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Pancreatite aguda

DEFINIÇÃO
● Processo inflamatório aguda que afeta o pâncreas, podendo envolver tecidos peripancreáticos
e/ou outros órgãos.
● Dois subtipos:
○ Pancreatite aguda edematosa intersticial: cursa com aumento difuso o localizado do
pâncreas secundário a edema inflamatório, sem necrose. Ocorre em 90% a 95% dos
doentes e está associada à doença leve, com baixa morbimortalidade (cerca de 3%).
Autolimitada, geralmente, apresenta resolução em uma semana.
○ Pancreatite necrosante: há evolução para necrose do parênquima pancreático, dos
tecidos peripancreáticos ou de ambos. Ocorre em 5% a 10% dos doentes e está associada
a quadros graves, com elevada morbimortalidade (cerca de 17% de mortalidade).
📢A principal causa de mortalidade dentre os portadores de PA varia com o passar dos dias de
doença:
● Primeiras duas semanas: ocorre devido à síndrome da resposta inflamatória sistêmica e da
falência orgânica.
● Semanas seguintes: sepse ou outras complicações da PA.

ETIOLOGIA
Litíase biliar - principal causa!
● Cálculos biliares representam cerca de 40% das causas de pancreatite aguda, embora apenas
3% a 8% dos portadores de cálculos biliares evoluam para essa condição.
● Mulheres de 50 a 70 anos, ainda que o risco de desenvolver PA secundária a cálculos seja
maior em homens.
○ A maior incidência em mulheres justifica-se pelo fato de elas terem maior
prevalência de doença biliar litiásica.
● Cálculos biliares menores que 5 mm são mais propensos a passar pelo ducto cístico e
obstruir a ampola de Vater formando a “LAMA BILIAR” (suspensão viscosa no interior da
vesícula)

❗Como o cálculo biliar causa pancreatite aguda?


● Teoria obstrutiva: o cálculo biliar migra para o ducto pancreático, obstruindo-o. No entanto,
a secreção pancreática mantém-se, promovendo aumento excessivo da pressão no interior
do ducto pancreático obstruído.
● Teoria do refluxo: o cálculo biliar fica impactado na ampola de Vater (formada pela união do
ducto pancreático com o ducto colédoco), permitindo o refluxo de sais biliares para o
pâncreas. Esses sais biliares provocariam, então, uma necrose das células acinares
pancreáticas.

O ducto pelo qual saem as secreções biliares


provenientes da vesícula biliar (em verde)
conecta-se ao ducto que sai do pâncreas (em
vermelho), formando a ampola de Vater. A
ampola de Vater desemboca na papila
duodenal, por meio da qual tais secreções são
lançadas no duodeno. Nessa imagem,
conseguimos ver que um cálculo proveniente
da via biliar pode impactar na ampola de Vater
e, com isso: 1) obstruir a saída das secreções
pancreáticas e 2) permitir refluxo de bile por
meio do ducto pancreático.

Álcool - segunda causa mais comum!


● 30% a 35% dos casos
● 5 - 10% dos etilistas evoluem para PA
○ A incidência varia de acordo com a quantidade de álcool ingerida (>100g de etanol/dia),
presença de tabagismo e suscetibilidade individual
● Homens jovens

❗Como o álcool causa pancreatite aguda?


● O álcool tem uma série de efeitos nocivos ao pâncreas, desencadeando a liberação de citocinas
inflamatórias, como NF-kappa beta, TNF alfa, Interleucina 1 (Il1). Há, então, um aumento da
expressão e da atividade de proteases apoptóticas, chamadas caspases.
● O álcool também diminui a perfusão pancreática, promove espasmo do esfíncter de Oddi
(situado na ampola de Vater), leva a uma sensibilização excessiva dos ácinos à colecistocinina e
promove precipitação proteica no lúmen dos ductos pancreáticos, levando a sua obstrução.
Medicamentos
● Sulfonamidas, metronidazol, tetraciclina, tiazídicos, furosemida,
estatinas, azatioprina, sulfassalazina, 6-mercaptopurina, ácido valproico, acetaminofeno e alguns
antirretrovirais

Colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE)


● PA é a complicação mais frequente associada a CPRE, 5% a 10% dos pacientes submetidos a
esse procedimento evoluem para PA
● Fatores de risco associado à PA pós-CPRE:
○ idade menor que 60 anos, história de PA pós-CPRE prévia, mais de duas injeções de
contraste no ducto pancreático, procedimentos terapêuticos (e não apenas
diagnósticos), esfincterotomia da papila menor, disfunção do esfíncter de Oddi e CPRE
realizada por profissionais em treinamento.
Alterações anatômicas
● Pâncreas divisum : 10% da população ➡️ Risco 5-10% de pancreatite aguda
● Pâncreas anular, coledococele tipo V, Junção biliopancreática anômala, Tumores

Idiopática - terceiro tipo mais comum de pancreatite!


● 25% a 30% dos casos
● Quando nenhuma etiologia é descoberta

FISIOPATOLOGIA
Teoria da autodigestão
● Células acinares: produtoras de enzimas digestivas (tripsina,
quimotripsina e amilase) que compõem o suco pancreático
● Ocorre uma ativação das enzimas proteolíticas ainda no
interior das células acinares, em pleno parênquima
pancreático
● As enzimas ativas, principalmente a tripsina ativada pela
catepsina B, seriam responsáveis pela digestão dos tecidos
pancreáticos, peripancreáticos e pela ativação de outras
enzimas. Essa morte celular intensa levaria à ativação do
complemento e à liberação de peptídeos de substâncias
vasoativas, gerando vasodilatação e aumento da
permeabilidade vascular.
● A partir daí, seria instalado quadro de síndrome de resposta
inflamatória sistêmica com potencial evolução para falência
orgânica e coagulação intravascular disseminada.
● A falência orgânica pode acontecer em QUALQUER órgão ou
sistema. Ou seja, caso a pancreatite aguda complete essa
evolução, estaremos diante de um gravíssimo quadro com
alto risco de desfecho fatal.
🥴DOENTE TÍPICO:
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
O típico paciente é aquele que apresenta dor abdominal moderada a intensa no
andar superior do abdome, com irradiação para o dorso e/ou “em faixa”, acompanhada de
náuseas e vômitos !
● Dor abdominal
○ intensidade variável
○ epigástrio, andar superior do abdome ou periumbilical
○ irradia para o dorso, flancos (direito e/ou esquerdo), tórax
ou abdome inferior
○ ALIVIA na posição genupeitoral (imagem) e PIORA supina
● Outros sintomas:
○ Icterícia (25%), principalmente de etiologia biliar
○ Dispneia
Exame físico
● SINAIS VITAIS: febre, taquicardia, hipotensão, taquipneia e hipoxemia
● MUCOSA: icterícia pode ser evidenciada por esclera amarelada.
● ABDÔMEN: dor leve à palpação ou dor intensa, difusa ou localizada
○ Distensão abdominal e ruídos hidroaéreos abolidos ou reduzidos podem estar presentes.
○ Massa abdominal palpável (necrose pancreática encapsulada, pseudocisto pancreático ou
pâncreas aumentado com coleções líquidas) pode existir.
● DERMATOLÓGICO (observados em alguns pacientes):
○ Equimoses em flancos (sinal de Grey-Turner);
○ Equimose periumbilical (sinal de Cullen);
○ Equimoses na base do pênis (sinal de Fox);
○ Paniculite ou necrose nodular da gordura subcutânea, ocorrendo, sobretudo, nas
extremidades

DIAGNÓSTICO
Para diagnóstico de pancreatite aguda, são necessários dois dos três critérios abaixo:
1. Achados clínicos típicos/compatíveis: dor abdominal no quadrante superior do abdome
associado a náuseas e a vômitos;
2. Elevação de 3 ou mais vezes nos níveis séricos de AMILASE e/ou LIPASE;
3. Achados característicos nos exames de imagem
Observações:
● O diagnóstico de PA não depende necessariamente dos exames de imagem
● Na fase inicial, a síntese de amilase e lipase é mantida, mas a secreção está bloqueada. Essas
enzimas saem das células acinares (onde são produzidas) e vão para o espaço intersticial,
chegando na circulação sistêmica

AMILASE LIPASE

Início do aumento: 6 - 12 horas Início do aumento: 4 - 8 horas


Pico em 48 horas Pico em 24 horas
Mantém elevação por 3 a 7 dias Mantém elevação por 8 a 14 dias
Os níveis de amilase e lipase não têm importância prognóstica na pancreatite aguda. OU SEJA,
NÍVEIS MAIS ELEVADOS NÃO SIGNIFICAM PANCREATITE AGUDA MAIS GRAVE!

Outros exames laboratoriais - critérios independentes preditores de PA grave:


● Hematócrito > 44%: critério independente para pancreatite aguda grave;
● Uréia > 20 mg/dL: preditor independente de mortalidade na pancreatite aguda grave;
● PCR ≥ 150 mg/dL no 3º dia: critério preditor de pancreatite aguda grave.

USG de abdome:
● OBRIGATÓRIO na admissão do paciente, mas não é necessário para o diagnóstico
○ é mandatório para estabelecer a etiologia
● Deve ser feita nas primeiras 48 horas de admissão
TC de abdome:
● Não é obrigatório e indispensável nos casos leves, sendo indicado:
○ Em caso de dúvida diagnóstica
○ Suspeita de complicações TC de abdome com contraste após 72 horas do início
dos sintomas de PA
○ Avaliação de prognóstico

Colangiorressonância - RNM
AVALIAÇÃO DA GRAVIDADE
Fatores de risco para gravidade
● Idade > 60 anos, obesidade (IMC > 30 kg/m2), história de alcoolismo e presença de
comorbidades (insuficiência cardíaca, insuficiência renal ou hepatopatia) são fatores de risco
independentes para gravidade da pancreatite aguda.
C → Comorbidade
A → Alcoolismo
I → Idade > 60 anos
O → Obesidade

Critérios de Ranson (o mais importante!)


● PA GRAVE quando 3 ou mais critérios de Ranson estiverem presentes!
Apache II
● baseia-se na idade, em comorbidades e em 12 medidas fisiológicas.
● PA GRAVE quando Apache ≥ 8!

Classificação de atlanta revisada


São sinais de falência orgânica:
➔ Pressão arterial sistólica < 90 mmHg
➔ PaO2 < 60 mmHg
➔ Creatinina > 2 mg/dL após ressuscitação volêmica
➔ Sangramento gastrointestinal superior a 500 mL em 24 horas.

TRATAMENTO
● O tratamento envolve a tríade jejum, analgesia e hidratação precoce
● Jejum é preconizado devido ao fato de a maioria dos pacientes apresenta dor abdominal,
náuseas e vômitos em sua apresentação clinica
● Analgesia com opióides como meperidina (vantagem de relaxamento do esfíncter de Oddi)
e morfina

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