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TBL: INTOXICAÇÃO POR MONÓXIDO DE CARBONO

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM:
1. Explicar a respeito das trocas alvéolo-capilares e o transporte de gases;
Troca gasosa:
Após o processo de ventilação com o ar atmosférico, ocorre a difusão do oxigênio
(O2) dos alvéolos para o sangue e a difusão do dióxido de carbono (CO2) do sangue para
os alvéolos e, para que esse processo ocorra de forma adequada, o alvéolo deve sofrer o
processo de perfusão, ou seja, chegada do sangue.
Difusão gasosa: o processo de difusão dos gases é promovida pelo movimento
cinético das próprias moléculas, sendo que ocorre da área de alta pressão para a de menor
pressão.
O volume de ar alveolar substituído por ar atmosférico novo a cada ciclo respiratório
é de apenas um sétimo do total, de maneira que são necessárias múltiplas respirações para
ocorrer a troca da maior parte do ar alveolar.
A concentração de O2 nos alvéolos, bem como sua pressão parcial, são controladas
por dois mecanismos: 1 – intensidade de absorção de O2 pelo sangue; 2 -intensidade de
entrada de novo O2 nos pulmões pelo processo ventilatório. Já o CO2 é continuamente
formado no corpo e transportado no sangue para os alvéolos, sendo, de modo contínuo,
removido dos alvéolos pela ventilação. Além disso, vale destacar que a PCO2 alveolar
eleva diretamente na proporção da excreção de CO2, e diminui na proporção inversa da
ventilação alveolar.
Observa-se que a composição geral do ar expirado é determinada por: 1 –
quantidade de ar expirado do espaço morto e 2 – pela quantidade de ar alveolar.
Sabe-se que a troca gasosa entre o ar alveolar e o sangue pulmonar se dá através
das membranas de todas as porções terminais dos pulmões, e não apenas nos alvéolos,
sendo essas membranas conhecidas coletivamente como membrana respiratória ou
membrana pulmonar. Essa membrana é constituída de camada de líquido contendo
surfactante (reveste o alvéolo e reduz a tensão superficial do líquido alveolar), epitélio
alveolar (composto por células epiteliais finas), membrana basal epitelial, espaço intersticial
delgado entre o epitélio alveolar e a membrana capilar, membrana basal capilar e a
membrana do endotélio capilar.
A espessura da membrana respiratória e a área de superfície dela são dois fatores
que podem afetar a intensidade de difusão gasosa. Nesse sentido, a espessura pode
aumentar em algumas situações, como em decorrência de líquido de edema no espaço
intersticial da membrana e nos alvéolos, de maneira que os gases da respiração precisam
se difundir não só através da membrana, mas também por esse líquido, ou em situações
como as de fibrose pulmonar, que pode aumentar de forma considerável a espessura de
algumas porções da membrana. Além disso, algumas situações podem fazer com que a
área de superfície da membrana respiratória seja reduzida, como na remoção total de um
pulmão e no enfisema, quando muitos alvéolos coalescem, com dissolução de muitas
paredes alveolares.
Transporte de gases:
A maior parte do transporte de O2 nos capilares dos tecidos é realizado pela
hemoglobina. Essa ligação é feita de forma frouxa e reversível, sendo “determinada” pela
PO2. Quando está alta, como nos capilares pulmonares, o O2 se liga à hemoglobina, mas
quando PO2 está baixa, como nos capilares teciduais, o O2 é liberado da hemoglobina.
Esse fenômeno recebe o nome de percentual de saturação da hemoglobina. Ademais, ela é
responsável por estabilizar a Po2 nos tecidos.
Ao chegar nos tecidos, o O2 reage com diversos nutrientes, formando grande
quantidade de CO2, que posteriormente penetra nos capilares dos tecidos e é transportado
de volta aos pulmões, onde se se difunde dos capilares pulmonares para os alvéolos, onde
é expirado.
O monóxido de carbono (CO) se liga a hemoglobina no mesmo ponto em que a
molécula de O2 se combina. Mas, o CO se liga cerca de 250 vezes mais facilmente que o
oxigênio, o que permite ao monóxido de carbono deslocar o O2 da hemoglobina, o que
diminui a capacidade de transporte de oxigênio no sangue. Vale destacar que, mesmo que
o conteúdo de O2 esteja reduzido no sangue, a PO2 do sangue pode ser normal, o que faz
com que a exposição ao CO seja muito perigosa, pois o paciente não apresenta os sinais
de hipoxemia, como o tom azulado das pontas dos dedos ou lábios.
Já o transporte de CO2 é baseado no balanço ácido-base dos líquidos corporais.
Inicialmente, o processo de transporte de CO2 se dá com a difusão dele pelas células dos
tecidos, na forma de dióxido de carbono molecular dissolvido. Após isso, ao entrar nos
capilares dos tecidos, o CO2 inicia uma série de reações químicas, essenciais ao seu
transporte. Nesse sentido, 70% é transportado devido a combinação dele com água nas
hemácias sob influência da anidrase carbônica, sendo esse meio de transporte o mais
importante. Além disso, o CO2 reage diretamente com radicais amina da molécula de
hemoglobina, formando o composto carbaminoemoglobina (CO2Hgb) (cerca de 30% da
quantidade total transportada).
Efeito Haldane → É o “inverso do efeito Bohr”, ou seja, a ligação do O2 com a
hemoglobina tende a deslocar o CO2 do sangue. Este efeito é baseado no fato de que a
combinação do O2 com a hemoglobina faz com que ela passe a atuar como um ácido mais
forte. Dessa forma, o CO2 se desloca do sangue para os alvéolos. Isto ocorre de duas
maneiras: em primeiro lugar, quanto mais ácida a hemoglobina, menos ela tende a se
combinar com o CO2. A maior acidez da hemoglobina também faz com que ela libere
muitos íons de hidrogênio, que se ligam aos íons bicarbonato para formar o ácido
carbônico, que, por sua vez, se dissocia em água e CO2, sendo o CO2 liberado do sangue
para os alvéolos, e depois para o ar.
2. Elucidar as diferentes formas em que podem ocorrer a intoxicação;
O Monóxido de Carbono, um produto da degradação dos hidrocarbonetos, trata-se
de um gás sem sabor e sem cheiro, invisível e não irritante.
Intoxicação exógena pode ser definida como um conjunto de efeitos nocivos ao
organismo produzidos pela interação de um ou mais agentes tóxicos com o sistema
biológico, representados por manifestações clínicas ou laboratoriais que revelam
desequilíbrio orgânico.
A gravidade das intoxicações é determinada por diversos fatores, dentre eles, o grau
de toxicidade do agente, a quantidade de substância a que o paciente foi exposto, o tempo
decorrido entre o acidente e a intervenção médica, além de fatores do próprio indivíduo,
como idade e competência imunológica.
O monóxido de carbono (CO) é produzido durante a combustão e rapidamente é
absorvido pelo pulmão, logo inclui inalação de fumaça de incêndio, escapamento de veículo
automotor e escapamentos de outros motores em ambientes pouco ventilados e várias
fontes industriais.. É uma intoxicação comum nos departamentos de emergência, sendo
que, nos Estados Unidos, é a intoxicação líder em óbitos.
3. Abordar a fisiopatologia da doença em questão, correlacionando com o quadro
clínico;
No sangue, o monóxido de carbono liga-se à hemoglobina com uma afinidade 210
vezes maior que o oxigênio, deslocando o oxigênio, causando hipóxia tecidual, ou seja,
diminui o transporte e fornecimento de oxigénio aos tecidos, o que explica a maioria dos
seus efeitos tóxicos. Desse modo, o metabolismo rapidamente passa de aeróbio para
anaeróbio; à mioglobina (cerca de 60X mais afinidade), causando hipóxia grave no músculo
cardíaco; e ao citocromo oxidase mitocondrial, impedindo a produção de adenosina
trifosfato. O monóxido de carbono também se liga a mioglobina, promovendo redução da
sua capacidade de carrear oxigênio, e inibe o complexo mitocondrial responsável pela
cadeia respiratória (citocromos). As consequências são:
● Hipóxia tecidual - leva a um aumento da pressão intracraniana e edema cerebral que
são particularmente responsáveis pela descida do nível de consciência, convulsões
e coma.
● Metabolismo anaeróbio;
● Acidose lática - pela produção de ácido láctico decorrente da hipóxia tecidular;
● Peroxidação lipídica, isto é degradação de ácidos gordos insaturados, o que conduz
à desmielinização irreversível dos lípidos do SNC;
● Formação de radicais livres - resultantes da conversão de xantina desidrogenasse
em xantina oxidase mediado por protéases resultantes da adesão dos leucócitos ao
endotélio lesado;
A intoxicação por CO causa a ativação plaquetar e de neutrófilos, com a formação
de radicais livres de oxigénio e a oxidação lipídica nos tecidos, nomeadamente no tecido
cerebral. A sequela mais grave verificada é a disfunção neurológica tardia, evidenciada em
14 a 40% dos doentes tratados. A inativação da citocromo oxidase e as lesões de
isquemia-reperfusão aparentam ser o mecanismo principal de lesão neurológica, mas
evidencia-se, igualmente, o aumento de glutamato (aminoácido excitatório) em cérebros de
ratos após intoxicação por CO. Os neurónios são as células mais susceptíveis aos efeitos
de hipóxia/isquemia, por terem necessidades mais elevadas de glicose e oxigénio. A
intoxicação aguda e severa de CO pode levar diretamente para encefalopatia difusa
hipóxico-isquémica, afectando predominantemente a substância cinzenta
Os principais achados são dispneia, taquipneia, cefaleia (descrita
predominantemente como frontal, forte, sem aura em pacientes com uma média de COHb
de 21,3%), labilidade emocional, náusea, vômitos e diarreia. Taquicardia e taquipneia
desenvolvem-se com resposta à hipóxia tecidular e o débito cardíaco aumenta inicialmente.
Progressivamente, podem surgir agitação, confusão, cegueira, distúrbios do campo
visual e evoluir para rebaixamento do nível de consciência e coma. O fundo de olho pode
mostrar ingurgitamento venoso (dilatação de vasos), papiledema (um edema do disco óptico
decorrente do aumento da pressão intracraniana) e atrofia do nervo óptico. No sistema
cardiovascular, podem surgir arritmias, dor torácica isquêmica, insuficiência cardíaca,
hipotensão e síncope (perda súbita e transitória da consciência secundária a hipoperfusão
cerebral difusa).
4. Esclarecer quais as formas de realização do diagnóstico (Exames de imagem;
Laboratoriais; Testes específicos; Etc.);
O exame físico toxicológico se baseia em dados observacionais que não necessitam
de cooperação para serem obtidos. O exame da pele e das membranas mucosas, com
especial atenção para a coloração e o grau de umidade, pode sugerir a intoxicação por
algum entre vários agentes.
As principais pistas para o diagnóstico são coloração cor de framboesa da pele e
das mucosas (consequência da vasodilatação provocada pelo CO e posterior isquemia
tecidual), intensa dispneia com oximetria de pulso e Pa02 normais e acidose metabólica
grave com aumento intenso do lactato. Além disso, a fração de carboxiemoglobina se
relaciona com a gravidade dos sintomas, conforme tabela abaixo.

Deve-se solicitar hemograma, função renal e hepática, glicose, gasometria arterial


com dosagem de lactato e eletrólitos. Os exames complementares podem mostrar aumento
de desidrogenase lática, mioglobina, creatina fosfoquinase, rabdomiólise e insuficiência
renal.
A avaliação invasiva da concentração de COHb por gasometria é aceite como o
diagnóstico de intoxicação por CO. Devido à semivida da COHb ser de 4 a 5 horas, o
respectivo valor deve ser obtido logo que possível.[17] No entanto, a principal desvantagem
reside no facto de a gasometria arterial não se encontrar disponível na emergência médica
pré-hospitalar
A tecnologia para essa medição torna-se, no presente, disponível através oxímetros
de CO portáteis e não invasivos, os quais veem melhorar significativamente a capacidade e
rapidez de diagnóstico de intoxicação por CO, essencialmente na Medicina Pré-Hospitalar.
Exames complementares para avaliar o grau de acometimento do paciente:
Face à alta incidência de lesão miocárdica nos doentes com exposição ao CO, deve
ser realizado em todos uma avaliação cardíaca, baseada no ECG e marcadores cardíacos
(creatina cinase [CK], CK-MB e troponina cardíaca I).
A avaliação da função neurológica deve, também, ser avaliada através de testes
neuropsiquiátricos. O teste mais simples é uma avaliação neurológica através do minimental
examination.
5. Apresentar os princípios gerais dos tratamentos existentes, relacionando o mesmo
com a fisiopatologia.
A metabolização do CO, através dos pulmões, depende da fração inspirada de
oxigênio:
● Quatro a seis horas: pressão atmosférica.
● Quarenta a oitenta minutos: oxigênio a 100%.
● Quinze a trinta minutos: oxigênio hiperbárico.
Por isso, a intervenção mais importante no tratamento de um paciente envenenado
por CO é a remoção imediata da fonte de CO e a instituição de 100% de oxigênio por
máscara facial ou tubo endotraqueal. Recomenda-se o tratamento inicial com 100% de
oxigênio normobárico para todas as vítimas suspeitas de envenenamento por CO,
independentemente da oximetria de pulso ou PO2 arterial.
Tratamento com oxigénio normobárico a 100% reduz a semi-vida da COHb para
aproximadamente 40 minutos, enquanto que oxigénio hiperbárico – 2,5 ATA – a 100% reduz
o mesmo valor para aproximadamente 20 minutos. Oxigénio hiperbárico tem efeito,
igualmente, na quantidade de oxigénio dissolvido no plasma, aumentando o valor cerca de
10 vezes, quantidade suficiente para as necessidades cerebrais e com benefício para os
tecidos em hipóxia. Além disso, parece previnir a peroxidação lipídica no tecido cerebral,
por meio da aceleração da regeneração da citocromo oxidase inativa e prevenção a adesão
leucocitária ao endotélio microvascular do cérebro mediado pela integrina β2. Por último, o
oxigénio hiperbárico provoca vasoconstrição, o que diminui o edema cerebral.
Em pacientes com intoxicação grave, há controvérsia em torno da capacidade da
oxigenoterapia hiperbárica (HBO) de diminuir a incidência e a gravidade de déficits
neurocognitivos retardados, após envenenamento por CO. Diretrizes especializadas
sugerem o tratamento com HBO nas seguintes circunstâncias:
● Nível de CO> 25%;
● Nível de CO> 20% em pacientes grávidas;
● Perda de consciência;
● Acidose metabólica grave (pH <7,1)
● Evidência de isquemia de órgão- alvo (por exemplo, alterações na escala de coma
de Glasgow, dor torácica e estado mental alterado);
Muitos pacientes com sintomas leves de um envenenamento não intencional podem
ser tratados em um departamento de emergência e receber alta com segurança. Pacientes
cujos sintomas não se resolvem, que demonstrem evidências eletrocardiográficas ou
laboratoriais de intoxicação grave ou que tenham outras causas médicas ou sociais para
preocupação, devem ser hospitalizados. A avaliação psiquiátrica deve ser obtida para todos
os pacientes com intoxicação por CO autoinfligida.
Monitorização cardíaca e acesso venoso são imprescindíveis num doente com
intoxicação por CO.

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