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O
Deveres e responsabilidades do Chief Compliance
EX
Officer na condução de investigações internas,
à luz dos programas de integridade
CL
Duties and responsibilities of the Chief Compliance
Officer in conducting internal investigations, in
U
the light of the integrity programs
SI
Cassio Roberto Conserino
Pós-graduando na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, em Direito Penal e Criminologia (2020).
VO
Bacharel em Direito pela Faculdade Católica de Direito de Santos. Em sua experiência junto ao MPSP,
foi integrante do GAECO – Grupo de Atuação Especial e Combate ao Crime Organizado (2003/2012).
É autor de livros sobre “Lavagem de Dinheiro” e “Crime Organizado e Institutos Correlatos”, pela
Editora Atlas. Promotor de Justiça Criminal do Ministério Público do Estado de São Paulo – MPSP.
cassio_conserino@hotmail.com
DO

João Rodrigues da Costa Bonvicino


Advogado, é bacharel em Direito pela PUC/SP. MBA em Direito Eletrônico pela Escola Paulista de
Direito – EPD, Pós-Graduado em Técnicas de Combate ao Crime Organizado pela Escola Superior
do Ministério Público do Estado de São Paulo e Especialista em Proteção a Vítimas, Testemunhas
e Colaboradores da Justiça pela Universidade Católica de Brasília – UCB. É professor convidado do
Curso de Compliance Executivo do Insper, na matéria de Investigações Privadas.
jbonvicino@gmail.com
SE

ÁREAS DO DIREITO: Penal; Comercial/Empresarial


N

O presente artigo analisa os deveres e as responsabilidades do Chief Compliance Officer


quando na condução de investigações internas, no contexto de programas de integridade.
Com o objetivo de analisar o tópico, procurou-se definir compliance com base na legislação
AD

pátria, estabelecer o conceito de programa de integridade, tratar das bases das investiga-
RESUMO:
ções internas perante o sistema jurídico brasileiro, e como parte essencial do programa de
integridade, e, assim, analisar finalmente as bases legais que delimitam os deveres e as
responsabilidades profissionais do Chief Compliance Officer, nas situações em que lidera
procedimentos de investigações empresariais.
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PALAVRAS-CHAVE: Compliance – Chief Compliance Officer – Programa de integridade – Investigações internas.

Out.-Dez. 2020 • Revista de Direito Penal Econômico e Compliance • 31


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Deveres e responsabilidades do Chief Compliance Officer na condução de investigações internas, à luz dos programas de integridade

This article aims to review the legal basis of the roles and responsibilities of the Chief
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Compliance Officer when leading Internal Investigations in Brazil. To achieve this objec-
tive, we studied the legal basis to define compliance from a Brazilian legal perspective,
including the basis for conducting Internal Investigations and its main characteristics.
ABSTRACT:
On this direction, we scrutinized the role of the Chief Compliance Officer before the
aforementioned assumptions. The final objective was to conclude describing limits of
EX
responsibilities of this professional when managing Internal Investigations and its con-
sequences.

KEYWORDS: Compliance and Ethics Program – Chief Compliance Officer – Internal Investigations.
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SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Programa de integridade e o conceito de compliance adotado
pelo Brasil. 3. Investigações internas e seus limites legais à luz do programa de integridade.
4. Chief Compliance Officer ou o Profissional com Deveres de Compliance. 5. Deveres e res-
U
ponsabilidades do Chief Compliance Officer frente à condução de investigações internas.
6. Considerações finais.
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1. Introdução
VO
principais características e seus limites le-
gais, e o uso dos resultados de investiga-
O presente artigo tem por objetivo tra- ções internas em sede de cooperação com
tar dos deveres e das responsabilidades do autoridades competentes; (iii) a defini-
Chief Compliance Officer frente à condu- ção de Chief Compliance Officer, caracte-
ção de investigações internas. Para tanto, rísticas de suas atividades, e a análise de
DO

foi percorrido o caminho metodológico seus deveres e responsabilidades no exer-


de definir compliance com base na legisla- cício da função, notadamente no que tan-
ção pátria, localizar as investigações inter- ge à condução de investigações internas
nas como parte essencial do programa de ou corporativas.
integridade e, a partir de tais balizamen-
No item 2, mencionamos o programa
tos, analisar os comandos legais que deli- de integridade e o conceito de compliance
SE

mitam os deveres e as responsabilidades adotado pelo Brasil, abordamos as bases le-


profissionais do Chief Compliance Officer gais para definição de programa de inte-
liderando procedimentos de investigações gridade em jurisdição local e exploramos
empresariais. o significado do termo compliance a par-
N

Em síntese, o artigo se propõe a ana- tir do critério legal adotado pelo legislador
lisar, dessa forma, os seguintes aspectos a brasileiro. Essa verificação se fez necessá-
AD

respeito dos temas definidos: (i) a defini- ria para localizar o tema, visto que muitas
ção de compliance e integridade corporati- das definições de compliance adotadas pe-
va especificamente adotada pela legislação las doutrinas disponíveis se inspiram em
brasileira, e as diretrizes que compõem conceitos provenientes de sistemas legais
sua concepção; (ii) a condução de inves- de outros países, notadamente o dos Esta-
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tigações internas, como pilar do progra- dos Unidos da América – EUA, com forte
ma de integridade, sua natureza jurídica, influência do Foreign Corrupt Practices Act

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(considerada uma das principais leis anti- do CCO à frente de procedimentos investi-
corrupção daquele país).1 gatórios de natureza privada.
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No item 3, abordamos as investigações As considerações finais, diante do ra-
internas e seus limites legais à luz do pro- cional adotado, reforçam a necessidade
grama de integridade, tratamos da nature- de os programas de integridade no Bra-
EX
za jurídica da investigação corporativa, seu sil revisarem as suas bases normativas, de
papel como pilar do programa de integri- forma a cumprirem integralmente com a
dade, seus limites legais, o trato e manu- Constituição Federal e as leis infracons-
seio com a prova colhida em sede privada, titucionais, especialmente no que tange
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e as possibilidades de uso de certos tipos aos limites legais de atuação do ente priva-
de elementos de informação em sede ad- do em situações que envolvam potenciais
ministrativa ou judicial com base em re- crimes e suas consequências no ambiente
ferências provenientes da jurisprudência empresarial e exijam a condução de proce-
U
trabalhista. É, ainda, tratado nesse item, o dimentos de investigações internas.
tema do uso dos resultados de investigação
interna para cooperação com autoridades.
SI
2. Programa de integridade
No item 4, referimos o Chief Complian-
e o conceito de compliance
ce Officer ou o Profissional com Deveres
de Compliance, abordamos o conceito de
adotado pelo Brasil
VO

Chief Compliance Officer, ou CCO, como A expressão compliance origina-se do


aquele profissional que lidera o programa verbo inglês to comply, cujo significado li-
de integridade, e, por essa razão, é o prin- teral é estar de acordo, em conformidade,
cipal responsável pela condução de inves- ou simplesmente “cumprir”.2 Bom ilus-
tigações internas. O fio condutor adotado trar que o compliance não quer dizer que
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na pesquisa analisou, portanto, a natureza seja unicamente estar em conformidade,


de sua atividade para, em seguida, abor- não é a transferência de um conceito se-
dar seus principais deveres e responsabi- mântico que revelará o conceito jurídico
lidades. de um instituto, entretanto, a etimologia
Por último, no item 5, debruçamo-nos da palavra é essa e não pode ser relegada
nos deveres e nas responsabilidades do Chief ao esquecimento quando for objeto de
SE

Compliance Officer frente à condução de in- análise. No meio jurídico brasileiro, a ex-
vestigação internas, em que se procurou pressão ganhou força ao ser utilizada nos
delimitar os deveres e as responsabilidades últimos anos para definir sistemas de ética
N

1. Como amplamente divulgado à época de sua promulgação, a Lei Federal 12.846/2013, também
AD

conhecida como Lei Anticorrupção, foi fortemente influenciada pela legislação similar dos EUA,
como mostra essa reportagem do Estadão, de 30.08.2016. Disponível em: [https://economia.
estadao.com.br/discute/inspiracao-estrangeira-ajuda-no-combate-a-corrupcao-no-brasil,278].
Acesso em: 14.07.2020.
2. Comply, do Inglês “cumprir” ou “consentir”, livre tradução disponível gratuitamente no website “Dicio-
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nário Linguee”, 2020, “dicionário inglês-português e buscador de traduções”. Disponível em [www.


linguee.com.br/portugues-ingles/search?source=auto&query=comply]. Acesso em: 14.07.2020.

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e integridade empresariais voltados para o públicos e privados são centrais para a


enfrentamento à fraude e corrupção. aplicação desse conceito em nosso orde-
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Vale destacar que pouco se discute a res- namento pátrio. Conforme estabelece a
peito do papel do ente privado no exercício Constituição Federal em seu artigo 37,
de funções de fiscalização de ilícitos. Exem- caput, a legalidade é princípio que rege a
EX
plos de definições de compliance usualmente administração pública. Em contraposi-
adotadas por boa parte dos autores e profis- ção, nos termos do artigo 5º, inciso II, da
sionais de mercado abordam o tema empres- Constituição Federal, é direito fundamen-
tando conceitos estrangeiros que ignoram tal no Brasil a máxima de que “ninguém
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não ser função precípua do ente privado re- será obrigado a fazer ou deixar de fazer al-
portar, investigar e sancionar condutas que guma coisa senão em virtude de lei”. Ex-
representem crimes ou ilícitos. plica Alexandre Mazza, em seu Manual de
Direito Administrativo:
O Estado, antes de tudo, detém o exer-
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cício do poder político. O Poder Político, “esse dispositivo constitucional contempla
nas palavras de Sundfeld,3 é caracterizado a chamada legalidade geral cujo alcance
SI
por dois elementos fundamentais: a pos- ultrapassa as fronteiras do Direito Admi-
sibilidade do uso da força física contra nistrativo. Na verdade, referido comando
aqueles que não se comportem conforme estabelece garantia ampla de que os parti-
VO
as regras vigentes; e a reserva de tal pos- culares não terão sua liberdade restringida
sibilidade, com exclusividade ao referido senão pelo parlamento.”4
ente público. Disso decorre a máxima de
Assim, aos particulares é vedada a con-
que todos, na sociedade brasileira, estão
duta que estiver proibida em lei, apenas.
subordinados ao Estado, invariavelmente.
Essa noção por vezes é conflitante com a
Segundo o autor:
DO

ideia do ente privado, notadamente a pes-


“[...] Estado de Direito é o que se subordina soa jurídica, investigar ilícitos e agir como
ao Direito, vale dizer, que se sujeita a nor- se Estado fosse no enfrentamento à corrup-
mas jurídicas reguladores de sua ação. O ção e à fraude. Por outro lado, é de interes-
Estado Polícia apenas submetia os indiví- se das pessoas jurídicas afastar problemas
duos ao Direito, mas não se sujeitava a ele.” jurídicos frente às autoridades públicas, de
SE

modo a permitir que a empresa possa focar


Dessa prerrogativa nasce o poder de esforços na atividade empresarial.
polícia, que atribui ao Estado a função de Evidências de que esse debate tem sido
apuração de ilícitos em geral. ignorado quando do aprofundamento do
N

Nesse sentido, no Brasil, o conceito de conceito de compliance adotado pelo Bra-


compliance deve ser criteriosamente ava- sil podem ser verificadas em definições de
liado com essa ótica, antes de ser aplica- compliance utilizadas na literatura atual,
AD

do. As diferenças essenciais entre os entes que apontam para referências distantes

3. SUNDFELD, Carlos Ari. Fundamentos do Direito Público. 5. ed. 7. tir. São Paulo: Malheiros Edito-
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res, 1992, p. 37.


4. MAZZA, Alexandre. Manual de Direito Administrativo. São Paulo: Editora Saraiva, 2015, p. 102.

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do sistema jurídico brasileiro, conforme autor assinala que existência de um progra-


os exemplos adotados por Artur de Brito ma de compliance eficaz pode excluir a per-
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Gueiros Souza: secução penal contra a corporação depois
do cometimento de um ilícito por parte de
“Programa de compliance – ou programa de seus integrantes ou prepostos. Além disso,
se a empresa vier a ser acusada e condenada
EX
integridade ou cumprimento – compreen-
de o conjunto de medidas preventivas de por crime cometido em seu nome ou bene-
autocontrole ou de autovigilância, adotadas fício, o fato de adotar um compliance pode
por corporações públicas ou privadas, para acarretar uma punição mais branda, nos
que seus dirigentes e empregados cumpram termos das U.S. Sentencing Guidelines.” 5
(grifo nosso).
CL
com as normativas, tanto internas como
externas, com o objetivo de se evitar a ocor-
rência de infrações, inclusive às de natureza Nota-se que a base utilizada para a de-
penal. O compliance também compreende finição exemplificada, que é comumente
medidas repressivas, vale dizer, protocolos adotada pelo mercado corporativo em geral,
U
de investigação de infrações já ocorridas, parte de referência dos EUA e menciona in-
sancionando-se, internamente, os seus res- clusive o guia que rege a atividade dos pro-
ponsáveis, bem como comunicando tais
SI
motores federais ao avaliaram os programas
ocorrências aos órgãos públicos fiscaliza-
dores. Entre os diversos instrumentos ine-
de compliance, intitulado United States Fede-
rentes a um programa de compliance está a ral Sentencing Guidelines,6 conforme explica
o Departamento de Justiça dos EUA:
VO
implantação de códigos de ética e políticas
de boa governança, bem como o estabele-
cimento de canais de denúncias (hotlines) “Additionally, the United States Senten-
à disposição de empregados ou do público cing Guidelines advise that consideration
externo, vale dizer, a quem queira figurar be given to whether the corporation had
como informante ou whistlebower. in place at the time of the misconduct an
effective compliance program for purposes
DO

Nesse sentido, Philip A. Wellner leciona


que compliance é o mecanismo interno of calculating the appropriate organizatio-
adotado pelas corporações para identificar nal criminal fine.”7
e prevenir a ocorrência de infrações dentro
das companhias, sendo certo que seus ele- Ou, em livre tradução:
mentos básicos seriam: 1) código de condu-
ta formal; 2) a existência de um compliance “Adicionalmente, o Guia dos Estados Uni-
SE

office e um compliance officer; e 3) canal de dos para Sentenciamento recomenda que


denúncias para os trabalhadores. Aquele seja considerado se a corporação possuía
N

5. SOUZA, Artur de Brito Gueiros. O informante no contexto dos sistemas de compliance. In: Minis-
tério Público Federal: inovações da Lei 13.964, de 24 de dezembro de 2019. Brasília, 2020. (Cole-
tânea de artigos, v. 07).
AD

6. Noções essenciais a respeito do sistema dos EUA a esse respeito podem ser estudadas no guia Fede-
ral Sentencing, The Basics, emitido pelo United States Sentencing Comission dos EUA. Disponível
em: [www.ussc.gov/sites/default/files/pdf/research-and-publications/research-projects-and-sur-
veys/miscellaneous/201811_fed-sentencing-basics.pdf]. Acesso em: 14.07.2020.
7. Departamento de Justiça dos EUA. Avaliação de Programas de Compliance Corporativo (Evalua-
O

tion of Corporate Compliance Programs), atualizado em junho de 2020. Disponível em: [www.
justice.gov/criminal-fraud/page/file/937501/download]. Acesso em: 14.07.2020.

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programa de compliance que possa ser con- por meio de códigos de ética e de conduta
siderado efetivo, no momento em que a ou outras políticas, normas e procedimen-
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conduta ilícita ocorreu, com o propósito de tos de controles corporativos, a parte in-
calcular a multa criminal” (grifos nossos). terna de cumprimento a qual deve se ater
o compliance.
EX
De se notar que tal diploma, embo-
ra não seja lei federal, trata-se de um guia Relevante afirmar que são regras de
com critérios objetivos direcionados aos cumprimento de programas com deveres
juízes para a aplicação da pena. É um mo- aplicáveis às empresas, que se dispõem
do de balizar qual será a resposta do Esta- unilateralmente a cumpri-los com o de-
CL
do quando se deparar com a hipótese de siderato de evitar desvios e também me-
argumento do compliance criminal. No lhorar a imagem e, ainda, colaborar para
capítulo VIII desse guia, por exemplo, te- uma sociedade mais justa e solidária. In-
mos informações concretas de como será questionavelmente, prevenir a incidência
U
avaliada a responsabilidade penal da pes- de ilícitos é muito melhor que remediá-
soa jurídica. Como se vê, há uma distância -los, em todos os sentidos, mormente no
que pertine à credibilidade e à reputação
SI
muito grande com o que acontece ordina-
riamente no cotidiano jurídico brasileiro. de uma empresa ou marca. Ainda assim,
isso não significa que o ente privado tenha
como missão cumprir com funções essen-
VO
¾ De todo modo, independentemente de cialmente de competência do Estado.
os conceitos que inspiram a prática de com-
pliance no Brasil partirem de premissas pre- Importante mencionar, nesse senti-
sentes em um sistema jurídico diverso do do, a definição de compliance adotada pe-
nosso, como dito, em que a pessoa jurídica lo Conselho Administrativo de Defesa
poderá inclusive ser sancionada criminal- Econômica – CADE, em seu “Guia: Pro-
DO

mente, conforme demonstrado pelo trecho grama de Compliance”: “Compliance é um


destacado, essa é a concepção que tem sido conjunto de medidas internas que per-
aplicada na prática. mite prevenir ou minimizar os riscos de
violação às leis decorrentes de atividade
Assim, uma vez inserido no meio cor- praticada por um agente econômico e de
porativo, portanto, o termo presta-se a in- qualquer um de seus sócios ou colabora-
SE

dicar que aquela pessoa jurídica que atua dores”.8


em compliance se submete à legislação a ela Cotejando as definições trazidas, é pos-
aplicável e alinha-se, por conseguinte, às sível afirmar que um dos principais objeti-
normas contábeis, jurídicas, tributárias, vos do compliance é evitar ou corrigir desvios
N

financeiras, trabalhistas, ambientais, en- de condutas que possam operar conflitos ju-
tre outras, respeitando-se regras internas diciais para o negócio e, consequentemente,
AD

e externas de órgãos regulamentadores. enodoar a sua fama e seu desempenho, in-


Ademais, regula-se o ambiente interno, fringindo vedação legal. Contudo, não são

8. CADE – Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Guia: Programas de Compliance: orien-


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tações sobre estruturação e benefícios da adoção dos programas de compliance concorrencial.


Brasília, 2017.

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apenas conflitos judiciais. O programa de segunda visão em que se observa o equilí-


compliance, assim, é amplo, relacionando- brio social e o da empresa/instituição, mor-
O
-se a diversas vertentes: mente com questões afetas à observância
de normas regulatórias, ambientais, tribu-
¾ ética e a implementação de um código de tárias, trabalhistas, ou ainda outras pró-
EX
ética e código de conduta;9 prias de cada mercado específico.
¾ socioambientais; Conforme escólio do decano do Su-
¾ de cultura corporativa; premo Tribunal Federal, ao discorrer so-
¾ segurança da informação; bre a conceituação de compliance no cerne
CL
da Ação Penal 470 (“Mensalão”), que te-
¾ privacidade de dados;
ve como parte de seu contexto o ambien-
¾ transparência; te das instituições financeiras, compliance:
¾ governança corporativa;
U
¾ boa gestão; “tem por objetivo possibilitar a implemen-
¾ accountability (prestação de contas e tação de rotinas e condutas, ajustadas às
transparência); diretrizes normativas fundadas nas leis,
SI
atos e resoluções emanados do Banco Cen-
¾ risk assessment (avaliação de riscos);
tral, bem assim normas apoiadas nas deli-
¾ investigações internas; berações emanadas da própria instituição
VO
¾diligências de terceiros, entre outros tópicos. financeira – há um controle externo, mas
também há um controle interno – em or-
Em linhas gerais, os programas de dem a viabilizar de modo integrado as boas
práticas de governança coorporativa e de
compliance visam, então, otimizar as ati-
gestão de riscos.”10
vidades e relações empresariais; diminuir
riscos, perda de recursos e credibilidade
DO

Essa visão vislumbra a prática de com-


proveniente de possíveis condenações en-
pliance com a finalidade precípua de en-
volvendo a empresa; e fomentar, sobremo-
frentar a corrupção, as fraudes, a lavagem
do, a ética empresarial.
de dinheiro, dentre outras ações delituo-
Destaca-se que o programa de com- sas e, aparentemente, situações revestidas
pliance atua em duas vertentes: a ótica da de ilicitudes, no campo penal ou adminis-
própria empresa/instituição a partir da fis-
SE

trativo. As práticas de compliance, prosse-


calização interna visando à repressão de in- gue o ministro:
frações por parte de seus empregados, que
não só transgridam o patrimônio da em- “devem ser encaradas como uma ativida-
presa/instituição, mas também evitar toda de central e necessária ao gerenciamento
N

sorte de condutas ilícitas; e, ainda, numa de risco das instituições financeiras e das
AD

9. Importante dizer que o código de ética e o código de conduta são documentos diversos. O segundo
diz respeito às condutas que devem ser discriminadas com o fim de dar concretude aos princípios
éticos descritos no código de ética.
10. BRASIL. STF – Supremo Tribunal Federal. Ministro Celso de Mello vota pela condenação de três diri-
O

gentes do Banco Rural e absolve Ayanna Tenório. Notícias STF, 06.09.2012. Disponível em: [www.
stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=217450]. Acesso em: 04.06.2020.

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empresas em geral, o que impõe aos admi- de pessoas jurídicas que produzirem atos
nistradores que atuem com ética, que ajam contrários à Administração Pública, opor-
O
com integridade profissional e que proce- tunizou a concessão de benefícios, nos
dam com idoneidade.” ilícitos administrativos e civis, àquelas
empresas que possuam área de compliance,
EX
No Brasil, o termo inglês complian- nos termos do artigo 7º, VIII, do referido
ce se popularizou com o advento da Lei dispositivo legal. Empresas que possuam
12.846/2013 (“Lei Anticorrupção”), mas mecanismos e procedimentos internos de
já temos informações a seu respeito ao me- integridade, auditoria e incentivo à de-
nos desde o advento da Lei 9.613/98, que
CL
núncia de irregularidades e a aplicação
previu o Controle de Operações Finan- efetiva de códigos de ética e de conduta
ceiras e suas incumbências. Além disso, no âmbito da pessoa jurídica, entre outros
um ano antes, o próprio BACEN (Banco elementos de controles internos, poderão,
Central) editou a Resolução 2554/9811 no assim, pleitear diminuições de sanções pe-
U
mesmo sentido, ou seja, da instituição e rante autoridades competentes.
implementação de controles internos.12
Nesse diapasão, faz-se possível a con-
SI
Segundo professou André Martinez:
cessão de benefícios quando, nos termos
“Num primeiro momento (anos 1999/ do artigo 7º, VII, da mesma lei, houver
cooperação da pessoa jurídica para a apu-
VO
2000), as instituições financeiras foram
obrigadas a criar em seus organogramas ração das infrações que eventualmente
áreas específicas de compliance, capaci- seus integrantes tenham produzido, quer
tando os responsáveis por referidas áreas. em autoria, quer em coautoria. O signifi-
Foram elaborados então códigos de éticas, cado de cooperação, nesse contexto, dever
cartilhas de conduta no atendimento aos ser compreendido como transparência e
clientes, treinamentos em agências, aná-
DO

compromisso em apurar os fatos de forma


lises matricial de riscos operacionais e de consistente, por meio de metodologias re-
mercado, entre outras tarefas. Sem falar na conhecidas, sob a coordenação das autori-
inauguração de uma nova era cultural sem-
dades, e conforme suas solicitações dentro
pre voltada para a ética e para a completa
das regras legais vigentes.
atenção à conformidade de todos os atos e
contratos às leis e demais normas aplicá- É possível afirmar que o artigo 7º, caput,
SE

veis ao ramo de atividade financeira.”13 da Lei Anticorrupção, nesse sentido, guarda


similitude com o artigo 59 do Código Penal,
O diploma legal de 2013, ao discrimi- que trata das circunstâncias judiciais para a
nar as sanções administrativas e judiciais aplicação da pena em crimes de modo geral.
N AD

11. Modificada parcialmente pelas Resoluções 3056/02 e 4390/14, ambas do BACEN (Banco Central).
12. Art. 1º. Determinar às instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo
Banco Central do Brasil a implantação e a implementação de controles internos voltados para as
atividades por elas desenvolvidas, seus sistemas de informações financeiras, operacionais e geren-
ciais e o cumprimento das normas legais e regulamentares a elas aplicáveis.
O

13. MARTINEZ, André Almeida Rodriguez. Compliance no Brasil e suas origens. 18.11.2016. Dispo-
nível em: [www.ibdee.org.br/compliance-no-brasilesuas-origens/].

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Portanto, nos casos em que se vislumbra- Em que pese o guia não servir como norma
rem a incidência de programas desenvol-
O
ou lei, é relevante notar, por intepretação in-
vidos em setores internos de compliance de versa, que o compliance genérico, ou não es-
determinada pessoa jurídica, as sanções po- pecífico, cobriria diversos outros temas que
derão ser minoradas, conforme prescreveu não apenas anticorrupção e atos contra a ad-
EX
o Decreto 8.420/2015, que regulamentou a ministração pública.
Lei Anticorrupção, com a possibilidade de
contemplação com descontos no valor de Nesse sentido, como se verá a seguir, os
eventual multa e diminuição ou eliminação paradigmas trazidos pelo referido decreto,
CL
de outras sanções previstas em lei. Impor- ao definir programa de integridade, supe-
tante dizer que, embora a Lei Anticorrup- ram em absoluto o tema da corrupção, re-
ção não tenha mencionado expressamente presentando um conjunto de mecanismos
o compliance criminal, limitando-se a ana- amplos que trata de temas como ética, an-
U
lisar ilícitos civis e administrativos, certo tifraude, devida diligência, necessárias co-
é que o seu decreto regulamentador con- municações, funcionamento e gestão de
ceituou de modo geral o programa de inte- canais de denúncias, treinamento, cul-
SI
gridade, donde se defluiu a conceituação tura corporativa, compromisso de gesto-
de compliance, que uma vez aplicado para res, entre outros elementos que não estão
evitar infrações penais, no âmbito empre- circunscritos apenas ao universo dos atos
VO

sarial, pode ser entendido como compli­ance contra a administração pública ou envol-
criminal. vendo agentes públicos.
Nessa perspectiva, sempre que uma
pessoa jurídica tiver que justificar para
¾ Nesse sentido, vale destacar como o ter-
mo compliance é utilizado no guia elabora- autoridades públicas no Brasil que ade-
DO

do pela Controladoria-Geral da riu a um programa de compliance, terá que


União,14 que se manifestou as-
sim:
“Programa de integridade é
um programa de complian-
SE

ce específico para preven-


ção, detecção e remediação
dos atos lesivos previstos na
lei 12.846/2013, que tem
como foco, além da ocor-
N

rência de suborno, tam-


bém fraudes nos processos
de licitações e execução de
AD

contratos com o setor pú-


blico.”
O

14. BRASIL. Controladoria-Geral da União. Programa de Integridade: diretrizes para empresas priva-
das. Brasília, setembro de 2015.

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atender às bases da definição prevista na iii. padrões de conduta, código de ética e


legislação pátria, notadamente ao que dis-
O
políticas de integridade estendidos, quan-
posto no Decreto 8.420/2015. Acentua-se, do necessário, a terceiros, tais como: forne-
mais uma vez, que referida regulamenta- cedores, prestadores de serviço, agentes
ção trouxe consigo o conceito adotado pe- intermediários e associados;
EX
lo legislador sobre o tema, que deve ser o iv. treinamentos periódicos sobre o pro-
fundamento para discutir seu significado grama de integridade;
do ponto de vista jurídico no Brasil. v. análise periódica de riscos para realizar
Assim, conforme o artigo 41 do referi- adaptações necessárias ao programa de
CL
do Decreto, o que no mercado corporativo integridade;
entende-se por programa de compliance, vi. registros contábeis que reflitam, de for-
no Brasil, deve ser compreendido como ma completa e precisa, as transações da
programa de integridade. Nos termos do pessoa jurídica;
referido artigo, tal programa consiste, no vii. controles internos que assegurem a
U
âmbito de uma pessoa jurídica, pronta elaboração e confiabilidade de re-
latórios e demonstrações financeiras da
SI
“[...] [n]o conjunto de mecanismos e pessoa jurídica;
procedimentos internos de integridade, viii. procedimentos específicos para preve-
auditoria e incentivo à denúncia de irregu- nir fraudes e ilícitos no âmbito de processos
laridades e na aplicação efetiva de códigos
VO
licitatórios, na execução de contratos admi-
de ética e de conduta, políticas e diretrizes nistrativos ou em qualquer interação com o
com objetivo de detectar e sanar desvios, setor público, ainda que intermediada por
fraudes, irregularidades e atos ilícitos pra- terceiros, tal como pagamento de tributos,
ticados contra a administração pública, na- sujeição a fiscalizações, ou obtenção de au-
cional ou estrangeira.” torizações, licenças, permissões e certidões;
ix. independência, estrutura e autoridade
DO

Em complemento, para que tal progra- da instância interna responsável pela apli-
ma possa ser considerado como de fato es- cação do programa de integridade e fisca-
truturado e efetivo, conforme o artigo 42 lização de seu cumprimento;
do Decreto 8.420/2015, que faz alusão ao x. canais de denúncia de irregularidades,
§ 4º do artigo 5º do mesmo decreto, que abertos e amplamente divulgados a fun-
se refere à dosimetria das sanções a serem cionários e terceiros, e de mecanismos
SE

aplicadas, de rigor que determinados pa- destinados à proteção de denunciantes de


drões precisam ser atendidos e avaliados boa-fé;
em conjunto, a saber: xi. medidas disciplinares em caso de viola-
ção do programa de integridade;
N

i. comprometimento da alta direção da pes- xii. procedimentos que assegurem a


soa jurídica, incluídos os conselhos de ad- pronta interrupção de irregularidades ou
ministração, evidenciado pelo apoio visível infrações detectadas e a tempestiva reme-
AD

e inequívoco ao programa de integridade; diação dos danos gerados;


ii. padrões de conduta, código de ética, xiii. diligências apropriadas para contra-
políticas e procedimentos de integridade, tação e, conforme o caso, supervisão, de
aplicáveis a todos os empregados e admi- terceiros, tais como fornecedores, presta-
nistradores, independentemente dos car- dores de serviço, agentes intermediários e
O

gos ou função exercidos; associados;

40 • Revista de Direito Penal Econômico e Compliance • Out.-Dez. 2020


US
Deveres e responsabilidades do Chief Compliance Officer na condução de investigações internas, à luz dos programas de integridade

xiv. verificação, durante os processos de fu-


Ademais, não é necessário para a obten-
ção do benefício que todas as 16 particu-
O
sões, aquisições e reestruturações societá-
rias, do cometimento de irregularidades laridades anteriormente descritas estejam
ou ilícitos ou da existência de vulnerabili- presentes no respectivo programa. Porém,
dades nas pessoas jurídicas envolvidas; é necessário que efetivamente haja um pro-
EX
xv. monitoramento contínuo do programa grama, já que ele deve ser estruturado, de-
de integridade visando ao seu aperfeiçoa- ve ser aplicado e atualizado de acordo com
mento na prevenção, detecção e combate as características e os riscos atuais das ati-
à ocorrência dos atos lesivos previstos no vidades específicas de cada pessoa jurídica,
art. 5º da Lei 12.846, de 2013, e
CL
segundo a qual, por sua vez, deve garantir o
xvi. transparência da pessoa jurídica quan- constante aprimoramento e adaptação do
to a doações para candidatos e partidos referido programa visando, pois, à sua efe-
políticos. tividade, conforme o texto da lei. Argui-se
que um arremedo de programa de integri-
U
dade não experimentará efeitos civis ou ad-
Esses 16 elementos – que devem ser en- ministrativos.
SI
tendidos como pilares mínimos nos quais Essa visão baseada em riscos torna-se
tais programas baseiam-se, ou eixos de elemento central do programa de integri-
composição do sistema de integridade – dade, uma vez que, para que de fato possa
VO
poderão ser demonstrados documental- ser considerado efetivo, tal programa pre-
mente na defesa da pessoa jurídica para fins cisará ser baseado em prévia avaliação dos
de obtenção de benefícios na dosimetria da riscos específicos da organização à luz de
pena, no competente Processo Adminis- seus negócios, e que assim o implemente
trativo de Responsabilização. São modelos e auxilie na mitigação ou neutralização de
ou paradigmas que devem nortear um pro- tais riscos. Do ponto de vista legal, o inciso
DO

grama de integridade e dessa forma devem V do artigo 42 do decreto em comento tra-


ser entendidos. Novamente, descendo aos duz a presença da análise de riscos (risk as-
detalhes de tais parâmetros, fica claro que sessment) como elemento estruturante dos
tais práticas não se limitam apenas a lidar programas de integridade.
com casos de corrupção em uma empre- Importante destacar, nesse sentido,
SE

sa privada. Ao contrário, fraudes e desvios que a Controladoria-Geral da União, por


de natureza privada são notadamente mais meio da Portaria 909/2015,16 e demais
comuns que casos de corrupção, quando o atualizações, estabeleceu critérios para a
ambiente corporativo é analisado.15 avaliação dos programas de integridade
N

15. A respeito das estatísticas de atos ilícitos em empresas, importante conferir a pesquisa anual da
AD

Associação dos Examinadores de Fraudes dos EUA, a ACFE, Report to The Nations, estudo global
sobre fraude ocupacional e abusos, que traz dados a respeito das principais incidências de ilícitos
no campo privado, com base em pesquisa empírica (ACFE – Association of Certified Fraud Exami-
ners, Report to The Nations. Disponível em: [www.acfe.com/report-to-the-nations/2018/default.
aspx]. Acesso em: 14.07.2020).
O

16. BRASIL. Controladoria-Geral da União. Portaria 909/2015. Disponível em: [https://repositorio.


cgu.gov.br/handle/1/34001]. Acesso em: 14.07.2020.

Out.-Dez. 2020 • Revista de Direito Penal Econômico e Compliance • 41


US
Deveres e responsabilidades do Chief Compliance Officer na condução de investigações internas, à luz dos programas de integridade

das empresas como pressuposto para a cimento de ética na gestão empresarial, e


aplicação da diminuição da multa. Tais referida premissa deve também nortear as
O
critérios podem ser sintetizados da se- investigações privadas ou corporativas,
guinte forma: (i) demonstração de que aqui denominadas investigações inter-
o programa de integridade é compatível nas, simplesmente. Em especial, os inci-
EX
com o seu porte, perfil de atuação e po- sos VII, IX, X, XI e XII do artigo 42 do
sicionamento no mercado, (ii) apresenta- Decreto 8.420/2015 estabelecem claras
ção de relatório de perfil e conformidade diretrizes que podem ser adotadas como
do programa – histórico de incidência do fundamento para a condução de investi-
CL
programa, com resultados alcançados an- gações internas:
teriormente, na linha de prevenção de
atos lesivos e (iii) demonstração de que o a. procedimentos específicos para prevenir
programa foi aplicado no próprio ato le- fraudes e ilícitos no âmbito de processos
sivo, tendo funcionado como prevenção
U
licitatórios, na execução de contratos ad-
num dano maior ou na reparação do pre- ministrativos ou em qualquer interação
juízo causado. com o setor público, ainda que interme-
SI
Os custos da não implementação des- diada por terceiros, tal como pagamen-
to de tributos, sujeição a fiscalizações, ou
se programa de integridade podem se con-
obtenção de autorizações, licenças, per-
cretizar não apenas financeiramente, mas,
VO
missões e certidões;
ainda, ocasionar dano à reputação da em- b. independência, estrutura e autoridade da
presa ou da marca, cessação de licença da instância interna responsável pela aplica-
operação, sanções às instituições e aos ção do programa de integridade e fiscali-
executivos e empregados, entre outros. zação de seu cumprimento;
Esse contexto reforça a importância de sua c. canais de denúncia de irregularidades,
abertos e amplamente divulgados a fun-
DO

adoção e aprimoramento.
cionários e terceiros, e de mecanismos
Nesse sentido, as bases seguras para seu
destinados à proteção de denunciantes
desenvolvimento devem obedecer aos cri- de boa-fé;
térios trazidos pelo Decreto 8.420/2015, d. medidas disciplinares em caso de viola-
descritos nos artigos 41 e 42, com o ob- ção do programa de integridade;
jetivo de servir para a análise de conse- e. procedimentos que assegurem a pronta
SE

quências decorrentes de casos em que se interrupção de irregularidades ou infra-


exigem respostas por partes das áreas de ções detectadas e a tempestiva remedia-
integridade corporativa e compliance – e, ção dos danos gerados;
portanto, por parte de seus responsáveis –,
N

como é o caso das investigações internas, a Dessa forma, parte-se da premissa de


seguir especificadas. que a investigação interna perpassa como
eixo transversal aos elementos anterior-
AD

mente descritos, considerados indicado-


3. Investigações internas e seus
res para a estruturação de programas de
limites legais à luz do programa integridade.
de integridade
Enuncia-se que os limites da investi-
O

O programa de integridade pressupõe, gação privada repousam exatamente na le-


entre muitas características, o reconhe- gislação, e não poderá haver tergiversação,

42 • Revista de Direito Penal Econômico e Compliance • Out.-Dez. 2020


US
Deveres e responsabilidades do Chief Compliance Officer na condução de investigações internas, à luz dos programas de integridade

sob nenhuma hipótese, sob pena do com- comunicações telegráficas, de dados,


prometimento e do reconhecimento da das comunicações telefônicas de nature-
O
existência do próprio modelo de confor- za íntima e privada, consoante, respecti-
midade e da obtenção de seus almejados vamente, os artigos 5º, X,17 XI,18 XII,19 da
efeitos. Ademais, eventuais desvios su- Constituição Federal de 1988 (CF), entre
EX
postamente têm o potencial de tornar o outras prerrogativas – por exemplo, sigi-
valor probante dos elementos de informa- lo bancário – que demandam a necessária
ção angariados por procedimento privado ordem judicial para serem afastadas.
inválido. Assim, nos termos da legislação cons-
CL
Dessa forma, todas as diligências pre- titucional e civil (Código Civil e Código
vistas no Código de Processo Penal ou de Processo Civil), todos os meios de pro-
em leis extravagantes são hábeis e com- vas legítimos e moralmente aceitos po-
patíveis com modelos de investigações dem servir ao objeto de uma investigação
U
privadas desenvolvidas em programas privada, até por força do permissivo legal
de integridade, desde que: (i) não utili- de aplicação analógica no artigo 3º, do Có-
SI
zem ferramentas e ações fundamentadas digo de Processo Penal (CPP). Não só a
em poder de polícia, portanto, de com- ética e a moral assim fundamentam essa
petência exclusiva de autoridades go- asserção, mas também a legalidade e a ob-
VO
vernamentais, notadamente a polícia servância da ordem jurídica cuja análise
judiciária e o Ministério Público, sem as será confiada ao dominus litis da ação pe-
devidas ­autorizações judiciais; (ii) não nal, nos moldes dos artigos 12720 e 129,
violem proibições legais; (iii) não res- I, CF.21
trinjam direitos à intimidade, à vida pri- Em complemento, como ensinam os
vada, à honra ou à imagem das pessoas; delegados de Polícia Federal Élzio Vicen-
DO

(iv) não restrinjam a inviolabilidade do te da Silva e Denisse Dias Rosas Ribeiro,


domicílio, das correspondências, das quando tratam da colaboração premiada

17. Constituição Federal, artigo 5º, inciso X: são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a
SE

imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente
de sua violação; [...].
18. Constituição Federal, artigo 5º, inciso XI: a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela
podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre,
N

ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial.


19. Constituição Federal, artigo 5º, inciso XII: é inviolável o sigilo da correspondência e das comu-
nicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem
AD

judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instru-
ção processual penal.
20. O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incum-
bindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais
indisponíveis.
O

21. Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: I – promover, privativamente, a ação
penal pública, na forma da lei.

Out.-Dez. 2020 • Revista de Direito Penal Econômico e Compliance • 43


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Deveres e responsabilidades do Chief Compliance Officer na condução de investigações internas, à luz dos programas de integridade

O
EX
CL
U SI
e investigação, a investigação privada ja- investigação interna de natureza privada e
mais poderá ser confundida como investi- empresarial.
gação policial: E, dentro desse espírito de correção,
VO

moral, retilineidade e legalidade, enten-


“Observa-se de pronto que o livro trata
demos que é inviável, por exemplo, ter-
explicitamente de investigação policial
e não o termo mais utilizado – investi- ceirizar uma investigação privada com o
gação criminal – pois o que se pretende uso de detetives particulares que operam
com essa provocação é demonstrar que a em “zonas cinzentas”, com a aquisição de
DO

polícia, quando investiga, cumpre dever informações sensíveis em detrimento da


constitucional, decorrente do artigo 144 intimidade e vida privada do investigado,
da Constituição Federal de 1988. [...] em sites da internet que atuam à margem
Várias profissões e instituições realizam da juridicidade, comercializando, v.g., bi-
investigação. A acepção da palavra inves-
lhetagens de ligações telefônicas, utilizan-
tigar, do latim investigare, é atuar sobre
do aparelhos de interceptação ambiental à
SE

vestígios, perseguir rastros, inquirir, in-


dagar, procurar metódica e sistematica- revelia do devido processo legal que exi-
mente algo.”22 ge ordem judicial, inserindo rastreadores
de localização de veículos automotores e
Nesse sentido, o que não for exclusi- programas de espionagem no computa-
N

vamente de competência de investiga- dor (ainda que ele seja da empresa), não
ções governamentais, a exemplo da bem fazendo a diferenciação entre o que é pri-
AD

definida investigação policial, poderá ser vado e o que é profissional e estritamente


adotado como procedimento a título de corporativo.

22. SILVA, Élzio Vicente da; RIBEIRO, Denisse Dias Rosas. Colaboração Premiada e Investigação: prin-
O

cípios, vulnerabilidades e validação da prova obtida por fonte humana. São Paulo: Editora Novo
Século, 2018.

44 • Revista de Direito Penal Econômico e Compliance • Out.-Dez. 2020


US
Deveres e responsabilidades do Chief Compliance Officer na condução de investigações internas, à luz dos programas de integridade

De outro lado, temos, no ordenamen- telefônicas ao sabor de sua vontade ou à


to jurídico, ferramentas que podem ser revelia de autorização do Poder Judiciário.
O
usadas, independentemente de ordem Porém, no caso de telefones celulares cor-
judicial e que poderão ser válidas numa porativos, como titular da propriedade da-
investigação privada. Entende-se que o quele terminal telefônico, fixo ou móvel, o
EX
empregado, do mais alto ou menor esca- representante legal da empresa poderá so-
lão, não tem direito à preservação de sua licitar formalmente junto às operadoras de
intimidade quando utiliza dispositivos telefonia a bilhetagem daquele aparelho
eletrônicos corporativos de uma empresa telefônico e tomar ciência do número das
CL
que adota clara política de uso de recur- ligações efetuadas e recebidas durante de-
sos de tecnologia para fins estritamen- terminado intervalo temporal, sem que is-
te profissionais e à luz de seu contrato de so afete qualquer direito do empregado. O
trabalho. Essa proposição se aplica, natu- telefone é restrito a questões funcionais e
ralmente, a todos os dispositivos eletrôni- não pessoais. Trata-se de ferramenta de tra-
U
cos a ele disponibilizados pela organização balho, como já pacificou, notoriamente, a
como ferramenta de trabalho (e.g., celula- Justiça do Trabalho com relação à matéria.
SI
res corporativos, tablets, laptops, estações Esse mesmo raciocínio pode ser estendi-
fixas, hard drives externos, pen drives etc.). do para os casos de chips de telefonia cedi-
O mesmo princípio é válido no que diz res- dos ao empregado. Não haverá óbice para
VO
peito ao acesso a seu uso dos sistemas de que o empregador obtenha a bilhetagem
informação da companhia (ERP, correios das ligações efetuadas e recebidas no horá-
eletrônicos, sistemas financeiros ou de Bu- rio que compreende o início e o término do
siness Intelligence e os logs decorrentes de trabalho. Inclusive, o empregador poderá
tal utilização). requerer junto à concessionária de telefo-
nia, além da bilhetagem,23 também infor-
DO

mações sobre a estação rádio-base (ERB


ou cell site), conhecidas vulgarmente co-
mo antenas ou torres de celulares, para ob-
ter a posição topográfica provável de uma
ligação telefônica efetuada de um terminal
SE

telefônico móvel corporativo, em horário


de trabalho, e, mesmo fora do horário, se o
contrato de admissão permitir.
E quanto aos e-mails corporativos?
Adota-se o mesmo argumento. Independe
N

de ordem judicial para a obtenção de seus


conteúdos. Caso essa situação seja ain-
AD

É claro que isso não dá salvo-condu- da reforçada por normas internas da pes-
to para a empresa produzir interceptações soa jurídica, que regule o uso de correios
O

23. Relação das chamadas efetuadas e recebidas por um determinado terminal telefônico móvel ou
fixo, em determinado dia e horário.

Out.-Dez. 2020 • Revista de Direito Penal Econômico e Compliance • 45


US
Deveres e responsabilidades do Chief Compliance Officer na condução de investigações internas, à luz dos programas de integridade

eletrônicos corporativos, com adequada intimidade por parte do empregado. Para


previsão também junto ao contrato de tra- dar publicidade sobre essa relação, é indi-
O
balho, ainda mais clara será a possibilida- cado que no corpo dos e-mails conste essa
de de acesso às comunicações. observação, isto é, de que aquele ambiente
O seu rastreamento não fere a privaci- é controlado.
EX
dade de quem quer que seja, nem tampou-
co o direito do investigado a integridade ¾ O e-mail corporativo serve, definitivamen-
de sua correspondência profissional. A te, para assuntos profissionais. Caso, even-
utilização do computador funcional ou do tualmente, seja utilizado indevidamente
para assuntos pessoais, igualmente, não há
CL
provedor da empresa, igualmente, consti-
tui-se em apetrechos de trabalho e possibi- invocar direito à privacidade, de modo que o
conteúdo pode estar sob a esfera de disponi-
lita ao empregador obter seus conteúdos
bilidade da empresa. De outro ângulo, caso
a fim de levar a efeito a efetividade de seu o empregado acesse e-mail pessoal no am-
U
programa de compliance, quanto ao pilar biente de trabalho, obviamente, não terá o
da investigação interna. A gênese da fis- empregador direito a vasculhá-lo, sob pena
calização dos e-mails corporativos situa- de incidência ao direito à sua privacidade, de
SI
-se na prevenção do mau uso, abusivo ou norte constitucional.25
ilegal do mecanismo que, inclusive, pode
causar danos à empresa. Nessa perspecti- Foi exatamente esse o teor da decisão
VO
va, Vitral Amaro citou precedente no qual do Tribunal Superior do Trabalho, da la-
a Sétima Turma do TST concluiu que o vra do ministro Ives Gandra Martins Filho,
acesso a e-mail corporativo pela própria em- que dispôs:
presa não configura dano moral. Segundo
esse julgado, “se o meio de comunicação é “se o meio de comunicação é institucio-
nal, não existe violação de sigilo de corres-
DO

o institucional – da pessoa jurídica –, não


há de se falar em violação do sigilo de cor- pondência pela própria empresa. Nessas
respondência pela própria empresa, uma condições, o empregado não tem direito à
indenização. O ministro concluiu que, se
vez que, em princípio, o conteúdo deve ou
o trabalhador quiser sigilo garantido, deve
pode ser conhecido por ela”.24 criar o próprio e-mail em sistemas univer-
De mais a mais é aconselhável que já no sais, como o GMAIL do Google ou o Hot-
SE

contrato de trabalho o empregador insira mail do Windows.”


cláusula indicando que o e-mail corpora-
tivo é sua propriedade e que o ambiente Durante o julgamento do caso pe-
de trabalho será fiscalizado e monitora- la sétima turma, o ministro Pedro Manus
do, razão pela qual inexequível, posterior- lembrou que o e-mail protegido consti-
N

mente, alegar surpresa ou infringência à tucionalmente é o pessoal. Os ministros


AD

24. TST, ED-RR-996100-34.2004.5.09.0015, 7ª T., rel. Min. Ives Gandra Martins Filho, DEJT
20.02.2009. Disponível em: https://www.lexml.gov.br/urn/urn:lex:br:tribunal.superior.traba-
lho;turma.7:acordao;rr:2009-02-18;996100-2004-15-9-0. Acesso em: 03.22.2020.
O

25. SILVA, Roberta Silvestre; FAVARI, Erika de. E-mail corporativo, invasão de privacidade? Lira
Advogados, s.d. Disponível em: [www.liraatlaw.com/conteudo/e-mail-corporativo-invasao-de-
-privacidade].

46 • Revista de Direito Penal Econômico e Compliance • Out.-Dez. 2020


US
Deveres e responsabilidades do Chief Compliance Officer na condução de investigações internas, à luz dos programas de integridade

acompanharam o voto do relator e rejei- procedimento de preservação de dados


taram o recurso (RR 9961/2004-015-09- eletrônicos.
O
00.1).26 Pelas mesmas razões concernentes à
Identicamente possível a realização de propriedade do telefone corporativo,
procedimentos para cópia de HD corpora- a empresa também poderá exercer o direi-
EX
tivo, bem como seus respectivos backups. to de propriedade e checar as conversas do
É cediço que a coleta dessas informações aplicativo WhatsApp, Telegram ou de ou-
é valiosíssima para obtenção de informa- tros aplicativos congêneres, atinentes às
ções relevantes e deve seguir os trâmites mensagens instantâneas mantidas no te-
CL
do procedimento computacional foren- lefone empresarial cedido ao empregado
se, preservando-se a cadeia de custódia dos ou até mesmo naquelas mensagens, áu-
arquivos digitais para evitar alegações de dios e fotografias “baixadas” no computa-
nulidade posteriormente, além de garan- dor profissional. Não há qualquer direito
U
tir maior transparência no manuseio das ao sigilo. É claro que haverá limitação na
evidências que compõem a investigação. checagem, isto é, apenas conversas e do-
cumentos que dizem respeito ao trabalho
SI
De bom tom, ainda, tal qual se faz com
as atas de constatação de sites, que a reali- que poderão ser esquadrinhados, prote-
zação dessas cópias seja efetivada na pre- gendo-se, assim, o direito constitucional à
sença de um Tabelião de Notas do Registro intimidade e à privacidade, separando as-
VO

Civil, que firmará e validará a autenticida- suntos e temas de interesse exclusivo das
de da diligência, além de conferir-lhe ve- apurações.
rossimilhança probatória, conforme o que Desse modo, se o computador de pro-
prevê o artigo 384 do Código de Processo priedade da empresa ou telefone de pro-
Civil. Trata-se de medida importantíssima priedade da empresa forem cedidos ao
DO

e desnecessita de aviso prévio do emprega- empregado para a realização de seus mis-


do, que deve ser adotada sempre que pos- teres profissionais, aquele que cedeu – o
sível e com os cuidados técnicos cabíveis. empregador – tem a prerrogativa de verifi-
Isso porque a ata notarial é ato de do- car as mensagens trocadas, naquele âmbi-
cumentação e não tem o condão de vali- to profissional, sem causar qualquer tipo
dar, do ponto de vista legal, o elemento de de irregularidade ou violação à privacida-
SE

informação que se pretende registrar, ser- de de quem quer que seja, por se tratar de
vindo tão somente para aumentar o grau exercício regular de direitos, e, por isso,
de integridade do registro em si. Ao con- interesse legítimo.
trário, em situações concretas poderá, in- O mesmo se diga no que diz respeito
N

clusive, ocorrer de a ata notarial registrar à licitude da utilização do mecanismo da


procedimento posteriormente conside- geolocalização do aparelho celular corpo-
AD

rado equivocado, como um erro de com- rativo visando, pois, identificar o percur-
putação forense, ocorrido ao longo de um so do empregado em horário de trabalho,

26. TST, ED-RR-996100-34.2004.5.09.0015, 7ª T., rel. Min. Ives Gandra Martins Filho, DEJT
O

20.02.2009. Disponível em: https://www.lexml.gov.br/urn/urn:lex:br:tribunal.superior.traba-


lho;turma.7:acordao;rr:2009-02-18;996100-2004-15-9-0. Acesso em: 03.22.2020.

Out.-Dez. 2020 • Revista de Direito Penal Econômico e Compliance • 47


US
Deveres e responsabilidades do Chief Compliance Officer na condução de investigações internas, à luz dos programas de integridade

especialmente se o empregado for incum- Resultado do Exercício), no setor contá-


bido de trabalhos externos. Se se movi- bil, que concentra o resumo da saúde fi-
O
mentar com o aparelho fora do horário de nanceira da empresa, com a identificação
trabalho deverá tomar a cautela de desligar dos lucros e prejuízos, uma espécie de
o rastreamento ou não o utilizar para ou- controle financeiro e que pode mascarar
EX
tros fins que não os profissionais. Nessas eventuais ilícitos.
hipóteses, a empresa não tem a prerrogati-
va de conhecer seu itinerário. ¾ Nesse contexto, o Chief Compliance Officer,
Também é plenamente possível mo- ou o investigador privado que com sua su-
CL
nitorar acessos à internet, leiam-se sites e pervisão coordene a apuração, pode ser visto
similares, realizados a partir dos equipa- como espécie de gatekeeper da integridade
mentos da empresa, desde que guardem do procedimento investigativo. Vale desta-
car o exemplo do Provimento 188/2018 do
conexão com as atividades ou ambiente de
Conselho Federal da Ordem dos Advogados
U
trabalho. Igualmente, é plenamente viável do Brasil,27 que estabelece regras para os ca-
perscrutar a linha de histórico de navega- sos em que o advogado conduza diligências
ção da web contida no desktop de trabalho investigatórias, e assim indica a diretriz e a
SI
a fim de observar e ter conhecimento das governança para sua atuação, quando à fren-
páginas visitadas pelo empregado durante te de uma investigação de natureza privada,
o horário de trabalho. Esse monitoramen- no exercício da profissão.
VO

to decorre do próprio direito de proprieda-


de do empregador, que, adicionalmente, é Além da análise digital e da realização
também responsável pelos acessos realiza- de diligências eletrônicas que indepen-
dos por seus sistemas de redes e conexão dem de autorização judicial, importante
com a internet, a depender dos tipos de lembrar-se que se mostram factíveis e de
DO

acesso que seus empregados façam. grande valia as investigações tradicionais,


Forçoso destacar que, ainda que o em- tais como: diligências in loco, também cha-
pregado não tenha sido avisado acerca da madas diligências de campo e coleta de da-
possibilidade desse controle, entendemos dos, que se consubstanciarão por meio de
que a fiscalização é válida porque emerge entrevista com o próprio funcionário in-
unicamente do direito de propriedade da vestigado, bem como por intermédio de
SE

empresa que limita o uso daqueles apare- entrevistas com pessoas ligadas ou não a
lhos para apenas e tão somente a realização ele ou à fraude investigada – testemunhas,
do trabalho para o qual o empregado se dis- por exemplo –, realização de pesquisas
pôs, e não para outras funções ou situações nos próprios bancos de dados da empresa,
N

que, em tese, podem esbarrar em ilícitos. realização de análise documental (contra-


Outrossim, de rigor afirmar que a in- tos, aditamentos, notas fiscais de presta-
ção de serviços, relatórios, planilhas etc.);
AD

vestigação interna pode encontrar frau-


des também mediante uma análise detida a feitura da análise de seu perfil comporta-
do DRE da empresa (Demonstrativo de mental, que englobará a sua vida pregressa
O

27. OAB – Ordem dos Advogados do Brasil. Provimento CF/OAB 188/2018. Disponível em: [www.oab.
org.br/leisnormas/legislacao/provimentos/188-2018]. Acesso em: 19.06.2020.

48 • Revista de Direito Penal Econômico e Compliance • Out.-Dez. 2020


USDeveres e responsabilidades do Chief Compliance Officer na condução de investigações internas, à luz dos programas de integridade

profissional, e, sobretudo, um trabalho em que executa as suas funções, a motiva-


mais acurado de investigação social sobre ção que o levou a cometer a ilegalidade, caso
O
referido funcionário, no que tange à sua identificada pelos meios disponíveis; enfim,
atuação profissional. todas as circunstâncias fáticas que envolve-
A bem da verdade, essas diligências si- ram o ato ilícito descoberto na investigação
EX
tuar-se-ão em momento preliminar para a corporativa devem ser relatadas.
identificação de indícios mais sólidos e que É de suma relevância que todo o mate-
fundamentarão entrevistas ou apurações rial coligido seja arquivado com os rigores
mais sedimentadas, com, inclusive, questio- técnicos de integridade e disponibilida-
CL
nários para os investigados, com validação e de da informação, seja dividido por grau
conhecimento da alta gestão da empresa. de importância probatória, padronizado e
As entrevistas, nos casos dos investiga- disponibilizado em caso de futura neces-
dos, comparam-se a uma espécie de inter- sidade, quer seja para delinear uma defe-
U
rogatório, no entanto, não devem ser assim sa, quer seja para o encaminhamento ao
conduzidas ou interpretadas. Nesse cená- Ministério Público para eventual ação pe-
SI
rio, outras pessoas poderão aparecer no nal, quer seja para obtenção de benefícios
seio investigatório e até mesmo obterem advindos da efetividade do programa de
uma confissão quando, por conseguinte, compliance, quer seja para motivar ações
VO
serão necessárias testemunhas instrumen- judiciais de interesse da empresa ou para
tárias para validá-la ou ratificá-la, ou, ainda, negociação de acordos de leniência.
poderá vir sob a roupagem de termo redu- A defesa a qual nos referimos anterior-
zido a escrito com a assinatura daquele que mente é defesa produzida sob o crivo do
afirmou cometer a irregularidade ou frau-
contraditório e da ampla defesa em causas
de e a assinatura das testemunhas. De todo
administrativas e cíveis, e, diferentemente
DO

modo, é importante lembrar que interroga-


do sistema americano, não há a possibili-
tório é ato de autoridade imbuído de poder
dade de utilizar o compliance criminal no
de polícia pelo Estado, motivo pelo qual o
Brasil como matéria de defesa, por ausên-
compliance deve se pautar pela condução de
cia de previsão legal.
entrevista amigável, sem características in-
quisitivas e que respeitem as leis e normas. Nesse relatório, é importante destacar
SE

todas as ações realizadas e consequente-


A última etapa do trabalho é a confecção
mente os resultados auferidos, incluindo
de um relatório final de apuração contendo
resumidamente o teor da denúncia, os prin- a metodologia utilizada para obtenção dos
cipais procedimentos investigatórios e ações resultados. Em casos de fraudes ou desvios
N

tomadas durante a investigação corporati- de conduta, no relatório constará capítulo


va, a qualificação das pessoas entrevistadas, próprio sobre isso, com recomendações e
planos de ações preventivos, melhoria da
AD

os resultados investigativos e a apresenta-


ção dos indícios, bem como a conclusão fi- governança corporativa, melhores contro-
nal sobre o caso. Planos de recomendações, les de profilaxia de fraudes e, sobremodo,
auditorias, controles e ações disciplinares haverá o detalhamento de meios para im-
também podem ser incluídos. Nessa pe- pedir a repetição do fato ilegal apurado.
O

ça discriminar-se-ão os investigados, o mo- Fundamental destacar que relatórios de


do de operar, o período de operação, o local investigação devem se ater a fatos e dados,

Out.-Dez. 2020 • Revista de Direito Penal Econômico e Compliance • 49


US
Deveres e responsabilidades do Chief Compliance Officer na condução de investigações internas, à luz dos programas de integridade

com foco em descrever detalhadamente subsidiará as demais providências jurídi-


eventos identificados, sem adjetivar con- cas cabíveis, como demissão pura e simples,
O
dutas ou acusar indivíduos, algo de com- ou com justa causa, arregimentação de ele-
petência exclusiva do Ministério Público, mentos para subsidiar processos cíveis de
caso presentes os pressupostos legais. Em recuperação de ativos perdidos pelos atos
EX
caso de existir a pretensão de capitulação ilícitos investigados, além de diversas ou-
das condutas identificadas por meio da in- tras providências cabíveis.
vestigação interna, ela deverá ser feita de Ao final, no contexto dos programas
forma hipotética, com as ressalvas de “pa- de integridade e compliance, com base na
CL
recer ser”, sempre que tal ato não tenha, legislação pátria analisada anteriormen-
ainda, sido confirmado por meio de um re- te, em especial dentro do que disposto
latório de inquérito policial que contenha nos moldes estabelecidos no artigo 42 do
indiciamento ou, ainda, procedimento in- Decreto 8.420/2015, será de responsabi-
vestigatório do Ministério Público com in- lidade do líder de compliance em uma or-
U
dícios veementes nesse sentido ou, ainda, ganização a condução de investigações
por meio de uma denúncia oferecida pe- internas. Nesse sentido, é central entender
SI
lo representante ministerial que ratifique quem é a figura que lidera o programa de
os fundamentos fáticos e jurídicos desco- integridade e compliance, com o objetivo
bertos pela investigação privada. De todo de analisar seus deveres e suas responsabi-
VO
lidades especificamente frente à condução
modo, recomenda-se a inexistência de um
de investigações internas.
juízo valorativo sobre os fatos descobertos
pela investigação privada.
4. Chief Compliance Officer ou o
Em que pese os relatórios de investiga- Profissional com Deveres de
ção serem essenciais, é necessário ter cui- Compliance
DO

dado para não incorrer nas condutas de


calúnia, denunciação caluniosa ou falsa co- A expressão Chief Compliance Officer
municação de crime, crimes previstos no (ou CCO) é o termo designado àqueles
Código Penal. Antes que os elementos de
informação reunidos em investigações
privadas sejam apresentados à Justiça, é
SE

prudente não os considerar como pro-


va, pois não foram submetidos ao cri-
vo do princípio do contraditório e da
ampla defesa. Tais elementos devem
N

ser compreendidos como declaração


unilateral da parte, de que decorre a
importância de ser pautado por proce-
AD

dimentos rigorosamente lícitos e dentro


dos limites impostos aos entes privados.
O desiderato das investigações corpo-
rativas é confirmar ou não determinada sus-
O

peita. Em casos de fraudes, corrupção ou


desvios éticos, será tal procedimento que

50 • Revista de Direito Penal Econômico e Compliance • Out.-Dez. 2020


US
Deveres e responsabilidades do Chief Compliance Officer na condução de investigações internas, à luz dos programas de integridade

profissionais que administram um pro- deveres centrais, a saber: (i) diligência e


grama de integridade e compliance e são (ii) comunicação. Isso porque, em que pe-
O
responsáveis pelas decisões tomadas no se sua função primordial ser de natureza
âmbito do programa. São responsáveis fiscalizatória, sua figura não se confunde
pelo monitoramento dos riscos de inte- com o fiscal da lei, considerando se tratar
EX
gridade, fiscalização, gerenciamento de de um ente privado, como já analisado.
controles internos, conformidade con- Conquanto os programas de integrida-
tábil, jurídica – incluindo-se as questões de estejam consolidados no meio corpo-
afetas à prevenção de crimes, trabalhis- rativo e também jurídico, não há previsão
CL
ta, ambiental etc., nos termos do inciso legal acerca das atribuições do Chief Com-
IX do artigo 42 do Decreto 8.420/2015.28 pliance Officer especificamente, além do
Outrossim, são responsáveis pela super- que disposto no inciso IX do artigo 42 do
visão da conformidade dentro da organi- decreto mencionado. Não há, por exem-
U
zação, com a lei, regulamentos, normas e plo, discriminação legal de seus poderes
políticas de boa gestão e governabilidade, e deveres, graus de responsabilidade, e,
incluindo a condução de investigações in- ainda, como será a sua aproximação com
SI
ternas e seus resultados. Reporta-se direta- autoridades estatais quando houver a de-
mente ao Chief Executive Officer. tecção de condutas ilícitas nas investiga-
A legislação pátria não obriga que o ções corporativas.
VO

responsável pelo programa de compliance A falta de tais previsões, notadamen-


seja advogado ou, menos ainda, bacharel te no texto do Decreto 8.420/2015, leva à
em direito. No entanto, boa parcela desses interpretação de que tal profissional res-
profissionais é composta por advogados. ponderá pelo programa de integridade e
Independentemente do perfil do profissio- compliance como um todo, nos limites da
DO

nal contratado para a função, no que tan- lei. Como visto, o CCO não tem poder de
ge à condução das investigações internas, polícia, considerando não ser agente pú-
pode-se afirmar que sempre existirá o mo- blico, e, desse modo, não deve ser confun-
mento em que o advogado deva ser engaja- dido com a figura do xerife, no sentido da
do para representar os interesses legítimos obrigatoriedade da aplicação da lei. No en-
dos clientes, frente às autoridades do siste- tanto, a analogia é sim aceita, na medida
SE

ma de justiça. em que cabe ao CCO fazer valer os parâ-


O CCO atua no ambiente interno da metros previstos nos incisos do artigo 42
empresa, acompanha constantemente do referido decreto, que, em regra, tradu-
seus atos e possui primordialmente o dever zem-se por meio de normas internas que
N

fundamental de diligência consistente na exigem fiscalização e monitoramento.


prevenção e, se o caso, na denunciação ou Em outras palavras, cabe ao CCO
AD

comunicação de operações ilícitas ou an- agir de forma diligente, e com os melho-


tiéticas. Dentro desse panorama são obri- res esforços, para demonstrar que procu-
gados a, primacialmente, executar dois rou aplicar o que previsto no regulamento
O

28. Autoridade da instância interna responsável pela aplicação do programa de integridade e fiscali-
zação de seu cumprimento.

Out.-Dez. 2020 • Revista de Direito Penal Econômico e Compliance • 51


US
Deveres e responsabilidades do Chief Compliance Officer na condução de investigações internas, à luz dos programas de integridade

interno da pessoa jurídica a respeito de tador (Decreto 8.420/2015), não nos trou-
suas normas de integridade. Nesse senti- xeram quaisquer regras a serem cumpri-
O
do, é comum o debate acerca da responsa- das pelo “observador qualificado”, também
bilização do CCO por supostos resultados chamado insider, sobre como será a sua
negativos da gestão de investigações inter- aproximação com os players do sistema
EX
nas, ou mesmo por alegado ato de omissão constitucional de investigação e persecu-
perante condutas ilícitas, caso o CCO não ção penal. Por ausência de normas específi-
venha a relatar os fatos identificados às au- cas, sugerimos que o primeiro contato seja
toridades competentes. feito com supedâneo no artigo 39 do CPP,29
CL
Assim, faz-se necessário abordar, final- isto é, exercício do direito de representação
mente, quais seriam os deveres do CCO, e defesa. Conforme as regras jurídicas pá-
diante da descoberta de fatos que repre- trias, apenas advogados podem represen-
sentem ilícitos ou potenciais ilícitos a par- tar interesses de entes privados em casos
U
tir de investigações corporativas. A dúvida empresariais, considerando-se, pois, des-
a respeito de se o conhecimento acerca de se universo excluídas as causas pertinentes
ilícitos deve ser entendido como uma con- aos Juizados Especiais, bem como as medi-
SI
duta irregular, ou seria defensável dentro das judiciais que qualquer cidadão tem o
dos moldes legais existentes, costuma sur- direito de pleitear diretamente, como o ha-
gir, por exemplo, sempre que os resulta- beas corpus.
VO

dos de investigações internas apontam Averbe-se, por importantíssimo, que


para potenciais fatos graves, mas a pessoa a representação será escrita ou feita oral-
jurídica opta por seguir caminho litigioso mente. Nesta hipótese, é possível que o
e não cooperativo. Chief Compliance Officer requeira uma au-
Abordaremos, a seguir, portanto, quais diência com o representante do Ministé-
DO

são os deveres e as responsabilidades do rio Público, que tem o dever de receber


CCO frente à condução de investigações qualquer do povo, ainda mais aqueles que
internas e seus resultados. queiram apresentar elementos de infor-
mação com fulcro no artigo 27 do Código
5. Deveres e responsabilidades do de Processo Penal,30 e apresente o resul-
tado das investigações privadas que con-
Chief Compliance Officer frente
SE

cluíram a respeito de algum ilícito penal,


à condução de investigações entregando o material amealhado para as
internas providências cabíveis.
A Lei Anticorrupção (Lei 12.846/ Advirta-se que é de suma relevân-
N

2013), assim como seu decreto regulamen- cia a concomitância da realização de uma
AD

29. O direito de representação poderá ser exercido, pessoalmente ou por procurador com poderes
especiais, mediante declaração, escrita ou oral, feita ao juiz, órgão do Ministério Público ou à
autoridade policial.
30. Art. 27 do Código de Processo Penal: Qualquer pessoa do povo poderá provocar a iniciativa do
O

Ministério Público, nos casos em que caiba a ação pública, fornecendo-lhe, por escrito, informa-
ções sobre o fato e a autoria e indicando o tempo, o lugar e os elementos de convicção.

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US
Deveres e responsabilidades do Chief Compliance Officer na condução de investigações internas, à luz dos programas de integridade

investigação privada com seus resultados no ato ilícito. Importante lembrar que é
em mãos, e a iniciativa para eventual acor- nesse momento que surge a possibilidade
O
do de colaboração premiada, até para que de o representante ministerial realizar uma
o CCO saiba a dimensão do problema que análise sobre os limites e a legalidade da
quer dirimir e enfrentar, além de quais são investigação corporativa produzida nos
EX
os limites da confecção de um acordo que autos, oportunidade em que poderá (i) re-
deva produzir, a fim de não prejudicar a cebê-la integralmente, (ii) parcialmente
empresa que representa, especialmente ou (iii) não recebê-la, se vislumbrar viola-
porque, diferentemente do sistema ameri- ções a direitos e garantias fundamentais, ou
CL
cano – em que sabemos de antemão qual mesmo condutas ilícitas mascaradas de di-
será a resposta do Estado, porquanto há ligências investigatórias, tais como acessos
previsibilidade e segurança jurídica, mo- indevidos a sigilos fiscais ou policiais, in-
vidos por critérios objetivos –, no Brasil há vasão sem ordem judicial em caixas de cor-
reios eletrônicos privados e pessoais, entre
U
uma lacuna grande em relação a como o
Estado se pronunciará depois de uma co- outras.
laboração premiada. Essa providência não Enuncia-se que representação instruí-
SI
significa vontade de se furtar às obrigações da com cópia da investigação privada, ou-
legais, mas aclarar a real dimensão dos ilí- trossim, poderá ser oferecida à autoridade
citos e dos potenciais ilícitos que serão ob- policial que procederá ao inquérito poli-
VO
jeto de análise do Direito Negocial. cial, se for competente. Se não o for, re-
Existe, ainda, a possibilidade de que meterá a quem quer que seja. E, por fim,
elementos de informação sejam, inclu- a representação pode ser encaminhada
sive, apresentados em estágios iniciais, também ao juiz ou perante este reduzida a
atribuindo ao Ministério Público a possi- termo, que submeterá a sua análise à auto-
DO

bilidade de participar na formulação dos ridade policial para que ela proceda ao in-
quesitos que poderão nortear investiga- quérito, sempre que o caso.
ções internas conduzidas pela pessoa ju- Caso a representação e seus elemen-
rídica, como reação à identificação de tos indiciários se mostrarem suficientes,
suspeita de ato ilícito em
sua órbita.
SE

Na peça de representa-
ção, a ser materializada por
meio de simples petição,
haverá a discriminação de
N

todas as informações ne-


cessárias à apuração fática
AD

e de autoria podendo, ain-


da, ser instruída com cópia
de relatório da investiga-
ção privada levada a efeito
pelo setor próprio de con-
O

formidade da pessoa jurí-


dica, que se viu implicada

Out.-Dez. 2020 • Revista de Direito Penal Econômico e Compliance • 53


US
Deveres e responsabilidades do Chief Compliance Officer na condução de investigações internas, à luz dos programas de integridade

poderão oportunizar ao órgão do Ministé- de diligência, em caso dos sujeitos obriga-


rio Público, dispensado inquérito policial, dos perante a Lei de Lavagem, a identifi-
O
já de plano, oferecer denúncia e na cota in- cação de um cliente cuja transação com
trodutória da denúncia sugere-se que se- a empresa supere determinado valor, ou
jam pormenorizados todos os argumentos seja, R$ 50.000,00, conforme Circular
EX
e as providências tomados pelo programa 3839/17 do Banco Central.31 Operações
de conformidade, que, desde já, advirta- identificadas também ocorrerão nos ca-
-se, não terão o condão de eximir quem sos que envolvam transações com países
quer que seja no aspecto criminal, repita- de risco elevado, contratações à distância,
CL
-se, por ausência de previsão legal. Toda- ou de pessoas politicamente expostas. No
via, no âmbito administrativo e cível, esses âmbito interno, tais deveres foram discri-
argumentos serão de considerável rele- minados na Lei de Lavagem de Dinheiro,
vância para fins da aplicação da sanção, especificamente, nos artigos 10 e 11 da Lei
conforme já explanado anteriormente. 9.613/99, com as modificações impostas
U
Destaca-se que a realização dessa ati- pela Lei 12.683/12.
vidade de compliance não possui cará- Assim, no artigo 10 do referido diplo-
SI
ter acusatório, mas, sim, trata-se de mero ma legal, temos os deveres de diligência, a
exercício do direito de defesa sob a pers- saber: identificação dos clientes e manu-
pectiva da profilaxia e, nesse novo e atual tenção de cadastro atualizado, nos termos
VO
panorama, vislumbra-se corregulação pú- das instruções emanadas pelas autorida-
blico-privada, com o firme desiderato de des competentes, manutenção de registro
fortalecimento da política pública de pre- de toda transação em moeda nacional ou
venção à criminalidade. A defesa dos in- estrangeira, títulos e valores mobiliários,
teresses legítimos das empresas pode ser títulos de crédito, metais, ou qualquer ati-
concretizada pelo enfrentamento da frau- vo passível de ser convertido em dinheiro,
DO

de e corrupção nos ambientes de negócios. que ultrapassar limite fixado pela autori-
A solidez da economia certamente depen- dade competente e nos termos das instru-
de da higidez do mercado e integridade das ções expedidas por ela.32
empresas e atores que nele operam. Além disso, o mesmo artigo pode ser en-
Enfatize-se que esses deveres de dili- tendido ainda como fundamento para obri-
SE

gência possuem diferentes graus e são in- gatoriedade de um programa de compliance


terpretados depois de uma identificação de prevenção à lavagem de capitais: sua re-
do risco negocial ou comercial de cada dação determina que os sujeitos obrigados
pessoa jurídica. Por exemplo, é um dever deverão adotar políticas, procedimentos e
N

31. A Circular 3.839/17 reduz de R$ 100 mil para R$ 50 mil o valor para Comunicações de Operações
AD

Automáticas (COA) ao Coaf, a partir de 27.12.2017. Operações envolvidas: 1. emissão ou recarga


de valores em um ou mais cartões pré-pagos, em montante acumulado igual ou superior a R$ 50
mil ou o equivalente em moeda estrangeira; 2. depósito em espécie, saque em espécie, ou saque em
espécie por meio de cartão pré-pago, de valor igual ou superior a R$ 50 mil; 3. emissão de cheque
administrativo, TED ou de qualquer instrumento de transferência de fundos contra pagamentos
O

em espécie, de valor igual ou superior a R$ 50 mil.


32. COAF. Resolução 13, de 30 de setembro de 2005.

54 • Revista de Direito Penal Econômico e Compliance • Out.-Dez. 2020


US
Deveres e responsabilidades do Chief Compliance Officer na condução de investigações internas, à luz dos programas de integridade

controles internos, compatíveis com seu observar e executar as regras de complian-


porte e volume de operações, que lhes per- ce; isto é, o dever de agir, nessa seara, in-
O
mitam atender aos critérios legais e norma- cumbe a quem tem, por lei, obrigação de
tivos,33 na periodicidade, forma e condições cuidado, proteção ou vigilância, nos ter-
por ele estabelecidas, cabendo-lhe preser- mos da alínea “a” do referido § 2º do arti-
EX
var, nos termos da lei, o sigilo das infor- go 13 do CP. Logo, no exemplo do sistema
mações prestadas. Com o advento da Lei de compliance voltado para esse escopo,
Anticorrupção, tais deveres de diligência os deveres de comunicação impostos pelo
passaram-se a integrar os sistemas de com- artigo 11 da Lei de Lavagem de Dinheiro
revelam relação de cuidado, proteção ou
CL
pliance e integridade corporativa daqueles
entes privados considerados sujeitos obri- vigilância em relação aos bens jurídicos
gados, otimizando ações de cumprimento tutelados pela referida lei de lavagem de
capitais, tais como: administração da justi-
de obrigações legais e seu monitoramento
ça, bem jurídico do crime anterior que deu
por parte de tais organizações.
U
respaldo ao de lavagem e sistema financei-
ro. Importante destacar a necessidade da
¾ Sem dúvida, a atividade do Chief Com- conjugação de dois pressupostos para fins
SI
pliance Officer, quando realizada dentro dos da omissão penalmente relevante: dever
limites legais na esfera de seus poderes-de- jurídico de agir e capacidade para agir ou
veres, produz resultados favoráveis à pre- poder de agir, sem prejuízo da presença do
VO
venção de crimes, tais como os de corrupção, elemento anímico.
lavagem de dinheiro, tráfico de influência,
Salienta-se que, na visão de Monteiro
advocacia administrativa, desvios de insu-
mos, fraudes, entre outros.
de Barros,

“a possibilidade de cumprir o dever jurídico


Especificamente, por exemplo, no es- de agir é requisito essencial à caracterização
DO

pectro da lavagem de dinheiro, poder-se-ia dos crimes omissivos. O § 2º do artigo 13 do


CP estabelece que ‘a omissão é penalmente
considerá-lo como uma espécie de garan-
relevante quando o omitente devia e podia
tidor34 do bem jurídico, a depender de agir para evitar o resultado’. Assim, a exigi-
sua conduta efetiva, nos termos do artigo bilidade de conduta diversa, que nos crimes
13, § 2º, do Código Penal35 (CP), que tra- comissivos integra a culpabilidade, nos de-
tou da omissão juridicamente e penalmen- litos omissivos funciona como elemento do
SE

te relevante, já que tem a incumbência de tipo penal.” (grifos nossos)36


N

33. Com nomenclatura modificada pela Medida Provisória 893, de agosto de 2019, que mudou de
COAF para UIF e também alterou a sua característica, que passa a ser meramente administrativa
inviabilizando que o órgão promova eventuais medidas cautelares de quebra de sigilo ou requisi-
AD

ção de instauração de investigação penal.


34. Ou, então, o gatekeeper, ou seja, o responsável por evitar o descumprimento das regras de confor-
midade em geral.
35. Art. 13, § 2º, CP: A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para
evitar o resultado.
O

36. BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Direito Penal: parte geral. São Paulo: Saraiva, 1999. v. 1.
p. 115-116.

Out.-Dez. 2020 • Revista de Direito Penal Econômico e Compliance • 55


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Deveres e responsabilidades do Chief Compliance Officer na condução de investigações internas, à luz dos programas de integridade

Especificamente nesse sentir, reprodu- o agente deve ter a vontade consciente de


zimos o entendimento de Débora Motta inobservar o dever de agir, com o objetivo
O
Cardoso, a qual sintetizou que “nos pro- de alcançar o resultado criminoso (dolo di-
gramas de compliance da lei de lavagem de reto) ou no mínimo assumindo o risco de
produzi-lo (dolo eventual). A ausência do
dinheiro, o CCO funciona como gatekee-
EX
dolo direto ou eventual pode, contudo, dar
per interno da própria instituição financei- ensejo ao crime comissivo por omissão cul-
ra, pois a lei incumbe a ele o poder para poso, desde que o resultado seja previsível
tomar decisões vinculadas aos deveres de ao homem médio da sociedade e o delito
compliance”. 37 seja punível na forma culposa.”39
CL
De se notar que não basta a ausência
de realização desses deveres de comunica- Logo, de rigor a existência do dolo, nas
ção para a caracterização da sua respon- suas modalidades, porque não existe a fi-
sabilidade penal, principalmente porque a gura da lavagem de dinheiro culposa.
U
simples ausência de comunicação das si- Se, de um lado, a função do CCO de ga-
tuações elencadas nos incisos do artigo 11 rante, nos casos de lavagem de dinheiro,
deriva do artigo 13, § 2º, alínea “a”, do CP,
SI
da Lei de Lavagem de Dinheiro, por si só,
não acarreta qualquer tipo penal autônomo. em outros casos – por exemplo, em pro-
Com efeito, assevera-se que as operações gramas de integridade de empresas am-
suspeitas sonegadas podem não ser neces- bientais – pode derivar do artigo 13, § 2º,
VO

sariamente ilícitas. Há de haver uma aná- alínea “b”, do mesmo diploma legal, por-
lise específica do caso concreto. A simples que de outra forma assumiu o risco de impe-
ausência dos deveres de comunicação po- dir o resultado, como no caso de contrato
de ensejar responsabilidade administrati- escrito de admissibilidade ao trabalho com
va,38 mas não penal. cláusulas pontuais e específicas nesse sen-
DO

O CCO poderá, assim, em tese, come- tido. Obtempera-se que mesmo nessa últi-
ter crime omissivo impróprio e não omissi- ma hipótese indeclinável a capacidade de
vo próprio. Definitivamente para que seja agir para impedir o resultado e a presença
responsabilizado faz-se imprescindível o do elemento anímico ou subjetivo de sua
conduta.
dever jurídico e a capacidade de agir para
evitar o resultado. E também o elemento A questão do compliance é tão rele-
SE

anímico ou subjetivo: vante que seu exame foi objeto da famo-


sa Ação Penal 470 (Mensalão) do STF, em
“Cumpre observar a propósito que, nos que alguns dirigentes do Banco Rural se vi-
crimes dolosos comissivos por omissão, ram condenados por gestão fraudulenta
N AD

37. CARDOSO, Débora Motta. Criminal Compliance na perspectiva da Lei de Lavagem de dinheiro. São
Paulo: LiberArs, 2015. p.189.
38. Sanções administrativas, que incluem advertência, multa pecuniária, inabilitação temporária
para pessoas físicas e cassação ou suspensão do exercício da atividade empresarial (art. 12 da Lei
de Lavagem de Dinheiro).
O

39. BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Direito Penal: parte geral. São Paulo: Saraiva, 1999. v. 1.
p. 115.

56 • Revista de Direito Penal Econômico e Compliance • Out.-Dez. 2020


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Deveres e responsabilidades do Chief Compliance Officer na condução de investigações internas, à luz dos programas de integridade

de instituição financeira e incorreram em A atividade de compliance não é disso-


ausência do cumprimento dos deveres de nante ou contraditória com o exercício da
O
vigilância e comunicação previstos na Lei advocacia, que aceita não só a defesa reati-
9.613/98 (Lavagem de Dinheiro). Frisa-se, va, mas também proativa. Parece-nos ab-
pois, a compreensão do Ministro Celso de solutamente factível uma defesa de cunho
EX
Mello, naquele julgamento, a saber: os ele- preventivo, o que não é menos importante
mentos produzidos nesse processo também que a defesa reagente, comumente utiliza-
revelam que o comportamento dos então di- da, mas que, paulatinamente, está per-
rigentes do Banco Rural (Kátia Rabello e José dendo a sua posição de única defesa a ser
exercitada. Destarte, assinala-se com ên-
CL
Roberto Salgado) constitui “notável exem-
plo a ser evitado, a todo custo, de desres- fase que compliance não é acusação, mas
peito patente, intencional, consciente às exercício profilático defensório com o es-
exigências impostas pelo dever de obser- copo de obter benefícios e resguardar a
vância das boas práticas de compliance”. imagem de uma empresa ou marca.
U
Conforme ele, os empréstimos eram con- Assim, entendemos que figura do Chief
cedidos e renovados sem observância das Compliance Officer é importantíssima nesse
SI
cautelas mínimas necessárias impostas pe- mecanismo e executa as funções de fiscali-
lo Banco Central para a verificação da capa- zação e controle no plano da boa governan-
cidade financeira dos clientes.40 ça corporativa, mantendo-se em posição
VO
de garantidor do bem jurídico nas hipóte-
¾ O propósito singular da conformidade é a ses supracitadas, com vistas a diversas ati-
prevenção e a dissuasão da fraude, assim co- vidades, entre as quais, a da prevenção da
mo do comportamento desconforme, não lavagem de dinheiro, quando o caso, e a
só na área criminal, mas nas áreas do meio condução de investigações internas, preci-
ambiente, trabalhista, financeira, tributá- puamente.
DO

ria, ética, entre outras. Esses modelos rela- Nesse sentido, sua responsabilidade
cionam-se com toda uma série de políticas, está adstrita à necessidade de registrar os
plataformas e códigos de condutas que de-
atos formais de comunicação às esferas
sembocam no respeito aos valores, normas e
prescrições contidos na realidade social. competentes da pessoa jurídica, de forma
que fique claro que ele exerceu sua função
com diligência e, ao mesmo tempo, co-
SE

Nos ambientes empresariais essa é municou tempestivamente a quem de di-


uma realidade dada, não há mais espaço reito o que foi identificado. A tomada de
para retrocessos. Programas umbráticos e decisão de cooperar com as autoridades
meramente simbólicos que visam apenas competentes, nos termos do artigo 7º da
N

diminuir ou mitigar os efeitos de uma pe- Lei 12.846/2013, é prerrogativa da pessoa


nalidade administrativa não subsistirão jurídica e não do CCO, ainda que ele de-
AD

nesse ambiente de ética, e por isso não pre- tenha poderes especiais e procurações es-
ponderarão à luz da Lei Anticorrupção. pecíficas para tais fins.

40. BRASIL. STF – Supremo Tribunal Federal. Ministro Celso de Mello vota pela condenação de três
O

dirigentes do Banco Rural e absolve Ayanna Tenório. Notícias STF, 06.09.2012. Disponível em:
[www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=217450].

Out.-Dez. 2020 • Revista de Direito Penal Econômico e Compliance • 57


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Deveres e responsabilidades do Chief Compliance Officer na condução de investigações internas, à luz dos programas de integridade

Interpretar a não comunicação de ilíci- efetivo poderá até mesmo ser contempla-
tos por parte do CCO, fora dos casos obri- da com o acordo de não persecução penal,
O
gatórios previstos em lei, como ato ilícito situação em que não há previsão no orde-
em si, seria estabelecer espécie de respon- namento jurídico brasileiro, que somente
sabilidade penal objetiva, inexistente no or- se aplica a pessoas físicas nas hipóteses do
EX
denamento jurídico pátrio. Nesse sentido, artigo 28-A e incisos do CPP.
com base nos fundamentos descritos no Na mesma linha de raciocínio de que
presente artigo, acredita-se que a sanção institutos alienígenas não podem ser ne-
decorrente da mera ocupação da posição cessariamente incorporados ao direito
CL
de CCO não deve jamais prosperar. Em brasileiro, por ausência de compatibili-
quaisquer dos casos, seja em matéria cri- dade formal e material com as nossas re-
minal ou cível, o CCO apenas poderá ser gras, tem-se que, no âmbito do programa
sancionado ou punido nos casos em que de integridade americano, é possível a in-
U
a sua conduta pessoal tenha colaborado – cidência da figura do whistleblower, cha-
com ação ou omissão – de forma clara e mado vulgarmente como “informante do
inequívoca para o ilícito apurado. bem” (denunciante) consubstanciando-
SI
-se em qualquer pessoa, envolvida ou não
6. Considerações finais no ilícito, que deseja elucidá-lo às autori-
dades competentes e que pode obter até
VO

A pesquisa realizada revela que ainda 30% do que o Estado reaver, o que ine-
existe certa confusão quanto à correta in- xiste no direito brasileiro. Esse instituto
terpretação do conceito de compliance que não se confunde com a colaboração pre-
vem sendo adotado no Brasil. Essa confu- miada ou muito menos com acordo de le-
são não seria nociva, caso não fustigasse niência. Não é, pois, um acordo, mas uma
DO

fundamentos importantes do sistema nor- denúncia.


mativo pátrio. Como demonstrado, o uso Fato é que não podemos nos distanciar
de definições que se baseiam no sistema dos pilares alienígenas do compliance, das
dos EUA, sem a devida análise crítica à luz linhas mestras que o alicerçaram, prima-
da lei brasileira, poderá incorrer em im- cialmente daqueles existentes nos países
precisões que partem das premissas que o anglo-saxões, desde que, evidentemente,
SE

ente privado deveria agir como se poder de estejam em consonância com o nosso orde-
polícia detivesse, ao apurar ilícitos come- namento jurídico; mas, é bem verdade que
tidos por entes privados. já não estamos mais engatinhando nesse
Urge frisar, ainda, que o compliance cri- assunto, uma vez que a Lei Anticorrupção,
N

minal é matéria de defesa posta nos Tribu- embora não tenha falado em compliance
nais nos EUA e, no Brasil, não tem o mesmo criminal especificamente, permitiu-nos
AD

efeito produzido em terras americanas. detidamente, por meio de seu decreto re-
Por isso, precisamos analisar com as res- gulamentar, trazer à baila o conceito de
salvas necessárias. O efeito de lá é diverso programa de integridade propriamente di-
do efeito de cá, mormente porque nos EUA to, o conceito do Chief Compliance Officer,
a pessoa jurídica pode ser responsabilizada as consequências administrativas e cíveis
O

penalmente, de modo que se apresentar um de um programa estruturado de complian-


programa de compliance criminal íntegro e ce e demais mecanismos e ferramentas

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Deveres e responsabilidades do Chief Compliance Officer na condução de investigações internas, à luz dos programas de integridade

que devem nortear essa atividade predo- responsabilidades do CCO frente à condu-
minantemente de avaliação de riscos em- ção de investigações internas, uma vez que
O
presariais. E, nesse sentir, o objetivo do a adequação detalhada do programa de in-
programa de compliance criminal nada tegridade aos paradigmas legais em geral
mais é do que evitar o risco do cometimen- protegem o CCO, afastando tendências de
EX
to do crime. Ele só será efetivo se evitar a interpretação que o tornariam responsável
prática delituosa. por atos que competem aos administrado-
Diante desse contexto, entendemos res principais da pessoa jurídica.
como fundamental que os Chief Com- E, derradeiramente, é de suma impor-
CL
pliance Officers se atenham às regras e aos tância que as reflexões acerca desse tema
princípios gerais de Direito, em especial sejam revisadas e aprofundadas pelos es-
àquelas previstas na Constituição Federal pecialistas e pelas autoridades brasileiras
de 1988, de modo a evitar que sua atua- de forma constante, de modo que possa-
U
ção esteja fora dos parâmetros legais váli- mos produzir uma doutrina genuinamen-
dos no Brasil. Essa visão é especialmente te local sobre a prática de compliance e
importante na análise dos deveres e das integridade corporativa.
SI
VO

Pesquisas do Editorial

Veja também Doutrinas relacionadas ao tema


DO

• A prática do compliance como um instrumento empresarial anticorrupção para preservação


das empresas, de Fábia Duarte Ferreira – RDB 81/161-178 (DTR\2018\19496);
• Compliance como antídoto à “pejotização”, de Graziele Lopes Ribeiro e Francislaine de Al-
meida Coimbra Strasser – RT 1014/21-41 (DTR\2020\3898); e
• Compliance e responsabilidade penal ambiental da pessoa jurídica no século XXI, de Andréia
SE

Leal Ferro – RBCCrim 160/19-55 (DTR\2019\40000).


N AD
O

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