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O mundo poético de Gil Vicente e seu panteísmo literário inundou e proporcionou à história

da literatura portuguesa com a mais rica representação do folclore peninsular, uma criação
original a partir de elementos tradicionais da Idade Média, dando voz a uma classe
extremamente vilipendiada, os camponeses, vítimas de todas as mazelas proporcionadas pelas
camadas mais altas, foi a sua sensibilidade para com os menos favorecidos, que deu vida as
mais mordazes sátiras aos clérigos e demais autarquias da idade média. Saraiva vai dizer
que“Os tipos vicentinos abrangem o conjunto da sociedade portuguesa da sua época. Na
base está o camponês "pelado" por fidalgos e clérigos a cuja voz Gil Vicente dá acentos
comoventes. No topo estão os clérigos de vida folgada e os fidalgos presunçosos e vãos, que
vivem uns e outros de confiscar o trabalho alheio...” (SARAIVA, pp. 7-22).

O teatro popular vicentino são verdadeiras críticas a vícios sociais transformadas em obras
literárias, o qual retrata o comportamento social de grupos representativos das camadas da
estrutura do tecido social, principalmente da nobreza e do clero, onde foca suas sátiras mais
intensas, vemos isso por exemplo no Alto da Barca do Inferno, onde ele narra a moralidade
religiosa versando o tema da redenção interagindo com figuras alegóricas.

Certamente seu maior alvo, é como bem retrata António José Saraiva, os agentes de injustiça
social, o clero "Gil Vicente soube aproveitar a sua situação na corte para uma crítica
atrevidíssima de diversos vícios sociais, especialmente relativos à nobreza e ao clero.", pois
estes se aproveitavam da sua posição eclesiástica para gozar a vida e espoliar os camponeses
estes são duramente criticados. Na Barca do Inferno assim como noutras obras como o Auto
da Feira, Auto da Alma e Barca da Índia, há uma alegoria simbólica além da alegoria
estrutural, a saber, as duas funções que desempenha a alegoria no teatro vicentino, é onde
reside a verdadeira mensagem de Gil Vicente, nele consta as correções morais e religiosas,
onde este simbolismo apresenta conotações do mundo espiritual, traço do teocentrismo
tradicional. De certo, essa caracterização das camadas sociais nos apresenta a mentalidade
psicossocial de diversas classes, como o Fidalgo, o Sapateiro, o Corregedor e o Frade
personagens-tipo do auto da Barca do Inferno.

Como podemos ver, o teatro popular de Gil Vicente apresenta características marcantes e
bastante padronizadas, que não podem ser desprezadas, e tem que ser entendidas dentro desta
realidade, sendo as principais: a crítica, a religiosidade, mas de um angulo diferente do que é
aceito na época, a didática e o senso moral. Mas como bem pontua Saraiva, essa ideologia
bem definida de Gil Vicente está calcada nos valores cristãos, e todo o combate ideológico
que trava contra a sociedade feudal está ligado a recursos que advém do conhecimento das
escrituras e também, como não poderia deixar de ser, da inspiração popular. "A sua crítica da
sociedade feudal em um critério moralista, e não oferece para ela qualquer alternativa.
Condena o fidalgo pela sua soberba, o artífice pela sua cobiça, o clérigo pela sua
devassidão, e tem pelo camponês a simpatia do Sermão da Montanha pelos humildes e
espoliados." (SARAIVA, pp. 7-22)

Além do que, o teatro vicentino é multiforme tendo vários gêneros, tais como: Auto pastoril, a
moralidade religiosa, as narrações bíblicas, a fantasia alegórica, a farsa episódica e o auto
narrativo, mas todas essas se encaixam em três grandes classes: a Alegoria, o Quadro e a
Narrativa.

Em suma, o teatro de popular Gil tem uma gama de riqueza poética incomparável, e a
conectividade que faz com os temas clássicos são extremamente geniais, e os personagens-
tipo bastante substanciais e variados, a não limitação da verossimilhança teatral o permitiu
utilizar ricamente paradoxos para criticar as convenções sociais através da fantasia, seus
aforismos são singulares e extremamente perspicazes, por tudo isso a personalidade poética
vicentina, com efeito, foram e são um marco para a literatura portuguesa e sua importância
social é grandiosa, merece ser mais contemplado nas esferas acadêmicas, pois sua obra pode e
deve ir além do gênio literário. “A substancia da obra de Gil Vicente não se traduz nem se
esgota facilmente em sentenças. Não é fácil transpô-la e prosa discursiva. ” (SARAIVA, pp.
7-22)

REFERENCIAS:

SARAIVA, António José, Teatro de Gil Vicente, Apresentação e Leitura de António José Saraiva,
Portugália Editora, Lda., 6.ª Edição, Lisboa, s.d., pp. 7-22.

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