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EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA JUÍZA DE DIREITO DA VARA

CRIMINAL DA COMARCA DE GOIANA, ESTADO DE PERNAMBUCO

Processo nº 0000682-66.2020.8.17.0660

JOSÉ FAUSTINO RAMOS DA SILVA, devidamente qualificado nos autos do


processo epigrafado, que lhe move o Ministério Público Estadual, por seu Advogado
devidamente habilitado nos referidos autos e que esta subscreve, com escritório
profissional delineado no preâmbulo, vem, respeitosamente, à presença de Vossa
Excelência, tempestivamente, apresentar suas ALEGAÇÕES FINAIS NA FORMA DE
MEMORIAIS, nos termos do artigo 403, § 3º do Código de Processo Penal, pelos
relevantes motivos de fato e de direito a seguir aduzidos:

DO RETROSPECTO PROCESSUAL

Breve exposição dos fatos narrados na inicial acusatória

O acusado foi preso, por força de mandado de prisão, pela suposta prática do crime
previsto no art. 33 da Lei 11.343/06.

Dado e passado, a instrução processual deu-se de forma satisfatória, vez que NÃO
sobreveio qualquer manifestação, tanto por parte dos agentes de polícia, estas
testemunhas de acusação, quanto do MPE a imputarem ao acusado qualquer outra conduta
criminosa, a ponto de agravar-lhe a situação, além da confissão da própria quanto ao
“manter em depósito” da substância entorpecente.

Alegações finais do Ministério Público pela condenação do acusado nos art. 33 da Lei de
Drogas.

Intimada a Defesa para apresentar as alegações finais por memorias, o que ora é feito.

Pois bem.

QUANTO AO MÉRITO

Da moralidade do acusado

Eminente Magistrado, nesta primeira incursão no terreno de mérito, impende dizer que o
acusado nunca se dedicou a atividades criminosas, é réu primário, vez que não apresenta
qualquer mácula em seus antecedentes criminais, nos termos das certidões em anexo.

O acusado possui residência fixa, é arrimo de família, haja vista ser responsável pelo
sustento dos seus pais.
O Auto de Apreensão da substância entorpecente acostado aos autos, solapa, de certa
forma, qualquer possibilidade de rechaço por parte da Defesa, afigurando-se, em razão
disso, induvidosa a prova da materialidade. Todavia, quanto à autoria, em que pese a
confissão do acusado no que tange ao “ter em depósito” da precitada substância
entorpecente, alguns pontos merecem ser apreciados, a fim de que haja uma valoração
cognitiva mais sutil e apurada acerca de sua participação naquele evento criminoso.

Eminente Magistrada, este Causídico não está pretenso a justificar a conduta contra juris
do acusado, de modo a trazer para o corpo destas conclusões alegacionais qualquer
exculpante/dirimente de culpabilidade. Não. O que se pretende, ao bem da verdade, é
demonstrar que os motivos supramencionados DETERMINARAM o comportamento do
acusado, no sentido de este ter em depósito a substância entorpecente.

Ante a situação de extremada dificuldade por que passava o acusado, Excelência, data
vênia, não é insano dizer que, naquela ocasião, era “inexigível conduta diversa”. Portanto,
é nessa infeliz situação que se revelou a conduta do senhor JOSÉ FAUSTINO do quando
manteve em depósito a referida substância ilícita, o que só vem a ratificar o seguinte
prolóquio: “Algum dia, em algum lugar e em um dado momento, a circunstância
poderá ser senhora de nossas condutas”.

Da causa de diminuição prevista no Parágrafo 4º, do art. 33, da Lei 11.343/2006.

Eminente Julgador, a despeito de o acusado ter “praticado” a conduta proibida insculpida


no art. 33, caput, da Lei 11.343/06, mais precisamente na modalidade ter em depósito,
cabe o exame das condições em que se desenvolveu tal conduta, na forma como
descrevemos acima, a fim de que seja evitado que o ora acusado seja colocado em
situação de desvantagem, ou seja, no mesmo patamar dos demais envolvidos. Ressalta-
se, nessa linha, que subscreve em favor do acusado, data vênia, a diminuição de pena
prevista no parágrafo 4º do artigo 33 da Lei 11.343/2006, verbis:

"§ 4.º Nos delitos definidos no caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser
reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos,
desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades
criminosas nem integre organização criminosa."

Das relevantes circunstâncias favoráveis do acusado

Ora, Meritíssima, discorremos anteriormente que o acusado é réu primário, possui bons
antecedentes, tem residência e emprego fixo, e jamais se levantou em seu desfavor, em
qualquer lugar pelo qual tenha estado ou passado, qualquer informação que o tivesse
vinculado ao cometimento de crime de qualquer natureza, razão pela qual se postula, com
supedâneo nas situações favoráveis anteriormente aventadas, e por ser questão de
justiça, admitindo-se eventual condenação no artigo 33, caput, da Lei de Drogas, seja-
lhe aplicável a causa de diminuição prevista no parágrafo 4º do precitado artigo, em seu
grau máximo, qual seja 2/3 (dois terços), ainda que seja reduzida a pena final abaixo do
mínimo cominado.

Nessa quadra é a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:


NEGATIVA DE APLICAÇÃO DA MINORANTE DO ART. 33, § 4º DA LEI DE DROGAS E
A NECESSIDADE DE FUNDAMENTAÇÃO EM DADOS CONCRETOS. O magistrado não
pode deixar de aplicar a minorante prevista no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006 se utilizando
exclusivamente dos elementos descritos no núcleo do referido tipo penal para concluir que o réu
se dedicava à atividade criminosa. O art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006 prevê a aplicação de
causa especial de diminuição de pena ao agente de crime de tráfico que tenha bons antecedentes,
seja réu primário, não se dedique a atividades criminosas nem integre organização criminosa.
Para que se negue a aplicação da referida minorante em razão do exercício do tráfico como
atividade criminosa, deve o juiz basear-se em dados concretos que indiquem tal situação, sob
pena de toda e qualquer ação descrita no núcleo do tipo ser considerada incompatível com a
aplicação da causa especial de diminuição de pena. Precedente citado:REsp 1.085.039-MG, DJe
28/9/2009. HC 253.732-RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 6/12/2012.

DOS POSSÍVEIS CRITÉRIOS PARA FIXAÇÃO DA PENA

Da conversão da pena privativa de liberdade por restritiva de direito

Verificando-se todo o contexto concernente à situação do ora acusado no evento


criminoso, foi possível demonstrar todas as condições favoráveis que desafiam outras
situações a serem observadas por esse respeitável Juízo. Vejamos:

POSSIBILIDADE DE PENAS RESTRITIVAS DE DIREITO. É perfeitamente admissível a


substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direito, bem como a concessão de
liberdade provisória. Resolução nº 05 do Senado suspendeu a parte final do art. 33, § 4º da Lei,
mais precisamente a expressão “vedada a conversão em penas restritivas de direitos”, declarada
inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal nos autos do HC 97.256/RS,
rel. Min. Ayres Britto, j. Em 18.3.2010. Logo, os agentes incursos no art. 33, § 4º, poderão ter
suas penas privativas de liberdade substituídas por restritivas de direitos (desde que observados
os requisitos do art. 44 do Código Penal). “O processo de individualização da pena é um
caminhar no rumo da personalização da resposta punitiva do Estado”.

E mais:

EMENTA: HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL. PENAL. TRÁFICO DE DROGAS.


PENA FIXADA EM PATAMAR INFERIOR A DOIS ANOS. PEDIDO DE CONCESSÃO
DE SURSIS. IMPETRAÇÃO PREJUDICADA. CONCESSÃO DA ORDEM DE OFÍCIO
PARA RECONHECER A POSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO DA PENA
PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS. 1. O Supremo Tribunal
Federal assentou serem inconstitucionais os arts. 33, § 4º, e 44, caput, da Lei n. 11.343/2006, na
parte em que vedavam a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos em
condenação pelo crime de tráfico de entorpecentes (HC 97.256, Rel. Min. Ayres Britto, sessão de
julgamento de 1º.9.2010, Informativo/STF 598). (…) 5. Concessão de ofício para reconhecer a
possibilidade de se substituir a pena privativa de liberdade aplicada ao Paciente por
restritiva de direitos, desde que preenchidos os requisitos objetivos e subjetivos previstos
em lei, devendo a análise ser feita pelo juízo do processo de conhecimento ou, se tiver
ocorrido o trânsito em julgado, pelo juízo da execução da pena.

Ainda no que tange ao entendimento do STF:

EMENTA: HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. ART. 33 DA LEI 11.343/2006:


IMPOSSIBILIDADE DE CONVERSÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE EM PENA
RESTRITIVA DE DIREITOS. DECLARAÇÃO INCIDENTAL DE INCONSTITUCIONALIDADE.
OFENSA À GARANTIA CONSTITUCIONAL DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA (INCISO
XLVI DO ART. 5º DA CF/88). ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA. (…) 3. As penas
restritivas de direitos são, em essência, uma alternativa aos efeitos certamente traumáticos,
estigmatizantes e onerosos do cárcere. Não é à toa que todas elas são comumente chamadas de
penas alternativas, pois essa é mesmo a sua natureza: constituir-se num substitutivo ao
encarceramento e suas sequelas. E o fato é que a pena privativa de liberdade corporal não é a
única a cumprir a função retributivo-ressocializadora ou restritivo-preventiva da sanção
penal. As demais penas também são vocacionadas para esse geminado papel da retribuição-
prevenção-ressocialização, e ninguém melhor do que o juiz natural da causa para saber, no caso
concreto, qual o tipo alternativo de reprimenda é suficiente para castigar e, ao mesmo tempo,
recuperar socialmente o apenado, prevenindo comportamentos do gênero.

Assim, ao ora acusada deve ser deferida a conversão da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos, conforme garantida pela lei penal, e ainda, que sua pena seja fixada
no mínimo legal pelas circunstâncias já elencadas.

Do direito de apelar em liberdade e manutenção da prisão domiciliar

Por fim, ainda na hipótese de condenação, requer seja deferido ao acusado direito de
apelar em liberdade, posto que já demonstrado nos autos reunir condições para tal e por
NÃO existir qualquer razão para que subsista o seu segregamento cautelar,

DOS PEDIDOS

Por todo o exposto, requer se digne Vossa Excelência:

1- QUE, em caso de condenação nas penas do art. 33 da Lei 11.343/06, seja aplicada ao
acusado a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da referida Lei de Drogas, por ser
o acusado primário, possuir bons antecedentes, nunca ter se dedicado às atividades
criminosas nem ter sido integrante de qualquer organização criminosa, conjugando-se,
desta feita, com o art. 65, III, d, do Código Penal, em seu patamar MÁXIMO de
redução, conforme argumentação já exposta, e em sendo reduzida a reprimenda, requer a
aplicação do REGIME ABERTO para o cumprimento da pena, bem como a
SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA
DE DIREITOS, conforme entendimento sedimentado do Supremo Tribunal Federal,
acima transcrito;

3- QUE seja concedido ao acusado o direito de APELAR EM LIBERDADE, nos


termos do art. 283 do CPP, por preencher os requisitos objetivos para tal benefício, ato
este que se revestirá na mais lúcida decisão, porque é bem aí que se fará JUSTIÇA!

Pede deferimento.

Recife, 28 de abril de 2022.

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