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Introdução ao Estudo do Direito

Necessidade do Direito
‘’O Homem é um animal social’’, ou seja, regula a vida em comunidade e, só através da interação
com os outros, da conjugação dos seus esforços, baseada na solidariedade e na divisão do
trabalho, o Homem atingirá a sua plana realização. Contudo, a convivência em sociedade só é
possível se existir um elenco mínimo de princípios ou regras que pautem a conduta humana.
Sociedades – Relações – Conflitos: Como prevenir? Como resolver? Com regras.
Onde há homem há sociedade. Onde há sociedade, há direito.
Podemos assim referir:
 Ordem Natural: ordem de necessidade (Exemplo: Está a chover e não podemos evitá-lo)
As suas normas não são substituíveis, aplicam-se de forma invariável e constante,
independentemente da vontade do Homem, ou mesmo contra a sua vontade. São normas
inerentes à própria natureza dos seres.
 Ordem Social: ordem de liberdade
As leis ou normas de conduta social são aquelas que se dirigem à vontade do Homem e se
propõem a nortear as suas condutas e, para além disso, são violáveis. Apesar das suas
normas exprimirem um ‘’deve ser’’ e se imporem ao Homem, este pode violá-las, pode
revelar-se contra elas ou pode mesmo alterá-las, sendo certo que a violação destas
normas só atinge na sua eficácia e não na sua validade. É uma ordem normativa.
Nós cidadãos (destinatários da lei), elegemos os nossos representantes que depois vão
criar leis.
Valores fundamentais do Direito
O Direito baseia-se na liberdade e sociabilidade de cada individuo, defendendo que a vida em
sociedade depende da imposição de uma ordem, ordem que nos é imposta, de um conjunto de
regras e padrões que orientem o comportamento do Homem, e estabelecem as regras da
organização da sociedade e das instituições que a compõem.
São dois, os valores fundamentais do Direito: justiça e segurança.
(Direito cria normas com o fim de atingir a justiça e a segurança entre cidadãos)
Justiça
O principal fim a atingir pelo Direito é a justiça.
A justiça é repartida em três modalidades fundamentais, sendo que estas modalidades
correspondem a 3 tipos de relações:
 Justiça Comutativa ou Corretiva (relação cidadão/cidadão)
É aquela que se estabelece entre os cidadãos, prevendo os direitos e deveres de uns para
com os outros (ideia de igualdade jurídico-social).
É aqui que se situa o Direito Privado: normas que regulam as relações entre indivíduos, e
entre estes e os entes públicos, visando restabelecer ou corrigir os desequilíbrios que
surgem nas relações interpessoais. Opera segundo um critério de igualdade simples ou
aritmética, que se traduz na equivalência das prestações, e abrange tanto as trocas
voluntárias ou lícitas como as involuntárias ou ilícitas.

 Justiça Geral ou Legal (relação cidadão/estado)


Este conceito engloba as relações entre os cidadãos (devedor) e o Estado (credor),
encontrando-se este numa situação de supremacia.
Neste patamar de justiça estabelece-se o que os cidadãos devem à sociedade (Estado),
como contribuição para o bem desta, para um bem comum.
 Justiça Distributiva (relação estado/cidadão)
Também estabelece relações entre Estado (devedor) e cidadãos (credor), mas neste
patamar o Estado surge com um papel de obrigação.
Através dos seus agentes e dos seus órgãos, o Estado tem o dever de proporcionar a
todos as condições necessárias a uma vida com bem-estar, através da repartição dos bens
comuns (saúde, segurança, educação, justiça, etc.) – critério de igualdade proporcional ou
geométrica.

Este é o papel da Ordem Jurídica, que é a ordem social regulada pelo Direito – conjunto de
normas de conduta social emanadas pelo Estado e garantidas pelo seu poder.
Assim pode-se afirmar não só que onde existe o Homem existe sociedade, mas também que
onde há sociedade há Direito.
Segurança
Embora não tenha a projeção da Justiça, pois representa um valor de hierarquia inferior, não
deixa de ser indispensável à vida social, pois está diretamente ligada à utilidade, às necessidades
práticas e às urgências da vida.
o Segurança com o sentido de paz social: O Direito visa garantir a convivência pacifica entre
os homens, prevenindo e solucionando os conflitos que surgem inevitavelmente na vida
social – missão pacificadora.
o Segurança com o sentido de certeza jurídica: O Direito deve ‘’proteger os direitos e
liberdades fundamentais dos cidadãos e os defender das eventuais arbitrariedades dos
poderes públicos ou abusos de poder’’ (estado regula a vida em sociedade, mas com
limites).

Relação entre o Direito, a Justiça e a Segurança


Na prática, a realização da Justiça e da Segurança em simultâneo, apresenta grandes
dificuldades, o que leva a que o Direito umas vezes dê prevalência à Justiça sobre a Segurança e
outras vezes o inverso.
Em qualquer dos casos, o sacrifício tem de ser parcial, o que significa que não se pode afastar
totalmente qualquer um desses valores, já que a finalidade é a de conjugar ambos.
A Necessidade de Regras como Condição de Subsistência da Vida em
Sociedade
A vida social só é possível porque os Homens acatam regras que visam instruir a ordem, a paz, a
segurança, a justiça e atenuar os conflitos de interesses que inevitavelmente surgem nas
relações sociais. É, assim indispensável a existência de regras que imponham condutas aos
membros da sociedade, com vista a evitar conflitos, desencadeados por diversos motivos, ou
minimizar as suas consequências.
Essas regras conferem, por um lado direitos e garantem certos usos fundamentais da liberdade, e
por outro proíbem aos indivíduos o abuso dos seus direitos. Podemos, por isso, dizer que em
sociedade vivemos de forma heterogénea.
Conceito de Direito
 Direito é um conjunto de normas que regula o comportamento humano numa determinada
sociedade, e numa determinada época.
 Está então sempre referido a uma dada sociedade. Não há Direito sem sociedade.
 É um conjunto de normas historicamente situadas. Não há Direito universal para todas as
épocas e todas as sociedades.
 Direito é uma técnica de organização social. O objetivo do Direito é a implantação de uma
certa ordem, tendendo a uma certa organização social.

Ordem Moral: A Ética


Visa o aperfeiçoamento do individuo, dirigindo-o para o bem.
É um conjunto de imperativos impostos ao Homem pela sua própria consciência ética, sendo o
seu incumprimento punido, principalmente, pelo arrependimento ou remorso, mas também pela
rejeição ou marginalização do grupo em que o individuo se insere.
Será, assim, uma ordem intra subjetiva, dado que relaciona a pessoa consigo mesma.
Distingue-se do Direito por via de dois critérios: Coercibilidade e Exterioridade.
Coercibilidade: O Direito e a Moral distinguem-se pelo tipo de coação e de sanções que se
aplicam a quem não cumprir as normas. As normas jurídicas são física e organicamente
suscetíveis de aplicação coerciva, enquanto que as morais não.
Exterioridade: O Direito e a Moral têm pontos de partida diferentes. A ordem jurídica é exterior
ao individuo, regulando a sua conduta externa. A ordem moral, por outro lado. Irá depender dos
valores do próprio individuo (por exemplo, pensar em roubar poderá ser moralmente condenável,
mas será um ato indiferente perante o Direito)
Ordem Religiosa
É a Ordem de fé, regulando as relações entre os crentes e os seus deuses.
É essencialmente intra-individual, refletindo-se também na sociedade dado que as crenças
religiosas dos indivíduos influenciam a sua conduta/comportamento.
O não cumprimento das normas religiosas leva a sanções de caráter extraterreno.
Ordem de Trato Social: Cortesia
Exprime-se através dos usos sociais, podendo variar dentro da mesma sociedade, conforme o
círculo social.
A violação destas normas implica apenas uma sanção social inorgânica que consiste
essencialmente num sentimento de reprovação por parte da comunidade levando muitas vezes à
marginalização do infrator.
Ordem Jurídica
Ordem normativa e intersubjetiva, assistida de coercibilidade material, que visa regular a vida do
Homem em sociedade, conciliando os interesses em conflito. Tem como valores fundamentais a
Justiça e a Segurança, utilizando como meio as normas jurídicas.
Norma Jurídica, Ordem Jurídica e Ordenamento Jurídico
Norma Jurídica: Regra de conduta social, assistida de proteção coativa.
Ordem Jurídica: Sociedade organizada pelo sistema de normas jurídicas. É um conceito mais
amplo que o conceito de Direito porque engloba todo o Direito e ainda tudo aquilo que cria e
aplica o Direito (instituições, órgãos, fontes do Direito, …). A ordem jurídica procura defender-se
dos atos ilícitos, recorrendo aos meios de proteção ou tutela jurídica, tanto preventivos como
repressivos, no qual se incluem as sanções jurídicas.
Ordenamento Jurídico: Conjunto de normas que regem uma dada comunidade, de um
determinado momento histórico. Engloba os princípios gerais ou fundamentais do Direito. É então
uma função essencial do Direito e consiste na ordenação das relações sociais.
Características das Normas Jurídicas:
o Coercibilidade (uso da força/ordem jurídica pode recorrer ao uso da força);
o Imperatividade (vinculativas, imperativas);
o Generalidade (aplicam-se todos por igual);
o Violabilidade (podem ser violadas);
o Abstração (regulam um número indeterminado de casos)
Coercibilidade: É a característica das normas jurídicas que indica que a ordem jurídica pode
recorrer à força para impor o cumprimento da norma (a coercibilidade não é uma característica de
cada norma jurídica per si, mas sim da ordem jurídica).
Imperatividade: As normas jurídicas não se limitam a aconselhar uma determinada conduta, elas
impõem uma conduta! São um comando.
Generalidade: As normas jurídicas são normas gerais porque se destinam a um conjunto amplo
de destinatários, e não a destinatários singularmente determinados.
Abstração: A normas jurídicas regulam um número indeterminado de casos do mesmo tipo, e não
a situações concretas ou individualizadas.
As Diversas Ordens Sociais Normativas
Moral Direito
Visa assegurar o
Visa dirigir a pessoa para o desenvolvimento do homem
Finalidade bem; Aperfeiçoamento pelo estabelecimento de
individual regras (regular a vida em
sociedade)
Intra-subjetivo, procura
Essência Intra-subjetiva, relaciona a evitar conflitos e promover a
(exterioridade) pessoa consigo mesma cooperação (relação do
homem c/ 3ºs)
Consciencializaçã O crivo da consciência do Para ser aplicado dispensa
o subjetiva sujeito a consciência individual
Coercibilidade Arrependimento (psíquica) Se necessário impõe-se
pela força (material)

Religião Direito
Impõe relações do crente Regula as relações
Finalidade com a divindade, e nas essenciais de uma
relações com o seu comunidade
semelhante
Intra-subjetiva
(sentimento de
Essência (exterioridade) transcendência; relação Intra-subjetivo
eu c/ a nossa fé e o
nosso Deus))
Consciencialização Estranho à ideia da Fé
Subjetiva Assenta na Fé (assenta na consciência
de cada um)
Não é assistida de
coercibilidade material É assistido de
Coercibilidade (ninguém nos obriga a coercibilidade material
determinado
comportamento)
Direito e Cortesia
Como vimos, a Cortesia é um conjunto de regras de convivência social que não sendo essenciais
à sobre vivência da própria comunidade, visam assegurar um bom relacionamento entre os seus
membros. Podem identificar-se como regras de trato social ou usos. O Direito é assistido de
coercibilidade material enquanto a ordem de trato social não.
Relações entre as diversas ordens sociais normativas
Entre a Ordem Jurídica e as outras ordens normativas podem surgir relações de: coincidência,
indiferença e/ou conflito.
Por exemplo, entre o Direito e a Moral há largas zonas de coincidência, pois dificilmente se
poderá conceber uma ordem jurídica totalmente contrária aos conceitos morais vigentes
(nomeadamente a regra ‘’não matar’’).
Podem, no entanto, surgir relações de indiferença como por exemplo as regras de trânsito.
Mas também há relações de conflito, como por exemplo a despenalização do aborto.

Direito e Realidades Afins


O Estado – Sociedade Politicamente Organizada
A vida sem sociedade pressupõe a existência de múltiplos interesses individuais, colidindo uns
com os outros e muitas vezes com tendência a se sobreporem aos interesses coletivos. O Direito
aparece como um instrumento capaz de regular as relações que se estabelecem entre os
membros da sociedade.
Tornou-se, pois, necessário o aparecimento de uma instituição que fosse dotada de meios
capazes de fazer cumprir a lei e que ao mesmo tempo possibilitasse a realização do bem-estar
social.
Esta instituição é o Estado, e representa a mais progressiva e complexa forma de sociedade
política.
Estado: É uma instituição que se situa acima da comunidade e que é dotada de meios capazes
de fazer cumprir a lei. Possibilita a realização do bem-estar social através da prestação de
serviços importantes para a coletividade. É a afirmação de um poder soberano exercido
uniformemente sobre um povo, num determinado território.
Entre o Direito e o Estado há uma relação de estreita interdependência – sendo o Estado uma
necessidade, também o Direito o é uma vez que representa a linguagem de quem o governa.
(Homem atribui soberania ao Estado através do voto)
O estado ao ser autor e intérprete das leis, ao impor a lei e a ordem é de facto um instrumento
indispensável para assegurar a vida do Homem em sociedade.
O Direito utiliza o Estado através das suas funções para garantir o cumprimento das regras e
normas e também o acesso da sociedade às necessidades coletivas.
Características do Estado
Estado: Sociedade politicamente organizada que congrega 3 elementos fundamentais: povo,
território e poder político.
Povo: conceito jurídico e político, entendido como uma comunidade de cidadãos, ou o conjunto de
nacionais de cada Estado.
Os cidadãos vinculam-se ao Estado por vida da cidadania ou por via da nacionalidade, sendo
esta atribuída com base em diferentes critérios.
Nacionalidade
1. O direito à nacionalidade é um direito fundamental dos cidadãos;
2. Os critérios de que depende a sua atribuição podem ser agrupados em duas categorias:
a. Ius Sanguinis – a nacionalidade é atribuição podem função dos laços sanguíneos ou
da filiação a nacionais de determinado Estado;
b. Ius Soli – a nacionalidade é atribuída em função do local de nascimento.
Conceitos semelhantes ao de ‘’povo’’ são o de nação e população:
Nação: Comunidade estável, inscrita ou não num determinado espaço geográfica, com
aspirações materiais e espirituais comuns, fundando-se numa história e cultura comuns. Tem,
geralmente, aspirações políticas. Note-se que o conceito de nação pode não coincidir com o de
Estado. Portugal pode ser considerado um Estado-Nação, dado que corresponde a uma nação
portuguesa, mas Espanha já não (Catalunha, País Basco, etc.).
População: Conjunto de pessoas que residem num determinado território e que integra
eventualmente cidadãos de outras nacionalidades. Tem uma natureza essencialmente
demográfica e económica, o que se opõe à natureza política e jurídica do conceito de povo.
Território: Compreende o solo e o subsolo (território terrestre), o espaço aéreo (território aéreo) e
o mar territorial (território marítimo), sendo as zonas sobre as quias o Estado exerce plenamente
o seu poder soberano. Farão igualmente parte do território os navios, aeronaves, aviões e
veículos sob bandeira nacional e as representações diplomáticas noutros países (consulados,
embaixadas, etc.).
Poder Político
Noção: faculdade de um povo de, por autoridade própria, instituir órgãos que exerçam com
relativa autonomia a jurisdição sobre um território, nele criando e executando normas jurídicas,
usando para efeito os necessários meios de coação.
O poder político pode assumir várias modalidades, entre elas o poder politico soberano ou a
soberania (poder político supremo e independente – supremo na medida em que não esta
limitado por nenhum outro poder vigente na ordem interna de cada Estado; e independente
porque na ordem internacional não terá que acatar quaisquer normas, a menos que
voluntariamente aceites, encontrando-se desta forma ao mesmo nível dos poderes supremos dos
outros Estados).
O conceito de Estado
Num sentido restrito – sociedade politicamente organizada, inscrita num determinado território
que lhe é privativo, tendo como características a soberania e independência;
Num sentido lato – incluem-se também Estados não soberanos (Estados federados dos EUA, da
Alemanha, do Brasil, por exemplo).
Estados Federados:
 Possuem Constituição própria, governo próprio;
 Legislam dentro do seu domínio;
 Têm meios para garantir a execução das sus leis no seu território.
…, contudo, não são Estados soberanos, pois as suas leis não podem ser contrárias às da
Constituição Federal.
Poderes e Funções do Estado
A teoria dos poderes tripartidos do Estado surgiu no seculo XVII e foi formulada pelo filosofo
inglês John Locke.
Posteriormente, Montesquieu alegava que a liberdade só seria possível caso ocorresse a
separação dos 3 poderes fundamentais do Estado:
 Poder legislativo: Poder de legislar;
 Poder executivo: Poder de executar as resoluções do poder publico;
 Poder judicial: Poder de julgar e condenar por violação de normas jurídicas.
Os grandes fins e objetivos a atingir pelo Estado serão, também, 3:
o Segurança;
o Justiça;
o Bem-estar económico e social.
Segurança: O cidadão necessita de ter a certeza de que o Estado lhe reconhece direitos e
deveres, e que estes o protegem de eventuais atos que o possam perturbar. A esta ideia estarão
inerentes os conceitos de estabilidade e previsibilidade nas relações jurídicas. Mas a segurança
individual não deverá ser o único fim do Estado – a segurança coletiva, a proteção do povo face a
ameaças exteriores, será também um fim do Estado.
Justiça: Ao Estado compete igualmente assegurar a Justiça. Obrigação de garantir que os
conflitos sociais são pacificamente solucionados por um conjunto de regras que corrijam os
desequilíbrios gerados. Ima sociedade organizada sob a égide da Segurança, mas sem Justiça
será uma sociedade totalitária.
Assim, a ordem justa será aquela em que a Segurança, ao serviço da Justiça, permite a
realização plena do Homem.
Bem-estar Economico e Social: Implica a promoção das condições de vida dos cidadãos, o
acesso a bens e serviços considerados como essenciais para a coletividade, tais como a
Educação, a Saúde, a Segurança Social, etc. Atualmente ganham relevâncias as funções de
preservação do ambiente e do património cultural. O seu fim derradeiro será assegurar a Justiça,
torná-la compatível com a Segurança e ao serviço do bem-estar económico e social.
ART. 9º CPR – tarefas fundamentais do Estado (os três fins do Estado que são, portanto,
interdependentes e complementares).
Funções do Estado
As funções do Estado são desenvolvidas através dos seus diferentes órgãos, caracterizando-se
por:
 Função política ou governamental;
 Função legislativa;
 Função administrativa ou executiva;
 Função jurisdicional ou judicial.
Função política ou governativa
Atividade exercida pelos órgãos do Estado que visa a definição e prossecução dos interesses
gerais da comunidade.
É a prática dos atos que define a política geral do país, sendo exercida pelo Presidente da
República, pela Assembleia da República e pelo Governo.
Função legislativa
Consiste na atividade pela qual o Estado cria o seu próprio Direito Positivo, no intuito de
disciplinar as relações que se estabelecem entre particulares e o poder público.
É exercida pela Assembleia da República e pelo Governo.
Função administrativa
Tem por fim a execução das leis e a satisfação das necessidades coletivas enquanto função
adstrita ao Estado. Função exercida pelo Governo.
Função jurisdicional
Atividades exercidas por órgãos colocados em posições de imparcialidade e independência
(tribunais), tendo como objetivo dirimir os conflitos de interesses públicos e privados, assim como
a punição da violação da Constituição da República Portuguesa e demais legislação.

Órgãos de Soberania
São a manifestação da vontade soberana do povo. Poderão ser órgãos singulares, colegiais ou
assembleias que, por força do Direito Constitucional vigente, têm competência para exercer as
funções imputáveis ao Estado.
Órgãos:
 Presidente da República – CRP, art. 120.º
 Assembleia da República – representativa de todos os cidadãos portugueses; CRP, art.
147.º
 Governo – CRP, art. 182.º
 Tribunais – CPR, art. 202.º
Presidente da República
Representa a República Portuguesa. Garante a independência nacional, a unidade do Estado e o
regular funcionamento das instituições democráticas. É por inerência Comandante Supremo das
Forças Armadas. (Art. 120.º CRP)
O PR é eleito por sufrágio:
 Universal (extensível a todos os cidadãos portugueses com capacidade eleitoral);
 Direto (porque os eleitores escolhem diretamente o PR);
 Secreto (nenhum eleitor está obrigado a revelar o sentido do seu voto).
O seu mandato é de 5 anos, não se podendo recandidatar a um terceiro mandato consecutivo.
Competência
 Art. 133.º CRP – competência quando a outros órgãos;
 Art. 134.º CRP – competência para a prática de atos próprios;
 Art. 135.º CRP – competência nas relações internacionais.
Compete-lhe ainda:
 Promulgar as leis e decretos-lei ou exercer o direito de veto;
 Proceder à fiscalização preventiva da constitucionalidade de uma norma que lhe tenha sido
submetida para a ratificação, podendo exercer o direito de veto (art. 278.º e 279.º CRP);
 Convocar extraordinariamente a Assembleia da República e dissolvê-la;
 Nomear o PM e os ministros e demitir o Governo.
Assembleia da República
A Assembleia da República é representativa de todos os cidadãos, pois apesar de os deputados
serem eleitos por círculos eleitorais, representam todo o país e não só o círculo pelo qual foram
eleitos. (Art. 147.º CRP).
Eleição: Os deputados são eleitos por círculos eleitorais. São elegíveis todos os cidadãos
portugueses eleitores, salvas as restrições que a lei eleitoral estabelecer por virtude de
incompatibilidade locais ou de exercício de certos cargos.
Legislatura: 4 sessões legislativas, com a duração de um ano cada uma.
Competências:
 Competência política e legislativa (art, 161.º CRP);
 Competência de fiscalização (art.162.º CRP);
 Competência quanto a outros órgãos (art. 163.º CRP);
 Reserva absoluta de competência legislativa – a AR não pode conceder ao Governo a
autorização para legislar sobre certas matérias (art. 164.º CRP);
 Reserva relativa de competência legislativa – a AR pode conceder ao Governo a
autorização para legislar sobre essas matérias (art. 165.º CRP).

Governo
Órgão de política geral do país e órgão superior da administração pública. (Art. 182.º CRP)
É composto PM, ministros e secretários e subsecretários de Estado.
Formação: O PM é nomeado pelo PR, ouvidos os partidos políticos representados na AR e tendo
em conta os resultados eleitorais. (art.187.º CRP)
Programa de Governo: O programa de Governo é submetido à apreciação da AR, através de uma
declaração do PM, no prazo máximo de 10 dias apos a sua nomeação (art.190.º CRP)
Competência:
 Política (art. 197.º CRP);
 legislativa (art. 198.º CRP);
 administrativa/executiva (art. 199.º CRP)
Tribunais
Órgãos independentes, estando apenas sujeitos à lei. (Art. 202.º e 203.º CRP)
O Juiz não se encontra sujeito a qualquer tipo de poder exterior no decorrer do julgamento dos
processos.
Os tribunais são órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do
povo. (Art. 202.º, nº1 CRP)
Competências:
o Assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos;
o Reprimir a violação da legalidade democrática;
o Dirimir os conflitos de interesse públicos ou privados
As decisões dos tribunais são vinculativas – são obrigatórias e prevalecem sobre as das outras
autoridades. (Art. 205.º, nº2 CRP)
A sua independência perante os poderes executivo e legislativo é indispensável à existência de
um verdadeiro Estado democrático – o juiz decide segundo o critério que considera certo e
encontra-se unicamente vinculado à lei.
Os juízes têm ainda as seguintes prerrogativas:
 Inamovibilidade: São nomeados vitaliciamente, pelo que não podem ser transferidos,
suspensos, promovidos, demitidos, aposentados exceto nas situações previstas pela lei
(art. 216º, nº1 CRP);
 Irresponsabilidade: Não são responsabilizados a título individual pelas decisões que
tomam no exercício das suas funções (art. 216.º, nº2 CRP).
Categorias de Tribunais:
 Tribunal Constitucional;
 Supremo Tribunal de Justiça e Tribunais Judiciais de 1º e 2º Instância;
 Supremo Tribunal Administrativo e os demais Tribunais Administrativos e Fiscais;
 Tribunal de Contas.
Estado de Direito, Estado Social de Direito e Estado de Direito Democrático
Estado de Direito
Aquele em que toda a atuação do poder político está subordinada a regras jurídicas, com vista a
assegurar os direitos e liberdades dos cidadãos perante o próprio Estado.
Estado Liberal de Direito
Surge a partir do século XVIII, atingindo o máximo da sua popularidade em meados do seculo
XIX. Nasce como reação ao absolutismo monárquico (omnipresença e intervencionismo do Rei).
Assentava na separação de poderes e tinha como única função zelar pela defesa e garantia dos
direitos e liberdade fundamentais e individuais, ignorando, contudo, as questões sociais.
Estado Social de Direito
Surge como resultado natural da ineficácia dos modelos liberalistas, nos finais do século XIX. O
facto de Estado não intervir na vida económica e social gerou situações gravosas para os direitos
e liberdades individuais e para a defesa do bem comum. Após as crises que se seguiram à I e II
Guerra Mundiais, a evolução nos sistemas democráticos/liberais do Ocidente fizeram com que o
Estado abandonasse a sua posição abstencionista, o que deu origem ao Estado Social de Direito.
Para além das esferas política e económica, o Estado passa igualmente a intervir na esfera
social.
Tenta conciliar a manutenção do capitalismo como sistema económico e, simultaneamente, a
prossecução do bem-estar geral.
Tradicionalmente os requisitos do Estado Social são:
 Império da Lei;
 Separação de Poderes;
 Legalidade da administração;
 Garantia jurídico-forma e efetiva realização material dos direitos e liberdades
fundamentais.
Estado de Direito Democrático
O Estado de Direito, atualmente, postula a democracia representativa e pluralista; considera-se,
assim, mais adequado falar em Estado de Direito Democrático.
Art. 2.º CRP – A Constituição da República Portuguesa acolheu esta designação.

As Relações Internacionais
Um dos elementos do Estado é o poder político, o qual desempenha diferentes funções no plano
interno e no plano externo.
No plano interno: O poder político traduz a autoridade de, por direito próprio, um povo fixado em
3wadeterminado território instituir os seus órgãos governativos.
No plano externo: O poder político traduz-se na soberania; na capacidade de um Estado se
representar internacionalmente.
Organizações Internacionais
A seguir à II Guerra Mundial a necessidade de garantir a paz e a segurança levou à criação de
Organizações Internacionais, para que fosse possível resolver as temáticas que ultrapassem as
competências de uma só nação, sendo de responsabilidade global. Estas possuem personalidade
jurídica autónoma a nível internacional, destinando-se à coordenação e à realização dos mais
variados interesses comuns.
As OI podem ser classificadas quanto:
 Ao objeto: Gerais, como a ONU; ou particulares como a UE;
 À estrutura interna: Intergovernamentais, como o OUA (Organização da Unidade Africana); ou
supranacionais, como a UE.
 Nas Organizações Intergovernamentais, cada EM, mantém na integra a sua soberania;
 Nas Organizações Supranacionais os seus membros delegam parte da sua soberania à
organização, com vista à resolução de determinados conflitos, possuindo as suas decisões
um carater mais vinculativo.
 Ao âmbito territorial: Para-universais, como a ONU; e regionais como a NATO;
 À natureza dos membros: Públicas, como a ONU; e privadas como a Cruz Vermelha
Internacional.
Direito e Sociedade
O Direito é condição sine qua non da existência e desenvolvimento da sociedade humana.
Compete ao Direito, num primeiro momento, estatuir as normas que determinarão o modo como
esses interesses se devem conciliar ou qual o interesse que deve triunfar.
Por exemplo:
 Nas relações entre vendedor e comprador, o art. 879.º CC prescreve que é obrigação do
vendedor proceder à entrega da coisa vendida, enquanto é dever do comprador pagar o
preço.
 Nas relações entre depositário e depositante, os arts. 1187.º (depositário é obrigado a
guardar a coisa depositada e a restituí-la cm os seus frutos, ect.) e 1199.º (o depositante
deve pagar a retribuição devida e reembolsar o depositário das despesas indispensáveis à
conservação da coisa, etc.) do CC, estabelecem o equilíbrio juridicamente desejado entre
os dois contraentes.
Este plano de regulamento social que o Direito institui nas suas normas é frequentemente
desrespeitado: o comprador não paga o preço, o contribuinte não satisfaz as suas obrigações
fiscais, etc. Quando estes conflitos irrompem, geram-se situações de crise que reclamam uma
solução em termos de Direito.
Numa sociedade civilizada não se aceita que seja o próprio interessado a realizar o seu direito.
Art. 1.º do Codigo do Processo Civil:
‘’A ninguém é lícito o recurso à força com o fim de realizar ou assegurar o próprio Direito…’’
O Direito institui órgãos imparciais e independentes a quem comete a função de ‘’administrar a
justiça’’.
Os tribunais: Arts. 202.º e ss. da CRP
Estes órgãos decidem em termos de definitivos (caso julgado), e ‘’obrigatórios para todas as
entidades públicas e privadas’’, ‘’nas termos previstos na lei’’ os litígios submetidos à sua
apreciação.

Os Diversos Ramos do Direito


Sendo certo que o Direito visa regular as relações da vida social e dada a natureza diversa que
estas apresentam, torna-se de maior utilidade proceder à divisão daquele em vários ramos ou
núcleos, de acordo com a diversidade das relações reguladas e com as características comuns
que se podem encontrar em certos grupos de normas jurídicas.
A primeira divisão que se impõe consiste em distinguir os dois principais ramos do Direito: Direito
Público e Direito Privado.
Em distinção remota aos jurisconsultos romanos que distinguiam entre ius Publicum e ius
Privatum.
Ius Publicum – tudo o que era tornado público, do conhecimento de todos e a todos se aplica;
Ius Privatum – todas as clausulas insertas nos contratos e testamentos, cujo conhecimento se
limitava às pessoas que outorgavam o contrato e só a estas era vinculativa.
Todavia, esta diferenciação já não é válida e tem sido polémica ao longo dos tempos.
São vários, hoje, os critérios propostos para distinguir o Direito Público do Direito Privado.
1. Critério da natureza dos interesses;
2. Critério da qualidade dos sujeitos.
Critério da natureza dos interesses
Este critério tem como base a qualidade dos interesses que a norma visa tutelar. Sendo assim:
 Direito Público – é constituído por normas endereçadas à realização de interesses próprios
da comunidade (interesses coletivos ou públicos);
 Direito Privado – é constituído por normas adstritas à satisfação de interesses privados, ou
seja, de interesses que apenas dizem respeito aos indivíduos que os titulam.
Este critério suscita algumas críticas, porquanto é difícil saber quando é que a norma regula
interesses privados ou públicos. Para além disso, todas as normas são elaboradas tendo em
conta interesses públicos e privados simultaneamente.
Por exemplo: As normas penais que punem o crime de homicídio. O objetivo principal destas
normas é o de garantir um valor cujo respeito é necessário à existência da própria coletividade
(interesse público). Apesar disso, também o interesse pessoal (privado) de cada um em
conservar a sua vida é por elas acautelado.
Devido à dificuldade em distinguir os direitos públicos dos privados, os defensores destes critérios
alteraram os conceitos já definidos. Este critério passou a basear-se na natureza do interesse.
Assim, as normas jurídicas seriam de direito privado ou de direito publico consoante se
propusessem satisfazer preponderantemente ou interesses privados ou interesses públicos.
Critério da qualidade dos sujeitos
De acordo com este critério:
 Direito Público – é constituído por normas que regulam as relações entre os Estados ou
entre o Estados e os particulares.
Por exemplo: Quando pune um criminoso, cobra um imposto, etc., o Estado afirma o seu
poder soberano perante os cidadãos, dando origem a uma relação cujas normas
reguladoras pertencem ao direito publico.
 Direito Privado – é constituído por normas que disciplinam as relações entre particulares
ou entre particulares e o Estado (despojado dos seus poderes de autoridade pública).
Por exemplo: Quando o Estado arrenda um prédio para nele instalar um serviço, age numa
posição jurídica igual à de um simples particular, sem qualquer poder soberano.
Talvez se possa dizer que a linha de fronteira que estabelece entre o direito público e o direito
privado passa pela seguinte distinção:
 As relações entre particulares pertencem sempre ao domínio do direito privado, enquanto
que as relações entre Estados integram sempre o direito público;
 As relações jurídicas em que apenas um dos sujeitos seja o Estado e a sua atuação seja
como ente sobrano, são de direito público;
 São de direito privado se o Estados age no exercício de uma personalidade privada igual à
de qualquer ente particular.
Este é o critério que maior unanimidade e menos críticas recebe, mostrando-se o mais adequado
atualmente.
O Direito Público
É caracterizado por estabelecer normas de organização do Estado e demais entidades públicas,
disciplinando o seu funcionamento e o seu estatuto.
Constituem ramos do Direito Público:
o Direito Constitucional: Baseia-se na Constituição, ocupando-se da organização do Estado,
dos órgãos de soberania e da repartição de poderes entre eles. Garante também os
direitos fundamentais dos cidadãos, regulando ao mesmo tempo a base do ordenamento
jurídico da comunidade;

o Direito Administrativo
O Direito Administrativo constitui como que a infraestrutura organizativa sobre que se apoia
todo o Direito Constitucional.
Pode definir-se como o sistema de normas jurídicas que regulam a organização e o
processo de agir da Administração Pública, quer a do Governo agindo no desempenho da
função executiva, quer a dos entes a ele subordinados diretamente, quer os órgãos e
agentes das autarquias regionais e locais.

o Direito Financeiro
O Estado para realizar os fins públicos, tem de fazer despesas e, para custear as
despesas, carece de obter receitas. A atividade de realização de despesas e obtenção de
receitas constitui a atividade do Estado.
Ao conjunto complexo de normas jurídicas que regulam a recolha, a gestão e a aplicação
dos recursos financeiros do Estado (normas disciplinadoras da ação financeira do Estado)
dá-se a designação de Direito Financeiro.

o Direito Fiscal
É o sistema de normas que disciplinam as relações de impostos, e definem os meios e
processos pelos quais se realizam os direitos emergentes destas relações. O Direito Fiscal
é constituído por normas de soberania fiscal, normas de incidência, normas de
lançamento, normas de liquidação e normas de cobrança;

o Direito Penal ou Criminal


A sociedade constitui-se sobre um núcleo de valores cujo respeito é necessário à sua
própria existência e desenvolvimento.
Por isso, torna-se imperativo a organização de formas particularmente eficazes de tutela
dos valores essenciais da vida comunitária, sujeitando aqueles que os violam a reações
jurídicas severas.
Para alcançar tal de desiderato, o Direito serve-se de duas categorias jurídicas
estreitamente correlacionadas: o crime e a pena.
Crime: Todo o comportamento que viola as regras de convivência social criminalmente
protegidas.
Pena: Reação jurídica que a lei liga à prática do crime. Só é aplicável a delinquentes
imputáveis. Aos imputáveis perigosos são aplicadas medidas de segurança.
Face a estes conceitos, podemos definir o Direito Penal como: conjunto de normas que
têm uma estrutura que, normalmente, faz corresponder uma situação (crime) e uma
sanção (pena)

o Direito Processual (civil, penal, administrativo, de trabalho, fiscal)


São ramos adjetivos, que se contrapõem aos respetivos ramos de direito substantivo. Ou
seja, não curam propriamente do Direito que confere direitos e obrigações
independentemente da intervenção jurídica, antes curam do modo como esta se deve
processar.
Referem-se, portanto, à proteção coativa, à tutela de tais direitos e obrigações; regulam as
ações e a sua tramitação, desde os seus pressupostos, requisitos, etc., até ao julgamento
final da causa.
No direito processual encontram-se positivados princípios fundamentais do Direito (como o
do contraditório, da audição das partes em confronto, de idoneidade probatória, etc.).
Muitas vezes as causas ganham-se ou perdem-se não por razões de fundo, de Direito,
mas por razoes de matéria processual, pormenores técnicos como por exemplo: Prazos,
provas e testemunhas.

o Direito Internacional Público


Regula as relações entre Estados e entre Estados e outros sujeitos da ordem jurídica
internacional, como a Santa Sé, a Ordem Soberana de Malta, Organizações Internacionais,
etc.
As fontes de um tal Direito são claramente supraestaduais. De acordo com o art. 38.º do
Estatuto do Tribunal Internacional de Justiça são fontes do direito internacional:
 As convenções internacionais;
 O costume internacional;
 Os princípios gerais de direito reconhecidos pelas nações civilizadas;
 As decisões judiciais e a doutrina dos juristas mais qualificados, como meio auxiliar
para a determinação das regras de direito.
Embora seja insuficiente o grau de institucionalização da comunidade internacional – não
dispõe de órgãos munidos de poderes legislativos, de poderes jurisdicionais obrigatórios e
de poderes de execução das sanções jurídicas – a verdade é que já ninguém hoje pode
negar o seu caráter jurídico e a sua subordinação ao Direito.
O Direito Privado
É o conjunto de normas reguladoras das relações entre particulares, e entre particulares e o
Estado, ou outros entes públicos desde que intervenham desprovidos de ius imperium.
Os ramos do Direito Privado são:
Direito Civil
 Conjunto de normas reguladoras das relações entre particulares que não se encontrem
sujeitas a outro ramo do direito em especial (Direito Comercial, Direito do Trabalho).
 É o ramo da ordem jurídica que primeiro se formou e é ainda hoje o mais profundamente
elaborado.
 O Código Civil em vigor, que substituiu o Código de Seabra (1867), divide o Direito Civil em
quatro grupos fundamentais de relações jurídicas:
o Livro I: Trata de questões gerais das leis, sua interpretação e aplicação, das
relações jurídicas – das pessoas singulares e pessoas coletivas, das coisas, dos
factos jurídicos e do exercício e tutela dos direitos.

o Livro II: Contém o ‘’Direito das Obrigações’’, ou seja, o complexo de normas que
fixam a disciplina do ‘’vínculo jurídico por virtude do qual uma pessoa fica adstrita
para com outra à realização de uma prestação’’ (art. 397.º CC); Direito dinâmico que
regula em particular a circulação de bens e serviços, as prestações (positivas ou
negativas – de dar, fazer ou não fazer), e a reparação dos danos (Responsabilidade
Civil). Tem como principal instituto o contrato, decorrente da instituição que é a
autonomia privada. Do art. 874.º ao art. 1250.º, o CC define vários tipos contratuais:
compra e venda, doação, sociedade, locação, comodato, mútuo, contrato de
trabalho.
o Livro III: ‘’Direito das Coisas’’ ou Direitos Reis; os direitos reais definem-se como
poderes diretos e imediatos sobre coisas certas e determinadas. São poderes que
garantem ao seu titular um certo domínio sobre o bem a que concernem. Estes
poderes têm eficácia real e absoluta, ou seja, permitem que o seu titular retire todas
ou algumas utilidades que de a coisa é suscetível, ficando todos os demais (não
titulares) obrigados à obrigação passiva universal, dever geral de abstenção, de não
perturbação do exercício de tal poder. Os direitos reias estão vinculados a um
numerus clausus (art. 1306.º CC), ou seja, só se poderão constituir com eficácia real
as figuras que a lei prevê – princípio da tipicidade dos direitos reais, ou seja, direito
de propriedade (arts. 1302.º e seguintes), usufruto (arts. 1439.º e seguintes), uso e
habitação (arts. 1484.º e seguintes), direito de superfície (arts. 1524.º e seguintes),
servidões prediais (arts. 1543.º e seguintes)

o Livro IV: Direito de família; debruça-se sobre as relações jurídicas constitutivas,


modificativas e extintas dos laços de família – desde o casamento, a filiação e a
adoção à separação de bens e ao divórcio, bem como as relações jurídicas
intrafamiliares (poder paternal, p/ exemplo)

o Livro V: É a disciplina que regula o chamamento de uma ou mais pessoas à


titularidade das relações jurídicas patrimoniais de uma pessoa falecida, o de cujus, e
a consequente devolução dos bens que a esta pertenciam; o regime de sucessão
pode ser organizado por um testamento, por um contrato ou pela lei, distinguindo-se
desta forma: sucessão testamentária, sucessão contratual e sucessão legal
(legitima – na falta de testamento; legitimatária – carater forçado).
Direito Comercial
 Ramo da ordem jurídica que se ocupa do comercio, ou seja, daquela atividade de
‘’mediação’’ lucrativa entre a produção e o consumo.
 É constituído por um conjunto de normas que regulam os atos objetiva e subjetivamente
comerciais.
 Presumem-se como atos comerciais:
o Atos que não sejam exclusivamente civis praticados por comerciantes;
o Atos, objetivamente regulados pela lei comercial, praticados por não comerciantes.
 No Direito Comercial estuda-se ainda, para além da qualificação como comerciais ou não
dos atos: sociedades comerciais, contratos comerciais, títulos comerciais, ect.
Direito do Trabalho
 Conjunto de normas jurídicas que visam regular as relações individuais e coletivas que têm
comum elemento unificante e desencadeante, o trabalho assalariado.
 O CC define o contrato de trabalho – art. 1152.º - como ‘’ aquele pelo qual uma pessoa se
obriga mediante retribuição, a prestar a sua atividade intelectual ou manual a outra pessoa,
sob autoridade ou direção desta’’.

As fontes do Direito
O problema das fontes de direito está naturalmente ligado à origem, aos processos de formação e
revelação das normas que compõem determinada ordem jurídica.
Segundo a Ordem Jurídica, o Direito pode ser visto num sentido mais lato ou num sentido mais
estreito. Segundo um sentido mais restrito ele é constituído pelos Sistemas de Regras e pelas
Situações Jurídicas.
Sistemas de regras: o ordenamento jurídico, ou seja, conjunto de normas que exprimem a Ordem
Jurídica e que regem uma dada comunidade num determinado momento histórico;
Situações jurídicas: as relações da Sociedade mais importantes para o Direito.
A Ordem Jurídica tem, como forma de ordenação da vida social, duas funções: função primaria e
função secundária.

Função Primária
A Ordem Jurídica funciona como princípio de ação da conduta do Homem na sociedade – surge
como fundamento normativo da conduta social, colocando os cidadãos uns perante os outros
num plano de igualdade jurídico-social, atribuindo-lhes poderes, prescrevendo-lhes deveres e
definindo-lhes responsabilidades, sendo a sanção a consequência imposta à violação das normas
jurídicas. Esta função traduz-se nas normas.
Função Secundária
A ordem jurídica estabelece as regras de organização da sociedade e das instituições sociais –
materializa-se através de instituições, determinando-lhes o estatuto funcional e organiza os
processos jurídicos de atação da função primaria. Nesta função, a ordem jurídica constitui o seu
próprio sistema ou ordenamento jurídico, garantindo a sua coerência pela instituição de órgãos
(tribunais) que impõem o cumprimento das sanções que aplicam pelo desrespeito das normas,
ainda que seja pelo uso da força.
A ordem jurídica exprime-se através das normas jurídicas que são um comando geral, abstrato e
coercível emanado por uma entidade superior.

Desta definição podemos retirar quatro características:


 Imperatividade: as normas jurídicas impõem determinadas condutas, ou direitos, através
de um comando ou uma estatuição;
 Generalidade: os seus preceitos dirigem-se a todos os membros da sociedade;
 Abstração: preveem condutas de um modo abstrato, ou seja, disciplinam um número
indeterminado de casos e de situações;
 Coercibilidade: pode-se recorrer ao uso da força para impedir ou reprimir a sua violação.
As normas jurídicas são estruturadas, ou seja, são construídas de acordo com 3 elementos:
previsão (de situações futuras, ou seja, a norma jurídica regula situações, casos que se prevê que
venham a acontecer), estatuição (a norma jurídica impõe uma conduta a adotar quando se
verifica a sua previsão), e sanção (dispõe de maios de coação pertencentes ao sistema
(ordenamento) jurídico para impor o seu cumprimento).
As fontes de direito são de facto a origem deste, ou seja, são os processos ou modos de criação
e revelação das normas jurídicas que disciplinam o homem nas suas relações sociais.
Os vários sentidos das fontes de direito são:
1. Sentido sociológico;
2. Sentido histórico;
3. Sentido político;
4. Sentido técnico-jurídico.
Sentido Sociológico
São fontes do Direito todos os circunstancialismos sociais que estiverem na origem de
determinada norma jurídica.
Exemplo: o aumento do parque automóvel nacional e a consequente multiplicação de acidentes
de viação deram origem ao Código de Estrada; a seca deu origem à tomada de medidas
compensatórias.

Sentido Histórico
São fontes de direito os diplomas, ou monumentos legislativos, os instrumentos que contêm
normas jurídicas; incluem-se todos os documentos desde a Lei das 12 Tábuas até às atuais
constituições.
Sentido Político
São fontes do direito os órgãos políticos que, em cada sociedade, estão incumbidos de emanar
ou aprovar normas jurídicas: a AR, o Governo, as Assembleias Regionais, Municipais e de
Freguesia.
Sentido Técnico-jurídico

As fontes de direito são os modos de formação e revelação das normas jurídicas; evidencia a
forma como é criada e se manifesta socialmente a norma jurídica. São considerados a lei, o
costume, a jurisprudência e a doutrina.
Saliente-se, no entanto, que alguns autores dizem que só a jurisprudência de conteúdo normativo
cria Direito e outros consideram que nem a jurisprudência nem a doutrina são criadoras de
Direito.
A posição destes últimos baseia-se numa distinção tradicional entre: fontes imediatas do Direito e
fontes mediatas do Direito.

Fontes imediatas
São as fontes que têm força vinculativa própria, pelo que são consideradas os verdadeiros modos
de produção de Direito. As fontes de direito imediatas são a lei e o costume, caso a lei o
determine.

Lei: norma jurídica proveniente de órgãos estaduais competentes, o Estado, e que se impõe a
todos os cidadãos.
Fontes mediatas
São aquelas que embora não tenham força vinculativa própria, são importantes pelo modo como
influenciam o processo de formação e revelação da norma jurídica. Ou seja, a doutrina,
jurisprudência e o costume.

Costume: fonte mediata de direito, que se forma espontaneamente em qualquer sociedade; para
se verificar a existência de costume, impõem-se duas condições cumulativas: corpus (pratica
constante – repetição de praticas sociais que podemos designar por usos sociais) e animus
(convicção da sua obrigatoriedade – é necessário que o uso constante seja acompanhado da
consciência da sua obrigatoriedade, ou seja, a pratica só leva à criação da norma quando as
pessoas se convencerem de que aquela pratica é algo vinculativo).
Jurisprudência: Orientação geral seguida pelos tribunais no julgamento dos casos concretos da
vida social, assim como as decisões por estes tomadas nos litígios que lhes são submetidos;
estas decisões chamar-se-ão sentenças se proferidas por um tribunal singular, ou acórdãos se
proferidas por um tribunal coletivo. Em Portugal, as decisões dos juízes não valem fora dos casos
específicos a que se reportam, o juiz tem de julgar unicamente de ‘’harmonia com a lei e a sua
consciência’’.
Doutrina: Compreende as opiniões e pareceres de jurisconsultos e outros especialistas do Direito;
consiste em artigos, monografias, etc.
Tratados Internacionais
Os tratados serão fontes de direito se uma ou mais das suas disposições previr a inserção de
normas jurídicas na ordem jurídica interna dos seus signatários. De acordo com a CRP, as
normas dos tratados, depois de aprovadas pela AR (ou Gov.), terão de ser ratificadas pelo PR e
publicadas em DR.
As normas emanadas dos órgãos competentes das organizações internacionais a que Portugal
pertence vigoram diretamente na ordem interna, desde que isso se encontre expressamente
previsto nos tratados.
As normas emanadas pela EU sob forma de regulamentos e diretivas, vigoram diretamente na
Ordem Jurídica interna portuguesa.

As fontes imediatas do Direito


A lei
A lei ocupa hoje um lugar privilegiado dentro das fontes de direito, de cujas modalidades é a mais
importante.
O valor é imediato e direto, valendo por si só e independentemente de qualquer outro fator,
contrapondo-se assim aos usos, aos assentos e à equidade (legalmente admitidos apenas como
sendo fontes mediatas do direito) cuja força vinculativa provém da lei, que define os termos e
limites da sua obrigatoriedade.

Art. 1.º do Código Civil


 Nº1: afirma expressamente que a lei é fonte imediata do direito;
 Nº2: considera leis ‘’todas as disposições genéricas provindas dos órgãos estaduais
competentes’’.
Esta noção de direito compreende:
 As normas jurídicas emanadas da AR (leis propriamente);
 As noras que procedem de outros órgãos estaduais com competência para as elaborar
(decretos-lei, decretos regulamentares, decretos, portarias, despachos normativos) ou das
autoridades locais, como por exemplo decretos das regiões autónomas e regulamentos
das autarquias locais.
Mas o que é a lei?
A palavra pode assumir diversos significados:
 Pode significar Ordenamento Juridico (art. 13.º, CRP);
 O ato normativo da AR (art. 18.º/2, CRP);
 Qualquer ato normativo (art.103.º/3 e 205.º/1, CRP).
Segundo Kelsen são 3 os pressupostos da lei: autoridade competente, observância das
formas previstas para essa atividade e introdução de um preceito genérico.
Podemos então distinguir lei em sentido formal e lei em sentido material.
Sentido formal: lei é todo o ato normativo emanado de um órgão com competência legislativa,
independentemente de conter ou não, uma verdadeira regra jurídica, exigindo-se que se revista
das formalidades relativas a essa competência.
Sentido material: considera-se todo o ato normativo, emanado de um órgão do Estado, mesmo
que não esteja no exercício de função legislativa, desde que contenha uma verdadeira regra
jurídica (não obedece aos formalismos solenes ou feita por um órgão sem capacidade legislativa)
Se no primeiro caso o que revela é o elemento formal do documento, ou seja, o modo como surge
no ordenamento jurídico; no segundo sentido vai—se atender à matéria/conteúdo contida no
diploma. Desta forma, há leia que só o são em sentido material, outras em sentido formal e
algumas que se revestem de ambos os sentidos.
Exemplo:
o Formal – lei da AR que concede uma condecoração a um PR;
o Material – portaria que aprove o regulamento dos Exames;
o Formal e Material – leis constitucionais, generalidade das leis ordinárias, etc.;

Podemos ainda distinguir lei em sentido amplo, sentido intermedio e em sentido restrito:
1. Lei em sentido amplo
Lei é toda a norma formalmente prescrita por um órgão estadual com poderes normativos
(ex.: decreto-lei, decreto regulamentar, portaria, etc.);
2. Lei numa aceção intermédia
Lei equivale à norma jurídica formalmente declarada por um órgão com poderes
legislativos e no exercício de tais poderes (ex.: leis da AR, decretos-lei do GOV, decretos
legislativos regionais das assembleias legislativas das regiões autónomas da Madeira e
doa Açores);
3. Lei em sentido restrito
O termo lei serve apenas para referir os diplomas legislativos elaborados pela AR.

É importante frisar:
 As leis não são todas da mesma espécie;
 As leis não têm todas o mesmo valor;
Há diferentes categorias de leis e cada categoria corresponde a um valor próprio.
Pelo que as diferentes leis, em vez de disporem num mesmo plano, estruturam-se numa
organização hierarquizada, com as leis mais importantes no topo e as leis de menor valor relativo
na base sendo que estas não podem contradizer, sob pena de ilegalidade, o que dispõem as leis
superiores.

A elaboração de uma lei


Cada órgão dotado de competência legislativa tem o seu modo próprio d agir na feitura das leis.
Salientemos a atividade legislativa da AR e do GOV.
As leis e os decretos-leis constituem a parte mais volumosa do corpo legislativo.
 A lei é elaborada pela AR, órgão legislativo por excelência, nos termos dos art. 161.º/c,
164.º e 165.º, CRP;
 Já os decretos-lei são criados pelo GOV, de acordo com o art. 198.º, CRP, relativo às suas
competências legislativas.
A lei e os decretos-lei são diplomas do mesmo valor podendo uma alterar ou revogar um decreto-
lei e vice-versa – estes diplomas têm igual dignidade hierárquica. Contudo, os art. 164.º e 165.º,
CRP, reservam à AR, ou seja, à lei, competência exclusiva sobre certas matérias, as quais não
poderão ser objeto de qualquer ato legislativo do GOV (art.164.º) ou só poderão ser regidas por
decreto-lei se a AR conferir ao GOV autorização legislativa (art.165.º).
Quando as matérias sobre as quais o Governo vai legislar não estão reservadas à AR, o GOV
entra em ‘’concorrência’’ com a AR: fala-se então competência legislativa concorrente (art.
198.º/1/a, da CPR).
Nos casos em que o GOV, no exercício das suas funções legislativas, trata de matérias de
competência relativa da AR, precisa de uma lei de autorização legislativa: fala-se então de
competência legislativa concorrente dependente (art. 198.º/1/b, CRP).
Por último, o Governo ainda pode fazer decretos-lei em matérias da sua exclusiva competência
(art. 198.º/2, CRP).

Processo de formação da lei


1. Iniciativa Legislativa (art. 167.º/1. CRP)
‘’A iniciativa da lei (…) compete aos deputados, aos grupos parlamentares e ao Governo, e
ainda, nos termos e condições estabelecimentos na lei, a grupos de cidadãos eleitores,
competindo a iniciativa de lei, no respeitante às regiões autónomas, às respetivas
assembleias legislativa regionais.’’
Assim: Quando a iniciativa cabe aos deputados, aos grupos parlamentares ou a grupos de
cidadãos eleitores (iniciativa parlamentar) – projeto de lei; se a iniciativa parte do GOV e
das assembleias legislativas regionais (iniciativa governativa ou regional) – proposta da lei;

2. Discussão e Aprovação (art.168.º e 170.º, CRP)


Após a entrega do projeto ou proposta de lei à AR, este é apresentado ao Plenário,
podendo os deputados apresentar propostas de alterações.
Quando admitidos, o projeto ou proposta de lei, são enviados a Comissões Permanentes
Especializadas, que deverão elaborar um parecer fundamentado sobre o mesmo.
A discussão no Plenário consiste em 3 passos:
a) Discussão e votação na generalidade – sobre os princípios de cada diploma
apresentado;

b) Discussão e votação na especialidade – sobre cada artigo, número e alínea.


É neste momento que é permitido aos deputados apresentar propostas de emenda
ao texto, sugerindo modificações, aditamentos, etc.
Através da votação na especialidade fixa-se o conteúdo do preceito, optando a AR
pelo texto original constante da emenda;
c) Votação final global
Concluída a votação na especialidade, o texto deverá ser de novo presente à AR
para a votação final global.
Além do processo legislativo ordinário, existe também o processo da urgência, onde se
pode dispensar o exame em comissão ou reduzir o respetivo prazo, limitar o número de
intervenções e uso da palavra pelos deputados e GOV e dispensar o envio à comissão
para redação final.

3. Promulgação, Referenda e Publicação (art. 136.º, 140.º e 119.º, CRP)


O diploma já aprovado, é remetido para a PR a fim de ser promulgado (art. 134.º/b, CRP);
Promulgação: o PR declara que o diploma passa a valer como lei e ordena o seu
cumprimento.
Poderá dizer-se que a promulgação é também um ato de participação efetiva do PR no
processo legislativo, podendo, nos termos do art. 136.º, CRP, proceder à apreciação do
mérito jurídico (eventual inconstitucionalidade) e político do diploma.
O PR, caso consideres que a medida legislativa é inconstitucional, pode exercer o poder
de veto, devendo então solicitar nova apreciação do diploma em mensagem
fundamentada. Se mesmo assim, a AR confirmar o seu voto por maioria absoluta, o PR
deverá promulgar um diploma num prazo de 8 dias.
Referenda: O PM, como representante do GOV, tem de referendar a promulgação do PR,
sob pena de inexistência jurídica da lei.
Publicação: Ato que consiste em levar a lei ao conhecimento geral dos indivíduos; recorre-
se ao Diário da República. O art. 119.º/2 dispõe que ‘’a falta de publicidade dos atos
previstos nas alíneas … implica a sua ineficácia jurídica’’.
O processo de elaboração dos decretos-lei corresponde ao mesmo figurino, com a só
diferença de a discussão e aprovação ter lugar no Conselho de Ministros (art. 198.º e
200.º/1/b, CRP).
Assinaturas sucessivas: O texto do diploma é submetido separadamente à assinatura do
PM e de cada um dos ministros competentes. Uma vez obtidas as assinaturas, o diploma é
presente ao PR para promulgação.
Aprovação em Conselho de Ministros: O texto do respetivo decreto-lei é apresentado e
aprovado em Conselho de Ministros, sendo depois enviado para promulgação para o PR.
Em caso de veto, o GOV pode: Arquivar, alterar, enviar para a AR sob a forma de proposta
de lei.

Inicio da vigência das leis


A publicação de uma lei é feita no DR, conforme o art. 119., CRP, marcando-se assim o momento
em que a lei se torna eficaz.
A falta de publicação de uma lei conduz à sua ineficácia jurídica, ou seja, a lei não produz efeitos
jurídicos. No entanto a lei não entra em vigor logo após a sua publicação.
Se as leis definem os comportamentos jurídicos a que os cidadãos estão vinculados, então é
imperativo, para que possam exercer cabalmente esta função rectora, que sejam levadas ao
conhecimento de todos aqueles a quem se dirigem, dando-lhes a saber o que juridicamente lhes
é exigido. Ninguém pode conformar a sua conduta a uma norma cujo conhecimento prévio lhe é
interdito.
Assim, para possibilitar aos destinatários da lei o conhecimento da sua existência e do seu
conteúdo difere.se o começo da vigência da lei para um momento posterior ao da sua publicação
no DR.
A lei só se torna obrigatória após o período de Vacario Legis: período em que o diploma legal,
embora já exista juridicamente, não tem qualquer efeito – art. 2.º/2 da lei nº74/98, de 11 de
Novembro: ‘’Na falta de fixação do dia, os diplomas entram em vigor em todo o território nacional
e no estrangeiro, no 5º dia após a publicação’’.
Este prazo só se aplica quando o legislador nada disser, pois pode acontecer que ele próprio
estabeleça em cada diploma a sua própria vacatio legis. Normalmente verificam-se duas
situações:
 Encurta-se o prazo, impondo-se a imediata entrada em vigor do diploma, quando esta é de
caráter urgente;
 Dilata-se o prazo de vacatio legis, por necessidade de adaptação e complexidade de
matéria.

Cessação da vigência das leis


Segundo o art. 7.º/1 do CC: ‘’Quando se não destine a ter vigência temporária, a lei só deixa de
vigorar se for revogada por outra lei’’.
São assim 2, os modos mais comuns de cessação da vigência das leis: a caducidade e a
revogação.
A caducidade de uma lei ocorre perante uma lei temporária. A própria lei determina a data em que
deixará de estar em vigor, ou a data em que entrará em vigor um novo diploma que a reveja. A
caducidade de uma lei poder-se-á verificar também quando uma lei serve para regular
determinada realidade que se altera. Nesta hipótese a lei deixa de ser sentido, caducando.
Esta caducidade da lei poderá ocorrer quando, por exemplo:
 Decorrer o prazo de vigência que a lei assinala;
 Cessar o estado das coisas (guerra, inundações, epidemias), que visava disciplinar (leis
transitórias);
 Desaparecer o objeto da sua regulamentação.

A revogação de uma lei pressupõe a entrada em vigor de uma nova lei que substitua a já
existente: as leis novas revogam as leis antigas.
Quanto à sua extensão a revogação pode ser total ou parcial:
 Total: a nova lei substitui totalmente a anterior;
 Parcial: a nova lei só altera alguns normativos da anterior.

Quanto à forma, a revogação pode ser expressa, tácita e de sistema:


 Expressa: a nova lei diz que a lei existente já está revogada;
 Tácita: quando resulta, não de uma declaração expressa e formal do legislador, mas da
incompatibilidade entre o disposto na lei antigo e o que a lei nova vem regular;
 De sistema: ocorre sempre que o legislador, através do novo ato legislativo, revela a
intenção de regulamentar total e esgotantemente determinada matéria jurídica.

O art. 7.º/2 refere-se precisamente a estas 3 formas de revogação: ‘’ a revogação pode resultar
de declaração expressa, da incompatibilidade entre as novas disposições e as regras
precedentes ou da circunstância de uma nova lei regular toda a matéria da lei anterior’’.
Importa ainda frisar aqui, os limites da revogação tácita – art. 7.º/3 do CC. A lei geral não revoga
a lei especial, exceto se for essa a intenção inequívoca do legislador; a contrário, a lei especial
posterior revoga a lei geral anterior, mas apenas no âmbito restrito da sua aplicação.
No mesmo art. 7.º/4, é definido que: ‘’a revogação da lei revogatória não importa o nascimento da
lei que esta revogara’’ – isso só acontecerá se o legislador o declarar expressamente através de
uma declaração repristinatória.

Hierarquia das leis


1. Constituição da República Portuguesa;
2. Convenções Internacionais;
3. Leis e decretos-lei;
4. Decretos-regionais;
5. Decretos-regulamentares;
6. Decretos Regulamentares Regionais
7. Resoluções do Conselho de Ministros
8. Portarias;
9. Despachos;
10. Posturas.

Regras:
 As leis de hierarquia inferior não podem contrariar as leis de hierarquia superior, tendo,
então, que se conformar com elas;
 As leis de hierarquia igual ou superior podem contrariar as leis de hierarquia igual ou
inferior;
 A lei mais recente revoga a lei mais antiga.
…, para estabelecer esta hierarquia há que distinguir leis/normas constitucionais de leis/normas
ordinárias.

Leis/normas constitucionais
O poder de estabelecer normas constitucionais denomina-se poder constituinte e ocupa o lugar
cimeiro do poder legislativo.
Constituição: Lei fundamental de um Estado; a qual fixa os grandes princípios fundamentais da
organização política e da ordem jurídica em geral.
Deste modo, as leis ou normas constitucionais são aquelas que estão incluídas na constituição e
que se encontram no topo hierárquico.

Leis/normas ordinárias
São todas as restantes leis/normas e podem agrupar-se em: leis/normas reforçadas ou
leis/normas comuns.
As leis/normas ordinárias reforçadas, como está expresso no art. 112.º/3 da CRP, ‘’têm valor
reforçado, alem das leis orgânicas, as leis que carecem de aprovação por maioria de 2/3, bem
como aquelas que, por favor da Constituição, sejam pressuposto normativo necessário de outras
leis ou que por outras devam ser respeitadas’’.
 Lei orgânica – art. 166.º/2 da CRP (remissão p/ art. 168.º/5 da CRP)
o Lei que regula o estado e capacidade da pessoa;
o Lei que regula os direitos, liberdades e garantias;
o Lei que regula o regime de punição das infrações disciplinares;
o Lei que regula as bases do sistema da segurança social e do serviço nacional de
saúde;
o …
 Leis que carecem de aprovação por maioria de 2/3 – art. 168.º/6 da CRP
o A lei que regula o exercício do direito de voto dos cidadãos portugueses residentes
no estrangeiro (art. 121.º/2 da CRP);
o A lei que regula as restrições ao exercício de direitos por militares e agentes
militarizados dos quadros permanentes em serviço efetivo, bem como por agentes
dos serviços e forças de segurança (art. 164.º/o))
 Leis que p/ força da Constituição, sejam pressuposto normativo necessário de outras leis
ou que por outras devam ser respeitadas:
o Leis estatutárias (aprovam e incorporam os estatutos das Regiões Autónomas) –
art. 161.º e 226.º da CRP;
o Leis de autorização (autorizam o Governo a legislar sobre matérias da competência
de reserva relativa da AR) – art. 112.º/2 e 165.º da CRP.

Estas encontram-se imediatamente abaixo das leis constitucionais. Estas provêm de órgãos com
competência legislativa como a AR (leis), o GOV (decretos-lei) e as ALR (decretos legislativos
regionais). As leis e decretos-lei têm o mesmo valor e a mesma força obrigatória.
As leis/normas ordinárias comuns estão subordinadas às leis ordinárias reforçadas e encontram
num nível hierárquico abaixo destas, é o caso dos decretos-regionais e dos decretos-
regulamentares.
É à AR que compete, por excelência, o primeiro papel legislativo e dela provêm as leis, moções e
resoluções, porém só as leis estabelecem verdadeiras regras jurídicas. Tem nomeadamente a
competência para elaborar alterações à Constituição, em matérias mais importantes possui
mesmo reserva absoluta para legislar e, sobre outras matérias (reserva relativa) pode autorizar o
GOV a fazê-lo.
O GOV para alem da competência legislativa própria tem competência regulamentar que exerce
fazendo os regulamentos necessários à boa execução das leis. Na verdade, tanto a lei como o
decreto-lei necessitam por vezes de ser ‘’especificados’’ devido à generalidade com que foram
elaborados.

Formas de regulamentos do GOV


 Decretos regulamentares: São diplomas emanados pelo GOV, promulgados pelo PR e
referendados pelo GOV;
 Resoluções do Conselho de Ministros: Provêm do Conselho de Ministros e não necessitam
de promulgação pelo PR;
 Portarias: São ordens do GOV dadas por um ou mais ministros e não carecem de
promulgação pelo PR.
 Despachos: São diplomas que têm apenas como destinatário os subordinados do ministro
ou ministros signatários e valem unicamente dentro do Ministério respetivo;
 Instruções: são meros regulamentos internos, contendo ordens dadas pelos ministros aos
respetivos funcionários, ou estabelecendo diretrizes para melhor aplicação dos diplomas
normativos.
 Circulares: É a designação dada às instruções quando estas são dirigidas a diversos
serviços.
 Decretos Regulamentares Regionais: São de âmbito regional (referentes às regiões
autónomas dos Açores e da Madeira)
 Posturas: Regulamentos emanados das autarquias locais, provindos dos corpos
administrativos competentes.

Síntese…
Hierarquia das Leis
1. CRP – fixa os grandes princípios da ordem política, social e económica e, estabelece
nomeadamente o regime jurídico de produção e modificação de normas jurídicas. por isso
se designa por lei primária. Juntamente com a CRP estão as leias constitucionais ou de
revisão;
2. Direito Internacional – de acordo com o art. 8.º da Constituição, as normas de direito
internacional são parte constituinte do direito português, desde que devidamente
aprovadas e ratificadas.
3. Atos normativos – as leis, os decretos-lei e os decretos legislativos regionais; as leis e os
decretos-lei, exceto as leis com valor reforçado (p/ exemplo as leis de autorização
legislativa), têm o mesmo valor, conforme o art. 112.º da CRP;
4. Atos de administração – regulamentos e atos administrativos, nomeadamente decretos
regulamentares, decretos regulamentares regionais, resoluções do conselho de ministros,
portarias, despachos, instruções, circulares e posturas locais.

Direito Internacional
Em linguagem corrente, por Direito Internacional entende-se Direito Publico. Contudo existe
também o direito internacional privado, regulador faz relações entre indivíduos pertencentes a
diferentes Ordens Jurídicas.
O direito internacional publico é o conjunto de regras e princípios decorrentes de um processo
que não é específico de um só Estado, mas que resulta da convergência de vários Estados, ou da
manifestação da vontade de outras entidades internacionais, como as Organizações
Internacionais.
Devido à inexistência de entidade que possa aplicar a coercibilidade, poderíamos não falar em
Direito Internacional, mas sim de Moral Internacional, baseada no princípio de Pact Sunt
Servanda.
De acordo com o art. 48.º do Estatuto do Tribunal Internacional de Justiça, as fontes mais
importantes do Direito Internacional são:
 O costume internacional, resultante de uma prática geral de procedimento uniforme e
constante, aceite como juridicamente obrigatória pelos membros da sociedade
internacional nas suas relações recíprocas;
 Convenções internacionais, que estabelecem normas expressamente reconhecidas pelos
Estados celebrantes;
 Atos de organizações internacionais, quer sejam decisões ou deliberações (conforme
provenham de órgão singular ou coletivo); quer sejam princípios gerais do direito
reconhecidos e aceites pelas chamadas ‘’nações civilizadas’’ e, cuja importância é decisiva
na regulamentação das relações internacionais;
 Os tratados.

Tratados
Os tratados são, de acordo com Charles Rousseau, acordos celebrados entre membros da
sociedade internacional que têm por objetivo a produção de efeitos de Direito, ou seja, um acordo
de vontades, em forma escrita, entre sujeitos de Direito Internacional, que resulta na produção de
efeitos jurídicos.
De acordo com a Constituição da República Portuguesa as normas pertencentes aos tratados
internacionais depois de aprovadas pela AR (art. 161.º/i) da CRP), ou pelo GOV (art. 197.º/1/c) da
CRP), ratificadas pelo PR (art. 135.º/b) da CRP) e publicadas no Diário da República (art.
119.º/1/b) da CRP), passam automaticamente a fazer parte do Direito português (art. 8.º/2 da
CRP).

O problema da eficácia do Direito Internacional


O direito interno possui um aparelho institucionalizado que utiliza quando necessário para impor a
norma. No que diz respeito ao Direito Internacional, a criação de um sistema geral de sanções por
parte do ordenamento internacional está ainda longe de acontecer.
As disputas entre os Estados raras vezes são levadas a Tribunal Internacional. Com efeito, o
Direito Internacional possui sanções, mas a sua eficácia é bastante precária. Podemos afirmar
que a aceitação voluntária por parte dos Estados de normas de Direito Internacional constitui
frequentemente o modo mais eficaz de dirimir os conflitos sem recurso ao uso da força.
O Direito Comparado assume assim grande importância, pois confronta as várias Ordens
Jurídicas, fazendo ressaltar as suas analogias e as suas diferenças. Este permite ao legislador
interno obter determinados pontos de referência, que lhe poderão ser úteis quando tenha de
legislar sobre certas matérias iguais ou análogas.
A verdade é que hoje muitas das normas em vigor na Ordem Jurídica têm uma origem em atos
internacionais. O art. 8.º da CRP faz referência a estas normas: Da ultima parte do n.º2,
claramente se infere que os preceitos de origem internacional ocupam, dentro da hierarquia das
leias, um lugar logo a seguir ao das normas constitucionais.

Direito comunitário
Ao conjunto de normas que regulam a constituição e funcionamento das Comunidades Europeias,
chama-se Direito Comunitário.
Para que se possa compreender este tipo de Direito é necessário distinguir duas noções: Direito
comunitário originário e direito comunitário derivado.

Direito comunitário originário


Constituído pelo conjunto de normas que estão na origem ou integram os tratados constitutivos
das Comunidades Europeias e, por todas as outras que alteram ou complementaram os tratados
originários.
São estes os tratados constitutivos das Comunidades Europeias, tratados relativos ao
alargamento da Comunidade Europeia, o Ato Único Europeu, o tratado de Maastricht, o Tratado
de Amesterdão e o tratado de Nice.

Direito comunitário derivado


Constituído pelas normas diretamente criadas pelas instituições comunitárias com competência
para tal, tendo em vista a execução dos tratados comunitários. Este tem de estar de acordo com
o direito originário.
Normas:
 Regulamentos: Contêm normas ferais e abstratas aplicáveis a uma generalidade de
pessoas e bens.
o São compulsivos na sua totalidade, pois nenhum Estado pode obstar à sua
execução, nem os aplicar de forma incompleta ou restritiva;
o Gozam de aplicabilidade direta, ou seja, entram diretamente em vigor na Ordem
Jurídica Interna nacional.
 Diretivas: Contêm instruções das instituições comunitárias aos Estados-membros e são um
meio de harmonização da Ordem jurídica comunitárias com a dos Estados, pretendendo-
se atingir objetivos comuns.
o São vinculativas nos EM a que se destinam, mas só no que diz respeito ao objetivo
a alcançar, deixando a forma e os métodos para o atingir ao discernimento das
autoridades nacionais;
o Para que vigorem num Estado é necessário que sejam transpostas para o Direito
Nacional.
 Decisões: São tomadas pelo Conselho ou pela Comissão, podem destinar-se a uma
empresa, a um governo ou a um individuo e são vinculativas para os EM.
 Pareceres e Recomendações: São tomadas pelas instituições da União Europeia, mas não
são vinculativos; apenas traduzem o ponto de vista da instituição que os emite.

Aplicação das normas comunitárias

Princípio do primado do Direito Comunitário sobre o Direito Interno


Em caso de conflito entre normas, aplica-se a norma comunitária. Mas qualquer disposição do
Direito derivado que contrarie princípios contidos na Constituição de algum dos EM pode ser
declarada inválida pelo tribunal competente do país em questão.

Princípio da Aplicabilidade Direta


A norma comunitária entra diretamente em vigor na ordem jurídica nacional.

Princípio do Efeito Direto


Os particulares têm a possibilidade de invocar, no órgão competente, uma norma de Direito
Comunitário, para afastar uma norma de Direito Nacional.

Instituições e órgão da União Europeia


Atualmente, as instituições comunitárias são as seguintes:

 Comissão
Constituída por 20 comissários, é considerada a guardiã dos Tratados Comunitários e
detentora do direito exclusivo e fazer propostas de legislação (direito de iniciativa). É
também a instância executiva das políticas comuns, ainda que em articulação com as
administrações nacionais. O mandato da Comissão é de 5 anos.

 Conselho da União Europeia


É o órgão de decisão e é composto por um ministro do GOV de cada EM, tendo em conta
a matéria em questão.
Compete ao Conselho da União Europeia elaborar legislação da União Europeia elaborar
legislação da União, estabelecer os seus objetivos políticos, coordenar as suas políticas
nacionais e elaborar os compromissos entre os diferentes interesses nacionais.

 Conselho Europeu
É constituído pelos chefes de Estado e de GOV dos EM, bem como pelo Presidente da
Comissão Europeia. Nele se debatem e definem as principais linhas de orientação política
e se abordam as questões da atualidade internacional. É o grande agente de impulso da
integração europeia. A Presidência da EU é exercida rotativamente por todos os EM,
sendo o mandato de seis meses.

 Parlamento Europeu
É o órgão de representação dos cidadãos europeus, fruto da vivência democrática de
todos os EM, é composto por 626 deputados (eleitos de 5 em 5 anos por sufrágio universal
e direto pelos cidadãos de toda a comunidade). É um órgão comunitário essencialmente
consultivo, cabendo-lhe pronunciar-se sobre a maioria das propostas submetidas ao
conselho. Aprova ainda o Orçamento da Comunidade e exerce um controlo político que
pode ir até à censura da Comissão.
Desempenha um papel essencial no processo de elaboração, modificação e adoção da
legislatura europeia e formula propostas de natureza política para o reforço da EU.
Incumbe-lhe, no âmbito das novas competências:
o Aprovar a composição da Comissão da UE;
o Aprovar os acordos internacionais mais importantes, que tenham consequências
para a situação financeira e para a legislação da Comunidade.

 Tribunal de Justiça
Assegura o respeito pela legislação comunitária. Resolve os litígios entre os EM e as
instituições comunitárias, bem como os litígios entre as entidades privadas e as instituições
comunitárias. Assegura o respeito pela unidade de interpretação do Direito Comunitário.

 Tribunal de Contas
A sua principal atividade é a do controlo do orçamento comunitário. Examina as contas de
todos os órgãos comunitários e consubstancia a sua atuação no relatório anual que é
publicado no Jornal Oficial das Comunidades. Adquiriu com o Tratado da UE o estatuto de
instituição comunitária. Assume uma maior importância no quadro da assistência que é
chamado a prestar ao Parlamento Europeu e ao Conselho no controlo da execução do
orçamento comunitário.

 Comité Económico e Social


É o órgão consultivo por excelência de todos os órgãos comunitários. Assiste a Comissão
e o Conselho na elaboração da legislação comunitária.

 Comité das Regiões


Foi criado como órgão consultivo pelo Tratado da União Europeia e surge como um
importante guardião do princípio da subsidiariedade.
 O.B.E.I.
Foi criado pelo Tratado de Roma para apoiar o desenvolvimento harmonioso da
Comunidade. É composto por um conselho de Administração e um Conselho Executivo,
fazendo parte do primeiro um ministro de cada EM, nomeadamente o Ministro das
Finanças. É, ao mesmo tempo, uma instituição comunitária e um Banco, isto é, contrai
empréstimos nos mercados internacionais e concede-os com fim de desenvolver o todo
comunitário.

Interpretação da lei
A interpretação das normas é um pressuposto indispensável da sua aplicação, sendo sempre
necessária e constitui uma das tarefas mais importantes do jurista. Logo, é preciso saber
interpretar as disposições legais reguladoras da atividade social.
Consiste na determinação ou fixação do exato sentido com que a lei deve ser aplicada.
Toda a norma, por mais clara que aparente ser – ao contrário do suposto na máxima ‘’ubi claris
non fit interpretatio’’ – requer sempre algum trabalho de interpretação, mesmo que instantâneo,
pois esta só poderá ser entendida através da interpretação das frases e palavras por que se
expressa.
A interpretação permite determinar ou fixar o exato sentido ou alcance com que a norma deve
valer.
Existem vários fatores que contribuem para que a interpretação seja uma necessidade: o texto
pode comportar múltiplos sentidos (termos ambíguos ou obscuros), conceitos de difícil
determinação e pela generalidade das leis (indefinidos casos e generalidade de indivíduos).
Esse conjunto de critérios ou princípios gerais orientadores da atividade interpretativa e que
garantem um mínimo razoável de uniformidade de soluções e a indispensável segurança jurídica,
constituem o que pode chamar-se de metodologia da interpretação ou hermenêutica jurídica.

As formas de interpretação poderão ser:


 Interpretação autêntica;
 Interpretação oficial;
 Interpretação doutrinal.

Interpretação autêntica
Operação realizada pelo próprio órgão legislador, mediante uma lei de valor igual ou superior à lei
interpretada: são as denominadas leis interpretativas (têm a força vinculativa própria da lei).
Tratava-se de uma lei interpretativa que fixa o sentido decisivo da lei.
Exemplo: Quando a AR interpreta por meio de uma nova lei (lei interpretativa) disposições
normativas de uma lei anterior, a interpretação que faz é autêntica. Esta interpretação é dotada
de força vinculante geral.

Interpretação Oficial
Operação levada a cabo através de uma norma de valor hierárquico inferior ao da norma
interpretada.
Exemplo: O ministro que por despacho fixa o sentido de normas constantes de um decreto-lei
procede a uma interpretação oficial. Neste caso a interpretação só é obrigatória para os serviços
dependentes do Ministro respetivo.

Interpretação doutrinal
Operação efetuada por jurisconsultos ou outras pessoas dedicadas ao estudo do Direito, na
decisão ou apreciação de casos concretos.
Nesta hipótese a interpretação não tem força vinculativa própria, possui apenas uma força que
resulta do ‘’poder de persuasão’’ dos argumentos em que se funda (tantum valet, quantum
probat).

Interpretação Judicial
Interpretação realizada pelos tribunais no âmbito de um processo judicial, não tendo qualquer
valor vinculativo fora deste.

Elementos de interpretação
Fatores ou instrumentos que o intérprete deve utilizar para fixar o sentido da lei.
Estes elementos aparecem vulgarmente agrupados em duas categorias: elemento gramatical e
elemento lógico.

Elemento gramatical
Este elemento tem como função excluir os sentidos da lei que não tenham qualquer apoio ou
correspondência nas suas palavras, e surgir perante normas que comportam mais do que um
sentido, aquele que mais corretamente se encaixa na sua letra.
A letra da lei representa o ponto de partida da interpretação, assim como o seu elemento base.
Este elemento consiste assim na utilização das palavras da lei, isoladamente e no seu contexto
sintático, para determinar o seu sentido possível.
Todavia, é necessário recorrer a outros elementos, devido às dificuldades que o texto legislativo
frequentemente comporta e que dificultam a determinação do seu sentido e alcance (expressos
anteriormente).
Por isto, é indispensável considerar o ‘’espírito da lei’’, porque apreender o sentido das leis não é
só conhecer as suas palavras, mas também penetrar na sua força e poder – ‘’scire leges non hoc
est verba earum tenere, sed vim ac potestem’’.

Elemento lógico
Consiste no ‘’espírito da lei’’, isto é, no seu sentido mais profundo.
Subdivide-se em 3 outros elementos:

 Elemento histórico
Este elemento compreende todos os dados ou acontecimentos históricos que explicam a
criação da lei. São estes:
o Precedentes normativos: constituídos pelas normas que vigoram em períodos
anteriores e que são objetos da história do Direito, como pelas normas de Direito
estrangeiro que tiveram influência na formação da lei.
o Trabalhos preparatórios: são os estudos prévios, os anteprojetos e projetos de lei,
as respostas a críticas feitas aos projetos, as atas das comissões encarregadas da
elaboração do projeto ou da sua discussão, que precedem a lei e documentam o
processo da sua elaboração.
o Occasio Legis: todo o conjunto de circunstâncias (políticas, sociais, económicas,
morais, etc.) que envolveram e influenciaram o aparecimento da lei – as
circunstâncias em que a lei foi elaborada.

 Elemento sistemático
Quando se recorre a este elemento, o intérprete deve situar a norma a interpretar no
ordenamento jurídico, atendendo ao espírito e unidade que lhe são próprios, e ponderar as
relações que essa norma tem com as restantes normas.
Assim, considera-se aquilo que se chama o contexto da lei (ponderam-se as relações que
a norma a interpretar tem com o conjunto de disposições a que ela pertence e que regulam
a mesma matéria ou instituto), e os lugares paralelos (consideram-se as relações que a
norma a interpretar tem com outras disposições legais que, embora distanciadas, regulam
problemas normativos paralelos ou afins).

 Elemento teleológico
Consiste na razão de se da lei, no fim ou objetivo que o legislador teve em vista ao
elaborar a norma (ratio legis), devendo ser acompanhada do conhecimento das
circunstâncias ou condições históricas em que ela foi elaborada (occasio legis).
De facto, é a interpretação teológica que nos revela que com a providencia legislativa se
quiseram acautelar, qual a sua importância relativa, que interesses se sacrificaram, numa
palavra, se apreende a racionalidade intrínseca da lei.

A existência de uma crise laboral ou habitacional, a constatação de abusos, são circunstâncias


que, se situadas na origem da publicação da lei, podem tomar uma importância decisiva no
processo da sua interpretação.

Resultados da interpretação
Concluída a tarefa interpretativa, encontrar-se-á normalmente o intérprete perante um sentido da
lei que tem por decisivo. É com esse sentido que a lei, na sua opinião, deverá valer.
Mas qual a correspondência do sentido eleito à letra da lei? A utilização do elemento logico estará
conforme/ajustado à expressão textual da lei?
É a propósito desta questão que a doutrina costuma distinguir, dentro dos resultados da
interpretação, as seguintes modalidades:
 Interpretação declarativa;
 Interpretação extensiva;
 Interpretação restritiva;
 Interpretação enunciativa;
 Interpretação revogatória.

Interpretação declarativa
Elege-se um dos sentidos que o texto direta e claramente comporta, por ser esse o que
corresponde ao pensamento legislativo. Entende-se que a letra da lei coincide com o espírito da
lei.
Diz-se que há interpretação declarativa quando o sentido que o intérprete fixou à norma coincide
com o significado literal ou um dos significados literais que o texto comporta, por ser o que
corresponde ao pensamento legislativo.
A interpretação declarativa pode ser lata ou restritiva, consoante o sentido mais amplo ou restrito
dado a algumas palavras que têm mais do que um significado. Porém, em ambos os casos se
trata de sentidos que cabem dentro do texto e não ultrapassa o significado gramatical do
termo/expressão empregue.
EXEMPLO: Art.1.º do CC de 1867 determinava que ‘’só o homem é suscetível de direitos e
obrigações’’. A palavra ‘’homem’’ pode ser interpretada num sentido mais lato – ser humano
(homem, mulher, crianças) – ou num sentido mais restritivo – ser humano do sexo masculino.

Interpretação extensiva
Entende-se que a letra da lei fica aquém do seu espírito, pelo que se torna necessário distender a
letra da lei para captar o seu espírito, para captar o sentido com que a lei deve efetivamente valer
(o legislador disse menos do que queria).
Haverá lugar à interpretação extensiva sempre que o legislador aludiu à espécie quando, na
realidade, queria referir-se ao género; quando fala em filhos com o sentido de descendente; ou
dala na venda com o significado de alienação. Em todos estes casos, a fixação do sentido
verdadeiro da lei obriga a uma compreensão alargada das suas palavras, portanto, à
interpretação extensiva do seu texto.
Quando a letra do texto fica aquém do espírito da lei (a fórmula adotada diz menos do que se
pretendia dizer), o intérprete alarga ou estende o texto, dando-lhe um alcance conforme ao
pensamento legislativo e faz corresponder a ‘’letra’’ ao ‘’espírito’’ da lei.
Não se trata de uma lacuna da lei, pois os casos não diretamente abrangidos pela ‘’letra’’ são
inequivocamente abrangidos pelo ‘’espirito’’ da lei.
A interpretação extensiva assume normalmente a forma de ‘’extensão teleológica’’: quando a
própria ‘’ratio legis’’ postula a aplicação a casos que não são diretamente abrangidos pela letra da
lei, mas são abrangidos pela finalidade da mesma.

Interpretação restritiva
Quando o intérprete conclui que o legislador adotou um texto que atraiçoa o seu pensamento, na
medida em que se diz mais do que o que se pretendia dizer – significação das palavras é mais
ampla do que aquilo que ele pretendia.
EXEMPLO: Quando o legislador menciona os descendentes com o sentido de filhos, ou se refere
a filhos querendo apenas abranger os filhos do casamento, ou quando refere genericamente o
homem para abranger apenas os homens casados. Em todas estas situações, o intérprete deve
então restringir o texto, isto é, encurtar o significado das palavras utilizadas pela lei, de modo a
harmonizá-las com o pensamento legislativo.

Art. 9.º do CC
Os três fatores mais importantes a ter em conta para uma boa interpretação:
 Unidade do sistema jurídico;
 Circunstâncias em que a lei foi elaborada;
 Condições especificas do tempo em que é aplicada.

Integração da lei
Todas as situações carecidas de regulamentação jurídica exigem uma resposta de Direito. A
ordem jurídica deve assegurar que toda a situação capaz de pôr um problema ao Direito receba
dele uma adequada solução.
Não obstante o ordenamento jurídico nacional ser constituído por um vasto conjunto de leis, a
verdade é que nunca estas conseguem abranger e contemplar diretamente todas as situações da
vida social que necessitam da disciplina jurídica.
Com efeito, a vida real é bem mais rica e variada em hipóteses do que a imaginação do legislador
em prevê-las, dando por vezes origem a situações da vida social que eram imprevisíveis no
momento da elaboração da lei, ou que, embora previsíveis, escaparam, contudo, à efetiva
previsão do legislador.
Assim, existe uma lacuna quando uma determinada situação, merecedora de tutela jurídica, não
se encontra prevista na lei. Perante estas situações deverá procurar-se a integração de lacunas
(encontrar uma solução jurídica para os casos omissos). Deverá averiguar-se primeiramente que
não há nenhuma regra aplicável, que o caso não está especificamente regulado.

Razões que estão na origem do problema das lacunas:


 Situações nova que o legislador não consegue prever;
 Situações demasiado complexas ou ‘’recentes’’ que levam o legislador a não legislar.
Problema
A questão fundamental que as lacunas suscitam é a do seu procedimento.
Colocado o intérprete, designadamente o julgador, perante uma situação real não regulada por
qualquer norma jurídica, isto é, em face de uma lacuna da lei, como deverá proceder?
Poderíamos à primeira vista pensar que o facto de determinada situação não ser regulada por lei
alguma, significaria a sua irrelevância para o Direito, constituindo um caso extrajurídico.
Todavia, esta posição é excluída pelo art. 8.º do CC.

Princípio da proibição da denegação da justiça


Os juízes não podem abster-se de julgar com fundamento na falta, obscuridade ou ambiguidade
da lei.
É de notar que o Tribunal só é obrigado a julgar quando o caso submetido à sua apreciação deva
ser juridicamente regulado, isto é, mereça a tutela jurídica. Seria na verdade inadmissível que os
tribunais tivessem de decidir situações que se devem considerar antes no seu âmbito da cortesia
ou das convenções sociais.
EXEMPLO: Se um individuo viesse a exigir a tribunal que um seu conhecido fosse condenado a
cumprimentá-lo, quando com ele se cruzasse na rua.

Em presença, portanto, de um caso omisso (casos não regulados, mas merecedores da tutela
jurídica), e dado o disposto no art. 8.º do CC, deve o julgador integrar a lacuna da lei atendendo
ao art. 10.º do CC, que estabelece:

1. ‘’Os casos que a lei não preveja são regulados segundo uma norma aplicável aos casos
análogos.’’
2. ‘’Há analogia sempre que no caso omisso procedam as razoes justificativas da
regulamentação do acaso previsto na lei.’’
3. ‘’Na falta de um caso análogo, a situação é resolvida, segundo a norma que o próprio
intérprete criaria, se houvesse de legislar dentro do espírito do sistema.’’

De acordo com este preceito a primeira tarefa do intérprete consiste no recurso à analogia,
aplicando ao caso omisso a norma reguladora de um caso semelhante. É necessário que exista
um cado análogo regulado por lei. Não basta, porém, encontrar vagas semelhantes entre o caso
omisso e o regulado para fundamentar o recurso à analogia, antes se torna necessário, que as
razoes justificativas do regime fixado para a situação legalmente prevista se mostrem validas e
adequadas para a questão não prevista.
Dada esta identidade de interesses, o princípio da igualdade de tratamento (casos semelhantes
devem ter um tratamento semelhante) impõe a aplicação ao caso omisso da norma que rege o
caso análogo. No entanto, o procedimento analógico só estará legitimado depois de se ter
cuidadosamente comprovado que os interesses são análogos e que é, em ambos os casos, a
mesma a razão de decidir.

Regra geral
 Sempre que possível deve-se fazer recurso à analogia com uma norma existente no
sistema;
 Na falta de norma que regule um caso análogo, haverá que proceder nos termos do art.
10.º/3 do CC, para efeitos de elaboração de uma norma ‘’ad hoc’’.

Analogia
Analogia consiste em aplicar ao caso omisso a norma reguladora de qualquer caso análogo.
A aplicação analógica distingue-se da interpretação extensiva, porque enquanto a primeira leva a
uma aplicação da lei a situações não abrangidas nem na letra nem no seu espírito, o segundo
pressupõe uma situação que não está compreendida na letra da lei, mas está no seu espírito.
Podemos referir dois tipos de analogia:
 Analogia legis: a analogia que se faz por recurso a uma norma vigente;
 Analogia iuris: tem lugar quando a lacuna é preenchida por princípios jurídicos assentes
em várias normas ou pela aplicação de princípios jurídicos gerais (boa fé, proibição do
abuso do direito, etc.)

Recurso à análoga porquê?


Justifica-se por uma razão de coerência normativa e de respeito pelo princípio da igualdade de
tratamento, e razão de certeza do Direito (valores da certeza e segurança jurídica).

Proibições do uso da analogia


Não se aplica a analogia quanto às:

 Normas excecionais – art. 11.º do CC


As normas excecionais não comportam aplicação analógica, mas admitem a interpretação
extensiva. Significa esta disposição que se excluem da aplicação analógica as regras que
contrariam princípios fundamentais informadores da Ordem Jurídica ou de um ramo do
Direito em particular, só se podendo utilizar a interpretação extensiva.
A aplicação analógica da lei distingue-se da interpretação extensiva, visto a primeira
conduzir à aplicação de uma lei a casos que ela não contempla nem na letra nem no
espírito, ao passo que a segunda se limita a aplicar a lei a situações deficientemente
abrangidas pela sua letra, mas compreendidas no seu espírito, em virtude do legislador, ao
elaborar a norma, ter dito menos do que pretendia.
Razão de ser desta restrição: A proibição decorre do pressuposto de que, se o caso não
cabe nem na letra nem no espírito da norma, é porque pertence ao domínio de
regulamentação do princípio (norma geral) de que ela, a norma excecional, justamente
constitui uma exceção.

 Normas penais incriminadoras (relação com o princípio da legalidade, art. 1.º do CP)
‘’Só se pode punir atos que já sejam crimes à data da sua prática’’ – princípio da não
retroatividade da lei: não é permitido a analogia para qualificar o facto como crime, definir
um estado de perigosidade ou determinar a pena/medida de segurança que lhe
corresponde.
Para além da analogia é também proibido o recurso à interpretação extensiva. Tal facto
deve-se à salvaguarda da liberdade individual contra abusos de poder.
Razão de ser da restrição: Trata-se de defender o cidadão do poder punitivo do Estado,
dando ao princípio da legalidade o seu justo alcance.

 Normas de direito fiscal


Não é permitida a analogia em relação `s normas de incidência e às que definem as
garantias dos contribuintes.
Não é possível a analogia por respeito ao princípio da legalidade.
Art. 103.º/3 da CRP: ‘’Ninguém pode ser obrigado a pagar impostos que não tenham sido
criados nos termos da constituição, que tenha natureza retroativa ou cuja liquidação e
cobrança não se façam nos termos da lei.’’

Criação de uma norma ad hoc pelo julgador


Na falta de caso análogo, regulado por lei, o legislador tem que elaborar e formular uma norma
‘’ad hoc’’ (uma norma cuja validade está circunscrita à resolução do caso omisso) que contemple
o tipo de casos em que se integra o caso omisso, dentro do espírito do sistema (art. 10.º/3 do
CC), capaz de fazer o sistema concluso na direção do caso concreto em função das
particularidades da situação em análise. Verificando-se uma lacuna da lei, e na falta de caso
análogo, deve o intérprete criar a norma que, sem violar os princípios fundamentais do
ordenamento jurídico estabelecido, julgue melhor e de forma mais razoável para o tipo de casos
em que a situação omissa se integra, aplicando-se seguidamente ao caso concreto.
Porém isto não significa que seja legitimo ao julgador o recurso à equidade, à justiça do caso
concreto, tendo em vista as particularidades da situação omissa e disciplinando-a atendendo
predominantemente a essas mesmas particularidades. Isto é, o jugador não poderá fundamentar
a sua decisão na livre apreciação das circunstâncias do caso decidido, resolvendo-o do modo que
pessoalmente considerar mais justo ou conveniente.
Pelo contrário, terá antes de isolar, dentro do caso decidido, aqueles elementos que são
tipicamente dotados de relevância jurídica, criando para eles a norma que o legislador, na
hipótese de haver previsto a situação lacunosa, muito provavelmente determinaria. Deve, pois,
elaborar (idealmente) a norma mais adequada não para o caso omisso em si mesmo, mas para o
género de casos em que ele se integra, completando assim ‘’o sistema legal onde se mostra que
o legislador o deixou por acabar’’.
Vai depois o julgador atuar com a ‘’ideia de ter de manter.se o estilo do sistema, a sua traça geral,
a sua fisionomia típica’’.
A norma que o juiz cria será dotada, apena, de validade singular, vinculando apenas o caso
omisso, sem que de modo algum adquira força decisória para futuros casos do mesmo tipo ou
para outros julgadores.

Classificação das Normas Jurídicas


Tendo em conta a diversidade de normas jurídicas, impõe-se construir categorias de normas que
permitam ordená-las e melhor revelar a sua natureza.

Normas imperativas, permissivas e supletivas


Critério: Atende-se nesta classificação ao modo como a norma jurídica atua sobre a vontade dos
seus destinatários.

Normas imperativas
Definem condutas imperativas aos seus destinatários, isto é, aqueles que se encontram na
situação nelas prevista.
Assim é imperativa a norma que impõe aos indivíduos de certa idade o seu cumprimento de
serviço militar.
Ora a conduta imposta pode ser positiva ou negativa: pode consistir numa ação ou omissão. Daí
a divisão das normas imperativas em precetivas e proibitivas.

 Precetivas: As normas que impõem uma conduta ou comportamento positivo.


Exemplos:
o A norma que manda pagar a contribuição predial;
o A norma que manda reduzir a escrito a escritura publica os arrendamentos para o
comercio, indústria ou profissão liberal;
o A norma que manda para a renda ao senhorio;
o A norma que manda prestar alimentos aos filhos.

 Proibitivas: As normas que impõem um comportamento negativo.


Exemplo:
o As normas que proíbem a prática de crimes;
o A norma que proíbe os pais e avós a venderem a filhos ou netos não consentirem
com a venda (art. 877.º do CC).

Normas permissivas (ou facultativas)


São aquelas que, regulamento embora certas situações, não se impõem obrigatoriamente,
limitando-se a conceder certas faculdades ou contendo um comando que os particulares podem
livremente.
Umas vezes essas faculdades concernem à prática de atos materiais (do CC – art. 1353.º: direito
de demarcação; 1356.º: direito de tapagem; art.1356.º: perecimento natural de árvores e
arbustos) e outras vezes, ao exercício de atividades jurídicas (art. 405.º do CC: ‘’as partes têm a
faculdade de fixar livremente o conteúdo dos contratos).
Estas comportam ainda uma subclassificação, pelo que se torna necessário distinguir entre:
normas dispositivas, normas supletivas e normas interpretativas.

 Normas dispositivas: São as que se limitam a conceder certos poderes ou faculdades,


deixando ao arbítrio do individuo praticar ou não praticar certos atos
Exemplos:
o Art. 950.º do CC – permite receber doações a todos os que não estejam inibidos de
as aceitar por disposição da lei;
o Art. 1698.º do CC – permite fixar o regime de bens do casamento em convenção
antenupcial;
o Art. 2188.º - permite fazer o testamento a todos os indivíduos que a lei não declare
incapazes de o fazer.

 Normas supletivas: Têm por finalidade suprir a falta ou insuficiência de manifestação da


vontade das partes, relativamente a certos assuntos que necessitam da disciplina jurídica.
Estas normas procuram assim interpretar a vontade hipotética ou presumível das partes,
mas só se aplicam se os particulares não adotarem uma solução diferente. O legislador
aproveita o silencio das partes para impor as soluções jurídicas ‘’ideais’’.
Estas normas encontram o seu âmbito de eleição no campo do direito dos contratos
(relação com o princípio da liberdade contratual – ver art. 405.º do CC).
Exemplos:
o Art. 772.º/1 do CC – respeitante ao lugar onde deve ser cumprida a obrigação,
estabelece que ‘’na falta de estipulação ou disposição especial da lei, a prestação
deve ser efetuada no lugar do domicílio do devedor’’;
o Art. 878.º do CC – relativo à compra e venda, dispõe que ‘’na falta de convenção em
contrário, as despesas do contrato e outras acessórias ficam a cargo do
comprador’’.
Como facilmente se verifica, qualquer destas disposições pode ser afastada pela vontade
dos interessados, na medida em que só serão aplicáveis se estes não c
convencionarem, oportunamente, regime diverso.

 Normas interpretativas: Normas que visam aclarar outras normas ou fixar o sentido de
determinadas expressões pouco claras usadas pelo legislador, ou pelos particulares nos
negócios jurídicos.
Exemplo:
o Art. 204.º e 205.º do CC (caracterizam coisas imoveis e coisas móveis).
o Art. 874.º, 940.º e 980.º do CC (fixam os termos em que as expressões ‘’compra e
venda’’, ‘’doação’’ e ‘’sociedade’’ devem ser entendidas quando utilizadas na
linguagem legal.
Destas interessa distinguir as chamadas leis interpretativas que se destinam a esclarecer e
fixar o sentido de uma lei anterior suscetível de mais de uma interpretação.
Enquanto a norma interpretativa esclarece o sentido de palavras ou expressões,
reportando-se a qualquer lei ou facto jurídico em que elas figurem, sejam anteriores ou
posteriores, e lei interpretativa reporta-se a uma lei anterior e só a essa.
Exemplo:
o Art. 2227.º do CC – ‘’se o testador designar certos sucessores individualmente e
outros coletivamente, são estes havidos por individualmente designados’’.
o Bem pode acontecer, com efeito, que um testamento contenha a seguinte frase:
‘’Deixo os meus bens a António, a Carlos e aos filhos do Manuel’’. Esta frase,
embora aparentemente clara, comporta duas interpretações diferentes: os filhos de
Manuel, no seu conjunto, são chamados a receber uma parte igual à de António e à
de Carlos ou, pelo contrário devem os bens do testador ser repartidos, em partes
iguais, por António, Carlos e cada um dos filhos de Manuel?
o Do artigo atrás citado conclui-se que a herança deve ser dividida em partes iguais
por todos os sucessores, considerando-se cada um dos filhos de Manuel como
individualmente designados.

Normas diretas e indiretas

Normas diretivas
Visam a resolução de problemas concretos da vida social, pelo que apontam aos seus
destinatários, de forma direta, as condutas que devem adotar.
Exemplo: Art. 2101.º do CC (direito de exigir a partilha da herança).

Normas indiretas
Têm por destinatários os órgãos de aplicação do Direito (nomeadamente tribunais, notários,
órgãos de polícia criminal), indicando-lhes os termos em que devem solucionar as questões
puramente jurídicas.
Assim o art. 9.º do CC respeita apenas ao problema da interpretação da lei e o art. 10.º do CC
regula em exclusivo a questão do preenchimento das lacunas.
São normas que se limitam a orientar o jurista nas tarefas da interpretação à aplicação da lei.

Próxima desta distinção está outra:


 Normas autónomas – definem por inteiro as condutas juridicamente devidas e permitidas,
contendo em si mesmas, autonomamente, as soluções que querem ver concretizadas na
realidade social.
 Normas não autónomas – são as que fazem referência a outras normas; as normas
indiretas são normas não autónomas, por se referirem sempre a outras normas.

Normas universais e normas locais

Normas universais
Normas cuja eficácia se alarga a todo o território nacional (normas do CP, CC, IRS).

Normas locais
Normas aplicáveis apenas dentro de uma circunscrição ou parcela de território nacional (posturas
municipais e legislativos regionais).

Normas gerais, excecionais e especiais


Normas gerais
Dizem-se gerais as normas que correspondem a princípios fundamentas do sistema jurídico e por
isso constituem o regime-regra do tipo de relações que disciplinam.
Exemplo: art. 405.º do CC – consagra o princípio da liberdade contratual; art. 219.º do CC –
princípio da liberdade de forma).
As normas gerais fixam grandes linhas de regulamento do direito: em geral, a declaração negocial
vale independentemente da forma que revista e os contraentes podem estipular as convenções
mais ajustadas aos seus interesses.
Mas acontece por vezes que a disciplina da norma geral se revela inadequada para certas
situações que, à mercê de circunstâncias especiais, necessitam de tratamento contrário ao
estabelecido pelo regime-regra.

Normas excecionais
Normas que dentro de setores e por razões privativas deles, contrariam as soluções das normas
gerais.
Exemplos: Confrontemos o art. 219.º com os arts. 875.º e 1143.º do CC. O art. 219.º do CC
estabelece que ‘’a validade de declaração negocial não depende da observância de forma
especial…’’ – Este preceito enuncia a regra geral de que a validade do negócio jurídico não
depende da forma especial, bastando que os seus interessados manifestem a vontade de os
celebrar e, aplica-se, em princípio, a todos os negócios jurídicos. Porém, o art. 875.º e o art.
1143.º do CC, relativos aos contratos de compra e venda e de mútuo, que são negócios jurídicos,
contrariam a regra geral, dispondo que: ‘’o contrato de compra e vens de bens imoveis só é válido
se for celebrado por escritura pública’’ e ‘’o contrato de mútuo de valor superior a 20.000€ só é
valido de for celebrado por escritura pública e, o de valor superior a 2.000€ se o for por
documento assinado pelo mutuário’’.
Normas especiais
Normas que dando resposta a necessidades concretas, desenvolvem, adaptando ou
especializando, princípios fixados em normas anteriores de alcance mais geral.
Não se trata de uma disciplina oposta da disciplina da norma geral, mas sim do desenvolvimento
desta, adaptando-a às particularidades de casos mais específicos. Representa um simples desvio
às normas gerais sem que, contudo, diretamente as contrarie.
Tanto as normas excecionais como as normas especiais vêm regular casos que, na falha delas,
seriam disciplinados pelas normas gerais. Mas enquanto que as primeiras consagram uma
regulamentação contraria à das normas gerais, as segundas completam-nas, adaptando-se à
particular natureza de certos grupos de relações.

NOTA: Estas relações de especialidade não se estabelecem apenas entre normas singulares,
podendo também constituir-se entre setores (ramos de direito). Exemplo: O direito comercial
constitui um ramo especial face ao Direito Civil.

Normas perfeitas, imperfeitas e mais e menos que perfeitas


Distinção que tem por base as consequências possíveis da violação das normas imperativas.

Normas mais que perfeitas


Normas que determinam a nulidade dos atos que as violam, e ainda a aplicação de uma pena aos
autores da violação.

Normas perfeitas
Normas que determinam apenas a nulidade dos atos que as contrariam.
Exemplo: Os contratos de compra e venda não celebrados por escritura pública, são nulos
(art.875.º do CC).
Normas menos que perfeitas
Normas que estabelecem como sanção para a sua violação, uma sanção diferente da nulidade.
Exemplo: Menor contrai casamento sem autorização do seu representante legal (art. 1649.º do
CC).

Normas imperfeitas
As normas imperfeitas que não estabelecem sanção para a sua violação, que podem ser
impunemente desrespeitadas.
Exemplo: Se o GOV, no exercício da sua ação política, não cumprir orientações como as
marcadas no art. 64.º, 65.º e 66.º da CRP, é difícil vislumbrar qualquer reação jurídica contra tais
infrações. É, no entanto, duvidoso que estas normas sejam verdadeiras normas jurídicas.

Normas remissivas, ficções legais e presunções legas

Normas remissivas
Pertencem à categoria das normas indiretas ou não autónomas.
O legislador não regulamenta direta e autonomamente a questão jurídica concreta, recorrendo
sim a outras normas que regem questões diferentes.
Exemplo:
o Art. 974.º do CC (revogação da doação por ingratidão do donatário), remete para os art.
2034.º e 2166.º do CC, para sabermos em que casos há ingratidão do donatário.
o As remissões que as normas operam podem ser materiais ou formais:
o Materiais quando a remissão é feira tendo em atenção o conteúdo da segunda
norma (art. 1935.º do CC quando estabelece que o tutor tem os mesmos direitos e
deveres dos pais).
o Formais quando a remissão é feita não tendo em atenção o conteúdo da segunda
norma, mas porque a norma para que se remete é a norma em vigor em
determinado momento ou em determinado espaço, independentemente do conteúdo
da norma.
Exemplo: Normas sobre conflitos de leis no tempo e as normas de direito
internacional privado.

Normas sobre conflitos de leis no tempo


Procuram resolver a questão de uma relação jurídica ter contacto com duas leis que se sucedem
no tempo. Têm de definir a lei aplicável no caso concreto, mas fazem-no não pelo seu conteúdo,
mas pelo facto de uma determinada norma se encontrar em vigor num determinado momento.

Normas de direito internacional privado


Procuram resolver a problemática levantada por uma situação concreta ter com dois ou mais
ordenamentos jurídicos. Têm de definir qual o ordenamento jurídico aplicável.

Ficções Legais
Hipótese em que o legislador em vez de remeter através de disposição expressa o regime
aplicável a determinada situação concreta para as normas reguladoras de um caso análogo ou
semelhante, prefere afirmar que o primeiro caso é ou considera-se igual ao segundo.
O legislador faz o que se denomina de remissão implícita (exemplo: art. 805.º/2/c) do CC)

Presunções legais
Traduzem-se numa operação com base na lei que permite deduzir de um facto conhecido, um
facto que se ignora (art. 349.º do CC – ‘’presunções são as ilações que a lei ou julgador tira de
um facto conhecido para afirmar um facto desconhecido’’)
Estas podem ser absolutas ou relativas.

 Presunções legais absolutas: presunções legais que não admitem prova em contrário.
Exemplo: Art. 1260.º do CC (‘’a posse adquirida por violência é sempre considerada de má
fé’’)

 Presunções legais relativas: presunções legais que admitem prova em contrário.


Exemplo: Art.786.º/1 do CC – o credor é admitido a ilidir a presunção de que ‘’estão pagos
os juros e as prestações’’.

Aplicação das leis no tempo


Cabem ao Direito duas funções tendencialmente antinómicas:
 Função estabilizadora
Ser capaz de garantir a continuidade da vida social, os direitos e as expectativas legitimas
das pessoas;
 Função dinamizadora e modeladora
Ser capaz de ajustar a ordem jurídica estabelecida à evolução social e de promover a sua
evolução num determinado sentido.

Sabemos já que quando uma lei é posta em vigor numa certa coletividade tal facto não significa
que a sua vigência se mantenha indefinidamente no tempo, sendo sempre possível revogá-la por
meio de outra lei posterior.
Ora se uma lei nova, revogando outra anterior, estabelece uma disciplina diferente para a mesma
espécie de situações, poderá levantar-se o problema de saber por qual das leis devem ser
reguladas aquelas relações constituídas no domínio da lei antiga que se mantenham depois da
entrada em vigor da lei nova ou que, na vigência desta, venham a ser apreciadas.
O problema de aplicação das leis no tempo surge quando se realizam cumulativamente, as
seguintes condições:
 Duas ou mais leis sucedem-se no tempo, regulamentando de forma diferente a mesma
questão jurídica;
 Uma situação jurídica entra em contacto ‘’temporal’’ com essas leis.

Questão:
o Averiguação da lei temporalmente competente;
o Aplicamos a lei que vigorava quando a situação jurídica se constitui (lei antiga) ou será
antes a que vigora no momento presente (lei nova)?

Vejamos por exemplo:


1. Determinada a lei vem instituir o divórcio num país, cuja legislação até aí o não admitia.
Será a nova lei aplicável apenas aos casamentos celebrados após a sua entrada em vigor
ou será de aplicar também aos celebrados anteriormente?
2. A e B celebram um contrato de compra e venda dum imóvel num momento em que a
legislação em vigor o considerava perfeito independentemente de qualquer formalidade
externa. Tempos depois é publicada uma lei nova exigindo escritura publica para a
validade dos tais contratos.
Se o contrato celebrado entre A e B for apreciado em tribunal no domínio da lei nova, deve
ou não ser considerado válido?
3. A lei em vigor no momento de celebração do casamento fixava em 14 anos a idade
nupcial; uma lei posterior elevou para 16 anos essa idade.
Poderá o casamento ser anulado, agora, sob o pretexto que um dos nubentes tinha 15
anos à data da realização do matrimónio (lei nova)?

Questão: qual a lei temporalmente competente?


 A) a lei que vigorava no momento em que a situação jurídica se constitui (lei antiga);
 B) a lei que vigora no presente (lei nova).

As hipóteses comportam assim duas soluções extremas:


A) Aplicação sistemática da lei antiga, a qual regulará as condições de validade da situação
em causa e os efeitos que esta venha eventualmente a produzir no futuro (princípio tempus
regit actum);
B) Aplicação irrestrita da lei nova: aplicar-se-á a todas as situações que se venham a ciar no
futuro e às situações que se constituíram antes da sua entrada em vigor (aplicação
retroativa da lei).

Argumentos a favor de cada uma das soluções


A) A favor da lei antiga – a aplicação a todas as situações jurídicas da lei que vigora no
momento em que estas se constituem é a única solução que tutela a confiança das
pessoas na estabilidade dos comandos jurídicos.
Existe a necessidade de garantir a adequada tutela das expectativas das partes, obstando
a que tais expectativas sejam defraudadas pela aplicação de uma lei com a qual as partes
não contaram, nem poderiam razoavelmente contar, uma vez que a lei nova iniciou a sua
vigência em momento ulterior ao da constituição da situação jurídica em causa.
Quem realiza os atos jurídicos só pode atender a leis em vigor no momento da prática do
ato e só nessas leis poderá firmar os interesses e expectativas por que orientará os seus
comportamentos futuros.
B) A favor da lei nova – a aplicação retroativa da lei, é, no entanto, única forma de assegurar
os valores da justiça e da modernidade.
As soluções consagradas na lei nova são mais justas e socialmente mais vantajosas, na
medida em que exprimem valores ético-culturais mais atualizados, que são um fator de
desenvolvimento e progresso da sociedade.
A justiça e a modernidade estarão, assim, ao serviço da aplicação imediata da nova lei,
mesmo às situações constituídas antes da sua entrada em vigor e que produzem ainda os
efeitos no momento presente: aplicação retroativa da lei.

A escolha de uma das soluções está intimamente ligada ao espírito ideológico de cada um:
 Espírito conservador (lei antiga);
 Pensamento reformista (lei nova)

Aplicação retroativa da lei


Uma lei é aplicada retroativamente quando o seu comando fixa a disciplina de factos que se
produziram no passado (em momento anterior à sua entrada em vigor), e/ou o regime jurídico dos
seus efeitos.

Graus de retroatividade
Retroatividade normal (1.º grau)
A nova lei aplica-se a situações jurídicas constituídas no passado, mas apenas no que concerne
aos efeitos jurídicos que estas venham a produzir após a sua entrada em vigor (ou seja, estes
efeitos têm de obedecer à lei nova).
Exemplo: A nova lei fixa como juro máximo admitido 15%; os contratos anteriores em que se
estipulam um juro superior àquele limite máximo passam, após entrada em vigor da nova lei, a
vencer o juro de 15%.

Retroatividade intermedia (2.º grau)


A nova lei aplica-se a situações jurídicas constituídas no passado, relativamente aos efeitos
jurídicos que estas venham a produzir após a sua entrada em vigor (destruindo esses mesmos
efeitos).
Exemplo: O mutuante é obrigado a restituir ao mutuário tudo o que acima de 15% recebeu a título
de juros, no passado.

Retroatividade máxima (3.º grau)


Neste grau a lei nova não respeita quaisquer efeitos jurídicos produzidos durante a vigência da lei
antiga, mesmo que se trate de situações definitivamente decididas por sentença transitada em
julgado (não respeita as ‘’causae finitae’’).
Estas causas teriam assim de ser ‘’reabertas’’ para serem julgadas outra vez segundo os
preceitos da lei nova.
Este grau é violador do princípio da divisão de poderes (o poder legislativo agride prerrogativas
próprias do poder judicial) e é condenado pelo disposto no art. 282.º da CRP.

‘’A declaração de inconstitucionalidade … produz efeitos desde a entrada em vigor da norma


declarada inconstitucional’’.

A entrada em vigor de uma nova norma não devera atentar contra as decisões transitadas em
julgado que foram proferidas tendo em conta uma norma que, se bem que agora revogada, era
inteiramente válida e atuante quando o caso julgado se formou.

Direito positivo vigente


Interessa proceder à análise do problema da aplicação das leis no tempo em sede jurídico-
positiva.
Não são poucas as Constituições que contém regras gerais sobre a aplicação da lei no tempo,
consagrando, de comum, o princípio fundamental da não-retroatividade da lei.
Na nossa Constituição atual não se encontra qualquer dispositivo com este alcance.
No entanto, a existência de um tal limite constitucional à retroatividade da lei já foi, entre nós
reconhecido pelo Tribunal Constitucional, ainda que se possa dizer, que se trata de um limite
muito amplo e difuso e mesmo, em alguns casos, de um limite facilmente permeável a juízos de
oportunidade política.

A CRP contém normas especiais sobre a aplicação no tempo das leis penais:
 Art. 29.º/1 – proibição da aplicação retroativa das leis incriminatórias;
 Art. 29.º/3 – proíbe a aplicação de penas ou medidas de segurança não previstas em lei
anterior;
 Art.29.º/4 – obriga à aplicação retroativa das leis penais com conteúdo mais favorável ao
arguido: aplica-se a pena mais leve se, entre a prática do crime e o momento da
condenação, se sucederem no tempo duas ou mais leis fixando sanções de diversa
gravidade.
 Art. 18.º/3 – proíbe a aplicação retroativa de leis restritivas dos direitos, liberdades e
garantias;
 Art. 103.º/3 – proíbe genericamente a aplicação retroativa das leis tributárias.

Legislação ordinária
Perante estes limites constitucionais, tem de reconhecer-se ao legislador ordinário ampla
liberdade na definição do regime temporal das leis que edita.
É frequente que o legislador acumule às leis disposições sobre a sua aplicação no tempo,
disposições essas que o intérprete terá de respeitar, salvo aquelas restrições constantes da CRP.
Outras vezes, o legislador, em vez de fixar limites precisos à aplicação da lei nova e da lei antiga,
opta pela instituição de um regime especial – regime transitório – para aquelas relações que,
constituídas ao abrigo da lei anterior, ainda subsistem quando entra a lei nova em vigor.
Assim os problemas de sucessão de leis no tempo, suscitados pela entrada em vigor de uma lei
nova, podem, pelo menos parcialmente, ser diretamente resolvidos por esta mesma lei através
das chamadas disposições transitórias.
As disposições transitórias podem ser de carater formal ou material:
 Caráter formal – são as que se limitam a determinar qual das leis, a lei antiga ou a lei nova,
é aplicável a determinadas situações;
 Caráter material – são as que estabelecem uma regulamentação própria, que não
coincidem nem com a lei antiga nem com a lei nova, para certas situações que se
encontram na fronteira entre estas duas leis; destinam-se a adaptar o regime da lei nova
às situações, a estabelecer a transição entre os regimes.
Porém, na maioria dos casos, o legislador não define especificamente o âmbito da eficácia
temporal da lei. E é para colmatar, precisamente este silêncio, que se coloca o problema geral da
eficácia das leis no tempo:
 Que lei aplicar às situações jurídicas que entram em contacto com duas leis de vigência
sucessiva?
Assim, na falta de disposições transitórias coube à doutrina a tarefa de propor soluções para este
problema (ex.: doutrina dos direitos adquiridos – a lei nova deve respeitar os direitos já
adquiridos).
Hoje é geralmente aceite a teoria do facto passado, acolhida pelo legislador no artigo 12.º do CC.

Teoria do facto passado: ‘’A lei só dispõe para o futuro; ainda que lhe seja atribuída eficácia
retroativa, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se
destine a regular’’.

Através deste preceito, podemos retirar as seguintes ideias:


o A lei só deve ter efeitos prospetivos, ou seja, só deve ‘’olhar’’ para o futuro;
o A lei nova deve assim respeitar todos os factos passados, isto é, verificados antes da sua
entrada em vigor, não atingindo situações que se devem considerar consumadas – tendo
eficácia não retroativa (princípio da não retroatividade);

Cada facto deve, pois, ter como lei reguladora a lei vigente ao tempo da sua verificação,
aplicando-se a lei nova aos factos ocorridos após a sua entrada em vigor e a lei antiga aos factos
verificados anteriormente, isto é, no domínio da vigência desta.
E mesmo que determinada lei se aplique ao passado, por ser atribuída eficácia retroativa,
presume-se que há intenção de respeitar os efeitos jurídicos já produzidos pelos factos que a lei
se destine a regular.
A simplicidade da solução atrás apresentada é contudo mais aparente do que real, pois a norma
jurídica não se limita a regular factos, regula também as suas consequências ou efeitos, muitos
dos quais, derivados de factos ocorridos antes de entrar em vigor uma nova lei, se prolongam
para além do inicio da sua vigência, tornando necessário distinguir quais as situações que por
constituírem simples efeitos ou consequências de factos passados, devem ser regulados pela lei
antiga e quais aquelas que devem ser regulados pela lei nova.
Procurando superar esta dificuldade estabelece-se o art. 12.º/2 do CC: ‘’Quando a lei dispõe
sobre as condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos ou sobre os seus
efeitos novos; mas, quando dispuser diretamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas,
abstraindo dos factos que lhes deram origem, entender-se-á que a lei abrange as próprias
relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor.’’

Na teoria do facto passado, surgem dois tipos de leis:


 As que dispõem sobre os efeitos ou sobre os requisitos de validade de quaisquer factos –
estas só se aplicam aos factos novos (factos que venham a ocorrer após a sua entrada em
vigor);
 Aquelas que dispõem sobre o conteúdo de certas relações jurídicas e o modelam sem
olhar aos factos que a tais situações deram origem – estas aplicam-se a situações jurídicas
constituídas antes da lei nova, as subsistentes ou em curso à data da sua entada em vigor;
 À constituição das situações jurídicas (requisitos de validade, substancial e formal, factos
enunciativos) aplica-se a lei do tempo em que essa celebração se verifica;
 Ao conteúdo das situações jurídicas que subsistam à data da entrada em vigor da lei nova,
aplica-se a lei antiga no que respeita ao regime futuro do conteúdo e seus efeitos.

Em conclusão: Fica o intérprete colocado na necessidade de determinar se a lei nova é uma lei
‘’reguladora de factos’’ ou uma lei ‘’reguladora de direitos e deveres (conteúdo da relação
jurídica)’’.

À luz dos critérios expostos, como solucionar as situações contempladas nos exemplos
enunciados no início desta matéria:
 Num país cuja legislação até aí o não admitia, será a lei nova aplicável apenas aos
casamentos celebrados após a sua entrada em vigor ou também aos celebrados
anteriormente?
A resposta a esta questão vai encontrar-se na segunda parte do art, 12.º/2 do CC: a nova
lei é imediatamente aplicável a todos os casamentos, incluindo os contraídos antes da
nova entrada em vigor, pois trata-se de uma disposição que vem regular o conteúdo da
relação jurídica matrimonial, atribuindo aos cônjuges um direito que até aí não possuíam,
sem fazer depender de qualquer facto.

 Se uma lei exigir, como condição de validade dos contratos de compra e venda de imoveis,
que os mesmos sejam realizados por escritura pública, quando a lei anterior não submetia
a validade desses contratos a quaisquer formalidades especiais, então a lei nova, nos
termos da primeira parte do art. 12.º/2 do CC e como lei ‘’reguladora de factos’’, aplicar-se-
á somente aos novos contratos, ou seja, àqueles que venham a ser celebrados apos a sua
entrada em vigor.

Especificidade do art.13.º do CC
O princípio geral da não retroatividade sofre, contudo, uma importante exceção. ‘’A lei
interpretativa integra-se na lei interpretada, ficando salvos, porém, os efeitos já produzidos pelo
cumprimento da obrigação, por sentença passada em julgado, por transação, ainda que não
homologada, ou por atos de análoga natureza’’.
Nos termos deste preceito a lei interpretativa, que se destina a fixar o sentido decisivo de uma lei
anterior obscura ou ambígua, integra-se na lei interpretada, formando com ela um todo. Sendo
assim tudo se passa como se tivesse sido publicada na data em que foi interpretada, ocupando o
seu lugar e, consequentemente, aplica-se aos factos verificados antes da sua entrada em vigor.

A lei interpretativa tem eficácia retroativa


Todavia, atendendo às consequências perniciosas e as perturbações que a aplicação retroativa
da lei a todos e quaisquer factos passados não deixaria de acarretar, ressalvam-se os efeitos já
produzidos pelos cumprimentos das obrigações por sentença passada em julgada, por transação,
ou por atos de natureza análoga, isto é, aqueles direitos já definitivamente fixados por decisão
judicial ou por convenção dos interessados.

Aplicação das leis no espaço


Os Estados não aplicam exclusivamente o seu direito interno no seu espaço, vendo-se forçados a
aplicar nos seus tribunais leis internas de outros Estados (quer pela nacionalidade dos sujeitos
intervenientes, quer pelo lugar onde os efeitos jurídicos se vão produzir, entre outros).
Surgem assim os conflitos das leis no espaço que são decididos mediante as regras de conflito:
permitem determinar qual das leis em contacto com a situação jurídica em questão, deve ser
declarada competente para a regular.
Exemplo: Aos atos realizados a bordo do navio, é aplicada a lei do país da bandeira desse navio.

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