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SUMÁRIO: 1 Introdução • 2 O controle preventivo dos atos de concentração pelo Cade • 3 Gun
Jumping: noções gerais • 4 Arras: breves observações • 5 O Gun Jumping nos Julgamentos do
Cade • 6 O Guia do Cade sobre Gun Jumping • 7 Procedimento Administrativo para Apuração
de Ato de Concentração no 08700.005408/2016-68: dissociação entre Arras e Gun Jumping
• 8 Conclusão • 9 Referências.
CONTENTS: 1 Introduction • 2 The preventive control of concentration acts by Cade • 3 Gun jumping:
general notions • 4 Down payment: brief remarks • 5 Gun Jumping at Cade’s judgments • 6 Cade's
Guide of Gun jumping • 7 Administrative Procedure of Concentration Act no. 08700.005408/2016-68:
dissociation between down payment and Gun Jumping • 8 Conclusion • 9 References.
1 Introdução
1 Nos EUA, o controle preventivo dos atos de concentração econômica tem amparo em três leis federais:
Seção 7A do Clayton Act (Hart-Scott-Rondino Antitrust Improvements Act), Seção 1 do Sherman Act e Seção
5 do Federal Trade Commission Act.
Essa é uma questão que dependerá de uma construção com base nas decisões
proferidas pelo Cade.
Importante analisar que, para a configuração do Gun Jumping, a consumação
da operação deve ocorrer antes da decisão final da autoridade antitruste. O lapso
temporal entre a notificação e a decisão final é chamado pela doutrina nos EUA
de waiting period. Para que não se configure a consumação prematura, as partes
envolvidas devem permanecer como entidades econômicas distintas. Caso já
exista uma unidade econômica, ainda que informalmente, estará configurado
inegavelmente o Gun Jumping.
Costumeiramente, a parte que investe na operação exige da outra parte a
realização de ações durante o tempo de espera, bem como procura prevenir-se da
existência de efeitos adversos que possam vir a ocorrer até a data de consumação.
Com isso, visa-se, no primeiro caso, a diminuição dos riscos da operação, e, no
segundo, a realocação dos riscos, com a finalidade de a outra parte manter o valor
do ativo (Silva, 2013, p. 24-25).
Para configurar a existência de Gun Jumping, o Cade deve demonstrar que a
consumação da operação ocorreu antes de proferir a decisão. Surge, desse modo,
a importância de se estabelecer o marco temporal da consumação do ato de
concentração econômica. Ocorre que a consumação, em um caso concreto, pode ter
ocorrido em diversos momentos: antes ou depois da notificação; antes ou depois da
decisão final do Cade.
Em razão disso, a doutrina estrangeira aponta a existência de duas modalidades
de Gun Jumping: procedimental e material. No primeiro caso, o Procedural Gun Jumping
ocorre quando o ato de concentração é realizado sem a notificação da autoridade
antitruste. No segundo caso, o Material Gun Jumping ocorre da seguinte maneira: as
partes praticam a coordenação das atividades antes da consumação formal do ato
de concentração (Winterscheid; Dubrow; Amezcua, 2014, p. 12).
A doutrina relaciona alguns atos que configuram indícios da existência de Gun
Jumping (Saito, 2013, p. 98-102):
Assim, busca-se evitar a ocorrência desses indícios, que são como que o disparo
do gatilho, configurando a existência de Gun Jumping.
Outra questão suscitada é se para o caso em tela seria aplicada a regra per se
ou a regra da razão. Essa análise é utilizada pelas agências dos EUA na análise do
ato de concentração à luz do Sherman Act. Por meio da regra per se, são questionados
acordos de restrição comercial ou que visam à restrição da concorrência, ocorrendo
a ilicitude pela simples execução do que foi acordado. Por outro lado, pela regra da
razão, as condutas não são ilegais em si mesmas, se não restringirem a concorrência
de modo desarrazoado. Assim, uma prática que, à luz da regra per se seria ilícita,
pode ser legitimada, demonstrando-se que os efeitos concorrencialmente positivos
sobrepujam os efeitos negativos.4
Assim, deve-se analisar qual regra a ser utilizada em caso de pagamento de arras.
No Brasil, estipula o Regimento Interno do Cade, em seu art. 147, § 2o, que:
No que tange ao pagamento de arras, o ponto mais sensível do art. 147, § 2o,
do Regimento do Cade (Brasil, 2017) é o que veda a existência de qualquer tipo de
influência de uma parte sobre a outra, conforme destacado. Assim, deve-se analisar
3 Ou seja, informação que pode desequilibrar a situação de concorrência existente, ex. margem de lucro,
preços do produto, estratégias e políticas competitivas, orçamento, marketing, investimento, custos de
produção, clientela etc. Nos EUA as agências permitem a troca de informações desde que de boa-fé, ou
seja, quando não implicarem em alteração das condições competitivas. Ainda assim, admite-se de modo
excepcional a troca de informações concorrencialmente sensíveis, desde que autorizada pela autoridade
antitruste, e sob cláusula de confidencialidade, como no caso Computer Associates.
4 Nos EUA, a regra per se foi reduzida a três situações: fixação de preços, alocação de mercados e recusa
de contratar. Porém, mesmo nesses casos, as autoridades analisam o caso com a finalidade de decidir se
a regra per se deva ser adotada.
5 Percebe-se a influência da legislação dos EUA. O Sherman Act, em especial, determina que as partes
permaneçam como entes distintos até a aprovação do ato.
Se, por ocasião da conclusão do contrato, uma parte der à outra, a título de
arras, dinheiro ou outro bem móvel, deverão as arras, em caso de execução,
ser restituídas ou computadas na prestação devida, se do mesmo gênero
da principal. (Brasil, 2002).
Assim, o valor pago a título de arras deverá ser computado no valor total a ser
pago, se for do mesmo gênero. Isso significa dizer que o sinal pode ser entendido
como início de pagamento, o que não lhe modifica a natureza.
O art. 418 disciplina as arras em caso de inadimplemento do contrato:
Se a parte que deu as arras não executar o contrato, poderá a outra tê-lo
por desfeito, retendo-as; se a inexecução for de quem recebeu as arras,
poderá quem as deu haver o contrato por desfeito, e exigir sua devolução
mais o equivalente, com atualização monetária segundo índices oficiais
regularmente estabelecidos, juros e honorários de advogado. (Brasil, 2002).
Nesse caso, há uma cumulação das arras com perdas e danos, se ficar
comprovado que as perdas superam o valor do sinal. É uma forma de evitar o
enriquecimento sem causa.
O art. 420 é o único que trata das arras indenizatórias, servindo as arras nesse
caso de prefixação de perdas e danos:
7 Marcas Jontex, Olla e Lovetex de preservativos, e Jontex e Olla de lubrificantes. A Reckitt Benckiser já
detinha as marcas KY (lubrificante) e Durex (preservativo).
8 Conclusão
Em resposta à questão formulada na introdução, o melhor entendimento é o de
que as arras, quer confirmatórias, quer penitenciais, não configuram por si só caso
de consumação prematura de ato de concentração econômica.
9 Referências
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