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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

Escola Superior de Teologia – EST


Turma Especial

Antônio dos Passos Pereira Amaral


31198953

RESUMO DO LIVRO
“PAIXÃO PELA VERDADE” DE ALISTER MCGRATH

São Paulo
Maio de 2011
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RESUMO DO LIVRO PAIXÃO PELA VERDADE

MCGRATH, Alister. Paixão pela Verdade: a coerência intelectual do

evangelicalismo. São Paulo: Shedd Publicações, 2007.

Alister E. McGrath, teólogo e apologista cristão, foi professor de teologia

histórica na Universidade Oxford e assumiu em 2008 a cadeira de teologia no

Departamento de Educação e Estudos Profissionais do King´s College, em Londres. Ex-

ateísta, pós-doutorado em biofísica molecular e doutorado em teologia pela

Universidade de Oxford, McGrath tem se destacado como um dos mais profícuos

pensadores cristãos da atualidade. Autor de um grande volume de obras nas áreas de

teologia histórica e científica, e também apologética, algumas delas publicadas em

português: Apologética Cristã no Século XXI pela Editora Vida, O Delírio de Dawkins

pela Editora Mundo Cristão, A Vida de João Calvino; Origens Intelectuais da Reforma

Protestante; e Teologia Histórica, todas pela Editora Cultura Cristã.

Em Paixão pela Verdade McGrath trata da coerência intelectual do

evangelicalismo, definindo ele mesmo sua obra como “uma exploração crítica, mas

também positiva, dos fundamentos intelectuais, da coerência e da credibilidade do

evangelicalismo” (McGRATH, 2007, p.20). O autor defende o movimento como o mais

coerente em termos de capacidade de argumentação e crítica dos grandes desafios

filosóficos e teológicos de nossa época, destacando o como a mais relevante forma de

Cristianismo da atualidade. Ele responde às especulações de oposicionistas que acusam

o evangelicalismo de anti-intelectualismo, e instiga os evangélicos a saírem da


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defensiva, propondo uma atitude intelectual ativa, fundamentada numa herança

intelectual histórica, tão vasta e rica quanto a secular. McGrath relembra-nos o grande

desafio de entrar no universo acadêmico demonstrando a capacidade argumentativa e

intelectual da nossa fé.

É exatamente nesse ponto que o autor introduz sua obra: porque os evangélicos

precisam ser tão hostis à teologia acadêmica? Como resposta ele argumenta que o

surgimento do fundamentalismo na América do Norte foi um dos grandes responsáveis

por promover o rompimento entre o intelectualismo e a fé, visto que propunha ser

“isento por bases religiosas de qualquer espécie de engajamento cultural ou necessidade

de pensar” (p. 11). McGrath apresenta também a dominância do pragmatismo no

evangelicalismo como uma razão para o distanciamento entre fé e academicismo, por

causa de sua grande “ênfase no crescimento da igreja, pregação de sentir-se bem e

estilos de ministétio informados em grande parte pela psicologia secular” (p.11). Em

terceiro lugar ele mostra como o secularismo e a ética liberal da academia teológica,

esta “percebida como anti-cristã” (p.15), afastaram o teólogo da realidade da igreja. Ele

afirma que “a teologia acadêmica é tanto elitista como irrelevante para a comunidade

cristã” (p. 17). Este elitismo intelectual da teologia acadêmica é apontado por MaGrath

como a quarta causa do distanciamento entre teologia e academia, vista como

“desdenhosa dos interesses de cristãos comuns” (p. 17). Devido às muitas críticas

dirigidas ao Evangelicalismo no passado, estou tomou uma postura defensiva levando

os teólogos evangélicos a gastarem mais tempo defendendo a autoridade das Escrituras

que discorrendo sobre seu conteúdo. Focando especialmente nos pontos positivos do

evangelicalismo, McGrath aborda a singularidade de Cristo, a autoridade das Escrituras,

e o evangelicalismo face aos desafios do pós-liberalismo, pós-modernismo e pluralismo

religioso.
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A singularidade de Cristo, tratada no primeiro capítulo, é a principal marca do

Cristianismo Evangélico, segundo McGrath, e que faz do Cristianismo uma religião

distinta de todas as outras religiões do mundo. Esta é uma característica da qual o

evangelicalismo nunca fugiu, como afirma o autor: “O evangelicalismo nunca sentiu

constrangimento em defender ou proclamar a singularidade de Jesus Cristo” (p. 21).

Essa singularidade advém da própria natureza de Cristo e de sua obra. A pessoa e obra

de Jesus Cristo constituem e definem a natureza do Evangelicalismo. Essa premissa

evangélica encontra oposição especialmente no racionalismo, no iluminismo e no

modernismo.

Para os racionalistas a autoridade primária advém da razão, colocando a

autoridade de Jesus como secundária e proveniente da autoridade anterior da moral

humana. Não se trata de uma razão intrínseca como afirma o Evangelicalismo, mas se

origina meramente na qualidade moral do seu ensino que são baseados em princípios

pré-existentes. Na visão iluminista, quando o Evangelicalismo assevera a autoridade

intrínseca de Jesus e espera que uma pessoa receba seus ensinos por causa de sua

autoridade, está cometendo um crime contra a razão e a intelectualidade individual.

Afirmam os iluministas que os ensinos de Jesus apenas representam o ideal de moral de

uma época na sociedade. O modernismo prega a autonomia humana, coloca o homem

como agente da criação, a natureza como sua escrava e a tecnologia como ferramenta de

domínio da criação. Suas ideias opõem diretamente à premissa evangélica de que Cristo

é Senhor de tudo, a criação lhe pertence e nós somos seus mordomos.

Para sustentar sua argumentação a respeito da autoridade de Cristo, McGrath

destaca a Sua importância revelacional como expressão exata (encarnada) do Deus

invisível na história. Em suma, o homem precisa de Deus para conhecer a Deus, pois só
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Ele pode revelar-se a Si mesmo. Este conceito é ofensivo ao Iluminismo, segundo o

autor, pois é contrária à premissa da autonomia intelectual, onde o ser humano conhece

por si só. Associada a importância de Cristo na revelação, está a Sua importância na

salvação, tornada possível por meio da Sua morte na cruz e Sua ressurreição física. A

cruz no Evangelicalismo é tanto a base para a salvação como o ponto-de-partida e o

centro da fé evangélica, tidos pelo iluminismo como bases irracionais.

Em continuidade McGrath discute a importância mimética de Jesus Cristo, isto

é, sua importância como modelo de moral e ética. O autor refuta a teoria do exemplo

moral que coloca o exemplo e a moral de Cristo como uma influência meramente

externa, para qual o homem pode olhar e se espelhar. Ele afirma a importância de Cristo

como exemplo a partir de uma realidade tornada possível somente pela Sua morte e

ressurreição, por intermédio de uma regeneração realizada pelo próprio Deus no coração

do crente. Jesus é o padrão no qual Deus quer transformar (e transformará) todos

quantos receberam de suas mãos a salvação. Ressalta ainda a importância doxológica de

Cristo, no qual se encerra todo o significado do verdadeiro culto e da verdadeira

adoração a Deus. A experiência de salvação afeta cada aspecto da existência humana e

principalmente o foco de sua devoção.

O autor encerra o capítulo um falando da importância querigmática de Jesus

Cristo. Ele deve ser proclamado no mundo, como única resposta para o mundo.

McGrath destaca o caráter evangelístico do Novo Testamento ao afirmar: “ Há uma

natureza fortemente querigmática no Novo Testamento, onde Cristo é visto como

alguém para ser proclamado e para quem uma resposta é esperada” (p. 41). Conclui

dizendo que “para os evangélicos, a teologia cristã é primeiro e sobretudo preocupada


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com a identidade e importância de Jesus Cristo” (p. 41), enfatizando o lugar central de

sua obra descrita nas Escrituras Sagradas.

A autoridade das Escrituras é o tema do segundo capítulo. O autor se preocupa

em falar do Evangelicalismo como uma clara continuidade da Reforma com seu apego à

Palavra escrita. O princípio marcante a Reforma é especialmente o fato de “que a vida e

o pensamento da comunidade cristã estão fundamentalmente em, e continuamente

reavaliados à luz da Escritura” (p. 45). Continuando a ideia de que Deus pode ser

suficientemente conhecido, neste ponto McGrath se apega à premissa de que Ele só

pode ser conhecido pelas Escrituras. Partindo de um argumento circular, mostra como

no Evangelicalismo a autoridade de Cristo é confirmada nas Escrituras e autoridade da

Bíblia advém do Cristo revelado, que é o Centro de toda a revelação divina. “Há uma

ligação orgânica e essencial entre os dois” (p.47).

Neste ponto o autor aborda a questão da suposta “crise em autoridade bíblica”,

argumentada pelas academias. McGrath chama a atenção para o fato de que o número

de cristãos que tomam a Escritura como autoridade está aumentando, e diminuído o

número de simpatizantes liberais. A visão de autoridade bíblica do Evangelicalismo é

rebatida por acadêmicos que argumentam que o homem vive numa época de autonomia

intelectual, onde cada indivíduo deve elaborar suas próprias regras e valores. Cristãos

evangélicos defendem a autoridade e creem que ela detém a verdade libertadora. Os

críticos da autoridade bíblica sugerem que os cristãos experimentariam a verdadeira

liberdade se abandonassem o conceito de autoridade bíblica.

McGrath aborda quatro abordagens rivais à autoridade bíblica: a cultura, a

experiência, a razão e a tradição. A primeira abordagem parte do pressuposto que a

teologia deve buscar legitimação e justificativa pública na cultura ocidental, ainda que
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isso signifique tornar-se irrelevante e pouco abrangente para outras culturas. A segunda

abordagem parte da ideia de que não se pode fazer teologia dissociada da experiência

humana. Há duas correntes nesta abordagem: uma liberal que defende que a experiência

é o que “provê um recurso fundamental para a teologia cristã” (p. 61); e uma

tradicional, que defende que a teologia é que oferece uma estrutura interpretativa pela

qual a experiência humana pode ser interpretada. A terceira abordagem, a razão,

entende que a teologia não pode servir de regulamentador de padrões universais por

questões morais. A Bíblia deve ser lida dentro do contexto cultural onde ela foi escrita e

não serve de padrão para outros contextos. E por último, a tradição, argumenta a força

da teologia a partir de sua existência e influência histórica. A tradição pode significar

que aquilo é tão verdadeiro que durou por toda a história, mas também pode significar

que sempre estivemos errados. McGrath discute que os quatro elementos são

importantes para o evangelicalismo. Este movimento fez uma releitura da autoridade

bíblica, sem comprometer a revelação. Afirma McGrath: “O compromisso com a

autoridade bíblica permanece; é meramente o modo de sua articulação que está

mudando” (p. 99).

O terceiro capítulo trata da relação do evangelicalismo com pós-liberalismo. Se

nos primeiros capítulos McGrath se preocupou basicamente com as bases do

Evangelicalismo, a partir deste capítulo até ao final ele se preocupará com as bases de

abordagens rivais, “bases sobre as quais podem ser criticadas” (p. 101). O pós-

liberalismo surgiu na década de 60 como fruto da desilusão com o liberalismo. Era na

verdade uma reação ao liberalismo que sempre foi visto, de acordo com McGrath,

“como uma ameaça séria à integridade e identidade cristã” (p. 101). Enquanto o

liberalismo teológico se ocupava em formar uma teologia a partir de conceitos

universais, o pós-liberalismo propunha uma interpretação dos conceitos à partir do


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contexto bíblico. Willian C. Placher foi o responsável por propor três características

fundamentais do pós-liberalismo: “a primazia da narrativa como categoria

interpretativa, a primazia da hermenêutica do mundo criado sobre o munda da

experiência humana, a primazia da linguagem sobre a experiência” (p. 102).

Relacionando o pós-liberalismo ao evangelicalismo, McGrath apresenta os

fundamentos da crítica pós-liberal ao fundamentalismo liberal, asseverando que os

universais do liberalismo não passavam de ideias obsoletas, pouco práticas para a

humanidade. Neste ponto ele ressalta o gênero distintivo e singular do cristianismo, que

é o caráter intra-bíblico da interpretação, sua história especial e seu diferente conjunto

de valores. O capítulo se fecha com as apreciações de três pensadores pós-liberais

(Lindbeck, Hauerwas e Frei) sobre o Evangelicalismo a respeito do que é a verdade,

porque a Bíblia e porque Jesus Cristo. McGrath conclui sugerindo que pós-liberalismo

como sistema de pesquisa pode ser muito útil ao evangelicalismo e que um

relacionamento nestes termos entre os dois é possível.

No capítulo 4 o autor discute a relação entre o evangelicalismo e o pós-

modernismo que começou a se despontar na década de 70 em reação ao Iluminismo. O

iluminismo era estritamente racionalista e afirmava que a razão podia levar o homem ao

conhecimento pleno e perfeito de Deus e de sua vontade. O pós-modernismo se

levantou rejeitando os ideais do Iluminismo alegando que sua abordagem era falsa e

prejudicial. Logo após uma série de conflitos e crises mundiais como duas guerras e a

grande depressão, a humanidade começou a perder confiança no mundo moderno e

acusava o iluminismo de prenunciar esses eventos. O Evangelicalismo de certa forma

sofreu influências do iluminismo ao começar a racionalizar a fé incorporando parte de

suas ideias. O Iluminismo afetou principalmente a visão do evangelicalismo quanto à


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natureza da Escritura, o significado de espiritualidade, o uso da apologética e a prática

do evangelismo. O Evangelicalismo passou a tratar a Bíblia como um mero depósito de

doutrinas desconsiderando a narrativa bíblica em si. Também passou a entender

espiritualidade como um entendimento racional da verdade e ajustamento a essa

verdade. Além disso transformou a defesa da fé num sistema racional de comprovação

por meio da razão simplesmente e o evangelismo em persuasão por meio do discurso

colocando de lado o aspecto sobrenatural da fé. O pós-modernismo chegou com uma

nova proposta, afirmando que é possível conciliar ideias conflitantes, ou pelo menos

tolerar. Surgem então o pluralismo e o relativismo, para os quais toda interpretação é

válida, mas sem valor universal. Nesses conceitos o diálogo e a tolerância são valores

mais importantes que a própria verdade. O pós-modernismo tem aversão à verdade,

tendo-a como uma ideia ou ilusória ou opressora. Neste ponto o autor apresenta as

ideias de Foucault, que argumenta que “a ideia de verdade brota dos interesses dos

poderosos” (p. 162), e de Lyotard, que afirma “que um resultado imediato da

diversidade inerente do mundo pós-moderno deve ser o abandono de qualquer noção de

um „consenso‟ moral ou intelectual” (p. 166). Enquanto isto o Evangelicalismo se

propõe como absolutista e singularista.

O último capítulo é sobre a relação entre o Evangelicalismo e Pluralismo

Religioso. McGrath mais uma vez apresenta o Cristianismo como único e singular

diferenciando-o de qualquer outro sistema religioso ou ideologia. A ideia de pluralismo

religioso é vista na pós-modernidade como necessária e benéfica para a humanidade.

Toda religião que assevere ser a religião verdadeira é tido como fundamentalista e

intolerante, o que não cabe no conceito de liberdade do homem pós-moderno. No

pluralismo, religião não é um caminho para Deus, mas um caminho para o interior do

próprio homem. O homem precisa se encontrar na sua fé, qualquer religião que
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promova isto é reputada como boa. O Evangelicalismo se impõe neste contexto

apresentando o Cristianismo como uma religião exclusivista, singular e diferenciada.

Este interpreta as outras religiões como desvios da verdade, por ter um entendimento

completamente diferente de Deus, da natureza e do meio de salvação. No Cristianismo o

Deus verdadeiro se revela em Cristo enquanto nas outras religiões não. O interesse do

pluralismo não é pela verdade e sim pela promoção da tolerância. McGrath afirma que

“o Evangelicalismo reconhece que o Cristianismo existe no meio de uma pluralidade de

religiões” (p. 201), mas ao mesmo tempo não vê necessidade de abandonar suas

convicções por causa dessa coexistência.

McGrath organizou formidavelmente o livro Paixão pela verdade tornando a

leitura agradável e fácil compreensão. Ele conseguiu comprovar a coerência intelectual

do Evangelicalismo em contraposição com diversas abordagens rivais de forma ao

mesmo tempo maestral e simples. Há uma grande e clara interatividade entre um tópico

e outro. A transição de capítulos é feita de forma muito tranquila, visto que ele se

preocupou em ligar a conclusão do capítulo anterior com a introdução do seguinte.

O autor peca em três pontos: não deu uma definição clara do que é o

Evangelicalismo no início do livro; não mostrou a origem histórica do Evangelicalismo

a partir do pietismo alemão e do metodismo inglês; e não fez distinção entre o

pensamento reformado e o Evangelicalismo, o primeiro mais fiel aos princípios da

reforma e o segundo muito influenciado pelo iluminismo. Apesar desses pontos

negativos o livro é de uma riqueza histórica e intelectual admiráveis. McGrath é de fato

um grande escritor.

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