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PÓS UTI UNICAMP Larissa Olivato

Alterações hemodinâmicas associadas à


Ventilação Mecânica
→ 30/11/2023

Ventilação mecânica - efeitos fisiológicos

A partir do momento em que o indivíduo é submetido a ventilação mecânica por alteração


na troca gasosa, acontecem efeitos nos sistemas:

● cardiovascular
● renal
● nervoso
● pulmonar
● musculoesquelético

Débito cardíaco

Um dos principais pilares que são afetados quando a ventilação mecânica é instalada é o
débito cardíaco.

O débito cardíaco é definido como o volume de sangue bombeado pelo coração em 1


minuto, sendo representado pela frequência cardíaca X o volume sistólico:

DC = FC x VS

O valor normal do débito cardíaco é de 4 a 6 L/min.

Portanto, a volemia do paciente também altera a interação da ventilação mecânica com o


sistema hemodinâmico

Interação coração-pulmão

O coração e o pulmão são mecanismos complexos e conflitantes quando há instalação da


ventilação mecânica, pois é preciso usar uma pressão positiva para a manutenção das
trocas gasosas, porém, acaba-se gerando alterações hemodinâmicas importantes.

Por exemplo, o paciente com DPOC possui disfunção do ventrículo direito, com isso, há
aumento da resistência vascular pulmonar e, consequentemente, aumento da pós carga.
Quando esse paciente é submetido a ventilação mecânica, a pressão positiva altera toda a
hemodinâmica e pode gerar ainda mais sobrecarga.

Já em pacientes com disfunção do ventrículo esquerdo, a pressão positiva auxilia no


coração, visto que há diminuição da pós carga.
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Portanto, a pressão positiva no ventrículo esquerdo ajuda, já no ventrículo direito pode


prejudicar.

Além disso, a resposta do sistema cardiopulmonar frente a demanda (oferta e consumo de


O2) depende de:

● reserva miocárdica
● função de bomba do coração
● volume circulante efetivo
● distribuição do fluxo sanguíneo
● tônus autonômico
● resposta endócrina
● pressão intratorácica (PIT)
● volumes pulmonares
● pressão em torno dos demais componentes do sistema cardiovascular

Os determinantes mais importantes envolvidos no comprometimento da função cardíaca


durante a ventilação mecânica são:

● as mudanças de pressão que acontecem dentro da parede torácica


● as alterações do volume pulmonar → alteram a resistência pulmonar e a tensão
da parede do ventrículo direito
● processos que afetam a pré e pós carga e também a contratilidade dos
ventrículos
● aumento da pressão intratorácica (PIT) → pois há relação com o retorno venoso
● as respostas hemodinâmicas podem ocorrer em indivíduos diante de um
mesmo modo ventilatório e são dependentes das condições cardiopulmonares
pré-existentes

Algumas patologias pulmonares afetam o ventrículo direito, sendo elas:

● SDRA grave
● TEP
● fibrose cística
● DPOC

Mecanismos envolvidos no comprometimento da função


cardíaca

Os mecanismos envolvidos no comprometimento da função cardíaca são:

● mudanças no retorno venoso


● aumento da resistência vascular pulmonar
● efeito exacerbado nas disfunções do ventrículo direito
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● compressão direta do pericárdio


● interdependência ventricular

Grande x pequena circulação

A grande circulação (circulação sistêmica) possui alta pressão

A pequena circulação (circulação pulmonar) possui baixa pressão (em torno de 15 mmHg)

Efeitos da pressão intratorácica (PIT) na hemodinâmica

O coração é afetado por qualquer mudança na pressão intra torácica, principalmente,


devido ao posicionamento anatômico, porém em algumas pessoas o coração é mais
afetado e em outras é menos afetado.

Quando a PIT é aumentada, tem diminuição do retorno venoso sistêmico para o ventrículo
direito e também há diminuição do fluxo de sangue ejetado pelo ventrículo esquerdo,
independentemente da função do coração.

Além disso, o aumento da PIT eleva a pressão do átrio direito e reduz a pressão transmural
sistólica do ventrículo esquerdo (diferença de pressão de um compartimento para o outro,
nesse caso do lado externo e do lado interno do coração), isso reduz o gradiente pressórico
para o retorno venoso, diminuindo a ejeção do ventrículo esquerdo e, consequentemente,
reduzindo o volume sanguíneo intratorácico.

Quando a PIT é diminuída, há aumento do retorno venoso que se opõe a ejeção do


ventrículo esquerdo, elevando o volume sanguíneo intratorácico.
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Portanto, na ventilação espontânea, há aumento do fluxo sanguíneo da veia cava para o


átrio direito, visto que tem aumento do retorno venoso. Já na pressão positiva (aumento da
PIT), há diminuição do retorno venoso, além de um ‘’remodelamento’’ nos átrios por
diminuição do volume sanguíneo.

Além disso, quando há aumento na PIT ocorrem outras consequências hemodinâmicas que
irão depender da

● condição volêmica
● função miocárdica

O aumento da PIT sob o sistema cardiovascular nos pacientes cardiopatas hipovolêmicos


compromete ainda mais a função cardíaca, já em pacientes hipovolêmicos o aumento da
PIT favorece a função cardíaca.

Ventilação mecânica

A ventilação mecânica aumenta a pressão pleural que é transmitida até a superfície do


coração, criando-se um gradiente pressórico entre a PIT e as pressões intracardíacas,
chamada-se de pressão transmural.

Ademais, as alterações na ventilação induzidas pela PIT geram mudanças na pressão do


átrio direito, facilitando ou dificultando o retorno venoso ao coração, o que depende de
alguns outros fatores, como da função do miocárdio e da volemia, por isso, é uma linha
tênue entre o benefício e o malefício do paciente ser submetido a ventilação mecânica, visto
que quando altera-se o retorno venoso para o ventrículo direito, haverá alteração na pré
carga do ventrículo esquerdo.
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Volumes pulmonares

As mudanças hemodinâmicas resultantes da mudança no volume pulmonar podem resultar


de mudanças na resistência vascular e da interdependência ventricular.

Os volumes pulmonares elevados podem influenciar negativamente a função do ventrículo


direito pelo aumento em sua pós carga.

Conceitos de pré e pós carga

Pré carga

A pré carga é o grau de tensão do músculo cardíaco quando ele começa a se contrair

Para a contração cardíaca, a pré carga é geralmente considerada como a pressão diastólica
final quando o ventrículo está cheio

Pós carga

A pós carga é a carga contra qual o músculo exerce a sua força contrátil

A pós carga do ventrículo é a pressão na artéria da saída do ventrículo, ou seja, do arco


aórtico para o ventrículo esquerdo e no tronco da artéria pulmonar no ventrículo direito, ou
seja, é a pressão arterial contra qual o ventrículo deve exercer a contração

Mecanismo de Frank-Starling

O mecanismo de Frank-Starling é a capacidade do coração em se adaptar a variação do


volume sanguíneo, modificando a sua contratilidade.

Efeitos indesejáveis da ventilação mecânica

Em um único ciclo com pressão positiva há uma variação grande do débito cardíaco, visto
que o volume sistólico do ventrículo esquerdo é afetado pelo volume sanguíneo, pela
frequência respiratória e pelo volume corrente durante a insuflação pulmonar.

Pré carga e interdependência ventricular

A interdependência ventricular diastólica é definida como as alterações na contração e no


volume ventricular que modificam a função do outro ventrículo, visto que o aumento do
volume de um ventrículo diminui o volume diastólico da outra câmara.
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O aumento do volume do ventrículo direito desvia o septo interventricular em direção ao


ventrículo esquerdo, diminuindo a complacência do ventrículo esquerdo (ele se torna menos
distensível)

Durante a ventilação mecânica, o volume do ventrículo direito em geral está diminuído,


minimizando os efeitos da interdependência ventricular.

Além disso, o uso da ventilação mecânica aumenta os volumes pulmonares, comprimindo


um ventrículo no outro e reduzindo os seus volumes.

Portanto, o restabelecimento do volume diastólico final do ventrículo esquerdo com a


infusão do volume leva ao restabelecimento do débito cardíaco durante o uso de PEEP
(pressão positiva) sem alterar a complacência diastólica do ventrículo esquerdo.

Efeitos da PEEP na hemodinâmica

O objetivo da oferta da PEEP é melhorar as áreas de troca gasosa e corrigir a hipoxemia,


particularmente, em pacientes com SDRA. Porém, a oferta de PEEP leva a redução do
débito cardíaco (por isso na titulação de PEEP o paciente pode ficar hipotenso)

A PEEP adequada promove uma troca gasosa melhor, além de melhor mecânica
respiratória e melhor hemodinâmica.

Mecanismos pelos quais a PEEP diminui o débito cardíaco:

● redução do retorno venoso


● redução da contratilidade
● aumento da pós carga
● liberação de mediadores humorais

Sendo assim, é preciso ter cuidado com a PEEP para não causar lesão pulmonar e riscos
hemodinâmicos.

SDRA e PEEP

Os pacientes com SDRA podem se beneficiar na oferta de PEEP, visto que há redução do
volume sistólico, do débito cardíaco e da frequência cardíaca, além da elevação da
resistência vascular sistêmica e pulmonar.

Interdependência entre os sistemas cardiovascular e


respiratório durante a ventilação mecânica

Os efeitos da ventilação mecânica sobre o sistema respiratório são sobre:

● as trocas gasosas
● a mecânica pulmonar
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● os músculos respiratórios

Efeitos sobre as trocas gasosas

Com a pressão positiva, há elevação ou redução do débito cardíaco que leva a efeito de
shunt pulmonar (todo o sangue que sai do coração passa pelo pulmão), além de hipoxemia
refratária durante a VM.

Quando há SDRA, ou seja, edema intersticial pulmonar, a PEEP em níveis ideais leva a
abertura das unidades alveolares colapsadas, melhorando a complacência e resistência do
sistema respiratório e a oxigenação tecidual

Efeitos sobre a mecânica respiratória

A ventilação mecânica pode gerar efeitos adversos, como edema intersticial, ingurgitamento
das veias da mucosa brônquica e aumento da pressão do capilar pulmonar, podendo haver
aumento da resistência e diminuição da complacência pulmonar

Efeitos sobre os músculos respiratórios

Um paciente com choque cardiogênico, por exemplo, possui benefícios do uso da


ventilação mecânica, visto que ele possui aumento da demanda da musculatura respiratória
e congestão pulmonar.

Quando ele é submetido a ventilação mecânica, a demanda é diminuída e há reversão da


acidose lática e prevenção de parada cardiorrespiratória por falência muscular.

Além disso, em pacientes com vigência de sepse há alteração da oferta e do consumo de


O2, sendo assim quando é instalado a VM, tem repouso da musculatura respiratória.

Efeitos da VM sobre a hemodinâmica

Sobre a hemodinâmica a VM possui efeitos nos gases sanguíneos e no sistema


cardiovascular

Efeitos nos gases sanguíneos

A hipoxemia e a acidose respiratória aumentam a resistência vascular pulmonar (a hiperoxia


também aumenta, por isso na VM deve-se ter cuidado para não gerar atelectasia por
absorção).

Em pacientes que necessitam de ventilação neuroprotetora, manter PaCO2 entre 35 a 40


mmHg e a SpO2 acima de 94%.

A PEEP melhora a hipoxemia e tem ação direta sobre a vasculatura extra-alveolar


colapsada, porém, deve-se usar criteriosamente.
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Efeitos no sistema cardiovascular

O principal efeito é sobre as mudanças no retorno venoso.

Em geral, estão diretamente relacionadas com as variações da pressão intratorácica.

As elevações da pressão venosa sistêmica podem ter consequências importantes para


outros órgãos.

Insuficiência cardíaca

A insuficiência cardíaca é uma síndrome clínica caracterizada pela incapacidade do coração


em atuar adequadamente como bomba, seja decorrente de déficits de contração e/ou
relaxamento, comprometendo o funcionamento do organismo.

A IC pode ser considerada diastólica quando existe déficit de contração ou sistólica quando
existe déficit de relaxamento

Os pacientes com insuficiência cardíaca se beneficiam da ventilação mecânica, pois com a


pressão positiva há diminuição da pós carga do ventrículo esquerdo, aumentando o volume
de ejeção do VE, através da redução da pressão arterial sistólica. Portanto, o aumento da
PIT diminui a pós carga do ventrículo esquerdo insuficiente.

Transição da VM para respiração espontânea em IC

A transição da VM para a respiração espontânea deve ser feita de forma cuidadosa e


criteriosa para não haver um aumento do trabalho respiratório, do retorno venoso e do
volume sanguíneo intratorácico, pois se houver provavelmente, haverá falha na extubação.

Os principais fatores de risco para falha de extubação são pacientes com DPOC,
miocardiopatias e obesidade.

O CPAP após a extubação é indicado de forma profilática para reduzir a pós carga do
ventrículo esquerdo.

Importância da ventilação mecânica protetora

É preciso manter uma ventilação mecânica protetora, ou seja, com:

● volumes correntes de 6 a 8 ml/kg de peso predito → em casos de SDRA de 4 a 6


● driving pressure até 15 → em obesos até 18
● pplatô até 30
● ppico até 30
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Visto que uma driving pressure maior que 18 leva a diminuição do retorno venoso, aumenta
a pós carga do ventrículo direito e diminui a pós carga do ventrículo esquerdo.

Além disso, se há diminuição do retorno venoso, e queda da pressão arterial, associada ao


aumento da PIT e uso de drogas vasoativas, não há volemia adequada e pode levar a
repercussões como insuficiência renal aguda.

Desmame do suporte ventilatório

Em pacientes com redução da reserva cardiovascular limitada a sobrecarga cardíaca pode


precipitar a falência ventricular e consequentemente levar a edema pulmonar com elevação
da sobrecarga do sistema respiratório e piora da troca gasosa.

Portanto, é preciso ter cuidado com o desmame ventilatório desses pacientes.

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