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IED - Sebenta

Introduçao ao direito (Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Coimbra)

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INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO

1º ANO / 1º Semestre
2020/2021

Licenciatura em Solicitadoria e Administração

Mariana Marques

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Índice
Parte I – O Direito: Caracterização Geral
1. A necessidade do Direito………………………………………………………………………3
2. Valores fundamentais do Direito: Justiça e Segurança…………………………..3
3. Um primeiro conceito de Direito…………………………………………………………..5
4. O Direito entre as ordens normativas: Religião, Cortesia e Ética…………….6
5. Direito e Realidades Afins: Estado, Sociedade e Economia…………………….8
6. Definição dos Conceitos de “Direito Positivo”, “Direito Vigente” e
“Direito Natural”…………………………………………………………………………………19
Parte II – A Norma Jurídica: Problemas Fundamentais
1. A norma jurídica…………………………………………………………………………………20
2. Modos de criação das normas jurídicas……………………………………………….27
3. As fontes de Direito: lei, jurisprudência, doutrina e costume……………….27
4. Interpretação da lei…………………………………………………………………………….43
5. Integração da lei: preenchimento de lacunas………………………………………49
6. O problema da aplicação da lei no tempo……………………………………………53
Parte III – Da Sistematicidade do Direito
1. O sistema jurídico……………………………………………………………………………….61
2. Características……………………………………………………………………………………61
3. Divisões: Direito Público e Direito Privado…………………………………………..62
4. Ramos: Direito Público e Direito Privado…………………………………………….64
5. Novo ramo de Direito: Direito Comunitário…………………………………………69

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Parte I – O Direito: Caraterização Geral


Todos os dias, juristas ou não, lidamos com conceitos de Direito. Ao ler jornais, ouvir
rádio, ver televisão, no nosso local de trabalho e até na nossa vida particular. Desde
que acordamos até que nos deitamos, muitas vezes sem ter consciência disso, estamos
em contacto com realidades jurídicas.
É por isso que, hoje em dia, saber o mínimo de Direito, é uma condição de cidadania
plena, antes de ser uma necessidade académica ou profissional.
A necessidade do Direito
A natureza social do Homem: “O Homem é um animal social” – Aristóteles
Só através da interação com outros homens, da conjugação dos seus esforços, baseada
na solidariedade e na divisão do trabalho, o Homem atingirá a sua plena realização.
Contudo, a convivência em sociedade só é possível se existir um elenco mínimo de
princípios ou regras que pautem a conduta humana.
Já diziam os romanos:
• Ubi homo, ibi societas – Onde há Homem há sociedade
• Ubi societas, ibi jus – Onde há sociedade, há Direito
Podemos assim falar de:
• Ordem Natural: ordem de necessidade
As suas normas não são substituíveis, aplicam-se de forma invariável e constante,
independentemente da vontade do Homem, ou mesmo contra a sua vontade. São
normas inerentes à própria natureza dos seres.
• Ordem Social: ordem de liberdade
As leis ou normas de conduta social são aquelas que se dirigem à vontade do
Homem e se propõem a nortear as suas condutas e, para além disso, são violáveis.
Apesar das suas normas exprimirem um “dever ser” e se imporem ao Homem, este
pode violá-las, pode revelar-se contra elas ou pode mesmo alterá-las, sendo certo
que a violação destas normas só as atinge na sua eficácia e não na sua validade. É
uma ordem normativa.
A inexistência de regras, a chamada anomia, implicaria, como consequência inevitável,
a dissolução da comunidade social, já que nenhum dos seus membros saberia quais os
direitos e deveres que lhe caberiam e, portanto, quais as posições em que estava
constituído perante os outros e perante a própria comunidade.
Valores fundamentais do Direito: Justiça e Segurança
O Direito baseia-se na liberdade e sociabilidade de cada indivíduo, defendendo que a
vida em sociedade depende da imposição de uma ordem, de um conjunto de regras e
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padrões que orientem o comportamento do Homem, e estabeleçam as regras da


organização da sociedade e das instituições que a compõem.
São dois, os valores fundamentais do Direito: Justiça e Segurança.
JUSTIÇA
O principal fim a atingir pelo Direito é a Justiça.
A justiça está repartida em três modalidades fundamentais, sendo que estas
modalidades correspondem a três tipos de relações:
• Justiça Comutativa ou Corretiva
Estabelece-se entre os cidadãos, prevendo os direitos e deveres de uns para com
os outros (ideia de igualdade jurídico-social).
É aqui que se situa o Direito Privado: normas que regulam entre indivíduos, e entre
estes e os entes públicos, visando reestabelecer ou corrigir os desequilíbrios que
surgem nas relações interpessoais.
Opera segundo um critério de igualdade simples ou aritmética, que se traduz na
equivalência das prestações, e abrange tanto as trocas voluntárias ou lícitas como
as involuntárias ou ilícitas.
• Justiça Geral ou Legal
Este conceito engloba as relações entre os cidadãos e o Estado, encontrando-se
este numa situação de supremacia.
Neste patamar de justiça estabelece-se o que os cidadãos devem à sociedade
(Estado), como contribuição para o bem desta, para um bem comum.
• Justiça Distributiva
Também estabelece relações entre Estado e cidadãos, mas neste patamar o Estado
surge com um papel de obrigação.
Através dos seus agentes e dos órgãos, o Estado tem o dever de proporcionar a
todos as condições necessárias a uma vida com bem-estar, através da repartição
dos bens comuns – critério de igualdade proporcional ou geométrica.
Este é o papel da Ordem Jurídica, que é a ordem social regulada pelo Direito –
conjunto de normas de conduta social emanadas pelo Estado e garantidas pelo seu
poder.
Assim pode-se afirmar não só que onde existe o Homem existe sociedade – ubi
homo, ibi societas – mas, também que onde há sociedade há Direito – ubi societas,
ibi jus.
SEGURANÇA

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Embora não tenha a projeção da Justiça, pois representa um valor de hierarquia


inferior, não deixa de ser indispensável à vida social, pois está diretamente ligada à
utilidade, às necessidades práticas e às urgências da vida.
• Segurança com o sentido de paz social
O Direito visa garantir a convivência pacífica entre os homens, prevenindo e
solucionando os conflitos que surgem inevitavelmente na vida social – missão
pacificadora.
• Segurança com o sentido de certeza jurídica
O Direito deve “proteger os direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos e os
defender das eventuais arbitrariedades dos poderes públicos ou abusos de poder”.
A certeza corresponde a uma necessidade de previsibilidade e estabilidade na vida
jurídica, por isso, é necessário que cada um possa prever as consequências jurídicas
dos seus atos e saber aquilo que pode contar para, com base em expectativas
firmes, orientar a sua conduta ou estabelecer os seus planos de vida.
Para haver certeza e estabilidade nas relações jurídicas, as normas têm de ser
dadas a conhecer a todas as pessoas de forma clara.
Relação entre o Direito, a Justiça e a Segurança
Na prática, a realização da Justiça e da Segurança em simultâneo, apresenta grandes
dificuldades, o que leva a que o Direito umas vezes dê prevalência à Justiça sobre a
Segurança e outras vezes o inverso.
Em qualquer dos casos, o sacrifício tem de ser parcial, o que significa que não se pode
afastar totalmente qualquer um desses valores, já que a finalidade é a de conjugar
ambos.
A vida social só é possível porque os Homens acatam regras que visam instruir a ordem,
a paz, a segurança, a justiça, e atenuar os conflitos de interesses que inevitavelmente
surgem nas relações sociais. É, assim indispensável a existência de regras que
imponham condutas aos membros da sociedade, com vista a evitar conflitos,
desencadeados por diversos motivos, ou minimizar as suas consequências.
Essas regras conferem, por um lado, direitos e garantem certos usos fundamentais da
liberdade, e por outro, proíbem aos indivíduos o abuso dos seus poderes. Podemos,
por isso, dizer que em sociedade vivemos de forma heterogénea, mas regemo-nos por
uma forma homogénea.
Um primeiro conceito de Direito
• Direito é um conjunto de normas que regula o comportamento humano numa
determinada sociedade, e numa determinada época
• Direito está sempre referido a uma dada sociedade. Não há Direito sem sociedade
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• Direito é um conjunto de normas historicamente situadas. Não há Direito universal


para todas as épocas e todas as sociedades
• Direito é uma técnica de organização social. O objetivo do Direito é a implantação
de uma certa ordem, tendendo a uma certa organização social
O Direito entre as ordens normativas: Religião, Cortesia e Ética
A ordem social, sendo complexa, subdivide-se em diversas ordens diferentes, das quais
se destacam quatro:
DIREITO E RELIGIÃO
É a ordem de fé, regulando as relações entre os crentes e os seus deuses.
É essencialmente intra individual, refletindo-se também na sociedade dado que as
crenças religiosas dos indivíduos influenciam a sua conduta/comportamento.
O não cumprimento das normas religiosas leva a sanções de caráter extraterreno.
Distingue-se do Direito por via de quatro critérios:
• Coercibilidade
R – não é assistida de coercibilidade material
D – é assistido de coercibilidade material
• Exterioridade
R – é intra subjetiva (sentimento de transcendência)
D – é intersubjetivo
• Finalidade
R – impõe relações do crente com a divindade, e nas relações com o seu
semelhante
D – regula as relações essenciais de uma comunidade
• Consciencialização subjetiva
R – assenta na Fé
D – é estranho à ideia de Fé
DIREITO E CORTESIA
A Cortesia é um conjunto de regras de convivência social que não sendo essenciais à
sobrevivência da própria comunidade, visam assegurar um bom relacionamento entre
os seus membros. Podem identificar-se como regras de trato social ou usos. O Direito
é assistido de coercibilidade material enquanto a ordem de Trato Social não.
Exprime-se através dos usos sociais, podendo variar dentro da mesma sociedade,
conforme o círculo social.
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A violação destas normas implica apenas uma sanção social inorgânica, que consiste
essencialmente num sentimento de reprovação por parte da comunidade, levando
muitas vezes à marginalização do infrator.
DIREITO E ÉTICA
Visa o aperfeiçoamento do individuo, dirigindo-o para o bem.
É um conjunto de imperativos impostos ao Homem pela sua própria consciência ética,
sendo o seu incumprimento punido, principalmente, pelo arrependimento ou remorso,
mas também pela rejeição ou marginalização do grupo em que o indivíduo se insere.
Será, assim, uma ordem intra subjetiva, dado que relaciona a pessoa consigo mesma.
Distingue-se do Direito por via de quatro critérios:
o Coercibilidade
O Direito e a Moral distinguem-se pelo tipo de coação e de sanções que se aplicam
a quem não cumprir as normas.
As normas jurídicas são físicas e organicamente suscetíveis de aplicação coerciva,
enquanto que as morais não.
M – Coercibilidade psíquica: arrependimento.
D – Coercibilidade material: se necessário impõe-se pela força.
o Exterioridade
O Direito e a Moral têm pontos de partida diferentes.
A ordem jurídica é exterior ao indivíduo, regulando a sua conduta externa.
A ordem moral, por outro lado, irá depender dos valores do próprio indivíduo: por
exemplo, pensar em roubar poderá ser moralmente condenável, mas será um ato
indiferente perante o Direito.
M - é intra subjetiva, relaciona a pessoa consigo mesma.
D – é intersubjetivo, procura evitar conflitos e promover a cooperação.
o Finalidade
M – visa dirigir a pessoa para o bem, visa o aperfeiçoamento individual.
D – visa assegurar o desenvolvimento do Homem pelo estabelecimento de regras.
o Consciencialização Subjetiva
M – o crivo da consciência do sujeito.
D – para ser aplicado dispensa a consciência individual.
Norma Jurídica, Ordem Jurídica e Ordenamento Jurídico
• Norma Jurídica – regra de conduta social, assistida de proteção coativa.
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• Ordem Jurídica – sociedade organizada pelo sistema de normas jurídicas. É um


conceito mais amplo que o conceito de Direito porque engloba o próprio Direito e
ainda tudo aquilo que cria e aplica o Direito (Instituições, Órgãos, Fontes do
Direito…).
A ordem jurídica procura defender-se dos atos ilícitos, recorrendo aos meios de
proteção ou tutela jurídica, tanto preventivos como repressivos, no qual se incluem
as sanções jurídicas.
Ordem normativa e intersubjetiva, assistida de coercibilidade material, que visa
regular a vida do Homem em sociedade, conciliando os interesses em conflito. Tem
como valores fundamentais a Justiça e a Segurança, utilizando como meio as
normas jurídicas.
• Ordenamento Jurídico – conjunto de normas que regem uma dada comunidade,
de um determinado momento histórico. Engloba os princípios gerais ou
fundamentais do Direito.
O Ordenamento Jurídico é uma função essencial do Direito e consiste na
ordenação das relações sociais.
Relações entre as diversas ordens sociais normativas
Entre a Ordem Jurídica e as outras ordens normativas podem surgir relações de:
coincidência, indiferença e/ou conflito.
• Por exemplo entre o Direito e a Moral há largas zonas de coincidência, pois
dificilmente se poderá conceber uma ordem jurídica totalmente contrária aos
conceitos morais vigentes (nomeadamente a regra “não matar”).
• Podem, no entanto, surgir relações de indiferença, como por exemplo as regras de
trânsito.
• Mas também há relações de conflito, como por exemplo a despenalização do
aborto.
Direito e Realidades Afins: Estado, Sociedade e Economia
DIREITO E ESTADO
A vida em sociedade pressupõe a existência de múltiplos interesses individuais,
colidindo uns com os outros e muitas vezes com tendência a se sobreporem aos
interesses coletivos. O Direito aparece, como um instrumento capaz de regular as
relações que se estabelecem entre os membros da sociedade. Tornou-se, pois,
necessário o aparecimento de uma instituição que fosse dotada de meios capazes de
fazer cumprir a lei e que ao mesmo tempo possibilitasse a realização do bem-estar
social.

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Esta instituição é o Estado e representa a mais progressiva e complexa forma de


sociedade política.
Estado – instituição que se situa acima da comunidade, que é dotado de meios capazes
de fazer cumprir a lei e possibilita a realização do bem-estar social, através da
prestação de serviços importantes para a coletividade.
É a afirmação de um poder soberano exercido uniformemente sobre um povo, num
determinado território.
Entre o Direito e o Estado há uma relação de estreita interdependência – porque sendo
o Estado uma necessidade, também o Direito o é, pois representa a linguagem de
quem o governa.
O Estado ao ser autor e intérprete das leis, ao impor a lei e a ordem, é de facto um
instrumento indispensável para assegurar a vida do Homem em sociedade.
Características do Estado
Estado – sociedade politicamente organizada que congrega três elementos
fundamentais: povo, território e poder político.
• Povo
Conceito jurídico e político, entendido como uma comunidade de cidadãos, ou o
conjunto de nacionais de cada Estado.
Os cidadãos vinculam-se ao Estado por via da cidadania ou por via da nacionalidade,
sendo esta atribuída com base em diferentes critérios.
Nacionalidade
O direito à nacionalidade é um direito fundamental dos cidadãos.
Os critérios de que depende a sua atribuição podem ser agrupados em duas
categorias:
o Ius Sanguinis – a nacionalidade é atribuída em função dos laços sanguíneos ou
da filiação a nacionais de determinado Estado.
o Ius Soli – a nacionalidade é atribuída em função do local de nascimento.
Conceitos semelhantes ao de “povo” são o de nação e população:
o Nação – comunidade estável, inscrita ou não num determinado espaço
geográfico, com aspirações materiais e espirituais comuns, fundando-se numa
história e cultura comuns.
Tem geralmente, aspirações políticas. Note-se que o conceito de nação pode
não coincidir com o de Estado. Portugal pode ser considerado um Estado-
Nação, dado que corresponde a uma nação portuguesa, mas Espanha já não
(Catalunha, País Basco, etc.).

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o População – conjunto de pessoas que residem num determinado território e


que integra eventualmente cidadãos de outras nacionalidades. Tem uma
natureza essencialmente demográfica e económica, o que se opõe à natureza
política e jurídica do conceito de povo.
• Território
Compreende o solo e o subsolo (território terrestre), o espaço aéreo (território
aéreo) e o mar territorial (território marítimo), sendo as zonas sobre as quais o
Estado exerce plenamente o seu poder soberano. Farão igualmente parte do
território os navios, aeronaves, aviões e veículos sob bandeira nacional e as
representações diplomáticas noutros países (consulados, embaixadas…).
• Poder político
Noção: faculdade de um povo de, por autoridade própria, instituir órgãos que
exerçam com relativa autonomia a jurisdição sobre um território, nele criando e
executando normas jurídicas, usando para efeito os necessários meios de coação.
O poder político pode assumir várias modalidades, entre elas o poder político
soberano ou a soberania. A soberania caracteriza-se por ser um poder político
supremo e independente.
o Supremo na medida em que não está limitado por nenhum outro poder vigente
na ordem interna de cada Estado.
o Independente porque na ordem internacional não terá de acatar quaisquer
normas, a menos que voluntariamente aceites, encontrando-se desta forma ao
mesmo nível dos poderes supremos dos outros Estados.
O conceito de Estado
• Num sentido restrito – sociedade politicamente organizada, inscrita num
determinado território que lhe é privativo, tendo como características a soberania
e independência.
• Num sentido lato – incluem-se também Estados não soberanos (Estados federados
dos EUA, da Alemanha, do Brasil, por exemplo).
Estados Federados:
• Possuem Constituição própria, governo próprio;
• Legislam dentro do seu domínio;
• Têm meios para garantir a execução das suas leis no seu território;
• Contudo… não são Estados soberanos, pois as suas leis não podem ser contrárias
às da Constituição Federal.
Poderes e Funções do Estado

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A teoria dos poderes tripartidos do Estado surgiu no século XVII e foi formulada pelo
filósofo inglês John Locke.
Posteriormente, Montesquieu alegava que a liberdade só seria possível caso ocorresse
a separação dos três poderes fundamentais do Estado:
• Poder legislativo – poder de legislar
• Poder executivo – poder de executar as resoluções do poder público
• Poder judicial – poder de julgar e condenar por violação de normas jurídicas
Os grandes fins e objetivos a atingir pelo Estado serão, também, três:
• Segurança
O cidadão necessita de ter a certeza de que o Estado lhe reconhece direitos e
deveres, e que estes o protegem de eventuais atos que o possam perturbar. A esta
ideia estarão inerentes os conceitos de estabilidade e previsibilidade nas relações
jurídicas.
Mas a segurança individual não deverá ser o único fim do Estado – a segurança
coletiva, a proteção do povo face a ameaça exteriores, será também um fim do
Estado.
• Justiça
Ao Estado compete igualmente assegurar a Justiça.
Obrigação de garantir que os conflitos sociais são pacificamente solucionados por
um conjunto de regras que corrijam os desequilíbrios gerados. Uma sociedade
organizada sob a égide da Segurança, mas sem Justiça será uma sociedade
totalitária.
Assim, a ordem justa será aquela em que a Segurança, ao serviço da Justiça,
permite a realização plena do Homem.
• Bem-estar económico e social
Implica a promoção das condições de vida dos cidadãos, o acesso a bens e serviços
considerados como essenciais para a coletividade, tais como a Educação, a Saúde,
a Segurança Social, etc.
Atualmente ganham relevâncias as funções de preservação do ambiente e do
património cultural.
O seu fim derradeiro será assegurar a Justiça, torná-la compatível com a Segurança
e ao serviço do bem-estar económico e social.
Art. 9º CRP – tarefas fundamentais do Estado – os três fins do Estado são, portanto,
interdependentes e complementares.
Funções do Estado
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As funções do Estado são desenvolvidas através dos seus diferentes órgãos,


caracterizando-se:
• Função política ou governativa
Atividade exercida pelos órgãos do Estado que visa a definição e prossecução dos
interesses gerais da comunidade.
É prática dos atos que define a política geral do país, sendo exercida pelo
Presidente da República, pela Assembleia da República e pelo Governo.
• Função legislativa
Consiste na atividade pela qual o Estado cria o seu próprio Direito Positivo, no
intuito de disciplinar as relações que se estabelecem entre particulares e o poder
público.
É exercida pela Assembleia da República e pelo Governo.
• Função administrativa ou executiva
Tem por fim a execução das leis e a satisfação das necessidades coletivas enquanto
função adstrita ao Estado.
Função exercida pelo Governo.
• Função jurisdicional ou judicial
Atividades exercidas por órgãos colocados em posições de imparcialidade e
independência (Tribunais), tendo como objetivo dirimir os conflitos de interesses
públicos e privados, assim como a punição da violação da Constituição da República
Portuguesa e demais legislação.
Órgãos de Soberania
São a manifestação da vontade soberana do povo. Poderão ser órgãos singulares,
colegiais ou assembleias que, por força do Direito Constitucional vigente, têm
competência para exercer as funções imputáveis ao Estado.
• Presidente da República (art. 120º CRP)
Representa a República Portuguesa, garante a independência nacional, a unidade
do Estado e o regular funcionamento das instituições democráticas. É por inerência
Comandante Supremo das Forças Armadas.
Eleição
O presidente da República é eleito por sufrágio:
o Universal – é extensível a todos os cidadãos portugueses com capacidade
eleitoral
o Direto – porque os eleitores escolhem diretamente o PR

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o Secreto – nenhum eleitor está obrigado a revelar o sentido do seu voto


Mandato (art. 123º CRP)
o 5 anos, não se podendo recandidatar a um terceiro mandato consecutivo
Competência
o Competência quanto a outros órgãos (art. 133º CRP)
o Competência para a prática de atos próprios (art. 134º CRP)
o Competência nas relações internacionais (art. 135º CRP)
Compete ainda:
o Promulgar as leis e decretos-lei ou exercer o direito de veto;
o Proceder à fiscalização preventiva da constitucionalidade de uma norma que
lhe tenha sido submetida para ratificação, podendo exercer o direito de veto
(art. 278º e 279º CRP);
o Convocar extraordinariamente a AR e dissolvê-la;
o Nomear o Primeiro Ministro e os ministros e demitir o Governo.
• Assembleia da República (art. 147º CRP)
A Assembleia da República é representativa de todos os cidadãos, pois apesar de
os deputados serem eleitos por círculos eleitorais, representam todo o país e não
só o círculo pelo qual foram eleitos.
Eleição
o Os deputados são eleitos por círculos eleitorais
o São elegíveis todos os cidadãos portugueses eleitores, salvas as restrições que
a lei eleitoral estabelece por virtude de incompatibilidades locais ou de
exercício de certos cargos
Legislatura
o 4 sessões legislativas, com a duração de um ano cada uma
Competência
o Competência política e legislativa (art. 161º CRP)
o Competência de fiscalização (art. 162º CRP)
o Competência quanto a outros órgãos (art. 163º CRP)
o Reserva absoluta de competência legislativa – a AR não pode conceder ao
Governo a autorização para legislar sobre certas matérias (art. 164º CRP)
o Reserva relativa de competência legislativa – a AR pode conceder ao Governo
a autorização para legislar sobre essas matérias (art. 165º CRP)
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• Governo (art. 182º CRP)


Órgão de política geral do país e órgão superior de administração pública.
Composição
O Governo é constituído por:
o Primeiro-ministro
o Ministros
o Secretários e subsecretários de Estado
Formação
O Primeiro-ministro é nomeado pelo PR, ouvidos os partidos políticos
representados na AR e tendo em conta os resultados eleitorais (art. 187º CRP).
Programa de Governo
O programa de Governo é submetido à apreciação da AR, através de uma
declaração do Primeiro-ministro, no prazo máximo de 10 dias após a sua nomeação
(art. 190º CRP).
Competência
o Política (art. 197º CRP)
o Legislativa (art. 198º CRP)
o Administrativa/executiva (art. 199º CRP)
• Tribunais (art. 202º CRP)
Os tribunais são órgãos de soberania com competência para administrar a justiça
em nome do povo.
o Os tribunais são órgãos independentes. Apenas estão sujeitos à lei (art. 203º
CRP)
o As suas decisões são vinculativas – são obrigatórias e prevalecem sobre as das
outras autoridades (art. 205º nº2 CRP)
o Esta independência perante os poderes executivo e legislativo é indispensável
à existência de um verdadeiro Estado democrático – o juiz decide segundo o
critério que considera certo e encontra-se unicamente vinculado à lei.
Competências
o Assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos
cidadãos
o Reprimir a violação da legalidade democrática
o Dirimir os conflitos de interesses públicos ou privados

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Os juízes têm ainda, também, as seguintes prerrogativas:


o Inamovibilidade – são nomeados vitaliciamente, pelo que não podem ser
transferidos, suspensos, promovidos, demitidos, aposentados, exceto nas
situações previstas pela lei (art. 216º nº1 CRP);
o Irresponsabilidade – não são responsabilizados a título individual pelas
decisões que tomam no exercício das suas funções (art. 216º nº2 CRP).
Categorias de Tribunais
o Tribunal Constitucional
o Supremo Tribunal de Justiça e Tribunais Judiciais de 1ª e 2ª Instância
o Supremo Tribunal Administrativo e os demais Tribunais Administrativos e
Fiscais
o Tribunal de Contas
o Tribunais privados
▪ Tribunais arbitrais (art. 209º nº2 CRP)
Resolução de questões derivadas de “relações jurídicas sujeitas ao domínio
da vontade das partes”.
Os litigantes instituem, por vontade comum (acordo arbitral), uma
instância (tribunal arbitral) a quem cometem poderes para dirimir a
questão que os opõe.
Vantagens apontadas à arbitragem:
⎯ Maior celeridade processual
⎯ Menores custas processuais
⎯ Possibilidade de os pleiteantes elegerem, como juízes-árbitros, pessoas
especialmente qualificadas e conhecedoras profundas da matéria
sobre a qual recai o litígio.
Estado de Direito, Estado Social de Direito e Estado de Direito Democrático
• Estado de Direito
Aquele em que toda a atuação do poder político está subordinada a regras jurídicas,
com vista a assegurar os direitos e liberdades dos cidadãos perante o próprio
Estado.
• Estado Liberal de Direito
Surge a partir do século XVIII, atingindo o máximo da sua popularidade em meados
do século XIX. Nasce como reação ao absolutismo monárquico (omnipresença e
intervencionismo do Rei). Assentava na separação de poderes e tinha como única

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função zelar pela defesa e garantia dos direitos e liberdades fundamentais e


individuais, ignorando, contudo, as questões sociais.
• Estado Social de Direito
Surge como resultado natural da ineficácia dos modelos liberalistas, nos finais do
século XIX. O facto de o Estado não intervir na vida económica e social gerou
situações gravosas para os direitos e liberdades individuais e para a defesa do bem
comum. Após as crises que se seguiram à 1ª e 2ª Guerra Mundiais, a evolução nos
sistemas democráticos/liberais do Ocidente fizeram com que o Estado
abandonasse a sua posição abstencionista, o que deu origem ao Estado Social de
Direito.
Para além das esferas política e económica, o Estado passa igualmente a intervir
na esfera social. Tenta conciliar a manutenção do capitalismo como sistema
económico e, simultaneamente, a prossecução do bem-estar geral.
Tradicionalmente os requisitos do Estado Social são:
o Império da Lei
o Separação de Poderes
o Legalidade da administração
o Garantia jurídico-formal e efetiva realização material dos direitos e liberdades
fundamentais
• Estado de Direito Democrático
O Estado de Direito, hoje em dia, postula a democracia representativa e pluralista;
considera-se, assim, mais adequado falar em Estado de Direito Democrático.
Art. 2º CRP – a Constituição da República Portuguesa acolheu esta designação
As Relações Internacionais
Um dos elementos do Estado é o Poder Político, o qual desempenha diferentes funções
no plano interno e no plano externo.
• No plano interno – o Poder Político traduz a autoridade de, por direito próprio, um
povo fixado em determinado território instituir os seus órgãos governativos
• No plano externo – o Poder Político traduz-se na soberania; na capacidade de um
Estado se representar internacionalmente.
Organizações Internacionais
A seguir à II Guerra Mundial a necessidade de garantir a paz e a segurança levou à
criação de Organizações Internacionais (OI), para que fosse possível resolver as
temáticas que ultrapassassem as competências de uma só nação, sendo de
responsabilidade global.

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As OI possuem personalidade jurídica autónoma a nível internacional, destinando-se à


coordenação e à realização dos mais variados interesses comuns.
As Organizações Internacionais podem ser classificadas quanto:
• ao objeto – gerais, como a ONU, ou particulares, como a UE
• à estrutura interna – intergovernamentais, como a OUA (Organização da Unidade
Africana), ou supranacionais, como a UE
o Nas Organizações Intergovernamentais, cada Estado-Membro, mantém, na
íntegra a sua soberania
o Já nas Organizações Supranacionais os seus membros delegam parte da sua
soberania à organização, com vista à resolução de determinados conflitos,
possuindo as suas decisões carácter vinculativo
• ao âmbito territorial – para universais, por exemplo a ONU, e regionais, como a
NATO (Organização do Tratado do Atlântico Norte)
• à natureza dos membros – públicas (ex.: ONU) e privadas (ex.: Cruz Vermelha
Internacional)
DIREITO E SOCIEDADE
O Direito é condição sine qua non da existência e desenvolvimento da sociedade
humana.
Compete ao Direito, num primeiro momento, estatuir as normas que determinarão o
modo como esses interesses se devem conciliar ou qual o interesse que deve triunfar.
Por exemplo:
• Nas relações entre vendedor e comprador, o art. 879º do CC prescreve que é
obrigação do vendedor proceder à entrega da coisa vendida, enquanto é dever do
comprador pagar o preço.
• Nas relações entre depositário e depositante, os arts. 1187º (o depositário é
obrigado a guardar a coisa depositada e a restituí-la com os seus frutos, etc.) e
1199º (o depositante deve pagar a retribuição devida e reembolsar o depositário
das despesas indispensáveis à conservação da coisa, etc.) do CC estabelecem o
equilíbrio juridicamente desejado entre os dois contraentes.
Este plano de regulamentação social que o direito institui nas suas normas é
frequentemente desrespeitado: o comprador não paga o preço, o contribuinte não
satisfaz as suas obrigações fiscais, etc. Quando estes conflitos irrompem, geram-se
situações de crise que reclamam uma solução em termos de Direito.
Numa sociedade civilizada não se aceita que seja o próprio interessado a realizar o seu
direito.

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Art. 1º do Código do Processo Civil – “A ninguém é lícito o recurso à força com o fim
de realizar ou assegurar o próprio Direito...”
O Direito institui órgãos imparciais e independentes a quem comete a função de
“administrar a justiça”.
Os tribunais
Arts. 202º e ss da CRP – estes órgãos decidem em termos definitivos (caso julgado), e
“obrigatórios para todas as entidades públicas e privadas”, “nos termos previstos na
lei” os litígios submetidos à sua apreciação.
DIREITO E ECONOMIA
Relação do tipo circular ou ambivalente: a economia reage sobre o direito e o direito
sobre a economia, num processo de recíprocas influências (ação-reação) pautado por
critérios de raiz social (utilidade, eficácia, justiça, etc.).
Nas palavras de Teixeira Martins: “… qualquer sistema económico exige um dado
regime jurídico que o assegure normativamente como sistema. Um regime jurídico que,
desde logo, normativize as suas relações típicas de produção, e bem assim de troca, de
consumo, etc., e que, além disso, sirva as necessidades do seu funcionamento,
garantindo os institutos e quadros jurídicos dentro dos quais as suas leis económicas
possam desenvolver-se.”
Contudo, o Direto não é “servo” da Economia. Não institui necessariamente uma
disciplina integralmente ancorada a interesses da vida económica.
O Direito está em condições de reagir sobre a economia, impondo o seu próprio ponto
de vista, soluções suscetíveis de reforçar, desviar, corrigir ou bloquear tendências
espontâneas do sistema económico.
• Cabe ao Direito definir o regime da propriedade dos bens económicos
• Presta os instrumentos necessários à circulação dos bens e serviço
A categoria jurídica do contrato é um meio indispensável ao funcionamento do
sistema económico – é através do contrato que o trabalhador fornece a sua força
do trabalho ao empregador, etc. Os termos em que esses contratos são redigidos
pesarão fortemente sobre a atividade económica.
• O Direito intervém com uma intenção corretiva sobre a economia
Procura em nome dos princípios de justiça social, atenuar desequilíbrios e
desigualdades que o processo económico, por si, facilmente produziria.
Cumpre ao Direito atuar, caucionar os valores sociais prevalentes, de modo a
esbater as diferenças económicas dos cidadãos.

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Definição dos Conceitos de “Direito Positivo”, “Direito Vigente” e


“Direito Natural”
DIREITO POSITIVO
Por Direito Positivo entende-se o conjunto dos princípios e normas jurídicas postos em
vigor, através de procedimentos legítimos, em qualquer comunidade. Todo o preceito
aí positivado (posto a vigorar) é parte do respetivo Direito Positivo.
DIREITO VIGENTE
Regulamenta a vigência do direito para uma determinada norma. A norma válida
atualmente é direito vigente, a norma que expira ou é modificada, é designada direito
histórico.
DIREITO NATURAL
Diz respeito à ordem pública e social como um todo, independente de normas
materiais, pois emana da moral, da ética e da consciência de um povo, refletindo no
direito positivo, considerando que o legislador deve levar em conta o valor social da
norma, pois a sua finalidade é torná-la obrigatória a todos, mas principalmente àqueles
que não respeitam o que é normalmente correto se não houver uma consequência
séria que os obriguem a fazê-lo.
O Direito Natural não é arbitrário, mas um direito sob medida; representa um
equilíbrio entre o que é certo e o que é errado. Não é possível afirmar que uma pessoa
ou uma coletividade agirá desta ou daquela forma, mas as probabilidade de agir
conforme o que determina o sistema ético e moral de uma sociedade é maior.

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Parte II – A Norma Jurídica: Problemas Fundamentais


A norma jurídica
A norma jurídica é uma regra de conduta tutelada coercitivamente. A norma jurídica
enuncia as condutas que são devidas pelos sujeitos jurídicos, os interesses que nas
situações concretas prevalecem e, nos conflitos de interesses juridicamente relevantes,
indica a quem pertence a razão jurídica, a parte cujos interesses devem triunfar.
Podem apontar-se como características da norma jurídica:
• Coercibilidade
É a característica das normas jurídicas que indica que a ordem jurídica pode
recorrer à força para impor o cumprimento da norma (a coercibilidade não é uma
característica de cada norma per si, mas sim da ordem jurídica).
• Imperatividade
As normas jurídicas não se limitam a aconselhar uma determinada conduta elas
impõem uma conduta, são um comando.
• Generalidade
As normas jurídicas são normas gerais porque se destinam a um conjunto amplo
de destinatários, e não a destinatários singularmente determinados.
• Violabilidade
Sendo as normas jurídicas uma criação do Homem, em última análise, e usando a
sua liberdade, pode esta vir a violá-las, tendo, no entanto, de se sujeitar a sofrer
sanções (forma como o direito reage contra quem viola as normas).
• Abstração
As normas jurídicas regulam um número indeterminado de casos do mesmo tipo,
e não a situações concretas ou individualizadas.
Classificação das Normas Jurídicas
Tendo em conta a diversidade de normas jurídicas, impõe-se construir categorias de
normas que permitam ordená-las e melhor revelar a sua natureza.
Neste sentido fala-se em diversas classificações.
• Normas imperativas, permissivas e supletivas – atende-se nesta classificação ao
modo como a norma jurídica atua sobre a vontade dos seus destinatários.
o Normas imperativas – definem condutas imperativas aos seus destinatários,
isto é, aqueles que se encontram na situação nelas previstas.
Assim é imperativa a norma que impõe aos indivíduos de certa idade o
cumprimento de serviço militar.
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Ora a conduta imposta pode ser positiva ou negativa: pode consistir numa ação
ou omissão. Daí a divisão das normas imperativas em precetivas e proibitivas.
▪ Norma percetiva – as normas que impõem uma conduta ou
comportamento positivo.
Por exemplo:
⎯ A norma que manda pagar a contribuição predial
⎯ A norma que manda reduzir a escrito a escritura pública dos
arrendamentos para o comércio, indústria ou profissão liberal
⎯ A norma que manda pagar a renda ao senhorio
⎯ A norma que manda prestar alimentos aos filhos…
▪ Norma proibitiva – as normas que impõem um comportamento negativo.
Por exemplo:
⎯ As normas que proíbem a prática de crimes
⎯ A norma que proíbe os pais e avós a venderem a filhos ou netos, se os
outros filhos ou netos não consentirem com a venda (art. 877º CC)
o Normas permissivas (ou facultativas) – são aquelas que, regulamentando
embora certas situações, não se impõem obrigatoriamente, limitando-se a
conceder certas faculdades ou contendo um comando que os particulares
podem livremente afastar.
Umas vezes essas faculdades concernem à prática de atos materiais (art. 1353º:
direito de demarcação; 1356º: direito de tapagem; 1356º: perecimento natural
de árvores e arbustos – CC) e outras vezes, ao exercício de atividades jurídicas
(art. 405º CC: “as partes têm a faculdade de fixar livremente o conteúdo dos
contratos).
As normas facultativas comportam ainda uma subclassificação, pelo que se
torna necessário distinguir entre:
▪ Normas dispositivas – são as que se limitam a conceder certos poderes ou
faculdades, deixando ao arbítrio do indivíduo praticar ou não praticar
certos atos.
Exemplos:
⎯ Art. 950º CC – permite receber doações a todos os que não estejam
inibidos de as aceitar por disposição da lei
⎯ Art. 1698º CC – permite fixar o regime de bens do casamento em
convenção antenupcial

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⎯ Art. 2188º CC – permite fazer o testamento a todos os indivíduos que a


lei não declare incapazes de o fazer
▪ Normas supletivas – normas que têm por finalidade suprir a falta ou
insuficiência de manifestação da vontade das partes, relativamente a
certos assuntos que necessitam da disciplina jurídica.
Estas normas procuram assim interpretar a vontade hipotética ou
presumível das partes mas só se aplicam se os particulares não adotarem
solução diferente.
O legislador aproveita o silêncio das partes para impor as soluções jurídicas
“ideais”.
Estas normas encontram o seu âmbito de eleição no campo do direito dos
contratos (relação com o princípio da liberdade contratual – art. 405º CC.
Como exemplos de normas supletivas:
⎯ Art. 772º nº 1 CC – respeitante ao lugar onde deve ser cumprida a
obrigação, estabelece que “na falta de estipulação ou disposição
especial da lei, a prestação deve ser efetuada no lugar do domicílio do
devedor”.
⎯ Art. 878º CC – relativo à compra e venda, dispõe que “na falta de
convenção em contrário, as despesas do contrato e outras acessórias
ficam a cargo do comprador.
Como facilmente se verifica, qualquer destas disposições pode ser afastada
pela vontade dos interessados, na medida em que só serão aplicáveis se
estes não convencionarem, oportunamente, regime diverso.
▪ Normas interpretativas – visam aclarar outras normas ou fixar o sentido de
determinadas expressões pouco claras usadas pelo legislador, ou pelos
particulares nos negócios jurídicos.
Ex: art. 204º e 205º do CC (caracterizam coisas imóveis e coisas móveis).
Arts. 874º, 940º e 980º CC (fixam os termos em que as expressões “compra
e venda”, “doação” e “sociedade” devem ser entendidas quando utilizadas
na linguagem legal.
Das normas interpretativas interessa distinguir as chamadas leis
interpretativas que se destinam a esclarecer e fixar o sentido de uma lei
anterior suscetível de mais de uma interpretação.
Enquanto a norma interpretativa esclarece o sentido de palavras ou
expressões, reportando-se a qualquer lei ou facto jurídico em que elas
figurem, sejam anteriores ou posteriores, a lei interpretativa reporta-se a
uma lei anterior e só a essa.

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Repare-se no art. 2227º CC que estabelece: “se o testador designar certos


sucessores individualmente e outros coletivamente, são estes havidos por
individualmente designados”.
Bem pode acontecer, com efeito, que um testamento contenha a seguinte
frase: deixo os meus bens a António, a Carlos e aos filhos do Manuel.
Esta frase, embora aparentemente clara, comporta duas interpretações
diferentes: Os filhos de Manuel, no seu conjunto, são chamados a receber
uma parte igual à de António e à de Carlos ou, pelo contrário devem os
bens do testador ser repartidos, em partes iguais, por António, Carlos e
cada um dos filhos de Manuel?
Do artigo atrás citado conclui-se que a herança deve ser dividida em partes
iguais por todos os sucessores, considerando-se cada um dos filhos de
Manuel como individualmente designados.
• Normas diretas e normas indiretas
o Normas diretas – visam a resolução de problemas concretos da vida social, pelo
que apontam, aos seus destinatários, de forma direta, as condutas que devem
adotar.
Ex: art. 2101º CC (direito de exigir a partilha da herança).
o Normas indiretas – têm por destinatários os órgãos de aplicação do direito
(nomeadamente tribunais, notários, órgãos de polícia criminal), indicando-lhes
os termos em que devem solucionar as questões puramente jurídicas.
Assim, o art. 9º CC respeita apenas ao problema da interpretação da lei e o art.
10º CC regula em exclusivo a questão do preenchimento das lacunas.
São normas que se limitam a orientar o jurista nas tarefas da interpretação a
aplicação da lei.
Próxima desta distinção está uma outra:
o Normas autónomas – definem por inteiro as condutas juridicamente devidas e
permitidas, contendo em si mesmas, autonomamente, as soluções que
querem ver concretizadas na realidade social.
o Normas não autónomas – são as que fazem referência a outras normas. As
normas indiretas são normas não autónomas, por se referirem sempre a outras
normas.
• Normas universais e normas locais
o Normas universais – normas cuja eficácia se alarga a todo o território nacional
(normas do Código Penal, do Código Civil, do IRS).

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o Normas locais – normas aplicáveis apenas dentro de uma circunscrição ou


parcela do território nacional (ex: posturas municipais e decretos legislativos
regionais).
• Normas gerais, excecionais e especiais
o Normas gerais – normas que correspondem a princípios fundamentais do
sistema jurídico e por isso constituem o regime-regra do tipo de relações que
disciplinam.
(ex: art. 405º CC – consagra o princípio da liberdade contratual e art. 219º CC
– princípio da liberdade de forma).
As normas gerais fixam grandes linhas de regulamentação do direito: em geral,
a declaração negocial vale independentemente da forma que revista e os
contraentes podem estipular as convenções mais ajustadas aos seus interesses.
Mas acontece por vezes que a disciplina da norma geral se revela inadequada
para certas situações que mercê de circunstâncias especiais, necessitam de
tratamento contrário ao estabelecido pelo regime-regra.
o Normas excecionais – normas, que dentro de setores restritos e por razões
privativas deles, contrariam as soluções consagradas nas normas gerais.
Para melhor compreender a diferença entre estas categorias de normas
confrontemos o art. 219º, arts. 875º e 1143º CC.
Art. 219º CC : estabelece que “a validade de declaração negocial não depende
da observância de forma especial…”.
Este preceito enuncia a regra geral de que a validade do negócio jurídico não
depende da forma especial, bastando que os seus interessados manifestem a
vontade de os celebrar, e aplica-se, em princípio a todos os negócios jurídicos.
Porém, o art. 875º e o art. 1143º CC, relativos aos contratos de compra e venda
e de mútuo, que são negócios jurídicos, contrariam a regra geral, dispondo que:
“o contrato de compra e venda de bens imóveis só é válido se for celebrado
por escritura pública” e “o contrato de mútuo de valor superior a 20.000 euros
só é válido se for celebrado por escritura pública, e o de valor superior a 2.000
euros se o for por documento assinado pelo mutuário”.
o Normas especiais – normas que dando resposta a necessidades concretas,
desenvolvem, adaptando ou especializando, princípios fixados em normas
anteriores de alcance mais geral.
Não se trata de uma disciplina oposta da disciplina da norma geral, mas sim o
desenvolvimento desta, adaptando-a às particularidades de casos mais
específicos. Representa um simples desvio às normas gerais sem que, contudo,
diretamente as contrarie.

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Tanto as normas excecionais como as normas especiais vêm regular casos que,
na falta delas, seriam disciplinados pelas normas gerais. Mas enquanto que as
primeiras consagram uma regulamentação contrária à das normas gerais, as
segundas completam-nas, adaptando-se à particular natureza de certos grupos
de relações.
Nota: estas relações de especialidade não se estabelecem apenas entre
normas singulares, podendo também constituir-se entre sectores (ramos de
direito).
Ex: O Direito comercial constitui um ramos especial face ao Direito Civil.
• Normas perfeitas, imperfeitas e mais ou menos que perfeitas – distinção que tem
por base as consequências possíveis da violação das normas imperativas.
o Normas perfeitas – normas que determinam apenas a nulidade dos atos que
lhes são contraídos.
Ex.: os contratos de compra e venda não celebrados por escritura pública, são
nulos (art. 875º CC).
o Normas imperfeitas – normas que não estabelecem sanção para a sua violação,
que podem ser impunemente desrespeitadas.
Por exemplo: Se o Governo, no exercício da sua ação política, não cumprir
orientações como as marcadas no art. 64º, 65º e 66º CRP, é difícil vislumbrar
qualquer reação jurídica contra tais infrações.
É no entanto duvidoso que estas normas sejam verdadeiras normas jurídicas.
o Normas mais que perfeitas – normas que determinam a nulidade dos atos que
as violam e ainda a aplicação de uma pena aos respetivos autores.
o Normas menos que perfeitas – normas que estabelecem como sanção para a
sua violação, uma sanção diferente da nulidade.
Ex: menor contrai casamento sem autorização do seu representante legal (art.
1649º CC).
• Normas remissivas, ficções legais e presunções legais
o Normas remissivas – pertencem à categoria das normas indiretas ou não
autónomas.
O legislador não regulamenta direta e autonomamente a questão jurídica
concreta, recorrendo sim a outras normas que regem questões diferentes.
Por exemplo: o art. 974º CC (revogação da doação por ingratidão do donatário),
remete para os art. 2034º e 2166º CC, para sabermos em que casos há
ingratidão do donatário.
As remissões que as normas operam podem ser materiais ou formais:
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▪ São materiais quando a remissão é feita tendo em atenção o conteúdo da


segundo norma (ex: art. 1935º CC quando estabelece que o tutor tem os
mesmos direitos e deveres dos pais).
▪ São formais quando a remissão é feita não tendo em atenção o conteúdo
da segunda norma, mas porque a norma para que se remete é a norma em
vigor em determinado momento ou em determinado espaço,
independentemente do conteúdo da norma.
Ex.: normas sobre conflitos de leis no tempo e as normas de direito
internacional privado.
⎯ Normas sobre conflitos de leis no tempo – procuram resolver a questão
de uma relação jurídica ter contacto com duas leis que se sucedem no
tempo; têm de definir a lei aplicável no caso concreto, mas fazem-no
não pelo seu conteúdo mas pelo facto de uma determinada norma se
encontrar em vigor num determinado momento.
⎯ Normas de Direito Internacional Privado – procuram resolver a
problemática levantada por uma situação concreta ter conexão com
dois ou mais ordenamentos jurídicos; têm de definir qual o
ordenamento jurídico aplicável.
o Ficções legais
Hipótese em que o legislador em vez de remeter através de disposição
expressa o regime aplicável a determinada situação concreta para as normas
reguladoras de um caso análogo ou semelhante, prefere afirmar que o
primeiro caso é ou considera-se igual ao segundo.
O legislador faz o que se denomina de remissão implícita. Ex.: art. 805º nº 2
alínea c) CC.
o Presunções legais
Traduzem-se numa operação com base na lei que permite deduzir de um facto
conhecido, um facto que se ignora (art. 349º CC: “Presunções são as ilações
que a lei ou o julgador tira de uma facto conhecido para afirmar um facto
desconhecido”).
As presunções legais podem ser absolutas ou relativas:
▪ Presunções legais absolutas (iures et iure): presunções legais que não
admitem prova em contrário.
Ex.: art. 1260º CC (“a posse adquirida por violência é sempre considerada
de má fé”).
▪ Presunções legais relativas (iuris tantum): presunções legais que admitem
prova em contrário.
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Ex.: art. 786º, nº 1 CC – o credor é admitido a ilidir a presunção de que


“estão pagos os juros e as prestações”.
Modos de criação das normas jurídicas
As normas jurídicas são estruturadas, ou seja, são construídas de acordo com três
elementos:
• Previsão – de situações futuras, ou seja, a norma jurídica regula situações, casos
que se prevê que venham a acontecer
• Estatuição – as normas jurídicas impõem uma conduta a adotar quando se verifica
a sua previsão
• Sanção – dispõe de meios de coação pertencentes ao sistema (ordenamento)
jurídico para impor o seu cumprimento
As fontes de Direito: lei, jurisprudência, doutrina e costume
O problema das Fontes do Direito está naturalmente ligado à origem, aos processos
de formação e revelação das normas que compõem determinada ordem jurídica.
Segundo a Ordem Jurídica, o Direito pode ser visto num sentido mais lato ou num
sentido mais estreito. Segundo um sentido mais restrito ele é constituído pelos
Sistemas de Regras e pelas Situações Jurídicas.
Sistemas de Regras – o ordenamento jurídico, ou seja, conjunto de normas que
exprimem a Ordem Jurídica e que regem uma dada comunidade num determinado
momento histórico.
Situações Jurídicas – as relações da sociedade mais importantes para o Direito.
A Ordem Jurídica tem, como forma de ordenação da vida social, duas funções:
• Função, Primária ou Prescritiva
A ordem jurídica funciona como princípio de ação da conduta do Homem na
sociedade – surge como fundamento normativo da conduta social, colocando os
cidadãos uns perante os outros num plano de igualdade jurídico-social, atribuindo-
lhes poderes, prescrevendo-lhes deveres e definindo-lhes responsabilidades,
sendo a sanção a consequência imposta à violação das normas jurídicas. Esta
função traduz-se nas normas.
• Função Secundária ou Organizatória
A ordem jurídica estabelece as regras de organização da sociedade e das
instituições sociais – materializa-se através das instituições, determinando-lhes o
estatuto funcional e organiza os processos jurídicos de atuação da função primária.
Nesta função, a ordem jurídica constitui o seu próprio sistema ou ordenamento
jurídico, garantindo a sua coerência pela instituição de órgãos (tribunais) que

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impõem o cumprimento das sanções que aplicam pelo desrespeito das normas,
ainda que seja pelo uso da força.
A ordem jurídica exprime-se através das Normas Jurídicas que são um comando geral,
abstrato e coercível emanado por uma entidade superior.
As Fontes do Direito são de facto a origem deste, ou seja, são os processos ou modos
de criação e revelação das normas jurídicas que disciplinam o homem nas suas relações
sociais.
A expressão Fontes do Direito tem sido utilizada pelos diversos autores em vários
sentidos:
• Sentido sociológico-material
São Fontes do Direito todos os circunstancialismos sociais que estiveram na origem
de determinada norma jurídica.
Por exemplo: o aumento do parque automóvel nacional e a consequente
multiplicação de acidentes de viação deram origem ao Código da Estrada; a seca
deu origem à tomada de medidas compensatórias.
• Sentido histórico-instrumental
São Fontes do Direito os diplomas, ou monumentos legislativos, os instrumentos
que contêm normas jurídicas; incluem-se todos os documentos desde Lei das 12
Tábuas até às atuais constituições.
• Sentido político-orgânico
São Fontes do Direito os órgãos políticos que, em cada sociedade, estão
incumbidos de emanar ou aprovar normas jurídicas: a AR, o Governo, as
Assembleias Regionais, Municipais e de Freguesia.
• Sentido técnico-jurídico
As Fontes do Direito são os modos de formação e revelação das normas jurídicas;
evidencia a forma como é criada e se manifesta socialmente a norma jurídica.
São considerados a lei, o costume, a jurisprudência e a doutrina.
Saliente-se, no entanto, que alguns autores dizem que só a jurisprudência de
conteúdo normativo cria Direito e outros consideram que nem a jurisprudência
nem a doutrina são criadoras do Direito.
A posição destes últimos baseia-se numa distinção tradicional entre:
o Fontes imediatas do Direito – fontes que têm força vinculativa própria, pelo
que são consideradas os verdadeiros modos de produção de Direito. As Fontes
do Direito imediatas são as normas corporativas e a lei, assim como o costume,
caso a lei o determine.
No nosso ordenamento jurídico apenas se considera a Lei.
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Lei – norma jurídica proveniente de órgãos estaduais competentes, o Estado,


e que se impõe a todos os cidadãos.
Norma Corporativa – normas impostas por organismos representativos de
corporações, no domínio das suas atribuições.
o Fontes mediatas do Direito – fontes que embora não tenham força vinculativa
própria, são importantes pelo modo como influenciam o processo de formação
e revelação da norma jurídica.
LEI
A Lei ocupa hoje um lugar privilegiado dentro das fontes de direito, de cujas
modalidades é a mais importante.
O seu valor é imediato e direto, valendo por si só e independentemente de qualquer
outro fator, contrapondo-se assim aos usos, aos assentos e à equidade (legalmente
admitidos apenas como sendo fontes mediatas do direito) cuja força vinculativa
provém da lei, que define os termos e limites da sua obrigatoriedade.
Usos
Art. 3º CC – Os usos que não forem contrários aos princípios da boa fé são
juridicamente atendíveis quando a lei o determinar (…)
Assentos
Figura extinta CC – o art. 2º foi revogado pelo Decreto-Lei nº329-A/95, 12-12.
O art. 2º CC determinava, ao tratar das fontes do direito, que “nos casos declarados na
lei, podem os tribunais fixar, por meio de assentos, doutrina com força obrigatória
geral”. Esta norma permitia a alguns tribunais superiores proferir decisões, de natureza
geral e abstrata, que, à semelhança das leis, eram revestidas de “força obrigatória
geral”.
Sempre que se verificasse um conflito de jurisprudência, era aberto o recurso para o
tribunal pleno, o qual, para além de resolver o caso recorrido, emitia uma norma sob
a forma de assento que, após a publicação em Diário da República, adquiria força
obrigatória geral, passando a vincular os tribunais, os demais órgãos do Estado e o
comum dos cidadãos.
Acontece que esta vinculatividade assinalada pelos assentos dificilmente se
compaginava com uma Constituição, que dispunha no seu art.º 115º, nº5, que
“nenhuma lei pode criar outras categorias de atos legislativos ou conferir a atos de
outra natureza o poder de, com eficácia externa, interpretar, integrar, suspender ou
revogar qualquer dos seus preceitos”.
Face a isto, em 1993, o Tribunal Constitucional avaliou a constitucionalidade dos
assentos, acabando por prenunciar que o art.º 2º do CC é inconstitucional “na parte

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em que atribui aos tribunais competência para fixar doutrina com força obrigatória
geral…” – esta decisão pôs termos a este instituto.
Equidade
A Equidade é considerada a justiça do caso concreto.
As normas jurídicas são gerais e abstratas, sendo-lhes impossível prever todos os casos
singulares, extremamente variáveis. Assim, podem preceituar soluções que não se
mostrem as mais adequadas e justas na sua aplicação a determinados casos concretos,
consideradas as circunstâncias particulares que os acompanham.
Seria então segundo a Equidade que se resolveriam esses casos, permitindo ao juiz
afastar-se da norma, para que, atendendo às particularidades de cada caso,
encontrasse a solução mais justa, ou seja, a equidade adapta-se melhor ao caso
concreto do que a solução estabelecida na lei, da qual se afasta.
Porém, o recurso à equidade, porque dá lugar a um largo campo de atuação do
julgador, poderia implicar sérios riscos de incerteza e insegurança; daí que os
legisladores limitem a sua aplicação, pois o Direito, para além da justiça, tem como fim
a segurança jurídica.
Por tudo isto, a Ordem Jurídica portuguesa é muito restritiva na admissão da equidade
(o art. 4º do CC estabelece as condições para a resolução com recurso à equidade).
Art. 1º do CC
O nº 1 afirma expressamente que a lei é fonte imediata do Direito.
O nº 2 considera leis “todas as disposições genéricas provindas dos órgãos estaduais
competentes”.
Esta noção de lei compreende:
• As normas jurídicas emanadas da Assembleia da República (leis propriamente);
• As normas que procedem de outros órgãos estaduais com competência para as
elaborar (decretos-leis, decretos regulamentares, decretos, portarias, despachos
normativos) ou das autoridades locais, como por exemplo decretos das regiões
autónomas e regulamentos das autarquias locais.
Mas o que é a lei?
A palavra lei pode assumir diversos significados:
• Pode significar Ordenamento Jurídico (art. 13º da CRP);
• O ato normativo da Assembleia da República (art. 18º, nº 2 da CRP);
• Qualquer ato normativo (arts. 103º, nº 3 e 205º, nº 1 da CRP).
Segundo Kelsen são três, os pressupostos da lei:
• Autoridade competente;
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• Observância das formas previstas para essa atividade;


• Introdução de um preceito genérico.
Podemos então distinguir lei em sentido formal e lei em sentido material:
• Sentido Formal – lei é todo o ato normativo emanado de um órgão com
competência legislativa, independentemente de conter, ou não, uma verdadeira
regra jurídica, exigindo-se que se revista das formalidades relativas a essa
competência.
• Sentido Material – considera-se todo o ato normativo, emanado de um órgão do
Estado, mesmo que não esteja no exercício de função legislativa, desde que
contenha uma verdadeira regra jurídica (não obedece aos formalismos solenes ou
feita por órgãos sem capacidade legislativa) – (ex: uma portaria que aprove um
regulamento de exames).
Se no primeiro caso o que releva é o elemento formal do documento, ou seja, o modo
como surge no ordenamento jurídico; no segundo sentido vai-se atender à
matéria/conteúdo contida no diploma. Desta forma, há leis que só o são em sentido
material, outras em sentido formal e algumas que se revestem de ambos os sentidos.
Por exemplo:
• Formal – lei da AR que concede uma condecoração a um PR;
• Material – portaria que aprove o Regulamento dos Exames;
• Formal e Material – leis constitucionais, generalidade das leis ordinárias…
Podemos ainda distingui lei em sentido amplo, sentido intermédio e em sentido
restrito:
• Lei em Sentido Amplo
Lei é toda a norma formalmente prescrita por um órgão estadual com poderes
normativos (ex: decreto-lei, decreto regulamentar, portaria, etc.) – sentido
material.
• Lei numa aceção intermédia
Lei equivale à norma jurídica formalmente declarada por um órgão com poderes
legislativos e no exercício de tais poderes (leis da Assembleia da República,
decretos-leis do Governo, decretos legislativos regionais das assembleias
legislativas das regiões autónomas da Madeira e dos Açores).
• Lei em sentido restrito
O termo lei serve apenas para referir os diplomas legislativos elaborados pela
Assembleia da República – sentido formal.
É importante frisar:

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• As leis não são todas da mesma espécie;


• As leis não têm todas o mesmo valor.
Há diferentes categorias de leis e cada categoria corresponde a um valor próprio.
Pelo que as diferentes leis, em vez de disporem num mesmo plano, antes de
estruturam numa organização hierarquizada, com as leis mais importantes mais no
topo e as leis de menor valor relativo na base, sendo que estas não podem contradizer,
sob pena de ilegalidade, o que dispõem as leis superiores.
A Elaboração de uma Lei
Cada órgão dotado de competência legislativa tem o seu modo próprio de agir na
feitura das leis.
Salientemos a atividade legislativa da Assembleia da República e do Governo. As leis e
os decretos-leis constituem, sem sombra de dúvida, a parte mais volumosa do corpo
legislativo.
A Lei é elaborada pela Assembleia da República, o órgão legislativo por excelência, nos
termos dos art. 161º alínea c), 164º e 165º, CRP.
Já os Decretos-Lei são criados pelo Governo, de acordo com o art. 198º da CRP, relativo
às suas competências legislativas.
A lei e os decretos-lei são diplomas do mesmo valor, podendo uma lei alterar ou
revogar um decreto-lei e vice-versa, estes diplomas têm igual dignidade hierárquica.
Contudo, os art. 164º e 165º da CRP reservam à AR (e à lei) competência exclusiva
sobre certas matérias, as quais não poderão ser objeto de qualquer ato legislativo do
Governo (art. 164º) ou só poderão ser regidas por decreto-lei se a AR conferir ao
Governo autorização legislativa (art. 165º).
Quando as matérias sobre as quais o Governo vai legislar não estão reservadas à
Assembleia da República, o Governo entra em “concorrência” com a AR: fala-se então
Competência Legislativa Concorrente (art. 198º, nº 1, alínea a) da CRP).
Nos casos em que o Governo, no exercício das suas funções legislativas, trata de
matérias de competência relativa da Assembleia da República, precisa de uma Lei de
Autorização Legislativa: fala-se então de Competência Legislativa Concorrente
Dependente (art. 198º, nº 1, alínea b) da CRP).
Por último, o Governo ainda pode fazer decretos-lei em matérias da sua exclusiva
competência (art. 198º, nº 2 da CRP).
Por sua vez a Assembleia da República pode legislar em matérias de competência
absoluta e de competência relativa (arts. 164º e 165º da C.R.P).
Processo de Formação da Lei
• Iniciativa legislativa (art. 167º, nº1 da CRP)
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“A iniciativa da lei (…) compete aos deputados, aos grupos parlamentares e ao


Governo, e ainda, nos termos e condições estabelecidos na lei, a grupos de
cidadãos eleitores, competindo a iniciativa de lei, no respeitante às regiões
autónomas, às respetivas assembleias legislativas regionais”.
Assim:
o Quando a iniciativa cabe aos deputados, aos grupos parlamentares ou a grupos
de cidadãos eleitores (iniciativa parlamentar) – projeto de lei
o Se a iniciativa parte do Governo ou das assembleias legislativas regionais
(iniciativa governativa ou regional) – proposta de lei
• Discussão e aprovação (arts. 168º e 170º da CRP)
Após a entrega do projeto ou proposta de lei à Assembleia da República, este é ao
Plenário, podendo os deputados apresentar propostas de alterações.
Quando admitidos, o projeto ou proposta de lei, são enviados a Comissões
Permanentes Especializadas, que deverão elaborar um parecer fundamentado
sobre o mesmo.
A discussão no Plenário consiste em três passos:
o Discussão e votação na generalidade – sobre os princípios de cada diploma
apresentado;
o Discussão e votação na especialidade – sobre cada artigo, número ou alínea.
É neste momento que é permitido aos deputados apresentar propostas de
emenda ao texto, sugerindo modificações, aditamentos, etc.
Através da votação na especialidade fixa-se o conteúdo do preceito, optando a
Assembleia da República pelo texto original constante da emenda,
procedendo-se posteriormente a uma:
o Votação final global – concluída a votação na espacialidade, o texto deverá ser
de novo presente à Assembleia da República para a votação final global.
Além do processo legislativo ordinário, existe também o processo da urgência,
onde se pode dispensar o exame em comissão ou reduzir o respetivo prazo, limitar
o número de intervenções e uso da palavra pelos deputados e Governo e dispensar
o envio à comissão para redução final.
• Promulgação, referenda e publicação (arts. 136º, 140º e 119º da CRP)
O diploma já aprovado, é remetido para a Presidência da República a fim de ser
promulgado (art. 134º, alínea b) da CRP).
o Promulgação – o Presidente da República declara que o diploma passa a valer
como lei e ordena o seu cumprimento.

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Poderá dizer-se que a promulgação é também um ato de participação efetiva


do PR no processo legislativo, podendo, nos termos do art. 136º CRP, proceder
à apreciação do mérito jurídico (eventual inconstitucionalidade) e político do
diploma.
O Presidente da República, caso considere que a medida legislativa é
inconstitucional, pode exercer o poder de veto, devendo então solicitador nova
apreciação do diploma em mensagem fundamentada.
Se, mesmo assim, a AR confirmar o seu voto por maioria absoluta, o Presidente
deverá promulgar o diploma num prazo de oito dias.
o Referenda – o Primeiro-Ministro, como representante do Governo, tem de
referendar a promulgação do Presidente da República, sob pena de
inexistência jurídica da lei.
o Publicação – ato que consiste em levar a lei ao conhecimento geral dos
indivíduos; recorre-se ao Diário da República. O art. 119º nº2 dispõe que “a
falta de publicidade dos atos previstos nas alíneas… implica a sua ineficácia
jurídica”.
O processo de elaboração dos decretos-lei corresponde ao mesmo figurino,
com a só diferença de a discussão e aprovação ter lugar no Conselho de
Ministros (arts. 198º e 200º, nº1, alínea d) da CRP).
Assinaturas sucessivas: o texto do diploma é submetido separadamente à
assinatura do Primeiro-Ministro e de cada um dos ministros competentes. Uma
vez obtidas as assinaturas, o diploma é presente ao Presidente da República
para promulgação.
Aprovação em Conselho de Ministros: o texto do respetivo Decreto-Lei é
apresentado e aprovado em Conselho de Ministros, sendo depois enviado,
para promulgação para o Presidente da República.
Em caso de veto o Governo pode:
▪ Arquivar
▪ Alterar
▪ Enviar para a Assembleia da República sob a forma de Proposta de Lei
Início da vigência das leis
A Publicação de uma lei é feita no Diário da República, conforme o art. 119º CRP,
marcando-se assim o momento em que a lei se torna eficaz.
A falta de publicação de uma lei conduz à sua ineficácia jurídica, ou seja, a lei não
produz efeitos jurídicos.
No entanto, a lei não entra em vigor logo após a sua publicação.

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Se as leis definem os comportamentos jurídicos a que os cidadãos estão vinculados,


então é imperativo, para que possam exercer cabalmente esta função rectora, que
sejam levadas ao conhecimento de todos aqueles a quem se dirigem, dando-lhes a
saber o que juridicamente lhes é exigido. Ninguém pode confirmar a sua conduta a
uma norma cujo conhecimento prévio lhe é interdito.
Assim: para possibilitar aos destinatários da lei o conhecimento da sua existência e do
seu conteúdo difere-se o começo da vigência da lei para um momento superior ao da
sua publicação no Diário da República.
A lei só se torna obrigatória após o período de Vacatio Legis: período em que o diploma
legal, embora já existia juridicamente, não tem qualquer efeito.
Art. 2º, nº2 da Lei nº 74/98, de 11 de novembro – “Na falta de fixação do dia, os
diplomas entram em vigor, em todo o território nacional e no estrangeiro, no 5º dia
após a publicação”.
Este prazo só se aplica quando o legislador nada disser, pois pode acontecer que ele
próprio estabeleça em cada diploma a sua própria vacatio legis. Normalmente
verificam-se duas situações:
• Encurta-se o prazo, impondo-se a imediata entrada em vigor do diploma, quando
esta é de carácter urgente.
• Dilata-se o prazo de vacatio legis, por necessidade de adaptação e complexidade
de matéria.
Cessação da vigência das leis
Segundo o art. 7, nº 1 do CC: “Quando se não destine a ter vigência temporária, a lei
só deixa de vigorar se for revogada por outra lei”.
São assim dois, os modos mais comuns de cessação da vigência das leis:
• Caducidade – de uma lei ocorre perante uma lei tem temporária.
A própria lei determina a data em que deixará de estar em vigor, ou a data em que
entrará em vigor um novo diploma que a reveja.
A caducidade uma lei poder-se-á verificar também quando uma lei serve para
regular determinada realidade que se altera. Nesta hipótese a lei deixa de ter
sentido, caducando.
A caducidade da lei poderá ocorrer quando, por exemplo:
o Decorrer o prazo de vigência que a lei assinala;
o Cessar o estado das coisas (guerra, inundações, epidemias), que visava
disciplinar (leis transitórias);
o Desaparecer o objeto da sua regulamentação.

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• Revogação – de uma lei pressupõe a entrada em vigor de uma nova lei que
substitua a já existente: as leis novas revogam as leis antigas.
Quanto à sua extensão a revogação pode ser total ou parcial:
o Revogação total (ab-rogação) – a nova lei substitui totalmente a anterior;
o Revogação parcial (derrogação) – a nova lei só altera alguns normativos da
anterior.
Quanto à forma, a revogação pode ser expressa, tácita e de sistema:
o Revogação expressa – a nova lei diz que a lei existente está revogada;
o Revogação tácita – quando resulta, não de uma declaração expressa e formal
do legislador, mas da incompatibilidade entre o disposto na lei antiga e o que
a lei nova vem regular;
o Revogação de sistema – ocorre sempre que o legislador, através do novo ato
legislativo, revela a intenção de regulamentador total e esgotantemente
determinada matéria jurídica.
O art. 7, nº 2 refere-se precisamente a estas três formas de revogação: “a
revogação pode resultar de declaração expressa (revogação expressa), da
incompatibilidade entre as novas disposições e as regras precedentes (revogação
tácita) ou de circunstancias de uma nova lei regular toda a matéria da lei anterior
(revogação de sistema)”.
Importa ainda frisar aqui, os limites da revogação tácita: (art. 7 nº3 do CC):
o A lei geral não revoga a lei especial, exceto se for essa a intenção inequívoca
do legislador;
o A contrario, a lei especial posterior revoga a lei geral anterior, mas apenas no
âmbito restrito da sua aplicação.
Para finalizar, o nº 4 desse mesmo artigo define que: “a revogação da lei
revogatória não importa o nascimento da lei que esta revogara”.
Isso só acontecerá se o legislador o declarar expressamente através de uma
declaração repristinatória.
Hierarquia das Leis
• Constituição da República Portuguesa
• Convenções Internacionais
• Leis e Decretos-Lei
• Decretos-Regionais
• Decretos-Regulamentares

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• Decretos Regulamentares Regionais


• Resolução do Conselho de Ministros
• Portarias
• Despachos
• Posturas
Regras:
• As Leis de hierarquia inferior não podem contrariar as leis de hierarquia superior,
antes tem de se conformar com elas;
• As leis de hierarquia igual ou superior podem contrariar leis de hierarquia igual ou
inferior;
• A lei mais recente revoga a lei mais antiga.
Para estabelecer esta hierarquia há que distinguir:
• Leis ou normas constitucionais
O poder de estabelecer normas constitucionais denomina-se poder constituinte e
ocupa o lugar cimeiro do poder legislativo.
Constituição – lei fundamental de um Estado, a qual fixa os grandes princípios
fundamentais da organização política e da ordem jurídica em geral.
Deste modo, as leis ou normas constitucionais são aquelas que estão incluídas na
Constituição e que se encontram no topo hierárquico.
• Leis ou normas ordinárias
São todas as restantes leis ou normas e podem agrupar-se se em:
o Leis ou normas reforçadas
Art. 112º nº3 CRP – “têm valor reforçado, além das leis orgânicas, as leis que
carecem de aprovação por maioria de dois terços, bem como aquelas que, por
força da Constituição, sejam pressuposto normativo necessário de outras leis
ou que por outras devam ser respeitadas”.
▪ Lei orgânica (art. 166º nº2 CRP)
⎯ Lei que regula o estado e capacidade da pessoa
⎯ Lei que regula os direitos, liberdades e garantias
⎯ Lei que regula o regime de punição das infrações disciplinares
⎯ Lei que regula as bases do sistema da segurança social e do serviço
nacional de saúde…
(remissão para o art. 168º nº5 CRP)
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▪ Leis que carecem de aprovação por maioria de dois terços (art. 168 nº 6
CRP)
⎯ A lei que regula o exercício do direito de voto dos cidadãos portugueses
residentes no estrangeiro (art. 121 nº 2 CRP)
⎯ Lei que regula as restrições ao exercício de direitos por militares e
agentes militarizados dos quadros permanentes em serviço efetivo,
bem como por agentes do serviços e forças de segurança (art. 164º al.
o).
▪ Leis que por força da Constituição, sejam pressuposto normativo
necessário de outras leis ou que por outras devam ser respeitadas
⎯ Leis estatuárias (aprovam e incorporam os estatutos das Regiões
autónomas) – art. 161º e 226º CRP
⎯ Leis de autorização (autorizam o Governo a legislar sobre matérias da
competência de reserva relativa da AR – art. 112º nº 2 e 165º CRP
⎯ Leis de enquadramento (disciplinam as regras estruturantes de
determinados setores jurídicos – art. 106º nº 1 CRP
⎯ Leis de bases (estabelecem as bases gerais dos regimes jurídicos – arts.
112º nº 2, 164º alínea i), 165º nº1 alínea f)
RESUMINDO
Leis ou Normas Ordinárias Reforçadas:
▪ Encontram-se imediatamente abaixo das leis constitucionais
▪ Estas provêm de órgãos com competência legislativa, AR (leis), Governo
(decretos-lei) e Assembleias Legislativas Regionais (decretos legislativos
regionais)
▪ As leis e decretos-lei têm o mesmo valor e a mesma força obrigatória
o Leis ou normas comuns
Estão subordinadas às leis ordinárias reforçadas e encontram num nível
hierárquico abaixo destas; é o caso: dos decretos-regionais e dos decretos-
regulamentares.
É a Assembleia da República que compete, por excelência, o primeiro papel
legislativo e dela provêm as leis, moções e resoluções. (Porém só as leis
estabelecem verdadeiras regras jurídicas). Tem nomeadamente a competência
para elaborar alterações à Constituição, em matérias mais importantes possui
mesmo reserva absoluta para legislar, e sobre outras matérias (reserva relativa)
pode autorizar o Governo a legislar.

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O Governo, para além da competência legislativa própria tem competência


regulamentar que exerce fazendo os regulamentos necessários à boa execução
das leis. Na verdade, tanto a lei como decreto-lei necessitam por vezes de ser
“especificados” devido à generalidade com que foram elaborados.
Formas de regulamentos do Governo:
• Decretos Regulamentares – são diplomas emanadas pelo Governo, promulgados
pelo Presidente da República, e referendados pelo Governo.
• Resoluções do Conselho de Ministros – provêm do Conselho de Ministros e não
necessitam de promulgação pelo PR.
• Portarias – são ordens do Governo dadas por um ou mais ministros e não carecem
de promulgação pelo PR.
• Despachos – são diplomas que tem apenas como destinatário os subordinados do
ministro ou ministros signatários e valem unicamente dentro do Ministério
respetivo.
• Instruções – são meros regulamentos internos, contendo ordens dadas pelos
ministros aos respetivos funcionários, ou estabelecendo diretrizes para melhor
aplicação dos diplomas normativas.
• Circulares – designação dada às instruções quando estas são dirigidas a diversos
serviços.
• Decretos Regulamentares Regionais – são de âmbito regional (referentes às
regiões autónomas dos Açores e da Madeira).
• Posturas – regulamentos emanados das autarquias locais, provindos dos corpos
administrativos competentes.
RESUMINDO
Hierarquia das Leis:
• Constituição da República Portuguesa – fixa os grandes princípios da ordem política,
social e económica, e estabelece nomeadamente o regime jurídico de produção e
modificação de normas jurídicas. Por isso se designa por lei primária. Juntamente
com a CRP estão as leis constitucionais ou de revisão.
• Direito Internacional – de acordo com o art. 8 CRP, as normas de direito
internacional são parte constituinte do Direito português, desde que devidamente
aprovadas e ratificadas.
Em linguagem corrente por Direito Internacional entende-se Direito Público,
contudo existe também o Direito Internacional Privado, regulador das relações
entre indivíduos pertencentes a diferentes Ordens Jurídicas.

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Direito Internacional Público – conjunto de regras e princípios decorrentes de um


processo que não é especifico de um só Estado, mas que resulta da convergência
de vários Estados, ou da manifestação da vontade de outras entidades
internacionais, como as Organizações internacionais.
Devido à inexistência de entidades que possam aplicar a coercibilidade,
poderíamos não falar em Direito Internacional mas de Moral Internacional,
baseada no princípio de Pact Sunt Servanda.
De acordo com o art. 38º do Estatuto do Tribunal Internacional de Justiça, as fontes
mais importantes do Direito Internacional são:
o O costume internacional, resultante de uma prática geral de procedimento
uniforme e constante, aceite como juridicamente obrigatória pelos membros
da sociedade internacional nas suas relações recíprocas
o Convenções internacionais, que estabelecem normas expressamente
reconhecidas pelos Estados celebrantes
o Atos das organizações internacionais, quer sejam decisões ou deliberações
(conforme provenham de órgão singular ou coletivo); quer sejam princípios
gerais do direito reconhecidos e aceites pelas chamadas “nações civilizadas”, e
cuja importância é decisiva na regulamentação das relações internacionais
o Os tratados
▪ Os tratados são, de acordo com Charles Rousseau, acordos celebrados
entre membros da sociedade internacional que têm por objeto a produção
de efeitos de Direito, ou seja um acordo de vontades, em forma escrita,
entre sujeitos de Direito Internacional, que resulta na produção de efeitos
jurídicos.
▪ De acordo com a Constituição da República Portuguesa as normas
pertencentes aos tratados internacionais depois de aprovadas pela
Assembleia da República (art. 161.º, alínea i) da CRP), ou pelo Governo (art.
191º, n.º 1, alínea c) da CRP), ratificadas pelo Presidente da República (art.
135º, alínea b) da CRP), e publicadas no Diário da República (art. 119º, n.º
1, alínea b) da CRP), passam automaticamente a fazer parte do Direito
português (art. 8º, n.º 2 da CRP).
O problema da eficácia do Direito Internacional: o Direito interno possui um
aparelho institucionalizado que utiliza quando necessário para impor a norma. No
que se refere ao Direito Internacional a criação de um sistema geral de sanções por
parte do ordenamento internacional está ainda longínqua.
As disputas entre os Estados raras vezes são levadas a Tribunal Internacional. Com
efeito, o Direito Internacional possui sanções, mas a sua eficácia é bastante
precária. Podemos afirmar que a aceitação voluntária por parte dos Estados de
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normas de Direito Internacional constitui frequentemente o modo mais eficaz de


dirimir os conflitos sem recurso ao uso da força.
O Direito Comparado assume assim grande importância, pois confronta as várias
Ordens Jurídicas, fazendo ressaltar as suas analogias e as suas diferenças. O Direito
Comparado permite ao legislador interno obter determinados pontos de
referência, que lhe poderão ser úteis quando tenha de legislar sobre certas
matérias iguais ou análogas.
A verdade é que, hoje, muitas das normas em vigor na Ordem Jurídica têm uma
origem em actos internacionais.
O art. 8º da CRP faz referência a estas normas. Da última parte do n.º 2 claramente
se infere que os preceitos de origem internacional ocupam, dentro da hierarquia
das leis, um lugar logo a seguir ao das normas constitucionais.
• Atos normativos – as leis, os decretos-leis e os decretos legislativos regionais. As
leis e os decretos-lei, excetuando as leis com valor reforçado, como por exemplo
as leis de autorização legislativa, têm o mesmo valor, conforme art. 112º da CRP.
• Atos de Administração – regulamentos e atos administrativos, nomeadamente
decretos regulamentares, decretos regulamentares regionais, resoluções do
conselho de ministros, portarias, despachos, instruções, circulares e posturas
locais.
JURISPRUDÊNCIA
É a orientação geral seguida pelos tribunais no julgamento dos casos concretos da vida
social, assim como as decisões por estes tomadas nos litígios que lhes são submetidos.
Estas decisões chamar-se-ão sentenças, se proferidas por um tribunal singular, ou
acórdãos se proferidas por um tribunal coletivo.
Uma questão que se coloca é a de saber se esses modos de decidir têm validade além
do respetivo processo, criando regras para os casos futuros.
Nalguns casos, como nos países da common law (EUA, Reino Unido, etc.), estas
decisões poderão ter caráter vinculativo fora dos casos a que se reportam, podendo
assim a Jurisprudência ser considerada fonte imediata de Direito.
O mesmo não se aplica, no entanto, a Portugal, onde as decisões dos juízes não valem
fora dos casos específicos a que se reportam.
Entre nós, o juiz tem de julgar unicamente de “harmonia com a lei e a sua consciência”,
sendo perfeitamente irrelevante que a sua decisão contrarie a que tenha sido tomada
por outro tribunal, ainda que de categoria mais elevada. Apesar de não ser fonte
imediata, desempenha uma importante função na formação de uma consciência
jurídica geral.
DOUTRINA
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Compreende as opiniões e pareceres de jurisconsultos e outros especialistas. Consiste


em artigos, monografias, etc.
Na Ordem Jurídica Portuguesa a doutrina não é considerada fonte do Direito. O valor
de uma opinião, por mais categorizado que seja o jurista que a emite, não lhe confere
razão extrínseca, do caráter formal, que a imponha como obrigatória.
Será uma fonte mediata, dado que contribui de forma extremamente relevante para a
formação do Direito, para a sua atualização e aperfeiçoamento.
COSTUME
Fonte mediante de Direito, que se forma espontaneamente em qualquer sociedade. É
também conhecido por Direito Consuetudinário. Para se verificar a existência de
costume, impõem-se duas condições cumulativas:
• Corpus – prática constante ou uso
A base de todo o costume é uma repartição de práticas sociais que podemos
designar por usos sociais.
• Animus – convicção da sua obrigatoriedade.
Não basta o uso para que o costume exista: é necessário que seja acompanhado
da consciência da sua obrigatoriedade, ou seja, a prática só leva à criação de uma
norma quando as pessoas se convencerem de que aquela prática não é algo de
arbitrário, mas é isso sim vinculativo e essencial à vida em comunidade.
Poderemos, assim, definir costume como um conjunto de práticas sociais reiteradas e
acompanhadas da convicção da sua obrigatoriedade.
O Direito Consuetudinário surgiu em Portugal a Lei da Boa Razão de 1769 que
condicionava o costume aos seguintes requisitos:
• Não ser contrário à lei expressa
• Ter pelo menos 100 anos
• Ser conforme à boa-razão
Os Tratados Internacionais
Os Tratados serão fontes de Direito se uma ou mais das suas disposições previr a
inserção de normas jurídicas na ordem jurídica interna dos seus signatários. De acordo
com a Constituição da República Portuguesa, as normas dos Tratados, depois de
aprovadas pela Assembleia da República (ou Governo), terão de ser ratificadas pelo
Presidente da República e publicadas em Diário da República.
As normas emanadas dos órgãos competentes das organizações internacionais a que
Portugal pertence vigoram diretamente na ordem interna, desde que isso se encontre
expressamente previsto nos respetivos tratados.

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As normas emanadas pela UE sob a forma de regulamentos e diretivas vigoram


diretamente na Ordem Jurídica interna portuguesa.
Interpretação da lei
A interpretação das normas é um pressuposto indispensável da sua aplicação, sendo
sempre necessária e constitui uma das tarefas mais importantes do jurista. Logo, é
preciso saber interpretar as disposições legais reguladoras da atividade social.
Consiste na determinação ou fixação do exato sentido com que a lei deve ser aplicada.
Toda a norma, por mais clara que aparente ser – ao contrário do suposto na máxima
“ubi claris non fit interpretatio” – requer sempre algum trabalho de interpretação,
mesmo que instantâneo, pois esta só poderá ser entendida através da interpretação
das frases e palavras por que se expressa.
A interpretação permite determinar ou fixar o exato sentido ou alcance com que a
norma deve valer.
Existem vários fatores que contribuem para que a interpretação seja uma necessidade:
o texto pode comportar múltiplos sentidos (termos ambíguos ou obscuros), conceitos
de difícil determinação e pela generalidade das leis (indefinidos casos e generalidade
de indivíduos).
Esse conjunto de critérios ou princípios gerais orientadores da atividade interpretativa
e que garantem um mínimo razoável de uniformidade de soluções e a indispensável
segurança jurídica, constituem o que pode chamar-se de metodologia da interpretação
ou Hermenêutica Jurídica.
As formas de interpretação poderão ser:
• Interpretação autêntica
Operação realizada pelo próprio órgão legislador, mediante uma lei de valor igual
ou superior à lei interpretada: são as denominadas leis interpretativas (têm a força
vinculativa própria da lei).
Trata-se de uma lei interpretativa que fixa o sentido decisivo da lei.
Por exemplo: quando a Assembleia da República interpreta por meio de uma nova
lei (lei interpretativa) disposições normativas de uma lei anterior, a interpretação
que faz é autêntica. Esta interpretação é dotada de força vinculante geral.
• Interpretação oficial
Operação levada a cabo através de uma norma de valor hierárquico inferior ao da
norma interpretada.
Por exemplo: o Ministro que por despacho fixa o sentido de normas constantes de
um decreto-lei procede a uma interpretação oficial.

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Neste caso a interpretação só é obrigatória para os serviços dependentes do


Ministro respetivo.
• Interpretação doutrinal
Operação efetuada por jurisconsultos ou outras pessoas dedicadas ao estudo do
direito, na decisão ou apreciação de casos concretos.
Nesta hipótese a interpretação não tem força vinculativa própria, possui apenas
uma força que resulta tão-só do “poder de persuasão” dos argumentos em que se
funda (tantum valet, quantum probat).
Alguns autores referem ainda a Interpretação Judicial: interpretação realizada
pelos tribunais no âmbito de um processo judicial, não tendo qualquer valor
vinculativo fora deste.
Elementos de interpretação
Fatores ou instrumentos que o intérprete deve utilizar para fixar o sentido da lei.
Estes elementos aparecem vulgarmente agrupados em duas grandes categorias:
• Elemento gramatical/literal
Este elemento tem como função excluir os sentidos da lei que não tenham
qualquer apoio ou correspondência nas suas palavras, e sugerir perante normas
que comportam mais do que um sentido, aquele que mais corretamente se encaixa
na sua letra.
A letra da lei representa o ponto de partida da interpretação, assim como o seu
elemento base.
Este elemento consiste assim na utilização das palavras da lei, isoladamente e no
seu contexto sintático, para determinar o seu sentido possível.
Todavia, é necessário recorrer a outros elementos, devido às dificuldades que o
texto legislativo frequentemente comporta e que dificultam a determinação do seu
sentido e alcance (expressos anteriormente).
Por isto, é indispensável considerar o “espírito da lei”, porque apreender o sentido
das leis não é só conhecer as suas palavras, mas também penetrar na sua força e
poder – “scire leges non hoc est verba earum tenere, sed vim ac potestem”.
• Elemento lógico
Consiste no “espírito da lei”, isto é, no seu sentido mais profundo.
Subdivide-se em três outros elementos:
o Elemento histórico
Este elemento compreende todos os dados ou acontecimentos históricos que
explicam a criação da Lei.
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São estes:
▪ Os Precedentes Normativos – constituídos pelas normas que vigoram em
períodos anteriores e que são objeto da História do Direito, como pelas
normas de Direito estrangeiro que tiveram influência na formação da lei.
▪ Os Trabalhos Preparatórios – estudos prévios, os anteprojetos e projetos
de lei, as respostas a críticas feitas aos projetos, as atas das comissões
encarregadas da elaboração do projeto ou da sua discussão, que precedem
a lei e documentam o processo da sua elaboração.
▪ Occasio Legis – conjunto de circunstâncias (políticas, sociais, económicas,
morais, etc.) que envolveram e influenciaram o aparecimento da lei – as
circunstâncias em que a lei foi elaborada.
o Elemento sistemático
Quando se recorre a este elemento, o intérprete deve situar a norma a
interpretar no ordenamento jurídico, atendendo ao espírito e unidade que lhe
são próprios, e ponderar as relações que essa norma tem com as restantes
normas.
Assim, considera-se aquilo que se chama o contexto da lei (ponderam-se as
relações que a norma a interpretar tem com o conjunto de disposições a que
ela pertence e que regulam a mesma matérias ou instituto), e os lugares
paralelos (consideram-se as relações que a norma a interpretar tem com outras
disposições legais que, embora distanciadas, regulam problemas normativos
paralelos ou afins).
o Elemento teleológico/racional
Consiste na razão de ser da lei, no fim ou objetivo que o legislador teve em vista
ao elaborar a norma (ratio legis), devendo ser acompanhada do conhecimento
das circunstâncias ou condições históricas em que ela foi elaborada (occasio
legis).
De facto, é a interpretação teleológica que nos revela os interesses que com a
providência legislativa se quiseram acautelar, qual a sua importância relativa,
que interesses se sacrificaram, numa palavra, se apreende a racionalidade
intrínseca da lei.
A existência de uma crise laboral ou habitacional, a constatação de abusos, são
circunstâncias que, se situadas na origem da publicação da lei, podem tomar
uma importância decisiva no processo da sua interpretação.
Resultados da interpretação

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Concluída a tarefa interpretativa, encontrar-se-á normalmente o intérprete perante


um sentido da lei que tem por decisivo. É com esse sentido que a lei, na sua opinião,
deverá valer.
Mas qual a correspondência do sentido eleito à letra da lei? A utilização do elemento
lógico estará conforme/ajustado à expressão textual da lei?
É a propósito desta questão que a doutrina costuma distinguir, dentro dos resultados
da interpretação, as seguintes modalidades:
• Interpretação declarativa
Elege-se um dos sentidos que o texto direta e claramente comporta, por ser esse
o que corresponde ao pensamento legislativo.
Entende-se que a letra da lei coincide com o espírito da lei.
Diz-se que há interpretação declarativa quando o sentido que o intérprete fixou à
norma coincide com o significado literal ou um dos significados literais que o texto
comporta, por ser o que corresponde ao pensamento legislativo.
A interpretação declarativa pode ser lata ou restritiva, consoante o sentido mais
amplo ou restrito dado a algumas palavras que têm mais do que um significado.
Porém, em ambos os casos trata-se de sentidos que cabem dentro do texto e não
ultrapassa o significado gramatical do termo/expressão empregue.
Por exemplo: o artº1 do CC de 1867 determinava: “só o homem é suscetível de
direitos e obrigações”.
A palavra “homem” pode ser interpretada:
o Num sentido lato – ser humano (homem mulher e crianças), interpretação
declarativa lata
o Num sentido mais restritivo – ser humano do sexo masculino, interpretação
declarativa restritiva
• Interpretação extensiva
Entende-se que a letra da lei fica também aquém do seu espírito, pelo que se torna
necessário distender a letra da lei para captar o seu espírito, para captar o sentido
com que a lei deve efetivamente valer (o legislador disse menos do que queria –
minus dixit quam voluit).
Haverá lugar à interpretação extensiva sempre que o legislador aludiu à espécie
quando, na realidade, queria referir-se ao género; quando fala em filhos com o
sentido de descendente; ou fala na venda com o significado de alienação.
Em todos estes casos, a fixação do sentido verdadeiro da lei obriga a uma
compreensão alargada das suas palavras, portanto, à interpretação extensiva do
seu texto.

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Quando a letra do texto fica aquém do espírito da lei (a fórmula adotada diz menos
do que aquilo que se pretendia dizer), o intérprete alarga ou estende o texto,
dando-lhe um alcance conforme ao pensamento legislativo e faz corresponder a
“letra” ao “espírito” da lei.
Não se trata de uma lacuna da lei, pois os casos não diretamente abrangidos pela
“letra” são inequivocamente abrangidos pelo “espírito” da lei.
A interpretação extensiva assume normalmente a forma de “extensão teleológica”:
quando a própria “ratio legis” postula a aplicação a casos que não são diretamente
abrangidos pela letra da lei, mas são abrangidos pela finalidade da mesma.
• Interpretação restritiva
Quando o intérprete conclui que o legislador adotou um texto que atraiçoa o seu
pensamento, na medida em que se diz mais do que o que se pretendia dizer (maius
dixit quam voluit) – a significação das palavras é mais ampla do que aquilo que ele
pretendia.
Por exemplo: quando o legislador menciona os descendentes com o sentido de
filhos, ou se refere a filhos querendo apenas abranger os filhos do casamento, ou
quando refere genericamente o homem para abranger apenas os homens casados.
Em todas estas situações, o intérprete deve então restringir o texto, isto é, encurtar
o significado das palavras utilizadas pela lei, de modo a harmonizá-las com o
pensamento legislativo.
• Interpretação enunciativa
É aquela pela qual o intérprete deduz de uma norma um preceito que nela apenas
está virtualmente contido (denominado sentido oculto), utilizando para tal certas
técnicas lógico-jurídicas que assentam nos seguintes argumentos:
o Argumento de maioria de razão ou a fortiori (“a maiori ad minus” e “a minori
ad maius”)
A lei que permite o mais também permite o menos (se é autorizada a alienação
de certos bens deve logicamente admitir-se que também é autorizada a sua
oneração).
A lei que proíbe o menos também proíbe o mais (proibindo-se a oneração,
logicamente se proíbe também a alienação).
o Argumento “a contrario” ou “a contrario sensu”
Deduz-se da disciplina “excecional” estabelecida para certo caso, um princípio-
regra de sentido contrário para os casos não abrangidos pela norma excecional.
Assim, seria fácil deduzir do disposto no art. 1143º CC o princípio de que a
validade formal dos contratos de mútuo não abrangidos na respetiva hipótese

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é independente da adoção de qualquer forma (princípio da consensualidade –


art. 219º CC).
Nota:
O argumento “a contrario” apenas terá força plena quando se consiga mostrar
a existência de uma implicação intensiva entre a hipótese e a estatuição, ou
sempre que seja possível demonstrar que a norma em causa exprime deveras
um “ius singulare”.
o Argumento das relações entre meios e fins
Este argumento apoia-se nas relações lógicas que se estabelecem entre meios
e fins, permitindo concluir, nomeadamente, que se uma lei proíbe um fim,
também proíbe os meios que o produzem, assim como se impõe a realização
de um fim, também há-de consentir os meios que o garantem.
• Interpretação revogatória ou ab-rogante
Quando a fórmula normativa é tão mal inspirada que nem sequer consegue aludir
com uma clareza mínima às hipóteses que pretende abranger e tomada à letra,
abrange outras que não estão no espírito da lei.
Em tais hipóteses, a atividade interpretativa revela apenas a necessidade de
desatender ao disposto numa norma, tendo-a por não escrita ou considerando-a
revogada. E é este resultado que legitima a denominação de revogatória ou ab-
rogante dada esta modalidade de interpretação.
A interpretação revogatória ou ab-rogante terá lugar apenas quando entre duas
disposições legais existir uma contradição insanável, ou seja, ocorrerá quando, não
obstante aos esforços interpretativos, se tem de concluir que a norma carece de
todo e qualquer sentido ou que repete inutilmente o que outra norma de modo
inequívoco determina.
Nos casos em que fórmula utilizada pelo legislador, apesar de incongruente, ainda
permite descobrir ou fixar à lei um sentido válido, fala-se em interpretação
corretiva.
Art. 9º do CC
Os três fatores mais importantes a ter em conta para uma boa interpretação:
• Unidade do sistema jurídico
• Circunstâncias em que a lei foi elaborada
• Condições específicas do tempo em que é aplicada

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Integração da lei: preenchimento de lacunas


Todas as situações carecidas de regulamentação jurídica exigem uma resposta de
Direito. A ordem jurídica deve assegurar que toda a situação capaz de pôr um
problema ao direito receba dele uma adequada solução.
Não obstante o ordenamento jurídico nacional ser constituído por um vasto conjunto
de leis, a verdade é que nunca estas conseguem abranger e contemplar diretamente
todas as situações da vida social que necessitam da disciplina jurídica.
Com efeito, a vida real é bem mais rica e variada em hipóteses do que a imaginação do
legislador em prevê-las, dando por vezes origem a situações da vida social que eram
imprevisíveis no momento da elaboração da lei, ou que, embora previsíveis, escaparam
contudo à efetiva previsão do legislador.
Voluntária ou involuntariamente, portanto, podem surgir espaços vazios no direito,
isto é, espaços que colocam problemas ao direito e que não encontram nele uma
norma que lhes seja diretamente aplicável. A estes espaços carecidos de
preenchimento normativo dá-se o nome de lacunas ou casos omissos.
Assim:
• Existe uma lacuna quando uma determinada situação, merecedora de tutela
jurídica, não se encontra prevista na lei.
• Perante estas situações deverá procurar-se a integração de lacunas (encontrar
uma solução jurídica para os casos omissos).
• Deverá, averiguar-se primeiramente que não há nenhuma regra aplicável, que o
caso não está especificamente regulado.
Razões que estão na origem do problema das lacunas:
• Situações novas que o legislador não consegue prever
• Situações demasiado complexas ou “recentes” que levam o legislador a não legislar
Problema
A questão fundamental que as lacunas suscitam é a do seu procedimento.
Colocado o intérprete, designadamente o julgador, perante uma situação real não
regulada por qualquer norma jurídica, isto é, em face de uma lacuna da lei, como
deverá proceder?
Poderíamos à primeira vista pensar que o facto de determinada situação não ser
regulada por lei alguma, significaria a sua irrelevância para o direito, constituindo um
caso extrajurídico.
Todavia, esta posição é excluída pelo art. 8.º do Cód. Civil.

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Princípio da proibição de denegação de justiça: os juízes não podem abster-se de julgar


com fundamento na falta, obscuridade ou ambiguidade da lei (art. 8.º do CC) –
proibição do non liquet.
É de notar que o tribunal só é obrigado a julgar quando o caso submetido à sua
apreciação deva ser juridicamente regulado, isto é, mereça a tutela jurídica. Seria na
verdade inadmissível que os tribunais tivessem de decidir situações que se devem
considerar antes no seu âmbito da cortesia ou das convenções sociais.
Como por exemplo: um indivíduo viesse a exigir a tribunal que um seu conhecido fosse
condenado a cumprimentá-lo, quando com ele se cruzasse na rua.
Em presença, portanto, de um caso omisso (casos não regulados mas merecedor da
tutela jurídica), e dado o disposto no art. 8º CC, deve o julgador integrar a lacuna da lei
atendendo ao art. 10º CC, que estabelece:
“1 – Os casos que a lei não preveja são regulados segundo uma norma aplicável aos
casos análogos.”
“2 – Há analogia sempre que no caso omisso procedam as razões justificativas da
regulamentação do acaso previsto na lei.”
“3 – Na falta de um caso análogo, a situação é resolvida, segundo a norma que o
próprio intérprete criaria, se houvesse de legislar dentro do espírito do sistema.”
De acordo com este preceito:
• A primeira tarefa do intérprete consiste no recurso à analogia, aplicando ao caso
omisso a norma reguladora de um caso semelhante. É necessário é que exista um
caso análogo regulado por lei
• Não basta, porém, encontrar vagas semelhantes entre o caso omisso e o regulado
para fundamentar o recurso à analogia, antes se torna necessário, que as razões
justificativas do regime fixado para a situação legalmente prevista se mostrem
válidas e adequadas para a questão não prevista
Dada esta identidade de interesses, o princípio da igualdade de tratamento (casos
semelhantes devem ter um tratamento semelhante) impõe a aplicação ao caso omisso
da norma que rege o caso análogo. No entanto, o procedimento analógico só estará
legitimado depois de se ter cuidadosamente comprovado que os interesses são
análogos e que é, em ambos os casos, a mesma a razão de decidir.
Por exemplo: “O Código Comercial estabelece que nos arts. 29.º e ss. algumas regras
sobre a escrituração dos comerciantes (comerciantes em nome individual e sociedades
comerciais): que livros de escrituração devem ter, por exemplo.”
Ora, de alguns artigos do Código Civil se vê que as sociedades civis devem ter
igualmente a sua escrituração – ver por exemplo arts. 988º e 1014º. Mas a escrituração
das sociedades civis não está regulada.

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Aplicar-se-ão por analogias regras respeitantes à escrituração dos comerciantes?


• Se a razão de ser dos arts. 29º e ss é a de regulamentar… uma escrituração
ordenada, em geral, pode aplicar-se a entidades que não são comerciantes. É o
que parece ser o mais correto.
• Se a razão de ser nos arts. 29º e ss. é a da regulamentar uma escrita comercial,
atendendo às particularidades desta, a analogia não seria possível.”
Um outro exemplo:
O art. 939º do CC ao determinar que a sujeição dos “outros contratos onerosos pelos
quais se alienem bens ou se estabeleçam encargos sobre eles” às regras da compra e
venda , opta, no preenchimento regulamentar de todo este espaço negocial, pelo
procedimento analógico.
Um contrato como a troca (permuta de bens por bens), terá a disciplina que para ele
derivar da aplicação adaptada ou analógica dos arts. 874º a 938º do CC.
Toda a remissão material, como a que se faz neste art. 939º, implica o recurso à
analogia. De facto, a norma ad quam (a norma para que se remete) só analogicamente
se poderá aplicar à questão visada pela norma remissiva.
Situação
• Regra geral
o Sempre que possível deve-se fazer recurso à analogia com uma norma
existente no sistema
o Na falta de norma que regule um caso análogo, haverá que proceder nos
termos do art.10º, nº3 CC, para efeitos de elaboração de uma norma “ad hoc”
Analogia
Analogia consiste em aplicar ao caso omisso a norma reguladora de qualquer caso
análogo. A aplicação analógica distingue-se da interpretação extensiva, porque
enquanto a primeira leva a uma aplicação da lei a situações não abrangidas nem na
letra nem no seu espírito, o segundo pressupõe uma situação que não está
compreendida na letra da lei mas está no seu espírito.
Podemos falar de dois tipos de analogia:
• Analogia legis – a analogia que se faz por recurso a uma norma vigente
• Analogia iuris – tem lugar quando a lacuna é preenchida por princípios jurídicos
assentes em várias normas ou pela aplicação de princípios jurídicos gerais (boa fé,
proibição do abuso do direito, etc.).
• Recurso à analogia porquê?

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Justifica-se por uma razão de coerência normativa e de respeito pelo princípio da


igualdade de tratamento, e Razão de certeza do Direito (valores da certeza e
segurança jurídicas).
• Proibições do uso da analogia
Não se aplica a analogia quanto às:
o Normas Excecionais (art. 11º CC) – as normas excecionais não comportam
aplicação analógica, mas admitem a interpretação extensiva. Significa esta
disposição que se excluem da aplicação analógica as regras que contrariam
princípios fundamentais informadores da Ordem Jurídica ou de um ramo do
Direito em particular, só se podendo utilizar a interpretação extensiva.
A aplicação analógica da lei distingue-se da interpretação extensiva, visto a
primeira conduzir à aplicação de uma lei a casos que ela não contempla nem
na letra nem no espírito, ao passo que a segunda se limita a aplicar a lei a
situações deficientemente abrangidas na pela sua letra, mas compreendidas
no seu espírito, em virtude do legislador, ao elaborar a norma, ter dito menos
do que pretendia.
Razão de ser desta restrição: a proibição decorre do pressuposto de que, se o
caso não cabe nem na letra nem no espírito da norma, é porque pertence ao
domínio de regulamentação do princípio (norma geral) de que ela, a norma
excecional, justamente constitui uma exceção.
o Normas Penais Incriminadoras (relação com o princípio mallum crime sine lege)
Art. 1º Código Penal – Princípio da Legalidade: “só se pode punir atos que já
sejam crimes à data da sua prática” – princípio da não retroatividade da lei; não
é permitido a analogia para qualificar o facto como crime, definir um estado de
perigosidade ou determinar a pena/medida de segurança que lhe corresponde.
Para além da analogia é também proibido o recurso à interpretação extensiva.
Tal facto deve-se à salvaguarda da liberdade individual contra abusos de poder.
Razão de ser da restrição: trata-se de defender o cidadão do poder punitivo do
Estado, dando ao princípio nullum crimen sine lege o seu justo alcance.
o Normas de Direito Fiscal – não é permitida a analogia em relação às normas de
incidência e às que definem as garantias dos contribuintes.
Não é possível a analogia por causa do princípio da legalidade.
Art. 103º nº3 CRP – “ninguém pode ser obrigado a pagar impostos que não
tenham sido criados nos termos da Constituição, que tenham natureza
retroativa ou cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da lei”.
Criação de uma norma ad hoc pelo julgador

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Na falta de caso análogo, regulado por lei, o julgador tem que: elaborar e formular uma
norma “ad hoc” (uma norma cuja validade está circunscrita à resolução do caso omisso)
que contemple o tipo de casos em que se integra o caso omisso, dentro do espírito do
sistema (art. 10º nº 3 CC), capaz de fazer o sistema concluso na direção do caso
concreto, em função das particularidades da situação em análise.
Verificando-se uma lacuna da lei, e na falta de caso análogo, deve o intérprete criar a
norma que, sem violar os princípios fundamentais do ordenamento jurídico
estabelecido, julgue melhor e mais razoável para o tipo de casos em que a situação
omissa se integra, aplicando-se seguidamente ao caso concreto.
Porém, isto não significa que seja legítimo ao julgador o recurso à equidade, à justiça
do caso concreto, tendo em vista as particularidades da situação omissa e
disciplinando-a atendendo predominantemente a essas mesmas particularidades.
Isto é, o julgador não poderá fundamentar a sua decisão na livre apreciação das
circunstâncias do caso decidendo, resolvendo-o do modo que pessoalmente
considerar mais justo ou conveniente.
Pelo contrário, terá antes de isolar, dentro do caso decidendo, aqueles elementos que
são tipicamente dotados de relevância jurídica, criando para eles a normas que o
legislador, na hipótese de haver previsto a situação lacunosa, muito provavelmente
determinaria.
Deve, pois, elaborar (idealmente) a norma mais adequada não para o caso omisso em
si mesmo mas para o género de casos em que ele se integra, completando assim “o
sistema legal onde se mostra que o legislador o deixou por acabar”.
Há-de pois o julgador atuar, como dizia o Professor Doutor Manuel de Andrade, com
“a ideia de ter de manter-se o estilo do sistema, a sua traça geral, a sua fisionomia
típica”.
A norma que o juiz cria será dotada, apenas, de validade singular, vinculando apenas o
caso omisso, sem que de modo algum adquira força decisória para futuros casos do
mesmo tipo ou para outros julgadores.
O problema da aplicação da lei no tempo
Cabem ao Direito duas funções tendencialmente antinómicas:
• Função estabilizadora
Ser capaz de garantir a continuidade da vida social, os direitos e as expectativas
legítimas das pessoas.
• Função dinamizadora e modeladora
Ser capaz de ajustar a ordem jurídica estabelecida à evolução social, e de promover
a sua evolução num determinado sentido.

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Sabemos já que quando uma lei é posta em vigor numa certa coletividade tal facto não
significa que a sua vigência se mantenha indefinidamente no tempo, sendo sempre
possível revogá-la por meio de outra lei posterior.
Ora se uma lei nova, revogando outra anterior, estabelece uma disciplina diferente
para a mesma espécie de situações, poderá levantar-se o problema de saber por qual
das leis devem ser reguladas aquelas relações constituídas no domínio da lei antiga que
se mantenham depois da entrada em vigor da lei nova ou que, na vigência desta,
venham a ser apreciadas.
O problema de aplicação das leis no tempo surge quando se realizam cumulativamente,
as seguintes condições:
• Duas ou mais leis sucedem-se no tempo, regulamentando de forma diferente a
mesma questão jurídica
• Uma situação jurídica entra em contacto “temporal” com essas leis
Questão:
• Averiguação da lei temporalmente competente.
• Aplicamos a lei que vigorava no momento em que a situação jurídica se constitui
(lei antiga) ou será antes a que vigora no momento presente (lei nova)?
Por exemplo:
• Determinada lei vem instituir o divórcio num país, cuja legislação até aí o não
admitia. Será a nova lei aplicável apenas aos casamentos celebrados após a sua
entrada em vigor ou será de aplicar também aos celebrados anteriormente?
• A e B celebram um contrato de compra e venda dum imóvel num momento em
que a legislação em vigor o considerava perfeito independentemente de qualquer
formalidade externa. Tempos depois é publicada uma lei nova exigindo escritura
pública para a validade de tais contratos.
Se o contrato celebrado entre A e B for apreciado em tribunal no domínio da lei
nova, deve ou não ser considerado válido?
• A lei em vigor no momento de celebração do casamento fixava em 14 anos a idade
nupcial; uma lei posterior elevou para 16 anos essa idade.
Poderá o casamento ser anulado, agora, sob o pretexto que um dos nubentes tinha
15 anos à data da realização do matrimónio (lei nova)?
Questão: qual a lei temporalmente competente?
Hipóteses:
A) A lei que vigorava no momento em que a situação jurídica se constituiu (lei antiga)
B) A lei que vigora no presente (lei nova)

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As hipóteses comportam assim duas soluções extremas:


A) Aplicação sistemática da lei antiga, a qual regulará as condições de validade da
situação em causa, e os efeitos que esta venha eventualmente a produzir no futuro
(princípio tempus regit actum);
B) Aplicação irrestrita da lei nova: aplicar-se-á a todas as situações que se venham a
criar no futuro, e às situações que se constituíram antes da sua entrada em vigor
(aplicação retroativa da lei).
Argumentos a favor de cada uma das soluções:
A) A favor da lei antiga – a aplicação a todas as situações jurídicas da lei que vigora no
momento em que estas se constituem, é a única solução que tutela a confiança das
pessoas na estabilidade dos comandos jurídicos.
Necessidade de garantir a adequada tutela das expectativas das partes, obstando a
que tais expectativas sejam defraudadas pela aplicação de uma lei com a qual as partes
não contaram, nem poderiam razoavelmente contar, uma vez que a lei nova iniciou a
sua vigência em momento ulterior ao da constituição da situação jurídica em causa.
Quem realiza os actos jurídicos só pode atender às leis em vigor no momento da
prática do ato e só nessas leis poderá firmar os interesses e expectativas por que
orientará os seus comportamentos futuros.
B) A favor da lei nova – a aplicação retroativa da lei, é no entanto a única forma de
assegurar os valores da justiça e da modernidade.
As soluções consagradas na lei nova são mais justas e socialmente mais vantajosas, na
medida em que exprimem valores ético-culturais mais atualizados, que são um fator
de desenvolvimento e progresso da sociedade.
A justiça e a modernidade estarão, assim, ao serviço da aplicação imediata da nova lei,
mesmo às situações constituídas antes da sua entrada em vigor e que produzem ainda
os efeitos no momento presente: aplicação retroativa da lei.
A escolha de uma das duas soluções está intimamente ligada ao espírito ideológico de
cada um:
A) Espírito conservador (lei antiga)
B) Pensamento reformista (lei nova)
Aplicação retroativa da lei
Uma lei é aplicada retroativamente quando o seu comando fixa a disciplina de factos
que se produziram no passado (em momento anterior à sua entrada em vigor), e/ou o
regime jurídico dos seus efeitos.
Graus de retroatividade
• Retroatividade normal ou 1º grau
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A nova lei aplica-se a situações jurídicas constituídas no passado, mas apenas no


que concerne aos efeitos jurídicos que estas venham a produzir após a sua entrada
em vigor (ou seja, estes efeitos tem de obedecer à lei nova).
Por exemplo: a nova lei fixa como juro máximo admitido 15%; os contratos
anteriores em que se estipulam um juro superior àquele limite máximo passam,
após a entrada em vigor da nova lei, a vencer o juro de 15%.
• Retroatividade intermédia ou de 2º grau
A nova lei aplica-se a situações jurídicas constituídas no passado, relativamente aos
efeitos jurídicos que estas venham a produzir após a sua entrada em vigor (1.ª
Grau), e relativamente aos efeitos jurídicos já produzidos antes da sua entrada em
vigor (destruindo esses mesmos efeitos).
Por exemplo: o mutuante é obrigado a restituir ao mutuário tudo o que acima de
15% recebeu a título de juros, no passado.
• Retroatividade máxima ou de 3º grau
Neste grau a lei nova não respeita quaisquer efeitos jurídicos produzidos durante
a vigência da lei antiga, mesmo que se trate de situações definitivamente decididas
por sentença transitada em julgado (não respeita as "causae finitae").
Estas causas teriam assim de ser “reabertas” para serem julgadas outra vez
segundo os preceitos da lei nova.
Este grau é violador do princípio da divisão de poderes (o poder legislativo agride
prerrogativas próprias do poder judicial) e é condenado pelo disposto no art. 282.º
da CRP.
“A declaração de inconstitucionalidade… produz efeitos desde a entrada em vigor
da norma declarada inconstitucional”. A entrada em vigor de uma nova norma não
deverá atentar contra as decisões transitadas em julgado que foram proferidas
tendo e conta uma norma que, se bem que agora revogada, era inteiramente válida
e atuante no momento em que o caso julgado se formou.
Direito Positivo Vigente
Interessa proceder à análise do problema da aplicação das leis no tempo em sede
jurídico-positiva.
Não são poucas as Constituições que contém regras gerais sobre a aplicação da lei no
tempo, consagrando, de comum, o princípio fundamental da não-retroatividade da lei.
Na nossa Constituição atual não se encontra qualquer dispositivo com este alcance.
No entanto, a existência de um tal limite constitucional à retroatividade da lei já foi,
entre nós reconhecido pelo Tribunal Constitucional, ainda que se possa dizer, que se
trata de um limite muito amplo e difuso e mesmo, em alguns casos, de um limite
facilmente permeável a juízos de oportunidade política.
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A) Constituição da República Portuguesa contém normas especiais sobre a aplicação


no tempo das leis penais:
• Artigo 29.º, n.º 1 (princípio nullum crimen sine lege) – proibição da aplicação
retroativa das leis incriminatórias
• Artigo 29.º, n.º 3 – proíbe a aplicação de penas ou mediadas de segurança não
previstas em lei anterior
• Já o artigo 29.º, n.º 4 – obriga à aplicação retroativa (retroatividade in mitius) das
leis penais com conteúdo mais favorável ao arguido:
o Aplica–se a pena mais leve se, entre a prática do crime e o momento da
condenação, se sucederem no tempo duas ou mais leis fixando sanções de
diversa gravidade.
• Artigo 18.º, n.º 3 – proíbe a aplicação retroativa de leis restritivas dos direitos,
liberdades e garantias;
• Artigo 103.º, n.º 3 – proíbe genericamente a aplicação retroativa das leis tributárias.
B) Legislação Ordinária
Perante estes limites constitucionais, tem de reconhecer-se ao legislador ordinário
ampla liberdade na definição do regime temporal das leis que edita.
É frequente que o legislador acumule às leis disposições sobre a sua aplicação no
tempo, disposições essas que o intérprete terá de respeitar, salvo aquelas restrições
constantes da CRP.
Outras vezes, o legislador, em vez de fixar limites precisos à aplicação da lei nova e da
lei antiga, opta pela instituição de um regime especial – regime transitório – para
aquelas relações que, constituídas ao abrigo da lei anterior, ainda subsistem quando
entra a lei nova em vigor.
Assim os problemas de sucessão de leis no tempo, suscitados pela entrada em vigor
de uma lei nova, podem, pelo menos parcialmente, ser diretamente resolvidos por esta
mesma lei através das chamadas disposições transitórias.
As disposições transitórias podem ser de carácter formal ou material:
• Disposições de carácter formal – são as que se limitam a determinar qual das leis,
a lei antiga ou a lei nova, é aplicável a determinadas situações.
• Disposições de carácter material – são as que estabelecem uma regulamentação
própria, que não coincidem nem com a lei antiga nem com a lei nova, para certas
situações que se encontram na fronteira entre estas duas leis. Destinam-se a
adaptar o regime da lei nova às situações, a estabelecer a transição entre os
regimes.

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Porém, na maioria dos casos, o legislador não define especificamente o âmbito da


eficácia temporal da lei. E é para colmatar, precisamente este silêncio, que se coloca
o problema geral da eficácia das leis no tempo: Que lei aplicar às situações jurídicas
que entram em contacto com duas leis de vigência sucessiva?
Assim, na falta de disposições transitórias coube à doutrina a tarefa de propor
soluções para este problema (ex.: doutrina dos direitos adquiridos - a lei nova deve
respeitar os direitos já adquiridos).
Hoje é geralmente aceite a teoria do facto passado, acolhida pelo legislador no artigo
12.º do CC.
Teoria do facto passado
Artigo 12.º do CC: “A lei só dispõe para o futuro; ainda que lhe seja atribuída eficácia
retroativa, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos
que a lei se destine a regular”.
Através deste preceito, podemos retirar as seguintes ideias:
• A lei só deve ter efeitos prospetivos, ou seja, só deve “olhar” para o futuro;
• A lei nova deve assim respeitar todos os factos passados, isto é, verificados antes
da sua entrada em vigor, não atingindo situações que se devem considerar
consumadas - tendo eficácia não retroativa (princípio da não retroatividade).
Cada facto deve, pois, ter como lei reguladora a lei vigente ao tempo da sua
verificação, aplicando-se a lei nova aos factos ocorridos após a sua entrada em vigor
e a lei antiga aos factos verificados anteriormente, isto é, no domínio da vigência
desta.
E mesmo que determinada lei se aplique ao passado, por ser atribuída eficácia
retroativa, presume-se que há intenção de respeitar os efeitos jurídicos já produzidos
pelos factos que a lei se destine a regular.
A simplicidade da solução atrás apresentada é contudo mais aparente do que real,
pois a norma jurídica não se limita a regular factos: regula também as suas
consequências ou efeitos, muitos dos quais, derivados de factos ocorridos antes de
entrar em vigor uma nova lei, se prolongam para além do inicio da sua vigência,
tornando necessário distinguir quais as situações que por constituírem simples
efeitos ou consequências de factos passados, devem ser regulados pela lei antiga e
quais aquelas que devem ser regulados pela lei nova.
Procurando superar esta dificuldade estabelece o art. 12.º n.º 2 do CC: “Quando a lei
dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos ou
sobre os seus efeitos, entende-se, em caso de dúvida, que só visa os factos novos;
mas, quando dispuser diretamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas,
abstraindo dos factos que lhes deram origem, entender-se-á que a lei abrange as
próprias relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor.”
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Na teoria do facto passado, surgem dois tipos de leis:


• As que dispõem sobre os efeitos ou sobre os requisitos de validade de quaisquer
factos – estas só se aplicam aos factos novos (factos que venham a ocorrer após a
sua entrada em vigor).
• E aquelas que dispõem sobre o conteúdo de certas relações jurídicas e o
modelam sem olhar aos factos que a tais situações deram origem – estas
aplicam-se a situações jurídicas constituídas antes da lei nova, mas subsistentes
ou em curso à data da sua entrada em vigor.
• À constituição das situações jurídicas (requisitos de validade, substancial e formal,
factos enunciativos) aplica-se a lei do tempo em que essa celebração se verifica.
• Ao conteúdo das situações jurídicas que subsistam à data da entrada em vigor da
lei nova, aplica-se a lei antiga no que respeita ao regime futuro do conteúdo e
seus efeitos.
Em conclusão: Fica o intérprete colocado na necessidade de determinar se a lei nova
é uma lei “reguladora de factos” ou uma lei “reguladora de direitos e deveres
(conteúdo da relação jurídica)”.
À luz dos critérios expostos, como solucionar as situações contempladas nos
exemplos enunciados no início desta matéria:
• Se uma lei vem instituir o divórcio num país cuja legislação até aí o não admitia,
será a lei nova aplicável apenas aos casamentos celebrados após a sua entrada
em vigor ou também aos celebrados anteriormente?
A resposta a esta questão há-de encontrar-se na segunda parte do n.º 2 do art.
12.º do CC: a nova lei é imediatamente aplicável a todos os casamentos, incluindo
os contraídos antes da nova entrada em vigor, pois trata-se de uma disposição
que vem regular o conteúdo da relação jurídica matrimonial, atribuindo aos
cônjuges um direito que até aí não possuíam, sem fazer depender de qualquer
facto.
• Se uma lei exigir, como condição de validade dos contratos de compra e venda de
imóveis, que os mesmos sejam realizados por escritura pública, quando a lei
anterior não submetia a validade desses contratos a quaisquer formalidades
especiais, então a lei nova, nos termos da primeira parte do n.º 2 do art. 12.º do
CC e como lei “reguladora de factos”, aplicar-se-á somente aos novos contratos,
ou seja, àqueles que venham a ser celebrados após a sua entrada em vigor.
Especificidade do artigo 13.º do CC
O princípio geral da não retroatividade sofre contudo uma importante exceção.

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“A lei interpretativa integra-se na lei interpretada, ficando salvos, porém, os efeitos já


produzidos pelo cumprimento da obrigação, por sentença passada em julgado, por
transação, ainda que não homologada, ou por actos de análoga natureza”.
Nos termos deste preceito a lei interpretativa, que se destina a fixar o sentido
decisivo de uma lei anterior obscura ou ambígua, integra-se na lei interpretada,
formando com ela um todo.
Sendo assim tudo se passa como se tivesse sido publicada na data em que foi
interpretada, ocupando o seu lugar e, consequentemente, aplica-se aos factos
verificados antes da sua entrada em vigor.
A lei interpretativa tem eficácia retroativa
Todavia, atendendo às consequências perniciosas e as perturbações que a aplicação
retroativa da lei a todos e quaisquer factos passados não deixaria de acarretar:
ressalvam-se os efeitos já produzidos pelo cumprimento das obrigações, por
sentença passada em julgada, por transação, ou por actos de natureza análoga, isto
é, aqueles direitos já definitivamente fixados por decisão judicial ou por convenção
dos interessados.
Aplicação das Leis no Espaço
Os Estados não aplicam exclusivamente o seu direito interno no seu espaço, vendo-se
forçados a aplicar nos seus tribunais leis internas de outros Estados (quer pela
nacionalidade dos sujeitos intervenientes, quer pelo lugar onde os efeitos jurídicos se
vão produzir, entre outros).
Surgem assim os conflitos das leis no espaço que são decididos mediante as regras de
conflito: permitem determinar qual das leis em contacto com a situação jurídica em
questão, deve ser declarada competente para a regular.
Por exemplo: aos actos realizados a bordo do navio, é aplicada a lei do país da
bandeira desse navio.

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Parte III – Da Sistematicidade do Direito


O sistema jurídico
Sistema jurídico ou legal é o conjunto de normas jurídicas interdependentes, reunidas
segundo um princípio unificador.
Essas regras utilizam uma linguagem prescritiva, cuja finalidade é disciplinar a
convivência social.
Características
Como caracteres do sistema jurídico podem apontar-se os seguintes:
• Descentralização
O fenómeno da descentralização do sistema tem a ver com o aparecimento de uma
pluralidade de fontes produtoras de normas e princípios jurídicos.
Esse fenómeno da descentralização é comprovado pelo aparecimento de um
número plural de órgãos normativos centrais (Assembleia da República e Governo)
e pela existência, na periferia, de uma multiplicidade de entes com poderes de
criação normativa (assembleias regionais, câmaras municipais, juntas de freguesia,
pessoas coletivas, etc.).
• Coercibilidade
A coercibilidade das normas jurídicas é uma decorrência da sua pertença ao direito;
a norma jurídica é jurídica e, como tal, garantida coercitivamente, porque integra
um sistema ele mesmo coercitivo. A fonte da coercibilidade reside no direito e é
ele que a comunica às suas normas, conquanto as normas jurídicas, organizadas
dentro do direito, reflitam necessariamente neste (e no seu sistema) uma
característica que lhes é comum.
• Plenitude/Completude
O julgador está legalmente vinculado a proferir uma decisão, devendo julgar todas
as situações revestidas de relevância jurídica, por outras palavras, todas as
situações humano-sociais que exijam, à luz da prevalente consciência jurídico-
comunitária, uma resposta de direito.
E é neste sentido que o sistema jurídico se pode considerar marcado pela
característica da plenitude ou completude.
• Hierarquização
As normas dispõem-se dentro do sistema segundo certa hierarquização: no topo
estão as normas constitucionais, na base localizam-se as normas regulamentares.
• Coerência

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O princípio da coerência do sistema significa a condenação das antinomias


normativas, ou seja, aquelas contradições valorativas em que um norma pune o
que a outra permite.
Incluem-se três princípios formais do direito:
o Princípio da hierarquia – se uma das leis em conflito é de valor hierárquico
superior à outra, prevalece a primeira.
o Princípio da especialidade – a lei especial prevalece sobre a lei geral.
o Critério temporal ou cronológico – se das duas leis conflituantes uma é
posterior à outra, a natural consideração de que deve ser acatada à vontade
mais recente e atual do legislador faz prevalecer a lei posterior.
Se ocorrer incongruência entre as leis, dá-se o nome de lacuna de colisão, devendo
o intérprete, no parecer de uma importante corrente doutrinária, considerar que
as duas normas conflituantes reciprocamente se anulam e que o espaço vazio
criado terá de ser preenchido segundo os procedimento determinados no artigo
10º do Código Civil.
• Finitude
Os limites do direito são imperativamente traçados no caso das normas que fixam
imposições; no que concerne às normas ligadas à autonomia da vontade, os limites
do direito podem ser alterados pelos sujeitos jurídicos, quer no sentido da sua
distensão (atribuição de tutela jurídica a acordos, em geral, não-jurídicos), quer no
sentido da sua retração (denegação de efeitos jurídicos a acordos comummente
concluídos sob o império do direito), tudo dependendo da vontade afirmada,
dentro de certas condições, pelos próprios interessados.
Divisões: Direito Público e Direito Privado
Sendo certo que o Direito visa regular as relações da vida social e dada a natureza
diversa que estas apresentam, torna-se de maior utilidade proceder à divisão daquele
em vários ramos ou núcleos, de acordo com a diversidade das relações reguladas e
com as características comuns que se podem encontrar em certos grupos de normas
jurídicas.
A primeira divisão que se impõe consiste em distinguir os dois principais ramos do
Direito: Direito Público e Direito Privado.
Esta distinção remonta aos jurisconsultos romanos que distinguiam entre ius Publicum
e ius Privatum.
• ius Publicum – tudo o que era tornado público, do conhecimento de todos e a todos
se aplica

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• ius Privatum – todas as cláusulas insertas nos contratos e testamentos, cujo


conhecimento se limitava às pessoas que outorgavam o contrato e só a estas era
vinculativa.
Todavia, esta diferenciação já não é válida e tem sido polémica ao longo dos tempos.
São vários, hoje, os critérios propostos para distinguir o direito público do direito
privado.
• Critério da natureza dos interesses
Este critério tem como base a qualidade dos interesses que a norma visa tutelar.
Sendo assim:
o Direito Público – constituído por normas endereçadas à realização de
interesses próprios da comunidade (interesses coletivos ou públicos).
o Direito Privado – constituído por normas adstritas à satisfação de interesses
privados, ou seja, de interesses que apenas dizem respeito aos indivíduos que
os titulam.
Este critério suscita algumas críticas, porquanto é difícil saber quando é que a
norma regula interesses privados ou públicos. Para além disso, todas as normas
são elaboradas tendo em conta interesses públicos e privados
simultaneamente.
Por exemplo: as normas penais que punem o crime de homicídio. O objetivo
principal destas normas é o de garantir um valor cujo respeito é necessário à
existência da própria coletividade (interesse público). Apesar disso, também o
interesse pessoal (privado) de cada um em conservar a sua vida é por elas
acautelado.
Devido à dificuldade em distinguir os direitos públicos dos privados, os defensores
destes critérios alteraram os conceitos já definidos. Este critério passou a basear-
se na natureza do interesse. Assim: as normas jurídicas seriam de direito privado
ou de direito público consoante se propusessem satisfazer preponderantemente
os interesses privados ou interesses públicos.
• Critério da qualidade dos sujeitos
De acordo com este critério:
o Direito Público – constituído por normas que regulam as relações entre os
Estados ou entre o Estado e os particulares.
Por exemplo: quando pune um criminoso, cobra um imposto, etc., o Estado
afirma o seu poder soberano perante os cidadãos, dando origem a uma relação
cujas normas reguladoras pertencem ao direito público.

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o Direito Privado – constituído por normas que disciplinam as relações entre


particulares ou entre particulares e o Estado (despojado dos seus poderes de
autoridade pública).
Por exemplo: quando o Estado arrenda um prédio para nele instalar um serviço,
age numa posição jurídica igual à de um simples particular, sem qualquer poder
soberano.
Talvez se possa dizer que a linha de fronteira que estabelece entre o direito
público e o direito privado passa pela seguinte distinção:
o As relações entre particulares pertencem sempre ao domínio do Direito
Privado, enquanto que as relações entre Estados integram sempre o Direito
Público;
o As relações jurídicas em que as apenas um dos sujeitos seja o Estado e a
sua atuação seja como ente soberano, são de Direito Público;
o São de Direito Privado se o Estado age no exercício de uma personalidade
privada igual à de qualquer ente particular.
Este é o critério que tem maior unanimidade e menos críticas, mostrando-se o mais
adequado atualmente.
Ramos: Direito Público e Direito Privado
DIREITO PÚBLICO
É caracterizado por estabelecer normas de organização do Estado e demais entidades
públicas, disciplinando o seu funcionamento e o seu estatuto.
Constituem Ramos do Direito Público:
• Direito Constitucional
Baseia-se na Constituição, ocupando-se da organização do Estado, dos órgãos de
soberania e da repartição de poderes entre eles. Garante também os direitos
fundamentais dos cidadãos, regulando ao mesmo tempo a base do ordenamento
jurídico da comunidade.
• Direito Administrativo
O direito administrativo constitui como que a infraestrutura organizativa sobre a
qual se apoia todo o Direito Constitucional.
Pode definir-se como o sistema de normas jurídicas que regulam a organização e
o processo de agir da Administração Pública, quer a do Governo agindo no
desempenho da função executiva, quer a dos entes a ele subordinados
diretamente, quer aos órgãos e agentes das autarquias regionais e locais.
• Direito Financeiro

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O Estado para realizar os fins públicos, tem de fazer despesas e, para custear as
despesas, carece de obter receitas. A atividade de realização de despesas e
obtenção de receitas constitui a atividade do Estado.
Ao conjunto complexo de normas jurídicas que regulam a recolha, a gestão e a
aplicação dos recursos financeiros do Estado (normas disciplinadoras da ação
financeira do Estado) dá-se a designação de Direito Financeiro.
• Direito Fiscal
É o sistema de normas que disciplinam as relações de impostos, e definem os meios
e processos pelos quais se realizam os direitos emergentes destas relações. O
Direito Fiscal é constituído por normas de soberania fiscal, normas de incidência,
normas de lançamento, normas de liquidação e normas de cobrança.
• Direito Penal ou Criminal
A sociedade constitui-se sobre um núcleo de valores cujo respeito é necessário à
sua própria existência e desenvolvimento.
Por isso, torna-se imperativo a organização de formas particularmente eficazes de
tutela dos valores essenciais da vida comunitária, sujeitando aqueles que os violam
a reações jurídicas severas.
Para alcançar tal desiderato, o direito serve-se de duas categorias jurídicas
estreitamente correlacionadas: o crime e a pena.
o Crime – todo o comportamento que viola as regras de convivência social
criminalmente protegidas.
o Pena – reação jurídica que a lei liga à prática do crime. Só é aplicável a
delinquentes imputáveis. Aos inimputáveis perigosos são aplicadas medidas de
segurança.
Face a estes conceitos, podemos definir o Direito Penal ou Criminal como conjunto
de normas que têm uma estrutura que, normalmente, faz corresponder uma
situação (crime), a uma sanção (pena).
• Direito Processual (civil, penal, administrativo, de trabalho, fiscal)
São ramos adjetivos, que se contrapõem aos respetivos ramos de Direito
substantivo. Ou seja, não curam propriamente do Direito que confere direitos e
obrigações independentemente da intervenção judiciária, antes curam do modo
como esta se deve processar.
Referem-se, portanto, à proteção coativa, à tutela de tais direitos e obrigações.
Regulam as ações e a sua transmissão, desde os seus pressupostos, requisitos, até
ao julgamento final da causa.

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No Direito Processual encontram-se positivados princípios fundamentais do Direito


(como o do contraditório, de audição das partes em confronto, de idoneidade
probatória, etc.).
Muitíssimas vezes as causas ganham-se ou perdem-se não por razões de fundo, de
Direito, mas por razões de matéria processual, pormenores técnicos como por
exemplo: prazos, provas, testemunhas.
• Direito Internacional Público
Regula as relações entre Estados ou entre Estados e outros sujeitos da ordem
jurídica internacional, como a Santa Sé, a Ordem Soberana de Malta, Organizações
Internacionais, etc.
As fontes de um tal Direito são claramente supraestaduais. De acordo com art. 38º
do Estatuto do Tribunal Internacional de Justiça são fontes do Direito Internacional:
o As convenções internacionais;
o O costume internacional;
o Os princípios gerais de Direito reconhecidos pelas nações civilizadas;
o As decisões judiciais e a doutrina dos juristas mais qualificados, como meio
auxiliar para a determinação das regras de Direito.
Embora seja insuficiente o grau de institucionalização da comunidade
internacional – não dispõe de órgãos munidos de poderes legislativos, de poderes
jurisdicionais obrigatórios e de poderes de execução das sanções jurídicas – a
verdade é que já ninguém hoje pode negar o seu carácter jurídico e a sua
subordinação ao Direito.
DIREITO PRIVADO
É o conjunto de normas reguladoras das relações entre particulares, e entre
particulares e o Estado, ou outros entes públicos desde que intervenham desprovidos
de ius imperium.
Os Ramos do Direito Privado são:
• Direito Civil
Conjunto de normas reguladoras as relações entre particulares que não se
encontrem sujeitas a outro ramo do Direito em especial (Direito Comercial, Direito
do Trabalho).
É o ramo da ordem jurídica que primeiro se formou e é ainda hoje o mais
profundamente elaborado.
O Código Civil em vigor, que substituiu o Código de Seabra (1867) divide o Direito
Civil em quatro grupos fundamentais de relações jurídicas.

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o Livro I – Parte Geral


Trata de questões gerais: das leis, sua interpretação e aplicação; das relações
jurídicas – das pessoas singulares e pessoas coletivas, das coisas, dos factos
jurídicos e do exercício e tutela dos direitos.
o Livro II – Direito das Obrigações
Contém o “Direito das Obrigações”, ou seja, o complexo de normas que fixam
a disciplina do “vínculo jurídico por virtude do qual uma pessoa fica adstrita
para com outra à realização de uma prestação” (art. 397.º CC).
Direito dinâmico que regula em particular a circulação de bens e serviços, as
prestações (positivas ou negativas – de dar, fazer ou não fazer), e a reparação
dos danos (Responsabilidade Civil).
Tem como principal instituto o contrato, decorrente da instituição que é a
autonomia privada.
Do art. 874º ao art. 1250º, o CC define vários tipos contratuais: compra e venda,
doação, sociedade, locação, comodato, mútuo, contrato de trabalho.
o Livro III – Direito das Coisas/Direitos Reais
Os direitos reais definem-se como poderes direitos e imediatos sobre coisas
certas e determinadas. São poderes que garantem ao seu titular um certo
domínio sobre o bem a que concernem.
Estes poderes têm eficácia real e absoluta, ou seja, permitem que o seu titular
retire todas ou algumas utilizadas que de a coisa é suscetível, ficando todos os
demais (não titulares) obrigados à obrigação passiva universal, dever geral de
abstenção, de não perturbação do exercício de tal poder.
Os direitos reais estão vinculados a um numerus clausus (art. 1306.º CC), ou
seja, só se poderão constituir com eficácia real as figuras que a lei prevê –
princípio da tipicidade dos direitos reais.
o Direito de propriedade (arts. 1302.º e ss)
o Usufruto (arts. 1439.º e ss)
o Uso e habitação (arts. 1484.º e ss)
o Direito de superfície (arts. 1524.º e ss)
o Servidões prediais (arts. 1543.º e ss)
Além destes direitos, que se dizem direitos reais de gozo, a lei ainda admite
com uma função de garantia dos direitos de crédito, os chamados direitos reais
de garantia.

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Direitos que reforçam, nas relações obrigacionais, a posição do credor,


atribuindo-lhe poderes especiais e privilegiados sobre bens do devedor ou de
um terceiro.
o Consignação de rendimentos (arts. 656.º e ss)
o Penhor (art. 666.º e ss)
o Hipoteca (art. 689.º e ss)
o Privilégios creditórios (art. 733.º e ss)
o Direito de retenção (art. 754.º e ss)
o Livro IV – Direito de Família
Debruça-se sobre as relações jurídicas constitutivas, modificativas e extintivas
dos laços de família – desde o casamento, a filiação e a adoção à separação de
bens ou de pessoas e bens e ao divórcio, bem como as relações jurídicas
intrafamiliares (poder paternal, por exemplo).
O Direito de Família regula, pois, as relações jurídicas familiares, decorrentes
do casamento, do parentesco, da afinidade e da adoção.
o Casamento – “contrato entre duas pessoas de sexo diferente que
pretendem constituir família mediante uma plena comunhão de vida”, dá
origem a múltiplas relações (pessoais e patrimoniais) entre os cônjuges.
o Parentesco – é o vínculo que une duas pessoas, pelo facto de uma delas
descender da outra, ou ambas descenderem de um progenitor comum.
O parentesco pode ser na linha reta (quando um dos parentes descende do
outro) ou na linha colateral (quando nenhum dos parentes descende do
outro, mas ambos procedem de um progenitor comum).
Efeitos jurídicos do parentesco:
▪ Efeitos sucessórios (art. 2133.º e 2157.º CC)
▪ Efeitos alimentares (art. 2009.º CC)
▪ Impedimentos matrimoniais (art. 1602º, alínea a) e b); art. 1604º)
o Afinidade – vínculo que liga um dos cônjuges aos parentes de outro.
Determina-se pelos mesmos graus e linhas que definem o parentesco e não
cessa pela dissolução do casamento.
o Adoção – vínculo que, prescindindo dos laços de sangue mas em tudo
semelhante à filiação natural, se estabelece por via legal entre duas
pessoas, podendo ser plena ou restrita.
o Livro V – Direito das Sucessões

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É a disciplina que regula o chamamento de uma ou mais pessoas à titularidade


das relações jurídicas patrimoniais de uma pessoa falecida, o de cujus, e a
consequente devolução dos bens que a esta pertenciam.
O regime da sucessão pode ser organizado por um testamento, por um
contrato ou pela lei, distinguindo-se desta forma: sucessão testamentária,
sucessão contratual e sucessão legal (legítima – na falta de testamento;
legitimatária – carácter forçado).
• Direito Comercial
Ramo da ordem jurídica que se ocupa do comércio, ou seja, daquela atividade de
“mediação” lucrativa entre a produção e o consumo.
É constituído por um conjunto de normas que regulam os atos objetiva e
subjetivamente comerciais.
Presumem-se como atos comerciais:
o Os atos que não sejam exclusivamente civis praticados por comerciantes;
o Os atos, objetivamente regulados pela lei comercial, praticados por não
comerciantes.
No Direito Comercial estuda-se ainda, para além da qualificação como comerciais
ou não dos atos:
o As sociedades comerciais
o Os contratos comerciais
o Os títulos de crédito…
• Direito do Trabalho
Conjunto de normas jurídicas que visam regular as relações individuais e coletivas
que têm comum elementos unificantes e desencadeantes, o trabalho assalariado.
O CC define o contrato de trabalho – art. 1152º - como “aquele pelo qual uma
pessoa se obriga mediante retribuição, a prestar a sua atividade intelectual ou
manual a outra pessoa, sob autoridade ou direção desta”.
• Direito Internacional Privado
Conjunto de normas jurídicas criado por uma autoridade política autónoma
(um Estado nacional ou uma província que disponha de uma ordem jurídica
autónoma), com o propósito de resolver os conflitos de leis.
Novo ramo de Direito: Direito Comunitário
Direito Comunitário – conjunto de normas que regulam a constituição e
funcionamento das Comunidades Europeias.

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Para que se possa compreender o Direito Comunitário devidamente é preciso


distinguir duas noções:
• Direito Comunitário Originário
Constituído pelo conjunto de normas que estão na origem ou integram os tratados
constitutivos das Comunidade Europeias, e por todas as outras que alteraram ou
complementaram os tratados originários.
Tratados que compõem o Direito Comunitário Originário:
o Os tratados constitutivos das Comunidades Europeias
o Os tratados relativos ao alargamento da Comunidade Europeia
o O Ato único Europeu
o Tratado de Maastricht ou Tratado da União Europeia
o Tratado de Amesterdão
o Tratado de Nice
• Direito Comunitário Derivado
Constituído pelas normas diretamente criadas pelas instituições comunitárias com
competência para tal, tendo em vista a execução dos Tratados Comunitários. O
Direito Derivado tem de estar de acordo como o Direito Originário.
Normas de Direito Comunitário Derivado
o Regulamentos – contém normas gerais e abstratas aplicáveis a uma
generalidade de pessoas e bens
▪ São compulsivos na sua totalidade, pois nenhum Estado pode obstar à sua
execução, nem aplicá-los de forma incompleta ou restritiva
▪ Gozam de aplicabilidade direta, ou seja, entram diretamente em vigor na
Ordem Jurídica Interna nacional
o Diretivas – contém instruções das instituições comunitárias aos Estados-
membros e são um meio de harmonização da Ordem Jurídica Comunitária com
a dos Estados, pretendendo-se atingir objetivos comuns.
▪ São vinculativas nos Estados-membros a que se destinam, mas só no diz
respeito ao objetivo a alcançar, deixando a forma e os métodos para o
atingir ao discernimento das autoridades nacionais.
▪ Para que vigorem num Estado é necessário que sejam transpostas para o
Direito Nacional.
o Decisões – são tomadas pelo Conselho ou pela Comissão, podem destinar-se a
uma empresa, a uma governo ou a um indivíduo e são vinculativas para os
Estados-membros.
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o Pareceres e Recomendações – são tomados pelas instituições da União


Europeia, mas não são vinculativos; apenas traduzem o ponto de vista da
instituição que os emite.
Aplicação das Normas Comunitárias
• Princípio do primado do Direito Comunitário sobre o Direito Interno
Em caso de conflito entre normas, aplica-se a norma comunitária. Mas qualquer
disposição do Direito derivado que contrarie princípios contidos na Constituição de
algum dos Estados Membros pode ser declarado inválida pelo tribunal competente
do país em questão.
• Princípio da Aplicabilidade Direta
A norma comunitária entra imediatamente em vigor na ordem jurídica nacional.
• Princípio do Efeito Direto
Os particulares têm a possibilidade de invocar, no órgão competente, uma norma
de Direito Comunitário, para afastar uma norma de Direito Nacional.
Instituições e Órgãos da União Europeia
Atualmente, as instituições comunitárias são as seguintes:
• Comissão
Constituída por 20 comissários, é considerada a guardiã dos Tratados Comunitários
e detentora do direito exclusivo de fazer propostas de legislação ( direito de
iniciativa). É também a instância executiva das políticas comuns, ainda que em
articulação com as administrações nacionais. O mandato da Comissão é de cinco
anos.
• Conselho da União Europeia
É o órgão de decisão e é composto por um ministro do Governo de cada Estado-
membro, tendo em conta a matéria em questão.
Compete ao Conselho da União Europeia elaborar legislação da União, estabelecer
os seus objetivos políticos, coordenar as suas políticas nacionais e elaborar os
compromissos entre os diferentes interesses nacionais.
• Conselho Europeu
É constituído pelos Chefes de Estado e de Governo dos países-membros, bem
como pelo Presidente da Comissão Europeia. Nele se debatem e definem as
principais linhas de orientação política e se abordam as questões da atualidade
internacional. É o grande agente de impulso da integração europeia. A Presidência
da U.E. é exercida rotativamente por todos os países-membros, sendo o mandato
de seis meses.

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• Parlamento Europeu
É o órgão de representação dos cidadãos europeus, fruto da vivência democrática
de todos os Estados-membros, é composto por 626 deputados, eleitos de cinco em
cinco anos por sufrágio universal e directo pelos cidadãos de toda a Comunidade.
É um órgão comunitário essencialmente consultivo, cabendo-lhe pronunciar-se
sobre a maioria das propostas submetidas ao Conselho. Aprova ainda o Orçamento
da Comunidade e exerce um controlo político que pode ir até à censura da
Comissão.
Desempenha um papel essencial no processo de elaboração, modificação e adoção
da legislatura europeia e formula propostas de natureza política para o reforço da
União Europeia.
Incumbe-lhe, no âmbito das novas competências:
o Aprovar a composição da Comissão da UE
o Aprovar os acordos internacionais mais importantes, que tenham
consequências para a situação financeira e para a legislação da Comunidade…
• Tribunal de Justiça
Assegura o respeito pela legislação comunitária. Resolve os litígios entre os
Estados-membros e as instituições comunitárias, bem como os litígios entre as
entidades privadas e as instituições comunitárias. Assegura o respeito pela unidade
de interpretação do Direito Comunitário.
• Tribunal de Contas
A sua principal atividade é a do controlo do orçamento comunitário. Examina as
contas de todos os órgãos comunitários e consubstancia a sua atuação no relatório
anual que é publicado no Jornal Oficial das Comunidades. Adquiriu com o Tratado
da UE o estatuto de instituição comunitária. Assume uma maior importância no
quadro da assistência que é chamado a prestar ao Parlamento Europeu e ao
Conselho no controlo da execução do orçamento comunitário.
• Comité Económico e Social
É o órgão consultivo por excelência de todos os órgãos comunitários. Assiste a
Comissão e o Conselho na elaboração da legislação comunitária.
• Comité das Regiões
Foi criado como órgão consultivo pelo Tratado da União Europeia e surge como
um importante guardião do princípio da subsidiariedade.
• Banco Europeu de Investimento
Foi criado pelo Tratado de Roma para apoiar o desenvolvimento harmonioso da
Comunidade. É composto por um Conselho de Governadores, um Conselho de
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Administração e um Conselho Executivo, fazendo parte do primeiro um ministro


de cada Estado-membro, normalmente o Ministro das Finanças. É, ao mesmo
tempo, uma instituição comunitária e um Banco, isto é, contrai empréstimos nos
mercados internacionais e concede-os com fim de desenvolver o todo comunitário.

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