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RESENHA

VIEGAS, Cláudia Mara de Almeida Rabelo; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. A


MULTIPROPRIEDADE IMOBILIÁRIA À LUZ DA LEI 13.777/2018, Belo Horizonte, p.
91-118, 6 set. 2019.

O conceito em questão de multipropriedade, presente no segundo capítulo,


consiste em um entendimento contemporâneo que demonstra a disposição de bens,
sendo distinto da propriedade tradicional, tendo em vista que o bem pode ser usufruído
de coisa comum por diversos titulares, de maneira particular por um período de tempo
pré-determinado podendo ter um benefício financeiro, atendendo também uma
relevância social. Para a compreensão de tal noção, deve-se entender o percurso
histórico da propriedade privada até a multipropriedade. O nascimento da propriedade é
algo debatido por diversos ramos e suas principais premissas são de ser um direito
natural, tem origem com o surgimento do indivíduo e é intrínseco ao estado e também
pela premissa de que tal direito à propriedade é oriunda do Estado. É indubitável
entender que o meio e período influenciaram diretamente no progresso do entendimento
de propriedade, alterando assim, aspectos morais, jurídicos e econômicos do ser
humano.

Desse modo, descrito no terceiro capítulo da obra, esta concepção,


consequentemente, progride juntamente com a passagem de estado do homem selvagem
para a do homem sedentário, tendo às populações fixas em locais físicos estipulados,
tendo sua renda e sobrevivência da terra. Ademais, ao passar das épocas, foi se
vinculando a propriedade como posse da nobreza, religião e como um bem de direito
absoluto e perpétuo podendo ter a serventia que bem entender de seu proprietário.
Posteriormente, foi adotada o entendimento de bem individual, mas com ótica
democrático, surgindo assim, uma linha jusnaturalista e contratualista.

Com isso, é chegado o Estado Democrático de Direito, que aponta o direito da


propriedade passando a adquirir acepção de direito fundamental, efetuado de maneira a
concilia-lo com a função social. Por isso, a CF/88 acrescentou o direito de propriedade
como um direito fundamental individual, buscando a certificar ao indivíduo a própria
liberdade e dignidade. Este direito também revela um dos princípios fundamentais da
ordenação econômica do Brasil (art. 170, II e III, CR/88), agregando uma preservação
ao aproveitamento econômico do bem. Sintetizando, a propriedade, além de servir às
carências privadas do proprietário, deve se compatibilizar aos interesses da sociedade.
Assim, no período de 1960, com o intuito de aquisição de investimentos novos para
impulsionar os setores da economia da França, surge o instituto da multipropriedade
imobiliária. Nascendo com a circunstância jurídica da economia repartida, tendência
mundial pela qual pessoas oferecem ativos subempregados por meio de novas práticas
comerciais.

É apresentado a idéia de que a multipropriedade originou-se sob dois rumos, o


Timesharing e o Fractional. O primeiro está associado com uma relação jurídica de
direito obrigacional, pela qual o contratante tem aquisição somente de “unidades de
tempo”, que asseguram direito de uso do bem por período pré-fixado. No Brasil, o
Time-sharing está transcrito nos artigos 28 e 29 do Decreto-Lei nº 7.381/201024, que
regulamenta a Lei nº 11.771/2008. Ademais, no âmbito da Fractional, há obtenção da
propriedade imobiliária registrada junto a matrícula do imóvel, caso em que o
comprador se torna proprietário da parte temporal obtida, tendo seus ônus e bônus
relacionados a propriedade, como manifesto pela Lei nº 13.777/2018, com a
nomenclatura de multipropriedade. A Multipropriedade retrata várias categorias,
descritas no quarto capítulo do texto, tais como: multipropriedade societária, de direito
real sobre coisa alheia, hoteleira e imobiliária, estudadas no quesito da perspectiva da
natureza jurídica de sua configuração.

Outrossim, são apresentadas diversas fragmentações de multipropriedades que


tem grande importância na sociedade, tais como na multipropriedade societária ou
acionária, que é constituída uma sociedade, proprietária do empreendimento, da qual os
adquirentes tornam-se sócios, conferindo-lhes o direito de utilização periódica de certa
unidade; Na multipropriedade real sobre coisa alheia, que demonstra que o
multiproprietário é classificado como detentor de direito real limitado, incidente sobre
propriedade que se preserva no patrimônio jurídico do empreendedor; Na
multipropriedade imobiliária ou real se dá no método de gozo de móveis e imóveis, por
parcelas de tempo, sob o controle de condomínio, garantindo a cada coproprietário o
direito de uso e desfrute exclusivo e perpétuo, em certo período anual e Na
multipropriedade hoteleira se dá na aquisição da propriedade de fração temporal do
imóvel compartilhado, acrescentando a transmissão da gestão das funções à empresa
hoteleira, de maneira a haver, no mesmo empreendimento, dupla direção.

No Brasil, a natureza jurídica da multipropriedade imobiliária admitida é a de


que a multipropriedade tem natureza de direito real e, na hipótese de penhora do imóvel
objeto de subdivisão, o coproprietário pode se servir de Embargos de Terceiro para
resguardar sua quota-parte.

É interessante ressaltar, presente no quinto capítulo do texto que dispõe sobre as


peculiaridades e efeitos da multipropriedade, que a multipropriedade tem a
possibilidade de ser por ação inter vivos contrato (de compra e venda) ou mortis causa
(testamento, registrado no competente Cartório de Registro de Imóveis), devendo correr
do ato a especificação dos períodos correspondentes a cada parcela de tempo. É de suma
importância se atentar com as regras, regulamentos para adequação desta instituição que
abrange diversas áreas e situações, que geram direitos e obrigações. Além do mais,
deve-se entender que, uma vez registrada a aquisição de fração temporal de um bem
imóvel em multipropriedade, o titular conquista o direito real de propriedade do
respectivo bem, que será efetuado de forma temporal, reiterado anualmente, de forma
cíclica e com caráter ininterrupto. Com relação ao tempo, o que cada parte que houve a
aquisição é indivisível, tendo o prazo mínimo, 7 (sete) dias, seguidos ou intercalados,
podendo ser determinados e estipulados, no mesmo período de cada ano ou incerto, caso
em que a escolha do período será feita de forma periódica, através de método objetivo
que respeite, quanto a todos os multiproprietários, o princípio da isonomia. O sistema
misto, que combina o fixo e o flutuante, também será aceito, contudo, todos os
multiproprietários terão direito a uma mesma quantidade mínima de dias seguidos
durante o ano, podendo haver a aquisição de frações maiores que a mínima, com o
correspondente direito ao uso por períodos também maiores.

Consequentemente, entende-se que no que se diz ao objeto da multipropriedade,


o legislador brasileiro restringiu a incidência do instituto ao bem imóvel urbano ou
rural, o caráter indivisível do bem compartilhado, que não se sujeita à ação de divisão
ou de extinção de condomínio. Ademais, incluem-se no regime de aproveitamento
temporal, as instalações, os equipamentos e o mobiliário destinados a seu uso e gozo.
Deve-se recordar que mesmo um condomínio edilício poderá adotar o regime de
multipropriedade em parte ou na totalidade de suas unidades emancipadas, através de
previsão no instrumento de instituição ou deliberação da maioria absoluta dos
condôminos.

Há direitos e obrigações dos multiproprietários, estes expostos pelo legislador,


garantindo a cada um dos condôminos em multipropriedade o direito de usar e gozar do
imóvel, incluindo-se aí sua cessão ou locação no período de tempo correspondente à sua
própria fração de tempo. Declarou a cada condômino o direito de votar e de participar
das assembleias gerais do condomínio em multipropriedade, sendo o voto proporcional
à quota de fração de tempo de cada condômino.

A respeito das obrigações do multiproprietário, além daquelas previstas no


instrumento de instituição e na convenção de condomínio, fica a seu cargo pagar a
contribuição condominial, ainda que renuncie ao uso e gozo, total ou parcial, do imóvel,
das áreas comuns ou das respectivas instalações, equipamentos e mobiliário; responder
por danos causados ao imóvel, às instalações, aos equipamentos e ao mobiliário por si;
comunicar imediatamente ao administrador os defeitos, avarias e vícios no imóvel; não
modificar, alterar ou substituir o mobiliário do imóvel; conservar, manter e utilizar o
imóvel as instalações, equipamentos e mobiliário, conforme seu destino e natureza;
desocupar o imóvel, impreterivelmente, até o dia e hora fixados no instrumento de
instituição ou na convenção de condomínio em multipropriedade, sob pena de multa
diária; permitir a realização de obras ou reparos urgentes.

Com relação ao direito de preferência na multipropriedade, expresso no artigo


quinto, determinado no art. 504 do CC, demonstra que se um dos condôminos quiser
dispor de sua cota parte, deverá, obrigatoriamente, oferecê-la a outro consorte, sob pena
de nulidade do ato, nos termos da lei. Ante tal comando, há doutrinadores defendendo a
submissão da multipropriedade, constituída sob a forma de condomínio, ao direito de
preferência50. No entanto, não se concorda com tal posicionamento. Tendo o legislador
regulamentado a propriedade em unidades autônomas, a rigor, o direito de preferência
previsto no art. 504 do Código Civil Brasileiro não se aplica na venda de fração
temporal de imóvel entre multiproprietários, ou seja, é válida a alienação da quota-parte
do coproprietário, sem o oferecimento do direito de preferência aos detentores de fração
maior do imóvel.

Para mais, o legislador esclarece que os multiproprietários não terão direito de


preferência quando da alienação de qualquer outra fração de tempo do mesmo imóvel,
não sendo necessária a comunicação ou concordância dos demais. Então, fica ressalvada
a possibilidade de se prever a preempção, em favor do instituidor do condomínio ou
entre os diversos multiproprietários, no título constitutivo ou na convenção de
condomínio, privilegiando o livre exercício da autonomia privada das partes.
No tocante aos efeitos do inadimplemento do multiproprietário, cada um
responde individualmente pelo custeio das obrigações de sua fração temporal, não
havendo solidariedade entre os diversos multiproprietários. É o caso do IPTU,
obrigação propter rem que recai sobre a fração periódica do devedor, não sendo possível
responsabilizar os demais multiproprietários por uma dívida própria. Até porque, no
caso de inadimplemento, o Fisco poderá executar a unidade periódica do devedor para
quitação da dívida tributária, sem alcançar ou prejudicar os demais multiproprietários.
Contudo, na hipótese de o imóvel objeto da multipropriedade ser parte integrante de
empreendimento, em que haja sistema de locação das frações de tempo, por meio de
uma administração única, repartindo entre si as receitas das locações,
independentemente da efetiva ocupação de cada unidade autônoma, poderá a convenção
do condomínio edilício estabelecer que em caso de inadimplência: o inadimplente fique
proibido de utilizar o imóvel até a integral quitação da dívida; a fração de tempo do
inadimplente passe a integrar o pool da administradora; a administradora do sistema de
locação fique automaticamente munida de poderes e obrigada a, por conta e ordem do
inadimplente, utilizar a integralidade dos valores líquidos a que o inadimplente tiver
direito para amortizar suas dívidas condominiais, seja do condomínio edilício, seja do
condomínio em multipropriedade, até sua integral quitação, devendo eventual saldo ser
imediatamente repassado ao multiproprietário.

Já acerca da possibilidade de incidência de gravames na unidade periódica, é


apresentado a possibilidade de incidência de gravames sobre o bem imóvel objeto de
multipropriedade, e a forma de sua execução. Incluída nos direitos reais, é legítima a
incidência de gravame sobre a coisa, desde que o ônus incida apenas na quota-parte do
devedor multiproprietário, sob pena de violação do direito de propriedade dos demais
co-titulares. Devido a isso, é admissível a incidência de gravames no bem
compartilhado, nos limites da fração do executado.

Em suma, mesmo sendo um tema recente com relação aos já inseridos neste
meio, é uma solução para divergências judiciais de grande relevância e frequência. Esta,
surgindo como forma de auxiliar na ascensão da economia em crise econômica mundial,
consistindo na realização de indivíduos que escolhem pela obtenção repartida de
determinada propriedade, pelo fato da não detenção de abundantes capitais para investir.

A presença deste instituto no Brasil vinha produzindo relutância e receios ao


meio jurídico, devido a ignorância sobre tal assunto. Contudo, a promulgação da Lei
13.777, que regulamenta a multipropriedade imobiliária, dando nova redação ao artigo
1.358 do Código Civil e aos artigos 176 e 178 da Lei 6.015/73, a Lei de Registros
Públicos, objetiva estimular o direito de propriedade e extrair a insegurança jurídica que
afetava o instituto. Tal ato trouxe vários benefícios que popularizam e facilitam o
emprego de tal aspecto jurídico. Assim, se dá na categoria de compartilhamento de
propriedade no tempo e não apenas no espaço, que alavanca a economia do país,
permitindo, num só ato, que pessoas de classes menos privilegiadas consigam adquirir
um imóvel de alto valor, com investimento de menor custo, além de poder beneficiar o
setor hoteleiro. Tendo tal lei descrita como um marco relevante para o setor imobiliário
brasileiro.

Diante ao exposto, conclui-se que a multipropriedade ainda depende de


intervenções da doutrina e do legislador, mas a recente Lei da Multipropriedade
Imobiliária já foi um avanço notável. Tal instituto tem e terá grande impacto no
mercado econômico do país, consequência da facilidade que a multipropriedade
possibilita no ingresso ao mercado imobiliário de pessoas sem uma receita abundante.

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