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11º Curso nacional de atualização em

Terapia intensiva

Módulo 7: Outros temas de


interesse II

Aula 2 ─ Pancreatite aguda

Dr. Leandro Utino Taniguchi


Objetivos
• Diagnóstico, estadiamento e prognóstico
• Terapêutica:
• CPER
• Nutrição em pancreatite
• Antibióticos profiláticos
• Cirurgia
Pancreatite aguda: linhas gerais
• Definições: Atlanta International Symposium on Acute
Pancreatitis

• Quadro leve: mínima disfunção orgânica com resposta à


administração de volume

• Quadro severo: um dos seguintes:


• Complicação local (necrose, pseudocisto ou abscesso)
• Falência orgânica
• Ranson ≥ 3 ou APACHE II ≥ 8
Bradley, Arch Surg 1993, 128: 586-90
Ann Surg 2012; 256: 875–880
Gut 2013; 62: 102–111
Pancreatite aguda: epidemiologia
• Idade média: 40 a 60 anos
• Homens > mulheres
• Recorrência em 10 anos variável:
• 48% em pancreatite alcoólica
• 21% em pancreatite biliar
• média geral 28,7%

• Em 80 a 90% dos casos: forma leve


• Em 20 a 30% dos casos: necrose pancreática
Pancreatite aguda: mortalidade
• Mortalidade geral: 2 a 10%
• Mortalidade com necrose infectada: 25 a 50%
• Idosos: mortalidade 15 a 25% vs. jovens < 10%
Pancreatite aguda: etiologia

Toouli J et al, J Gastr Hepatol 2002; 17: S15-S39


Pancreatite aguda: quadro clínico
Dor abdominal: mais importante. Pode ser ausente em: diálise
peritonial e quadro pós-operatório

• Náusea e vômitos frequentes

• Febre: observar início da febre

• Quadro clínico não específico!!


Pancreatite aguda: diagnóstico bioquímico

• Dosagem das enzimas pancreáticas é o padrão


para o diagnóstico, desde que associado a um
quadro clínico suspeito
Pancreatite aguda: diagnóstico bioquímico

• Amilase: eleva-se 2 a 12 horas após início do


quadro, com pico em 48 horas e normalização em 3
a 5 dias

• 19% das pancreatites não tem elevação de


amilase (pancreatite alcoólica)

Troouli J et al, J Gastr Hepat 2002; 17: S15-S39


Smotkin J et al, J Clin Gastroenterol 2002; 34: 459-462
Pancreatite aguda: diagnóstico bioquímico por
amilase
Várias condições cursam com hiperamilasemia
(especificidade de 80%)

Sabiston´s Textbook of Surgery, 15th edition 1997


Pancreatite aguda: diagnóstico bioquímico por
amilase

• Dosagem de suas isoformas não melhora o

diagnóstico

• Amilase: excretada pelos rins (45 kD) – Insuficiência

renal interfere com o exame


Pancreatite aguda: diagnóstico bioquímico por
amilase
• Dosagem sérica NÃO se correlaciona com o
prognóstico ou gravidade

• Especificidade em torno de 100% se utilizar um


cut-off de três vezes o valor normal

Troouli J et al, J Gastr Hepat 2002; 17: S15-S39


Smotkin J et al, J Clin Gastroenterol 2002; 34: 459-462
Pancreatite aguda e lipase
• Lipase: aumenta em 4 a 8 horas do início do quadro,
pico em 24 horas e retorna ao normal em 8 a 14 dias

• Mais específica para pancreatite que a amilase


(96% especificidade)

• Eleva-se em quadros abdominais intestinais

• Mais sensível que amilase em pancreatite


alcoólica
Pancreatite aguda: estadiamento e prognóstico

• Necessária para identificação dos pacientes graves


para tratamento precoce e adequado

• Avaliação por meio de:


• Dados laboratoriais
• Índices clínicos
• Exames de imagem
Pancreatite aguda: estadiamento e prognóstico

• Dados laboratoriais prognósticos: no momento,


proteína-C reativa

• PCR: mais bem estabelecido e estudado


• Diferencia leve da severa (após 48 horas)
com S 83-100% e VPP 37-77%

Troouli J et al, J Gastr Hepat 2002; 17: S15-S39


Smotkin J et al, J Clin Gastroenterol 2002; 34: 459-462
Frossard J-L et al, Am J Respir Crit Care Med 2001; 164: 162-170
Pancreatite aguda: estadiamento e prognóstico

• PCR melhor acurácia após 48 horas: quadro de


disfunção orgânica já estabelecido

• Cut-off atualmente em 150 mg/L

Smotkin J et al, J Clin Gastroenterol 2002; 34: 459-462


Frossard J-L et al, Am J Respir Crit Care Med 2001; 164: 162-170
Triester SL et al, J Clin Gastroenterol 2002; 34: 167-176
Pancreatite aguda: estadiamento e prognóstico

• Índices prognósticos (Ranson, APACHE II)


• Critérios de Ranson (1974):

Triester SL et al, J Clin Gastroenterol 2002; 34: 167-176


Pancreatite aguda: estadiamento e prognóstico
• Os critérios de 1974 são para pacientes de etiologia alcoólica (75%
da casuística)
• ≤ 2 critérios: 0% mortalidade
• 3 a 4 critérios: 15% mortalidade/50% UTI
• 5 a 6 critérios: 50% mortalidade/100% UTI
• ≥ 7 critérios: 100% mortalidade

• Problemas:
• Só podem ser concluídos após 48 horas
• Não pode faltar dados para os critérios
• Somente válidos para etiologia alcoólica (difícil diagnóstico
etiológico nas primeiras horas)
Pancreatite aguda: estadiamento e prognóstico

Wilson C et al, Br J Surg 1990


Domínguez-Muñoz JE et al, Pancreas 1993
Pancreatite aguda: TC de abdôme
• Critérios de Balthazar:
• A – Pâncreas normal
• B – Aumento do parênquima pancreático
• C – Alterações do tecido peripancreático
• D – Coleção peripancreática fluida única
• E – Duas ou mais coleções ou gás retroperitonial

Balthazar EJ, Radiol Clin North America 2002; 40: 1199-209


Pancreatite aguda: necrose em TC e prognóstico

Balthazar EJ, Radiol Clin North America 2002; 40: 1199-209


CTSI em pancreatite aguda

Balthazar EJ, Radiol Clin North America 2002; 40: 1199-209


Pancreatite aguda: tomografia computadorizada

• CT severity index e relação com morbimortalidade

Balthazar EJ, Radiol Clin North America 2002; 40: 1199-209


Pancreatite aguda: TC de abdôme e problemas

• Necrose pode não ser evidente na TC. Após 2 a 3 dias a


acurácia da TC melhora

• Sensibilidade da TC para necroses pequenas é em torno de


50%

• TC não avalia adequadamente necrose do tecido


retroperitonial

Balthazar EJ, Radiol Clin North America 2002; 40: 1199-209


Pancreatite aguda: recomendação para TC

• TC inicial:
• Quadro severo após 72 horas
• Piora aguda do quadro clínico

• TC evolutiva:
• Se TC inicial A – C, somente caso ocorra piora do
quadro clínico
• Grau D – E, TC após 7 a 10 dias
Troouli J et al, J Gastr Hepat 2002; 17: S15-S39
Pancreatite aguda: CPER
Estudo de Leicester, UK (Neoptolemos et al., Lancet 1988; 2:
979-83)
• n=121, pancreatite biliar com CPER ± ES em 72 horas
• CPER com sucesso: 94% dos casos leves e 80% dos
severos
• CPER é um procedimento seguro!!
• CPER diminui as morbidades (61% conservador vs. 24%)
nos quadros severos
• CPER diminui tempo de internação nos quadros severos
• Sem diferença significativa de mortalidade
Complicações Mortalidade
Com colestase
60
Complicações

50
40
30 54%
20
25%
10
0
Tardia Precoce

• Sem redução de mortalidade


• Sem benefício nos casos sem colestase
van Santvoort et al, Ann Surg 2009; 250: 68-75
Pancreatite aguda: CPER
• Conclusões: CPER + ES (se necessária) é indicada
nos casos com pancreatite biliar severa e/ou com
colangite associada, icterícia ou dilatação ducto biliar
comum

• Sempre que indicar CPER: cobertura antibiótica e pronto para


cirurgia, se procedimento falhar
Pancreatite aguda: nutrição
• Pancreatite leve: jejum – curso autolimitado, em
média por 5 a 7 dias
Mitchell et al, Lancet 2003; 361: 1447-55
Yousaf et al, Br J Surg 2003; 90: 407-420
Troouli et al, J Gastr Hepat 2002; 17: S15-S39

• Jejum + SNG com aspiração:


• Benefício teórico (“repouso pancreático”)
• Secreção de suco pancreático semelhante aos controles
sem pancreatite
Lobo et al, Br J Surg 2000; 87: 695-707

• Trabalhos randomizados não demonstraram benefício do


jejum com SNG
Levant et al, JAMA 1974; 229: 51-52
Naeije et al, BMJ 1978; 2: 659-660
Pancreatite aguda: nutrição
• Pancreatite: causa de catabolismo intenso

• Nutrição oral ou gástrica estimula a secreção


pancreática

• Nutrição enteral pós-Treitz não aumenta


significativamente a secreção pancreática em
relação ao basal e parenteral
Lobo et al, Br J Surg 2000; 87: 695-707
Qin et al, World J Gastroenterol 2003; 9: 2270-3
Pancreatite aguda: nutrição

BMJ 2004; 328(7453): 1407


Pancreatite aguda: nutrição

JPEN 2006; 30: 143-56


50
40
Infecção Pancreática
30
47%
20 Infecção
32%
20% Extrapancreática
10 11%
0
ENTERAL PARENTERAL
Digestive Surgery 2006; 23: 336-44
Pancreatite aguda: antibióticos
• Necrose pancreática: fator de risco para infecção

• Via mais provável: translocação do TGI (60 a 80%


enterobactérias, 20 a 30% Gram-positivos, 10% fungos)
Howard et al, Am College Surg 2002; 195: 759-67

• Infecção da necrose: mais comum a partir da segunda


semana
Isenmann et al, abstract Am Pancreatic Meeting 1992

• Infecção da necrose pancreática aumenta mortalidade e


disfunção de órgãos
Le Mée et al, Arch Surg 2001; 136: 1386-90
Pancreatite aguda: antibióticos
• Primeiros estudos de ATB: sem nenhum benefício
• Uso de ampicilina em pacientes com pancreatite leve
Craig et al, Ann Intern Med 1975; 83: 831-2
Finch et al, Ann Surg 1976; 183: 667-71

• Antibióticos com penetração pancreática:


• Netilmicina e tobramicina com pouca penetração
• Mezlocilina, piperacilina, ceftizoxime e cefotaxime com
penetração intermediária
• Ciprofloxacina, ofloxacina e imipenem com boa
penetração pancreática
Büchler et al, Gastroenterology 1992; 103: 1902-8
Gastroenterology 2004; 126: 997-1004
Br J Surg 2006; 93: 674-84
Pancreatite aguda: antibióticos
• Uso de antibióticos de largo espectro está associado
com aparecimento de formas multirresistentes,
aumento dos Gram-positivos e fungos
Gloor et al, Arch Surg 2001; 136: 592-6
Howard et al, J Am Coll Surg 2002; 195: 759-67

• Multirresistência está associado a pior prognóstico


Gloor et al, Arch Surg 2001; 136: 592-6
Pancreatite aguda: antibióticos
Pancreatite aguda: cirurgia
• Desbridamento de necrose infectada, necrose de
órgãos abdominais ou perfuração
Am J Surg 1997; 173:71-75
Pancreatite aguda: cirurgia

Mier et al, Am J Surg 1997; 173:71-75


Connor, Pancreas 2006; 33: 128-34
Connor, Pancreas 2006; 33: 128-34
Connor, Pancreas 2006; 33: 128-34
Pancreatology 2002; 2: 565-73
• Não usar ATB profilático ou descont seletiva do TGI
• Nutrição enteral pós-Treitz após ressuscitação
• NPP após 5 a 7 dias de tentativa de enteral (acrescentar
glutamina) sem imunonutrição
• FNA por USG ou TC para diagnóstico de infecção
• Cirurgia para os infectados (aguardar se possível)
• CPER até 72 h dos casos de icterícia obstrutiva

Crit Care Med 2004


Pancreatite aguda: conclusões
• Diagnóstico precoce com enzimas (suspeita clínica)

• Avaliação prognóstica com clínica e TC se necessário

• Ressuscitação precoce

• Se colangite ou icterícia obstrutiva, avaliar CPER + ES

• Nutrição enteral pós-Treitz sempre que possível

• Antibióticos profiláticos: papel em pancreatite??

• Se infecção, desbridamento cirúrgico a ser avaliado


Obrigado!

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