nas áreas
destinadas às oficinas e serviços gerais. Considerando a topografia as quadras são
arqueadas ou a retícula é assente em mais do que uma direção para melhor se assentarem
ao relevo dos terrenos.
Opções pelo traçado em retícula aparecem em locais de relevo aproximadamente plano
indo até encontrar uma barreira física, que acontece nas situações de declividade
acentuada, curso de água, ou, ambos. Fortaleza, Ceará, apresenta o caso de pequena
declividade, para lembrar uma entre as cidades brasileiras.
A planta desta cidade, datada de 1875, mostra como a retícula ultrapassa a barreira e
prossegue, mostrando aberturas para sempre se prolongar. Este exemplo é de uma opção
de projeto pouco comum, a persistência para manter a direção sempre regular do traçado
em malha, facilitada pelo terreno plano e oficializada pelo plano diretor da cidade. Em
outros sítios devido a acidentes do terreno, não apenas devido à topografia, mas, a outros
interesses do proprietário e do técnico responsável pelo traçado, o sentido da retícula pode
variar de direção, figura 8-1.
Na cidade de São Paulo, um bom exemplo do resultado da aplicação das retículas aparece
no distrito do Tatuapé onde se destacam os corredores principais que ora são paralelos e
ora se curvam para garantir pouca declividade para as vias, mantida as transversais
164

aproximadamente paralelas. O distrito hoje demonstra acentuado processo de


verticalização, favorecido pelo suporte físico que facilita a ocupação de lotes grandes e a
junção de outros menores para ocupações do tipo multiuso. Por intervenções público-
privado (melhor, privado-público) como já vem se esboçando ao longo da rua Platina o
Tatuapé poderia evoluir para apresentar áreas-protegidas de alta qualidade ambiental,
atendendo diferentes classes de renda e boa configuração física, suportadas por projetos
que estimulem a vida nas calçadas e em enclaves de áreas para amenidades das pessoas
em espaços privados, figura 8.2.

Figura 8-1: planta da cidade de Fortaleza, 1875

Fonte: Arquivo municipal, Commons Wikimedia, 23.05.2018

A visão retrospectiva de projetos desde Mileto até Brasília demonstra a facilidade do


emprego, a flexibilidade do traçado em malha e sua adaptabilidade a programas
necessários para atender diferentes sociedades em diferentes séculos.
CORREDORES E SUBÁREAS - 165

Figura 8-2: Trecho do distrito do Tatuapé, cidade de São Paulo

Fonte: Google Earth, 21.09.2020

Nos exemplos deste texto pode-se ressaltar como a versátil quadra de Mileto (1 ha) é
reinterpretada em Savannah para se adaptar a um módulo de repetição maior (2,5 ha), com
vias locais internas ao perímetro desenhando pequenas quadras; em Brasília o módulo de
repetição passa para 8 ha e em Milton Keynes a malha ordenadora do projeto passa a 100
ha, devido a precedência ser dada ao sistema viário que atravessa a cidade. Estas
transformações do tipo original concebido por Hipodamo de Mileto, ao longo do tempo
são comentadas com propriedade por Joan Busquets, arquiteto-professor visitante de
Harvard que deixou, em relatório de pesquisa sobre cidades em malha, o depoimento a
seguir:

Diversas culturas têm apresentado uma variedade de interpretações


sobre os sistemas em malha que servem como um efetivo suporte para
múltiplos domínios, traçado viário, parcelamento de áreas privadas,
espaços públicos, diversidade de edificações, e outros (BUSQUETS, 2014,
p. 131).

Da nossa observação própria lançamos a hipótese de que os traçados em malha retangular,


e, com mais propriedade as retangulares com largura até oitenta metros e comprimento
por volta de cento e cinquenta metros (usual no Brasil) tem boa capacidade para subdivisão
em lotes.
166
CORREDORES E SUBÁREAS - 167

CAPÍTULO 9: As quadras do Bairro Jardim, em Santo André, São Paulo

Quando a aluna e hoje arquiteta Amanda Chyoshi, cidadã de Santo André, foi bolsista do
Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica, atendendo a um programa de
quatro semestres oferecido pelo Conselho Nacional de Pesquisas, na Universidade São
Judas Tadeu, ela contribuiu com a nossa investigação sobre as quadras de formato
ortogonal, ou, base do nomeamos por tecido do tipo tradicional. Como procedimento de
trabalho se aplicou o princípio de análise da forma urbana através dos setores, vias,
corredores e subáreas. Foi selecionado como área-estudo um setor, situado em um distrito
do município de Santo André, chamado Bairro Jardim. Definido o setor por vias que
atravessam a pesquisa se centrou na flexibilidade que o traçado em retícula possibilita para
a ocupação dos espaços da cidade e em áreas a urbanizar. No caso do Bairro Jardim a
atenção foi dispensada para as maneiras de parcelar uma quadra em lotes e suas
transformações com o tempo. Para embasar esta opção se fez vista sobre o projeto de
cidades de tecido tradicional e outras contemporâneas que apresentassem variações deste
critério. Material colhido a mais tempo e utilizado nos capítulos precedentes, resultante de
referências bibliográficas, de viagens e por vezes assuntos anteriores, por nós apresentados
através de artigos. A constatação de fundo está centrada no princípio que a demanda para
usos novos ao passar do tempo induz as transformações das quadras, enriquece a
configuração do tecido e oferece opções para o redesenho, em particular, do limiar entre
os espaços privados representados pelos lotes e o espaço das vias públicas. Como se
poderia dizer: esse é o mote do desenho urbano contemporâneo! (SPECK, 2012).
O Bairro Jardim foi inicialmente desenvolvido por força da implantação de um parque
industrial no município de Santo André, condição facilitada pela existência da linha férrea
que beira o Rio Tamanduateí e as terras planas de várzea. Hoje, em decorrência da
desativação das plantas industriais de grande porte, o transporte pela ferrovia se destina
ao fluxo de pessoas e não é mais preferencial para as cargas. O tecido urbano cuja
transformação é lenta, se mantém com os trechos de quadras grandes consolidadas onde
estavam as indústrias e quadras regulares destinadas a outras atividades. Pairavam
indústrias de grande porte e hoje espaços vazios, alguns ainda com galpões, aproveitados
168

por empreendedores privados que visam os negócios imobiliários e as instalações para


serviços, particularmente do segmento residencial. Decorre também a valorização dos
terrenos menores, antes residências térreas e sobrados, agora prédios residenciais
pontuados por comércio e serviços. Interesses que vão de encontro a notória a atração de
famílias para habitar o bairro em estudo, por conta da sua localização privilegiada na
cidade. Destacam-se no bairro o Parque Celso Daniel, o Shopping Grand Plaza, boas escolas
da rede pública e privada e duas vias que atravessam e são parte da definição do setor, a
Avenida Dom Pedro II e a Avenida Industrial, figura 9 -1.

Figura 9-1: O bairro no sentido longitudinal, visto por ângulos opostos.

Fonte: Google Earth, 28,04, 2018.


CORREDORES E SUBÁREAS - 169

A fileira de quadras lindeiras com a ferrovia, mais uma onde foi implantado o parque,
tiveram seu desenvolvimento retardado devido a saída das grandes indústrias o que vem
ocorrendo como um processo gradual. Pelas fotos aéreas pode-se observar que a
densidade maior de edifícios em altura ocorreu e isto ainda acontece na terceira faixa de
quadras paralelas a ferrovia. Esta formação dos espaços deve-se a continuidade das vias
que apoiam o sistema de retículas do Bairro Jardim com o restante da cidade até chegar a
sua área central. Fato que acelerou a caracterização de um centro de bairro, oferecendo
espaços para habitação, comércio, instituições e áreas livres (modestas) que evoluem
harmonicamente para o centro da cidade. Neste sentido, se admite o Bairro Jardim como
um bom exemplo da flexibilidade do emprego das retículas em um contexto em que a
ocupação do solo é mais recente quando comparada com o de cidades mais antigas.
Citamos antes o caso da Ilha de Manhattan, em Nova Iorque, de Fortaleza e das quadras
do distrito do Tatuapé em São Paulo e se pode constatar a diversidade de formas de uso e
ocupação do solo que o tecido em retículas possibilita, figuras 9-1A e 9-1B.

Sobre a planta do bairro foi realçado o perímetro de cada um dos setores, selecionados por
vias que atravessam e resultou uma subdivisão em oito subsetores, figura 9-2.

Figura 9-2: Oito subsetores de um setor no Bairro Jardim.

Fonte: Diagrama do autor.


170

Os procedimentos de análise aplicados subentendem o setor como uma porção do tecido


urbano delimitado por vias e no caso em estudo o setor tem a superfície de 127 ha. O
estudo do sistema viário coloca em evidência as vias que atravessam e as vias de
distribuição resultantes da análise relativa de sua hierarquia. A área ocupada pelas vias é
de 28 hectares. No estudo leva-se em consideração questões como: fluxo, largura da rua e
principalmente sua extensão. A partir destes parâmetros, é possível identificar as ‘vias que
atravessam’ e as ‘vias que distribuem’. Quatro vias que atravessam (Av. Prestes Maia, Av.
Industrial, Viaduto Antônio Adib Chammas e Rua das Figueira), definem o contorno da área
de estudo formando um grande retângulo. Uma quinta via (Avenida Dom Pedro II) que
atravessa longitudinalmente pelo meio deste setor serviu para a divisão em partes. No
sentido transversal se considerou vias de distribuição que a realidade as mostra
configurarem o viário principal; elas formam retângulos que variam de 600 a 1.000 m e
lembram as quadrículas grandes, com a separação do tráfego de passagem, da cidade de
Milton Keynes. Destas decisões para subdividir o setor em estudo, resultaram oito
subsetores com forte regularidade do traçado conforme mostra a figura 9.2.
Quanto as quadras subdivididas em lotes pequenos, de 75 a 250m² e médios até 500m²,
pelo traçado original eles se destinavam a construções residências. Muitas casas foram
construídas e o tempo fez com que se adaptassem para comércio e serviços, e, é comum
na parte detrás dos lotes haver uma edícula antes separada e hoje emendada ao bloco
principal. Lotes justapostos são utilizados para construções maiores como
estabelecimentos comerciais, alguns baixos - loja no térreo e acima mais dois pavimentos
para moradia ou escritórios - outros, em altura para residências ou escritórios,
apresentando ou não comércio no térreo. Como construções maiores se identificam os
conjuntos de edifícios altos em lotes agregados para constituir um maior. As
transformações produzem uma interessante variação volumétrica na quadra, reforçada
pelo atendimento a diretrizes para os recuos das edificações solicitadas pela prefeitura do
município. A legibilidade da face da rua onde isto acontece ganha em complexidade,
entendida no contexto pouco exigente em relação aos elementos urbanos exigidos pela
nossa sociedade.
CORREDORES E SUBÁREAS - 171

Quatro exemplos da relação entre as edificações e o sistema de vias aparecem na figura 9-


3. Há uma escolha inicial das pessoas que constroem tipos de edifícios, para tão logo sejam
colocados para venda no mercado e ocupados assumam o aspecto final de moradia com
seus elementos adicionais de segurança. Isto vem através do fechamento frontal para
separar o privado do público, as vezes com muros altos formando uma barreira também
visual no caso dos setores residenciais. Esta forma de fechamento que esconde a fachada
do imóvel, a qual deveria ser o elemento principal para ser visto, produz um visual pobre
da rua. No geral as calçadas têm pouca largura convidando a não se plantar árvores e pelo
modo como cada proprietário faz sua calçada se produz um cenário pouco atrativo para o
passeio seguro e agradável no dia a dia das pessoas. Nas vias que atravessam e nas que
distribuem onde há comércio a paisagem se torna estimulante devido ao estímulo visual
proporcionado pelos dispositivos de propaganda, as cores, o movimento dos veículos e das
pessoas na procura de seus destinos para trabalhar, comprar, chegar no prédio onde mora
ou simplesmente passear pela rua de comércio. Isto é a paisagem urbana.
Em 9.3A, uma quadra pertencente a via que atravessa se transforma, mostrando
construções antes residências de alto padrão no corredor, hoje usadas para comércio e
serviços e prédios residenciais cujo acesso é pela via de trás, onde há menos trânsito de
passagem. Em 9.3B, na via que atravessa, aparecem edifícios para comércio no térreo e
escritórios em cima. Em 9.3C, uma transformação lenta em via local, sem substituição das
partes existentes. Em 3C, uma via local onde foi construído um edifício alto.
O estudo dos tipos leva em consideração a importância de cada via, com respeito a cidade
e quanto ao subsetor estudado. Assim, uma via que distribui o trânsito pode ser
considerada via que atravessa, quando analisada no âmbito de um subsetor. Há tamanho
de lotes variados em faixas lindeiras de um corredor. No Bairro Jardim se destaca o lote do
parque, que pertence a dois corredores que atravessam, além de outros lotes que
aumentam a mancha do corredor (indústrias) em contraste com os lotes de pequena
profundidade dos corredores associados às vias cujas quadras apresentam os lotes típicos,
figura 9-4.
172

Figura 9-3: Formas de ocupação das quadras no Bairro Jardim

Fonte: foto autores, 23.11.2017

Figura 9-4: Os corredores que atravessam

Fonte: Diagrama do autor


CORREDORES E SUBÁREAS - 173

As quadras do setor em estudo podem ser representadas em forma de diagrama e suas


dimensões se destacam por este meio. Total de cinquenta e oito quadras que perfazem 99
ha.
A primeira parte desta investigação se refere à ocupação do espaço físico em planta, às
vezes, se recorrendo a volumetria apenas para verificar aspectos particulares da sua
projeção horizontal. A seguir, uma planta mostra os espaços que deveriam estar livres
(desocupados) referentes aos recuos frontais das edificações, somados a largura das vias.
Ou seja, o diagrama mostra em branco as faixas correspondentes a soma das vias mais os
recuos, ressaltando em preto a porção das quadras onde se pode construir. Em uma
simulação, se a área resultante dos recuos exigidos de cinco metros para as vias que
contornam uma quadra de 10.000 m² for reduzida do total da quadra, o espaço livre
resultante será de 8.100 m². Deste número deverá se suprimir a área resultante da
obrigatoriedade de recuos laterais, de fundos e eventuais restrições adicionais para a
garantia da insolação e ventilação de cada edificação. No diagrama se simulou as vias -
calçada mais a faixa de rolamento - se adotando como média 16 m de largura, somado aos
cinco metros de recuo em cada lado, figura 9-5.
Figura 9-5: A área onde se assentam as construções por quadra.

Fonte: diagrama do autor


174

Em adição ao diagrama das quadras é interessante considerar outro para mostrar a


projeção horizontal das edificações, seguindo o roteiro usualmente recomendado para os
trabalhos de Morfologia Urbana. Este tipo de diagrama anuncia o estudo do tecido urbano,
que deverá ser complementado e ajustado em função de dados do local, figura 9-6.
Por meio da técnica figure ground, é possível destacar a forma da projeção de cada
edificação e em consequência avaliar o contraste com relação às áreas livres, fundo em
branco. No Bairro Jardim durante a realização deste estudo foi possível compreender a
diferença entre as ocupações consolidadas através de pequenas edificações em contraste
com as novas de maior projeção horizontal, as construções irregulares e os ditos
‘puxadinhos’ típicos da nossa cultura de permissividade.

Figura 9-6: Projeção horizontal das edificações, figure ground.

Fonte: Diagrama do autor

Modo geral o Bairro Jardim passou a se caracterizar pela construção de edifícios em altura
que utilizam uma parte significativa da superfície do lote para a garagem, cuja laje de
cobertura é para ser entendida como um ‘sobressolo’ ajardinado e distribuidor do
movimento das pessoas para o acesso a diferentes blocos do condomínio. Existem as
edificações de baixo gabarito com grande projeção horizontal como os supermercados,
revendedoras de veículos e ginásios de esporte, escolas e hospitais, que aparecem no figure
ground ocupando uma projeção horizontal expressiva. Nas fotos a seguir se pode observar
algumas características das relações público-privado comuns no Bairro Jardim e repetitivas
na região de São Paulo, figura 9-7. Em figura 7A, observar o muro do condomínio, a parede
CORREDORES E SUBÁREAS - 175

da garagem em segundo plano e em seguida o prédio. Em 7B, uma via de distribuição com
casas recuadas e grades.

Figura 9-7: Calçadas e recuos frontais.

Fonte: fotos autor, novembro 2017

Quanto ao tamanho dos lotes a predominância é daqueles entre 250 m² e 1.000 m², no
total de setenta lotes (total aferido 41.242 m²); os lotes entre 1.001 e 2.500 m² vêm em
seguida sendo dezesseis no total (23.279 m²), seguidos por um lote maior de 2.501 m² e
quatro lotes no total de 68.783 m².
Os terrenos vazios são em maioria utilizados para estacionamento, visto que a área
apresenta grande atividade comercial e de serviços, figura 9-8. Em 8A, lote de área grande
na espera por empreendimento privado. Em 8B, estacionamento sempre que houver lotes
disponíveis. Classificamos as quadras três dimensões, as ‘pequenas’ medindo de 0 a 7.500
m² destacadas na figura em cor clara, as quadras ‘médias’ de 7.500 m² à 12.500 m² em tom
intermediário e as quadras ‘grandes’ maiores que 12.500 m², na tonalidade escura, figura
9-9.
Figura 9-8: Lotes vazios ou ocupados para estacionamento.

Fonte: Google Earth, 07.11.2017


176

Quanto a observação sobre as quadras, se considerou a dimensões dos lotes. Os menores


e maiores lotes de cada quadra, havendo nas quadras pequenas desde lotes de 65 m², até
lotes de 2.366 m², em quadras médias o menor lote de 82 m² e o maior com 2.428 m², e
nas quadras de grande porte, o menor lote tem 72 m² e o maior a 133.692 m².
A localização das quadras conforme a dimensão dos lotes: pequenos em amarelo, médios
em laranja e grandes em vermelho, se apresenta na figura 9.9.
Figura 9-9: Dimensões das quadras

Fonte: Diagrama do autor

Quadra de estudo

Para o que se pretende demonstrar através do estudo das quadras retangulares,


selecionamos no Bairro Jardim uma quadra para servir como referência. Trata-se de
consolidar ideias que vimos ensaiando no correr do estudo, sobre a flexibilidade e as
possibilidades para transformação que as quadras retangulares apresentam. Chamamos
esse tipo de ‘quadra tradicional’, seja em Manhattan, em Fortaleza ou em São Paulo. Depois
da certeza de estar razoavelmente familiarizado com o Bairro Jardim, selecionamos uma
quadra de referência que pudesse expressar as questões ligadas a transformação dos lotes
e de sua volumetria. Ela se localiza no setor 8, entre as vias Avenida Dom Pedro (na foto à
direita), Rua das Caneleiras (abaixo), Rua das Aroeiras (a esquerda) e Alameda Gaspar
Nogueira (uma das vias laterais do Parque Celso Daniel), figura 9-10.
CORREDORES E SUBÁREAS - 177

Figura 9-10: Vista aérea da quadra de referência

Fonte: Google Earth, 07.11.2017

Com dimensão de 130 por 110 m (área 14.300 m²) a quadra retangular foi inicialmente
desenhada para lotes residenciais, as construções seguiram os recuos frontais de acordo
com as diretrizes oficiais e o gabarito ficou entre um e dois pavimentos. Há lotes de 300 m²
(10x30 m), o que chama atenção para que o público-alvo do loteador era da classe média
(talvez, o pessoal administrativo de empresas). A quadra foi subdividida inicialmente em
módulos de 10 m no sentido da lateral de 130 m e nos outros lados foram desenhados lotes
maiores. Nas laterais de 100 m lotes os tem profundidade de 65 m (talvez para galpões), e,
pela foto atual se percebe as subdivisões que restaram no miolo da quadra. Voltado para a
Rua das Caneleiras há um edifício residencial de torre única com vinte e um pavimentos
mais o térreo, isolado no lote com recuo frontal de cinco metros e significativo recuo em
uma das laterais. Vizinho ao prédio há um lote (2.162 m²) - dois lotes agregados por um
único proprietário - que possui acesso por duas ruas e hoje utilizado para estacionamento,
com certeza, na espera de um grande empreendimento. Os lotes voltados para a avenida
Dom Pedro II sofreram as mudanças de uso esperadas para um ambiente de passagem de
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forte vocação comercial, agora com adaptações para estabelecimentos comerciais


(restaurantes e outros), mas, de potencial para verticalização, figura 9-11.

Figura 9-11: Quadra de referência, vias do entorno

Fonte: foto autor 22.05.2017

Em 11A aparece a Rua das Caneleiras com o edifício de 21 pavimentos, em 38B a Rua das
Aroeiras ao fundo a Rua das Caneleiras, em uma vista que hoje é possível por haver apenas
um edifício na quadra, que foi uma das razões da seleção desta quadra para o estudo.
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CONCLUSÃO - Entenda a trama da cidade para melhor projetar suas partes

Reportando-nos à Barcelona, ressalta que o aspecto indigesto para a concretização de um


plano é o parcelamento da quadra em lotes pequenos, adequados para quem pretende
construir sua moradia ou ter um pequeno comércio. No ensanche isso não foi contemplado
pelo plano de ocupação, as quadras seriam completadas por blocos que ocupassem lotes
grandes entre a rua e o pátio central. O tempo é que fez mudanças no sentido de haver
quadras com lotes de pouca frente e compridos desrespeitando o critério da quadra possuir
um pátio interior; segundo nossas observações restritas a análise de fotos aéreas e notícias
da mídia, no sentido de os moradores retomarem o conceito de pátio de acordo com Cerdá.
A escolha criteriosa de tipos a serem adotados para o fracionamento de uma quadra é
fundamental no projeto urbano, nele há de se considerar a realidade para o fracionamento
em lotes face a tipos esperados no tempo do projeto e seu prognóstico de comercialização
é mais fácil reunir lotes menores do que repartir o grande onde a expectativa é para
empreendimento maior. Sobre este assunto vale lembrar o texto ‘Quando a rua vira casa’
do arquiteto-professor Carlos Nelson Ferreira dos Santos, onde ele explora a ideia de
arranjos entre lotes pequenos para áreas de vizinhança residencial, simulando quadras de
120 x 120 m (14.400 m²) para demonstrar a proposta de pátios centrais abertos de 40 x 40
m = 1.600 m², acessíveis por passagens de 4 m de largura desde as quatro vias laterais.
Formato este que multiplicado para as quadras de um setor da cidade teria muito maior
rigidez que o das quadras barcelonesas, ou as tradicionais, apesar da possibilidade de se
alinhar algumas das vielas de quatro metros, para passagens interligadas de pedestres
(SANTOS, 1988).
Seja em Barcelona ou em outras propostas de resultado esperado excessivamente
controlado, como a de Carlos Nelson, fica a questão de como administrar; quem deverá
pagar a conta da manutenção dos espaços comuns? Seriam públicos? Caso sejam privados,
como se gerenciaria o limiar público-privado? Há solução viável? O cidadão inglês
certamente esbravejaria: Not In My Backyard! (NIMBY, expressão repetida entre os
planejadores urbanos anglo-saxões). Apesar de que nos países não latinos existem muito
menos ‘muros’ ou limiares intransponíveis.
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Os pequenos pátios no miolo das quadras, ou, de quatro quadras como especulou o
professor Nelson, foi fruto de uma época em que nas escolas de arquitetura e urbanismo
se aplicava aos alunos o exercício de como ocupar os fundos de lotes de nossas quadras
ortogonais típicas, sem considerar as questões (dificuldades) relativas à implementação de
um projeto urbano. Desta época resultaram desenhos interessantes, sem muita
preocupação com a propriedade da terra, de manutenção das áreas, de políticas públicas
abertas para viabilizar o projeto urbano. Neste sentido Cerdá em Barcelona teve melhor
resultado trabalhando com maior abertura da quadra, sugeriu diretrizes urbanísticas
simples, apesar das questões que levantamos sobre a rigidez do desenho que induziu
alterações, devido à necessidade haver de lotes estreitos e eliminar o pátio central onde a
renda das famílias fosse pequena.
Trabalhamos o princípio de que a quadra tradicional possibilita diversas configurações e
alterações do seu parcelamento, razão da permanência e da obtenção de maior
complexidade nos espaços quando acompanhada por diretrizes edilícias nascidas de um
bom conceito para o projeto urbano. As possibilidades decorrem do parcelamento da
quadra em lotes, com frente pequena nas implantações mais antigas, quase sempre
pensados no formato residencial, fato que hoje em dia facilita os agrupamentos requeridos
para empreendimentos de maior porte.
Acreditamos que o planejamento urbano resulta do entendimento da região e vai
chegando até o bairro, mas, o oposto é válido e muito instrutivo, pois segmentos de bairro
e comunidades localizadas podem oferecer informações sobre os lotes e arranjos de
espaços para o projeto urbano. São a fonte geradora para ideias originais de planejamento
e projeto urbano.
Nas cidades apontadas como sustentáveis, por exemplo, Portland - EUA, que se notabilizou
pelo constante cuidado com fatores de sustentabilidade, o traçado dos seus setores foi
projetado em malha ortogonal numa época em que tal atributo era pensado pelo seu lado
prático. Característica que facilitou a implantação pioneira do sistema Transit Oriented
Development, T.O.D, hoje difundido mundialmente. Outro exemplo é Milton Keynes,
cidade apresentada por ser um caso em que se espelha o entendido como uma situação
ideal para organizar os espaços urbanos através da mobilidade. As vias que atravessam
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formam uma malha que favorece o estabelecimento de áreas de vizinhança segundo o ideal
da neighborhood bem equilibrada e um centro de cidade fácil de acessar, de uso
diversificado incluindo habitações. Trazendo o conceito para a trama tradicional de São
Paulo, poderia se dizer que a ideia de vizinhança projetada para Milton Keynes tem sua
contrapartida nas áreas protegidas, conforme conceituamos, pois elas apresentam:
circulação local, uso misto e áreas livres bem distribuídas. Ou seja, em alguns distritos de
São Paulo se pode selecionar trechos do tecido urbano, como o dos exemplos citados, com
potencial para serem redesenhados como áreas protegidas.
O Novo Urbanismo trouxe o interesse para a retomada do tecido urbano tradicional em
projetos novos. Nos EUA, para localizações de subúrbio ou em vazios urbanos, mostrou a
vantagem da maior densidade de ocupação do solo e o consequente adensamento
populacional. O projeto do bairro Seaside espelha este padrão, com suas quadras
retangulares e os cortes em diagonal típico do urbanismo tradicional. Representa a procura
necessária e indispensável para agregar no projeto os aspectos ambientais e da ecologia,
como questões de base para o Urbanismo desde suas etapas de planejamento, elaboração
de planos e projetos.
Na cidade tradicional se encontra a ordenação do traçado ditada pela história, pela lógica
(às vezes falta dela) de crescer por pequenos incrementos, pelas fissuras impostas por
obras viárias de grande porte ou pela implantação dos condomínios fechados, sejam
residenciais, institucionais ou industriais. Chega-se assim a São Paulo, palco de nossos
estudos sobre a forma dos tecidos urbanos onde a realidade atual é a matéria prima, se
dispõe da história da cidade e dos tantos projetos que deram sentido à sua arquitetura.
Pelo estudo desta cidade consolidamos o procedimento para entender os traçados urbanos
com base nas vias que atravessam, nas vias que distribuem e nos movimentos em direção
às vias locais. Os conceitos de setor, corredor e de subárea foram derivados da observação
de como as pessoas se apropriam do solo acessível segundo as três categorias de vias. São
Paulo apresenta um conjunto de tecidos urbanos influenciados pela lógica socioeconômica
e política; não seguindo completamente as regras impostas por planos diretores
elaborados e reelaborados em períodos relativamente grandes, sob a responsabilidade de
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órgãos oficiais. O planejamento é que vai se desenvolvendo para consolidar as tendências


engendradas pela realidade.
Os planos são conservadores, consolidam, ampliam ou reduzem zonas de uso e ocupação
do solo, acompanham a inevitável tendência para a expansão do uso misto dos espaços; o
zoneamento é atualizado como instrumento da consolidação de tendências observadas na
época do plano. Um plano importante porque trouxe inovações quanto aos instrumentos
de controle urbanístico, inspirado em conceitos do T.O.D (Transit Oriented Development),
se valeu da tendência internacional para valorizar o sistema de transportes, estabeleceu
políticas públicas para os logradouros e teve um verniz de participação popular, foi o Plano
Diretor Estratégico do Município de São Paulo, PDE 2014. No entanto, ainda não há
abertura para os projetos de área localizadas do tipo - special districts - que necessitam a
participação igualitária entre público e privado. Na cidade de São Paulo existem espaços
pequenos, subsetores, de predominância residencial ou de uso misto que se prestam para
este tipo de intervenção, as áreas protegidas descritas no capítulo 4, para as quais demos
destaque, além de outros que podem ser apresentados por grupos privados de interesse
no mercado imobiliário.
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