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MATERIAL DE APOIO | PROFESSOR FLÁVIO TARTUCE

Negócios Imobiliários
DIREITO DAS COISAS (CC, ARTS. 1.196 A 1.510-A)

Aula Professor Flávio Tartuce

1. Introdução. Direito das Coisas x Direitos Reais


Direito das Coisas: ramo do Direito Civil que tem por objeto o estudo e a regulamentação das
relações de domínio – Livro do Código Civil de 2002.

Obs.: A usucapião é uma das formas de converter a posse em propriedade.

Questão: quem é o sujeito passivo da relação dominial? O sujeito passivo é universal, ou seja, é
toda a coletividade. Por isso, os efeitos dessa relação são, em regra, “erga omnes”.
Entre os civilistas, prevalece o entendimento segundo o qual não existe posse ou propriedade
sobre bens incorpóreos ou imateriais. Portanto, inadmite-se a expressão “propriedade intelec-
tual”, empregando-se “direitos intelectuais” ou “direitos de autor” (José de Oliveira Ascensão e
Silmara Chinellato).
No mesmo sentido, a Súmula 228 do STJ: “É inadmissível o interdito proibitório para a proteção
do direito autoral”.
• Também por isso há um grande equívoco técnico no tratamento dos fundos de investimen-
to inserido no CC/2002 pela Lei da Liberdade Econômica (Lei 13.874/2019) (CC, arts. 1368-
C1 até 1.368-F).
1 CC, art. 1368-C: “O fundo de investimento é uma comunhão de recursos, constituído sob a forma de condomínio de
natureza especial, destinado à aplicação em ativos financeiros, bens e direitos de qualquer natureza. (Incluído pela
Lei nº 13.874, de 2019). § 1º Não se aplicam ao fundo de investimento as disposições constantes dos arts. 1.314
ao 1.358-A deste Código. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019). § 2º Competirá à Comissão de Valores Mobiliários
disciplinar o disposto no caput deste artigo. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019). § 3º O registro dos regulamentos
dos fundos de investimentos na Comissão de Valores Mobiliários é condição suficiente para garantir a sua publicidade
e a oponibilidade de efeitos em relação a terceiros. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)”

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O termo “Direitos Reais” significa um conjunto de categorias ou institutos relacionados à


propriedade, seja ela plena ou limitada (previstos no art. 1.225 do Código Civil2).

São direitos reais:


• Inc. I: propriedade plena.
• Inc. II: superfície.
• Inc. III: servidões.
• Inc. IV: usufruto.
• Inc. V: uso.
• Inc. VI: habitação.
• Inc. VII: direito do promitente comprador do imóvel – Trata-se do compromisso de compra
e venda registrado na matrícula do imóvel.
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• Inc. VIII: penhor.


• Inc. IX: hipoteca.
• Inc. X: anticrese.

• Inc. XI: concessão de uso especial para fins de moradia.


• Inc. XII: concessão de direito real de uso.

• Inc. XIII: a laje – incluído pela Lei nº 13.465/17.

→ Observação: sobre a natureza jurídica da laje, há duas correntes:


• Direito real de gozo ou fruição sobre coisa alheia (superfície) (Mazzei, Simão, Stolze, Pam-
plona e Tartuce).
• Direito real sobre coisa própria (Rosenvald, Kümpel e Carlos Elias de Oliveira).
→ Questão: o rol do artigo 1.225 do Código Civil é taxativo (“numerus clausus”) ou exemplifica-
tivo (“numerus apertus”)? Existem duas correntes:

• Visão clássica (1ª corrente) (majoritária, inclusive para provas de 1ª fase): rol taxativo (prin-
cípio da taxatividade) (Caio Mário, Orlando Gomes, Maria Helena Diniz e Álvaro Villaça).

2 CC, art. 1.225: “São direitos reais: I – a propriedade; II – a superfície; III – as servidões; IV – o usufruto; V – o uso; VI – a
habitação; VII – o direito do promitente comprador do imóvel; VIII – o penhor; IX – a hipoteca; X – a anticrese. XI – a
concessão de uso especial para fins de moradia; XII – a concessão de direito real de uso; e XIII – a laje”.

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• Visão contemporânea (2ª corrente) (minoritária, por enquanto): rol exemplificativo.


Subcorrentes:
• Não há taxatividade, mas há tipicidade, ou seja, necessidade de previsão em lei (Gustavo
Tepedino).
• Não há taxatividade, nem tipicidade. A autonomia privada pode criar novos direitos reais
(Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald). Exemplo: “Time-sharing”.

→ Existem direitos reais que não estão no rol do artigo 1.225 do Código Civil, estando previs-
tos em leis especiais.

Exemplo: alienação fiduciária em garantia (direito real de garantia sobre coisa própria):
• Em se tratando de bens móveis, a alienação fiduciária em garantia está regulamentada pelo
Dec.-Lei nº 911/69.
• Em se tratando de bens imóveis, ela está regulamentada pela Lei nº 9.514/97.
A respeito do “time-sharing” (multipropriedade imobiliária fracionada no tempo), há um
precedente do STJ (REsp nº 1.546.165/SP) no sentido de que ele é um direito real, mas que não
supera a ideia de taxatividade do rol do art. 1.225 do Código Civil, confirmando a 1ª corrente:
“PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. MULTIPROPRIEDADE
IMOBILIÁRIA (TIME-SHARING). NATUREZA JURÍDICA DE DIREITO REAL. UNIDADES FIXAS DE
TEMPO. USO EXCLUSIVO E PERPÉTUO DURANTE CERTO PERÍODO ANUAL. PARTE IDEAL DO
MULTIPROPRIETÁRIO. PENHORA. INSUBSISTÊNCIA. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO.
1. O sistema time-sharing ou multipropriedade imobiliária, conforme ensina Gustavo Tepedino,
é uma espécie de condomínio relativo a locais de lazer no qual se divide o aproveitamento
econômico de bem imóvel (casa, chalé, apartamento) entre os cotitulares em unidades fixas de
tempo, assegurando-se a cada um o uso exclusivo e perpétuo durante certo período do ano. 2.
Extremamente acobertada por princípios que encerram os direitos reais, a multipropriedade
imobiliária, nada obstante ter feição obrigacional aferida por muitos, detém forte liame com
o instituto da propriedade, se não for sua própria expressão, como já vem proclamando a
doutrina contemporânea, inclusive num contexto de não se reprimir a autonomia da vontade
nem a liberdade contratual diante da preponderância da tipicidade dos direitos reais e do
sistema de numerus clausus. 3. No contexto do Código Civil de 2002, não há óbice a se dotar
o instituto da multipropriedade imobiliária de caráter real, especialmente sob a ótica da
taxatividade e imutabilidade dos direitos reais inscritos no art. 1.225. 4. O vigente diploma,
seguindo os ditames do estatuto civil anterior, não traz nenhuma vedação nem faz referência
à inviabilidade de consagrar novos direitos reais. Além disso, com os atributos dos direitos
reais se harmoniza o novel instituto, que, circunscrito a um vínculo jurídico de aproveitamento
econômico e de imediata aderência ao imóvel, detém as faculdades de uso, gozo e disposição
sobre fração ideal do bem, ainda que objeto de compartilhamento pelos multiproprietários de
espaço e turnos fixos de tempo. 5. A multipropriedade imobiliária, mesmo não efetivamente
codificada, possui natureza jurídica de direito real, harmonizando-se, portanto, com os
institutos constantes do rol previsto no art. 1.225 do Código Civil; e o multiproprietário, no
caso de penhora do imóvel objeto de compartilhamento espaço-temporal (time-sharing),
tem, nos embargos de terceiro, o instrumento judicial protetivo de sua fração ideal do bem
objeto de constrição. 6. É insubsistente a penhora sobre a integralidade do imóvel submetido
ao regime de multipropriedade na hipótese em que a parte embargante é titular de fração

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ideal por conta de cessão de direitos em que figurou como cessionária. 7. Recurso especial
conhecido e provido” (REsp 1546165/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Rel. p/
Acórdão Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 26/04/2016, DJe
06/09/2016).
→ Observação: em 2018, a Lei 13.777 introduziu os artigos 1.358-B a 1.358-U no Código Civil,
tratando da multipropriedade imobiliária.

2. Diferenças entre os Direitos Reais e os Direitos Pessoais Patrimoniais

Exemplos (por excelência):


• Direitos reais: propriedade.
• Direitos pessoais patrimoniais: contrato.

Direitos reais Direitos pessoais patrimoniais


Relação entre um sujeito ativo e uma coisa. O Relação pessoal entre um sujeito ativo (credor)
sujeito passivo é universal. e um sujeito passivo (devedor).
Princípio da publicidade (tradição ou registro). Princípio da autonomia privada.
Rol taxativo art. 1.225, CC Rol exemplificativo – art. 425, CC3.
Efeitos “erga omnes” (absolutos) Efeitos “inter partes” (relativos).
O patrimônio do devedor responde pelas
A coisa responde.
dívidas.
Caráter permanente. Caráter transitório.

O quadro divisório ainda existe, mas há uma tendência de aproximação entre os direitos reais e
os direitos pessoais patrimoniais, “contratualizando” o Direito das Coisas (Luciano de Camargo
Penteado – “Contratos de Direito das Coisas”).

Demonstrando essa aproximação (5 aspectos):

→ 1º aspecto: há uma tendência em se afirmar que o rol do art. 1.225 do Código Civil não é
taxativo, mas exemplificativo.
→ 2º aspecto: em muitos casos, o direito real origina-se da autonomia privada.
→ 3º aspecto: há uma tendência doutrinária e jurisprudencial de aplicação da boa-fé objetiva
aos direitos reais.
→ 4º aspecto: nem sempre o direito real terá efeitos “erga omnes”. Exemplo:
• Súmula 308 do STJ4: a boa-fé objetiva vence a hipoteca, que passa a ter efeitos “inter partes”.

3 CC, art. 425: “É lícito às partes estipular contratos atípicos, observadas as normas gerais fixadas neste Código.”
4 Súmula 308 do STJ: “A hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração
da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel”.

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Além disso, nem sempre o direito pessoal terá efeitos “inter partes”. Exemplo:
• A função social do contrato na sua eficácia externa (Enunciado nº 21 – I Jornada de Direito
Civil5). O contrato pode gerar efeitos perante terceiros. Exemplo: CC, art. 6086 (teoria do
terceiro cúmplice).

→ 5º aspecto: nem sempre o direito real terá caráter permanente. Exemplos: alienação fiduciá-
ria em garantia e condomínio comum.
Por outro lado, nem sempre o contrato será transitório – Exemplo: contratos cativos de longa
duração (Cláudia Lima Marques) (“casamentos contratuais”).
Observação: Além desses cinco aspectos de aproximação, existem conceitos híbridos, que es-
tão no “meio do quadro”. Exemplo: obrigação “propter rem” (própria da coisa, mista, híbrida,
ambulatória ou reipersecutória) – Exemplo: dívidas condominiais (CC, art. 1.3457).

3. Noções Básicas de Posse (CC, arts. 1.196 a 1.224). Conceito, natureza


jurídica, teorias justificadoras e diferenças quanto à detenção

Conceito: domínio fático que uma pessoa exerce sobre uma coisa.
A posse estará presente quando a pessoa tiver pelo menos um dos atributos relativos à
propriedade (CC, art. 1.1968).

→ Atributos da propriedade (“GRUD”):


• Gozar/fruir.
• Reaver/buscar.
• Usar/utilizar.
• Dispor/alienar.

→ Propriedade:
• Plena: todos os atributos.
• Limitada: alguns atributos.
• Posse: basta um atributo.

5 Enunciado nº 21, I JDC: “A função social do contrato, prevista no art. 421 do novo Código Civil, constitui cláusula geral
a impor a revisão do princípio da relatividade dos efeitos do contrato em relação a terceiros, implicando a tutela
externa do crédito”.
6 CC, art. 608: “Aquele que aliciar pessoas obrigadas em contrato escrito a prestar serviço a outrem pagará a este a
importância que ao prestador de serviço, pelo ajuste desfeito, houvesse de caber durante dois anos”.
7 CC, art. 1.345: “O adquirente de unidade responde pelos débitos do alienante, em relação ao condomínio, inclusive
multas e juros moratórios”.
8 CC, art. 1.196: “Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes
inerentes à propriedade”.

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→ Afirmações:
• Todo proprietário é possuidor (direto ou indireto).
• Nem todo possuidor é proprietário. Exemplos: locatário, comodatário e depositário.

Natureza jurídica: segundo Moreira Alves, a posse é fato e é direito.


Questão: é um direito de qual natureza? A posse é um direito de natureza especial ou “sui ge-
neris”. Portanto, não é direito real nem direito pessoal.

Teorias justificadoras da posse (3).

a) Teoria subjetiva (Savigny)

→ P = C + AD.
Posse = “corpus” (domínio fático) + “animus domini” (intenção de ser proprietário da coisa).
→ Por esta teoria, o locatário, o comodatário e o depositário não são possuidores, pois falta-
-lhes a intenção de dono. Portanto, a teoria subjetiva não foi adotada no Brasil no CC/1916 nem
no CC/2002.

A teoria subjetiva, no Brasil, somente é relevante para fins de usucapião (posse “ad usucapio-
nem”).

b) Teoria objetiva ou simplificada (Ihering)


→ P = C.
Posse = “corpus” (domínio fático).
→ Dentro do “corpus”, há um “animus”, não de ser proprietário, mas de explorar economica-
mente a coisa.
→ Por essa teoria, o locatário, o comodatário e o depositário são possuidores.
→ Entre as duas teorias clássicas, esta foi a adotada no Brasil (CC, arts. 1.1969 e 1.19710); e tinha
sido adotado pelo Código Civil de 1916).

c) Teoria da posse social ou da função social da posse (Saleilles – França; Perozzi – Itália;
Hernandez Gil – Espanha).
P = C + FS.
Posse = “corpus” (domínio fático) + função social.

9 CC, art. 1.196: “Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes
inerentes à propriedade”.
10 CC, art. 1.197: “A posse direta, de pessoa que tem a coisa em seu poder, temporariamente, em virtude de direito
pessoal, ou real, não anula a indireta, de quem aquela foi havida, podendo o possuidor direto defender a sua posse
contra o indireto”.

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→ A função social é componente da posse.


Hernandez Gil citando Perozzi: Um homem caminha por uma rua com um chapéu na cabeça. Se-
gundo Savigny, tal indivíduo teria a posse sobre o chapéu, porque o tem sobre a cabeça, podendo
tirá-lo dela e nela recolocá-lo, estando pronto a defender-se caso alguém tentar arrebatá-lo. Para
Ihering, o sujeito seria considerado possuidor, porque aparenta ser o proprietário do chapéu. Por
fim, com Perozzi, nesse caso existe posse pois, quem tem o chapéu na cabeça torna aparente que
quer dispor dele só, e a sociedade, espontaneamente, se abstêm de importuná-lo.

→ Esta teoria foi adotada implicitamente pelo Código Civil de 2002, diante da valorização da
posse-trabalho.

Artigos:
• CC, art. 1.238, parágrafo único11: usucapião extraordinária. O prazo cai de 15 para 10 anos
se houver posse-trabalho.
• CC, art. 1.242, parágrafo único12: usucapião ordinária. O prazo cai de 10 para 5 anos se hou-
ver posse-trabalho ao lado de um requisito formal.
• CC, art. 1.228, §§ 4º e 5º13: desapropriação judicial privada por posse-trabalho (Miguel Re-
ale).

Posse (CC, art. 1.196) e detenção (CC, art. 1.19814).

→ O detentor também é chamado de “servidor da posse” ou “fâmulo da posse”.

→ O detentor tem a coisa em nome de outra pessoa, com quem tem relação de dependência,
recebendo ordens e instruções suas.

→ Exemplos:

• Exemplo 1: “Parei o meu carro em um estacionamento e entreguei as chaves ao manobrista”:

11 CC, art. 1.238: “Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel,
adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare
por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis. Parágrafo único. O prazo
estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia
habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo”.
12 CC, art. 1.242: “Adquire também a propriedade do imóvel aquele que, contínua e incontestadamente, com justo
título e boa-fé, o possuir por dez anos. Parágrafo único. Será de cinco anos o prazo previsto neste artigo se o
imóvel houver sido adquirido, onerosamente, com base no registro constante do respectivo cartório, cancelada
posteriormente, desde que os possuidores nele tiverem estabelecido a sua moradia, ou realizado investimentos de
interesse social e econômico”.
13 CC, art. 1.228: “O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder
de quem quer que injustamente a possua ou detenha. (...) § 4º: O proprietário também pode ser privado da coisa
se o imóvel reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de
considerável número de pessoas, e estas nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e serviços
considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante. § 5º: No caso do parágrafo antecedente, o juiz
fixará a justa indenização devida ao proprietário; pago o preço, valerá a sentença como título para o registro do
imóvel em nome dos possuidores”.
14 CC, art. 1.198, “caput”: “Considera-se detentor aquele que, achando-se em relação de dependência para com outro,
conserva a posse em nome deste e em cumprimento de ordens ou instruções suas”.

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• Empresa de estacionamento: depositária (possuidora).


• Manobrista: detentor.

• Exemplo 2: ocupação irregular de terras públicas: a posição do STJ sempre foi no sentido de
detenção (REsp nº 556.721/DF). Em 2016 (REsp nº 1.484.304/DF – Inf. 579), entendeu-se
que há posse injusta, a qual não possibilita usucapião, mas possibilita o ingresso com ação
possessória contra quem invade a área. Em 2018, voltou-se à tese da detenção (Súmula
619, STJ15).
“EMENTA – EMBARGOS DE TERCEIRO – MANDADO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE – OCUPAÇÃO
IRREGULAR DE ÁREA PÚBLICA – INEXISTÊNCIA DE POSSE – DIREITO DE RETENÇÃO NÃO CON-
FIGURADO. 1. Posse é o direito reconhecido a quem se comporta como proprietário. Posse e
propriedade, portanto, são institutos que caminham juntos, não havendo de ser reconhecer
a posse a quem, por proibição legal, não possa ser proprietário ou não possa gozar de qual-
quer dos poderes inerentes à propriedade. 2. A ocupação de área pública, quando irregular,
não pode ser reconhecida como posse, mas como mera detenção. 3. Se o direito de retenção
depende da configuração da posse, não se pode, ante a consideração da inexistência desta, ad-
mitir o surgimento daquele direito advindo da necessidade de se indenizar as benfeitorias úteis
e necessárias, e assim impedir o cumprimento da medida imposta no interdito proibitório. 4.
Recurso provido” (REsp 556.721/DF, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado
em 15/09/2005, DJ 03/10/2005, p. 172).
“EMENTA – PROCESSUAL CIVIL. ÁREAS PÚBLICAS DISPUTADAS ENTRE PARTICULARES. POSSI-
BILIDADE DO SOCORRO ÀS DEMANDAS POSSESSÓRIAS. 1. A ocupação de área pública, sem
autorização expressa e legítima do titular do domínio, não pode ser confundida com a mera
detenção. 2. Aquele que invade terras e nela constrói sua moradia jamais exercerá a posse em
nome alheio. Não há entre ele e o proprietário ou quem assim possa ser qualificado como o
que ostenta jus possidendi uma relação de dependência ou subordinação. 3. Ainda que a posse
não possa ser oposta ao ente público senhor da propriedade do bem, ela pode ser oposta con-
tra outros particulares, tornando admissíveis as ações possessórias entre invasores. 4. Recurso
especial não provido” (REsp 1484304/DF, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, jul-
gado em 10/03/2016, DJe 15/03/2016).

• Exemplo 3: caseiro:
• Em relação à sede da fazenda: detentor.
• Em relação à casa de colono (comodato): possuidor.

→ Observação: o detentor pode passar a ser possuidor (CC, art. 1.198, parágrafo único16). Isso
é possível por força de contrato, nos casos em que a pessoa passa a se comportar como possui-
dora (Enunciado 301, IV Jornada de Direito Civil17).

15 Súmula 619, STJ: “A ocupação indevida de bem público configura mera detenção, de natureza precária, insuscetível
de retenção ou indenização por acessões e benfeitorias.”
16 CC, art. 1.198, parágrafo único: “Aquele que começou a comportar-se do modo como prescreve este artigo, em
relação ao bem e à outra pessoa, presume-se detentor, até que prove o contrário”.
17 Enunciado 301, IV JDC: “É possível a conversão da detenção em posse, desde que rompida a subordinação, na
hipótese de exercício em nome próprio dos atos possessórios.”

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