Você está na página 1de 63

Colelitíase e

complicações
Danilo Saragiotto Ferreira de Mello (9596)
Clínica cirúrgica – Dr. João Bordim
Definição de Colelitíase

Presença de cálculos biliares,


independentemente de sua localização.

Também é considerada, por muitos autores, como


a presença de cálculos biliares na vesícula biliar.
Anatomia
Anatomia
Trígono
hepatocístico
ou de Calot

OBS: Trígono de Calot


original = artéria cística,
ducto cístico e ducto
hepático comum.
Vascularização

A artéria cística origina-se, em 85% dos


casos, da artéria hepática direita.

Uma porção < 10% drena para o hilo vesicular,


enquanto grande parte da vesícula drena
diretamente para o leito hepático, ou seja, não
encontramos uma veia cística propriamente dita.
Fisiopatologia

Os cálculos biliares se formam quando há desequilíbrio


entre os diversos componentes da bile: colesterol,
fosfolipídeos e sais biliares.

Outros fatores que contribuem para a formação de


cálculos são: alterações de esvaziamento da vesícula
biliar (estase de bile) e a presença de bactérias que
possam desconjugar os sais biliares.
Epidemiologia

Incidência: 10-15% entre adultos brancos


em países desenvolvidos (> 700 mil casos
anualmente nos EUA).

Maior incidência em mulheres (4 : 1).


Fatores de risco
• Sexo feminino (estrogênio; metabolismo do colesterol)

• Aumento da atividade hemolítica (hipersaturação de pigmentos)

• Diminuição do pool de sais biliares (ex.: ressecções intestinais)

• Aumento da concentração biliar de colesterol (exs.: obesidade,


rápida perda de peso)

• Doenças sistêmicas (exs.: DM, gordura abdominal)

• Idade > 40 anos; cirrose; gestantes...


Fatores de risco (“7 Fs”)
• Female: sexo feminino
• Forty: idade > 40 anos
• Fertile: multiparidade
• Fair: caucasianos
• Fat: obesidade
• Fast weight loss: rápida perda de peso
• Family: histórico familiar positivo
Composição dos cálculos

1. Cálculos de colesterol:
amarelos

2. Cálculos pigmentares:
marrons ou negros

3. Cálculos mistos
(maioria)
Lama biliar

Representa uma mistura de mucina com


cristais de colesterol e bilirrubinato.

É um potencial precursor da colelitíase,


na medida em que os cristais podem se
agrupar, formando cálculos biliares.
Quadro clínico

Colelitíase assintomática (> 60% dos casos)

Colelitíase sintomática (Colecistopatia crônica calculosa):

• Dor abdominal profunda e contínua em HCD de 30min – 2h


(< 6h) após as refeições, principalmente gordurosas
• Possível irradiação para dorso ou andar superior do
abdome
• Náuseas e vômitos
Exames laboratoriais
Leucograma, bilirrubinas, amilase e lipase normais são
frequentemente encontrados em cólicas biliares
(colelitíase).

Leucocitose com neutrofilia sugere colangite ou colecistite,


e bilirrubinas elevadas, às custas de bilirrubina direta com
elevação de enzimas canaliculares (FA e GGT), denotam
coledocolitíase, colangite ou pancreatite biliar.

A elevação de amilase e lipase acima de 3x o limite superior


da normalidade é compatível com pancreatite aguda.
Diagnóstico - Colelitíase
Ultrassonografia (USG) é o exame de escolha!

• Barato, alta disponibilidade; sem radiação ionizante


• Não identifica cálculos < 2mm
• Exame complementar: USG endoscópica

Presença de cálculo impactado no infundíbulo da


vesícula, independente de mudanças de decúbito,
porém sem espessamento ou delaminação na parede
do órgão. Formação de sombra acústica.
USG - Colelitíase
Tratamento – Colelitíase assintomática
Deve-se considerar idade e estado clínico do paciente.

Indicações de colecistectomia (padrão-ouro → laparoscópica):

• Maior risco de neoplasia de vesícula: HF de câncer de vesícula


e vias biliares ou calcificações na parede da VB ou aspecto de
vesícula em “porcelana”.

• Alto risco de colecistite aguda: diabéticos e imunodeprimidos.

• Cálculos maiores que 2 cm e menores que 0,5 cm (riscos de


colecistite aguda e pancreatite biliar, respectivamente).
Tratamento – Colelitíase
Tratamento farmacológico (baixíssima efetividade): ácido
ursodesoxicólico 300-600mg/dia VO por até 12 meses;
reservado para pacientes com alto risco cirúrgico.

A realização de colangiografia intraoperatória


(cateterização do ducto cístico com realização de exame
contrastado durante a cirurgia) de rotina é controversa.

Colelitíase sintomática (CCC): sintomáticos +


colecistectomia eletiva.
Complicações da colelitíase

As manifestações clínicas da colelitíase que levam o


paciente a um serviço de emergência estão associadas, na
maioria das vezes, à impactação do cálculo no infundíbulo
vesicular ou no ducto cístico.

O tempo e a localização ajudam na diferenciação entre a


cólica biliar (duração < 6 horas) e a dor da colecistite
aguda (6 horas), que são as complicações mais comuns.
Complicações da colelitíase
Colecistite aguda

É a inflamação aguda da vesícula biliar, que geralmente


está associada à colelitíase como evento inicial. A
obstrução do esvaziamento da vesícula leva à cólica
biliar persistente.

Com a manutenção da obstrução, ocorre a distensão


progressiva da parede vesicular, o que compromete a
microcirculação, causando desde isquemia até necrose.
Quadro Clínico - Colecistite aguda
• Dor persistente (> 6h) em HCD, podendo irradiar
para dorso e ombro direito

• Vômitos e febre; hiporexia

• Sinais de sepse (em pacientes mais graves; casos


de perfuração)

• Sinal de Murphy positivo

• Icterícia é incomum
Fonte: Sanar.
Cólica biliar X Colecistite aguda
Ambas podem apresentar dor em HCD associada ou não
ao sinal de Murphy (dor à inspiração profunda à
palpação do ponto cístico).

Entretanto, qualquer paciente sem resolução completa


da dor em HCD deve ser avaliado com diagnóstico
provável de colecistite aguda.

A dor mais persistente, associada a febre, toxemia e


icterícia, descarta o diagnóstico de cólica biliar simples.
USG – Colecistite aguda
Cálculos biliares impactados, distensão da vesícula biliar, edema
de parede (com ou sem delaminação), líquido perivesicular e
sinal de Murphy sonográfico.
Tomografia Computadorizada
Não há evidências que apoiem o uso da TC
como principal método de imagem inicial na
avaliação da colecistite aguda.

Contudo, a tomografia computadorizada é


particularmente útil para avaliar complicações da
colecistite, como pancreatite biliar, coledocolitíase,
colecistite gangrenosa, íleo biliar e
perfuração da vesícula biliar.
Ressonância magnética

Sensibilidade e especificidade semelhantes à USG.

Utilizada em situações de urgência (USG difícil


devido a obesidade), suspeita de coledocolitíase,
gestantes, etc.
Critérios de Tokyo - Colecistite aguda
Tratamento – Colecistite aguda
Colecistite aguda de grau I (leve): colecistectomia laparoscópica
precoce (24-48h) OU observação após melhora com tratamento
clínico inicial.

Colecistite aguda de grau II (moderada): tratamento clínico +


colecistectomia após melhora do quadro agudo (se não responsivo:
drenagem percutânea da VB seguida de colecistectomia).

Colecistite aguda de grau III (grave): suporte


ventilatório/circulatório (devido à disfunção orgânica) +
colecistotomia (drenagem precoce da VB) + colecistectomia eletiva.
Antibioticoterapia
Colecistite acalculosa ou alitiásica
• Pacientes internados cronicamente em UTI

• Início do quadro com FOI

• Dor em HCD pode estar ausente – difícil diagnóstico

• USG/TC inespecíficos (líquido perivesicular)

• Colecistocintilografia é útil no diagnóstico

• Tratamento: colecistectomia (VLP) ou


colecistotomia percutânea em pacientes inaptos à
cirurgia
Colecistite enfisematosa
• Forma rara e grave
• Necrose com gangrena e gás no interior da vesícula
• Associação com Clostridium perfringens
• USG: presença de ar na parede da vesícula biliar
• Tratamento: colecistectomia (VLP) – alta mortalidade
Colecistite aguda – Complicações

• Empiema (colecistite supurativa)

• Gangrena

• Perfuração
Síndrome de Mirizzi

Gerada pela compressão contínua de um cálculo


na vesícula biliar sobre a via biliar principal,
resultando em processo inflamatório local e
eventual comunicação entre as estruturas.

Sintomas como: dor abdominal, icterícia,


náuseas, vômitos, colúria, prurido, entre outros.
Síndrome de Mirizzi
Diagnóstico - Síndrome de Mirizzi
Pode ser realizado por USG, TC ou colangioRNM. Entretanto, na
maioria das vezes o diagnóstico é intraoperatório.
Tratamento - Síndrome de Mirizzi

Varia de colecistectomia simples à derivação


biliodigestiva, a depender da gravidade do caso e
dos achados intraoperatórios.

Não há contraindicação para videolaparoscopia.


Pancreatite aguda biliar (PAB)

É um processo inflamatório agudo do pâncreas relacionado com a


presença ou a passagem de cálculo no colédoco distal, causando
obstrução temporária ou persistente ao fluxo de bile.

Em parte dos pacientes com colelitíase, o cálculo mantém-se


impactado na papila duodenal, podendo causar pancreatites
reentrantes ou mesmo o agravamento da pancreatite.

Nos casos de pancreatite aguda biliar, é mandatório que o cálculo


migrado da vesícula biliar responsável pelo processo seja removido.
Quadro clínico - Pancreatite aguda

Dor em faixa, epigástrica ou no


HCD, às vezes irradiada para
dorso, acompanhada de
náuseas e vômitos. Dor à
palpação do andar superior do
abdome.

Nas pancreatite hemorrágicas,


podemos notar hematomas em
flancos (sinal de Grey-Turner) e
periumbilical (sinal de Cullen).
Diagnóstico - Pancreatite aguda
O diagnóstico de pancreatite aguda requer 2 dos 3 critérios:
quadro clínico, laboratorial (elevação de 3x o LSN da amilase
ou lipase) e imagem.

A TC de abdome não é necessária em todos os casos e é


importante para confirmar o diagnóstico nos casos
duvidosos, auxiliando na avaliação de casos graves ou com
suspeita de complicação. Pacientes com pancreatite leve
(maioria) que tiveram diagnóstico confirmado pelo quadro
clínico típico e critério laboratorial não necessitam de TC.
Diagnóstico - Pancreatite aguda
Classificação de gravidade de Atlanta modificada
Escore de Marshall modificado
Tratamento - Pancreatite aguda

Pancreatite aguda leve: jejum + hidratação + sintomáticos.

Pancreatite aguda moderada ou grave: jejum + hidratação +


sintomáticos + suporte clínico em UTI + monitoramento com
exames de imagem (detectar coleções infectadas e/ou
sinais de hemorragia).

Está indicada a colecistectomia na mesma internação!


Tratamento - Pancreatite aguda

Pancreatite aguda com necrose infectada (PANI) – presença de


gás em meio a necrose em TC/RNM ou cultura positiva em
material colhido por punção:

1. Realizar ATBterapia (guiada pela cultura ou uso empírico de


carbapenêmico ou Cefepime associado a Metronidazol).

2. Drenagem endoscópica → Drenagem percutânea →


Necrosectomia cirúrgica (em último caso – alta mortalidade).
Coledocolitíase

Presença de cálculos na via biliar principal (ducto


colédoco/hepático comum), levando a um quadro
clínico caracterizado por náuseas, vômitos e dor.

A icterícia obstrutiva (manifesta por colúria, hipocolia


fecal e prurido cutâneo) é achado frequente. Sintomas
de colangite (icterícia e febre) podem estar associados.

É a principal causa de colangite!


Coledocolitíase

Pode ser classificada como:

1. Primária: cálculos formados na via biliar principal.


(FR: corpos estranhos, estenoses ou cistos nas vias biliares)

2. Secundária (mais comum): cálculos da vesícula


biliar migram para a via biliar principal.
(FR: microcálculos (<5mm), ducto cístico curto ou vesícula séssil)
Coledocolitíase
8-10% dos pacientes assintomáticos têm o diagnóstico
de coledocolitíase na colangiografia intraoperatória,
realizada durante colecistectomia.

Suspeita pré-operatória de coledocolitíase: elevação


de enzimas canaliculares.

Outro fator de risco é a história pregressa de


pancreatite aguda biliar!
Diagnóstico – Coledocolitíase

Exames laboratoriais iniciais: AST/ALT, FA, GGT, bilirrubinas


totais e frações, amilase e lipase.

• USG de abdome: avaliação inicial de quadros de icterícia,


podendo detectar dilatação de vias biliares e eventuais sítios
de obstrução, porém confirma o diagnóstico de
coledocolitíase em apenas 50% dos casos.

• TC: complementa os achados da USG, fazendo o diagnóstico


diferencial com doenças pancreáticas e neoplasias.
Diagnóstico – Coledocolitíase

• ColangioRNM: é o exame mais adequado no diagnóstico da


coledocolitíase, em detrimento da CPRE, uma vez que é
sensível, não invasiva e não requer uso de radiação ionizante e
contraste.

• CPRE: alta morbimortalidade associada (pouco usada para


diagnóstico).

• USG endoscópica (Ecoendoscopia): excelente opção para o


diagnóstico diferencial da icterícia obstrutiva, incluindo a
coledocolitíase.
USG / RNM – Coledocolitíase
Tratamento – Coledocolitíase

OBS: Tratamento cirúrgico = coledocotomia +


dreno de Kehr / derivação biliodigestiva.
Colangiopancreatografia retrógrada
endoscópica (CPRE)
Papilotomia endoscópica + retirada dos cálculos da via biliar.

Complicações: pancreatite, sangramento, perfuração


duodenal e colangite.
Derivação biliodigestiva

Deve ser considerada em


pacientes idosos, com
grande dilatação do
colédoco e múltiplos
cálculos na via biliar
principal, pelo risco de
recorrência.
Outras complicações importantes da colelitíase são:

Colangite: infecção das vias biliares;

Íleo biliar: secundário à migração de cálculos


grandes pela via biliar principal, chegando ao
intestino delgado e causando obstrução intestinal a
nível da válvula ileocecal.
Referências
https://www.einstein.br/doencas-sintomas/colelitiase

https://d3043uog1ad1l6.cloudfront.net/uploads/2021/04/sinaldemurphy.png

COLELITÍASE%20E%20COMPLICAÇÕES%20EINSTEIN%20copy.pdf

https://lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/163860/000329449.pdf?sequence=1#:~
:text=A%20pancreatite%20aguda%20biliar%20(PAB)%20%C3%A9%20um%20proces
so%20inflamat%C3%B3rio%20agudo,persistente%20ao%20fluxo%20de%20bile.
Obrigado!

Você também pode gostar