Você está na página 1de 20

O CRISTÃO E A CULTURA

– Michael Horton –

“Não peço que os tires do mundo, e sim que os guardes do mal” (Jo 17.15)

Introdução

Se o mundo é do meu Pai, por que eu estou só passando por ele?


Ao longo dos anos, temos criado os nossos próprios guetos de artistas, superestrelas e
apresentadores, com versões cristãs de tudo o que há no mundo;

Para a Igreja medieval, a filosofia, a arte, a música e a ciência se confundiam tanto com a
religião que era impossível distinguitr uma da outra.

A pressão para justificar a arte, a ciência e a diversão em termos do seu valor espiritual ou
sua utilidade evangelística acaba prejudicando tanto o dom da criação quanto o dom do evangelho.

Reforma → A vocação passou a ser um dom da criação. Até mesmo os não cristãos, que
também portam a imagem de Deus, possuem esse chamado divino. A Reforma defendia uma
teologia que abarca o mundo; os temas bíblicos por ela recuperados trouxeram de volta ao povo de
Deus um sentido de pertencer a este mundo durante o tempo que Deus nos deu, mas no sentido de
estarem no mundo e não de serem do mundo.

A pressão para justificar a arte... faz com que a indústria cristã imite a arte comercializada do
entretenimento secular; isso banaliza tanto a arte quanto a religião. Há um erro no ato de criar
versões distintamente “cristãs” de tudo no mundo (ou seja, na criação);

“Cultura”: sentido mais amplo; tanto a cultura popular (esportes, política, ensino público,
música popular e diversões, etc.) como à alta cultura (horticultura, literatura, as artes e a ciência, a
música clássica, a ópera, etc.). Conceito → a atividade humana que tem como objetivo o uso, o
prazer e o enriquecimento da sociedade.
“igreja”: a igreja institucional onde a Palavra é pregada e os sacramentos administrados;
também, o organismo vivo fundado por Cristo;

Cap.1 Como ser um cristão secular

“Só quero servir ao Senhor.” – Normalmente, nós consideramos a paixão por servir ao
Senhor como uma paixão por missões, evangelismo e envolvimento nas atividades e nos ministérios
da igreja institucional. Vamos repensar.

Dificuldade de entender a relação com o mundo → perceber a terra como um reino


governado por Satanás; melhor o evangelismo do que a atividade secular;

Satanás está no controle?


2Co 4.4 – muitos concluem que o munco está sob o controle de Satanás e suas hostes;
dualismo cósmico entre Deus e Satanás, luz e trevas, bem e mal; (impulso gnóstico!!)
[critica a visão de muitos sobre batalha espiritual, demônios territorialistas, etc;] → Na
Bíblia, a batalha espiritual ocorre na terra, quando Satanás tenta confundir o crente ou diminuir nele
a confiança em Cristo; é uma batalha pelos corações e pelas mentes, e tem a ver com a verdade
versus erro, fé versus incredulidade, crença em Cristo versus crença em qualquer outra coisa ou
pessoa.
“o deus deste século” não significa que Deus reina no âmbito espiritual enquanto um deus
mau reina nas arenas “seculares” e “mundanas” → o sentido é que satanás é apenas deus deste
mundo no sentido de que ele está sendo servido como se fosse Deus.
Não seria o máximo da arrogância, beirando a blasfêmia, sugerir que é a vitória do crente
sobre as forças demoníacas, em vez do triunfo de Cristo de uma vez por todas, que garante a
libertação das amarras de Satanás?

Alguns bons exemplos


Como podemos nos tornar “cristãos seculares” no melhor sentido da expressão?
Tomar o mundo como uma atividade espiritual e piedosa, em vez de separar-se dele com o
entendimento distorcido de estar se separando do pecado. [Lutero dizia que até mesmo na cela do
monge ele tinha aquele malando junto consigo]; [ex do Lutero e o sapateiro];
– Na Família: ideia de que era algo secular e comum, portanto, cristãos mais devotos se
separariam dessas preocupações para subir a escada da piedade cristã; relação sexual era
vista como um mal necessário para a procriação; Reforma mudou isso; Lutero é ume ex.
– Na Arte: compara-se arte medieval religiosa e o barroco holandês secular para ver a antiga
necessidade de justificar a arte com o elemento religioso; / ex: Família Sagrada retrata em
halos dourados e em Rembrandt, com aspecto campesino; princípios: (1) há aceitação do
mundo como ele é de fato, criado por Deus, mas quebrado e corrupto; (2) não é necessário
“santificar a arte e exigir que ela sirva aos interesses morais e religiosos da igreja.” A criação
é uma esfera legítima por direito próprio. A Reforma libertou a arte das amarras, permitindo
que ela fosse um empreendimento puramente secular, para a glória de Deus.
– Na Música: músicos como Bach que moveram-se livremente entre o secular e o sagrado sem
confundir nenhum dos dois; nas artes dramáticas, peças medievais eram sempre do bom e
mau; Beza escreveu a primeira tragédia francesa;
– Na Literatura: surgimento do romance moderno, estudos históricos, variedade;
– Na Ciência: ex de confusão – o caso de Corpénico; Para os reformadores, a Bíblia era sobre
Cristo, não sobre o relacionamento dos planetas; “o segundo livro de Deus” (criação)
harmoniza-se com o primeiro (as Escrituras);
– Na Educação: Lutero persuadiu o governo a proclamar a educação universal compulsória
tanto para meninas como para meninos pela 1ª vez na história ocidental; Calvino e a
Academia de Genebra; João Comenius, reformador polonês e pai da educação moderna;
– Hoje – Abraham Kuyper “Não existe uma só polegada, em todo o domínio da nossa vida
humana, da qual Cristo, que é soberano sobre tudo, não proclame 'Meu!'”

Cap 2. Esfera de soberania: cuidar dos nossos próprios afazeres

Ideia de Kuyper: “esfera de soberania”; ex: Transformamos as escolas por meio da política?
Na Escritura, encontramos as tarefas culturais como tendo sido dadas antes mesmo da
criação do governo, sendo este último necessário em razão da Queda.

Na política, ativistas cristãos e liberais seculares muitas vezes são mais parecidos do que
desejamos admitir. Eles parecem compartilhar uma dependência do Estado e da esfera política ou
judicial para resolver os problemas morais e espirituais da sociedade. Não seria melhor focalizar os
deveres dos pais no lar em vez de entregar a responsabilidade aos políticos?
Na arte: esperamos que haja utilidade social para o empreendimento. Deve ajudar o culto,
evangelismo, incentivar moralidade, patriotismo cívico, desenvolver caráter... Porém, a arte tem o
seu valor intrínseco. Rookmaker: a arte não precisa de justificativas.

Família: o lar ser uma pequena igreja ou pequeno seminário; Deus quer que pais assumam
plena responsabilidade por suas família; não devem culpar outras instituições e nem depender delas
para as condições do lar (ex: o estado, escolas, o mundo em geral);
O lar foi a primeira instituição da sociedade fundada por Deus; é o bercário da igreja → a
família é a única instituição social que é ao mesmo tempo secular e sagrada. (família de ateus não
são menos fundada por Deus; eles criam famílias não apenas pelo instinto biológico, mas, por cauda
da imagem de Deus que os faz criaturas que requerem comunhão).
O lar cristão é: uma instituição civil, arraigada na criação; e uma instituição sagrada,
arraigada na redenção;
Obs: a resposta final não está na política, na igreja ou no lar, mas em Deus;
– igreja: restauração da sua confiança no poder da Palavra
– família: restauração da sua confiança na importância do tempo de qualidade e na Escritura
– nação: restauração da sua confiança na missão secular de proteger seus cidadãos;

Cristo e a cultura
“Christ and Culture” (1951), de H. Richard Niebuhr (neo-ortodoxo alemão reformado);
classificou cinco abordagens diferentes:

1- Cristo contra a cultura


dos primeiros cristãos; reação compreensível devido a perseguição dos primeiros séculos;
monasticismo; também, característicos dos anabatistas do séc XVI;
Porém, essa rejeição da cultura é evidente não só nos místicos, monges e mártires, mas
também naqueles que secularizaram a mensagem de Cristo;
Tendem a gloriar-se na natureza irracional da fé; marcados pelo legalismo; há suspeita do
mundo natural; a Escritura é secundária em relação aos lampejos espirituais intuitivos; o elemento
gnóstico nessa abordagem torna-se evidente; coisas terrenas são inerentemente pecaminosas,
enquanto coisas celestes são inerentemente virtuosas.

2- O Cristo da cultura
na outra extremidade, Cristo existe como a encarnação da própria cultura; herança do
liberalismo protestante; o liberalismo alemão tentou tornar o cristianismo razoável para o
iluminismo que não cria mais nos milagres. Cristo era menos o Deus-homem e mais um moralista.
[rendem Jesus às suas agendas ideológicas, politizam-no] – Cristo é identificado com o que
os homens concebem como os seus mais altos ideais, suas instituições, sua melhor filosofia.

3- Cristo acima da cultura


nem antagonismo, nem assimilação (como as duas anteriores); a questão fundamental não é
entre Cristo e o mundo, mas entre Deus e o homem; essa abordagem sugere que o mundo não é nem
abençoado e nem amaldiçoado; Niebuhr atribui a Tomás de Aquino;

4- Cristo e a cultura em paradoxo


dualismo; afirma a cidadania dupla do cristão, membro da cidade de Deus e da cidade dos
homens; esferas diferentes, com propósitos diferentes; há forte diferenciação: graça de Deus,
pecado no homem; criação e redenção; ideia de que a cultura jamais será um meio para se encontrar
a Deus; mas ela tem um propósito diferente, uma pessoa encontra prazer no trabalho, família, artes,
educação, etc. Lutero enfatizou esse tema com a sua doutrina dos dois reinos; Calvino apoiava a
ideia; Contudo, ele insistia com os crentes para que vivessem com influência notada na cultura.

5- Cristo, o transformador da cultura


a que Niebuhr escolhe; não há ilusão de que o mundo vire o Paraíso pelo progresso humano,
mas há anseio para ver avanços científicos; não fica apenas de lado, quer ser agente de reforma no
mundo; cristãos transformacionais querem tornar o mundo melhor;
(1) doutrina da criação é importante: o não cristão ainda porta a imagem de Deus e, pela
graça comum, é capaz de grandes feitos de bem cultural; (2) convicção de que a humanidade é
caída, total depravação; mas → não somos pecadores porque somos humanos! O pecado é
consequencia da rebeldia moral, da queda; Portanto, o problema não é o mundo, mas a oposição do
mundo a Deus; o crente deve participar do mundo como um tratro que expõe tanto a glória de Deus
quanto o pecado humano; (3) o mundo aguarda redenção; há expectativa de vitóriar parcias
ocasionais; ponto de vista de Agostinho, Calvino e da tradição reformada.

As Escrituras e a cultura
Pontos fracos da obra de Niebuhr: tende ao reducionismo; é simplista ao colocar
movimentos e indivíduos em categorias demarcadas; ex: a igeja romana representou diversos
movimentos – monges (cristo contra a cultura) e papas (cristo da cultura);
O que as Escrituras ensinam?
AT: há dois reinos; o reino e a cultura de Deus estão unidos enquanto a nação (israel)
espelha o reino de Deus; Israel quebra a aliança, é exilada, os reinos são divididos;
NT: os crentes colocam suas esperanças num reino melhor, celeste;
Obs: (a) evitar confundir reino de Deus com nação terrena (ex: israel); (b) evitar ver a
cidadania no céu como antítese e participação da cidadania na terra;

Em muito agimos nos extremos: “Cristo contra a cultura” e “Cristo da cultura”


→ demonstramos ódio pela alta cultura, mas estamos viciados na cultura popular;
desprezamos a cultura, mas permanecemos muito ativos nela;

Proposta: conciliar mais “Cristo e a cultura em paradoxo” e “Cristo transformador”


→ este mundo é do meu Pai Celeste, e no entanto, aqui não é o meu lar!

Cap. 3 “Vã filosofia”: uma desculpa para o anti-intelectualismo?

Cl 2.8
Tertuliano: “é a filosofia que fornece a bagagem intelectual para as heresias”; ao enfrentar o
gnosticismo, disse: “maldito Aristóteles, que ensinou-lhes a dialética, a arte que tanto destroi quanto
constroi”; Tertuliano estava lutando com gnósticos que exploravam esse método; isso fez com que
ele o abandonasse e usasse o texto bíblico para o combater (a dialétca); Tertuliano trovejou: “o que
tem Jerusalém a ver com Atenas, a igreja com o mundo acadêmico, o cristão com o herege?”... para
Tertuliano: “Depois de Jesus Cristo não temos necessidade de especulação, deopis do evangelho
não precisamos mais pesquisar.”
Do outro lado – Justino Mártir: procurou provar a superioridade intelectual e filosófica do
cristianismo; abriu a 1ª escola cristã em Roma; porém sua apreciação à razão o levou a aceitar
ingenuamente ideias seculares que minavam ensinos sobre pecado e graça, natureza da alma e a
criação. Dois lados: (1) Tertuliano: amor pelas Escrituras, cego para a graça comum, espécie de
alienação; (2) Justino Mártir: Boa apologética, mas elevou a razão, espécie de secularismo;

Ninguém jamais se levanta, hasteia uma bandeira e grita: Estamos permitindo que o mundo,
em vez da Palavra, determine o que cremos e como viveremos“; no entanto, é exatamente isso o que
acontece em cada período de declínio.

Se uma abertura para com a filosofia na religião sempre leva à perversão de ambos, por que
não simplesmente tampar os nossos ouvidos, ignorar o mundo e ler só a Bíblia? Por que perder
tempo com a sabedoria do mundo, se o risco é tão grande?

O valor da criação
A advertência bíblica é contra confundir coisas celestiais e terrenas, mas não é contra as
coisas terrenas (!!); o perigo está em confundir o que sempre deve ser distinto.
Não é que Paulo cresse que Platão e Aristóteles nada tinham dizer a respeito de qualquer
verdade ou valor, mas que, sempre que eles falavam de temas que a Bíblia falava, o que regeria
sempre o coração e a mente do cristão teria de ser a Escritura!

Paulada → Enquanto muitos evangélicos insistiram que estão imunes às “filosofias


mundanas e seculares dos homens”, simplesmente porque nunca leram um livro de um filósofo
secular, o próprio movimento demonstra uma imensa dívida para com o pragmatismo filosófico de
William James, o utilitarismo de John Stuart Mill, e o consumismo do final do século 20. Talvez os
nossos pastores não leiam esses autores, mas eles leem os especialistas em crescimento de igreja
que foram treinados em sociologia, psicologia e marketing e demonstram muitas vezes maior
conhecimento dessas disciplinas seculares do que da teologia da Escritura (!!!)

Problemas terrenos
a) cristãos que dizem sem compaixão que Jesus é a resposta pra todas as mazelas;
subestimam o problema e deixam de ser resposta;
b) acham que em razão da queda não existe nada ou quase nada bom e belo no mundo que
não seja especificamente cristão; assim temos a subcultura de acessórios cristãos;
Muito bom, ler → Institutas 2.2.15 (reconhecimento dos notáveis);

Esperanças celestiais
essa confusão entre coisas seculares e celestiais tmb subestima as coisas celestiais: o céu é
alto demais, portanto, em vez de encontrar Deus onde ele permite que o conheçamos (na revelação)
por meio da fé, tentamos trazê-lo para o nosso nível (na experiência) pela especulação.

Paulada → Se conhecêssemos o suficiente da Palavra de Deus pare reconhecer, por


exemplo, que a resposta terapêutica da “autoestima” está muito longe e é muito inferior à riqueza de
“Agora nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus”, seríamos capazes de discernir
o trigo da verdade do joio dos sentimentos populares.

Levar cativo todo pensamento


Portanto, Paulo não ataca a filosofia em si, mas o gnosticismo que promoveu confusão entre
o cristianismo e a filosofia grega; a chegada da última contaminou a doutrina;
Obs: o inimigo não é o incrédulo ou as instituições do mundo, mas toda ideia que tem a
audácia de se levantar contra o trono de Cristo;

Apologética
At 17 → Paulo edificou pontes de compreensão ao citar de memória a poesia e a prosa de
filósofos gregos seculares; Isso não foi confundir coisas terrenas (filosofia grega) com coisas
celestiais (Deus e a salvação), mas foi construir uma escada da terra para o céu usando a revelação
natural que os seus ouvintes possuíam; A revelação natural (verdade que havia na filosofia grega)
foi útil até certo ponto, depois, somente e revelação especial (Deus, condição humana, juizo e
salvação). Paulo entendeu e explorou a verdade da visão secular do mundo, mas julgou os erros a
partir da Escritura.

Os que desconhecem a força daquilo que faz parte da escravidão do incrédulo nunca saberão
como libertá-lo (!!!!)

Evitar os dois perigos


a) só porque a sabedoria e o conhecimento popular não navegam em direção a Deus por
meio de Cristo, não significa que são inuteis; só porque não se obtem salvação dos grandes
filósofos, não significa que devemos desprezá-los; assim, a várias áreas do saber seriam
irrelevantes; só porque não se aprende sobre a redenção na cruz com as artes e as ciência não
devemos descartá-las; quão proveitoso é a cura para uma doença através da pesquisa científica;
Existe muito que vale a pena conhecer sobre coisas seculares, que a Bíblia não ensina.
Contudo, não existe nada a respeito de Deus que o mundo possa nos dizer com mais verdade do que
o próprio Deus já revelou na sua Palavra (!!)

toda pessoa possui uma perspectiva filosófica que influencia até mesmo sua maneira de ler a
Bíblia; seja de Sartre ou da TV, sofisticado, urbano, superficial, passageiro. É ingênuo pensar que
não somos afetados pelo contexto em que vivemos; Temos que trazer esses preconceitos de tempo e
lugar à tona, julgá-los pela Palavra, e reter aquilo que é bom.

Dn 1.3-5 → Daniel e seus companheiros da corte israelita recusaram as iguarias da mesa do


rei, contudo, eles aprenderam a língua e a literatura da Babilônia (!!!) ver Dn 1.17-20.
José foi elevado a uma posição de destaque semelhante no Egito;

Cap. 4 O cristianismo e as artes

Se sente culpado por gostar de um filme por sua arte ou atores ainda que reconheça que sua
msg seja errada?
Embora exista uma pocentagem respeitável de arte criada por cristãos através dos séculos,
nos dias atuais a interação dos crentes com as artes é desconfortável. Talvez não pelo utilitarismo
que destroi o impulso artístico, mas o pragmatismo do evangelismo e das atividades da igreja;
Será que um crente talentoso tem que escolher entre Cristo (dirigir cânticos de louvor) e o
mundo (cantar ópera)?
Antigamente: música da igreja era “alta arte” (ex: Bach) e músicas de qualidade; produzia-se
pela responsabilidade com a igreja, não com a indústria multimilionária da musica cristã;
Nos falta considerar a questão da beleza;
Muitos de nós que fomos criados no mundo evangélico atual, afogados no mar da
modernidade (marketing, psicologia, sentimentalismo melindroso, individualismo, etc.) nos
encontramos numa terra estranha quando o foco está nos atributos de Deus e nas verdades da
história redentora... cânticos refletem foco autobiográfico (centrado no homem) sobre mim e as
minhas experiências, minha decisão, minha obediência, minha felicidade.

Adoração como “autoeexpressão” → Queremos “nos expressar” por meio de cânticos de


louvor, enquanto nos hinos clássicos antes do séc 19 os crentes queriam compreender Deus e a
redenção (!!!)

Na arte, nós estamos novamente no âmbito da criação, não da redenção; da graça comum, e
não da salvadora; do secular, e não do sagrado. Contudo, tanto a criação, como o comum e o secular
têm a benção de Deus mesmo que não tenham utilidade na igreja ou nas missões evangelísticas.

Critérios artísticos:
Quais são os critérios bíblicos para se julgar a boa arte em contraposição à arte ruim?
Nenhum. Arte: mais ligada às impressões da imaginação do que aos argumentos e ao caráter
descritivo; diferente do cientista, o artista não presta contas da sua visão do universo;
ex: pinta mapa da cidade (objetivo e realista), essência da cidade (subjetivo, impressionista);
as Parábolas são como a segunda, transcende a linguagem puramente descritiva; e as parábolas de
Jesus são tão verdadeiras quanto suas declarações proposicionais;
[entra em hermenêutica histórico-gramatical e mergulha em comentar sobre – deixa o
assunto da arte de lado.]
→ expressões artísticas (seja um pouco de poesia, alegoria ou metáfora) muitas vezes
traduzem uma impressão ou destacam um ponto que explica mais claramente as coisas, de um modo
que uma proposta clara por vezes não consegue. No entanto, essas expressões não podem ser a base
na qual elaboramos a nossa teologia.
Obs: os artistas não receberam um mandato divino para serem lógicos, dedutivos ou
indutivos, realistas ou abstratos. O objetivo deles não é principalmente educar, evangelizar ou
exortar, mas entreter e provocar. (!!)

“Arte cristã”:
Existe tal coisa? Eram os grandes escritores e artistas de séculos passados, como Milton,
Bunyan, Handel e Rembrandt pioneiros da “literatura e arte cristã”, ou simplesmente cristãos que
criaram boa arte? Em qualquer curso secular de literatura que ainda aprecie os clássicos do
Ocidente, o número de escritores que professam ser cristãos é a maioria, mas as suas obras são
classificadas como “clássicos da literatura”;

Obs: Os cristãos devem sentir-se livres para apreciar e criar música popular, se esta for a sua
preferência, mas será que isso é aceitável no culto?
Não podemos permitir que o mundo dite como cantaremos ou falaremos na presença de
Deus. É Deus, e não os de fora da igreja, que nos dá o modelo de culto.
Cristãos reformados se arriscam a ser chamados de “mundanos” pelos mesmos que
permitiram que o mundo definisse a sua própria vida espiritual e a arte que produzem.

É por isso que a distinção entre “secular” e “sagrado” deve ser mantida. (!!!) A Reforma não
rejeitou essa distinção, mas rejeitou a hierarquia ligada a ela, como se uma fosse mais importante ou
espiritualmente aceitável a Deus.

Deus está envolvido em toda a vida e não se limita ao “religioso”. Deus está tão envolvido
com a criação quanto com a redenção. Interessado tanto no comum quanto no sagrado. (!!!)
Problema → Igreja Medieval: não só distinguia o sagrado e o comum, mas fazia com que
uma fossa boa e a outra má, de modo que eles pensavam que os cristãos mais espirituais eram os
que seguiam o “serviço cristão de tempo integral”, em vez de vocações “seculares” (comuns).

É pos isso que a arte e a religião requerem existência independente – não uma existência
sem relação ou isolada, massuma existência distinta. Quando os cristãos perdem a fé no poder da
Palavra, eles se voltam para as imagens, mas a expressão artística não é um caminho confiável para
Deus; (!!!)

“Ficção cristã”:
como devemos ver as tentativas de alguns escritores de produzir “ficção cristã”?
Corre-se o risco de não se ter nem boa teologia e nem boa literatura; a expressão artística
acaba tendo de ser justificada por uma mortal da história cristã; transforma o cristianismo em
moralismo e não no anúncio da redenção, e faz da literatura um sermao em vez de uma história.

Bom ex, Lewis: há grande forças nos arquétipos (ex: Aslan – Cristo) → os leitores podem
ter uma impressão mais forte do caráter de Deus e de seus modos de lidr com os seres humanos pela
leitura dessa ficção, que nunca mencionaa Deus, a igreja ou qualquer outra coisa explicitamente
cristã por nome. Como nas parábolas de Jesus, a ficção não precisa ser explicitamente cristã. (!)
Observe como cada uma das parábolas de nosso Senhor pode manter-se por si mesma como
história, e só são vistas como explicitamente cristãs quando ele as explica em termos de não ficção.

Obs: não significa que isso é um modelo regra; escrever ficção não explicitamente cristã,
mas que os personagens transmitam verdades cristãs; não. Podemos escrever contos de fadas ou
poesias que não deixa algo subententido sobre religião ou ser cristão, porque toda a realidade foi
criada por Deus, quer nós mencionamos ou não; quer os leitores creiam ou não.

Secular e sagrado
Ao distinguir entre “secular” e “sagrado”, não estaríamos voltando ao isolacionismo e
separatismo que diz haver um lugar certo para os cristãos aqui, mas não ali?
A Reforma libertou cristãos da dicotomia secular-sagrado: sim e não.
– sim: quebra do dualismo neoplatônico entre espírito e matéria; tudo para a glória de Deus;
– não: manteve-se a distinção entre “coisas celestiais” e “coisas terrenas”;

ex: varrer o chão não é uma atividade religiosa ou cristã, mas glorifica a Deus porque é
serviço e vocação para com o próximo, de alguém que leva em si a imagem de Deus. (!!!!)

Há a distinção clara na Bíblia entre o santo e o comum. Israel, não santa; Egito, Babilônia,
Pérsia, comuns; elas não eram separadas, ainda assim, alvos da graça comum, da revelação natural;

Não há nada de errado com arte que apele aos sentimentos e à imaginação, mas há muito de
errado com um culto motivado por sentimentos e imaginação. Portanto, a música para ser cantada
na igreja deve ser julgada por critérios diferentes daqueles pelos quais julgamos a arte comum.
Não há nada não espiritual sobre apreciar um concerto secular por simples prazer. Embora
não devamos ser ingênuos quanto às visões do mundo que formam a música secular, nem ignorar a
letra porque gostamos da música, não precisamos ser rigorosamente analíticos quanto à música.
Mas temos de ser rigorosamente analíticos quanto à música sacra. Porque ela não foi feita
simplesmente para o nosso entretenimento: é feita para adorar a Deus! Deve ser verificado a
integridade teológica;

Cap. 5 A arte na vida do cristão

Nós, evangélicos, consideramos a questão do belo com certa falta de jeito.


[relata um conto romântico de tendência gnóstica (dualismo neoplatônico) que exalta o
quanto a matéria é má e o espírito é bom e puro; ideia de que só o artita entende verdadeiramente o
significado além da realidade, enquanto o restante do mundo se contenta em viver uma vida prática,
comum, material e cotidiana.] → Lewis: “Um autor jamais deverá ver a si mesmo como o criador
da beleza ou sabedoria antes inexistente, mas simplesmente como alguém que procura demonstrar
pela sua própria arte algum refleco da Beleza e da Sabedoria eternas.”

A arte não é nem mundana e nem redentora, nem de baixa estirpe e nem divina. Por um lado
há a tendência de julgar tudo, inclusive a arte, por sua utilidade; por outro, a tendência de associar a
arte com o “espiritual”, como se trabalhar com ferro fosse menos espiritual simplesmente por sua
relação com a matéria.
Como um cristão poderá entender melhor a arte e ajudar outros a apreciá-la mais?

Como entender a arte


Como ler ficção
Desligar a MTV
O bom, o verdadeiro e o belo
Em matéria de arte, o “bom” de uma pessoa poderá ser o “mau” de outra, e esse relativismo
muitas vezes leva as pessoas modernas a concluir que o mesmo pode ser dito da religião e da moral
em geral. Se não distinguirmos as esferas, criaremos o dogmatismo que leva à relativização da
religião e da moral;
o “bom” na arte: lembrandro sempre que estamos no âmbito da criação, não da redenção; da
experiência, não da revelação.
Obs: é possível ter prazer na arte semp aprovar o artista (!!)
É também possível que determinada obra seja boa num sentido estético (ou seja, artístico),
mas moralmente má, e vice-versa.
E ela não é proibida para o cristão → ora, se fosse assim, a descrição do adultério de davi
com Bate-Seba e o assassinato de Urias ideado por ele seriam impróprios para os ouvidos cristãos.
De modo semelhante, encontramos na Escritura expressões ou descrições que não são
verdadeiras. (é essa rica diversidade que encontramos na Escritura que tantas vezes falta na
expressão cristã contemporânea);

Donne não precisavar usar o nome de Deus para validar as suas poesias do mesmo modo
que Deus não precisa estampar o seu nome nas árvores, nas pedras, nas montanhas, nos vales e nas
criaturas para validá-los (!!!!!)

temos que discernie o verdadeiro, o bom e o belo (Fp 4.8)

Cap. 6 O cristianismo e a ciência moderna: não podemos ser amigos?

Kuyper: “Há escondido no calvinismo... um impulso, uma inclinação, um incentivo à


investigação científica.”
Por que a ciência floresceu nas terras protestantes e não nas católicas romanas?

Stanley L. Jaki → a ciência nasceu e cresceu à maturidade na “cristandade”; A crença de que


Jesus Cristo é o único filho gerado de Deus, tornou-se não apenas a afirmativa central da convicção
cristã, mas criou um ninho cultural propício para “chocar” esse ovo frágil que costuma ser abortivo.
O monoteísmo cristão (aa fé num só Deus em três pessoas) não apenas explicava os fatos científicos
(ordem, unidade, diversidade, etc.) como também oferecia a única base racional para seguir atrás
desses fatos.

John Polkinghorne → teologia e ciência são fundadas sobre as mesmas pressuposições:


buscar oferecer explicações da realidade. Em vez de fé cega, devemos reconhecer a harmonia entre
a revelação natural e a especial, rejeitando qualquer teoria que diga que tenhamos que desprezar os
fatos. Os cientistas protestantes acreditavam que havia dois “livros de Deus” – o livro da natureza e
o livro da Escritura – e que cada um fornecia informação que não se encontrava no outro. No
entanto, eles não eram contraditórios nos seus relatos.

Intoxicado pelas possibilidades empíricas e racionais, o Iluminismo tendia a eliminar a


necessidade dessa revelação especial, e em vez disso decidiu que a ciêencia era em si mesma
competente para chegar às respostas de todas as perguntas importantes.
– antes: boa distinção entre ciência e religião, rev geral e especial, graça comum e especial;
– Iluminismo: cientistas tornanm-se novos sumo sacerdotes do conhecimento humano;

A ciência reivindicou para si mesma também a esfera religiosa (ex: naturalismo,


pressuposição não provada, mas o compromisso religioso que a pesquisa científica adota);
(!!) Ironicamente, a ciência hoje muitas vezes operta sobre a pressuposição filosófica de que
o universo seja produto do acaso; no entanto, todo o empreendimento científico tem de funcionar
com base na pressuposição prática de que existe ordem e projeto até mesmo para justificar um dia
de oito horas no laboratório. (!!)
Não pode haver teorias estáveis, leis físicas, previsibilidade, sem pressupor ordem e plano; e
não se pode pressupor ordem e plano sem levar a algum tipo de crença em como essa ordem e plano
vieram a existir num universo contingente.
Em essência, a ciência não só retirou a Escritura como a explicação do quadro maior das
peças do quebra-cabeça, mas agora procura ser, ela mesma, reveladora.

A religião da ciência:
Como Polkinghorne, Jaki e outros argumentam, a ciência moderna não poderia ter nascido
num país hindu ou budista, porque a essas religiões falta a crença na compreensibilidade do mundo.
Um mundo de puro encantamento e pluralidade politeísta não pode oferecer um berço para
conceitos tais como leis da natureza, da lógica e da razão.
Kaiser: “E oposição aos apoiadores da autoridade papal, os reformadores enfatizavam a
ordenação divina dos leigos cristãos nas questões seculares como o governo civil e as artes
mecânicas” (Creation and the History of Science, Grand Rapids: Eeerdmans, 1991, p.12).
À medida que a Reforma libertou os leigos para chamados seculares e buscas artísticas e
filosóficas não especificamente relacionadas com a igreja e nem medidas por suas aplicações
espirituais e morais, ela forneceu também um espírito crítico e aberto para o florescimento das
ciências.
A ênfase de Calvino sobre a providência divina – foi tmb estímulo para a procura por
padrões e leis. Deus não é só responsável pela salvação e pelo avanço do reino de Cristo, mas ele é
também responsável pela rotação dos planetas.

Os dois livros de Deus


O controle dos planetas e marés dos oceanos eram tanto efeito da obra de Deus quanto
ressuscitar alguém dentre os mortos. Contudo, Deus realiza um como providência divina (que é tão
normal que pode se conformar a determinados padrões observáveis) e o outro como milagre (e é,
portanto, tão extraordinário que não pode ser previsível de acordo com as leis comuns e
observáveis).

A divisão
O que acontece quando a ciência e a Escritura parecem contradizer-se; lembrando que Deus
é o autor de ambos, e que seres humanos imperfeitos podem interpretar de moro errado qualquer
dos dois;
Os Dois Reinos → o reino da natureza era acessível por meio das artes e das ciências com
base na razão e na observação humana; o reino de Deus era acessível por meio do perdão dos
pecados com base no ensino da Escritura. Em última instância, os dois se uniam em Deus: um
baseado em todas as suas obras, o outro baseado na sua palavra.
O protestantismo contribuiu para o surgimento da ciência com uma visão da cultura e da
atividade humana como sendo de serviço ao próximo.

Realismo de bom senso


em grande parte pela influência de Immanuel Kant, que insistia que a fé repousava sobre
uma base irracional e não empírica, a ligação entre ciência e fé foi minada;
Para Kant: fé – âmbito numenal (espiritual); ciência – âmbito fenomenal (coisas de verdade
que podem ser observadas e provadas racionalmente);
O rcionalismo de Kant e o idealismo de Hegel insistem que não existe realidade
independente da mente. A condição pós-moderna na qual nos encontraos atualmente apenas acentua
essa crença. Com o colapso da experiência moderna da razão sem Deus, veio a desilusão com a
própria razão. As pessoas chegaram agora a crer que não existe verdade absoluta. Jacques Derrida
liderou a acusação dos desconstrucionistas literários. O desconstrucionismo acredita que os textos,
seculares ou religiosos, não possuem significado objetivo, mas têm o significado que lhes é dado
pelo leitor e não pelo autor.

O evidencialismo
diz que a realidade é conhecível e que se deve tomar decisões sobre a verdade do mesmo
modo que se tomam decisões sobre os mínimos detalhes da vida cotidiana
[apologética de Princeton – B.B. Warfield e os Hodges / precursor: John Warwick
Montgomery] → argumentou que o melhor modelo para a apologética cristã é o do tribunal de
justiça.

Preparados para responder


precisamos recuperar esse “realismo de bom senso”;
as objeções às reivindicações do cristianismo não vêm na verdade do âmbito da ciência tanto
quanto do âmbito da própria teologia. David Huma, um dos filósofos principais do Iluminismo que
negava o miraculoso, pelo menos reconhecia que estava fazendo um compromisso a priori,
pressuposicional, com a imposibilidade do milagroso, mas muitos cientistas e pensadores hoje
acreditam ingenuamente que a sua rejeição da visão sobrenatural e teíste do mundo é baseada em
fatos, embora seja apenas baseada na fé cega e dogmática no naturalismo.
p.114 → o propósito deste capítulo era convidar o leigo médio, que não é nem teólogo nem
cientista, a considerar o campo comum entre ciência e fé. Se tanto secularistas quanto cristãos
reconhecessem os seus preconceitos e suas pressuposições (nós todos os temos), poderia haver mais
diálogos frutíferos no futuro.

Recuperação espiritual
Por vezes, temos uma visão deísta, ao pensar que quando pernas são alongadas ou mortos
são ressuscitados, Deus está operando, mas quando se trata das obras normais da vida cotidiana,
Deus não está envolvido;
Devemos recuperar a nossa paixão pelo mundo material da criação de Deus;
Devemos recobrar uma apreciação pela relativa autonomia da natureza;
Falar onde Deus falou e permanecer calado – ou permitir que a revelação natural fale – onde
deus não falou nas Escrituras é uma grande arte que precisamos reaprender.

Cap. 7 Trabalhar para o final de semana

Max Weber, a ética protestante e o espírito do capitalismo;


Conquanto o catolicismo medieval tenha consagrado o monge que rejeitava as atividades
mundanas, o protestantismo (em especial o calvinismo) chamava o crente para o mundo.
A interpretação de Weber – provar a eleição por meio da prosperidade material – é um erro e
já foi desmentido; mas é verdadeiro que a Reforma formou uma ética de trabalho protestante, ou
puritana;
antes: trabalho era importante, contribuía para o sentido de comunidade; hoje: trabalho e
cultura artificiais, ocidentais veem trabalho como sem sentido, exaustivo, enfadonho, sevil, odiento,
algo a ser suportado enquanto a “vida” é confinada ao “tempo de folga”;
Não temos existência independente, mas se tirarmos Deus da nossa visão do mundo ou se o
empurramos para dentro da área “espiritual”, enquanto nosso trabalho diário continua sendo
basicamente “secular”, a maior parte do nosso tempo será gasto no que consideramos atividade
desprovida de significado. É a teologia que dá significado a todas as atividades da existência
humana.
O capitalismo estava arraigado na santificação protestante do trabalho, mas o secularismo
substituiu a honestidade, a diligência e a preocupação solidária pelo hedonismo e pela autoestima.
Agora não somos cidadãos responsáveis, mas pessoas portadoras de direitos. O trabalho não é mais
uma vocação, mas um emprego, não é o meu dever servir ao próximo, mas dever dos outros
(geralmente do Estado).

O problema do pietismo:
o pietismo tende a criar um “gueto cristão” que a Reforma tentou desfazer;
chegamos ao ponto de possuir nossas próprias estações de rádio e televisão, cinemas,
programas de entrevistas, cruzeiros, estrelas de rock, divertimentos e outros apetrechos do
hedonismo moderno, sem ter que nos preocupar com deixar o gueto. Chamamos isso de
evangelismo, e talvez até intencionássemos que fosse evangelismo, mas acabou criando apenas uma
igreja que é do mundo, mas não está no mundo.

Julgamos a nossa saúde espiritual em termos de grupos de células, estudos bíblicos, círculos
de oração, etc, e concluimos que somos bastante vigorosos. Porém, o cristianismo bíblico deve nos
levar a padrões diferentes de julgar a saúde: a Palavra está sendo pregada? Sacramentos
corretamente administrados? Prática da disciplina e boa ordem na igreja? Se essas perguntas não
podem ser respondidas com confiança, não há saúde, não importa o ativismo desenfreado dentro do
gueto.
Visão “pietista” de gueto → chamar o crente para fora do mundo e para dentro de atividades
relacionadas com a igreja;
Visão bíblica → chamar o crente para fora da igreja e para dentro do mundo;

Não devemos fazer que as pessoas que trabalham diligentemente na sua vocação
desenvolvam um sentimento de culpa porque não conseguem estar presentes a todas as atividades
relacionadas com a igreja, ou por não se oferecerem para as tarefas ligadas à igreja. É a igreja que
serve ao cristão para que o cristão possa servir a Deus dentro do mundo.
Um cristão não vai ao trabalho na segunda-feira de manhã apenas para converter pessoas a
Cristo; ele vai para seguir a sua vocação, a qual foi ele designado pelo Criador divino.
Se alguém tem essa perspectiva vertical e vê o seu trabalho como um serviço a Deus e ao
próximo, até mesmo as tarefas mais simples ganham significado.
Calvino: olhar para a sua vocação (Institutas, 3.11.6)

A base bíblica para a vocação


Qual o fundamento para essa visão? Gênesis. Deus deu autoridade ao homem porque
somente essa criatura foi feita à sua imagem. Incluído nessa imagem havia um sensus divinitatus.
Por essa razão, o homem é homo religionis, intrinsecamente religioso. Assim, toda atividade
humana foi feita para ser inerentemente religiosa – desde o plantio da semente (agricultura) até a
nomeação dos animaiz (zoologia). [ser-para-Deus ou no ser-para-um-ídolo].

Por vezes, somos tomados de tal maneira pelas consequências da Queda para a alienação
pessoal de Deus que ignoramos os diversos efeitos cósmicos relatados em Gênesis. A maldição pela
transgressão de Adão veio não apenas sobre o relacionamento humano-divino, mas sobre a terra,
sobre o nascimento de filhos, sobre a vida diária no mundo. Este mundo não era mais uma grande
catedral da bênção divina; tornou-se campo de batalha para a guerra civil entre os construtores da
cidade de Deus e aqueles que desejam construir cidades para si neste mundo.

Graça comum: Deus, sendo justo, pode ser longânimo para com o mal no coração de seus
próprios filhos e a rebeldia dos incrédulos; quanto mais nós, sendo injustos, deveremos suportat a
incredullidade e a maldade de nossos vizinhos e colegas de trabalho. → isso não significa omissão,
mas que podemos trabalhar lado a lado com aqueles que não compartilham da nossa crença,
convicção, atitute ou visão do mundo. (!!!)

O que dizer dos fins de semana?


Apatia vs. workholics → visão bíblica requer que tenhamos diligência na nossa atividade
mundana, e também nos conclama levar a sério o descanso. Deus nos chamou, por nos fazer à sua
imagem, para imitar a sua obra, bem como imitar o seu descanso.
AT: modelo de trabalho e descanso (Ex 20.8-10; 31.14; Lv 25.2; Dt 5.12-15; Is 56.2-7);
[o autor faz inferências sobre o sábado: pós-queda passou a significar o apontamento do
descando em Deus através de Cristo; Mt 11.28 cf. Mt 12; Com a ressurreição de Cristo o sábado
chegou; Hb 4; geração incrédula não entra no descanso (Nm 14.21-35); somente por meio da obra
de Jesus e da fé nele que podemos ter o descanso.] – o sábado como instituição terrena não existe
mais porque a realidade já nos veio em Cristo. (há contudo razão para guardar o dia de culto
público); NT não reitera o sábado, mas cedo na era apostólica o domingo passou a ser celebrado
com o “Dia do Senhor” (Ap 1.10), porque era o aniversário semanal da ressurreição dee Cristo, o
acontecimento que inaugurou o descanso do sábado para o povo de Deus.

E qual é o significado disso para a nossa doutrina do lazer?


O nosso lazer, assim como o nosso trabalho, deve ser visto de modo escatológico; Pensai nas
coisas do alto (Cl 3.2-5); só podemos ser úteis a Deus e ao próximo se trancarmos a nossa mente e o
nosso coração na identidade que temos em Cristo;

inquietação ocidental contemporânea: períodos de lazer com diversão, troféus, brinquedos


recreações e “agora eu preciso descansar das minhas férias”.
J. Gresham Machen (séx XIX): hoje as crianças crescem para serem entretidas, antigamente,
as crianças sabiam se entreter. [a primeira exige pouca imaginação ou esforço];
A maioria de nós não fica feliz sozinha, fomos criados paa outras pessoas, somos nós em
comunhão com pessoas, com laços relacionais; mas, estamos nos tornando antissociais e isolados à
medida que o comércio se torna central; os relacionamentos humanos se reduzem à utilidade
econômica. Resultado: no fim do dia sentimos como se a última coisa que queremos é ver outra
pessoa.

Uma questão de família


ela não é apenas a unidade de construção mais básica da sociedade, mas também da igreja.
– o dia do Senhor: descansar em família;
– a refeição da noite: em família; catecismo, dever dos pais, secundariamente, da igreja;
– noite da família: leitura, música, comunhão;
– leitura em voz alta: ler para os filhos; pesquisas → crianças não deveriam poder assistirà
televisão até que estejam completamente alfabetizadas (por volta dos 8 anos de idade);

Deus reina sobre tudo


Um dos retratos mais impressionantes de Lutero não é do grande homem sozinho, mas junto
com a sua família, que cantava enquanto ele os acompanhava ao violão.
Enquanto a igreja medieval tinha colocado a família como menos espiritual do que dedicar-
se a Deus como monge, os reformadores eram unânimes em afirmar que o lar cristão era tão
sagrado quanto a própria igreja. (!!!!)

Em nossos dias, os relacionamentos entre empregadores e empregados, gerência e mão de


obra não especializada, marido e esposa, pais e filhos, e trabalho e lazer estão todos se
desintegrando.
diagnóstico: igualitarismo vigente que considera qualquer hierarquia ou ordem d eautoridade
como inerentemente maléfica. → Porém, a Escritura não nos ensina a nivelar todos os
relacionamentos e democratizar todos os ofícios e posições no mundo; pelo contrário, ela nos
conclama a considerar os nossos superiores e inferiores com dignidade e respeito, e submeter toda a
vida ao reino soberano do nosso Redentor-Rei.

[história excelente!!]
Um dia, um senhor caminhava e passou por um lugar em que havia uma construção em
andamento. Ele perguntou aos trabalhadores: “O que estão fazendo?” Um disse: “Estou quebrando
pedras da pedreira”. Outro respondeu: “Sou responsável por fazer a argamassa que juntará as
pedras”. Um terceiro homemm, coberto de lama, empurrava o carrinho de mão, e parou apenas o
tempo para dizer com prazer e orgulho: “Estou construindo uma catedral”.
O que estamos fazendo com a nossa vida? Trabalhando pelo final de semana ou construindo
uma catedral? Os três homens estavam envolvidos na mesma obra, mas somente um tinha em vista
o grande quadro.
Longe da perspectiva transcendente (divina, vertical, teológica), vemos apenas os detalhes
da rotina diária: eu registro informações de contabilidade, eu limpo a casa, eu julgo casos no
tribunal, eu digito a correspondência e dou telefonemas para outras pessoas, e assim por diante.
Porém, quando começamos a assinar as composições das nossas músicas do dia a dia com o “Soli
Deo Gloria” como fez Bach, até mesmo o trabalho mais enfadonho ou corriqueiro torna-se divino.

Cap. 8 Um mundo enlouquecido

Séc 20 viu algumas das brutalidades mais selvagens e o mal mais baixo de toda a história da
humanidade. Duas guerras mundiais, terrorismo internacional na forma de totalitarismo e facismo,
individualismo egoísta, nacionalismo e o “desejo de poder”. Não podemos descartar a coincidência
entre essas tendências na História mundial e uma aberta rejeição de Deus.
Nos anos 60, os jovens não se rebelaram contra o cristianismo de per si, mas contra a
modernidade. Eles reagiram contra as igrejas na mesma extensão em que elas refletiam e defendiam
as estruturas da modernidade.
O nosso acervo de imagens nos leva a concluir que a rebeldia daquele tempo era o problema,
em vez de um sintoma. (!!!)

Modernidade: Quando foi?


Bastilha (1789) – Muro de Berlim (1989)
Arraigada na Renascença e no Iluminismo – não chegou ao fim;

Modernidade O que é?
A crença no progesso → na Renascença (sécs 14-16) os novos intelectuais estavam ansiosos
por voltar a uma suposta “era dourada” da civilização, localizada na antiga Grécia e Roma.
Convencidos de que viviam num período estéril de dogmatismo eclesiástico, cunharam a expressão
“era das trevas”;
monge da idade média, Joaquim di Fiore: era do Pai (AT), era do Filho (NT), era do Espírto
iria chegar: religiões se uniriam, fraternidade e unidade espiritual. Na renascença essa ideia atraiu
Petrarca, um neoplatônico: a própria História estava se movendo para além da existência material
(igreja, sacramentos Bíblia, credo, doutrina) e entrando numa era espiritual. Ex: os anabatistas da
Reforma adotaram essa abordagem esperando a descida iminente do ES para levar o mundo a um
estado de paz perfeita e santidade. Na verdade, uma seita anabatista radical tentou introduzir essa
Era do Espírito pela força, tomando posse da cidade alemã de Munster;
Hegel (1770-1831): promulgou essa visão da História numa filosofia de panteísmo (tudo é
Deus); a História era o progresso em direção a esse estado perfeito de puro espírito; [misticismo
panteísta + racionalismo rigoroso] → dialética hegeliana: a História em espiral em direção à
perfeição espiritual por meio de tese, antítese e síntese.
Marx (1818-83): Hegel, seu pai filosófico, e os revolucionários anabatistas, seus
precursores; o “secularismo espiritual” levaria à esperada utopia. Ex: feudalismo da idade média
(tese), revolução dos camponeses no séc 16 (antítese), um passo mais próximo da utopia (síntese);
O estado perfeito não era alcançado por meio de uma linha direta, mas mediante os ziguezagues das
sucessivas reações e contrarreações.
Obs: Hegel foi tanto o “pai” [ou avô] do capitalismo quanto do comunismo, porque Adam
Smith (a riqueza das nações), tão instrumental no surgimento do capitalismo industrial, dependia
também da visão hegeliana do progresso histórico. → essa visão inspirou:
– John Dewey, pai da educação moderna;
– Sigmund Freud, “pai” da psicologia;
– Friederich Schleiermacher, pai da teologia liberalista moderna;

Essa ideia do progresso finalmente levou cientístas e filósofoa a divorciar suas disciplinas
das “superstições” e dos “dogmas” da fé, promulgando a noção de ser homem ou mulher de fé era
ser “retrógrado”, enquanto a visão científica (ou seja, naturalista) caminhava ombro a ombro com o
progresso. Ex: Darwin foi filho da sua era hegeliana ao explicar a história natural em termos de
progresso evolucionário.
Obs: resumo reducionista; não foi Hegel sozinho quem arquitetou a modernidade e sua visão
de progresso, mas era um dogma universal do Iluminismo;
Obs: além das tendências intelectuais, havia a notável explosão da tecnologia. A Revolução
Industrrial, a tecnologia deu forma material ao espírito do progresso, os progressos na ciência,
medicina, educação, política, etc, alcançariam a utopia. O advento da utopia justificava atá a morte
de milhões que impediam o caminho dos “iluminados” [era apenas uma antítese, um mal necessário
para se chegar ao fim esperado].

A razão universal
David Hume (1711-76), empirista britânico: o que não pudesse ser observado não poderia
ser considerado “conhecimento”.
– Racionalistas: é verdadeiro quando se conforma com a razão;
– Empiristas: é verdadeiro quando se conforma com a experiência e a observação universais.
Como milagres não fazem parte dessa experiência/observação universal, tinham de ser
eliminados; universo, apenas leis naturais. Ex: ressurreição de Cristo é eliminada.
Immanuel Kant (1724-1804): reduziu o campo do racionalismo; a razão existe na mente de
cada pessoa e isso leva a conclusões a respeito do mnundo. Kant tentou combinar o racionalismo
com o empirismod e Hume. Portanto, a fé: campo numenal (espiritual) que não pdoe ser
demonstrado à razão ou à observação; a ciência e a filosofia: campo fenomenal, que pode ser
demonstrado.
[assim, somente o que podeia ser demonstrado pela religião, podia ser considerado] →
resultado: Kant, criado no pietismo, reduziu o âmbito da religião racional à moralidade. (!!!)

Todo o projeto iluminista se dedicou a construir uma torre de progresso que alcançasse os
céus; um espiritualismo secular, uma religião naturalista de realizações humanas com pouco ou
nenhum espaço para Deus; dogma do progresso inevitável; a onipotência da razão humana.

Quais foram os resultados práticos?


O que começa hoje como especulação filosófica acaba movendo exércitos e construindo
impérios amanhã.
[sobre a tecnologia e o imediatismo] Temos de reconhecer as enormes ramificações da
modernidade (tanto as boas quanto as más) na nossa própria vida, se quisermos procurar compensar
pelos efeitos negativos.

Onde estavam os evangélicos em tudo isso?


O rótulo “evangélico” passou a ser usado durante a Reforma.
Os idólatras da era moderna muitas vezes deixam de levar em conta a extensão em que os
seus sonhos não poderiam ter existido, não fosse o sonho do cristianismo bíblico. Mesmo a sua
visão secular do progresso foi baseada na escatologia cristã de redenção e esperana. Até mesmo o
projeto de declarar independência de Deus – ou seja, de repetir a Queda – requer que o cristianismo
seja verdade.
É verdade que o cristianismo foi explorado até mesmo por teólogos e pastores a serviços de
ideologias de esquerda e de direita; eles cederam aos diversos Baalins da modernidade, usando o
cristianismo como um disfarce para o racismo, a depredação do meio ambiente, a escravatura, o
sexismo, a tecnologia e a adoração do poder.
→ Deus ainda é soberano e há de julgar o mundo (At 17.31; Dn 4.34-35): esperança.

Conclusão No mundo, mas não do mundo

Philipp Jakob Spener, pai do pietismo; preocupação com a doutrina e com a prática de vida
cristã; Hoje, “pietismo” tem a conotação de uma piedade interior que ignora o mundo, a não ser
como objeto de evangelismo e missões.
Na época da prória Reforma, os reformadores enfrentavam os abusos da igreja católica
romana, como também os excessos dos anabatistas, que queriam separar-se totalmente do mundo.

A Escritura nos ensina que há dois perigos que devemos evitar: o separatismo e o
secularismo. [Como já visto desde muito tempo] → Justino Mártir: via o cristianismo
principalmente como um sistema filosófico e incorporou a ele ideias gregas incompatíveis;
ertuliano: insistia que o cristianismo e a Filosofia eram de tal maneira opostos.

A doutrina bíblica da criação: no mundo


Deus declarou que o mundo é bom; foi nesse mundo que ele anunciou o seu plano de
redenção e o executou na História verdadeira;
Foi no Mar Vermelho, não num mítico rio “espiritual”, que Deus salvou Israel do exército de
Faraó; numa montanha deu a Lei a seu povo; adorado num templo de verdade; genealogia de Cristo
destaca sua humanidade; antepassados de caráter notável, outros diábílico; Redenção ocorre no
espaço-tempo do mundo (1Jo 1.1-2); até os não-cristãos são feitos à semelhança de Deus (Tg 3.9); o
mundo não pertence a Satanás, “o mundo é meu, e quanto nele se contém” (Sl 50.12).

A doutrina bíblica da redenção: mas não do mundo


Por que João nos diz que não devemos amar o mundo e nem o que há no mundo? (1Jo 2.15)
“mundo” no seu estado de caído, hostilidade a Deus e oposição à sua Palavra.
A visão gnóstica da redenção é salvação do corpo, da existência material, do tempo, da
história e deste mundo; já a Escritura aponta em termos de salvação do corpo e da alma juntos no
tempo, na História e neste mundo.
O mundo na sua essência não é o problema. Distorcido pela influência gnóstica, muitos
cristãos falam da sua pecaminosidade como se ela estivesse ligada diretamente à sua humanidade.
“A questão não é a natureza, mas a corrupção da natureza” (Calvino).

O outro lado da moeda: a Bíblia se opõe também ao secularismo. A atividade relativa ao


mundo é sancionada por Deus, mas o secularismo é molfar ideias, crenças, métodos e nosso estilo
de vida de acordo com o mundo.
(!!!) Muitos de nós fomos criados em igrejas nas quais esse “secularismo” era associado
com vocações seculares, sucesso financeiro e dançar, beber, fumar ou frequentar lugares em que
essas atividades ocorriam. Isso não é – repito enfaticamente: não é – o secularismo descrito na
Escritura. (!!!)
→ tornamo-nos seculares quando os programas de entrevistas de televisão substituem os
sermões, o culto é transformado em consumismo orientado pelo mercado, e categorias terapêuticas
ou políticas começam a substituir a ênfase bíblica nas nossas igrejas. (!!!)
→ tornamo-nos seculares quando as obsessões pelas questões “práticas” tomam o lugar do
sólido discipulado bem-informado e quando começamos a pensar que a popularidade visível e o
sucesso numérico são a medida do ministério. (!!!)
(!!!) nossas igrejas podem tornar-se portadores do vírus do secularismo sem que tenhamos
que nos incomodar com o mundo. (!!!)

Jo 17.14-19 → somos santificados não porque temos nos separado progressivamente do


mundo, mas porque o próprio Cristo se separou do mundo e nós estamos em Cristo. Temos de
reconhecer esse fato e responder a ele separando-nos progressivamente da perspectiva mundana.
Nunca realizamos isso totalmente na nossa vida na terra, mas é o objetivo para o qual prosseguimos
com zelo.

O que isso significa para uma visão cristã do mundo?

Criação e Redenção – distintos, mas não seapados


No princípio, tudo era bom. Toda a vida era sagrada, de orações à labuta diária – não havia
distinção entre o secular e o sagrado. (!!!) O trabalho era uma vocação divina, designado para a
construção do Reino de Deus pelo avanço da cultura e de uma civilização piedosa.
Com a Queda (rebeldia), o tecido da vida humana foi rasgado. O trabalho, outrora ligado ao
prazer e à alegria adoradora em cumprir o propósito de Deus, agora envolveria “fadiga e dor”. A
instituição do casamento e da família não mais seria considerada santa ou sagrada, porque a “casa
dos ímpios” e a “casa dos justos” agora se distinguiam. O trabalho também não mais se
caracterizava como a construção do Reino de Deus. Uma civilização piedosa estava fora de questão
mediante a expulsão do Eden (Gn 3.24); o que esmaga todas as esperanças humanas de se construir
uma sociedade perfeita. (!!!)
→ mas, Deus não deixou Adão e Eva sem esperança. Mesmo em faze de seu juízo, ele
anunciou o evangelho (Gn 3.15; 3.21)
As boas-novas não mudaram, porém, as más notícias para o mundo. A promessa de redenção
não restaurou o paraíso e nem removeu a maldição anunciada por Deus sobre as instituições e as
pessoas do mundo caído. Foram banidos do Jardim e forçados a viver neste mundo, não mais como
príncipes que reinavam no mundo como o reino de Deus, mas como estrangeiros e peregrinos.
(!!!) Gn 4 → estudiosos do hebraico dizem que a resposta de Eva pode ser também traduzida
“com o auxílio do Senhor adquiri o homem”; é provável que Eva tivesse pensado que tinha acabado
de dar à luz o Messias prometido, porque a promessa de Deus tinha sido sobre “tua semente” sem
indicar uma geração específica. Eva deve ter ficado surpresa ao saber que este sobre quem ela
colocara as suas esperanças, em vez de ser o seu salvador, assassinou o irmão. (!!!)
→ Caim e Abel: a primeira briga religiosa – devemos inventar qualquer tipo de adoração
que preferirmos, ou a que o Senhor ordenou? Sacrifícios animais, como o que Deus fez para vestir o
primeiro casal, foram escolhidos por Deus para prefigurar o Cordeiro de Deus que tira o pecado do
mundo. Além disso, Abel selecionou “das primícias do seu rebanho” (v.4), o que tinha propósito de
antecipar Cristo, “o primogênito de muitos irmãos” (Rm 8.29; Cl 1.15; Hb 1.6; Ap 1.5). Porém,
Caim escolheu fazer um sacrifício com vegetais. Ele escolheu o seu próprio caminho de salvação à
parte de Cristo, à parte da promessa, e Deus o rejeitou.
→ Interessante: em vez de destruir Caim imediatamente, Deus preservou a vida dele, mas
declarou a maldição: “Serás fugitivo e errante pela terra” (v.12). Deus ainda prometeu sua marca
sobre Caim para que o não ferisse de morte quem quer que o encontrasse” (v.15).
Por que tanto carinho por um homem culpado de matar o próprio irmão? Caim teve um
filho, Enoque, e edificou uma cidade com o seu nome (v.17) – arquitetos urbanos; Jabal, pai da
pecuária; Jubal, músico; Tubalcaim, atífice; Deus preservou Caim com o propósito de edificar uma
cidade.
Do outro lado: Adão → Sete → Enos, daí se começa a invocar o nome do Senhor (v.25-26);
[um constroi uma cidade, outro um altar]; Caim procurou pôr um fim à sua peregrinação inquiera
por meio da construção de uma cidade, enquanto Sete colocou a sua esperança na cidade eterna.
Antes da Queda não havia distinção entre o secular e o sagrado; depois, a cidade de Deus
(jardim) é devolvida ao céu, o paraíso terreno é interditado; nenhuma cidade terrena pode ser
confundida com uma civilização piedosa ou com o reino de Deus. (!!!)

Obs.: não é necessário que se “abençoe” o trabalho ou as instituição seculares com o


adjetivo “cristão”; há, sim, distinção entre o secular e o sagrado, entre o reino de Cristo e os reinos
do mundo, mas o reino secular é honrado porque foi criado por Deus; ainda assim, Caim é sempre
Caim, e a cidade do homem jamais se torna a cidade de Deus até o final da História.

(!!!) Estar no mundo, portanto, significa que os cristãos e não cristãos trabalham lado a lado,
ambos possuindo a imagem divina e igualmente capazes de virtudes civis, criatividade, prazer, dor,
sucesso, fracasso, sabedoria e bondade. Nosso interesse artístico e criativo ou acadêmico não tem
que ter cunho evangelístico ou eclesiástico para justificar o nosso tempo e investimento nesses
afazeres.
Estar no mundo, mas não ser do mundo requer que conheçamos a fé cristã o bastante para
reconhecer quando estamos permitindo que definições, atitudes, percepções e modelos seculares
formem a nossa crença e expressão.
(!!) Temo que, como às vezes não apreciamos suficientemente a nossa permanente
pecaminosidade mesmo como cristãos, não levemos suficientemente a sério a imagem de Deus nos
não cristãos.

Graça comum e graça salvadora


os incrédulos são capazes de grandes coisas porque (a) ainda possuem a imagem de Deus,
assim como qualquer cristão e (b) são dotados e refreados pela proviência geral e supervisora de
Deus e pela sua graça comum.
Ex: um cristão e um ateu numa linha de montagem, ambos glorificam a Deus ao cumprir a
sua vocação terrena. Conquanto o ateu não tenha o propósito de glorificar a Deus, mesmo quando as
suas criaturas estão violenta e decididamente contra ele, até nesse caso, então, a glória de Deus será
servida (cf. Sl 76.10 – até a ira humana há de louvar-te).
Como Deus preservou Caim e, na sua graça comum, orientou a construção da civilização
secular, assim também ele continua a superintender a edificação das nossas cidades terrenas.

Gn 11 → o propósito dessa metrópole era criar uma torre tão alta que se houvesse um novo
dilúvio eles não seriam atingidos. Em vez de confiar na promessa de Deus de não mais julgar o
mundo por meio de um dilúvio universal, com o arco-íris como sacramento, esses arquitetos da
civilização tomaram em suas próprias mãos a salvação e construíram uma cidade com o propósito
expresso de redimir os seus habitantes. Em vez de confiarem na promessa, procuraram salvar a si
mesmos pela tecnologia de suas próprias mãos.

(!) Pela criação, estamos envolvidos numa tarefa comum, unidos por experiências comuns, e
ligados por laços comuns com os incrédulos. Isso quer dizer que não devemos ver o mundo como
alienado por ser ele “o mundo”, mas porque atualmente ele está em rebelião contra Deus.

At 2 → Assim como Dus desceu em juízo sobre a salvação secular da torre de Babel,
confundindo as línguas e dividindo as nações, no Pentecostes ele desceu em salvação sobre a igreja,
permitindo a cada homem e mulher que veio das nações longínquas da terra para festa em
Jerusalém, que ouvisse o evangelho na sua própria língua nativa. Era um sinal do reino espiritual
que já cgegara em Cristo e aguarda a sua consumação quando a cidade do homem mais uma vez
tornar-se sagrada, a cidade de Deus.

Obs: José e Daniel são bons exemplos de cristãos no governo secular, mas eles não
procuraram transformar seus respectivos cargos em catalizadores para transformar os reinos do
mundo em teocracias bíblicas como Israel fora. Simplesmente seguiram a sua vocação no mundo
com excelência e diligência.
(!!!) Os crentes são santos porque pertencem a Cristo, mas o ambiente ao qual foram
chamados é comum. (!!!) Espera-se deles que sejam diferentes na sua crença, na sua atitude e no
seu estilo de vida, mas não se espera dos crentes que convertam o ambiente secular num espaço
sagrado.
(!!!) Quando tomavam decisões no tribunal, José e Daniel tinham de basear seus
julgamentos nas leis egípcias e babilônicas, não sobre a lei hebraica, e conquanto não pudessem
endossar nada que violasse a Palavra de Deus, e nem participar de nada disso;

(!!) “Toda a vida é sagrada”, “toda atividade é atividade do Reino” – isso era verdadeiro no
Éden. Em Jesus: “meu reino é de outro lugar. Não é mais deste mundo”. (!!!) Toda a vida não é
sagrada, mas aquilo que é simplesmente comum (ou seja, “secular”) tem o seu valor e a sua honra
por ser parte da criação de Deus. Ele é o Senhor tanto do secular como do sagrado.

O que isso significa para a nossa vida no mundo?


O artista cristão não precisa justificar a sua vocação por aquilo que a torna espiritual,
religiosa, moral, evangelística ou relacionada com a igreja. Sua arte não precisa redimir: ela
simplesmente deve entreter e expressar excelência artística.
Um encanador cristão não precisa instalar “encanamentos cristãos” e nem um juiz tem que
abrir uma sessão do tribunal com uma palavra de oração e “cristianizá-la” com leituras bíblicas.
(!!!) Nao precisamos justificar tudo o que cremos ou fazemos com base na Escritura. (!!!)
Ex: A Bíblia não diz como devemos trocar o óleo do carro, não explica a circulação sanguínea; Há
aspectos da criação de filhos que não são mencionados na Escritura, como também há um grande
número de questões práticas de “coisas terrenas” que a Bíblia deixou para os seres humanos
descobrirem. → A Bíblia concerne àquilo que não se pode descobrir na natureza: o evangelho de
Jesus Cristo. Algo que jamais aprenderíamos por meio das nossas próprias investigações, sabedoria
ou percepção.
(!!!!!!) Ex: “Alimentação Infantil Baseada na Bíblia” – o artigo não cita passagens
específicas, os autores admitem que não existem. Porém, eles fornecem princípios básicos da
Escritura como ordem, bom juízo, amor, paciência, cuidado, etc. → Há alguma razão pela qual
devíamos considerar esses princípios como sendo especificamente bíblicos? Não seria possível
qualquer pessoa, cristã ou não, aparecer com a mesma lista?
E essa tendência de ver a Bíblia principalmente como um livro de respostas, regras e um
manual de instrução para a vida não acaba diminuindo a mensagem verdadeira da Escritura?
(!!!) [A bíblia não propõe princípios de alimentação infantil!] A Escritura é suficiente para
tudo o que se relaciona com a verdade salvadora e à revelação da vontade moral de Deus, mas ela
não tem a intenção de ser suficiente para tudo o mais. Nós não precisamos de uma visão cristã da
mecânica de automóveis ou de princípio bíblicos para a cirurgia cardíaca. Por que precisaríamos de
música cristã, livros cristãos, arte cristã ou empresas cristãs? Há, sim, música de igreja [apropriada
para o culto] e arte de igreja [ex. Arquitetura]; Mas precisamos de música pop cristã ou livros
cristãos de receitas? Há um método cristão de se fazer uma fritada?

Revelação natural e revelação especial


Rm 2.14-15 – procedem em conformidade com a lei; mostram a norma da lei gravada no seu
coração; acusando-se ou defendendo-se; “lei natural” discussão a respeito de certo e errado, verdade
e mentira, justiça e corrupção, beleza e horror, crime e castigo.
Reformadores chamam de “justiça, virtude e justificação civis” – “civil”, ou seja, que serve à
vidade do homem, como os descendentes de Caim produziram grandes avanços na civilizaçãode
seus dias embora tivessem sido banidos da cidade de Deus. A justiça civil é apenas “trapo de
imundícia” perante o juízo divino (Is 64.6). No entanto, é essa virtude externa, puramente civil, que
explica como os incrédulos podem edificar civilizações razoavelmente justas, com grandes
tradições artísticas, literárias, científicas e legais. (se a lei de Deus está escrita na consciência do
pagão que nunca conheceu a Escritura, então os não crentes são capazes de estabelecer sociedades
razoavelmente justas).
(!!) Assim como Deus deu sabedoria a Daniel para entender a literatura e a filosofia
seculares, do mesmo modo ele também dá graciosamente a sua graça comum para todos os que
portam a sua imagem. Não se trata de conhecimento salvador, mas é um dom do Espírito. Não
houvesse esse dom do Espírito na criação e providência, o mundo seria feio, tirano, injusto e infeliz
– absolutamente desprovido de entendimento, educação, riso, prazer, deleite ou cântico. (!!)
Aqui a Reforma libertou os homens e mulheres que tinham sido levados a crer que, a não ser
que estivessem envolvidos com um “ministério de tempo integral” ou pudessem usar sua arte a
serviço da igreja, eram cristãos de segunda categoria.
Ao buscar a excelência na arte e na música, se esta for a nossa vocação, e ao não usar as
nossas habilidades simplesmente como meio de pregação, ensino, evangelismo, ou repreensão,
tratemos um sorriso à face do Deus que criou a beleza e o prazer como aceitáveis por direito
próprio.

Reconstruindo os fundamentos
(!!!) Sociólogo Wade Clark Roof: os norte-americanos gostam de “espiritualidade” mas não
de “religião”; gostam de formar deuses de sua própria experiência; enxergam a religião como
exigindo determinado credo e conjunto de dogmas, juntamente com um código moral de
expectativas divinas. Democráticos até o âmago, resistimos quando nos dizem no que crer e como
viver – até mesmo quando é Deus quem fala. (!!!)

Os oficiais da igreja são dados não para construir igrejas maiores com uma série de
programas impressionantes e “celebrações” empolgantes, mas → EF 4.12-14 (aperfeiçoamento dos
santos para edificação do corpo).

A História tem provado, repetidas vezes, que a prática da igreja, em qualquer época, não é
melhor do que a sua teoria. (Geralmente a sua prática está aquém da sua teoria.)
Quando alguém perde as suas chaves, o conselho mais comum é retraçar os próprios passos.
O mesmo é válido quando a igreja perdeu a sua direção, como nos dias de hoje.

Antes de recuperar a cultura, temos de recuperar a pureza da doutrina e da vida que sempre
teve influência transformadora no mundo. Temos de parar de nos acomodar à cultura a que opomos
e começar a transformá-la.
A Reforma não começou para mudar a cultura, [mas em grande parte o fez]. Muitos
movimentos cristãos hoje se formam com este intuito, mas acabam sendo transformados pela
cultura porque as suas raízes são por demais superficiais.

Você também pode gostar