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III
DO USUFRUTO, USO E HABiTAÇÃO
CAPÍTULO 1
DISPOSIÇÕES GERAIS
ARTIGO 1.0
Conceito de usufruto
atendi, fruendi, salva rerum substantia — tal como o fizeram, entre outros, os
Códigos francês (art.° 578.0), o espanhol (art.° 467.0), o italiano de 1865
(art.° 477.0) e o nosso ~rojecto definitivo (art.’ 2.3.63.0), pondo-se mais expressi
vamente em destaque certos caracteres que lhe são próprios.
O Código espanhol, ao falar na conservação da forma e da substância da
coisa, acrescenta, no qüe cremos haver originalidade: «a no ser que ei titulo de
sa constitación o ia ley autoricen otra cosa». Parece terem-se visado os casos em
que, paralelamente ao que se passa com os fideicomissos de resíduo, se autorize
o usufrutuário a dispor dos bens, se tiver necessidades. Não nos parece vantajoso
admitir uma tal desfiguração da figura do usufruto.
~ já conveniente considerar expressamente o usufruto como um direito pleno,
absoluto, o que permitirá, por um lado, distinguir essa figura do simples arrenda
mento ou de outros vínculos obrigacionais que atribuem, igualmente, ao titular
o uso e a fruição da coisa, e, por outro lado (cfr. art.° 745~0, n.° 2.°, do Código
suíço), harmonizar o conceito com a possibilidade legal da alienação do direito
por acto inter vivos, o que não resulta claramente da redacção do art.° 2.197.°.
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Também nos parece aconselhável assinalar o carácter temporário do usufruto.
Na verdade, esse direito termina sempre com a morte dos titulares, se pessoas NOTA — O problema da constituição do usufruto, do uso e da habitação
físicas, ou ao fim de trinta anos, se constituído em benefício de pessoas jurídicas. por usucapião tem sido debatido entre nós e em países estrangeiros. Aceitamos
Não se mantém, na redacção proposta, a referência a coisas mobiliárias ou a opinião dominante, razoável a todos os títulos, tal como o fez o Código italiano
imobiliárias. Tem, é certo, esta referência, que não se encontra em geral nos de 1942 (art.° 978.0), o Código alemão (~ 1.033.0), o suíço (art.° 746.°, n.° 2.0)
cunstância de o usufruto poder incidir sobre coisas consumíveis, e, ainda, a de não o é se atendermos ao animus, pois este pode esclarecer o sentido e o significado
as leis admitirem em certos casos substituição do objecto (ver, por exemplo, daquela materialidade. Não há, portanto, motivo, para abrir uma excepção aos
o art.° 2.247.° do nosso Código) têm levado alguns autores a porem de parte princípios gerais sobre a aquisição das coisas por usucapião.
aquele requisito ou a substituírem-no por outros, expressos nas seguintes fórmulas: Não se faz qualquer referência ao usufruto constituído judicialmente. No nosso
«sem alteração do destino económico», ou «como um prudente proprietário». As alte direito actual só num caso — o dos art.°0 2.148.° e 2.150.° — é permitida essa
rações não trazem maior exactidão ao conceito, e a verdade é que as excepções que forma de constituição. Mas, além de excepcional esse caso, sempre se poderá
as leis consagram, não atingem a ideia mestra, desde que entendida em termos dizer que tal usufruto tem ainda por base uma Trata-se
hábeis, de que o usufrutuário não pode alterar o objecto sobre que incide o seu de tornar efectivo o legado de uma pensão ¶vel.
direito. Por isso mantivemos a fórmula.
A afirmação de que o. úsufrutuário não é o proprietário da coisa (a coisa
é alheia) já feita no texto vigente, traduz com precisão a concepção latina do
direito de usufruto como forma de servidão pessoal. Embora este problema interesse
sobretudo como problema de construção dogmática, a ideia de uma propriedade
limitada pela servidão, desde a constituição do usufruto, não deixa de representar
a síntese das mais variadas soluções legais, quer respeitantes à transmissão do
direito em vida do usufrutuário, quer respeitantes às causas e consequências da O usufruto pode ser constituído em favor de uma ou de mais
extinção do usufruto e fixação do momento em que os direitos do proprietário pessoas simultânea ou sucessivamente, contanto’ que existam ao
~e consideram entrados no seu património.
tempo em que se torna efectivo o direito do primeiro usufrutuário.
Hil
não se vê motivo para alterar a solução actual do nosso direito. Um usufruto pretação da vontade do disponente, e não há motivos para distinguir, sob este
sucessivo dura tanto tempo como o usufruto instituído directamente em benefício aspecto, o usufruto contratual do usufruto testamentário, ao contrário do que
do último titular. O que importa, pois, é não permitir, para não prolongar têm feito os Códigos estrangeiros e, especialmente, o Código brasileiro em dis
a sua duração, a nomeação de usufrutuários que não possam ser imediatamente posição expressa (art.° 740.0). Os casos são paralelos e merecem o mesmo
beneficiados, por não existirem à data em que se torna efectivo o direito do tratamento.
primeiro instituído.
Note.se, ainda, que o usufruto sucessivo não dura mais do que o usufruto
simultâneo, se se aceitar a tradição mileníria do direito de acrescer em relação ARTIGO 5.°
às quotas vagas e em relação às que forem vagando pela morte dos co-usufrutuários
(cfr. art.° 2.250.° do Código Civil).
Hesitamos quanto à possibilidade de constituição do usufruto em benefício
Duração do usufruto
de concepturos, nos termos do actual art.° l.777.°. Lôgicamente parecia preferível
deixar em vigor, no campo do usufruto testamentário, as regras sobre capacidade Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, o usufruto não
testamentária passiva. Mas as desvantagens acima apontadas, e ainda a conveniência pode exceder a vida do usufrutuário. Sendo constituído a favor de
de não manter por largo tempo situações condicionais, levou-nos a aceitar a solução
uma pessoa jurídica a sua duração máxima será de trinta anos.
do nosso Código (cfr. art.°0 2.199.° e 1.870.°—redacção de 1930).
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fixando-se um limite miximo de duração o de cem anos
— — para além do qual que incluímos no n.° 2.° deste art.° 6.°, o art.° 2.224.°, no caso especial de
o usufruto dos municipia e entidades semelhantes não podia subsistir (este alienação.
prazo de 100 anos mantém-se no art.° 741.° do Código brasileiro). O prazo de O art.° 2.207.° refere-se especificadamente ao empréstimo, ao arrendament~
30 anos tem sido acolhido em legislações modernas (Código italiano de 1942, ou aluguer e à alienação. Esta enumeração exemplificativa pode ser substituída
art.° 979.0, Código espanhol, art.° 515.0). A fixação dum limite de tempo tem por uma designação genérica. O art.° 980.’ do Código italiano fala em cessão do
a sua justificação na impossibilidade de se admitir um usufruto perpétuo, o que usufruto. Não nos parece feliz o nome, desde que o usufruto não é um direito
seria a negação do próprio direito de propriedade e da finalidade económica do de crédito, mas um direito real. Por outro lado, é possível e conveniente, com
instituto. Todavia, o Código alemão (~ 1.061.0) não estabelece qualquer limite, uma fórmula mais genérica, abranger todos os actos de atribuição do usufruto
reconhecendo a existência do usufruto enquanto durar a entidade beneficiária a terceiros, embora não constituam, em rigor, uma cessão do direito, como o arrenda
(igualmente o Código austríaco, ~ 529.0). mento, o empréstimo, etc., ou mesmo outros negócios atípicos e inominados, fora de
O art.° 2.244.° refere-se aos estabelecimentos, corporações ou sociedades. qualquer possível qualificação em consequência da natureza temporária do
Estas três expressões — aliás de sentido equívoco — podem englobar-se numa usufruto.
só pessoas jurídicas. Assim se exprime o art.° 979.0 do Código italiano de 1942,
— Mais simplesmer~te, pois, mas mais rigorosamente, segundo pensamos, limita
com o especial objectivo de abranger todas as entidades colectivas, públicas ou mo-nos a falar no trespasse temporário ou definitivo do direito a terceiro.
particulares. Tem-se levantado, porém, em Itália, um problema quanto ao usufruto Não é da tradição romanista esta transferência. A ela se opunham não só
constituído em benefício de sociedades a que a lei não atribui personalidade a origem histórica do instituto como a sua finalidade económica e o seu carácter
jurídica, ou de associações não reconhecidas. Para uns, desde que não há personali pessoal (função alimentar). Mas já na época clássica e depois nos códigos
dade, só pode considerar-se constituído um usufruto simultâneo em benefício de modernos se admitiram derrogações, a princípio apenas quanto ao exercício do
todos os sócios. Para outros, deve aplicar-se por analogia a limitação dos trinta direito (cfr. art.° 717.° do Código brasileiro, § 1.059.° do Código alemão,
anos. Cremos que só a primeira solução é làgicamente defensável. Não reconhecer e art.° 758.° do Código suíço) e posteriormente quanto ao próprio direito real
a lei personalidade e, simukâneamente, admitir a constituição ao usufruto em de gozo. O nosso Código foi, ao contrário do Código italiano de 1865 (art.° 492.0),
benefício do ente colectivo, é supor uma clara contradição de princípios. Isto nos bem explícito a este respeito, como o Código espanhol (art.° 480.0) e o Código
leva à aceitação do texto nos termos em que se encontra redigido. italiano de 1942 (art.° 980.0). Não há razão fundada para se retroceder na
orientação.
A possibilidade de se estabelecerem no título constitutivo do usufruW limi
tações ao exercício daquele direito, já se prevê no art.° 2.201.° do Código actual.
ARTIGO 6.° Fica agora também referido o caso de as limitações resultarem da lei. Num caso,
pelo menos, nos parece aconselhável a solução — a do usufruto legal dos pais —
Trespasse do usufruto a terceiro tal como se prescreve no art.° 326.’ do Código italiano. ~ matéria a regular no
lugar próprio.
O usufrutuário pode trespassar a outrem o seu direito,
1. No art.° 980.° deste Código impõe-se a notificação da cessão ao proprietário
da raiz, sob pena de o cedente ficar solidàriamente obrigado com o cessionário
temporária ou definitivamente, ou onerá-lo, salvas as restrições
em relação àquele. Não vemos o alcance prático desta disposição. Não existem
impostas pelo título constitutivo ou pela lei. prôpriamente obrigações do usufrutuário em relação ao proprietário, susceptíveis
2. O usufrutuário responde pelos danos que as coisas pade de um regime de solidariedade, que não estejam previstas no n.° 2.’ do artigo
cerem por culpa da pessoa que o substituir. em projecto, inspirado no art.° 2.224.° do nosso Código (cfr. art.° 498.’ do
Código espanhol). E por essas deve sempre responder o usufrutuário, haja
NOTA — A atribuição a terceiro dos direitos do usufrutuário, evidentemente ou não notificação da transferência. Afirmam os autores italianos quê a notifica
que só por acto entre vivos, visto que pela morte do titular os direitos caducam, ção tem por objectivo pôr o proprietário em condições de vigiar, se quiser,
é facultada no art.° 2.207.°, e a ela se refere também, para estabelecer a doutrina o exercício dos direitos do usufrutuário. Não nos parece isso necessário. A vigilância
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tem carácter objectivo. Não importa que os actos de uso e fruição da coisa sejam CAPÍTULO II
praticados pessoalmente pelo usufrutuário, por serviçais ou mandatários, ou por
terceiro a quem tenham sido transmitidos os respectivos poderes. O que importa
é definir a responsabilidade do cedente nos termos em que o fizemos, o que, DIREITOS DO USUFRUTUÁRIO
entre outros, tem o efeito necessário de não permitir o levantamento da caução
prestada. ARTIGO 8.°
cem atribuir uma configuração mais rígida à posição do usufrutuário. Não e que deu lugar ao nome do instituto, sem curarmos do problema de saber
estamos convencidos da grande relevância prática do princípio que consigna se conceitualmente é de admitir o fructus sina uszi. Pràticamente, desde que’ se
a nossa lei. Ë em geral aceite pelas partes o usufruto tal como o regula o legislador admitem restrições aos poderes do usufrutuário ~ 7.0), há vant~e~ em fazer
em normas havidas como supletivas. Mas isso não quer dizer que se deva eliminar a destrinça desses poderes, indo, ao encont~Ó de pás~íy s solu~É contratuais
a doutrina do art.° 2.201.°. Ela pode satisfazer em muitos casos interesses do que se aproximem do simples direito de uso oü de hab~aj4~Q, sç~/~dentificarem
comércio jurídico. E, embora seja muito difícil fixar dogmàticamente os li2nites com eles. ~%-
do instituto em face dum preceito como este, e seja, por outro lado, de utilidade Não parece ja necessario fazer referencia neste~~~’ ~s tres especies de
social muito discutível a admissibilidade de certas figuras atípicas, a verdade é que frutos — naturais, industriais e civis. A f.ruiça~ i~-~direito inerente ao direito
a doutrina não tem criado dificuldades de ordem prática. de propriedade. Ë, pois, no capítulo da p~~aa~1e que deve ser definido esse
O Código alemão, mais modestamente, estabelece (~ 1 .030.°) que o usufruto direito, e enumeradas as várias faculdades em que se desdobra, e não aqui.
pode ser limitado por exclusão de certos produtos úteis, O Código francês A concepção do bom pai de família, como forma de limitar os poderes
(art.° 628.0) formula princípio idêntico ao da nossa lei, mas sàmente em do usufrutuário, muito usada já pelos nossos praxistas, e que se contém nos
relação ao uso e habitação. Não obstante, os autores têm-se inclinado em França Códigos espanhol (art.° 497.0) e italiano (art.° 1.001.0), como a concepção do
para a sua aplicação ao usufruto. Foi na discussão do Código italiano de 1942 proprietário prudente do nosso art.° 2.223.°, e do bom administrador do Código
que ostensivamente se resolveu pôr de lado a solução daquele código, para não suíço (art.° 755.°), ou do boni viri arbitratu do direito romano, é reconhecida-
se admitirem, afirmou-se, figuras anómalas de pouca utilidade económica. mente vaga e imprecisa. Tem, porém, o mérito de permitir aos tribunais a resolu
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ção criteriosa de um sem número de casos impossíveis de prever numa fórmula sobretudo, a finalidade que a coisa tinha no momento da constituição do usufruto,
abstracta. único meio seguro de garantir ao proprietário da raiz a sua restituição no estado
Abandonamos a expressão proprietário prudente do at~t.° 2.223.°, que tem, em que se encontrava.
evidentemente, o mesmo sentido de bom pai de família, para não darmos assento Em vários Códigos estrangeiros aparece consignado, ao lado do direito
à tese de que o direito de usufruto é um direito de propriedade, ou mesmo de uso e de fruição ou do direito de gozo, o direito de posse (cfr. art.° 718.°
um direito real quando incide sobre direitos de crédito. do Código brasileiro, art.° 755.° do Código suíço, § 1 .036.° do Código alemão
Durante a discussão do Código italiano vigente, foi proposta, sem êxito, e art.° 982.° do Código italiano de 1942).
a supressão desta fórmula. Foi considerada, por um lado, redundante, por estarem Na atribuição de poderes de uso e fruição está já naturalmente implícito
já limitados os poderes do usufrutuário pelo respeito devido ao destino econó o direito de possuir ou reter a coisa, sem o qual a figura de usufruto apareceria
mico da coisa, e, por outro lado, contraditória, dada a equiparação desses poderes inteiramente desvirtuada. Nunca por isso entre nós se duvidou desta solução,
aos poderes do proprietário. e o mesmo acontece na França e acontecia na Itália, na vigência do Código
de 1865, não obstante a falta de preceitos expressos.
Nenhuma das razões procede. Embora se respeite o destino económico da
Mas haverá vantagem em consignar expressamente o direito de posse? Não
coisa, ela pode ser usada, fruída ou administrada em termos impróprios dum
conduzirá a atribuição do direito de posse ao usufrutuário à possível suposição
bom pai de família ou dum proprietário prudente. Por outro lado, não obstante
de que se pretende consagrar legislativamente mais um caso de posse jurídica
a tendência para encarar o direito de propriedade como função social, hão-de
ou civil, ou seja de posse formal independentemente dos seus elementos constituti
admitir-se sempre, dentro da legalidade, proprietários imprudentes, ou maus
vos — corpus e animas (cfr. art.os 953,0 e 2.O11.° do nosso Código)? Não terá
pais de família. São os que deixam deteriorar as coisas por uso excessivo e imode
rado, os que não usam dos meios convenientes de conservação, os que não utilizam a atribuição daquele direito apenas interesse naquelas legislações que não admitem
a posse de direitos?
os bons processos técnicos de cultura das terras, os que não substituem as árvores
Depois de muita hesitação concluímos pela conveniência de reconhecer expressa-
mortas, etc., etc.. A equiparação dos poderes do usufrutuário aos do proprietário,
mente o direito às acções possessórias.
sem nenhum limite, tal como o fez o Código francês (art.° 578.0), é, pois,
Em primeiro lugar, é preciso não esquecer a possível influência das fontes
inconveniente, O proprietário pode não ser prudente. O usufrutuário tem de
romanistas, que, na época clássica, não consideravam o usufrutuário senão como
o ser, para não se afectarem os direitos do titular da raiz.
mero detentor — o usufrutuário detinha a coisa em nome do dominas — e que,
O respeito pelo destino económico da coisa — outro dos limites formulados
na época post-clássica e justinianeia, distinguiam a posse da coisa da posse do
neste artigo— não representa uma simples confirmação ou interpretação da ideia
usufruto, do que nasceu a categoria do quafi possessio usafructus.
romanista que deixamos expressa no art.° 1.0 de que o usufrutuário deve respeitar
Em segundo lugar, admitindo-se mesmo a posse do usufruto, o que está
a forma e a substância da coisa. Os dois princípios podem coincidir, é certo.
implícito da própria possibilidade da aquisição do usufruto por prescrição, não
Assim, quem usufrui uma mobília não pode utilizá-la como fonte de energia
resulta daí necessàriamente que em relação à coisa possa usar-se dos meios
lançando-a a uma caldeira. Não só se destrói a substância da coisa como se
possessórios. Pode admitir-se perfeitamente, como se admite na direito romano,
desrespeita a sua finalidade económica. Quem usufrui, porém, uma casa de
posse em nome alheio, em nome do dominas, ou a figura da quasi possessio.
habitação não deve poder transformá-la num estábulo para animais, embora não
altere a sua forma e substância. Igualmente o usufrutuário não deve poder
transformar num jardim, ou num parque de recreio, uma horta, um pomar ou ARTIGO 9°
um campo de jogos. Intervém aqui, apenas, o destino económico da coisa como
limite aos poderes de uso e fruição. Percepção dos frutos
Será por vezes muito difícil saber se há, rigorosamente, uma inovação
proibida ou uma benfeitoria. Mas não pode a lei entrar no campo casuístico, 1.Os frutos naturais percebidos ao tempo em que o usufruto
e acontecerá mesmo que casos aparentemente iguais devam ter soluções diferentes,
começa, pertencem ao proprietário; os percebidos ao tempo da
em atenção ao relevo ou importância das inovações. Ë matéria que deverá deixar-se,
igualmente, ao bom senso dos tribunais que deverão ter em linha de conta, extinção do usufruto, pertencem ao usufrutuário.
44 45
que a repartição dos frutos relativos aos anos agrícolas em que começa e em
Os frutos civis pertencem ao usufrutuário em proporção
2.
que se extingue o usufruto, cria uma situação permanente de incerteza, e, em
do tempo que dura o usufruto. consequência disso, de dúvidas e de estados aleatórios, que o novo sistema não
resolve nem afasta. Qual a natureza dos direitos do proprietário e do usufrutuário
em relação aos frutos que não chegaram a colher-se? Direito real? Direito de
NOTA— Se, quanto à partilha dos frutos civis, a generalidade das legis
crédito? Qual a posição daqueles titulares no caso em que duas ou mais colheitas,
lações aceitam a solução da partilha pro rata temporis (faz excepção o Código
iguais ou diferentes, se sucedem dentro do mesmo ano agrícola? Quando se
Civil brasileiro que manda atender no seu art.° 723.° à data do vencimento),
deverá começar a contar o período frutífero, se a produção não tem lugar em
quanto à partilha dos frutos naturais (ou também dos industriais nos países que
épocas determinadas? E em relação à produção pecuária, como se contam esses
aceitam a distinção) têm sido formuladas soluções diversas.
períodos? Em relação a terceiros como resolver as dificuldades que nascem de
No direito romano a aquisição dos frutos naturais verificava-se no momento
não poder saber-se, em muitos casos, nem mesmo no momento da colheita, se
da /~‘erceptio. Tratava-se, pois, de uma aquisição jure corporis e não jure seminis,
todos os frutos pertencem ao usufrutuário?
ao contrário da solução germânica, fundada no princípio de que quem semeia
A experiência italiana parece não ter sido feliz. Substituiu-se um sistema
colhe (Wer siiht. der mãht). A tradição latina foi seguida por quase todos os
de resultados certos e indiscutíveis por um sistema imperfeito e, afinal, igualmente
códigos modernos. Adoptaram-na o Código de Napoleão (art.° 585 .°)~ o Código
aleatório. Deve considerar-se que a natureza aleatória dos direitos é inevitável
português (art.0s 2.203.° e 2.204.0), o Código italiano de 1865, o Código espanhol
em muitos casos por necessidade da certeza do direito em geral. Não pode, por
(art.° 472.0), o Código alemão (~ 953.°), o Código suíço (art.° 756.0) e o Código
exemplo, a vida de umas horas, ou uma morte prematura, trazer alterações
brasileiro (art.° 721.0). Todos se referem à separação dos frutos, ou à situação
profundas à disciplina sucessória? E o próprio usufruto vitalício não pode durar
de pendência, para fixarem o momento da sua aquisição pelo usufrutuário ou
mais de um século ou apenas uma hora?
pelo proprietário.
Por tudo nos parece que não deve o futuro Código desviar-se do sistema
Recentemente, o Código italiano de 1942 desviou-se desta solução, aplicando
tradicional, e que é o sistema geralmente consagrado, como acima mostramos.
aos frutos naturais a regra da divisão pro rata temporis dos frutos civis
Neste artigo demos à expressão frutos naturais um significado lato, que
(art.° 984.0).
não é o corrente e legal entre nós, por influência do Código Civil francês.
Impressionou-se o legislador italiano com certos inconvenientes e injustiças
~ que a distinção entre frutos naturais e industriais não tem base científica.
do sistema tradicional, especialmente naqueles casos em que os períodos frutí
Não há normalmente frutos exclusivamente naturais, porque a natureza precisa
feros são muito longos. Vejamos, para exemplo, o que se passa com a cortiça.
de ser orientada pelo homem para produzir; não há, por outro lado, frutos
Pode acontecer que um usufrutuário de um ano ou de meses perceba os frutos
exclusivamente industriais, porque não pode prescindir-se nunca da acção da
de 9 anos, e pode acontecer que um usufrutuário de 8 anos fique sem quaisquer natureza. Isto nos levou a pôr de lado as expressões frutos pendentes e frutos
frutos. Basta, no primeiro caso, que coincida a colheita com a época do usufruto;
ultimados, só compatíveis, em rigor, com os frutos agrários ou com os frutos
basta, no segundo, que pouco tempo antes do seu início toda a cortiça tenha fabris, para adoptarmos a designação latina que nos parece perfeitamente rigorosa
sido colhida. Um dia a mais ou a menos de duração do usufruto, pode, assim, ter,
e aplicável em todos os casos — frutos percebidos.
como consequência, a atribuição ao usufrutuário ou ao proprietário dos rendi
mentos de anos. Também se podem verificar situações semelhantes nos usufrutos
de matas, pinheirais ou árvores de corte periódico, e em muitos outros casos. ARTIGO 10.0
Ë, pois, mais conforme à razão, dizem alguns juristas, a nova solução, e melhor
sob o ponto de vista económico, pois que fomenta o zelo pela produtividade das Indemnização ao usufrutuário
terras, dada a certeza de se colherem sempre os frutos correspondentes à duração
da propriedade e do usufruto. O usufrutuário, ao começar o usufruto, não é obrigado
1.
Não obstante estes exemplos e estas considerações, a experiência itaãiana
a abonar ao proprietário despesa alguma feita; mas o proprietário
tem revelado sérios inconvenientes de ordem prática do novo sistema, e também
dificuldades igualmente sérias de resolução de alguns problemas de ordem jurídica.
é obrigado a abonar, no fim do usufruto, as despesas de cultura,
46 47
sementes, matérias-primas e, de uma maneira geral, todas as des ARTIGO 11.0
pesas de produção feitas pelo usufrutuário.
2. As disposições do número anterior não prejudicam os Frutos colhidos prematuramente
direitos de terceiro’ adquiridos ao começar ou ao terminar o usu
fruto.
O usufrutuário responde pelos frutos, que, por dolo, colher
NOTA — O actual sistema português, consagrado nos art.Os 2.203.°, § 1.0, prematuramente, se vier a extinguir-se o usufruto antes da época
e 2.204.° do Código Civil, e adoptado em Espanha (art.° 472.0), tem sido criti normal da colheita.
cado por criar uma situação de privilégio em relação a um dos titulares. Enquanto
que o usufrutuário não é obrigado a qualquer indemnização pelas despesas de
NOTA — Corresponde esta disposição à do art.° 2.25 3•0 do Código Civil.
produção feitas pelo proprietário, já este deve indemnizar aquele, findo que
Eliminou-se a sua segunda parte por conter doutrina em manifesto desacordo com
seja o usufruto. O sistema da reciprocidade é adoptado em regra pelas legis
os princípios gerais sobre aquisição de frutos.
lações, embora em dois sentidos diferentes. Na Suíça (art.° 756.°, n.° 2.°)
Embora a aplicação deste aftigo respeite ao momento da extinção do usufruto,
ambos têm direito à indemnização. Na França (art.° 585.0) e no Brasil (art.° 721.°)
pareceu-nos conveniente, dada a sua directa subordinação às regras dos artigos
nenhum deles goza desse direito (acontecia o mesmo em Itália antes de 1942).
que antecedem, colocá-lo neste capítulo dos direitos do usufrutuário.
Consagraram estes últimos códigos a solução então mais generalizada, embora
não fosse a solução latina, que prevaleceu na Suíça. Actualmente em Itália
(art.° 984.0), as despesas de produção e de recolha ficam a cargo do proprietário
e do usufrutuário em proporção dos seus direitos aos frutos.
Atribui-se à influência de Pothier a doutrina do nosso Código e do Código
ARTIGO 12.°
espanhol. Este jurisconsulto teria baseado a irresponsabilidade do usufrutuário na
presunção de que o instituidor (doador, testador ou vendedor) teria pretendirlo
entregar os bens no estado em que se encontravam, ao passo que a irresponsabilidade Alienação dos frutos antes da colheita
do proprietário perante o usufrutuário ou seus herdeiros importaria um verdadeiro
locupletamento à custa alheia.
Embora discutíveis, como todas as soluções que se fundam em presumidas Se o usufrutuário tiver alienado os frutos antes da colheita
vontades, não vemos razões sérias para nos desviarmos da doutrina do nosso
e se extinguir o usufruto antes que sejam colhidos, subsistirá
Código. Por que se há-de impor a reciprocidade, se estamos a definir os poderes
do usufrutuário, e estes podem, sem quaisquer peias, ser delimitados com maior
a venda, mas o preço pertencerá ao proprietário, deduzidas as des
ou menor amplitude? Acresce que, em relação ao termo do usufruto, e tratando-se pesas de produção, nos termos do n.° 1.0 do ad.° 1O.°; e, se a colheita
de um usufruto a prazo, seria econàmicamente inconveniente a solução do direito se achar em parte feita e em parte por fazer, será o preço dividido
francês e brasileiro, porque conduziria fatalmente à inércia do usufrutuário no entre o proprietário e o usufrutuário ou seus herdeiros, em pro
último ano de produção. Este não se sujeitaria, certamente, a despesas, com porção da parte colhida e da que falta colher.
a certeza de que não colheria quaisquer frutos nem gozaria do direito a uma
indemnização. Por outro lado, consideramos bem fundadas as razões de Pothier
quanto à constituição do usufruto. Quer se trate de uma fonte gratuita ou onerosa, NOTA — Corresponde ao art.° 2.252.° do Código Civil. Alteramo-lo apenas
é de presumir na generalidade dos casos a intenção de entregar a coisa no estado na parte em que se refere à morte do usufrutuário, por ser evidente que a dis
em que se encontrava, sem outra compensação, na segunda hipótese (constituição posição deve aplicar-se em qualquer caso de extinção do usufruto.
onerosa), que não seja o preço recebido. Quanto à colocação deste artigo ver a nota ao artigo anterior..
48 49
4
ARTIGO 13.° da propriedade. Isto quer dizer que o usufruto abrange as coisas acessórias, se
houver acordo, e que, na dúvida, se presume esse acordo.
O primeiro caso não precisa de ser previsto. Claro que os limites objectivos
Acessões e direitos inerentes à coisa usufruz’da do usufruto serão sempre fixados por acordo ou por vontade do disponente se
se trata de um legado. Quanto à presunção legal, é muito duvidoso que ela deva
O usufrutuário tem direito a gozar das coisas acrescidas, e, ge aceitar-se, por não corresponder certamente, em muitos casos, a uma presunção
ralmente, de todos os direitos inerentes à coisa usufruída. de facto. Cremos que deve deixar-se o problema sujeito às regras gerais sobre coisas
acessórias, a versar noutro título do Código, deixando aqui apenas a regra formu
NOTA — Corresponde ao art.° 2.206.° do Código Civil, cuja redacção, muito lada no texto de que, geralmente, o usufrutuário goza de todos os direitos
semelhante à do art.° 479.° do Código espanhol, nos parece superior à do inerentes à coisa usufruida.
art.° 983.° do Código italiano de 1942.
Claro que este artigo está relacionado com os princípios que vierem a esta
belecer-se sobre acessões. Mas, seja qual for o âmbito deste instituto, uma coisa ARTIGO 14.°
fica sendo certa: a que, pertencendo as acessões ao proprietário, o seu gozo pertence
ao usufrutuário enquanto durar o usufruto, sem prejuízo dos regimes especiais
que para alguns casos se estabelecem adiante. Benfeitorias úteis e voluptuárias
Parece que no direito romano esta regra não tinha a amplitude que lhe dão
as legislações modernas. Apontavam-se as excepções, como a de surgir uma ilha. 1. O usufrutuário pode fazer na coisa usufruída as benfeitorias
num rio, cujo gozo deveria desde logo ser atribuído ao proprietário, dada a auto
úteis e voluptuárias, que bem lhe parecerem, contanto que não
nomia material da coisa acrescida. Talvez por influência do direito romano, se
tenha limitado o Código francês a facultar o gozo dos aluviões. Dificilmente, altere a forma ou a substância da coisa, mas não terá por isso
porém, se poderão distinguir pràticamente esses casos de completa autonomia, e nem direito a indemnização alguma.
làgicamente se compreende, desde que é através da acessão, e, portanto, da coisa 2. O usufrutuário poderá, todavia, levantar as ditas benfeito
sujeita ao usufruto, que o direito se expande, que fiquem afastados em qualquer rias, se o fizer sem detrimento da coisa, ou compensá-las com dete
caso os poderes do usufrutuário. riorações.
Não nos referimos especialmente ao gozo das servidões, por manifesta des
necessidade. Não só são direitos inerentes à coisa usufruída, como não seria
possível outra solução, dada a sua inseparabilidade dos prédios a que activamente NOTA — Limitamo-nos a reproduzir a doutrina dos art.°8 2.217.° e 2.220.0
pertencem. do Código Civil.
Discutível é o problema de saber quais os meios de que o usufrutuário pode A solução do nosso direito não é admitida em todas as legislações. Ela
servir-se para fazer valer o seu direito sobre as servidões, O nosso Código resolve corresponde, porém, pelo que respeita à não concessão do direito a uma indemniza
o problema permitindo no art.° 2.219.° ao usufrutuário usar de todos os meios ção pelas benfeitorias áteis ou voluptuárias, à solução tradicional nos países
que competem ao proprietário para ser mantido no usufruto, e essa solução será latinos. Assim se preceitua no Código francês (art.° 599.°), no Código italiano
adiante proposta. de 1865 (art.° 495.0) e no Código espanhol, que quase se limitou a traduzir
Também no art.° 35,0 do nosso anteprojecto sobre servidões resolvemos aqueles dois preceitos do nosso Código (art.0s 487.° e 488.0).
outra questão discutida, e que consiste em saber se o usufrutuário pode constituir Já nos Códigos alemão (~ 1.049.0) e suíço (art.° 753.°) se estabelece dou
novas servidões activas. Não obstante o carácter temporário do seu direito,. trina diferente. Qualquer deles atribui aó usufrutuário o direito a uma indemnização
pronunciamo-nos pela afirmativa. calculada segundo as regras da gestão de neg&ios sem mandato. E o novo
No Código alemão (~ 1.031.0) preceitua-se que o usufruto de um prédio Código italiano, seguindo de pérto esta orientação, confere ao usufrutuário o mesmo
abrange as coisas acessórias, nos termos estabelecidos em matéria de aquisição direito, fazendo corresponder o montante da indemnização, ou às despesas feitrs
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ou ao aumento de valor, conforme o maior benefício para o proprietário (nossa não tenha direito a indemnizações não seria justo que pagasse deteriorações quando
solução em matéria de posse de boa fé — art.° 499.°, § 4.°). compensáveis. Pode ser até da essência do melhoramento a perda daquilo que
- Funda-se a nova solução do direito italIano, por um lado, numa razão de existia anteriormente e que se substitui por alguma coisa de novo.
justiça, e, por outro lado, na necessidade de resolver questões várias que em
França e na Itália se suscitavam. A razão de justiça é esta: Desde que o valor
da coisa é aumentado, o proprietário não deve poder locupletar-se à custa do
usufrutuário. As di~vidas a que a velha doutrina dava lugar, incidiam sobretudo ARTIGO 15.°
sobre a determinação rigorosa dos campos de aplicação das regras relativas à posse
de boa fé e ao usufruto, sob este aspecto profundamente diferentes, por se
consignar naquelas o direito à indemnização quanto às benfeitorias úteis. Enten Usufruto de coisas deterioráveis
diam alguns autores, por exemplo, que eram os princípios da posse que deviam
aplicar-se às construções novas. Outros distinguiam entre melhoramentos e acessões,
aplicando só aos primeiros a disciplina do usufruto. 1. Se o usufruto abranger coisas, que não sendo con
Nem a razão de justiça convence inteiramente, nem o Código italiano de 1942 sumíveis, são susceptíveis de se deteriorarem pelo uso, não será
conseguiu eliminar todas as dúvidas. O usufrutuário que introduz melhoramentos obrigado o usufrutuário a mais do que restituí-las no fim do
-
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L-ústico, de matérias-primas duma fábrica, etc., etc.. Trata-se em qualquer das
ARTIGO 16.° hipóteses dum complexo de coisas, sujeitas, no todo, a um regime especial que
não é o das coisas consumíveis.
Usufruto de coisas consumíveis Alguns textos estrangeiros (Código brasileiro, art.° 726.°, alemão, § 1 .067.°,
e suíço, art.° 772.0) atribuem ao quase-usufrutuário o direito de propriedade sobre
os bens usufruídos.
1. Se o usufruto tiver por objecto coisas consumíveis, pode Às longas discussões académicas sobre a natureza desta figura — igual ou
o usufrutuário servir-se delas ou aliená-las; mas é obrigado a res diferente da do usufruto, prôpriamente dito, embora com a mesma finalidade
tituir o seu valor, findo o usufruto, se as ditas coisas tiverem sido económica, atributiva ou não de um direito de propriedade ao usufrutuário —
não pode ficar inteiramente alheia a lei. E que duma ou doutra solução resultam
estimadas; se o não foram, poderá fazer a restituição pela entrega consequências práticas de relevo, como, por exemplo, quanto à determinação da
de outras do mesmo género, qualidade ou quantidade, ou do valor pessoa por conta de quem corre o risco no caso de perecimento da coisa usufruída,
destas na conjuntura em que findar o usufruto. por força maior ou caso fortuito. Considerando-se o usufrutuário proprietário
2. O usufruto constituído nos termos do número anterior não das coisas consumíveis desde a constituição do usufruto, recairá sobre ele o risco,
importa transferência da propriedade para o usufrutuário. enquanto que, na concepção oposta, o risco correrá por conta do proprietário
da raiz, pois a transferência da propriedade só se verifica no próprio acto de
consumo. Também tem interesse o problema quanto à execução, por terceiros,
NOTA — O n.° 1.0 corresponde ao art.° 2.209.° do Código Civil, que contém do património do usufrutuário. Poderão ser penhorados as próprias coisas ou
a doutrina tradicional, aceite também pelas legislações estrangeiras. Já no direito apenas o usufruto? Tudo depende ainda, da questão de saber se a propriedade se
romano se admitia, com a configuração e regime actuais, o quase-usufruto; iransferiu.
assim denominado por se atribuir ao usufrutuário, contra a regra do respeito pela Ambas as soluções têm os seus defensores. Nós julgamos, não sem algumas
substância da coisa, o poder de a consumir, devendo apenas restituí-la em valor, dúvidas, que a transferência do domínio pode conduzir a soluções inconvenientes
ou em género, qualidade e quantidade. e até iníquas. Sobretudo quanto ao último problema posto, é de salientar a injus
As alterações que introduzimos na forma correspondem a objectivos deter tiça do benefício concedido aos credores de poderem executar a própria coisa,
minados. aproveitando-se do seu valor integral, e não apenas do valor do usufruto. Mal
Em primeiro lugar eliminamos a palvra «fungíveis» por haver confusão se compreenderia, por outro lado, a sujeição, porventura, do nu-proprietário,
entre coisas consumíveis e fungíveis. Se em regra as coisas consumíveis são a um rateio entre credores quanto ao seu crédito (restituição do valor).
fungíveis, já é incorrecto dizer-se que as coisas fungíveis podem ser consumidas. Mesmo, porém, em relação ao primeiro problema posto, não deixa de se
Em segundo lugar, substituímos a palavra «abranger» pela fórmula «tiver justificar mal que, havendo dois titulares — usufrutuário e nu-proprietário deva
—
por objecto». E de notar no nosso texto, como em outros de códigos estrangeiros,
o risco correr exclusivamente por conta do primeiro e não por conta dos dois
a influência do direito romano, que fixou o regime do quase-usufruto tendo em em harmonia com os seus respectivos direitos, O que é lógico é que, desaparecida
vista especialmente os legados de usufruto sobre um património ou sobre uma
a coisa por motivo de força maior ou caso fortuito, fique o nu-proprietário sem
universalidade de bens. Ora, se essa é a regra, há que admitir, porém, a sujeição
a raiz (restituição do valor) e o usufrutuário sem a possibilidade de a consumir.
ao mesmo regime, do usufruto que incida exclusivamente sobre coisas consumíveis Porque preferimos estas soluções, que conduzem à integração do quase-
não integradas em patrimónios, e este caso não está rigorosamente previsto na
-usufruto na figura clássica do usufruto e no seu regime geral, ficamo-nos na
fórmula actual, desde que se emprega a palavra «abranger». E certo que nunca
afirmação simples de que o usufrutuário pode servir-se das coisas consumíveis,
se pôs em dúvida a necessidade de interpretar extensivamente o texto ou de
com o simples acréscimo dos poderes de alienação, e, declaramos expressamente,
o aplicar por analogia. Mas é preferível alterá-lo.
em parágrafo especial, para evitar as dúvidas que outros códigos têm levantado,
Acresce ainda que pode o usufruto abranger coisas consumíveis e não se
que o usufruto sobre coisas consumíveis não importa transferência da proprie
dever aplicar o regime legal, por essas coisas não terem sido consideradas isolada-
dade para o usufrutuário.
mente como objecto do usufruto. E o caso de sementes englobadas num prédio
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‘4
Dogmàticamente pode continuar a discutir-se a excelência duma solução que em oposição com o limite que estabelecemos no art.° 8.° aos poderes do usufru
admite o direito de consumo e o poder de alienação fora do direito de pro tuário— o respeito pelo destino económico da coisa.
priedade. O problema passa, porém, a interessar apenas como problema académico. Não nos impressiona nem um facto nem outro, tão evidente nos parece
Como reconhecemos que a doutrina proposta é discutível, sobretudo se a vantagem para os dois titulares da substituição da cultura, quando seja impossível
a compararmos com as soluções legais sobre mútuo, não deixaremos de notar ou prejudicial a renovação de plantas do mesmo género. A substituição de culturas
que se se vier a admitir a transferência da propriedade no próprio momento está dentro da actividade normal dum proprietário prudente, sempre que os
da constituição do usufruto, são convenientes algumas providências legislativas, terrenos se mostrem cansados, comece a desenvolver-se uma nova doença, ou se
para se evitar a execução de terceiros em prejuízo do proprietário de raiz. Parece verifiquem casos semelhantes.
que essa transferência deverá, pelo menos, ficar dependente da entrega da coisa,
depois de prestada a caução.
ARTIGO 18.°
Perecimento natural das árvores e arbustos 1.As árvores ou arbustos que caírem ou forem arrancados
ou quebrados por acidente, pertencem ao proprietário, sem pre
1.O usufrutuário de árvores ou arbustos pode aproveitar-se juízo do disposto no n.° 2.° do artigo seguinte, quando se trate de
das que forem perecendo naturalmente. matas ou árvores de corte.
2. Tratando-se de árvores ou arbustos frutíferos, o usufrutuá 2. O usufrutuário pode, todavia, aplicar essas árvores e arbus
rio é obrigado, todavia, a plantar tantos pés quantos perecerem tos às reparações que tiver obrigação de fazer, ou exigir que
naturalmente, ou a substituir esta por outra cultura igualmente o proprietário as retire, desocupando o terreno.
útil para o proprietário, se for impossível, ou prejudicial, a reno
vação de plantas do mesmo género. NOTA — Corresponde à segunda parte do art.° 2.210.°, cuja doutrina se não
altera.
NOTA — Corresponde aos art.os 2.210.°, primeira parte, e 2.226.° do Código Já dissemos em nota ao artigo anterior que a solução legal é juridicamente
Civil. a mais lógica. Mas será pràticamente a mais justa?
A atribuição ao usufrutuário da propriedade das árvores que perecerem O problema foi largamente discutido entre nós a propósito do ciclone de
naturalmente, sejam ou não frutíferas, constitui doutrina dominante nas legisla 15 de Fevereiro de 1941, procurando vários autores atenuar os efeitos do
ções. A solução é, sem dúvida, jur’xdicamente a mais lógica. O que morre natural art.° 2.210.° que consideravam iníquos.
mente representa um fruto da terra, e, como qualquer outro fruto, deve pertencer Cremos que não pode deixar de se impor uma distinção: a de constituírem
ao usufrutuário, ao contrário do que sucede com as árvores que caem por acidente. as árvores capital e a de constituírem frutos. Neste segundo caso é que o prO
Estas, não sendo árvores de corte, constituem um capital, instrumento de rendi; blema tem realmente acuidade, e será resolvido no aitigo seguinte que fixa
mentos, e não frutos, pelo que devem ser atribuídas ao proprietário, nos termos o regime do usufruto sobre árvores de corte. No primeiro caso, porém, a solução
do artigo seguinte. do art.° 2.210.° do Código Civil e, portanto, a deste art.° 18.° do anteprojecto,
A faculdade conferida na última parte do parágrafo segundo deste artigo, é ainda, a nosso ver, a mais justa. Julgamos evidente que o prejuízo pela perda
já consignada na segunda parte do art.° 2.226.° do Código Civil, não tem da coisa deve ser suportado pelos dois titulares na medida dos seus direitos.
correspondente nas legislações estrangeiras, e pode considerar-se, sob certo aspecto, E se, em alguns casos, tratando-se, por exemplo, de árvores frutíferas, o prejuízo
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1
imediato atinge mais fortemente o usufrutuário, na generalidade dos casos, tra ARTIGO 190
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Deve supor-se, em primeiro lugar, no instituidor do usufruto, a intenção de pràticamente, qualquer corte, e portanto a utilização das árvores. Não é, porém,
atribuir ao usufrutuário a fruição da mata ou das árvores precisamente nas mesmas neste campo do usufruto que devem ser tomadas medidas de carácter económico
condições em que elas estavam a ser utilizadas até então. E a vontade do insti relativas ao aproveitamento regular das matas. Essas medidas devem ter carácter
tuidor deve ser respeitada, nos termos do art.° 7.° deste anteprojecto (cfr. geral, e quando sujeitas a elas os proprietários, se reflectirão no usufrutuário, corno
art.° 2.201.0 do Código Civil). Pelo menos, portanto, fora dos usufrutos legais, limitações de direito público, sem necessidade de providências especiais.
é esta juridicamente a melhor solução. Bem vistas as coisas, a situação jurídica das matas nestas condições, não
Mas há outras razões. difere substancialmente da situação daquelas que se destinam a fins meramente
Pode acontecer, e isso é mesmo de prever como muito vulgar, que os voluptuários, à consolidação das terras, à defesa contra os ventos, a regular
proprietários da região não tenham um sistema uniforme de utilização das matas. o uso das águas, à protecção da caça, ou ainda a produzir frutos, como castanha,
Mesmo tratando-se de árvores da mesma natureza, tanto elas podem ser aprovei bolota, cortiça, resina, etc., e que não estão sujeitas em princípio, ao regime
tadas para lenha, logo que atinjam um certo desenvolvimento, como reservadas deste artigo, visto não se tratar de matas ou árvores de corte.
para madeiras, conforme o critério puramente pessoal do proprietário. Bem sabemos Dissemos e sublinhamos que em princípio há identidade. E porquê? Porque
que poderá dizer-se que não há senão um sistema econômicamente certo de uma mata pode ter uma dupla finalidade. Destinando-se à defesa das terras, das
aproveitamento das matas. Mas essa é mais uma razão para não dever õ usufru águas, dos ventos, ou sendo mesmo meramente voluptuária, pode estar sujeita,
tuário, que deve ser prudente, submeter a administração, à possível imprudência por praxe do proprietário, a cortes periódicos, e neste caso, o usufrutuário poderá
dos vizinhos. prosseguir com esses cortes, desde que não prejudique os outros fins.
Há ainda um terceiro aspecto a considerar de não menor relevo. Todos estes exemplos que demos e as soluções que propomos põem em
Pode ser norma do proprietário, em vez de fazer cortes periódicos das árvores evidência o carácter subjectivo do destino das matas e das árvores. Deve atender-se
de maior porte, ou por talhões, deixar desenvolver a mata até à sua plena sempre à finalidade que lhe era atribuída pelo proprietário, de preferência
maturação e fazer depois o corte total. Em vez de rendimentos periódicos obtém a quaisquer interesses de ordem económica ou objectivamente mais convenientes,
capitalizações a longo prazo. A observância deste uso deve ter, como consequência, e essa concepção, que está, de resto, na mente dos comentadores italianos, mostra
em face dos princípios que adoptamos, não poder o usufrutuário aproveitar-se senão a superioridade da fórmula agora adoptada em relação à fórmula antiga ou
das árvores que forem naturalmente perecendo (art.° 17.0), ou daquelas cujo à usada pelo Código italiano de 1942 — prática constante da região (art.° 989.0).
corte for necessário para o regular desenvolvimento das matas. Trata-se, assim, Neste Código italiano mandam-se respeitar em primeiro lugar as leis e os
e ainda, da manutenção das praxes seguidas pelo proprietário, praxes que podiam regulamentos florestais. Não há necessidade de uma declaração expressa nesse
ser profundamente afectadas se se prescrevesse apenas o respeito pelos costumes sentido. Toda a lei de interesse e ordem pública, vigente ou que venha a ser
da terra. promulgada em futuras reformas agrárias, será evidentemente de aplicar de pre
Mas será realmente esta a melhor solução, ou deverá, de preferência, atribuir-se ferência aos princípios de direito privado. A estes compete apenas resolver os
neste caso ao usufrutuário o direito de fazer cortes segundo as regras comuns, conflitos de interesses entre proprietários e usufrutuários.
assegurando-se sempre dum rendimento?
Ainda uma última nota sobre este problema:
Claro que afastamos sem hesitações uma terceira solução, que seria a de lhe
Pode parecer haver contradiçã~ entre as conclusões a que chegámos
facultar o corte total quando as árvores estivessem no seu completo desenvolvi
e a afirmação de que na falta de praxes por parte do proprietário se observará
mento, tal como o faria o proprietário. ~E que, por um lado, não se compreenderia
o costume da terra. A possibilidade de se observarem os costumes deve ser,
que ao usufrutuário acabasse por ser atribuída uma parte do capital usufruído,
realmente, rara, mas essa possibilidade está prevista no Código espanhol, e, em
contra, como dissemos, a natural expectativa dõ instituidor do usufruto, e, por
alguns casos, especialmente nos usufrutos legais ou quanto ao problema da
outro lado, seria sempre muito difícil, e, portanto, fonte de incertezas e conflitos,
forma por que se hão-de efectuar os cortes, não é difícil encontrar matéria para
precisar o momento em que a mata se deveria considerar em plena maturação.
aplicação desses costumes.
Quanto às outras duas soluções — praxes do proprietário ou costumes da
terra— dissemos que optávamos pela primeira, juridicamente mais perfeita, embora O número segundo deste artigo contém doutrina nova que vem em certa
já lhe tenha sido apontado um inconvenier~te de ordem económica o de impedir,
— medida dar satisfação às reivindicações que se fizeram pçr ocasião do ciclone
60 61
/
de 15 de Fevereiro de 1941. Entendemos que se deve manter a doutrina con NOTA — O art.° 2.213.° do Código Civil, proibindo ao usufrutuário
sagrada no art.° 18.°, segundo a qual a propriedade das árvores que caen~ a abertura de minas, supunha em vigor o regime do art.° 465.0 do mesmo Código,
ou forem arrancadas ou quebradas por acidente pertencem ao proprietário. Já que permitia a pesquisa e lavra de minas, independentemente de autorização
cti~semos porquê. Simplesmente, no caso de matas ou árvores de corte, pode do Governo. Hoje não é assim. Nem o proprietário nem o usufrutuário as podem
haver, em certo momento, uma lesão grave para o usufrutuário. Este pode ficar explorar sem concessão do Governo, e, portanto, não há que tomar nenhuma pro
sem quaisquer rendimentos, enquanto o proprietário obterá antecipadamente uma vidência especial em relação a este, que é, como aquele, havido como terceiro em
parte do seu capital. A solução que propomos, depois de analisadas muitas das relação ao domínio público do Estado. O usufrutuário pode, pois, como qualquer
sugeridas, é a que nos parece mais equitativa e mais conforme à posição relativa outra pessoa, incluindo o proprietário, obter uma concessão nos terrenos usufruídos.
dos dois titulares. Há apenas que resolver duas ordens de problemas: o da situação do usufrutuá
rio de concessões mineiras e o da situação do usufrutuário de terrenos onde existam
explorações de terceiro.
ARTIGO 20.°
Vejamos as soluções que nos parecem mais conformes com a natureza do
usufruto. As razões do art.° 19.°, relativas à exploração de matas, levam-nos aqui
Usufruto de plantas de viveiro à sujeição às praxes seguidas pelo titular da concessão. ]~ esta sem dúvida
a solução conveniente, como meio de evitar que a excessiva ganância do
O usufrutuário de plantas de viveiro é obrigado’ a conformar-se usufrutuário o leve, em prejuízo do proprietário, a cansar excessivamente a mina.
igualmente, no arranco das plantas, com a ordem e praxes do No Código alemão (‘~ 1.038.0) e suíço (art.° 771.0) mandam-se aplicar expressa-
proprietário, ou, na sua falta, com o costume da terra, tanto pelo mente as regras respeitantes à exploração de florestas.
que toca ao tempo e ao modo do dito arranco, como pelo que Tratando-se do usufrutuário do terreno, nenhuma dificuldade se pode levantar
quanto à renda pela superfície ocupada. Trata-se dum fruto civil. Quanto
toca ao tempo e ao modo’ de retanchar o mesmo viveiro. à quantia proporcional ao valor do minério extraído, calculada pelo imposto
NOTA —Reproduzimos a disposição do art.° 2.212.° do Código Civil, que profissional que for liquidado à Fazenda Nacional, é que podem levantar-se
está em rigorosa harmonia com o direito do usufrutuário à percepção dos frutos dúvidas. Há quem entenda que tratando-se duma indemnização pelos prejuízos
produzidos pela coisa sem prejuízo da sua substância ou destino económico. que a exploração da mina causa ao prédio, essa indemnização deve pertencer por
Sômente substituímos os costumes do sítio pela observância, em primeiro lugar, das inteiro ao proprietário, tendo o usufrutuário apenas o usufruto dela. Em França
praxes seguidas pelo proprietário, pelas mesmas razões que nos levaram a igual distinguem-se duas hipóteses: a da mina já existir ao tempo da constituição
substituição no artigo anterior. do usufruto, ou ter sido concedida posteriormente. No primeiro caso a indemniza
ção pertence ao usufrutuário; no segundo, ao proprietário. Na primeira hipótese,
é indubitável que é aquela a boa solução. Deve estar no ânimo do instituidor
ARTIGO 21.° do usufruto atribuir ao usufrutuário os benefícios que ele próprio gozava.
Na segunda hipótese parece ser ainda esta a melhor solução. Como remuneração
Exploração de minas periódica que dura enquanto existe a exploração, ela não corresponde exactamente
aos prejuízos sofridos pelo prédio na sua substância,~ mas é ainda uma com
1. O usufrutuário duma concessão mineira deve conformar-se pensação, embora ideal, pela ocupação de coisa alheia, uma espécie de homenagem
ao direito de propriedade enquanto este é afectado pela mina em exploração.
na sua exploração com as praxes seguidas pelo respectivo titular
2. ~O usufrutuário de terrenos onde existam explorações mi~
neiras tem direito às quantias devidas ao proprietário do solo, quer
a título de renda, quer por qualquer outro, em proporção do tempo
que durar o usufruto.
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ARTIGO 22.° -
NOTA — Este direito já é conferido pelo § único do art.° 2.213.°, e jus
tifica-se a sua concessão pelos benefícios que naturalmente advêm para os prédios
sem prejuízo sensível para o proprietário. Rigorosamente ele ultrapassa a esfera
Exploração de pedreiras dos poderes conferidos no art.° 14.°, pois é indubitável que há alteração na
forma e na substituição da coisa. Isso explica a necessidade desta disposição.
Não se diz no ~ único do art.° 2.213.° se o usufrutuário tem direito a uma
1.‘O usufrutuário não pode abrir ~ novo pedreiras sem con
indemnização. A solução negativa parece impor-se em face do art.° 2.217.°, como
sentimento do proprietário. Mas se elas já estiverem em exploração se imporia neste anteprojecto em face do art.° 14.°. Não é, porém, inútil, repetir
quando começar o usufruto, pode o usufrutuário explorá-las, con a doutrina. Podem evitar-se dúvidas.
formando-se com a regra estabelecida no n.° 1.0 do artigo anterior. Juntamente com as águas, faz referência aquele parágrafo à pesquisa de
2. Esta proibição não inibe o usufrutuário de extrair pedra do adubos minerais. Essa parte deve considerar-se revogada por estarem tais adubos
solo para reparaç&s ou obras a que seja obrigado. abrangidos no art.° 1.0 do Decreto n.° 18.713, de 11 de Julho de 1930, e não há
~ue alterar agora a legislação mineira.
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ARTIGO 25.~ Considerada a universalidade como um todo, não pode aplicar-se a cada
suas unidades, isoladamente, o regime próprio do usufruto. Há que encarar o todo,
considerando como frutos da universitas apenas as crias que não são necessárias
Tesou~ros à substituição das que, por qualquer causa, faltarem.
Com pequenas variantes, mais de forma do que de fundo, é esta a solução
Se o usufrutuário descobrir no prédio usufruído algum tesouro, adoptada pelos Códigos francês (art.° 616.0), italiano de 1865 e 1942 (art.00 513.0
observar-se-ão as disposições deste Código acerca dos que acham. e 994.°, respectivamente) e espanhol (art.° 499.~).
tesouros em terreno alheio. Ë certo que, dogmàticamente, esta figura da universalidade de facto não
é aceite por todos os autores, inclinando-se alguns para a concepção, neste caso,
do usufruto de disposiç&, paralela, mas ainda assim distinta do do quase-usufruto.
NOTA — Transcreve-se o art.° 2.216.° do Código Civil.
Ë este um problema que não nos interessa discutir porque não conduz a soluções
Consideramos inútil esta disposição, porque rigorosamente nunca podem
diferentes das consagradas pelas leis modernas e pelo direito romano. Teremos
caber ao usufrutuário senão os direitos que lhe advierem da sua posição de
em qualquer caso de reconhecer que o rebanho, como toda a universalidade de
achador, O tesouro não pode ser considerado fruto ou produto da coisa por n~o
animais, se apresenta no seu todo com um destino económico próprio, e que
estar de forma nenhuma relacionado com o prédio. Trata-se, porém, de um preceito~
que está consagrado em quase todas as legislações (cfr. Código francês, art.° 598.°,. a isso se terá de atender ao definir os direitos do usufrutuário, ao qual se impõe,
por preceito genérico, o respeito pelo destino económico da coisa. Daí a obrigação
Código alemão, ~ 1 .040.°, Código italiano, art.° 988.0) e a sua eliminação poderia,
por isso, suscitar dúvidas futuras de interpretação. de substituir, com as crias, as cabeças que, por qualquer causa, faltarem, man
tendo-se sempre a unidade do todo.
Por qualquer forma, diz a nossa lei, e ela é, sob este aspecto, superior
à italiana que se refere apenas aos animais mortos, e à espanhola que fala em
ARTIGO 26.° animais «que morrem anual e ordinàriamente, ou faltem pela sagacidade dos
animais daninhos». Ë que, conforme o direito romano, e a própria doutrina
daqueles países, devem ser substituídas as cabeças logo que se tornem inúteis,
Usufruto sobre universalidades de animais
ou desde que tenham sido alienadas pelo usufrutuário. Neste último caso, mesmo,
não havendo perda por caso fortuito, não deixa o usufrutuário de ser responsável
1.Se o usufruto for constituído num rebanho, ou numa uni pela substituição em quantidade e qualidade, mesmo que não tenha crias suficientes.
versalidade de animais, será o usufrutuário obrigado a substituir Também o nosso Código, referindo-se genèricamente às universalidades de-
com as crias novas as cabeças, que, por qualquer causa, faltarem.. animais, e apenas designando a título exemplificativo os rebanhos, tem mais
2. Se os animais se perderem na totalidade, ou em parte, por amplitude do que os códigos citados que, especificando essas universalidades
(troupeau, em França, rebaiio ó piara de ganados, em Espanha, mandra o u~’r
caso fortuito, sem produzirem outros que os substituam, o usufru
gregge, em Itália) dão causa a dúvidas de interpretação ou à necessidade de
tuário será tão-sômente obrigado a entregar as cabeças restantes.. aplicação dos textos por analogia a casos não previstos. Não devem deixar,
3. O usufrutuário será, contudo, responsável pelos despojos~ na verdade, de se aplicar os mesmos princípios a outras universalidades que
dos animais, se de tais despojos se tiver aproveitado. não podem designar-se por aqueles termos. Tem o seu relevo, por exemplo, o que
se passa com os enxames de abelhas, relativamente aos quais não é possível
NOTA — Transcreve-se sem qualquer alteração o art.° 2.225.° do Código aplicar, isoladamente, o regime do usufruto, nem atribuir ao usufrutuário a plena
Civil, que nos parece superior, na sua forma e na sua doutrina, a qualquer dos. propriedade, logo que haja, ao fim de uns meses, substituição total das unidades
artigos correspondentes dos códigos estrangeiros. que os constituem.
A universalidade de animais, como tipo característico de universitas-fact4. Para que haja universalidade, é prçciso, porém põe-se neste caso uma
—
carece de um tratamento jurídico especial, como o já tinha no direito romano.- questão de facto que a lei não pode resolver — que o destino dos, animais, mais
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Hilili
do que o seu número, porque isso pode variar de terra para terra, imprima ARTIGO 27.°
carácter unitário ao conjunto, isto é, lhe dê a consistência de um todo orgânico,
destinado a perpetuar-se.
Usufruto de rendas ou pensões temporárias
Não introduzimos também qualquer alteração na doutrina do § 1.0 do
art.° 2.225.°, que nos parece superior à de qualquer dos textos citados. O grande,
se não o maior problema suscitado pelo Código italiano nesta matéria, resulta O usufrutuário de rendas ou pensões temporárias tem direito
da forma equívoca da última parte do primeiro parágrafo do seu art.° 994.°.
a perceber as prestaç6es correspondentes à duração do usufruto,
O usufrutuário é obrigado a substituir as cabeças «dopo che ia mandra o ii
gregge ia cominciato ad essere mancante dei numero primitivo». Parece, pois que
sem ser obrigado a qualquer restituição.
só depois da perda se devem substituir as cabeças, e, portanto, se o usufruto
se extingue neste intervalo nenhuma responsabilidade tem o usufrutuário, que NOTA — O Código italiano de 1942 não reproduziu a disposição do
apenas deverá entregar as cabeças existentes. art.° 482.° do Código de 1865 (cfr. art.00 588.° do Código francês e 475.° do
Não tem sido seguida esta orientação, considerada injusta, nem a diametral Código espanhol) que atribuía ao usufrutuário a totalidade das prestações corres
mente oposta, considerada também injustíssima, segundo a qual o usufrutuário pondentes à duração do usufruto. Trata-se, no entanto, duma disposição con
é responsável sempre que se tenha aproveitado de crias suficientes para integrar veniente, porque não é líquido, atendendo aos princípios gerais, qualquer das
a universalidade durante toda a duração do usufruto, isto é, nos anos precedentes. soluções possíveis e designadamente a solução proposta.
Os autores procuram, parece que arbitràriamente, solução intermédia, referindo-se As rendas ou pensões temporárias representam, ao contrário do que sucede
às relaç6es «entre nascimentos e mortes dentro do ciclo anual da prolificação do com a renda perpétua, não só o pagamento dos interesses correspondentes a um
rebanho» (Pugliese). certo capital, mas também o reembolso periódico duma parte desse mesmo capital.
Parece que o problema, já encarado em textos romanos que aceitam, neste Ë isto claro, sobretudo, quando tenha sido constituída a renda por título oneroso,
caso, a responsabilidade do usufrutuário, sem, aliás, a limitarem, tem na nossa lei, em que o cálculo das prestações é feito precisamente em atenção a esse reembolso.
e segundo o texto adoptado, uma solução satisfatória. Se acontece terminar a renda ou pensão antes do usufruto, vem mesmo o usufru
Se a perda, total ou parcial, ocorre naturalmente (e nessa perda pode incluir-se tuário a gozar do direito como se fosse o seu único titular, percebendo os ren
a alienação das cabeças em decadência) e não por caso fortuito, a responsabilidade dimentos e todo o capital correspondente.
pertence ao usufrutuário. Ele devia prudentemente, como bom pai de família A solução que propomos é, apesar disto, a solução que melhor se justifica.
(cfr. art.° 8.°) ir aproveitando as crias para a substituição. Ë esta segundo a consagrada nas leis. Deve partir-se do princípio de que, quando se constitui
cremos a doutrina romanista, e é a que resulta a contrario do nosso texto. um usufruto sobre pensões ou rendas temporárias — a mais vulgar é a renda
Se a perda se deve a caso fortuito, o usufrutuário deverá, sem dúvida, ainda vitalícia
— se pretende atribuir ao usufrutuário o direito de perceber integral
como bom pai de família, aproveitar todas as crias para a substituição. Mas se, mente as prestações que se forem vencendo, sem diminuição da parte correspon
entretanto, findar o usufruto, nenhuma responsabilidade lhe pode ser pedida. dente à amortização do capital, o que só por meio de difíceis cálculos matemáticos
Entregará, nos termos do n.° 2.°, o rebanho no estado em que se encontrar. Eis por se poderia determinar. Ë a ideia que inspira a doutrina do art.° 1.568.° do
que nos não parece vantajoso alterar o que é suficientemente claro, e o que é justo. Código francês, segundo o qual, sendo o dote constituído num usufruto, o marido
ou seus herdeiros não são obrigados, pela dissolução do casamento, a restituir
O n.° 2.° corresponde, sem alteração, ao § 2.° do art.° 2.225.° do senão o direito do usufruto, e não as prestações recebidas, doutrina que se contém,
“N~ Có~9~/Tem também, em relação às disposições paralelas dos códigos estrangeiros, implicitamente, no art.° 1.160.° do nosso Código.
~~avantagem de se referir genêricamente aos despojos, como no Código espanhol, Tem-se apontado como semelhante, e, na verdade, é grande a analogia,
e não apenas às peles: Estes despojos, que podem ser peles ou qualquer outra o caso do usufruto de coisas deterioráveis (cfr. art.° 15.0). Também aqui pode
coisa útil, transformam-se, pois, em coisas consumíveis, e, como tais, podem acontecer que o usufrutuário venha não só a perceber os frutos,- mas, de facto,
ser aproveitadas, mas responde o usufrutuário, neste caso, pelo seu valor (cfr. a gozar o domínio pleno. E sempre acontecerá, pelo menos, que o uso, dete
art.° 16.0), riorando a coisa, e diminuindo-lhe o valor, faça aproximar a coisa do seu fim,
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sem que o proprietário de raiz tenha direito a um reembolso correspondente Mas se se trata de títulos que são amortizados ou de obrigações vencidas?
à diminuição efectiva do capital, tal como o credor duma renda temporária. Deverá o usufrutuário levantar as respectivas importâncias, embora se continue
Num e noutro caso devem considerar-se tais consequências como as pretendidas a exigir o acordo quanto à nova colocação?
pelos contraentes ou instituidores do usufruto. A nossa lei parece exigir também neste caso o acordo ou o suprimento
para o levantamento, o que contrasta com a tradição justinianeia, seguida pela
generalidade dos códigos latinos (cfr. Código espanhol, art.° 507.°, Código bra
sileiro, art.° 719.°, e doutrina italiana anterior ao Código de 1942), segundo
ARTIGO 28.° a qual o usufrutuário podia exigir o pagamento dos créditos vencidos, desde que
tivesse sido prestado, anteriormente ou para o efeito, a necessária caução (em
Usufruto de capitais postos a juro contrário, o Código suíço, art.° 774.0).
Esta solução tradicional era criticada por muitos autores. ~ o que o jus
1. O usufrutuário de capitais postos a juro ou a qualquer outro exigendi, reconhecido ao usufrutuário, transformava o usufruto num quase-usufruto,
visto os capitais serem coisas consumíveis, e este facto e as suas consequências,
interesse, ou investidos em títulos de crédito, tem o direito de
levaram o legislador italiano a mudar de orientação em 1942. Pelo actual
perceber os frutos correspondentes à duração do usufruto. art.° 1.000.0, é necessário o acordo do titular do crédito, com o que se tem
2. ‘O levantamento e a inversão dos capitais referidos não também em vista assegurar o assentimento deste à nova aplicação dos capitais.
podem fazer-se sem o acordo dos dois titulares. No caso de diver Foi a orientação que seguimos.
gência pode o consentimento do proprietário ou do usufrutuário O n.° 2.° está redigido em termos de mostrar que a iniciativa para o levan
ser judicialmente suprido. tamento e inversão de capitais pertence indiferentemente ao proprietário ou ao
usufrutuário. Já. esta doutrina se deduz do § 3•0 do art.° 2.237.° do Código Civil.
Embora se possa argumentar contra esta faculdade com a afirmação de que, na
NOTA —A disposição do art.° 2.237.° do Código Civil contém os prin
pendência do usufruto, o titular da raiz não goza de quaisquer poderes de
cípios informadores deste artigo e do imediato.
administração, a solução legal é, sem dúvida, a mais justificável, dado o interesse
Não se declara expressamente naquele artigo, ao contrário do que sé faz
que este tem em obter uma boa colocação para o seu capital. Assim como pode
agora, que o usufrutuário tem o direito de perceber os interesses dos capitais
pedir a entrega da coisa se o usufrutuário fizer mau uso dela, também deve poder
postos a juro ou investidos em títulos de crédito. Trata-se, efectivamente, de
promover, quando conveniente, a colocação dos seus valores em melhores con
uma afirmação inútil, pois a solução impõe-se como consequência necessária dos
dições.
preceitos gerais consagrados nos art.~ 8.° e 9.°. Devendo regular-se, porém, esta
Não se faz distinção neste artigo er~tre títulos de crédito nominativos e ao
matéria no capítulo dos direitos do usufrutuário, como se impõe, importa lôgica
portador. ~ o bastante, segundo cremos, para se não considerar sujeito ao regime
mente começar por dizer quais são efectivamente esses direitos, e não apenas quais
do quase-usufruto, o usufruto que incida sobre títulos ao portador.
são as restrições.
~ certo que nas relações com terceiros o usufrutuário é, neste caso, um ver
Na parte referente ao levantamento e inversão dos capitais, seguimos a dou
dadeiro proprietário, pelo que o devedor não só lhe deve o pagamento de juros
trina do Código Civil. Como o risco pela perda ou diminuição de valor dos
como o reembolso do capital. E também as transitiissões aproveitam a todo
capitais colocados corre por conta do titular da raiz, parece evidente que o usufru
o possuidor de boa fé. Note-se, porém, que este regime não difere, afinal, do
tuário não deve, por si só, ter o arbítrio da escolha. Ambos são interessados, mas
das coisas móveis não consumíveis que tenham de ser entregues em espécie.
os seus interesses são, em certa medida, opostos. O proprietário preferirá natural
Também podem ser alienadas, ou mesmo destruídas, em prejuízo do proprietário.
mente uma colocação segura, embora pouco rendosa; pelo contrário, o usufrutuário
Trata-se, num ou noutro caso, de factos ilícitos praticados pelo usufrutuário, e que
preferirá uma aplicação mais rendosa embora menos segura. Se os capitais já estão
o sujeitam à respectiva responsabilidade por perdas e danos.
empregados quando começa o usufruto, impõe-se o respeito por essa colocação.
Só por acordo, ou então com suprimento judicial do consentimento de algum
deles, se deverá, pois, permitir a substituição.
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ARTIGO 29.° ARTIGO 30.°
1. O usufrutuário de quantias em dinheiro, ou de capitais O usufrutuário de títulos de crédito tem direito à fruição
levantados nos termos sobreditos, tem a faculdade, desde que tenha dos prémios ou outras utilidades aleatórias produzidas pelo título.
prestado a devida caução, de os usufruir como bem lhe parecer,
correndo, neste caso, por sua conta o risco pela perda ou diminuição NOTA — Aceita-se a solução do art.° 1.998.° do Código italiano, salvo
na parte em que este artigo impõe, pela aplicação do art.° 1.000.0, a colocação
das respectivas quantias.
do capital recebido de acordo com o proprietário. Tratando-se duma quantia em
2. Se o usufrutuário não quiser usar do direito que lhe
dinheiro deve poder o usufrutuário usar da faculdade que lhe é conferida pelo
é conferido no número anterior, é aplicável o disposto no n.° 2.° do artigo anterior.
art.° 28.°. Sendo os prémios acessórios do título, devem pertencer, em princípio, ao
proprietário; mas deve estender-se o benefício ao respectivo usufrutuário. ]~ natural,
NOTA — Pode o usufruto constituir-se originàriamente sobre somas em mesmo, que, dada a possibilidade de distribuição de prémios, o rendimento do
dinheiro, e pode, por levantamento de capitais investidos, ou outras causas adiante título se encontre reduzido em relação à taxa do mercado. Ora, o prejuízo do
previstas, transformar-se o usufruto em quase-usufruto. Em qualquer destes casos, usufrutuário justifica uma compensação. Imaginemos o prémio de uma casa de
o titular da raiz é, no fundo, um credor do usufrutuário, vencendo-se o crédito habitação. Ela deverá pertencer ao proprietário, mas o usufrutuário não deve ficar
no momento da extinção do usufruto. Esta situação só é facultada ao usufrutuário sem o seu usufruto.
quando os capitais estiverem sem colocação, pois em qualquer outra hipótese Não obstante os termos do art.° 1.998.° citado, tem-se discutido em Itália
há que aplicar a disposição do artigo anterior. se pertence ao proprietário ou ao usufrutuário o prémio que não é constituído
O Código italiano de 1942 não admite esta situação. Levantados os capitais, por uma soma de capital mas por uma prestação susceptível de uma só utilização,
estes devem ser obrigatàriamente investidos, e não havendo acordo quanto à colo como, por exemplo, uma viagem. Aqui parece-nos que o benefício deve pertencer
cação, resolverá o juiz (art.° 1.000.0). ao usufrutuário, salvo se esse prémio importar a amortização do título, e na parte
Contra a tradição do próprio direito italiano, esta solução tem sido justificada correspondente à amortização. Trata-se duma utilidade aleatória que não representa
por duas razões: por um lado, deve-se facultar sempre ao titular da raiz a possi um benefício de capital, e que é, portanto, caracteristicamente, um fruto do título.
bilidade duma colocação mais vantajosa; por outro lado, deve-se-lhe permitir
a escolha do meio que repute mais idóneo para se libertar das flutuações do
valor da moeda. ARTIGO 31.°
Não são razões de grande merecimento. Elas esquecem os interesses do
usufrutuário, e, além disso, não há garantia, em caso nenhum, para o titular Usufruto de títulos de participação
de raiz, de que qualquer novo investimento lhe não traga uma futura redução do
capital. Ora, nesta incerteza, não pode deixar de se considerar objectivamente justa 1. O usufrutuário de acções ou de partes sociais tem direito:
a transformação do usufruto num quase-usufruto, o que, importa, pràticamente,
a) Aos lucros distribuídos correspondentes ao tempo de dura
a transformação do capital num crédito sobre o usufrutuário, transferindo-se para
este o risco pela perda ou diminuição de valor. ção do usufruto;
Quando o usufrutuário não queira usar desta faculdade, será, então, por b) A votar nas assembleias gerais, salvo tratando-se de deli
acordo, ou por decisão do tribunal, investido o capital usufruído, nos termos berações que importem alteração do estatuto ou a dissolução da
do n.° 2.°. sociedade;
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c) A usufruir os valores que couberem à parte social sobre o acordo dos dois para que possa ser exercido o direito de voto. Confere o direito
que incide o usufruto, no acto de liquidação da sociedade. ao proprietário a lei espanhola sobre sociedades anónimas, de 1951 (art.° 41.0)
e a do mesmo país sobre sociedades de responsabilidade limitada, de 1953
2. No caso previsto na segunda parte da alínea b) do número
(art.° 24.0). Entre nós, à falta de lei expressa, têm sido sustentadas variadas
anterior, o voto pertencerá conjuntamente ao usufrutuário e ao soluções, predominando, àltimamente, a que atribui o direito de voto ao pro
titular da raiz. prietário (Prof. J. G. Pinto Coelho).
Seguimos no texto uma solução ecléctica, por nos parecer a que mais se
NOTA — São variados os problemas suscitados a propósito da distribuição harmoniza com os princípios gerais. Tivemos, todavia, o cuidado de não cair
dos lucros. Em princípio pode assentar-se em que, como frutos civis, os dividendos no gravíssimo inconveniente da incerteza da qualificação das deliberações. Atri
devem ser partilhados pro rata tem porís. Mas esta solução, que resulta da apli buímos, para isso, à semelhança dos Códigos suíço e italiano, o direito de voto
cação das regras gerais formuladas noutras disposições, não resolve claramente ao usufrutuário, e só admitimos a intervenção do proprietário nas deliberações que
todas as dúvidas. O problema é complexo porque há lucros que se acumulam importarem alteração do estatuto ou a dissolução da sociedade.
e que só são distribuídos mais tarde, até pela atribuição aos accionistas dos fundos O usufrutuário é o administrador dos bens, consequência necessária dos
de reserva ou de acções próprias. Adoptamos a regra de que deve atender-se ao seus poderes de uso e de fruição, e os actos normalmente discutidos nas assembleias
momento em que se auferem os lucros — «correspondentes ao tempo de duração gerais respeitam precisamente à administração da sociedade. iii claro, como re
do usufruto» — e não ao momento da sua distribuição. ~ certo que falamos em conhecem os autores, que o proprietário tem os seus interesses ligados à marcha
«lucros distribuídos»; mas esta palavra visa apenas excluir, em harmonia com dessa administração, mas, rigorosamente, esses interesses não se distinguem dos
a doutrina dominante, quaisquer direitos do usufrutuário a lucros que a sociedade que tem em relação a quaisquer outros bens ou valores administrados pelo usufru
tenha destinado a amortizações ou a fundos de reserva, ou, de uma maneira geral, tuário. Não se justificam, por isso, medidas excepcionais para este caso. Se a socie
a capitalizações, e que não sejam, efectivamente, distribuídos. dade é mal administrada em consequência do voto do usufrutuário, o proprietário
Em Espanha, o art.° 41.0 da lei sobre sociedades anónimas apenas atribui poderá usar dos direitos, que a lei a todos confere, de pedir a entrega da coisa,
ao usufrutuário os lucros produzidos e distribuídos durante o usufruto, cerceando-se, ou seja das medidas cautelares e repressivas que lhe são facultadas.
assim, a nosso ver, inexplicàvelmente, os seus direitos. Os dividendos podem ser Em harmonia ainda com os princípios gerais que regem o usufruto, enten
distribuídos depois da cessação do usufruto, e devem caber, até integralmente, ao demos que algumas deliberações não devem ser tomadas sem o acordo do
usufrutuário, se corresponderem a lucros obtidos durante o usufruto. proprietário. São as previstas na alínea b) do n.° 1.0. Desde que haja alteração
A atribuição do direito de voto ao usufrutuário ou ao proprietário é outro dos estatutos ou dissolução da sociedade, altera-se a substância da coisa ou o seu
dos grandes problemas levantados. i~ que ambos têm os seus direitos ligados destino económico, pelo que não deve bastar o voto do usufrutuário.
à marcha dos neg&ios sociais, e os seus interesses são, ou podem ser, opostos.
Como tem sido notado pelos autores, ao proprietário interessa sobretudo a solidez Dissolvida a sociedade, acontecerá normalmente que as partes sociais
da sociedade e, portanto, a constituição de reservas, amortizações do activo, etc., usufruídas venham a ter um valor superior ao seu valor nominal. Se houve, na ver
ao passo que ao usufrutuário interessam sobretudo os dividendos. Daqui a diver dade, cautelosa administração, se se constituíram os necessários fundos de reserva,
sidade de opiniões e de teses formuladas pela doutrina e pelas leis, umas radicais, se se desvalorizam prudentemente o artivo, é natural que as partes sociais
atribuindo o direito de voto exclusivamente a um dos sujeitos, outras intermédias, apareçam valorizadas na liquidação da sociedade. Qual a posição do usufrutuário?
distinguindo entre actos de pura administração e os restantes, ou entre deliberações Em pura lógica formal, parece que deveria fazer-se uma discriminação, atribuindo
tomadas pelas assembleias ordinárias ou extraordinárias, ou, ainda, entre acções a este, em propriedade, a parte -que devesse considerar-se como lucro, e que foi
nominativas e ao portador. levada à conta de fundos de reserva ou de amortização, considerando essa parte
O Código suíço das obrigações (art.° 690.0) e o Código ital~iano de 1942 como se efectivamente, numa administração menos prudente, tivesse sido dis
(art.” 2.352.0) conferem o direito de voto ao usufrutuário, embora aquele o res tribuída.
ponsabilize perante o proprietário pelos actos de menos consideração pelos seus Não nos parece ser esta a boa solução. Lucros são apenas os dividendos
interesses, O Decreto brasileiro n.° 2.627, de 26 de Dezembro de 1940, exige distribuídos, como acima dissemos. São esses os visados~ pelo instituidor do
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usufruto. As outras receitas, quando afectadas à solidez da sociedade, ao desen CAPITULO III
volvimento dos seus negócios e ao aumento dos lucros, conduzem rigorosamente
a um fenómeno de capitalização, que dá lugar, segundo os princípios gerais,
a um aumento do capital usufruído, mas que não pode justificar à atribuição
duma parte da raiz ao usufrutuário. OBRIGAQDES DO USUFRUTUÁRIO
O Prof. J. G. Pinto Coelho, trancreve de Sanchez Torres o seguinte: «As
quantias levadas a reservas não são rendas ou rendimentos, senão antes capitais,
que aumentam o activo social, e que por vezes estão até afectos a fins especiais. ARTIGO 330
Defesa do usufruto
NOTA —Corresponde ao corpo do art.° 2.221.° do Código Civil. Fizeram-se
apenas algumas alterações de forma.
O usufrutuário pode usar de todos os meios, que competem ao O Código francês (art.° 600.0) e o Código italiano de 1942 (art.° 1.002.0)
começam por prescrever que o usufrutuário tomará conta dos bens no estado
proprietário, para ser mantido no seu usufruto.
em que se encontrarem. Não se trata, porém, como é doutrina comum, de uma
obrigação do usufrutuário, nem, prôpriamente, de matéria a regular neste capítulo.
NOTA — Corresponde ao corpo do art.° 2:219.° do Código Civil. Os bens são, por princípio, sempre transmitidos no estado em que se encontram,
Cremos que não se quis nesta disposição atribuir ao usufrutuário apenas a acção quer se trate de transmissão mortis causa, quer de transmissão inter vivos.
típica do usufruto — a confessoria ou vindicatio usafructus — mas também, Substituímos a palavra fungíveis por consumíveis, por esta ser mais correcta.
e sobretudo, as acções possessórias. Estas foram atrás conferidas ao usufrutuário Aludimos ao pagamento de qualquer outra indemnizaçao, por poder, de
(art.° 8.°, n.° 2.0), e, portanto, a disposição terá um alcance mais limitado, mas facto, haver lugar a outras indemnizações não previstas e que devam igualmente
ainda assim, útil. ser caucionadas. Como exemplo, poderá citar-se a do art.° 1~1 deste anteprojecto.
.°
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ARTIGO 340
é nova. Ela tem sido debatida em Itália, inclinando-se a doutrina para a scilução
da sua inexigibilidade, com o argumento de que a dispensa não equivale em
Dispensa de caução nenhum caso a uma diminuição da quota legitimária. ~ esta a solução que
resulta do texto proposto.
1. A caução a que se refere o artigo anterior não é exigível ao No n.° 2.°, que corresponde ao § 2.° do art.° 2.221.°, não fizemos referência
alienante com reserva de usufruto, nem aos pais usufrutuários legais especial às doações e testamentos, por nos parecer que a disposição deve ser
sempre aplicada, embora seja oneroso o título constitutivo do usufruto.
dos bens dos filhos menores, salvo se passarem a segundas núpcias,
nem ao cônjuge sobrevivo pelo usufruto dos bens do cônjuge
falecido havido por sucessão, salvo declaração testamentária em ARTIGO 350
contrário.
2. Pode igualmente o usufrutuário ser dispensado, nó título Falta de caução
constitutivo do usufruto, de inventário e de caução, não havendo
ofensa de direitos de terceiro. 1.Se o usufrutuário não prestar a caução devida, pode o pro
prietário exigir que os imóveis se arrendem, se dêem em parceria
NOTA —Corresponde este artigo aos dois parágrafos do art.° 2.221.° do
ou se ponham em administração, que os móveis se vendam ou lhe
Código Civil.
No n.° 1.0, correspondente ao § 1.0, não nos referimos especificadamente,
sejam entregues, e que os capitais, bem como as importâncias dos
como a lei vigente, às vendas e doações, por nos parecer claro que igual doutrina preços das vendas, se dêem a juros, ou se empreguem em títulos
não deve deixar de se aplicar se for outro o acto de alienação. Como exemplo, de crédito nominativos.
pode indicar-se a troca. 2. Não havendo acordo quanto ao destino dos bens, pode
Mantivemos a referência ao art.° 148.° (celebração de segundas núpcias). o consentimento do proprietário ou do usufrutuário ser judicial
Outros casos poderiam ser referidos, como o do art.° 151.0 do Código vigente. mente suprido.
Parece-nos, porém, que esses e outros casos, devem ter a sua disciplina no
capítulo do poder paternal, tanto mais que, como sanção, pode ser atingido
3. Em qualquer caso, as rendas, juros ou frutos pertencem ao
o próprio poder ou alguma das suas faculdades, como a administração dos bens, usufrutuário. Sendo os bens móveis entregues ao proprietário,
e não é este o lugar para regular essa matéria. é devido por este ao usufrutuário o juro legal do seu valor.
Omitimos a doutrina relativa ao usufruto do marido sobre os bens da
mulher, por ser coisa que não existe no nosso direito. Trata-se dum manifesto NOTA — Com maior ou menor desenvolvimento todas as legislações
erro por influência do art.° 601.0 do Código francês. estrangeiras tomam providências semelhantes às do nosso art.° 2.222.° para
Neste n.° 1.0, omitimos ainda a referência ao art.° 2.003.0, por entendermos o caso de o usufrutuário se recusar a prestar a devida caução. E todas elas se
que não se justifica a distinção entre sucessão legítima e testamentária, distinção inspiram na ideia de que, por falta de caução, não deve o usufrutuário ser
que parece resultar do texto em vigor. No entanto acrescentamos, como não privado dos frutos, devendo apenas procurar evitar-se o prejuízo do proprietário.
podia deixar de ser, que o testador, no caso de sucessão testamentária, pode Quanto aos imóveis ficam previstos três destinos: o arrendamento, a parceria,
declarar o contrário, isto é, impor a caução. ou a simples administração de terceiro. A lei actual não faz referência à parceria,
Se vier a consagrar-se a solução dos art.~s 163.° e 164.° do anteprojecto sobre o que tem dado lugar a dúvidas. Em muitos casos, e atendendo-se a certos tipos de
direito das sucessões do Prof. Galvão Teles, que chama o cônjuge sobrevivo cultura, é muito difícil, e sempre inconveniente, impor o arrendamento. A renda
como herdeiro legitimtfrio ao usufruto de metade da herança, e podendo esse tem de ser certa e determinada, e o valor das colheitas, como por exemplo o do
usufruto incidir sobre as quotas de outros herdeiros legitimários, é que pode vinho, pode oscilar tão profundamente de ano para ano, que o contrato, ou se
pôr-se em dúvida, nesta parte, se a dispensa de caução é de aceitar. A questão não tornará aleatório ou muito oneroso para o usufrutuário. -
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diminuição do valor do usufruto, ora à boa ou má fé do proprietário, para fixarem
Quanto aos móveis permitimos a sua venda ou entrega ao proprietário,
o regime.
e a aplicação do preço, assim como de quaisquer outros capitais, pela forma que, Cremos que a solução do nosso direito é a que, no ponto de vista económico,
por acordo, se entender mais conveniente. A solução é idêntica à do art.° 28.° oferece maiores vantagens, e não tem inconvenientes no ponto de vista jurídico,
deste anteprojecto (levantamento de capitais). Os casos são paralelos, e, por isso visto não poder ser prejudicado o usufrutuário.
admitimos o suprimento judicial do consentimento de qualquer dos titulares. Também, em princípio, não deve o proprietário poder exigir do usufrutuário
O art.° 2.222.° do Código Civil não prevê a possibilidade da entrega dos qualquer indemnização. Deve aceitar-se o pressuposto de que as obras são feitas
móveis ao proprietário. Ora pode não convir a venda, tratando-se sobretudo em vista de benefícios futuros, a colher depois do termo do usufruto, e que
de móveis de mérito artístico ou de valor estimativo. Inspirando-nos no Código são esses que compensam as despesas efectuadas. Nem mesmo no caso de boa fé
espanhol (art.° 495.°) admitimos aquela possibilidade (claro que não se dis e título se jüstifica a aplicação das regras da acessão (art.° 2.306.0) porque
pensa o acordo ou o suprimento judicial do consentimento, nos termos do estas regras não se adaptam à situação precária do usufrutuário. Daí a solução
n.° 2.0). Neste caso, e ainda por inspiração do Código espanhol, como o pro do n.° 2.°, que reproduz a doutrina do Código em matéria de despesas extraordiná
prietário passa a ter o gozo da coisa, deverá entregar ao usufrutuário os juros rias (art.° 2.230.°). Tudo se prevê com a necessária equidade, pelo que nos
legais correspondentes ao valor dos móveis. parece superior esta solução às dos Códigos italiano de 1942 (art.° 1.005.°),
espanhol (art.° 302.0) e brasileiro (art.° 734.0), na parte em que obrigam
o usufrutuário ao pagamento de juros pelas sornas dispendidas.
ARTIGO 36.°
requisito: são apenas ordinárias aquelas, que, no ano em que forem necessárias, podem determinar equívocos e incertezas.
não excederem dois terços do rendimento líquido desse ano. Igual sistema foi
sancionado no Código brasileiro (art.° 734~0, ~ único). O direito do usufrutuário de se eximir da feitura das reparações ordinárias,
na verdade, muito difícil formular um conceito seguro de reparação renunciando o usufruto, é de longa data objecto de discussão. Para uns autores,
ordinária. Há mesmo autores que descrêem dessa possibilidade, e deixam para a obrigação de reparar está relacionada com o gozo da coisa. Restituindo-se, pois,
o juiz o encargo de resolver caso por caso. Outros procuram uma linha de orientação, os frutos, deve cessar aquela obrigação. Para outros, a obrigação nasce com
embora pouco definida. Tem-se dito, por exemplo, que é ordinária a reparação a constituição do usufruto, e não pode alterar-se o seu conteúdo sem consenti
necessária para conservar durante um período limitado de tempo, não superior mento do credor (proprietário). Consideramos preferível a primeira tese.
à duração da vida humana, o rendimento da coisa. ~ este um critério que não A segunda tem uma base puramente jurídica, que não afasta a razão lógica
pode aceitar-se, pois, à parte a sua imprecisão, toma por base o interesse do da outra. -
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aquelas— o legislador cuida da conservação da coisa em benefício do proprietá o princípio. Se se trata, rigorosamente, de reparações, é evidente que se não
rio
—, este não é já obrigado às reparações extraordinárias. Fá-las se quiser, tendo transforma a estrutura ou o desenho da obra. Se houver alteração, são outros os
o usufrutuário apenas o direito de as fazer à sua custa e exigir o pagamento princípios que devem ser aplicados. Já atrás ficou assinalado que o usufrutuário
do valor que tiverem no fim do usufruto, ou o seu custo, se de valor inferior. não pode alterar a forma ou a substância da coisa (art.° 1.0) ou o seu destino
Isto significa que os interesses do usufrutuário não são objecto da mesma atenção económico (art.° 8.0).
por parte do legislador, o que tem a iua justificação lógica, dado que o pro Introduzimos de novo o direito de retenção que é conferido também pelo
prietário, enquanto não tira quaisquer utilidades efectivas da coisa, não deve Código italiano de 1942 (art.° 1.006.0).
ser compelido a fazer despesas.
Admite o Código italiano (art.° 1.004.0) que fiquem a cargo do usufrutuário
as reparações extraordinárias que resultem necessàriamente do não cumprimento da
obrigação da manutenção ordinária da coisa. Assim, por exemplo, se o usufrutuário ARTIGO 390
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CAPÍTULO IV Tudo o que dissemos em nota a este art.° 30.° quanto à extinção dos direitos
reais pelo não uso, pode aplicar-se ao usufruto. Desde que se considere a caducidade
pelo não uso um instituto autónomo distinto da prescrição extintiva, aquele
EXTINÇÃO DO USUFRUTO
aplicável no campo dos direitos reais, e este no dos direitos de crédito, não há
que falar em prescrição, como o faz o n.° 4.’ do art.° 2.241.°, nem que aplicar
ARTIGO 43.° as disposições que a regem, designadamente as relativas à suspensão e interrupção.
O Código italiano de 1942 refere-se simultâneamente à prescrição e ao não
Causas da extinção uso, considerando aquela uma consequência deste — per prescrizione per efletto
dei non uso durato per venti anni (art.° 1.014.°, n.° 1.0) —. E teve-se, parece,
O usufruto extingue-se: em vista resolver precisamente o problema da aplicação das regras da prescrição, em
a) Por morte do usufrutuário, ou chegado o termo do prazo sentido oposto ao que adoptámos no texto. Simplesmente acontece que na Itália
por que o usufruto foi conferido, quando este não é vitalício; as discussões continuam. ~ que, nem teàricamente a identificação é perfeita,
pois os dois institutos hão-de reflectir necessàriamente as diferenças entre os
b) Pela reunião do usufruto e da nua-propriedade na mestria
direitos de crédito e os direitos reais, aqueles como direitos relativos, com sujeitos
pessoa; passivos determinados, estes sem determinação de sujeitos — o proprietário não
c) Pelo’ seu não exercício durante vinte anos, qualquer que é senão um dos sujeitos passivos do usufruto—, nem pràticamente se justifica,
seja o motivo; pelas mesmas razões, a identificação completa dos regimes.
d) Pela perda total da coisa usufruída. Os problemas da suspensão e da interrupção têm sido, precisamente, os mais
discutidos, e as razões da discussão são ainda as mesmas: aqueles institutos
NOTA —Corresponde ao art.° 2.241.° do Código Civil. supõem a existência de relações entre dois sujeitos —um activo e outro passivo —
Na alínea a) confirma-se a doutrina do art.° 5~0 deste anteprojecto, trans e nos direitos reais faltam os sujeitos passivos. Quem deverá, por exemplo,
crevendo-se sem qualquer alteração o n.° 1.0 do citado art.° 2.241.°. Já atrás reconhecer o direito ao usufrutuário para o efeito do n.° 4•o do art.° 352.°
justificámos a conveniência de manter o carácter pessoal do usufruto. do nosso Código Civil? Só ficticiamente se poderá, neste caso do usufruto,
Não aproveitámos a doutrina do n.° 2.° deste artigo por nos parecer que considerar o titular da nua-propriedade como representante de todos os sujeitos
a matéria da resolução de direitos deve ser versada em termos gerais e não passivos, ficção para que tendem alguns autores italianos.
a propósito de casos particulares, sobretudo quando nada de especial haja a pre E não se trata de uma simples dificuldade de ordem construtiva, indiferente
ceituar-se. quando se procuram as melhores soluções práticas. ~ que, como se acentuou em
Na alínea b) reproduzimos a doutrina do n.° 3~0, embora com alterações matéria de servidões, ao reformar-se em 1930 o n.° 2.° do art.° 2.279.° do
na forma. E porquê? Neste número refere-se o legislador à confusã~. Ora, este Código Civil, qualquer que seja o motivo e não obstante a incapacidade do
termo não está correctamente empregado, e, por isso, o substituímos, falando proprieta’rio dominante, a servidão deve caducar ao fim de trinta anos. Há na
antes, à semelhança do Código italiano, na reunião do usufruto com a nua- verdade interesse público em fazer caducar os jure en re aliena, enquanto que,
-propriedade. A confusão, própria dos direitos de crédito, supõe a reunião na no domínio das obrigações, estão em jogo meros interesses particulares, e só
mesma pessoa das qualidades de sujeito activo e passivo da mesma obrigação. esses são compatíveis com as regras da suspensão ou da interrupção.
Não pode, porém, em matéria de usufruto, considerar-se o proprietário como O n.° 5~0 do art.° 2.241.° refere-se à renúncia do usufrutuário. O Código
titular passivo. O seu direito é absoluto; dirige-se tanto ao proprietário como italiano não se refere a este modo de extinção, e julgamos também, já como nos
a terceiros, o que torna impossível, teàricamente, a figura da confusão. Já no orientámos em matéria de servidões, que não há vantagem em referir uma
nosso anteprojecto sobre servidões prediais, evitámos o emprego daquela palavra forma de extinção que resultará ou não resultará da aplicação de princípios
(art.° 30.0), admitindo, todavia, a extinção pela reunião dos dois domínios na gerais a consagrar noutro capítulo do Código. Isto sob um aspecto, porque noutro,
mesma pessoa, com base no princípio, aqui também aplicável, de que nemine não pode deixar de considerar-se irrenunciável o usufruto quando a sua
res sua servit. existência assenta em regimes de ordem pública, tal como, o do usufruto legal
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dos-pais. Este direito, por estar integrado no poder paternal, e dele fazer parte, NOTA — A disposição do art° 2 243 do Codigo Civil em confronto
°
parece ser de sua natureza irrenunciável, dando-se a esta palavra o seu sentido com a do n.° 6.° do art.° 2.241.° e com as dos art.°° 2.246.° e 2.247.°, revela
rigoroso de negócio jurídico unilateral. a influência de doutrinas romanistas, hoje em grande parte abandonadas pelas -~
Referimo-nos, por último, à perda total da coisa usufruída. Que a perda legislações modernas.
total da coisa sobre que incide um direito real, implica a extinção desse mesmo Parecem dominar na nossa lei os seguintes princípios: se se perde a coisa
direito, é doutrina geral que não oferece dúvidas. Elas suscitam-se porém, principal extingue-se o usufruto; se se perde a coisa acessória continua o usufruto
a propósito da perda parcial ou da rei mutatio. Vê-las-emos a propósito doutros em relação à principal; se se perde em parte a coisa principal, continuando,
artigos. porém, a restante a manter a sua finalidade própria, o usufruto continua sobre
esta parte. Não são soluções que necessàriamente resultem do art.° 2.243.°,
ARTIGO 440
mas é a doutrina que manifestamente inspirou os art.°° 2.246.° e 2.247.°. Sendo
o edifício a coisa principal, se este se destruiu, diz o primeiro daqueles artigos,
não terá o usufrutuário direito de desfrutar, nem o solo, nem os materiais
Usufr~uto até certa idade de terceira pessoa restantes; sendo o edifício um acessório do prédio rústico, diz o segundo dos
artigos, poderá o usufrutuário gozar do solo e dos materiais.
O usufruto, concedido a alguém até certa idade de terceira Este problema prende-se com um outro que procuramos resolver no a.° 2.°
pessoa, durará pelos anos prefixos, ainda que essa terceira pessoa deste artigo. ~ o de saber se a rei mutatio deve importar a extinção do usufruto,
faleça antes, salvo se o dito usufruto tiver sido expressamente ou se o usufrutuário pode continuar a usufruir os resíduos que ainda tenham
concedido só em atenção à existência da dita pessoa. alguma utilidade ou valor económico. São correntes os casos em que, embora não
seja já possível aproveitar a coisa em harmonia com a sua finalidade económica,
NOTA —Transcrevemos sem qualquer alteração o art.° 2.245.° do Código não fica inteiramente destruída a sua utilidade ou o seu valor. Se um automóvel
Civil, cuja doutrina, na sua primeira parte, se inspira no art.° 620.° do Code de se inutilizar, como tal, fica a sucata ainda aproveitável; de um prédio urbano
Napoléon. Trata-se duma norma interpretativa da vontade. Supõe o legislador incendiado, fica o terreno e ficam alguns materiais de construção; de um rebanho
que não foi a vida de terceiro que se tomou em consideração, mas um certo extinto por uma epidemia, podem ficar os despojos, etc., etc.. -
número de anos. Como regra absoluta, ela é, evidentemente, perigosa; mas No direito romano entendia-se que a rei mutatio importava a extinção do
o nosso legislador tomou as cautelas convenientes, admitindo desvios na segunda usufruto, e há, na verdade, uma certa correspondência entre esta solução e a ideia
parte daquele artigo (cfr., na mesma orientação, o Código espanhol, art.° 516.0). de que deve sempre respeitar-se o destino económico da coisa. Dir-se-á: desde
Ë nestas condições que aceitamos a doutrina. que não é possível respeitar esse destino, porque a coisa se transformou, não há
razão para a subsistência do direito.
Foram estes os princípios que inspiraram o nosso art.° 2.246.°, assim como
ARTIGO 45° o art.° 624.° do Código francês, na parte em que ambos negam ao usufrutuário
o direito de desfrutar o solo e os materiais restantes. Afastaram-se já claramente
da tradição romanista os Códigos italiano de 1865 (art.° 520.0) e de 1942
Perda parcial e «rei mutatio»
(art.° 1.018.0), e o espanhol (art.° 517.°).
Cremos que esta última é a boa orientação. A tradição romana tem apenas
1. Se a coisa usufruída se perdér só em parte continuará por si a lógica jurídica, pois nem se compreende que um caso fortuito, um
o usufruto na parte restante. incêndio, por exemplo, venha atribuir ao proprietário da raiz poderes que ele,
2. É de aplicar a disposição do número anterior se a coisa como tal, não deveria exercer senão depois da extinção normal do usufruto,
se transformar noutra que ainda tenha valor, embora com finali nem se justifica que ao usufrutuário seja coarctado um direito de que virtualmente
dade económica distinta. é titular, só porque as circunstâncias impõem uma nova, exploração económica.
90 91
Estas razões justificam a doutrina que formulámos genèricamente no n.° 2.° tário e outra para o usufrutuário, considerando-se extinto o usufruto, O sistema,
deste artigo. Noutra disposição resolveremos o caso especial das construções. porém, consagrado, da inversão da soma recebida em títulos da dívida pública
consolidada, ou dado a juros, com audiência do usufrutuário, deve ser eliminado
e substituído pelos princípios gerais que adoptámos sobre usufruto de capitais.
ARTIGO 46.°
No n.° 2.° referimo-nos às requisições ou expropriações por utilidade pública. de 1942 (art.° 1.018.°, 2.~ parte).
~ assinalada pelos autores a analogia entre estes casos e o da perda da coisa No n.° 3.° reproduzimos, sem alteração, a doutrina do art.° 2.247.° do
por culpa de terceiro, e isso nos leva a resolvê-los no mesmo artigo. Código Civil.
Já, neste domínio, o nosso Código (art.° 2.248.0) se afastou da regra,
possIvelmente mais lógica no ponto de vista jurídico, mas não conveniente, de
estabelecer, tal como referimos acima, duas indemnizações, uma para o proprie.
92 93
[
No caso de este não querer segurar a coisa ou pagar os respectivos prémios,
ARTIGO 48.°
é que deve poder então o proprietário, para evitar prejuízos futuros, fazer o seguro,
auferindo, desta forma, todas as vantagens. No seu interesse impõe-se, ou esta
Seguro da coisa destruída solução, ou a de considerar o usufrutuário responsável, na falta de seguro, pelas
consequências, como se se tratasse de um acto de má administração. Neste último
sentido se orientam os Códigos alemão (~ 1.045.°) e suíço (art.° 767.°)
1. Se o usufrutuário tiver feito o seguro da coisa, ou pago e o projecto italiano da Comissão Real (art.° 145.0). Foi considerado em Itália,
os prémios pelo seguro já feito, o usufruto transfere-se para a e parece-nos que bem, demasiadamente gravosa esta última solução.
indemnização recebida.
2. Tratando-se de um edifício, o proprietário poderá recons
truí-lo, transferindo-se neste caso o usufruto para o novo edifício. ARTIGO 49.°
Se, porém, a soma dispendida na reconstrução for superior à in
demnização recebida, o direito do usufrutuário será proporcional Mau uso por parte do usufrutuário
à indemnização.
3. Sendo os prémios pagos pelo proprietário, a este perten O usufruto não se extingue, ainda que o usufrutuário faça mau
cerá por inteiro a indemnização. uso da coisa usufruída; mas, se o abuso se tornar consideràvelmente
prejudicial ao proprietário, poderá este req~erer, ~ie se lhe
NOTA — O confronto deste artigo com o preceituado nos três parágrafos entregue a coisa, obrigando-se a pagati anualmente ao ~setfrutuário
do art.° 2.246.° do Código Civil, revela algumas importantes divergências.
o produto líquido da dita coisa, de~ois dé~4eduzid~ despesas .~
Dá-se à dispqsição, em primeiro lugar, maior amplitude. Enquanto aqueles
parágrafos se referem exclusivamente a edifícios, deixando-se sem regime as outras
e o prémio, que pela sua administração lh~~
coisas, regulam-se agora genèricamente todos os casos, e apenas especialmente
se prevê, quanto a edifícios, a hipótese de o proprietário querer proceder à sua NOTA — Reproduz-se o art.° 2.
reconstrução, aceitando-se a doutrina do Código italiano de 1942 (art.° 1.01 9•0), As siluções adoptadas nas ~ entre dois ~istemas: o de
já parcialmente formulada no nosso Código. considerar extinto o usufruto se o usufrutuário fizer mau uso da coisa, e o da
A orientação geral agora seguida foi também a de não estabelecer para entrega da coisa ao proprietário, mediante .~o pagamento do rendimento líquido
a indemnização proveniente do seguro uma disciplina diferente da adoptada para ao usufrutuário. Segundo o Código brasileiro (art.° 739.0, VII), por exemplo,
os outros casos de sub-rogação previstos nos artigos anteriores, desde que considera-se extinto o usufruto «por culpa do usufrutuário, quando aliena,
o usufrutuário tenha voluntàriamente pago os prémios respectivos. Pareceu-nos deteriora, ou deixa arruinar os bens, não lhes~ acudindo com os reparos de
que não deve interessar, por um lado, o facto de este ter sido solicitado pelo conservação». O Código espanhol (art.° 520.0), por sua vez, reproduzindo a dis
proprietário para o pagamento, como não deve, em caso algum, ser atribuído posição do nosso art.° 2.249.°, situa-se na soluçãô oposta. Podem considerar-se
ao usufrutuário o pleno domínio da indemnização. Os diferentes parágrafos do intermédias as soluções dos Códigos francês (art.° 618.0) e italianos de 1865
art.° 2.247.°, se é que não estão alterados pelo ~ 3.° do art.° 428.° do Código e 1942 (art.00 516.° e 1.015.0). Todos atribuem à autoridade judicial o poder
Comercial, supõem, a nosso ver erradamente, que a obrigação de seguro da coisa de decidirem, conforme as circunstâncias, pela extinção do usufruto, ou por
incide conjuntamente sobre os dois titulares, pelo que a falta de um deles outra solução, que é no Código francês a da entrega dos bens ao proprietário
importa a atribuição do direito à indemnização exclusivamente ao outro. Não nos mediante o encargo de pagar anualmente ao usufrutuário uma soma determinada,
parece isto razoável. O encargo do seguro deve considerar-se, em princípio, inerente e que pode ser nos Códigos italianos, a exigência de uma garantia, a locação
aos frutos da coisa, pelo que não deve o usufrutuário ter direito, em qualquer da coisa, a sua colocação sob administração de terceiro, ou a sua entrega ao
hipótese, à indemnização, senão como usufrutuário dela. proprietário mediante o pagàmento duma prestação anual ao usufrutuário.
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A solução da extinção do usufruto era desconhecida do direito romano, e não
foi sem uma forte reacção da doutrina que em França e na Itália se permitiu respectivos frutos, quanto o exigirem as suas necessidades pessoais
aos tribunais a aplicação dessa sanção, considerada em geral mais de e as da sua família.
ordem penal do que privada, dada a não existência de relações sinalagmáticas 2. Quando este direito se refere a casas de morada chama-se
entre o usufrutuário e o proprietário, que permitissem considerar a sanção como direito de habitação.
o resultado do não cumprimento dum contrato. Esta e a razão de que a entrega
da coisa ao proprietário é suficiente para assegurar os seus direitos e evitar
prejuízos, levam-nos a manter a solução tradicional. - NOTA — Engloba-se neste preceito a doutrina dos art.°’ 2.254.° e 2.257.°
Ë difícil indicar com precisão os pressupostos de facto em que deve fundar-se do Código Civil com algumas alterações de forma.
a decisão dos tribunais. Qualquer enumeração de causas terá de ser exemplificativa, Embora compreensível, não é muito correcta a parte final daquele primeiro
pelo que nos pareceu suficiente a fórmula vaga do nosso direito. artigo, como tem sido justamente notado pelos autores. Parece depreender-se
dele que, sendo suficientemente abastado o usuário, e não carecendo, por isso,
de usar e fruir a coisa, cessa o seu direito, o que não representa a intenção normal
ARTIGO 50.° do instituidor. --
o- direito de retenção, que o usufrutuário ou seus herdeiros tenham Entre a redacção proposta e a do Código italiano de 1942 há uma diferença
por desembolsos de que devam ser pagos. sensível na parte em que limitamos o uso, e náo apenas os fruto~, às necessidades
pessoais do usuário. Do texto italiano (art.° 1.021.0) tem-se deduzido a solução
NOTA — A doutrina que aceitamos contém-se no art.° 2.251.° do Código de que, quanto ao uso, é possível a sua constituição em benefício de pessoas
Civil. Encontra-se também formulada nos Códigos espanhol (art.° 522.0) e italiano jurídicas, por não se haver limitado o seu exercício à satisfação de necessidades
de 1942 (art.° 1.001.0). De novo apenas fizemos referência, à semelhança deste pessoais. A uma sociedade, por exemplo, poderá ser atribuído o direito de habitar
último código, ao art.° 1 6.°, que estabelece regime especial para as coisas con uma casa, ou seja o direito de nela instalar um estabelecimento, ou o direito de
sumíveis. usar um automóvel. Parece-nos que as necessidades do comércio jurídico não -
A última parte do artigo deverá ser considerada provisória. Dependerá justificam esta ampliação da já rara figura do uso. Pode perfeitamente adaptar-se
certamente da forma por que se vier a regular o direito de retenção. a essas necessidades o usufruto com quaisquer limitações impostas pelo instituidor,
o que neste anteprojecto, como no direito vigente, é admitido.
A possibilidade de o usuário aproveitar os- frutos não é a solução tradicional,
CAPÍTULO V se nos reportarmos às origens Éomanas do instituto. A fronteira que marcava
os limites dos dois institutos usufruto e uso era precisamente essa.
USO E HABITAÇÃO — —
ARTIGO 52.°
Na família do usuário ou do morador usuário compreendem-se
apenas o cônjuge, não separado de pessoas e bens, os filhos sol
Constituição, extinção e regime
teiros, outros parentes a quem sejam devidos alimentos, e as pessoas
que, convivendo com o respécti’vo titular, se encontrem ao seu
Os direitos de uso é de habitação constituem-se e extinguem-se
serviço ou das pessoas designadas.
pelos mesmos modos que o usufruto, e são igualmente regulados
pelo seu título constitutivo; na falta ou deficiência deste, observar-
-se-ão as disposições seguintes. NOTA — A facilidade com que alguns autores, entre nós, têm dado à família,
para este efeito, um alcance tal que nela compreendem os ascendentes, os sogros,
NOTA—Contém este preceito a doutrina do art.° 2.255.°. os sobrinhos, e ainda outros parentes, mostra a vantagem de fixar, supletiva
A natureza flexível do direito de uso é admitida pelo Código francês mente, claro é, uma limitação.
(art.° 628.°), não obstante a falta de declaração expressa no mesmo sentido em Damos ao problema a solução que lhe foi dada pelos Códigos italiano
relação ao usufruto. Já atrás dissemos, a propósito do art.° 7•0, que a solução de 1942 (art.° 1.023.0) e brasileiro (art.° 744.0), com a aceitação de algumas
do nosso direito diverge da solução admitida pela generalidade das legislações sugestões da doutrina. Em ambos esses códigos são mencionados os filhos
estrangeiras, que atribuem ao usufruto, como ao uso, uma configuração rígida. solteiros e as pessoas que prestam serviços domésticos. Não há no Código italiano
Admitida a elasticidade do usufruto, claro que não pode agora discutir-se o pro referência expressa ao cônjuge do usuário, nias a doutrina é unânime em o con
blema em relação ao uso. siderar abrangido pelo preceito. Quanto aos parentes a quem são devidos alimentos,
os autores italianos dividem-se. Se, por um lado, pode entender-se que esta
obrigação não deve incidir indirectamente sobre o proprietário, por outro lado,
não pode deixar de se notar que, ao constituir-se o direito de uso ou de habitação,
ARTIGO 530
se têm normalmente em vista as pessoas a quem são devidos alimentos pelo
beneficiário.
Fixação das necessidades peisoais O Código brasileiro ao mencionar as pessoas que prestam serviços ao titular
do direito fala em serviços domésticos, e o Código italiano apenas em serviço,
As necessidades pessoais do usuário ou do morador usuário tanto ao titular como à família. Optámos por esta última forma, sobretudo por
uma razão: a de se abrangerem alguns casos especiais apontados pelos autores
são fixadas segundo a sua condição social.
italianos, como o de o usuário, velho ou doente, precisar de ter em sua com
panhia, para lhe prestar assistência, um parente ou outra pessoa, não vinculada
NOTA —Pareceu-nos conveniente estabelecer um critério, embora necessària por contrato de serviços domésticos.
mente vago, de fixação das necessidades pessoais do usuário ou do morador
99 -
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J
.ARTIGO 55° ARTIGO 57.°
NOTA — Corresponde, com algumas alterações de forma, ao art.° 2.258.° NOTA — Damos um carácter genérico à disposição, à semelhança do Código
do Código Civil. A mesma doutrina está consagrada na generalidade das legisla espanhol (art.° 528.°), do Código brasileiro (art.° 745.0), e do Código italiano
ções (cfr. art.00 631.° e 634.° do Código francês, 525.° do Código espanhol, de 1942 (art.° 1 .O26.°). Pareceu-nos perigosa a indicação taxativa de preceitos,
528.° do Código italiano de 1865, e 1.024.° do Código italiano de 1942) tal como se faz no nosso Código, tanto mais que é possível que, num ou noutro
e funda-se no carácter estritamente pessoal do direito, que é atribuído com caso, a aplicação das regras do usufruto deva ficar dependente da especial con
o objectivo de assegurar de certa maneira alimentos aos respectivos titulares. figuração que se tenha dado ao uso ou à habitação.
P. A. PIRFS DE LIMA
ARTIGO 56.°
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íNDICE
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