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Índice

Introdução.....................................................................................................................................1

Conceitos da Psiquiatria para Histeria: Transtorno de Personalidade Histérica..................2

Breve Histórico sobre a Doença Mental.....................................................................................4

Histórico sobre a Histeria............................................................................................................6

Tabela 1. Linha do Tempo: Contexto Histórico da Histeria................................................8

Abordagem Psicodinâmica sobre a Histeria............................................................................10

Conclusão....................................................................................................................................15

Referências Bibliográficas.........................................................................................................16
Introdução
Uma das principais características da psicopatologia, como campo de
conhecimento, é a multiplicidade de abordagens e referenciais teóricos que tem
incorporado nos últimos 200 anos. Dentre essas, citamos a Psicanálise, que busca
compreender o homem como um ser “determinado”, dominado por forças, desejos e
conflitos inconscientes. A Psicanálise dá grande importância aos afetos, que segundo
ela, dominam o psiquismo; o homem racional, autocontrolado, senhor de si e de seus
desejos, é para ela uma enorme ilusão (Dalgalarrondo, 2008).
Na visão Psicanalítica, os sintomas e síndromes mentais são considerados
formas de expressão de conflitos predominantemente inconscientes, de desejos que não
podem ser realizados, de temores aos quais o indivíduo não tem acesso. O sintoma é
encarado, nesse caso, como uma “formação de compromisso”, certo arranjo entre o
inconsciente, as normas e as permissões culturais e as possibilidades reais de satisfação
desse desejo. A resultante desse emaranhado de forças, dessa “rama conflitiva”
inconsciente, é o que se identifica como sintoma patológico. (Dalgalarrondo, 2008).
Este trabalho tem como objetivo compreender as Síndromes Histéricas, base
para a elaboração da Teoria Psicanalítica de Freud, percorrendo desde seu histórico,
iniciando por Hipócrates, os Babilônios e passando pela Idade Média e a Inquisição,
como também buscando a compreensão pela visão Psiquiátrica (Segundo os critérios do
DSM-IV) e Psicodinâmica, compreendendo as idéias freudianas sobre a histeria. Na
intenção de enriquecer a compreensão teórica, também foi utilizado os conceitos de
Lacan, também com base psicanalítica.

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Conceitos da Psiquiatria para Histeria: Transtorno de Personalidade
Histérica
Segundo os critérios do DSM-IV as Síndromes Histéricas caracterizam-se por
apresentar manifestações clínicas tanto referentes ao corpo como à mente e ao
comportamento. No corpo, predominam as alterações das funções sensoriais e motoras
e, na mente, aquelas relacionadas à consciência vígil, à memória e às percepções
(Micale apud Dalgalarrondo, 2008). O comportamento do individuo com histeria é
caracteristicamente dramático, teatral, infantil, sedutor, manipulativo, buscam
constantemente ser o centro das atenções (Dalgalarrondo, 2008).
O paciente histérico apresenta uma peculiaridade relacionada à necessidade de
contato, porém apresenta dificuldade em mantê-lo e aprofundá-lo, vivenciam
inautenticidade no contato interpessoal; as relações soam falsas, como se houvesse
sempre representações no relacionamento com as pessoas (Van Den Berg apud
Dalgalarrondo, 2008).
Características de acordo com o DSM-IV (American Psychiatric Association)
para Transtorno de Personalidade Histérica:
 Emocionalmente refreada e circunscrita.
 Exibicionismo sexualizado e necessidade de ser amado.
 Bom controle dos impulsos.
 Sedução de apelo sutil.
 Ambição e competitividade.
 Relações triangulares maduras.
 Separações de objetos de amor podem ser toleradas.
 Superego severo e algumas defesas obsessivas.
 Desejos transferências sexualizados desenvolvem-se gradualmente e são
vistos como irrealistas (Gabbard, 1998).
As Síndromes Histéricas subdividem-se em dois grandes grupos: histeria de
conversão e histeria dissociativa. Na Histeria Conversiva, há uma alteração do
funcionamento corporal que não se conforma com os conceitos atuais da anatomia e
fisiologia do sistema nervoso central e periférico. Pode ocorrer em situações de estresse
e produz redução considerável do desempenho corporal, psíquico e do comportamento.
Caracterizado pela presença de um ou mais sintomas neurológicos variados: paralisias,
anestesias, cegueira, perturbações no andar e no ficar de pé (astasia-abasia) e perda da

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fala ou rouquidão. Tais sintomas não podem ser explicados por uma doença neurológica
ou sistêmica conhecida. Sendo, o diagnóstico associado a fatores psicológicos com o
inicio ou exarcebação dos sintomas (Dalgalarrondo, 2008). Na Histeria Dissociativa,
podem ocorrer alterações na consciência, com crises que se assemelham a crises
epiléticas, são chamadas de pseudo-crises, porém do ponto de vista clínico é
fundamental diferenciar o transtorno das crises epilépticas para que haja um diagnóstico
diferencial para o tratamento adequado. Na Histeria Dissociativa há o rebaixamento e
afunilamento da consciência (estado crepuscular histérico), o paciente pode apresentar
amnésias histéricas nas quais o indivíduo esquece elementos seletivos e significativos
do ponto de vista psicológico. Há presença também de fugas histéricas e fenômenos
senso perceptivos, como ilusões e pseudoalucinações (Dalgalarrondo, 2008).
O DSM-IV também considera o diferencial entre o transtorno de personalidade
histérica da personalidade histriônica, sendo está baseada nos sintomas da histeria,
porém com uma variante mais primitiva, muito mais impulsiva e muito menos instável,
que se parece muito com o transtorno de personalidade borderline (Gabbard, 1998).

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Breve Histórico sobre a Doença Mental

A cerca de 2.500 a.C, os mesopotâmios acreditavam que as doenças mentais


eram atribuídas à possessão demoníacas, sendo tratadas por métodos mágico-religiosos
através dos médicos-sacerdotes. (Alexander, 1968).
As antigas culturas Hebraicas consideravam a doença mental uma punição pelos
pecados e contavam com a cura por meio da magia e da oração, conferindo poderes a
um único deus, causador da saúde e da doença (Alexander, 1968). Por volta de 1550
a.C, papiros egípcios já mostravam a descrição do cérebro como a sede das funções
mentais; Os filósofos gregos (Sócrates, Platão e Aristóteles) acreditavam ser os
distúrbios mentais o resultado de pensamentos desordenados, prescrevendo o método
persuasivo de cura, por meio das palavras (Schultz e Schultz, 2005).
Nos poemas de Homero (aproximadamente 1000 a.C) são encontradas
referências sobre a insanidade mental, a qual era atribuída aos castigos dos deuses. Os
médicos hipocráticos são apontados como responsáveis pela primeira classificação das
doenças mentais e dos tipos de personalidade, e também por relatos sobre os delírios
tóxicos orgânicos e sintomas depressivos (Mendes, 1995).
Com a ascensão do Cristianismo, os Transtornos Mentais voltam a ser atribuídos
as possessões demoníacas, sendo que o tratamento imposto pela Igreja, consistia em
torturas e execução daqueles considerados possuídos pelo Demônio. No século XV, a
inquisição conduzida pela Igreja, perseguia a Heresia e a Bruxaria, identificando
implacavelmente os sintomas de doenças mentais, oferecendo como cura, severas
punições (Schultz e Schultz, 2005).
Weyer, na Idade Média, apontado com um dos primeiros médicos psiquiatras,
lutou contra a revivescência da demonologia, das crendices espirituais e dos exorcismos
explicando as psicoses coletivas e ressaltando a importância de se conhecer melhor a
patogenia dos fenômenos mentais (Kolb, 1997).
Por volta do século XVIII, a doença mental passou a ser vista como um
comportamento irracional, ficando os portadores trancafiados em instituições
semelhantes à prisões, sem receber nenhum tipo de tratamento; eram acorrentados às
camas ou à barras de ferro presas na parede. Por vezes eram exibidos publicamente em
circos ou eventos, como animais de Zoológico (Schultz e Schultz, 2005).

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Somente após o final do Século XVIII, que pensamentos como o de Philippe
Pinel passaram a ser considerados, e a doença mental começou a ser compreendida
como um fenômeno natural passível de tratamento por meio de métodos da ciência
Natural; o indivíduo acometido de tais transtornos passou à ser visto como um ser
humano em sofrimento, que merece receber métodos que possibilitem a cura. (Schultz e
Schultz, 2005).
A partir disso, a Psiquiatria passou a buscar tratamentos para as doenças
mentais, dividindo-se entre duas visões: a somática e a psíquica, mas concordando com
o fato de tratar-se de uma doença. E é nesse cenário que surge a Psicanálise (Schultz e
Schultz, 2005).

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Histórico sobre a Histeria

Durante muito tempo, a histeria representou um grande fantasma para a


medicina. A dificuldade é decorrente da impossibilidade objetiva de obtenção de uma
causa. Uma aporia, posto que não existe lesão neurológica correspondente aos sintomas
e que pudesse ser identificada como causa. Seria um transtorno das sensações?
Transtorno da alma ou do humor? Como um mal ‘feminino’, haveria algum vínculo
entre a histeria e a menstruação? (Alves, 2009).
A palavra histeria tem sua origem no Grego (histeros), onde seu significado está
relacionado ao útero; ao longo da história, estava por definição ligada de forma
indissociável ao feminino e com o sexual. Desde a antiguidade e em particular com
Hipócrates, a histeria já era usada para designar transtornos em mulheres que não
haviam tido gravidez. Em manuscritos egípcios, muitos séculos mais antigos que a
acepção de Hipócrates, é apresentada uma doença identificável correspondente ao
termo, e com manifestações corporais (Kahun). (Moura, 2009).
Já na Idade Média, período em que a Igreja exercia grande poder político e
econômico, questões culturais e sociais mostravam-se intimamente relacionadas aos
quadros histéricos. Qualquer questionamento às suas crenças e dogmas era visto como
grande ameaça. Qualquer movimento ou hábitos que diferiam das crenças pregadas,
eram considerados magia ou bruxaria, sendo entendidos como formas ardilosas de o
demônio conquistar espaço. Tal postura gerou medo e terror, solidificando assim o
poder da Igreja (Riemenschneider, 2004).
Com o Renascimento, novas perspectivas surgiram, com discussões acadêmicas,
filosóficas e teológicas acontecendo. Antes que isso se tornasse realidade, porém, muita
coisa se passou. Ao perceber que seu domínio não era tão inquestionável quanto antes, a
Igreja reagiu violentamente (Riemenschneider, 2004). .
É dessa época o ápice da Inquisição e dos autos-de-fé em que é possível se
aproximar da histeria, já que muitos dos casos que hoje são compreendidos como tal,
eram tidos, na ocasião, como manifestações de bruxaria. Em 1599, Pierre L`Estoile
escreveu em seu diário sobre o julgamento de Martha Brossier:
"As agitações que observamos não têm nada da natureza das doenças; (...) não
sendo nem epilepsia, a qual supõe a perda de todo o sentimento e julgamento; nem a
afecção que nós chamamos de histeria, a qual não ocorre jamais sem privação, ou
dificuldade de respiração. (...)” (Riemenschneider, 2004).

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De fato, as características apresentadas por Martha não diferem muito das
descritas por Freud mais de 300 anos depois: estão presentes as alterações de percepção,
de sensação e motoras, a multiplicidade de personalidades e grande plasticidade de
sintomas (Riemenschneider, 2004).
Na Europa do século XIX a Histeria viria a ser a doença do momento,
coincidindo com as profundas mudanças que afetaram a estrutura familiar sob a pressão
da industrialização, quando os papéis de homens e mulheres se polarizaram como
nunca. Embora não fosse manifestamente culpável, o paciente histérico era
estigmatizado por seus sintomas, era um suspeito, oriundo de uma linhagem talvez
suspeita. Existia ainda a suspeita de que o ser humano era dividido num eu consciente,
moral e em alguma outra coisa, problemática, irracional, que precisava ser contida
(Borossa, 2005).
Foi durante as décadas de 1860 e 1870, que o médico francês Jean-Marie
Charcot, conhecido como fundador e criador da Neurologia moderna, estudou a histeria,
termo ainda relacionado para descrever os comportamentos emocionais extremos da
mulher, relacionados à problemas uterinos. A partir da observação de milhares de
mulheres no hospital parisiense Salpêtrière, Charcot definiu as “Leis da Histeria”,
acreditando ter compreendido todas as vertentes da doença; afirmava que a histeria era
uma condição herdada que tinha seu ciclo por toda a vida, com sintomas provocados por
situações de choque. (O Livro da Psicologia, 2012).
Charcot acreditava que o surto se apresentava com regras padrões, válidas
independente do contexto social, cultural e histórico, sendo que seu curso seguia fases
claramente ordenadas e estruturadas, e que poderia ser curada com o hipnotismo (O
Livro da Psicologia, 2012).
Alguns autores porém, acreditam que a histeria se modifica conforme o contexto
sociocultural vigente em cada época, sendo que os sintomas histéricos sofreram
mudanças no decorrer da história, influenciados pela época, cultura, trazendo uma
marca do discurso contemporâneo (Zimerman, 2001).
Sigmund Freud, um dos alunos de Charcot, estava convencido que a Histeria era
uma enfermidade física, e interessou-se por ela. Seria a primeira doença escrita por ele
em sua teoria Psicanalítica. (O Livro da Psicologia, 2012).

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Tabela 1. Linha do Tempo: Contexto Histórico da Histeria
O Papiro de Kahun, de origem Egípcia, relata casos de
1900 a.C mulheres com distúrbios comportamentais causados por
"úteros móveis".
O médico grego Hiócrates cunha o termo "Histeria" para
400 a.C designar algumas doenças femininas descritas em seu livro
"On the diseases of women".
O médico inglês Thomas Willis realiza necropsias em
1662 d.C mulheres "histéricas" e não encontra indícios de patologias
uterinas, como se acreditava até então.
Alfred Binet passa a trabalhar com Charcot no Hospital
1883 d.C Salpêtière, em Paris, e mais tarde escreve sobre o método
hipnótico de Charcot para tratar a Histeria.

Sigmund Freud, aluno de Charcot, publica Estudos sobre a


1895 d.C
Histeria.

(O Livro da Psicologia, p. 30, 2004)

Freud foi inserido no mundo do inconsciente em 1885, quando conheceu o


trabalho de Charcot, que fazia o uso da Hipnose no tratamento de seus pacientes, e
vinha obtendo um significativo sucesso; como considerava a Histeria um distúrbio
mental causado por anormalidades no sistema nervoso, proporcionou novas e
importantes possibilidades de tratamento, fazendo com que Freud retornasse o Viena
ansioso para utilizar esses novos conhecimentos associado a uma técnica exequível. (O
Livro da Psicologia, 2012).
No início de sua carreira, ainda sob forte influência de Charcot, Freud utilizava a
hipnose na tentativa de tratar a patologia na intenção de buscar lembranças traumáticas
relacionadas a cada um dos sintomas e, em 1895, publicou com Breuer o “Estudos sobre
Histeria”. É nesse trabalho que pela primeira vez o autor utiliza o termo "trauma"
(Riemenschneider, 2004).
Segundo sua primeira teoria sobre o tema, a paciente deveria lembrar-se do
evento doloroso e vivenciar as emoções que não havia podido expressar de forma
adequada na ocasião. Em sua obra há recortes clínicos do atendimento de cinco
mulheres, sendo esses alguns dos casos mais importantes para a história da psicanálise:
Anna O., Emmy Von N., Lucy, Katharina e Elisabeth Von R.. Todas com algo em
comum: sintomas clássicos de histeria de conversão (na qual conflitos psíquicos são
convertidos em manifestações somáticas motoras ou sensitivas, dolorosas ou limitantes)
(Riemenschneider, 2004).

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A histérica passou a ser considerada vítima das condições sociais opressivas ou
rebeldes, por contestar aquelas condições cujo comportamento estranho, perturbador,
exprimia um sentimento de desconforto profundo e/ou um protesto contra as limitações
de sua situação (Borossa, 2005).
O interesse de Freud pela histeria revela um enigma até então incompreensível
para a ciência. Muitas vezes, os casos eram tomados como artimanhas e encenações que
desestabilizavam o conhecimento médico. Tal como fazia o homem religioso do século
XVI diante das bruxas, os médicos - sentindo-se desafiados - tratavam das pacientes de
forma punitiva. (Riemenschneider, 2004)
Apesar das convicções de Freud, porém, os resultados dos tratamentos não eram
promissores. Muitas pacientes o abandonavam e outras não apresentavam sinais de
melhora. Tal situação o deixou muito preocupado com seu futuro profissional e pessoal.
Em crise, Freud abandonou os estudos com as histéricas e voltou aos laboratórios de
Neuroanatomia (Riemenschneider, 2004).
Com a morte de seu pai, iniciou sua auto-análise e percebeu que seus sofrimentos
tinham a mesma natureza das que ouvia de seus pacientes. O resultado mais conhecido
desse processo analítico é a obra fundamental de Freud, “A Interpretação dos Sonhos”
(1900), onde estão lançadas as bases da psicanálise: a divisão do aparelho psíquico, a
noção de recalque e a proposição do funcionamento dinâmico do Inconsciente. O autor
afirma que os sonhos têm sentidos que podem ser apreendidos por meio de um método,
eficiente também para a compreensão dos sintomas histéricos. Essas proposições
acarretam uma forma até então inédita de compreender o ser humano. Está fundada
assim a psicanálise (Riemenschneider, 2004). .
Satisfeito com os resultados, publica em 1905 o livro “Fragmentos da Análise de
um Caso de Histeria”, mais conhecido como o “Caso Dora”, um relato clínico em que
as relações entre sonhos e sintomas histéricos são evidentes. Trata-se, também de uma
histeria de conversão (Riemenschneider, 2004).

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Abordagem Psicodinâmica sobre a Histeria

A abordagem da histeria do ponto de vista da psicodinâmica nos faz retomar


momentos de constituição da teoria e da clínica psicanalítica, em que a busca de
respostas para os problemas da histeria eram da ruptura freudiana com o discurso
médico, pois, apesar de se manifestar através de uma variedade de sintomas corporais
muito complexos, esses não se limitavam apenas a questões fisiológicas (Cukiert, 1999).
Freud e Breuer quando trabalhavam com a hipnose percebiam que os pacientes
ao serem hipnotizados eram capazes de evocar lembranças esquecidas durante o estado
de vigília, concluía-se que o esquecido se mantinha ativo e tinha efeitos da amnésia
patógena, sendo um “processo intencional” e que a cura seria efeito da recordação e ab-
reação das lembranças traumáticas. Acreditava-se que se o paciente estabelecesse
confiança com o médico seria capaz de confessar aquilo que o fazia sofrer. No entanto,
com os estudos Freud vai se dando conta de que a histérica não esconde do outro, mas
de si mesma, e que a dimensão do escondido é maior para ela do que para o outro. A
partir da idéia do esquecimento intencional, Freud chegará à motivação inconsciente
(Breuer e Freud, 1969).
Para Breuer, o estado hipnóide será a condição fundamental para a formação de
um grupo psíquico separado, carregado de afeto, que dará lugar a produção de sintomas
histéricos, mas para Freud o grupo psíquico separado surgirá justamente a partir do
esquecimento intencional que a histérica faz para se livrar do intolerável (Breuer e
Freud, 1969).
Freud tratou de uma paciente, que sofria de dores nas pernas e dificuldade para
caminhar. No processo de cura, as dores conduziam a um episódio ocorrido em sua
adolescência, o pai doente requeria cuidados, dedicava-lhe atenção e sofria com a
situação que o pai se encontrava, mas, não era capaz de expressar seus sentimentos
diante desta situação, nem suas lágrimas nem suas alegrias. Uma noite a paciente sai e
encontra-se com um jovem com o qual vivia uma correspondida atração, volta para casa
em estado de felicidade, mas encontra o pai ainda mais doente, isso a faz firmar um
propósito de não encontrar-se mais com o jovem. Então, houve um afastamento da
própria realidade afetiva, assim como o fechamento dos canais de expressão, facilitando
a dissociação. Segundo Freud foi gerado um conflito de incompatibilidade de
representações: a representação erótica era contrastante com a doença do pai, tornando-
se intolerável, levando a necessidade de afastá-la da consciência tornando-a esquecida.

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Não houve o livre fluir da descarga afetiva na representação erótica o que vigorou as
dores reumáticas que a paciente sofria nas pernas (Breuer e Freud, 1969).
Por meio da teoria da sedução e da teoria do trauma que Freud vai estabelecer a
relação existente entre o sexual e o recalque. A teoria da sedução e a temporalidade do
trauma serão os dois lugares a partir dos quais Freud tentará responder e este
cruzamento do sexual com o recalque. Um adulto seduz uma criança. A figura de um
pai perverso está presente em vários relatos clínicos da época, ou seja, de uma
sexualidade que invade o campo num momento em que não há possibilidade de
compreender um estimulo sexual num tempo pré-sexual. Isto produz um impacto que só
após a puberdade poderá ser percebido como sexual, ocorrendo neste caso, o recalque e
o sintoma (Fuks e Alonso, 2004).
Mais tarde Freud abandona a teoria da sedução, e assume que realmente existia
um trauma, mas, não de ordem física. O traumático não será a cena acontecida, mas a
sim a lembrança que irá traumatizar o eu. Freud constata, pelas experiências dos
tratamentos, que o que se recalca é sempre o sexual. O conflito histérico tem a ver com
a identidade sexual, é o recalque como mecanismo fundamental da estruturação
histérica, que se instala como conseqüência do Complexo de Édipo (Fuks e Alonso,
2004).
Freud distingue o recalque em três momentos: sendo recalque primordial, cuja
aparição é concomitante à diferenciação entre o eu e o id; os recalques primários,
anteriores ao conflito edipiano e a constituição do supereu e os recalques secundários
exercitados pela ação do supereu, conseqüência da resolução do Complexo de Édipo. A
histérica cindida organiza dois discursos pela ação do recalque: o da defesa e do desejo.
A defesa não elimina o desejo, pelo contrário, está presente no próprio exercício da
sedução, na gestualidade erotizada e no sintoma conversivo (Fuks e Alonso, 2004).
No conceito psicanalítico de histeria, suas manifestações corporais têm um
caráter central, um determinismo complexo, que envolve fatores traumáticos quanto
conflituais, leva a que o sofrimento desemboque, na histeria, em sintomas corporais
chamados conversivos. O conceito de conversão ocupa um lugar importante nas
concepções psicopatológicas desenvolvidas por Freud, o que permitem delimitar e
organizar conceitualmente o campo das psiconeuroses. Portanto, fornece a base
explicativa para o mecanismo de formação dos sintomas da histeria e permite
diferenciá-la da neurose obsessiva e de quadros alucinatórios agudos, originários
igualmente em um conflito defensivo. O sintoma histérico conversivo diferencia-se

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também para Freud, do sintoma somático, que funciona como signo da doença orgânica.
A ruptura freudiana com o discurso médico traz a tona questões a respeito do
funcionamento psíquico e o reconhecimento do papel da sexualidade humana nos
transtornos, onde sua influência não se limitava apenas a questões fisiológicas e
corporais até então, foco de estudo da medicina. Para Freud cada acontecimento, cada
impressão vivencial carrega certo valor afetivo, uma carga de afeto da qual o eu se livra
por meio de uma reação motora ou um trabalho associativo. Se o individuo não pode ou
não quer tramitar o excedente, a lembrança dessa impressão adquire a impressão de um
trauma e passa a ser a causa de sintomas permanentes de histeria (Fuks e Alonso, 2004).
Sobre as contribuições de Lacan acerca da histeria, considera-se que o neurótico
é aquele que usa seu eu para colocar sua questão, e o faz não a colocando. Sendo o eu
uma entidade imaginária, faz com que o sujeito se iluda com a realidade externa, e
apontam o engano de certas facções psicanalíticas ao centrar suas intervenções
terapêuticas de forma a alimentar estas ilusões, ao invés de desmontá-las. Para Lacan, o
ponto chave da função do eu no neurótico acaba sendo o resultado do entrecruzamento
das dimensões simbólica e imaginária. Enquanto a primeira depende do significante,
sendo esta dimensão a responsável pela ordenação do sujeito através de uma lei, a
segunda baseia-se na primazia da Gestalt fálica, em que, no caso da mulher, é colocada
como uma ausência. De tal modo, a menina toma emprestado um desvio através da
identificação com o pai, seguindo durante um tempo os mesmos caminhos do menino.
Esta acomodação é vista por Lacan como a via mais curta, fazendo com que a histeria
feminina se apresente sob uma estrutura mais simples, entretanto revelando poucos
pontos de ruptura. Sendo assim, o sujeito adapta-se mais comodamente ao seu sintoma
(Revista Científica Eletrônica de Psicologia, 2009).
Para Lacan a histérica confere ao Outro o lugar dominante, na cena da sedução
de sua fantasia, em que figura o encontro com o Outro, ela não está presente como
sujeito, mas como objeto; “não fui eu foi o outro”. Na clínica aparece com uma
reivindicação ao Outro, a quem ela nada deve, é o Outro que lhe deve algo, o outro não
possui o falo. Está sempre a procura de um “senhor”, de um mestre: inventa um mestre
não para submeter-se a ele, mas para reinar apontando suas falhas de dominação. A
histérica estimula o desejo do Outro e dele se furta como objeto, se faz presente pela
falta (Netto, 2011).

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Relacionando as descobertas freudianas sobre a histeria com as contribuições
teóricas de Lacan, podemos traçar um panorama da histeria como se apresenta
atualmente.
Foi com os estudos de Charcot e Freud que a histeria se firmou como
psicopatologia na época. Naquela época vivia-se uma ordem geral implacável e feroz
repressão contra a sexualidade, conduzindo assim uma moralidade hipócrita e artificial.
Por conta desta repressão, o corpo denunciava sintomas que eram consideradas
verdadeiras encenações, desejos sexuais que insistiam em retomar. A sustentação da
histeria na época tinha uma rede de apoio ou sustentação que poderíamos entender
como um “excesso de amparo” (Bezerra, 2004). Contudo, vemos Freud, um homem de
seu tempo, o qual chocou sua sociedade com suas teorias da etiologia sexual das
neuroses e da sexualidade infantil. Isto mostra que a histeria, já na época de Freud, não
poderia ser limitada àquelas que apresentavam fortes sintomas conversivos, se
encaixando no estereótipo da mulher reprimida sexualmente (no sentido leigo da
palavra) e obediente. A dita mulher fálica já ganhava seu espaço e, imaginamos, que
através de suas análises com Freud puderam superar seus sintomas e ascender numa
feminilidade que lhes possibilitou serem pessoas produtivas e atuantes na sociedade
(Revista Científica Eletrônica de Psicologia, 2009).
A histeria no cenário contemporâneo, não cabe mais àquelas figuras de outros
tempos (Freud). E se antes havia um coletivo “excesso de amparo”, hoje temos
características de autoridades sendo destruídas e ridicularizadas. Assistimos
progressivamente a liberação da sexualidade em todos os seus aspectos e à
agressividade cada vez mais sem limites, encontramos então, um coletivo “excesso de
desamparo” (Bezerra, 2004). O uso do corpo como um objeto demonstra que a histérica,
ainda, pode apresentar sintomas físicos, porém não exatamente conversivos, sendo que a
busca da forma perfeita mascara, assim, distúrbios alimentares de várias ordens dando a
idéia de uma doença auto-infligida. Outra hipótese encontrada em Freud seria da
histeria como uma doença parasita, a qual neste caso estaria se aproveitando de uma
fraqueza do sujeito para se instalar. Esta fraqueza, tal como a encontramos hoje, parece
se localizar na ordem do ideal, puramente imaginário, tendo se deslocado, de alguma
forma, das manifestações patológicas físicas (Revista Científica Eletrônica de
Psicologia, 2009).
Retomando o raciocínio de Lacan, sendo a histérica alguém desprovido da
Gestalt fálica, incorporada na imagem do pênis, e buscando no desvio com a

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identificação com o homem um meio de simbolizar esta falta, a fim de ascender a sua
posição feminina; o que percebemos na histérica contemporânea é uma constante
demanda deste lugar masculino, sendo que o ideal construído parece dirigir esta
demanda às últimas conseqüências, no sentido de propagar a alienação do sujeito em
sua busca incessante pelo objeto fálico, através do uso do corpo como um fetiche, e
perpetuar um discurso reivindicatório de insatisfação permanente. O uso da sexualidade,
também, pode ser uma "faca de dois gumes"; sendo, por um lado, visto como um direito
conquistado através do movimento feminista, o qual ganhou forças pela reivindicação
de tomar um lugar, o lugar masculino. Aqui, a identificação com o homem toma vias
mais diretas, sendo a demanda de igualdade, a qual sempre permeou as histéricas, agora
apoiada pela sociedade, neste caso, o grande Outro (Netto, 2011).
Contudo, é inegável a importância dos direitos conquistados através dos
movimentos feministas, tais questões levantadas a cerca da histeria não se restringem
apenas ao feminino, o que percebemos é o movimento da histeria ao longo do tempo
como a expressão de impulsos e formas de lidar com o que se deseja, conquistas que
atravessaram o tempo com contribuições significativas da teoria psicanalítica sobre a
sexualidade humana. A contemporaneidade traz a tona os pontos relevantes já estudados
pela psicanálise, bem como possíveis falhas e contribuições de seus seguidores como
Lacan que levantou um novo olhar para questões pertinentes ao funcionamento da
personalidade histérica, levando em conta os aspectos sociais e culturas
contemporâneos. Esperamos que o movimento histérico que parece tomar conta da
sociedade moderna encontre a verdade perdida sobre o que realmente se deseja (Netto,
2011).

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Conclusão

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Referências Bibliográficas

ALEXANDER, F.G: A História da Psiquiatria. Da Antiguidade até a Era Moderna.


São Paulo: IBRASA, 1968.

ALVES, Rafael: A Invenção da Histeria: Revista História, Ciências, Saúde –


Manguinhos, Rio de Janeiro, v.16, n.3, p.819-822, jul.-set. 2009.

BEZERRA, M. M. S: Histeria na Contemporaneidade. Portal dos Psicólogos, 2004.


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