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MARCELLO TICCA

TRADUÇÃO: MICHELE A. VARTULI

Alimentação
sem mentiras
99 informações erradas
sobre o que e como comemos

São Paulo – Editora Senac São Paulo – 2020


SUMÁRIO

Nota da edição brasileira


Introdução
Lista de abreviações

1 No café da manhã
Leite longa vida (UHT) é muito menos nutritivo que leite fresco
Leite cura úlcera
Leite desnatado contém menos cálcio
Doces causam diabetes
Sucos e concentrados podem substituir as frutas in natura
O iogurte é um “santo remédio”

2 Pausa para um café


O café de coador é mais leve do que o espresso
O café descafeinado faz mal
O café aumenta o colesterol do sangue
É preferível evitar comer entre as refeições
Idosos devem tomar menos café
Nada de café para quem está usando antidepressivos
Açúcar demerara e mel engordam menos do que açúcar re nado

3 Almoço e jantar
Comer macarrão à noite engorda
A carne de porco é pesada e não deve ser consumida no verão
Peixe faz bem para a memória porque contém fósforo
Ostras são afrodisíacas
Os ovos com gema laranja e aqueles com casca branca são os mais
nutritivos
Alimentos supercongelados são mais pobres em comparação com
os frescos
A manteiga tem mais gordura que o óleo
O óleo de grãos é mais leve que o azeite de oliva e contém menos
calorias
O gelato é um alimento completo e pode substituir uma refeição
Frutas devem ser comidas longe das refeições
Pelo menos nas festas posso comer o que eu quiser!

4 Cru e cozido
É melhor comer apenas alimentos crus
A carne do cozido é pouco nutritiva, ao passo que o caldo contém
muitos nutrientes
Os ovos são pesados para a digestão
O cozimento por micro-ondas faz mal à saúde
Para obter uma fritura leve, é preciso usar pouco óleo
Frituras engordam e fazem mal ao fígado

5 Bebidas
Não se deve beber água durante as refeições
O vinho tinto fortalece o sangue
O segredo do vinho está no resveratrol
Uma “bebidinha” revigora
As bebidas alcoólicas nos esquentam
Um drinque após as refeições ajuda na digestão
Beber muita água facilita a retenção de líquidos
Beber água com limão faz bem e emagrece
Tomar cerveja ajuda mulheres que amamentam a produzir mais
leite
Energéticos e álcool são uma combinação segura

6 Esportistas e “geração saúde”


Quem pratica esportes deve consumir muito mais proteínas e
vitaminas do que quem não pratica
Vitaminas e sais minerais: quanto mais, melhor
Os superalimentos têm propriedades curativas
Quem pratica esportes precisa tomar suplementos
Tisanas, alimentos especiais e regimes drásticos puri cam e
desintoxicam o organismo
Em época de provas, é preciso comer muito mais
Geleia real e própolis são ricos em nutrientes
O alho e a cebola protegem o coração e o estômago
O chiclete pode engordar e é perigoso quando ingerido
As intolerâncias alimentares fazem engordar

7 Dietas
A dieta dissociada emagrece porque separa os carboidratos das
proteínas
As dietas “só proteína” são as ideais para emagrecer
É possível emagrecer substituindo refeições por shakes e barrinhas
Alimentos light são bons para emagrecer
“Mas era uma refeição à base de peixe!”
Cream crackers e grissini no lugar do pão me ajudam a emagrecer
Para perder peso, é necessário eliminar totalmente as gorduras da
dieta
Tomar muito café ajuda a emagrecer
Quem dorme pouco é mais magro
Produtos sem glúten emagrecem
Para emagrecer, é preciso abolir o macarrão
O arroz tem menos calorias que o macarrão, portanto, é dietético
O jejum total desintoxica e emagrece
Pular refeições ajuda a emagrecer
Quando começo uma dieta, os primeiros quilos que perco são só
água
Estou acima do peso porque tenho ossos pesados
Preciso perder quilos demais, então nem vou tentar
Eu peso muito porque retenho muitos líquidos
Não importa se eu recuperar o peso, depois emagreço de novo
Beber álcool ou vinagre emagrece
A receita mágica para emagrecer: os comprimidos que queimam
gordura
Para emagrecer, é preciso renunciar à vida social
Óculos azuis para emagrecer

8 Comida e saúde
Faz mal comer carne e macarrão na mesma refeição
Os ovos fazem mal ao fígado
Um cálice de vinho tinto funciona como um remédio
O cálcio da água é inútil e provoca cálculos renais
O espinafre previne a anemia por ser rico em ferro
Chocolate e salame provocam acne
O mel faz passar a tosse
A vitamina C cura o resfriado
Devemos evitar os ovos porque eles contêm muito colesterol
Não há intolerância à lactose com o leite cru
A futura mamãe precisa comer por dois
O café faz aumentar a pressão arterial

9 A “fobia do branco”
Para adultos, tomar leite não é natural e faz mal
A muçarela é um queijo leve
As carnes brancas são menos nutritivas que as vermelhas
A farinha branca é tóxica
Pratos “sem molho” são mais leves
Sal iodado é o novo veneno legalizado
Para emagrecer, é preciso abolir o sal da cozinha e da mesa

10 Frutas “milagrosas”
Somente a banana contém muito potássio
Limão desinfeta os frutos do mar
O abacaxi (ou a toranja) após as refeições queima gorduras
As vitaminas estão na casca da fruta
As frutas de verão são cheias de açúcares
Castanhas e nozes são uma generosa fonte de ômega 3
As frutas frescas contêm todas as vitaminas

Agradecimentos
Sobre o autor
NOTA DA
EDIÇÃO BRASILEIRA

Notícias e informações falsas sobre alimentação já circulam há bastante


tempo entre nós, mesmo antes da internet; muitas delas concebidas por
crenças infundadas e até fantasiosas. Com o poder de disseminação das
redes, no entanto, essa circulação atingiu níveis preocupantes, chegando a
representar um risco para a saúde, já que muitas pessoas adotam dietas “da
moda” e hábitos que prometem resultados extraordinários, sem pensar em
suas condições particulares nem veri car os embasamentos e os riscos de
tais métodos.

Por esse motivo, obras como esta de Marcello Ticca são extremamente
importantes, já que, para combater o perigo das “fórmulas milagrosas” e da
cultura da desinformação, o autor apresenta conhecimentos e informações
recentes e cienti camente comprovados, elucidados em uma linguagem de
fácil compreensão, mostrando que o segredo para a saúde e para a boa
alimentação, na verdade, reside em regras muito simples: equilíbrio e
atenção às quantidades e à qualidade da comida, sem a necessidade de
eliminar praticamente nenhum alimento da dieta.

Embora fale de um contexto italiano, os assuntos e os alimentos


mencionados – bem como os “mitos” gerados em torno deles – muito se
assemelham àqueles do cotidiano brasileiro, e nesta edição os casos mais
particulares foram cuidadosamente adaptados à nossa realidade. O livro
ainda tem a vantagem de poder ser lido na sequência ou somente em partes,
cabendo ao leitor selecionar os tópicos que mais lhe interessarem.

Este lançamento do Senac São Paulo rea rma a importância da seriedade e


da con abilidade na interpretação de certas informações, principalmente
quando o assunto é saúde e alimentação, aspectos tão essenciais para a vida
em sociedade e para o bem-estar de cada um.
NÓS TENDEMOS A PROCURAR O QUE NOS
DÁ RAZÃO E A OBLITERAR O QUE
DESMENTE A NOSSA VISÃO ANTERIOR DO
MUNDO. CONFRONTAMO-NOS CADA VEZ
MENOS COM QUEM PENSA DIFERENTE: UM
FENÔMENO ALIMENTADO, SEGUNDO TOM
NICHOLS, TAMBÉM PELA “MORTE DA
ESPECIALIZAÇÃO”, ISTO É, PELA
TENDÊNCIA A NOS COLOCARMOS NO
LUGAR DOS ESPECIALISTAS.

TRATA-SE, COMO ESCREVEU ASIMOV, DE


UMA ILUSÃO GERADA PELA PRETENSÃO DE
QUE “A MINHA IGNORÂNCIA É TÃO
VÁLIDA QUANTO O SEU CONHECIMENTO”.

ANTONIO NICITA
Docente da Università La Sapienza e comissário da
Autorità per le Garanzie nelle Comunicazioni (AGCOM)
INTRODUÇÃO

Uma coletânea de lugares-comuns e de verdadeiras “lendas urbanas”


relacionadas aos alimentos e à alimentação: isso era necessário? Já não se
falou e se escreveu o su ciente sobre comida?

Sabemos que no passado muitos especialistas do setor já tentaram rebater as


numerosas e difundidíssimas “falsas verdades” que circulam acerca do que
comemos, mas todas as evidências indicam que isso não bastou. E a prova
está no fato de que, hoje em dia, no quesito mitos fajutos e falsas
convicções, o setor da alimentação supera todos os recordes de quantidade,
variedade, fecundidade e, infelizmente, também indestrutibilidade das
invenções, sempre novas e surpreendentes. Encontramos esses “mitos
alimentares” o tempo todo, tanto nas conversas entre amigos quanto nos
diálogos com pacientes, nas páginas dos jornais e, lamentavelmente, também
em certas declarações de pessoas pertencentes ao mundo da saúde. E sua
esmagadora presença não passa de um re exo do nível insu ciente de
informação que existe sobre esse tema, e da facilidade com a qual certas
teorias, instigantes e bem apresentadas, conseguem se arraigar em um
imaginário coletivo evidentemente muito vulnerável.

No entanto, é nosso dever não aceitar passivamente essa situação e tentar de


todas as formas fazer algo para corrigi-la e melhorá-la. Isso pelo simples
fato de que muitas vezes não se trata apenas de mal-entendidos inofensivos
que nos fazem rir, mas, ao contrário, de crenças distorcidas que se difundem
na cultura popular, equívocos aparentemente pouco importantes que, em vez
disso, se não são contrastados e redimensionados, adquirem uma
credibilidade que não merecem, a ponto de condicionar profundamente as
escolhas e os comportamentos relativos ao modo de se alimentar. E isso,
como a experiência do dia a dia nos ensina, pode pôr em risco tanto a
completude quanto a qualidade e a variedade da alimentação diária, e,
portanto, de nitivamente pode comprometer a saúde, sobretudo nas
camadas mais jovens da população.

En m, tentar corrigir os lugares-comuns alimentares é importante. Mas,


para fazer isso, é preciso conhecê-los a fundo e entender por que brotam
como cogumelos, multiplicando-se incessantemente e resistindo por décadas,
invulneráveis contra qualquer tipo de desmentido, por mais bem
documentado que seja. Não foi à toa que Ancel Keys – famoso acadêmico
americano responsável por coordenar os estudos que, na década de 1950,
zeram ressurgir as vantagens do modelo alimentar mediterrâneo para a
saúde – escreveu que basta um só dia para dar vida a uma nova “tese”
alimentar, por mais infundada que ela seja, mas, depois, dez anos de provas
cientí cas contrárias não são su cientes para apagá-la da mente das pessoas.

Muitas são as causas dessa incontestável realidade. A primeira é certamente


o interesse visceral que tudo aquilo que diz respeito à comida desperta em
cada um de nós, talvez pelo simples fato de que camos frente a frente com
essa necessidade básica todos os dias, mais de uma vez por dia. A segunda
vem da consciência acerca da forte relação, muitas vezes vivida com uma
sensibilidade exagerada, que existe entre o que comemos e o nosso bem-
estar. Mas a terceira causa é sem dúvida o erro, cometido por muitas
pessoas, de considerar o tema “alimentação” como algo trivial, como um
assunto ao alcance de todos e sobre o qual qualquer um, mesmo sem
preparo especí co, teria – sabe-se lá por quê – o direito de falar à vontade,
emitindo juízos inapeláveis e fazendo valer as próprias ideias pessoais como
se fossem verdades indiscutíveis.

Os preconceitos alimentares que poluem o conhecimento popular podem ter


diferentes origens. Podem se tratar de ideias que eram aceitas antigamente,
mas que depois foram superadas pelo progresso da pesquisa cientí ca, sem
que o grande público pudesse (ou quisesse...) tomar ciência disso. Ou então
de convicções e experiências pessoais transformadas em regras (a atitude
mais anticientí ca que se possa conceber) e muito difundidas porque
conseguem impressionar ou por serem apresentadas de forma hábil. Ou
ainda de teses e modas “modernas” divulgadas com maestria para promover
algum produto, algum medicamento ou alguma atividade pro ssional. Ou,
en m, de crenças arraigadas na tradição popular, em que se acredita,
erroneamente, que “a voz do povo é a voz de Deus”.

Nos anos 1990, um grupo de especialistas enfrentou essa questão


compilando uma lista de cerca de sessenta lugares-comuns alimentares
particularmente difundidos entre nós, con ando a um importante instituto
de pesquisa a tarefa de desenvolver uma enquete com o objetivo de
identi car quais seriam os mitos mais fortemente gravados no imaginário
coletivo. Daí surgiu uma classi cação[1] interessante e também
surpreendente, sob certos pontos de vista; um quadro de luzes e sombras
que, por um lado, parecia indicar um conhecimento maior em comparação
com o passado, mas, por outro, denunciava impiedosamente a permanência,
sobretudo entre os menos jovens, de algumas “alucinações alimentares” que
se esperava já terem sido superadas.
Seja como for, é fato que os mitos alimentares surgem, rmam-se e
espalham-se com extrema facilidade também hoje em dia. Ou deveríamos
dizer sobretudo hoje em dia? Sim, porque, neste terceiro milênio, a facilidade
com a qual a internet permite que certas notícias possam ser criadas e
espalhadas de maneira “viral”, como costuma-se dizer, fez com que as “fake
news alimentares” se multiplicassem de maneira impressionante, aumentando
em vez de diminuir, e que novos mitos sempre aparecessem dia após dia.
Uma constatação que por si só bastaria para con rmar o quanto é oportuno
abordar a situação e atualizar as já válidas coletâneas desse tipo, surgidas
nos últimos vinte anos.

Mas não é só isso. Para tornar essas convicções erradas do campo alimentar
mais consistentes e incisivas – e, portanto, mais perigosas –, também
contribui fortemente uma atitude que sempre existiu, mas que há alguns
anos parece ter se agigantado: re ro-me àquilo que foi e cazmente de nido
como “neoxamanismo” (termo de autoria do professor Rosario Sorrentino)
e “anticienti cismo”, que se concretiza na tendência de ser fascinado pela
“ciência do faça você mesmo” e por teoremas cientí cos autorreferentes –
tantas vezes sustentados por estranhos círculos formados por atores,
apresentadores, DJs, jornalistas, astros do rock e in uenciadores de várias
naturezas –, ao mesmo tempo que se descon a de tudo que vem do mundo
da ciência. Uma tendência e uma atitude tão presentes na sociedade
moderna que chegam a dar vida a fenômenos importantes e coletivos de
autêntico distanciamento e raivosa rebelião contra as regras que a
comunidade cientí ca tenta difundir (e às vezes, por que não dizer, até
mesmo impor) em nome do bem comum.
Os exemplos recentes que foram parar nas primeiras páginas dos jornais (e
até nos tribunais) estão em nossa memória. Além dos episódios mais
clamorosos, porém, o que preocupa é a difusão dessa mentalidade no tecido
social. Na Itália, há algum tempo tem piorado a situação que já em 2001 o
professor Angelo Panebianco sintetizava da seguinte forma, em um editorial,
enxergando muito longe: “As elites italianas, também por causa de sua
formação predominantemente não cientí ca, têm por tradição um
relacionamento di cílimo com a ciência. A maior parte delas não entende
seus procedimentos e não está em condições de lhes dar o devido valor”.

Sábias palavras. E como repetimos há anos, a causa provavelmente deve ser


procurada em um bem de nido defeito cultural básico da nossa sociedade,
ou seja, no despreparo para entender como é concebida e como funciona a
dialética cientí ca, a qual, por sua própria natureza, não comporta certezas,
mas apenas hipóteses. E hipóteses que, aliás, devem ser continuamente
controladas e veri cadas, em um incessante reexame crítico que não deveria
induzir desorientação ou ceticismo, mas sim representar a melhor garantia
da seriedade e da qualidade dos resultados obtidos, dos modelos de
comportamento sugeridos e, en m, quando o assunto é comunicação,
também das notícias divulgadas.

Em vez disso, entre nós, na maioria das vezes acontece o contrário: de fato,
a nossa formação cultural, substancialmente do tipo losó co-humanística –
ou, se quisermos, do tipo lógico-literária –, e a escassa educação nos
princípios da ciência moderna fazem com que a nossa mentalidade esteja,
sempre e apenas, em busca de certezas e respostas precisas, irrefutáveis e
imutáveis no tempo; uma atitude que fatalmente leva a interpretar mal a
justa cautela que se deve usar ao apresentar certos resultados e certas
hipóteses, ao passo que se deixa fascinar por quem assume o papel de
oráculo e pretende enunciar apenas “verdades” absolutas. É exemplar, com
relação a isso, a síntese contida em um título do médico-escritor Cornaglia
Ferraris: “A medicina avança com as dúvidas, os charlatões têm apenas
certezas”.

E é desse modo que (e aqui é novamente o professor Panebianco que fala)


“acontece um curto-circuito na comunicação, tanto que não são nunca os
cientistas que realmente falam à nação, e sim somente a mídia, com suas
falácias, seus preconceitos ideológicos, sua demanda por sensacionalismo”. E
ainda: “os inúmeros indivíduos acometidos pela síndrome anticientí ca,
inclusive os que leram Popper e não entenderam, argumentam que a ciência
não oferece certezas, e, portanto, pode ser considerada mera opinião, e que
cada um é livre para escolher a opinião que prefere. Não é assim. Mesmo
nos casos mais cheios de lacunas, existe sempre uma opinião cientí ca que
prevalece – talvez provisória, mas sempre baseada no saber –, e devemos
ouvi-la e respeitá-la. A alternativa é deixar de lado a razão e permitir que
apenas as emoções, e os pregoeiros que as administram, governem nossas
escolhas”.

Um diagnóstico impecável, sobretudo se pensarmos que essas palavras foram


escritas depois de tantas e tão discutidas terapias antitumorais (como as de
Hamer, de Gerson e de Di Bella),[2] mas bem antes que acontecessem
outros casos ruidosos, que também arrebanharam tantos apoiadores, como
aquele dos dois médicos que alegavam poder curar tumores, um usando
bicarbonato e o outro, acupuntura e cortisona; ou como o tratamento
Stamina,[3] ou a recentíssima e insensata campanha contra as vacinas – em
relação à qual o mesmo professor Panebianco viu-se obrigado a voltar à
carga em 2017, perguntando-se de novo com veemência: “Por que pessoas
sem nenhuma credencial para isso põem-se a ponti car sobre temas
cientí cos complexos, pretendendo ‘falar de igual para igual’ com os
verdadeiros especialistas?”.

En m, a situação não dá mostras de melhorar, e o mesmo vale, infelizmente,


para a divulgação cientí ca em geral; portanto, também para aquela
relacionada às problemáticas alimentares. Temos exemplos disso todo dia na
mídia e sobretudo nas redes sociais, visto que o livre acesso à internet
favorece a difusão em massa de qualquer notícia, inclusive as falsas e as que
seriam melhor não serem transferidas apressadamente para a opinião
pública antes de veri cadas e con rmadas. E essa circulação, livre de
qualquer controle de mérito, é realmente um grande problema no delicado
setor das informações sobre saúde. Um setor que, como ressaltou o famoso
jornalista cientí co Luciano Onder, tem grande relevância ética e apresenta
aspectos e deveres totalmente particulares, pois, ao contrário de outros
ramos do jornalismo, não pode se dar ao luxo de visar apenas a audiência:
os dois tipos de informação não podem absolutamente seguir as mesmas
regras.

Voltando ao âmbito mais restrito das “balelas alimentares”, também nesse


campo a mentalidade anticientí ca em expansão tem seguramente muitas
responsabilidades pelo modo como tantas lendas bizarras e convicções
errôneas se difundem com desarmante facilidade, e sobretudo se arraigam
de forma resistente em todo nível cultural. E é somente enfrentando esses
argumentos com precisão e redimensionando ou desmentindo ao menos
uma parte deles que podemos esperar uma melhora no conhecimento desse
setor que, é inegável, foi culpadamente negligenciado pela informação
institucional.

Que que bem claro: ninguém deve se iludir pensando que discutir e tentar
desmisti car uma série de preconceitos alimentares possa resolver o
problema. Acreditar nisso seria realmente pretensioso. No entanto, talvez
não seja ousado demais esperar que possamos ao menos dar uma pequena
contribuição positiva, tanto esclarecendo alguns pontos de controvérsia
quanto registrando uma situação que está mudando continuamente.

Para justi car de uma vez por todas o nascimento de uma nova coletânea de
crenças populares, também existem tanto o inequívoco interesse que o
assunto desperta no público quanto a oportunidade de ampliar e atualizar a
lista com relação às anteriores. Nestas páginas, de fato poderão ser
encontrados muitos conhecimentos antigos, ao lado de novos “mitos” que
antes não haviam surgido ainda, alguns dos quais vêm acompanhados por
convicções, ideias e comportamentos realmente peculiares. É justo ressaltar
que muitos destes últimos foram obtidos principalmente por experiência
pessoal, ou seja, pelo confronto diário com tantas pessoas caracterizadas por
uma extraordinária variedade de bases culturais, de costumes e inclinações,
bem como de verdadeiras ideias xas, sempre muito difíceis de corrigir.

Gostaria também de sublinhar que não interpretei a análise desse


caleidoscópio de mitos alimentares somente como uma maneira banal de
satisfazer o gosto de desmentir, ou, menos ainda, de pôr na berlinda certas
ideias erradas e às vezes até vagamente cômicas. A intenção foi outra, e
espero que ela transpareça claramente nestas páginas: não apenas me limitar
a desmentir certas ideias discutíveis, mas, sim – por certo “vício”
pro ssional, confesso –, aproveitar a ocasião para acrescentar também toda
uma série de outras notícias e informações que acredito que possam ser
úteis e interessantes a quem quer que se preocupe com a própria
alimentação.

Uma amostragem sintética dessas notícias potencialmente úteis que inseri


talvez explique melhor a ideia. Por exemplo, aprofundar informações sobre a
composição nutricional de várias categorias de alimentos de grande
consumo; ou então tornar conhecidos os níveis de absorção sugeridos para
muitos nutrientes de grande importância, inclusive alguns dos menos
comentados, como ômega 3 ou iodo. Ou, ainda, falar dos re exos que
algumas tendências atuais podem ter, como a dos alimentos light ou dos
integrais, a dos alimentos sem glúten ou daqueles que substituem refeições, a
dos suplementos ou a dos chamados “superalimentos”. Ou indicar os níveis
idôneos de consumo para cobrir as principais necessidades, incluindo as dos
esportistas e estudantes, destacando os possíveis perigos das “megadoses”.
Ou sinalizar os riscos trazidos por modas alimentares discutíveis – como a
do jejum prolongado e a do vinho visto como medicamento – e por
comportamentos à mesa típicos da nossa época, da moda do sushi à dos
energéticos. Ou então enfrentar, com certo aprofundamento, algumas
idiossincrasias cromáticas muito em voga, como aquelas que têm como alvo
as carnes vermelhas e os supostos “venenos brancos”, ou seja, farinha, leite e
açúcar – nada a dizer, no entanto, sobre as críticas ao abuso do sal, ao passo
que me pareceu muito oportuno dar explicações acerca do sal iodado. Ou,
ainda, discutir modelos alimentares que erram por excesso de zelo, como a
dieta sem molho, a alimentação para gestantes ou a dos estudantes em época
de provas. Ou sintetizar e difundir, o quanto for possível, muitas das
principais recomendações contidas em diretrizes o ciais para uma
alimentação sadia. Ou lembrar das interações entre alguns alimentos e
determinados medicamentos, bem como os conselhos e os possíveis
problemas relacionados a vários tipos de cozimento, da fritura à fervura,
passando pelo forno de micro-ondas. E, certamente, ressaltar os riscos
trazidos pela adoção de dietas emagrecedoras bizarras ou desaconselháveis,
ou também de dietas baseadas em intolerâncias a alimentos. E outras coisas
mais.

O objetivo, en m, não foi apenas desmentir muitas das mais difundidas


falsas crenças alimentares, mas também fornecer uma série de dados e
conselhos práticos que o consumidor comum di cilmente consegue
conhecer, já que não tem à sua fácil disposição os documentos de divulgação
preparados e aprovados pela comunidade cientí ca.

O leitor provavelmente notará, também, a ausência de alguns mitos


alimentares entre os mais frequentemente citados nas conversas e na
imprensa. É verdade, mas, além do fato de que a lista poderia ser
praticamente in nita, há também casos nos quais, no m das contas, à luz
do que se sabe hoje, a falsa crença não era tão fajuta que merecesse ser
inapelavelmente desmentida. Alguns exemplos para explicar melhor: o fumo
que emagrece (infelizmente, é verdade que o fumo quase sempre faz perder
peso, embora seja um agente emagrecedor mortal, que não deve ser
recomendado a ninguém; no entanto, não se trata de um mito), ou a
idealização exagerada da pimenta, do chocolate amargo com alto teor de
cacau, do chá-verde e dos produtos biológicos (são alardeados em demasia
os benefícios não demonstrados, mas sem dúvida existe alguma base sólida
para isso), ou a idolatria intransigente demais das virtudes salvadoras da
dieta vegana (cujos méritos e defeitos, para as diversas faixas de idade,
devem ser examinados com serenidade e sem preconceitos, mas que são
difíceis de discutir no âmbito limitado de poucas páginas), ou ainda a
história do chocolate que causaria “dependência” como se fosse uma droga
(não se trata de uma dependência real, mas é fato que o cacau contém
algumas substâncias farmacologicamente ativas capazes de agir sobre o
sistema canabinoide cerebral endógeno), e assim por diante.

ALGUMAS BREVES CONSIDERAÇÕES, PARA


CONCLUIR
A primeira diz respeito à inegável ausência, no texto, de inúmeros aspectos
– até importantes – relativos à nutrição humana. O motivo está no desejo
de manter-se el ao propósito de fazer referência somente aos temas
ligados, de alguma maneira, a um “mito”. Ademais, a omissão de certos
assuntos condiz com as intenções iniciais, que certamente não
contemplavam a pretensão de trazer à luz um tratado de ciência da
alimentação.

Há outra coisa que eu gostaria de ressaltar mais uma vez, como apelo nal, a
uma atitude de equilíbrio e cautela que deveria ser sempre comum a todos
aqueles que se ocupam de temas do tipo cientí co, tanto no papel de
estudiosos quanto no de divulgadores ou simples a cionados. Ou seja,
lembrar de que a ciência, por sua própria natureza, não quer e não pode dar
certezas imediatas, exatamente porque está em contínua evolução. Somente
suas veri cações ao longo do tempo podem garantir certa estabilidade de
juízo. Um exemplo relacionado à nutrição é dado pelo fato de que, por
muitas décadas, as pesquisas focaram nos efeitos dos cerca de quarenta
nutrientes conhecidos (das gorduras e proteínas às vitaminas e aos sais
minerais), enquanto hoje em dia a atenção está concentrada na miríade de
compostos bioativos presentes nos alimentos – compostos que, junto dos
nutrientes propriamente ditos, agem para a promoção da saúde. Trata-se de
um campo de estudo fascinante, sobre o qual ainda sabemos pouco, e que
nos próximos anos promete desdobramentos interessantíssimos e
potencialmente muito vantajosos para todos.

En m, permitam-me cultivar a ilusão de que ter utilizado o assunto curioso


e estimulante das “mentiras no prato” como veículo para difundir ou
atualizar também informações de caráter cientí co (relativas à alimentação
e à saúde, bem como ao uso e ao confronto diário com a comida, com as
substâncias que ela contém e com os efeitos que produz) possa ser julgado,
de maneira geral, como uma suplementação, à qual não falta certa utilidade,
ou talvez até um pequeno valor agregado à pura e simples abordagem do
tema superatual dos mitos alimentares.
[1] Alimentazione Notizie, nº 2, ano X, 1999.

[2] Ryke Geerd Hamer, Max Gerson e Luigi Di Bella foram os criadores de métodos experimentais e

não ortodoxos de tratamento do câncer, respectivamente, na Alemanha, nos Estados Unidos e na

Itália. Esses tratamentos geraram polêmicas relacionadas à comprovação dos resultados e, em alguns

casos, também acerca do papel do Estado em seu custeio para os pacientes. (N. E.)

[3] Método experimental baseado em células-tronco, elaborado pela entidade Stamina Foundation

Onlus, na Itália, que esteve envolvido em polêmica semelhante ao caso Di Bella. (N. E.)
LISTA DE
ABREVIAÇÕES

ALA ácido alfa-linolênico

BCAA branched-chain amino acids (aminoácidos de cadeia rami cada)

CNSA Comitato Nazionale per la Sicurezza Alimentare (Comitê Nacional


para a Segurança Alimentar)

CREA-NUT Centro di Ricerca Alimenti e Nutrizione (Centro de Pesquisa


de Alimentos e Nutrição), anteriormente denominado Istituto
Nazionale della Nutrizione (Instituto Nacional de Nutrição) e depois
INRAN

DHA ácido docosahexaenoico, ácido graxo poli-insaturado da série ômega 3

EFSA European Food Safety Authority (Autoridade Europeia para a


Segurança Alimentar)

EPA ácido eicosapentaenoico ou icosapentaenoico, ácido graxo ômega 3

FDA Food and Drug Administration (Agência de Administração de


Alimentos e Medicamentos), órgão do governo americano

FOSAN Fondazione per lo Studio degli Alimenti e della Nutrizione


(Fundação para o Estudos dos Alimentos e da Nutrição)
HDL high density lipoprotein (lipoproteínas de alta densidade)

IARC International Agency for Research on Cancer (Agência Internacional


de Pesquisa do Câncer)

LARN Livelli di Assunzione di Riferimento di Nutrienti ed energia per la


popolazione italiana (Níveis de referência de absorção de nutrientes e
energia para a população italiana)

LDL low density lipoprotein (lipoproteínas de baixa densidade)

NASA National Aeronautics and Space Administration, agência civil


governamental responsável pelo programa espacial dos Estados Unidos
e pela pesquisa aeroespacial

OMS Organização Mundial da Saúde

RDA recommended dietary allowances (doses diárias recomendadas)

VLDL very low density lipoproteins (lipoproteínas de muito baixa densidade)


1 NO CAFÉ DA MANHÃ

LEITE LONGA VIDA (UHT) É MUITO


MENOS NUTRITIVO QUE LEITE FRESCO
Trata-se de uma convicção tão comum quanto exagerada. Nem vamos falar
de todas as vantagens práticas ligadas ao fato de assegurar ao leite uma
conservação muito duradoura, mesmo em temperatura ambiente. Essa
conservação é obtida porque o tratamento chamado de UHT (sigla de ultra
high temperature), feito a cerca de 140 °C por pouquíssimos segundos, além
de destruir as bactérias patogênicas – como acontece também na mais
branda “pasteurização” (aquecimento a 72 °C por cerca de 15 segundos, que
possibilita a conservação no refrigerador por não mais que seis dias) –,
destrói também os esporos termorresistentes e todos os micro-organismos
responsáveis pela alteração do próprio leite. Resultado: a possibilidade de
conservar o produto de três a seis meses em temperatura ambiente.

Do ponto de vista do valor nutritivo, as consequências são as seguintes: uma


perda insigni cante do valor biológico das proteínas (cerca de 6%);
nenhuma in uência nas gorduras presentes; alguma variação no conteúdo de
vitamina D e sobretudo na vitamina A (um aspecto não negligenciável,
porque o leite é uma boa fonte dessas vitaminas); perdas de até 30% das
vitaminas B1 e B12 (ao passo que a B2 e a niacina, que são termoestáveis,
são preservadas); diminuição da vitamina C em até 50% da quantidade
inicial (o que tem pouca importância, porque o leite não é uma fonte
relevante dessa vitamina); e nenhuma variação no que se refere aos sais
minerais, em especial ao cálcio, do qual o leite é uma fonte preciosa na
alimentação humana.

De maneira geral, portanto, o leite longa vida perde muito pouco do seu
valor nutritivo em comparação com o produto fresco, e as reduzidas perdas
são amplamente compensadas pela sua maior disponibilidade e pela
possibilidade de distribuí-lo e conservá-lo convenientemente, sem a
trabalhosa obrigatoriedade da cadeia de distribuição refrigerada.

LEITE CURA ÚLCERA


É uma força de expressão no mínimo imprópria. De fato, se é verdade que o
leite, no momento em que chega ao estômago, efetivamente desempenha
certa ação de neutralizar o eventual excesso de acidez, também é verdade
que seu efeito a longo prazo é quase o oposto, no sentido de que ele acaba
estimulando a produção de ácidos nas fases seguintes do processo digestivo.

De qualquer forma, não se trataria de uma cura para a úlcera, mas apenas de
uma atenuação dos distúrbios advindos da hiperacidez, ou, na melhor das
hipóteses, de uma branda prevenção. Na verdade, essa atividade protetora da
mucosa gástrica, ligada por certo período a um elevado poder de
tamponamento que era atribuído ao leite, é desmentida por muitos e precisa
ser amplamente redimensionada.

LEITE DESNATADO CONTÉM MENOS


CÁLCIO
Não está claro de onde veio essa ideia, que, no entanto, é bastante comum.
Sabemos que o leite, com seus derivados, consiste em uma importante fonte
de cálcio de fácil absorção, graças também à ação favorecedora da caseína, a
principal proteína do leite, e da lactose. O fato é que, na alimentação média
dos italianos, o cálcio contido no leite e nos seus derivados garante mais de
55% da absorção total desse mineral, sobretudo graças aos queijos (média
de consumo de 57 g por dia per capita, praticamente de quatro a oito
porções-padrão por semana!).[4]

Tomar leite é um ótimo hábito, mas é preciso ressaltar que o leite integral
(100 g do qual contêm 87 g de água, apenas 3,6 g de gordura e 4,9 g de
açúcar, além de 3,3 g de proteínas, 34 mg de colesterol e apenas 65 kcal) é
estranhamente encarado como “alimento gorduroso”. Um equívoco que
muitas vezes induz as pessoas a deixarem de consumir leite e se orientarem
– enganadas, talvez, também pelos nomes e impelidas por modismos – para
“leites” vegetais (de soja, de arroz, de amêndoas, etc.), que na verdade não
merecem ser de nidos assim, como uma sentença da Corte de Justiça da
União Europeia decretou em 2017.[5] Agora está claro que só pode ser
chamado de “leite” o produto da secreção das glândulas mamárias, e que
esses produtos vegetais, embora tenham uma boa dignidade nutricional, não
devem ser confundidos com o leite de vaca, de cabra ou de qualquer outro
mamífero.

Também é preciso dizer que a visão equivocada do leite como alimento


gorduroso levou muitas pessoas a preferirem a variedade de leite
semidesnatado (1,5 g de gordura, 45 kcal e 7 mg de colesterol por 100 g)
ou totalmente desnatado (0,2 g de gordura, 36 kcal e apenas 2 mg de
colesterol por 100 g).[6] Trata-se de uma escolha válida, mas o estranho é
que muitos consumidores se abstêm de fazê-la (preferindo em vez disso os
produtos alternativos citados anteriormente) pela bizarra convicção de que
o leite desnatado tenha perdido também uma parte do seu cálcio com maior
parte do seu conteúdo de gordura.

Isso está absolutamente errado. O cálcio, um dos nutrientes mais


importantes fornecidos pelo leite, está presente em uma medida de
aproximadamente 119 mg para cada 100 g de leite integral (a dose diária
indicada para adultos oscila ao redor dos 1.000 mg). Pois bem, as tabelas de
composição dos alimentos nos dizem que no leite semidesnatado
encontramos 120 mg de cálcio a cada 100 g, e no totalmente desnatado, um
teor ainda maior: 125 mg, o que faz sentido, considerando que se tiramos
parte de um componente (a gordura, nesse caso) é inevitável que a
concentração dos demais aumente, ainda que de forma limitada (a água
aumenta para 90,5%, os açúcares para 5,3%, etc.).

Portanto, não é preciso temer que parte do cálcio se perca se forem


preferidas as variedades de leite mais magro à disposição em toda parte no
comércio.

E, para completar o discurso sobre os “não leites” vegetais (chamá-los de


“bebidas à base de soja”, por exemplo, é mais correto), devemos lembrar que
o de soja fornece de 40 kcal a 50 kcal a cada 100 g, 1,8 g de gorduras,
obviamente vegetais, e de 3 g a 3,5 g de proteínas. A eventual adição de
cálcio (160 mg a cada 100 g) permite que esse bom produto, de certa
forma, imite ainda mais o espectro nutritivo do leite animal. Existe alguma
limitação – mas não tão importante – na qualidade proteica: a soja é uma
leguminosa e suas proteínas têm um bom valor nutritivo, porém levemente
inferior àquele das proteínas de origem animal, e, portanto, também ao das
proteínas do leite. Para sermos mais exatos, o “índice de qualidade das
proteínas” (que se baseia na pontuação atribuída aos aminoácidos presentes,
corrigido para a digestibilidade das proteínas) atribui o valor máximo
(superior a 1) às proteínas do leite, dos ovos, da carne e de maneira geral
àquelas dos produtos de origem animal, enquanto o índice das proteínas da
soja é 0,95 (bom mesmo assim), e o dos legumes, de 0,70 a 0,75.

DOCES CAUSAM DIABETES


Na mentalidade comum, o aparecimento de diabetes em adultos sempre foi
associado, no passado, a um elevado consumo de açúcar e de doces.

O diabetes mellitus é uma doença muito comum, caracterizada por uma


alteração do metabolismo da glicose que se re ete no metabolismo das
proteínas e no das gorduras: abrange, portanto, todos os aspectos
metabólicos do organismo e envolve, em suas complicações, vários órgãos e
sistemas, como o cardíaco, o vascular, o renal, e em particular os vasos da
retina – a retinopatia diabética é a causa mais frequente de cegueira.

A classi cação das várias formas de diabetes é muito complexa. Para


esquematizar, pode-se falar de diabetes mellitus tipo 1 (também chamado de
diabetes infantojuvenil ou insulinodependente) e de diabetes mellitus tipo 2
(também chamado de diabetes do adulto ou insulinorresistente).

O diabetes tipo 1 é o mais traiçoeiro: surge bruscamente e suas causas


podem ser resumidas a uma combinação de fatores genéticos, ambientais e
imunológicos. Trata-se de uma doença autoimune que em geral se manifesta
durante a infância ou a adolescência e é caracterizada pela escassez –
inicialmente relativa e depois absoluta – de insulina (hormônio produzido
pelo pâncreas), resultando em acidose e em elevados valores de glicose no
sangue em jejum (hiperglicemia) e na urina (glicosúria), etc.

O diabetes tipo 2 representa cerca de 90% dos casos de diabetes, é muito


comum em pacientes obesos e é a forma mais frequente que surge na idade
adulta, além de ser a mais comum em termos absolutos na população, tendo
aumentado muito nos últimos anos. Consiste em uma doença metabólica
também caracterizada pela glicemia elevada, que se manifesta quando o
pâncreas produz uma quantidade correta de insulina, mas esta não consegue
desempenhar sua função por causa da resistência das células-alvo
(receptoras): nas fases iniciais da patologia, isso leva a uma hiperprodução
compensatória de insulina por parte do pâncreas (ao contrário do que
acontece no diabetes tipo 1); porém, nas fases seguintes, essa produção
tende a diminuir cronicamente.

A dieta quase sempre tem papel crucial para desencadear o diabetes tipo 2
ou facilitar seu aparecimento. De fato, a obesidade é considerada a principal
causa do seu surgimento em indivíduos que são geneticamente predispostos.
Essa forma de diabetes está ligada a um estilo de vida incorreto,
caracterizado por uma alimentação desequilibrada e/ou excessiva e pela falta
de atividade física. Também há uma forte caracterização genética, por isso
tende a ser hereditária: quem tem pais ou parentes diabéticos tem maior
probabilidade de desenvolver essa patologia. E, visto que o diabetes tipo 2
deriva muitas vezes de hábitos desequilibrados, a correção do estilo de vida
(com a normalização do peso e o combate à vida sedentária por meio da
prática constante de exercícios físicos aeróbicos) é a primeira providência
terapêutica a ser tomada. Caso isso não seja su ciente para manter a
glicemia sob controle – o que acontece com muitas pessoas, mesmo quando
o estilo de vida é perfeito –, será preciso intervir com medicamentos.

No entanto, não é totalmente correto pensar que o consumo de doces (por


si só) tenha necessariamente a responsabilidade direta por causar ou
facilitar a doença. Na verdade, os doces também estão envolvidos no
aparecimento do diabetes tipo 2 somente quando constituem uma fonte de
calorias em excesso em relação às reais necessidades, exatamente como pode
acontecer com qualquer outro alimento de alta densidade calórica. E é fato
que o diabetes tipo 2 aparece quase sempre associado ao sobrepeso ou à
obesidade, que estão presentes em 70% dos pacientes. Para esse quadro – e,
portanto, para o aparecimento da doença –, contribui a sobrecarga
metabólica ligada aos excessos alimentares, em particular aqueles
relacionados a alimentos de alto índice glicêmico (um índice que, trocando
em miúdos, representa a capacidade que uma certa dose de alimento tem de
aumentar a glicemia) e elevado teor calórico.

Um último aspecto é que, nos doces em geral, muitas vezes o problema é


mais favorecido pela abundância de gorduras do que pela de açúcares.
Muitos estudos populacionais desmentiram a crença popular de que o que
leva ao diabetes é principalmente o consumo de grandes quantidades de
açúcares, sugerindo, em vez disso, que a maior contribuição para o
surgimento da doença vem do consumo excessivo de gorduras, em particular
das saturadas, ou seja, as que estão presentes em maior quantidade nos
produtos animais. Essencialmente, a responsabilidade dos doces não seria
especí ca, mas estaria ligada ao fato de que com frequência eles são
consumidos em quantidades elevadas e sobretudo em acréscimo às refeições
normais, contribuindo assim para aumentar desmedidamente a absorção
calórica diária e facilitar esse aumento de peso que cria os pressupostos para
o surgimento da doença.

De qualquer forma, é necessário frisar que, seja qual for a forma de diabetes,
a dieta representa um dos pivôs do tratamento. A estratégia dietética a ser
adotada, recomendada por todas as associações nacionais e internacionais de
estudo do diabetes, é a de fazer refeições com carga glicêmica controlada,
bem distribuídas ao longo do dia, ricas em carboidratos complexos (amidos
e bras), moderadas no teor calórico e pobres em gorduras saturadas e
açúcares simples. Isso para manter sob controle tanto a massa corporal
quanto os níveis de gorduras, glicose e insulina no sangue.

Na prática, respeitar essas recomendações não implica necessariamente


eliminar de maneira drástica os produtos doces da nossa vida, pelos quais
tanta gente nutre uma verdadeira paixão. É mais que su ciente escolhê-los e
dosá-los com critério, possivelmente consumindo-os, de preferência, no
contexto de uma refeição, talvez revezando-os com outros produtos de valor
nutritivo mais ou menos semelhante e cuidando para manter o equilíbrio
entre a energia absorvida nos alimentos e a energia consumida nas
atividades cotidianas.

Em resumo, a primeira regra para evitar o diabetes nos adultos é não


aumentar o próprio peso; portanto, ser mais ativo sicamente e não comer
demais de maneira geral, seja qual for o tipo de alimento.
SUCOS E CONCENTRADOS PODEM
SUBSTITUIR AS FRUTAS IN NATURA
Os sucos e concentrados de frutas são uma moda muitas vezes motivada
pela falsa convicção de que nossa dieta atual é sempre e inevitavelmente
incapaz de satisfazer nossas necessidades de vitaminas e sais minerais.

Naturalmente, não há mal nenhum em permitir-se, em casa ou em um bar,


consumir um suco derivado de frutas e hortaliças, obtido com um extrator a
frio ou com uma centrífuga mais simples. Aliás, se esse consumo toma o
lugar daquele enésimo café ou de uma bebida alcoólica, a escolha está
aprovada sem ressalvas, desde que – e que que bem claro – ela seja somada
ao consumo de frutas, e jamais se torne um pretexto para abrir mão delas
completamente!

En m, o consumo de frutas deve sempre ter preferência em relação ao de


concentrados e sucos. De fato, optando por estes últimos, perde-se a maior
parte das bras presentes nas frutas e hortaliças ( bras que são preservadas
em sua maioria se, por exemplo, optarmos pela fruta batida); além de que a
sensação de saciedade, tão útil para evitar comer demais, é menor;
desaparecem o re exo e o gosto da mastigação e também certo efeito de
“limpeza” da superfície dos dentes que algumas frutas exercem.

De nitivamente, é sempre preferível optar por frutas in natura; mas, claro,


para aqueles que as ignoram ou não as consomem de jeito nenhum,
concentrados e sucos são melhores do que nada!

O IOGURTE É UM “SANTO REMÉDIO”


Isso não é de todo verdade. O iogurte sem dúvida é um ótimo alimento,
muito útil porque fornece os mesmos nutrientes preciosos contidos no leite,
sobretudo o cálcio, e de forma até mais digerível. Além disso, facilitando as
coisas para quem tem intolerância, ele contém somente a metade,
aproximadamente, da quantidade de lactose presente no leite.

No entanto, quanto a uma eventual ação de melhoria da ora bacteriana


intestinal – ação de grande utilidade –, o iogurte age somente em parte,
ajudando muito pouco no combate à constipação. De fato, dos fermentos
lácteos geralmente usados na produção do iogurte comum (Lactobacillus
bulgaricus e Streptococcus thermophilus), presentes em número elevadíssimo
(muitos milhões) em cada grama do produto, somente uma parte ín ma
consegue superar a barreira ácida do estômago e, portanto, eles não chegam
em número su ciente ao trato intestinal, onde deveriam desempenhar sua
função.

Por outro lado, os “leites fermentados” presentes atualmente no mercado


contêm, sempre em grandes quantidades (até 30 milhões por grama), cepas
mais resistentes, chamadas de fermentos probióticos, capazes de suportar a
elevada acidez dos sucos gástricos. Esses micro-organismos, portanto,
efetivamente alcançam – vivos, ativos e em grande número – a última parte
do intestino, onde se multiplicam ativamente, colonizando-a de maneira
muito e caz. Dessa forma, eles exercem uma válida função de reequilíbrio
da ora bacteriana intestinal, colaborando para restabelecer suas condições
normais, o que traz vantagens notáveis tanto para a saúde do próprio
intestino quanto para a do nosso organismo como um todo.
Alguns exemplos das ações favoráveis desempenhadas por uma boa ora
bacteriana (ou microbiota humana) são: reforço do sistema imunológico,
proteção contra micro-organismos patogênicos, melhor absorção de
princípios nutritivos importantes, prevenção das infecções intestinais, apoio
aos processos digestivos, produção de substâncias protetoras da própria
parede intestinal, etc.
[4] Segundo a International Osteoporosis Foundation (Fundação Internacional de Osteoporose), para

ter uma dieta equilibrada é necessário ingerir 1.000 mg de cálcio por dia. No Brasil, a população

consome apenas metade da dose indicada: para indivíduos acima de 20 anos, a média é de 505

mg/dia. (N. E.)

[5] No Brasil, existe um projeto de lei aguardando designação para proibir o uso da palavra “leite”

nos rótulos que não são de origem animal. (N. E.)

[6] Uma recomendação presente no Guia alimentar para a população brasileira (MINISTÉRIO DA

SAÚDE, 2014) é a de que as versões do leite sem gordura ou com menos gordura (desnatadas ou

semidesnatadas) podem ser mais adequadas para os adultos. (N. E.)


2 PAUSA PARA UM CAFÉ

O CAFÉ DE COADOR É MAIS LEVE DO QUE


O ESPRESSO
Não é verdade, embora muitas pessoas estejam rmemente convencidas
disso. O que engana são o sabor e o aroma do café de coador,
decididamente menos intensos – o que pode alimentar a ideia de “leveza”.

Uma premissa geral: a quantidade de cafeína presente nos vários tipos de


café habitualmente consumidos no mundo varia segundo os diversos
métodos de preparo da infusão, mas também segundo o tipo de grãos que
são usados (as várias espécies de café contêm percentuais diferentes de
cafeína), as quantidades de pó e de água acrescentadas, o maior ou menor
tempo de contato entre o pó e a água, a temperatura alcançada durante o
preparo, o conteúdo usual das xícaras, etc. Isso explica por que somos
obrigados a ser um tanto aproximativos ao tentar determinar o teor médio
de cafeína presente nos diferentes tipos de café adotados mundo afora, tão
diferentes de uma cultura para a outra. No entanto, algumas considerações
con áveis podem ser feitas. Limitemo-nos, então, aos tipos de café a que
podemos ter acesso mais facilmente.

O café de coador, melhor dizendo, “café ltrado”, é preparado fazendo a


água fervente passar pelo pó de café com torra média e moagem grossa,
depositado sobre um ltro de papel. São usados de 30 g (nos Estados
Unidos) a 80 g (nos países europeus) de pó de café para cada litro de água.
[7] O tempo de contato é longo: cerca de 6 minutos – e esse aspecto, aliado
ao notável volume de água, faz com que seja extraído do pó de café um
porcentual muito elevado de cafeína, que chega a uma e ciência de extração
de 97% a 100%. Assim, a quantidade de cafeína contida na clássica xícara de
café de coador, em média, vai de 115 mg a 120 mg – quantidade bem
superior tanto àquela contida em um espresso comum quanto à do café feito
na cafeteira italiana. O total, obviamente, está relacionado também à
quantidade que costumeiramente é servida e ingerida, ou seja, aos cerca de
180 ml a 200 ml representados pela capacidade da xícara.

A coisa muda quando falamos do café “fervido”, típico da Noruega e das


zonas setentrionais dos países escandinavos. Ele é preparado fervendo-se de
50 g a 70 g de pó de café (especialmente da espécie arabica), com moagem
grossa e torra leve, em um litro de água, por cerca de 10 minutos. Obtém-se
uma bebida que é tomada sem ltrar, em xícaras de 150 ml a 190 ml. A
e ciência da extração de cafeína é de 75% e seu teor varia de um mínimo de
85 mg a um máximo de 145 mg por xícara.

Quanto aos tipos de café mais populares, existe outra falsa crença relativa à
dose de cafeína presente em cada xícara: trata-se da convicção de que o
“café de padaria” (o espresso) contém muito mais cafeína do que o café
feito na cafeteira italiana (moka). Também nesse caso a realidade é
divergente e está ligada às diferenças entre os dois modos de preparo, que
não são poucas.

O espresso da padaria é preparado ltrando-se, sob pressão, cerca de 6 g a 7


g de café, bem torrado e namente moído. Entra em jogo um volume muito
pequeno de água (de 40 ml a 60 ml), cuja temperatura de extração é de 92
°C a 94 °C, e o tempo de contato entre a água e o pó é particularmente
breve, de apenas 30 segundos ou menos. A e ciência da extração de cafeína
é, portanto, muito inferior à do café ltrado: apenas 80%, e na Itália o
volume nal de líquido presente na xícara ca entre 20 ml e 35 ml.[8]

Já o café de cafeteira italiana, que é obtido por ltragem forçada com água
aquecida, prevê o uso de 5 g a 8 g de pó de café, namente moído e bem
torrado, para cada xícara. O tempo de contato entre a água e o café é de 1 a
2 minutos, e, portanto, a e ciência da extração de cafeína é alta – vai de
92% a 98%. O conteúdo de cada xícara varia, na Itália, entre 40 ml e 60 ml.

No m das contas, portanto, embora o espresso geralmente tenha um sabor


mais forte, a quantidade de cafeína presente na xícara é, em média, quase
igual ou levemente mais alta no café caseiro: cerca de 60 mg a 80 mg contra
os 40 mg a 60 mg do “café de padaria”. Pequenas diferenças, como se vê, e
que nem sempre estão presentes, mas que desmentem a impressão geral de
um espresso mais carregado de cafeína em comparação com o café caseiro.

Na prática, considerando que as recomendações gerais para adultos sadios


geralmente são de não superar 300 mg de cafeína por dia (com exceção das
gestantes: no máximo 200 mg por dia, de acordo com a European Food
Safety Authority – EFSA), ter uma noção das diferentes quantidades de
cafeína presentes nos tipos de café que preferimos pode ser útil para
controlar melhor o número de xícaras ou canecas que podemos nos permitir
ao longo de 24 horas. Em um dossiê de 2015, a EFSA aconselha que um
adulto não deve ultrapassar 5,7 mg de cafeína por quilo de massa corpórea
por dia, mas, em geral, o consenso é uma dose sensata, que corresponde a
exatamente 4 mg ou 5 mg por quilo de massa corpórea. Portanto, com base
no que já foi exposto, para quem prefere o café espresso, em média cinco
xícaras são o limite diário que é melhor não ultrapassar costumeiramente.
Para quem opta pelo caseiro, feito na cafeteira italiana (que na Itália
representa cerca de 70% do café consumido), o limite pode ser
sumariamente indicado como quatro ou cinco xícaras por dia. Finalmente,
para os amantes do café de coador, seria bom não ir além de duas, no
máximo três xícaras por dia.

Isso contanto que as pessoas se limitem apenas ao café: não esqueçamos, de


fato, que ao cálculo geral devem ser somadas também as outras fontes de
cafeína, como alguns chás (cerca de 40 mg a 50 mg de cafeína por xícara),
os vários refrigerantes do tipo cola (cerca de 35 mg a 50 mg por latinha),
os energéticos (com quantidades variáveis de cafeína, que em média vão de
50 mg a 100 mg por latinha de 250 ml, mas às vezes chegam a até mais que
o dobro disso) e os alimentos estimulantes, como o chocolate (25 mg de
cafeína por 50 g de chocolate amargo e cerca de 10 mg por 50 g de
chocolate ao leite), etc.

De qualquer forma, esses são números cujo peso deve ser avaliado caso a
caso. De fato, para a cafeína, a capacidade de tolerância (entendida como
uma menor sensibilidade aos seus efeitos psicoestimulantes, entre outros)
instaura-se em muito poucos dias, ainda que de forma diferente para cada
pessoa, e com a mesma rapidez pode desaparecer assim que a pessoa se
abstém de tomar café. É preciso notar, no entanto, que a cafeína não induz
ao que se chama “adição”, ou seja, não motiva quem a consome e dela se
bene cia a aumentar a dose. Pelo menos não na maior parte das pessoas.

Um último mito precisa ser desconstruído. Engana-se quem pede um café


“curto” na ilusão de assim obter um impulso mais forte graças a uma maior
quantidade de cafeína, e obtém, aliás, o efeito contrário: na verdade, o
espresso curto contém menos cafeína do que o “longo”, porque, como já foi
dito, o volume menor de água que é utilizado extrai menos substâncias do
pó de café e, portanto, também menos cafeína. Invertendo o raciocínio, se o
desejo é tomar um café “longo” sem aumentar a dose de cafeína absorvida, o
único jeito é pedir um café normal e diluí-lo com água quente. Quanto a
acrescentar leite para “enfraquecer” a cafeína, é inútil: serve apenas para
modi car o gosto da bebida.

O CAFÉ DESCAFEINADO FAZ MAL


Essa é uma crença baseada na convicção de que o café descafeinado conteria
doses não desprezíveis dos solventes químicos usados para extrair a cafeína.

Trata-se de um temor totalmente infundado. Vejamos o porquê, começando


por explicar que os procedimentos usados para eliminar a cafeína do café
são de três tipos.

No primeiro, utiliza-se água pré-tratada, de forma a extrair dos grãos apenas


a cafeína e não os outros componentes hidrossolúveis. Em seguida, os grãos
descafeinados são secos com ar quente.

No segundo procedimento, utiliza-se gás carbônico comprimido, que extrai


a cafeína agindo nos grãos previamente umedecidos com vapor e água,
dentro de um extrator.

O terceiro procedimento, hoje em dia menos utilizado, prevê o uso de dois


solventes (diclorometano e etilacetato), os quais extraem a cafeína agindo
nos grãos previamente inchados com vapor. E é sempre o vapor, no nal,
que remove praticamente qualquer vestígio dos solventes. Por m, os grãos
são secos.

Podemos concluir, portanto, que o difundido temor de que o café


descafeinado possa conter traços de substâncias potencialmente prejudiciais
é infundado. Além disso, é preciso lembrar que, de qualquer forma, esses
tratamentos são efetuados nos grãos de café crus, que em seguida são
torrados – uma operação que por si só faria desaparecer todo vestígio de
substâncias espúrias, incluindo os solventes, caso tivessem sido usados. E
seja qual for o procedimento utilizado, no café descafeinado há apenas
traços de cafeína.

Não esqueçamos também que o uso do café descafeinado pode trazer


algumas vantagens: possibilita tomar mais xícaras nos casos em que haja
restrições ao consumo do café integral por causa de determinados
problemas (como hipertensão grave, taquicardia, alterações da qualidade do
sono, etc.) e favorece a conservação de outras moléculas dotadas de ações
bené cas presentes no café normal, sobretudo os antioxidantes.

Um último aviso: a descafeinização não elimina os compostos de natureza


lipídica (diterpenos) que, quando presentes em grande quantidade (como
acontece no café fervido, característico de vários países do norte da
Europa), podem provocar um aumento da colesterolemia (isto é, do nível de
colesterol no sangue). No entanto, o problema é irrelevante no café ltrado
(feito com coador), no café espresso e no de cafeteira italiana.

É
O CAFÉ AUMENTA O COLESTEROL DO
SANGUE
Trata-se de um alerta, hoje amplamente redimensionado, que surgiu nos
anos 1980 depois que vários estudos (experimentais), conduzidos na
Noruega, na Bélgica, na Finlândia e em outros países do norte da Europa,
haviam revelado justamente uma relação positiva entre o consumo de café e
o aumento do colesterol no sangue.

Esses dados preocupantes, relativos a uma bebida tão popular e tão


amplamente consumida no mundo todo, provocaram o surgimento de uma
série de estudos de controle, tanto nos Estados Unidos quanto na Europa
ocidental. Pois bem, por sorte tais estudos não con rmaram os resultados
alarmantes colhidos no norte da Europa. Logo depois, a atenção dos
pesquisadores voltou-se para os métodos de preparo da bebida e, de fato, os
experimentos seguintes permitiram descobrir que o aumento da
colesterolemia era veri cado apenas com o consumo do café “fervido”,
preferido tipicamente em vários países da Europa setentrional: ele é
preparado fervendo-se o pó de café pouco torrado e moído grosso por 10
minutos, para depois tomar o líquido obtido sem ltrá-lo. Por outro lado, a
colesterolemia permanecia praticamente inalterada pelo consumo do café
ltrado (ou “à americana”), do café solúvel, do espresso e do café feito em
cafeteira italiana. E veri cou-se também que não havia diferenças, nesse
aspecto, entre indivíduos normais e outros com o colesterol elevado.

As pesquisas seguintes, mais aprofundadas, identi caram depois os


responsáveis pelo efeito de aumento do colesterol no sangue: trata-se de
dois diterpenos oleosos presentes no café (cafestol e caveol, para ser mais
preciso) que são liberados durante a infusão do pó de café. Os terpenos são
substâncias gordurosas produzidas por várias plantas e presentes na
natureza nos óleos essenciais voláteis de temperos ou ervas aromáticas, aos
quais conferem seus aromas e odores característicos. Pois bem, ocorre que
as gotículas oleosas que contêm tais substâncias podem estar presentes no
café fervido e não em outros tipos de café, feitos por outras modalidades,
pois nesses casos elas são retidas pela presença do ltro: isso explica por que
o método de preparação do café in ui, e muito, em sua presença na bebida
nal.

Aliás, a quantidade de diterpenos é a mesma no descafeinado (o


descafeinado “fervido” de fato exerce os mesmos efeitos de aumento do
colesterol do café normal) e é maior na variedade arabica do que na
variedade robusta.

Outros estudos de controle (entre os quais também estão alguns estudos de


intervenção) realizados posteriormente na Itália permitiram concluir:

que os diterpenos estão presentes em quantidades mínimas no café


ltrado, em quantidade muito pequena no de cafeteira italiana e no
espresso, mas em quantidades de cinco a seis vezes superiores no café
fervido;

que três xícaras de espresso ou de café de cafeteira por dia não têm
efeito algum sobre os níveis sanguíneos tanto do colesterol total como
do LDL (o colesterol “ruim”);

que, como se pode intuir, também pode ter relevância a reação


individual à absorção de diterpenos eventualmente presentes no café:
no caso de pessoas de maior risco, em virtude da hereditariedade, de
uma vida sedentária ou do consumo excessivo de colesterol ou de
ácidos graxos saturados nos alimentos, pode-se sugerir que não
ultrapassem três ou quatro xícaras de espresso por dia;

e que, de nitivamente, os conhecimentos atuais permitem a rmar que


o café contribui de maneira insigni cante para a elevação dos níveis de
colesterol no sangue.

Uma preocupação a menos, considerando a enorme difusão e a popularidade


universal dessa bebida, a qual é tão consumida hoje em dia que se calcula
que seu comércio só perca em importância para o do trigo.

É PREFERÍVEL EVITAR COMER ENTRE AS


REFEIÇÕES
O contrário é que é verdade. Já possuímos uma enorme quantidade de dados
– obtidos tanto em estudos experimentais quanto em estudos sobre grandes
grupos populacionais – demonstrando que aumentar a frequência das
refeições in uencia de maneira positiva uma série de variáveis importantes
para a boa saúde, contanto, é claro, que se mantenha sob controle a
quantidade e a qualidade gerais do que se come. E, paralelamente, também
foi demonstrado que se, ao contrário, o consumo de alimentos for
concentrado em uma única grande refeição diária, ou no máximo duas, os
riscos para a saúde tendem a aumentar signi cativamente.

Resumindo, parece que o fracionamento das refeições é realmente o


comportamento alimentar mais correto, ou seja, aquele que – com a
quantidade e a qualidade da dieta consumida, sempre é bom repetir – é
capaz, por um lado, de reduzir o risco do sobrepeso e da obesidade, do
aumento do colesterol no sangue, da glicemia e do acúmulo de gordura no
corpo; e por outro, de provocar uma vantajosa diminuição dos níveis de
insulina e glicose no sangue após a refeição.

En m, a “alimentação fracionada” dilui de forma útil a carga de nutrientes,


com o resultado de que as mesmas calorias, divididas em mais momentos,
acabam também estimulando muito menos a produção de tecido adiposo.

IDOSOS DEVEM TOMAR MENOS CAFÉ


De fato há alguma verdade nessa a rmação. No entanto, a ideia mais
comum, ou seja, de que o consumo de café deve ser severamente limitado
depois dos 70 anos, é radical demais.

Vamos explicar: é verdade que os mais velhos se mostram mais sensíveis à


ação da cafeína. Portanto, limitar o número de cafezinhos tomados durante
o dia é sensato, a não ser que se recorra ao descafeinado. Dito isso, um
idoso substancialmente bem de saúde pode se permitir de duas a três xícaras
de café por dia (até quatro, como limite que é melhor não ultrapassar por
prudência) sem correr nenhum risco e também para buscar um possível
benefício (que não deve ser valorizado demais) em relação à melhora do
desempenho psicofísico.

Além disso, é preciso lembrar que um café após as refeições pode ser
particularmente útil nessa faixa etária para reduzir a queda de pressão que
os mais velhos costumam sofrer nesses momentos do dia.

É Á
NADA DE CAFÉ PARA QUEM ESTÁ USANDO
ANTIDEPRESSIVOS
Trata-se de uma proibição severa demais e provavelmente sem motivo.
Sabe-se que o café interfere favoravelmente em diversos receptores, muitas
vezes propiciando uma agradável sensação de bem-estar. Além disso, muitos
autores relatam ter registrado outros efeitos positivos, como maior
capacidade de concentração, estímulo das faculdades mentais e do sistema
nervoso central e elevação do rendimento no trabalho. Dentro de certos
limites, portanto, a rma-se que o café poderia exercer também “algum efeito
antidepressivo e estimulante de maneira geral”.

Com base nessas considerações, o paciente com depressão também deveria


poder se bene ciar, do ponto de vista psicológico, de um consumo
moderado de café; e, de qualquer forma, não existem motivos válidos para
proibir o uso dessa bebida a quem está tratando a depressão. O único
cuidado a ser seguido parece ser o de evitar tomar café ao mesmo tempo ou
em um horário muito próximo do momento em que são tomados os
medicamentos antidepressivos.

Conclusão: o paciente com depressão pode se permitir tomar café, dentro


do limite de três a quatro xícaras por dia, contanto que não seja junto dos
medicamentos receitados pelo psiquiatra.

AÇÚCAR DEMERARA E MEL ENGORDAM


MENOS DO QUE AÇÚCAR REFINADO
É preciso fazer uma distinção. Para doses iguais, essa a rmação está correta
para o mel, o qual é uma solução densa de vários açúcares simples
(sobretudo de frutose e glicose, e de pouquíssima sacarose), os quais
representam cerca de 80% do peso do mel, e contém cerca de 18% de água,
fornecendo, assim, menos calorias do que o açúcar (300 calorias a cada 100
g contra 400 do açúcar). Além disso, é preciso lembrar que o mel tem um
poder adoçante levemente superior ao do açúcar re nado (sacarose),
portanto, em teoria, quantidades menores (mas bem pouco menores...)
podem ser usadas para obter o mesmo resultado. Ressaltamos que em uma
colher de sopa (rasa) cabem de 20 g a 30 g de mel e 10 g ou 15 g de
açúcar, enquanto uma colher de café (rasa) contém 5 g de açúcar e 10 g de
mel.

É preciso acrescentar também que o mel goza de outras características


favoráveis, como a presença de cerca de 40 mg de polifenóis com ação
antioxidante em cada 100 g. Indiscutivelmente é um ótimo produto, ainda
mais com o prestígio de suas características de alimento “natural” e seu
encanto como o provável primeiro alimento doce a ser descoberto e
utilizado pelo homem desde seus primórdios. O aroma e o sabor do mel
também são particularmente atraentes e podem ser diferentes de acordo
com a origem botânica, ou seja, com o tipo de néctar oral coletado pelas
abelhas: já foram reconhecidos cerca de trezentos tipos diferentes a julgar
pelo sabor, pelo aroma e até pela cor.

Dito isso, também observamos, porém, que o mel muitas vezes é coroado
com uma aura “salutar” muito enfática acerca de seus efeitos anti-
in amatórios e antimicrobianos, que no entanto não foram comprovados,
além de a rmações exageradas sobre outras supostas vantagens nutritivas.
Na verdade, o mel contém apenas traços de vitaminas, sais minerais e ácidos
orgânicos, em quantidades tão reduzidas que sua contribuição para a
ingestão total de princípios nutritivos é praticamente insigni cante: para
exempli car, se é verdade, como às vezes se a rma, que no mel também
encontramos cálcio, é igualmente verdade que, deixando de lado o problema
da biodisponibilidade, um simples cálculo revelaria que para fornecer a
mesma quantidade de cálcio contida em uma caneca de leite seriam
necessárias cerca de trezentas colheres de mel...

Já quanto ao açúcar “escuro”, a suposição de que ele engorda menos que o


açúcar re nado é infundada. Vale esclarecer que o açúcar é oferecido no
mercado em três variedades: o açúcar re nado, obtido da beterraba ou da
cana-de-açúcar, que de fato é re nado até a obtenção de cristais de cor
branca; o açúcar de cana demerara, cuja cor escura se deve a um estado de
re no incompleto que permite a permanência de pequenas quantidades de
resíduos vegetais (melaço) na superfície dos cristais – o qual é responsável
pela diferença na cor e no sabor, mas sem nenhum signi cado nutricional; e
o açúcar de cana mascavo (quase nunca presente nos balcões dos cafés), no
qual permanecem pequenas quantidades de bras e sais minerais, e que de
fato tem valor calórico levemente inferior, mas também apresenta um gosto
peculiar que o torna menos apreciado e, portanto, que limita muito sua
difusão.

Todos esses tipos de açúcar são praticamente compostos apenas por


sacarose, um dissacarídeo formado pela união de uma molécula de glicose
com uma de frutose. O açúcar demerara tem, portanto, características
nutricionais e valor calórico idênticos aos do açúcar re nado, além de ser
menos solúvel, o que pode efetivamente levar uma parte dele a se depositar
no fundo da xícara, e portanto não ser ingerida.
Optar por um ou pelo outro, de nitivamente, é apenas uma questão de
gosto, e a ideia de que o açúcar demerara apresente uma tendência menor
de causar o aumento de peso é inconsistente.

Uma pequena digressão nal: ao falar de açúcares simples, é preciso ressaltar


que, assim como está certo dizer que não se deve demonizá-los, também é
indispensável lembrar que seu consumo total deve car dentro dos 15% das
calorias diárias (segundo a última revisão dos LARN),[9] incluindo no
cálculo também os açúcares contidos em alimentos fundamentais, como
frutas, hortaliças e leite.

Por sua vez, a Organização Mundial da Saúde (OMS) chega a recomendar


que não se supere o nível de 10% das calorias diárias em açúcares simples
presentes nos alimentos, nas bebidas, no mel, nos sucos de fruta e
concentrados, porém excluindo dessa conta os açúcares presentes no leite,
em frutas frescas e hortaliças, para os quais não haveria evidências de efeitos
adversos. Na realidade, o verdadeiro objetivo da OMS é promover uma
redução do consumo de açúcares na forma de bebidas e guloseimas (uma
latinha de qualquer bebida açucarada pode conter até 40 g de açúcares
simples, para não falar dos açúcares escondidos em produtos acima de
qualquer suspeita e amplamente consumidos: uma colherzinha de ketchup
contém cerca de 4 g, por exemplo), os principais suspeitos de provocar,
sobretudo em crianças, a transposição dos limites aconselhados pela
prudência.

Não existe nenhuma prova cientí ca válida de que o uso prudente e


moderado dos açúcares simples, inclusive do açúcar comum (sacarose),
facilite o surgimento de tumores ou de doenças metabólicas como o
diabetes, a obesidade, a aterosclerose (excetuando a cárie dos dentes, que, no
entanto, é fácil de se prevenir com uma correta higiene bucal). Os riscos
derivam somente dos excessos, e de fato, nenhuma autoridade cientí ca do
mundo aconselha ninguém a excluí-los totalmente da dieta, apenas a limitar
o seu consumo. Aliás, os próprios LARN lembram que “um teor total
superior a 25% da energia da dieta pode ter efeitos adversos sobre a saúde”.

Deve-se acrescentar que, sob esse ponto de vista, junto da quantidade de


açúcares simples, tem importância também a sua qualidade: esses são dois
fatores que determinam a “carga glicêmica” total de uma refeição (ou de um
alimento), o que corresponde ao seu real efeito na resposta glicêmica, isto é,
nos níveis pós-prandiais de glicose no sangue.
[7] No Brasil, em geral também são utilizados de 80 g a 100 g de pó de café para cada litro de água.

(N. E.)

[8] No Brasil, as xícaras de espresso costumam conter, em média, de 30 ml a 50 ml. (N. E.)

[9] Livelli di Assunzione di Riferimento di Nutrienti ed energia per la popolazione italiana: trata-se de um

documento técnico utilizado como referência para nutricionistas na Itália. (N. E.)
3 ALMOÇO E JANTAR

COMER MACARRÃO À NOITE ENGORDA


Um típico exemplo dos muitos mitos alimentares “aumentados” pelas
notícias que circulam sem controle na internet é este que defende a
proibição de consumir “carboidratos” (ou seja, segundo a crença comum,
pão, macarrão, pizza, etc.) à noite, ou, indo mais longe ainda, após certo
horário da tarde. E o melhor é que as várias correntes de pensamento que
sustentam essa teoria nem mesmo estão de acordo acerca do horário em que
deveria soar tal “toque de recolher”: há quem diga genericamente “à tarde” e
há quem se aventure a determinar a hora exata em que a proibição passa a
valer, como das 14 horas em diante, ou após as 18 horas, e por aí vai,
fantasia afora.

Trata-se, obviamente, de uma proibição tão criativa quanto sem fundamento.


Ao contrariá-la, é interessante aproveitar a oportunidade de prestar mais
atenção à refeição vespertina. Isso em homenagem à hipótese (na onda da
“cronobiologia”, que foi honrada com o Prêmio Nobel de Medicina em
2017) de que os ritmos circadianos – o nosso “relógio biológico” – in uem
também no nosso metabolismo e na utilização dos nutrientes absorvidos na
dieta, isto é, no modo como utilizamos ou armazenamos as calorias
alimentares (calorias de qualquer origem, que que bem claro) como
reserva. Segundo essa hipótese, a mesma quantidade de energia terá efeitos
diferentes no metabolismo – e, portanto, também no nosso peso – se for
absorvida nas refeições da manhã ou nos jantares.
Trata-se de hipóteses sobre as quais muito trabalho está sendo feito e que
começaram a receber algumas con rmações tanto em estudos com animais
de laboratório quanto em seres humanos. Na prática, parece que indivíduos
(com a mesma alimentação e atividade física) que consomem a maior parte
das calorias de sua dieta na primeira parte do dia conseguem controlar
melhor tanto o próprio peso quanto a gordura do corpo em comparação
com aqueles que comem mais no período noturno, ou mesmo na segunda
parte do dia.

De qualquer forma, é importante ressaltar ainda que essas hipóteses e esses


resultados dizem respeito à quantidade e à qualidade da alimentação como
um todo, e estão bem longe de sugerir que, como fantasiam alguns, depois
da refeição noturna somente as calorias do macarrão e da pizza se
transformariam implacavelmente em tecido adiposo, ao passo que, no
sentido contrário, o consumo de alimentos proteicos obrigaria o organismo
– não se sabe ao certo por quê – a queimar calorias e eliminar as gorduras
acumuladas.

Vale a pena repetir que os efeitos dos ritmos circadianos na massa corpórea
representam um tema interessante, mas sobre o qual ainda falta esclarecer
muita coisa, e o mesmo se aplica às causas que provocariam tais efeitos. Por
exemplo, é verdade que a capacidade de produzir insulina varia conforme o
momento do dia (é menor nas horas noturnas em comparação com as
diurnas), mas as in uências relativas sobre a massa corpórea e suas
variações ainda precisam ser comprovadas. Entre outras coisas, dar como
certo que haja uma di culdade relevante em produzir insulina na segunda
parte do dia levaria a deduzir que o índice glicêmico dos diferentes
alimentos se modi ca sensivelmente de acordo com a hora, e isso, pelo que
sabemos até agora, não está provado.

Voltando ao bordão “nada de macarrão à noite”, essa perseguição de sempre


com os “carboidratos” cheira a mais do mesmo e à vontade de seguir os
modismos do momento. Muito mais aceitável, em vez disso, é falar da
oportunidade de distribuir a alimentação ao longo do dia, aliviando a
refeição noturna em favor do desjejum e da refeição do meio-dia, com
impacto favorável em vários parâmetros, entre os quais também está o da
glicemia, além da massa corpórea. Os estudos que se multiplicam sobre esse
tema examinam as relações entre a nossa maneira de comer e as
progressivas variações, ao longo do dia, do metabolismo basal, da produção
de hormônios e do consumo de energia. Sabemos que a produção, por parte
do nosso organismo, de alguns hormônios dedicados de maneira particular
ao consumo energético e de outros hormônios que interferem na utilização
dos açúcares parece ser mais e ciente na primeira parte do dia. Se tudo isso
se traduz na sugestão de limitar o teor calórico do jantar a 30% das
necessidades diárias (e de passar para 20% o do desjejum e 40% o do
almoço, mais um ou dois lanches), no fundo estamos falando de um
discurso aceitável de distribuição ponderada, no qual existe apenas o
conceito de moderação, o que é bem diferente da ideia de exclusões
injusti cadas. En m, sugerir uma refeição noturna de teor energético
reduzido signi ca aconselhar o uso limitado de todos os tipos de alimentos
e de qualquer prato de alto conteúdo calórico, e não, certamente, pôr no
banco dos réus somente os costumeiros “carboidratos”.

Por outro lado, em pleno século XXI, não faz nenhum sentido insistir em
dizer ou escrever, como alguns já zeram, que “cereais e seus derivados,
legumes e batatas devem ser comidos até as 15 horas, enquanto carnes,
peixes, ovos e laticínios devem compor a refeição noturna” (negligenciando,
entre outras coisas, o ótimo teor de proteínas das leguminosas), sem
apresentar nenhum respaldo cientí co válido para isso. E o mesmo pode ser
dito da a rmação: “frutas devem ser comidas até as 18 horas”, ou seja, com
a misteriosa concessão de três horas adicionais e ignorando o detalhe de
que, em média, as frutas contêm mais açúcares simples do que os legumes...

A conclusão é que não existe nenhum “toque de recolher” especí co para o


macarrão e que não há motivo válido para não consumir também produtos
ricos em carboidratos na refeição noturna. Os novos dados que estão
surgindo devem ser acompanhados com interesse, mas o que conta mais
para engordar ou emagrecer ainda é o tamanho e o valor calórico das
porções que ingerimos, bem como a quantidade total de calorias que
absorvemos durante o dia todo comparada à quantidade que gastamos
(especialmente com atividade física).

Uma última observação: o macarrão – sem condimentos demais – é digerido


muito mais fácil e mais rapidamente do que a carne; portanto, a sua inclusão
na refeição noturna facilita a digestão e, por conseguinte, favorece também a
qualidade do sono. Ao contrário, cou demonstrado que consumir alimentos
ricos em gorduras na refeição noturna piora notavelmente o repouso à noite
e aumenta consideravelmente a probabilidade do surgimento da apneia
noturna, com aumento da sonolência diurna e risco de hipertensão, infarto e
acidente vascular cerebral (AVC).

Essa também é a opinião da famosa Mayo Clinic de Rochester (famosíssima


organização americana sem ns lucrativos empenhada na prática clínica, na
educação e na pesquisa médica, cuja autoridade no campo da nutrição é
universalmente reconhecida), inserindo o caso do macarrão em uma breve
lista de “dez mitos alimentares que devem ser desmentidos”. Segundo eles:
“Não deveríamos comer nada depois das 19 horas, nem um bago de uva? Se
fazer lanchinhos pode aumentar o peso ou impedir sua perda, a culpa não é
da hora, mas do quanto se está comendo. É muito comum escolher
guloseimas gordurosas e calóricas como lanchinho antes de ir para a cama e
é isso que muitas vezes leva a comer distraidamente e a consumir uma
quantidade excessiva de calorias”.

A CARNE DE PORCO É PESADA E NÃO DEVE


SER CONSUMIDA NO VERÃO
É uma velha história, que fazia sentido há uns quarenta anos, quando os
porcos de corte eram muito diferentes dos atuais, porque se permitia que
aumentassem de peso bem além do momento em que completavam seu
crescimento natural. Isso fazia com que os animais acabassem aumentando o
próprio porte exclusivamente por depositar mais gordura por todo o corpo,
um fenômeno que podia ser evidenciado pelo acúmulo de até 8 ou 10
centímetros de tecido adiposo sob o couro. Isso sem falar do inevitável e
paralelo aumento da gordura intersticial presente nos cortes de carne
destinados ao consumo humano.

Nesse contexto, a advertência para não consumir carne de porco, bem como
outros produtos particularmente gordurosos, nos meses quentes do ano
tinha certa lógica. Mas tudo isso já não existe mais. O que torna “pesado”
um produto é sobretudo a quantidade total de gorduras presentes, e hoje as
novas técnicas de criação, o uso de rações modi cadas e controladas e a
escolha das raças (animais de pequeno porte) levaram a uma notável
redução da presença de gordura nas carnes de porco e, portanto, também
nos embutidos. Uma mudança que obrigou os especialistas em química dos
alimentos, há uns trinta anos, a atualizar sensivelmente os dados relativos a
esse produto que guravam nas tabelas o ciais anteriores de composição
dos alimentos mais comumente consumidos.

Hoje, esse novo “porco magro” (proveniente de criações certi cadas e


vendido em lojas especializadas), que aliás é abatido muito precocemente
em comparação com seu antepassado dos anos 1950, tem cerca de 2
centímetros de gordura subcutânea apenas, e o seu lé, que pode ser
consumido em qualquer estação do ano, contém as mesmas quantidades
reduzidas de gordura que caracterizam outras carnes que sempre
desfrutaram da fama de serem mais magras. Além disso, vale lembrar que a
carne suína apresenta mais dois aspectos vantajosos: é particularmente
saborosa e suas gorduras contêm mais ácido oleico (monoinsaturado) e
menos ácidos graxos saturados em comparação com a maior parte das
outras gorduras animais.

PEIXE FAZ BEM PARA A MEMÓRIA


PORQUE CONTÉM FÓSFORO
Antes de mais nada, vale esclarecer que não é verdade que o peixe é
particularmente rico em fósforo se comparado, por exemplo, à carne
vermelha: em geral, encontramos de 130 mg a 260 mg de fósforo em 100 g
de peixe, contra 150 mg a 230 mg na carne fresca. Mas não é só isso: são
muitos os alimentos que contêm quantidades de fósforo notavelmente mais
elevadas, como os legumes, os queijos, as castanhas e os crustáceos, levando
em conta que a biodisponibilidade do fósforo é muito superior nos
alimentos de origem animal se comparada aos de origem vegetal.

Também é preciso lembrar outras coisas. É verdade que o fósforo está


presente em uma quantidade notável no tecido nervoso – e, portanto,
também no cérebro – sob a forma de fosfolipídios, mas o nosso corpo
possui, de qualquer forma, uma enorme reserva de fósforo que pode utilizar
em caso de necessidade. Além disso, o fósforo é amplamente comum nos
alimentos, e o organismo humano tem ótima capacidade de retê-lo e utilizá-
lo, o que leva a entender que uma carência de fósforo causada por
insu ciente teor alimentar é praticamente impossível. En m, ministrar
quantidades adicionais de fósforo na ilusória convicção de que isso possa
melhorar a memória ou as faculdades mentais é totalmente inútil, já que um
aumento do teor de fósforo (seja ele dietético, seja farmacológico) é seguido
por um rápido incremento da sua eliminação por via renal.

Mas, para encerrar qualquer discussão sobre o tema, é preciso reiterar


sobretudo que não existe nenhuma relação entre a absorção desse mineral e
a melhoria da capacidade mnemônica.

Voltando ao peixe, uma eventual relação com as capacidades cognitivas


poderia ser creditada à sua riqueza em alguns ácidos graxos poli-insaturados
necessários para o desenvolvimento do sistema nervoso e fundamentais para
a funcionalidade encefálica durante toda a vida. Somos obrigados a obter
esses ácidos graxos pré-formados nos alimentos, já que a nossa capacidade
de sintetizá-los autonomamente é muito limitada. Graves de ciências desses
ácidos graxos nas primeiras fases da vida aparentemente podem retardar o
desenvolvimento do cérebro e das capacidades cognitivas. Além disso, o
peixe contém também outros nutrientes importantes para a função cerebral,
como o iodo (muito raro nos nossos alimentos comuns: peixes e moluscos
são as fontes alimentares mais relevantes), o ferro, o selênio e as vitaminas,
em especial a vitamina D.

Como está evidente, porém, isso é um campo totalmente diferente, e nem


esse tipo de argumentação nos impede de considerar arbitrária qualquer
relação entre o consumo de peixe e a memória.

OSTRAS SÃO AFRODISÍACAS


A lenda dos alimentos afrodisíacos – ou seja, que podem estimular o desejo
sexual – nos persegue há séculos, embora nunca tenha sido identi cada, em
alimento algum, nenhuma substância capaz de provocar tal efeito.

Quais os alimentos que de vez em quando são trazidos à tona? Em primeiro


lugar estão as ostras, por causa de uma “lenda” forjada por alguns
excêntricos estudiosos baseada no bom conteúdo de zinco desses moluscos
bivalves. Segundo eles, a falta de zinco levaria a fatores como gônadas de
menores proporções e atrasos no amadurecimento sexual, falta de
testosterona, produção reduzida de espermatozoides e até impotência. No
entanto, tudo isso foi constatado apenas em zonas rurais limitadas, após
uma dieta praticamente desprovida de proteínas animais e na presença de
uma síndrome de má absorção: nesses casos extremos, a carência de zinco se
manifestou em atrasos do crescimento, até com casos de nanismo
hipogonádico, hepatomegalia e anemia.
Trata-se, porém, de casos extremos. Em geral, nunca cou provada nenhuma
atividade de “revigoramento” sexual em seguida à suplementação de zinco,
muito menos após o consumo de porções generosas de ostras, até porque o
zinco está normalmente presente na nossa alimentação (em carnes, ovos,
peixe, leite e cereais) e desempenha várias ações no nosso organismo (no
metabolismo dos hormônios da tireoide, no amadurecimento de células do
sistema imunológico, etc.) que, no entanto, pouco têm a ver com o desejo
sexual.

Algumas pessoas acreditam que a indevida fama das ostras teria nascido,
seguindo a antiga “doutrina dos signos”, com base na semelhança entre o
formato das ostras e o dos testículos humanos. Uma hipótese como tantas
outras...

Discursos semelhantes podem ser feitos também sobre outros ingredientes


muitas vezes tidos como afrodisíacos. A pimenta é um deles. Contém
capsaicina, um princípio ativo que melhora a microcirculação e estimula a
produção de adrenalina por parte das glândulas suprarrenais, provocando
sensações de bem-estar, mas sem nenhuma relação comprovada com a
atividade sexual.

Foram mencionadas também algumas frutas tropicais, as trufas (com base


na hipótese de que contivessem um hormônio masculino), o cacau e o café
(por seus efeitos positivos sobre o humor), o vinho (talvez por seu efeito de
relaxamento dos freios da inibição: na verdade, o efeito depressivo do
sistema nervoso central exercido pelo álcool deveria agir de modo contrário
ao desejado...), e por aí vai.
Substancialmente, portanto, podemos dizer que alimentos realmente
afrodisíacos, ao que parece, não existem. O possível efeito positivo sobre o
desejo sexual parece ligado, mais do que à composição dos alimentos, à sua
maior ou menor capacidade de evocar e facilitar situações emocionalmente
peculiares, adequadas a criar o estado de ânimo propício e o clima certo
para o surgimento do desejo. Um efeito indireto, en m. Mais do que isso,
realmente não parece haver nada de concreto.

OS OVOS COM GEMA LARANJA E AQUELES


COM CASCA BRANCA SÃO OS MAIS
NUTRITIVOS
Trata-se de duas a rmações substancialmente infundadas. A casca, que é
formada principalmente por carbonato de cálcio, serve apenas para proteger
o conteúdo do ovo – sua cor não in ui em nada no conteúdo nem,
portanto, nas propriedades nutricionais do ovo em si. A coloração é ligada a
fatores genéticos e depende unicamente da raça das galinhas.

Já a cor da gema (amarelo pálido, amarelo-ouro, vermelho-alaranjado e


assim por diante) depende exclusivamente do que as galinhas comem, ou
seja, do tipo e da quantidade de certas substâncias pigmentadoras, chamadas
de xanto las, que pertencem à família dos carotenoides e que existem nas
rações oferecidas às poedeiras. Além de serem corantes naturais, as
xanto las são também antioxidantes, úteis para a proteção das vitaminas e
das gorduras presentes na gema. A composição das rações, entre outras
coisas, varia também de acordo com a destinação prevista para os ovos, ou
seja, se servirão para a alimentação humana ou para produzir pintinhos.
A maior parte dos pigmentos que determinam a coloração da gema se
encontra em vegetais, em particular na alfafa: trata-se de betacaroteno e de
outros carotenoides amarelos que também são precursores da vitamina A
(no sentido de que se transformam nessa vitamina no nosso organismo) e
cuja cor amarela é mascarada, nas plantas, pelo verde da cloro la. Já no
milho, além do betacaroteno que dá ao cereal sua cor alaranjada e que passa
para o ovo, intensi cando sua cor, encontram-se outras xanto las, como a
luteína e a zeaxantina, as quais conferem uma distinta coloração amarela,
mas não são transformadas em vitamina, portanto não aumentam
propriamente o valor nutritivo do ovo; porém, elas têm o mérito de serem
poderosos antioxidantes e terem a tendência de se concentrar
preferencialmente na retina, protegendo-a da degeneração macular
relacionada à idade (DMRI), que, no Ocidente, é a principal causa de
cegueira.

Como já dissemos, as xanto las determinam a cor da gema, indo de um


amarelo pálido a um forte laranja. Além disso, para obter um tom mais
escuro, às vezes são acrescentados à ração pigmentos normalmente ausentes
nas rações naturais, ou seja, corantes arti ciais, entre os legalmente aceitos, é
claro. Trata-se sobretudo de xanto las vermelhas com nomes complicados
(capsantina, presente nos extratos da páprica; cantaxantina, presente em
algumas algas e bactérias, etc.). O motivo de acrescentá-los é a preferência
que o consumidor costuma ter por gemas de cor mais intensa, uma
preferência ligada à recordação dos ovos de galinhas alimentadas com milho
amarelo, rico em betacaroteno, e de épocas nas quais a cor amarelo pálido
da gema indicava um mau estado de saúde das poedeiras.
En m, as pessoas dão importância demais à cor da gema: nutricionalmente,
os ovos com gema amarela clara e os com gema vermelho-alaranjada são
equivalentes. Como já frisamos, a única verdadeira diferença consiste na
coloração – que, em decorrência disso, é passada à massa folhada que
fazemos em casa, por exemplo...

ALIMENTOS SUPERCONGELADOS SÃO


MAIS POBRES EM COMPARAÇÃO COM OS
FRESCOS
Não é verdade. Entre todos os métodos de conservação de alimentos criados
pelo homem, o supercongelamento é talvez o melhor, ou seja, aquele que
mais respeita e preserva a qualidade e o valor nutritivo dos alimentos. E isso
sem a adição de nenhuma substância conservante, simplesmente por meio
da ação de temperaturas muito baixas (de pelo menos -18 °C) que, no
processo de supercongelamento, são atingidas também nas partes internas
(no “centro”) do produto em um tempo extremamente curto, muito mais
rápido do que no congelamento simples.

Tais temperaturas provocam a rápida transformação da maior parte da água


presente no alimento em gelo. Quando isso acontece, os micro-organismos
presentes são em parte destruídos ou de qualquer forma impedidos de
desenvolver suas funções, e portanto de alterar o alimento em si. O aspecto
da rapidez com a qual são atingidas as temperaturas desejadas também
permite preservar da melhor forma a aparência, a consistência, o sabor e a
estrutura do produto, ou seja, aquelas que são de nidas como suas
“características organolépticas”. Isso porque no interior do produto formam-
se cristais de gelo muito pequenos (ao contrário do que acontece no
congelamento simples), os quais, exatamente por suas dimensões reduzidas,
não dani cam as paredes celulares que formam o tecido do alimento. Essa
peculiaridade também contribui para preservar o valor do produto nal,
pois impede que no momento do descongelamento aconteça a liberação de
sucos celulares que contêm proteínas, açúcares, vitaminas solúveis e sais
minerais, um fenômeno que provocaria notáveis perdas do seu valor
nutritivo.

Além disso, se o tratamento for aplicado no tempo adequado (por exemplo,


no caso do peixe, deve ser feito no próprio pesqueiro que o capturou; ou, no
caso dos legumes frescos, no máximo três horas após a colheita), é possível
obter produtos cujo valor nutritivo, em certos casos, chega a ser até superior
àquele do mesmo produto de nido como “fresco”, mas que pode ter cado
muitas horas à temperatura ambiente antes de alcançar o ponto de venda ou
a casa do consumidor nal. Tudo isso contanto que a conservação do
produto supercongelado aconteça, sem nenhuma interrupção, em
temperaturas iguais ou inferiores a -18 °C até o momento do consumo: a
chamada “cadeia de distribuição refrigerada”. Portanto, é importante que o
comprador faça uso de bolsas ou caixas para congelados no transporte e que
tenha o cuidado de guardar o produto no freezer caseiro o quanto antes. A
-20 °C, um produto pode ser armazenado por até noventa dias; a -25 °C, até
180 dias, e a -30 °C por mais de 180 dias, com reduções de valores
nutricionais muito pequenas, notadas sobretudo nas vitaminas C e B1 e no
ferro, que se tornam signi cativas somente depois de períodos de
armazenamento anormalmente longos, por volta de dez a doze meses.

Quanto ao difundido temor acerca da presença de conservantes, os produtos


supercongelados estão entre as conservas que menos precisam deles. Por
exemplo, não há sinal deles nos legumes supercongelados nem na maior
parte dos lés de peixe (conforme os rótulos indicam). Outros produtos
(crustáceos, por exemplo) podem contê-los, mas trata-se sempre de
conservantes autorizados, inócuos e discriminados nos rótulos – por
exemplo, polifosfatos estabilizantes ou então antioxidantes. Mais rara ainda
é a presença, indicada com especial destaque nos rótulos, de bissul tos ou
metabissul tos, que podem provocar reações alérgicas: para os produtos da
pesca, podem ser utilizados em crustáceos e em preparados mistos para
risoto ou sopa.

Também é preciso lembrar que o supercongelamento provoca leves


modi cações em alguns produtos que tornam algumas vitaminas e sais
minerais mais biodisponíveis e induzem também a uma maior
digestibilidade dos carboidratos e das proteínas presentes.

Como se vê, é injusti cada a opinião crítica que muitas pessoas têm acerca
dos produtos supercongelados, talvez por estarem apaixonadas demais pelo
“natural a qualquer preço”.

A MANTEIGA TEM MAIS GORDURA QUE O


ÓLEO
E, portanto, conteria também mais calorias, considerando a mesma
quantidade. De nitivamente não é verdade; aliás, o que ocorre é o contrário
disso. A manteiga contém em média 83,5% de gorduras, contra 100% de
qualquer tipo de óleo, já que em sua composição entram também cerca de
17% de água, contra 0% no óleo. Portanto, 100 g de manteiga contêm cerca
de 760 kcal, contra as 900 kcal de qualquer tipo de óleo (sem nenhuma
diferença entre o óleo cru e o cozido, ao contrário do que muita gente
pensa).

Em uma comparação do ponto de vista nutricional entre a manteiga e o


azeite de oliva, o que foi descrito no parágrafo anterior é, na prática, o
único aspecto positivo em favor da primeira. E na verdade trata-se de um
aspecto de pouca relevância: na avaliação de uma gordura para a
alimentação humana, de fato o ponto fundamental a ser considerado é a
qualidade dos ácidos graxos que compõem aquele produto.

Pois bem, por esse aspecto, o azeite de oliva, em particular o extravirgem,


não teme comparações no tocante ao tipo de ácidos graxos presentes e ao
seu equilíbrio conjunto. Vejamos os números: 100 g de azeite de oliva
extravirgem contêm cerca de 83 g de ácidos graxos insaturados (os mais
saudáveis, também porque tendem a reduzir o nível de colesterol no
sangue), dos quais a maior parte (75 g) são ácido oleico (o melhor, tanto
por ser monoinsaturado quanto porque, além de reduzir o colesterol “ruim”
no sangue, não modi ca ou até faz aumentar o “bom”), e apenas 16 g de
ácidos graxos saturados – aqueles que, em geral, tendem a aumentar os
níveis de colesterol no sangue ainda mais até do que o teor alimentar do
próprio colesterol. Além disso, o azeite não contém naturalmente nenhum
colesterol.

Quanto à manteiga, os números correspondentes são de nitivamente menos


favoráveis: 100 g do produto fornecem apenas 26,5 g de ácidos graxos
insaturados (incluindo 21 g de ácido oleico) e 49 g de ácidos graxos
saturados, acompanhados de 250 mg de colesterol (contra zero do azeite de
oliva). As diferenças são bem evidentes e depõem de modo unânime em
favor do azeite de oliva, e também, de forma menos acentuada, de vários
outros óleos vegetais.

Mas as vantagens do azeite extravirgem não são apenas as citadas até aqui,
pois esse óleo exibe ainda muitas virtudes nutritivas e salutares que a
manteiga não tem, ou tem de forma bem reduzida: ele é rico em vitamina E,
contém mais de cem tipos de substâncias antioxidantes e saborizantes, além
de que é facilmente digerido e capaz de melhorar a digestibilidade do prato
como um todo, pois estimula a secreção de bílis e de várias enzimas
digestivas. E não é só isso: várias pesquisas já veri caram há anos que o uso
habitual do azeite de oliva extravirgem exerce também uma série de outras
ações positivas, por exemplo, sobre a cútis, o crescimento dos ossos, o
amadurecimento do sistema nervoso central e outras mais.

Isso não signi ca de forma alguma que a manteiga deva ser demonizada ou
excluída a priori da nossa mesa e da nossa cozinha: as indicações são apenas
de utilizá-la esporadicamente e sobretudo em quantidades moderadas – as
diretrizes alimentares italianas sugerem uma porção-padrão de cerca de 10
g, ou seja, o equivalente a uma colher de café cheia.[10] Entre outras coisas,
é preciso lembrar também que a manteiga, além de ser uma boa fonte de
vitamina A, é razoavelmente fácil de digerir e bem tolerável também porque
boa parte dos seus ácidos graxos saturados é de cadeia curta, ou seja, mais
fáceis de serem atacados pelas nossas enzimas digestivas.

O ÓLEO DE GRÃOS É MAIS LEVE QUE O


AZEITE DE OLIVA E CONTÉM MENOS
CALORIAS
Essa convicção bastante absurda sobrevive, estranhamente, até no terceiro
milênio e mesmo entre pessoas com boa cultura geral. Ela é a enésima
demonstração da força de persuasão que podem ter os slogans publicitários,
alguns dos quais sugeriram essa ideia durante décadas, ainda que sem
declará-la abertamente, claro, mas passando-a habilmente como uma
mensagem subliminar...

É uma ideia sem fundamento algum, nem lógico, nem químico. Todos os
óleos, de fato, são constituídos exclusivamente por 100% de gorduras (e não
poderia ser de outra forma) e fornecem a mesma quantidade de calorias –
vale dizer, 9 kcal por grama –, independentemente da sua origem e do seu
aspecto mais ou menos transparente ou denso (é inegável, por outro lado,
que esse último detalhe pode efetivamente induzir ao erro).

Mas o valor energético é só um dos pontos a serem considerados. De fato,


se no teor energético os óleos se equivalem, é indiscutível que o azeite de
oliva, e em particular o extravirgem, é absolutamente o melhor óleo para a
alimentação humana, por muitos motivos: por exemplo, é o único obtido
por simples pressão, sem processos químicos; é o mais equilibrado em sua
composição de ácidos graxos e, como já mencionamos, contém uma centena
de substâncias de ação aromatizante e saborizante (e, portanto, pode ser
usado em quantidades moderadas sem prejuízo do sabor), além de muitos
compostos fenólicos de ação antioxidante; melhora a digestão dos alimentos
gordurosos; e é uma ótima fonte de ácido graxo monoinsaturado – o ácido
oleico – que, vale lembrar mais uma vez, reduz os níveis sanguíneos do
colesterol LDL (o colesterol “ruim”) ao mesmo tempo que aumenta os do
colesterol HDL (o “bom”).
Alguns óleos de grãos sem dúvida também são ótimos para a nossa
alimentação em virtude do seu teor de vitaminas A e E, por exemplo, e por
sua riqueza em ácidos graxos poli-insaturados “essenciais” (ou seja, que
precisam necessariamente ser obtidos dos alimentos, pois nosso organismo
não consegue sintetizá-los), que são preciosos tanto como precursores de
moléculas com elevada atividade biológica quanto como componentes das
paredes celulares.

Mas certamente não é por acaso que o azeite de oliva extravirgem desfruta
de uma posição de absoluto prestígio em todo o mundo – um prestígio
plenamente justi cado por suas características e que com certeza não pode
ser maculado por lendas urbanas acerca de um suposto teor energético mais
alto que o dos outros óleos.

O GELATO É UM ALIMENTO COMPLETO E


PODE SUBSTITUIR UMA REFEIÇÃO
Por de nição, o alimento “completo” – vale dizer, um alimento que
contenha todas as substâncias nutritivas de que precisamos nas quantidades
certas – não existe, nem como produto natural, nem como arti cial.
Portanto, é evidente que tampouco o gelato[11] pode aspirar ao mérito
dessa lisonjeira de nição.

O gelato não é um alimento completo. No entanto, é certo considerá-lo um


alimento. De fato, seu valor nutricional não é negligenciável, embora varie
muito de acordo com os ingredientes usados: leite e creme de leite, ovos,
açúcar, cacau, café, frutas, etc. Encontramos, portanto, proteínas do leite e
dos ovos, gorduras de fácil utilização, açúcares simples, algumas vitaminas
(A, B2 e E, se ele levar chocolate) e alguns sais minerais (cálcio e fósforo).

O valor calórico varia entre cerca de 220 kcal (por 100 g) no gelato com
leite e cerca de 160 kcal para os de frutas, levando em conta também que,
por causa da tecnologia utilizada, os industrializados contêm mais ar do que
os artesanais (de 40% a 50% contra 30%). Na verdade, um gelato de certo
tamanho e complexidade pode chegar facilmente a 400 kcal ou 500 kcal, e,
portanto, “substituir” uma refeição, mas somente do ponto de vista do teor
de energia – certamente não pode substituí-la do ponto de vista do valor
nutricional (e isso também deve ser feito apenas de maneira esporádica),
nem do ponto de vista da saciedade: uma refeição limitada apenas ao gelato
será assimilada e digerida bem rapidamente, resultando na volta da sensação
de fome em um intervalo de poucas horas.

A conversa é outra com relação a certos doces – sobretudo industrializados


– à base de gelato e sorvete, mas que na verdade são produtos complexos
que, além do sorvete propriamente dito, contêm também casquinhas,
biscoitos, castanhas picadas, chocolate, chantili, etc. Seu valor calórico
aumenta, e cresce também (ainda que de forma limitada) a capacidade de
saciar por um pouco mais de tempo.

En m, o lugar ideal do gelato é a hora do lanche, entre as refeições, ou


então como sobremesa após o almoço – uma sobremesa aconselhável porque
tem menos calorias que a maior parte dos clássicos alimentos doces. Nesse
caso, porém, é preciso ter o cuidado de sorvê-lo lentamente, deglutindo os
bocados quando já estiverem derretidos – assim não correremos o risco de
atrapalhar a digestão que já está em curso nem de provocar re exos
desfavoráveis na mobilidade intestinal. Consumido com esses cuidados, o
gelato chegará ao estômago a uma temperatura muito menos baixa do que a
de uma bebida gelada. Entenda-se que seu consumo deve ser previsto em
substituição a outros alimentos, e não somado a eles: o teor calórico do
gelato, portanto, deve ser incluído no cálculo geral diário.

Mas há também outras possíveis indicações para o alimento “gelato”: como


uma forma agradável de fazer quem toma pouco leite consumi-lo mais,
como alternativa válida para suplementar a alimentação em caso de falta de
apetite ou febre, como recurso para quem tem problemas de mastigação, etc.

Resumindo, uma boa pedida em todas as estações e também em regimes de


emagrecimento,[12] nos quais pode ser facilmente inserido, com frequência
e porções razoáveis, graças ao seu valor calórico não excessivo: a vantagem
está no fato de que sua “gostosura” é muito grati cante e permite uma
adesão mais tranquila às inevitáveis restrições típicas dos regimes
hipocalóricos.

FRUTAS DEVEM SER COMIDAS LONGE DAS


REFEIÇÕES
Muitíssimas pessoas estão totalmente convencidas disso. No entanto, uma
regra assim, válida para todos, não tem motivo para existir.

A verdade é que frutas frescas podem ser comidas a qualquer hora do dia,
sem contraindicações. O importante é comê-las, se possível, ao menos duas
ou três vezes ao dia, tanto no desjejum – ou como um lanche entre as
refeições – quanto antes das principais refeições, ou ainda ao seu nal. A
única exceção pode dizer respeito apenas a algumas pessoas que, por
sofrerem de dispepsia gástrica, ou seja, di culdades digestivas relacionadas
ao estômago, possam efetivamente perceber que sua digestão é mais lenta
depois que consomem frutas com o estômago já cheio. Para elas, valerá
mesmo assim a norma de não abrir mão das frutas, mas, sim, de adotá-las
como lanche em outros momentos do dia.

À parte esses casos particulares, é preciso dizer claramente que, para todas
as pessoas sadias, frutas frescas representam a melhor maneira de concluir
uma refeição. Inclusive porque consumi-las nesse momento apresenta várias
vantagens: as primeiras são que o costume bem mediterrâneo de concluir o
almoço e o jantar com o sabor geralmente doce de uma fruta, em vez de
uma sobremesa, ajuda a diminuir o teor calórico e a não abusar dos doces, e
além disso facilita a manutenção de uma melhor higiene bucal, já que a
mastigação de algumas frutas contribui para remover parte dos resíduos de
alimentos da arcada dentária. Outro motivo válido é que frutas no m das
refeições ajudam sensivelmente a atingir uma sensação mais duradoura de
saciedade.

Mas há, também, outras ótimas razões que tornam aconselhável o consumo
de frutas à mesa. Por exemplo, a notável melhora que o teor de vitamina C
de muitos tipos de frutas frescas produz na absorção do ferro contido nos
alimentos que fazem parte da mesma refeição: e bem se sabe como é difícil
satisfazer as necessidades desse mineral na nossa alimentação diária e como
é comum a carência de ferro, em especial nas mulheres jovens. Finalmente,
não esqueçamos que as frutas frescas, assim como as hortaliças, contêm
quantidades relevantes de micronutrientes de ação antioxidante, como
vitamina C e carotenoides, tocoferóis e vários compostos fenólicos, cuja
presença é revelada pela cor dos produtos hortifrúti. Portanto, consumir
frutas frescas (e também hortaliças) durante a refeição apresenta outro
importante lado positivo: assegurar que tais componentes bioativos estejam
presentes no estômago, e assim desempenhem a sua ação defensiva,
exatamente no momento em que são mais úteis, ou seja, ao mesmo tempo
que chegam outros alimentos contendo materiais altamente oxidáveis, aptos
a desencadear processos oxidantes nocivos ao nosso organismo.

Apesar de todas essas realidades incontestáveis, a falsa ideia de que frutas


frescas nunca devem ser comidas durante as refeições circula e, como
dizíamos, continua resistindo rme e forte. As razões citadas dizem respeito
a uma hipotética diminuição da velocidade do processo digestivo que seria
causada pelas próprias frutas frescas, chegando a provocar fermentações e
distúrbios digestivos – a rmações equivocadas que se baseiam em uma
generalização inaceitável do que podem ser as di culdades digestivas de uma
minoria para o universo total dos consumidores.

E a difusão “viral” dessa notícia falsa induziu, há poucos anos, a famosa


Mayo Clinic de Rochester (Estados Unidos) a se posicionar o cialmente,
preocupada com o fato de que muitos poderiam renunciar, sem saber bem
por que e sem motivo, a todas as vantagens já mencionadas. Ela o fez
mediante a publicação de um comunicado sobre o tema, que continha, entre
outras coisas, estas explicações: “Os argumentos relativos às di culdades
digestivas provenientes do consumo de frutas frescas em associação com
outros alimentos não são respaldados por nenhuma evidência cientí ca. Para
o nosso organismo, é absolutamente natural digerir vários alimentos ao
mesmo tempo, para depois absorver seus nutrientes. Nossas enzimas
digestivas trabalham muito bem simultaneamente, cada uma levando a cabo
sua tarefa bem de nida. Aliás, às vezes é até aconselhável comer frutas junto
de outros alimentos...”, para depois repetir algumas das indicações que já
citamos nas linhas anteriores.

Trata-se de uma intervenção com autoridade, por parte de uma instituição


que é a cúpula da ciência médica, e uma tomada de posição que esperamos
que possa contribuir para desmentir esse falatório e estimular os
consumidores a aproveitarem melhor o precioso patrimônio nutritivo e as
numerosas vantagens típicas das frutas.

PELO MENOS NAS FESTAS POSSO COMER


O QUE EU QUISER!
O conceito em si é até aceitável. O aspecto “hedonístico” e socializador da
mesa e da boa comida, assim como das bebidas alcoólicas e dos brindes, está
fora de discussão; aliás, representa um valor agregado de grande relevância.

Isso signi ca que ninguém sonha em censurar todos aqueles – e são a


grande maioria – que nos dias ou períodos de festa se comportam à mesa
diferentemente do costume, aproveitando a gastronomia festiva sem muitos
freios. A única sugestão que poderíamos dar a eles seria a de ter bom senso,
e, portanto, não exagerar na autoindulgência e nessa mentalidade
autoabsolvedora, que são típicas sobretudo dos períodos prolongados de
festa, como o nal de ano ou as férias. Uma mentalidade que pode nos levar
a exagerar de verdade, com possíveis problemas, por exemplo, de ordem
digestiva, ou no tocante ao risco de contrair “dívidas” que deverão ser pagas
nos meses seguintes no plano da massa corpórea, por exemplo.
En m, é mais do que justo desfrutar da boa mesa com parentes e amigos,
por ocasião das festas, dos aniversários e das comemorações de qualquer
natureza. No entanto, com uma só advertência – uma só, mas de grande
importância do ponto de vista médico: tudo o que dissemos anteriormente
vale quase que para qualquer um, mas com a única e fundamental exceção
daqueles que têm ou tiveram graves problemas de saúde, e que, portanto,
são encorajados a se conter e se cuidar constantemente, mesmo nas ocasiões
mais despreocupadas e alegres. De fato, não se pode jamais esquecer que,
para a maior parte dessas pessoas, o equilíbrio alcançado graças aos
tratamentos, às terapias médicas e a um estilo de vida mais prudente é
bastante delicado e pode ser rompido até mesmo por um único
comportamento alimentar demasiado fora dos limites da normalidade.

Em resumo, determinadas situações de risco derivadas de problemas de


saúde estão e continuam “à espreita”, mesmo nos dias festivos; portanto,
impõem comedimento e cautela mesmo nas circunstâncias mais
despreocupadas. Isso signi ca que, para dar alguns exemplos, diabéticos,
cardíacos (sobretudo os que se recuperam de um infarto recente) e
hipertensos; quem sofre de cálculos hepáticos ou biliares, pessoas
acometidas por gota ou úlcera gastroduodenal, entre outros, terão de
observar certa moderação mesmo em todas as festas e ocasiões que se
celebram sobretudo à mesa, com familiares e amigos, comportando-se com
muito mais atenção do que os outros comensais, tanto na escolha quanto
nas quantidades das porções.

De fato, a dura realidade é esta: a dietoterapia, tão útil para a saúde e para o
bem-estar dessas pessoas, não pode conceder tréguas festivas, a não ser
ocasionalmente, e mesmo assim com moderação.
[10] No Brasil, o Guia alimentar para a população brasileira (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2005) sugere

a ingestão de apenas uma porção de óleos ou gorduras por dia – no caso da manteiga, seria o

equivalente a ½ colher de sopa. (N. E.)

[11] Embora o gelato e o sorvete muitas vezes levem os mesmos ingredientes na composição (como

leite, açúcar, ovos, entre outros), existem algumas diferenças entre os dois, uma das quais é a

quantidade de gordura e de ar adicionada no processo de produção: em muitos casos, o gelato chega a

ter metade da gordura presente no sorvete, por isso sua consistência tende a ser mais leve. (N. E.)

[12] No caso dos regimes de emagrecimento, é recomendável consumir preferencialmente o gelato de

fruta e sempre em pequenas porções. (N. E.)


4 CRU E COZIDO

É MELHOR COMER APENAS ALIMENTOS


CRUS
É o que defendem com paixão os seguidores mais intransigentes de uma das
tantas modas alimentares modernas, o “crudismo” – os quais muitas vezes
são também veganos dogmáticos ou até “frutarianos”. Eles dizem isso
baseando-se nas a rmações de um círculo restrito de “gurus” (higienistas e
naturistas, não raramente também médicos) cujas posições fundamentalistas
e extremistas ao demonizar qualquer alimento cozido estão, porém,
totalmente na contramão do que as pesquisas e os conhecimentos cientí cos
já demonstraram e continuam a demonstrar.

Abordar a questão é importante, porque a escolha de comer


preferencialmente alimentos crus muitas vezes é promovida e instilada no
imaginário coletivo utilizando tanto insinuações com pouco fundamento
sobre sabe-se lá quais perigos e depauperações nutritivas ligados ao
cozimento dos alimentos, quanto exagerando além de qualquer limite
razoável as qualidades protetoras dos alimentos crus. E também porque o
“crudismo”, ainda que raramente vivido de forma integral, tornou-se hoje
uma moda que envolve muitas pessoas, especialmente os jovens.

Falemos disso, portanto, e possivelmente sem nenhum preconceito


ideológico. Isso signi ca relegar ao esquecimento as posições radicais e as
a rmações claramente exageradas e injusti cáveis. De fato, é inadmissível
ainda ler e ouvir frases do tipo “os alimentos cozidos estão mortos” ou “uma
dieta baseada sobretudo em alimentos crus reverte o processo degenerativo
do corpo, provocado pelas doenças de longa duração, e retarda o
envelhecimento”, ou ainda “nas frutas, as proteínas estão em toda parte e,
portanto, as frutas têm uma composição parecida com a do leite humano e
podem substituir a carne e o peixe”. São a rmações sem nenhuma base na
realidade e sem fundamento algum – seja ele racional, seja cientí co –, que
ultrajam, além da lógica, também os conhecimentos tanto da medicina
quanto da química...

Deixando de lado os absurdos e raciocinando com equilíbrio, as perguntas a


serem feitas são bastante simples: é certo ou errado comer alimentos crus? E
em que quantidade é bom fazê-lo? Agir assim pode fazer bem? Ou, ao
contrário, pode ser nocivo? Responder de maneira sensata é até fácil demais:
em uma dieta variada e equilibrada, há lugar tanto para alimentos crus
quanto para cozidos, levando em conta, porém, algumas advertências que
variam de acordo com as características dos alimentos de que estamos
falando.

Portanto, antes de mais nada, é preciso fazer uma distinção. As frutas e as


hortaliças são alimentos que se aconselha comer crus ou cozendo-os de
forma branda, ou seja, em temperaturas não muito elevadas, mas sobretudo
com tempos de cozimento breves (eventualmente recorrendo ao cozimento
no vapor ou na panela de pressão) para preservar melhor o seu patrimônio
de vitaminas e sais minerais. No caso do cozimento na água, para reduzir as
perdas, é preciso ferver as hortaliças em uma quantidade reduzida de água e
não por muito tempo, depois de tê-las picado o mínimo possível. Em alguns
casos, para recuperar a parte dos nutrientes que se dissolve na água é
possível utilizar o líquido do cozimento para preparar sopas ou molhos.
No entanto, lembramos que alguns produtos vegetais importantes (como
batatas, legumes e cereais), mesmo sendo dotados de boas propriedades
nutritivas e sabor agradável, quando crus, não são nem comestíveis, nem
digeríveis pelo homem, e só passam a sê-lo graças à ação do calor. De fato,
as temperaturas elevadas modi cam e tornam mais fácil de assimilar o
amido: elas determinam a ruptura das paredes de celulose que envolvem as
células vegetais, tornando, assim, os nutrientes acessíveis às nossas enzimas
digestivas; também tornam inócuas algumas substâncias prejudiciais que
impediriam o uso desses produtos como alimento humano e destroem
alguns “antinutrientes”. Esse termo indica as substâncias presentes na
natureza, em vários alimentos (hortaliças, castanhas, ovos crus, etc.), que
interferem na absorção e na digestão de vários princípios nutritivos – no
caso dos legumes, trata-se de inibidores da digestão das proteínas.
Resumindo, o cozimento constitui um tratamento indispensável se
quisermos que esses alimentos sejam completamente comestíveis e
utilizáveis por nós.

Essa é a primeira vantagem oferecida pelo cozimento. A segunda, muito


semelhante do ponto de vista prático, é a de tornar os alimentos mais
facilmente digeríveis, já que o calor provoca no alimento processos
semelhantes aos digestivos, ou seja, transforma substâncias químicas
complexas em outras mais simples. Um exemplo típico é o do amido, no
qual, sob a ação do calor seco, uma parte se transforma em dextrinas e
açúcares simples. Outro exemplo diz respeito aos alimentos de origem
animal: é verdade que muitos também podem ser digeridos crus, mas é
inegável que o cozimento deixa a carne mais macia e mais fácil de mastigar
e digerir, tanto por modi car e quebrar as moléculas das proteínas
musculares (uma espécie de pré-digestão) quanto por transformar em
gelatina as duras bras de colágeno do tecido conjuntivo. Além disso, o
calor tem outras ações positivas: por exemplo, no ovo, ele desativa duas
substâncias presentes na clara, uma das quais tem ação antidigestiva (a
albumina crua não é utilizada pelo corpo e é eliminada nas fezes) e a outra
(a avidina) consegue sequestrar a biotina, uma vitamina do complexo B.

Certamente, o calor deve ser controlado (utilizando-se temperaturas as mais


baixas possíveis e tempos os mais breves possíveis) para minimizar os
possíveis efeitos negativos sobre o valor nutricional dos alimentos, os quais
consistem na perda parcial de alguns aminoácidos e vitaminas,
especialmente a vitamina C, a B1, a B6, os folatos e as vitaminas A e E.
Temperaturas moderadas também permitem evitar a formação de
substâncias potencialmente tóxicas, sobretudo originadas das gorduras. De
qualquer forma, no caso de vitaminas e sais minerais, em geral trata-se de
perdas não particularmente graves do ponto de vista nutricional, que
obviamente são levadas em conta ao se sugerir as porções-padrão a serem
consumidas dos alimentos que precisam ser cozidos. Também é preciso
notar que o conteúdo de iodo (precioso mineral do qual é tão difícil
garantir quantidades adequadas na comida) é reduzido em cerca de 20% no
caso de fritura ou cozimento na grelha e em cerca de 50% no caso de
fervura.

E é interessante notar que as perdas causadas pelo cozimento muitas vezes


são compensadas por inesperados efeitos favoráveis: por exemplo, o
licopeno, importante antioxidante que abunda no tomate, torna-se muito
mais disponível – e, portanto, desempenha melhor sua ação – no produto
cozido (molhos, etc.). Por sua vez, as várias substâncias anticancerígenas,
que são uma das maiores virtudes das brássicas (couve, brócolis, etc.),
permanecem mesmo após o cozimento dessas hortaliças, ainda que em
quantidade menor, enquanto o ácido fólico passa a apresentar uma absorção
muito mais fácil após o cozimento. E também a disponibilidade de
carotenoides e alguns antioxidantes aumenta em muitas hortaliças depois de
fervidas ou cozidas no vapor.

Do mesmo modo, jamais se deve esquecer que o resultado nal do


cozimento é, em todo caso, um produto mais macio e mais mastigável, e,
portanto, mais fácil de engolir e de assimilar e mais facilmente “atacável”
por nossos sucos gástricos. Aliás, nossos antepassados foram muito
bene ciados por essas vantagens no plano da mastigabilidade e da
digestibilidade depois que conseguiram controlar o fogo e cozinhar os
alimentos: todos os paleoantropólogos concordam em a rmar que nosso
processo evolucionário foi facilitado em grande parte pelo fato de podermos
extrair um índice maior de substâncias nutritivas dos alimentos à disposição
graças ao cozimento, e de podermos parar com a demoradíssima e cansativa
mastigação de produtos excessivamente duros, exatamente porque estavam
crus. Para fazer uma comparação, calcula-se que ainda hoje nossos “primos”,
os chimpanzés, gastem até 50% ou 60% do dia mastigando seus alimentos.
Como já se escreveu de forma muito documentada, para as primeiras
espécies de Homo (do Homo ergaster em diante), o cozimento sem dúvida
resolveu o problema do “tempo alimentar” (mastigação + digestão +
absorção), melhorando o teor de nutrientes e de calorias e incentivando um
consumo maior de carne, além de deixar-lhes muito mais tempo livre para
várias atividades complexas, decisivas para incrementar o ímpeto
evolucionário.
Em resumo, segundo os especialistas, o cozimento da comida está “entre as
forças motrizes da evolução humana”. E os seres humanos modernos, elo
nal (por enquanto) dessa longa cadeia, dedicam em média menos de uma
hora por dia ao ritual da mastigação.

Voltando ao cozimento, lembramos que a terceira vantagem que ele traz é a


de tornar os alimentos mais agradáveis, já que, cozinhando-os, tanto os
princípios alimentares presentes quanto os ingredientes acrescentados
originam uma variedade de aromas e sabores que estão ausentes ou pouco
evidentes no estado cru: e, novamente, esse enriquecimento melhora a
digestibilidade do alimento cozido, favorecendo a produção de sucos
salivares e gástricos.

Além disso, há uma quarta vantagem nada negligenciável: o cozimento torna


os alimentos mais seguros higienicamente. De fato, nos alimentos quase
sempre está presente uma população microbiana mais ou menos numerosa,
relacionada a muitos fatores diferentes. Grande parte desses micro-
organismos é dani cada ou destruída pelo calor, enquanto podem restar só
algumas toxinas termorresistentes, como as dos esta lococos, se já tiverem
sido produzidas.

O aspecto da segurança higiênica não é nada secundário. Não é por acaso


que, paralelamente à propagação dessa paixão por comida crua (basta
pensar na popularidade do sushi e do sashimi, uma verdadeira moda que
conquista cada vez mais pessoas), tenha aumentado também o número de
casos de intoxicações alimentares que o cozimento conseguiria prevenir.
Para dar alguns exemplos, re ro-me aos casos de salmonelose por ovos ou
carne de aves, aos de toxoplasmose (perigosa principalmente para gestantes
e imunodepressivos) causada pelo uso de carnes pouco seguras consumidas
cruas ou malcozidas (para a EFSA, a carne de porco consumida crua ou
malcozida é a principal fonte de infecções por hepatite E na Europa), aos de
intoxicações por Salmonella ou Escherichia coli do leite cru e as causadas por
moluscos contaminados com micro-organismos e vírus; até a multiplicação
de várias parasitoses que antigamente eram típicas do Pací co, mas agora
são frequentes também no Ocidente, provocadas justamente por pratos à
base de peixe cru: estrongiloidíase, distomíase, mas sobretudo a mais
conhecida e temida anisakíase (ou anisaquiose).

Esta última trata-se de uma “zoonose” cujos casos estão rapidamente


aumentando na nossa região (alerta feito em 2017 pelo British Medical
Journal Case Reports), em boa parte também por causa da preferência por
pratos típicos japoneses à base de peixe cru. A infecção é provocada por um
nematódeo (um verme), o Anisakis simplex, parasita intestinal cujas larvas –
que podem estar presentes em quase todos os peixes (e também em
moluscos como polvos, lulas e calamares, mas não em crustáceos) e que são
muito difundidas também no Mediterrâneo – encontram-se exatamente nas
vísceras do peixe. Se não forem destruídas pelo calor (de 1 a 10 minutos a
temperaturas de no mínimo 60 °C no interior do produto) ou por um
congelamento prolongado (mantido a -18 °C logo após o abate por não
menos que 96 horas no freezer caseiro com porta separada, ou -20 °C no
coração do produto por pelo menos 24 horas, conforme previsto pela atual
norma europeia),[13] essas larvas migram para os tecidos do peixe e,
quando ingeridas pelo homem, penetram nas paredes do estômago e do
intestino do hospedeiro, provocando dores e lesões agudas. Elas podem até
perfurar a parede intestinal ou provocar a formação de granulomas e
também fortes reações alérgicas. O cozimento evita completamente esse
problema, ao passo que a defumação a frio, a salga por menos de seis
semanas e a marinada são inúteis. O peixe marinado, no passado, foi a
principal causa de anisakíase na Itália. Em vez disso, são muito oportunos a
imediata evisceração do peixe e um controle cuidadoso, já que as larvas são
visíveis a olho nu (medem de 1 a 3 centímetros).

De qualquer forma, em geral desaconselha-se o consumo de peixe cru a


grávidas, crianças, idosos e imunodepressivos por precaução, tanto pelo
risco de anisakíase como de listeriose, uma infecção provocada pela Listeria
monocytogenes, uma bactéria que sobrevive tanto à temperatura do
refrigerador quanto à defumação ou à marinada do peixe, mas que é
desativada em cerca de 10 segundos a 70 °C. Portanto, boas garantias de
segurança são oferecidas pelo “salmão defumado no calor”, por exemplo. Já o
defumado a frio – exatamente o tipo preferido pelos consumidores italianos
– pode representar um risco, embora os controles a que é submetido sejam
particularmente constantes e e cazes no país.

O que concluir? Um exame equilibrado de todas as notícias relatadas até


aqui só pode con rmar o que foi sinalizado já no início: a nossa dieta ideal
deve ser um mix acertado de produtos crus e cozidos, e deve ser preparada
seguindo certas precauções – por um lado, utilizando métodos de cocção
mais brandos para alterar o mínimo possível o valor nutricional dos nossos
alimentos, e na outra vertente, respeitando condições higiênicas de absoluta
segurança ao consumir produtos crus e ao se permitir certos pratos, como
um carpaccio de carne ou peixe ou uma porção de sushi ou sashimi.

E se nos deixarmos conquistar pelos modismos do momento e desejarmos


consumir com maior assiduidade aqueles pratos crus que no passado já
criaram algum problema, façamos isso, mas sem exagerar nem na
frequência, nem na quantidade. E talvez, também, escolhendo com muita
atenção e espírito crítico os restaurantes mais sérios e con áveis (mesmo os
étnicos!), os quais, porém, costumam também ser os mais caros – detalhe
que pode constituir um obstáculo difícil de ser superado pelos mais
apaixonados seguidores do sushi: jovens ou muito jovens, em geral.

A CARNE DO COZIDO É POUCO NUTRITIVA,


AO PASSO QUE O CALDO CONTÉM MUITOS
NUTRIENTES
Essa convicção é falsa, e aliás, os termos dessa premissa podem até ser
invertidos.

De fato, durante o processo de fervura, os componentes fundamentais da


carne continuam quase que completamente no próprio produto, apenas uma
pequena parte passa à água do cozimento que constitui o caldo. Para ser
exato, passam somente pequenas quantidades das substâncias que
conseguem sair sem di culdade das células dos tecidos da carne: um pouco
de sais minerais (potássio, fosfatos, etc.) e de vitaminas hidrossolúveis,
substâncias aromáticas e também poucas gorduras e poucas substâncias de
natureza proteica (peptídeos, creatina, etc.).

A quantidade de proteínas que passa para a água do cozimento durante a


fervura depende dos tipos de proteínas presentes e de como o cozimento é
conduzido. Se o produto proteico (carne, peixe, etc.) é colocado na água já
fervendo, o brusco contato com uma temperatura tão alta provoca a
coagulação das camadas super ciais do alimento, com a formação de uma
na camada isolante que faz com que muito poucas proteínas solúveis
consigam se dissolver na água. Desse modo, teremos um bom cozido e um
caldo pobre.

Se, ao contrário – como muitas vezes acontece –, o alimento é imerso em


água fria sem sal, à medida que o aquecimento ocorre haverá uma passagem
maior de proteínas solúveis para a água do cozimento, a qual, portanto, será
enriquecida com proteínas, enquanto a carne (ou o peixe) cará
parcialmente empobrecida, obtendo-se um caldo mais nutritivo, além de
mais rico em aromas e sabores. E se a carne utilizada for picada em pedaços
pequenos, a passagem de substâncias nutritivas para o caldo obviamente será
maior, por causa do aumento da superfície de contato entre o produto e a
água.

É sobretudo nesses últimos dois casos que a passagem de proteínas solúveis


para a água do cozimento pode levar a perdas relevantes do valor
nutricional (por parte da carne) e alcançar um poder nutritivo e calórico de
certa quantia (por parte do caldo) – um caldo que, portanto, deve ser
utilizado, e não descartado.

Mas trata-se sempre de uma transferência de nutrientes um tanto limitada.


De fato, em todos os casos o valor nutricional do caldo, que não é
propriamente um alimento de verdade, continua substancialmente
desprezível: são poucos gramas de gordura e de proteínas para cada 100 g, e
cerca de 30 calorias. Dados que redimensionam drasticamente o mito do
valor do caldo como “revigorante”, um papel que talvez ele possa reivindicar
somente por ter certa ação de estímulo do apetite e por suas características
tônicas de produto energético, capaz de estimular suavemente o sistema
nervoso – e muito pouco comparável, sob esse aspecto, ao café e ao chá.

Ao contrário, voltamos a lembrar, a carne fervida conserva a maior parte de


seu patrimônio original, assim como as carnes que são cozidas seguindo
outros procedimentos.

OS OVOS SÃO PESADOS PARA A DIGESTÃO


Entre as muitas acusações – frequentemente exageradas e sem motivo – que
são feitas aos ovos, aparece também essa da má digestibilidade.

Trata-se de uma crítica substancialmente infundada. De fato, se tomarmos


como parâmetro de comparação, por exemplo, a velocidade de esvaziamento
gástrico, podemos constatar que dois ovos crus ou cozidos moles deixam o
estômago em cerca de duas horas, e dois ovos cozidos duros o fazem em
três horas. Pois bem, para que o mesmo aconteça após a ingestão de uma
caneca de café com leite, é necessário um par de horas, e para uma porção
normal de carne, três horas.

Pode-se concluir que, ao contrário do que muitos continuam a rmando, os


ovos não apresentam problemas particulares de digestibilidade, contanto que
não sejam cozidos demais e sobretudo que sejam preparados sem excessos
de gordura.

O COZIMENTO POR MICRO-ONDAS FAZ


MAL À SAÚDE
Trata-se de uma dúvida que surgiu no passado provavelmente por causa da
segurança incompleta dos primeiros fornos, que apareceram há quase
setenta anos; mas, nos aparelhos modernos, os problemas dos modelos
iniciais já foram completamente superados, assim como foram dissipados
vários outros temores que nos anos seguintes haviam se difundido com
relação a essa técnica – a qual, na verdade, pode até ter resultados menos
problemáticos do que outras modalidades de cozimento, inclusive algumas
consideradas bastante tranquilas, como a frigideira ou a chapa.

Pode-se dizer que o cozimento por micro-ondas representou um passo à


frente nas modalidades de cozimento caseiro, um progresso parecido com o
da popularização das panelas de pressão. E inúmeros estudos já
testemunharam que ele é absolutamente inofensivo e permite uma boa
preservação do valor nutricional dos alimentos. Esse tipo de cozimento
baseia-se na ação de ondas eletromagnéticas de alta frequência – que são da
mesma família das ondas de rádio e da luz visível –, as quais são produzidas
no forno de micro-ondas por um dispositivo, o magnetron. Essas ondas
vibram 2,5 bilhões de vezes por segundo e atingem toda a superfície externa
da comida, penetrando no alimento por 2 a 3 centímetros de profundidade
e fazendo vibrar as partículas de água e de gordura, de modo a produzir
calor por atrito, o qual depois penetra mais profundamente por convecção.

O forno de micro-ondas aquece cerca de cinco vezes mais rapidamente do


que os métodos convencionais (gás ou eletricidade) e pode chegar também
a temperaturas muito elevadas, mas por períodos bem breves – o que é uma
vantagem no tocante à preservação do valor nutricional dos alimentos, tanto
pela brevidade da exposição a altas temperaturas quanto pela ausência de
perdas por dissolução nos caldos de cozimento. De fato, trata-se de uma
espécie de fervura a seco, na qual o calor é produzido no interior dos
alimentos, assim eles são aquecidos de maneira diferente daquela que
acontece nos cozimentos tradicionais. Nestes últimos, o calor passa
gradualmente da superfície externa para o coração do produto, com duas
possíveis consequências negativas: algumas camadas periféricas do alimento
podem ser submetidas a temperaturas extremamente elevadas por períodos
mais prolongados, com o risco de modi car tanto as características
organolépticas quanto o valor nutritivo, e o produto, no nal, corre o risco
de car cozido demais por fora e cozido de menos por dentro.

Que que bem claro que as micro-ondas não são cancerígenas de forma
alguma (uma ideia infundada, mas que circulou por certo tempo) e
tampouco são ionizantes; portanto, não deixam os alimentos radioativos
(outro temor que continua vivo até hoje entre algumas pessoas). Além disso,
a abertura da porta do forno bloqueia imediatamente sua emissão: assim, é
mentira (esta lenda também se difundiu) que as micro-ondas possam
provocar lesões oculares. Elas são re etidas pelo metal (por isso os
recipientes metálicos não são adequados para uso no forno de micro-ondas),
mas atravessam o vidro, a porcelana, a cerâmica (desde que sem decorações
douradas ou metálicas) e o papel, sem aquecê-los; portanto, esses são os
principais materiais de que devem ser feitos os recipientes para fornos de
micro-ondas, além da terracota, que, no entanto, tende a se aquecer.

As vantagens nutricionais em comparação com alguns métodos tradicionais


consistem na já mencionada ausência da perda de elementos nutritivos pela
passagem para a água do cozimento, a melhor retenção de nutrientes
termolábeis (isto é, que não resistem ao calor) e a possibilidade de evitar o
acréscimo de condimentos gordurosos. As vantagens organolépticas estão
ligadas ao fato de que as alterações no sabor e na cor são irrelevantes. Por
suas características – já que não gratina nem assa os alimentos –, o forno de
micro-ondas não pode conferir ao produto aquele dourado super cial que
tanto agrada, mas que às vezes acarreta alguma desvantagem nutritiva, e
tampouco favorece a fermentação (nada de bolos, pizza ou pão). Quanto a
dourar, o problema foi resolvido faz tempo com a adição de um prato grill
que permite simular o efeito do forno “tradicional”.

Os usos mais aconselháveis são o descongelamento, que é muito rápido e


sem que a água saia do alimento, e o aquecimento de pratos prontos, no
qual se evita que os alimentos sequem e percam fragrância; além do
cozimento direto, que, como já falamos, permite usar menos sal e
condimentos do que nos métodos tradicionais e é mais rápido. Praticamente
todos os alimentos são adequados a serem cozidos por esse método, com
poucas exceções (como os ovos com casca), enquanto, para certos tipos de
verduras e frutas, convém fazer uma pequena incisão na casca ou em sua
superfície.

Um último temor que ressurge com frequência é que o cozimento por


micro-ondas não seja e caz em neutralizar os micro-organismos
eventualmente presentes nos alimentos (Salmonella ou outros), pois a
temperatura no interior dos alimentos, nesse método, não superaria os 65
°C. Na verdade, essa temperatura às vezes pode chegar aos 100 °C, e os
testes realizados demonstraram que a menor e cácia que às vezes se veri ca
na destruição dos micro-organismos se deve principalmente a tempos
insu cientes de cozimento. Na prática, seguir as instruções dos fabricantes e
evitar abreviar os tempos de cozimento permitiu constatar que a resistência
dos micro-organismos ao tratamento por micro-ondas é equivalente à
veri cada nas outras técnicas de tratamento térmico. Lembramos que a
quase totalidade dos germes perigosos é destruída aquecendo-se os
alimentos (melhor se estiverem em pedaços) a 70 °C por pelo menos 10
minutos.

Para concluir, o cozimento por micro-ondas, do ponto de vista da


segurança, equivale às outras técnicas e até apresenta algumas vantagens do
ponto de vista da preservação do valor nutricional dos alimentos. É provável
que as numerosas suspeitas levantadas contra ele década após década
encontrem justi cativa somente naquela instintiva descon ança acerca do
progresso tecnológico que todos nós, alguns mais e outros menos, nutrimos
em nossa alma.

PARA OBTER UMA FRITURA LEVE, É


PRECISO USAR POUCO ÓLEO
É uma ideia errada, ainda que aparentemente muito lógica. Na verdade, para
fritar mais rápido e ter um produto nal que absorva uma menor
quantidade de óleo – e, portanto, que resulte mais leve –, o truque consiste
justamente em mergulhar por completo o alimento a ser frito (se possível,
cortado em pedaços pequenos) em uma notável quantidade de óleo fervente,
a uma temperatura que não deve ultrapassar os 180 °C. Fazendo assim, na
superfície do alimento vai se formar uma crosta na e resistente, formada
pelas moléculas das camadas mais externas do produto que reagem entre si.
Uma das vantagens dessa crosta, além de tornar o produto nal mais
crocante – e, portanto, mais agradável –, é que ela é impermeável,
impedindo que uma quantidade muito grande de óleo seja absorvida – a
qual, mais ou menos inadvertidamente, depois iremos ingerir junto da
fritura.

Usar muito óleo é particularmente útil ao fritar batatas, que liberam um


pouco de água no óleo fervente, baixando sua temperatura: isso poderia
retardar ou impedir parcialmente a formação da crosta, fazendo com que a
batata frita absorvesse óleo demais, especialmente se forem fatias nas, cuja
superfície de contato com o óleo é particularmente grande em relação ao
peso. Corre-se o risco, assim, de ter produtos com até mais de 30% do peso
formado por óleo (frito, ainda por cima). Pois bem, usar muito óleo para
fritar minimiza a redução da temperatura e evita essas consequências.

Obviamente, também é preciso saber escolher o óleo certo: o mais adequado


continua sendo o azeite de oliva extravirgem, e entre os óleos de grãos, seria
bom optar pelo óleo de amendoim, por sua composição não tão distante
daquela do azeite de oliva, ou seja, sem um grau excessivo de insaturação e,
portanto, com uma maior resistência às alterações provocadas pelo calor.

Concluindo, uma fritura caseira (na qual notamos que as temperaturas


críticas para o óleo são alcançadas por um tempo muito breve), feita da
maneira correta, causará a absorção de uma quantidade de gorduras não
superior a 10% do peso inicial do alimento: ele será, portanto, bem digerido
e é adequado a um consumo livre do sentimento de culpa, ainda que seja
bom evitar o consumo frequente de frituras, pois, de qualquer forma, trata-
se de um produto cujo teor de gorduras e calorias é superior ao normal.
FRITURAS ENGORDAM E FAZEM MAL AO
FÍGADO
Dita assim, trata-se de uma posição um pouco drástica demais sobre um
tipo de cozimento tradicional da nossa cozinha, que não merece ser
demonizado de forma inapelável.

De fato, basta seguir algumas poucas regras razoáveis de “boa fritura” para
concluir que esse pecado da gula, desde que preparado da forma correta,
tem o direito de estar presente à nossa mesa, ainda que não com frequência
excessiva. Se por um lado os dados epidemiológicos disponíveis hoje em dia
efetivamente prognosticam um risco maior de desenvolver patologias
cardiovasculares, diabetes e também certos tipos de tumor para quem
exagera na frequência do consumo de frituras, por outro, con rmam que
“no âmbito de uma dieta equilibrada e variada em seu conjunto, o consumo
moderado de alimentos fritos não representa um risco efetivo para a saúde,
contanto que tais alimentos sejam obtidos seguindo boas práticas de
preparação” (segundo um documento da Fondazione per lo Studio degli
Alimenti e della Nutrizione – FOSAN, de 2010).

Comecemos pela a rmação “frituras engordam”. Na realidade, não é de


forma alguma garantido que as frituras sejam necessariamente os preparados
mais ricos em gordura: uma fritura bem feita absorve cerca de 7% a 10% do
seu peso inicial em gorduras, menos que um assado ou um guisado –
contanto, porém, que ela seja frita da forma apropriada, ou seja, tendo
cuidado para que o alimento não absorva uma quantidade muito elevada da
gordura na qual o fritamos, e que o óleo seja do tipo mais indicado, de
modo que a quantidade que for absorvida de qualquer forma (e que
comeremos) contenha o mínimo teor possível de ácidos graxos deteriorados
pelo calor.

Foram mencionados danos ao fígado. Não resta dúvida de que as frituras


impõem mais trabalho aos órgãos responsáveis pela digestão, mas o fígado
em si não lida com o próprio alimento, e sim com o que sobra do produto
depois que ele é “trabalhado” e transformado pelo estômago e pelo intestino
em substâncias quimicamente simples, que, como tais, entram no sangue e aí
chegam ao fígado, o qual retém parte dos nutrientes para as suas
necessidades e redistribui o resto – às vezes depois de tê-los processado em
parte – para as células dos outros sistemas do organismo. Portanto, esse
órgão terá problemas (que podem resultar em insu ciência hepática,
esteatose, cirrose e outros) somente se for sobrecarregado com frequência
demais, ou se as gorduras ou o álcool estiverem presentes em quantidade
excessiva (é do fígado a tarefa de derramar a bílis na cavidade intestinal,
exatamente para providenciar a digestão e a absorção das gorduras), ou
ainda pela eventual presença de substâncias perigosas – o que ocorre, por
exemplo, se um cozimento inadequado tiver provocado nas moléculas de
gordura alterações que determinem sua toxicidade, em geral provocando um
dano celular que supere a capacidade de regeneração das células hepáticas.
Nesse ponto, porém, não estaríamos mais falando de “boa fritura” nem de
bom uso dos produtos fritos, e o discurso mudaria completamente.

Trata-se, en m, de entender a maneira correta de fritar; e as variáveis


principais a serem consideradas são a temperatura e a duração da fritura, a
natureza do óleo, o tipo de alimento e a técnica utilizada.
Quanto ao primeiro item, lembramos que, durante a fritura, os alimentos
podem absorver quantidades de óleo que variam de 10% a 30% do seu peso
(como no caso das batatinhas fritas). Portanto, sua parcela de gordura se
modi ca tanto qualitativamente (torna-se mais semelhante ao óleo da
fritura) quanto quantitativamente (aumenta), com um notável incremento
decorrente também do valor calórico do produto nal, já que cada grama de
gordura aporta 9 kcal. No entanto, mergulhar o produto a ser frito em óleo
abundante já muito quente favorece (sobretudo nos alimentos que contêm
tanto amido quanto proteínas, ou então que foram previamente
enfarinhados ou empanados) a formação de uma “crostinha” impermeável
externa que, além de lhe conferir aromas particulares, reduz tanto as perdas
de líquidos e de nutrientes quanto a absorção de gordura, pois impede que o
óleo penetre em seu interior. Também é útil fracionar o alimento a ser frito
em pedaços menores, os quais, entre outras coisas, fritarão em tempos mais
breves (outro aspecto vantajoso).

Quanto ao óleo preferencial, é bom optar pelo azeite de oliva extravirgem


ou óleo de amendoim, pois são os que têm o “ponto de fumo” mais elevado.
Essa expressão indica a temperatura na qual os componentes do óleo
começam a se degradar, primeiro partindo-se e depois formando uma
substância cancerígena, a acroleína. Quanto mais alto o ponto de fumo,
maior a resistência do óleo a essa alteração. Pois bem, o ponto de fumo do
azeite extravirgem de oliva é de 210 °C, e o do óleo de amendoim, 180 °C,
absolutamente os mais altos. E o azeite de oliva é o mais estável no calor,
graças também à sua particularíssima composição química, rica em ácidos
graxos monoinsaturados e não rica demais em poli-insaturados (os quais,
embora recomendáveis para a saúde, são, no entanto, particularmente
vulneráveis a temperaturas elevadas), e graças também à presença de
polifenóis antioxidantes, os quais também contribuem para dar estabilidade
ao cozimento.

Além disso, é importante utilizar panelas antiaderentes e com bordas altas,


para poder mergulhar facilmente os alimentos no óleo fervente, e uma
fritadeira com termostato: a temperatura ideal de cozimento não deve
superar os 160 °C a 180 °C. Aliás, é aconselhável que ela se mantenha entre
140 °C e 160 °C. Lembramos, também, que ao fritar qualquer alimento,
inclusive verduras, o tipo de preparo pode fazer uma grande diferença: a
quantidade de óleo absorvido é a mais baixa nas hortaliças ao natural,
multiplica-se até vinte vezes para um empanamento com ovo e farinha, e
aumenta ainda mais para hortaliças em “tempurá” (prato típico da cozinha
japonesa à base de verduras e peixes, empanados separadamente e fritos).
Outras melhorias podem ser realizadas enxugando-se os produtos fritos com
papel-toalha, que efetivamente consegue reter e eliminar do alimento uma
parte da gordura presente nas camadas mais externas.

Por outro lado, um aquecimento prolongado e a temperaturas muito altas


causa a degradação tanto dos alimentos quanto da gordura do cozimento, e
fritar alimentos proteicos aumenta o risco da formação de substâncias
(como as aminas heterocíclicas) suspeitas de serem cancerígenas. Além
disso, todos os tratamentos térmicos em altas temperaturas a partir de
matrizes ricas em amido e em um certo aminoácido (a asparagina), em
particular as batatas e também os cereais, podem determinar a formação de
acrilamida. Trata-se de uma substância genotóxica (ou seja, capaz de
dani car o material genético das nossas células) e cancerígena (segundo a
EFSA, em 2015), que pode se formar naturalmente durante cozimentos
acima dos 120 °C em muitos produtos – por exemplo, naqueles de forno,
como nos biscoitos, no pão torrado, no café e em seus substitutos (como a
cevada), e sobretudo nas batatas fritas e nas batatas ao forno. Justamente as
batatas podem contribuir de maneira signi cativa para a absorção alimentar
da acrilamida, uma substância que ainda está sendo estudada para de nir
seu efetivo risco à saúde. Em 2016, a EFSA não conseguiu determinar sua
dose “segura”, e estabeleceu uma dose “inofensiva” cautelosamente muito
baixa, de cerca de 1 micrograma ao dia para um homem de 60 kg: essa
quantidade pode ser encontrada em 3 g de batatas fritas, em 4 g de biscoitos
ou em 5 g de cereais matinais. Em 2017, a Comissão Europeia julgou
preocupantes os níveis de exposição alimentar da população europeia à
acrilamida e decidiu impor uma redução do seu conteúdo nos alimentos,
xando um limite máximo para certos produtos; a regulamentação deveria
entrar em vigor em 2018.[14]

Os produtos à base de farinha integral contêm a maior quantidade de


acrilamida, cuja eventual presença é revelada pelo cheiro e pela cor
amarronzada típicos da tostagem – um indício da reação que leva à
formação da substância. Algumas precauções para reduzir sua presença são:
utilizar batatas provenientes de cultivos com baixo conteúdo de asparagina;
fritá-las (ou cozinhá-las de outra forma) por mais tempo, mas abaixo de
150 °C, evitando dourar em excesso; conservar as batatas em temperatura
ambiente, sempre superior a 8 °C (não no refrigerador!) e deixá-las de
molho por pelo menos 30 minutos antes do cozimento. As batatas fervidas a
100 °C não apresentam traços de acrilamida.

Como dissemos, ao fritar, os principais parâmetros que determinam as


diferenças de qualidade no produto nal são a temperatura alcançada e a
duração do cozimento. A demonstração mais clara disso está em se
comparar uma fritura caseira e uma fritura feita em fábricas de salgadinhos,
rotisserias, restaurantes em escala industrial, etc. A fritura caseira é aquela
que, em experimentos adequadamente conduzidos, resultou sem dúvida a
melhor, por uma série de motivos: em geral tem duração máxima de 30 a
60 minutos, óleo (frequentemente azeite de oliva extravirgem) que em geral
nunca é reutilizado, ou no máximo é usado em dois ou três ciclos de fritura;
temperaturas máximas por volta de 160 °C e estresse térmico (ou seja, as
temperaturas críticas capazes de provocar no óleo a formação de substâncias
potencialmente tóxicas) que é alcançado por períodos muito breves, entre 7
e 10 minutos. Em síntese, na fritura feita em casa, a maior parte do
processo acontece em temperaturas inferiores àquelas que alteram
profundamente o óleo, e o produto nal é o melhor tipo de fritura que se
pode obter.

Bem diferente é a situação que foi veri cada em muitas empresas que
fornecem frituras ao mercado (certamente não em todas!). Nesses
contextos, às vezes acontece que o óleo (em geral não é o azeite
extravirgem, por motivos óbvios de custo) não só é mantido em altas
temperaturas por várias horas (e até dias) e por mais ciclos (serviços de
restaurante), ou até em um ciclo contínuo (fritura industrial), mas também
muitas vezes é apenas “completado” com óleo novo, em vez de ser
substituído por inteiro, o que facilita a formação maciça e mais rápida dos
produtos de degradação do próprio óleo também naquele que foi
acrescentado. O resultado corre o risco de ser uma fritura de má qualidade e
com maior presença de substâncias potencialmente prejudiciais.

Um exemplo: batatas fritas feitas em casa seguindo boas normas contêm


cerca de 7% de gordura (e fornecem cerca de 200 kcal a cada 100 g),
enquanto as batatas chips em saquinhos contêm cerca de 30% (e 540 kcal a
cada 100 g, isso sem falar do sal). Infelizmente, porém, os dados à
disposição indicam que o preço elevado do azeite de oliva extravirgem
limita seu uso em frituras a apenas 30% da população.

En m, é permitido fritar, contanto que não com muita frequência e da


maneira certa. No entanto, não exageremos tampouco na outra direção,
como fazem os apoiadores de uma singular teoria que circula há algum
tempo e que prega as vantagens de consumir produtos fritos ao menos duas
vezes por semana para “treinar” o fígado a funcionar melhor. Trata-se de
uma tese estimada pelos seguidores da “alimentação funcional”, mas também
um tanto isolada (a ideia de que o fígado deva ser treinado como um
músculo de fato é meio estranha) e que não é aceita e tampouco rati cada
pela comunidade cientí ca, até porque não é respaldada por provas
experimentais válidas. É uma opinião pessoal de algumas pessoas, que de
fato não aparece em nenhum documento o cial, nem nas diretrizes
subscritas pelas instituições e agências cientí cas.

É verdade, no entanto, que os efeitos negativos das frituras sobre o fígado


foram excessivamente dramatizados no passado, embora estando ainda bem
vivos no imaginário coletivo. Podemos concluir que permitir-se de vez em
quando o gosto de uma fritura é totalmente lícito, pois um uso moderado de
frituras e produtos fritos é tolerado pelo fígado muito melhor do que
comumente se pensa, especialmente se a fritura foi bem executada – o que
signi ca usar os óleos ideais (sobretudo o azeite de oliva extravirgem ou o
óleo de amendoim enriquecido com ácido oleico), evitar temperaturas acima
de 180 °C, não fritar por tempo demais, limitar a adição de sal e de
temperos (eles aceleram a alteração do óleo), jamais reutilizar o óleo ou
adicionar óleo fresco ao usado, preferir produtos de pequenas dimensões e
mergulhá-los no óleo já fervente; e, após a fritura, drená-los ou enxugar por
fora o excesso de óleo absorvido pelo alimento.
[13] Segundo o FDA, todo molusco ou peixe a ser consumido cru deve ter sido congelado a uma

temperatura de -35 °C por 15 horas ou de -20 °C por pelo menos sete dias. Vale ressaltar que a

inviabilização das larvas só é feita pelas baixas e altas temperaturas ou pela salinidade quando estas

atingem todas as partes do peixe. (N. E.)

[14] No Brasil, segundo informações da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), ainda não

há uma regulação acerca da quantidade de acrilamida presente nos alimentos. (N. E.)
5 BEBIDAS

NÃO SE DEVE BEBER ÁGUA DURANTE AS


REFEIÇÕES
Essa convicção, muito difundida e dura de matar, baseia-se na ideia de que
beber água durante uma refeição possa “diluir” os sucos gástricos
produzidos pelas paredes do estômago, retardando assim a digestão e
levando o alimento a car mais tempo no estômago.

Na verdade, as coisas não são assim: ao contrário, beber uma quantidade


adequada de água durante a refeição (de 600 ml a 700 ml, ou seja, de
quatro a cinco copos) é inclusive útil, tanto para facilitar a sensação de
saciedade quanto para favorecer os processos digestivos, melhorando a
consistência dos alimentos ingeridos e de nitivamente acelerando o
esvaziamento do estômago.

Entre outras coisas, a água que bebemos acaba até por facilitar, de certa
forma, a secreção dos sucos gástricos. Estes últimos de fato são constituídos
em grande parte por água, que, portanto, é indispensável para a sua
formação: se eu tomar pouca água durante a refeição, as glândulas presentes
no estômago incumbidas da secreção dos sucos gástricos deverão obter a
água que falta tirando-a de outros sistemas do organismo, uma operação que
prolongará o tempo de digestão.

O VINHO TINTO FORTALECE O SANGUE


Durante muitos anos resistiu na mentalidade popular a convicção de que o
vinho tinto – provavelmente em virtude de sua cor bastante similar à do
sangue – tivesse um poder antianêmico, ou seja, contivesse muito ferro e
fosse capaz de in uir na produção de glóbulos vermelhos.

Não é verdade, de forma alguma. Já foi demonstrado que o teor de ferro


presente no vinho não só é modesto (em média cerca de 0,5 mg para cada
100 ml da bebida), mas também muito pouco utilizável por parte do nosso
organismo. E também cou determinado que o vinho, esse “néctar dos
deuses” celebrado por poetas e escritores desde a Antiguidade, não possui
nenhuma capacidade de aumentar o número de glóbulos vermelhos nem de
promover a síntese de hemoglobina. Aliás, quem consome quantidades
excessivas de vinho corre o risco de incorrer em de ciências de folatos e de
ferro, cuja carência pode provocar anemia, assim como o consumo excessivo
e crônico de álcool pode acarretar danos ao fígado.

En m, também sob esse ponto de vista é um grave erro conceitual


considerar o vinho quase como um medicamento. Trata-se simplesmente de
uma bebida agradável, rica em signi cados simbólicos e sociais, que contém
uma boa dose de álcool e que, portanto, pode ser consumida se de fato o
quisermos, mas somente com muita parcimônia e se possível durante as
refeições.

Exatamente, portanto, como sugerem hoje todas as diretrizes alimentares de


maior credibilidade.

Á
O SEGREDO DO VINHO ESTÁ NO
RESVERATROL
As cascas de algumas variedades de uva são ricas em resveratrol, uma
substância polifenólica que vai parar mais ou menos inalterada no vinho
tinto (ou seja, aquele que é vini cado com toda a casca). Essa substância foi
descoberta em 1976 e desde então recebeu muita atenção em virtude de
seus supostos efeitos bené cos para a saúde.

A esse respeito foram acumulados muitos dados, frequentemente


discordantes entre si, e multiplicaram-se também as controvérsias entre os
estudiosos. De vez em quando, são atribuídas ao resveratrol não apenas
importantes funções antioxidantes, mas também ações cardioprotetoras,
antitumorais, antiobesidade, antiaterogênese, anti-in amatórias,
antitrombóticas... Mas uma das possíveis ações de maior interesse pareceu
ser, desde o princípio, a de induzir um prolongamento da vida das células de
levedura, mediante a ativação de certo gene: com base nisso, a indústria
farmacêutica imediatamente entrou em ação para obter uma possível
aplicação no ser humano, e continua trabalhando a m de conseguir
produzir um medicamento inspirado exatamente no resveratrol, mas que
seja mais e caz, de modo a poder reduzir as doses a serem absorvidas para
alcançar o efeito desejado nos seres humanos.

O problema das doses necessárias para se alcançar qualquer efeito protetor é


de grande importância: é preciso dizer que o resveratrol natural é pouco
biodisponível e é metabolizado em um tempo curto (depois de ingerido,
desaparece em cerca de 30 minutos).
Também ressaltamos o fato de que, em anos recentes, vários estudos que
pareciam demonstrar uma conexão entre o resveratrol e os efeitos
cardioprotetores e de prevenção de tumores foram desmentidos, embora
ainda haja provas su cientes, em animais, que fazem pensar que esse
polifenol possa reduzir a incidência tanto de hipertensão e de cardiopatia
isquêmica quanto a de tumores no cólon – sempre em animais.

E foi justamente nas doses de resveratrol possíveis de serem obtidas com um


consumo moderado de vinho que a atenção de tantos pesquisadores se
concentrou recentemente, em relação a um possível efeito preventivo de
tumores. De fato, já cou demonstrado que o principal cancerígeno presente
nas bebidas alcoólicas é o próprio álcool – tanto que ele foi introduzido pela
International Agency for Research on Cancer (IARC) no grupo 1 dos
cancerígenos, ou seja, entre aqueles que são cancerígenos para humanos
além de qualquer dúvida razoável. E, efetivamente, a mesma IARC, em seu
European Code Against Cancer,[15] no item 6, sugere: “Se consumir álcool,
limite o consumo. Não consumir bebidas alcoólicas é bené co para a
prevenção do câncer”.

A essa altura, já que, conforme mencionamos, dados obtidos por


experimentos em animais demonstraram que o resveratrol, acima de certas
doses, consegue reduzir a incidência de muitos tumores relacionados ao
álcool (cólon, fígado, mama), surgiu justamente a pergunta: sua presença no
vinho seria signi cativa o su ciente para provocar uma diminuição efetiva
desse risco em humanos? No passado, foram publicados dados muito
contrastantes sobre os níveis de ingestão de resveratrol alcançáveis mediante
o consumo moderado de vinho: segundo alguns autores, tais níveis não
cariam muito distantes do que seria útil para que a substância
desempenhasse sua atividade biológica em geral; já segundo outros, mesmo
as estimativas mais otimistas das quantidades absorvidas com o vinho tinto
seriam muito inferiores àquelas que resultaram e cazes nos experimentos.
En m, o X da questão era entender qual seria “a exposição humana ao
resveratrol atingível com um consumo aceitável de vinho”.

Assim, um novo estudo recentemente se dedicou a efetuar uma meticulosa


avaliação comparativa entre a carcinogenicidade (isto é, o potencial de
causar câncer) do álcool e a anticarcinogenicidade do resveratrol presente
no vinho. A conclusão foi que seriam necessários mais de cem copos de
vinho por dia (111, para ser exato) para alcançar níveis de resveratrol
capazes de exercer um efeito protetor que compensasse os riscos ligados à
presença do álcool. Portanto, concluíram os autores, já que na prática tais
níveis “úteis” de resveratrol são inatingíveis de forma sensata, está
descartado que essa substância, nos limites em que é ingerida com um
consumo normal de vinho, possa ter uma real e cácia quimioprotetora ou
preventiva contra os tumores relacionados ao álcool.

Segundo os mesmos estudiosos, é discutível também a segurança do


consumo do resveratrol em doses elevadas ou muito elevadas na forma do
suplemento anunciado e vendido por vários meios, inclusive a internet. De
acordo com eles, ministrar resveratrol a seres humanos como suplemento
não é aceitável.

Voltando à alimentação “normal”, um pequeno aparte: poucas pessoas sabem


que quantidades notáveis de resveratrol podem ser tranquilamente
encontradas em muitos produtos naturais agradáveis, como o morango, a
groselha, o mirtilo (e as frutas vermelhas em geral) e o amendoim, em
doses até mais abundantes do que naquela presente no vinho, e ainda sem
correr os riscos relacionados à presença do álcool, o que signi ca a
possibilidade de ingerir maiores quantidades sem o mesmo temor. Um
detalhe que é bom ter em mente.

UMA “BEBIDINHA” REVIGORA


É somente uma ilusão pensar que um drinque alcoólico qualquer, mesmo
com uma elevada concentração de álcool, possa conceder um aumento de
energia ou trazer mais força.

O álcool é, na prática, um sedativo, exercendo um efeito de depressão do


sistema nervoso central. Portanto, tudo o que pode fazer é provocar uma
diminuição da sensação de cansaço ou dor, mas certamente não levará mais
energia para os músculos. Entre outras coisas, é preciso também ressaltar
que, se é verdade que o álcool contém muitas calorias – 7 kcal por grama –,
também é verdade que só uma parte dessas calorias é utilizável no esforço
muscular propriamente dito.

Do mesmo modo, é preciso desmentir a ideia de que o álcool pode ajudar


alguém a se recuperar de um choque; aliás, como ele provoca uma
vasodilatação periférica, existe o risco de que tenha um efeito contrário, no
sentido de que determina uma diminuição do uxo sanguíneo para os
órgãos internos, especialmente para o cérebro.

AS BEBIDAS ALCOÓLICAS NOS


ESQUENTAM
É verdade só em partes, e também é perigoso acreditar nisso. De fato, a
vasodilatação cutânea induzida pelo álcool produz apenas uma momentânea
e enganadora sensação de calor, mas ao mesmo tempo provoca também uma
maior dispersão do calor corporal para o exterior e, assim, leva a um maior
resfriamento do corpo em um tempo um tanto breve.

Esse fenômeno não traz danos quando se está em um ambiente aquecido;


mas, ao contrário, se a pessoa está exposta a temperaturas notadamente
inferiores à do corpo, o resultado será um perigoso aumento do risco de
uma friagem, que pode se transformar em grave hipotermia.

Com relação a isso, pode ser considerado um exemplo o caso do bêbado


que, nos meses frios, ao ar livre e à noite, incorre em fenômenos graves de
friagem com facilidade muito maior do que alguém que não consumiu
bebidas alcoólicas.

UM DRINQUE APÓS AS REFEIÇÕES AJUDA


NA DIGESTÃO
É uma a rmação absolutamente falsa. Ao contrário, o álcool retarda a
digestão e, embora provoque um aumento da secreção gástrica, altera os
tempos de esvaziamento do estômago.

E não só isso: a ingestão de mais álcool no m das refeições aumenta a


carga de trabalho do fígado, o órgão que se incumbe quase completamente
da difícil tarefa de eliminar com urgência do organismo essa substância
estranha representada pelo álcool. De fato, para este último não existe
nenhuma possibilidade de armazenamento no nosso corpo: o álcool ingerido
entra rapidamente na corrente sanguínea e dali passa para todos os uidos
corporais (ainda que sua ingestão com o estômago cheio faça com que ele
seja absorvido mais lentamente), mas deve mesmo assim ser metabolizado
com rapidez – uma operação que acontece, como dissemos, em pequena
parte no estômago, mas sobretudo no fígado.

No entanto, a capacidade do fígado de transformar o álcool é limitada: esse


órgão consegue metabolizar e eliminar apenas cerca de 6 g de álcool por
hora (os gramas de álcool presentes em 100 ml de bebida podem ser
obtidos multiplicando-se a graduação alcoólica por 0,8), e essa operação o
sobrecarrega muito. Isso explica o agravo que podem representar, para as
funções desempenhadas pelo fígado, os cerca de 12 g de álcool presentes em
uma bebida destilada, especialmente se forem somados àqueles dos copos de
vinho eventualmente já ingeridos no decorrer da refeição.

Escolher um licor de ervas em vez de uma grappa ou uma dose de uísque


pode melhorar o quadro? Muito pouco, sinceramente. Se é verdade que os
licores à base de ervas contêm algumas substâncias que podem, em certa
medida, estimular a secreção dos sucos gástricos e da bílis – e, portanto,
facilitar a digestão das gorduras –, é preciso lembrar que, por sua vez, eles
também contêm álcool: um aspecto que por si só basta para praticamente
anular as eventuais vantagens ligadas à sua composição particular.

En m, esse acréscimo de álcool no m das refeições, à parte de qualquer


outra consideração acerca dos perigos associados a uma elevada taxa de
álcool no sangue (para a direção de veículos, só para citar o exemplo mais
banal), dá a entender que a digestão só pode ser prejudicada por esse hábito,
no sentido de que será retardada e tornada mais difícil e laboriosa,
considerando a contribuição fundamental que o fígado é obrigado a dar
durante o próprio processo digestivo.

BEBER MUITA ÁGUA FACILITA A


RETENÇÃO DE LÍQUIDOS
Não é a ingestão de água que provoca a retenção de líquidos. A realidade é
muito diferente disso.

Por “retenção de líquidos” queremos dizer uma presença de água maior do


que o normal no nosso corpo, a ponto de provocar, às vezes, até edemas:
esse termo indica os inchaços anormais em razão do acúmulo de líquidos
localizados no espaço extracelular – ou seja, entre as células do tecido
subcutâneo – particularmente em determinadas partes do nosso corpo,
como as coxas, os glúteos, os tornozelos e o abdômen. É um distúrbio
bastante comum que afeta milhões de pessoas, principalmente as mulheres.
Entre as prováveis causas, as mais graves – mas, por sorte, menos frequentes
– são resultantes de disfunções cardíacas ou renais, hipertensão arterial,
patologias do fígado, reações alérgicas, uso de medicamentos à base de
cortisona ou estroprogestínicos, etc. Na maioria dos casos, porém, as origens
do distúrbio são problemas mais leves, como a má circulação venosa ou
linfática, uma drenagem linfática pouco e ciente ou uma retenção
pronunciada de água provocada por um aumento do teor de sódio nos
uidos corporais.

Pode-se dizer, portanto, que a retenção de líquidos depende muito pouco da


quantidade de água que ingerimos, e está, em vez disso, muito mais
relacionada a maus hábitos alimentares (como a presença de elevados teores
de sódio e de outras substâncias nos pratos que consumimos) e ao nosso
estilo de vida em geral – vale dizer, principalmente às escolhas e aos
comportamentos pouco aconselháveis, como o sedentarismo e o sobrepeso
dele decorrente, o fumo, o abuso do sal ou do álcool, etc.

Com base em todas as considerações feitas, as verdadeiras armas para evitar


uma retenção de líquidos excessiva podem ser esquematizadas assim:

beber água com frequência e em boas quantidades, inclusive


antecipando o aparecimento da sensação de sede;

evitar os excessos de sal (cloreto de sódio), tanto aquele acrescentado à


mesa ou na cozinha quanto o que já é parte integrante dos alimentos;

ater-se a uma dieta muito variada e rica em frutas e hortaliças, que


ajude a evitar o sobrepeso e forneça generosas quantidades de
vitaminas, potássio, bras e substâncias antioxidantes e vasoprotetoras
(como a vitamina C);

ser mais ativo sicamente, tanto nas ações normais do dia a dia (andar
a pé, subir escadas, etc.) quanto empenhando-se em uma signi cativa
atividade motora ao menos três ou quatro vezes por semana.

Estes últimos cuidados, além de ajudarem a manter um peso correto,


permitirão também desfrutar do efeito “drenante” dos músculos (sobretudo
os das pernas), os quais, ao se contraírem, espremem as veias profundas,
empurrando o sangue para o alto e permitindo, assim, que ele re ua melhor
para o coração. Dessa forma, é possível evitar ou reduzir os inchaços
provocados pelos líquidos que, estagnando-se e acumulando-se nas regiões
inferiores do corpo (como pés e tornozelos), podem provocar edemas,
pernas pesadas, cãibras, formigamentos, pequenas hemorragias, etc.

BEBER ÁGUA COM LIMÃO FAZ BEM E


EMAGRECE
Um hábito que se difundiu rapidamente em anos recentes – derivado, ao
que parece, da medicina ayurvédica – é justamente este de beber pela manhã
um ou mais copos de água morna à qual foi acrescentada uma quantidade
generosa de suco de limão.

Quais as expectativas? Uma promessa genérica de “sentir-se melhor” e, para


alguns, também um efeito emagrecedor. No tocante à esperança de se sentir
melhor, efetivamente essa mistura hidratante pode favorecer uma sensação
de bem-estar – um pouco pelo efeito placebo, mas também porque o limão
facilita a digestão e a água morna estimula o peristaltismo intestinal,
ajudando na regularidade do próprio intestino (e essa ação anticonstipante,
de fato, é percebida por muitas pessoas).

O discurso já muda quanto à esperança de um emagrecimento induzido por


esse costume. Trata-se de uma ilusão, segundo alguns, ligada ao fato de que
o limão – e sua casca em particular – contém uma bra solúvel (a pectina)
que poderia induzir uma sensação de saciedade. Mas um efeito desse tipo
seria presumível somente para o consumo de doses elevadas dessa bra, ou
seja, doses su cientes para produzir um efeito de preenchimento do
estômago. Nada a ver, portanto, com as doses mínimas eventualmente
fornecidas por um só limão.
Nada contra essa nova “moda”, mas não cultivemos a ilusão de efeitos
emagrecedores que não existem, tampouco de efeitos salutares em larga
escala, conforme anunciado pelos quatro cantos da velha e inefável internet,
sem nenhuma base séria demonstrável.

TOMAR CERVEJA AJUDA MULHERES QUE


AMAMENTAM A PRODUZIR MAIS LEITE
Uma ideia totalmente infundada, também enraizada na tradição popular.

Tomar cerveja não aumenta a produção de leite nem prolonga a duração da


amamentação. Ao contrário, o álcool contido na cerveja pode inibir o início
da lactação e impede a produção da oxitocina, o hormônio que estimula a
contração dos dutos mamários. Além disso, estudos bem controlados
veri caram que o álcool e outras substâncias amargas presentes na cerveja
modi cam e tornam menos agradável o cheiro e o sabor do leite, fazendo
com que o recém-nascido mame menos e piorando a qualidade do seu sono
(com repousos mais breves e caracterizados por frequentes interrupções).

E também não se pode esquecer de um aspecto muito mais grave: o próprio


álcool passa facilmente para o leite, e, portanto, também é ingerido pelo
bebê, o qual não tem a capacidade de metabolizá-lo e corre o risco de sofrer
danos em vários órgãos. Além disso, o álcool pode provocar no lactente
sintomas como hipoglicemia, vômito e diarreia.

Substancialmente, se tomar bebidas alcoólicas representa sempre um risco,


seu consumo durante a gravidez e a amamentação (bem como na infância e
na adolescência) deve absolutamente ser evitado.

É Á Ã
ENERGÉTICOS E ÁLCOOL SÃO UMA
COMBINAÇÃO SEGURA
Muitos pensam assim, infelizmente. Mas é uma ideia errada, muito
difundida entre os jovens, e também perigosa por vários motivos.

Os energéticos são bebidas não alcoólicas que contêm várias substâncias


estimulantes, listadas no rótulo. São bem diferentes dos isotônicos,
suplementos de sais minerais e água cuja nalidade é repor as perdas
hidrossalinas resultantes da atividade física ou de qualquer transpiração
intensa, e portanto utilizados principalmente por quem pratica esportes.

A publicidade estimula o consumo dos energéticos alardeando sua


capacidade de melhorar o desempenho tanto físico quanto mental,
utilizando todos os meios possíveis e slogans promocionais de grande
impacto. Eles estão presentes em cerca de 165 países há mais de 25 anos
(há cerca de quinze na Itália), embora em certos períodos sua venda tenha
sido proibida em algumas nações europeias por causa das possíveis
consequências causadas por um consumo excessivo. Aparentemente, são
consumidos por 40% dos adultos, 68% dos adolescentes e cerca de 18% das
crianças menores de 10 anos.

Eles contêm água, açúcares, aromatizantes, às vezes também vitaminas e sais


minerais, mas sobretudo uma série de substâncias excitantes e energéticas,
como a cafeína (de 50 mg a 400-500 mg por latinha, ou seja, até seis ou
mais vezes a quantidade presente em um café espresso), taurina (uma
substância ácida que contém enxofre, presente em altas concentrações nos
músculos esqueléticos e que parece ser capaz de reduzir a fadiga muscular),
glucoronolactona (um açúcar), frutose e sacarose (cerca de 10%), carnitina,
gingko biloba, guaraná, ginseng, etc. O problema da dosagem dessas
substâncias advém sobretudo de um consumo que muitas vezes não é
controlado e que pode levar a efeitos colaterais não desprezíveis, como
irritabilidade, estado de agitação, irrequietude, e até taquicardia e
hipertensão prolongadas por várias horas. E todos os dados das pesquisas
que foram realizadas indicam unanimemente que entre os jovens há uma
generalizada predileção por essas bebidas, vistas como produtos desejáveis e
instigantes, ao passo que não há quase nenhuma percepção acerca dos riscos
ligados ao seu abuso. Aliás, a opinião mais corrente sobre os energéticos é
outra e também substancialmente positiva: “quando você bebe álcool, um
energético te ajuda a continuar ligado”.

De fato, o principal problema, totalmente negativo, consiste justamente na


sua combinação com bebidas alcoólicas, uma combinação muito popular
entre os jovens e em geral feita por eles mesmos na balada, misturando
energéticos em drinques. O perigo – real e comprovado pelas estatísticas
que temos à disposição – consiste no fato de que o efeito estimulante dos
energéticos mascara o efeito sedativo e depressivo do álcool, e assim impede
que seja percebido o estado de alteração etílica ou até de embriaguez. A
consequência é que quem consome a mistura não para e não deixa de beber
– ao contrário, continua a ingerir outras bebidas alcoólicas até chegar a
picos particularmente elevados de álcool no sangue, o que torna concreto
um risco crescente de comportamentos perigosos para ele próprio e para os
outros. E, de fato, os dados relativos a essas situações revelam um aumento
signi cativo de quedas, comportamentos violentos, brigas e acidentes,
sobretudo acidentes ao volante de automóveis ou com motos, com uma
frequência notadamente maior do que com o consumo apenas de álcool.
O motivo é fácil de se intuir: a periculosidade de um bêbado atordoado pelo
álcool ou jogado em uma poltrona é in nitamente menor do que a de um
bêbado mantido acordado arti cialmente (mas que, mesmo assim, sofre os
efeitos negativos do álcool sobre os re exos, a percepção do perigo, a
avaliação das próprias capacidades e a coordenação motora) que resolve
dirigir um veículo.

Essa capacidade, imaginada por muitos jovens, de suportar melhor o álcool


como um dos “méritos” dos energéticos não representa apenas uma
convicção equivocada, mas também um m em si mesmo. A verdade é bem
diferente: trata-se de uma crença que provoca situações de elevado risco
social, algo de que todos deveríamos tomar consciência e contribuir para
desconstruir, em nome do bem comum.
[15] Código europeu contra o cancro, constituído de doze recomendações para a redução do risco de

câncer. Disponível em: http://cancer-code-europe.iarc.fr (em português de Portugal).


6 ESPORTISTAS E “GERAÇÃO
SAÚDE”

QUEM PRATICA ESPORTES DEVE


CONSUMIR MUITO MAIS PROTEÍNAS E
VITAMINAS DO QUE QUEM NÃO PRATICA
É um mito muito presente no imaginário coletivo, de raízes culturais e
sociais profundas, mas absolutamente exagerado. Talvez esteja ligado à
ilusão de que comer mais garanta também mais energia, e sobretudo à ideia
de que, sendo os músculos constituídos por proteínas, é preciso comer
muita carne (ou um grande número de claras de ovo...) para construir mais
músculos.

Na verdade, essas convicções difusas decididamente devem ser


redimensionadas. Para os indivíduos ativos sicamente, são mais que
su cientes as quantidades de proteína normalmente indicadas para qualquer
pessoa – ou seja, para adultos, cerca de 1 g por quilo de massa corpórea por
dia, quantidade que deve ser bem subdividida entre as proteínas de origem
animal e as de origem vegetal. Somente aos esportistas e atletas cujas
atividades são caracterizadas por treinamentos contínuos, regulares e de
elevada intensidade é reconhecida uma necessidade proteica maior do que
os níveis recomendados anteriormente, a qual vai de 1,3 g a 1,5 g por quilo
por dia, com a possibilidade de aumentar até o máximo de 1,8 g
(aproximadamente), mas somente em situações especiais e por períodos de
tempo bem determinados. Apenas em pouquíssimos esportes de força e
potência máxima (como levantamento de peso, lutas, etc.), nos quais é
necessário desenvolver massas musculares particularmente volumosas, os
especialistas admitem que se possa subir até doses diárias de proteínas de 2
g a 2,5 g por quilo, para quem está em competição: mesmo nesses casos,
porém, deve ser por breves períodos e bebendo maiores quantidades de água
para assegurar a eliminação do aumento de resíduos nitrogenados.

Para ajudar a traduzir essas indicações em alimentos, especi camos que na


carne fresca as proteínas representam em média 20% do peso líquido (e de
16% a 19% no peixe), de 27% a 28% no presunto e no salame, e 32% na
bresaola;[16] nos derivados de cereais, o porcentual em peso de proteínas
varia de 6% a 7% nos biscoitos e no arroz, de 8% a 9% no pão e 11% no
macarrão; nas leguminosas, é de 22% a 23%, na soja, 19%; nos ovos inteiros,
de 12% a 13% (16% na gema e 11% na clara); nos queijos frescos oscila em
média de 17% a 20%, e nos queijos curados, de 25% a 29%; no leite integral,
3,3%, etc.

Como se vê, as quantidades de proteínas recomendadas para os esportistas


são, na grande maioria dos casos, quantidades que podem ser asseguradas
pela alimentação normal e respeitando a composição porcentual da dieta que
é válida para todos: as mais recentes recomendações para os italianos
aconselham que o teor de energia derivado das proteínas que entre 12% e
18% do teor calórico total.[17] E para chegar a esse nível, não há nenhuma
necessidade de recorrer a quantidades extraordinárias de alimentos
hiperproteicos, muito menos a suplementos de proteínas ou de aminoácidos
isolados, em pó ou em comprimidos.
Entre outras coisas, um aspecto muitas vezes negligenciado é o fato de que,
do ponto de vista da nalidade para a qual são consumidos, os excessos de
alimentos e de substâncias proteicas são inúteis, porque acabam por ser
utilizados pelo organismo para produzir energia. Além disso, esses excessos
podem ser prejudiciais, já que impõem uma sobrecarga de trabalho aos rins
e ao fígado, muitas vezes acarretando uma relativa carência de carboidratos
alimentares e de bras, bem como riscos de cetose e desidratação; e,
obviamente, também carregam consigo muitas gorduras e colesterol. Em
resumo, teores proteicos superiores a 2 g por quilo de peso não trazem
vantagem alguma para ns de incremento da massa muscular e melhoria do
desempenho esportivo.

Para concluir, segundo os LARN, “embora não haja dados relativos a uma
toxicidade aguda por excesso de proteínas, está provado que seu consumo
excessivo não oferece nenhum benefício para o estado de saúde e bem-
estar”.

Em síntese, não existem dietas “especiais” para esportistas e atletas. Muito


simplesmente, o esportista deve ser considerado um indivíduo sadio,
caracterizado por necessidades energéticas superiores àquelas do sedentário
em virtude do gasto energético aumentado, relacionado com o esporte que
pratica e com a intensidade e a duração dos treinos. Pois bem, essas
necessidades aumentadas devem ser garantidas respeitando as mesmas
regras e equilíbrios das porções alimentares que valem para todos,
aumentando sobretudo o teor de carboidratos no seu conjunto. O que
signi ca, para as várias categorias de carboidratos alimentares:
para a bra alimentar, o consumo de referência no adulto equivale a
12,6 g a 16,7 g para cada 1.000 kcal ingeridas diariamente, com um
mínimo de 25 g ao dia;

quanto ao consumo dos carboidratos simples, ou melhor, disponíveis


(como glicose, frutose, sacarose, lactose, etc.), os quais são digeridos e
utilizados rapidamente, e daqueles de nidos como complexos, ou
melhor, não disponíveis (formados por um número maior ou menor de
unidades simples, como o amido presente em vários cereais, legumes,
etc.), os quais são absorvidos mais lentamente por causa do maior
trabalho digestivo que exigem, os LARN sugerem respeitar uma
proporção de cerca de 1:4 em favor dos “não disponíveis”.[18]

Voltando às proteínas, é preciso notar que essa mesma dieta hipercalórica à


qual o atleta e o esportista têm direito bastará para assegurar um teor em
proteínas superior ao normal, e sem dúvida será su ciente para determinar
condições e funcionamento ideais também para massas musculares
particularmente desenvolvidas.

Um discurso semelhante vale também para as vitaminas. O esportista


“normal” obterá todas as vitaminas de que necessita de sua alimentação,
proporcionalmente mais abundante em relação àquela de um indivíduo
sedentário. Somente em períodos de treinamento particularmente
prolongados e intensos podem ser previstas doses aumentadas de vitamina
C, de vitamina E e das vitaminas do complexo B, porque elas estão
envolvidas nos processos metabólicos cuja função é utilizar os nutrientes
fornecidos pela dieta.
VITAMINAS E SAIS MINERAIS: QUANTO
MAIS, MELHOR
Pode parecer estranho, mas há quem acredite que, se certo suplemento
alimentar (ou até certo medicamento), consumido na dose certa, faz bem, o
mesmo produto poderá trazer benefícios ainda mais acentuados se
consumido em doses maiores.

É o fascínio pela suplementação a qualquer custo e pelas “megadoses”, muito


difundido especialmente entre os “supersaudáveis” ou os saudosistas de certa
“era de ouro” – que por sinal nunca existiu – na qual uma humanidade feliz
podia desfrutar à vontade de alimentos genuínos e naturais, ao passo que
hoje, segundo eles, os modernos tratamentos industriais e de conservação
teriam empobrecido os alimentos a tal ponto que existiriam sérios riscos de
carência de vários nutrientes importantes. Uma tese amplamente desmentida
por muitos aspectos, como a melhora das características físicas das novas
gerações, registrada em países desenvolvidos, ou o aumento da expectativa
de vida, entre outras. Fatos incontestáveis, sobre os quais certamente
in uem muitos fatores diferentes (melhor higiene pública, vacinações,
disponibilidade de medicamentos cada vez mais poderosos, etc.), mas para
os quais também contribui, sem dúvida, a grande disponibilidade de
alimentos de bom valor nutricional. Mas isso já é outra história.

O forte atrativo do recurso a suplementações com vários nutrientes em


doses mais elevadas do que as sugeridas é uma realidade bastante conhecida.
Desde sempre, ao compilar as recomendações acerca dos níveis
aconselháveis de absorção de nutrientes de acordo com a idade, o sexo, o
porte físico, o estilo de vida e as situações siológicas (crescimento,
gravidez, amamentação, etc.), as sociedades cientí cas de todo o mundo
sempre se preocuparam em incluir também os “tetos” de consumo, que seria
bom não ultrapassar. O mesmo tem sido feito na Itália desde o nal dos
anos 1970, com o acerto e a revisão sistemática do documento de consenso
que é resultado de um trabalho colegiado dos operadores da nutrição, e cuja
curadoria é feita pela Società Italiana di Nutrizione Umana (SINU). Trata-
se dos Livelli di Assunzione di Riferimento di Nutrienti ed energia per la
popolazione italiana (LARN), documento técnico consultado por todos que
operam no setor da nutrição no país.

Os LARN, cuja quarta revisão foi lançada recentemente, preveem a


indicação dos níveis recomendados de absorção e de uma absorção
adequada para os vários princípios nutricionais, entre outras coisas. Além
disso, como já dissemos, estabelecem também um “upper level” (UL)
indicado justamente como “nível máximo tolerável de absorção”, ao menos
para todos os nutrientes sobre os quais dispomos de dados su cientes.
Conforme explicam, trata-se “do valor mais elevado de absorção desse
nutriente que se considera não ser associado a efeitos adversos na saúde da
totalidade dos indivíduos de um grupo populacional especí co”. O consumo
rotineiro acima do UL aumenta o risco de efeitos adversos, ao passo que
manter-se habitualmente abaixo do UL permite evitar o perigo de que tais
efeitos se manifestem. O documento também diz que, uma vez superado o
nível máximo, particularmente no caso de absorção crônica, o risco
potencial de efeitos adversos cresce com o aumento do teor.[19]

É sempre ao bom senso que devemos recorrer. E esse é o aspecto ignorado


ou negligenciado por muitos “supersaudáveis” amantes das megadoses de
vitaminas, proteínas, sais minerais e vários outros princípios nutricionais:
muitas substâncias que são importantes para a nossa saúde e das quais
necessitamos, se forem consumidas em doses escassas demais por muito
tempo, provocam uma série de distúrbios por carência – mas também
podem, ao contrário, criar até problemas graves quando exageramos em seu
consumo. De fato, não são poucos os princípios que, se presentes em
quantidade excessiva no nosso organismo, podem tornar-se prejudiciais ou
até tóxicos. E quando essas situações perigosas acontecem, as causas quase
nunca estão em erros alimentares, mas com frequência no uso irresponsável
desses suplementos, em pó ou em comprimidos, que são vendidos
livremente e empurrados por campanhas publicitárias que conhecem muito
pouco os limites ao alardearem suas supostas vantagens, na maioria dos
casos passando batido pelos riscos de doses excessivas.

A lista é longa, mas é encabeçada pelas vitaminas lipossolúveis, as quais


desde sempre atraíram a atenção dos estudiosos exatamente por essa
característica que as torna capazes de se depositar no tecido adiposo e na
gordura presente em órgãos e tecidos, e também de serem eventualmente
liberadas em tempos breves e quantidades notáveis (por exemplo, no caso
de emagrecimento rápido). São justamente essas vitaminas (A, D, K e E) as
mais propensas a provocar casos de “hipervitaminose”, síndromes bem
conhecidas clinicamente e identi cadas com precisão. Alguns breves
exemplos são: o excesso de vitamina A pode provocar, além da xantocromia
– ou seja, a coloração amarelo-alaranjada da pele da palma das mãos (por
carotenoides) –, outros problemas dermatológicos, bem como anorexia e
cefaleias, irritabilidade, dores nos ossos, hipertro a do baço e do fígado.
Vitamina K demais pode causar distúrbios gastrointestinais, anemia
hemolítica e danos ao fígado. O excesso de vitamina E pode comprometer a
capacidade de coagulação do sangue. E merece particular atenção a vitamina
D, que muitas vezes é (oportunamente) receitada na forma de preparados
oleosos a serem consumidos habitualmente: ultrapassar as doses indicadas
pelo médico traz o risco de intoxicação aguda ou crônica, com náuseas,
diarreia, perda de peso, presença excessiva de cálcio no sangue e na urina,
cálculos e reduzida funcionalidade nos rins, além de calci cação de tecidos
moles ou das paredes dos vasos sanguíneos.

Por sua vez, as vitaminas solúveis em água, cujo excesso é normalmente


eliminado com facilidade pelos rins, apresentam riscos menores de
hipervitaminose, mas isso não signi ca que eles estejam de todo ausentes:
por exemplo, o excesso de vitamina B6 pode provocar uma neuropatia
periférica sensorial; ácido fólico demais pode causar complicações
neurológicas; vitamina PP (niacina) em demasia, rubor cutâneo transitório.
Até com a amadíssima vitamina C é melhor tomar cuidado: de fato, a
popularidade dessa vitamina muitas vezes a torna objeto de autoprescrições
“megavitamínicas”, com doses que chegam a exceder em dez (e até mais)
vezes as recomendadas. Foram relatados distúrbios como diarreia osmótica e
outros problemas gastrointestinais, excesso de ácido úrico na urina, cálculos
renais de oxalato (em quem tem predisposição), potencialização dos efeitos
negativos dos estrógenos, etc. Não se trata de relatos frequentes, e a
toxicidade aguda dessa vitamina é muito baixa, mas também para a C vale a
cautelosa regra áurea de não se exceder, nem nas doses elevadas, nem na
duração do período de suplementação. Para essa vitamina, os LARN não
estabelecem um UL, em razão da falta de dados su cientes sobre sua
toxicidade; no entanto, de acordo com um documento de 2006 da EFSA,
recomenda-se não superar habitualmente a absorção de 1 g ao dia: doses
mais elevadas aumentam o risco de ter efeitos gastrointestinais adversos, os
quais podem surgir com doses de 3 g a 5 g ao dia. Ao que parece, doses de
1,5 g ao dia não trazem risco de cálculos renais. Em todo caso, os níveis
recomendados pelos LARN são de 85 mg ao dia para as mulheres (100 mg
durante a gravidez, 130 mg somente durante a amamentação) e 105 mg
para os homens.[20] Valores bem distantes, como se vê, das doses prediletas
dos maníacos por suplementação. Avalia-se que a dose máxima absorvível
diariamente de alimentos ricos em vitamina C esteja por volta de 400 mg:
doses superiores, portanto, só são alcançadas com o uso de suplementos
farmacêuticos.

E também com os sais minerais – que se tornaram metas privilegiadas das


campanhas publicitárias atualmente – é preciso manter o equilíbrio. Os
riscos maiores se concretizam nos casos de absorção “aguda” de doses
exageradas, a ponto de superar a grande capacidade que o nosso organismo
tem de se adaptar graças a uma série de mecanismos de reequilíbrio e
compensação. Todavia, mesmo ingerir por longos períodos uma dose mais
razoável, mas ainda assim elevada, pode produzir perigosos fenômenos de
acumulação.

Limitemo-nos aos sais minerais mais “populares”. Hoje o magnésio está


muito em voga, porque tem certa e cácia contra a dor de cabeça e também
contra cãibras musculares, já que reduz a hiperexcitação dos nervos. Mas
exagerar não é bom: um consumo elevado e/ou prolongado demais de
magnésio em suplementos ou medicamentos, em especial quando associado
a alterações da função renal, pode provocar náuseas, vômito, hipotensão,
bradicardia, distúrbios intestinais e depressão do sistema nervoso central.
Doses excessivas de ferro em suplementos podem gerar fenômenos de
toxicidade aguda, com distúrbios gastrointestinais seguidos de efeitos nos
sistemas cardiovascular, nervoso, hepático e renal, até a hemocromatose (o
acúmulo progressivo do mineral em diversos órgãos e tecidos, uma condição
hereditária bastante comum na Europa). Zinco demais consumido em
suplementos pode causar distúrbios intestinais, febre e interferências no
metabolismo do cobre e do ferro. Demasiado iodo pode causar
hipertireoidismo, doenças autoimunes e reações de hipersensibilidade. Uma
intoxicação aguda por excesso de cobre pode provocar danos ao fígado.
Exagerar nos suplementos de selênio (um mineral que tem participação
válida no sistema de defesa antioxidante das células) pode levar à dermatite
edemática, a alterações nas unhas e nos cabelos, a distúrbios
gastrointestinais e a anomalias neurológicas.

Quanto ao cálcio, os LARN recomendam, para adultos, o consumo diário de


1.000 mg (1.200 mg para mulheres após a menopausa) para a manutenção
da massa óssea,[21] e também lembram que as evidências experimentais não
justi cam a utilidade de suplementações relevantes de cálcio acima de tais
doses, frisando que o uso inadequado de suplementos cria o risco de
provocar absorções excessivas a ponto de se aproximar do nível máximo
tolerável de 2.500 mg ao dia. Os possíveis efeitos tóxicos resultantes do
consumo exagerado são, sobretudo, excesso de cálcio no sangue (com
sintomas como náuseas, prisão de ventre, desidratação, etc.), calci cações
vasculares, insu ciência renal, nefrocalcinose e formação de cálculos renais.
Também é preciso lembrar, porém, que uma presença maior de cálcio no
intestino favorece a formação de oxalato de cálcio insolúvel, o que reduz
tanto a absorção do ácido oxálico quanto sua excreção pelos rins – este, por
sua vez, é um fator de risco para a formação de cálculos renais de oxalato.

Também é bom não se exceder com o potássio, elemento essencial no nosso


organismo em tantos processos fundamentais e atualmente tão alardeado (e,
portanto, também “autorreceitado”) para combater, por exemplo, os efeitos
negativos da transpiração abundante (cãibras musculares e outros): uma
introdução excessiva de potássio na forma de suplementos pode manifestar
uma toxicidade tanto aguda quanto crônica, especialmente na presença de
complicações da sua excreção pela urina. Segundo os LARN, é oportuno que
os suplementos farmacológicos de potássio sejam evitados na primeira
infância e sejam ingeridos na idade adulta sob estrito controle médico.

E pode causar surpresa descobrir que existem riscos também nas doses
excessivas de outros componentes alimentares, inclusive alguns realmente
“insuspeitáveis”. Tomemos como exemplo os ácidos graxos poli-insaturados
(AGPI), aqueles vistos pelo imaginário coletivo – em seus dois grandes
grupos, os ômega 6 e os ômega 3 – como “bons” por excelência,
especialmente por sua e cácia em melhorar o quadro das gorduras
circulantes no sangue (em especial colesterol e triglicérides) tanto
quantitativa quanto qualitativamente. Também para eles, os LARN, em
acordo com a Food and Agriculture Organization of the United Nations
(FAO-OMS)[22] e com a EFSA, indicam intervalos de referência para uma
dose correta, que deve ser calculada em relação ao consumo total de energia:
de 5% a 10% da energia total para os AGPI considerados conjuntamente
(sendo que, na realidade, na dieta dos italianos estamos em 4% a 5%), e,
para as duas categorias, 4% a 8% para os ômega 6 (cuja disponibilidade
depende exclusivamente da dieta) e 0,5% a 2% para os ômega 3, dos quais
pelo menos 250 mg ao dia já na forma de cadeia longa, ou seja, EPA e
DHA[23]. A disponibilidade destes últimos depende tanto da alimentação
quanto de processos de conversão, que infelizmente acontecem de maneira
muito limitada no nosso organismo. Também é importante que na
alimentação os ômega 6 e os ômega 3 tenham a razão correta entre si
(cerca de 5:1), o que atualmente não é nada respeitado (os italianos estão
perto de uma razão 10:1!), sobretudo por causa da insu ciente presença dos
ômega 3 na dieta costumeira.

Como se vê, é preciso prestar atenção principalmente a um aumento do


consumo dos ômega 3, e em particular aos de cadeia longa (EPA e DHA),
para melhorar a qualidade das gorduras da alimentação. Realmente vale a
pena: sua absorção correta – que também é possível obter por meio de uma
suplementação direcionada e sensata, bem como com a ajuda de produtos da
indústria alimentar estudados ad hoc – demonstrou ter muitos efeitos
positivos, como na redução dos riscos cardiovasculares e do aparecimento
de alguns tumores, no ritmo cardíaco, na prevenção das tromboses, no
funcionamento do sistema imunológico, na diminuição dos níveis de
triglicérides no sangue, na funcionalidade do encéfalo, etc. Lembramos ainda
que as quantidades certas desses preciosos nutrientes são difíceis de obter
sem consumir com frequência produtos pesqueiros: por exemplo, foi
demonstrado que para a prevenção primária das doenças cardiovasculares
são necessárias quantidades de DHA iguais às contidas em duas ou três
porções semanais de peixe. E a recente introdução, no mercado, de produtos
de vários tipos enriquecidos com esses ácidos graxos poderá provavelmente
facilitar a obtenção dos níveis recomendados também recorrendo a
alimentos e preparações diferentes dos produtos da pesca.

São nutrientes preciosos, portanto, esses ácidos graxos ômega 3. Também no


caso deles, porém, o uso de doses suplementares excessivas traz o risco de
provocar alguma consequência negativa. A disponibilidade nas farmácias de
suplementos prontinhos para uso pode levar alguém a adotar o princípio do
“quanto mais, melhor” e introduzir doses maciças de ômega 3, talvez até por
longos períodos: existem algumas dietas populares que parecem sugerir usos
desse tipo. As consequências podem ser um excesso de uidez do sangue,
com problemas de baixa coagulação, e, em casos extremos, derrames
hemorrágicos, membranas celulares mais uidas e expostas a maiores riscos
de oxidação na ausência de uma maior proteção (mais vitamina E, por
exemplo), um retardamento da utilização dos ômega 6 (eles também, como
dissemos, com muitas funções positivas na saúde humana) pela competição
bioquímica, etc.

Outra mania muito comum em nossos dias é a de consumir generosas


suplementações de proteínas na ilusão de estimular a síntese das proteínas
corporais e assim aumentar a massa muscular. Felizmente, não existem
dados de toxicidade aguda por excesso de proteínas, e, segundo os LARN,
mesmo o consumo do dobro do recomendado pode ser considerado seguro,
embora não estejam descartadas consequências negativas para teores
maiores que esse limite.[24] Os LARN não estabelecem, portanto, um UL
para as proteínas, embora aconselhem moderação e prudência, sublinhando
que “um consumo excessivo de proteínas não oferece nenhum benefício ao
estado de saúde e bem-estar”. O Ministério da Saúde italiano, por sua vez,
impôs somente limites qualitativos à suplementação proteica para esportistas
(nada de aminoácidos isolados demais), lembrando que “ao determinar as
quantidades recomendadas, devem-se levar em conta as outras fontes de
proteínas consumidas com a dieta”.

Não é supér uo, en m, repetir que teores diários de proteínas superiores a


2 g por quilo de massa não trazem nenhuma vantagem relativa ao
incremento da massa muscular e à melhoria do desempenho esportivo, e que
esses teores podem ser obtidos com a alimentação normal, sem a
necessidade de recorrer a produtos dietéticos especí cos constituídos por
proteínas ou aminoácidos isolados. Em geral, os suplementos fornecem, para
cada dose, um mínimo de 7 g até um máximo de 15 g de proteínas ou de
aminoácidos, os quais podem estar presentes como aminoácidos isolados ou
como misturas. Se as doses indicadas forem seguidas, é improvável que se
chegue a uma superdosagem – a qual é possível, no entanto, no caso de uso
inadequado do produto, considerando também que esses suplementos têm
venda liberada.

Sim, porque mais um exemplo de como o magnetismo da publicidade e a


propagação descontrolada, boca a boca, de meras experiências pessoais pode
in uir em nossas escolhas é o caso do uso exagerado dos aminoácidos de
cadeia rami cada (conhecidos como branched-chain amino acids ou BCAA).
Como veremos no tópico sobre os suplementos esportivos, os BCAA são
três aminoácidos essenciais (leucina, isoleucina e valina) muito populares
por certa capacidade de promover a síntese proteica, de fornecer energia e
de favorecer a recuperação muscular depois de uma lesão ou de uma carga
de trabalho particularmente intensa. O problema é que as mensagens que
alardeiam ações dos BCAA na internet (e não apenas ali), do tipo “destruir
os excessos de gordura, construir quilos de novos músculos, modelar o
corpo e dar uma carga de energia”, são justamente o que pode impulsionar
os internautas mais despreparados em busca de megadoses. Trata-se de
a rmações fantasiosas, claro, mas que perigam encontrar terreno fértil
sobretudo em certos ambientes esportivos e nas academias. Por isso, não é
inútil lembrar uma vez mais que as vantagens de uma forte suplementação
de BCAA são duvidosas, que esses aminoácidos estão amplamente presentes
nas proteínas dos alimentos comuns e que o consumo de doses excessivas
pode interferir na utilização normal dos outros aminoácidos.
Em todo caso, é preciso ter em mente que o consumo diário de BCAA não
deveria superar os 5 g; que é aconselhável a associação com as vitaminas B1
e B6; que suas embalagens devem alertar no rótulo que, para um uso mais
prolongado do que seis ou oito semanas, é necessário o parecer de um
médico; e também que o produto é contraindicado nos casos de patologia
renal, na gravidez e para menores de 12 anos. Acrescentamos que os
suplementos proteicos devem ser considerados produtos nutricionalmente
pobres em comparação com as proteínas contidas nos alimentos: de fato,
faltam-lhes os vários fatores nutricionais que aumentam a
biodisponibilidade recíproca dos nutrientes presentes na comida. Além
disso, seu uso indiscriminado, sobretudo se for iniciado na juventude, pode
não ser de todo desprovido de perigos para a saúde, e poderia facilitar
especialmente certa dependência psicológica da busca de medicamentos
capazes de melhorar arti cialmente o desempenho atlético.

Na verdade, não são poucos os exemplos de como um imprudente “excesso


de entusiasmo” e certas xações vagamente maníacas, além de serem inúteis,
podem provocar efeitos desfavoráveis na saúde. Um último exemplo diz
respeito ao licopeno. Todos já ouviram falar dele: trata-se de um carotenoide
presente nas frutas e nas hortaliças, dotado de uma excelente ação
antioxidante – decididamente é um dos principais antioxidantes fornecidos
pela alimentação. Pois bem, também para o licopeno, que é usado como
corante especialmente em bebidas sem álcool, um grupo de especialistas da
EFSA julgou necessário xar uma dose total diária aceitável de 0,5 mg por
quilo de massa corpórea.

Isso para frisar mais uma vez que, para qualquer substância, mesmo a mais
bené ca, existem limites de absorção, os quais não é aconselhável
ultrapassar. Portanto, evitemos nos deixar levar pelo fascínio das megadoses
e em vez disso usemos o bom senso e a moderação para obter as maiores
vantagens possíveis de tudo o que a indústria dos alimentos – e também a
farmacêutica – conseguem pôr hoje à nossa disposição.

OS SUPERALIMENTOS TÊM PROPRIEDADES


CURATIVAS
É um dos mitos do momento, sabiamente construído por sites da internet
que exaltam as “mágicas” propriedades terapêuticas de uma série de
produtos exóticos, provenientes das tradições da América Latina ou do
Oriente; produtos que depois – veja só que coincidência – os mesmos sites
oferecem para venda com entrega domiciliar.

Comecemos pela própria de nição. O nome “superalimento” já é por si só


enganoso e indevido, visto que esses produtos (nada baratos) não contêm
nada que não possa ser encontrado em nossos alimentos comuns do dia a
dia e não possuem nenhuma propriedade salutar especial. Quem os promove
se aproveita do fascínio do exótico, que tão facilmente nos cativa e nos
impele a cultivar a ilusão de que se possa encontrar em algum alimento
incomum a fórmula capaz de prevenir doenças e reforçar misteriosamente a
nossa saúde.

Tudo isso bate de frente com os princípios basilares da ciência da nutrição,


segundo os quais não existem alimentos “bons” e “ruins” e que na verdade
não precisamos de superalimentos, mas, sim, de um uso correto dos
alimentos que temos à disposição, ou seja, de recorrer habitualmente a uma
dieta completa e equilibrada, que é perfeitamente capaz de nos fornecer
sozinha todos os nutrientes de que precisamos e de nos ajudar a desfrutar
de boa saúde.

E é sintomático que também para esses supostos “superalimentos”, como


para tantas bizarras dietas sazonais que aparecem e desaparecem velozmente
todo ano, ninguém consiga (e às vezes nem tente) fornecer provas
convincentes de sua e cácia, mas em vez disso tente torná-los atraentes
a rmando que famosos atores ou atrizes, cantores de sucesso ou campeões
do esporte os usam muito (ou, no caso das dietas, adotam-nas sem
reservas), com resultados bombásticos no âmbito do rejuvenescimento, da
forma física e da saúde mental. Sob esse aspecto, já de saída o sistemático
recurso dos depoimentos de celebridades deveria bastar para despertar
suspeitas e nos levar a descon ar a priori dessas notícias que, em vez disso,
apesar de todos os desmentidos, são aceitas frequentemente como verdades.

E às vezes as celebridades também se empenham pessoalmente em se tornar


fabricantes de fake news, causando problemas graças à força de persuasão
que deriva do seu fascínio e de sua ampla visibilidade. Os exemplos não são
poucos. Recentemente lemos sobre uma famosa atriz, já premiada com o
Oscar, que criou há anos um site no qual lança (assim foi escrito)
“contínuas propostas-balelas”, com predileção particular pelo campo da
medicina – ela acabou merecendo, por essa sua atividade, até um
desmentido o cial da NASA quando exaltou certos curativos energéticos
que haviam sido criados, segundo a atriz, para os astronautas, e que seriam
capazes de reequilibrar “a frequência energética do corpo”, uma expressão
francamente enigmática. Mas não é só isso: à mesma atriz foi dedicado um
livro, escrito por um professor universitário canadense, com o único
objetivo de listar e rebater as várias ideias insensatas que ela propaga sem
parar. Pois bem, entre essas a rmações discutíveis não faltava, para
embarcar na moda, o encorajamento a comer goji berries em grande
quantidade, porque são “cheias de antioxidantes”.

Voltando aos supostos “santos remédios” com nomes exóticos, estes


exemplos esclarecerão melhor por que na verdade eles não desfrutam de
nenhuma virtude nutricional.

As goji berries, das quais existem dois tipos principais, vêm do Tibete e da
China e são utilizadas na medicina chinesa como tônicos e sobretudo para
combater doenças respiratórias e estimular o sistema imunológico. São
consumidas secas, in natura ou em pó. Têm uma boa quantidade de
antocianinas (polifenóis antioxidantes), licopeno (outro poderoso
antioxidante) e muita bra, além de algumas vitaminas e sais minerais. Pois
bem, todas as hortaliças e frutas de cor vermelho-arroxeada – como as
frutas vermelhas, a cereja, o tomate, etc. – são ricas em antocianinas. O
tomate também é riquíssimo em licopeno. A bra é fornecida
abundantemente por qualquer castanha ou fruta seca, por legumes e várias
hortaliças. Quanto às goji berries, é preciso ressaltar um alerta que apareceu
muito recentemente na Revue Française d’Allergologie sobre alguns casos de
reações alérgicas bastante graves veri cados em uma dezena de pacientes
após consumirem essa fruta (alguns dos quais, porém, eram atópicos, ou
seja, predispostos a esses fenômenos). As veri cações feitas indicaram que
algumas proteínas das goji berries foram responsáveis pela reação anormal,
um detalhe con rmado por estudos realizados na Espanha. Em alguns casos,
bastou até o consumo de uma única fruta para desencadear a reação, muitas
vezes associada a outros tipos de alergia. É oportuno que esse poder
alergizante seja conhecido, até porque os derivados das goji berries entram
na composição de vários cosméticos.

Os grãos de chia, típicos das Américas Central e do Sul, e ligados até (ao
que parece) à civilização asteca, são apresentados sobretudo como
riquíssimos em cálcio e em ácidos graxos ômega 3. Ora, além do fato de que
não há nenhuma notícia sobre a biodisponibilidade desses nutrientes (aliás,
é cabível duvidar dela), é impossível esquecer que as fontes privilegiadas de
ômega 3 (e especialmente daqueles de cadeia longa, os mais difíceis de
encontrar) continuam sendo os produtos pesqueiros e, em segundo lugar, as
castanhas, enquanto o cálcio é fornecido de uma forma muito fácil de
absorver e assimilar pelo leite e pelos laticínios, pela água potável,[25] pelos
vegetais crucíferos, etc.

E poderíamos continuar com a couve frisada ou kale (rica em compostos


sulfurosos com poder preventivo de certos tumores – exatamente, porém,
como os nossos mais humildes brócolis e couve- or), com a romã (que
contém muitas antocianinas – presentes, de qualquer forma, em muitas
outras frutas e hortaliças) e com o abacate, que, sim, é rico em ácidos graxos
monoinsaturados e poli-insaturados, mas também contém 23% de gorduras,
que fazem seu poder energético ser de assombrosas 230 kcal a cada 100 g:
além disso, os mesmos ácidos graxos podem ser encontrados
confortavelmente no azeite de oliva extravirgem e em outros óleos vegetais,
bem como no peixe, nas castanhas, nas azeitonas e em muitas hortaliças.

En m, não há mal nenhum em permitir-se “também” o consumo desses


produtos exóticos, se realmente assim desejamos e se consumi-los nos dá
uma ilusória sensação de segurança. Mas façamos isso sem nunca esquecer
que a de nição de “superalimentos” ou de “alimentos salutares” é arbitrária
e imerecida. Não existem “comidas saudáveis” – existe, em vez disso, uma
“dieta saudável” equilibrada, que pode nos ajudar a viver bem, inspirada no
modelo alimentar mediterrâneo, ou seja, rica em hortaliças e frutas, capaz de
fornecer todos os antioxidantes, a bra, a água, as vitaminas e os sais
minerais de que precisamos, com as quantidades certas de proteínas,
gorduras e açúcares simples – e, portanto, também de calorias.

QUEM PRATICA ESPORTES PRECISA


TOMAR SUPLEMENTOS
É uma ideia errada. Uma pessoa em boa saúde e que se alimenta
corretamente não tem nenhuma necessidade de consumir suplementos de
forma habitual (para situações ambientais especiais e incomuns e para
provas físicas particularmente extenuantes, a história é outra), nem mesmo
se pratica esportes todos os dias.

O uso de suplementos, tanto aqueles com nalidades energéticas quanto


aqueles do tipo vitamínico-mineral, pode ser justi cado somente para atletas
pro ssionais de alto nível, e sempre sob supervisão médica. Nem mesmo
passar um par de horas na academia de quatro a cinco vezes por semana
determina a necessidade de recorrer a suplementações proteicas ou
vitamínicas. E tampouco é verdade que uma hora de esforço atlético ou de
corrida torne indispensável tomar bebidas suplementadas com sais minerais
(as quais, entre outras coisas, representam também um acréscimo de
calorias). De fato, somente após um exercício muito intenso e prolongado
pode tornar-se necessário repor os sais que foram perdidos por causa de
uma transpiração particularmente abundante, e também nesse caso o líquido
de que mais necessitamos continua sendo principalmente a água: a nal, o
suor é composto por mais de 99% de água e somente uma mínima parte de
substâncias orgânicas (cerca de 0,2%) e inorgânicas (cerca de 0,7%).

Efetivamente, a alimentação de quem pratica esportes não deve se afastar


dos costumes inspirados no modelo alimentar mediterrâneo e somente se
diferencia da alimentação “normal” pelo aumento do teor energético e por
uma necessidade maior de água. O primeiro deve ser garantido
aumentando-se sobretudo o consumo de carboidratos, principalmente os
complexos, enquanto a segunda é satisfeita bebendo água normal, potável, de
forma gradual e adequada em relação às perdas, tanto antes quanto durante
e depois da atividade física.

Também para o eventual aumento da necessidade proteica determinado por


um treino contínuo, regular e de elevada intensidade, é preciso evitar tanto
a autoprescrição de suplementos proteicos quanto causar desequilíbrio na
própria dieta, consumindo quantidades exageradas de alimentos ricos em
proteínas: a melhor opção é seguir os conselhos dos especialistas em
medicina esportiva, que em geral trabalham junto dos atletas de alto nível,
mas que muitas vezes estão à disposição para oferecer consultoria em
sociedades esportivas e nas academias mais organizadas. E, portanto,
também os esportistas “amadores” que mesmo assim desejem utilizar
suplementos de uso mais corrente e facilmente disponíveis, como aqueles à
base de ácidos graxos ômega 3 – os preparados multivitamínicos ou de
aminoácidos de cadeia rami cada –, é bom que perguntem sempre a opinião
de um médico esportivo.
Os aminoácidos de cadeia rami cada (BCAA) merecem menção particular,
considerando sua popularidade nos ambientes esportivos. Trata-se de três
aminoácidos essenciais (leucina, isoleucina e valina) que seriam capazes de
promover a síntese das proteínas (efeito anabolizante), de favorecer os
processos de recuperação depois de uma carga de esforço muscular ou de
uma lesão, e de ter um efeito energético. De fato, existem estudos na
literatura que demonstram certa e cácia em melhorar o desempenho
esportivo, em doses que variam de 0,1 g a 0,25 g por quilo de massa
corpórea; mas trata-se de dados pouco unânimes entre si, sobre os quais
permanecem fortes dúvidas, sobretudo quanto aos eventuais benefícios reais
no apoio ao desempenho atlético de resistência. E não se pode esquecer que
esses três aminoácidos são amplamente presentes – e nas proporções
corretas – nas proteínas dos alimentos comuns, os quais, portanto, se
consumidos na quantidade e variedade certas, são capazes de satisfazer até
as necessidades diárias aumentadas de um atleta.

Mas muitas vezes o uso de suplementos de BCAA é motivado também pela


esperança de obter aumentos da quantidade circulante de hormônio do
crescimento (growth hormone ou GH) e, portanto, determinar um
incremento da força e da massa muscular. A análise dos dados disponíveis,
porém, parece desmentir qualquer efeito do tipo em atletas sadios, bem
alimentados e bem treinados: nesses casos, o treinamento e o já elevado teor
de aminoácidos fornecido pela comida seriam su cientes, por si só, para
obter o máximo estímulo possível do GH, de forma que o uso de
suplementos proteicos e de aminoácidos não levaria a nenhum aumento da
concentração plasmática desse hormônio.
Voltando ao tema mais generalizado dos suplementos esportivos, é preciso
sublinhar novamente a importância de consumi-los com cuidado e com a
ajuda dos especialistas do ramo para determinar a quantidade e a duração da
suplementação. Esses aspectos devem ser estabelecidos levando-se em conta
muitos fatores, como a idade, o sexo, o estado nutricional inicial, as cargas
de esforço, a composição corporal, eventuais carências nutricionais, etc.

TISANAS, ALIMENTOS ESPECIAIS E


REGIMES DRÁSTICOS PURIFICAM E
DESINTOXICAM O ORGANISMO
“Puri cação” e “desintoxicação” são termos muito em voga e muito
fascinantes, mas sem nenhum signi cado verdadeiro, ao menos na acepção
que é comumente usada. Não é por acaso que eles praticamente só aparecem
em certos sites da internet e nos textos que podem ser de nidos como
“populares” no sentido pejorativo do termo, ou seja, textos que tendem
quase que exclusivamente a impressionar a fantasia do leitor e se preocupam
muito pouco em informar da maneira correta ou fazer referências de forma
equilibrada somente àquilo que se baseia em provas cienti camente válidas e
aceitas pela medicina o cial.

O fato é que expressões semelhantes não aparecem quase nunca nas


diretrizes o ciais, nos documentos de consenso produzidos pelas sociedades
cientí cas e nas recomendações alimentares das instituições credenciadas.

No campo da alimentação, “puri car-se” e “desintoxicar-se” representam,


substancialmente, um falso problema. É verdade, porém, que o mito do
binômio intoxicação-desintoxicação é muitíssimo popular, a ponto de o
departamento de medicina da Harvard ter julgado necessário fazer um
pronunciamento como autoridade sobre isso, publicando um documento
o cial para tentar reconduzir a questão aos seus limites justos.

Termos desse tipo só podem ser usados quando falamos de venenos, de


medicamentos, de substâncias psicotrópicas ou de álcool – casos muito
particulares, nos quais a desintoxicação será realizada mediante
procedimentos especí cos e protocolos sobre os quais existe o consenso da
comunidade cientí ca.

Já no tocante a certas “toxinas” genéricas e não muito especi cadas que nos
a igiriam por causa – dependendo das diferentes teorias – do estresse, da
poluição da vida moderna ou dos alimentos industrializados e empobrecidos
de hoje em dia, tão diferentes daqueles de uma hipotética “era de ouro” (que
na realidade a humanidade jamais conheceu), ou de mil outras causas, todas
relacionadas ao mundo moderno, felizmente existe bem pouca coisa na
verdade. As únicas “toxinas” de que se pode falar em uma pessoa sadia não
são mais do que os detritos normais que se formam durante os processos
siológicos do nosso catabolismo. Detritos cuja formação é amplamente
prevista pelo nosso corpo, o qual, de fato, está perfeitamente equipado para
contê-las e eliminá-las sozinho, de forma totalmente autônoma,
autodepurando-se dia após dia graças à ação do fígado, dos rins e do
aparato gastrointestinal, justamente os órgãos que são responsáveis por
desempenhar essas tarefas.

Resumindo, não são necessários sucos, tisanas, “gororobas”, “superalimentos”


exóticos ou regimes de emergência, mais ou menos “orientaloides” para nos
salvar dos “venenos” da vida moderna: tais artifícios não cumprem nenhuma
de suas promessas. A verdade, como lembra o cialmente a renomada Mayo
Clinic, é que quem desfruta de boa saúde não tem nenhuma necessidade de
“puri car” o próprio corpo. Para estar bem, é mais do que su ciente adotar
um estilo de vida ativo e ser moderado e ponderado em tudo, tanto na
alimentação diária (por exemplo, dando preferência a alimentos integrais,
bebendo muita água e reduzindo o uso de produtos muito processados)
quanto nos hábitos e nas pequenas extravagâncias do dia a dia.

EM ÉPOCA DE PROVAS, É PRECISO COMER


MUITO MAIS
Trata-se de uma ideia errada, que se baseia sobretudo no ímpeto afetivo que
surge ao ver os lhos debruçados sobre os livros por horas e horas nos dias
que precedem um exame ou qualquer prova emocionalmente estressante. E
há quem note, com perspicácia, que o aspecto inevitavelmente pálido e
fatigado de quem cou trancado por muito tempo em um quarto, sem se
permitir um mínimo bronzeado, também induz os pais a exagerar no zelo
com a alimentação...

Na base de tudo isso existe e resiste um grande equívoco. É verdade que o


funcionamento do cérebro – que representa apenas 2%, aproximadamente,
da nossa massa corpórea total – requer o consumo de uma quantidade
relevante de energia: cerca de um quinto, e até um quarto, de todo o nosso
consumo energético basal (termo que indica a quantidade de energia
utilizada por nós em condições de repouso absoluto e neutralidade térmica).
O principal combustível do cérebro é a glicose, e esse órgão também regula
o equilíbrio energético do corpo, no sentido de que é informado pelos
sistemas periféricos sobre o estado das reservas energéticas mediante alguns
sinais, tanto de tipo nervoso quanto hormonal, e por sua vez age de várias
maneiras para regular o consumo de alimentos.

Mas de que forma o cérebro “queima” energia para funcionar? Ele faz isso,
em grande parte, por meio do trabalho desenvolvido pelas sinapses, ou seja,
os pontos de contato pelos quais as células nervosas se comunicam entre si
– e que são cerca de um quatrilhão. Mas o fato fundamental é que,
substancialmente, esse consumo de energia não depende do quanto a
atividade do cérebro é intensa – isto é, ele permanece praticamente
inalterado quer a pessoa esteja descansando, quer esteja re etindo ou
estudando intensamente. Já foi demonstrado que 45 minutos de trabalho
intelectual fazem consumir apenas 3 kcal a mais em comparação ao
consumo durante o repouso; ou seja, quase nada. Não existe, portanto,
nenhuma necessidade de se superalimentar nessas situações em que, entre
outras coisas, somos forçados à inatividade durante as muitas horas que
passamos debruçados sobre os livros.

E conscientizar-se de tudo isso é ainda mais importante à luz de alguns


estudos que demonstraram uma nítida tendência, por parte de jovens muito
empenhados nos estudos, a comer mais do que o normal, talvez por causa
do estresse e de variações nos níveis de alguns hormônios (cortisol e
insulina). E o fato de que as atividades que utilizam muito o cérebro e
pouco os músculos podem motivar, por si só, a comer mais, constitui mais
um alerta para aqueles que querem evitar um indesejado aumento de peso
coincidente com a época de provas.

En m, nos períodos críticos de estudo intenso, os estudantes não precisam


de maiores quantidades de comida. Em geral, também é preciso lembrar que
não existe nenhum alimento (como peixe ou outras fontes de fósforo),
assim como nenhum esquema alimentar capaz de melhorar o aprendizado,
reforçar a memória ou aumentar a agilidade mental. E a glicose necessária
para o sistema nervoso pode ser tranquilamente obtida, nas quantidades
requeridas, por uma dieta normal, equilibrada e variada. Em vez de se
preocupar com isso, seria muito útil distribuir a alimentação diária por no
mínimo cinco refeições, baseando-a sobretudo em frutas e hortaliças, além
de porções moderadas de macarrão e arroz (ótimas fontes de amido e
açúcares), e reduzindo as gorduras e os pratos abundantes demais em geral.

Seria bom começar pela manhã com um belo desjejum, rico em alimentos
que contenham tanto açúcares simples (de liberação rápida) quanto
complexos (de liberação mais lenta), capazes de alimentar o cérebro
imediatamente e também durante as três ou quatro horas seguintes – por
exemplo, biscoitos, torradas, pão, cream crackers ou ocos de cereal, geleia
ou mel, além de leite ou iogurte. É bom que as refeições não sejam de
dimensões excessivas, inclusive a m de favorecer uma volta mais rápida aos
estudos nas horas pós-prandiais. Também é importante permitir-se fazer
pausas, com lanchinhos regeneradores (“vitaminas” de frutas, frutas in
natura, leite, sucos, etc.) e algo doce, mas não com um impacto calórico
excessivo (gelato de frutas é o ideal), também para ter uma grati cação que
torne menos árduo o retorno ao estudo.

Sempre nos períodos de estudo intenso, é totalmente inútil exagerar nas


“ajudas” como café e bebidas contendo cafeína: a melhora da atenção
proporcionada por essa substância e o aumento relativo da capacidade de
concentração e solução de problemas repetitivos e entediantes realmente
existem, mas têm limites bem precisos! Esqueçam o álcool, que deprime o
sistema nervoso, e menos aconselháveis ainda são os auxílios
farmacológicos, como os “reconstituintes cerebrais” de antigamente, os
produtos estimulantes “neurotônicos” e os polivitamínicos, a não ser em
casos particulares, nos quais o melhor juiz será o médico da família.
Também são desaconselháveis os tranquilizantes e moduladores de humor,
dos quais calcula-se que pelo menos um estudante em cada dez faça uso
indiscriminado. Para recarregar as baterias, é muito melhor reservar alguns
minutos do dia para se dedicar a uma atividade física moderada, que
permitirá distrair-se e render mais nos estudos nas horas seguintes.

E no dia da prova, que muitas vezes dura até seis horas e sem dúvida causa
um notável estresse psicofísico? Depois do costumeiro desjejum, preparado
segundo as indicações que já demos, é bom precaver-se para o inevitável
surgimento da fome, previsivelmente por volta da metade da manhã. Será
útil levar um ou mais lanchinhos para serem consumidos prontamente, a m
de antecipar-se à chegada da fome e prevenir a perda de concentração que
ela acarretaria. Para isso, são úteis alimentos que saciem bastante, sejam de
fácil digestão – melhor se forem sólidos – e que também apresentem uma
combinação dos dois tipos de açúcares. Alguns exemplos são barrinhas de
cereais, cream crackers, grissini e biscoitos; uma torta de geleia ou também
chocolate, capaz de estimular e de induzir um estado de espírito positivo.
Como muitas vezes as provas acontecem em períodos quentes, quando a
transpiração é mais intensa – e também graças à ansiedade –, é igualmente
importante dispor de uma reserva de água (de 150 ml a 200 ml, ou seja, um
copo médio) para facilitar a assimilação e a utilização mais rápidas.

Comportar-se assim nas épocas de provas, à mesa e nas adjacências, signi ca


melhorar as próprias chances de se sair bem, com base também na
preparação e na capacidade de cada um. Por outro lado, comportar-se
segundo os velhos esquemas, que induziam os pais, por excesso de amor, a
superalimentarem o estudante às vésperas das provas, confundindo o
inevitável cansaço mental derivado de um esforço que é
preponderantemente intelectual com aquele – muito mais dispendioso – que
está ligado ao esforço físico, signi ca correr o risco de se ver às voltas, no
nal, com um estudante igualmente aprovado, mas também
desagradavelmente mais pesado...

GELEIA REAL E PRÓPOLIS SÃO RICOS EM


NUTRIENTES
Um mito um tanto aumentado, que se insere na aura fascinante de tudo
aquilo que é ou parece “natural” e, portanto, por de nição, seria não apenas
inofensivo, mas também bené co.

O que é a geleia real? Simplesmente, é a substância secretada pelo sistema


glandular das abelhas operárias, que representa o alimento essencial das
larvas e da abelha-rainha. A elas certamente faz muito bem – o que não
signi ca automaticamente que também deva fazer bem, na mesma medida,
aos seres humanos.

A geleia real é constituída de quase 70% de água, e o restante, de proteínas e


aminoácidos (cerca de 14,5%), açúcares (cerca de 11,5%), gorduras (cerca
de 3%) e pequenas quantidades de vitaminas, oligoelementos, sais minerais e
agentes antibacterianos. En m, nutrientes que podem – quase todos – ser
encontrados normalmente na maior parte dos alimentos que costumamos
consumir.
Há quem conjecture que a lenda das grandes vantagens associadas ao
consumo da geleia real derive do fato de que a abelha-rainha tenha uma
expectativa de vida enormemente superior à das abelhas operárias, ainda
que ela viva empenhada em uma contínua atividade reprodutora. Pode ser,
mas resta o fato concreto de que nunca foi provado cienti camente nenhum
efeito signi cativo no nosso organismo por parte do que esse produto
contém, inclusive traços de hormônios e enzimas. Um produto que, entre
outras coisas, é consumido eventualmente por nós em doses muito
reduzidas como parte de vários suplementos alimentares, os quais são
destinados a pessoas convalescentes, com apetite reduzido ou estafa, e nos
quais muitas vezes ele está associado ao mel. E as doses quase irrelevantes
constituem, naturalmente, outro ponto de interrogação com relação às
supostas ações favoráveis. Isso para não falar do preço, particularmente
elevado, sobretudo em relação à quantidade.

Resumindo, não há presença signi cativa de substâncias nutritivas e


nenhuma ação bené ca comprovada, certi cada em bases cientí cas sérias. E
também é bom prestar atenção à região de origem: de fato, já que a
produção nacional de geleia real só consegue cobrir uma pequena parte da
demanda do mercado (cerca de 3%, ao que parece), muitas vezes circulam
quantidades notáveis de geleia real produzida por países do terceiro mundo,
e em particular pela China.[26] O produto chinês custa muito menos, mas
muitas vezes veri cou-se que estava fortemente contaminado por
cloranfenicol, um antibiótico que estimula a produção de geleia real por
parte das abelhas, mas cujo uso em animais destinados à produção de
alimentos é proibido na Europa. Suspeita-se que o cloranfenicol seja
genotóxico, ou seja, capaz de alterar o DNA.
Não é muito diferente o caso do própolis, cujo uso também é proposto com
outras nalidades, ou seja, mais para ns curativos do que alimentares. De
fato, se a geleia real não deixa de ser um alimento – ainda que não para os
seres humanos –, o própolis é uma substância que as abelhas operárias
extraem das plantas para depois elaborá-la e transformá-la em uma espécie
de resina que serve para calafetar as fendas presentes na colmeia e cobrir
tanto as superfícies internas do apiário quanto eventuais corpos estranhos
em putrefação, de modo a impedir o desenvolvimento de micro-organismos
capazes de comprometer a vida da colônia e a conservação das reservas de
alimento. Daí vem o nome: pro polis, ou seja, “diante da cidade”, fazendo
menção à sua presença na entrada da colmeia.

Sim, porque a principal virtude do própolis (substância sobre a qual foram


conduzidas mais de 1.300 pesquisas) reside justamente em suas nalidades
antissépticas e antibióticas: segundo vários estudos, ela seria ativa na
eliminação de numerosos micro-organismos e também do vírus da gripe
tipo A e de algumas micobactérias. Ele é constituído por cera, resinas e
bálsamos, óleos etéreos, pólen, materiais orgânicos e minerais; e é utilizado
como tintura-mãe, xarope ou spray, ou pode ser encontrado em pomadas e
unguentos, em cremes dentais, xampus e sabonetes, ou, en m, em cápsulas.
E também, porém mais limitadamente, como suplemento alimentar em
gomas de mascar ou pastilhas mastigáveis.

É preciso reiterar que o uso tradicional do própolis é como anti-


in amatório e existem alguns experimentos que aguardam con rmação
de nitiva sobre seu uso clínico mais recente. Devemos acrescentar que uma
atividade antibacteriana semelhante pode ser encontrada, até em maior
medida, em muitos outros produtos vegetais, como vários temperos que
custam muito menos, mas desfrutam de um fascínio menos pronunciado no
imaginário coletivo.

Em conclusão, o própolis tem pouco a ver com a alimentação, e de qualquer


forma, considerá-lo uma panaceia, como muita gente faz, é forçar a mão; é
um dos muitos exageros ligados ao costumeiro halo de magia que envolve
tantos produtos que vêm inalterados – ou quase – da natureza. Uma questão
pouco racional, mas da qual muitos de nós ainda não conseguimos nos
libertar, nem mesmo no terceiro milênio.

O ALHO E A CEBOLA PROTEGEM O


CORAÇÃO E O ESTÔMAGO
É comum ouvir isso a respeito deles e dos mais variados temperos. Nessas
a rmações, com efeito, sempre há um fundo de verdade, mas também uma
boa dose de exagero otimista.

Os temperos são usados pela humanidade desde tempos imemoriais e, assim


como as ervas aromáticas, foram considerados produtos raros e preciosos, a
ponto de enriquecer os comerciantes árabes que controlavam as principais
rotas do seu comércio. Eles serviam para preservar e para aromatizar,
melhorando ou modi cando o sabor dos alimentos, bem como para
combater bactérias e fungos causadores de doenças e capazes de alterar a
própria comida: isso graças a certa ação antisséptica e talvez também
antibiótica que possuem, a qual se deu mais destaque no nal dos anos
1990.
Para isso, alguns estudiosos zeram testes in vitro com dezenas de temperos
e trinta bactérias diferentes, constatando que a ação bactericida mais ampla
estava na cebola, no alho, na pimenta-da-jamaica e no orégano (ativos sobre
100% das bactérias testadas!), seguidos pelo tomilho, pelo estragão, pelo
cominho e pelo cravo. Nas últimas posições desse ranking em particular,
estavam a pimenta-do-reino, o gengibre e o limão. O lado fraco desse
experimento consistia no fato de que ele foi conduzido in vitro, ao passo que
os testes conduzidos in vivo tiveram resultados muito mais decepcionantes,
provavelmente porque as partículas de alimento “sequestram” os
componentes inibidores dos temperos e os impedem de agir.

Mas isso conta pouco, porque é óbvio que nos dias de hoje esse tipo de ação
antisséptica perdeu sua importância, à luz das modernas tecnologias de
conservação. O que não impede, porém, que os temperos ainda sejam muito
bem vistos e procurados por vários motivos compreensíveis: o aroma que
conferem aos pratos, sobretudo graças à sua riqueza em óleos voláteis; uma
inabalável con ança em suas propriedades conservantes, principalmente por
causa das substâncias antioxidantes que contêm; e também a convicção de
que possuem, alguns mais e outros menos, preciosas propriedades anti-
in amatórias, preventivas, de estímulo às defesas imunológicas e de proteção
da saúde. Todos estes últimos aspectos não são infundados, mas, como
veremos, muitas vezes tendem a ser um pouco enfatizados demais.

Examinemos rapidamente alguns exemplos. Um dos temperos mais


considerados e apreciados é certamente o alho (allium sativum), típico da
cozinha mediterrânea junto da pimenta, que foi usado durante séculos (e
esteve presente nas farmácias já nos anos 1950) para curar de tudo, desde
problemas digestivos até parasitoses intestinais, tosse e picada de cobra (!).
Hoje recebe muito interesse porque alguns estudos epidemiológicos
trouxeram à luz uma possível função protetora contra certas doenças
cardiovasculares e tipos de tumores. O que há de verdade nisso?
Efetivamente, foram coletadas muitas provas acerca de um papel que o alho
desempenha em reduzir a pressão sanguínea e melhorar a uidez do sangue
(diminuindo, assim, o risco de trombose), além de baixar os níveis
hemáticos do colesterol mais perigoso (LDL), ao mesmo tempo que
aumenta os do colesterol que tem uma função defensiva (HDL). O
problema, pelo que consta, é que tais resultados teriam sido obtidos com
doses diárias de alho um tanto elevadas: de acordo com alguns
experimentos, as doses e cazes seriam de cerca de 1 g a 2 g de alho fresco
por dia para baixar a pressão; de 12 g a 50 g (ou seja, de 7 a 28 dentes) de
alho fresco, sempre de forma continuada, para a ação antitrombótica; e
doses de 8 g a 30 g ao dia, dependendo dos estudos, para baixar o nível de
colesterol no sangue.

Existem também dados mais favoráveis, porém, como a rmaram os autores


de alguns estudos publicados em revistas muito sérias, é indiscutível que
tanto após a experimentação no homem com doses “normais” quanto após
uma ampla revisão da literatura, o efeito de baixar o colesterol no sangue
deve ser considerado substancialmente modesto. De qualquer forma, à parte
a precisão sempre discutível dos números citados, trata-se de doses nada
fáceis de serem alcançadas por nós (já em certos países do Oriente Médio, o
alho é mastigado costumeiramente...), e não há certeza alguma de que para
obter determinados efeitos bastem as pequenas quantidades ingeridas na
nossa cozinha do dia a dia. Sem contar o problema dos odores (e do hálito):
de fato, os componentes inodoros do alho não são ativos e se transformam
nas substâncias sulfurosas ativas somente quando ele é cortado ou esmagado
– o problema é que tais substâncias, como todos sabem, são
“prepotentemente cheirosas”, como alguém as de niu. Tentou-se remediar
pondo no comércio cápsulas de alho e também um pó inodoro, porém rico
nas substâncias ativas – este último, em alguns estudos, falhou (com 900
mg ao dia), já em outros demonstrou certo efeito preventivo em relação aos
processos iniciais da formação da placa aterosclerótica nas paredes
vasculares.

Por outro lado, algo mais promissor foi indicado em relação aos tumores do
estômago e do cólon, com base em estudos epidemiológicos: mais de 28 g
de alho por semana ofereceriam certa proteção, embora os mesmos autores
pedissem cautela, à luz dos problemas que surgiram na elaboração dos
dados.

En m: o alho não é um alimento, é um condimento; as pequenas


quantidades usadas tornam insigni cante seu teor de nutrientes. Ele é um
complemento saborizante típico de muitas receitas, tanto mediterrâneas
quanto orientais, e de qualquer forma é útil para reduzir o uso de sal; além
de ter um leve efeito diurético e estimulador das secreções do estômago,
mas pode ter efeitos colaterais, como acidez gástrica e erupções cutâneas.

Também sobre a cebola (allium cepa) foram tiradas conclusões terapêuticas


semelhantes às do alho, que de fato é seu parente próximo, e podemos
repetir muitas das coisas já ditas. Sua característica é a boa presença de
muitos componentes interessantes: substâncias bioativas ricas em enxofre,
quercetina (um potente antioxidante) e outras substâncias semelhantes
(como antocianinas na cebola roxa), bras solúveis probióticas e selênio:
tudo parece conferir à cebola certa ação preventiva em relação a alguns
tumores (do estômago em particular), mesmo com doses reduzidas, mas
diárias, ou com o consumo de pelo menos duas porções por semana, de
acordo com um estudo italiano.

Mas em todos os temperos e ervas aromáticas encontramos uma ampla


variedade de substâncias toquímicas ao menos em pequena quantidade – as
quais são responsáveis também por seu aroma característico –, além de
vitaminas e sais minerais, cujo signi cado nutricional, porém, é
negligenciável do ponto de vista prático, em virtude das pequenas
quantidades que são usadas desses saborizantes. Ressaltamos que entre as
moléculas aromáticas também podem estar, como em todos os produtos
vegetais, substâncias tóxicas, como o metileugenol do manjericão e da noz-
moscada (classi cado como cancerígeno para o homem do tipo 2B, ou seja,
“possível” e não “provável”), ou o estragol das sementes de erva-doce.
Também nesse caso, no entanto, vale considerar que a potencial
periculosidade dessas substâncias começa em doses muito elevadas, muito
distantes daquelas do uso normal que é típico dos temperos. Portanto,
nenhum problema.

Pode-se concluir que usar temperos certamente não faz mal e provavelmente
pode fazer bem; que utilizá-los é aconselhável, tanto para usar menos
gorduras e menos sal quanto para tornar os pratos mais apetitosos, bem
como por sua capacidade de exaltar os sabores e de aumentar e variar os
aromas; que os temperos podem favorecer a digestão, estimulando a
secreção dos sucos gástricos e talvez também das enzimas digestivas; e,
nalmente, que é provável que o uso de temperos exerça também outros
efeitos positivos sobre a saúde, os quais provavelmente conseguiremos
conhecer melhor nos próximos anos.
Todavia, tudo isso não signi ca que devamos cometer o erro de considerá-
los “santos remédios” ou de superestimá-los, mesmo porque a quase
totalidade deles é utilizada em quantidades realmente pouco relevantes. Por
exemplo, a ideia de que alguns temperos (como a adorada pimenta) possam
substituir os medicamentos para a hipertensão ou outras doenças
cardiovasculares é errada e perigosa. E não nos esqueçamos das
contraindicações, como as intolerâncias individuais ou a presença de uma
úlcera gástrica ou duodenal, visto que os temperos estimulam as secreções
do aparelho digestivo e exercem uma ação irritante das mucosas.
Finalmente, vale ressaltar o fato de que alguns deles (como o gengibre, a
cúrcuma, a pimenta-do-reino, a canela e também o alho) interagem com
determinados medicamentos, aumentando sua atividade (com os
quimioterápicos, um efeito que pode ser vantajoso, mas também com os
anticoagulantes orais e com medicamentos hipotensivos, como os inibidores
da enzima conversora de angiotensina, por exemplo), ou então reduzindo
sua e cácia (com alguns medicamentos antivirais, por exemplo), ou ainda
intensi cando seus efeitos colaterais. Mas mesmo essas interferências só se
veri cam com um consumo continuado e em altas doses, situações
francamente raras.

O CHICLETE PODE ENGORDAR E É


PERIGOSO QUANDO INGERIDO
Não há problema: mesmo quem está de dieta ou quer evitar engordar pode
mascar chiclete tranquilamente. De fato, as gomas de mascar contêm,
quando muito, quantidades muito reduzidas de açúcar, e portanto aportam
muito poucas calorias – cerca de 10 a 20 por unidade.
Também é preciso tecer outras considerações. Dentro de certos limites,
mascar chiclete alivia a sensação de fome, sobretudo aquela causada pela
ansiedade, até porque seu sabor adocicado estimula fortemente os centros
cerebrais dedicados a reconhecer justamente esse gosto, de certa forma
enganando-os e enviando sinais não muito diferentes daqueles relacionados
à ingestão de comida.

Isso vale também para as popularíssimas variedades de chicletes nas quais o


açúcar foi substituído por adoçantes hipocalóricos (o xilitol, por exemplo),
para algumas das quais, além da redução do teor calórico do chiclete (cerca
de 4 kcal por unidade), parecem provados alguns efeitos preventivos em
relação à cárie dos dentes, pois provocam sensíveis reduções no número dos
micro-organismos presentes na cavidade bucal. De fato, esses micro-
organismos que são parcialmente responsáveis pelo início do processo da
cárie – pois fermentam facilmente os carboidratos, determinando a
formação de ácidos que atacam a superfície dos dentes – utilizam como
substrato nutritivo justamente os açúcares, ao passo que não conseguem
fazer o mesmo com os adoçantes substitutos.

Em resumo, enquanto doces e balas sem açúcar reduzem o risco de cárie de


maneira passiva – isto é, apenas tomando o lugar de um lanche mais
propenso a causar cáries –, o consumo de gomas de mascar sem açúcar
parece ser capaz de trazer vantagens mais consistentes: de fato, tanto o já
citado xilitol como outros poliálcoois utilizados no lugar do açúcar em
alimentos, bebidas e também nas gomas de mascar demonstraram ter a
capacidade de manter a mineralização dos dentes, e, portanto, de barrar sua
erosão. É por esses motivos que as gomas de mascar com xilitol podem ser
consideradas, em um certo sentido, “alimentos funcionais”, conforme
lembram as indicações em alguns dos rótulos que justamente mencionam
suas propriedades bené cas para a saúde dos dentes.

De qualquer forma, também é preciso lembrar que, como toda vez que
deglutimos também engolimos ar (cerca de 3 ml a 5 ml, até quando
engolimos apenas saliva), mastigar por muito tempo, e especialmente
chiclete, signi ca também aumentar notavelmente a quantidade de gases já
presentes siologicamente no aparato gastrointestinal – o que pode
provocar sensações incômodas e alguns distúrbios, como eructações
frequentes, atulência, distensão abdominal excessiva (até causar dor
persistente) e também algum problema de hiperacidez gástrica, decorrente
do aumento da secreção ácida que ocorre por causa da pronunciada
distensão das paredes do estômago.

No que diz respeito à ingestão acidental de um chiclete, tampouco esse


evento, que também suscita tantos temores instintivos, deve causar
preocupação: de fato, as substâncias usadas na produção da goma de mascar
vêm da goma arábica, um produto natural e totalmente inofensivo para o
aparelho digestivo. Tudo se resume, portanto, a uma sensação desagradável,
porém passageira.

AS INTOLERÂNCIAS ALIMENTARES FAZEM


ENGORDAR
Não é bem assim, embora muita gente esteja convencida disso, e ainda que a
falsa equação “intolerância = aumento de peso” circule sem parar nas redes.
As intolerâncias alimentares são algo bem diferente e menos perigoso do
que as alergias alimentares, que são operadas por mecanismos imunológicos
e desencadeadas até por quantidades mínimas de algum alimento, e muitas
vezes são mediadas pela produção de anticorpos IgE. Em vez disso, as
intolerâncias alimentares devem-se a várias causas, às vezes pouco
reconhecidas; não de agram uma resposta do sistema imunológico e podem
ser sumariamente classi cadas como enzimáticas (isto é, caracterizadas pela
ausência de uma enzima dedicada à digestão ou metabolização de algum
componente do alimento: por exemplo, a intolerância à lactose ou ao glúten,
o favismo, a intolerância congênita à frutose, etc.) ou como farmacológicas
(reação a um componente do alimento, como o glutamato, os sulfetos, a
histamina, etc.).

Trata-se de reações adversas a alimentos, respostas anormais que os


organismos das pessoas predispostas apresentam quando entram em contato
com determinados componentes de algumas comidas ou com substâncias
que se formam durante o processo digestivo, ou ainda com componentes
dotados de atividade farmacológica, aditivos alimentares, metais (como o
níquel), etc. A maior parte de tais respostas anormais se concretiza na má
absorção do alimento em questão, dando origem a uma série de reações que
provocam cefaleias e sintomas envolvendo predominantemente o aparelho
gastrointestinal (como náuseas, vômito, diarreia, dores abdominais,
meteorismo,[27] etc.), ou, mais raramente, retenção de líquidos ou sintomas
na cútis, no sistema musculoesquelético, no sistema nervoso (como
depressão, ansiedade, irritabilidade), ou ainda em outros sistemas.

É fácil, portanto, entender quão infundada é a convicção de que sofrer de


intolerâncias alimentares leve a um aumento de peso e que a simples
eliminação de alimentos aos quais se é intolerante provoque
automaticamente um fácil emagrecimento. Aliás, por se tratar de má
absorção, poderíamos no máximo chegar à hipótese exatamente contrária: se
um alimento é mal ou pouco absorvido, as calorias alimentares fornecidas
por esse alimento não estarão disponíveis para o organismo da pessoa
envolvida, ou estarão só em parte, o que, longe de favorecer um aumento de
peso, poderia na verdade levar a um emagrecimento, porém indesejável, por
ser consequência de um processo patológico.

A única relação possível entre intolerâncias alimentares e aumento do tecido


adiposo de reserva poderia consistir em um estado geral de in amação do
organismo que seria de agrado pela reação aos alimentos aos quais se é
intolerante. A hipótese é que esse processo in amatório geral possa in uir
no metabolismo e, portanto, favorecer um aumento de peso, talvez graças a
uma menor sensibilidade à insulina e à transformação mais fácil da energia
dos alimentos em gordura. Trata-se, no entanto, de teorias que aguardam
con rmação, e que se referem, de qualquer forma, a uma in uência modesta
no aumento das reservas corporais de gordura.

O problema é que se especula muito sobre essas situações, o que geralmente


é feito de duas maneiras: primeiro, jogando com o fácil equívoco em que o
paciente pode cair quando interpreta as incômodas sensações de inchaço
(abdominal e de outros tipos) provocadas pelas intolerâncias como sinais de
um aumento da gordura corporal, e segundo, tentando identi car os
alimentos responsáveis pela intolerância com base em métodos que não são
reconhecidos como válidos – aliás, são considerados nada con áveis pela
comunidade cientí ca em geral e pelos especialistas em particular. Dois
documentos o ciais recentes também certi cam isso e são fáceis de achar: o
primeiro por parte das principais associações de médicos alergologistas
italianos e o segundo do Comitato Nazionale per la Sicurezza Alimentare
(CNSA), ambos oferecendo uma longa e detalhada lista de testes tão
conhecidos e populares quanto desprovidos de qualquer validade cientí ca.

A esta altura, ca mais fácil explicar por que muitas pessoas efetivamente
perdem muitos quilos seguindo as dietas que lhes são receitadas depois de
serem diagnosticadas com algumas “supostas” intolerâncias, quase sempre
com base em qualquer um desses métodos nada con áveis, quando não
misti cadores. É aí que está o X da questão: como dissemos, não existem
testes validados cienti camente para um diagnóstico exato das intolerâncias,
com exceção dos testes de intolerância à lactose (o chamado breath test ou
teste do hidrogênio expirado), à d-xilose, e para a determinação da
intolerância ao glúten (busca no sangue por três anticorpos diferentes,
biópsia intestinal, etc.). Portanto, na maior parte dos casos, não é possível
determinar uma “dieta por eliminação” focada na causa real da intolerância,
como seria desejável – o que explica (mas não justi ca!) o fato de que
muitas vezes as pessoas decidem proceder às cegas, aceitando como válido o
resultado de um dos métodos nada con áveis que já citamos. Mas o
problema é que esse resultado quase sempre incrimina e põe no banco dos
réus como a causa de intolerâncias uma variedade de produtos
exageradamente ampla: produtos que, vejam só a coincidência, são quase
sempre os mesmos, e todos muito populares, além de serem
costumeiramente consumidos em doses excessivas pelas pessoas com
sobrepeso (como leite e queijos, derivados do trigo, azeite de oliva,
alimentos fermentados, etc.).
Em decorrência disso, as dietas prescritas com base nesses diagnósticos tão
vagos são sempre muito pobres e baseadas em restrições alimentares
exageradamente rígidas. O emagrecimento resultante, portanto, não é
provocado (como o paciente pode ser induzido a crer, em boa-fé) pela
exclusão dos alimentos aos quais ele seria intolerante, mas simplesmente
pela arriscada imposição de refeições muito reduzidas, que muitas vezes se
assemelham perigosamente a um “semijejum” e que, além de serem quase
sempre restritas demais, muitíssimas vezes não são nem um pouco
balanceadas do ponto de vista nutricional.

Aí está o problema. Excluir arbitrária e injustamente determinados


alimentos importantes, e às vezes grupos inteiros de alimentos, por vários
meses (quando não por toda a vida) resulta em uma dieta que, se for
seguida por muito tempo, pode criar quadros de desnutrição e também
verdadeiras síndromes de carência de nutrientes importantes, além de
perigosos desequilíbrios na atitude com relação à comida, a ponto de
encaminhar a pessoa a distúrbios do comportamento alimentar, em especial
nos pacientes psicologicamente mais frágeis, como os adolescentes. Mas não
é só isso: refeições desse tipo também são incapazes de favorecer um estilo
alimentar genericamente melhor, e, portanto, de lançar as bases para
impedir, em seguida, a recuperação do peso porventura eliminado.

En m, é errado e arriscado tentar emagrecer seguindo uma dieta que exclui


alimentos considerados “culpados” com base na execução de algum desses
testes tão comumente usados quanto insatisfatórios em sua sensibilidade
e/ou especi cidade (e que, estranhamente, dão positivo em 90% dos
casos...). A eventual perda de peso resultante é provocada, mais do que por
alguma intolerância evitada, pela pobreza das refeições que são impostas, a
ponto de concretizar – vale a pena repetir – o risco de carências
nutricionais mais ou menos graves, sobretudo se for seguida por muito
tempo.

A coisa já muda quando há condições de utilizar as indicações dos poucos


testes con áveis que mencionamos anteriormente, ou aquelas obtidas
eventualmente por outros testes ou fornecidas com su ciente precisão pelo
próprio paciente. Nesses casos, torna-se possível estabelecer uma correta
terapia dietética, eliminando de nitiva (nos casos de doença celíaca e, quase
sempre, de intolerância à lactose) ou temporariamente, por períodos mais
ou menos longos e em um esquema de rodízio, os poucos alimentos que
forem identi cados de maneira con ável como as causas principais dos
sintomas de intolerância.

Tais alimentos devem ser substituídos criteriosamente por outros produtos


de valor nutritivo correspondente ou semelhante àquele dos alimentos
eliminados, sempre com a ajuda do médico da família ou de um especialista.
Somente dessa forma será possível obter a redução ou o desaparecimento
dos sintomas desfavoráveis (e eventualmente, se for aconselhável, também
uma redução do sobrepeso) sem piorar a qualidade conjunta das porções
alimentares habituais.
[16] Tipo de carne salgada e seca semelhante ao salame, comum na Lombardia (norte da Itália). (N.

E.)

[17] Segundo o Guia alimentar para a população brasileira (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2005), a

recomendação é a de que as proteínas representem de 10% a 15% do valor energético total. (N. E.)

[18] Ainda segundo o Ministério da Saúde, os carboidratos totais devem corresponder de 55% a 75%

do valor energético total, entre os quais 45% a 65% devem ser provenientes de carboidratos

complexos e bras e menos de 10% de açúcares livres (ou simples). (N. E.)

[19] No Brasil, a Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa), por meio da Resolução RDC nº 269, de

22 de setembro de 2005, indicou os valores de ingestão diária recomendada (IDR) de proteínas,

vitaminas e minerais para os diferentes grupos populacionais. Em 2018, a Instrução Normativa nº 28,

de 26 de julho de 2018, também estabeleceu listas de constituintes e limites de uso autorizados para

os suplementos alimentares. (N. E.)

[20] No Brasil, de acordo com a Anvisa, os valores recomendados para a ingestão diária de vitamina

C são de 45 mg para adultos, 55 mg para gestantes e 70 mg para lactantes. O limite máximo está em

torno de 1,9 g para adultos maiores de 18 anos e 1,7 g para gestantes e lactantes. Também há

recomendações especí cas para outros grupos populacionais, como as crianças. (N. E.)

[21] Segundo a Anvisa, a recomendação para a ingestão diária de cálcio também é de 1.000 mg para

adultos (e 1.200 mg para gestantes) na população brasileira. (N. E.)

[22] Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura.

[23] Ácido eicosapentaenoico e ácido docosahexaenoico.


[24] No Brasil, segundo a Anvisa (2018), os dados disponíveis não foram su cientes para estabelecer

limites máximos para proteínas e carboidratos. No entanto, o emprego dessas substâncias foi

considerado seguro com base nas quantidades recomendadas para sua e cácia ou em função do seu

histórico de uso. (N. E.)

[25] Na Itália, a água potável disponível para consumo tem um alto teor de calcário, o que já não

acontece com a água que consumimos no Brasil. (N. E.)

[26] No Brasil, também importa-se geleia real da China. (N. E.)

[27] Diz respeito ao acúmulo de gases no intestino ou abdômen. (N. E.)


7 DIETAS

A DIETA DISSOCIADA EMAGRECE PORQUE


SEPARA OS CARBOIDRATOS DAS
PROTEÍNAS
É uma colocação sem sentido. O motivo misterioso que torna possível
emagrecer dissociando, ou seja, evitando combinar nas duas principais
refeições do dia o clássico “primeiro componente” com o igualmente
clássico “segundo componente” não consiste certamente na “mágica”
separação de proteínas e carboidratos – como alguns divulgadores
televisivos “laicos” sustentaram durante anos e como muitos ainda pensam,
equivocadamente –, mas, sim, no fato muito mais trivial de que essa escolha
facilita a tarefa de comer menos, sem a necessidade de mergulhar em
complicados cálculos de calorias ou na construção de um regime
emagrecedor propriamente dito.

Na prática, um dos dois componentes principais previstos na estrutura


tradicional da nossa refeição é abolido; e isso, mesmo admitindo que
sejamos um pouco mais generosos nas dimensões do único prato que nos
permitimos (acompanhado, espera-se, também por uma porção de hortaliças
e outra de frutas), leva quase sempre a uma redução do montante calórico
total da refeição.

Trata-se de um sistema muito adotado nas dietas “faça você mesmo”, e no


m das contas, não é dos piores. É certamente mais simples e prático
permitir-se, por exemplo, um só prato de dimensões normais na refeição do
meio do dia em vez de um “primeiro” e um “segundo” pela metade, para
depois inverter as opções na refeição da noite. O problema é que, ao fazer
isso a longo prazo, corre-se o risco de reduzir excessivamente as
quantidades totais de consumo tanto dos produtos à base de amido quanto
daqueles eminentemente proteicos, o que com o tempo pode provocar,
conforme foi demonstrado, algumas carências marginais dos nutrientes cujas
necessidades são menos fáceis de satisfazer.

Entre outras coisas, essa crença errada corre o risco também de parecer uma
con rmação da absurda convicção – infelizmente ainda muito presente e da
qual falamos também em outra parte deste livro – de que consumir
produtos ricos em carboidratos e produtos ricos em proteínas juntos, ou na
mesma refeição, pode ser de alguma maneira prejudicial ou ao menos
desaconselhável. Uma ideia que não apenas contraria todos os critérios
aceitos pela comunidade cientí ca mundial acerca da composição que deve
ter uma dieta equilibrada e variada, e vai de encontro aos conceitos básicos
do próprio modelo alimentar mediterrâneo, mas que também é desmentida
pela pura e simples composição química de alguns dos mais importantes
alimentos que o homem tem à sua disposição há milênios.

Por exemplo – é preciso mais uma vez insistir –, o próprio alimento-


símbolo dos carboidratos, ou seja, o macarrão, contém em cada 100 g do
produto 11 g de proteína e cerca de 70 g de carboidratos; portanto, embora
seja um dos alimentos mais amados e mais amplamente consumidos do
mundo, apresenta em seu interior (e sem que isso traga nenhuma
consequência negativa) essa “perigosa” mistura que algumas teorias
extravagantes exigem que seja evitada como a peste. Fazer essa consideração
torna ainda mais evidente a falta de fundamento de certas lendas urbanas
que, no entanto, continuam a angariar adeptos, especialmente na internet
(como sempre).

E é muito provável que a vulnerabilidade de uma parcela da opinião pública


a certas teorias estranhas (e erradas) que dizem respeito à alimentação
dependa também de uma mania muito em voga atualmente, que é a de
de nir simplisticamente como “carboidratos” os alimentos à base de amido e
como “proteínas” os alimentos eminentemente proteicos. Vale a pena falar
disso, porque essa simpli cação aparentemente inofensiva na verdade
esconde muitos perigos, entre os quais o de vili car, aos olhos do
consumidor menos esclarecido, o complexo valor nutritivo de alimentos
fundamentais – um valor nutritivo que, ressaltamos, encontra a própria
exaltação sobretudo na complexidade e na ação sinérgica dos incontáveis e
bem diferenciados componentes que caracterizam os produtos que
utilizamos todos os dias.

Isso signi ca que de nir super cialmente o macarrão, o arroz ou o pão


simplesmente como “carboidratos” é redutivo e corre o risco de passar a
ideia de que tudo o que esses importantes alimentos têm a oferecer são
apenas amido e açúcares. Da mesma forma, referir-se à carne, ao peixe ou
aos ovos com o termo resumido “proteínas” induz a crer que o teor proteico
seja a única virtude nutritiva desses produtos, levando a negligenciar a
presença de muitos outros nutrientes essenciais, como a vitamina B12, o
ferro, o iodo, o selênio, os ácidos graxos essenciais, e assim por diante.

E essa observação, entendam, não representa um preciosismo acadêmico ou


uma implicância semântica: de fato, nos tempos de hoje, com a livre
circulação de notícias no mínimo aventureiras, esse modo de se expressar
concretiza o risco de que, do jeito que as coisas vão (e não achem que estou
exagerando), a presença desses alimentos na dieta passe a não ser mais
considerada fundamental, e sim apenas facultativa, ou até que eles possam
ser substituídos por um simples suplemento ou um envelope de shake
proteico. Na prática, isso é uma ajuda concreta à desinformação que se
alastra.

Voltando à dieta dissociada como método para emagrecer, uma pesquisa


recente de uma importante policlínica italiana apurou que, aos 13 anos, um
em cada quatro garotos e uma em cada três garotas já seguiram pelo menos
uma dieta, recorrendo quase sempre a um “faça você mesmo” obtido por
recomendação de alguém, da internet ou de jornais e revistas – portanto,
escolhendo como e quanto comer por conta própria, ou con ando em fontes
não autorizadas e sem a devida competência.

Já falamos bastante das principais carências nutritivas que podem ser


induzidas por uma dissociação mantida por muito tempo. E de fato, o
exame de uma série de chas hospitalares permitiu veri car, com uma
convincente relação de causalidade, um aumento da anemia ferropriva
justamente nas adolescentes que se “autoimpuseram”, durante meses, a
aparentemente inofensiva prática da dieta dissociada.

Lembramos, portanto, que emagrecer “dissociando” por muito tempo, sem


supervisão médica e sem providenciar as eventuais suplementações desejadas
é desaconselhável de maneira geral, e mais ainda em uma idade tão tenra e
em uma situação siológica tão delicada e vulnerável.

Ó Í Ã
AS DIETAS “SÓ PROTEÍNA” SÃO AS IDEAIS
PARA EMAGRECER
Não é verdade, essas dietas estão bem longe de ser a solução “ideal”. Na
realidade, trata-se de esquemas alimentares fortemente desequilibrados, além
de bastante arriscados se adotados por muito tempo, e aos quais falta uma
verdadeira validação cientí ca. Basta pensar que há bem poucos anos a
renomada British Dietetic Association [Associação Britânica de Nutrição],
ao compilar o ranking das cinco piores dietas emagrecedoras que já
surgiram, reservou as duas primeiras posições justamente para dois
esquemas dietéticos desse tipo.

O primeiro modelo veio a público em Londres, em 1984; mas nos anos


1920 já haviam sido usados esquemas semelhantes para tentar curar
pacientes pediátricos com epilepsia. Nas décadas seguintes, várias dietas
hiperproteicas apareceram e desapareceram incontáveis vezes como métodos
para combater a obesidade, a cada ocasião reapresentando-se na grande
imprensa como importantes novidades, embora o princípio básico fosse
sempre o mesmo, e o que mudava eram apenas o nome e as técnicas
comerciais de lançamento, mais ou menos imaginativas e mais ou menos
originais. Tudo isso se repetiu e se repete, inexoravelmente, até os dias de
hoje.

As características desses modelos, como dissemos, são sempre as mesmas:

Forte restrição do consumo de carboidratos, tanto dos simples quanto


dos complexos, seja de que fonte forem; com valores bem abaixo do
mínimo estabelecido pelas recomendações da comunidade cientí ca.
Aumento desproporcional do espaço reservado aos produtos ricos em
proteínas, até elevar de maneira exagerada o porcentual de energia
fornecido por elas (relativo ao total das calorias diárias) acima
daqueles 12% a 18% sugeridos pelos últimos LARN – chega-se a 30% e
até 40%, possivelmente fazendo o uso de fórmulas proteicas em pó
também.

Em paralelo, um grande aumento (despercebido) também das


gorduras, as quais inevitavelmente estão presentes nos alimentos
proteicos consentidos em grande quantidade, e que nessas dietas
chegam a aportar mais de 60% das calorias totais, contra os 20% a 35%
sugeridos para adultos pelos LARN.[28]

No chamado “período de ataque” previsto pelas mais clássicas dietas


hiperproteicas, a quantidade de carboidratos (amidos e açúcares simples) cai
para menos de 50 g por dia (somente 5% das calorias totais, contra os 45%
a 60% sugeridos pelos LARN e cerca de 60% do esquema “mediterrâneo”),
[29] quando sabe-se que o mínimo necessário para os requerimentos do
tecido nervoso e dos glóbulos vermelhos é de cerca de 150 g ao dia. Essa
restrição excessiva dos carboidratos causa, em um tempo bastante curto, a
instauração de um estado de cetose, ou seja, um aumento da acidez do
sangue e dos outros uidos corporais acima dos níveis normais (que são
levemente alcalinos e cuidadosamente mantidos por uma série de sistemas
de compensação). Essa acidose é caracterizada por um alto nível circulante
de substâncias denominadas “corpos cetônicos”, as quais também são
utilizadas como fonte de energia pelos tecidos. Tudo isso representa uma
espécie de leve intoxicação crônica, uma situação anti siológica que, quando
prolongada, pode provocar vários efeitos desfavoráveis.
Entre eles está também um empobrecimento do patrimônio proteico do
organismo (um verdadeiro paradoxo para uma dieta hiperproteica!). Por um
lado, a cetose barra a síntese de novas proteínas corporais, e por outro,
favorece o desmantelamento de parte daquelas já presentes (sobretudo as
dos músculos) para permitir sua utilização tanto a m de produzir energia
(já que os carboidratos são tão escassos) quanto para obter aminoácidos a
serem transformados (pelo fígado) exatamente em carboidratos, em um
processo chamado gliconeogênese (ou seja, a formação de nova glicose).
Dessa forma, os músculos também são corroídos e, conforme os resultados
dos estudos conduzidos, de nitivamente a tão desejada perda de peso
acontece quase que mais à custa desses tecidos magros e da água do
organismo do que do próprio tecido adiposo. No m das contas, realmente
não é o que se poderia chamar de um emagrecimento ideal!

Em síntese, portanto, com uma dieta desse tipo, perde-se peso por vários
motivos: 1) come-se menos porque a cetose age sobre o sistema nervoso
central, reduzindo a sensação de fome; 2) uma considerável parte da energia
fornecida pelas proteínas alimentares é “desperdiçada” como calor, porque
elas induzem uma termogênese alimentar (assim é chamado o dispêndio
calórico que se segue à ingestão de determinado macronutriente) mais
elevada do que aquela induzida por gorduras e carboidratos; 3) as proteínas
têm um elevado poder de produzir a sensação de saciedade; 4) a monotonia
e a limitação das opções oferecidas por uma dieta tão pouco variada cansam
rapidamente quem a pratica, impelindo-o a reduzir espontaneamente as
quantidades de comida consumidas.

Sem dúvida, porém, essas dietas são também muito populares, por motivos
bem compreensíveis: são muito simples de se seguir, pois oferecem a
possibilidade de comer à vontade alimentos e pratos muito saborosos, sem
precisar calcular e medir porções e condimentos; asseguram uma
pronunciada sensação de saciedade, que também é favorecida, como
dissemos, pela elevada presença de corpos cetônicos em circulação no
sangue; e consentem quase sempre uma redução de peso inicial rápida, até
rápida demais, o que representa um forte ímpeto motivacional.

No entanto, também são numerosos e relevantes os pontos fracos desses


regimes. Os de uma dieta hiperproteica seguida por muito tempo foram
meticulosamente listados alguns anos atrás pela American Heart Association
[Associação Americana de Cardiologia], em um documento publicado em
sua revista o cial: trata-se tanto de carências no per l nutricional quanto de
riscos no âmbito da saúde. Quanto ao primeiro aspecto, os especialistas
ressaltam que a monotonia das escolhas possíveis e a presença muito escassa
das substâncias bené cas contidas nos produtos vegetais (derivada da
reduzidíssima introdução de frutas, cereais e hortaliças) fazem com que
essas dietas sejam gravemente carentes em potássio, cálcio e magnésio; em
elementos antioxidantes e outras substâncias bioativas e de ação protetora,
bem como em várias vitaminas, em sais minerais essenciais e em bra; e que
comportem uma quantidade excessiva não só de gorduras saturadas e
proteínas, mas também de sódio e de bases purínicas. Quanto aos riscos
para a saúde, segundo os cardiologistas americanos, eles dizem respeito a
possíveis aumentos do nível de colesterol no sangue, e em particular do
nível de LDL (o colesterol “ruim”), ao perigo aumentado de problemas
cardiovasculares e de gota, de hipertensão arterial e osteoporose, à
sobrecarga de trabalho para os rins e o fígado, com possível piora da função
renal, sobretudo nos indivíduos menos jovens, etc.
O aspecto positivo é que as dietas hiperproteicas extremas, em geral, são
seguidas somente por poucas semanas, também segundo os conselhos de boa
parte dos textos que as promovem. Isso, felizmente, limita muito a
frequência e o surgimento dos efeitos colaterais indesejados. De qualquer
forma, é evidente que adotar esquemas do tipo, como fazem sobretudo
aqueles que optam pelo “faça você mesmo” sem consultar um médico, não é
nada indicado para quem não estiver em boa saúde. Por exemplo, jamais
deveriam fazer isso os diabéticos, os doentes cardíacos e quem tem
problemas renais ou hepáticos, quem apresenta altos níveis sanguíneos de
colesterol e/ou triglicérides ou é hipertenso: e, vejam só, são situações muito
frequentes justamente em indivíduos obesos! De qualquer forma, se alguém
decidir experimentar algum desses esquemas, é aconselhável que faça isso
por períodos de tempo muito limitados de, no máximo, três ou quatro
semanas.

Um último esclarecimento é necessário: estudos muito precisos apuraram


que os bons resultados iniciais de perda de peso das dietas hiperproteicas
não se con rmam a longo prazo – no decorrer de um ano, comprovou-se
que a quantidade de massa perdida com um regime desse tipo é
praticamente idêntica àquela que se pode perder com uma dieta hipocalórica
equilibrada, a qual, porém, traz riscos muito menores, tanto para a saúde
quanto para a completude da nutrição. E também foi constatado que a
recuperação do peso perdido nas dietas hiperproteicas é praticamente
inevitável e acontece inclusive em tempos bastante curtos. De fato, outro
defeito básico desses sistemas é que eles não ajudam a aprender um modelo
de alimentação que possa ser útil, depois, para a manutenção do peso.
Em 2017, a Società Italiana di Diabetologia publicou um documento-guia
sobre a aplicabilidade, ao paciente diabético, de várias dietas da moda
diferentes do tradicional modelo alimentar mediterrâneo – que é sempre a
melhor escolha, visto que adotá-lo, como a rmou o presidente da sociedade,
signi ca “reduzir a probabilidade de diabetes em 52% em relação a uma
simples dieta com pouca gordura”. Sobre a “dieta cetogênica”, examinada no
documento com muito equilíbrio e com riqueza de referências à literatura
existente, a conclusão foi a seguinte: “Ainda que ocasionalmente úteis para
induzir uma rápida redução do peso, as dietas extremas não demonstraram
efeitos bené cos a longo prazo no paciente diabético no tocante à perda de
peso e tampouco no que se refere à redução do risco cardiovascular. Uma
correta abordagem nutricional no diabetes deve prever uma alimentação
variada e balanceada. Somente dessa forma pode-se induzir uma mudança
permanente dos hábitos alimentares e obter efeitos bené cos também sobre
a qualidade de vida”.

Resumindo, as dietas hiperproteicas extremas são métodos de emergência


que devem ser evitados, ou no máximo adotados somente durante períodos
muito breves, pois provocam uma perda de peso ilusória e temporária, que
além disso envolve também riscos já bem identi cados no plano da saúde.
Riscos que, no m das contas, não vale a pena correr.

É POSSÍVEL EMAGRECER SUBSTITUINDO


REFEIÇÕES POR SHAKES E BARRINHAS
Trata-se de uma grande ilusão, ainda que muitas vezes seja considerada
atrativa.
Na verdade, essas estratégias pouco servem para emagrecer, já que a
diferença de valor calórico entre esses substitutos das refeições e uma
verdadeira refeição “dietética”, ou um sanduíche, é bem pequena. No m das
contas, essas substituições invariavelmente trazem resultados modestos, até
porque não podem ser usadas por muitos dias ou adotadas com muita
frequência, por uma série de motivos:

os substitutos das refeições têm valor nutricional limitado e muito


inferior ao de uma refeição normal, então, utilizá-los com frequência e
por muito tempo pode acarretar carências nutritivas até graves;

eles induzem uma sensação de saciedade pouco duradoura, criando,


portanto, problemas de fome nas horas seguintes;

psicologicamente, representam uma cessão total do controle do próprio


peso a um produto pré-fabricado, e por conseguinte são uma renúncia
a tentar emagrecer de maneira sensata, ou seja, modi cando os
próprios maus hábitos;

com os shakes, são perdidos tanto o gosto quanto as vantagens do


processo siológico da mastigação;

se o uso desses produtos persistir mais ou menos a longo prazo, pode


induzir problemas de constipação.

Isso não invalida que os substitutos das refeições possam ser úteis para uso
esporádico em particulares situações: por exemplo, durante uma pausa
muito breve no trabalho, quando somos obrigados a comer rapidamente no
escritório; quando não há, nos arredores, lugares onde possamos consumir
rapidamente uma refeição mais normal e não conseguimos nos organizar
para trazer de casa algo para comer, etc. A sua potencial utilidade não está
tanto na capacidade de fazer emagrecer, e sim na sua exibilidade para um
uso ocasional.

Um uso que pode também ser previsto no quadro de uma estratégia de


emagrecimento preparada por um especialista, que proverá para que, nas
demais horas do dia, sejam compensadas as inevitáveis lacunas típicas do
substitutivo de refeições. Ou mesmo na fase de manutenção de um resultado
alcançado de maneira mais razoável. Ou ainda, ocasionalmente, para
compensar as consequências – tanto digestivas quanto no peso – de uma
“grave” infração das regras.

En m, produtos desse tipo podem ser úteis, desde que empregados


oportunamente, no quadro de uma estratégia acertada com o médico. No
entanto, é preciso dizer que demasiadas vezes eles são “autorreceitados” sem
muito juízo, como o único meio de emagrecer, levando a pessoa a deixar de
fazer aquilo que deveria ser feito, ou seja, intervir no próprio estilo de vida.

ALIMENTOS LIGHT SÃO BONS PARA


EMAGRECER
Produtos “light” são os alimentos “suavizados”, ou seja, modi cados em sua
composição original de forma a obter produtos o mais parecidos possíveis,
no aspecto e no sabor, aos seus equivalentes tradicionais, mas caracterizados
por uma menor “densidade calórica” e, portanto, adequados a fornecer um
menor número de calorias por porção.
Em geral, para conseguir tudo isso, entre os vários componentes do
alimento são reduzidos os açúcares e as gorduras, e às vezes o álcool. Para
manter o sabor e a consistência, muitas vezes são adicionados vários tipos
de aditivos, e ocasionalmente, para compensar a subtração de parte dos
nutrientes, acrescentam-se bras alimentares não digeríveis, como a celulose,
ou ainda são feitas substituições especí cas das gorduras (por proteínas
vegetais ou amidos modi cados) ou da sacarose (por edulcorantes
hipocalóricos ou sem calorias). Nos mercados italianos, as principais
categorias de produtos light são representadas por cerveja, queijos, manteiga,
margarina, leite, iogurte, bebidas e também vários produtos de confeitaria.

A nalidade para a qual esses produtos foram inicialmente concebidos e


criados era sobretudo a de ajudar quem desejasse ingerir menos calorias
alimentares, a m de perder peso e alcançar o próprio objetivo sem fazer
sacrifícios demais, permitindo-se certos sabores agradáveis sem muitas
consequências desagradáveis. Quando esses produtos apareceram no
mercado, de fato despertaram muitas esperanças, no sentido de que deram a
impressão de poderem ser um válido instrumento para simpli car a luta
contra o excesso de peso e a obesidade.

Em seguida, porém, aconteceu também o que já havia sido veri cado em


outros países que tiveram a mesma experiência em períodos anteriores:
percebeu-se que, apesar das premissas teóricas serem promissoras, na prática
os produtos light funcionavam muito pouco. E isso por uma série de
motivos, que aos poucos foram se delineando com bastante clareza.

Antes de mais nada, é verdade que tais produtos conseguem uma economia
das calorias ingeridas, mas a margem não é muito ampla, e, portanto, não é
possível usá-los livremente: eles podem ser úteis somente se empregados no
lugar dos “normais” correspondentes, mas sempre em quantidades bem
calculadas, no âmbito de uma dieta bem programada e de nida em seu
conjunto.

Além disso, muitos deles, mesmo sendo “aliviados”, fornecem de qualquer


forma uma quantidade discreta de calorias: mais uma armadilha que
somente pode ser evitada lendo com cuidado as informações nutricionais do
rótulo. Um típico exemplo de engano no qual é fácil cair consiste no
chocolate “dietético”, que alardeia o fato de ter substituído a sacarose por
frutose: ele pode ser útil para diabéticos, mas o teor calórico é idêntico ao
do chocolate tradicional, só que nem todos se dão conta disso.

E esse é outro problema: a excessiva sensação de segurança que o uso de um


produto light pode inspirar, levando facilmente ao consumo de quantidades
mais elevadas não só do produto light em si, mas também de outros
alimentos. E isso justamente porque, do ponto de vista psicológico, o uso do
equivalente “suavizado” dá a sensação de se ter uma margem maior para
poder dar mais espaço a um consumo geral mais livre.

En m, de qualquer forma, é preciso prestar atenção. Os produtos “sem


alguma coisa” não só não resolvem automaticamente o problema do excesso
de calorias consumidas, mas muitas vezes foram piorados do ponto de vista
do per l nutricional. Citamos os casos de biscoitos de chocolate com
reduzido teor de gorduras, as quais são substituídas, porém, por um
conteúdo maior de açúcares. Ou então de um achocolatado de leite
desnatado que também continha menos gorduras, mas mais açúcares. Isso
sem falar de certos produtos sem glúten, que contêm muito menos proteínas
em comparação com o produto original, mas muito mais gorduras. Mais
uma vez: é necessário car de olho no rótulo!

Como já dissemos, muitas vezes os produtos light contêm adoçantes sem


calorias ou hipocalóricos (aspartame, sucralose, sacarina e similares) no
lugar da sacarose, o açúcar comum. Que que bem claro que os adoçantes
permitidos para consumo, assim como não são de forma alguma
indispensáveis, tampouco são perigosos, desde que usados nas doses
sugeridas – doses que foram calculadas para 1 kg de massa corporal, com
uma enorme margem de segurança para uso humano em relação às
quantidades que, nos experimentos de toxicidade a curto e longo prazos,
mostraram algum efeito nos animais de laboratório. Todos os adoçantes no
comércio são seguros, nas dosagens aconselhadas – isso é o que con rma
também a EFSA, o que signi ca que, em relação ao peso, as doses
potencialmente perigosas para o homem são tão elevadas que estão fora de
qualquer possibilidade prática de serem realmente consumidas.

Hoje em dia está sendo registrado, porém, um aumento notável do recurso a


alimentos hipocalóricos também por parte das crianças. Basta pensar no
consumo de refrigerantes sem açúcar. Pois bem, estudos muito amplos
demonstraram recentemente que tais produtos ajudam bem pouco tanto a
manter a glicemia em um bom nível quanto a emagrecer. Aliás, existe quem
a rme que eles poderiam até favorecer um aumento do peso, já que os
centros cerebrais dedicados a reconhecer o sabor doce seriam estimulados e
enganados pela presença do adoçante, o que favoreceria a produção extra de
insulina – um hormônio que, como se sabe, estimula o armazenamento de
gorduras no tecido adiposo e induz um rápido retorno da sensação de fome,
com consequências fáceis de se imaginar. Em resumo, haveria uma alteração
do controle do apetite, mesmo porque, diante de um açúcar “falso”, não
seriam desencadeados os processos que levam à saciedade: o resultado geral
é que acaba-se comendo mais, também por causa da estimativa errada, para
menos, da energia absorvida que já mencionamos. Em grande parte, trata-se
de hipóteses ainda aguardando con rmação, mas rati cadas por pesquisas
recentes em vastos grupos de consumidores de todas as idades.

Conjuntamente, parece mesmo que as bebidas light não oferecem vantagens


para a saúde em comparação com as versões normais e é possível que
possam agir sobre a ora intestinal, alterando-a. Também com as bebidas,
en m, há o risco concreto de adotar comportamentos compensatórios que
anulam os potenciais benefícios derivados do recurso aos produtos light. E
em todo caso, já foi demonstrado que a economia calórica obtida com os
produtos sem açúcar é muito relativa (somente nas versões light das bebidas
açucaradas a redução calórica é notável). O uso dos adoçantes, por si só,
não basta para provocar diminuições sensíveis do peso do corpo (nem
mesmo com seu uso diário no café!) se ao mesmo tempo não for reduzida
signi cativamente a quantidade total das calorias absorvidas com a dieta, e
se não for aumentada a atividade física.

Concluindo, não há nada de mal em recorrer a algum produto “suavizado”


se desejarmos emagrecer sem renunciar a certos sabores ou a certos
caprichos grati cantes; mas deve car bem claro que utilizar alimentos light
não é nem necessário, nem su ciente para perder peso. É preciso sempre
controlar as quantidades totais do que comemos, e tomar muito cuidado
para não justi car, inconscientemente ou não, excessos de consumo com
base no raciocínio de que “a nal, é um produto com menos calorias”.
É melhor aceitar a realidade: os produtos light, sozinhos, não resolvem o
problema. Mas podem ser úteis se forem usados racionalmente no conjunto
de um regime bem controlado.

“MAS ERA UMA REFEIÇÃO À BASE DE


PEIXE!”
É difundidíssima a convicção de que uma refeição, mesmo abundante, mas
“à base de peixe”, é automaticamente garantia de um reduzido teor calórico.
Trata-se de uma re exão “consoladora”, que, no entanto, não corresponde
totalmente à realidade.

Hoje em dia, de fato reduziu-se muito a diferença entre as calorias


fornecidas por duas porções semelhantes dos produtos pesqueiros mais
comumente consumidos e dos cortes mais solicitados de todas as carnes de
animais terrestres. Isso porque, nos últimos trinta anos, para ir ao encontro
das demandas do mercado, os criadores conseguiram diminuir notavelmente
a quantidade (e melhorar a qualidade) das gorduras presentes na carne,
tanto a bovina quanto a de aves e a suína; e são sobretudo as gorduras
presentes que determinam o maior ou menor impacto calórico “de base” de
um alimento ou de um prato.

Alguns números importantes: entre 100 g líquidos de produto fresco, o teor


calórico dos produtos pesqueiros mais comuns oscila, em média, entre as 70
kcal das lulas, merluzas, calamares e camarões (60 kcal para o polvo), para
cerca de 120 kcal da tainha e da dourada, até as 160 kcal do atum fresco,
180 kcal do salmão cru e 215 kcal do arenque fresco. Para as carnes frescas,
os valores correspondentes variam das 90 kcal da vitela e 100 kcal a 130
kcal do frango sem pele até as 140 kcal da capa de lé, 160 kcal da carne de
cordeiro e 170 kcal do lombo de porco. Como se vê, diferenças bastante
reduzidas, se forem consideradas para as porções que normalmente são
consumidas.

Quanto ao que diz respeito aos lipídios em particular, no peixe fresco –


mesmo se não quisermos considerar as poucas variedades um pouco mais
gordurosas, como o salmão fresco (12% de gorduras), o arenque (17%), a
cavala (11%) e o atum fresco (8%), e incluindo também crustáceos e
moluscos, que não são propriamente “peixes”, mas são comumente incluídos
nessa de nição – o conteúdo lipídico oscila (sempre para 100 g líquidos de
produto cru) de cerca de 1 g a 2 g (merluza, linguado, robalo, camarão,
lagosta, polvo, lula, calamar, por exemplo) até cerca de 6 g. Pois bem, para
as mesmas quantidades de carnes “terrestres” de uso mais frequente, o nível
médio vai de cerca de 3 g a 8 g.

Uma diferença pequena, en m, e pode-se dizer o mesmo também para o


teor do temido colesterol, cujo aporte por alimentos deveria car, em média,
abaixo dos 200 mg a 300 mg ao dia: as carnes mais comuns contêm de 50
mg a 80-90 mg a cada 100 g, enquanto os produtos marinhos, em média de
50 mg a 70 mg, variando dos 35 mg do salmão aos 150 mg do camarão,
passando pelos 65 mg do calamar e os 50 mg da ostra, apesar de ela conter
86% de água...

Naturalmente, a coisa muda muito com relação à qualidade dessas gorduras:


de fato, é apenas nos produtos marinhos que podemos encontrar teores
signi cativos daqueles preciosos ácidos graxos ômega 3 de cadeia longa, que
nosso organismo precisa fazer muito esforço para sintetizar, e que, portanto,
devemos introduzir prontos em uma certa quantidade, a qual nos é
assegurada por pelo menos três porções semanais de alimentos provenientes
do ambiente marinho.

Para voltar às “refeições à base de peixe”, en m, o que realmente fará


diferença será o número e o tamanho dos pratos (por exemplo, evitemos
incluir na refeição, além dos tradicionais “primeiro” e “segundo” pratos, um
“antepasto marinho”, inevitavelmente acompanhado de muito pão...) e as
doses de gorduras nos condimentos, previstas pelas diversas receitas, ou
acrescentadas generosamente demais por nós mesmos à mesa. E não
esqueçamos jamais que as frituras absorvem uma parte notável dos óleos em
que são cozidas, e que apenas 1 g de qualquer óleo nos fornece 9 kcal! Sob
esse ponto de vista, os tipos de cozimento mais aconselháveis para o peixe
são, sem dúvida, a fervura e o cozimento “no sal”.

CREAM CRACKERS E GRISSINI NO LUGAR


DO PÃO ME AJUDAM A EMAGRECER
Trata-se de uma ideia provavelmente ligada ao modo como esses produtos
esfarelam e à sensação de leveza que transmitem, mas é equivocada.

Cream crackers, grissini e também torradas, na verdade, são mais


“consistentes” do que o pão, pois contêm menor quantidade de água (em
torno de 6% apenas, contra 30% a 35% do pão), além de que são preparados
acrescentando-se certa quantidade de gorduras (contêm cerca de 10%), ao
passo que as variedades mais comuns de pão são produzidas somente com
água, farinha, sal e fermento e contêm somente entre 0,5% e 2% de
gorduras. A consequência lógica é que, para o mesmo peso, os substitutos do
pão fornecem mais calorias: cerca de 430 kcal a cada 100 g, contra as cerca
de 270 kcal do pão.[30]

Outra possível origem dessa crença pode estar ligada ao fato de que
controlar a quantidade de pacotinhos de cream crackers e de grissini que
consumimos à mesa parece mais fácil do que controlar a quantidade de pão.
No entanto, há também o reverso da medalha: partir da ideia de que cream
crackers e grissini são mais leves pode muitas vezes criar um álibi
psicológico que induz a comer mais deles, resultando que, no m das contas,
o teor calórico total, longe de ter sido reduzido, revela-se consideravelmente
aumentado.

Uma curiosidade: grissini e similares são difíceis de passar no prato para


aproveitar o que sobra dos atraentes molhos à base de gorduras que muitas
vezes envolvem nossos alimentos, ao passo que a mesma operação, se
usarmos pão, torna-se tão fácil e convidativa que renunciar a ela é realmente
difícil – quem sabe também com base nessa consideração é que tenha se
difundido a ideia de que esses produtos podem ajudar a controlar a
quantidade de calorias alimentares que ingerimos.

PARA PERDER PESO, É NECESSÁRIO


ELIMINAR TOTALMENTE AS GORDURAS DA
DIETA
É uma ideia errada e sem sentido, até porque é impossível de se realizar, na
verdade. E mesmo se fosse possível fazê-lo, eliminar as gorduras da nossa
dieta seria um erro: de fato, para estar bem, precisamos ingerir determinada
quantidade de gorduras, mas sem exagerar (o que, porém, costuma
acontecer com bastante frequência). Nas quantidades e com a qualidade
certas, as gorduras alimentares são indispensáveis. Justamente quanto à
qualidade, são preferíveis, por serem mais “saudáveis”, as gorduras vegetais
(tanto os óleos e margarinas quanto as gorduras naturalmente presentes nos
alimentos do mundo vegetal) – as quais são, em sua maioria, insaturadas –
em comparação com as gorduras animais (manteiga, toucinho, banha, nata e
gorduras naturalmente presentes nos produtos do mundo animal), que são
predominantemente saturadas. Uma exceção são as gorduras presentes em
grande parte dos produtos pesqueiros. E é preciso ressaltar que a diferente
qualidade das gorduras pode ter efeitos importantes no estado de nutrição e
de saúde do homem.

Por que a presença das gorduras na nossa alimentação é essencial? Porque


elas são uma fonte concentrada de energia (9 kcal por grama, isto é, mais
que o dobro do que proteínas e carboidratos apresentam) e porque
fornecem ácidos graxos essenciais que o nosso organismo não é capaz de
sintetizar (portanto, devem ser obrigatoriamente ingeridos com a comida),
os quais são, por exemplo, componentes fundamentais das paredes celulares
e funcionam como precursores de várias moléculas com elevada atividade
biológica. As gorduras também favorecem o transporte e a absorção das
vitaminas lipossolúveis e dos carotenoides, bem como de outros compostos
bioativos lipossolúveis (como o licopeno); ajudam a trazer a sensação de
saciedade e conferem sabor aos alimentos, entre outros motivos.

Por outro lado, é verdade que muitas vezes acabamos por consumir
habitualmente mais gorduras alimentares do que deveríamos, o que torna
bem mais pesado o nosso equilíbrio energético, considerando a já lembrada
alta “densidade energética” das gorduras. E é verdade que, justamente por
causa disso, as gorduras – tanto as que são acrescentadas aos pratos no
cozimento como aquelas já presentes na própria estrutura dos alimentos –
são os primeiros componentes que devem ser limitados, até fortemente,
quando se decide diminuir o teor calórico da dieta. De maneira geral,
portanto, essa estratégia não está errada, contanto que seja usada com
comedimento, ou seja, simplesmente diminuindo o consumo de substâncias
gordurosas, e não abolindo-as por completo – o que aliás, como já dissemos,
é tecnicamente impossível.

En m, para perder peso é su ciente reequilibrar o equilíbrio energético


total, isto é, consumir menos calorias do que se gasta. E isso se obtém de
maneira muito simples, aumentando a atividade física e diminuindo de
forma equilibrada o consumo de todos os diferentes nutrientes e alimentos,
sem alterar profundamente a composição qualitativa das porções por meio
de exclusões drásticas.

Quanto às gorduras, portanto, será su ciente limitar de forma mais ou


menos severa tanto seu acréscimo na forma de condimento quanto o uso de
alimentos que contenham quantidades importantes de lipídios, de acordo
com a situação e os conselhos do nosso médico. Mas isso sem considerar a
hipótese de exclusão total, que, além de ser praticamente impossível de
realizar, também seria desprovida de bom senso e arriscada para a nossa
saúde.

TOMAR MUITO CAFÉ AJUDA A


EMAGRECER
É uma ilusão inocente, ainda que não seja totalmente infundada a ideia de
que o café possa de fato dar alguma ajuda marginal a quem deseja controlar
o próprio peso, tanto porque ele induz certa sensação de saciedade quanto
porque possui uma modesta ação de estímulo do metabolismo, graças ao seu
conteúdo de cafeína: um modesto efeito “termogênico”, ou seja, um pequeno
empurrão para dissipar parte da quantidade de energia absorvida com a
dieta. Mas não se trata de efeitos relevantes.

A realidade é que efeitos consistentes sobre a massa corpórea foram obtidos


experimentalmente apenas com o consumo de doses farmacológicas (ou
seja, particularmente elevadas) de cafeína – vale dizer, quantidades muito
superiores àquelas que podem ser obtidas não só do número de espressos
que em média sugere-se não ultrapassar diariamente (que seriam cerca de
quatro ou cinco), mas mesmo do número de xícaras (cerca de dez a cada 24
horas) que em geral é indicado como o limite máximo e que jamais deve ser
ultrapassado, nem por quem tolera muito bem essa bebida.

Além disso, é preciso considerar que seria equivocado identi car o café
apenas com a conhecidíssima cafeína. Ela é um alcaloide brandamente
estimulante que pode in uenciar vários órgãos e sistemas (desde o
cardiovascular até os rins e o sistema nervoso central), mas que, nas doses
comumente consumidas com o café, exerce efeitos bastante modestos.

Na verdade, essa bebida estimulante tem uma composição química


complexa, pois contém centenas e centenas de substâncias, ainda nem todas
conhecidas. Sua distribuição e as quantidades relativas diferem de uma
espécie para a outra e se modi cam notavelmente com a torrefação, o
processo que transforma o grão verde em grão torrado, pronto para ser
moído e utilizado na preparação da bebida. De acordo com o tipo de
torrefação, alguns componentes se transformam, outros desaparecem e
outros ainda são formados: trata-se de centenas de substâncias voláteis que
determinam o aroma do café torrado, junto de pigmentos marrons, as
melanoidinas, às quais os pesquisadores atualmente dedicam muita atenção.

Muitos dos vários componentes são substâncias bioativas, ou seja, capazes


de exercer uma função no metabolismo celular. Trata-se de minerais como o
potássio e o magnésio, de gorduras terpênicas, de precursores de vitaminas e
sobretudo de antioxidantes, como taninos, melanoidinas e ácidos
clorogênicos. Justamente sobre estes últimos concentrou-se a atenção, há
alguns anos, em virtude de uma possível ação emagrecedora – mas essa
hipótese jamais foi con rmada. Aliás, os relativos estudos levaram, muito
recentemente, a um desmentido o cial acerca de possíveis efeitos desse tipo
nesse componente natural do café.

QUEM DORME POUCO É MAIS MAGRO


Na verdade, o certo é o contrário: todos os estudos conduzidos sobre esse
tema demonstraram que aqueles que dormem, em média, somente entre 4 e
6 horas por noite tendem tanto a aumentar de peso quanto a armazenar
mais tecido adiposo.

Quanto às causas, existem várias hipóteses. Algumas são do tipo


comportamental: os indivíduos insones se mostram, em geral, menos
dispostos a manter uma atividade física regular, muitas vezes resultando
menos ativos e mais apáticos do que aqueles que dormem um número
su ciente de horas. Além disso, nas horas de vigília noturna, eles têm mais
oportunidades de se permitir quantidades adicionais de comida, em geral
escolhendo alimentos hipercalóricos, como se naqueles momentos alguns
mecanismos de autocontrole deixassem de funcionar.

São temas que despertam grande interesse e sobre os quais as pesquisas


continuam. Um estudo recente conduzido com cerca de 2 mil homens,
acompanhados durante um ano, além de con rmar a relação direta entre a
refeição noturna rica demais em gorduras e a piora da qualidade do sono,
veri cou que aqueles que dormem pouco e mal se sentem mais desprovidos
de energia e estão mais inclinados a comer demais, chegando a devorar
cerca de 200 kcal a mais por dia, cedendo mais facilmente à tentação de
fazer lanchinhos noturnos ricos em gorduras e açúcares.

Outras hipóteses acentuam a responsabilidade parcial de possíveis


mecanismos hormonais, como uma alteração da produção de alguns dos
hormônios que regulam o apetite (menos leptina, que reduz a sensação de
fome, e mais grelina, que a estimula), ou também uma diminuição das taxas
de eliminação da gordura corporal, por causa da maior produção de cortisol
(o chamado “hormônio do estresse”), que, entre outras coisas, faz com que
os músculos sejam mais utilizados do que o tecido adiposo como fonte de
energia para o organismo.

E os neurologistas – que por sinal estão interessados sobretudo nos efeitos


que a privação aguda do sono por dezenas de horas consecutivas exerce
sobre várias regiões do cérebro – con rmaram que dormir muito pouco
produz uma espécie de autointoxicação do córtex pré-frontal, o qual é
ativado pelos hormônios do apetite até provocar uma orientação espontânea
para alimentos com alto conteúdo calórico. Entender as relações entre a
privação do sono e a predisposição à obesidade é muito importante, porque
é possível que as áreas do cérebro envolvidas no fenômeno sejam as mesmas
ativadas em quem passa da conta com o álcool ou faz uso de drogas.

Mas, de maneira mais geral, hoje é grande a atenção voltada às relações


entre a redução das horas de sono e o aumento da probabilidade de
desenvolver doenças metabólicas como o diabetes tipo 2 e a obesidade.
Entendeu-se que as relações entre as doenças metabólicas e o sono são
muito complexas e merecem ser aprofundadas. Por exemplo, chegou-se à
conclusão de que tanto uma privação de sono parcial, mas repetida, quanto a
má qualidade do sono, acordando repetidas vezes durante a noite,
modi cam o metabolismo da glicose e a secreção de insulina, aumentando o
risco de surgimento do diabetes. E que uma alteração crônica do ritmo
sono-vigília acaba por alterar o relógio biológico a ponto de dever ser
considerada um fator de risco de doenças metabólicas equivalente à
inatividade física ou a uma dieta desbalanceada.

No conjunto, pode-se dizer que muitas coisas estão sendo descobertas sobre
a relação existente entre a privação do sono e o aumento de peso. Mesmo
que as ideias ainda não estejam de todo claras. Por exemplo, em certos
casos, poderíamos estar diante de uma inversão entre causa e efeito, se,
hipoteticamente, uma obesidade abdominal produzisse tantas apneias e
dispneias noturnas a ponto de piorar a qualidade do sono até provocar a
própria insônia.

Concluindo, pensar que uma boa qualidade habitual do sono possa dar uma
ajuda válida a controlar melhor o peso está longe de ser uma heresia. E em
todo caso, obviamente, está con rmado que dormir muito pouco ou dormir
mal decididamente faz mal à saúde...

PRODUTOS SEM GLÚTEN EMAGRECEM


É uma ideia errada, e con ar nos alimentos gluten-free para emagrecer
representa apenas uma moda que explodiu nos últimos anos.

Uma moda que se encaixa na mais ampla mania dos “alimentos sem alguma
coisa”, que tomou o lugar daquela dos alimentos enriquecidos com algum
nutriente na concorrência pelo mercado alimentar. A causa talvez esteja no
fato de que estes últimos são vistos instintivamente pelo consumidor como
mais “engordativos”, justamente porque contêm algo a mais,
independentemente da natureza e da quantidade dos nutrientes
acrescentados.

Como se sabe, o glúten é um complexo proteico presente em muitos cereais


(como trigo, cevada, centeio, aveia, trigo emmer, trigo kamut, etc.),
responsável por efeitos tóxicos nas pessoas que têm predisposição a serem
intolerantes ao próprio glúten, levando à doença celíaca propriamente dita.
“O único tratamento que garante ao celíaco um bom estado de saúde é a
dieta sem glúten, conduzida com rigor”, avisa a Associazione Italiana
Celiachia [Associação Italiana de Doença Celíaca] –; portanto, é fácil
entender quão vantajosa é uma maior disponibilidade de produtos sem
glúten para quem é celíaco ou sofre de hipersensibilidade ao glúten. Mas o
fato estranho é que, nos países que têm esses dados disponíveis, embora os
diagnósticos de doença celíaca não tenham aumentado substancialmente em
número nos últimos anos, as vendas de produtos livres de glúten quase
triplicaram: nos Estados Unidos, cerca de 20% da população adquire esse
tipo de alimentos, sendo que os celíacos são só 1%, e isso mesmo
considerando que o número de pessoas interessadas possa ter aumentado no
máximo mais 8% ou 10% (e não mais do que isso) com a inclusão daqueles
que têm outros problemas relacionados ao glúten (como hipersensibilidade
ao glúten ou alergia ao trigo).

Na Itália, calculou-se recentemente que cerca de 6 milhões de pessoas


decidiram eliminar o glúten, mesmo não sofrendo de doença celíaca ou de
hipersensibilidade. O mercado do “sem glúten” aumenta 27% a cada ano e
em 2016 chegou a um total de 320 milhões de euros, dos quais 105 foram
gastos (ou jogados fora?) por “celíacos da moda” e 215 por pacientes com
diagnóstico de doença celíaca. Certamente essa situação também foi
determinada pelo marketing agressivo das empresas produtoras, a ponto de
conferir ao glúten uma imerecida imagem negativa. E sem dúvida, a lenda
de que a dieta sem glúten ajuda a emagrecer deu uma boa “mãozinha” para
isso.

En m, muitas pessoas decidem passar para uma alimentação sem glúten por
decisão pessoal, ou porque foram induzidas a imitar as numerosas
celebridades (atrizes, atletas, etc.) que proclamam ter sido convertidas a essa
moda, ou porque acham que isso pode ajudá-las a perder peso, ou porque
acham que essa alimentação é mais saudável ou “dietética”, ou ainda porque
se autodiagnosticaram intolerantes com base em sintomas genéricos ou mal
interpretados. Também de acordo com a Associazione Italiana
Gastroenterologi Ospedalieri (AIGO),[31] “o mito que alimenta essa moda
reside na convicção de que uma dieta pobre em cereais e produtos que
contenham glúten é emagrecedora e salutar. O risco ligado a essa escolha é
o de reduzir o consumo de vitaminas do complexo B e de bras bené cas
para a saúde do intestino, e também o de compensar a falta de massas e pão
com gorduras saturadas”.

Muitas dietas e muitos sites da internet exaltam imprudentemente as


hipotéticas vantagens do gluten-free (como mais energia, mais proteção para
o coração, perda de peso...) sem que exista nenhuma prova válida disso.
Aliás, alguns estudos recentes desmentiram que a dieta sem glúten reduza o
risco cardiovascular, e também é preciso considerar que limitar o glúten
pode levar a um consumo reduzido de cereais integrais.

Pois bem, é preciso dizer de uma vez por todas que os produtos sem glúten
não servem para emagrecer, por toda uma série de motivos muito claros.
Antes de mais nada, eles apresentam maiores quantidades de gorduras se
comparados aos produtos correspondentes que contêm glúten, ainda que
esse aspecto esteja sendo atenuado nos últimos tempos: essas gorduras são
acrescentadas para suprir a ausência das propriedades típicas do glúten, ou
seja, para conferir à massa viscosidade, elasticidade e resistência. Uma
comparação efetuada recentemente permitiu veri car que, por exemplo, o
pão sem glúten contém, em média, o dobro de gorduras em relação ao pão
normal, e naturalmente menos proteínas. A mesma situação se dá também
com os biscoitos. Além disso, os produtos sem glúten apresentam maior
índice glicêmico (uma medida do aumento da glicemia após o consumo de
certa dose de um alimento), o qual é mais baixo para o glúten. Finalmente, a
ausência do glúten determina um esvaziamento mais rápido do estômago, o
que provoca uma menor duração da sensação de saciedade.
Não é por acaso que os celíacos que começam a consumir esses produtos,
além de recuperar peso por nalmente se livrarem dos efeitos negativos da
doença e recomeçarem a assimilar normalmente as substâncias nutritivas,
podem também tender a engordar em seguida. Tanto o gosto renovado por
certos alimentos quanto o consumo diário de produtos com uma maior
densidade calórica têm um papel nisso.

En m, os produtos sem glúten servem somente para construir uma dieta


adequada aos celíacos. A própria AIGO escreveu isso com todas as letras:
“Acreditar que a dieta sem glúten seja mais saudável e faça emagrecer é um
perigoso equívoco que banaliza a doença celíaca, a qual atinge 1% da
população, para os quais a exclusão do glúten não é uma escolha, mas uma
verdadeira salvação”, e também: “Desfaçamos um mito: a dieta para celíacos
não serve para emagrecer.”

PARA EMAGRECER, É PRECISO ABOLIR O


MACARRÃO
Essa reputação de “alimento que engorda” persegue o macarrão há muitos
anos e impeliu muitas pessoas a abolirem ou limitarem excessivamente o seu
consumo.

Trata-se, na verdade, de uma generalização muito super cial que corre o


risco de penalizar sem motivo tanto o sabor das nossas refeições e o prazer
à mesa quanto o equilíbrio da alimentação, segundo o qual é bom que de
45% a 60% das calorias totais diárias sejam fornecidas pelos carboidratos, e
principalmente os carboidratos complexos (sobretudo amido),[32] nos
quais o macarrão é rico. Mas não é só isso: acontece muito que quem
renuncia ao macarrão acaba recorrendo a alimentos como carne ou salames,
queijos ou produtos ricos em gorduras e açúcares simples para se saciar,
obtendo o resultado duplamente indesejado de desequilibrar mais ainda a
própria dieta e não chegar à almejada redução de peso.

O que nos faz engordar é apenas o excesso de energia alimentar consumida


em relação às nossas reais necessidades, um excesso que se torna mais fácil
se as necessidades de energia são baixas por causa de uma vida sedentária.
Vamos dizer claramente: o macarrão pode fazer parte de qualquer dieta
correta, basta que seja preparado e consumido com moderação. E de fato, a
moderação é justamente uma das características do tradicional modelo
alimentar mediterrâneo.

Mas o que signi ca, na prática, “moderação”? De acordo com as novas


diretrizes alimentares, signi ca que, para o macarrão especi camente, deve-
se prever porções-padrão de cerca de 80 g (ou 50 g a 60 g para quem é
sedentário, ou até 120 g para quem é sicamente ativo) do produto seco,
que está destinado a ter seu peso aumentado de 100% a 120% no
cozimento, isto é, atingirá até cerca de 160 g a 200 g depois de cozido –
uma quantidade respeitabilíssima para qualquer apetite. E isso signi ca
também prestar muita atenção aos condimentos: a recomendação é
acrescentar molhos leves e contendo poucas gorduras (as quais, é bom
lembrar, fornecem 9 kcal por grama!) na alimentação diária ou utilizar
também verduras, peixe ou legumes, dando vida, nesse caso, a um “prato
único”, ou seja, capaz de reunir em si as características nutritivas de um
primeiro e um segundo pratos tradicionais.
Resumindo, o que conta são as doses do produto e o tipo de preparo e da
receita, até porque um prato bem temperado e saboroso fatalmente nos
induzirá a nos exceder na quantidade ou a repetir, algo que nem todos
podem se permitir.

Se utilizado com equilíbrio, o macarrão poderá fazer parte da nossa


alimentação diária sem pôr em risco nossa silhueta e até nos ajudando a
prevenir ou a combater o sobrepeso. Prova disso são os inúmeros estudos –
dois dos quais foram conduzidos muito recentemente com cerca de 23 mil
pessoas – que veri caram novamente que recorrer ao macarrão (melhor se
cozido al dente para ter um impacto menor na glicemia), em um quadro de
moderação como o que descrevemos, leva a um risco menor de sobrepeso e
de obesidade, incluindo a abdominal (a mais perigosa para a saúde),
contanto, obviamente (mas isso vale para qualquer alimento), que sejam
consumidas quantidades proporcionais às próprias necessidades calóricas
totais.

E já que falamos de macarrão, aproveitemos a ocasião para explicar, ainda


que resumidamente, o que queremos dizer com alimentação do tipo
mediterrâneo – um assunto ao qual nos referimos com frequência nestas
páginas – e quais são os motivos para o grande prestígio de que ela desfruta
em todo o mundo. É oportuno fazê-lo, pois sobre a chamada “dieta
mediterrânea” em geral existem concepções um tanto confusas.

Antes de mais nada, é mais correto de ni-lo como “modelo alimentar


mediterrâneo”, justamente para não confundir (como muitas vezes acontece
por causa da desinformação que circula sobre comida e nutrição) com uma
das tantas dietas – emagrecedoras ou não – que entram na moda a cada
ano.

Ao contrário dos modismos, o modelo alimentar mediterrâneo é um assunto


muito sério, cuja validade salutar é comprovada por inúmeros estudos e
provas cientí cas tanto dos tipos bioquímico e clínico quanto
epidemiológico, ou seja, baseadas em veri cações e intervenções também de
longa duração, com amplos grupos populacionais. Suas vantagens em termos
de saúde dependem da sua estrutura particular, que se assemelha muito aos
modelos que em todo o mundo as autoridades sanitárias aconselham como
“dieta prudente”, útil para todos os graus de prevenção contra as doenças
que, em nossa época, representam as principais causas de morbidade e de
mortalidade prematura.

Em síntese: deve haver mais bras e produtos vegetais (portanto, mais


carboidratos complexos); menos açúcares simples e menor índice glicêmico
total; mais ácidos graxos monoinsaturados e poli-insaturados; mais ácidos
graxos ômega 3; menos produtos de origem animal, e, portanto, também
menos gorduras em geral e menos gorduras de origem animal em particular
(consequentemente, menos ácidos graxos saturados e trans); e menos sal.
Além disso, deve haver abundância de componentes bioativos menores com
ação antioxidante (os folatos, por exemplo) ou com outros efeitos também
de prevenção de muitos tumores ( toestrógenos ou compostos sulfurados
presentes nas crucíferas e em alguns temperos, etc.). É importante frisar que
todas são substâncias que, quando consumidas com os alimentos, são
capazes de agir e cazmente em sinergia mútua e com outras substâncias
ainda não identi cadas, desenvolvendo um efeito conjunto que se
demonstrou nitidamente superior aos efeitos obtidos com os princípios
nutritivos individuais ingeridos isoladamente.

Isso signi ca que, passando dos princípios nutritivos aos alimentos


propriamente ditos, nesse modelo de consumo a principal fonte de energia
são os alimentos vegetais, com os cereais não re nados e seus derivados em
primeiro plano (como pão e macarrão na Itália ou arroz na Grécia e na
Espanha, etc.), acompanhados por relevantes quantidades de legumes,
hortaliças, frutas, castanhas e gorduras vegetais (sobretudo o azeite de oliva
extravirgem como gordura para condimento), sem excluir moderadas
quantidades de produtos de origem animal – sobretudo peixes e produtos
pesqueiros em geral, e carnes alternativas, ou seja, diferentes da carne
bovina –, além de leite e derivados do leite, e o vinho como bebida alcoólica
de preferência, mas consumido em doses moderadas e fracionadas, na hora
das refeições. Tudo isso no quadro de um estilo de vida mais sóbrio e mais
ativo sicamente.

É fato que hoje o modelo alimentar mediterrâneo é considerado pela


comunidade cientí ca mundial como o modelo de referência a ser
recomendado para proteção da saúde e para uma maior expectativa de vida.
E não é por acaso que a FAO o considera um verdadeiro exemplo de
alimentação sustentável; que justamente suas características são usadas como
referência para estabelecer as indicações e as diretrizes alimentares a serem
seguidas em todo o mundo, e que recentemente a UNESCO o tenha até
proclamado um patrimônio cultural imaterial da humanidade.
O ARROZ TEM MENOS CALORIAS QUE O
MACARRÃO, PORTANTO, É DIETÉTICO
À parte a dúvida quanto ao signi cado do termo “dietético”, devemos dizer
que, se quisermos usar essa palavra para indicar algo que por si só facilita o
emagrecimento, como muitos fazem, estamos no caminho errado.

Basta dar uma olhada nas tabelas de composição dos alimentos para se dar
conta de que determinada porção de arroz fornece substancialmente as
mesmas calorias que uma porção análoga de macarrão. Além disso, os dois
produtos também são muito semelhantes do ponto de vista da capacidade de
produzir a sensação de saciedade, já que 100 g de macarrão cru se tornam,
depois de cozidos, cerca de 200 g a 220 g, enquanto 100 g de arroz cru
tornam-se aproximadamente 230 g a 240 g de produto pronto para ser
consumido.

O problema principal, para esses dois ótimos alimentos, é o tipo e a


qualidade dos condimentos com os quais os enriquecemos; então, “dietético”
não é o arroz em si, nem o macarrão, mas, sim, a escolha da receita certa e a
mão leve na hora de acrescentar molho e encher o prato...

O JEJUM TOTAL DESINTOXICA E


EMAGRECE
A mania atualíssima da magreza (que não deve ser confundida com a justa
busca por um peso adequado à idade e à estrutura física) tornou popular
uma série de métodos de emagrecimento criticáveis e potencialmente
perigosos.
Entre eles está na moda, há vários anos, o jejum total prolongado, durante o
qual se bebe apenas água, muitas vezes com o auxílio da acupuntura, que
serve para tornar mais tolerável a privação total de comida. O problema é
que esse método é alardeado como uma panaceia, ótima para emagrecer e
“desintoxicar”, quando em vez disso representa para o organismo um choque
que traz certo risco e que, entre outras coisas, leva a uma perda de peso
quase sempre ilusória.

É preciso fazer algumas distinções. Um jejum total de duração breve – 24


horas, por exemplo – é bem tolerado pelo nosso corpo, o qual põe em ação
leves adaptações metabólicas para garantir o teor em substâncias nutritivas
aos órgãos vitais mais vulneráveis (por exemplo, glicose para as funções
cerebrais) e para conservar a massa proteica. Um jejum de um dia, portanto,
quase nunca traz problemas – aliás, pode representar uma pausa salutar para
dar um descanso aos órgãos do sistema digestivo e pode ser adotado de vez
em quando, contanto que se beba muita água para eliminar pelos rins
nitrogênio, ureia, ácido úrico e eventuais corpos cetônicos produzidos
justamente pelo jejum. Mas que que claro: certamente não serve como
estratégia para emagrecer.

A coisa muda radicalmente quando falamos de jejuns hídricos prolongados.


Como dissemos, a privação completa e prolongada de comida (não de água)
representa um estresse ao qual o organismo reage como a qualquer evento
traumático, ou seja, com uma típica “reação de emergência”, convocando os
vários hormônios cuja função é intervir nessas situações – sobretudo a
adrenalina, o cortisol e o glucagon, que em poucas horas, e depois em
poucos dias, obtêm toda a glicose possível (indispensável para os glóbulos
vermelhos e para o sistema nervoso) das reservas corporais de glicogênio,
esgotando-as (como combustível, o glicogênio é su ciente apenas para cerca
de 24 horas de jejum), e depois começam a dissociar parte das proteínas
corporais (sobretudo musculares nos primeiros dias e depois as hepáticas e
as do baço) para obter outro elemento necessário, o nitrogênio, e ainda mais
glicose à custa de alguns aminoácidos, que por isso são exatamente de nidos
como glicogênicos. Substancialmente, isso é uma espécie de autocanibalismo,
como alguém o de niu. O organismo consome o próprio precioso tecido
muscular tanto para prover, ao menos em parte, as próprias necessidades
energéticas quanto para obter as mínimas quantidades de nitrogênio e de
glicose que precisa receber diariamente e que lhe são negadas no jejum.
Agora, que que bem claro: em si mesma, essa “reação de alarme” é um
mecanismo protetor desencadeado pela redução da glicemia e que é útil
contanto que o estresse não dure demais. Se, em vez disso, a situação de
emergência se prolonga excessivamente, esses mecanismos protetores se
tornam prejudiciais: adrenalina demais põe o coração e as artérias à dura
prova; cortisol demais depaupera os ossos e os músculos; também os rins e
o fígado podem ter problemas, e o próprio músculo cardíaco pode sofrer
danos. Em conclusão, o jejum prolongado e repetido provoca variações
complexas nos equilíbrios hormonais, e a longo prazo corre-se o risco de
causar sérios danos ao organismo. A literatura relata também vários efeitos
colaterais menores, provocados por jejuns que passaram dos cinco dias,
como depressão do humor, fadiga e irritabilidade fáceis, sensações de frio,
queda da libido, etc. Além disso, a rápida perda de peso das primeiras 24 a
48 horas deve-se principalmente à perda de água (que representa, em
média, de 55% a 60% da massa corpórea total de um adulto) e de glicogênio
(há cerca de 300 g a 400 g dele entre fígado e músculos). Nos primeiros
dois (até quatro) dias, o físico aparentemente responde bem, e aliás, os
níveis mais elevados de cortisol podem trazer uma peculiar sensação de
energia. Mas depois o quadro muda. Nos dias seguintes, o organismo, como
dissemos, começa a atacar as proteínas dos tecidos e tenta obter energia
recorrendo também à gordura armazenada. Infelizmente, porém, a utilização
dos ácidos graxos liberados pela dissociação dessa gordura ca incompleta
em razão da falta de carboidratos, o que provoca a circulação de
quantidades relevantes de corpos cetônicos: a capacidade do organismo de
oxidar essas substâncias logo é superada e as cetonas se acumulam no
sangue, até instaurar uma verdadeira acidose metabólica. As cetonas também
têm um efeito de inibição da fome e substituem a glicose como combustível
para o cérebro, mas representam uma espécie de intoxicação endógena. Foi
demonstrado que no jejum total prolongado a concentração hemática de
corpos cetônicos pode chegar a níveis superiores àqueles que necessitariam
de intervenção médica, segundo a American Diabetes Association.

En m, esse método não só não educa a um comportamento alimentar mais


correto e representa o risco de abrir caminho para a anorexia nervosa (“o
sinistro fascínio do jejum”, segundo os psiquiatras) como também provoca
uma perda de peso em grande parte ctícia, porque é obtida principalmente
à custa de tecidos magros e da água do corpo, e menos à custa das gorduras.
De fato, os corpos cetônicos limitam a dissociação dos lipídios e também a
produção de hormônios da tireoide, retardando assim o metabolismo basal.
E como se não bastasse, a circulação e a eliminação dos corpos cetônicos
pela urina, pelo suor e pelo ar expirado, que podem ser notadas por seu
peculiar cheiro de acetona, é interpretada pelos entusiastas do jejum como a
prova tangível de que aconteceu a desintoxicação e a puri cação das toxinas,
quando na verdade não passa da demonstração de que se instaurou uma
cetose.
Também é preciso acrescentar que, no nal do período de jejum, a volta à
alimentação “normal” provoca invariavelmente a recuperação de um peso
igual – quando não superior – ao que se perdeu, e ainda por cima com
formação de maiores quantidades de tecido adiposo. Isso piora a
composição corpórea (os músculos “canibalizados” não se reconstituem
senão em pequena parte) e torna ainda mais árdua qualquer futura tentativa
de controle do próprio peso. Além disso, não se pode esquecer que a
presença de cardiopatias, assim como de anemia, diabetes, gastrite ou úlcera,
antecedentes psicóticos ou infartos recentes constituem contraindicações ao
jejum total, ainda que de breve duração.

Bem diferente é o jejum modi cado que se efetua no hospital, em casos


especí cos e sob rígido controle médico. Esse modelo de jejum terapêutico é
planejado de forma a assegurar diariamente certo teor em carboidratos e a
cobertura das necessidades proteicas e de vitaminas e sais minerais diárias, e
em certos casos pode ser utilizado para iniciar uma estratégia bem
programada de correção de um sobrepeso acentuado ou de uma obesidade
relevante.

Interessante mencionar também outro campo de aplicação do jejum que nos


últimos anos está se tornando cada vez mais popular: a teoria é que um
breve jejum, ou uma restrição calórica também acentuada, pode de agrar
uma série de mecanismos defensivos favoráveis, como a ativação de genes
que reduzem o estado in amatório e estimulam fatores de crescimento e de
renovação celular (com a eliminação de detritos), e talvez também o
aumento da expectativa de vida e o retardamento – ao menos em animais de
laboratório – do crescimento de alguns tumores. Trata-se de um empolgante
campo de pesquisa no qual operam muitos estudiosos de valor e que
ultimamente traduziu-se em propostas voltadas também ao grande público.
Vale a pena lembrar algumas delas.

A primeira proposta consiste no chamado jejum intermitente, a ser feito em


dois ou três dias não consecutivos da semana, e que consiste em car de 15
a 18 horas de jejum depois de um café da manhã livre e de uma refeição
menos rica no meio do dia. O jejum começa às 15 horas e prossegue até a
manhã seguinte, evitando qualquer ingestão de alimentos à tarde e à noite.
Nos outros dias, deve-se seguir um regime alimentar normal. Consumir
alimentos somente nas horas de atividade diurna, ao que parece, ajuda a
prevenir algumas patologias metabólicas e também a obesidade; isso, no
entanto, está baseado em medições indiretas e preliminares, das quais
espera-se uma con rmação mais sólida.

Uma variação sobre o tema foi proposta por um estudioso inglês em um


livro de sucesso, o alternate-day fasting (jejum em dias alternados), com dois
dias não consecutivos por semana de forte restrição (consumindo apenas
25% das próprias necessidades, 500 kcal ou 600 kcal – dias fast) e cinco
dias de alimentação sem restrições (dias feast), consumindo até 125% das
próprias necessidades (!). A promessa do autor é de perda de peso e
combate ao diabetes, à demência e aos tumores; porém, um estudo de
controle muito bem realizado pela University of Illinois em cem obesos
adultos acompanhados durante um ano inteiro descartou que esse esquema
pudesse dar resultados melhores do que uma restrição calórica diária normal
no tocante à perda de peso e à cardioproteção.

Depois, também ganharam muito espaço nos meios de comunicação de


massa as propostas de um estudioso italiano que trabalha entre Milão e a
Califórnia, Valter Longo, o qual sustenta a tese – nada excepcional – de que
a restrição calórica pode favorecer um aumento da expectativa de vida,
porém, até agora, ele infelizmente só demonstrou em culturas de leveduras,
nematódeos e ratos, e ainda com uma e ciência que parece diminuir à
medida que se avança na escala evolutiva. Com base nisso, de início o autor
propôs a ideia de uma “dieta da longevidade”: um esquema “quase
vegetariano” com menos calorias e menos proteínas (sobretudo de origem
animal), baseado em legumes, cereais integrais, verduras e peixe, dividido
em duas a três refeições e um a dois lanches diários, com a costumeira
“janela” noturna de 12 horas durante a qual não se deve comer nada. O
resultado deveria ser um efeito de retardar o envelhecimento. Além disso,
ele adverte para evitar as populares dietas hiperproteicas e hiperlipídicas,
prejudiciais à saúde; reduzir drasticamente os açúcares simples e preferir
legumes e hortaliças, etc. – trata-se de linhas de comportamento aceitáveis,
mas que, francamente, pouco têm a ver com jejum. Muito menos aceitáveis,
em vez disso, são seus conselhos para evitar o consumo de frutas, pão e
macarrão.

Em seguida, como modelo mais fácil de seguir, o mesmo Valter Longo


publicou e distribuiu nas livrarias uma dieta com o cativante nome de
“mima-jejum”, apresentada como um “botão de reset” que permitiria que as
células se regenerassem. Trata-se de uma espécie de jejum “modi cado” de
cinco dias consecutivos de duração (com cerca de 1.000 kcal a 1.090 kcal
no primeiro dia e 725 kcal a 800 kcal nos quatro seguintes) a ser feito no
máximo uma vez ao mês e de três a doze vezes ao ano, alternando-o com a
alimentação habitual. A promessa, desta vez, é de “reprogramar as células e
retardar o envelhecimento” até ganhar dez anos de vida, uma a rmação
francamente ousada e até agora não respaldada por provas su cientes. Mas
isso interessa até certo ponto à maior parte dos leitores comuns, os quais,
em vez disso – e como era previsível –, interpretaram também essa dieta
como mais um método para tentar emagrecer, embora o autor não esteja
substancialmente de acordo, e aliás sugira que sua dieta só deva ser seguida
sob rígido controle médico, para não correr riscos.

Como se vê, no tema do “jejum breve”, campo de pesquisa muito promissor


para o futuro, o interesse e as atenções dos estudiosos se multiplicam; mas
está bem claro que esses “pseudojejuns”, que receberam tanto espaço na
grande imprensa, felizmente nada têm a ver com os excessos e os riscos
ligados ao jejum absoluto prolongado, uma prática decididamente
desaconselhável.

Nas manchetes simpli cadas dos jornais e na mente dos leitores, porém, as
diferentes propostas muitas vezes terminam se sobrepondo e se confundindo
entre si, à custa de uma correta informação do público. No m das contas,
permanece fortíssima a sensação de que seguir as diretrizes recomendadas
pela OMS e pela comunidade médica mundial, com base nas linhas gerais do
modelo alimentar mediterrâneo, seja atualmente – e para todos – o método
mais lógico e compreensível, e também o mais adequado, para garantir uma
boa saúde, uma massa corpórea correta e o melhor desenvolvimento possível
da expectativa de vida característica de cada pessoa.

PULAR REFEIÇÕES AJUDA A EMAGRECER


A prática do dia a dia nos ensina que essa estratégia, que em teoria poderia
ter certa lógica, na realidade funciona muito pouco, e por muitos e
diferentes motivos.
Antes de mais nada, pular uma refeição e, portanto, enfrentar um jejum de
várias horas signi ca correr o risco de entrar em hipoglicemia, e sabemos
que a concentração de glicose no sangue deve ser mantida constante
sobretudo por causa das exigências do tecido nervoso, que é obrigado a
utilizá-la, pois só é capaz de obter energia dela. E a falta de um
fornecimento adequado de glicose ao cérebro é capaz de provocar danos aos
neurônios em pouco tempo. Por conseguinte, o organismo reage
prontamente e de várias maneiras à hipoglicemia, tanto obtendo glicose das
reservas de glicogênio do fígado e dos músculos – que, no entanto, são
limitadas e não duram muitas horas – quanto ativando outros mecanismos.
Entre eles está a liberação de um hormônio, o cortisol, que além de ter a
função de desencadear, a médio e longo prazo, um processo destinado a
obter glicose e energia à custa das proteínas musculares, também pode gerar
em pouco tempo um estado de estresse que cria o risco de determinar o
aparecimento de uma fome compulsiva e difícil de controlar. Dois
fenômenos pouco desejáveis, evidentemente. E a eventual perda de peso que
se segue imediatamente ao jejum deve-se mais à perda de líquidos do que ao
consumo das gorduras acumuladas.

Além disso, na refeição seguinte é fácil que a pessoa incorra no erro de


comer demais e de forma voraz, à custa também de uma boa digestão, tanto
pela lógica sensação de fome causada pelas 10-12 horas de jejum quanto
pela inevitável sensação mental de ter um “crédito” em relação à comida e
poder, portanto, permitir-se quantidades superiores às normais. Dessa
forma, grande parte das hipotéticas vantagens advindas de ter evitado a
refeição anterior inevitavelmente são perdidas.
E com um agravante nada corriqueiro: essa refeição superdimensionada
provocará uma liberação maior de insulina, um hormônio cuja tarefa, entre
outras, está também a de incentivar a síntese de tecido adiposo. É
justamente esse um dos motivos pelos quais constatou-se que, em geral,
consumir a alimentação diária concentrando-a em apenas uma ou duas
grandes refeições em vez de fracioná-la no decorrer do dia (considerando a
mesma qualidade e quantidade dos alimentos consumidos) facilita um
aumento de peso e um aumento da massa gorda, dos níveis de colesterol no
sangue e da glicemia, além dos consequentes riscos de doenças
cardiovasculares e de diabetes.

E não é só isso: se a refeição mais rica é a da noite, uma quase inevitável


consequência será uma fase digestiva mais difícil e prolongada, com
repercussões desfavoráveis na qualidade do descanso noturno.

QUANDO COMEÇO UMA DIETA, OS


PRIMEIROS QUILOS QUE PERCO SÃO SÓ
ÁGUA
Evidentemente é só maneira de dizer, embora haja quem leve isso ao pé da
letra.

O que é inegável é que, quando nos empenhamos em um programa de


emagrecimento, em geral os primeiros quilos são perdidos mais facilmente,
ao passo que, nos períodos seguintes, a perda de peso por unidade de tempo
ca mais lenta. Isso acontece por vários motivos: a inevitável adaptação do
metabolismo (que reage à redução das calorias alimentares e à diminuição
do peso reduzindo o próprio consumo energético de base e combatendo,
assim, os efeitos buscados pela dieta hipocalórica), a própria diminuição da
massa corpórea (para a mesma atividade motora, a redução da carga a ser
transportada faz diminuir também o consumo de energia pelos músculos); e
muitas vezes também a – quase inevitável – menor adesão à dieta, que se
veri ca com o passar das semanas, etc.

Isso, porém, não signi ca que os primeiros quilos perdidos sejam “só água”.
Mais simplesmente, esses primeiros quilos eliminados têm, na maioria das
vezes, um conteúdo de tecido adiposo menor em relação àquele que
caracterizará os quilos perdidos na sequência, já que junto da “gordura”
perdem-se também quantidades maiores ou menores de outros componentes
do nosso organismo, como uidos corporais, glicogênio muscular, etc. São
esses componentes os principais responsáveis pela acelerada perda de peso
inicial.

Quanto ao glicogênio, que é constituído por 5 a 7 mil moléculas de glicose


ligadas entre si, é preciso dizer que ele representa a mais importante reserva
de energia “pronta para uso” pela atividade dos músculos esqueléticos, os
quais geralmente contêm de 200 g a 300 g desse polissacarídeo (e outros
100 g, aproximadamente, estão presentes no fígado). Via de regra, o
glicogênio muscular é consumido durante o esforço físico para depois ser
reabastecido rapidamente nas refeições seguintes.

Voltando às variações de peso durante uma fase de emagrecimento, há outro


aspecto a ser considerado: vale dizer que, nas semanas sucessivas, a redução
mais lenta do peso será parcialmente compensada pelo fato de que os quilos
perdidos serão quase sempre caracterizados e tornados mais válidos por
uma maior presença porcentual de tecido adiposo. E lembramos que é
justamente a eliminação de gordura – e apenas ela – que merece ser
de nida como “emagrecimento”!

Entre outras coisas, o que dissemos até aqui ajuda a entender por que é tão
importante que quem se dedica a um programa de emagrecimento se faça
acompanhar por um médico, o qual, além de impedir que seja adotada uma
dieta restritiva demais ou excessivamente desbalanceada, também o ajudará a
interpretar corretamente as respostas da balança e a monitorar as variações
da composição corpórea, evitando assim, inclusive, momentos de desânimo
muitas vezes exagerados e substancialmente infundados.

E mais uma vantagem está ligada à oportunidade que o médico também terá
de ajudar o paciente a identi car a meta certa a ser objetivada, e a não cair
na armadilha da busca por um “peso ideal” autorreceitado e quiçá
inalcançável. Efetivamente, o peso ideal não passa de um conceito sem bases
cientí cas claras, que deve ser substituído pela identi cação de um peso
“desejável” relacionado à estatura, à constituição física, à idade e ao sexo –
algo com o que nosso médico pode nos ajudar, evitando que caiamos em
desilusões talvez sem motivo algum, ou, pior ainda, que teimemos com
programas dietéticos drásticos demais, os quais podem trazer riscos não só à
nossa saúde, mas também, em casos especí cos e infelizmente não raros, ao
nosso equilíbrio físico e psicológico.

ESTOU ACIMA DO PESO PORQUE TENHO


OSSOS PESADOS
Trata-se de um “lugar comum” difundidíssimo, repetido a cada passo, e
certamente em boa-fé, por pessoas que alegam estar geneticamente
condenadas a pesar demais, sem salvação.

Há um pouco de confusão nisso. Na verdade, as dimensões do esqueleto não


têm muito a ver com o peso, visto que nossos ossos representam no máximo
20%, aproximadamente, daquilo que constatamos quando subimos na
balança: seria mais ou menos 14 kg para uma pessoa de 70 kg. Mas os
valores médios oscilam entre 10,5 kg e 12,5 kg, de acordo com a estatura.
Além disso, a variação entre uma pessoa e outra, e também entre o homem e
a mulher, não supera os 2 kg, mesmo em uma hipotética comparação do
esqueleto de Ajax, o Grande com o de uma bailarina do Bolshoi...

Portanto, se uma pessoa está realmente acima do peso, os ossos têm muito
pouco a ver com isso, e o principal culpado é sempre o tecido adiposo
armazenado em excesso no corpo. No entanto, é verdade que uma ossatura
mais sólida tem a ver com a “silhueta” da pessoa, ou seja, com o seu “tipo
morfológico”, no sentido de que ossos mais pesados em geral são
acompanhados por músculos naturalmente mais volumosos e redondos.
Como o músculo tem um peso especí co mais elevado que a gordura, uma
musculatura desse tipo é notavelmente mais pesada se comparada com uma
caracterizada por músculos nos e alongados, e acarreta um aumento não
desprezível da massa corpórea basal total. Trata-se, porém, de quilos de
tecidos magros, muito ativos metabolicamente, e que são um componente
importante da chamada “massa magra”, cuja in uência no plano do bem-
estar jamais deve ser confundida com aquela atribuída aos tecidos com um
componente maior de gordura.

E quanto à outra tipologia de musculatura, lembramos que os músculos


nos e alongados, que pesam não poucos quilos a menos, são igualmente
e cientes do ponto de vista do esforço físico: um atleta com essas
características pode tranquilamente vencer uma Olimpíada ou um Tour de
France.

En m, o tipo de desenvolvimento muscular pode levar a variações notáveis


no peso basal de uma pessoa, bem diferente do aumento eventual e
sucessivo causado pelo acúmulo de tecido adiposo em excesso. A utuação
do tecido adiposo (sua deposição ou remoção) continua sendo, portanto, a
maior causa das oscilações da massa corpórea a médio e longo prazo. Em
vez disso, as variações do peso em períodos muito curtos (horas ou dias),
ainda que chamem muito a atenção (e afetem o humor...) daqueles que –
equivocadamente – se pesam com uma frequência obsessiva, até mais vezes
no âmbito de um mesmo dia, são em sua maioria em razão de modi cações
do componente hídrico do nosso corpo e muito pouco têm a ver com
situações de engorda ou de emagrecimento propriamente ditas.

PRECISO PERDER QUILOS DEMAIS, ENTÃO


NEM VOU TENTAR
Aí está uma atitude humanamente compreensível, mas profundamente
errada.

Posições derrotistas desse tipo podem derivar da consciência de não ter


força de vontade ou perseverança su cientes para enfrentar um regime
emagrecedor, ou então da frustração provocada por decepções anteriores; ou
ainda pela ideia de se ver diante de um caminho tão longo, por causa do
grande número de quilos em excesso, que faz passar até a vontade de tentar.
No entanto, a aceitação de um elevado sobrepeso ou de uma verdadeira
obesidade como algo invencível representa um perigo grande demais para a
saúde e a qualidade de vida. De fato, sabe-se bem o quanto o excesso de
peso pode aumentar o risco de complicações metabólicas (diabetes, doenças
cardiovasculares, hipertensão, etc.) e de alguns tipos de tumores, além de
problemas do tipo mecânico, por causa das articulações (com a artrite
precoce) e da insu ciência respiratória (apneias obstrutivas no sono, com a
consequência de de ciências na memória e na concentração, hipertensão
arterial, problemas cardíacos e cerebrais, etc.). Vale lembrar que são
consequências cujo surgimento é mais provável quando o tecido adiposo em
excesso se localiza sobretudo na parte superior do corpo e nas zonas
viscerais, uma distribuição comum nos indivíduos do sexo masculino, mas
que também pode ser veri cada de maneira pontual nas mulheres,
especialmente na fase pós-menopausa.

Lembramos que a distribuição central ou visceral (androide) da gordura


corporal é considerada um fator de risco independente para a redução da
expectativa de vida, a ponto de hoje a topogra a da gordura corporal ser
considerada mais signi cativa do que a própria quantidade absoluta de
massa gorda. Uma avaliação dessa topogra a pode ser efetuada medindo-se
a circunferência da cintura no ponto que corresponde à menor
circunferência do tronco, cando em pé e sem prender a respiração: valores
iguais ou superiores a 88 centímetros para a mulher e 102 para o homem
estão associados a um aumento do risco.

Mas voltemos à tentação – compreensível, mas não aceitável – de desistir


antes mesmo de enfrentar um programa de emagrecimento que se a gura
longo demais porque o número de quilos a perder é particularmente
elevado. Trata-se de uma decisão injusti cada, além de perigosa, e que pode
ser superada com o aconselhamento correto. De fato, o que poucos sabem é
que numerosos estudos efetuados em grupos populacionais já permitiram
veri car que, para fazer os índices de risco que mencionamos diminuírem
sensivelmente, nem sempre é necessário enfrentar caminhos longos demais e
tampouco é indispensável perder muitíssimos quilos ou aproximar-se muito
do próprio peso “desejável”, conforme calculado com base na idade e no
porte físico (não usemos o termo “peso ideal”, que é uma abstração
desprovida de bases cientí cas reais).

Na realidade, já se sabe que, mesmo na presença de um sobrepeso muito


relevante, perder alguns quilos – ainda que poucos – muitas vezes pode
bastar para obter vantagens notáveis para a própria saúde. Em outras
palavras, na maioria dos casos é su ciente eliminar ainda que só uma parte
relativamente pequena do excesso de massa gorda (apenas 10% ou até 5%
do peso inicial) para obter melhoramentos signi cativos das condições
clínicas gerais e reduzir de maneira perceptível os riscos de saúde
relacionados à obesidade. E, portanto, até uma redução modesta da
circunferência da cintura – “ el indicadora da gordura visceral”, como foi
adequadamente descrita – é acompanhada de melhoras notáveis no quadro
geral.

En m, alcançar pelo menos essa meta parcial signi ca ter levado a cabo, sem
esforço excessivo, uma exitosa intervenção preventiva. E mesmo se a
redução do peso for limitada, outros sinais indicarão que as coisas
melhoraram, sinais reconfortantes e fáceis de se perceber subjetivamente:
uma rápida melhora da insu ciência respiratória, que se traduz em uma
diminuição ou no desaparecimento do ronco, na redução das apneias e
dispneias noturnas, na melhora da qualidade do sono e em um maior bem-
estar geral.

Voltamos a repetir que toda essa melhora do quadro geral – que traz
consigo notáveis benefícios metabólicos e cardiovasculares – em um
porcentual elevado dos casos pode ser obtida sem restrições calóricas
severas ou difíceis demais de suportar, envolvendo tempo e sacrifício
razoáveis. Uma notícia encorajadora, ainda que seja verdadeira dentro de um
quadro de empenhos a serem adotados e regras a serem respeitadas.

Mas também existem situações – e são frequentes – em que se tem a


impressão de que, independentemente dos esforços, a recompensa do
resultado esperado nunca chega. Totalmente típicos são os casos nos quais,
por querer decidir sozinha com base em premissas erradas, a pessoa
estabelece metas insensatas, objetivos que nunca são alcançados, por mais
sacrifícios que se faça. O risco é chegar à conclusão de que o caso é
desesperador ou, como já ouvimos dizer, de que a pessoa “engorda só de
respirar”, sendo que às vezes a raiz do problema está simplesmente no erro
conceitual de onde se partiu.

Quanto a isso, alguns exemplos são muito didáticos. O primeiro que


podemos citar é o daqueles que teimam em querer voltar a um peso
reduzido demais em relação à idade: pessoas na idade madura que
perseguem obstinadamente o peso e a silhueta dos 20 anos, negligenciando
o fato de que a estrutura corporal muda inexoravelmente com o passar do
tempo – o que signi ca, nos anos “enta”, que um leve sobrepeso de alguns
quilos em relação ao peso da juventude (e também um leve acúmulo nas
ancas) não só é siológico na maioria dos casos como chega até a ter algum
efeito protetor (com poucas exceções para indivíduos dotados de
compleição particularmente franzina). De fato, um leve incremento de 3 kg
a 5 kg em relação ao peso juvenil adequado, com o passar dos anos, parece
inclusive poder melhorar a expectativa de vida. E algo semelhante pode ser
dito também para o idoso em relação ao adulto.

Dessa forma, é inútil teimar e tornar a dieta insistentemente mais rígida na


vã esperança de recuperar um peso que já não é mais realista. Um peso que,
mesmo se pudesse nalmente ser alcançado, ainda que com esforço e à custa
de grandes sacrifícios, seria fruto também de perdas de massa magra e se
revelaria impossível de ser mantido com o tempo, pois de certa maneira não
seria mais natural.

E para citar outro exemplo bastante comum, há outra situação bem parecida
que apresenta os mesmos problemas e os mesmos lados negativos, e deriva
igualmente de avaliações equivocadas mais ou menos da mesma natureza:
trata-se dos casos frequentes de garotas adolescentes de porte atlético ou
decididamente “mediterrâneo”, cujo peso deriva sobretudo de uma estrutura
muito sólida, com boa presença de tecidos magros, as quais decidem que
querem emagrecer de qualquer maneira, sem aceitar conselhos de ninguém.
E fazem isso simplesmente para seguir “regras” sem critério da moda ou
decisões autônomas erradas (muitas vezes provocadas pela comparação com
garotas da mesma idade, mas com uma morfologia completamente
diferente), ou ainda porque receberam maus conselhos ou foram
in uenciadas pelas nada con áveis tabelas de peso × altura que aparecem em
revistas. Assim, acontece que essas meninas tão jovens começam a se
alimentar mal, pulando refeições ou fazendo jejum, e invariavelmente
empobrecendo muito a própria alimentação, combinando quase sempre tudo
isso com a adoção de uma atividade física extenuante e obsessiva.

Essas são iniciativas irre etidas e arriscadas – particularmente


desaconselháveis em uma idade tão delicada – que levam a perdas de peso
causadas, em boa parte, também à perda de massa magra, sobretudo
muscular, e, portanto, mais a um depauperamento do que a um verdadeiro
emagrecimento. E tudo isso acontece, muitas vezes, sem conhecimento dos
pais, por causa da pesquisa um tanto neurótica de níveis de peso
completamente inadequados para a compleição física das interessadas,
pondo em risco sua saúde e, com frequência, também certos equilíbrios
emocionais delicados.

Como se vê, estamos novamente diante de problemas criados por uma visão
errada sobre a meta a ser buscada e por uma escassa cultura especí ca.
Erros que poderiam ser evitados com facilidade simplesmente tendo o bom
senso e a humildade de pedir (e em seguida respeitar...) um simples
conselho do médico da família; um parecer que não só evitaria chegar a uma
renúncia resignada e pessimista demais (no caso de sobrepesos
aparentemente tão grandes que parecem inatacáveis) de forma precipitada,
mas também evitaria as avaliações erradas acerca do próprio peso, as quais
são capazes de levar a pessoa a adotar comportamentos alimentares tão
drásticos que prejudicam a saúde e o estado nutricional como um todo.

EU PESO MUITO PORQUE RETENHO


MUITOS LÍQUIDOS
A convicção de sofrer de uma excessiva retenção de líquidos (acumulação
anormal de líquidos nos tecidos) é extraordinariamente comum entre as
pessoas com sobrepeso – e não somente entre elas –, mas na maioria dos
casos sem motivos válidos.

De fato, em pessoas com um peso superior ao normal é bem raro observar


uma presença de líquidos corporais signi cativamente maior do que aquela
encontrada de forma geral; e quando isso acontece, a gravidade do
fenômeno é similar à que ocorre nas pessoas com peso normal.

É verdade que às vezes são encontrados edemas evidentes, ou seja, inchaços


que denunciam um acúmulo de líquido entre as células do tecido
subcutâneo. As causas disso podem ser gerais, que são as mais graves
(descompensação cardíaca, problemas renais, cirrose hepática, etc.), ou mais
localizadas (como in amação cutânea ou obstrução de algum vaso venoso
ou linfático).

Entre esses depósitos de líquido subcutâneos e localizados – que são,


obviamente, de gravidade muito menor –, os mais frequentes são aqueles
que ocorrem nas partes inferiores do corpo (sobretudo nos tornozelos e
pés), quase sempre provocados por insu ciência venosa ou obstrução
linfática nos membros inferiores. E também é comum ocorrer casos de
in amação crônica da derme e dos tecidos subcutâneos, que provoca uma
dermatopaniculopatia edemato broesclerótica, comumente conhecida como
“celulite”, na qual também está incluído um componente aquoso.

No entanto, sejamos realistas: tanto os edemas localizados quanto a celulite


em sua maioria representam fenômenos de existência limitada, cujo efeito
sobre a massa corpórea total é relativo e que, além disso, aparecem com
mais facilidade justamente na presença de um excesso de peso e de um
maior acúmulo de gordura, unidos a um acentuado sedentarismo – todos
fatores que criam obstáculos à circulação e ao “retorno venoso” do uxo
sanguíneo dos membros inferiores até o coração.

Mas nem é tanto a esse tipo de situação que se referem as pessoas com
sobrepeso quando se lamentam: “eu retenho muita água e isso me faz pesar
mais”. A referência é quase sempre a um inchaço, tanto do estômago e do
abdômen quanto de várias outras partes do corpo (sobretudo as coxas), que
quase nunca é atribuído espontaneamente ao aumento excessivo da
espessura da gordura subcutânea, mas em vez disso é posto na conta dessa
“retenção” genérica, culpada pelo desconforto, pelo “empachamento” e por
sensações desagradáveis de acentuado aumento das próprias dimensões.

A realidade é outra. Como já dissemos, na maioria dos casos, o exame


clínico e instrumental da composição corpórea dessas pessoas quase nunca
leva à constatação da presença de uma retenção hídrica relevante. Aliás, na
maioria das vezes, o porcentual de líquidos presentes se mostra abaixo
daqueles 55% a 60% do peso total que são considerados o índice normal de
uidos no adulto. E isso é fácil de se explicar: basta pensar que, nas pessoas
obesas e nas com sobrepeso, o tecido adiposo (ou massa gorda) está
presente em quantidade sensivelmente superior àquela considerada normal
(vale dizer, de 15% a 20% do peso total no homem e cerca de 20% a 25%
na mulher), frequentemente chegando a 35% ou 40% ou mais do peso total.
Pois bem, o que muitos ignoram é que, no nosso corpo, justamente o tecido
adiposo apresenta os menores porcentuais absolutos de água: apenas 10%, e,
portanto, muito menos não só do que os músculos e órgãos internos (cerca
de 75% de água) mas também, surpreendentemente, menos que o próprio
tecido ósseo (cerca de 30% de água).

Ter esses números em mente permite entender como é possível que, em um


corpo que apresenta uma quantidade elevada de tecido adiposo, a
quantidade total de líquidos acabe por ser quase sempre abaixo do normal.
Retenção hídrica causando sobrepeso, que nada...

E não é só isso: as considerações expostas aqui também fazem entender que,


em geral, a última coisa de que um obeso normalmente precisa é tomar
diuréticos – algo que às vezes acontece por uma mera nalidade tática, isto
é, uma espécie de truque destinado a obter, de qualquer maneira, uma
redução (ilusória) do peso total na balança...

NÃO IMPORTA SE EU RECUPERAR O PESO,


DEPOIS EMAGREÇO DE NOVO
É um raciocínio errado, que nos leva perigosamente a deixar de lado
qualquer autocontrole. Um raciocínio típico sobretudo de quem se sente
seguro demais porque, para perder peso, provavelmente já adotou algum dos
tantos ilusórios “atalhos” que parecem tornar tudo mais fácil e rápido – mas
que, em vez disso, além de serem bastante perigosos para a saúde,
praticamente nunca levam a uma verdadeira solução do problema.

Para tanto, a escolha é farta: jejuns hídricos prolongados, regimes


desesperadamente hiperproteicos, com abolição total dos alimentos que
contêm carboidratos; uso de medicamentos (muitas vezes proibidos) que
tiram a fome brevemente e estimulam o metabolismo; dietas de um alimento
só; esquemas super-rígidos que excluem grupos inteiros de alimentos,
baseando-se em fantasiosos testes de intolerância alimentar, e assim por
diante.

O resultado pode até ser a perda de muito peso na balança (mas não
necessariamente de muito tecido adiposo) e em pouco tempo. Esse detalhe
da rapidez, aliás, não é de forma alguma um resultado a ser comemorado: de
fato, todos os especialistas “sérios” concordam com o critério de que um
regime emagrecedor correto, equilibrado e variado – capaz, portanto, de
melhorar de maneira duradoura os hábitos alimentares – deve ser planejado
de forma a determinar um dé cit energético diário médio de cerca de 700
kcal a 800 kcal, no máximo 1.000 kcal, em relação às necessidades reais. O
resultado esperado em termos de perda de peso oscilará, portanto, entre 0,5
kg e 1 kg por semana, de acordo tanto com o consumo energético
suplementar derivado do indispensável aumento da atividade motora quanto
com a capacidade de adaptação do metabolismo de cada indivíduo.

Sim, porque existe também esse último aspecto, muitas vezes subestimado: o
nosso organismo é, em maior ou menor medida, um poupador, que por
centenas de milhares de anos evoluiu em condições de tamanha carestia que
os “premiados” com a sobrevivência eram os que melhor se adaptavam por
longos períodos à escassez de comida, baixando o próprio metabolismo
basal (responsável por cerca de 70% do nosso consumo energético) e assim
reduzindo o próprio consumo. Pois bem, ainda hoje – ou seja, em um
período de fácil acesso a tanta comida de alta densidade calórica e
facilmente disponível –, nós, seres humanos “modernos”, possuímos essa
capacidade mais ou menos intacta, embora não a percebamos. Assim,
quando nos impomos uma dieta hipocalórica, tanto por motivos estéticos
quanto por motivos de saúde, o nosso corpo registra essa situação como
algo perigoso e reage adaptando-se, como descrevemos anteriormente,
contrariando e retardando, portanto, os efeitos da dieta.

Esse fenômeno acontece com qualquer um, mas em certas pessoas é tão
pronunciado que retarda muito, chegando até a bloquear (mesmo
rapidamente) a perda de peso, mesmo em pessoas que efetivamente acusam
relevantes excessos de gordura corporal e teriam realmente necessidade de
emagrecer mais.

Mas a falsa convicção a ser desfeita diz respeito, em particular, ao modo


como são subestimados os riscos inerentes a recuperar o peso que foi
perdido. Essa recuperação, como todos sabem, veri ca-se muitas vezes
naqueles que mais cedo ou mais tarde cam cansados de se controlar e
voltam a comer como faziam antes. Pode acontecer com qualquer um: com
aqueles que relaxam demais com os primeiros bons resultados; com os
“poupadores”, que obviamente sofrem uma forte sensação de decepção; com
aqueles que, embora tenham perdido mais ou menos o tanto de peso que
prometiam a si mesmos, deixam-se envolver novamente pelo prazer de
comer sem impor limites, con ando sempre na própria capacidade de
perder peso novamente, se necessário; e nalmente, sobretudo com quem
perdeu peso rapidamente com alguma dieta-relâmpago ou outros métodos
pouco aceitáveis.

Em vez disso, para todos eles – e mais ainda para os “poupadores”, que são
aqueles que correm maior risco de recuperar o peso facilmente – seria
indispensável adotar um esquema de manutenção, ou seja, um regime que
permita a preservação dos resultados obtidos, um meio-termo razoável entre
as escolhas alimentares anteriores (vale dizer, aquelas que foram
responsáveis pelo aumento de peso) e a dieta rígida que determinou o
emagrecimento. Tudo isso, obviamente, será mais fácil para quem seguiu um
regime planejado corretamente, que represente de maneira adequada o novo
modelo a ser seguido e, espera-se, seja acompanhado por um aumento da
atividade física. Para essas pessoas, será menos árduo manter um peso
satisfatório, ainda que com inevitáveis – porém modestas – oscilações. Ao
contrário, vão recair muito mais facilmente nos velhos hábitos aqueles que
emagreceram seguindo um dos métodos “anormais” e exageradamente
drásticos citados aqui, já que na prática eles não modi caram
conscientemente seu estilo de vida, nem do ponto de vista das atividades,
nem no aspecto de como se alimentar.

Nesses casos, infelizmente, quase sempre acontece não só a recuperação de


todos os quilos que haviam sido eliminados, mas também a acumulação de
outros adicionais, especialmente na região do abdômen, ou seja, aquele tipo
de tecido adiposo que está mais relacionado a um estado de in amação geral
e ao risco do surgimento de doenças cardiovasculares, diabetes, hipertensão
arterial, etc. E isso em muitos casos se veri ca inclusive diversas vezes, em
uma espécie de círculo vicioso muito comum na história clínica de um
obeso, o qual é de nido como weight cycling syndrome ou, em linguagem
mais popular, “efeito sanfona”. Na prática, trata-se de reduções temporárias
de peso repetidas várias vezes ao longo dos anos (e quase sempre realizadas
reproduzindo os métodos equivocados já adotados anteriormente), seguidas
por aumentos superiores ao peso perdido.

As consequências são muito negativas, sob vários pontos de vista. Antes de


mais nada, no plano da saúde, considerando as bem conhecidas relações
entre um grande sobrepeso e a obesidade com um maior risco de doenças
metabólicas, respiratórias e osteoarticulares. No plano psicológico, acarreta a
frustração e a falta de con ança em si mesmo, além da “dietoterapia” que
essas recaídas criam nas pessoas que vitimam. En m, também em um
terceiro aspecto, talvez menos conhecido, perder e recuperar mais vezes
esses quilos acaba modi cando sensivelmente a composição corpórea da
pessoa interessada: de fato, ao emagrecermos, não perdemos peso apenas à
custa do tecido adiposo, mas também de parte dos uidos corporais (que
representam cerca de 55% a 60% do peso de um adulto) e de parte da
massa magra. No entanto, quando recuperamos os quilos perdidos,
infelizmente acumulamos principalmente massa gorda, que no m alcançará
níveis superiores aos de antes como porcentual do peso total, sinalizando
uma situação geral nitidamente piorada.

E como se não bastasse, essa redução da massa magra (que é certamente a


massa mais ativa, do ponto de vista do metabolismo) e esse incremento da
massa gorda, tanto porcentual quanto em valores absolutos, tornam-se mais
acentuados a cada novo ciclo. As inevitáveis consequências são um
metabolismo cada vez mais preguiçoso e um risco maior para a saúde –
além, logicamente, de tornar mais árdua qualquer nova tentativa de
melhorar o próprio peso.

En m, ciclos repetidos de “perda-recuperação” de muitos quilos podem até


nos levar de volta ao mesmo peso que tínhamos dez ou vinte anos antes,
mas somente na aparência: na realidade, a situação será muito diferente,
porque o “efeito sanfona” muda e piora profundamente a composição do
nosso organismo, aumentando os riscos para o nosso bem-estar. Mais uma
consequência negativa, muitas vezes negligenciada e subestimada, da
incapacidade de corrigir de maneira substancial um estilo de vida errado em
seu conjunto.

BEBER ÁLCOOL OU VINAGRE EMAGRECE


Pode parecer inacreditável, mas entre as muitas loucuras que emergem na
internet (e não só nela) aparece também a exaltação de supostas
propriedades emagrecedoras “milagrosas” atribuídas ao álcool, munidas de
fantásticas equivalências entre o consumo de álcool e as horas passadas em
várias atividades físicas adequadas para proporcionar um consumo extra de
calorias, sempre com a nalidade de eliminar um pouco de gordura
corporal. Há também quem se limite, de forma mais “comedida”, a
aconselhar uma eliminação somente dos destilados e da cerveja e dá sua
permissão para continuar a beber vinho, garantindo que isso não terá
nenhuma consequência para o peso corporal.

É realmente difícil entender como podem nascer teorias assim, desmentidas


não apenas pela falta de qualquer fundamento cientí co, mas também pela
banal constatação de que cada grama de álcool fornece 7 kcal, o su ciente
para classi car o álcool em segundo lugar no ranking energético, cando
abaixo apenas das 9 kcal por grama das gorduras, e bem acima das cerca de
4 kcal das proteínas e dos tão temidos carboidratos.

Portanto, cada “unidade alcoólica”, correspondente a cerca de 12 g de etanol


(equivalente a um cálice de 125 ml de um vinho de graduação alcoólica
média, uma latinha de 330 ml de cerveja de graduação alcoólica média ou
uma “dose de bar” de um destilado, isto é, 40 ml) representa
inexoravelmente entre 75 kcal e 100 kcal. Uma contribuição nada
desprezível, sobretudo se o consumo é habitual ou diário e se considerarmos
também que todos os dados de que dispomos con rmam que o prazer da
bebida quase inevitavelmente é combinado com um aumento do consumo
de comida. De fato, o álcool é capaz de estimular os neurônios que regulam
a sensação de fome, induzindo a comer mais, e também, de acordo com
certos estudos, a procurar particularmente alimentos de pouca qualidade,
ricos em carboidratos e gorduras – uma explicação, ao menos parcial, para o
“efeito aperitivo”, o qual é mediado também por uma in uência sobre a
grelina, hormônio estimulante do apetite que é produzido pelas células do
fundo do estômago e por células especí cas do pâncreas.

Substancialmente, mesmo considerando um uso moderado de álcool – ou


seja, dois copos de vinho por dia – é fácil calcular que o teor suplementar
de energia corre o risco de determinar um depósito extra de tecido adiposo
superior a 0,5 kg por mês, se não for compensado por mais exercícios
físicos. Que emagrecimento, que nada! E isso mesmo levando-se em conta
que o nosso organismo não consegue utilizar as calorias do álcool com a
mesma e ciência que demonstra para as calorias de outras fontes; portanto,
uma pequena parcela das calorias trazidas pelo álcool, por sorte, é
“desperdiçada”, sobretudo na forma de calor.

Assim, tomar maiores quantidades de álcool e emagrecer é um binômio que


não funciona. Com uma só exceção, muito pouco recomendável: a dos
alcoólatras, os quais quase sempre são, efetivamente, magros (e
desnutridos), mas somente pelo fato de que em seus hábitos o abuso
sistemático das bebidas alcoólicas acaba tomando em grande parte o lugar
do consumo de alimentos.
Mas a internet é inesgotável e nos presenteia com outra pérola: “tomar um
copo de vinagre por dia emagrece”. Naturalmente, isso não é verdade; não
sabemos de nenhuma evidência cientí ca de que o vinagre possa contribuir
para eliminar parte da gordura depositada em nossas células adiposas, e não
há notícias de experiências práticas que validem essa hipótese.

Isso vale para todas as variedades de vinagre, inclusive o de maçã, cujo ácido
acético (que seria o agente encarregado de “queimar rapidamente as
gorduras, transformando gorduras e glicídios em energia”, segundo a
internet) é de nido nas redes como “mais saudável do que o de outros tipos
de vinagre”, seja lá o que esse adjetivo possa indicar nesse contexto. E a
mesma falta de con rmações con áveis afeta também todas as outras
a rmações que são imprudentemente feitas, na maioria das vezes em sites
em que, não por acaso, também é proposta a venda de garrafas de vinagre –
a rmações sempre provenientes de fontes com bem pouco crédito, que
a rmam, sem nenhuma prova concreta, que beber um copo de vinagre duas
vezes ao dia conseguiria “antecipar o surgimento da sensação de saciedade”,
“acelerar o metabolismo”, “melhorar a pressão sanguínea”, “combater o
colesterol ruim”, e claro (como não poderia faltar), também “exercer um
efeito desintoxicante”.

Não é por acaso, aliás, que os conselhos de utilizar vinagre para emagrecer
estejam sempre acompanhados da recomendação de associá-lo também a um
consumo menor de comida, sobretudo de frituras e condimentos
gordurosos, e a um aumento da atividade física. É evidente que, se
acontecer, a eventual perda de peso será causada por essas boas normas de
comportamento, e certamente não pelo uso de vinagre...
Mas não é só isso: não apenas o vinagre não tem nenhum poder
emagrecedor, como beber um copo dele por dia terá inevitavelmente um
efeito irritante sobre as mucosas da boca e do esôfago, podendo induzir uma
acidez gástrica com facilidade, e muito provavelmente provocará danos ao
esmalte dos dentes. E o conselho de tomá-lo diluído com água não protege
ninguém dessas consequências desagradáveis. Resumindo, é melhor nem
tentar...

A RECEITA MÁGICA PARA EMAGRECER: OS


COMPRIMIDOS QUE QUEIMAM GORDURA
Uma ilusão antiga, que já provocou uma in nidade de fracassos e decepções,
mas que continua renascendo das próprias cinzas...

Sabemos que nas modernas sociedades industrializadas (e não só nelas) o


sobrepeso e a obesidade são muito comuns. Na Itália, atualmente, calcula-se
que essas duas condições afetem respectivamente 21% (sobrepeso) e 10%
(obesidade) das crianças e 32% e 10% dos adultos, chegando a um pico de
56% (somando as duas) em idosos do sexo masculino.[33] As médias gerais
nos dizem que mais de quatro em cada dez italianos são afetados, e o dado
relativo às crianças é particularmente alarmante, considerando que uma
criança com sobrepeso tem, por vários motivos, maior probabilidade de
apresentar problemas de peso também quando adulta.

Essa verdadeira “epidemia global” (de nição da Organização Mundial da


Saúde), mais que um problema de natureza estética (embora muitos o vejam
sobretudo assim), constitui um problema de saúde pública. De fato, o
excesso de peso, especialmente se persistir por longos períodos, expõe (com
uma relação comprovada de causa e efeito) a um aumento do risco de
desenvolver vários distúrbios, de forma isolada ou conjunta, principalmente
doenças cardio e encefalovasculares (maior causa de mortalidade precoce
em países desenvolvidos), diabetes, hipertensão arterial, alguns tipos de
tumores, doenças renais e hepáticas, insu ciência respiratória (apneias
noturnas), além de doenças dos ossos e nas articulações (em um porcentual
altíssimo, mas que muitas vezes são ignoradas ou subestimadas). E é preciso
acrescentar que o risco cresce tanto com o aumento do sobrepeso quanto
nos casos (muito frequentes) em que o tecido adiposo se localiza sobretudo
na região abdominal e intra-abdominal.

Não foi por acaso que, em 2013, a American Medical Association concedeu
à obesidade o caráter de doença, permitindo o acesso a seguros-saúde para
aqueles que precisam enfrentar os respectivos tratamentos. Na Itália, a partir
de 2019, é possível até que a incidência do sobrepeso e da obesidade seja
incluída na Legge di Bilancio (“Lei do Orçamento”) como um dos doze
indicadores que de nem o benessere equo e sostenibile (BES),[34] por ser
“uma ótima maneira de prever o risco de um amplo espectro de patologias
crônicas”.

Portanto, controlar e normalizar o próprio peso é importante sob muitos


pontos de vista. Mas é também um problema difícil de resolver, porque o
sobrepeso e a obesidade são condições complexas, que envolvem muitos e
diferentes fatores causais e de predisposição, capazes de interagir uns com
os outros: a genética (os genes que predispõem à obesidade são numerosos),
o ambiente (tanto familiar quanto social), o estilo de vida (sedentarismo,
hábitos alimentares, conteúdo habitual de energia da comida), etc. Em
síntese, hoje acredita-se que as in uências genéticas determinam
amplamente se uma pessoa pode se tornar obesa ou não, mas que é
sobretudo o ambiente – no sentido amplo da palavra – que determina se
aquela pessoa vai efetivamente tornar-se obesa, e também o grau de sua
obesidade.

En m, os problemas do sobrepeso e da obesidade são muito complexos. E é


ilógico iludir-se achando que problemas complexos possam ter soluções
simples, como apenas intervenções dietéticas breves, por mais drásticas que
sejam; uma estadia em um spa; uma completa abstenção da comida por
alguns dias; ou, menos ainda, remédios milagrosos. A experiência demonstra
que essas medidas de emergência jamais resolvem a situação de forma
duradoura. Perder peso para sentir-se melhor e prevenir os riscos ligados ao
excesso de peso requer, antes de mais nada, a decidida vontade de enfrentar
essa condição, a predisposição para objetivar o melhor resultado possível
com muita constância e ainda mais paciência (uma condição que se criou
em questão de anos não pode ser resolvida em poucas semanas!), além da
adesão a uma série de providências e de novos hábitos, direcionados e
personalizados, que envolvam tanto o comportamento quanto o modo de se
alimentar.

De fato, na maioria dos casos, o excesso de peso é provocado principalmente


por um consumo de calorias alimentares costumeiramente superior ao gasto
efetivo de energia. Portanto, o bom senso e a experiência clínica nos dizem
que a maior parte das pessoas obesas ou com sobrepeso deveria e poderia
enfrentar e aliviar o problema simplesmente levando uma vida um pouco
mais ativa sicamente e reduzindo o teor calórico habitual, ou seja,
comendo menos, mas comendo de tudo; subdividindo a própria alimentação
diária em três refeições, com mais um ou dois lanches; limitando o consumo
de gorduras e açúcares e privilegiando a opção por alimentos de alto valor
nutricional, reduzida densidade calórica e elevado volume (o que signi ca
que têm mais poder de saciar com uma menor quantidade de energia) –
como hortaliças, frutas e cereais. Essa é a regra geral, válida para quase
todos, incluindo os raros casos de pessoas com problemas metabólicos
especí cos, que além da dieta precisarão de outras intervenções.

Simples, em teoria. No entanto, a realidade atual nos diz que o setor do


“emagrecimento a qualquer custo”, tão na moda, está infestado por pessoas
que, sob a insígnia do “resultado rápido”, inventam e propõem as teorias
mais irracionais e espalhafatosas, desviando a atenção dos caminhos
sugeridos pela lógica e pelos conhecimentos cientí cos. São os falsos
inovadores que sustentam o fato de estarem nadando contra a corrente com
seus “atalhos”, os quais vão desde fantasiosas teorias desprovidas de qualquer
base séria, mas tornadas mais atraentes por depoimentos de celebridades (e
promessas de resultados estarrecedores), passando por extravagantes
suplementos para emagrecer (na internet está à venda até um moderador de
apetite inalável, obviamente “100% natural”), até estranhas substâncias “para
estimular o metabolismo” e misturas de princípios ativos muitas vezes
disfarçadas de cápsulas homeopáticas ou de ervas. Métodos arriscados e
deseducativos, que nunca resolvem o problema e podem provocar recaídas
negativas, tanto no âmbito físico quanto no do humor e do moral.

Claro, é da natureza humana esperar que um medicamento possa nos ajudar


a emagrecer melhor e com menos esforço. Mas, infelizmente, é preciso dizer
em alto e bom tom que na atualidade não dispomos de medicamentos
realmente e cazes e seguros para “curar a obesidade”. Por anos foram
testadas, aprovadas e utilizadas muitas fórmulas, mas aquelas destinadas a
fazer consumir mais calorias e reduzir a fome foram todas proibidas por lei,
uma após a outra, porque os efeitos colaterais perigosos revelaram-se
superiores ao benefício possível. As de outro tipo (hormônios da tireoide,
gonadotropina coriônica, antidepressivos, diuréticos, etc.) não podem ser
levadas seriamente em consideração para uma abordagem correta da cura da
obesidade. E é muito incerta a e cácia das poucas moléculas ainda presentes
nas farmácias, inclusive aquelas que visam barrar a absorção intestinal dos
nutrientes e as poucas recentemente aprovadas pela Food and Drug
Administration (FDA) nos Estados Unidos, e que chegaram à Itália no nal
de 2017.

A pesquisa por novos princípios ativos nesse campo prossegue


incessantemente, justi cada pela importância do problema e pela imensidão
do público interessado, e espera-se que o futuro possa trazer novidades
positivas. Mas, por enquanto, a situação está como foi descrita; e em todo
caso, o recurso a um medicamento não poderia nunca representar a
verdadeira solução, mas, sim, apenas um apoio às estratégias clássicas, uma
ajuda temporária, certamente admissível e oportuna em determinados
momentos críticos – por exemplo, para facilitar a modi cação inicial de
hábitos que estão tão errados quanto arraigados, ou para obter uma maior
aceleração inicial do emagrecimento em um obeso mórbido, ou ainda para
intervir nos casos em que a perda de peso de quem já está em tratamento se
torna mais lenta. Não por acaso, as autoridades sanitárias recomendam que
só se tente utilizar alguma ajuda farmacológica quando se estiver na
presença de uma obesidade declarada, ou seja, com um IMC (índice de
massa corpórea, que consiste na razão entre peso em quilogramas e a
estatura em metros ao quadrado) superior a 30, e mesmo assim, por
períodos de poucas semanas.
É lícito perguntar: mas se a situação objetiva é essa, por que na internet e na
propaganda boca a boca entre pacientes ainda se fala tanto da livre
disponibilidade de medicamentos “manipulados”, ou seja, fabricados em
farmácias de manipulação por indicação médica, e anunciados como
“milagrosos” para obter o desaparecimento da fome, junto a fáceis e
mirabolantes reduções de peso? Do que se trata? Comecemos explicando
que não estamos diante de nada novo: os moderadores de apetite
manipulados existem desde os anos 1970 e 1980, e consistem quase sempre
de cápsulas ou comprimidos nos quais estão misturadas muitas substâncias
diferentes reunidas para agir, por exemplo, tanto sobre a fome e o humor
quanto sobre os uidos corporais ou a tireoide. Nos primeiros anos, eles
continham anfetaminas, que depois felizmente sumiram de circulação por
causa de seus efeitos negativos, mas atualmente são substituídas por seus
parentes próximos “simpaticomiméticos”, cujo uso como emagrecedores,
tanto isoladamente quanto em combinações manipuladas, também foi
proibido diversas vezes pelo Ministério da Saúde italiano (não só sua
prescrição, mas também seu preparo).[35] Além disso, embora estejam
sempre na mira de repetidas proibições ministeriais para esse m, também
podem ser encontrados estimulantes da tireoide, ansiolíticos (para combater
os efeitos excitantes dos simpaticomiméticos), antidepressivos,
hipoglicemiantes, diuréticos (para simular o emagrecimento fazendo perder
líquidos) e até medicamentos antiepilépticos, além de várias substâncias
como cafeína, cromo, laxantes, etc.

O problema desses “coquetéis” emagrecedores manipulados, fortemente


criticados pela medicina o cial, não está só na sua incapacidade de dar uma
resposta séria e segura ao problema do excesso de peso: de fato, as rápidas
diminuições de peso que eles podem provocar são ilusórias (e alcançadas
sobretudo à custa dos tecidos magros e da água – um número menor na
balança não garante que o método escolhido seja o certo...) e são
invariavelmente seguidas por recuperações de peso até superiores, já que
qualquer e cácia cessa assim que o consumo dos coquetéis é interrompido.

Não, as críticas são justas e também motivadas pelo fato de que, na maioria
das vezes, eles contêm várias moléculas diferentes em associação na mesma
cápsula. O alerta dos farmacêuticos e clínicos é que juntar tantos princípios
ativos – de efeitos inclusive contrastantes – traz o risco de criar perigosas
interações medicamentosas entre as substâncias, tanto com reforços quanto
com inibições das suas ações individuais, e com o perigo de gerar “reações
adversas que podem aumentar em relação ao número de substâncias
associadas na mesma preparação”, segundo a Agenzia Italiana del Farmaco
[Agência Italiana de Medicamentos]. E o Istituto Superiore di Sanità
[Instituto Superior de Saúde] con rmou que “a combinação de vários
princípios ativos a m de emagrecer aumenta inevitavelmente os riscos de
reações adversas e torna ainda mais desfavorável a relação risco/benefício”.

En m, “nenhum dos medicamentos da lista do Nucleo Antiso sticazioni dei


Carabinieri (NAS)[36] apresenta entre as suas indicações aprovadas o uso
para emagrecer” (também segundo o Istituto Superiore di Sanità), e
nenhum paciente jamais resolveu de verdade seus problemas de peso usando
essas fórmulas. Então, como é que esses “remédios” continuam
sobrevivendo, circulando e angariando adeptos na web (precursora disso foi
Wanna Marchi com seus “derretedores de barriga” na TV: alguém se lembra
dela?) e não só lá? E o usuário, mesmo em sua propensão instintiva a
acreditar em soluções milagrosas, pode ser acusado de tudo, menos de ser
ingênuo ou pouco atento à sua saúde. Talvez o X da questão esteja no parco
conhecimento do que esses medicamentos manipulados representam e das
suas enormes limitações: talvez lembrar esses detalhes, ainda que
sinteticamente, tenha alguma serventia.

Então, é bom esclarecer que esses manipulados para emagrecer, tanto os


compostos quanto os que contêm uma só substância, não são nem produtos
homeopáticos ou “naturais”, nem descobertas revolucionárias, e menos ainda
fórmulas secretas inventadas por algum gênio desconhecido da química.
Sabemos muito bem o que contêm: várias substâncias bastante conhecidas,
caracterizadas pelos mais diferentes mecanismos de ação, com pouquíssimo
efeito a longo prazo sobre a perda de peso (a tolerância à sua ação é rápida)
e com efeitos colaterais comuns e desagradáveis (nervosismo, taquicardia,
insônia, tremores, hipertensão arterial, etc.). E os frequentes abandonos
precoces de terapias do tipo – e infelizmente, também, alguns episódios que
ao longo desses anos foram parar nas páginas policiais dos jornais ou nos
tribunais – con rmam que seguir tais métodos traz riscos.

Aliás, basta pensar bem nisso por um momento: se os produtos ou coquetéis


emagrecedores manipulados fossem mesmo uma solução aceitável, segura e
duradoura, ninguém os proibiria. Ao contrário, esses remédios gurariam
triunfalmente na farmacopeia o cial, à disposição de todos; seriam
receitados de bom grado e às claras, e muito provavelmente controlados
pelo Servizio Sanitario Nazionale [Serviço Nacional de Saúde], em vez de
serem aconselhados, produzidos, distribuídos e tomados
“semiclandestinamente”, como acontece agora, muitas vezes à revelia do
próprio médico ou de parentes e amigos dos interessados. E além disso, toda
a comunidade médica os usaria com prazer, ajudando a multidão de pessoas
que têm problemas de excesso de peso.
Vamos lembrar que poucos anos atrás a Organização Mundial da Saúde
(OMS) de niu a obesidade, com todas as suas consequências para a saúde,
como um dos maiores desa os que a humanidade está enfrentando no
século XXI. Mas ela certamente não mencionou armas farmacológicas
e cazes, que infelizmente não estão disponíveis: apenas lembrou que o
necessário é aprender a comer melhor e acostumar-se a mexer mais o corpo.
Sugestões muito mais válidas se considerarmos que uma atividade física
moderada, mas regular, além de trazer muitos benefícios e provocar um
consumo suplementar de calorias, ajuda a preservar a massa muscular e a
combater, mesmo nas horas seguintes ao exercício, a redução do consumo
energético de base (ou seja, aquele que continua mesmo quando estamos em
um estado de completo repouso), redução essa que acontece
espontaneamente quando seguimos uma alimentação hipocalórica.

Tentemos, portanto, usar o bom senso. Os “queimadores de gorduras” e


“derretedores de barriga” existem somente na linguagem publicitária de
vendedores hábeis e em algumas manchetes fantasiosas de jornal. Outra
consideração que precisa ser feita foi proposta há algum tempo, com grande
argúcia, por um conhecido médico romano: “parece realmente paradoxal
pretender curar a obesidade, a m de prevenir suas possíveis complicações
cardiovasculares, lançando mão de medicamentos cujos principais efeitos
colaterais afetam justamente esse mesmo sistema!”.

Outro aspecto que não pode ser subestimado é este: muitos de nós, e
sobretudo as numerosas falanges dos “menos jovens”, já somos obrigados a
tomar vários medicamentos todo dia, por motivos válidos. Portanto, é
realmente irracional aumentar mais ainda esse número sem razões válidas,
correndo o risco de criar outros problemas e de sofrer outros efeitos
indesejáveis – tudo isso apenas para buscar uma inexistente solução
milagrosa para um problema que deve ser enfrentado seguindo práticas
muito mais racionais e bem ponderadas.

Uma última observação: a verdadeira arma contra escolhas erradas desse


tipo não está tanto nos decretos ministeriais – embora sejam bem-vindos –
que as proíbem ou colocam obstáculos, e sim em uma melhor informação
institucional e em um envolvimento proativo dos pacientes. Trata-se, em
resumo, de uma batalha de conhecimento e conscientização, que poderá ser
vencida somente se os interessados aprenderem a não procurar ou a rejeitar
essas ajudas ilusórias, e a esperar dos pro ssionais da saúde somente
indicações sérias e personalizadas sobre como se alimentar melhor e como
melhorar o próprio estilo de vida.

PARA EMAGRECER, É PRECISO RENUNCIAR


À VIDA SOCIAL
Não só não é necessário como também é contraproducente para o bom
êxito do programa de emagrecimento.

Um bom regime emagrecedor sem dúvida deve prever algumas pausas


ponderadas, tanto para conceder uma dose de grati cação (que aumente a
adesão à própria dieta) quanto para não impor padrões rígidos demais, que
em pouco tempo fariam essa dieta ser entendida como algo insuportável,
que nos penaliza demais e que inclusive nos faz perder o contato com
amigos e parentes, considerando que na vida moderna as ocasiões sociais
acontecem quase que invariavelmente em volta de uma mesa.
En m, o fato de estar de dieta não deve nos impedir de conviver com as
pessoas com as quais nos sentimos bem; mas, claro, desde que sejam
observadas algumas precauções e respeitando algumas regras.

Antes de mais nada, mesmo nas ocasiões mais agradáveis, é preciso evitar
entrar naquele estado de ânimo em que “tudo é permitido”, e em vez disso
conseguir participar procurando fazer algumas escolhas, tanto quantitativas
quanto qualitativas. Isso signi ca, trocando em miúdos, não se deixar
convencer demais pelas lisonjeiras propostas do cardápio do restaurante;
não se deixar arrastar pelo exemplo (e pelas exortações...) dos outros
comensais; pedir pratos (inclusive os primeiros, à base de macarrão ou
arroz) que seja possível preparar e temperar de maneira mais sóbria;
solicitar, em geral, tipos de cozimento (fervido, na chapa, ao sal, etc.) que
demandem menores quantidades de condimentos gordurosos e verduras
temperadas com vinagre ou limão em vez das fritas, ou saladas sem molho,
para serem temperadas à mesa; manter distância do cesto de pães para não
cair demais em tentação; limitar as bebidas alcoólicas à dose mínima de um
copo (se realmente não puder abrir mão); e, nalmente, concluir a refeição
com o sabor doce da fruta ou no máximo de um pequeno gelato cremoso ou
de frutas, em vez de doces entupidos de gordura, cremes e açúcar. Algo
semelhante pode ser feito também em situações mais exigentes, como um
convite para comer na casa de alguém em vez do restaurante: provar de
tudo, mas possivelmente em porções reduzidas e recusando-se
educadamente a repetir, de forma a agradar o(a) dono(a) da casa e ao
mesmo tempo não exagerar com as transgressões, ainda que previstas e
legítimas.
Essa estratégia não é tão difícil de ser executada, mesmo porque, depois dos
primeiros dias de dieta, a sensação de fome se reduz, e aliás, já à mesa pode
acontecer com frequência de se notar uma sensação precoce de saciedade,
bem antes do m da refeição. Conseguir se comportar dessa forma permite
alcançar muitos objetivos de uma vez só. Antes de mais nada, não teremos a
sensação – muito perigosa psicologicamente – de que a dieta nos exclui do
convívio com as pessoas com quem amamos estar. Depois, o progresso na
direção do resultado desejado, ou seja, o emagrecimento, será retardado de
forma modesta; ou, se houver aumento de peso, será de pouca monta e não
a ponto de criar a perda da motivação para seguir em frente. Além disso,
não faremos concessões excessivas a pratos muito saborosos e agradáveis, o
que é útil, já que provar novamente certos sabores sem dúvida tornaria mais
difícil voltar em seguida ao regime mais austero.

Naturalmente, todo esse discurso só faz sentido – e sem gerar


consequências negativas para o programa de emagrecimento – contanto que
as ocasiões a que comparecermos da maneira descrita não forem mais do
que uma ou duas por semana. É certo que as di culdades crescem de forma
exponencial naqueles casos em que nossos hábitos, ou os compromissos de
trabalho, aumentam esses números para quatro ou cinco ocasiões semanais.
Nesses casos, é preciso ou conseguir selecioná-las, escolhendo aquelas que
são realmente imperdíveis, ou ser ainda mais rme nos pedidos e nas
escolhas, para limitar o tamanho da transgressão e evitar prejudicar tudo.

Sim, pois entre as possíveis consequências negativas, é preciso ter em mente


também os aspectos psicológicos. Quando estamos em dieta, nosso
metabolismo tende a diminuir para se adaptar ao regime de redução
calórica; e isso signi ca que, se de repente nos permitirmos um jantar muito
abundante (que pode facilmente superar as 2.000 kcal totais), chegaremos
às condições ideais para um incremento de peso particularmente acentuado,
tanto sintetizando mais gorduras quanto recuperando um nível notável de
certos componentes corporais que são em parte eliminados bem no início da
dieta (um fato que, entre outras coisas, contribui para a maior velocidade
inicial da perda de peso). Aí está o motivo pelo qual, como muitos sentem
na própria pele, um jantar particularmente rico durante um período de dieta
pode fazer a balança acusar até 1 kg ou 1,5 kg a mais de uma vez só, com
consequências devastadoras para o moral. Mas trata-se mais de aparência do
que de realidade: de fato, daquele quilo, não mais do que 150 g a 200 g
podem ser tecido adiposo; o resto será representado por substâncias não
adiposas, como líquidos, mas também outras – por exemplo, 100 g ou 200 g
de glicogênio, cujas reservas hepáticas e musculares, que haviam sido
empobrecidas pelos primeiros dias de dieta, são restauradas nessa ocasião. E
como cada grama de glicogênio se une a três de água, está explicado por que
o ponteiro da balança pode exceder em muito o verdadeiro tamanho da
“encrenca” criada.

O problema é que a pessoa envolvida não tem os meios técnicos para


distinguir entre o acúmulo de substâncias adiposas e aquele das não
adiposas. Na maior parte dos casos, ela se limitará a constatar o tamanho do
aumento, concluirá tristemente que precisou de uma semana para perder 1
kg e bastou um só jantar para voltar ao ponto de partida e, muito
provavelmente, reagirá cando desconsolada e abandonando totalmente a
empreitada. E aí está o aspecto mais desagradável: tudo isso graças a um
equívoco que não teria acontecido se a noitada “de liberdade” tivesse sido
levada com certa moderação, em vez de ser comemorada com demasiada
abundância.
En m, o primeiro conselho continua sendo o de não exagerar demais, nem
mesmo na noite livre. Mas o segundo é certamente o de evitar, depois de
um jantar “suspeito”, o ritual um tanto masoquista de se pesar. Então, como
proceder em circunstâncias assim? O melhor a fazer é esquecer a balança,
retomar a dieta como se nada tivesse acontecido e pesar-se depois que se
passarem pelo menos quatro ou cinco dias. É uma maneira sensata para
entrar imediatamente na linha e também deixar passar um período de
tempo su ciente para eliminar de novo aquele índice de substâncias não
adiposas que tanto contribuíram para falsi car o balanço da noitada entre
amigos, tornando-o exageradamente pesado...

ÓCULOS AZUIS PARA EMAGRECER


É o que a rma uma empresa japonesa que vende pela internet justamente
esses óculos dotados de lentes azuis, prometendo um bom emagrecimento –
o qual é devido, pelo que se diz, a uma ação calmante exercida por essa cor
nos centros cerebrais da fome e também à capacidade do “azul” de conferir
à comida um aspecto mais desagradável, que desencorajaria seu consumo.

Ao que parece, essa hipótese emagrecedora foi con rmada por um


experimento conduzido na University of Arkansas, cujos resultados foram
publicados em uma revista cientí ca francesa: a luz de LEDs azuis, em
comparação com a de LEDs brancos ou amarelos, teria induzido alguns
voluntários do sexo masculino a não tocar na comida, ao passo que não teria
tido efeito algum nas mulheres. A hipotética explicação é que não existem
alimentos azuis na natureza (o que, aliás, nem mesmo é verdade); assim,
essa cor comunicaria a impressão de um alimento arti cial, potencialmente
perigoso ou avariado, e portanto que deve ser evitado. E por que as
mulheres não caem nessa armadilha? Mistério.

Daí para a ideia de comer usando óculos azuis para se sentir menos atraído
pela comida e, portanto, comer menos – um verdadeiro atalho para perder
peso – foi um pequeno passo. Assim como foi imediata a ideia comercial de
pôr à venda justamente óculos dotados de grandes lentes azuis, fabricados
para esse uso. Depois disso, as sugestões se multiplicaram, até chegarem a
aconselhar a instalação de uma lampadinha azul no refrigerador, de usar
toalhas e guardanapos azul-escuros, de pôr os alimentos em recipientes
azuis ou embrulhá-los em papel azul, e outras fantasias mais.

Tudo isso é muito divertido, mas também é evidentemente discutível e bem


pouco aplicável como método emagrecedor. À parte qualquer outra
consideração, um genérico “comer menos” totalmente casual e baseado
apenas em uma aversão aos alimentos certamente teria consequências
desastrosas para os equilíbrios e os teores nutricionais da dieta – e,
portanto, também para a saúde.

Mas não é só isso: há também outro aspecto que torna menos “leve” o
discurso sobre as lentes azuis, e aqui intervêm os especialistas em
oftalmologia, que nos lembram que a luz azul é um componente da luz
visível prejudicial para a retina. De fato, ela possui energia elevada, e sua
mensagem cromática é muito difícil de decifrar por parte dos cones (células
fotorreceptoras especí cas da retina, dedicadas a enxergar as cores), aos
quais impõe um esforço particularmente pesado. Teme-se que a foto-
oxidação induzida por essa cor possa contribuir para provocar a
degeneração macular relacionada à idade, uma doença ligada ao
envelhecimento que atinge a mácula (a parte central da retina) e que
representa a principal causa de perda de visão central após os 55 anos.

Não é por acaso, como advertem os especialistas, que quem sofre dessa
doença ou tem predisposição a ela deve usar lentes ou próteses endo-
oculares chamadas de blue-blocker ou blue-control, dotadas de um ltro com
pigmentos amarelos que absorve o componente cromático azul, poupando
assim a mácula dos seus efeitos negativos. Mesmo com esses cuidados, a
percepção das cores ca inalterada.

En m, ao que parece, usar lentes azuis para emagrecer não só di cilmente


produziria algum efeito (ao menos, ao que parece, para as distintas
senhoras), mas a longo prazo traria também o risco de se converter em um
dano para nossos preciosos órgãos da visão. Aí é totalmente evidente que o
aspecto “folclórico” do caso desaparece, e surge em vez disso a oportunidade
de desmentir e desaconselhar a todos, veementemente, o recurso a essa
estranha prática importada do Oriente...
[28] No Brasil, o Guia alimentar para a população brasileisra (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2005) sugere

que as gorduras (ou lipídios) compreendam de 15% a 30% do valor energético total na alimentação e

que o porcentual de proteínas seja de 10% a 15%. (N. E.)

[29] Ainda de acordo com o Guia alimentar para a população brasileira (MINISTÉRIO DA SAÚDE,

2005), os carboidratos devem representar de 55% a 75% do valor energético total obtido pela

alimentação. A versão mais recente, de 2008, usa como referência a OMS. (N. E.)

[30] Aqui o autor se refere ao pão italiano. No Brasil, o mais consumido é o pão francês, que em

média contém, a cada 100 g, 28,5% de umidade, 300 kcal, 8 g de proteínas, 3,1 g de lipídios, 58,6 g

de carboidratos e 2,3 g de bras. (N. E.)

[31]5 Associação Italiana de Gastroenterologistas Hospitalares.

[32] Segundo o Guia alimentar para a população brasileira (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2005), do valor

energético total que deve ser composto por carboidratos na alimentação (55% a 75%), recomenda-se

que de 45% a 65% sejam provenientes de carboidratos complexos e bras. (N. E.)

[33] No Brasil, o Ministério da Saúde divulgou um levantamento segundo o qual, em 2016, cerca de

18,9% dos adultos (maiores de 18 anos) já eram considerados obesos e mais da metade da população

(54%) apresentava sobrepeso. (N. E.)

[34] “Bem-estar justo e sustentável”, série de indicadores sociais adotados para avaliar as informações

em nível nacional na Itália. (N. E.)

[35] As anfetaminas são proibidas no Brasil. As drogas simpaticomiméticas (para emagrecimento)

não são proibidas, porém, seu uso é extremamente controlado por receitas B2. (N. E.)
[36] Núcleo Antifalsi cações da Polícia Militar Italiana. (N. E.)
8 COMIDA E SAÚDE

FAZ MAL COMER CARNE E MACARRÃO NA


MESMA REFEIÇÃO
A menos que com essa colocação imprecisa não se esteja querendo sugerir a
“dissociação de alimentos” (já falamos disso na página 137), é preciso dizer
desde já que se trata de uma crença desprovida de fundamentos cientí cos,
que vai de encontro aos esquemas clássicos da alimentação mediterrânea,
aquela que é considerada a mais recomendável do mundo. Não existe
nenhum motivo cientí co que impeça ou proíba de associar, na mesma
refeição, alimentos ricos em proteínas e alimentos ricos em carboidratos;
nem em nenhuma parte do mundo as instituições cientí cas e médicas
jamais propuseram indicações desse tipo.

Essa crença muitas vezes é sintetizada de maneira simplista, como “não se


devem unir proteínas e carboidratos na mesma refeição” porque sua mistura
provocaria graves distúrbios intestinais, fermentações jamais vistas,
autointoxicações pouco especi cadas, problemas relativos ao diferente pH
gástrico necessário para a sua digestão, e outras fantasias do tipo.

Para começar, o aviso para separar as proteínas dos carboidratos no prato é


um conceito sem sentido, já que – não será inútil lembrar de novo – quem
come macarrão já está consumindo um alimento que em 100 g apresenta 11
g de proteínas unidas a cerca de 70 g de carboidratos, entre simples e
complexos, tudo isso sem provocar nenhum desastre digestivo. E as mesmas
considerações poderiam ser feitas falando de outros cereais, como o arroz e
o milho: trata-se de produtos que estão entre os mais amados do mundo,
amplamente consumidos nos cinco continentes há uma eternidade e por
bilhões de pessoas, para muitas das quais, aliás, representam a base da
alimentação diária – tudo isso sem nenhuma consequência negativa. E o que
dizer das leguminosas, alimentos salutares por excelência, adorados tanto
por onívoros quanto por vegetarianos e pelos mais ferrenhos membros da
“geração saúde”? Pois bem, em cada 100 g de leguminosas coabitam de 20 g
a 23 g de proteínas e de 45 g a 55 g de carboidratos disponíveis. Mesmo a
amadíssima pizza de tomate e muçarela contém, para cada 100 g, 7 g de
proteínas junto de 53 g de carboidratos. E poderíamos citar muitos outros
exemplos.

Além disso, se o macarrão e a carne fossem incompatíveis, seria preciso


abolir elementos como o molho à bolonhesa e outros condimentos
tradicionais da cozinha mediterrânea à base de peixe e de carne. Até outros
tipos de pizza, como a de muçarela com anchovas ou a de linguiça calabresa,
isso sem falar do cuscuz e da paella...

E no que diz respeito a eventuais problemas gastrointestinais, é preciso


ressaltar que na realidade esse problema das combinações entre os diferentes
alimentos é substancialmente um não problema. Como foi acertadamente
escrito, nosso aparelho digestivo se estruturou ao longo dos milênios para
uma digestão mista e é capaz de “desmontar”, nas suas várias fases, tanto as
proteínas quanto os carboidratos e as gorduras, sem que uma fase inter ra
na outra. O estômago tem a capacidade de misturar, transformar e deixar
pronto para a digestão intestinal qualquer tipo de alimento,
independentemente da sua composição e da ordem de chegada. A única
diferença pode consistir em uma variação (um pequeno prolongamento)
dos tempos de esvaziamento do estômago em si.

O discurso pode mudar quanto às consequências que a união das duas


categorias de alimentos – aqueles mais ricos em carboidratos e aqueles
tipicamente proteicos – na mesma refeição pode ter sob outros pontos de
vista: se eu me permitir ambos os pratos e me exceder na quantidade e nos
condimentos, aí sim poderão surgir problemas tanto digestivos quanto de
outra natureza, por causa do excesso de gorduras e de calorias ingeridas em
uma única refeição. Mas trata-se de um aspecto totalmente diferente do que
é prognosticado pelos apoiadores da “dissociação” ou por quem defende a
necessidade – inexistente – da obrigatória separação de alimentos
caracterizados por composições químicas diferentes.

OS OVOS FAZEM MAL AO FÍGADO


É um dos “mitos” alimentares mais duros de matar. Na realidade, trata-se de
uma a rmação extremamente genérica e também pouco generosa com um
alimento tão importante quanto o ovo, cujo valor nutricional é elevadíssimo.

Não é verdade que os ovos façam mal ao fígado. Ao contrário, os ovos


contêm muitas substâncias que, além de serem úteis para um correto
funcionamento do próprio fígado, são também dotadas de ações protetoras
em relação às células que compõem o tecido hepático: por exemplo,
fosfolipídios (substâncias gordurosas que contêm fósforo, componentes
essenciais de todas as membranas biológicas), colina (uma substância
orgânica essencial que é sintetizada no fígado e está envolvida em muitas
reações metabólicas) e metionina (um aminoácido essencial que contém
enxofre). Em particular, a carência desta última facilita a degeneração
adiposa do fígado, primeira etapa de uma possível cirrose.

En m, é possível consumir ovos nas doses e com a frequência que as


diretrizes nutricionais sugerem (ou seja, um ovo de duas a quatro vezes por
semana)[37] e pode, aliás, ser até vantajoso também para quem sofre de
doenças hepáticas.

As únicas cautelas e exceções dizem respeito às pessoas acometidas por


cálculos na vesícula ou in amações agudas ou crônicas das vias biliares. Os
ovos, de fato, como qualquer outro alimento que contenha quantidades não
desprezíveis de gordura, podem estimular as contrações da vesícula e
provocar dolorosas cólicas.

UM CÁLICE DE VINHO TINTO FUNCIONA


COMO UM REMÉDIO
Essa convicção, muito comum e apoiada inclusive por pareceres médicos de
renome, surgiu no nal dos anos 2000.

Naquele período, foi esmiuçada toda uma série de pesquisas epidemiológicas


realizadas nas últimas décadas do século passado, que em seu conjunto
pareciam efetivamente dar uma indicação bastante precisa: as pessoas
acostumadas com um consumo regular e moderado de bebidas de baixa
graduação alcoólica (como vinho e cerveja) teriam a tendência de viver
mais tempo e apresentar menor incidência de algumas doenças crônicas, não
só em comparação com quem bebia de maneira excessiva (o que faz
bastante sentido), mas também com quem não bebia álcool. Essas
propriedades bené cas estavam relacionadas, segundo as hipóteses de maior
crédito, a certa ação do próprio álcool e também à presença, sobretudo no
vinho tinto, de substâncias polifenólicas e antioxidantes que não existem nos
destilados.

Logicamente, o aparecimento dessas conclusões, ainda que tímido, nos


documentos o ciais que tratam das relações entre alimentação e saúde teve
grande impacto sobre a opinião pública e, graças também ao empurrão de
interesses comerciais bem compreensíveis, contribuiu muito para o
surgimento do popular slogan que atribuía a um moderado consumo de
vinho o mérito de defender a saúde – especialmente o tinto, ou seja, aquele
obtido utilizando também as cascas dos bagos de uva. Daí para se falar de
doses “aconselháveis” de álcool – salvo diferentes casos especí cos e a
grande variabilidade individual na tolerância – foi apenas um passo. O que
contribuiu também, em certos casos, para o grande equívoco de acreditar
que não fosse descabido, no m das contas, instigar quem não bebia a
começar a fazê-lo, justamente em virtude dos já mencionados efeitos
protetores.

Hoje, graças ao progresso das pesquisas e à ampliação dos conhecimentos, a


opinião da comunidade médica mudou, orientando-se para uma prudência
muito maior com relação a certas conclusões, e sobretudo à sua difusão
indiscriminada.

Antes de mais nada, é preciso lembrar que as substâncias antioxidantes e


protetoras a que nos referimos encontram-se facilmente e em grandes
quantidades em uma vastíssima variedade de produtos hortifrúti, sem a
incômoda e perigosa companhia do álcool. A conclusão à qual chegou-se
hoje, largamente compartilhada tanto pela OMS em suas diretrizes
nutricionais quanto por outras inúmeras autoridades cientí cas, como o
Osservatorio Nazionale sull’Alcool [Observatório Nacional do Álcool], do
Istituto Superiore di Sanità, é que os efeitos negativos do álcool sobre vários
sistemas – e o sistema nervoso em particular –, mesmo quando consumido
em doses moderadas, tendem inevitavelmente a ultrapassar os eventuais
efeitos positivos assegurados por outros componentes do vinho.

Portanto, é bom ressaltar que o álcool etílico não é um nutriente e continua


sendo uma substância não essencial, estranha ao nosso organismo e tóxica
sob muitos aspectos, hoje classi cada como cancerígena e teratogênica (ou
seja, capaz de produzir deformações no feto, se for consumida na gravidez),
sobretudo para os tumores do esôfago, do aparelho digestivo e da mama.
Pois bem, um relatório de 2017 do grupo United European
Gastroenterology sublinha que somente um europeu em cada dez sabe que
tomar bebidas alcoólicas expõe a um aumento do risco de câncer. E de fato,
muito poucos estão a par do fato de que o álcool etílico foi inserido pela
International Agency for Research on Cancer, da OMS, na classe 1 entre as
substâncias certamente cancerígenas para o homem (só para dar uma ideia,
é a mesma classe do amianto, da fumaça de tabaco, do arsênico e das carnes
vermelhas processadas às quais a imprensa deu tanto destaque), embora seja
justo especi car que, obviamente, os respectivos níveis de risco são
diferentes e estão relacionados – também, mas não somente – à quantidade
e à frequência de consumo ou exposição.

Do mesmo modo, quase ninguém sabe que o European Code Against Cancer
recomenda, de forma clara e em seu site o cial: “Se você bebe álcool de
qualquer tipo, limite o consumo. Para prevenir o câncer, o melhor é evitar
bebidas alcoólicas”. E os próprios LARN, em sua recentíssima última revisão,
de nem como “risco” qualquer consumo de bebidas alcoólicas: baixo risco
para um consumo baixo, alto risco para um consumo alto.

A principal consequência dessa evolução do pensamento cientí co é que


hoje não é mais possível falar de doses “aconselháveis” de consumo de
álcool, e que mesmo acenar para um consumo “moderado” é inexato e pode
ser enganoso. Julga-se que as únicas respostas que um médico responsável
pode dar às dúvidas de um paciente são estas: o consumo de bebidas
alcoólicas é meramente recreativo; de qualquer forma, é sempre melhor
evitar o consumo habitual de bebidas alcoólicas; por nenhum motivo o
próprio vinho pode ser apresentado como um remédio.

Além disso, quem é saudável e não tem sobrepeso (não esqueçamos que
cada grama de álcool fornece 7 kcal!), e realmente deseja permitir-se
bebidas alcoólicas, para limitar os riscos é bom que se atenha a doses que
poderíamos justamente de nir como “consumo de baixo risco”. Essas doses,
para os homens, consistem em duas “unidades alcoólicas” ao dia,
entendendo por “unidade alcoólica” cerca de 12 g de álcool – o equivalente
a mais ou menos 125 ml de vinho ou 330 ml de cerveja, ambos de média
graduação alcoólica; ou então, menos aconselhável, uma “dose de bar” de
destilado, cerca de 40 ml. Para as mulheres, que por vários motivos são
muito mais vulneráveis aos efeitos do álcool, esse consumo de baixo risco é
xado em uma só unidade alcoólica ao dia. Parece até inútil explicar que tais
doses diárias não são, por motivos evidentes, cumulativas para uso em
apenas uma ou duas ocasiões semanais, como o m de semana.
E permanecem válidas, naturalmente, algumas recomendações: se possível,
fazer coincidir o consumo de bebidas alcoólicas com o momento das
refeições, para obter picos mais baixos de alcoolemia; evitar totalmente o
consumo de álcool na infância e na adolescência (nessas idades, a
capacidade do organismo de transformar o álcool é imperfeita), durante a
gravidez (lembremos o signi cado do termo “teratogênico”) e durante a
amamentação (o álcool chega à criança por meio do leite e pode provocar
graves danos); reduzir o consumo para idosos, nos quais a alcoolemia, para
um mesmo consumo, aumenta mais; e prestar extrema atenção às numerosas
interações que existem entre o álcool e muitos medicamentos.

O CÁLCIO DA ÁGUA É INÚTIL E PROVOCA


CÁLCULOS RENAIS
Duas a rmações tão populares quanto inexatas. De fato, por muito tempo se
acreditou que o cálcio da água que bebemos não poderia contribuir de
forma alguma para alcançar as doses diárias recomendadas desse nutriente.
Ao contrário, pesquisas relativamente recentes demonstraram que o nosso
organismo tem uma ótima capacidade de absorver e utilizar o cálcio que
está presente – muitas vezes em quantidade substancial – na água potável.
Uma capacidade comparável até com aquela relativa ao cálcio fornecido pelo
leite e seus derivados, considerada desde sempre a mais elevada.
Efetivamente, os últimos dados sobre o consumo alimentar permitiram
calcular que, se é verdade que na dieta dos italianos 57% do cálcio são
garantidos pelo leite e seus derivados (só os queijos contribuem com 35%),
também é verdade que a água potável fornece um porcentual não
desprezível, de cerca de 9% a 10%.
A biodisponibilidade do cálcio contido na água potável representa uma
ótima notícia,[38] considerando como é difícil alcançar nossas necessidades
de cálcio, esse elemento tão precioso para a saúde dos ossos e dentes quanto
para outras funções essenciais, como a transmissão dos impulsos nervosos, a
contração muscular, a permeabilidade das membranas celulares, etc.

A segunda a rmação, que por muito tempo também foi considerada


incontestável, refere-se ao papel que o cálcio contido na água potável teria
em facilitar a formação dos cálculos renais, com particular referência àqueles
de oxalatos e de uratos. Também nesse caso, porém, a visão dos urologistas
mudou com o tempo.

Partindo do princípio de que o pilar fundamental da prevenção dos cálculos


consiste sempre em uma elevada absorção de líquidos (cerca de 2 a 2,5
litros diários de água, distribuídos o mais uniformemente possível ao longo
do dia), em geral sempre se sugeriu aos pacientes que preferissem água com
baixo resíduo. Hoje, porém, a orientação é negar a periculosidade da água
com resíduo xo elevado, ou seja, com alto conteúdo de sais minerais (água
“dura”), e considera-se acertado permitir também que pessoas com
predisposição à formação de cálculos urinários bebam qualquer tipo de água,
sem temer que o cálcio contido nela possa induzir essa formação. De fato,
constatou-se que o cálcio tem notáveis capacidades de se associar, na
cavidade intestinal, com o ácido oxálico presente em muitas verduras,
complexando-o e favorecendo em seguida sua eliminação nas fezes – e esse
é um dos motivos que basearam a mudança das orientações.

Essa mudança de visão, em certos casos, chegou a consentir até mesmo o


uso de águas minerais fortemente mineralizadas, e, portanto,
particularmente ricas em cálcio, às quais parece ser possível atribuir até uma
função protetora.

O ESPINAFRE PREVINE A ANEMIA POR


SER RICO EM FERRO
Provavelmente é um mito ligado também aos famosos quadrinhos do
Popeye, e é tão comum que se tornou o símbolo das falsas crenças ligadas à
comida.

Na verdade, o único aspecto inegável é que o espinafre, assim como outras


verduras e leguminosas, contém uma maior quantidade de ferro em
comparação com a carne em valores absolutos (entre uma vez e meia e o
dobro). No entanto, é falsa a alegação de que esses vegetais possam dar uma
ajuda válida contra a anemia ferropriva, porque trata-se de um tipo de ferro
(ferro não heme) que se apresenta, em sua totalidade, de uma forma pouco
assimilável e pouco utilizável por parte do nosso organismo. De fato, apenas
uma pequena fração do ferro presente nos produtos vegetais é retida e
utilizada (cerca de 2% a 8%, dependendo da composição da dieta); o resto
não é absorvido, mas permanece na cavidade intestinal e no m é eliminado
com as fezes. Por outro lado, o ferro contido nos alimentos de origem
animal – carne e peixe em particular – é constituído por cerca da metade de
uma forma muito mais biodisponível (ferro heme), tanto que de 15% a 35%
do mineral são retidos e utilizados pelo organismo humano.

Portanto, as pessoas afetadas por anemia ferropriva (muito frequente nas


mulheres em idade fértil, particularmente nas adolescentes, além das
gestantes, cujas necessidades de ferro são mais elevadas) precisam dar mais
espaço a alimentos que contenham esse ferro mais biodisponível,
principalmente às carnes.

Entre outras coisas, o ferro contido nos alimentos de origem animal exerce
também outro efeito útil, o de aumentar notavelmente (até cinco vezes!) a
disponibilidade do ferro contido nos alimentos vegetais, se eles forem
consumidos na mesma refeição. Por isso, segundo os LARN, em uma dieta
mista ocidental, calcula-se que a biodisponibilidade do ferro alimentar seja
de 14% a 18% no conjunto, ao passo que, nas dietas vegetarianas, varia de
5% a 12%.

En m, a clássica combinação de uma porção de carne acompanhada por


verduras funciona bem, tanto sob esse ponto de vista quanto no âmbito do
teor em substâncias antioxidantes garantido justamente pelas hortaliças: um
teor muito útil para combater os potenciais efeitos negativos derivados de
métodos de cozimento da carne pouco aconselháveis, como o churrasco na
brasa ou uma fritura mal executada.

CHOCOLATE E SALAME PROVOCAM ACNE


A acne é um fenômeno quase siológico na adolescência: ela atinge cerca de
70% a 80% dos jovens no período da puberdade, ao menos em suas formas
mais brandas.

Trata-se de um distúrbio in amatório das unidades pilossebáceas, ou seja,


das glândulas sebáceas que produzem o sebo, dos dutos sebáceos que levam
o sebo para a superfície cutânea e do folículo pilífero associado à glândula.
O que provoca a acne é sobretudo o aumento da produção de hormônios
andrógenos (característicos dos homens, mas produzidos também pelas
mulheres), levando ao aumento da secreção de um tipo particular de sebo e
à modi cação da ora bacteriana presente no duto sebáceo, a qual coloniza
o sebo estagnado na glândula e produz várias substâncias que de agram
justamente o processo in amatório. As consequentes reações in amatórias
concentradas no duto e ao redor dele provocam as lesões da acne: cravos
(ou comedões), pequenos relevos sólidos (pápulas), lesões mais profundas
(nódulos ou cistos), até elementos cheios de pus (as pústulas, ou seja,
“espinhas” na linguagem popular).

Além dos hormônios andrógenos, ao que parece, também o fumo e a


insulina (e, portanto, também as dietas ricas em açúcares) contribuem para
estimular essa in amação, bem como os hormônios do estresse – o que
explica por que a acne piora nos períodos de maior tensão nervosa, como na
época dos exames escolares ou universitários. Parece que há também certa
predisposição genética.

No que diz respeito à dieta, portanto, há muitos preconceitos, alguns dos


quais, porém, são substancialmente infundados. Por exemplo, não é verdade
que para curar a acne seja útil uma dieta sem molhos, julgando que alguma
piora seja provocada pelo leite, o qual poderia estimular as glândulas
sebáceas. As bebidas alcoólicas agravam o quadro, talvez porque aumentem a
sensibilidade da pele à in amação. Mas, de maneira geral, pode-se dizer que
nenhum alimento sozinho é responsável pela acne – nem mesmo aqueles
que são invariavelmente acusados no senso comum, como o chocolate e o
salame.
O chocolate é um réu particularmente visado, muitas vezes com base em
coincidências e experiências pessoais isoladas. O fato é que todos os estudos
conduzidos demonstraram que esse produto não provoca nenhuma
consequência nem no andamento da acne, nem no tipo ou na quantidade de
sebo produzido – nem mesmo em experimentos prolongados por um mês,
ministrando 1.200 kcal de chocolate ao dia. E é fato que o chocolate não
contém nenhuma substância capaz de in uir sensivelmente nos equilíbrios
hormonais.

Uma defesa semelhante pode ser feita também acerca do salame: a


experiência nos diz que a contribuição desse produto para o surgimento ou
a piora da acne é negligenciável, bem como a dos alimentos gordurosos em
geral, dos doces e das bebidas adoçadas – contanto, é claro, que haja
moderação na quantidade.

Isso não invalida o fato de que é aconselhável seguir hábitos alimentares


corretos. Resumindo, as escolhas sábias a serem feitas são as mesmas: muita
fruta, verdura e bra, ácidos graxos ômega 3 dos peixes e alimentos ricos
em antioxidantes. Também é preciso ter uma atenção especial para não
exagerar no consumo de alimentos processados, pratos de fast-food em
geral, salames, embutidos e doces: um uso demasiado frequente e/ou
excessivo desses produtos pode, de fato, exacerbar o problema nos
indivíduos com acne ou predispostos a essa condição. Escolhas sábias, que
entre outras coisas ajudam também a evitar o aumento de peso, o qual pode
ser a causa de desequilíbrios hormonais – sendo que estes, como dissemos,
estão envolvidos no surgimento da acne.
Todos estão de acordo sobre essas regras gerais do bom senso. E resta o fato
de que excluir completamente o chocolate, um produto que agrada
muitíssimo, da alimentação dos jovens afetados por esse distúrbio cutâneo –
em geral passageiro – representa para eles somente uma injusti cada e inútil
punição.

O MEL FAZ PASSAR A TOSSE


Trata-se de uma ilusão inocente, embora conte com muitos defensores
apaixonados.

Não resta dúvida de que o mel possa trazer certo alívio quando somos
atormentados pela tosse e pela dor de garganta: de fato, suas características
emolientes contribuem para atenuar a sensação de irritação da garganta que
muitas vezes desencadeia os ataques de tosse.

Embora seja bené ca, é uma ação branda, que age favoravelmente apenas
nos casos de tosse provocada por uma in amação “alta”, do tipo
faringolaríngea. Naturalmente, não é possível obter nenhum benefício para a
tosse que se origina na traqueia ou nos brônquios – nesse caso, parece até
desnecessário explicar, mas nenhum dos vários tipos de mel possui qualquer
e cácia terapêutica: essas situações, en m, devem ser enfrentadas de forma
especí ca, com intervenções medicamentosas.

A VITAMINA C CURA O RESFRIADO


Entre as várias ações desempenhadas pelo ácido ascórbico (vitamina C), a
hipótese de uma função preventiva ou curativa no âmbito de doenças como
o resfriado comum e a gripe é certamente aquela que alcançou a mais alta
fama na mentalidade popular.

Na realidade, a convicção de que fortes doses de ácido ascórbico possam


prevenir os resfriados, reduzir sua incidência ou curar um resfriado já
existente data dos anos 1940, sendo depois difundida e defendida sobretudo
pelo ganhador do Prêmio Nobel, Linus Pauling; e nalmente foi
redimensionada pela pesquisa mais moderna. É bom explicar que Pauling
chegou a recomendar doses altíssimas de vitamina para prevenir gripes,
resfriados, doenças cardiovasculares e o envelhecimento, as quais chegavam
de 6 g a 18 g por dia (na época, o valor de referência normal para um
adulto era de 60 mg, que hoje foi elevado para 85 mg a 105 mg, e 130 mg
para mulheres que amamentam) – doses que, conforme foi veri cado
depois, não só são totalmente inúteis para aumentar o nível da vitamina no
sangue, já que os excessos são prontamente eliminados pela urina, mas
também apresentam até certo risco de facilitar a formação de cálculos renais
de oxalato ou o aparecimento de outros distúrbios.

Numerosos estudos foram realizados sobre esse tema, mas a validação dos
resultados relativos sempre foi um tanto complicada, até pela di culdade de
identi car o resfriado comum como uma entidade patológica bem de nida.
Em todo caso, a análise de grande parte desses estudos permitiu veri car
que, na maior parte das pessoas que recebiam regularmente 1 g de vitamina
C por dia (vale dizer, cerca de dez vezes o atual nível de referência para um
homem adulto em condições normais), não acontecia a diminuição do
número de resfriados, e sim a diminuição tanto da duração da doença
quanto da gravidade dos sintomas relacionados. En m, uma espécie de
efeito preventivo, já que ao contrário, com a doença já presente, os possíveis
benefícios pareciam mais dúbios.

Essa redução da gravidade dos sintomas e do mal-estar nas doenças do


início das vias respiratórias estaria de acordo com algumas ações atribuídas
à vitamina C: proteção das mucosas, potencialização geral das respostas
imunológicas do organismo e proteção contra os efeitos secundários nocivos
que se seguem à liberação, por parte dos leucócitos neutró los, de
compostos oxidantes que participam da destruição de vírus e bactérias.

No conjunto, hoje é possível con rmar que as vantagens relativas ao uso da


vitamina C no resfriado consistem unicamente em aliviar as sensações
subjetivas ligadas aos sintomas típicos e em favorecer uma menor duração
da doença. Avalia-se que, para obter tais efeitos, seja necessário tomar doses
de 1 g a 2 g ao dia por vários dias, ou seja, doses bastante superiores à
quantidade diária recomendada para um adulto sadio.

Na prática, houve um redimensionamento com relação àquilo que se


pensava antigamente, mas também, no m das contas, é um bom motivo
para uma moderada suplementação que, em determinados períodos do ano,
pode ainda ter certa razão de ser.

DEVEMOS EVITAR OS OVOS PORQUE ELES


CONTÊM MUITO COLESTEROL
... e, portanto, fazem aumentar o risco de doenças cardíacas e vasculares.
Essa é a opinião amplamente difundida em todos os níveis há décadas, o que
fez com que os ovos se tornassem verdadeiros símbolos de como um
alimento pode ser injustamente demonizado.

Sabe-se que quando a quantidade de colesterol presente no sangue – em


especial a do colesterol transportado pelas lipoproteínas de baixa densidade
(LDL e VLDL) – chega a valores elevados (colesterolemia), aumenta-se o
risco de danos do tipo aterosclerótico em importantes artérias e órgãos
vitais, a ponto de facilitar o surgimento de graves doenças (sobretudo se
estiverem presentes outros fatores de risco, como o fumo, o excesso de peso,
o sedentarismo, etc.). As artérias coronárias e o coração estão
particularmente em risco, podendo chegar ao infarto e à morte súbita.

Mas atenção: não se deve cair no erro de considerar o colesterol em si um


inimigo. Ao contrário, trata-se de uma substância indispensável ao nosso
organismo, pois é um componente essencial das membranas celulares e
precursor de várias moléculas de elevada atividade biológica, como os
hormônios esteroides, os ácidos biliares e a vitamina D. Portanto, nosso
organismo o produz ativamente, tanto que cerca de 80% do colesterol que
circula no sangue é justamente sintetizado por nós mesmos, sobretudo no
fígado. Essa consideração redimensiona amplamente o papel do colesterol
contido nos alimentos, o qual pode incidir somente sobre cerca de 20% do
total presente no sangue – apesar disso, o colesterol alimentar deve, de
qualquer forma, ser cautelosamente mantido abaixo dos 300 mg diários
(200 mg para quem tem altos níveis de colesterol “ruim”, riscos hereditários
ou patologias cardiovasculares).

Mas outros pontos precisam ser sublinhados: antes de mais nada, vale
lembrar que somente uma parte do colesterol alimentar é absorvida (entre
10% e 50%) e também que nosso organismo se autorregula, com maior ou
menor e ciência, diminuindo a síntese interna quando recebemos colesterol
exógeno demais na nossa alimentação – na prática, quanto mais colesterol
comemos, menos produzimos. Em relação a isso, viu-se que existe uma
grande variabilidade individual intra e interpessoal na resposta da
colesterolemia ao colesterol presente na dieta.

Vamos tentar esquematizar as relações entre aquilo que comemos e a


quantidade de colesterol presente no organismo e no sangue. Os níveis
hemáticos de colesterol, e sobretudo das suas frações mais perigosas, podem
aumentar principalmente se a dieta: 1) é abundante demais, e, portanto,
hipercalórica; 2) é rica demais em gorduras e em gorduras animais, nas
quais abundam ácidos graxos saturados (alguns dos quais estimulam a
autoprodução de colesterol no organismo e impedem sua eliminação); 3) é
rica demais em colesterol, em álcool e em açúcares simples. Ao contrário,
uma dieta “prudente”, com teor calórico normal, rica em produtos vegetais,
que contenha as quantidades certas de produtos de origem animal e de
gorduras e doses moderadas de colesterol, combinada com um uso reduzido
do sal e do álcool e acompanhada por um estilo de vida sicamente mais
ativo, aumenta notavelmente a nossa probabilidade de controlar o fator de
risco representado pelo colesterol – e isso vale também para os casos mais
graves, aqueles com uma predisposição genética à hipercolesterolemia.

Mas falemos dos ovos. Que a gema do ovo contém muito colesterol, não
resta dúvida. No entanto, como dissemos, isso não implica de forma alguma
a necessidade de excluir esse alimento da dieta, pois o aspecto mais
importante continua sendo a composição geral da própria dieta. Entre
outras coisas, renunciar aos ovos signi caria renunciar a um elemento capaz
de produzir uma elevada sensação de saciedade e de fornecer (por baixo
custo e com um impacto calórico limitado) proteínas de elevadíssimo valor
biológico, apenas 5 g a 6 g de gordura (metade das quais são insaturadas),
quantidades razoáveis de vitamina A, de outras vitaminas (como B1, B2 e
PP) e de vários minerais, como magnésio, potássio, cálcio, zinco, ferro e até
iodo, sem contar alguns antioxidantes envolvidos na proteção da retina.

Além disso, a quantidade de colesterol contida nos ovos que são produzidos
hoje em dia foi notavelmente redimensionada: de fato, as novas técnicas de
criação (e sobretudo o uso de diferentes tipos de rações, diferentes raças de
galinhas e a idade menor das poedeiras) levaram a uma notável redução,
além das gorduras, também do colesterol contido na gema, tanto que dos
cerca de 250 mg (por gema) de antigamente passou-se aos cerca de 185 mg
atuais, 30% a menos. E é bom lembrar também que uma longa série de
estudos conduzidos nas últimas décadas mostrou que a relação entre o
consumo de ovos, a colesterolemia e os riscos cardiovasculares resulta um
tanto fraca e inconstante. O mais clamoroso desses estudos foi o de um
grupo de pesquisadores da Harvard School of Public Health, que
acompanhou cerca de 120 mil pessoas durante períodos de nove a quinze
anos, veri cando que, nos indivíduos não diabéticos, jamais se produziu um
impacto apreciável na colesterolemia e no risco de doenças cardiovasculares
ou encefalovasculares, nem com o consumo de um ovo por dia. Resultados
parecidos foram obtidos há poucos anos por pesquisadores do Karolinska
Institutet, de Estocolmo, com cerca de 70 mil pessoas acompanhadas
durante treze anos: nenhuma associação signi cativa foi encontrada entre o
consumo de ovos e o risco de infarto do miocárdio ou de AVC.
Portanto, hoje muitos pensam que, mais do que falar de “dietas com baixo
teor de colesterol”, deveríamos falar de “dietas capazes de baixar a
colesterolemia”. Colocar ênfase demais no papel do colesterol alimentar
pode ser contraproducente, pois leva a subestimar o impacto de outras
recomendações – talvez até mais importantes – sobre o tipo e a quantidade
das gorduras da dieta.

Com base em tudo isso, as atuais diretrizes alimentares indicam que um


consumo aceitável pode ser estimado em dois a quatro ovos por semana,
distribuídos pelos vários dias, e eventualmente consumidos de forma isolada
e não aos pares, mas também com a possibilidade de um aumento para
pessoas sadias e sicamente ativas, mantida a recomendação básica de variar
com regularidade as próprias escolhas alimentares gerais.[39]

No m das contas, uma bela revanche para um alimento que durante anos
viu-se sistematicamente no banco dos réus, e de forma realmente exagerada.

NÃO HÁ INTOLERÂNCIA À LACTOSE COM


O LEITE CRU
Mais uma ideia que circula na internet e mais uma vez uma ideia infundada.
Imaginar que o leite cru – ou seja, não pasteurizado – conserve bactérias
“boas”, capazes de melhorar a absorção da lactose pelas pessoas intolerantes
a esse dissacarídeo (por serem desprovidas da enzima digestiva lactase) é
uma ideia sugestiva, porém errada. Isso foi demonstrado por alguns estudos
muito con áveis baseados no breath test (um exame não invasivo que mede a
quantidade de hidrogênio expirada pelos pulmões depois do consumo de
lactose, sinalizando a de ciência da lactase): para quem é intolerante à
lactose, não existem diferenças entre o leite cru e o leite pasteurizado (ou
seja, aquecido de forma moderada a 72 °C por 15 segundos).

O resultado é muito lógico, já que os dois tipos de leite contêm quantidades


parecidas de lactose. Falar disso, porém, permite voltar ao tema dos
cuidados a serem adotados quando se deseja tomar leite cru.

Esse tipo de leite certamente pode ser atraente por parecer mais “natural” –
com todas as incógnitas incluídas nesse termo que tão frequentemente é
usado de forma abusiva. Quem o ama (na Itália existem mais de mil
máquinas automáticas de distribuição de leite cru a granel, controladas pelo
órgão de vigilância sanitária, e a venda cresceu a partir de 2004)[40] está
convencido de que o leite cru é muito mais rico em substâncias nutritivas
do que o pasteurizado, mas essa avaliação é absolutamente exagerada. Por
outro lado, alguns dados favoráveis, que surgiram em alguns estudos e
merecem con rmação, estão relacionados a possíveis efeitos protetores de
manifestações alérgicas (dermatites, rinites, asma).

Por “leite cru” autorizado entende-se leite refrigerado a 4 °C após a


ordenha, tratado a temperaturas não superiores a 40 °C e depois
transportado e distribuído segundo os melhores padrões higiênicos
possíveis.

Mas, em todo caso, é bom levar em conta o fato de que o leite é um


substrato ideal para o crescimento de micro-organismos, e que, portanto,
mesmo o leite recolhido e manipulado com todas as atenções do mundo
corre o risco de se deteriorar bem rapidamente do ponto de vista higiênico.
Ao contrário, os tratamentos a que o leite é submetido nas centrais são
capazes tanto de recuperar o produto, eliminando ou desativando os agentes
patogênicos responsáveis por doenças transmissíveis ao homem, quanto de
aumentar a duração do tempo pelo qual ele pode ser conservado, mediante a
destruição de uma parte dos micro-organismos sapró tos – ou seja, não
patogênicos, mas mesmo assim responsáveis pelas alterações do próprio
leite. Em particular, citamos o método da pasteurização, que mantém
substancialmente inalterado o valor nutricional desse importante alimento e
garante a máxima segurança para cerca de seis ou sete dias, com
conservação na temperatura do refrigerador.

Pelo mesmo motivo, o leite cru também deve ser conservado sob
refrigeração, mas, de qualquer forma, ele apresenta alguns riscos, os quais
impõem muitos cuidados a quem queira usá-lo. As normas vigentes obrigam
a uma série de controles veterinários muito minuciosos, mas os especialistas
advertem que, apesar disso, é praticamente impossível descartar a presença
de germes que podem contaminar o produto tanto no momento da ordenha
quanto nas fases seguintes. Portanto, o leite cru, mesmo aquele preparado e
conservado da melhor maneira, pode apresentar uma carga bacteriana não
desprezível, capaz de provocar até infecções alimentares graves.

Os dados falam por si: poucos anos atrás, em Atlanta (nos Estados Unidos),
os renomados centros para o controle e a prevenção de doenças locais
desaconselharam o cialmente os americanos a beber leite cru não
pasteurizado, visto que, nos quinze anos anteriores, justamente esses
produtos foram a causa de 80% de todas as infecções causadas pelo
consumo de leite e derivados no país, e isso mesmo nos estados onde o
consumo do produto cru havia sido autorizado. O que comprova que a
legalização e os relativos controles muitas vezes não representam um
instrumento su ciente para impedir esse tipo de infecções.
Na Itália, muitos controles são realizados e os dados sobre os riscos de
contaminação por várias bactérias (Campylobacter, Escherichia coli, Salmonella,
Listeria e outras), por sorte, são bastante reconfortantes. Isso não impede
que o leite cru continue sendo (junto da carne e do peixe crus) um
potencial veículo de contaminação microbiana, o que deve ser levado em
conta sobretudo para evitar riscos a indivíduos vulneráveis, como crianças e
idosos.

Alguns anos atrás, a EFSA também ressaltou que, de qualquer forma, todo o
processo – desde o estábulo até o consumidor nal – envolve elevados
riscos de contaminação patogênica, ainda que executado com perfeição, e
reforçou a exigência de informar adequadamente os consumidores acerca
dos potenciais riscos e de como evitá-los, tomando cuidado com os grupos
mais vulneráveis e fervendo o leite antes do consumo. Sim, porque na Itália
existe a obrigatoriedade – não conhecida por todos – de ferver o leite cru
antes do consumo, e a indicação para respeitar essa regra de higiene
(totalmente supér ua para o leite pasteurizado) é reproduzida também nas
máquinas de distribuição.

Uma pequena observação à parte: quem escolhe o leite cru muitas vezes o
faz para ter um produto “natural” e não “dani cado” e empobrecido pelos
tratamentos tecnológicos. Pois bem, a fervura, indispensável para poder
consumir esse tipo de leite sem riscos, é muito mais prejudicial para as
vitaminas e para outros princípios nutritivos contidos no leite do que a
pasteurização e os vários processos de esterilização.

Por exemplo, o fato de que a pasteurização produz uma “desnaturação” em


boa parte das proteínas presentes é entendido como um fenômeno negativo
graças ao escasso conhecimento sobre o signi cado desse termo, que de fato
causa uma primeira impressão desagradável – mas, na verdade, a
desnaturação não passa de uma mudança da estrutura “nativa” da proteína,
sem nenhum efeito negativo sobre a quantidade nem sobre a qualidade dos
aminoácidos presentes, e que aliás aumenta a digestibilidade das próprias
proteínas. Do mesmo modo, a película que se forma na superfície do leite
quando ele é fervido, impropriamente chamada de “nata”, na verdade não é
formada por gordura (como a que antigamente a orava espontaneamente
no leite integral não homogeneizado), mas, sim, por uma na camada de
proteínas coaguladas (lactoalbumina e lactoglobulina), junto do cálcio. Na
prática, trata-se de uma pequena fração dos nutrientes do leite que, no
entanto, nem todos apreciam e que, por isso, muitas vezes é descartada e
perdida.

A FUTURA MAMÃE PRECISA COMER POR


DOIS
Um mito a ser inserido de forma discreta na presente lista, com base na
convicção de que essa crença já tenha praticamente desaparecido da
mentalidade popular.

Vamos abordar o assunto por via das dúvidas, ainda que de maneira breve.
Naturalmente, não é verdade que a gestante precisa comer por dois. Essa
antiquada a rmação é claramente exagerada: sob vários aspectos, é mais do
que su ciente que a gestante se atenha a certos comportamentos que
favorecerão o êxito da gravidez e também bene ciarão o recém-nascido.
Para permanecer no campo da nutrição, repetimos que a alimentação na
gravidez não difere muito daquela dos períodos normais, embora precise ser
cuidada com particular atenção, tanto na sua quantidade quanto na
qualidade.

No que diz respeito à necessidade de energia, o consumo suplementar de


calorias exigido pela gestação é relativamente limitado, sobretudo nos
primeiros meses (poucas dezenas de calorias a mais por dia), e não autoriza
excessos. Isso vale também para os meses seguintes, já que os níveis
suplementares necessários de energia são menos elevados do que é comum
supor: por volta de 250 kcal a mais por dia no segundo trimestre e 500 kcal
no terceiro. Em geral, a alimentação deve ser controlada para que as
variações de peso permaneçam dentro dos limites sugeridos pelo
ginecologista, para evitar o aumento de vários riscos, como de hipertensão,
peso neonatal excessivo ou baixo demais e complicações pós-parto.
Lembramos que uma parte do tecido adiposo armazenado a mais vai se
revelar, depois, precioso para as exigências ligadas à amamentação.

O outro aspecto, da qualidade, é até mais importante e também deve ser


cuidado com atenção, como fator decisivo para o crescimento da criança. É
preciso atender sobretudo às necessidades de proteínas de elevado valor
biológico, de gorduras principalmente do tipo insaturado e de algumas
vitaminas e sais minerais. O uso do sal e dos açúcares simples deve ser
limitado.

As proteínas de elevado valor biológico podem ser obtidas facilmente do


peixe, das carnes magras, de ovos e do leite e seus derivados; elas são
essenciais para construir os tecidos do bebê. Como dose extra, bastam
poucos gramas a mais por dia nos primeiros meses e depois quantidades
gradualmente crescentes, até os cerca de 25 g a mais no terceiro trimestre. É
preciso lembrar também que na gravidez aumentam decididamente as
necessidades de cálcio, de ferro, de iodo e de vitaminas como o ácido fólico,
a B1, a B2, a B12 e a vitamina A. Essas necessidades devem ser respeitadas
adotando-se uma alimentação muito variada, rica em leite e laticínios e com
uma ampla variedade de frutas e hortaliças (sobretudo de cores amarelo-
alaranjado e verduras de folhas largas e verde-escuras). Negligenciar esses
aspectos pode trazer consequências negativas sobretudo para a mãe. Por
exemplo, os cerca de 200 mg a 250 mg de cálcio que a cada dia passam
para o esqueleto do feto devem ser garantidos pela alimentação da gestante;
caso contrário, serão os ossos maternos que irão fornecê-los,
descalci cando-se, portanto.

Além disso, os especialistas recomendam adotar somente sob orientação


especí ca as suplementações de vitamina D (também durante a
amamentação), de iodo, de ácido fólico, de ferro e de vários outros
micronutrientes. Em vez disso, insistem muitíssimo na manutenção de uma
boa atividade física e na absoluta abstenção do fumo (tanto do ativo quanto
do passivo, provável causa de deformações, distúrbios cognitivos e
patologias respiratórias), como também do álcool. Quanto ao café, eles
apenas recomendam não ultrapassar de duas a três xícaras por dia, e
manter-se abaixo de 200 mg diários de cafeína – lembrando que esse
alcaloide está presente em doses de 40 mg a 80 mg por xícara de café, mas
também em refrigerantes do tipo cola, em chás e no chocolate.

É Ã
O CAFÉ FAZ AUMENTAR A PRESSÃO
ARTERIAL
Essa também, como muitas outras, é uma ideia tão difundida quanto
exagerada. Vejamos o porquê.

Os efeitos exercidos pelo café sobre a pressão arterial dependem quase que
exclusivamente da quantidade de cafeína. Dado o interesse sobre o assunto e
a difusão universal da bebida “café”, o tema foi estudado atentamente tanto a
curto quanto a longo prazo, ministrando só a cafeína ou o café “inteiro” e
outras bebidas que a contêm.

Os resultados obtidos, bastante unânimes, permitiram estabelecer algumas


conclusões: antes de mais nada, que o efeito sobre a pressão arterial existe e
que é nitidamente maior depois de ser ministrada (de forma experimental)
só a cafeína. Em vez disso, o consumo de cafeína por meio das modalidades
típicas do dia a dia – ou seja, sobretudo tomando café – provoca um
aumento muito limitado tanto da pressão arterial sistólica (cerca de 1-2
mmHg, ou seja, milímetros de mercúrio) quanto da diastólica (ainda menos:
cerca de 0,5-1 mmHg), considerando de três a cinco xícaras por dia em
consumidores habituais com pressão arterial normal. Já em quem não está
acostumado a tomar café, o aumento provocado por uma xícara pode chegar
até 4-5 mmHg. De qualquer forma, trata-se de diferenças modestas e
praticamente sem importância clínica ( car de pé ou subir escadas podem
induzir incrementos de pressão até superiores), além de que o efeito parece
desaparecer dentro de pouco tempo.

O quadro é um pouco diferente para os indivíduos hipertensos, nos quais os


estudos realizados demonstraram, mesmo nos consumidores habituais, um
aumento mais pronunciado da pressão, por volta de 5 mmHg e de 3 mmHg,
respectivamente, para as pressões sistólica e diastólica. Essas pessoas,
portanto, devem tomar mais cuidado e seguir os conselhos do seu médico
acerca do número de cafés que podem ingerir, levando também em conta
que o café quase nunca é a única fonte de cafeína da dieta (essa molécula é
encontrada em quantidades signi cativas também em chás, no chocolate, nos
refrigerantes do tipo cola, nos energéticos, etc.) e que uma boa alternativa é
representada pelo café descafeinado.

A referência anterior ao consumo “habitual” não é por acaso. De fato, este é


outro aspecto importante que os estudos realizados trouxeram à tona e que
apresenta uma relevância prática: o consumo habitual de cafeína determina,
dentro de um tempo muito breve no nosso organismo, a instauração de um
mecanismo de “tolerância”, no sentido de que o próprio organismo se adapta
à absorção da cafeína e reage controlando seus efeitos sobre a pressão
arterial. Em decorrência disso, o aumento de pressão se redimensiona no
giro de um ou dois dias, e a longo prazo, tende quase a desaparecer.

Nos indivíduos normais, mas também nos hipertensos, esse mecanismo se


instaura em poucos dias. Atenção a esse ponto, pois com a mesma rapidez
ele também se perde: basta interromper por 24 horas o consumo de cafeína
para que a tolerância desapareça e, portanto, o aumento da pressão seja mais
relevante no momento em que se volta a consumir a substância. Mas isso
ocorre nas fases iniciais, apenas o necessário para que a tolerância surja de
novo, e sempre dentro de um tempo breve.

Outro efeito singular dessa “tolerância” consiste no fato de que, muitas


vezes, nos consumidores habituais de doses moderadas de café, a pressão
arterial resulta em uma média mais baixa não só em relação àquela
encontrada nos consumidores de quantidades elevadas, mas também àquela
dos não consumidores. É possível que os efeitos diuréticos do café e o seu
conteúdo de potássio in uam também sobre isso.

Concluindo, nas pessoas com pressão arterial normal, um consumo habitual


e moderado de café tem um efeito muito limitado sobre a pressão arterial. O
discurso já muda para os indivíduos hipertensos ou com risco de doenças
cardiovasculares: no caso deles, será preciso usar de mais cautela, avaliando
as situações caso a caso.
[37] Alguns estudos recentes já mostram que o ovo pode ser consumido diariamente, até mais de uma

vez por dia. Ver nota na página 221. (N. E.)

[38] Ressaltamos que no Brasil a água não contém uma concentração elevada de íons de cálcio e

magnésio como ocorre na Europa. (N. E.)

[39] Como foi mencionado anteriormente, pesquisas mais recentes indicam que a ingestão de um ovo

ao dia é aceitável, desde que inserida em uma alimentação equilibrada. De acordo com a Sociedade

Brasileira de Cardiologia, porém, deve-se ter cuidado na forma de preparo do ovo – ou seja, quando

ele é frito ou mexido, há adição de gorduras, aumentando as calorias e, dependendo do tipo de

gordura, elevando o colesterol. (N. E.)

[40] No Brasil, é proibida a venda de leite cru para o consumo direto da população, de acordo com o

Decreto-Lei nº 923, de 10 de outubro de 1969. (N. E.)


9 A “FOBIA DO BRANCO”

PARA ADULTOS, TOMAR LEITE NÃO É


NATURAL E FAZ MAL
Uma a rmação que está muito em voga já faz alguns anos e que, claro, é
defendida ferrenhamente por muitas pessoas na internet, pois está bem
inserida na teoria dos “venenos brancos”, dos quais voltaremos a falar
adiante. No entanto, vejam só, quem defende que os adultos deveriam
manter distância do leite e de seus derivados para evitar mil problemas de
saúde são quase que exclusivamente sites, associações e autores muito
parciais em suas ideologias, e desprovidos de qualquer relação com as
instituições, agências ou sociedades cientí cas cuja autoridade, ao contrário,
é reconhecida universalmente.

Aqueles que defendem a ideia de não consumir leite e derivados baseiam-se


principalmente em uma visão vegetariana restrita acerca da alimentação, ou
então nas conclusões contidas em um livro publicado há uns quinze anos
por dois médicos americanos, o The China Study, escrito com base em um
projeto de pesquisa originalmente realizado por algumas universidades
ocidentais em colaboração com um par de faculdades chinesas de ciências
médicas. O objetivo era avaliar a ligação entre alimentação e saúde em
grupos populacionais amplos. As intenções eram ótimas, bem como os
nomes dos estudiosos e epidemiologistas inicialmente envolvidos, mas com
o tempo as metas iniciais se perderam pelo caminho, com particular
referência tanto à metodologia adotada e ao modo de avaliar os resultados
obtidos quanto à cautela e à con abilidade das conclusões a que se chegava.
O fato é que quase todos os pesquisadores do grupo original prudentemente
se afastaram, e os resultados do estudo nunca foram publicados em
nenhuma revista cientí ca con ável (o que signi ca que nunca passaram
pela avaliação de revisores independentes cienti camente reconhecidos),
tampouco foram substancialmente aceitos pela comunidade cientí ca.

No m das contas, os resultados e as conclusões apareceram unicamente na


forma desse livro assinado apenas pelos doutores Campbell (pai e lho),
que alcançou um grande sucesso de vendas e permitiu que os autores
registrassem uma marca para vender produtos orgânicos, medicamentos e
outras coisas. A repercussão do estudo foi favorecida tanto pelo fato de
defender teses muito populares entre partes nada pequenas da população
(como a de que mesmo o consumo de doses reduzidíssimas de produtos de
origem animal trariam o risco de doenças e que somente uma dieta vegana
permitiria viver bem e evitar, ou até curar, tumores e outras doenças
crônicas e degenerativas) quanto pelo seu lançamento em alguns programas
de TV de grande audiência, como ocorreu, por exemplo, na Itália. Não por
acaso, o livro tornou-se uma espécie de Bíblia para os veganos radicais, e na
prática, entre as muitas conclusões arriscadas – já que chegou-se a elas
forçando as relações entre os dados obtidos e os efeitos observados, e
descartando uma parte dos resultados que não se alinhava às teses que os
autores queriam defender –, são acusados sobretudo a carne, as gorduras de
origem animal e os produtos à base de leite, em particular a caseína, a
principal proteína do leite.

Uma das acusações feitas à caseína é a de favorecer o aparecimento de


alguns tipos de tumor por meio do estímulo à produção de determinados
hormônios, como os estrógenos e os chamados “fatores de crescimento
semelhantes à insulina” (insulin-like growth factor ou IGF). Tudo isso, porém,
com base em resultados nada con áveis, obtidos pelos Campbell somente
em animais de laboratório ou in vitro, utilizando doses de caseína
anormalmente elevadas e impraticáveis em uma alimentação normal; cujas
conclusões foram arbitrariamente estendidas pelos autores ao ser humano,
acusando todos os alimentos de origem animal como causadores. O fato é
que amplos estudos conduzidos nos anos seguintes desmentiram
praticamente todas essas acusações presentes em The China Study e
provaram que o consumo do leite de vaca pode ter apenas efeitos muito
modestos nesses âmbitos. Na prática, demonstrou-se que não há nenhuma
evidência de relações claras entre o consumo de leite de vaca e os tumores
de mama, do pâncreas e do cólon; que o incremento de IGF no organismo
causado pelo leite é mínimo; e que a contribuição em estradiol (hormônio
relacionado ao risco de tumores na mama) também é mínima, mesmo para
quantidades elevadíssimas de leite, segundo um documento da FAO.

Mas não é só isso: também foi demonstrado que as mesmas acusações feitas
à caseína poderiam ter sido lançadas contra o consumo de qualquer proteína
de origem vegetal, em particular da soja. De qualquer forma, os efeitos
sempre estariam ligados ao consumo de quantidades muito elevadas dos
produtos discutidos, e não ao uso balanceado e moderado que as
recomendações o ciais sugerem para qualquer tipo de alimento, incluindo o
leite e seus derivados.

Portanto, é supér uo aprofundar-se mais no exame dos dados publicados


pelos Campbell, cujas conclusões, baseadas em metodologias e análises
estatísticas discutíveis e limitadas, nunca chegaram a um nível de
credibilidade e de garantia que lhes permitisse serem publicadas como um
trabalho cientí co aceito e compartilhado. Basta lembrar que The China
Study também foi declarado não con ável pela Associazione Italiana per la
Ricerca sul Cancro [Associação Italiana para a Pesquisa do Câncer], a qual
quis ressaltar, adicionalmente, que “não existem estudos em favor de uma
dieta que elimine totalmente as proteínas de origem animal, e em particular
os laticínios”.

Em vez disso, é preciso dizer que os apoiadores da guerra ao leite também


baseiam-se muito em outros tipos de considerações, voltadas a apossar-se
das camadas menos preparadas da opinião pública com argumentos do tipo:
“não é estranho que o homem seja o único animal que continua tomando
leite mesmo quando adulto? E ainda por cima, leite de outra espécie animal?
E por que será que cerca de 65% da população mundial são incapazes de
digerir o leite? Não seria um sinal de que esse alimento deve ser evitado
após o desmame?”.

Para começar, vamos eliminar da conversa alguns equívocos. O argumento


de que somente o ser humano adulto continua tomando leite é realmente
fraco (há uma in nidade de coisas que só o ser humano faz em todo o reino
animal, desde transformar e cozinhar a comida até construir arranha-céus e
espaçonaves...), além de inexato: se oferecermos leite a um felino ou um cão,
eles aceitarão com muito prazer. E por falar em coisas únicas do primata
“homem”, e continuando no tema da comida, o ser humano é realmente
diferente, pois é a única espécie animal que aprendeu a criar outros animais
com a nalidade de obter deles, além de lã e roupas, também ovos, carne e
leite (todos alimentos que deveriam ser proibidos?); assim como a única
espécie que foi capaz de trabalhar a terra e cultivar, por exemplo, o trigo,
além de obter dele a farinha e com ela preparar de tudo, desde macarrão e
tortas à pizza napolitana – ou devemos declarar que comer pizza também
não é “natural”? Uma teoria talvez sugestiva, mas evidentemente absurda e
muito pouco popular. Considerando tudo isso, é melhor arquivar o
argumento do “não natural” e seguir adiante...

Entre as outras considerações feitas pelos inimigos do leite, algumas são


mais interessantes e merecem respostas e explicações. Para início de
conversa, sobre o valor nutricional do leite não pode haver dúvidas: leite e
derivados são preciosas fontes de cálcio facilmente assimilável, essencial para
a saúde dos ossos e dentes e para outras funções fundamentais (na dieta
italiana, mais de 50% do cálcio é assegurado por esses produtos, sobretudo
pelos queijos, e o resto por cereais e derivados, verduras e hortaliças, com as
brássicas puxando a la, e pela água potável),[41] bem como fontes de
proteínas de elevadíssimo valor biológico; de vitaminas importantes como a
A, a B12, a B2 e também a D; e de minerais como potássio, fósforo, zinco e
até o raríssimo iodo, este último em quantidades não desprezíveis – calcula-
se que uma só caneca de leite cru por dia possa contribuir de forma
signi cativa para cobrir a necessidade média diária de iodo. Essas
características nutritivas são documentadas pelo fato de que o leite materno,
como única fonte alimentar, consegue duplicar a massa corpórea do recém-
nascido em apenas cinco ou seis meses, um ritmo de crescimento que não é
comparável a nenhuma outra fase da vida.

As diretrizes alimentares, tanto as nacionais quanto as internacionais, estão


todas de acordo sobre o papel do leite como alimento ao qual se deve
recorrer diariamente, se possível. No entanto, o seu consumo está em queda
mesmo nos países onde, por tradição, ele sempre foi considerado uma
bebida, além de um alimento. E também na Itália o consumo médio de leite
é baixo demais, chegando a apenas 120 g em média para os adultos (150 g
se os que não o consomem forem excluídos), contra os cerca de 250 g
sugeridos. Para o iogurte, estamos só em 20 g por dia em média (86 g só
entre os que o consomem), ao passo que o consumo de queijos é maior do
que o recomendado.[42] E sem a ajuda do leite e dos seus derivados, é
quase impossível alcançar os cerca de 1.000 mg de cálcio que representam o
nível médio de absorção diária recomendado para esse mineral. Além disso,
é preciso sublinhar outra característica interessante do leite, que é seu efeito
sobre a saciedade, demonstrado por estudos de intervenção controlada sobre
o homem.

É fato que existem pessoas que não digerem o leite, pois na idade adulta
param de produzir quantidades su cientes de lactase, a enzima digestiva
necessária para quebrar o açúcar presente no leite (a lactose) em seus dois
componentes (glicose e galactose). A ausência da lactase, e a consequente
intolerância à lactose, não é grave do ponto de vista médico, mas sem
dúvida cria vários problemas: de fato, a lactose que chega sem ser digerida
ao cólon é fermentada pela ora intestinal, produzindo hidrogênio, metano
e gás carbônico, o que provoca distúrbios intestinais, atulência, cãibras
abdominais, diarreia e outros sintomas desagradáveis. A intolerância à
lactose, entre outras coisas, também respeita uma distribuição geográ ca
característica: por exemplo, é muito comum na Ásia e nas populações
americanas nativas, e em geral é mais frequente quanto mais se desce para o
sul. Na Índia, relata-se que os intolerantes representem 37% na região norte
e sobem para 77% na Índia meridional. Ao contrário, a lactose é bem
tolerada por um altíssimo porcentual de várias populações do norte da
Europa e da América do Norte, com picos superiores a 90%.
Mas para tudo há uma explicação. O homem começou a usar o leite (e
sobretudo os seus derivados, como queijos e iogurte, que na época
certamente eram mais fáceis de conservar) como alimento somente cerca de
dez mil anos atrás, no início do Neolítico, e isso logo incorreu (sobretudo
nos grupos dedicados à atividade pastoral) em uma mutação, uma adaptação
ao uso alimentar do leite não materno, com a relativa conservação da
expressão do gene que codi ca a enzima lactase – mutação essa que lhe
conferiu a capacidade de digerir o leite mesmo depois de adulto. E não há
como negar, as leis da evolução não mentem: se nos dias de hoje a produção
da lactase continua presente em cerca de um terço da população mundial
(quase dois bilhões de pessoas...), isso signi ca que essa mutação foi
bené ca, ou seja, como se escreveu, “deu a quem a possuía e aos seus
descendentes uma vantagem evolutiva”, até tornar-se dominante e ser
transmitida de pai para lho.

Quais seriam as vantagens? Por exemplo, obter mais cálcio e vitamina D


para os povos do Norte, que têm menos possibilidades de formar a vitamina
na cútis por meio da ação dos raios solares. De qualquer forma, também
existem populações que toleram o leite mesmo sem produzir lactase, graças
à ajuda de uma ora intestinal especí ca. Então, de fato é bastante absurdo
sustentar que consumir leite quando adultos não seja “natural”, visto que
bilhões de pessoas estão perfeitamente equipadas para fazê-lo. E hoje em
dia, quem sofre com os incômodos da intolerância e não quer renunciar ao
tão válido teor nutricional garantido por esse tipo de alimento pode
tranquilamente recorrer às versões sem lactose, já disponíveis em toda parte
e para todo tipo de produto; ou então tentar com o iogurte, que tem as
mesmas qualidades nutritivas do leite e contém uma quantidade muito
reduzida de lactose, ou ainda com os queijos curados, nos quais a lactose é
praticamente inexistente.

Além de tudo isso, ainda se faz muita confusão entre a intolerância ao leite e
a alergia às proteínas do leite, que se manifesta sobretudo na infância. E há
quem chegue a dizer que o consumo de leite (e de laticínios) provoca
osteoporose, porque acidi ca o sangue – cujo pH na verdade é mantido
constante pelos so sticados e indispensáveis sistemas de tamponamento
presentes no nosso organismo. Portanto, é falso que o leite possa favorecer a
osteoporose, a qual consiste em uma redução da densidade dos ossos, com o
progressivo enfraquecimento da sua estrutura até chegar a uma acentuada
fragilidade. Quando muito, o que ocorre é o contrário: de fato, está provado
que um teor de leite e de laticínios reduzido na infância e na adolescência
tem relação com um risco maior de fraturas na idade adulta – lembremos
que o pico da massa óssea só pode ser alcançado nos primeiros trinta anos
de vida, e que não por acaso a osteoporose foi adequadamente de nida
como “uma doença pediátrica que se manifesta na terceira idade”.

Mas também nos anos seguintes um teor adequado de leite e derivados é de


grande utilidade, pois contribui para retardar a perda siológica de massa
óssea relacionada à idade – e isso mesmo considerando que a assimilação do
cálcio alimentar e sua deposição caem cerca de 25% depois da menopausa e
com o envelhecimento. Não é inútil lembrar também que as principais
causas da osteopenia e da osteoporose devem ser procuradas em fatores
hormonais (os estrógenos previnem a perda de massa óssea) e metabólicos,
além da carência de cálcio e de vitamina D na dieta e um estilo de vida
sedentário: de fato, a atividade dos músculos melhora o metabolismo do
esqueleto, estimulando a produção de tecido ósseo.
Voltando ao tema das declarações irresponsáveis que muitas vezes são
publicadas e difundidas: sobre as relações entre o consumo de leite e o
surgimento de tumores, ressaltamos que um relatório do American Institute
for Cancer Research [Instituto Americano para a Pesquisa do Câncer] nega
explicitamente que exista alguma ligação entre o consumo de produtos
lácteos e o tumor do ovário, e que a própria renomadíssima IARC, em seu
European Code Against Cancer, atualizado em 2015-2016, não fez nenhuma
menção de qualquer aumento do risco de tumores ligado ao consumo de
leite e derivados e da caseína – e isso mesmo tendo entre seus autores
italianos um pesquisador, um tanto notório também por sua exposição na
mídia, que não perde nenhuma oportunidade de sublinhar os efeitos
negativos de um “excessivo” consumo de leite, porém sem nunca atrever-se
a aconselhar sua eliminação. Até hoje, o conjunto dos mais recentes dados
disponíveis, obtidos tanto em estudos epidemiológicos quanto em amplas
meta-análises, indica que o consumo de leite e derivados “não está associado
nem a riscos apreciáveis, nem a efeitos protetores relacionados com o risco
total de tumores”.

Portanto, eliminar leite e laticínios da dieta não tem motivo e é inclusive


perigoso para a completude da alimentação habitual. Quanto a outros
possíveis riscos discutidos, o segredo consiste sempre em ater-se a um
consumo moderado, segundo as indicações das autoridades cientí cas. Todas
as diretrizes mundiais aconselham unanimemente o consumo habitual de
duas a três porções de leite ou derivados por dia. Os estudiosos de Harvard
sugerem uma porção de 240 ml ao dia. Em 2017, o Haut Conseil de la
Santé Publique [Conselho Superior da Saúde Pública francesa] só alertou
para não ultrapassar de duas a três porções-padrão diárias de leite, queijos e
iogurte. E também as últimas Linee Guida per la Alimentazione Italiana
[Diretrizes para a Alimentação Italiana] indicam como correto o consumo de
até duas ou três vezes ao dia para o leite (porção-padrão de 125 g,
praticamente um copo médio)[43] ou para o iogurte (porção-padrão, um
potinho de 125 g), dando preferência aos produtos semidesnatados, por
causa da elevada presença de gorduras saturadas. Para os queijos, é
recomendado o consumo semanal de duas a três porções de 100 g para os
frescos (menos gordurosos) e de 50 g para aqueles com mais de 25% de
gorduras (produtos curados).

En m, o consumo diário das quantidades certas de leite e/ou de seus


derivados representa um ótimo hábito. E outro ótimo hábito seria o de
aprender a descon ar de certas desinformações preconceituosas, não
sustentadas nem por bases cientí cas veri cadas, nem pela imparcialidade de
juízo.

A MUÇARELA É UM QUEIJO LEVE


Não existem queijos verdadeiramente “magros”, à parte alguns produtos
dietéticos preparados ad hoc, ou seja, do leite desnatado. No entanto, é
verdade que, em comparação com os queijos mais curados, os laticínios e
queijos frescos contêm mais água e menos gordura, e, portanto, também
menos calorias por porção: por exemplo, na muçarela de vaca,[44]
encontramos cerca de 59% de água, contra 30% no parmesão e no pecorino
e cerca de 31% no gruyère (e cerca de 76% na ricota).

A muçarela em particular não pode ser de nida como “leve”, considerando


que contém quantidades razoáveis de gorduras: elas são efetivamente
menores do que as de outros tipos de queijo, mas não tão reduzidas quanto
o seu aspecto branco e inocente parece sugerir. Na muçarela de vaca, por
exemplo, as gorduras representam cerca de 19% do peso, contribuindo para
um teor calórico igual a 250 kcal por 100 g do produto. A de búfala, então,
chega a cerca de 24% de gordura e 290 kcal por 100 g. Esses dados devem
ser comparados àqueles relativos às quantidades de gorduras presentes nos
vários tipos de queijo, as quais variam de 24 g a 35 g por 100 g de produto
(com o pico nos 47% do mascarpone), para um teor calórico que oscila
entre 300 kcal e 450 kcal, sempre considerando 100 g.

Portanto, é verdade que a muçarela, como também outros queijos frescos,


pode gabar-se de uma densidade calórica inferior à da maior parte dos
queijos, mas também é verdade que as diferenças não são tão grandes
quanto geralmente se supõe. Não há problema em apreciá-la, mas sem
exagerar na quantidade: de fato, é bom não esquecer que esse laticínio é tão
agradável que é muito fácil consumir porções realmente avantajadas dele,
em geral muito superiores àquelas que nos permitimos de queijos curados.

Também é preciso acrescentar que a digestão dos queijos “frescos” é mais


trabalhosa que a dos queijos curados, também porque a caseína contida
neles está presente em uma forma menos madura, de modo a impor um
esforço mais prolongado ao nosso aparelho digestivo.

AS CARNES BRANCAS SÃO MENOS


NUTRITIVAS QUE AS VERMELHAS
Simplesmente não é verdade. A cor não indica uma diferença de qualidade
nutritiva e tampouco uma maior capacidade da carne vermelha de “encorpar
o sangue”.
A cor da carne depende essencialmente do conteúdo de mioglobina, uma
metaloproteína de cor vermelha que contém ferro, a qual, por sua elevada
a nidade com o oxigênio, serve como reserva desse elemento no músculo,
ou seja, é útil por reter o oxigênio que chega até ele pelo sangue e que é
indispensável ao músculo para desempenhar sua função.

A quantidade de mioglobina presente varia dependendo da atividade de cada


grupo muscular, e nos animais ela é maior nos músculos que trabalharam
mais intensamente durante a vida. Além disso, depende também da espécie,
da idade do animal, do seu sexo e da alimentação. A clássica e incerta
distinção entre carnes brancas (frango, vitela, coelho, peru, cordeiro) e
vermelhas (boi adulto, cavalo e porco) era feita principalmente com base no
menor ou maior conteúdo de ferro e na quantidade e qualidade das
gorduras, mas hoje perdeu grande parte do seu signi cado e é discutida
também por não corresponder à de nição siológica de bras brancas ou
vermelhas. De fato, no mesmo animal existem tanto carnes brancas quanto
vermelhas: o peito e a coxa do frango são um exemplo esclarecedor disso.

Dessa forma, é importante insistir que entre os dois tipos de carne não
existem diferenças substanciais quanto ao teor nutricional, o qual depende
da quantidade e do tipo de proteínas, da presença de vitaminas (em
particular do complexo B) e do conteúdo de ferro e zinco. Por exemplo,
ambas as categorias de carnes contêm mais ou menos as mesmas
quantidades de proteínas (em média, cerca de 20% do peso) de idêntico e
muito elevado valor biológico, uma avaliação que tem a ver com a sua
qualidade e o seu conteúdo de aminoácidos essenciais ou indispensáveis (ou
seja, aqueles que não podem ser sintetizados no nosso organismo e que,
portanto, devem obrigatoriamente ser absorvidos com os alimentos).
E quanto a “encorpar o sangue”, o ferro é, na prática, a única substância
nutritiva importante de que as carnes vermelhas são efetivamente um pouco
mais ricas. O ferro é o componente central e fundamental da molécula de
hemoglobina, o pigmento presente nos glóbulos vermelhos que confere ao
sangue sua cor característica e cuja tarefa é transportar o oxigênio. Mas,
embora a cor da carne possa sugerir considerações equivocadas acerca disso,
repetimos que esse precioso mineral – muitas vezes em falta na alimentação
média atual, mesmo naquela dos países mais ricos – está presente em
quantidades signi cativas, e com a mesma satisfatória biodisponibilidade,
também nas carnes chamadas de brancas. De fato, todas as carnes desfrutam
de um bom conteúdo de ferro, e mais exatamente de uma forma
denominada “ferro heme”, fácil de ser absorvido e utilizado pelo nosso
organismo.

Um último esclarecimento: outra convicção muito comum que circulou por


anos foi a de que a carne “branca” só deveria ser destinada a pessoas idosas
ou doentes. É outra ideia infundada, talvez derivada da maior leveza e
digestibilidade desses tipos de carnes mais pobres em tecido conjuntivo e,
portanto, mais macias e mais fáceis de mastigar.

Falando em carnes vermelhas, não se pode deixar de mencionar o clamor


midiático – que é compreensível, porém excessivo, e desembocou em um
alarmismo injusti cado – que se seguiu ao recente pronunciamento da IARC
(a qual faz parte da OMS) acerca da relação entre o consumo de carnes
processadas e vermelhas e o risco de tumores. Como se pode lembrar, o
documento inseriu as carnes “processadas” (salgadas, fermentadas,
defumadas, secas ou com adição de conservantes) no grupo das substâncias
certamente cancerígenas para o homem (grupo 1) e as carnes “vermelhas”
(todos os tipos de músculos de mamíferos) em um grupo que implica um
nível de risco menor (grupo 2 A, de substâncias provavelmente cancerígenas
para o homem).

O objetivo do relatório não era dar indicações sobre o que e como comer –
nem o que excluir – que fossem válidas para as diferentes populações e para
as diferentes pessoas no âmbito de uma mesma população. De maneira mais
simples, ele havia sido planejado para emitir juízos coletivos sobre classes
inteiras de produtos, sem poder fazer muitas distinções (não existem
trabalhos cientí cos su cientes sobre produtos individuais), para fornecer
avaliações qualitativas, e não quantitativas. De fato, nesse relatório, são
postas lado a lado, inevitável e obrigatoriamente, substâncias cujo grau de
periculosidade é enormemente diferente e não comparável. Para dar um
exemplo, as carnes processadas (e todas juntas, ou seja, o toucinho e as
salsichas de cachorro-quente junto de produtos submetidos às mais rígidas
disciplinas de produção, como o presunto de Parma ou o San Daniele...)
encontram-se no grupo 1, junto da terapia de reposição hormonal na
menopausa, da bactéria Helicobacter pylori (que tantos de nós hospedamos
no estômago), das radiações ultravioleta (mas nem por isso alguém pensou
em fechar os balneários...) e do álcool; além do fumo, do benzeno, do
arsênico e até do amianto e da fumaça de óleo diesel!

O problema da compreensão foi intensi cado em seguida pela chegada


direta das conclusões desse relatório às primeiras páginas dos jornais, e do
consequente impacto sobre uma opinião pública pouco preparada a perceber
certas distinções nada evidentes. De fato, era – e ainda é, obviamente –
muito difícil para o leitor comum interpretar o signi cado de uma
classi cação como a da IARC, e ainda mais difícil compreender as variações
dos níveis de “risco relativo” e “risco absoluto”, ou seja, de risco “real”, assim
como o seu signi cado (a probabilidade de que um evento aconteça, e não a
certeza; a correlação, e não a ligação entre causa e efeito), além das
diferenças entre os dois conceitos, tendo à disposição somente as notícias,
forçosamente resumidas, fornecidas pela grande imprensa.

A propósito disso, é justo lembrar que em todos os campos de estudo nos


quais se lida com números e estatísticas corre-se o risco de ser super cial ou
precipitado, e portanto de interpretar e julgar como se estivessem ligados
por uma relação de causalidade (causa-efeito) certos fenômenos que, em vez
disso, estão associados apenas por um andamento muito semelhante, ou seja,
são correlatos, o que pode ser em razão do acaso ou de um fator comum, e
que no entanto não implica automaticamente que um esteja provocando o
outro.

Um episódio curioso, justamente para sublinhar esses riscos interpretativos e


aconselhar a prudência: anos atrás, um pesquisador alemão chegou a
publicar na Nature (e a respeitada revista prestou-se a isso de bom grado)
uma provocação que consistia em um brevíssimo estudo estatístico,
representado por um grá co que comparava a curva mostrando a
diminuição dos novos nascimentos de crianças no intervalo de 1965 a 1980
em toda a Alemanha Ocidental com a curva que assinalava, no mesmo
período de tempo e no mesmo território, a diminuição do número de
ninhos de cegonha. Pois bem, as duas curvas coincidiam de forma
surpreendente, o que certamente não autorizava ninguém a conectar os dois
fenômenos, como se o segundo (menos ninhos) tivesse provocado o
primeiro (menos nascimentos), quase provando que esses grandes seres
bicudos realmente são necessários para fazer os recém-nascidos chegarem
ao seu destino... Uma provocação inteligente e que vale a pena ter em
mente.

Depois, também a prontidão com a qual vários grupos muito interessados se


precipitaram imediatamente a ampli car a mensagem contribuiu para
agigantar a repercussão alarmista na opinião pública, colaborando para
aumentar a confusão.

Deve-se dizer que a repercussão que o relatório da IARC teve no mundo em


relação ao consumo de carne pegou de surpresa até os estudiosos que o
elaboraram, os quais zeram de tudo para esclarecer depois, por todos os
canais possíveis, que o documento não continha sentenças de exclusão de
nenhum alimento e que o problema era e continuava sendo somente o das
quantidades e das frequências de consumo. De fato, a sugestão da
IARC/OMS nunca foi a de parar de comer carnes processadas e vermelhas,
muito menos os outros tipos de produtos de origem animal, como as carnes
brancas, e sim apenas não consumir doses abundantes demais e com muita
frequência. E não se trata de nada novo: nas regras para uma alimentação
correta elaboradas em todo o mundo (OMS, pirâmides alimentares, RDA
americanas, diretrizes para a alimentação, etc.), a carne está sempre
presente, regularmente acompanhada do preceito taxativo de consumi-la em
quantidades reduzidas.

Além disso, os italianos estão entre os povos que menos comem carne na
Europa, e os principais tipos de carnes processadas a que o relatório se
refere não estão presentes com tanta frequência em nossa mesa. As
recomendações da IARC, bem como da OMS e do World Cancer Research
Fund [Fundo Mundial para a Pesquisa do Câncer] para a carne vermelha
são de consumir quantidades inferiores a 400 g por semana. Pois bem,
nosso consumo real, segundo a pesquisa mais con ável, ou seja, aquela
realizada pela CREA-NUT, é de 420 g de carnes vermelhas por semana, ou
seja, cerca de 60 g por dia: mesmo com toda a cautela do mundo, por se
tratar de dados médios, é justo dizer que são valores bastante alinhados com
as recomendações internacionais, e que um eventual redimensionamento
para adequar-se totalmente ao limite seria de pouca monta, e portanto não
tão difícil de realizar.[45]

O discurso já muda para os salames, cujo nível de risco, vale lembrar, é


maior do que aquele das carnes vermelhas: nesse caso, as recomendações
internacionais sugerem limitar-se ao consumo esporádico ou, melhor ainda,
abster-se totalmente deles. Quanto ao consumo de salames na Itália, a
pesquisa mencionada veri cou um valor médio de 190 g de salames por
semana, equivalentes a uma dose média de 27 g por dia: à luz das
recomendações, essas quantidades são consideradas elevadas demais e
certamente deveriam ser reduzidas.

É útil acrescentar que a mesma IARC, em seu European Code Against Cancer,
primeiro lembra que “comer muita carne vermelha aumenta a probabilidade
de desenvolver tumores no cólon” e depois acrescenta: “mas ela também
fornece numerosos nutrientes; via de regra, recomenda-se não consumir
mais do que 400 g ou 500 g de carne vermelha por semana”. Os mesmos
autores do estudo da OMS apressaram-se em lembrar, também, o valor
nutritivo da carne, a rmando que “tudo depende de quanta carne se come.
Por si só, comer carne expõe a um risco baixo, mas o alerta é justi cado em
termos de saúde pública se considerarmos o grande número de pessoas no
mundo que a consomem”. E a Associazione Italiana per la Ricerca sul
Cancro diz com todas as letras que “o consumo excessivo de carnes
vermelhas aumenta o risco de desenvolver alguns tumores, mas esse
aumento é proporcional à quantidade e à frequência, de modo que comer
carne vermelha uma ou duas vezes por semana é aceitável, ao passo que as
carnes vermelhas processadas (salames, embutidos e carnes enlatadas)
deveriam ser consumidas apenas esporadicamente”.

En m, nada de realmente novo, para vergonha do clamor que se criou. No


m das contas, voltamos sempre a isto: também para a carne só os excessos
habituais de consumo (e os maus métodos de cozimento) podem trazer
riscos sérios para a saúde.

A FARINHA BRANCA É TÓXICA


Um clamoroso exagero muito recente, bem inserido na cruzada geral –
popular na internet – contra tudo o que é branco. O alvo preferido desse
“movimento de opinião”, infelizmente apoiado com frequência por
declarações imprudentemente bombásticas de alguns envolvidos, que (como
eles admitem explicitamente) comprazem-se demais com o efeito retórico,
são os chamados quatro venenos brancos: leite, açúcar, sal e farinha branca
ou re nada.

Como se vê, tudo é posto no mesmo balaio, juntando produtos cujas


características e “periculosidades” são muito diferentes. Vamos nos limitar,
neste caso, ao problema da farinha.

Em primeiro lugar, os cereais desempenham há milênios um papel


fundamental na alimentação humana como fonte de nutrientes e de energia,
e vale lembrar que alguns deles só são utilizáveis na prática depois de serem
moídos para obter uma farinha, a qual servirá para criar toda uma série de
produtos de imenso consumo, desde o macarrão até o pão, o cuscuz, a pizza,
os biscoitos, o panetone, a polenta, e assim por diante. Ora, considerando
que no trigo os nutrientes presentes nos grãos estão distribuídos de maneira
não homogênea, do exterior para o interior, é evidente que os diferentes
processos de moagem e de bene ciamento in uirão profundamente na
composição do produto nal. Em particular, a remoção das camadas
externas levará à perda da maior parte da bra e do germe, e portanto de
vitaminas, sais minerais e substâncias bioativas que estavam presentes
originalmente.

O que resulta disso? Simplesmente que consumir cereais integrais e


produtos derivados obtidos de farinhas integrais é uma ótima escolha, a qual
está ligada à redução do risco de obesidade, de diabetes tipo 2, de doenças
cardiovasculares e de algumas formas de tumores. O consumo de cereais
integrais e de produtos obtidos de suas farinhas facilita uma maior sensação
de saciedade, melhora o funcionamento do intestino, promove o
crescimento de uma ora bacteriana intestinal favorável e melhora também
a resposta insulínica e glicêmica (graças a um índice glicêmico mais baixo,
ou seja, a um menor efeito hiperglicemizante para a mesma dose) tanto em
indivíduos sadios quanto em diabéticos.

Sobre esses aspectos já existe um consenso geral. Não é por acaso que as
novas diretrizes para uma alimentação sadia dedicadas ao povo italiano
recomendam que pelo menos metade das porções de cereais consumidos
seja do tipo integral e que eles estejam presentes diariamente em nossa
mesa. Outra sugestão: escolher preferencialmente produtos de fato integrais
(obtidos de farinhas tipo 1 ou 2) em vez de produtos obtidos de misturas
de farinha branca com farelo. Tudo isso é fácil de realizar na prática,
simplesmente substituindo algumas porções de alimentos re nados pelas
suas versões integrais, e utilizando também os cereais integrais em grãos que
se usam nas sopas, como milho, trigo emmer, aveia, cevada, etc. As
recomendações de 2017 da Agence Nationale de Sécurité Sanitaire de
L’alimentation [Agência Francesa de Segurança Sanitária dos Alimentos], e
em geral aquelas das instituições cientí cas de todo o mundo, seguem essa
mesma linha.

No entanto, alguns aspectos precisam ser ressaltados: antes de mais nada, se


é verdade que no produto integral os sais minerais estão presentes em maior
quantidade, também é verdade que eles são absorvidos de maneira
incompleta pelo organismo por causa da permanência de substâncias
( tatos) que os ligam e limitam sua absorção. E quanto a eventuais
vantagens dos produtos integrais no controle da massa corpórea, estudos
experimentais muito recentes sugeriram que o uso exclusivo de cereais
integrais pode aumentar a taxa metabólica em repouso e fazer absorver
menos energia da comida, por um efeito direto da bra na digestibilidade
dos outros alimentos. Mas tudo ainda precisa ser con rmado, e em todo
caso as diferenças encontradas são bastante reduzidas. Portanto, já que o
teor calórico dos produtos integrais é bem pouco inferior ao dos produtos
re nados correspondentes, pode-se dizer que, ao contrário do que muitos
consumidores esperam, recorrer a alimentos integrais sem controlar o teor
total de energia da dieta não é su ciente, por si só, para induzir uma
redução signi cativa da massa corpórea.
Existe uma concordância bastante generalizada sobre o que foi dito até aqui;
mas não há nada que autorize a rmações imprudentes como as que
mencionamos sobre os “venenos brancos”, as quais são destinadas,
infelizmente, a apossar-se da imaginação dos leitores e dos usuários da
televisão e da internet, causando uma forte impressão. A rmações como
essas trazem o risco de provocar tanto desinformação quanto um clima de
“caça às bruxas”, ou seja, situações que são totalmente opostas à atmosfera
de sereno confronto que deve permear qualquer debate cientí co, mesmo
em uma área como a da ciência da alimentação, vivida pela maior parte das
pessoas de forma tão emocional.

Por exemplo, é fato que a farinha branca tem um índice glicêmico mais alto
do que a farinha integral, porque contém quase exclusivamente amido e uma
fração proteica, mas isso não nos autoriza a a rmar automaticamente que
ela “cause diabetes” ou determine uma hiperprodução de insulina. De fato, o
índice glicêmico é uma variável complexa, que não envolve um só
ingrediente, mas, sim, o produto nal e a nossa refeição em seu conjunto –
a nal, nós não comemos farinha, muito menos a farinha sozinha! Além
disso, pode acontecer que certos tipos de pães produzidos com farinhas
integrais tenham um índice glicêmico igual ou até superior ao do pão
produzido com farinha branca. E são parecidos também os índices
glicêmicos – bastante baixos – do macarrão produzido com sêmola integral
e daquele produzido com sêmola re nada: consumir macarrão cozido al
dente é a melhor maneira de reduzir seu impacto glicêmico.

Quanto à questão dos tumores, é sabido que eles são doenças multifatoriais,
que dependem de muitos aspectos diferentes, não só nutricionais; portanto,
é inaceitável a rmar de forma simpli cada, como infelizmente foi feito, que
a farinha branca provoca câncer. Instituições de prestígio, como o Istituto
Nazionale dei Tumori [Instituto de Tumores] de Milão, o World Cancer
Research Fund [Fundo Mundial para a Pesquisa do Câncer] e o próprio
European Code Against Cancer concordam que declarações desse tipo são
despropositadas, e recomendam simplesmente manter uma dieta sadia, com
base predominantemente em cereais integrais, legumes, verduras e frutas – e
se resguardam de atribuir à farinha branca culpas que ela não tem.

O termo “re nada” também contribui para a demonização da farinha


branca. Muitos que trabalham nesse setor gosta de lembrar que é o petróleo
que é re nado, não a farinha – a qual, em vez disso, é “peneirada”. Aliás, na
Europa, o uso de branqueadores químicos para a produção de farinhas foi
proibido por uma norma especí ca da comunidade europeia que está em
vigor desde 1998; portanto, o temor tão comum de encontrar resíduos de
substâncias desse tipo nos produtos à base de farinha branca é totalmente
injusti cado.[46]

Permitam-nos uma pequena re exão nal. É verdade que o campo da


informação alimentar é difícil e complexo, e que os desdobramentos das
pesquisas e dos conhecimentos obrigam periodicamente a rever certos
conceitos e a corrigir determinadas mensagens (e isso é algo positivo!). Mas
haveria muito menos confusão se alguns dos envolvidos mantivessem um
equilíbrio melhor e não se deixassem seduzir pelo fascínio das a rmações
bombásticas; e a tarefa das instituições, cujo dever é atualizar o universo dos
consumidores sobre os temas da nutrição e da alimentação, seria
imensamente facilitada...

Ã
PRATOS “SEM MOLHO” SÃO MAIS LEVES
É um preconceito que custa a morrer, e ele remonta a épocas em que, como
alguém acertadamente descreveu, “a consistência cientí ca era quase
impossível e estava voltada mais à aparência ou aos perigos da higiene do
que à diversidade dos conteúdos nutricionais”.

Sábias palavras. Todos temos em mente o “cardápio branco” da nutrição


hospitalar – como se devêssemos temer mais pela digestibilidade do molho
de tomate no condimento do macarrão ou do arroz do que pela da manteiga
ou do próprio óleo. A verdade, e isto também já foi escrito, é que o fígado e
o estômago realmente não se deixam impressionar pelas cores, somente por
aquilo que os alimentos e os vários pratos contêm.

A maior ou menor facilidade com que conseguimos digerir e assimilar o que


comemos depende principalmente do volume de comida ingerido, de uma
mastigação correta e da quantidade de gorduras presentes – são sobretudo
elas que prolongam a permanência do bolo alimentar no aparelho digestivo.
Em geral, os pratos mais fáceis de digerir são os simples e com pouco
acréscimo de gorduras (melhor ainda se crus), como pouco azeite de oliva.
Portanto, se “comer sem molho” signi ca um macarrão condimentado com
muita manteiga e queijo parmesão, teremos um prato “branco”, mas que
certamente não merece ser de nido como “leve”. E as mesmas considerações
valem para alguns queijos e a própria muçarela, aparentemente tão fresca e
leve.

Hoje em dia, o “cardápio branco” desapareceu de grande parte das cozinhas


hospitalares, mas na mente de muitas pessoas persiste a ideia de que um
prato de arroz na manteiga seja mais leve e mais fácil de digerir do que
outro condimentado com um simples molho de tomate e pouco azeite. É um
típico exemplo de como às vezes podemos ser enganados e
desencaminhados pela ideia de que a sabedoria implícita nas máximas
herdadas dos “anciões da tribo” seja uma verdade que deve ser aceita sem
reservas.

SAL IODADO É O NOVO VENENO


LEGALIZADO
Parece inacreditável, mas na internet chegou-se a escrever até isso, e em
outros lugares, insistir em manchetes como “aqui estão os efeitos colaterais
que eles escondem de você”.

A rmações de derrotistas, de verdadeiros fanáticos das teorias da


conspiração, embora felizmente essas últimas fake news resultem um tanto
isoladas e neutralizadas pela correta informação disponível na maioria dos
outros sites, os quais desmentem e desmontam esses alarmismos
injusti cados.

De qualquer forma, embora não seja muito comum, ainda se trata de um


“mito alimentar”, e não se pode desperdiçar a ocasião de ilustrar para todos
as vantagens que o uso do sal iodado já está trazendo parcialmente, e
sobretudo que poderá trazer, de forma crescente, em um futuro próximo.
Mas esse novo progresso só pode se concretizar se aproveitarmos cada
ocasião para explicar os termos da questão e convencer um número cada
vez maior de pessoas a fazer a escolha certa, ou seja, utilizar habitualmente
o sal iodado no dia a dia.
O problema básico é que em todo o mundo, inclusive no Ocidente, a
alimentação normal nos fornece uma quantidade de iodo inferior à
necessária. Essa carência é difundidíssima, sendo mais ou menos
pronunciada em uma ou outra região (atualmente é de nida como
“leve/moderada” na maior parte do território italiano, presente também nas
regiões litorâneas e com focos de grave dé cit no centro-sul do país), e
representa um verdadeiro problema para a saúde.[47] O iodo é um
nutriente essencial, algo que o nosso organismo não pode sintetizar sozinho
e que precisamos necessariamente receber nos alimentos, os quais
representam a única fonte signi cativa desse mineral para o homem.

E infelizmente, o iodo encontrado nos alimentos é pouco. As fontes mais


ricas são os animais de origem marinha (em especial alguns moluscos) e as
algas marinhas. Quanto ao resto, o conteúdo de iodo varia muito segundo
inúmeros fatores (sobretudo o tipo de solo e várias intervenções na
agricultura e na indústria): em geral é escasso na água, nas frutas, nos
cereais e também nos legumes e hortaliças, algumas das quais (como a
couve, o nabo e a cebola), ainda por cima, às vezes contêm substâncias
“criadoras de bócio” que atrapalham a absorção desse mineral. Em vez disso,
encontramos um pouco mais de iodo no leite e nos derivados do leite, nos
ovos e também na carne. Como se não bastasse, o cozimento faz com que se
perca uma parte desse teor, que vai de um quinto à metade do iodo
presente.

Mas por que uma ingestão escassa demais de iodo na alimentação habitual
pode se tornar um problema de saúde? Porque o iodo é indispensável para a
tireoide, a qual, de fato, capta e concentra ativamente quase todo o pouco
iodo que vem dos alimentos e aquele presente no organismo (normalmente
de 15 mg a 20 mg), usando-o para sintetizar os seus hormônios. Estes
últimos são importantíssimos para manter o metabolismo dos tecidos em
um bom nível, bem como para o crescimento e o amadurecimento normais,
para o desenvolvimento do cérebro, etc.

A tireoide tem uma grande capacidade de adaptação, mas quando o


fornecimento alimentar em iodo é escasso demais e dura muito tempo, os
níveis desse mineral disponíveis no organismo podem diminuir até o ponto
de atrapalhar o funcionamento normal da glândula, ou seja, de impedi-la de
sintetizar e pôr em circulação quantidades adequadas dos seus hormônios.
Assim, podem aparecer vários distúrbios, que vão desde um aumento
notável das dimensões da glândula, eventualmente acompanhado também
por nódulos (o bócio – que pode car tão grande a ponto de requerer uma
cirurgia), até um verdadeiro hipotireoidismo, com efeitos prejudiciais no
crescimento e desenvolvimento cerebral (particularmente graves na gestação
e para o feto, em recém-nascidos e em crianças) e vários graus de
comprometimento neurológico, como retardamento mental e às vezes
também neoplasias. Na Itália, calcula-se que mais de 6 milhões de pessoas
sofram de problemas relacionados à tireoide, e a cada ano são cerca de 40
mil os casos nos quais é necessária a intervenção cirúrgica.

Se a situação é essa e se podemos obter o iodo somente por meio da


alimentação (ele não é obtido inalando a brisa do mar, embora muitos
pensem assim – mais uma crença infundada...), era evidente que a solução
mais lógica – e também a mais barata – fosse acrescentar esse mineral aos
alimentos ou a produtos de uso diário. E de que forma? Foram seguidos
vários caminhos, e todos demonstraram ser e cazes. Na Áustria e na Suíça,
por exemplo, os casos de bócio e de tumor da tireoide são muito menos
frequentes do que na Itália graças a uma vigilante política de iodação das
águas potáveis e à adição de iodo a produtos de uso comum, como o pão e o
chocolate, ou a ingredientes como o sal. Na Finlândia, o iodo foi ministrado
ao gado para obter derivados de leite com um maior teor do mineral. Nos
Países Baixos, as pani cadoras são obrigadas a usar sal iodado na fabricação
do pão. Na China, na Índia e na América do Sul acrescentou-se iodo ao
óleo, aos alimentos embalados, à água para irrigação e também às rações, de
modo que ele entrasse na cadeia alimentar. E assim por diante.

Na Itália, decidiu-se desde 1977 enriquecer com iodeto e/ou iodato de


potássio o sal comum de cozinha. Esse é o “sal iodado” de que se fala, que
pode ser tanto no quanto grosso, e que não é um produto dietético – não
deve ser confundido nem com o sal que tem reduzido teor de sódio, nem
com o “sal marinho” (o qual contém quantidades insu cientes de iodo). Ele
é vendido no comércio comum e é, para todos os efeitos, um alimento
normal de uso corrente, cujo consumo é recomendado (certamente não
imposto) a toda a população pelo Ministério da Saúde italiano.

Esse “sal forti cado com iodo” consegue aportar, para cada grama de sal, 30
microgramas de iodo. Pois bem, a absorção diária adequada foi xada em 70
microgramas para crianças lactentes, 100 microgramas para crianças até 10
anos, 130 microgramas para quem tem de 11 a 17 anos, 150 microgramas
para adultos e 200 para gestantes e mulheres que estão amamentando. Isso
porque o feto, o recém-nascido e as gestantes estão particularmente
expostos aos danos da carência de iodo, relativos também ao
desenvolvimento intelectual da criança, e o leite materno naturalmente já
contém mais que o dobro do iodo presente no leite de vaca.
É preciso sublinhar que o programa nacional de iodopro laxia nem sonha
em propor que se aumente o consumo de sal – não se deve nem pensar
nisso, e tampouco é necessário. De fato, o cálculo é muito fácil: mesmo
diminuindo o uso do sal até chegar àquele consumo de 5 g ao dia (em vez
dos 9 g que são a média nacional na Itália)[48] sugerido pela OMS como o
justo equilíbrio entre a satisfação do paladar e a prevenção dos riscos
ligados ao sódio, chegaremos exatamente aos almejados 150 microgramas de
iodo que são recomendados. Parece tudo muito simples; porém, na Itália, a
utilização de sal iodado está entre as mais baixas da Europa, tanto nas
residências quanto nos restaurantes e em produtos industrializados. Segundo
a OMS, para uma real e cácia é preciso objetivar um índice de 95% do sal
vendido, ao passo que o nosso consumo, mesmo tendo duplicado nos
últimos doze anos, chegou a 60% somente em 2016 (mas era de 3% no nal
do século passado!).

O consumo ainda precisa aumentar, portanto, mas já é su ciente para


con rmar que esse caminho é o certo. Em 2016, pela primeira vez, o bócio
na idade escolar caiu para menos de 5% nas regiões da Ligúria, da Toscana,
do Lácio e da Sicília, e caiu também nas Marche – uma con rmação dos
resultados positivos obtidos anteriormente com crianças em idade escolar
em algumas regiões graças a campanhas educativas concentradas tanto nos
hábitos alimentares quanto no uso do sal iodado: diminuição do bócio de
60% para 8% em dez anos na Toscana, com resultados análogos (redução a
um terço dos valores iniciais) também na província de Bolonha no período
de dez anos, demonstrando que “o bócio pode ser eliminado com um pouco
de informação”.
Resumindo, o sal iodado funciona. Mas é preciso insistir, combatendo a
desinformação, explicando melhor o problema a quem o conhece pouco,
incentivando as campanhas promocionais institucionais; quem sabe
acrescentando, além da obrigatoriedade dos comerciantes de oferecer o
produto para venda (obrigatoriedade instituída em 2005, que provou ser
e caz), também a obrigatoriedade de apenas vender sal iodado. E
desenvolvendo outras estratégias: pensa-se no uso de sal enriquecido na
indústria, em sal iodado protegido para resistir melhor ao cozimento, em
hortaliças enriquecidas com iodo mediante a iodação da água da irrigação,
em enriquecer com iodo as rações (o leite pode dar uma contribuição
signi cativa), etc. A importância do problema da carência de iodo e a
possibilidade de recorrer a soluções e cazes e baratas justi cam plenamente
toda a atenção que está sendo dada aos programas de iodopro laxia,
também com o objetivo nada negligenciável de reduzir os altos custos (cerca
de 150 milhões de euros por ano) que o tratamento do bócio signi ca para
o Servizio Sanitario Nazionale [Serviço Nacional de Saúde italiano].

Portanto, informemos ao maior número possível de pessoas que o sal iodado


tem o mesmo sabor e as mesmas características do sal comum; que pode e
deve ser utilizado em todas as idades e em todas as condições siológicas
em vez do sal normal, mas com as mesmas doses reduzidas; que todos
podem usá-lo e que, com um consumo moderado de sal, as quantidades de
iodo ingeridas são sempre muito inferiores aos valores que podem causar
efeitos negativos, como o bócio tóxico nodular ou o hipertireoidismo: esses
“valores que não se deve superar” foram xados em 600 microgramas por
dia!
Não há contraindicações, na verdade. No entanto, em nome da prudência, é
melhor consultar o médico no caso da presença de patologias especí cas da
tireoide, como hipertireoidismo, formas tumorais, nódulos, tireoidites e
tireoidite autoimune de Hashimoto.

A conclusão? Façamos uso do acertadíssimo slogan “pouco sal, mas iodado” e


coloquemo-lo em prática. Ele nos dará uma ajuda valiosa em prevenir tanto
as consequências negativas da carência de iodo quanto aquelas igualmente
prejudiciais do excesso de sódio.

PARA EMAGRECER, É PRECISO ABOLIR O


SAL DA COZINHA E DA MESA
O sal não contém calorias, portanto, não pode engordar. A ideia de aboli-lo
para emagrecer talvez tenha surgido da confusão que se pode fazer quando,
desejando perder peso, ouve-se também a recomendação de reduzir os
excessos de condimentos. Mas são somente os condimentos com substâncias
gordurosas que devem ser limitados quando se deseja evitar o aumento de
peso causado pela acumulação de tecido adiposo. O sal pode fazer o
ponteiro da balança se mexer, e em geral só temporariamente, apenas
quando provoca uma notável retenção de líquidos nas pessoas predispostas.
Trata-se, porém, de um aumento somente do peso e em geral passageiro,
bem diferente de uma verdadeira “engorda” – processo que envolve o
aumento da massa gorda do corpo. Duas coisas bem distintas, como se vê.

No entanto, certamente é bom reduzir o consumo de sal por outros motivos


muito válidos de proteção da saúde. É um fato incontestável que o consumo
excessivo e habitual de sal (cloreto de sódio) é muito comum hoje em dia:
na Itália, consumimos em média, tanto nos alimentos quanto acrescentando-
o na cozinha e à mesa, cerca de dez vezes mais que a quantidade
efetivamente útil e cerca de duas vezes a quantidade diária sugerida pela
OMS (5 g, uma colher de café) como um justo equilíbrio entre a satisfação
do paladar e a prevenção dos riscos ligados a um consumo excessivo de
sódio.

Que riscos são esses? Em síntese: maior probabilidade de desenvolver


hipertensão arterial, para os indivíduos com predisposição; maior perigo de
apresentar doenças do coração, dos vasos sanguíneos e dos rins
(independentemente do surgimento da hipertensão); aumento das perdas de
cálcio por via renal (com consequente aumento da probabilidade de ter
osteoporose) e também um risco mais elevado de desenvolver tumores no
estômago.

Ora, se pensarmos que bastaria reduzir o teor diário de sal em apenas 5 g


para fazer diminuir em 23% a incidência de AVCs e em 17% a de doenças
cardiovasculares, segundo a OMS; e se considerarmos que são su cientes
poucas semanas para adaptar nosso paladar a sentir como saborosos pratos
que antes nos pareceriam insossos, é preciso concluir que não caminhar
nessa direção é realmente insensato!
[41] Na dieta brasileira, cerca de 2/3 do cálcio são assegurados pelo consumo de leite e derivados,

porém nossa ingestão média ainda é baixa, atingindo apenas metade dos 1.000 mg indicados por dia.

(N. E.)

[42] Segundo dados de 2010 fornecidos pelo IBGE, o consumo alimentar médio per capita de leite

integral no Brasil é de apenas 34,7 g por dia; o de leite desnatado, 4,7 g/dia; o de iogurtes, 9,8 g/dia;

e o de queijos, 6,8 g/dia. (N. E.)

[43] De acordo com a Sociedade Brasileira de Alimentação e Nutrição, para indivíduos saudáveis que

necessitam de 2.000 kcal/dia, recomenda-se o consumo diário de três porções de lácteos para ajudar a

atingir as recomendações diárias de cálcio e proteínas. Um copo de leite (200 ml) corresponde a uma

dessas porções. (N. E.)

[44] A mozzarella italiana, mesmo aquela produzida do leite de vaca, é diferente do queijo que

conhecemos no Brasil como muçarela e se assemelha à nossa muçarela de búfala. (N. E.)

[45] No Brasil, segundo pesquisa do IBGE (2010), o consumo médio de carne bovina no país

corresponde a 63,2 g/dia, e o de carne suína, 8,5 g/dia. (N. E.)

[46] No Brasil, quando falamos sobre o re namento de um alimento, queremos dizer que este passou

por transformações em sua estrutura, ou seja, foram retiradas algumas partes (principalmente película

e germe de grãos), deixando-o com um valor nutricional mais pobre, com menos bras, vitaminas e

minerais. (N. E.)

[47] No Brasil, a iodação do sal tornou-se obrigatória desde a década de 1950, o que reduziu

signi cativamente os casos de distúrbios gerados pela de ciência desse nutriente. No entanto, ainda
persistem algumas diferenças entre estados e regiões, e a prevalência de casos de de ciência de iodo é

maior na região Norte em comparação com as demais regiões do país. (N. E.)

[48] No Brasil, 44,2% das amostras colhidas na Pesquisa Nacional para Avaliação do Impacto da Iodação

do Sal sugerem um consumo excessivo do sal no país, segundo relatório publicado em 2016. (N. E.)
10 FRUTAS “MILAGROSAS”

SOMENTE A BANANA CONTÉM MUITO


POTÁSSIO
É uma equação que quase todos têm em mente: você sua muito, sente
cãibras musculares com frequência ou está se sentindo fraco? Com certeza
está com falta de potássio, e nada melhor que um par de bananas para car
novinho em folha.

Ora, é verdade que a banana contém muito potássio – 350 mg para cada
100 g da parte comestível. Mas é francamente exagerada toda essa exaltação
como a fonte alimentar primária e quase única desse mineral, que aliás é
preciosíssimo: o potássio, que é o principal íon presente nos líquidos
intracelulares e é essencial para uma série de funções vitais, desempenha
importantes funções também fora da célula, estando envolvido, por exemplo,
na transmissão dos impulsos nervosos, no controle da contração muscular
(os músculos estriados voluntários são ricos nele) e também no controle da
pressão arterial.

O potássio é tão amplamente distribuído nos alimentos que ter carência dele
é muito improvável: seu verdadeiro dé cit está ligado a condições
patológicas especí cas, e se for prolongado, pode produzir graves danos
renais, arritmias cardíacas, entre outros problemas.

A água contém bem pouco potássio, e as fontes alimentares mais ricas nele
são vários tipos de frutas e verduras, e também as carnes frescas. Mas na
vasta área das frutas e hortaliças encontramos muitos produtos mais ricos
em potássio do que a banana, embora essa virtude seja desconhecida:
podemos citar o kiwi (400 mg/100 g), as castanhas europeias frescas (395
mg), as azeitonas pretas (430 mg), a groselha (370 mg), a alcachofra (380
mg), a couve-de-bruxelas (450 mg), a erva-doce (395 mg), a chicória (380
mg), as batatas (570 mg), a rúcula (470 mg), o abacate (400 mg), o
espinafre (530 mg), isso sem falar de vários tipos de castanhas e frutas
secas – 980 mg para cada 100 g de damascos secos, 680 mg no amendoim,
740 mg nas castanhas europeias secas, 1.000 mg nos gos secos, 780 mg
nas amêndoas, 470 mg nas avelãs, 970 mg no pistache, 830 mg nas ameixas
secas. E não são poucos os produtos nos quais a presença do potássio está
próxima do teor das bananas, ou seja, oscila entre os 250 mg e os 330 mg:
damascos frescos, melancia, toranja, romã, pêssego, gos frescos, abacaxi...

Para uma fruta, a banana contém pouca água e mais açúcares e amidos, com
um valor calórico de 65 kcal por 100 g da parte comestível – só um pouco
superior ao da maioria das outras frutas de consumo comum; portanto, não
merece ser evitada por quem teme engordar. Por outro lado, o seu amido é
totalmente digerível só quando ela está completamente madura, e do ponto
de vista das vitaminas e sais minerais, ela tem muito pouco a acrescentar.

De onde vem, então, a fama dessa fruta? Certamente do quanto ela é


agradável, da facilidade com que pode ser descascada (é incrível quantas
pessoas a recusam confessando inocentemente ter preguiça de descascá-la!),
da sua inclusão (bem esmagada) na dieta das crianças após alguns meses de
vida,[49] e também da publicidade que dela zeram tantos atletas que desde
sempre a utilizam, até durante as competições, tanto pelo seu teor de
potássio quanto por seus 15% de açúcares de rápida assimilação.

Ã
LIMÃO DESINFETA OS FRUTOS DO MAR
É uma crença tão comum (e potencialmente perigosa) quanto
absolutamente falsa. Na verdade, o suco de limão não possui propriedades
antimicrobianas ou desinfetantes e não pode de maneira alguma servir para
esterilizar. O problema diz respeito essencialmente aos moluscos bivalves ou
lamelibrânquios, uma classe que engloba cerca de 13 mil espécies
predominantemente marinhas, como os mexilhões, os vôngoles, os mariscos,
as ostras, as vieiras, as lapas, etc.

Pois bem, o ácido cítrico e o ácido ascórbico presentes no suco de limão são
totalmente insu cientes para eliminar tanto o risco de infecções causadas
por vírus e/ou bactérias, eventualmente presentes nesses re nados produtos,
quanto o perigo de intoxicações advindas do seu consumo – um perigo que
deriva diretamente do fato de que esses moluscos, que se nutrem dos micro-
organismos presentes na água e não necessitam de ração, ltram
continuamente grandes volumes de água para procurar comida, o que os
leva a reter e a concentrar em seu interior relevantes quantidades tanto de
substâncias poluentes e tóxicas que podem estar presentes na água quanto
de micro-organismos potencialmente nocivos para a saúde humana, desde a
Escherichia coli até a Salmonella.

Portanto, se alguém deseja consumir tais alimentos sem cozinhá-los, as


primeiras garantias são representadas, antes de mais nada, pelo controle da
região de origem e pela escolha de um revendedor seguro e de con ança,
bem como da constatação de que o produto foi inspecionado pelas
autoridades sanitárias antes de chegar ao mercado. As garantias seguintes,
porém, estão ligadas sem dúvida à sábia advertência de cozinhar bem os
próprios moluscos, deixando-os ferver por pelo menos 15 minutos ou
dispondo-os na frigideira em uma camada uniforme, para certi car-se de
que os micro-organismos eventualmente presentes serão desativados. Por
cautela, um bom critério é eliminar os moluscos que não se abrem, que
apresentam a concha quebrada ou que já estão abertos antes do cozimento.

Também é bom lembrar que o cozimento não elimina o risco químico nem
o biotoxicológico (de metais pesados e toxinas). Para essas substâncias, são
necessários controles no início da cadeia produtiva, e tudo deve estar
registrado no rótulo, o qual deve indicar a origem do produto. Trata-se de
um detalhe importante: de fato, existem águas mais limpas e com padrões
biológicos mais elevados, e águas menos seguras, em cujo caso deve ser
realizado um tratamento de depuração em águas limpas (estabulação) a m
de eliminar eventuais agentes patogênicos. Por conseguinte, os especialistas
aconselham adquirir sempre produtos embalados em redes íntegras e
lacradas, com o rótulo anexo.

Por m, de qualquer forma, a cautela impõe que idosos, crianças, gestantes e


imunodepressivos se abstenham de comer frutos do mar crus, mesmo
quando houver motivos su cientes para considerá-los totalmente seguros.

O ABACAXI (OU A TORANJA) APÓS AS


REFEIÇÕES QUEIMA GORDURAS
... e, portanto, faria emagrecer. Não é verdade, infelizmente. Trata-se
certamente de duas frutas excelentes do ponto de vista nutricional: o
consumo frequente de abacaxi (que contém 40 kcal a cada 100 g de polpa e
um discreto teor de potássio e vitamina C) e de toranja (25 kcal a cada 100
g e muito potássio, além de muita vitamina C, por ser uma fruta cítrica)
com certeza é aconselhável, assim como o de muitas outras frutas. Mas não
em virtude dessa suposta capacidade de eliminar gorduras – nem aquelas
presentes nos alimentos, muito menos as que já estão depositadas no nosso
corpo.

O nascimento dessa autêntica “lenda urbana” foi causado por boatos


descontrolados, que depois foram alimentados, de maneira mais ou menos
escusas, por conveniências publicitárias e de mercado. Mas trata-se
realmente de uma lenda. Para justi cá-la, foi dito sobre a toranja, sem bases
cienti camente válidas, que ela “ajudaria o metabolismo” e regularia o nível
da insulina, do colesterol e dos triglicérides no sangue, aplacando, além
disso, a sensação de fome e moderando a pressão arterial: nada a ver, em
todo caso, com uma ação especí ca “antigordura”. E estudos até recentes
com alguns voluntários não deram resultados signi cativos no tocante à
massa corpórea.

Para completar o discurso sobre a toranja, vale a pena acrescentar algumas


observações.

Essa fruta contém duas avononas (compostos fenólicos pertencentes aos


avonoides, muito e cazes como antioxidantes e presentes em quantidades
notáveis também na laranja) – mais precisamente, a hesperetina (análoga à
hesperidina) e a naringenina (que determina o sabor amargo da toranja) –,
as quais, já nas doses atingidas com uma dieta normalmente rica em frutas e
hortaliças, seriam capazes (segundo alguns estudos, todos aguardando
con rmação) de barrar a formação da placa aterosclerótica nas paredes dos
vasos sanguíneos, in uenciando favoravelmente, portanto, a saúde
cardiovascular.
Um segundo aspecto importante que deve ser assinalado é a notória
capacidade da toranja e do seu suco de interferirem no funcionamento e na
atividade de diversos medicamentos, em particular de alguns antagonistas do
cálcio (de ação anti-hipertensiva); de algumas estatinas (medicamentos para
baixar o colesterol no sangue), como a sinvastatina e a atorvastatina; dos
estrógenos e também de outros remédios, como a ciclosporina (um
imunossupressor), a buspirona (um ansiolítico), a terfenadina (um anti-
histamínico) e alguns corticosteroides. Essas interferências podem levar a
uma multiplicação dos efeitos desses medicamentos, inclusive dos colaterais,
e pensa-se que elas tenham origem justamente na naringenina, que retarda a
metabolização dessas moléculas, aumentando, assim, sua biodisponibilidade
e a duração de sua ação, mantendo-as em circulação por mais tempo.
Quanto a outro anti-histamínico, a fexofenadina, tanto a laranja quanto a
toranja exerceriam um efeito contrário, reduzindo-lhe a quantidade em
circulação. Essas interações variam em intensidade de um medicamento para
outro, mas levá-las em conta é importante, ainda que evitar tais efeitos
indesejáveis não seja difícil: basta, de fato, observar um intervalo de tempo
adequado entre o horário da ingestão do medicamento e o do eventual
consumo da fruta ou do seu suco. Recentemente, a FDA americana quis
lembrar o problema aos consumidores norte-americanos com uma nota
publicada em uma revista dedicada a eles.

Já quanto ao abacaxi, foi analisada uma enzima contida na fruta, a


bromelina. Ora, é verdade que o abacaxi contém essa enzima, cujas ações,
porém, consistem apenas em uma certa função anti-in amatória e em uma
ajuda para quebrar as proteínas alimentares: resumindo, nem sinal do
suposto obstáculo à assimilação das gorduras ingeridas com os alimentos – a
qual, aliás, seria bem diferente da eliminação propriamente dita dessas
gorduras...

En m, não há o que fazer. Alimentos mágicos não existem. Para “queimar”


as gorduras acumuladas (uma expressão, aliás, equivocada e enganadora), o
único meio sensato continua sendo empenhar-se para perder peso comendo
menos e fazendo mais exercício...

AS VITAMINAS ESTÃO NA CASCA DA FRUTA


O contrário é que é verdade. De fato, os mais importantes princípios
nutritivos da fruta (açúcares simples, pró-vitamina A, vitamina C,
substâncias de ação antioxidante, minerais como potássio e magnésio e
ácidos orgânicos, além de bra), até por serem solúveis ou dispersáveis na
água, estão, logicamente, concentrados não na casca, mas, sim, na polpa, que
é a parte suculenta e mais rica em água. Aliás, é justamente na polpa que
esses princípios são sintetizados, utilizando a energia solar, o gás carbônico
da atmosfera e as substâncias extraídas do solo. E é na polpa que eles
permanecem, dissolvidos nessa água de que a polpa – e não a casca – é rica.

As funções da casca se limitam, na prática, à proteção da fruta. O seu teor


nutricional, além de alguns antioxidantes como a quercetina e as
antocianinas (em doses muito limitadas por sinal, dado o peso insigni cante
dessa parte externa da fruta: em média apenas 4% a 5% do seu peso total),
em certas variedades consiste somente no conteúdo de bras insolúveis do
tipo celulótico e em bras formadoras de gel, como a pectina.
Em relação a isso, comer a fruta com casca, quando possível, é certamente
útil, também para garantir uma maior sensação de saciedade, contanto que
ela seja cuidadosamente lavada para eliminar a maior parte dos eventuais
resíduos de pesticidas e de outras substâncias tóxicas que possam ter se
depositado na sua superfície. Por esse lado, portanto, as frutas “orgânicas”
apresentam inegáveis vantagens.

AS FRUTAS DE VERÃO SÃO CHEIAS DE


AÇÚCARES
Uma espécie de mantra sobre o qual muitas pessoas estão dispostas a jurar.
Mas é substancialmente infundado.

De resto, basta dar uma olhada nas ilustres tabelas de composição dos
alimentos[50] elaboradas pelo antigo Istituto Nazionale della Nutrizione
(hoje CREA-NUT) para descobrir que a realidade é bem diferente. Na
verdade, em numerosas variedades de frutas típicas da primavera ou do
verão, de sabor muito doce e atraente, veri camos que a presença de
açúcares simples (quase exclusivamente frutose e sacarose) é muito mais
limitada do que se pensa.

Alguns números copiados tais e quais das já citadas tabelas: o damasco


contém, em 100 g da parte comestível, menos de 7 g de açúcares (e 28
kcal); a cereja, cerca de 9 g (e 38 kcal); o morango, pouco mais de 5 g (e
27 kcal); o pêssego e a nêspera, cerca de 6 g (e 27 kcal e 28 kcal
respectivamente); a ameixa, 10,5 g (e portanto 42 kcal); o go, cerca de 11
g (e 47 kcal). A exceção é a uva, com 15,6 g de açúcares e 61 kcal por 100
g.
Pois bem, se examinarmos os dados referentes às frutas típicas do inverno,
perceberemos não só que as frutas de verão em geral não são mais
“carregadas” de açúcares – e portanto não são mais ricas em calorias –, mas
também que muitas vezes algumas variedades são, por esse aspecto, até
vantajosas: a laranja contém quase 8 g de açúcares por 100 g e aporta 34
kcal; o tangor,[51] 9 g de açúcares e 37 kcal; a pera, 8,8 g e 35 kcal; o kiwi,
9 g e 44 kcal; a tangerina, assombrosos 17,6 g e 72 kcal; a toranja, 6,2 g e
26 kcal; e a insuspeitável maçã, de 9,4 g a 11,3 g de açúcares e um teor
calórico que varia de 38 kcal a 44 kcal por 100 g de polpa.

E a amadíssima romã, tão na moda também por seu conteúdo de


antioxidantes (aliás, exageradamente alardeado)? Os açúcares compõem
quase 16%, e o teor calórico é de 63 kcal.

Mas os casos mais bombásticos são de duas variedades tipicamente de verão,


para as quais a associação “sabor doce e, portanto, muitos açúcares” é feita
automaticamente na avaliação da maioria das pessoas: trata-se do melão-
cantalupo, cuja polpa contém 90% de água, e portanto somente 7,4 g de
açúcares (e 33 kcal) por 100 g – ainda assim mais que a melancia, que
chega a 95,3% de água, com apenas 3,7 g de açúcar, para um valor calórico
ainda mais baixo: somente 15 kcal por 100 g de polpa. Portanto, a melancia,
embora seu sabor doce e agradável possa enganar, tem direito de ser
de nida (e a ideia está se espalhando) como um alimento “dietético”, até
porque produz uma notável sensação de saciedade, assim como o melão.
Mas lembremos que ela pode trazer sérios problemas gastroenterológicos se
for consumida muito fria e em notáveis quantidades após uma refeição
pesada.
Combater a má fama das frutas de verão como alimentos hipercalóricos
pode ajudar a impedir que esses ótimos alimentos sejam evitados ou
consumidos com parcimônia demais por quem teme pela própria silhueta. E
isso seria realmente uma pena, pois as frutas de verão (como grande parte
das frutas de inverno), além de fornecer importantes quantidades de
vitamina C e de pró-vitamina A, também são ricas em ácidos orgânicos
(cítrico, tartárico e málico), úteis para dar gosto e para regular o equilíbrio
acidobásico do sangue; bem como em sais minerais (sobretudo muito
potássio), em bra, em água e em outros fatores não vitamínicos muito
úteis, como os polifenóis antioxidantes.

Vale lembrar que consumir a quantidade certa de potássio é importante


também porque serve para combater a ação hipertensiva dos excessos de
sódio, típicos da nossa alimentação, além de exercer um efeito alcalinizante,
o qual é vantajoso para contrabalançar a tendência à acidose resultante de
uma dieta rica em produtos de origem animal.

As bras presentes nas frutas são tanto do tipo insolúvel – úteis para regular
as funções intestinais – quanto do tipo solúvel (ou formador de gel),
e cazes por seu efeito de saciedade e para modular a absorção intestinal de
gorduras e açúcares. Além disso, as bras desse segundo tipo, e sobretudo as
pectinas, são capazes de ligar-se à água presente na fruta para depois liberá-
la gradualmente no interior do nosso organismo: dessa forma, conseguem
manter um bom grau de hidratação dos nossos tecidos até nos períodos em
que as elevadas temperaturas do ambiente tenderiam a nos desidratar, com
uma e cácia superior àquela que se conseguiria com a simples ingestão de
água ou de outras bebidas.
Mas as frutas, sobretudo quando consumidas nas suas respectivas estações e
no grau certo de maturação, têm também outras virtudes importantes
relacionadas às diversas cores que as caracterizam: trata-se daqueles
preciosos tocompostos que demonstraram ter tantos efeitos positivos na
defesa da nossa saúde, e cuja presença é justamente revelada pela coloração
do produto nos vegetais em geral – e, portanto, também nas hortaliças. A
lista é realmente instigante: nas frutas vermelhas (cereja, melancia, laranja
sanguínea,[52] morango, etc.) prevalecem as antocianinas, poderosos
antioxidantes, anti-in amatórios e vasoprotetores; nas frutas amarelas e
laranjas (laranja-lima, tangerina, toranja, damasco, caqui, pêssego, melão,
etc.) encontramos, além de muito betacaroteno (precursor da vitamina A),
muitos avonoides, que reduzem o risco de tumores e doenças
cardiovasculares, e também antocianinas; nas frutas verdes (como o kiwi), a
cor denuncia a presença da cloro la, associada sempre a muitos
carotenoides; nas frutas azuis e roxas (mirtilo, amora, framboesa, go,
ameixa, uva escura), as antocianinas dominam. Já as frutas com polpa
branca (maçã, pera) contêm muita quercetina, um antioxidante ativíssimo,
além de avonoides.

En m, um conjunto de virtudes tanto nutritivas quanto do tipo protetor,


que justi cam a conhecida exortação a consumir frutas com frequência, a
qualquer momento do dia, compondo um “arco-íris” com as escolhas. O
teor calórico, como dissemos, não constitui em si um problema. Quando
muito, o perigo pode paradoxalmente se esconder na presença simultânea,
durante a mesma época do ano, de tantos tipos diferentes de frutas, todos
igualmente agradáveis e atraentes: uma situação que pode nos levar a
excessos nas quantidades de consumo somente se, quase sem perceber,
somarmos degustações demais de todas as diferentes variedades, acabando
por exagerar na quantidade total.

Um perigo claramente previsto pelos provérbios da sabedoria popular, mas


que pode ser evitado com um pouco de atenção, e que de qualquer forma
não deve, em hipótese alguma, levar-nos a renunciar a esses ótimos
produtos, muito menos por convicções infundadas como essas, sobre uma
carga exagerada de açúcares.

CASTANHAS E NOZES SÃO UMA GENEROSA


FONTE DE ÔMEGA 3
É uma convicção muito comum, que contribui para determinar o que para
muita gente já se tornou um hábito diário: “todo dia, no desjejum ou como
lanche, consumir um punhado de amêndoas (ou nozes, ou avelãs, ou
pistache)”. E se perguntarmos o porquê dessa escolha, a resposta é
invariavelmente “porque fazem bem”. Mas “bem” em que sentido? Quase
ninguém sabe dizer; fazem bem e pronto.

Desde já esclarecemos que não há motivo algum para desencorajar esse


costume, contanto que nem as “castanhas e nozes”, nem as “sementes
oleaginosas”, como são corretamente de nidos os produtos em questão,
sejam exageradamente idealizadas como “superalimentos” hipersalutares e
capazes até (esse boato também circula, infelizmente) de substituir os
medicamentos em certas situações. Uma atitude desse tipo é duplamente
questionável, já que constitui um plano inclinado que leva facilmente a
escorregar para a adoração de outros produtos de preço alto e fascínio
exótico, que são empurrados (especialmente na internet) por um marketing
muito habilidoso, mas dos quais na verdade não temos nenhuma
necessidade.

Mas voltemos à categoria das “castanhas e nozes” e das “sementes


oleaginosas”, que inclui substancialmente nozes, amêndoas, amendoins,
avelãs, pinoli, castanha-de-caju e sementes de gergelim, de abóbora, de
girassol e de papoula. Quanto às castanhas em particular, ninguém duvida
de que se trata de um grupo de alimentos caracterizado por teores
nutricionais de boa qualidade – muitas proteínas vegetais de valor razoável
(de 14% a 22% do peso em média, até um máximo de 32% nos pinoli),
muita bra (de 4% a 13% do peso), algumas vitaminas (a E e algumas do
complexo B) e uma boa presença de minerais como potássio e magnésio (do
qual as amêndoas em especial são ricas), mas também zinco, selênio, ferro e
cálcio, ainda que a disponibilidade seja prejudicada pela presença do ácido
fítico, que limita sua absorção. Também é notável a quantidade de gorduras,
principalmente insaturadas e poli-insaturadas – vale dizer, as melhores do
ponto de vista dos efeitos sobre a saúde: de 50% do peso nos pinoli a 55%
nas amêndoas, e de 65% nas avelãs a cerca de 70% nas nozes, das quais é
conhecido certo efeito de diminuição dos níveis de colesterol no sangue.
Nestas últimas, os ácidos graxos poli-insaturados representam, inclusive,
73% do total de ácidos graxos presentes, uma indiscutível medalha de honra
ao mérito. Merece destaque, também, como nota indiscutivelmente positiva,
o elevado porcentual de ácido oleico (o ácido graxo monoinsaturado que
tantas virtudes confere ao azeite de oliva) encontrado nas amêndoas, nas
avelãs e no pistache.

Esse tipo favorável de gorduras parece justi car a recente reavaliação de um


uso ponderado das castanhas (cerca de 20 g a 30 g por dia) em vista de um
possível papel protetor contra doenças cardiovasculares e alguns tipos de
tumores – contanto, porém, que elas sejam usadas com juízo, tanto nas
doses quanto na frequência de consumo, considerado o elevado valor
calórico desses produtos: cerca de 600 kcal por 100 g para as amêndoas, os
pinoli e o pistache, e cerca de 650 kcal para as avelãs, quase 700 kcal para
as nozes. Não é por acaso que as novas diretrizes alimentares para os
italianos sugerem consumir castanhas uma ou duas vezes por semana, em
quantidades de cerca de 30 g,[53] eventualmente substituindo um igual
número de porções de frutas; ao passo que o Haute Autorité de Santé
[Conselho Superior da Saúde Pública francesa], em 2017, aconselhou um
consumo não superior a um punhado por dia, desde que sem sal e prestando
atenção aos alergênicos eventualmente presentes.

En m, são produtos de ótimo valor nutricional, cujo consumo sem dúvida


pode ser aconselhado a todos, seguindo-se as advertências mencionadas.
Mas o argumento deste “mito alimentar” era outro: a inabalável convicção
de que as castanhas e as nozes sejam tão ricas em ácidos graxos ômega 3 de
cadeia longa (os mais ativos no sentido da proteção, conhecidos como EPA
e DHA) que possam até substituir, nesse aspecto, o peixe e os produtos
marinhos. E nisso discordamos.

Antes de mais nada, lembremos por que é tão importante aumentar o


consumo desses ácidos graxos poli-insaturados em particular, e fazê-lo de
maneira contínua, já que parece que os ômega 3 de cadeia longa têm
capacidade limitada de serem armazenados no nosso organismo, portanto
necessitam ser consumidos sistematicamente na dieta. Em síntese, EPA e
DHA são capazes de proteger a saúde com particular e cácia sobretudo por
meio da redução dos fatores de risco cardiovascular, mas também por
outros meios, pois têm a capacidade de desencadear efeitos antiarrítmicos,
anti-in amatórios e antitrombóticos, efeitos de redução dos níveis de
triglicérides no sangue, além de possíveis efeitos antitumorais (sobretudo na
próstata e nas mamas) e outros favoráveis ao desenvolvimento do sistema
nervoso e ao funcionamento do sistema imunológico – para citar apenas os
principais aspectos positivos.

Infelizmente, na Itália, absorvemos muito pouco deles, mais ou menos 50


mg a 100 mg diários em média, enquanto a “absorção adequada” mínima é
estimada pelos LARN em 250 mg diários, e a ideal em 1.000 mg, chegando
a 4.000 mg para uma prevenção e caz. Portanto, deveríamos cuidar para
absorvê-los em maior quantidade e com maior frequência. Os mesmos
LARN especi cam que “a quantidade sugerida na prevenção primária é de
500 mg de DHA por dia e corresponde ao consumo de duas a três porções
de peixe por semana”. De fato, EPA e DHA são particularmente abundantes
nos organismos marinhos, desde os mais simples (como toplânctons e
algas) até as variadas espécies de peixes e mamíferos marinhos. Ora, já que
resultaria um pouquinho difícil consumir algas ou carne de leão-marinho
com regularidade (para não falar dos toplânctons...), só restam os produtos
marinhos em geral e os peixes em particular como fonte alimentar mais
lógica, agradável e disponível de EPA e DHA “pré-formados”: de duas a três
porções de pelo menos 120 g a 150 g cada, líquidos, do produto por
semana bastam para alcançar a absorção média diária recomendada de
ômega 3 de cadeia longa.

Nem é preciso dizer que nos produtos pesqueiros o conteúdo de ômega 3


de cadeia longa varia de acordo com a espécie e o conteúdo em gorduras,
além das condições climáticas (mais baixo nos peixes de águas mais
quentes) e do tipo de alimento disponível no ambiente de crescimento, mas
os níveis são sempre bons. Ainda de acordo com os dados dos LARN, o EPA
está presente nos peixes magros (truta e tenca) em quantidades que vão dos
20 mg aos 100 mg por 100 g líquidos do produto, e nos peixes mais
gordurosos, chega a 1.300-1.700 mg/100 g (enguia e sardinhas frescas). O
DHA, por sua vez, vai de um mínimo de 100 mg/100 g na merluza a um
máximo de 2.000 mg/100 g na enguia e no atum. Lembrando que as doses
diárias aconselhadas indicadas anteriormente referem-se à soma dos dois
ácidos graxos.

Nos outros alimentos – ou seja, naqueles diferentes dos “produtos


pesqueiros” –, os preciosos EPA e DHA, infelizmente, estão totalmente
ausentes ou aparecem em quantidades desprezíveis. E nas castanhas e nozes
de que falávamos? Essa classe de produtos é ou não é uma fonte apreciável
de ômega 3 de cadeia longa, como tanta gente (incluindo tantos médicos)
a rma com convicção? Infelizmente, a resposta deve ser negativa. As tabelas
nos dizem inexoravelmente que 100 g de amendoins, amêndoas, avelãs,
nozes e pistaches contêm praticamente zero miligramas tanto de EPA
quanto de DHA, contra as doses reduzidas presentes em alguns tipos de
carne (330 mg em média por 100 g de produto no frango, 150 mg por 100
g na carne bovina e nos embutidos).

Em teoria, poderia haver outro aspecto positivo: as castanhas e as nozes


(principalmente as nozes), assim como poucos outros produtos – óleo de
soja e sementes de linhaça por exemplo –, contêm boas quantidades de um
ácido graxo em particular, o ácido alfa-linolênico (ou ALA, também um
ômega 3, mas não de cadeia longa), que está presente na dieta em
quantidades limitadas e tem vários efeitos positivos sobre nossa saúde, sendo
também o ômega 3 “ancestral”, ou seja, o precursor dos ômega 3 de cadeia
longa, no sentido de que é adequado a ser convertido justamente em EPA e
DHA pelo organismo.

Talvez daí tenha nascido o equívoco. De fato, aparentemente, tudo parecia


poder funcionar bem: as castanhas (e o óleo de soja e as sementes de
linhaça) fornecem o precursor (o ácido alfa-linolênico), o organismo o
transforma nos ômega 3 de cadeia longa e o problema está resolvido.
Infelizmente, não é tão simples, já que existe um percalço que muitos
ignoram: esses ômega 3 de fontes vegetais não são iguais àqueles presentes
nos peixes justamente porque precisam ser convertidos em EPA e DHA, e o
mecanismo de conversão endógena disponível no nosso organismo trabalha
com uma e ciência totalmente inadequada à demanda. De fato, nos seres
humanos, a transformação do ácido alfa-linolênico em ômega 3 de cadeia
longa é muito limitada: resulta apenas em 0,3% a 8% (para o EPA) e 0% a
4% (para o DHA) nos homens, ao passo que é um pouco mais alta nas
mulheres, nas quais chega a 21% para o EPA e a 9% para o DHA. Mais uma
vez, segundo os LARN: “Esse limite metabólico muitas vezes é esquecido,
mas na realidade seriam necessárias absorções diárias extremamente
elevadas de ácido alfa-linolênico para atender às necessidades de EPA e
DHA, caso eles não fossem absorvidos diretamente com a alimentação”.

En m, vamos pôr tudo às claras e dar paz aos nossos corações. As castanhas
e as nozes são um ótimo alimento sob muitos pontos de vista, mas quando
se trata de assegurar as doses certas dos preciosos ácidos graxos “ômega 3
de cadeia longa”, elas não ajudam muito, e sobretudo não podem de forma
alguma ser consideradas uma alternativa válida para quem não come peixe e
outros produtos pesqueiros. A solução inteligente para essa nossa
incapacidade de formar quantidades su cientes de EPA e DHA realmente
não consiste em recorrer aos suplementos disponíveis na farmácia, mas
apenas em consumir com maior frequência os alimentos nos quais esses
derivados estão presentes já prontinhos, e em doses signi cativas. E esses
alimentos privilegiados são identi cáveis quase exclusivamente com os
peixes e outros organismos marinhos. Como medida extrema, o óleo de
algas marinhas também poderia dar uma ajuda, embora não seja tão fácil de
encontrar e de utilizar habitualmente. E os LARN ressaltam também que
nos últimos anos apareceram no mercado alimentos suplementados
(enriquecidos) com EPA e DHA (leite bovino e ovos, por exemplo), que
podem ajudar a se aproximar com maior facilidade dos níveis de consumo
recomendados.

Como mencionamos, no presente estado das coisas, na Itália, o consumo


médio de peixe é modesto, cerca de 90 g por semana. Só nos resta esperar
que mais informações tanto sobre o valor nutricional do peixe quanto sobre
esses aspectos em particular possam contribuir para melhorar a situação no
futuro.

AS FRUTAS FRESCAS CONTÊM TODAS AS


VITAMINAS
Não exatamente, embora muitas pessoas pensem assim. Trata-se de uma
generalização que superestima o teor vitamínico de um alimento como as
frutas frescas (embora ele seja ótimo). As únicas vitaminas das quais os
vários tipos de frutas carregam quantidades importantes e signi cativas são
substancialmente a vitamina C e a pró-vitamina A, ou seja, os carotenoides,
que depois, no nosso organismo, são transformados justamente em vitamina
A.

Para sermos exatos, é preciso dizer que a vitamina C é amplamente comum


em muitos alimentos de origem vegetal, mas particularmente nas frutas
cítricas, no kiwi, no pimentão, no morango, no melão, no tomate e nas
hortaliças de folhas verdes. Já a vitamina A está presente como tal em
poucos produtos de origem animal (especialmente no fígado, e também no
leite, nas gemas dos ovos e na manteiga) e como precursora (carotenoides,
dos quais o betacaroteno é o mais comum e com maior atividade pró-
vitamínica) em vários vegetais de cor amarela ou laranja (abóbora, cenoura,
melão, pêssego, damasco, etc.), no tomate e em algumas hortaliças de folhas
verdes (espinafre, brócolis, couve, etc.) – nestas últimas, sempre
encontramos a cloro la e outros pigmentos associados aos carotenos.

Concluindo, não é verdade que as frutas frescas contenham todas as


vitaminas e que cada uma possa ser encontrada nas frutas frescas, como
mantém a tradição popular. Mas deve car bem claro que esse
esclarecimento não diminui em nada a importância de um consumo
generoso e habitual das muitas variedades dessa categoria de produtos. Além
disso, subentende-se que, conforme foi demonstrado, se uma dieta baseada
em uma adequada e variada seleção de alimentos é perfeitamente apropriada
para assegurar um bom estado de nutrição vitamínica em condições
normais, isso acontece também graças à constante presença de boas
quantidades de frutas.
[49] A Sociedade Brasileira de Pediatria recomenda manter somente leite materno até os 6 meses.

(N. E.)

[50] No Brasil, existe a Tabela Brasileira de Composição de Alimentos desenvolvida pelo Núcleo de

Estudos e Pesquisas em Alimentação da Unicamp, com nanciamento do Ministério da Saúde e do

Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Outras universidades também apresentam

projetos relacionados à composição dos alimentos. (N. E.)

[51] Variedade híbrida entre a tangerina e a laranja doce. (N. E.)

[52] Também conhecida como laranja moro ou laranja vermelha, variedade que apresenta a coloração

avermelhada ou violácea da polpa e do suco. (N. E.)

[53] No Brasil, seguem-se as recomendações americanas de no máximo 30 g por dia. No Guia

alimentar para a população brasileira não é determinada uma quantidade. (N. E.)
AGRADECIMENTOS

Sou muito grato aos amigos Laura e Andrea, do CREA-NUT, pela


assistência e atualização documental e pelo apoio moral. Ao Fausto, por seu
precioso espírito crítico, e à Anna, por ter me aguentado nos meses de
preparação do texto. E também à Lia Di Trapani, da editora, pela sua in nita
paciência, e à Sabina pela inestimável colaboração técnica. E nalmente a
Amleto, Enrica, Eugenio, Gianni, Michelangelo e Tonino, colegas de trabalho
e amigos de uma vida inteira, pelos conselhos e apoio, na memória comum
do caríssimo Gianni Tomassi, verdadeiro ponto de referência para todos nós
no tocante ao equilíbrio, conhecimento cientí co e capacidade de
aprofundamento: a ele dedico idealmente este livro, com enorme afeto.
SOBRE
O AUTOR

MARCELLO TICCA é médico, livre-docente e especialista em ciência da


alimentação. É vice-presidente da Società Italiana di Scienza della
Alimentazione e sócio da Società Italiana di Nutrizione Umana. Por cerca de
quarenta anos desenvolveu atividades de pesquisa para o Istituto Nazionale
della Nutrizione, no qual dirigiu o departamento de documentação e
informações nutricionais. Participou do aprimoramento de várias edições e
revisões dos LARN e das diretrizes para a alimentação italiana sadia;
presidindo e coordenando os grupos multidisciplinares de especialistas que
realizaram a edição de 2003 e a revisão de 2017. Foi membro do Comitato
Nazionale per la Sicurezza Alimentare [Comitê Nacional para a Segurança
Alimentar], instituído pelo Ministério da Saúde italiano. É colaborador
médico-cientí co em diversos jornais, programas de televisão e de rádio na
Itália.
Administração Regional do Senac no Estado de São Paulo
Presidente do Conselho Regional: Abram Szajman
Diretor do Departamento Regional: Luiz Francisco de Assis Salgado
Superintendente Universitário e de Desenvolvimento: Luiz Carlos Dourado

Editora Senac São Paulo


Conselho Editorial:
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Administrativo: João Almeida Santos
Comercial: Marcos Telmo da Costa

Edição e Preparação de Texto: Gabriela Lopes Adami


Revisão Técnica: Gabrielle Carassini Costa
Coordenação de Revisão de Texto: Luiza Elena Luchini
Revisão de Texto: Karen Daikuzono
Projeto Gráfico Original e Editoração eletrônica: Antonio Carlos De Angelis
Capa: Thiago Planchart, sobre imagem de GettyImages
Produção de ePub: Josué de Oliveira, Ricardo Diana

Título original: Miraggi alimentari: 99 idee sbagliate su cosa e come mangiamo


© 2018, Gius. Laterza & Figli

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(Jeane Passos de Souza - CRB 8ª/6189)
Ticca, Marcello
Alimentação sem mentiras : 99 informações erradas sobre o
que e como comemos / Marcello Ticca; tradução de Michele A.
Vartuli. – São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2020.
Título original: Miraggi alimentari – 99 idee sbagliate su
cosa e come mangiamo
e-ISBN 978-85-396-2965-7 (ePub/2020)
ISBN 978-85-396-2964-0 (impresso/2019)
1. Mitos alimentares 2. Alimentação 3. Hábitos alimentares
4. Nutrição 5. Dieta I. Título II. Vartuli, Michele A.

19-1011t CDD-613.2
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1. Nutrição e dieta 613.2
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