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SEXUALIDADE
AULA 1
Prof. Victor Hugo Brandão Meireles
CONVERSA INICIAL
Foucault, para auxiliar no pensamento da Psicologia em seus campos de atuação e ajudar a lidar
Os objetivos desta aula são discutir, de forma sucinta, a história da sexualidade na sociedade
que é sexualidade.
Iremos falar um pouco sobre como constitui a sexualidade para Foucault. Para isso,
precisamos adentrar um pouco na história sobre a sexualidade na perspectiva desse mesmo autor.
Você já deve ter ouvido falar do filósofo, historiador e ativista Michel Foucault (1926-1984)
teoria psicanalista de Jacques Lacan. Todavia, para esta aula iremos focar apenas em Foucault.
Para Foucault (1984, p. 9), o termo sexualidade só surgiu no século XIX e tudo que vem antes
O próprio termo “sexualidade” surgiu tardiamente, no início do Século XIX. [...] O uso da palavra
jurídicas, pedagógicas e médicas; como também as mudanças no modo pelo qual os indivíduos
são levados a dar sentido e valor a sua conduta, seus deveres, prazeres, sentimentos, sensações
e sonhos.
Então, para Foucault, para pensar a sexualidade em seu aspecto histórico ocidental,
precisamos levar em consideração as instituições sociais que produzem saberes a respeito, como a
sobre a sexualidade, definindo-a pelas regras e os tabus. Nesse sentido, surgem as relações de
poder, que para Foucault (1984; 2017) são relações de dominação que regulam suas práticas sobre
corpos dos indivíduos. E o poder em Foucault é entendido como relações complexas, mas iremos
Temos as instituições falando sobre o que é e não é sexualidade e nesse processo, se instala o
poder, sobre o que pode fazer e o que não pode. Depois, o sujeito singular se questiona, se
confunde e se constrói por meio desses discursos. Para Foucault (1984), os indivíduos devem e
podem se reconhecer como pertencentes dessa sexualidade, que faz parte de seus corpos.
Até meados do século XVII, o sexo foi considerado um aspecto natural da vida humana, não
havia problemas em palavras que eram usadas para descrever momentos íntimos ou em falar
sobre eles. Corpos nus eram comuns e até para crianças não havia nada de escandaloso. Assim
como afirma Foucault (2017, p. 7), os “gestos diretos, discursos sem vergonha, transgressões
visíveis, anatomias mostradas e facilmente misturadas, crianças astutas vagando, sem incômodo
nem escândalo, entre os risos dos adultos: os corpos ‘pavoneavam’”. A expressão da sexualidade
Desde a época clássica até o início do século XVII o sexo fazia parte de um campo sagrado e
não profano (Nascimento, 2005), no qual as práticas sexuais tinham um lugar mais libertador.
Apesar disso, conforme as mudanças na sociedade ao longo dos séculos se caracterizam pela
influenciaram a postura que se tornou cada vez mais pessoal e menos comunal, mais interna que
reduzida na linguagem, pois era por essa via que o controle se tornava livre no discurso para
transformar coisas ditas em palavras presentes nas relações. Tentava-se impor um silêncio e uma
censura (Foucault, 2017). Assim, surgiram diversos discursos sobre o sexo que se multiplicaram no
próprio campo do exercício do poder: “incitação institucional a falar do sexo e a falar dele cada vez
mais; obstinação das instâncias do poder a ouvir falar e a fazê-lo falar ele próprio sob a forma da
Entretanto, no século XVII, a igreja católica via o sexo não mais mencionado sem ponderação,
mas suas especificidades, suas relações e efeitos eram resguardados ao privado. Tudo era dito,
mas sempre deixava de lado o desejo. Era vivida a cumplicidade do movimento do corpo e a
complacência do espírito (Foucault, 2017). Foucault está falando do pecado, aquilo que precisa ser
de repressão.
A igreja católica procurou produzir seus efeitos específicos sobre o desejo aplicando-o em
formato de discurso. Tais efeitos continham o domínio e o desinteresse sobre o sexo, mas também
a “[...] reconversão espiritual, de retorno a Deus [...]” (Foucault, 2017, p. 25). Então, a igreja como
uma instituição social falava sobre sexo e consequentemente produziria um discurso a respeito?
Por mais que possa parecer que se instalava uma censura sobre o sexo, o que aconteceu foi
ao contrário. Cada vez mais constituiu-se um sistema que produziu discursos sobre o sexo, mas
sempre mais suscetíveis em funcionar sobre os indivíduos (Foucault, 2017). Imagine um sistema de
mecanismos de poder que para seu funcionamento precisa dos discursos como parte principal
para regular o sexo: manter seu domínio sobre os corpos. Nesse domínio se tinha a igreja.
A partir disso, Foucault (2017) falava que nascia uma incitação política, econômica e de técnica
como análise para falar sobre esse tema por meio de pesquisas quantitativas e casuais que
classificou, numerou e especificou não pelo discurso moral, mas por um discurso racional. Para
Foucault (2017, p. 28), se instalou uma espécie de polícia do sexo: “[...] necessidade de regular o
sexo por meio de discursos úteis e públicos e não pelo rigor de uma proibição”.
Não era mais visto como proibição e o Estado também tinha como necessidade falar sobre o
sexo, sendo mais uma instituição social produzindo um saber a respeito ao mesmo tempo que
controlando. O sexo não era mais julgado e, sim, administrado. Uma das grandes novidades nas
técnicas de poder já no século XVIII foi o surgimento da população como problema econômico e
político. Os governos e o Estado sofreram com a expansão industrial de seus povos e o sexo se
o efeito do celibato ou das interdições, a incidência das práticas contraceptivas. (Foucault, 2017,
p. 29)
Surgiram análises de condutas sexuais, de suas determinações e seus feitos, nos limites entre
Uma forma que regulava nas organizações familiares pensava mais a maneira em que levavam
o sexo e isso chegou às crianças. Nos colégios do século XVIII falava-se sobre isso, mas não
explicitamente e aparecia como “o espaço da sala, a forma das mesas, o arranjo dos pátios de
recreio, as distribuições dos dormitórios (com ou sem separações, com um sem cortina), os
que Foucault (2017, p. 31) chamava de “discurso interno da instituição”. As instituições educativas
falavam de sexo, mas aquele que era apenas conveniente para a burguesia e o Estado.
Muito se começava a pensar e fazer sobre uma educação sexual com as crianças; era preciso
controlar o que as crianças deveriam saber sobre sexo. As instituições pedagógicas falavam sobre,
mas de uma forma em que tanto para as crianças quanto para os adolescentes os conteúdos eram
codificados. Falava-se sobre sexo, faziam crianças e adolescentes falarem sobre sexo, a família
falava sobre sexo, as instituições falavam sobre sexo e cada vez mais multiplicavam-se discursos
sobre o sexo. Criaram-se inúmeros dispositivos institucionais e estratégias discursivas sobre o foco
Estamos falando de uma tentativa de repressão, que é algo que mantém como uma
condenação ao desaparecimento de algo, pelo silêncio, uma afirmação da inexistência, de que não
existe nada do que possa ser falado. (Rodrigues; Nielsson, 2019; Foucault, 2017).
A igreja usava as confissões e o pecado para aprisionar um saber sobre o sexo pelo divino. Já
a literatura trazia o sexo mais detalhado, aquele que é unicamente biológico, e a medicina, em
conjunto com a psiquiatria e o direito, reforçava o biológico e as perversões. Eram instituições que
produziram saberes sobre o que era, o que podia fazer e sobre o que se podia falar.
Por isso a tentativa de uma política repressiva é uma hipótese para Foucault (2017), pois o
conjunto de características negativas relacionados ao poder, ora do Estado, ora do colégio, ora da
Igreja, dificultava a produção do saber sobre o sexo e a sexualidade, mas ao mesmo tempo
produziria mais saberes sobre. Tudo era mantido em segredo e só se falava daquilo que o Estado
permitisse; dessa forma “é chamada a atenção para o sexo, para as técnicas que são usadas pelo
poder e por quais meios de discurso a sexualidade pode regular o indivíduo” (Rodrigues; Nielsson,
2019, p. 4).
Até o momento vimos de forma sucinta como se instalava uma perspectiva repressiva sobre
sexualidade no século XIX. Isso ajudou na produção do saber científico criando uma scientia
sexualis.
No início do século XIX a tentativa de uma repressão sexual se tornava evidente com a era
vitoriana (1837-1901). Essa era foi o reinado da rainha Vitória no Reino Unido e ficou marcada pela
burguesa. A sexualidade era resguardada e levada para dentro de casa. Ninguém falava sobre,
apenas mencionava como uma forma funcional de reprodução (Foucault, 2017). Todavia, para
Foucault (2017) não era exatamente um silenciamento do sexo, sendo já iniciada uma repressão
O direito se instalava apenas para aqueles que se classificavam como casais, heterossexuais,
brancos, legítimos e procriadores. Estamos falando da formação de uma família tradicional. Para
Foucault (2017, p. 7-8) “impõe-se como modelo, faz reinar a norma, detém a verdade, guarda o
direito de falar, reservando-se o princípio do segredo. No espaço social, como no coração de cada
moradia, um único lugar de sexualidade reconhecida, mas utilitário e fecundo: o quarto dos pais”.
A moral vitoriana se instalou na sociedade dando o direito de que apenas um grupo social se
apropriasse dos aspectos da sexualidade, aquele que era tradicional, heterossexual, reprodutora e
privada. Como a razão poderia falar sobre isso? A filosofia evitava esse terreno; evitava a hipocrisia.
O que se podia falar sobre o sexo publicamente era apenas aquele que funcionava para o bem de
todos, por um padrão socialmente ótimo (Foucault, 2017). Estamos falando da heterossexualidade.
Para Nascimento (2005, p. 66), a repressão sexual em Foucault foi pensava meio das suas
próprias práticas, que eram difundidas pelas “[...] instituições que regulamentam essas práticas,
juntamente com todo o conjunto explicito de interdições e censuras”. É a partir disso que o sexo
passava a ser regulamentado como forma de saber pela medicina, psiquiatria, pedagogia e pelo
direito. Todas essas instituições se colocavam interessadas para falar sobre o sexo; não daquele
que fazia parte de um sujeito histórico e cultural, mas daquele privado e censurado.
Nesse período começavam a surgir técnicas de poder que “[...] regulamentam a população
como problema econômico e político na relação entre população, riqueza, mão de obra, força de
trabalho [...]” (Nascimento, 2005, p. 67). O sexo passava a ser uma questão de dispositivo,
controlado em nível político na sociedade; iniciava-se a censura e noção de tabu sobre sexo e
sexualidade.
Mesmo que o modelo de família que se instaura na sociedade vitoriana encorajava o silêncio,
(Rodrigues; Nielsson, 2019). Contudo, o marcador de classe é evidenciado pelo capital nesse
São desmoralizadas as sexualidades tidas como ilegítimas, sendo designadas apenas a lugares
que gerassem retorno de capital, mantendo em mente que, em uma época de Revolução
Industrial onde a mão de obra é vastamente explorada não deveriam ser gastas energias nos
Para Foucault (2017), eram marcantes quatro grandes conjuntos de estratégias desenvolvidas
para construir dispositivos específicos sobre saber e poder sobre o sexo. O primeiro é a
histerização do corpo da mulher que acontece em três processos que qualificam e desqualificam
seu próprio corpo: é vislumbrado como elemento repleto de sexualidade; é relacionado a
patologias e aos saberes médicos; é posto em comunicação com o corpo social e, dessa forma,
sobre ele, [...] no sentido de os pequenos serem passíveis de atividades sexuais, consideradas
indevidas e imorais, além de trazerem perigos físicos” (Oliveira, 2015, p. 94). Então, temos
profissionais inseridos nesse campo educando o sexo e a criança. O terceiro é a socialização das
condutas de procriação que ocorre pelo problema econômico, criando “[...] medidas sociais que
visam reduzir a fecundidade descontrolada de casais” (Olveira, 2015, p. 94). Desse modo ocorre a
responsabilização dos casais sobre o sexo que praticam. Por último, a psiquiatrização do prazer
perverso, que entende a impulsão sexual como biológica e psíquica, culminando em novos saberes
em que a psiquiatria produzirá para identificar comportamentos que atingem esse tipo de instinto,
“[...] é a produção de tecnologias para corrigir e normalizar as anomalias sexuais” (Oliveira, 2015, p.
94).
ascensão da burguesia vitoriana o sexo só poderia ser vivido para um modelo familiar econômico
voltado para procriação, com proibições e repressões, como se qualquer outra forma de expressão
de sexualidade fosse errada; havia tentativa de repressão sexual para não se falar sobre o sexo, o
que Foucault irá chamar de hipótese repressiva, mas que na verdade falava-se sobre o sexo
O controle tem como intenção duas faces, o prazer e o poder. Existiam outras formas de
expressão da sexualidade e o sujeito mais do que nunca era o exemplo de que o sexo já não era
mais controle somente pelo prazer. Agora o poder também precisaria entrar em cena como via de
controle dos corpos. Assim, surge a ciência como criadora de uma verdade sobre a sexualidade, o
A seguir, discutiremos a ciência sexual (que Foucault chamará de scientia sexualis) como
diversas. Nesse século, o discurso científico era aquele que se recusava a ver e ouvir, a recusa de se
Foucault considerou um marco histórico a ruptura com as tradições orientais ars eotica que
eram bastantes comuns em países como China, Japão, Índia e também no Império Romano, pois
tinham como base a multiplicação dos prazeres. Essa ruptura foi o que se instalou nas sociedades
ocidentais como scientia sexualis, que foi desenvolvida a partir do século XIX e teve como núcleo
singular obrigatório o ritual de confissão, como ocorreu nos séculos anteriores na intenção de
A sexualidade, a scientia sexualis era vista como um correlato de práticas discursivas e que
tinham como características fundamentais, segundo Foucault (2017), a defesa de uma verdade
absoluta sobre ela. Tinha como disputa um discurso produzido por meio da técnica de confissão
da igreja e um discurso produzido pelo saber científico, definindo-a como algo natural e
campo novo de significações para serem descobertas, no qual nesse momento a psicanálise teve
grande importância.
Estudiosos psicanalistas eram os únicos profissionais naquela época que estimulavam seus
pacientes a explorar mais seus segredos sexuais e afetivos, pois poderiam representar peça
importante para saúde a mental e emocional (Spargo, 2017). Foucault enxergava a vertente da
psicanálise como caminho possível para produzir um saber sobre a sexualidade em seu valor
cultural e não natural (Spargo, 2017). A psicanálise, para Tamsin Spargo (2017), não buscava
silenciar e/ou reprimir a sexualidade das pessoas, mas se introduzir como instituição produtora de
A scientia sexualis ocidental de Foucault buscava encontrar uma única verdade sobre a
2017). A confissão cristã era mantida pelo pecado, na qual o indivíduo confessava aos padres tudo
aquilo que envolvia o sexo no privado. Dessa forma, vimos a historicidade de pessoas que
guardavam desejos, emoções e pensamentos até conversarem com alguém, como na igreja em
confessionários, passando para práticas médicas, jurídicas, pedagógicas e familiares, até chegarem
contar pecados ao padre, descrever sintomas ao médico, submeter-se a cura pela fala: confessar
pecados, confessar doenças, confessar crimes, confessar a verdade. E a verdade era sexual.
Nesses cenários confessionais, quem fala produz uma narrativa sobre a própria sexualidade que
é interpretada por uma figura de autoridade. A verdade revelada nesse processo, claro não é
descoberta, mas produzida. Ela existe como um saber no interior de um discurso particular e
O sexo e a sexualidade não eram julgados e, sim, administrados. A igreja e outras instituições
tentativa de repressão sexual pela produção de uma ciência sexual. Pela perspectiva scientia
sexualis todas essas instituições buscavam falar sobre uma verdade a respeito da sexualidade
Depois que culminou em ciência sexual, o dispositivo da sexualidade apareceu para conter a
explosão de discursos sobre o sexo e a sexualidade que, por meio de estratégias de poder, criou
populações para atenderem especificamente a uma urgência história: “[...] a escola, o hospital, o
exército, a oficina, a prisão, a família, entre outros, são alguns desses dispositivos.” (Oliveira, 2015,
p. 91).
século XVIII como uma forma de obrigatoriedade dos indivíduos em se confessarem sobre o sexo.
O que se predominava era tudo aquilo relacionado ao sexo e à sexualidade como pecado. No
burguesia. Isso se associava à força de trabalho, na qual tendia-se a pensar o sexo controlado por
dispositivos que direcionavam o indivíduo a prender suas energias apenas ao trabalho e não aos
ao trabalho. Todavia, ela não estava fora desse dispositivo, mas que acontecia com outras formas
de controle sobre a sexualidade, como pela “[...] moralização dos pobres – para que se efetive a
organização da família e o controle judiciário e médico das perversões, que visa proteger a
saúde pública em controlar o sexo. Foram criados investimentos para que escola e psiquiatria
tornassem o casal responsável pelo sexo que praticavam, dentre outras medidas.
sociais sobre um momento histórico: a produção de saberes sobre sexo e sexualidade como
discursos de repressão. São estratégias que aparecem nas relações de força no trabalho e
sustentam diversos tipos de saber e por elas eram sustentados. O dispositivo nada mais era do que
um jogo de poder que sempre estava ligado ao saber que dele nasce (Nascimento, 2005).
A temática da sexualidade vem sendo bastante discutida nos últimos séculos e a Psicologia
tem sido uma das áreas do conhecimento humano e científico a trabalhar com esse tema. A
E o que é sexualidade e como esse termo pode contribuir para as práticas profissionais na
Psicologia? O termo sexualidade só surgiu no século XIX e apareceu colado com a explosão
discursiva sobre o sexo. Esse termo incorporou em um sujeito perpassado por regras e normas
sociais que dividiam o discurso entre diversas instituições sociais, considerando uma mudança que
passava a vivenciar uma nova forma de conduta sobre o que se fazia, o que se falava e o que se
Para Louro (1997), Foucault estudava em seu livro a sexualidade como invenção social,
entendida como uma forma em que se constituía na sociedade a partir dos múltiplos discursos a
respeito do sexo. Ainda que sejam discursos que regularizavam, normalizavam e instauram saberes
sobre a verdade (Louro, 1997). A sexualidade, para Louro (2008, p. 8), se constrói a partir de
regula e multiplica nas instâncias e instituições que ditam as novas normas (Louro, 2008).
mídia, igreja, ciência e das leis, dos movimentos sociais e dispositivos tecnológicos, para que
surjam muitas formas de experienciar seus prazeres, desejos, troca de afetos, amar e ser amado
(Louro, 2008). “O único modo de lidar com a contemporaneidade é, precisamente, não se recusar a
Em uma perspectiva da Psicologia e como contribuição para esse tema, a autora Kahhale
(2015) analisa o conceito de sexualidade pelas relações de gênero, pois amplia a noção de
dando espaço para que a sexualidade possa ser expressada por meio das condições sociais,
culturais e históricas como processo simbólico e histórico. Esse processo constituiu a identidade
do sujeito, considerando como ele vivencia tais sentidos simbólicos sobre suas experiências
(Kahhle, 2015).
A sexualidade é singular, histórica e social, perpassada pela cultura que caracteriza a vida dos
sujeitos nas mais variadas relações sociais e contextos em que estão inseridos. Não diz respeito só
a sexo, gênero, orientação sexual, relações sexuais, afetivas e amorosas, mas também como
expressamos em nossas relações sociais, nossos processos emocionais e simbólicos diante disso
que nos constituem. O beijo, o abraço, as carícias, até o amar, o gostar, o adorar e o sentir. Se tudo
isso constitui nossa sexualidade, de onde veio? O que nos dizem sobre? O que é permitido e o que
não é? O que e quem pode vivenciar no público e o que e quem só pode no privado?
Para Kahhle (2015), debater a sexualidade é também discutir valores, normas sociais e
sentido a ‘sexualidade de cada um’ implica tomá-la como uma construção histórica no âmbito das
relações sociais, relaciona às formas de vida e as necessidades que a humanidade encontrou e/ou
construiu” (Kahhle, 2015, p. 234).
NA PRÁTICA
Com base no que foi discutido nesta aula, vimos que as instituições sociais produzem um
discurso sobre a sexualidade e uma delas é a área da educação. Imagine que você, psicólogo
escolar de uma escola pública da sua cidade, precisa atender ao caso de um adolescente que foi
exposto por meio de rumores de que teria tido relações sexuais e o professor usou esse
adolescente como exemplo em sala de aula, de que aquilo na adolescência era pecado. Como
você poderia acolher esse adolescente e quais estratégias poderia desenvolver em conjunto com a
escola na produção de um novo saber sobre sexo e sexualidade, tanto para alunos quanto para
professores?
FINALIZANDO
produziram saberes sobre sexo e sexualidade ao longo dos séculos e como formas de regulação;
houve tentativas de repressão sexual sobre o que se falava e o que se vivia. Entretanto, aconteceu
ao contrário, ainda se falava a respeito, tornando apenas hipótese que havia censura. Com isso,
surgiu um tipo de ciência sexual, a scientia sexualis, uma forma de produzir verdade sobre o sexo e,
consequentemente, a sexualidade. Uma explosão de discursos surge criando o dispositivo da
sexualidade que historicamente foi formando técnicas e instrumentos para controlar os indivíduos.
Por fim, você consegue imaginar nos dias atuais como ainda se constroem saberes sobre a
sexualidade, sabendo que o discurso presente na sociedade é aquele que sempre detém o saber. E
na sociedade vivemos em relações em que existe o saber, existe o poder. Como afirma Foucault
(2017, p. 77), “a história da sexualidade – isto é, daquilo que funcionou no século XIX como
domínio de verdade específica – deve ser feita, antes de mais nada, do ponto de vista de uma
REFERÊNCIAS
FOUCAULT, M. História da sexualidade I: A vontade de saber. Tradução: Maria Thereza da
Costa Albuquerque e J. A. Guilhon Albuquerque. 4. ed., Rio de Janeiro/São Paulo: Paz e Terra, 2017.
FOUCAULT, M. História da sexualidade II: o uso dos prazeres. Tradução: Maria Thereza da
KAHHLE, E. M. P. Subsídios para reflexão sobre sexualidade na adolescência. In: BOCK, A. M. B.;
moldada pelo poder. In: VI Seminário Internacional de Direitos Humanos e Democracia, 6, 2018.
Tradução: Heci Regina Candiani; posfácio Richard Miskolci. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2017.