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Copyright© 2021 JESSICA D.

SANTOS

Revisão: Andrea Moreira

Leitura Crítica: Isis e Scarllat

Capa: Sarah Libna

Diagramação: Jessica D. Santos

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Dados internacionais de catalogação (CIP)

ACASO PERFEITO

1ª Edição

1. Literatura Brasileira. 2. Literatura Erótica. 3. Romance. Título

I.

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É proibida a reprodução total e parcial desta obra, de qualquer forma ou

por qualquer meio eletrônico, mecânico, inclusive por meio de processos


xerográficos, incluindo ainda o uso da internet, sem permissão de seu editor (Lei

9.610 de 19/02/1998). Esta é uma obra de ficção, nomes, personagens, lugares e


acontecimentos descritos são produtos da imaginação do autor, qualquer

semelhança com acontecimentos reais é mera coincidência.


Todos os direitos desta edição são reservados pela autora.

Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico da Língua


Portuguesa (1990), em vigor desde 1º de janeiro de 2009.
SUMÁRIO
PRÓLOGO
CAPÍTULO 1
CAPÍTULO 2
CAPÍTULO 3
CAPÍTULO 4
CAPÍTULO 5
CAPÍTULO 6
CAPÍTULO 7
CAPÍTULO 8
CAPÍTULO 9
CAPÍTULO 10
CAPÍTULO 11
CAPÍTULO 12
CAPÍTULO 13
CAPÍTULO 14
CAPÍTULO 15
CAPÍTULO 16
CAPÍTULO 17
CAPÍTULO 18
CAPÍTULO 19
CAPÍTULO 20
EPÍLOGO
AGRADECIMENTOS
SOBRE A AUTORA
OUTRAS OBRAS
Dedico esse livro ao meu primo Alef, que faleceu dia 28 de março desse ano.
Te amo primo, obrigada por tudo! Sinto sua falta todos os dias.
Safira nunca imaginou que tomar umas doses com um cliente bonitão teria

alguma consequência. Mas teve. Uma gravidez.

A jovem se viu encrencada quando as duas linhas no teste de gravidez

apareceram. Ela jamais imaginou que anos depois o reencontraria. Muito menos

que ele era o pai da sua melhor amiga.

Ele continuava o mesmo homem que a seduziu naquela noite. Agora, ela

estava em apuros, guardando o segredo a sete chaves com o mesmo tremor

inquietante que Victor Guterres tem o dom de causar nela.


Victor faria Safira se render, e no processo tentaria não acabar na cama

com ela.

Mais uma vez.

Dois desconhecidos entrelaçados em um acaso perfeito que o destino fez

questão de uni-los. Mas será que o amor será capaz de superar as mentiras,

intrigas e perseguições?
SAFIRA

Hoje seria o meu dia de folga, mas uma colega ficou doente e eu estou

cobrindo o turno dela. Um pouco de trabalho é bom para distrair a mente, melhor

do que ficar na minha casa, onde o clima não anda muito bem.

— Menina, atenda aquela mesa ali. — A mulher do meu chefe aponta para

uma mesa afastada, onde um homem de cabelos escuros está cabisbaixo,

parecendo pensativo.

Dou uma avaliada nele rapidamente e percebo que nunca o vi aqui nos
meus turnos.

— Sim, senhora. — Pego a comanda e a caneta no bolso do meu avental e

sigo até o homem.

Sorrindo educadamente, eu me aproximo do cliente e... Nossa! Ele parece

bem bonitinho.

— Boa noite. O que o senhor vai querer? — pergunto, olhando-o com

curiosidade.

Seu olhar parece distante, parece não ter notado a minha presença. Depois

de vários segundos, ele fixa seus olhos em mim e meu coração bate

descompassado. De longe eu o achava bonitinho, mas agora, com seus lindos

olhos azuis profundos fixos em mim, tenho a certeza de que é o homem mais

lindo que já vi. Ele parece ser um pouco mais velho do que eu, talvez uns trinta

anos.

— Oi? Não entendi, desculpe. — Ele dá um sorriso fraco, meio

constrangido.

— Ah, tudo bem. O que vai querer? — pergunto, já pronta para anotar o
pedido. Ele franze a testa, parecendo confuso, então decido ser um pouco

intrometida. — Está tudo bem com o senhor? — indago, realmente preocupada.

Ele parece estar alheio a tudo, como se nem mesmo soubesse o que está fazendo

aqui.

— Me traga a bebida mais forte que tiver na casa. — Faz seu pedido,

ignorando a minha pergunta sobre estar bem.

Uau, o bonitão é grosseiro.

— O.k., já retorno, com licença. — Vou até o barman e faço o pedido, mas

não a bebida mais forte da casa, não sei o que esse homem tem para querer se

embriagar tão rápido. É estranho o meu comportamento? É sim, e muito,

normalmente só faço o meu trabalho, que é servir as mesas, e volto para o meu

canto. Só que esse cliente é diferente, algo nele que me deixa curiosa.

Encostada no balcão, observo o desconhecido com os dedos afundados no

cabelo escuro e cabisbaixo.

— Ei, está no mundo da lua? — O barman cutuca meu ombro, assustando-

me.
— Droga — murmuro, virando-me para o meu colega de trabalho, que me

encara com diversão e a bebida nas mãos.

— Se ficar tanto tempo secando o cara ele vai perceber. Acho que não

deveria paquerar no local de trabalho. — Ele me provoca e ri.

Suspiro alto ao pegar o copo de suas mãos. Nem sei se está brincando ou

sendo intrometido.

— Aqui está, senhor. — Coloco o copo na mesa.

— Você já me chamou de senhor tantas vezes, estou me sentindo um velho

de verdade — diz e dá uma risada abafada. Ele sequer me olha, dá um gole na

bebida e eu quase perco o fôlego quando lambe os lábios naturalmente

avermelhados. — Essa é a bebida mais forte que você tem? — Dessa vez ele me

olha, deixando-me sem graça com o seu olhar acusatório.

— Eu o chamo de senhor por educação, estou em meu ambiente de

trabalho — falo, séria, mas com o coração acelerado por estar neste momento

sob o olhar intenso do belo homem. — E não sei te dizer se é a mais forte porque

não bebo nada alcóolico, mas se quiser eu trago outra coisa. — Desvio o olhar

do dele, pois menti sobre não beber.


— Não precisa, essa está ótima. Obrigado. — Pela primeira vez, sua voz

soa mais alegre.

— Garota, venha aqui! — A esposa do meu chefe me chama.

Odeio quando ela me chama por “garota”, ela sabe meu nome. Prefiro mil

vezes trabalhar no turno em que o marido dela está, ele é um senhor muito

educado e me trata muito bem.

— Com licença — digo, e afasto-me dele.

— Não te pagamos para que fique conversando com os clientes, garota!

Está de olho no bonitão? Tira seu cavalinho da chuva, porque aqui não é lugar

pra namoro! — diz a senhora Miriam, me olhando feio quando eu me aproximo

dela.

— Eu, não... — Tento me explicar.

— Vá atender as outras mesas — ela me interrompe —, vou mandar outra

pessoa atender aquela mesa — diz e me dá as costas.

Passo a última hora atendendo outras pessoas, e a cada passo que eu dou

no salão entregando os pedidos, sinto que estou sendo observada pelos olhos
azuis intensos do desconhecido. Eu consigo sentir seu olhar queimando em mim,

talvez por estranhar não ter sido mais atendido por mim. Ou nem esteja me

olhando, é tudo coisa da minha cabeça.

Sento-me na banqueta e apoio meus cotovelos no balcão. Cansada, inspiro

profundamente e agradeço mentalmente por faltar poucos minutos para o meu

turno acabar.

Sentindo um pouco de calor, levo as mãos ao meu cabelo e o prendo em

um rabo de cavalo. Assusto-me ao sentir um toque no meu ombro, então viro-me

e me deparo com meu chefe.

— Minha filha, já pode ir para casa. Eu assumo daqui — diz o senhor,

gentilmente.

Trabalhei além da conta, a noite foi bem movimentada.

— Tem certeza? — pergunto, passando os olhos pelo salão, que ainda está

cheio. Automaticamente, meus olhos fixam no moreno bonito que está olhando

em nossa direção. Envergonhada, volto o olhar para o meu patrão.

— Tenho sim, amanhã você terá que vir novamente, então vá descansar.
Tenha uma boa noite, querida — diz e se afasta.

Ele está certo, amanhã é outro dia e preciso estar aqui novamente.

Levanto-me e sigo para o quartinho dos fundos, onde os funcionários trocam o

uniforme. Troco de roupa, ajeito meus cabelos e, após recolher os meus

pertences, saio do cômodo. Meu celular começa a tocar, então o pego e vejo que

é a minha mãe.

— Oi, mãe, aconteceu alguma coisa?

— Que horas você chega? Já são quase meia-noite, e o Zé está

reclamando que você sai e chega a hora que quer. Ele disse que aqui não é

hotel! — diz, com grosseria.

— Mãe, eu estou no trabalho — respondo, irritada —, a senhora sabe

disso. É daqui que sai o nosso sustento. Não estou fazendo nada errado, e se

estivesse, seria um problema meu, não do seu marido, que... — Calo-me, com as

mãos trêmulas de tanto nervoso. — Nós já discutimos mais cedo, e não quero

ficar chateada novamente, então não vou voltar para casa hoje. Não se preocupe,

ficarei por aqui. O seu marido se acha no direito de me controlar, de controlar o

que acontece em nossa casa, então ele deveria trabalhar para ter esse direito.
— Ele tem idade para ser seu pai, Safira! Deveria respeitá-lo. Ele só não

trabalha porque vive doente, não pode pegar muito peso e...

Por mais que eu tente alertá-la do seu relacionamento tóxico, ela não me

dá ouvidos, está completamente cega.

— Mãe, acorda! Eu cansei desse homem, que é um lixo, um aproveitador.

Ele não te merece! — exclamo, e só então percebo que alguns clientes estão me

observando, até o bonitão que não sei o nome.

— Safira, não venha mesmo para casa, não tolero que trate meu marido, o

homem que eu amo, com tamanha falta de respeito. Quando você estiver calma,

volte para a minha casa.

Meu coração se quebra com as suas palavras. Sentindo um nó na garganta,

encerro a ligação. Ela disse minha e não nossa casa. Uau, perdi o direito da

minha casa também, eu sabia que um dia essa hora ia chegar. Guardo meu

celular na bolsa e respiro fundo, então olho para o balcão do bar duas vezes antes

de decidir que vou afogar minhas mágoas na bebida. Não sou de beber muito,

mas hoje preciso de algo forte para eliminar a dor que estou sentindo, nem que

seja por algumas horas.


— Me sirva algo bem forte, por favor — peço, ao me sentar na banqueta.

Agradeço mentalmente por não ser mais o chato do barman que estava no meu

turno.

Termino de virar a terceira dose de tequila e abaixo a cabeça, chorando de

raiva, tristeza e decepção pelo simples fato de não conseguir dar um basta em

toda merda que está acontecendo na minha casa. Sei que a situação em casa está

insuportável, sei que a minha mãe e o marido dela só me deixam ficar lá porque

sou a única que coloca dinheiro dentro daquela casa. Eu sei que deveria me

impor, no entanto, não quero machucar a pessoa que mais amo nessa vida. Ela é

minha única família, não posso dar as costas para a mulher que me deu a vida, eu

seria um monstro.

— Posso me sentar aqui? — Assusto-me com a voz grave e levemente

rouca atrás de mim. Assinto, cabisbaixa, mas não respondo. O desconhecido se

senta ao meu lado, porém, continuo com a cabeça baixa, chorando baixinho. —

Não deveria derramar suas lágrimas por quem não merece.

Ainda em silêncio, limpo meu rosto e respiro fundo.

— O que vai querer, senhor? — pergunta o barman.


— Me dê um uísque com gelo, por favor — pede o bonitão.

Levanto o rosto e o olho com curiosidade, dessa vez estamos mais

próximos, consigo avaliá-lo melhor. Passo alguns segundos o encarando, mas

disfarço quando o homem fixa seus olhos em mim, ele não fala nada, apenas me

olha e dá um pequeno sorriso em seguida.

— Uma vodca, por favor — peço ao barman. Estou nervosa e nem sei por

quê. Até parece que nunca vi um homem bonito na minha frente.

— Não deveria misturar bebidas, é ruim.

Encaro seu maxilar firme e quadrado, seus lábios finos e rosados. O olhar

dele é firme e masculino, e sexy, muito sexy.

— É, eu sei. Mas quem é você para me dizer isso, se está fazendo o

mesmo? — Abro um sorriso para ele e o olho em desafio, fazendo-o gargalhar.

— Arisca — provoca-me antes de pegar o copo de uísque das mãos do

barman. — Obrigado. — Ele se vira para mim e dá um gole em sua bebida, seus

olhos me queimam como fogo.

— Nunca o vi por aqui, e trabalho neste lugar faz tempo. — Dessa vez
ouso o olhá-lo dos pés à cabeça, e percebo que suas roupas e sapatos devem ter

custado o olho da cara. — Você não tem cara de que frequenta lugares como

esses. Está perdido? — Passo a língua nos lábios e noto que seus olhos

acompanham meus movimentos.

— E eu tenho cara que frequento quais lugares? — Ele arqueia a

sobrancelha, aparentemente achando graça do que eu acabo de dizer.

— Locais elegantes. Você está muito engomadinho para um bar como esse

— falo, colocando uma mecha de cabelo atrás da orelha.

— Às vezes é bom mudar de ambiente. — Ele solta um suspiro de pesar.

— Sou Victor. E você está certa, é a primeira vez que venho a esse lugar, mas

isso não quer dizer que eu não frequente lugares como este. — Estende a mão

para mim e eu a pego, sentindo uma eletricidade gostosa tomar conta do meu

corpo.

— Entendo. Seja bem-vindo ao melhor bar do bairro. — Dou um sorriso.

— Eu já me apresentei, agora só falta você me dizer o seu nome — fala,

curioso.
Disfarço meu nervosismo e olho para o barman que está longe,

conversando com um cliente. Agradeço por ele não ser o do meu turno, assim

poderei contar uma mentirinha. Hoje não quero ser a Safira trabalhadora que está

cansada de ser abusada pela mãe, quero ser outra pessoa. Uma pessoa impulsiva,

que sabe aproveitar a vida.

— Sou Beatriz. É um prazer te conhecer, Victor. — Sorrio para ele.

— Belo nome.

Sou uma péssima garota, dei o nome da minha colega de trabalho para ele.

Mas quem se importa? Hoje quero ser como ela, alegre, impulsiva e sem muitos

problemas na vida. Aliás, qual o problema em dar outro nome? Nem sei se ele

realmente se chama Victor.

— Obrigada, Victor. — Dou de ombros.

— Você ainda está em horário de trabalho? — Ele olha ao redor do bar,

que já não tem muitas pessoas, em seguida, olha para as minhas roupas.

— Vai me convidar para um encontro a essa hora? — provoco-o e ele

nega, gargalhando.
— Não seria uma má ideia. Você é uma garota muito alegre, conseguiu me

fazer rir algumas vezes em poucos minutos. Estou curioso para saber mais sobre

você — diz, bem-humorado.

— Fico feliz em ter conseguido fazer alguém feliz hoje. — Engulo em

seco e ele nota. — Enfim... você parecia triste mais cedo. Me desculpe a

intromissão, mas você está com algum problema, Victor?

Eu e minha boca grande. O que tenho na cabeça? Não devo ficar fazendo

perguntas sobre a vida dos clientes, nem me envolvendo com eles, mesmo que

eu não esteja em horário de trabalho.

Victor agora está sério. Ele abaixa a cabeça, parecendo pensativo, e eu fico

curiosa para saber o que toma seus pensamentos neste momento. De início ele

parece ignorar a minha pergunta, mas logo me encara.

— Problemas pessoais. — Sua voz sai um pouco amargurada, com uma

ponta de decepção. — Aceita que eu te pague uma bebida? — pergunta, até

parece que está tentando mudar de assunto.

Victor faz um sinal para o barman e pede uma bebida para nós.

Começamos a conversar e o tempo passa tão rápido que nem percebemos. Mas o
homem sentado ao meu lado é do tipo que não gosta muito de falar sobre si, é

reservado, enquanto eu conto tudo o que acontece na minha vida.

Em alguns momentos eu o pego com o olhar distante, em seus olhos azuis

vejo uma mistura de tristeza e rancor. Eu me pego pensando no que deve estar

passando em sua cabeça, mas sei que não irá me falar, acabamos de nos conhecer

e ele é muito reservado.

— Você é bem reservado, misterioso! — exclamo, rindo e ele acompanha

a minha risada.

— Como assim? — Arqueia a sobrancelha.

— Na primeira oportunidade que tive eu te contei a merda que está

acontecendo na minha vida, e você só ouviu, não disse nada. — Tropeço nas

palavras, o álcool começa a fazer efeito. — Sou uma pessoa muito curiosa, então

me diz, o que te trouxe para cá? Você não tem cara de homem de porta de bar.

Não me diga que estou errada, porque sou garçonete, sei de muitas coisas.

— Vou te contar algumas das minhas decepções, estamos ficando bêbados

e talvez você nem se lembre depois — fala um pouco enrolado e ri.


— Isso. Desabafar faz bem, é como se livrar de um peso! — eu o incentivo

entre risos. Tento me ajeitar na banqueta e quase caio para trás, mas ele me

segura pelos cotovelos para impedir a minha queda.

— Te peguei! — Inclina o corpo para falar perto do meu ouvido.

— Pegou mesmo. — Reviro os olhos e tento me ajeitar no banco. —

Vamos, não me enrole, me conte o que o trouxe aqui.

— Hoje faz três anos que a minha esposa faleceu. Nesse momento minha

filha deve estar aos prantos, se lembrando da data miserável e de alguém que não

merece um terço das lágrimas da minha menina — diz, amargurado.

Arregalo os olhos e isso parece incentivá-lo, pois ele começa a contar

sobre a ex-mulher, e desde o momento que saiu da cidade a negócios até quando

entrou no bar.

— Parece que você é mais encrencado do que eu — falo, com pesar na

voz. Todo o álcool que estava querendo dominar meu corpo desapareceu após o

seu desabafo. — Victor, foi um prazer te conhecer, mas está na minha hora. —

Levanto-me e ele me acompanha.


— Não está tarde para ir embora sozinha? — pergunta, me analisando.

— Um pouco, mas não tenho nada de valor para ser roubado. — Sorrio,

mas ele continua sério.

— Você está enganada. — Dessa vez ele sorri e eu fico meio balançada.

Victor se aproxima e fala no meu ouvido. — Podem querer roubar o seu coração

— fala e eu fico toda arrepiada.

— Parece que você está tentando fazer isso, e acho que conseguiu.

— Você tem horário para chegar em casa, Beatriz? — pergunta ao se

afastar de mim.

— Acho que ninguém quer me ver hoje, então, não. Mas qual o motivo da

pergunta? Você é algum tipo de assassino em série? Você tem todas as

características de um — declaro e Victor gargalha.

— Não sou nenhum maníaco. Só quero saber se topa ter um encontro

comigo — sugere e umedece os lábios.

Meu Deus, esse homem é lindo, seu olhar sedutor, seu sorriso bonito.

— Não acha que é um horário um pouco estranho para um encontro? —


falo, quase gaguejando, porque Victor se aproxima mais uma vez e coloca as

mãos em minha cintura.

— Não tem nada de estranho no que podemos fazer a essa hora, Beatriz.

Só me diz se aceita ou não. Meu carro está no estacionamento, e eu estou

hospedado perto daqui. E não se preocupe, não tenho intenção alguma de te

fazer mal, apenas coisas boas, muito boas. Mas você só vai saber se aceitar sair

comigo.

Sua voz quente e sexy quase me faz derreter.

— Aceito — concordo, mesmo com receio. Eu nunca o vi, mas

estranhamente ele me conquistou com seu charme.

— Vou pagar a conta e já saímos. — Antes de me dar as costas, ele me

pega de surpresa ao beijar os meus lábios.


VICTOR

— Pai, minha amiga chega hoje de viagem. Você se lembra que falei que

ela ficará aqui até conseguir se estabilizar na cidade, certo? — fala Vitória, com

expectativa, enquanto beberico o café e passo os olhos no meu iPad.

Alessandra, a minha namorada, se remexe incomodada na cadeira ao meu

lado, mas não diz nada, continua tomando seu café.

— Pensei que essa garota já tivesse resolvido esse problema. Faz uns dois

meses que você me falou sobre ela — esclareço, a contragosto.


Não gosto de estranhos na minha casa. Por mais que minha filha fale que

essa amiga é confiável e boa pessoa, eu não a conheço.

— Pois é. Mas a Safira só conseguiu uma maneira de chegar até aqui

agora. Você não mudou de ideia sobre deixar minha amiga ficar em casa?

Quando Vitória põe uma coisa na cabeça, ninguém é capaz de tirar.

— Por acaso você conhece a família dela? Filha, você disse que a conhece

há anos, mas ela nunca esteve aqui em casa. Para mim é uma desconhecida, não

conheço a índole dela. A amizade com essa garota é muito misteriosa. — Ignoro

a sua pergunta enquanto coloco a xícara na mesa e a encaro.

— Não sei por que está sendo tão ruim! — Ela bufa e me fuzila com os

olhos negros. — A Safira não vai nos roubar e nem nos matar, nada do tipo! Não

posso deixar que ela e o filho fiquem na rua. Se eles não vierem para cá, eu os

levarei para a casa dos meus avós. — A voz de Vitória é carregada de decepção,

mas ela deveria entender o meu lado.

Furiosa, minha filha se levanta da mesa e sai, nem mesmo espera a minha

resposta antes de subir a escada com pressa.


Olho para Alessandra, que se manteve calada até agora. Ela sabe muito

bem que a minha filha não aceitaria a sua opinião, as duas não se dão muito bem.

— E para completar há uma criança de brinde? A minha casa virou abrigo

agora? — Me recosto na cadeira e passo a mão no rosto, frustrado.

Perco até a fome depois do clima de merda que fica entre mim e minha

filha. Quando Vitória me pediu para deixar sua amiga ficar aqui por um tempo,

ela não disse que tinha uma criança envolvida, somente enfatizou que a garota

estava vindo para Santo Antônio para recomeçar a vida aqui.

— Querido, relaxe. A nossa menina ficou chateada porque você está

querendo voltar atrás — diz Alessandra, tocando em minha mão e a acariciando.

— Você sabe que quando ela coloca algo na cabeça não tira mais.

— Sim, é verdade. — Bufo, contrariado. — Vou deixar que Vitória traga

essa tal amiga, só espero que essa garota não queira se alojar na minha casa para

sempre. Aqui não é casa de caridade.

— Você está certo, amor, mas não fique chateado com a sua filha por uma

coisa boba como essa. A casa é grande, o que não falta é espaço... — Minha

namorada é muito compreensiva, está sempre do lado de Vitória, enquanto


minha filha não suporta a Alessandra.

— Verdade, querida. Vou falar para ela que essa garota pode vir com a

criança. — Dou um sorriso para a Alessandra, que retribui, demonstrando que

fica feliz com a minha atitude.

Levanto-me e sigo até o quarto da minha filha, determinado a fazer as

pazes com ela. Odeio quando ela fica zangada comigo por besteira, e uma

desconhecida não vai ser a causa do nosso desentendimento, apesar de já ter

sido.

Bato à porta do quarto da minha filha e espero. Nada. Bato mais uma e

outra vez, nada. Frustrado, pigarreio, quase perdendo a paciência. Respiro fundo

e decido chamá-la, talvez esteja pensando que é a Alessandra.

— Vitória, sou eu. Abra a porta, quero falar com você. — Toco na

maçaneta para abrir a porta, mas me afasto ao ouvir sua voz.

— O que o senhor quer? Esfregar na minha cara que quem manda na casa

é o senhor? — ela diz com rancor.

Reviro os olhos por seu comportamento infantil.


— Precisamos conversar. É do seu interesse — afirmo, ignorando suas

palavras.

Não demora para que a porta seja aberta. Olho confuso para a minha filha,

que está com os olhos avermelhados, parece ter chorado. Fico perplexo ao notar

que essa tal amiga deve ser realmente importante para ela.

— O que é tão urgente para o senhor largar o seu café da manhã e vir até

meu quarto? — Arqueia a sobrancelha negra e cruza os braços, emburrada.

Mesmo com seus vinte e dois anos, Vitória se comporta como uma adolescente.

— Safira e o filho podem ficar aqui até conseguirem outro lugar. — O

nome dessa garota desconhecida soa estranho para mim, quando o pronuncio

sinto como se ela não fosse uma boa companhia para a minha filha. Mas não a

conheço, não posso julgá-la.

Vitória não diz nada, apenas vem em minha direção e se joga em meus

braços, toda sorridente.

— Obrigada, pai! Sabia que não me decepcionaria! — Gargalha, feliz.

Mais aliviado por ela não estar mais irritada comigo, decido saber um
pouco sobre a amiga.

— Essa garota não é menor de idade, né? Não quero problemas para mim.

— Mal termino de falar e minha filha tem uma crise de riso. Confuso, afasto-me

dela.

— Safira tem vinte e cinco anos, senhor Victor.

Agradeço mentalmente por isso, um problema a menos, eu já tenho

muitos.

— Ao menos isso — murmuro, mas disfarço ao desviar o olhar para a

cama de Vitória, que tem o notebook aberto. Na tela, vejo um garotinho lindo e

sorridente. — Quem é? — Automaticamente vou até a cama e pego o

dispositivo, colocando-o no meu colo.

— Ah, essa coisa gostosa é meu afilhado, o Miguel. O filho da Safira.

Um calafrio passa por minha espinha quando o nome dela é mencionado.

Por que o nome dessa garota mexe tanto comigo?

Meneio a cabeça para me livrar dos meus pensamentos sem sentido.

Curioso, olho para o menino de cabelos lisos e claros. Seus olhos são lindos —
azuis intensos —, e seu sorriso de sapeca mexe comigo, por alguns instantes me

pego sorrindo para a imagem.

— Ele é uma graça, não é? Também sou apaixonada pelo Miguel.

Me assusto ao ouvir a voz de Vitória atrás de mim. Sem graça, largo a

máquina na cama e me levanto, esfregando as mãos na minha calça antes de as

passar na cabeça. Não sei como agir quando percebo meu encantamento pelo

filho da amiga de Vitória.

— É... sim. Recado dado, pode avisar a Safira que ela será bem-vinda em

nossa casa. — Passo por ela e saio em disparada do quarto, sem entender o meu

comportamento repentino.

**

—Você só pode ter perdido o juízo, meu amigo. — Lucas, meu amigo, fala

assim que eu termino de contar sobre os dois hóspedes que terei em casa.

Depois da conversa com Vitória, saí para encontrar meu amigo no

restaurante Bella Flor. Aproveitei que tínhamos uma reunião pendente para falar

sobre a nossa sociedade para passar a tarde conversando com ele sobre tudo o
que está acontecendo. Neste momento, estou sendo repreendido por ele.

— Ainda não perdi, mas se ela continuar assim, com certeza vou perder —

murmuro, largando a caneta ao lado do documento que acabo de assinar.

Pedi para Alessandra, que é a nossa gerente, para usar o escritório do

restaurante por algumas horas.

— A Vitória só tem idade. Já está quase chegando aos vinte e três anos e

não faz nada da vida. Você a mimou demais, agora vai ter que aturar, irmão —

Lucas diz.

E é verdade. Após a morte da mãe dela, eu fui um pai tão excessivamente

presente, que acabei estragando a minha filha.

— Não discordo. — Descanso minhas costas na cadeira e fecho os olhos.

— Nunca vi essa tal Safira, nem sei quem são seus pais, só sei que ela está vindo

de São Paulo e tem vinte e cinco anos.

— Muito arriscado não saber nada sobre essa mulher. Como elas se

conheceram você ao menos sabe? Ela é três anos mais velha do que a Vitória, e

como elas se tornaram amigas, se essa Safira morava em São Paulo? — Meu
amigo me encara, desconfiado.

— São tantas perguntas sem respostas! Só sei que deixei a garota vir para a

minha casa. Vamos ver aonde vai chegar essa história — falo, impaciente.

— E o que Alessandra acha disso? Concordou em você enfiar uma

desconhecida dentro de casa? — indaga, divertido.

— Ela me apoiou. Na verdade, apoiou a Vitória. Você sabe que Alessandra

não gosta de ficar mal com Vitória, e nem que eu fique — afirmo, e Lucas faz

uma careta engraçada.

— Sua namorada parece uma pessoa boa até demais, ela faz de tudo para

ficar bem com a sua filha — diz, rindo.

— Gosto da maneira dela de agir, só prova o quanto gosta de mim de

verdade. — Dou de ombros, voltando minha atenção para os documentos a

minha frente.

As horas passam e eu nem percebo, quando a noite chega Lucas e eu nos

despedimos. Recolho minhas coisas e saio do restaurante com Alessandra, que

decidiu ficar em sua casa essa noite.


**

Estaciono o carro na garagem de casa depois de ter deixado Alessandra na

casa dela. Ao entrar em casa, encontro-a vazia, sem sinal de Vitória ou Joana —

a nossa funcionária —, que já deve ter ido embora a essa hora.

Cansado, subo a escada e vou para meu quarto, estranhando o silêncio. Me

dispo e entro no banheiro para tomar uma ducha. Depois de alguns minutos no

banho, saio e procuro uma roupa para dormir. Passo a mão no meu cabelo úmido

enquanto olho para a porta aberta da varanda do meu quarto, um vento gosto me

atinge, me atraindo até lá.

Olho para o céu e vejo o quanto a noite está bonita. Pensativo, solto um

suspiro e abaixo a cabeça. A conversa que tive com meu amigo não sai da minha

cabeça.

Será que estraguei a minha filha tanto assim?

De uma certa maneira Vitória me controla, mesmo eu sendo o pai. Fui pai

aos dezesseis anos, era muito novo, nem curti a minha adolescência. Eu era mais

maduro que os garotos da minha idade, enquanto alguns pensavam em jogar

futebol, videogame, eu estava fazendo sexo escondido dos meus pais. Muitas
vezes faltei no colégio para sair com as garotas.

Aline, a mãe de Vitória, tinha dezoito anos quando começamos a sair e

logo ela engravidou. O fato de eu ter pouca idade na época não me eximiu da

responsabilidade que eu sabia que tinha. Assumi tudo, como deveria ser.

— Pai, o senhor está aí?

Me assusto com as batidas na porta do meu quarto. Saio da varanda e entro

no quarto.

— Estou, Vitória, o que aconteceu? Pensei que não estivesse em casa,

quando cheguei estava tudo em silêncio — falo, já perto da porta.

Abro a porta e me deparo com minha filha sorrindo de orelha a orelha.

— Oi. — Seu sorriso aumenta.

— Oi, querida — Retribuo o sorriso, dando espaço para que ela entre.

— A Safira e o Miguel estão aqui, agora ela foi colocar o garotinho na

cama. Pensa em um menino cheio de energia! — Ela bate palmas, animada, e eu

finjo um sorriso.

Safira e Miguel. Sinto algo estranho quando ouço esses nomes. O que há
comigo? Balanço a cabeça para me livrar dos meus devaneios.

— Chegaram que horas? — ouso perguntar, mas me arrependo em

seguida.

— Depois que o senhor saiu com a Alessandra, não demorou muito para

ela me ligar. Daí eu peguei meu carro e fui buscar os dois na rodoviária. — Os

olhos de Vitória brilham ao falar deles.

Fico curioso para saber que tipo de relação elas têm, deve ser uma amizade

bem forte, coisa de alma, se é que existe isso.

— Rodoviária? Achei que ela viesse de avião. — Deixo escapar ao me

sentar na cama.

— Safira não tem grana para isso, pai, um amigo que deu uma carona para

ela — Vitória diz, tristonha. Ao menos sei que minha menina tem um coração

enorme, ela só está querendo ajudar a amiga.

— O.k. No que posso ser útil para a senhorita? — pergunto para quebrar o

clima pesado que se formou no quarto.

— Em nada, sr. Guterres! Só vim comunicar a chegada dos meus


“hóspedes” e desejar uma boa noite — ela fala gentilmente.

— Tem certeza? — Olho desconfiado para ela.

— Er... quero pedir também que o senhor trate a Safira bem. Ela é uma boa

pessoa, prometo que não irá se arrepender de estar a acolhendo — diz, quase

inaudível.

— E por que eu maltrataria a sua amiga, filha? Não se preocupe, não sou

tão mal-educado assim. Sei guardar meus sentimentos para mim — falo, meio

chateado.

— Desculpa, pai... É que... pela manhã o senhor não parecia nada satisfeito

quando eu disse que eles chegariam hoje. — Ela abaixa a cabeça e passa a mão

nos cabelos castanho-escuros.

— Confesso que não fiquei nem um pouco feliz, mas se você confia nela,

eu também devo confiar. E se de alguma maneira eu a magoei, peço perdão. —

Me levanto e vou até ela, abraçando-a em seguida. Vitória me aperta contra seu

corpo e encosta o rosto no meu peito. — Eu fiquei um pouco desconfortável,

afinal, nem sei como vocês se conheceram, entende?


Vitória levanta o rosto e me encara, assentindo ao concordar comigo.

— Está um pouco tarde e é uma longa história, foi muito engraçado como

nos conhecemos. Prometo que depois eu conto. — Ela dá um sorriso lindo e eu a

acompanho.

— Certo, vou esperar. — Pisco para a minha filha, que sorri abertamente.

— Boa noite, pai!

— Boa noite, meu anjo. Descanse. — Beijo sua testa e a deixo ir.

Quando Vitória sai do meu quarto, eu fecho a porta e me deito na cama.

Bocejo duas, três vezes antes de sentir meu corpo relaxar e a sonolência tomar

conta de mim.
SAFIRA

Olho para o meu filho que está brincando com a ponta dos meus cabelos

enquanto está mamando. Miguel é meu sol, a minha eterna luz, meu filho é o

verdadeiro motivo da minha mudança de São Paulo para Santo Antônio. Tenho

certeza de que aqui terei um recomeço, uma oportunidade, um emprego.

Três semanas atrás eu estava trabalhando em uma loja de roupas, mas

acabei sendo demitida quando precisaram cortar alguns funcionários, uma vez

que o movimento começou a cair e os proprietários começaram a ter

dificuldades.
Na noite em que meu filho foi concebido, eu estava trabalhando como

garçonete em um bar no lugar de uma colega que havia ficado doente. Como não

sei dizer não a ninguém, e uma vez que estava chateada com meu padrasto e

minha mãe, acabei aceitando. Achei que seria melhor distrair a mente no

trabalho, e foi nessa mesma noite que conheci o pai de Miguel, um homem

lindo, muito charmoso, um pouco mais velho do que eu. Ainda me recordo da

nossa noite como se fosse ontem.

É só fechar os olhos e pensar no homem que me deu meu maior presente.

Lembro-me perfeitamente dos seus lindos olhos, do seu sorriso, a maneira como

ele franzia a testa enquanto conversávamos.

... Estamos aos beijos, toques e mãos bobas, não sou nenhuma virgem,

mas Victor é um homem experiente, sabe como beijar, enlouquecer uma mulher e

arrancar suspiros e gemidos dela, nesse momento, apenas com o toque da sua

boca na minha já me sinto entregue a ele.

... Ele vai deslizando a boca em minhas costas, fazendo uma trilha

torturante até chegar a minha bunda. Victor aperta minha carne com seus

dentes e eu solto gemido de dor e prazer.


Determinada a acabar com a sua tortura dele, viro-me e fico de frente

para ele, então me inclino em sua direção e o beijo. Retribuindo com a mesma

intensidade, ele me surpreende ao me suspender em seu colo. Entrelaço as

pernas ao redor na sua cintura enquanto sou levada para a cama...

Eu jamais acreditei em amor à primeira vista, mas naquela noite

comprovei que as pessoas podem sim se apaixonar por alguém que nunca viram

antes; fiquei completamente encantada por Victor.

— Está quase acabando, não é, meu amor? — brinco com Miguel, que

sorri ao tirar a mamadeira da boca e colocar de novo.

Tão lindo! A única coisa que puxou a mim foi a cor dos cabelos loiros,

porque a boca e os olhos são uma mistura minha e do pai dele. Até mesmo seu

sorriso é parecido com o do pai, e a personalidade... só pode ser dele também,

porque a mim esse garotão não puxou.

Victor. Esse nome está marcado na minha memória há anos, é a única coisa

que sei sobre o pai do meu filho. O nome.

— Intrusa entrando! — Vitória fala assim que entra no quarto.


Estou tão distraída, que nem a ouvi batendo à porta. Dou um sorriso para a

minha amiga, que parece feliz com a minha presença. Sou imensamente grata a

ela por ter me acolhido.

Em São Paulo, quem cuidava do Miguel para mim era uma amiga,

Patrícia. Nós dividíamos o aluguel e esse arranjo era bom para nós duas, mas

quando o seu namorado teve que mudar para outra cidade, ela decidiu que

deveria acompanhá-lo. Foi então que tudo começou a complicar para mim. Eu

precisei arrumar uma babá para o meu filho, tive que assumir integralmente o

aluguel, sem contar as despesas com alimentação, vestuário do meu pequeno,

então o meu salário passou a não ser mais suficiente. E só me afundei mais

quando me demitiram.

Ontem, quando cheguei, fiquei perplexa com a elegância da casa, que

parece mais uma mansão, tudo muito lindo e aconchegante. Minha amiga é

como um anjo em minha vida, me buscou na rodoviária e preparou um quarto

para mim e meu bebê.

— Intrusa nada. Bom dia, Vitória. — Faço uma careta.

Ela sorri ao se agachar ao lado de Miguel e passar as mãos no cabelo dele.


— Estou apaixonada por este menino, como pode? — Ela o olha com

admiração.

E eu a entendo, sou completamente apaixonada pelo meu pequeno desde

que ele nasceu, quando o vi pela primeira vez o meu mundo ficou colorido. Saí

da escuridão e encontrei a luz.

— Ah, amiga, eu te entendo, porque eu também estou! — declaro,

sorridente.

Por alguns minutos fico pensativa ao me recordar de quando descobri que

estava grávida. Meu padrasto me expulsou de casa, e minha mãe nem se abalou,

ficou do lado dele. O desgraçado jogou minhas coisas na rua enquanto gritava na

frente dos vizinhos que eu era uma vagabunda que estragou a vida engravidando

de um desconhecido em um bar ralé.

Ele queria que eu abortasse, mas me neguei a fazer isso, então minha mãe

disse que eu deveria arcar com as consequências, já que eu tinha vinte e três anos

e estava empregada. Eu que me virasse para sustentar o “feto” que crescia em

minha barriga. Ainda dói me lembrar das palavras dela e dos tapas que ela me

deu.
Após ter sido expulsa de casa, fiquei sem saber o que seria de mim e do

meu bebê, porque apesar de ter um emprego no bar, eu não ganhava o suficiente

para sustentar uma criança. Naquela mesma noite, desnorteada, procurei meu

chefe e contei o que tinha acontecido. Comovido com a minha história, ele me

cedeu o quartinho dos fundos, dizendo que eu poderia ficar por alguns dias. Não

era grande coisa, mas eu não tinha opção.

Depois de quase uma semana longe de casa eu conheci Vitória, que foi

como um anjo enviado por Deus. A garota de cabelos longos e castanhos estava

sentada à mesa com alguns amigos, sorrindo e tomando cerveja, quando me

aproximei para anotar seus pedidos, ela percebeu que eu tinha chorado, então se

levantou e me puxou para uma mesa afastada. Vitória quis saber se eu estava

bem, o que tinha acontecido, e eu me encontrava tão magoada com minha mãe,

com a minha vida, que acabei desabafando para aquela desconhecida gentil.

Eu tinha acabado de ser demitida, estava vulnerável, nem mesmo sabia

para onde iria depois que o meu expediente acabasse. Vitória me deu muitos

conselhos, me fez sorrir dizendo que nem tudo estava perdido e pediu o meu

WhatsApp. Fiquei envergonhada ao dizer que meu telefone não tinha esse
aplicativo, só fazia ligações mesmo.

Naquela época, ela tinha vinte anos, três anos mais nova do que eu, mas

ela foi incrível, me fez uma proposta surreal. Até pensei que estava sonhando

quando a garota pegou em minhas mãos e me disse que tinha um lugar onde eu

poderia ficar até que tudo se resolvesse. Ele me ofereceu a casa de uma amiga,

onde estava passando alguns dias. Eu não pensei duas vezes antes de aceitar a

sua ajuda. Não podia recusar.

— Safira, o que houve? Estou te achando tão pensativa — questiona

Vitória, me tirando dos meus devaneios.

Coloco uma mecha de cabelo atrás da orelha e dou um sorriso

envergonhado para ela, que está com a sobrancelha arqueada.

— Estava pensando em como nos conhecemos. Você foi meu anjo, amiga,

ainda o é — declaro, olhando para Miguel, que me estende a mamadeira para

mostrar que acabou de mamar.

Sorrindo, coloco a mamadeira em cima da cômoda e o sento em seguida.

— Eu tenho cara de anjo? Ah, para com isso, dona Safira, eu só fiz o que
achei certo. Se todas as pessoas agissem como eu, o mundo não estaria como

hoje. Um caos! — Sorri de orelha a orelha com seu tom divertido.

— Amiga, o que você fez por mim foi mais do que um gesto nobre. Você

nem me conhecia! — exclamo, com os olhos lacrimejados.

— Sem choro, por favor, vou borrar minha maquiagem! — provoca e eu

gargalho. — Vamos descer, o café já está na mesa e eu quero te apresentar o meu

pai. — Ela pisca para mim.

Quase três anos de amizade com Vitória e eu nunca soube o nome do pai

dela. Ela só se refere a ele como "papai" ou "pai", nunca me disse o nome do

homem que lhe deu a vida. Acho que ele nem mesmo foi pauta de alguma

conversa nossa. De uma coisa tenho certeza, ele deve ser uma pessoa muito

abençoada, porque tem uma filha incrível.

— Safira, Terra chamando! Você está muito pensativa hoje, tem certeza de

que está tudo bem? — Estala os dedos na frente do meu rosto, me fazendo sair

do meu transe.

— Está tudo bem sim, só estava pensando em algumas coisas — minto,

dando um sorriso para ela, que assente.


— Então vamos logo. Meu pai odeia atrasos na hora do café, ele é um

pouco certinho demais. — Revira os olhos e eu dou risada.

— O.k., vamos antes que o sr. Guterres venha nos buscar! — brinco com o

sobrenome, uma vez que só isso sei dele.

Pego Miguel no colo, mas logo ele vai para os braços de Vitória, que tem

um sorriso enorme quando o pega e ele dá um sorrisinho para ela. Meu filho

sabe encantar as pessoas.

Assim que chegamos à sala, eu me deparo com uma mulher muito linda,

loira e alta, muito bem-vestida, de olhos escuros e lábios pintados de vermelho.

Deve ser a famosa Alessandra, que Vitória tanto fala; a namorada do pai que

vive mais na casa deles do que na dela.

— Bom dia, garotas. — O olhar que a mulher lança em minha direção é

estranho. Ela arregala os olhos ao me analisar dos pés à cabeça, deixando-me

constrangida com o seu escrutínio.

— Bom dia. Safira, essa é a Alessandra, a namorada do meu pai. —

Vitória é seca ao me apresentar a mulher. — Onde está o meu pai? — minha

amiga pergunta sem nem olhar para a mulher enquanto brinca com os dedos de
Miguel.

— Bom dia, senhora — falo, sem graça ao notar que a mulher ainda tem

seus olhos em mim. A sua expressão fechada deixa evidente que não gosta nem

um pouco da minha presença.

— Ele está nos esperando na copa — responde a loira, dirigindo-se para a

enteada.

— O.k. Vamos, amiga? — Vitória fala para mim, ignorando totalmente a

mulher ao fazer um sinal para que eu a acompanhe.

Passo a mão no meu vestido para tentar disfarçar o nervosismo ao ver que

Alessandra nos segue. Sigo Vitória até a copa enquanto observo atentamente os

detalhes por onde passarmos — é tudo muito lindo e bem decorado. Na copa,

encontro a mesa posta com um café da manhã bem variado — torradas, pães

diversos, suco, queijo e outras coisas gostosas —, mas o que mais chama a

minha atenção é o homem de costas do outro lado do cômodo, olhando

pensativamente pela janela. Ele tem um porte atlético e está com roupa social, o

cabelo levemente bagunçado, o desconhecido parece ser jovem.

— Amiga, vou te apresentar o meu pai.


Vitória chama a minha atenção quando estou me perguntando se aquele

homem de costas é seu namorado, algum amigo da família ou seu pai. Não me

lembro de ela ter me falado algo sobre namorado, talvez seja um amigo.

— Pai, quero que conheça a Safira.

Assim que ela fala, eu olho para trás para procurar o sr. Guterres, mas não

vejo ninguém. Estranho.

— Bom dia, Saf...

Recuo ao ouvir a voz masculina e arregalo os olhos, levando a mão ao

peito quando a minha respiração falha assim que o estranho se vira e vejo Victor,

que me encara pálido e perplexo.

Não pode ser. Não pode ser.

Só posso estar sonhando, a qualquer momento vou acordar. É isso!

Com as mãos trêmulas, olho para Vitória e a encontro apertando levemente

as bochechas de Miguel, que solta uma risada gostosa, atraindo a atenção

do... pai! Meu Deus, como isso aconteceu?

— Er... eu... eu... — gaguejo, nervosa, antes de olhar para a Alessandra. A


loira está me encarando com uma expressão fechada, nem mesmo tinha

percebido a sua presença na mesa, nem sei em que momento ela se sentou.

— Mamã! Mamã! — Miguel se manifesta, estendendo os braços em minha

direção.

Não sei como reagir, estou sem saber o que fazer. Meus olhos fixam nos de

Victor, enquanto os dele demonstram surpresa antes de mudarem para irritação.

O pai do meu filho começa a respirar pesadamente e tenta disfarçar ao dar um

sorriso. Mas acaba exibindo um sorriso frio, causando uma dor no meu peito.

— Amiga... não... estou muito bem. Do nada, me deu uma dor de cabeça

insuportável — minto, com os olhos lacrimejando. Estou ficando sem ar, meu

corpo parece que vai desabar, minhas pernas estão bambas.

— Talvez seja por não ter tomado café. Coma alguma coisa, tenho certeza

de que vai passar. — Vitória soa tão atenciosa, que abaixo a cabeça,

envergonhada com a minha atitude.

Eu transei com o pai da minha amiga, engravidei do pai dela! A criança

que ela segura nos braços não é apenas o filho da sua melhor amiga, é o seu

irmão também.
— É... pode ser. Mas eu quero subir, por favor. — Minha voz sai chorosa,

não consigo olhar nos olhos de ninguém agora.

— Suba, então. Deixe o lindão aqui comigo, e qualquer coisa me chame.

Levanto a cabeça e tomo coragem para encarar a minha amiga. Solto uma

respiração aliviada ao notar que ninguém, pelo menos as duas mulheres,

percebem o que está acontecendo.

— Com licença. — Minha voz sai quase em um sussurro.

Como uma covarde, deixo o meu filho para trás e vou me esconder. Sei

que corro o risco de Victor fazer as contas e descobrir que o menino no colo da

sua filha é dele, mas, neste momento, não tenho forças para enfrentar o meu

passado, não agora.

O que eu vou fazer da minha vida?

Por que será que o destino gosta de brincar comigo dessa maneira?

Eu não sei o que fazer agora, estou perdida.


VICTOR

"Pai, quero que conheça a Safira."

A voz da minha filha soa na minha cabeça enquanto aperto os punhos e

esmurro a parede do meu escritório. Eu realmente esperava ver a famosa Safira,

mas ao me virar para conhecer a amiga da minha filha, eu me deparei com

Beatriz. Pelo menos era esse nome que ela me deu na noite em que nos

conhecemos e transamos depois que saímos daquele bar. Quando a vi me

encarando como se eu fosse um fantasma, percebi que ela estava tão surpresa

quanto eu. Ou sabe fingir muito bem.


— Porra, o que eu fiz?! — Olho para meus punhos avermelhados.

Safira correu como uma covarde, temia me encarar e receava ouvir as

palavras que poderiam sair da minha boca quando descobri que ela não se chama

Beatriz. Depois que ela decidiu se esconder, meus olhos foram automaticamente

parar no garoto que minha filha carregava nos braços — o filho dela. Eu quis

perguntar a Vitória a idade dele, mas achei melhor me calar, já estava com a

cabeça cheia demais para começar a supor as coisas. Eu apenas disfarcei e pedi

licença, dizendo que tinha algumas ligações para fazer no meu escritório. Assim

que fechei a porta do escritório liguei para a única pessoa que me ouve e pode

me aconselhar em momentos de apuros — Lucas.

Agora estou aqui, esperando o meu amigo chegar, minha cabeça uma

bagunça total, acho que a qualquer momento posso ficar louco.

Como vou explicar para a minha filha que dormi com essa garota que ela

chama de amiga?

Balanço a cabeça, tentando afastar esses pensamentos, mas é impossível.

Não preciso dizer nada, é só fazer o mesmo que Safira — fingir que não

nos conhecemos —, então tudo vai ficar bem e cada um segue com a sua vida.
Além do mais, a noite que tivemos foi insignificante, apenas sexo, e uma vez só.

Porra, Victor, o problema nem é esse!

Vitória nunca o perdoará se descobrir que no dia que completou três anos

da morte dela você foi para a cama com a amiga dela, essa que ela parece adorar.

Mas, talvez, naquela época elas nem se conheciam. Ou conheciam? Estou sendo

paranoico demais, confundindo tudo.

Ouço algumas batidas à porta e fico atento.

— Sou eu — diz a voz do outro lado.

Solto um suspiro de alívio ao ver que Lucas, com o semblante preocupado,

entra no escritório e fecha a porta.

— Fique bem à vontade, a conversa vai ser longa, meu amigo — declaro,

levando a mão às minhas têmporas latejantes.

— Vim o mais rápido que pude. O que aconteceu? Parece que você viu um

fantasma — ele fala bem-humorado ao se sentar no sofá de couro.

Puxo a cadeira e me sento de frente para Lucas. Ele passa a mão em sua

barba rala, enquanto me analisa e nota que não estou nada bem. Muitos anos de
amizade resulta nisso, basta um olhar para saber que algo está muito errado com

o outro.

— Lembra-se da Beatriz? — Dou ênfase ao nome, sentindo o gosto

amargo invadir a minha boca. Passo os dedos nos fios do meu cabelo e solto um

grunhido. Caralho, eu estou fodido.

— Como esquecer? Você ficou falando sobre a noite que passou com ela

por quase duas semanas. — Ele dá um sorriso malicioso, mas logo fica sério

quando nota que não estou de bom humor. — O que aconteceu?

O pior.

— Esqueça esses detalhes — falo, indignado comigo mesmo. — A garota

que está dentro da minha casa é a Beatriz, que, na verdade, se chama Safira! É

uma puta confusão do caralho.

Lucas arregala os olhos, boquiaberto com a minha revelação. Fico só

imaginando a aparência que eu tinha quando a vi, quando pensei que estava

vendo uma miragem.

— Puta que pariu! Me conta essa história direito, não estou entendendo
nada. — Ele ri e eu fecho ainda mais a cara. — Quer dizer que a mulher que

você fodeu há alguns anos está sob o mesmo teto que você, e ainda é amiga da

Vitória?

Assinto, engolindo em seco, minha garganta quase rasgando.

— Sim, exatamente isso. Mas naquela noite ela me disse que se chamava

Beatriz. Eu que não estou entendendo porra nenhuma! — Minha cabeça lateja,

estou preocupado com o que pode acontecer de agora em diante.

— Você tem que descobrir qual dos nomes é o verdadeiro. — Lucas me

encara visivelmente preocupado, e eu sei o porquê da sua preocupação.

— Isso não será um problema — murmuro, amargurado.

É muita coincidência eu ter transado com a mulher que se diz amiga da

minha filha. Isso é tudo muito suspeito, não confio nela a ponto de tê-la dentro

da minha casa, não mesmo. Preciso tomar alguma providência.

Estava em um bar em São Paulo quando conheci a "Beatriz", ela era a

garçonete que me atendia. Nesse dia completava três anos da morte de Aline, eu

quis fugir da pressão que estava sentindo dentro de casa com Vitória e saí de
Santo Antônio para fazer uma viagem a negócios no lugar do meu amigo. Eu

disse a ele que não suportava ver o quanto a minha filha chorava e sofria com a

perda da mãe, mesmo depois de tanto tempo, então ele sugeriu que eu fosse no

lugar dele e que deixasse Vitória aos seus cuidados, ele a distrairia o suficiente

para enfrentar esse dia.

A mãe sempre foi a maior inspiração de Vitória, e por mais que o tempo

tivesse passado, o dia da sua morte sempre provoca um grande sofrimento na

minha princesa. Ela a amava muito, claro, e por mais que eu não suportasse mais

ver o seu sofrimento por uma pessoa que nem mesmo merecia suas lágrimas, por

mais chateado que eu ficasse com a situação, nunca poderia destruir a boa

imagem que ela tinha da mãe.

Aline nunca foi uma mulher íntegra, ela poderia fingir ser uma mãe e

esposa perfeita, mas não passava de uma farsa, uma vagabunda traidora. Dei

tudo para ela que estava ao meu alcance — amor, fidelidade, carinho —, mas ela

não soube retribuir. Enquanto eu estava trabalhando, procurando fazer a minha

empresa crescer para que pudéssemos ter uma vida mais confortável, a safada

estava trepando com outro na nossa cama.


Depois de tantos anos juntos, eu descobri que a minha querida esposa, a

mulher com quem eu tinha me casado e que pensava me amar loucamente, me

traía com uma pessoa que ela dizia ser seu irmão. Aline teve a coragem de trazer

um filho da puta desconhecido para dentro da nossa casa quando nossa filha

tinha dez anos de idade, e o apresentou como seu irmão mais novo, o único

parente vivo. Eu aceitei numa boa o sujeito dentro da minha casa, afinal, quando

nos conhecemos ela me disse que não tinha família, não tinha ninguém na vida.

Mas depois de anos surgiu esse tal irmão, o Marcelo, que ela nunca havia

mencionado pois nunca tiveram uma boa relação, foi o que ela me disse.

Foi então que, um belo dia, ela me disse que ele a tinha procurado para que

pudessem fazer as pazes e ela não viu motivos para que isso não acontecesse, já

que eram dois adultos e poderiam deixar as diferenças de lado, e eu, como um

otário, o maior corno da história, deixei que Aline enfiasse o amante dela, que eu

acreditava ser seu irmão, dentro da nossa casa. Sustentei o vagabundo por um

bom tempo enquanto ele comia a minha mulher pelas minhas costas.

A mãe da minha filha me fez de trouxa. Eu a amava, acreditava nela, tinha

confiança na mulher que me deu uma família, me deu a minha maior felicidade
que eu poderia querer — Vitória. Eu jamais vi maldade nela, confiava de olhos

fechados, e em troca recebi muitas traições.

Lembro-me bem de uma discussão entre mim e Aline porque ela

maltratava muito a Vitória, tudo era motivo de grito. Eu não sabia o verdadeiro

motivo do seu estresse e por que descontava as frustrações em uma pessoa

inocente que a venerava. Só depois que descobri a sua traição que montei o

quebra-cabeça — naquele dia seu “irmão” levou a namorada para nos apresentar.

Até hoje eu me pergunto como nunca notei as trocas de olhares, os sorrisos que

um dava para o outro. Tudo.

Fui tão inocente que me deixei ser colocado no bolso e ser feito de idiota

por aqueles desgraçados. Eu fiquei sabendo da sua traição através de um detetive

um mês antes do acidente que os matou. Eles estavam fugindo quando um

caminhão desgovernado arrastou o carro de Aline para fora da estrada, o

automóvel foi arremessado contra um despenhadeiro, explodindo em seguida.

Quando recebi a notícia da morte de Aline fiquei desolado, afinal, ela era a

mãe da minha filha, e por mais que eu já soubesse da sua traição, eu não podia

demonstrar indiferença em um momento tão delicado para a minha filha. Apesar


de os anos terem passado, eu continuo mantendo a farsa para todos de que a

Aline era uma santa, somente Lucas sabe a verdade.

— Irmão, tenho alguns assuntos pendentes fora da cidade. Só passei aqui

porque você me deixou muito preocupado. — Meu amigo me tira dos meus

pensamentos e eu balanço a cabeça, ainda me sentindo aéreo. — Qualquer coisa

me ligue que eu venho o mais rápido possível.

— Pode deixar, obrigado por ter vindo, eu precisava desabafar. — Solto

um grunhido.

Lucas se levanta, e antes de sair damos um aperto de mão.

Minutos se passam e eu continuo no mesmo lugar, com cabeça

fervilhando. Estou em uma situação complicada e tenho que resolver isso antes

que as coisas piorem mais. Vou me manter longe de Safira até que eu consiga

ficar com ela a sós para que possamos esclarecer as coisas.


SAFIRA

Transei com o pai da minha melhor amiga sem saber.

Mas como eu poderia saber, se na época eu nem a conhecia? Mas isso não

muda o fato de que fiz sexo com o pai dela. Tudo seria mais fácil se não tivesse

uma gravidez envolvida. Para começo de conversa, nem mesmo sabia que o pai

dela era tão jovem, nunca tive motivos para perguntar sobre isso. A única coisa

que eu sabia era que Vitória não tinha mãe, a coitadinha havia falecido em um

acidente de carro com o tio dela, somente isso. Jamais imaginei que a minha

amiga tinha um pai de trinta e oito anos de idade.


Estou há quatro dias na casa dos Guterres e evitando o Victor, parece que

ele vem fazendo o mesmo, porque desde aquele dia no café da manhã — que não

aconteceu —, não o vi mais.

Só desço para comer quando todos não estão mais presentes, o que

aumenta ainda mais a desconfiança da Vitória. Mas não posso simplesmente

dizer "amiga, me perdoa, mas não quero ficar perto do seu pai. Eu e ele tivemos

uma noite ardente de sexo e acabei engravidando. Aliás, o Miguel é seu irmão."

Ela já cansou de me perguntar por que não desço para tomar café com ela

ou almoçar na hora que todos se reúnem à mesa, e para todas as suas perguntas,

graças a Deus, tive uma resposta que não a convenceu muito, no entanto, não

insistiu.

Nervosa, mordo o lábio inferior e olho para Miguel deitado na cama,

dormindo como um anjo. Passo suavemente as mãos em seu rosto sereno e

sorrio. Amo tanto meu filho, ele é a minha razão de viver, o melhor presente que

eu poderia receber da vida.

Quando eu descobri sobre a gravidez estava de um mês, assim que percebi

que a minha menstruação estava atrasada, passei em uma farmácia e comprei um


teste. Precisava acabar com as minhas dúvidas, e não deu outra, o teste

confirmou a gravidez, então, rapidamente, marquei uma consulta com a minha

ginecologista, a dra. Elisa, só para confirmar o que já era óbvio.

De início fiquei assustada com a notícia, mas ao mesmo tempo fascinada.

Minha história é uma porra de um clichê — eu estava tomando anticoncepcional,

mas um bendito resfriado me obrigou a tomar antibiótico, que acabou anulando

o efeito do anticoncepcional. Coisa de louco, né?

Me pego pensando no dia em que me expulsaram de casa e meu padrasto

me humilhou na frente dos vizinhos dizendo que eu me arrependeria e voltaria

com o rabo entre as pernas quando fosse demitida por estar grávida e não ter

onde morar. Ele se enganou. Não voltei, muito menos implorei algo para eles. As

palavras dele ficaram cravadas na minha cabeça e me fortalecem até hoje.

No fundo, eu sabia que minha mãe tinha esperança de que eu retornasse

para casa e dissesse "me ajude a resolver esse problema", então ela me levaria

para alguma clínica clandestina e tiraria meu bebê.

Me deito ao lado do meu pequeno e o observo dormir, sua respiração é tão

calma, seu sono parece estar bem gostoso. Solto uma risada baixa quando ele
suga a chupeta com força. Acho que alguém está sonhando.

Depois de um tempo deitada, ouço batidas à porta. Acho que é Vitória...

Não é. Hoje ela foi para a faculdade e depois irá a um clube que frequenta

algumas vezes por semana com alguns colegas. Ela até me convidou, mas nem

cogitei ir, tenho um pequeno para cuidar. Minha amiga pareceu chateada de

começo, mas depois me entendeu.

— Já vai! — exclamo, já fora da cama. Calço as sandálias e sigo até a

porta, abrindo-a em seguida. Ao ver quem é eu me arrependo e tento fechá-la,

mas ele me impede.

— Precisamos conversar. — Sua voz sai baixa e dura.

Sem ter opção, assinto e peço que entre. Victor segue até a cama e fixa

seus olhos em nosso filho, que graças a Deus continua dormindo, depois se vira

para mim com os olhos semicerrados. Neste momento eu gostaria de conseguir

ler mentes para saber o que está passando em sua cabeça.

— O que deseja, sr. Guterres? — Finjo indiferença ao encará-lo com

firmeza.
— Quais as suas intenções vindo até a minha casa e virando amiga da

minha filha, Beatriz? — Ele dá ênfase debochadamente ao nome que dei a ele

quando nos conhecemos.

Desvio o olhar, envergonhada. Seus olhos azuis me queimam como fogo.

Merda!

— Não entendi, senhor. — Dou de ombros ao fechar a porta. Não quero

correr o risco que alguém nos pegue tendo essa conversa nada agradável.

— Eu quero você fora da minha casa e longe da Vitória — fala sem

rodeios, sua expressão está fechada. Percebo que seus músculos estão tensos e

sua respiração acelerada.

— O... o que disse? — gaguejo, sentindo meus olhos arderem.

— Isso que ouviu. Há quanto tempo vem planejando isso tudo? — Victor

olha para Miguel e depois me encara com nojo, seu olhar de desprezo faz meu

estômago embrulhar.

— Como assim, está louco? — Minha voz sai falha, embargada. Meu

coração está morrendo a cada palavra dele.


— Eu não acredito em coincidências, garota, muito menos em destino.

Naquela noite você me disse que se chamava Beatriz, e este não é seu nome,

certo? Safira... foi assim que a minha a filha a apresentou há alguns dias. Abra

logo o jogo e diga o que pretende, Safira, Beatriz, ou seja lá como se chama de

verdade — rosna e se aproxima de mim, cheio de ódio.

Dou um passo para trás e acabo batendo as costas na porta. Escroto!

Apavorada e com as mãos trêmulas, baixo meus olhos e encaro meus pés,

pedindo aos céus para me dar sabedoria para poder lidar com essa situação.

— Não há jogo algum, Victor. — Ouso chamá-lo pelo nome. — Assim

como você, também fui pega de surpresa. Nunca passou pela minha cabeça que

você pudesse ser o pai de Vitória. — Deixo as lágrimas caírem ante a injustiça

que o homem está fazendo comigo.

— Conta outra. Acha que vou acreditar em você? — Ele dá uma risada

sarcástica. — Quanto você quer? Depois que pegar a grana dê o fora daqui. —

Victor se aproxima mais e ficamos cara a cara.

Furiosa por ele me comparar a uma prostituta, bato em seu rosto com

força, ouvindo seu grunhindo em seguida.


— Seu porco! — exclamo, enojada com a sua ação.

— Foda-se. Eu vi mulheres do seu tipo, transa com o cara na mesma noite

que o conhece para...

Não o deixo terminar de falar, dou outro tapa nele. Victor esmurra a parede

ao meu lado e segura em meu queixo, me obrigando a encará-lo.

— Me largue! — ordeno, já no limite, mas sou ignorada.

— Qual a idade do menino? — pergunta, sério. Victor solta um suspiro e

analisa meu rosto calmamente. Ao perceber que estou assustada, ele se afasta e

leva as mãos à cabeça.

— Um ano e três meses — afirmo e quase sai em sussurro.

— Quando ele nasceu? Em que data? Que mês? — questiona, meio

descontrolado.

Me nego a passar por mais uma humilhação.

— O que quer saber? Se meu filho é seu? A resposta é não. — Meu

orgulho fala mais alto. — Miguel é filho do meu ex-namorado, não se preocupe,

ele não é sua responsabilidade.


— Se a criança não é minha, o que veio fazer aqui? O que quer de mim, da

minha filha? — Victor volta a se aproximar como um predador prestes a atacar

sua presa.

— Não vim atrás de nada seu, eu nem sabia seu sobrenome, nada sobre

você, foi uma grande surpresa o encontrar aqui... Jamais pensei que o encontraria

novamente — acabo confessando e me recrimino mentalmente por ter falado

demais.

— O.k., se você está dizendo. Vitória me disse que você precisa de um

emprego — diz, mudando completamente de assunto. Parece que alguém andou

procurando saber mais sobre a minha vida.

— Não que seja da sua conta, mas, sim, preciso trabalhar para sustentar o

meu filho. — Fecho meus olhos para não o encarar. Sei que é infantil da minha

parte, mas esse imbecil me encara com tanta intensidade, que eu posso acabar

me contradizendo sobre a paternidade de Miguel.

Sei que foi burrice ter mentido, mas não vou facilitar para ele, se ele for

tão inteligente quanto acha, irá descobrir isso sozinho.

— E já encontrou o seu ex-namorado para dizer que ele é pai? —


pergunta, meio sarcástico, tentando me fazer cair em contradição.

— Isso não lhe diz respeito. Estou passando alguns dias na sua casa, mas

não lhe devo satisfações da minha vida particular, sr. Guterres! — Empurro seu

ombro enquanto passo por ele.

— Eu ainda não sei o que está planejando — Victor dá um sorriso

desconfiado —, mas pode ter certeza de que vou descobrir, Safira. — Estala a

língua e depois toca a minha cintura, provocando arrepios em meu corpo.

— Não estou planejando nada, deve parar com essas ideias malucas! —

falo, esgotada. — Se veio aqui tentar me convencer a deixar a sua casa, você

acaba de conseguir. Vou sair hoje mesmo.

Tento me afastar dele, no entanto, Victor pressiona o meu corpo contra o

dele e encosta sua boca em meu ouvido.

— Posso ser tudo, menos idiota. Você não vai a lugar algum com o meu

filho. Você é uma péssima mentirosa, nem mesmo conseguiu sustentar o olhar

por muito tempo quando perguntei pelo pai do Miguel. — Seu hálito quente e a

voz rouca fazem meu corpo estremecer.


— Saia de perto de mim, seu babaca egocêntrico. Apesar de estar

hospedada na sua casa, a minha vida ainda é minha. E até onde eu me lembro,

não te devo nenhum tipo de satisfação. Nós só tivemos uma noite de sexo e nada

mais. — Esmurro seu peitoral definido.

— Veremos! Tenha uma boa noite, Safira — Victor volta a falar no meu

ouvido.

O miserável, antes de se afastar, deposita um beijo no meu pescoço. Sem

ação, me afasto da porta, e, em seguida, vejo-o sair do quarto com aquele ar

arrogante. Esse homem é prepotente demais, se acha o dono do mundo. Onde fui

me enfiar? Estou ferrada em todos os sentidos. Victor Guterres não parece ser

um homem de promessas vazias, e eu tenho medo do que ele pode ser capaz de

fazer contra mim.

Eu posso muito bem pegar minhas coisas e sumir daqui... para onde eu

iria? A minha única opção é continuar aqui, e me manter firme em minhas

palavras. A namorada dele está aqui todo santo dia, então não corro perigo

algum. Victor não será louco de se expor, tenho certeza de que sua namorada não

aceitará um filho fora do relacionamento deles, isso é o que me conforta.


SAFIRA

Poucos minutos após a saída de Victor ouço algumas batidas à porta, então

fico alerta.

Será que aquele imbecil voltou para tirar a minha paz de novo?, penso,

fechando os punhos, mas respiro aliviada ao ouvir a voz de Vitória em seguida.

Nossa, ela não demorou muito no clube.

Um pouco nervosa, abro a porta para a minha amiga, que me olha um

desconfiada. Fico imaginando o que pode ter acontecido, afinal, ela apareceu
minutos depois do seu pai sair do meu quarto. Será que ela o encontrou? Ou pior,

será que ela ouviu alguma coisa? Estou começando a surtar.

— Oi... oi... Vitória! — falo, gaguejando um pouco. — Entre — peço,

tentando controlar meu nervosismo.

Ela prontamente entra no quarto e sorri ao ver seu afilhado dormindo.

— Aconteceu alguma coisa, Safira? — pergunta, me analisando.

Balanço a cabeça negando, por dentro estou morrendo de medo. Ela ouviu

algo, tenho certeza! Estou bem ferrada. Será o fim da nossa amizade! Nem

imagino como ela vai reagir ao saber do meu envolvimento com o seu pai. Eu,

no lugar dela, não ia querer mais a minha amizade.

— O que poderia ter acontecido, amiga? — respondo-lhe com uma

pergunta e dou um sorriso para disfarçar. — E você, por que chegou cedo?

Pensei que voltaria mais tarde, afinal, foi ao clube se divertir um pouco. —

Mudo o foco da conversa, mas parece que ela está decidida a ter uma resposta

para a pergunta que tento fugir de qualquer maneira.

— Fiquei com dor de cabeça, quis voltar cedo — diz, ainda me olhando
desconfiada. — Está chateada comigo, né? Eu sei que você tinha me dito que

procuraria um trabalho por conta própria porque já te ajudei muito, mas não

aguentei e comentei com o meu pai sobre isso... Quando eu estava subindo para

te ver, eu o vi saindo do seu quarto e ele estava furioso. Achei que vocês tinham

discutido por algo, sei lá, porque eu errei em tomar a frente da situação e...

desculpe, Safira! Eu tenho a boca grande demais — desabafa.

Fico surpresa, e não pelo fato de ela ter contado que estou procurando

emprego, mas por ela não ter ouvido nada. Quase tive um treco enquanto

pensava besteiras. Mas não muda o fato de que Vitória viu seu pai saindo do meu

quarto, e ainda por cima furioso.

— Nem sei o que te dizer, amiga. — Olho agora para Vitória mais aliviada

e segura, porque sei que não estava ouvindo atrás da porta. — Mas... Foi isso

sim, seu Victor veio me procurar para falar do emprego e eu já imaginei que

você tivesse falado com ele sobre a situação.

Espero que ela compre essa minha maldita mentira.

Parecendo envergonhada, Vitória se aproxima e me abraça.

— Não está mesmo chateada comigo? — indaga.


— Claro que não, sua boba. — Rio. — Amigos são para isso, para todo

momento, e você não errou, o.k.?! — falo, ainda sorrindo. — Seu pai só veio

porque sabe que somos muito próximas e quis ajudar, mas fiquei envergonhada e

o dispensei. Ele deve ter ficado furioso por causa disso. O sr. Guterres parece ser

uma fera! — Meu coração dói por mentir, mas é necessário.

— Ah, te amo, sua linda! — exclama e se afasta, já com um sorriso nos

lábios. — Meu pai é muito turrão, apesar de ser um homem jovem é muito

carrancudo, mas, relaxa, ele é uma boa pessoa.

Se tivéssemos conversado mais sobre seu pai, se eu tivesse visto fotos dele,

talvez não me encontraria nessa enrascada, porque saberia que o sr. Guterres é

o mesmo homem que conheci há alguns anos.

— Também te amo. Notei que ele é uma pessoa bem séria, mas... não

importa. Sou grata a ele por ter me deixado ficar aqui com meu filho. Poucas

pessoas fariam isso. — Dou um sorriso para ela.

— Eu não seria sua amiga se não te desse esse apoio em um momento tão

difícil, como o que está passando agora — declara.

Acabo concordando com ela, porque ela não tinha obrigação alguma de
abrir as portas da sua casa para mim.

— Amiga, seu pai tinha que idade quando você nasceu? Confesso que

fiquei surpresa quando o conheci, ele é muito novo. Achei que ele fosse o seu

namorado, ou um amigo... sei lá... — pergunto, curiosa. Essa pergunta ficou na

minha mente desde que encontrei Victor naquela manhã.

— Minha mãe era mais velha que o papai, ele tinha dezesseis anos quando

eu nasci. — Dá risada, e eu a acompanho. — Meu pai era muito safado quando

engravidou a minha mãe, hoje que está mais sossegado. Pra ser sincera, já me

acostumei com a ideia de ter um pai tão jovem, mas fico irritada quando minhas

amigas dão em cima dele, já deixei de trazer algumas para cá, porque todas as

vezes elas davam trabalho. Uma vez peguei uma amiga se enfiando na cama do

meu pai, graças a Deus ele não me viu a arrastando pelos cabelos para fora do

quarto dele. A minha sorte é que ele estava tomando banho. Enfim, não trago

mais garotas para a minha casa, e graças aos céus que você não é nenhuma louca

a fim do meu pai. Acho que eu surtaria se isso acontecesse.

Ah, se você soubesse, amiga! Eu fiz mais do que me enfiar na cama do seu

pai, fizemos mais do que deveríamos ter feito... e se você souber, tenho certeza
de que me estrangula.

Finjo um sorriso e passo a mão no pescoço, envergonhada com as suas

palavras.

— Uau, minha nossa! Entendi... Que loucura! — Com muita dificuldade,

consigo manter meu olhar firme no dela.

— É isso, Safira. Estou falando muito, desse jeito vou acabar acordando o

nosso lindinho — diz, rindo baixinho. — Vou para o meu quarto, quero tomar

um banho e depois dormir, amanhã o dia será longo.

— Boa noite, amiga, durma bem — digo, me aproximando da porta.

— Tenha uma boa noite de sono também.

Nos despedimos e ela se vai enquanto fico com a cabeça cheia de teorias.

O que me espera essa noite não é um bom sono, mas sim uma bela dor de

cabeça. Minha cabeça já está estourando.

**

Acordo cedo e deixo Miguel na cama com alguns brinquedos enquanto

vou tomar meu banho rapidamente. Meu filho ainda é muito pequeno para ficar
muito tempo sozinho. Quando saio do banheiro visto uma calça jeans cintura

alta, uma regata branca com gola alta, faço um rabo de cavalo no alto da minha

cabeça e, para finalizar, passo um batom rosa bem clarinho.

— É, meu amor, está na hora de darmos as caras. — Pego Miguel no colo

e ele envolve os bracinhos em meu pescoço e encosta a cabeça no meu ombro.

Meu menino fofo!

Já são quase oito da manhã, acho que a família deve estar reunida tomando

café. Não posso passar o resto da vida enfiada neste quarto, então decidi me

reunir a eles. Com meu filho nos braços, saio do quarto e sigo para a escada.

Coragem, Safira!

Solto um suspiro ao descer os últimos degraus. Mil coisas passam por

minha cabeça a cada passo que dou em direção à copa, onde provavelmente o

casal e minha amiga estarão reunidos. Meu coração acelera, mas a sensação ruim

que sinto em meu peito é muito pior. Não acho que devo permanecer sob o

mesmo teto que o homem que ontem me ofereceu dinheiro para deixar a casa

dele e sua filha em paz. Só que, pensando bem, o idiota me colocou contra a

parede logo em seguida, como se tivesse esse direito, exigindo que eu não fosse
a lugar algum com o filho dele. Em momento algum confirmei a sua suspeita,

será que ele se deu conta disso? Eu nunca disse que Miguel é filho dele.

Victor Guterres é um imbecil e prepotente, e eu estou disposta a enfrentá-

lo. Se ele acha que vou abaixar minha cabeça está muito louco, eu o farei engolir

as palavras toda vez que pensar em me desmoralizar.

— Bom dia — cumprimento Vitória, que está sentada à mesa.

Arqueio levemente a sobrancelha ao ficar surpresa por encontrá-la sozinha.

Olho ao redor procurando os dois, mas não os encontro, então disfarço e dou um

sorriso para a minha amiga, que para de comer e se levanta para pegar o Miguel

dos meus braços.

— Termine de comer primeiro, Miguel não vai à lugar algum, não se

preocupe.

— O.k. Tenho uma novidade pra você, mas só conto depois de você comer

também — diz, enquanto pega um prato e coloca algumas coisas, em pouco

tempo ele está cheio.

Será que o pai dela e a namorada estão dormindo? Eles vão aparecer
ainda? Estou criando milhares de teorias agora. Me remexo na cadeira, e por

sorte Vitória não nota meu pequeno desconforto.

— Me conte a novidade enquanto comemos, estou muito curiosa — peço,

ajeitando Miguel em meus braços, que está agitado colocando a mão na boca e

balbuciando.

— Arrumei uma entrevista de emprego para você, e será daqui a meia

hora. Você tem alguns minutos para ir se apresentar como candidata para a vaga.

Fico sem reação, surpresa. Minutos? Como assim?

— Uau... Amiga, obrigada... Nem sei o que te dizer... mas obrigada! —

Fico tão emocionada que até gaguejo.

— Não diga nada, apenas me dê meu afilhado e tome seu café. E nem

precisa se preocupar com essa gostosura aqui, eu fico com ele. — Se oferece,

sorridente. Vitória empurra a cadeira para trás, se levanta e pega Miguel dos

meus braços, que vai alegremente para os braços da dinda.

— Você não tem nenhum compromisso? Não quero ser motivo de

discórdia na sua casa. Talvez seu pai não goste da ideia de você ficar cuidando
do meu filho... Não sei se ele e a namorada veriam isso com bons olhos. —

Minha voz sai um pouco baixa, receio que o casal entre a qualquer momento e

me pegue falando deles.

— Meu pai não vai se intrometer em nossa amizade, amiga, ele não é uma

pessoa má, já a nojenta da Alessandra... mas se ela pensar em meter o nariz onde

não deve, eu a coloco no lugar dela. Miguel é meu afilhado, cuido dele sim e

ponto final. Mas não precisa se preocupar com os dois, eles não estão em casa.

Aquelazinha não dormiu aqui e meu pai saiu bem cedinho e provavelmente vai

demorar. — Vitória pisca para mim, depois beija a bochecha da criança, que cai

na gargalhada com o mimo. — Agora se alimente. Depois que acabarmos, vou te

passar o endereço.

— Sim, senhora! — Assinto e começo a fazer a minha refeição.

**

Depois do café, subo para o quarto, pego a minha bolsa e meu currículo e

sigo para fazer a entrevista no endereço que Vitória me deu. Como fica pertinho

da casa dela — não demoro nem seis minutos — decidi vir a pé. Fico esperando

mais de trinta minutos sentada a uma mesa aguardando que me chamem.


Talvez nem irão me contratar, o lugar é tão elegante que nem me encaixo

nele, acho que os funcionários são rebuscados.

Segundo Vitória, o restaurante é de um amigo querido e a vaga já está

garantida, basta eu me apresentar como sendo indicada por ela. Mas estou

insegura, já que não fui recebida pelo gerente do local, só um funcionário que

perguntou se eu desejava alguma coisa antes de me entregar o cardápio. Assim

que o rapaz virou as costas, coloquei o cardápio na mesa e comecei a ficar

frustrada e nervosa.

— Safira, é você?

Congelo no mesmo instante que ouço a voz atrás de mim. A pessoa quer

confirmar se sou eu, no entanto, sinto que é uma confirmação que ela já tem,

mas quer fazer pouco de mim, a sua voz entrega tudo.

Grande merda! Não pode ser, vou matar a minha amiga.

— Ah, oi, sra. Alessandra! — Viro-me para ela e encontro seu olhar

indiferente.

A mulher me olha dos pés à cabeça e me sinto pequena diante dela, diante
da sua onipotência. Ela veste um vestido simples vermelho com uma abertura na

lateral e um escarpim preto. A diaba é requintada, bonita, alta e tem o corpo

curvilíneo. Apesar de não ir muito com a cara dela, confesso que o desgraçado

tem um bom gosto.

— Oh, meu bem, não me chame de senhora, sou jovem assim como você.

— A loira sorri e joga os cabelos longos para trás, em seguida, arqueia a

sobrancelha e mantém seus olhos mim como se desejasse me devorar por algum

motivo.

— A senh... você...

— É o seguinte, meu amor — sou interrompida —, a Vitória me pediu

ontem, com tanto carinho, para te dar uma oportunidade em meu restaurante, que

nem consegui dizer não para a minha linda enteada. — A namorada de Victor

cruza os braços sobre o peito.

Meu Deus.

Meu Deus.

Não pode ser!


É uma grande piada. Como a minha amiga me envia para trabalhar com a

secretária do diabo? Não conheço essa mulher há muito tempo, mas com os anos

sozinha no mundo lutando pela minha sobrevivência aprendi a conhecer melhor

as pessoas, e Alessandra não me passa uma boa impressão. Sinto o cheiro de

falsidade, de maldade no ar.

Minha garganta queima e meus olhos ardem quando Alessandra dá uma

leve gargalhada, como se eu fosse um animalzinho com medo da tempestade.

Não vou abaixar a cabeça para ela. Vim aqui pelo emprego, pelo meu filho, ele

está em primeiro lugar, então vou enfrentar a fera. Sou mãe solo, não tenho

nenhuma renda e qualquer emprego é válido, não importa se a chefe é a

encarnação do próprio satanás.

— Pensei que um homem fosse me entrevistar. A Vitória disse que o local

é de um amigo dela... Talvez ela tenha esquecido de mencionar que era a

“senhora”. — Enfatizo o senhora de propósito, suas narinas infladas indicam que

consegui cutucar a serpente.

— Lindinha, me acompanhe até o meu escritório, o salão não é lugar para

entrevistar subordinados. Me siga — diz e estala os dedos, como se eu fosse seu


cachorro.

Com um pouco de raiva, olho ao nosso redor e vejo algumas pessoas

saindo e entrando do restaurante, enquanto outras aproveitam a refeição,

sorrindo ou conversando.

Ela gira nos calcanhares e segue em direção a uma sala ao lado do balcão

da recepção. Depois de ver a namorada de Victor sumir do meu campo de visão,

levanto-me, tomo um pouco de ar, pego minha bolsa e sigo até a sala,

empurrando a porta preta e entrando. Logo me deparo com senhora arrogante

sentada atrás de uma mesa chique.

— Sente-se. — Aponta para a cadeira à sua frente, e só então noto o anel

de compromisso no seu dedo. Tenho certeza de que ele não estava ali quando nos

conhecemos.

Apesar de ela não me pedir nada, ficar em silêncio só me olhando por

longos minutos, tiro meu currículo da bolsa e o coloco na mesa.

— Senhora Alessandra, aqui está o meu currículo com minhas

experiências e...
Sou interrompida por uma risada. Suando frio, desvio meus olhos para a

prateleira e acabo vendo alguns porta-retratos com fotos dela com o Victor

parecendo felizes, sorrindo na maioria das fotos.

— Ele é lindo, não é? — pergunta e eu quase caio da cadeira, assustada.

— Como? — gaguejo, sem querer olhar nos olhos dela. Aonde ela quer

chegar?

— Meu namorado, garota, não se faça de sonsa.

Dessa vez olho para Alessandra, que está com um sorriso gélido, de matar.

— Ninguém ainda teve a coragem de lhe dizer, mas eu digo. Você não é

bem-vinda naquela casa. Victor não gosta de você, só a aceitou por caridade,

porque você é amiga da filha dele, a única que ele tem, é normal os pais fazerem

as vontades, não é?

— Senhora, não estou te entendendo. — Ameaço me levantar, mas ela faz

um sinal para que eu continue sentada.

— Ah, mas você já vai me entender. — Passa as mãos no cabelo, como se

tivesse o arrumando. — Desde o dia que você chegou, estou te observando, sei o
quanto ficou abalada ao ver meu homem lindo, jovem, rico e muito gostoso. Nem

mesmo conseguiu manter os olhos nele por muito tempo, estava com medo de

que eu percebesse que você gostou dele, não é?

— Minha senhora, é o seguinte: desde que cheguei, não tive segundas,

terceiras nem quartas intenções com o sr. Victor. Como a senhora sabe, ele é pai

da minha melhor amiga, eu respeito isso.

Safira mentirosa. Mas o que a pessoa não é capaz de fazer para encontrar a

paz.

— Talvez a senhora tenha uma visão distorcida da minha pessoa —

continuo —, não precisa me ver como um perigo ou algo do tipo. Vocês formam

um belo casal, e estou na casa do seu namorado há poucos dias, somos estranhos

um para o outro, a única pessoa que tenho vínculo é Vitória, e prendendo manter

assim. — Empino o nariz, dando a ela uma resposta à altura.

— Você não será a primeira e nem a última amiga da minha querida

enteada que come meu namorado com os olhos e deseja ir para a cama dele. Mas

vou dar corda para você até vê-la se enforcar. Acredite, isso não vai demorar

muito para acontecer. — Ela se levanta, vai até a prateleira e pega um dos
quadros. — Victor Guterres está muito bem comprometido comigo.

Se ela realmente acha isso, não entendo seu ataque de ódio e nem vejo o

motivo dessa conversa.

— Minha senhora, não vou levar em conta as suas palavras, pois vejo que

está descontrolada, tamanho é o seu ciúme sem motivo. Eu vim aqui pelo

emprego, e se não farei entrevista alguma é só dizer que saio agora mesmo. Não

tenho interesse no seu relacionamento, não estou nem aí para o sr. Victor. A

única coisa que me importa é o emprego no estabelecimento, mas se não me

empregará me dispense logo, meu tempo vale muito, tenho uma criança para

cuidar. — Despejo em um só fôlego.

— Nem deveria ter colocado seus pés aqui, meu bem — ela gargalha —,

você não é qualificada nem para o cargo mais baixo do restaurante — declara.

Fecho os punhos, imaginando como seria bom segurar a vadia pelos

cabelos loiros de farmácia e dar na sua cara para que aprenda a tratar melhor as

pessoas.

— O.k., obrigada pela atenção. Passar bem. — Pego meu currículo e o

coloco na bolsa.
— Quando sair feche a porta, querida — pede, seca.

Eu não respondo, apenas me viro de costas e sigo até a porta.

Vaca louca!

Vitória está certa, essa mulher é o demônio, não vale nada.

— Alessandra? — chamo-a quando coloco a mão na maçaneta da porta e

me viro para ela.

— Diga, garota.

— Não esquece de limpar o canto da boca. — Ela me olha confusa,

irritada, enquanto dou meu melhor sorriso. — O veneno está escorrendo. —

Abro a porta com tudo e saio, pelo menos tento, porque me choco contra uma

parede musculosa.

Levanto os olhos e me deparo com os olhos azuis intensos de Victor. Não

sei se é um ato automático ou proposital, mas suas mãos vão rapidamente para a

minha cintura, me segurando com tanta força que parece que vai me partir ao

meio.

— Safira, o que faz aqui? — pergunta.


Rapidamente afasto as mãos dele da minha cintura, como se tivesse

alguma doença contagiosa. Mas não, seu toque é quente e me queima, me

provoca, causa sensações estranhas no meu corpo.

— Amor, não sabia que vinha para cá. — A voz da mulher é cínica, mansa,

nem parece a cobra de minutos atrás.

Tento me afastar mais do homem, mas ele não me dá espaço para sair do

ninho de cobra, digo, da sala da namorada possessiva dele, que vem em nossa

direção como uma naja querendo dar o bote.

— Com licença, sr. Guterres, estou de saída — peço, quase sussurrando,

sem paciência para aturar mais uma das indiretas de Alessandra, que é uma

ótima atriz, aliás.

— Já resolveram a contratação? — pergunta ele.

Eu não respondo, deixo que a toda poderosa fale. Desvio meus olhos do

casal e encaro a parede de cor bege.

— Safira infelizmente não se encaixa no perfil do restaurante — fala a

venenosa, e eu reviro os olhos.


— E por que ela não se encaixa no perfil do meu restaurante? O que ela

tem que a difere dos outros? É tão especial assim? — O tom dele é sério,

exigente.

Espera... Meu restaurante? Mas o restaurante não é da Alessandra?

— Querido, ela tem um filho pequeno para criar. Quem vai cuidar dele? O

pequeno Miguel parece ser tão dependente dela, tadinho...

Furiosa, passo pelo casal, mas paro quando uma mão se fecha ao redor do

meu braço.

— Você está contratada. Apareça amanhã em horário comercial para

receber as instruções e o uniforme — fala Victor, me deixando boquiaberta e a

namorada furiosa.

— Amor, você vai passar por cima da minha ordem na frente dessa

menina? — chia Alessandra, inconformada.

— Pode ir, Safira, sua entrevista acaba aqui — diz ele, soltando meu

braço.

Respiro aliviada e saio correndo sem nem mesmo agradecer. Atravesso o


salão do restaurante e chego à calçada, com as pernas trêmulas, e envio uma

mensagem para Vitória avisando que em breve estarei na casa dela.


VICTOR

— Ela não tem o perfil para trabalhar aqui, Victor! — exclama Alessandra,

andando de um lado ao outro com a mão na cintura, aparentemente furiosa por

eu ter passado por cima da ordem dela.

— Não vou discutir com você por bobagem. Já tomei a minha decisão, a

menina fica. — Tranco a porta alguns minutos depois de Safira sair. Agora estou

ouvindo os berros da minha namorada.

Eu estava conversando com um fornecedor pelo celular e ia entrando na


sala de Alessandra, quando Caio, um funcionário de muitos anos do restaurante,

me avisou que a minha namorada estava na sala com uma moça. Logo me

lembrei que a minha filha havia pedido que contratasse a amiga no Bella Flor,

antes de eu ter uma pequena discussão com Safira. Prometi a Vitória que

empregaria a garota. Agora vejo que foi uma péssima ideia ter deixado

Alessandra entrevistá-la no meu lugar, assim que entrei na sala notei que havia

uma tensão entre elas.

— Tenho anos comandando o Bella Flor e você nunca tomou a frente na

contratação de funcionários. Agora quer decidir quem contrato ou não? —

pergunta, com um tom ácido.

— Sim, Alessandra! Safira irá trabalhar aqui e ponto final. A última

palavra sempre será a minha, sendo assim, decidi que a amiga da minha filha

será funcionária do meu estabelecimento. — Minha voz sai dura.

Porra, em poucas semanas a garota conseguiu virar a minha vida de

cabeça para baixo.

— Vai brigar comigo por causa daquela... — A voz de Alessandra falha.

— Você está brigando sozinha, querida — digo, aumentando a sua fúria.


Os olhos da mulher me fuzilam e eu fico irado com seu comportamento

infantil. Se ela está assim sem saber o que houve entre mim e Safira, imagina

quando souber.

— Me dê um bom motivo para você estar defendendo-a, um bom motivo

para empregar uma pessoa que chegou há poucos dias na sua casa e ainda tem

uma criança pequena para cuidar. — Minha namorada se aproxima e eu recuo,

chateado.

— Safira tem um filho para criar e ela está sem emprego, não tem uma

casa, precisa pagar as contas. É um bom motivo para você? — respondo, sem

paciência.

— Amor, faça o que achar que é certo — diz, por fim, parecendo mais

calma. — Sei que Vitória adora a amiga, e você não negaria um pedido da sua

única filha, certo? — Minha namorada sorri, mas eu não retribuo.

— Exatamente. Minha filha sempre será prioridade na minha vida, e um

pedido dela eu não nego — afirmo e dou as costas para Alessandra, que tenta me

tocar, mas eu me esquivo. — Estou de saída. Consegui resolver o problema com

o fornecedor, amanhã ele virá conversar para que possam resolver a questão do
pagamento e trará também a mercadoria.

Não espero a resposta dela, saio da sala pisando duro. Até a ouço me

chamar, mas finjo não ter ouvido nada.

Merda. Em poucos minutos consegui perder a paciência e ganhei uma puta

dor de cabeça.

Meu amigo tem razão, faço todas as vontades de Vitória. Estraguei a

minha filha e agora tenho que arcar com as consequências, mas dessa vez não foi

por Vitória, foi porque eu quis.

Ela não sabia que nem mesmo precisava pedir um emprego para a Safira,

porque... caralho, eu ia me oferecer para ajudá-la. Sim, eu a ajudaria não por ter

sentimentos por ela, longe disso, não temos química, não rola nada, foi só uma

noite juntos, e não significou muito.

Só a estou ajudando porque ainda tenho minhas dúvidas quanto a

paternidade daquela criança. Talvez Miguel seja consequência da noite que eu

estava tentando esquecer que fazia três anos que a traidora da minha esposa tinha

morrido. Depois de uma reunião supercansativa, eu estava disposto a beber até

tirar as merdas das lembranças da falecida da cabeça, e foi aí que conheci a bela
garçonete, a Beatriz, linda, educada, atenciosa e de olhos encantadores.

Neste momento o destino deve estar rindo da minha cara por ter

conseguido foder com todos os meus princípios em tão poucos dias. Quando

tudo parece ser simples, prestes a se encaixar, Safira aparece na minha frente e

faz tudo descer ladeira abaixo.

Pela primeira vez na vida, eu, Victor Guterres, não sei o que fazer.

**

SAFIRA

Depois de alguns minutos caminhando, finalmente chego e toco a

campainha, sendo recebida por dona Joana, que é a cozinheira da casa. Ela é

uma senhora muito educada e atenciosa, passa a maior parte do tempo

preparando coisas gostosas para a família.

— Olá — cumprimento-a com um sorriso e ela retribui.

— Olá, filha — diz, me dando passagem para entrar.

— A senhora sabe onde a Vitória e meu pequeno estão? — indago,

curiosa.
— A menina está na piscina com seu príncipe. — Dona Joana pisca para

mim e o meu sorriso aumenta.

— Certo, vou vê-los. Obrigada e com licença — agradeço, passando por

ela.

Sigo para área externa da casa e me deparo com uma cena linda — minha

amiga de biquíni sentada em uma das espreguiçadeiras à sombra, com meu filho

usando uma sunguinha do Nemo entre as pernas dela, enquanto ela passa

protetor solar nele. O garotinho parece amar o que a madrinha está fazendo,

porque ele está gargalhando.

Me aproximo deles, mas minha amiga não percebe minha presença. Ela

beija o topo da cabeça de Miguel, que ri mais ainda.

— Iti, que menino assanhado! — diz Vitória, voltando a passar o protetor

solar nele.

— Você será uma ótima mãe, amiga — falo, atraindo a atenção das duas

melhores pessoas da minha vida.

Miguel fica agitado quando me vê, seus olhinhos brilham e eu sorrio para
ele.

— Que susto, Safira. Só daqui muitos anos, meu pai me mataria se

engravidasse agora. Nem terminei a faculdade e não sou independente —

exclama ela, de olhos arregalados, mas sorri em seguida.

E eu que nem comecei a faculdade, engravidei de um cliente do local que

eu trabalhava e fui demitida pouco depois de saberem da minha gravidez.

— Eu o ajudaria te matar — brinco, me aproximando deles. — Termine a

sua faculdade, se torne independente, curta a vida, se case e depois pense em

filhos. Amo meu filho, mas engravidar cedo é bem complicado, amiga, não é

fácil ser mãe. É gostoso? É. Mas também é muito difícil, ainda mais quando se é

mãe solo. — Estendo os braços para Miguel e ele vem para mim, então beijo sua

bochecha e depois a curva gordinha do seu pescoço.

— Está certa — fala, se ajeitando na espreguiçadeira. — E como foi na

entrevista? Pela sua cara acho que algo deu errado. — Vitória fica sem graça.

— Por que não me disse que Alessandra é a dona... gerente, sei lá o que do

restaurante? — Me sento na espreguiçadeira ao lado da dela e coloco Miguel em

meu colo.
— O quê? Aquela mulher não é dona do Bella Flor, ela só é a gerente,

mas... O que isso tem a ver? — Minha amiga está com os olhos semicerrados.

— Quando cheguei para a entrevista, fiquei um bom tempo esperando ser

atendida, e quando fui me deparei com a sua... a namorada do seu pai. Ela me

chamou para uma sala e me disse muitas coisas, me humilhou, e no final me

dispensou falando que eu não estava qualificada para trabalhar no restaurante

dela — falo em um só fôlego, deixando Vitória vermelha de raiva. Imagina se eu

desse os detalhes da conversa? Minha amiga mataria a namorada do pai.

— Mas era meu pai que ia te entrevistar, eu pedi a ele para te dar uma

força. O que aquela vagabunda queria se metendo onde não devia? — Ela rosna,

raivosa, e eu desvio meus olhos para a piscina.

Imaginei que a minha amiga não pediria favor a Alessandra, ela nem

mesmo gosta daquela bruxa. Tenho certeza de que seria incapaz de pedir à

venenosa para me dar um emprego, mas a mulher falou com tanta segurança que

eu acreditei em suas palavras. Por outro lado, acho que teria sido pior ficar frente

a frente com Victor em uma entrevista, ainda mais depois de termos nos

desentendido quando ele foi falar comigo. Enfim, tudo de ruim que tinha para
acontecer, aconteceu.

— Nem imagino. Só sei que seu pai chegou na hora que eu estava saindo e

deixou claro para Alessandra que amanhã começo a trabalhar, porque estou

contratada — digo, não a surpreendendo.

— Caramba, amiga, desculpa. Não sabia que aquela mulher ia ser capaz de

te humilhar, normalmente ela é uma sonsa com as pessoas que convivem com

meu pai. Só não lhe disse que era no restaurante do meu pai, porque achei que

você poderia não aceitar. Mas não vi problema em te dar essa força, porque

somos melhores amigas, somos como irmãs. — Ela estende a mão e eu a pego.

— Não se preocupe, você só quis ajudar, como sempre. E eu te agradeço

imensamente por ter esse coração enorme. — Dou um sorriso para ela.

— Fazemos de tudo por quem amamos, não é?

— Sim. — Assinto e olho para o meu filho que nos encara atento, tão

inocente. — Vitória, não fala nada para o seu pai sobre a namorada dele, só

agradeça a ele por mim. Mas não vou aceitar o emprego, não quero trabalhar ao

lado de uma pessoa mau caráter, eu não suportaria olhar todos os dias para a cara

daquela cobra, que com toda certeza faria questão de me infernizar. Amanhã vou
distribuir alguns currículos, e se não for pedir demais... Você pode tomar conta

do seu afilhado até que eu volte?

— Safira, o que você decidir terá o meu apoio. E está certa, ter que

trabalhar ao lado de Alessandra é pedir para morrer, não sei por que achei que

poderia dar certo. E tranquilize esse coração, meu afilhado estará em boas mãos

amanhã — fala minha amiga, e nós duas damos risada.

— Obrigada, meu anjo — agradeço-a, sorridente.

— Vamos entrar um pouco na piscina? — convida ao se levantar.

Eu recuso e me levanto em seguida, com Miguel nos meus braços.

— Não, obrigada pelo convite. Vou dar um pouco de atenção ao Miguel —

falo. — Curta o sol e tome seu banho de piscina, vamos deixar para outro dia,

pode ser? Agora tenho uma pequena responsabilidade em minhas mãos. — Faço

cócegas em meu filho, que gargalha gostoso.

Sigo para dentro de casa com Miguel e deixo Vitória para trás, que pula na

piscina logo em seguida.


SAFIRA

Saí de casa às sete, deixando Miguel dormindo no quarto da Vitória.

Agradeci aos céus por não ter encontrado Victor ontem no jantar. Soube pela

minha amiga que o pai dela tinha ido dormir na casa da Alessandra, fiquei

aliviada por não ter que encarar o homem. Saí tão cedo, nem sei se ele voltou ou

não para casa, mas isso não é problema meu.

Preciso encontrar um emprego rápido, logo o leite, as fraldas e remédios

do meu filho acabam, e eu não posso pedir mais nada para a Vitória. Sei que ela

não mediria esforços para me ajudar, mas o que ela fez e faz por mim já é muito.
Não quero abusar. Então preciso trabalhar em qualquer lugar, fazendo qualquer

coisa, só preciso ter dinheiro para pagar minhas contas.

Estou na rua há horas, passei em dois restaurantes e disseram que não

estavam contratando no momento, mas que eu poderia deixar meu currículo, só

que eu sei que nem mesmo vão passar os olhos por ele. Passei também em uma

cafeteria e não consegui nada novamente.

Esgotada, entro em uma loja de roupas e as funcionárias parecem não ter

ido com a minha cara, já deixam isso claro quando me olham dos pés à cabeça.

Elas dizem que não estão contratando forasteiros, então me dou conta que este

será mais um problema para conseguir um emprego aqui.

Por último, tento em uma lanchonete chamada Imperium. Pelo menos

alguém teve a decência de olhar o meu currículo antes de dar um pé na minha

bunda.

“Você não tem muita experiência, só trabalhou em um bar como garçonete

e em uma loja de roupas. Mas se surgir alguma vaga ligaremos.” Essas são as

palavras do dono de uma lanchonete superchique. Mesmo dizendo que estou

disposta a ocupar qualquer cargo, nem que seja para limpar os banheiros, o
homem não me contrata. Não insisto, já estou exausta e com vontade de chorar

por ter levado vários nãos em um só dia.

Volto para casa da minha amiga, chorando e soluçando. Quando toco a

campainha, limpo minhas lágrimas e respiro fundo, não quero que me vejam

chorando. Apesar de enxugar as malditas lágrimas do meu rosto, meus olhos

vermelhos me entregarão que andei chorando, sem contar que a ponta do meu

nariz fica tão vermelho quanto.

Solto o ar pela boca, toco mais uma vez a campainha e espero que alguém

abra a porta. Tiro meu celular da bolsa e vejo que já são seis e quinze da tarde.

Miguel deve estar sentindo a minha falta, e a minha amiga com certeza está

atrasada para se aprontar para a faculdade.

Droga!

Andei tanto hoje que nem sinto minhas pernas direito, aliás, sinto-as sim...

latejando. Parece que passaram um trator em cima delas. Meus dedos doem nas

sapatilhas, aposto que quando eu as tirar vou encontrar algumas bolhas.

Quando vou tocar mais uma vez a campainha, a dona Joana aparece, toda

sorridente, mas não consigo retribuir seu sorriso, apenas desejo boa-noite e
abaixo a cabeça antes de entrar na casa.

Amanhã é outro dia.

Amanhã talvez alguém me ligue.

Nada está perdido.

Caminho a passos largos até a sala e quase caio quando me deparo com

uma cena assustadora. Para quem não sabe de nada, é algo normal, fofo, mas

para mim é terrível, perigoso. Victor está com o nosso filho no colo, sorrindo

para ele, seus olhos brilham.

— Me dê agora o meu filho — rosno. Com as mãos trêmulas, pego Miguel

do colo de Victor, que arqueia a sobrancelha. — O que pretende com meu filho?

Quem o autorizou a pegá-lo? — Olho ao redor e percebo que estamos sozinhos.

Quando vi Miguel no colo dele, nem me preocupei que Joana poderia estar por

perto. Respiro aliviada quando noto que ela já havia ido para a cozinha.

Será que ele descobriu que eu menti? Não, claro que não, só eu sei do meu

segredo, não tem como Victor saber de nada.

— Por que esse espanto, Safira? — O homem tem os olhos semicerrados.


Com a pulsação acelerada, abraço meu filho com tanta força que ele

choraminga. Arregalo os olhos quando Miguel se joga para os braços do pai, que

sorri para a criança.

Meu Deus!

Respire, Safira.

Não surte.

Não surte.

— Me diga quem deixou você pegar o meu filho! — exclamo, furiosa.

— Ouvi vocês mesmo antes de descer as escadas! — Gelo ao ouvir Vitória

falar. — O que está acontecendo aqui?

Olho na direção da escada e minha amiga nos observa sem entender nada.

Provavelmente estou pálida e perto de ter um treco, enquanto o cretino está

tão tranquilo, parece que nada aconteceu. Victor tem o corpo relaxado no sofá e

um sorriso imbecil nos seus lindos lábios.

— Oi, filha. A sua amiga não gostou de me ver com o filho dela, logo eu,

que sou ótimo em cuidar de crianças. — O miserável está com os olhos fixos em
mim, me provocando descaradamente mesmo sob o olhar da minha amiga, que

parece não perceber quando se aproxima de nós.

— Céus, Safira, se acalme. Só deixei o pequeno com meu pai para buscar

uma fralda. Relaxa, estou sentindo sua tensão daqui. Meu pai não é nenhum

marinheiro de primeira viagem. — Ela ri.

Vitória nem imagina o quanto estou nervosa, amedrontada. Não posso

deixá-la desconfiada, se eu me negar a deixar Miguel com Victor posso colocar

tudo a perder.

— É coisa de mãe, amiga, só isso — falo, sorrindo para disfarçar.

Aproveito que Miguel está se jogando para Victor para o deixar pegar a

criança, que logo cai na gargalhada quando recebe cócegas na barriga.

Minha expressão fecha imediatamente.

É ciúme?

Medo?

Não sei!

— Droga, peguei a fralda errada. Já volto, e se comportem! — fala Vitória


antes de subir a escada.

— Se o filho não é meu, como você diz, não precisa temer nada, Safira. —

A voz dele soa arrogante. Olho rapidamente para a escada para ter certeza de que

Vitória não está por perto. — Sua mãe é muito nervosinha, garotão! — Ele

aperta de leve as bochechas do filho, que acha graça.

Esse cara é louco, não tem medo de sermos descobertos.

— Não tenho nada a temer mesmo. Só agi assim porque ele não te

conhece, poderia ficar assustado. — Quase gaguejo, mas Miguel não colabora,

porque gargalha alto quando o pai simula uma mordida no bracinho dele.

— Veja só, até ele reconhece que sou maravilhoso, sendo assim, qual o

motivo desse seu desespero? Estou certo, né? Você está mentindo para mim —

me confronta, mas eu nego balançando a cabeça.

— Mentindo sobre o quê? — pergunta Vitória, aparecendo de repente.

Estou tão atordoada, que nem percebi a chegada dela.

— Safira só pode estar mentindo a idade do filho. Ele é grande demais

para um ano e pouco, parece ter uns dois anos — diz Victor, nos acobertando.
Agradeço-o mentalmente por isso.

— Talvez tenha puxado ao pai — fala Vitória, se aproximando e tirando o

irmão do colo do pai. Sinto meu estômago revirar. — Amiga, vou trocar o

Miguel lá no meu quarto. Você deve estar exausta, vá tomar um banho,

descansar, mais tarde eu o levo para você.

— O.k. Vou só pegar alguma coisa para comer depois do banho — minto,

nervosa.

— Vou trocar o meu gatinho. — Vitória sobe novamente, me deixando

sozinha com Victor, que se levanta e me segura pelos braços.

— Você pode enganar a minha filha, que não sabe sobre nós, mas a mim

você não engana. Eu quero a verdade. Agora, Safira — rosna, perto do meu

rosto.

— Não sei do que você está falando, sr. Guterres. Preciso tomar um banho,

estou suada e cansada... Tenho que dar atenção ao meu filho, que não vi o dia

todo. Ele precisa de mim — falo, mas sou ignorada.

O homem me agarra pela cintura e me arrasta para um corredor enquanto


tento me soltar, mas é claro que não consigo, ele deve ser dez vezes mais forte

que eu.

Victor Guterres é um desgraçado!


VICTOR

Arrasto Safira até meu escritório, mesmo contra a vontade dela, enquanto

demonstra o quanto está indignada com a minha atitude.

— Está louco?! — pergunta, raivosa, mas ignoro seus berros.

— Saiba que existe teste de DNA, e se eu quiser posso descobrir se Miguel

é meu ou não — digo, deixando-a calada.

Em um movimento rápido, passo a chave na fechadura e a guardo no meu

bolso para que ela não tente sair.


— Por que fez isso, seu... seu... — Safira tenta falar, mas está se sentindo

tão encurralada, que não consegue dizer o que quer.

— Posso pontuar todos os motivos. Quero a verdade agora! Ninguém aqui

é criança, Safira. Preciso saber se sou o pai — falo, apontando o dedo para ela,

que semicerra os olhos.

Em passos lentos me aproximo dela e a pressiono contra a parede,

deixando-a de olhos arregalados. Levo uma mão a sua cintura enquanto a outra

vai ao seu braço.

— Não, Victor. Chega dessa merda toda! Eu já disse que meu filho é de

um ex — diz, desviando os olhos dos meus. Ela nem consegue sustentar o olhar

por muito tempo.

— Você pensou muito em mim? — Aproximo a boca da sua orelha e

pergunto baixinho. Ela prende a respiração e balança a cabeça negando. — Essa

pose de durona é por ter medo de admitir que não conseguia me tirar da sua

cabeça? — continuo falando enquanto deslizo meus dedos em seu braço,

deixando-a com seus pelos arrepiados.

— Já falamos sobre isso, esqueceu? Pare de ser idiota e me deixe em paz.


Daqui a pouco a sua amada aparece e sobra para mim. — Safira tenta me afastar

empurrando o meu ombro, mas falha miseravelmente.

— Não tente mudar o foco da nossa conversa. — Me afasto dela

propositalmente e a vejo inspirar com força.

— Só me deixe em paz, Victor. Estou cansada, fiquei o dia todo

caminhando à procura de um emprego, e agora preciso tomar um banho e pegar

o meu filho. Vitória tem sido um anjo em minha vida, mas ela tem uma vida

também, preciso deixá-la descansar. — Encaro seus olhos claros que estão

flamejantes.

— Já que não quer me dizer a verdade, amanhã iremos à clínica fazer o

exame. — Disparo, deixando-a de olhos arregalados e com a pele mais branca

que o normal. Cada vez tenho mais certeza das minhas suspeitas. Miguel é meu

também.

— Você não tem esse direito. O que quer com isso? Quer que Vitória e sua

namorada saibam que transamos loucamente no dia em que nos conhecemos em

um bar, onde você estava enchendo a cara para ver se esquecia que sua esposa

falecida era infiel? É isso que quer? Ou quer terminar de ferrar com a minha
vida? A esposa falecida é a mãe da minha melhor amiga, e ela a venera até hoje,

acha que a mãe era uma santa! Você acha que Vitória irá te perdoar e me perdoar,

Victor? Você quer jogar tudo para o alto por uma desconfiança sem fundamento

algum? Eu já falei que o Miguel é filho de um ex. Quer estragar o

relacionamento que você tem com a sua filha e ainda ganhar de brinde uma briga

feia com a sua namorada? — Safira faz pergunta atrás de pergunta. Seus olhos

estão lacrimejados, está quase chorando.

— Não estou nem aí! — Volto a me aproximar dela, que encolhe o corpo.

— Maldito destino que me trouxe até você. Se eu pudesse voltar no tempo

não teria vindo para cá, minha vida aqui está pior do que em São Paulo —

afirma, soluçando.

— Do que você tem medo, Safira? De me confirmar o que eu já sei, é isso?

— Toco em seu rosto e ela recua, batendo as costas na parede.

— Acha que o fato de eu nem saber que você era pai da Vitória na época

vai me ajudar em alguma coisa com ela? — pergunta, soluçando. Limpo as

lágrimas que descem por sua bochecha. — Sou muito grata a ela. Durante todo

esse tempo foi ela quem me ajudou, que esteve ao meu lado. Você acha que eu o
deixarei acabar com a nossa amizade dessa maneira? Você é o pai dela! Podem

brigar hoje, mas amanhã ou depois voltam a fazer as pazes! — Ela ergue os

olhos avermelhados e me encara extremamente magoada.

Talvez Safira não conheça muito bem a minha filha. Vitória venera tanto a

mãe, que se souber que transei com outra mulher no dia em que completou três

anos da morte de Aline, ela irá virar as costas para mim também.

— Acho que não conhece Vitória o suficiente para saber que ela é capaz de

me odiar também, mesmo eu sendo o pai dela. Safira, o Miguel é meu filho

também, e Vitória precisa aceitar isso. O futuro de uma criança inocente está em

jogo, e eu quero e preciso ajudar a criá-lo, auxiliá-la financeiramente.

Ela ouve minhas palavras em silêncio, sem se exaltar, parece até mesmo

ponderar as minhas palavras. Agradeço mentalmente por isso.

— O que você quer de mim? Seja sincero, estou disposta a ouvir sem te

julgar — diz com seriedade. — Há poucos dias me ofereceu dinheiro para sumir

da sua vida e da minha amiga, e agora está querendo assumir uma criança que

nem é sua? Por acaso você tem algum fetiche em ser corno? — Safira sorri dessa

vez, me fazendo rir da sua ousadia.


— Eu só quero o que é meu por direito, porra! — Cerro a mandíbula.

— E o que é seu por direito, Victor? — questiona, descendo os olhos até

meus lábios.

— Você sabe o que é meu, Safira. — Aproximo meu rosto do seu,

deixando nossas bocas próximas, mas não o suficiente para que nossos lábios se

toquem.

Pego uma mecha do seu cabelo que cai em seu rosto e coloco atrás da sua

orelha, logo noto que sua respiração fica irregular.

— Não, eu não sei. — Sua voz sai levemente rouca, então aproveito e roço

meus lábios nos dela.

— Vou tirar essa história a limpo, tenho direito saber se Miguel é meu

filho ou não. E não será você que vai me impedir de descobrir a verdade —

sussurro contra sua boca e depois a beijo.

De início ela resiste ao esmurrar meu peito, mas logo corresponde. Deslizo

a língua em seus lábios para pedir passagem segundos antes de ela me beijar

com ferocidade, e, claro, aceito a sua investida. Safira leva uma mão ao meu
cabelo e puxa de leve, gemo contra sua boca ao gostar da sua ousadia.

Nosso beijo começa a esquentar, então afasto nossos lábios e pressiono seu

corpo contra a parede, desço uma mão até o seu jeans e abro o botão, puxando o

zíper para baixo em seguida. Desprevenida, a loira arregala os olhos e me para.

— Victor... o que... vai fazer... Está louco? — Gagueja, semicerrando os

olhos carregados de luxúria.

— Shhh. Já ouviu falar que proibido é mais gostoso? — Não espero uma

resposta, beijo sua boca novamente.

Safira suspira e corresponde o beijo sem demora, agarrando o meu

pescoço, e passando as unhas levemente em minha pele que está queimando

como fogo.

Proibido é mais gostoso o caralho, Victor! Fuja enquanto ainda há tempo.

O que você está fazendo, cara? Essa garota está te enlouquecendo, você é

comprometido, caralho.

Muitas coisas vêm a minha cabeça, mas nem mesmo com meu

subconsciente me alertando consigo me afastar de Safira neste momento. E vê-la


tão entregue a mim depois de ter me desafiado me deixa excitado, de pau duro,

salivando para poder tocar em cada parte do seu fodido corpo delicioso.

Pego Safira no colo e a ponho sentada na minha mesa. Sob os olhos

quentes da garota, desço o jeans dela até as coxas e puxo sua calcinha para

baixo, em seguida inclino meu corpo contra o seu e beijo seus lábios

entreabertos. Safira geme surpresa quando afasto um pouco suas pernas e enfio

os dedos em sua boceta lisinha que está molhada para mim.

— É... errado... ahh, Victor — diz, entre gemidos com sua voz rouca,

quase em súplica.

Rio da minha desgraça. Sei o quanto estou ferrado por saber que ela tem

razão, e mesmo assim continuo deixando o desejo falar mais alto.

— Há quanto tempo você não goza e dá essa boceta? — pergunto baixinho

ao levar a minha boca ao seu ouvido. Movimento meus dedos em seu clitóris

lentamente e depois intensifico, roubando gemidos dela. — Shhh, não responda,

só goze para mim. — Roço o nariz em seu pescoço, cheirando sua pele

perfumada antes de beijar e morder, sem parar de estimular seu clitóris.

Fascinado pelos seus gemidos tímidos, levo a mão a sua blusa e com a
ajuda dela tiro a peça, em seguida faço o mesmo com o sutiã preto de renda.

Salivando, fixos meus olhos nos mamilos rosados e levo a boca ao seio

direito, abocanhando-o sem dó. Safira geme, rebola e se esfrega nos meus dedos,

me levando a acreditar que há muito tempo não é tocada por um homem. O seu

desespero para gozar na minha mão me excita pra caralho.

Se ela está assim só com o toque dos meus dedos, imagino como ficaria

com meu pau invadindo com força a sua boceta molhada e quente.

Depois de um tempo mamando no seio de Safira, beijo sua boca e ela

morde meus lábios com força, então faço o mesmo ao sentir seu canal começar a

ficar estreito, apertando meus dedos. A diaba está quase alcançando seu deleite.

— Ahh... e... eu.. aiii... — Safira goza, estremecendo.

Sorrio satisfeito ao vê-la se desmanchar em meus braços.

— Consegui te deixar menos estressada? — indago, passando os braços

em sua cintura enquanto a garota ri baixinho.

— Não devíamos ter feito isso... é errado. Você é comprometido —

sussurra, ficando ereta ao sentir meu toque em suas costas nuas.


— Eu sei que é, mas... — Quando começo a falar alguém bate à porta.

— Amor, você está aí? Ainda está chateado comigo? — pergunta

Alessandra, dando batidas à porta.

Safira e eu nos afastamos rapidamente. Pálida, a amiga da minha filha me

encara enquanto arruma sua calcinha e depois sobe a calça, então corre para

colocar o sutiã e a blusa de volta. Fico sem ação, andando de um lado para o

outro. Nervoso, passo a mão na barba por fazer e olho para a porta, onde minha

namorada bate desesperada, esperando que eu a abra.

Estou muito fodido.

Victor Guterres, você está lascado demais.


ALESSANDRA

Nós, mulheres, quando sentimos que o nosso relacionamento está correndo

perigo por causa de uma qualquer temos que ficar alerta e lutar com todas as

forças para impedir que a rival fique com o nosso homem. E é isso que tenho

feito esses dias. Venho lutando com todas as minhas forças para deixar aquela

garota longe do meu namorado, que em breve será meu marido. Tenho certeza de

que Victor irá colocar uma aliança em meu dedo, ele só precisa de um

empurrãozinho.

Há alguns dias, quando Victor me comunicou que Vitória traria uma amiga
e uma criança para viver com eles por alguns dias, fiquei com raiva daquela filha

mimada dele, porém não demonstrei, apenas disse que não queria me envolver

na decisão deles.

Vitória não gosta de mim e eu tampouco dela, mas para que meu

relacionamento dure com seu pai maravilhoso, gostoso e rico, tenho que aturá-la,

fingir ser quem não sou para conseguir o que quero. Ele a mima, e mesmo

odiando tenho que sorrir, concordar e ser a melhor madrasta aos olhos do meu

namorado e aos da pirralha, que não escondem sua antipatia por mim. Tento dar

o meu melhor e sempre a supero, enquanto me trata mal, me ignora, eu ganho

pontos com seu pai por ser uma mulher maravilhosa e paciente que atura uma

garota chata e cheia de vontades.

Namoro com Victor há três anos, durante esse tempo tive que viver na

sombra, engolir os desaforos de Vitória para conquistar seu pai e alcançar meus

objetivos. Ainda me lembro como se fosse ontem...

Tínhamos quase que acabado de começar a namorar quando ele me levou a

sua casa e a garota ridícula deu um show. Ela chorou muito quando ele disse que

eu dormiria lá, e no dia seguinte sequer olhou para o pai e ficaram um bom
tempo sem se falar.

Para o relacionamento deles voltarem ao que era antes custou um pouco,

mas eu não me importei com a birra dela, me fiz de boazinha e até chorei

dizendo que não ficaria na casa dele para não magoar a sua filha, uma vez que

ela não aceitava o nosso relacionamento. Victor acabou entendendo a situação e

não me pressionou.

Mas dias depois eu dei o troco, sugeri que ele ficasse na minha casa, e

assim ele o fez por vários dias. E até hoje faço isso — às vezes durmo na casa

dele, outras ele fica na minha —, mas se dependesse de mim já não viveríamos

em casas separadas, estaríamos morando sob o mesmo teto e Vitória bem longe,

em algum buraco sozinha.

No entanto, os dois são muito próximos, e nada que eu faça é suficiente

para separá-los. Já tentei de tudo, mas o idiota ama demais a chatinha e lambe o

chão que ela pisa. Ele faz todas as vontades da filha — se ela pedir para ele se

deitar na estrada para ela passar com o carro por cima, o bobo vai lá e faz.

Eu o amo, Victor é especial para mim, mas sua inépcia com aquela idiota

me tira do sério. Estou com os nervos à flor da pele por ter que suportar Safira e
aquele bebê na minha casa, sim, minha casa, porque em breve irei me mudar

para lá e serei a dona de tudo.

Não vai demorar muito para que eu coloque aquele lugar em ordem, e a

primeira coisa que farei é expulsar aquela abusada da casa do meu homem. Eu

sei o que ela esconde e espero que continue assim, porque se ousar abrir a boca

para confirmar as suspeitas do meu amorzinho, ela irá se arrepender.

Victor não sabe, mas no dia em que ele estava conversando com o Lucas

eu os ouvi falando sobre a vagabunda e o pirralho bastardinho. Quase surtei,

fiquei louca para entrar naquela sala e gritar com ele, exigir que me dissesse por

que me traiu, mas me contive, não ganharia nada me exaltando.

Mamãe me ensinou a agir com frieza em uma situação como essa, e se eu

jogasse tudo para o alto perderia meu trabalho como gerente no restaurante mais

renomado da cidade e o namorado. Victor pode ser uma boa pessoa, mas ele é

um homem sem muita paciência, e fazê-lo se estressar comigo não é meu desejo.

Eu só quero domar aquele homem o suficiente para que vire as costas para a

filha e faça todas as minhas vontades, me mime como a mima, me dê tudo o que

quero sem questionar, não que ele questione por eu gastar seu dinheiro, porém,
sou ambiciosa, quero tudo dele e vou ter assim que me tornar a senhora

Guterres.

Saio do meu carro e sigo em direção ao meu futuro lar a passos lentos,

com um sorriso no rosto, pronta para ser recebida por meu homem. Vim

convidá-lo para dormir na minha casa, preciso fazer as pazes com ele depois da

nossa discussão no restaurante.

Ele está com tanta pena da garota, que agora está dando migalhas para ela.

A pobrezinha está morando de favor na casa dele, e tenho certeza de que foi dar

uma de vítima para a amiguinha para que o pai arrumasse um emprego no

restaurante. Se depender de mim, ela nunca irá trabalhar no Bella Flor e se tiver

coragem de aparecer lá vou colocá-la para lavar as privadas e limpar o chão de

joelhos, só assim ela aprenderá onde é o seu lugar.

No dia da sua entrevista, fiz com que Victor negociasse com o fornecedor

só para que eu tivesse uma brecha para poder colocar a ratinha contra a parede.

Mesmo que não tenha durado muito a humilhação que a fiz passar, eu me senti

satisfeita ao ver seus olhos lacrimejados e assustados, de alguma maneira,

mesmo sem que ela admitisse, consegui intimidá-la com minhas palavras,
mostrei quem manda ali.

— Senhora Alessandra — Joana me cumprimenta ao abrir a porta depois

de eu ter tocado a campainha três vezes. Essa velha é uma lerda, não sei por que

ainda a mantém na casa, deveriam mandá-la para um asilo.

— Onde está o sr. Guterres? — Franzo o nariz ao passar pela

empregadinha, que baixa os olhos envergonhada.

— Seu Victor está no escritório, mas está ocupado — diz, cabisbaixa.

— O.k., pode se retirar. Se precisar de você eu a chamo. — Faço um gesto

com a mão para que ela saia da minha frente, então sigo para o escritório.

— Sim, senhora. Com licença — fala a empregada enquanto caminho pelo

corredor, ignorando-a.

Assim que eu me casar e me tornar dona disso tudo, vou contratar uma

equipe de empregados qualificados. Victor tem muito dinheiro, mas não sabe

usar, só tem uma empregada e não tem motorista particular.

Em breve me mudo para cá de uma vez. Passeio meus olhos pela

decoração brega da casa — rico com espírito de pobre. Aff!


Antes de bater à porta escuto um gemido feminino. Encosto meu ouvido

na madeira e, em seguida, reconheço a voz de Victor perguntando se conseguiu

deixar alguém menos estressada.

Que porra é essa?

Sem entender o que está acontecendo, respiro fundo e conto até três antes

de interromper a diversão dele com quem quer que seja. Nem quero pensar que é

a piranha, porque, no fundo, sei quem é a mulher do outro lado da porta

transando com meu futuro marido.

— Amor, você está aí? — pergunto com doçura, mas com as unhas

cravadas na madeira. Mesmo sentindo raiva, mantenho minha compostura. —

Ainda está chateado comigo? — Faço uma voz dengosa e reviro os olhos.

O filho da puta me ignora e o silêncio me deixa mais nervosa. Desgraçado.

Encosto o rosto na madeira e começo com meu teatro, me forço a chorar.

Quando estou soluçando, abrem a porta e eu tenho a minha confirmação.

Respire fundo. Não surte, Alessandra. Essa garotinha é inexperiente, não

sabe nada da vida. Victor não a trocaria por uma boceta qualquer, uma garota
que nem tem um diploma e ainda é uma pobretona, uma sem-teto.

— Boa noite, Alessandra. — Meu namorado finge tão bem, que se eu não

tivesse ouvido a puta gemer acreditaria que nada tinha acontecido.

— Oi, amor, boa noite... Por que demorou para abrir? — questiono,

passeando meus olhos em Safira, que está com o rosto corado e os olhos

brilhando. Os lábios dela estão inchados e avermelhados, assim como os dele.

A vadia está com cara de que acabou de ser bem fodida, e quando se trata

de comer uma mulher bem, Victor é especialista, é um dos motivos por eu ser

louca por ele, depois do dinheiro, claro.

— Sr. Guterres, com licença. E obrigada pelos conselhos. — A piranha

passa por mim e não me cumprimenta.

Paciência, Alessandra. A hora dessa mosca morta vai chegar e você faz um

estrago com ela.

Fixo meus olhos em Victor e disfarço meu nojo só de imaginar onde a

boca dele esteve.

— Não me avisou que estava vindo — diz, seco.


Sorrio para ele, mas, no fundo, estou louca para meter a mão na cara dele e

pedir que pare de ser um cretino. O desgraçado está comendo a puta debaixo do

meu nariz. Aposto que ela deve ter dado para ele por alguns trocadinhos para

comprar fraldas para o pirralho.

— Querido, liguei para o telefone da casa, mas ninguém me atendeu. —

Me faço de coitada e sua expressão muda. Me aproximo dele e passo os braços

ao redor do seu pescoço, franzindo o nariz disfarçadamente ao sentir nele o

cheiro do perfume barato da cadela.

— Deveria ter tentado no meu celular, é para isso que você tem meu

número na sua agenda — fala e passa os braços ao redor da minha cintura.

Idiota!

— Desculpe, bebê. Vim te chamar para dormir na minha casa. — Passo os

dedos no pescoço dele e vejo leves arranhões, mas me faço de cega ao sentir que

o seu corpo fica tenso com o meu toque. O desgraçado engole em seco,

pensando que vou falar alguma coisa. — Estou com raiva de mim mesma por

termos brigado. Odeio quando você fica bravo comigo por bobagem. — Tento

beijar sua boca, mas ele vira o rosto e acabo beijando sua bochecha.
— Hoje não vai dar, prometi a Vitória que assistiria a um filme com ela

mais tarde. — Não sinto a verdade em suas palavras, mas assinto mesmo assim.

— Você nunca gostou dessas coisas, querido. — Afundo meus dedos em

seu cabelo macio.

— As pessoas mudam, Alessandra. — Ele se afasta de mim rapidamente,

fazendo meu coração vacilar.

Ele está insinuando que está mudando por causa daquela imbecil? Não é

possível que um homem como Victor se encante tão rápido por uma mulher

insignificante como ela.

— O que isso quer dizer, amor? — indago, temerosa.

— Nada, Alessandra, deixa quieto. Você quer ficar para o jantar?

— Já comi, lindo, mas posso te acompanhar. — Passo as mãos nos meus

cabelos, tentando manter o controle e a voz calma. Passo por Victor e me sento

na sua cadeira.

Ele se vira e me encara meio confuso, então dou um sorriso sexy enquanto

começo a desabotoar a minha camisa.


— O que está fazendo? — pergunta, sério.

— O que acha de transarmos gostoso na sua mesa? — Dou uma risada

safada. — Nunca transamos aqui, poderíamos inaugurar. — Desço para o

terceiro botão e Victor nega.

— O jantar já deve estar pronto. Hoje meu dia foi cansativo, preciso de um

banho, querida — mente descaradamente, olhando em meus olhos.

Recusou sexo. Ele nunca me negou nada. E agora está sendo frio e me

rejeitando, sinal de que a ninfeta está o enlaçando com sua carinha songamonga.

Pense em algo rápido. Pense.

Um jantar romântico? Não, acho que não resolveria nossos problemas.

Talvez meus pais? Isso! Família para Victor é algo sagrado, e ele não terá

como recusar um encontro com meus pais.

— Tudo bem, querido, você está certo. — Levanto-me e vou até ele. —

Victor, meus pais chegam em três dias, o que acha de darmos um jantar de boas-

vindas?

— Por mim tudo bem, faça o que achar necessário. — Ele faz uma careta
como se estivesse sentindo dor.

— Está tudo bem, amor? — Passeio meus olhos por seu rosto enquanto ele

assente.

— Sim, só estou com um pouco de dor de cabeça.

— Vamos para o seu quarto, vou te dar um remédio e te fazer uma

massagem depois que você tomar um banho. — Ofereço-me, sorrindo.

Ele não diz não e nem sim, me dando a entender que estou no controle

novamente, eu o venci pelo cansaço. Puxo Victor para fora do escritório,

contente por tê-lo convencido a fazer o jantar para os meus pais.

Decidi que farei o jantar aqui, convidarei alguns amigos e o induzirei a me

pedir em casamento. Estamos juntos há um tempo e tenho certeza de que com

meus pais ao nosso lado, ele não vai deixar de realizar o meu maior sonho — ser

sua esposa. Em breve, a Safira e o bebê dela serão apenas péssimas lembranças

para Victor e Vitória, porque vou descartá-los mais fácil do que imaginei.
SAFIRA

Com as mãos trêmulas, enxugo meu cabelo na toalha enquanto me encaro

no espelho. Acabo de sair do banho e estou morrendo de dor de cabeça, que na

verdade se chama dor na consciência. Eu não deveria ter ido tão longe com

Victor. Por mais que ele seja atraente, experiente e irresistível, eu deveria ter sido

forte, mas não, deixei que o desejo falasse mais alto. Errei ao permitir que ele

que me tocasse intimamente, nem devíamos ter nos beijado, para início de

conversa. Victor é comprometido, e se está com Alessandra é porque a ama.

Termino de enxugar meu cabelo e fico por alguns minutos diante do


espelho me encarando e percebendo o quanto fui fraca. E ainda sou, pois basta

fechar os olhos para que a imagem do seu sorriso lindo ao me ver gozar em seus

dedos tomam a minha mente e o meu corpo começa a vibrar.

Mordo os lábios e reprimo o meu pensamento. Me afasto do espelho e me

jogo na cama, então olho para o teto e fico pensando o que Vitória faria se

soubesse que a criança que ela tanto adora é seu irmãozinho, e que eu e seu pai

nos envolvemos mais uma vez. Talvez ela passe a me odiar e me mande embora

de uma vez da sua vida.

Victor não quis entender o motivo do meu medo em contar a verdade para

ele — essa que ele já sabe, mas que precisa da minha confirmação — e para

minha amiga sobre a paternidade de Miguel. Para ele estou sendo egoísta ao

pensar somente na amizade que tenho com a Vitória, mas não é bem isso. Ela foi

o meu porto seguro durante a minha gravidez e continua sendo, é uma das

pessoas mais importantes que tenho na vida, e sei o quanto ela odeia mentiras.

Quando vi o pai do meu filho na casa dela deveria ter aberto o jogo,

contado tudo a ela, mas depois que ela me disse que deixou de trazer amigas

para a casa pois ficavam de olho em seu pai, eu recuei como uma covarde. Se eu
a perder nem sei o que farei para conseguir o seu perdão, porque Vitória é uma

pessoa muito rancorosa quando quer, e eu não quero magoá-la.

Por outro lado, eu me pego pensando na proposta de Victor em auxiliar na

criação do meu filho, uma criança inocente que está perdendo a oportunidade de

ter um pai por um medo meu de assumir as consequências dos meus atos.

Ouvir a voz da Alessandra do outro lado da porta do escritório de Victor

quase me fez infartar, mas fiquei um pouco aliviada quando Victor abriu e a

namorada entrou, porque, em minha mente louca, a minha amiga estava com ela

e seria o fim da nossa amizade se ela desconfiasse de algo, pois eu não

conseguiria mentir na cara dela, acabaria contando tudo.

Não digo que foi menos assustador ter sido pega por Alessandra, pelo

contrário, fiquei extremamente envergonhada. Onde eu estava com a cabeça para

ter feito aquilo? Pela milésima vez... ele é comprometido e pai da minha melhor

amiga.

Ouço as batidas à minha porta e fico alerta, então levanto-me e começo a

me vestir.

— Já vou! — exclamo.
Assim que abro a porta, me deparo com Vitória com o rosto um pouco

sonolento, e com Miguel dormindo em seus braços como um anjinho.

— O pequeno desmaiou — diz, sussurrando e encarando o irmão.

Esse é um dos motivos do meu filho sempre ter gostado da sua dinda,

nunca ter recusado seu colo. Ela é extremamente amorosa e atenciosa com ele,

posso dizer que chega a ser uma segunda mãe. Miguel é uma criança que não vai

para o colo de qualquer pessoa, mas com Vitória ele fica animado, eles possuem

uma conexão incrível.

— Entre — peço, me afastando um pouco para ela entrar no quarto.

— Nem conversamos direito hoje. Me conta como foi seu dia — pede,

depois de deixar Miguel na cama e se virar para mim.

— Até que não foi tão ruim ganhar vários nãos no mesmo dia — brinco e

ela arregala os olhos. — Acho que vou tomar banho de sal grosso, porque as

coisas parecem que estão piorando para mim.

— Se acalme e não pense assim. Nada está perdido, tenho alguns contatos

e posso te ajudar, basta você querer — diz.


Assinto e cruzo os braços sobre o peito.

— Vou voltar a procurar emprego só semana que vem, estou sendo muito

folgada te usando como babá. Você tem uma vida para viver, a faculdade para

cursar — afirmo e Vitória faz uma careta.

Se ao menos eu tivesse um emprego, contrataria uma babá para cuidar do

meu filho quando eu precisasse sair, assim não tomava muito tempo da minha

amiga. Sei que ela não se importa de cuidar dele, porém, ela tem seus afazeres e

eu não posso jogar a minha responsabilidade nas costas dela.

Se dependesse de mim, levaria Miguel comigo para onde eu fosse, mas eu

não consigo um emprego sem saberem que tenho um filho, imagina se eu

aparecesse para uma entrevista com ele nos braços?

— Eu realmente preciso trabalhar, estou enlouquecendo, não suporto ficar

parada — declaro, frustrada ao olhar para cama onde meu filho dorme.

— Eu já disse que em breve encontraremos algo para você. Agora, relaxe.

— Vitória se aproxima de mim e me abraça.

Impossível relaxar na situação em que me encontro. Não quero parecer


ingrata, mas não fico à vontade morando nesta casa. Todos me tratam muito

bem, mas nada como ter o seu cantinho, ter suas despesas pagas com o seu

dinheiro. Tudo que preciso para sobreviver tenho aqui, só que fico extremamente

envergonhada sabendo que saiu do bolso de Victor, apesar de Vitória dizer que

tudo que é do pai é dela, para não me deixar sem jeito.

— Obrigada — agradeço, ainda abraçada a ela.

— Não me agradeça ainda, vou aceitar seus agradecimentos quando tiver

um emprego e puder me pagar aquele jantar que me prometeu — brinca e eu dou

risada da sua maneira descontraída. — Eu faço de coração, sua boba, você sabe

disso.

— Nunca vou me esquecer desse jantar, assim que receber meu primeiro

salário iremos comemorar. — Afasto-me dela, sorrindo.

— Amanhã vou ligar para um amigo, tenho certeza de que semana que

vem a senhorita será contratada.

— Amiga, quero que seja sincera comigo. — Olho em seus olhos e ela

assente meio confusa.


— Claro, o que é? — indaga, parecendo ansiosa.

— Cuidar do Miguel te atrapalha muito? Sei que já me disse milhares de

vezes que não, mas fico com receio, sabe?

— Nunca atrapalhou. Amo muito o seu filho... Tenho uma ligação

inexplicável com ele. — Seus olhos se viram para a cama e ela sorri gentilmente.

— Não acredito em vidas passadas, mas se isso realmente existe, acho que

Miguel era meu filho, ou meu irmão... sei lá. Eu o amo tanto que nem sei

explicar. É o suficiente para você, dona Safira?

Não, ele não foi seu irmão na vida passada, ele é seu irmão nesta vida

mesmo.

— É mais do que suficiente. — Pisco para ela e passo a mão na garganta

para aliviar o nó que se forma nela.

— Desde que você chegou, não tivemos tempo para ter um papo de

mulherzinha, sabe? Homens, sexo... — fala a última palavra baixo e sorrindo. —

Mas acho que já está tarde, né? Vamos combinar algo amanhã.

— Está um pouco tarde, mas quando quiser falar sobre garotos e outras
coisas é só me procurar — falo, ainda sorrindo.

— Já vou te adiantar, porque estou ansiosa demais... Estou saindo com um

cara, bom... ele é mais velho e, com certeza, meu pai vai surtar quando souber.

Mas o sexo é tão bom que estou me sentindo nas nuvens — diz em um sussurro

enquanto olha para a porta, com medo de ser ouvida.

— E qual o problema o cara ser mais velho? Homens mais velhos são os

melhores para se relacionar, a meu ver. Mas por que seu pai surtaria? É uma

escolha sua e você já é uma mulher adulta. — Dou de ombros e minha amiga

cora.

Fico feliz por ela estar saindo com alguém que a faça sorrir e se sentir

bem.

— O problema não é a idade, e sim a pessoa, amiga. — Ela sorri, travessa.

— Meu pai vai me matar, mas enquanto ele não descobre, vou continuar com a

minha aventura e aproveitar bastante o sexo. — Se abana e eu dou risada.

Nem faço ideia de quem seja o homem que está fazendo Vitória ficar tão

animada, mas não pretendo perguntar o nome do felizardo até que ela queira me

dizer quem é o seu romance proibido.


— O.k., o.k. Viva sua aventura, transe sem moderação, mas use camisinha

— alerto-a, que assente.

— Pode deixar que estou me cuidando. Tomo anticoncepcional e não

deixo de transar sem camisinha. Deus me livre uma gravidez não planejada. —

Vitória arregala os olhos ao notar o que acaba de dizer. — Desculpe, amiga, não

quis dizer...

— Está certíssima, não me ofendeu em nada. Continue com esse

pensamento — aconselho e ela respira aliviada. Estou certa de que ela ficou com

medo de me magoar, mas isso está longe de acontecer.

— É isso. Meu afilhado está entregue e eu vou me deitar também. Amanhã

tenho que acordar cedo para resolver algumas coisas na rua, e à tarde vou à

faculdade. O dia vai passar voando — diz. — Boa noite, Safira, durma bem.

— Você também. Boa noite.

Nos despedimos e ela sai do quarto, em seguida, fecho a porta e me deito

ao lado do meu filho na cama.

As horas passam e eu continuo acordada encarando o teto, com as mãos


apoiadas debaixo da cabeça. Meus pensamentos não me deixam ter uma noite

tranquila de sono. O que aconteceu entre mim e Victor fica se repetindo em

minha mente cada vez que tento fechar os olhos para dormir.

Eu gostei de como me beijou, tocou, me fez gozar e sussurrou em meu

ouvido, e me sinto suja e arrependida, porém, parece que nem tanto, já que não

consigo tirá-lo da minha cabeça.

Como posso ainda me sentir tão atraída por alguém com quem transei há

anos? Acho que estava muito carente e ter sido tocada por alguém... despertou o

meu lado fogoso e a vontade louca de transar.

Meu Deus.

Meu Deus.

Acho que vou enlouquecer.

Fecho os olhos com força e cruzo as pernas ao sentir minha intimidade

ficar úmida quando me lembro da boca de Victor nos meus mamilos —

lambendo, mordendo e beijando — e dos seus dedos brincando com meu clitóris

enquanto eu gemia, ansiando por cada toque dele.


— Victor... — sussurro um gemido baixinho ao sentir meu ventre queimar.

Droga, Safira!

Me repreendo logo em seguida ao me deitar de bruços e fechar os olhos.

Fico por alguns minutos assim até que ouço batidas fracas à porta, fazendo meu

coração acelerar. Que horas são? Uma? Duas? Três da madrugada? Não sei.

Meio assustada, eu me sento e pego o celular na cômoda, então vejo que

são duas e quinze da madrugada. Quem será?

Sigo até a porta e me encosto nela.

— Quem é? — pergunto, baixinho, para não acordar o meu pequeno.

— Sou eu — fala Victor, do outro lado.

Meu estômago revira e meus lábios ficam secos.

Certo. Oh, meu Deus! Não pense muito, Safira, só veja o que ele quer e

depois o mande embora.

Abro a porta e o homem praticamente invade o quarto. Quando olho para

ele, minha respiração fica ofegante. Merda, estou me sentindo uma cadela no cio

só de olhar para Victor, que está usando uma calça pijama de algodão branca
marcando seu pau, e para acabar com a minha sanidade, o homem está sem

camisa e com os cabelos levemente bagunçados.

— Aconteceu alguma coisa? — Finjo bocejar ao tirar meus olhos do seu

corpo e desviar para a janela fechada.

Ele não responde, só fecha a porta e se posiciona atrás de mim, me fazendo

estremecer e meu coração disparar.

— Aposto que não está conseguindo dormir, assim como eu — diz,

encostando a boca na minha orelha e levando as mãos a minha cintura.

— Eu estava dormindo, mas você me acordou — digo, lambendo os lábios

e com o corpo tenso.

— Precisamos conversar. — Coloca a mão na alça da minha camisola e a

desliza pelo meu ombro.

— Uma hora dessas? — Arfo ao sentir os lábios quentes de Victor na

minha pele.

— Uhum — assente, deslizando sua boca em meu pescoço.

— Não seja louco, tem uma criança no quarto. — Tento me esquivar do


seu toque, mas é mais forte do que eu, do que qualquer coisa.

— Não vejo problema algum em nosso filho estar dormindo aqui. — O

som da sua voz sai com tanta certeza, que chega a vibrar em meu ouvido,

causando arrepios pela espinha e me deixando sem ação. — Não se estresse, não

preciso da sua confirmação para saber que aquele menino na cama é meu. Sei

que fui eu que coloquei aquele bebê aqui dentro, e estou disposto a assumi-lo se

me permitir.

Meu sangue esquenta quando ele toca a minha barriga por cima do tecido

da camisola e a acaricia enquanto beija o meu pescoço.

— Eu tenho medo, Victor, você não entende — sussurro, afastando as

mãos dele do meu corpo e permanecendo de costas para ele.

— Medo do quê? Você é adulta, também sou — diz, me virando para ficar

de frente para ele. A minha respiração fica presa na garganta quando Victor toca

em meu rosto e fixa seus olhos nos meus. Seu semblante está sério, determinado.

— Não sei se você sente raiva ou medo, mas se ainda estiver chateada com o que

eu te disse quando descobri que mentiu sobre seu nome, eu peço perdão. E

quanto a ter oferecido a você dinheiro para sumir foi errado, eu sei, mas também
fui um covarde, fiquei apavorado, cheguei a pensar que você estava querendo me

dar um golpe ou fazer com que a minha filha ficasse contra mim — esclarece e

eu sinto sinceridade no que fala.

— O que passou, passou — digo, e realmente penso assim. — Mas a

questão não é essa. Você tem a sua vida, a sua família e tem uma namorada.

Estou me sentindo péssima com o que aconteceu no escritório. Imagina se a

Alessandra e a Vitória descobri...

— Que Miguel é meu filho? — completa, tocando em meus braços.

Assinto, acabando de uma vez por todas com a sua maldita dúvida.

— Só de olhar nos seus olhos consigo perceber que não está disposto a

arriscar tudo por uma criança que nem viu nascer, Victor. A sua vida parece sob

controle, e a essa altura do campeonato você não vai querer jogar tudo para o

alto — desabafo.

Ele estreita seus olhos azuis profundos que brilham de raiva.

— Se parasse de tentar adivinhar as coisas, talvez não estaríamos tendo

essa conversa agora.


— Posso estar equivocada? Sim, mas o que você quer com isso tudo? Do

nada quer assumir meu filho, depois está tentando me beijar, me tocar. — E me

deixar louca. — Não vou transar com você, não quero ser uma diversão

novamente. Você tem ao seu lado uma mulher madura que parece te amar e está

com você faz um bom tempo. Vocês têm uma história juntos, e o que eu tenho

com você?

— Um filho, porra. Não é o suficiente pra você? Não estou te pedindo em

casamento, só quero que me deixe assumir as minhas responsabilidades, quero

poder dar ao meu filho tudo o que ele precisar. — A raiva está estampada em seu

rosto bonito.

— Tudo bem, tudo bem. Se eu concordar com isso iremos resolver da

minha maneira, o.k.?! — falo, séria, sentindo a garganta arder e uma vontade

imensa de chorar.

— O.k. — assente, e passa a mão no cabelo, parecendo frustrado.

— Primeiro de tudo, não quero que me toque, nunca mais, ouviu? — falo,

nervosa e insegura. Não sei se vamos conseguir nos manter longe vivendo sob o

mesmo teto. — Como eu disse, não quero ser a sua diversão. Não temos uma
história de amor, muito menos nos amamos ou estamos apaixonados. Somos

apenas pais de uma criança e precisamos resolver as nossas diferenças para que

tudo dê certo.

Ele limpa a garganta, parecendo incomodado.

— E quem disse que você seria apenas uma diversão? — questiona ao me

dar as costas, me fazendo sentir culpada.

É tudo muito novo para mim. Ele não me ama, eu não o amo, só temos

uma coisa em comum, o nosso filho, nada mais que isso.

— Victor... — começo, no entanto, ele me ignora e sai do quarto, me

deixando com um vazio no coração.

O que é isso que estou sentindo?

Não é amor.

Não tivemos um relacionamento.

Não nos amamos.

Não sentimos nada um pelo outro.

Nem nos conhecemos direito.


Somos como dois estranhos.

Apenas sinto tesão por Victor, ele é gostoso, viril, sexy e muito bonito, tem

uma boa pegada e é bom de cama, só isso. Meus pensamentos fervem e eu sinto

um gosto amargo na boca.


VICTOR

Passaram-se três dias desde aquela conversa com Safira. Depois daquela

noite não nos vimos mais, apesar de estarmos na mesma casa. Parece que ela

estava me evitando e eu não fiquei surpreso, porque também fiz de tudo para não

trombar com ela.

— Você não fez isso, não estou acreditando. — Lucas me olha espantando

assim que termino de contar o que aconteceu entre mim e Safira.

— Sim, eu fiz, meu amigo. E o pior de tudo que não me arrependo. —


Apoio os cotovelos na mesa e passo a mão no rosto.

— Não vou dizer que estou surpreso, porque não estou. Eu sabia que a

qualquer momento você cairia em tentação. Era óbvio que rolaria algo entre

vocês. — Seu olhar é acusador, mas eu dou de ombros.

Se meu amigo está assim, imagina se souber que a Alessandra quase nos

pegou no escritório. Sem contar que depois que Safira saiu, minha namorada

quis transar e eu recusei.

Estamos no meu escritório, aqui temos mais privacidade, já que a casa está

cheia. Alessandra apareceu às seis da manhã com uma equipe para arrumar a

casa para o jantar. Como eu disse que ela tinha total liberdade para organizar o

tal jantar, ela dispensou dona Joana e contratou um buffet.

Já são quase sete da noite e minha casa ainda está cheia de estranhos,

seguindo as ordens da minha namorada. Até sugeri que contratasse os

funcionários do Bella Flor para que ganhassem um dinheiro extra, mas ela não

quis.

— Não estava em meus planos, então não me olhe com essa cara. — Bufo,

pegando a garrafa de uísque ao meu lado e enchendo meu copo e o dele.— Estou
fodido, não consigo controlar a porra do desejo que sinto por ela. Por mais que

eu tente manter minhas mãos longe, quando vejo já estou parecendo...

— Um idiota apaixonado — ele completa e dá uma risada esnobe.

Cerro meu maxilar. Que amigo filho da puta que eu tenho.

— Não tire suas próprias conclusões. Não estou apaixonado, é só tesão

reprimido — falo, e sai mais como um resmungo, então o idiota aperta os lábios

para não rir. — Pode rir, continue rindo da minha desgraça. Quando você sentir o

mesmo que eu vai me entender, e quem vai rir da sua cara serei eu. Otário! —

Fecho as mãos ao redor do copo e o levo à boca, engolindo o líquido.

— Eu já senti isso e não só uma vez, mas várias vezes, e com muitas

mulheres. — Pisca para mim e eu o ignoro.

Lucas é um mulherengo, tem trinta e seis anos e ainda não sossegou, vive

trocando de namorada, não fica com mais de um mês com a mesma mulher.

— Você virá hoje à noite? — Sondo e ele assente com um certo brilho nos

olhos, certamente está com nova paquera.

— Não perco por nada esse jantar — diz, divertido. — Quer apostar
quanto que Alessandra quer te pressionar para pedi-la em casamento na frente

dos pais dela? Tenho certeza de que vou ganhar.

— Ela não seria louca. — Fecho a cara. — Se eu quisesse me casar com

ela já a teria pedido em casamento há muito tempo — dessa vez falo baixo.

— Então diga isso a ela, não deixe que a mulher se iluda com a ideia de

que algum dia se tornará a senhora Guterres — aconselha.

No fundo, ele está certo. Ela deve pensar que um dia iremos nos casar.

— Da última vez que me casei, minha esposa trouxe o irmão/amante para

morar na minha casa. Se Alessandra quiser podemos continuar como estamos,

mas casar eu não me caso. Com nenhuma mulher. — Recosto-me na cadeira e

Lucas começa a gargalhar, parece até que contei alguma piada.

— Não sei, mas acho que um dia você ainda se casa.

— Vá s...

Somos interrompidos quando alguém invade o meu escritório. Levanto

meus olhos e encontro a minha filha parecendo extremamente irritada.

Puta merda. Que o inferno comece.


— Pai, por que a nossa casa está cheia de gente e a Alessandra mandando

e desmandando como se fosse a dona de tudo? — Vitória coloca as mãos na

cintura e me encara com raiva.

— Não vai falar com o seu padrinho, meu amor? Para que esse estresse

todo, você é muito novinha para ficar tão rabugenta. Está na TPM? — pergunto,

bem-humorado, mas logo me arrependo ao vê-la revirar os olhos e ignorar meu

amigo, que me encara com diversão.

Como falar para Vitória que esqueci de avisá-la que teremos um jantar em

nossa casa? Os últimos dias foram corridos, mal fiquei em casa.

— O Lucas não é meu padrinho. Ele nunca me batizou, e eu não o

considero como padrinho. Tenho certeza de que não me considera como sua

afilhada também. Pelo amor de Deus, né, pai! — diz rispidamente. Arqueio a

sobrancelha ao notar que meu convidado fica pálido e meio desconcertado, mas

não demora para se recompor. — E pare de me tratar como criancinha só para

fugir da minha pergunta. O que aquela mulher acha que está fazendo?

— Querida, esqueci de te avisar que teremos um jantar. Era para eu ter

feito isso há três dias — esclareço, sem jeito, ao notar que Vitória fica magoada.
— Ah é? Convidei alguns amigos da faculdade para ficarmos na piscina,

eles chegarão às oito. Não vou desmarcar por causa daquela cobra. — Minha

filha aperta os lábios e me fuzila com os olhos.

— Vitória, olha o respeito — repreendo-a e percebo que meu amigo nos

observa em silêncio.

— Que respeito, papai? O senhor não acha que eu merecia um pouco de

respeito também? Pelo menos deveria ter me mandado um e-mail, uma

mensagem avisando que a cachorra da sua namoradinha iria usurpar o lugar da

minha mãe de uma vez por todas — grita, furiosa.

Respiro fundo e olho para o meu amigo, que me lança um olhar como se

dissesse “não resolva as coisas com a cabeça quente”. Concordando com ele,

fecho os punhos debaixo da mesa e fico calado por alguns minutos, sob o olhar

da minha filha, que tem os olhos lacrimejados.

— Filha, Aline sempre será a sua mãe, nenhuma mulher vai tomar o lugar

dela na sua vida. Por favor, se controle porque não estamos sozinhos. — Cerro

os dentes e sinto a veia do meu pescoço latejar. Estou quase mandando meu

autocontrole para o inferno.


Vamos lá, Victor, conte a ela que Aline era uma vagabunda que a

maltratava por causa de um escroto.

— Os homens são todos iguais, e o senhor não fica atrás! — Sua voz está

carregada de revolta.

— Saia da minha sala agora, antes que eu perca a paciência com você. —

Aponto para a porta. Minha voz sai dura e eu sinto por ter que agir com firmeza

com ela, mas é assim que tem que ser, porque estou prestes a fazer uma besteira

que poderá a magoar muito mais.

— Está me maltratando por causa daquela mulher? — pergunta, me

lançando um olhar magoado. Sua voz está nitidamente embargada, sei que

minhas palavras a machucaram.

Tem que ser assim. Só vá em frente.

— Logo os convidados irão chegar. Se não quiser se reunir com a gente,

fique em seu quarto ou leve seus amigos para a piscina. Mas não faça muita

bagunça e nada de muitas bebidas e som alto — falo e recebo um olhar incrédulo

de Vitória, de completo choque.


— O senhor quem manda, é o dono de tudo isso aqui mesmo. Com licença

e boa noite. — Ela me dá as costas e sai da sala batendo a porta com força,

causando um estrondo.

Decido ignorar, não quero a magoar ainda mais por bobagens.

— Se ela já age assim com a Alessandra sendo apenas minha namorada,

imagina se eu me casasse? Isso aqui viraria um inferno! — Inspiro fundo.

Lucas finalmente deixa de ser uma planta e se manifesta.

— É, irmão, boa sorte com a sua filha furacão, porque eu já vou embora.

— Antes de se levantar, ele pisca para mim. — Volto mais tarde.

— Acha que eu devo contar a verdade? — indago, levantando-me

também. Tenho que me arrumar, os pais de Alessandra logo chegarão.

— Qual delas? Sobre você estar louco para trepar com a loirinha linda que

é mãe do seu filho, ou sobre Aline ter feito você de corno por anos, dentro da sua

própria casa? — Ele me dá um sorrisinho maldoso.

Desgraçado.

—Foda-se, Lucas. Não preciso de um inimigo, porque já tenho você. —


Meu semblante endurece e o maldito se diverte.

— Cara, que idade você tem mesmo? Preciso do meu amigo de volta, você

está muito rabugento. Não sabe nem brincar. Porra, não é porque tem uma filha

de quase vinte e três anos que precisa se comportar como um idoso. — Ele revira

os olhos. — Você tem trinta e oito anos, é jovem, precisa relaxar e gozar! Ter

tido filhos cedo demais não te fez bem. — Debocha, para me tirar do sério.

— Vá à merda, Lucas! Vaza daqui antes que eu te chute para fora da minha

casa. — Semicerro os olhos e logo ouço uma gargalhada.

— Daqui a algumas horas nos encontramos de novo. Até breve! — Se

despede e segue até a porta.

Fecho os olhos e jogo minha cabeça para trás. Estou puto e frustrado. A

noite ainda nem começou e eu já estou no limite. Por Deus.

— Victor — Lucas me chama. Abro os olhos e arqueio a sobrancelha,

esperando que ele fale. — Não importa o quanto vai magoar Vitória ao saber

quem era a mãe dela, e se você teve algo no passado com a amiga dela. Acredito

que por mais que a verdade doa, ela é a que deve ser contada sempre. A verdade

dói, tem consequências, mas todos merecem a sinceridade. Apenas siga o seu
coração, o resto você resolve depois — diz e sai, me deixando pensativo.

**

SAFIRA

— Não precisa se preocupar que não vou subir muito tarde. Antes da meia-

noite você será dispensada, tudo bem? — falo para a babá que Vitória arrumou

para olhar Miguel enquanto eu me junto a ela e seus amigos.

Minha amiga convidou algumas pessoas da faculdade para vir a sua casa,

parece que hoje vou conhecer o amigo dela que vai conseguir uma vaga para

mim na empresa da família dele.

— Não se preocupe com o horário, a sra. Vitória me pagou um extra para

que eu pudesse dormir aqui — diz a mulher, e eu arregalo os olhos.

— Mas não será nec...

Não termino de falar, porque somos interrompidas quando a porta do meu

quarto é aberta com violência.

— Já está pronta, Safira? — pergunta Vitória, com a voz embargada.

Assinto e olho para o meu vestido tubinho vermelho simples de alças finas
e depois para meus pés.

— Quase. Só preciso calçar as sandálias e passar um batom, coisa rápida

— digo, estranhando seu comportamento.

Ela está inquieta, morde os lábios com força, com certeza quer chorar.

Seus olhos estão vermelhos e eu me pergunto o que deve ter acontecido. Será

que brigou com o paquera dela?

— Então se apresse, minha querida, não vamos fazer a nossa pequena

reunião antes do horário combinado. Enviei uma mensagem para todos, logo

trarão as bebidas. Hoje iremos nos divertir como nunca — diz e empina o nariz,

meio arrogante.

— Aconteceu algo? — indago, tentando entender o que está acontecendo.

— Você já viu a cobra lá embaixo mandando e desmandando em um

pessoal, não é? — pergunta, e eu assinto. — Pois é, meu pai deixou a namorada

dele preparar um jantar aqui em casa e agora aquela ridícula está adorando

passear na minha casa com aquele maldito sorriso venenoso só para mostrar que

pode fazer o que quiser com o idiota do Guterres! — sibila, e eu fico sem ação

com o tamanho da sua fúria.


Ela nunca falou assim do pai, a coisa deve estar mesmo feia.

— Se acalme, não adianta se estressar, talvez seja isso que ela quer.

Apenas faça o contrário, mostre a Alessandra que você pode ser muito melhor.

Cancele essa reunião com seus amigos e compareça ao jantar, seja educada e não

demonstre que está abalada. Nesse momento você precisa mostrar maturidade

para que seu pai entenda que mesmo não gostando do relacionamento, você vai

estar ao lado dele. — Me aproximo dela, que está com a expressão endurecida.

— Odeio te decepcionar, amiga, mas quando se trata de Alessandra, parece

que eu perco a sanidade — fala, rancorosa. — Nem pelo meu pai me sento

àquela mesa com seus amigos fúteis. Alessandra tem péssimo gosto para

amizade, e eu não vou suportar ver aquelas mulheres olhando para mim e

cochichando pelos cantos. Solte esse cabelo, fica mais bonito e mais sexy solto

— muda de assunto completamente —, e aproveite para passar um lápis nos

olhos para destacar essas belezuras que você carrega. Vou te apresentar a uma

pessoa para que possa se divertir um pouco. — Pisca para mim, e eu fico

perplexa.

Não estou procurando um namorado. Minha cabeça está ocupada demais


com outra pessoa para pensar em outros homens.

— Não acho uma boa ide...

— O sr. Guterres me permitiu ficar na piscina — ela me interrompe —,

então ele que aguente meus convidados, assim como vou ter que aguentar os

dele. — Ela dá de ombros e eu engulo o nó que se formou na minha garganta.

— Vitória, não sou a pessoa mais indicada para falar de maturidade, mas

pense bem antes de agir com a cabeça quente. Remarque essa reunião para outro

dia — falo, mas ela nega.

— Enquanto Victor estiver com Alessandra, ele vai ter que me suportar

sendo imatura, mimada e mal-educada. Eu não suporto aquela mulher, e daqui a

pouco vou fazer desse jantarzinho dela um inferno. Vou terminar de me arrumar

e já volto para descermos — conclui.

Antes que eu abra a boca mais uma vez, ela me dá as costas e sai do

quarto, pisando duro.

Não posso deixar a minha amiga sozinha, o jeito é embarcar na loucura

dela. E seja o que Deus quiser.


SAFIRA

Depois de bons minutos esperando Vitória perto da escada, finalmente ela

surge com um vestido longo e preto com abertura na lateral — simples e sexy

—, cabelos soltos e uma maquiagem suave. As suas belas sandálias de tiras

trançadas com salto alto e fino destacam suas pernas torneadas.

— Como estou? — pergunta, sorrindo e dando uma voltinha.

— Maravilhosa! — Pisco para ela.

Seu sorriso fica ainda maior quando ela se aproxima mais.


— Decidi seguir o seu conselho, quer dizer, metade dele — declara,

entrelaçando nossos braços.

— Te dou tantos — brinco, fazendo-a gargalhar.

— Vamos participar desse jantar, Alessandra terá que me engolir —

afirma, enquanto descemos a escada.

— Como assim vamos? — Congelo, travando os pés no chão.

Vitória quase cai com o tranco e me olha confusa.

— Acha que vou te excluir? Você virá comigo, é a minha convidada. —

Minha amiga joga os cabelos para trás e depois empina o nariz.

— Vitória, não acho uma boa ideia. Como os seus amigos não vêm mais,

acho melhor eu subir para ficar com o meu filho — sugiro, apavorada.

Como vou olhar para Alessandra depois do que permiti que o namorado

dela fizesse comigo? Não é justo. É errado... E a família dela está aqui,

provavelmente é um jantar bem importante. Estar no mesmo ambiente que o

casal vai me deixar com a consciência ainda mais pesada.

— Nem pense nisso. Surgiu uma coisa muito melhor para essa noite, e
preciso da sua companhia — explica. — Por favor, não me deixe enfrentar as

feras sozinha, não faça isso comigo.

— Nem estou com uma roupa apropriada...

— E nem precisa — Vitória me interrompe. — Você está linda, pare de

inventar desculpas. Não me faça desistir de mostrar ao meu pai que sou uma

pessoa suficientemente madura para aguentar a Hidra — resmunga, me fazendo

descer os últimos degraus.

Dou risada com a comparação de Vitória. Hidra, na mitologia grega era um

monstro que habitava um pântano.

— Promete que vai se comportar? — Minha voz sai em súplica.

— Sim, senhora — Vitória balança a cabeça. — Agora vamos, os nossos

convidados estão nos esperando à mesa com os outros — diz maliciosamente,

me fazendo arregalar os olhos.

Convidados? Quando vou questionar Vitória, fico tensa ao ouvir a voz

enfurecida de Victor, que está no meio da sala com uma taça de vinho na mão

direita, enquanto a esquerda está cerrada.


Cacete de homem bonito! Ser tão bonito assim deveria ser considerado

pecado.

Disfarço e olho para Victor mais uma vez; ele está vestido com um terno

slim preto com colete, e seu cabelo está penteado para trás, sem nenhum fio fora

do lugar. Os sapatos sociais pretos de verniz completam o look.

— O que você ganha com essas atitudes, Vitória? Por que você convidou

dois estranhos para um jantar familiar? — o homem diz enquanto vem em nossa

direção a passos largos.

Sem saber direito o que está acontecendo, eu me sinto perdida.

— Olá, papai. Convidei Bruno e Rafael para fazerem companhia para mim

e a Safira. Não achei que fosse um problema, uma vez que eu moro aqui e todos

daquela sala estão acompanhados. Realmente achei que eu pudesse convidar as

pessoas para virem a minha casa, mas se quiser posso mandá-los embora. — A

voz de Vitória soa inocente, como se ela realmente não visse problema algum ter

convidado seus amigos para o jantar.

Dou um leve aperto em seu braço para indicar que estou ciente das suas

intenções. Ela fez de propósito, claro, e sabe muito bem que o seu pai nunca irá
pedir que ela mande seus convidados embora.

— Seus convidados podem ficar, Vitória, não precisa mandar ninguém

embora. — Bufa e declara. Seus olhos azuis focam em mim rapidamente antes

de ele disfarçar e encarar a filha mais uma vez, que está vibrando ao meu lado

por ter vencido esse embate.

— Sabia que não ia me decepcionar, papai — diz ela animadamente. —

Vamos, Safira, os meninos estão nos esperando.

Já estou vendo que isso vai sobrar para mim. Visivelmente contrariado,

Victor nos olha uma última vez antes de nos dar as costas e seguir para a sala

onde está acontecendo o jantar. Em silêncio, Vitória e eu o seguimos.

Tomamos nossos assentos à mesa em que estão duas amigas de

Alessandra, um casal de idosos muito gentil — que imagino que sejam os pais

dela — um amigo de Victor com uma mulher muito bonita o acompanhando.

Sinceramente, essa foi a pior ideia que Vitória poderia ter tido.

Alguns minutos depois, percebo que Alessandra está me encarando,

parecendo furiosa. Ela tenta disfarçar o desconforto com a minha presença, mas
não parece estar conseguindo, então a mulher pede licença para se levantar, beija

os lábios do namorado e vai até a cozinha. Minutos depois ela volta com os

garçons contratados.

Victor e Lucas, seu amigo, se entreolham e conversam enquanto o pai de

Vitória fica com seus olhos azuis intensos focados em mim.

— Quem é essa gracinha ao lado da Vitória, meu genro?

Quase engasgo com a comida ao ouvir a mãe de Alessandra perguntar ao

me encarar com curiosidade.

— Ela é amiga da minha enteada, mamãe. Está passando alguns dias em

nossa casa, não é, meu amor? Mas logo vai encontrar um lugar para se mudar

com o seu filho — diz a cobra, passando a mão nos cabelos de Victor, que se

remexe na cadeira parecendo incomodado.

Viro-me para o lado quando ouço alguns risos e encontro as amigas da

loira oxigenada, achando graça do veneno que a naja mãe destila.

— Ah, entendi. Mas uma menina tão jovem e bonita como você deveria

estar aproveitando a vida, não criando um filho. Aposto que o pai dessa criança
deve tê-la deixado arcar com toda a responsabilidade, já que no momento não

tem um teto para ficar e precisou se alojar na casa da amiguinha. — A senhora é

tão venenosa como a filha.

Não seja mal-educada, Safira, não dê a elas o que querem.

Respiro fundo e decido voltar para o lugar de onde eu não deveria ter saído

— meu quarto. Faço menção de me levantar, mas paro quando a voz revoltada

de Victor enche meus ouvidos.

— Já chega. Não tolero esse tipo de comportamento na minha casa.

Alessandra, pare agora a sua mãe ou não respondo por mim. A vida da Safira

não interessa a ninguém nesta mesa, muito menos a pessoas que ela nem mesmo

conhece. A sua mãe não tem o direito de meter o nariz onde não deve. — Bate

com os punhos fechados na mesa, assustando a todos.

— Amor, perdoe a mamãe, às vezes ela se expressa mal... — Alessandra

arregala os olhos e tenta pegar na mão do namorado, mas ele a afasta. Tenho

certeza de que Alessandra não esperava que ele reagisse dessa maneira.

— Acho bom que comece a guardar as suas opiniões para si, ninguém aqui

quer saber o que você pensa ou deixa de pensar sobre a vida alheia. — A voz de
Victor soa fria, dessa vez seus olhos estão em mim.

— Me perdoe, meu genro, não achei que magoaria a menina com as

minhas palavras. — A cobra mãe fala, mas eu a ignoro.

— Não se preocupe, o que a senhora disse não me afetou em nada. Se

opinião vendesse, muitos estariam ricos por aí. — Pisco para ela. — Agora

vamos aproveitar o jantar, está uma delícia.

— Já chega, querida. Não é da sua conta a vida da moça. — Ao menos o

pai é educado.

A megera versão 1.0 da filha assente e se cala.

Com vergonha, olho para as pessoas à mesa e percebo que tentam disfarçar

o desconforto que todos estão sentindo. Vitória, por outro lado, me lança um

olhar como se quisesse dizer que está prestes a explodir, deixando claro que não

gostou nadinha do que aconteceu. Balanço a cabeça pedindo para que se acalme,

pois se ela decide abrir a boca, a situação vai piorar.

Depois de alguns minutos as coisas parecem ficar mais calmas, ao menos

todos conseguem fingir que está tudo bem. O jantar transcorre sem problemas,
vez ou outra o meu acompanhante tenta iniciar uma conversa, mas não dou

muita atenção, estou com o pensamento longe. Só quero que esse jantar acabe

logo.

Victor não para de me encarar durante o jantar, sempre que olho em sua

direção, encontro seus olhos concentrados em mim, parece até que tenta me

dizer algo. De repente, nossa troca de olhar é interrompida quando Alessandra se

levanta e bate com o talher em uma taça, para atrair a atenção de todos.

— Como todos sabem, Victor e eu nos amamos muito, então decidi dar o

próximo passo em nosso relacionamento.

Desespero permeia os olhos de Victor, que se levanta rapidamente, segura

o braço da namorada e a arrasta da sala. Quando a conversa ao redor da mesa

recomeça, eu permaneço calada, esperando que tudo se acabe, até que Vitória se

levanta e me arrasta para longe dos demais.

— Percebeu o que essa mulherzinha ia fazer? Ela acha que vai conseguir

ficar noiva do meu pai? — Só encaro a minha amiga, sem saber o que dizer. —

Mulher ridícula, deveria desistir de uma vez do meu pai. Tenho quase certeza de

que ele está com outra e, certamente, deve ser muito melhor que essa jararaca.
Sinto um toque em meu ombro, então me viro e encontro Lucas.

Parecendo um pouco sem graça, ele me pede para acompanhá-lo antes de trocar

um olhar estranho com a minha amiga. Ela o fuzila com os olhos, mas ele a

ignora e se afasta rapidamente. Essa casa... essas pessoas são confusas demais.

Não estou entendendo nadinha.

— Se eu demorar muito me salve, não tenho ideia do que Lucas quer

comigo — cochicho no ouvido de minha amiga.

Ela sorri e dá um tapa na minha bunda quando estou saindo, me fazendo

ruborizar de vergonha.

— Oi, Safira. — Aproximo-me do amigo do pai de Vitória. — Victor

comentou que você precisa de um emprego, então tenho uma proposta pra você.

Estou precisando de uma atendente de telemarketing, e se você topar pode

começar na próxima semana o treinamento. O salário não é grande coisa, pois a

jornada de trabalho é de apenas seis horas, cinco dias na semana. Então, o que

me diz?

Encaro-o, sem saber o que responder, tentando assimilar as suas palavras.

— Safira, não gostou da proposta? Você entendeu o que eu disse? —


pergunta, em dúvida.

— Eu... é que... jamais pensei que você fosse me oferecer... Deixa pra lá.

Aceito, claro! — confirmo, mas com medo de que seja uma brincadeira de muito

mau gosto, afinal, eu mal o conheço.

— Certo. Vou te passar as informações até o fim dessa semana, então

marcamos direitinho. Obrigado por aceitar, tenho certeza de que iremos nos dar

muito bem. — Pisca para mim.

— Eu que agradeço, será um prazer — respondo, dando um sorriso um

pouco sem graça.

Volto para a mesa, ainda refletindo a conversa breve que tive com Lucas.

Alessandra é gerente da rede de restaurante do Lucas e Victor, sendo assim, a

ideia de trabalhar no restaurante não vai funcionar. O melhor a fazer é esperar,

afinal de contas, não posso desconsiderar nenhuma possibilidade de renda.

Victor e Alessandra voltam para a mesa, noto que a maquiagem dela está

borrada. O homem se desculpa com todos e diz que infelizmente precisará

encerrar o jantar antes do esperado. Gentilmente, ele informa que marcará uma

nova data para compensar a todos.


Alessandra sai furiosa da sala, e suas amigas a seguem. Os pais dela se

despedem carinhosamente de Victor, enquanto sou arrastada para a piscina por

Vitória e seus amigos.

**

Olho para os amigos de Vitória que estão conversando animadamente e me

sinto deslocada. Eles bebem e riem, enquanto fico sentada em uma

espreguiçadeira um pouco afastada, com um copo de água na mão, sem intenção

alguma de me juntar a eles. Sinto que essa fase de curtição passou, pelo menos

para mim. São mais de dez e meia da noite, estamos aqui desde o fim do jantar.

Ainda sou jovem e sei que preciso me divertir, mas o mundo da minha

amiga não é o meu. Sou uma mulher adulta e tenho um filho para cuidar que,

aliás, está lá em cima com uma babá que nunca tinha visto na vida, enquanto

estou aqui, na beira da piscina, observando essas pessoas estranhas se

embebedando, conversando sobre assuntos frívolos.

Desvio meus olhos da casa e os fixo em Vitória e seus amigos. Assim que

o jantar terminou, Vitória rapidamente ligou para alguns amigos convidando-os a

virem para cá. O grupo agora é formado por cinco garotas — eu, Vitória e três
morenas de cabelos longos — e quatro rapazes bonitos — dois chegaram com as

meninas. Estão todos bem-vestidos, filhinhos de papai. Definitivamente, não

combino com esse ambiente.

— Amiga, sai da toca e vem beber um pouco — exclama Vitória, erguendo

a taça de vinho para mim.

— Estou bem aqui — dou um sorriso forçado —, e estou bebendo algo

mais saudável. — Ergo meu copo de água e ela revira os olhos, enquanto suas

três amigas riem.

Será que estou conhecendo o outro lado de Vitória somente agora? Não

quero me decepcionar. Bebo a água e finjo demência quando vejo um dos

rapazes se aproximar de mim logo após a minha amiga cochichar algo no ouvido

dele. Nem me lembro do seu nome, não fui apresentada corretamente aos

convidados de Vitória. Na verdade, eu não quis e nem tenho interesse neles.

— Você é a Safira, certo? — O cara sorri para mim, nitidamente animado.

Arqueio a sobrancelha e o encaro sem interesse algum. Ele é alto, tem

cabelos negros e os olhos da mesma cor. É bonito, mas nada que chame muita a

atenção, é o típico playboy — bem arrumado, cheiroso, nitidamente vaidoso e


com músculos nos lugares certos.

— Sim, sou eu. No que posso ser útil? — respondo com grosseria e me

arrependo assim que vejo a sua cara de espanto.

— Sou o Gustavo. A Vitória me disse que você está procurando emprego,

acho que posso te ajudar. — Ele estende a mão em minha direção, ainda em pé

na minha frente.

Fico extremamente envergonhada quando ele confirma que é o tal amigo

de Vitória que pode me empregar.

— Ah sim, ela me disse sobre você. — Sem graça, pego na mão dele para

cumprimentá-lo.

— Posso me sentar? — indaga de uma maneira tão educada, que me pego

sorrindo.

— Claro que sim. — Dou espaço para que ele se sente na espreguiçadeira

comigo.

— Meu pai é dono de uma rede de hotéis e estão sempre precisando de

funcionários. Se tiver interesse eu falo com ele, tenho certeza de que ele a
encaixa em algum hotel. A vaga que sempre aparece é de camareira, tudo bem

para você?

— E por que não estaria? — Olho confusa para ele. — Vou receber meu

salário no final do mês e ainda vão assinar a minha carteira? — pergunto e ele

assente, agora quem parece confuso é Gustavo.

— Sim, claro que sim... Será tudo como manda a lei. Só perguntei por

você ser tão bonita e... não pensei que aceitaria um emprego tão simples como

esse. Mas se quer mesmo um emprego, a vaga é sua — conclui, envergonhado.

— Emprego é emprego. Para mim é maravilhoso, e será ainda mais

quando eu começar a trabalhar. Os boletos não esperam e eu tenho um filho para

alimentar, comprar roupas, fraldas, levar ao médico. — Pisco para ele, que fica

levemente pálido. Levanto-me e me viro para Gustavo. — Ah, beleza não põe

comida na mesa! O importante é trabalhar e ter dinheiro para se manter.

Nem sei se ainda terei um emprego depois dessa. O cara começou bem,

mas depois veio com aquele papo-furado de ser tão bonita e blá-blá-blá, graças a

Deus sou pé no chão. Eu quero mesmo é ganhar meu dinheiro, nem ligo se serei

a faxineira, camareira, motorista. O importante é ter o suficiente para cuidar do


meu filho.

Aproveito que Vitória está distraída, saio de fininho e sigo na direção da

casa. Ao entrar pela porta da cozinha, eu me deparo com a última pessoa que eu

queria encontrar no momento — Victor. Ele está pegando algo na geladeira e não

percebe a minha presença, então tento passar despercebida, mas não tenho muito

sucesso.

— Está se divertindo, Safira? — Sua voz soa fria.

— Como é? — Fico confusa com o seu tom de voz. — Esquece. Boa

noite, e com licença. — Passo por ele, que ainda está de costas para mim.

— Eu te fiz uma pergunta, Safira. — Com um movimento rápido, ele

segura o meu pulso antes que eu me afaste.

— Sim, você fez, mas não sou obrigada a responder. A pessoa que deve

satisfação a você foi embora horas atrás — retruco, me livrando do toque dele.

— O que aquele cara queria com você? — pergunta, com os dentes

cerrados.

Arqueio a sobrancelha, muito confusa. Ou nem tanto.


Victor está com ciúmes? Não, não pode ser, acho que estou delirando.

— Arrumando um emprego para mim — respondo, mesmo sem vontade, e

ouço uma risada sarcástica de Victor. — E o que você tem a ver com isso? Por

acaso estava me espionando? — confronto-o.

— Estava observando a bagunça de Vitória, não entenda errado... Então eu

a vi com aquele garoto... ele estava claramente dando em cima de você. E por

que você quer outro emprego, se o Lucas já te arrumou um? — Seus olhos têm

fogo, ira.

— Se acha que tem o direito de me controlar só por ter mandado seu

amiguinho arrumar um emprego para mim está muito enganado. Não vou

permitir que brinque comigo, nem você e nem a sua namorada. Cansei de toda

essa merda, cansei de abaixar a cabeça para tudo só porque estou aqui de favor.

— Dou as costas novamente para ele, mas travo os pés quando ele começa a

falar.

— Você não está aqui de favor. Tudo que eu tenho é dos meus filhos

também, aceite o fato de que essa casa é de Miguel. Eu a aguardo no meu

escritório às onze da noite, não se atrase e nem ouse não aparecer. Hoje
resolveremos isso de uma vez por todas — Victor fala e sai da cozinha, me

deixando sem entender sobre o que está falando.


VICTOR

Estava no limite, a mãe da Alessandra e, principalmente, a minha

namorada, decidiram que essa noite era perfeita para tirar Safira do controle.

Fiquei admirado por minha filha não ter tomado à frente da situação, já que é

explosiva. Estava a ponto de explodir quando minha sogra fez pouco da

paternidade do meu filho. Eu já estava revoltado com toda essa merda delas, e

bastou Alessandra vir com a história de dar um passo no nosso relacionamento

que esqueci de como é ser educado e a arrastei para longe dos convidados, para

que pudéssemos esclarecer as coisas.


— O que aconteceu, amor? Por que está me olhando com essa cara? —

Os olhos da mulher estão arregalados, ela está pálida.

Solto o braço de Alessandra e me afasto dela.

— Que história é essa de dar um passo no nosso relacionamento? — Com

a expressão fechada, inspiro com força e cerro os punhos.

Lucas tem razão, chega de viver nessa mentira. Não iremos à lugar algum,

não há nada que me prenda a esse namoro que há tempos está desgastado. Não

somos felizes há meses. Se ainda estamos juntos é por conveniência, pelo fato de

ela ser gerente do meu restaurante. Na minha cabeça, dava para ir levando as

coisas desse jeito, mas nesta noite tive a certeza de que não dá mais. Está

ficando insuportável continuar nesse relacionamento.

— Me arrastou na frente dos convidados para falar isso, Victor? — Sua

voz sai embargada.

Bufo, irritado por ela está se fazendo de sonsa.

— Entenda uma coisa, Alessandra, ninguém me obriga a fazer o que eu

não quero. Ninguém — rosno, apontando o dedo para ela.


— Tem certeza? Nem a sua filhinha? — acusa, com os olhos lacrimejados.

— Não coloque a Vitória no meio da nossa conversa! — falo impaciente.

— Mas não é sempre ela a culpada das nossas brigas? Sua filha é

mimada, meu amor. Aceite. Ela sempre me odiou, sempre me tratou muito mal, e

eu faço de tudo para nos aproximarmos, para sermos uma família. A nossa vida

começou a desabar desde que aquela garota e o pirralho apareceram. —

Chorando, Alessandra tenta se aproximar, mas eu recuo.

— Já percebeu que está colocando pessoas que não tem nada a ver com o

que está acontecendo no meio da nossa conversa? — acuso-a, mas ela parece

não se abalar.

— Ah, então aquela vagabunda que você engravidou quando já éramos

comprometidos não tem nada a ver com o seu comportamento idiota? — diz

calmamente, sua voz é baixa e o tom ameaçador.

Fico sem ação. Alessandra sabe sobre Miguel e Safira? Como? Quem

contou?

— Eu sei de tudo! Ouvi você falando com Lucas sobre a aventura com
essa garota podre, uma safada que transa com qualquer um e engravida de

propósito. — Suas palavras são duras.

Eu a encaro com incredulidade, nunca a vi falando assim.

— Não quero ser grosseiro com você, Alessandra, mas se controle.

— Assuma de uma vez que me traiu e fez filho com outra. Você me disse

várias vezes que não queria outro filho, e agora, do nada, está disposto a

defender uma criança que pode nem ser sua — diz, com raiva.

— Tínhamos acabado de começar a sair, nem mesmo namorávamos. Para

mim não foi uma traição. — Deixo escapar e ela avança para cima de mim,

tentando atingir o meu rosto, mas eu a seguro pelos pulsos.

— Está confirmando que aquele moleque é seu filho? — rosna, enquanto

lágrimas deslizam em seu rosto.

— Sim, Alessandra. Aquela criança tem nome, ele se chama Miguel. E sim,

é meu filho. — Olho bem em seus olhos, que agora estão arregalados. — Eu o

assumirei, darei meu sobrenome a ele, serei um pai presente na vida dele.

— Vai cair nesse golpe? Safira viu que você tem dinheiro, ela só quer
acabar com a nossa relação para ter o caminho livre pra te fazer de trouxa!

Cuidado, querido. Acho que deve fazer um exame de DNA para comprovar se é

seu, aquela garota deve ter se deitado com vários homens — provoca.

— Já chega. Nunca imaginei que você fosse assim, tão maldosa. Quem é

você? Onde está aquela namorada tão carinhosa e compreensiva? — Me afasto

mais, passando as mãos na cabeça. — Aceitei que fizesse esse jantar, mas nunca

imaginei que era uma armadilha, estava tudo diante dos meus olhos, só que

mais uma vez fui um idiota.

— Ah, você engravida outra, me chuta após anos de relacionamento e

agora quer ser a vítima da história? — pergunta, se aproximando.

— Acabou, Alessandra. Não existe mais um relacionamento, uma história.

Leve seus pais para a sua casa, não a quero mais aqui — falo, friamente.

— Não me diga que está apaixonado pela amiguinha da sua filha? Espero

que caia na real e veja que eu sou a mulher ideal para você, e não uma garota

como Safira, uma oportunista com um filho que supostamente é seu — afirma,

venenosa.

— A minha vida não te diz respeito, não mais — retruco, ácido. — E eu


não preciso de exame algum para saber que Miguel é meu. E tudo o que é meu é

do meu filho, e tudo que é do meu filho é da mãe dele. Acho que você me

entendeu, certo?

— Você só pode estar bêbado. Tomou algumas taças de vinho a mais. Vou

para a minha casa e amanhã volto para conversarmos melhor. Você não está

bem, posso ver que não. — Alessandra tenta limpar a maquiagem borrada.

— Estou ótimo, nunca estive melhor. Alessandra, estou ciente das minhas

palavras e o nosso namoro termina aqui, não quero mais nada com você — falo

secamente.

— Você está assim por que eu decidi te pedir em casamento na frente de

todos? É sério? — indaga com insistência.

— Também! Mas não é por isso que quero terminar. — Olho-a nos olhos e

noto que não chora mais. — Vivemos juntos por um tempo, eu me sentia bem ao

seu lado, éramos um casal que visava a mesma coisa, mas já não quero mais

isso. Preciso de alguém que não seja perfeita demais, alguém que... Enfim, essa

pessoa não é você. Estou atraído por outra mulher, e eu não quero te magoar, te

trair, continuar em uma relação sem futuro.


— Quer dizer que ama a Safira? — A voz dela sai embargada, magoada.

— Eu não disse isso. Não sei o que sinto por ela, mas estou atraído, isso é

tudo que posso dizer. — Inspiro profundamente.

— A criança que está confundindo os seus sentimentos, amor. Se quiser

podemos criá-lo juntos, cuido dele como se fosse meu. Tenho certeza e que

aquelazinha aceita um cheque bem gordo em troca do filho — sugere.

— Você só pode estar louca se acha que vou separar mãe e filho. Eu não

sou um monstro! — rosno, revoltado. — Não se refira a ela dessa maneira e saia

da minha casa agora. Esse jantar já deu.

— Victor... me perdoa...

— O que tínhamos para falar já foi dito, agora vá embora. — Dou as

costas para ela e sigo para a sala de jantar.

**

Após Alessandra sair com seus convidados, subi para o meu quarto, tomei

um banho e retornei para meu escritório.

Recostado na poltrona, ao refletir sobre o rompimento com Alessandra, um


filme passa na minha cabeça com todas as barbaridades que ela disse.

Minha decisão já está tomada, não vou mudar de ideia, não existe

possibilidade alguma de seguir com essa relação. Não estamos mais em sintonia

como antes.

Ouço algumas batidas à porta, e antes mesmo que eu autorize a entrada,

vejo o rosto de Safira na porta entreaberta.

— Pode entrar — falo e a vejo entrar.

Ela parece ter decidido vir de última hora, talvez estivesse indo dormir.

Safira está sem maquiagem, com uma camisola curta e o cabelo preso em um

coque frouxo. Ela está sexy.

— Estou aqui. O que tem para me dizer, Victor? Me diga o que quer, está

tarde demais para uma conversa — me ataca.

— Sente-se, por favor — peço. Safira assente e após se sentar me encara,

esperando que eu me manifeste. — Vou assumir o meu filho, já decidi isso e

espero que também esteja de acordo. Não quero esperar mais um segundo para

dar a Miguel o que é dele por direito. Se me permitir darei ao nosso filho meu
sobrenome, carinho, amor... tudo que um pai deve fazer.

— Estou de acordo. Você é o pai, tem todo direito de assumir o nosso

filho. — Sou pego de surpresa, mas não escondo o sorriso. — Se era só isso,

agora preciso ir — fala e se levanta.

— Quero dizer outra coisa.

Safira se senta novamente, impaciente. Na verdade, não tenho nada para

dizer. Então, a voz de Lucas soa em minha mente. “Você está se apaixonando

pela garota, meu amigo.”

Porra, ela é tão linda, e sei que estou a fim dela. Muito a fim. Ter Safira

embaixo do meu teto me fez perceber que preciso descobrir o que estou sentindo

por ela.

— Victor, faz quase cinco minutos que estou te esperando falar alguma

coisa. Me desculpe, mas tenho mais o que fazer, com licença. — Ela se levanta

novamente, e eu não consigo resistir ao impulso de contê-la.

— Espere... — digo, puxando-a para perto do meu corpo, suas costas

coladas ao meu peito.


— Me solte, por favor. Não acho nada normal esses seus rompantes. —

Tenta ser firme, mas falha miseravelmente. Agora sei que a afeto e gosto disso,

eu a desejo e ela corresponde, mesmo que seja de uma maneira arisca.

— Não vá, apenas me escute e depois você pode fazer o que quiser. — Eu

a viro de frente e vejo a loira com seus longos cílios tremulando, parecendo meio

desnorteada. — Eu quero você... na verdade, é mais que isso, eu preciso de você.

Não consigo mais conter esse sentimento que lateja dentro de mim, e sei que

você sente o mesmo quando estamos juntos.

— Acho que você não sabe nem o que sente direito. Agora me deixe

passar, ou vou fazer um escândalo tão grande, que o vexame do jantar da sua

mulher essa noite vai ser fichinha — profere as palavras com um ciúme velado.

— Rompi com ela.

Antes que ela diga alguma coisa, eu não resisto e a beijo de maneira

urgente, quente e completamente envolvente. Safira retribui com a mesma

intensidade, se entrega a mim.

Em um movimento rápido, eu a levanto pelas pernas e, rapidamente, ela as

envolve em meus quadris. Em seguida, sigo devagar até a mesa e a deposito


gentilmente ali.

— Safira... — sussurro no seu ouvido e desço minha boca até seu pescoço,

dando uma mordidinha. — Quero mais que uns bons amassos, quero você por

inteira, quero que seja minha mais de uma vez.

— Você teve... sua chance... — responde, tentando resistir às minhas

investidas em seu pescoço enquanto mordisco e beijo todo o local. Desço pelo

colo e beijo cada lado de seus peitos, me deliciando com sua pele macia e

cheirosa. Safira segura os meus cabelos e os puxa, demonstrando o quanto está

sendo prazeroso.

— Você quer que eu pare? — pergunto antes de abaixar o decote de sua

camisola, deixando livre um dos seus seios. Eu o abocanho e saboreio o gosto

doce da sua pele. Ela geme e segura o meu cabelo com mais força, me segurando

contra o seu corpo.

Afasto-me dela mesmo sob seu protesto e resmungo. Deixo-a nua e encaro

o seu corpo com meu olhar ardente. Umedeço os lábios ao focar em seus

mamilos rodados e enrijecidos. Passo um braço por sua cintura fina enquanto

levo a outra mão aos seus longos cabelos loiros e lisos. Em seguida, seguro seu
queixo e deslizo minha língua em sua boca, beijando-a vorazmente. Nossas

línguas dançam dentro da sua boca ao mesmo tempo em que deslizo a mão por

suas costas, deixando sua pele arrepiada.

Acalmando nosso beijo, roço meu nariz no dela e começo a massagear

seus lábios macios com os meus. Safira fecha os olhos novamente, aproveitando

o nosso momento. Beijo-a lenta e suavemente, chupando sua língua como se

estivesse saboreando a minha sobremesa favorita.

— Preciso de você... — ela pede mais do que estou oferecendo.

— Serei seu de hoje em diante. — Pegando-a no colo, eu a levo até o sofá

do escritório e a deito antes de acariciar o seu sexo e beijar carinhosamente a sua

vulva.

Meto dois dedos em sua boceta lisinha e melada, em seguida, levo-os à

boca para provar o seu sabor. Safira se abre mais para mim quando vê a cena, ela

eleva os quadris quando abro seus lábios devagar com a língua e saboreio o mel

que escorre dela. Mordisco os lábios enrijecidos da sua vagina e deslizo minha

língua em seu clitóris, tirando gemidos dela.

Estou lambendo seu néctar quando vejo que Safira está perdendo o
controle, então chupo e mordisco sua boceta, penetrando a sua cavidade com a

minha língua, fazendo-a gemer alto com as minhas investidas. Com seu corpo se

contorcendo sob a minha boca e dedos, saboreio o seu gosto até que ela atinge o

clímax, gozando em minha boca.

— Victor... — Sua voz sai como uma súplica, me deixando ainda mais

excitado e motivado a lhe dar prazer.

Desejo-a mais do que antes, preciso penetrá-la, sentir o calor do seu corpo

contra o meu, ouvir seus gemidos perto do meu ouvido enquanto adoro cada

parte do seu corpo.

Desabotoo minha calça e a desço com a boxer, em seguida, tiro a camisa e

encaro Safira, pedindo permissão. Assim que ela me dá um sorriso safado, eu a

puxo para mim e a sento em meu colo, encaixando meu pênis em sua entrada

lambuzada. Gememos juntos quando ela se movimenta lentamente sobre meu

pau rígido e pulsante. Ela rebola, como se estivesse fazendo uma dança erótica

em meu colo. Seus gemidos me deixam mais excitado, urro quando ela crava as

suas unhas afiadas em meu peito e depois sorri para mim.

Safira morde os lábios de uma maneira sexy pra caralho enquanto desce e
sobe no meu pau com mais velocidade. Fascinado com seus movimentos, coloco

uma mão em seu quadril para guiá-la e levo a outra ao seu cabelo e o puxo para

trás, deixando seus peitos na altura da minha boca. Eu os chupo e mordisco de

leve, arrancando gemidos dela.

Enquanto a mulher cavalga em mim com maestria, tiro a boca dos seus

seios e puxo seu corpo contra o meu antes de apertar a sua bunda com força.

Beijo seu ombro e sigo para o pescoço, onde mordo e arranho sua pele com

meus dentes.

Disposto a ter mais dela antes que alcance seu deleite, inverto nossas

posições sem sair de dentro de Safira, e a deito no sofá, abrindo mais as suas

pernas. Seguro uma das coxas e a penetro fundo enquanto a minha mão livre

passeia por seus seios, por sua barriga suada e alcança seu clitóris escorregadio.

Eu a masturbo ao mesmo tempo que meto rápido e com força. Sem deixar de me

pedir por mais, Safira chama o meu nome.

Ela leva as mãos ao meu rosto e me puxa para um beijo quente, intenso e

desesperado. Com nossas bocas grudadas e as línguas entrelaçadas, nossos

gemidos saem abafados. Bombeio lentamente na loira quando ela desliza uma
mão em meu cabelo e o puxa, causando uma ardência excitante no meu couro

cabeludo, enquanto a outra segue para a minha bunda e a aperta, arranhando em

seguida. A vagina dela vai se contraindo no meu pau conforme eu vou a

alargando, sentindo seu corpo todo tremer de prazer a cada investida.

O barulho dos nossos corpos suados se chocando me deixa mais excitado.

— Aii... vou gozar... Victor...

Faço movimentos circulares com o quadril e meto firme e com bastante

precisão, fazendo-a morder os lábios e semicerrar os olhos.

Isso... goza para mim, linda.

Quando a boceta dela aperta o meu pau, eu a preencho com mais vigor e

mais duro, sabendo que está gozando. Minhas pernas começam a tremer assim

que encho sua cavidade com a minha porra quente e grossa.

Deito meu corpo sobre o dela com cuidado para não a machucar e afundo

meu rosto na curva do seu pescoço, beijando carinhosamente a pele macia e

suada.

— Quando eu disse que te desejo e a quero para mim, não estava


brincando. — Acariciando um dos seus seios, noto que sua respiração fica

intensa. — Não pense que estou querendo te usar ou te tornar a minha amante,

jamais faria isso. Você merece mais e estou disposto a te dar se me permitir.

Safira não fala nada, apenas acaricia minhas costas e tenta controlar a

respiração ofegante, em seguida, ela começa a rir.

— O meu coração está batendo no mesmo ritmo do seu — diz, com graça.

— Acho que eles estão batendo um para o outro. — Levanto o meu rosto e

sorrio para ela, que parece entender o que quero dizer.

Saio de dentro dela e a puxo para o meu colo, então acaricio suas costas

macias. Seus olhos claros e sérios se fixam em mim, então coloco seu cabelo

atrás das orelhas e beijo a ponta do seu nariz, abrindo um sorriso ao vê-la me

olhar meio desconfiada.

— O que você quer de mim, Victor? Não vou aceitar que brinque comigo

— afirma.

— Eu quero você e o meu filho em minha vida, Safira. Estou disposto a

tudo para tê-los. — Olho-a com seriedade e noto que seus olhos ficam marejados
e sua pele mais pálida que o normal.

Sim, eu os quero na minha vida e eu os terei.


SAFIRA

“Eu quero você e o meu filho em minha vida.”

As palavras determinadas de Victor me fazem refletir. Ainda em seu colo,

me remexo inquieta ao me lembrar que não usamos proteção. Mesmo que eu

tome contraceptivo, quero ter certeza de que não serei pega de surpresa mais

uma vez com uma gravidez não planejada.

— O que preciso fazer para que acredite em mim? — Victor, leva uma

mão ao meu rosto e a outra para as minhas costas, deslizando os dedos em minha
pele escorregadia.

Para ser sincera, eu não esperava uma atitude dessa vinda dele. Eu sabia

que ele queria assumir Miguel, mas me incluir em seus planos me faz pensar que

talvez ele me queira em seu presente e futuro.

— Não faz nem vinte quatro horas que você terminou com Alessandra... E

o que eu fiz? Me entreguei a você sem sentir culpa, sem pensar direito. O pior é

que me sinto péssima por não estar arrependida. — Respiro fundo quando ele

passa o polegar em meus lábios carinhosamente e me encara com tanta atenção

que faz meu coração bater descompassado.

— Não quero que fique com a consciência pesada — diz com seriedade.

— Reconheço que errei com Alessandra e preciso pedir desculpas por não ter

sido sincero com ela. Talvez eu a tenha magoado por não ter suprido as

expectativas dela, mas eu não posso continuar em um relacionamento que não

funciona mais, entende? Estou muito atraído por você, Safira, não sei se é amor

ou paixão, mas eu a quero comigo. Eu nunca conseguiria continuar com

Alessandra tendo você por perto. Seria uma tortura. E talvez eu a magoaria ainda

mais, porque não sei se conseguiria me controlar. — Victor umedece os lábios e


eu sigo o movimento que faz.

— E se eu não tivesse aparecido na sua vida novamente? Vocês ainda

estariam juntos, não é? — Saio do seu colo e me sento ao seu lado, de frente

para ele. Está na hora de esclarecemos as coisas, conversarmos como dois

adultos.

— Talvez sim, talvez não. — Dá de ombros. Eu o encaro confusa,

esperando por uma explicação concreta. — Quando algo não é para dar certo, ele

simplesmente não dá. Mesmo que você não voltasse para a minha vida, em

algum momento Alessandra e eu iríamos terminar. Mas por que essa pergunta?

— Ergue a sobrancelha negra e me olha.

— Por nada, só estou curiosa. Você ainda a ama? Já a amou? — pergunto.

Vi muitos casos em que os homens rompem seus relacionamentos para viverem

aventuras, e quando se cansam voltam para a amada. Eu preciso saber se não é

isso que Victor planeja, porque não estou disposta a ser brinquedo de ninguém.

— Tive sentimentos por ela, mas não chegou a ser amor. Há muito tempo

que não amo alguém, Safira, nem sei se um dia cheguei a amar a mãe da minha

filha. — Victor se recosta no sofá e pega as minhas mãos, deslizando o dedo em


minha pele carinhosamente. — Aline me magoou tanto com aquela traição, que

acabei me tornando o que mais temia. Bem lá no fundo, sei que agi como a

minha falecida esposa, julguei-a tanto e por fim quase fiz o mesmo. Reconheço o

meu erro com a Alessandra, eu a traí sim, mas a diferença é que eu não quis

continuar com a farsa e viver com uma pessoa que não amo.

“Se eu desse a ela falsa esperança seria um grande filho da puta. A única

saída foi cortar pela raiz antes que eu me afundasse ainda mais. Muitas vezes,

Lucas me aconselhou a terminar com Alessandra, mas eu estava cego, às vezes

penso que era o medo de ficar sozinho, afinal de contas, no mundo em que

vivemos é difícil encontrar alguém de confiança, uma pessoa que queira somar

com você, e ter uma mulher como ela ao meu lado era bom. Pelo menos era isso

que eu achava até a venda cair dos meus olhos e me fazer enxergar a minha

merda já feita. Tenho consciência de que preciso me redimir, mas ao vê-la

tentando me obrigar a me casar com ela como se eu fosse um moleque me

deixou louco. Sei que está insegura em relação a mim, que tem medo de se

magoar, mas se eu não a quisesse, não estaríamos aqui. Por favor, não me julgue

antes da hora.”
Meu coração vacila quando sou puxada para os seus braços fortes e recebo

um beijo na testa.

— Não preciso que me diga que me quer milhares de vezes, Victor, só que

demonstre, me mostre e me faça acreditar que realmente é merecedor do meu

amor — digo, encorajada. — Ainda sou jovem, mas já tenho meu filho e nunca

gostei desse lance de ficar saindo com vários rapazes. Sempre fui muito

reservada, e só estive com três homens, você foi o último, que me deu o Miguel.

No dia em que nos conhecemos abri uma exceção e me entreguei a um

desconhecido que tinha um sorriso perdido, mas ao mesmo tempo lindo e

conquistador.

— Estou disposto a te conquistar, Safira, mas não quero esconder nada de

ninguém. A Vitória precisa saber da nossa história — diz.

Assinto, meio agitada por dentro. Apesar do nosso encontro de anos atrás

ter sido rápido, ter engravidado de Victor nos fez ter mais do que uma história,

temos um laço que nunca poderá ser desfeito.

— Concordo com você. Amanhã contaremos juntos tudo o que aconteceu,

assim não haverá mal-entendido. — Mordo os lábios, meio nervosa. Quando


ergo o rosto e vejo as horas no relógio pendurado na parede tomo um susto. São

quase duas da madrugada, nem percebi como as horas tinham voado. — Merda

— murmuro.

— O que houve? — pergunta, curioso.

— São quase duas e o Miguel ainda está com a babá. Não estou

acostumada a deixá-lo com quem eu não conheço. Sem contar que não quero que

Vitória nos veja antes de contarmos a ela. — Levanto-me e começo a pegar as

minhas roupas no chão.

— Está certa. — Victor levanta-se também e pega suas roupas espalhadas,

enquanto eu coloco a minha e ajeito meu cabelo. Pelo menos tento.

Um pouco mais recomposta e pronta para sair, dou uma última olhada para

o pedaço de mau caminho que está se vestindo. Solto um suspiro e encaro a

porta, então dou as costas para Victor e paro quando ele começa a falar.

— Esqueci alguma coisa? — Dou uma de desentendida ao notar que ele

está com os olhos fixos em minha boca.

— Não sei, esqueceu? — Arqueia a sobrancelha e sorri de lado ao me


pegar pela cintura e roubar um beijo. Suas mãos descem até a minha bunda

enquanto levo meus dedos aos seus cabelos lisos e levemente bagunçados.

Quando sua língua quente e macia invade a minha boca, aprofundo nosso

beijo que até então estava lento, tornando-se voraz e cheio de saudade. Em

pouco tempo as mãos de Victor estão dentro da minha calcinha, os dedos

afundando em minha vagina com movimentos lentos inicialmente, e ficando

rápidos em seguida, torturando-me. Solto um gemido e mordo seus lábios para

castigá-lo, depois paro o nosso beijo e o encaro.

— Teremos muito tempo para curtir um ao outro. Agora eu preciso ir. —

Beijo-o rapidamente e tiro sua mão de dentro de mim, mesmo já estando a ponto

de me jogar nele para passar o resto da madrugada em seus braços.

— Tem razão — diz, compreendendo o meu ponto de vista.

— Boa noite, Victor.

— Boa noite, Safira — deseja-me antes que eu saia do escritório,

deixando-o para trás.

Subo a escada com cuidado e sigo para o meu quarto, mas gelo ao me
deparar com a minha amiga na porta, com a babá ao seu lado, pálida e com os

olhos levemente arregalados.

Meu Deus.

— Vitória, o que faz acordada uma hora dessas? — Quase gaguejo, mas

me contenho.

Minha amiga me avalia dos pés à cabeça e dá um sorrisinho desconfiado

antes de se aproximar.

— Onde você estava? — indaga.

— Fui... fui beber água! — falo o que vem à minha cabeça.

A babá balança a cabeça parecendo querer dizer algo, porém se cala.

— Eu também, e não a vi lá. Acho que nos desencontramos — retruca,

voltando a me avaliar.

— Deve ter sido isso. Depois de beber água, decidi tomar um ar lá fora. —

Sorrio, nervosa.

Vitória arqueia a sobrancelha, parece se divertir com algo, mas não

comenta.
— Esse perfume é igual ao do meu pai. — Ela torce o nariz e eu quase me

engasgo.

— Ah... certo... estou com um novo perfume. Não sabia que o sr. Guterres

o usava também. — Dessa vez gaguejo e me recrimino mentalmente.

— Meu Deus, respira, amiga! Estou brincando! — Gargalha. — A Marina

me disse que você tinha ido beber água. Eu nem desci, por isso não nos

trombamos, só estava brincando. Relaxa.

— E o que faz acordada uma hora dessa? Miguel está bem? — pergunto,

olhando para Marina, que assente.

— Está sim, senhora. A dona Vitória veio até o seu quarto e eu estava

acordada, não durmo cedo, estava lendo um livro — esclarece a babá.

Sinto o peso dos meus ombros sumirem.

— Safira, só respire, nada aconteceu. Eu tive uma... discussão com meu

casinho. Fiquei um pouco chateada e acabei perdendo o sono, então vim ver se

você estava acordada — diz e sorri. — Mas já me resolvi com ele, estamos bem

de novo. Mas é tarde, e o Miguel está dormindo, acho melhor ir para o meu
quarto. Vou voltar para o meu edredom quentinho, daqui a algumas horas tenho

que ir à faculdade.

— Certo. Tenha uma boa noite de sono — falo e sorrio para ela, que

assente e segue para o seu quarto.

Entro no meu quarto e vejo meu filho dormindo como um anjinho. Aviso à

Marina que vou tomar um banho e já volto. Enquanto tomo um banho, decido

que preciso agradecer a ela por não ter me desmentido, mas assim que saio do

quarto, eu a encontro dormindo na cama extra que foi colocada para ela. Assim

que amanhecer vou pedir desculpas pelo transtorno.

**

Acordo cedinho com a intenção de agradecer a Marina, mas não a

encontro. A cama extra já está desmontada, estamos no quarto somente eu e

Miguel. Em menos de meia hora, consigo tomar um banho e dar um banho em

Miguel antes de o deixar com seus brinquedinhos.

Um tempo depois, eu me aproximo da cama e pego Miguel, que resmunga

um pouco quando larga seu martelinho e leva as mãos ao meu rosto, apertando

as minhas bochechas.
— Oi, meu filho. Hoje iremos contar a Vitória a minha história com o seu

pai. —Encaro seus olhinhos azuis iguais aos de Victor e sorrio. Meu pequeno só

tem a cor do meu cabelo, o resto é a cópia fiel do pai.

Quase não dormi a madrugada passada, fiquei pensando nas mentiras que

inventei para Vitória. Quase tive um treco quando ela sentiu o perfume do pai.

Mesmo que eu quisesse contar a ela naquele momento o que estava acontecendo

eu não podia, Victor e eu combinamos de contar juntos, será melhor assim, nós

três reunidos para falarmos sobre a minha história com Victor.

— Auá, auá! — Miguel balbucia.

Rio da sua forma de comunicação enquanto se remexe em meus braços.

— Você quer água, meu amor? — indago, quando ele continua tentando

falar água.

— Auá, mamã! — repete e passa os bracinhos ao redor do meu pescoço,

apoiando o rosto em meu ombro.

— Vamos encher a sua tetê com um pouco de água.

A criança sorri quando menciono a sua mamadeira, que apelidei


carinhosamente de tetê. Vou até a cômoda e pego a mamadeira, em seguida, saio

do quarto com ele ainda em meus braços.

Desço a escada e sigo para a cozinha, onde me deparo com dona Joana

cantarolando. Sorrio para a senhora, que me cumprimenta alegremente antes de

apertar levemente as bochechas de um certo alguém que parece não ter gostado

muito do gesto ao fazer uma cara de choro. Para que ele não comece a chorar,

beijo seu rosto e falo que a “tetê” está quase pronta, logo tenho de volta uma

criança agitada e animada. Com Miguel ainda em meu colo, coloco um pouco de

água na mamadeira e dou para ele.

— Como esse menino é lindo, uma bênção, minha filha! — diz a senhora.

O meu sorriso aumenta, fico toda orgulhosa do meu filho. Que mãe não

ficaria quando o seu filho é elogiado?

— Ele é sim. — Coloco Miguel no chão e vou até o armário pegar os

utensílios para preparar seu mingau. — Dona Joana, a senhora sabe me dizer se

Vitória já saiu e se tinha uma moça com ela? E o sr. Victor está em casa ou saiu

também? — indago, de costas para ela enquanto mexo na panela.

— A menina Vitória saiu cedo, antes da seis e meia, e estava com uma
moça sim. O sr. Guterres está em casa, entrou no escritório cedinho.

Imagino que ele não vai sair hoje, uma vez que combinamos de falar com

a filha dele.

— Ah sim, obrigada — agradeço. Ela logo me pede licença, dizendo que

vai subir para ajeitar os quartos.

Minutos depois escuto um estrondo. Semicerro os olhos e me viro na

direção de Miguel e o encontro com uma panela nas mãos, batendo contra a

madeira do armário, enquanto outras estão jogadas no chão. Até que demorou

para ele encontrar uma nova distração.

— Meu Deus, filho, não destrua a casa do seu pai — resmungo, desligando

o fogo ao perceber que o mingau está no ponto.

Aproximo-me do sapeca que sorri para mim. A inocência de uma criança é

tão linda, que ele nem imagina o quanto é errado o que acaba de fazer. Ele está

achando a coisa mais divertida do mundo. Encaro seus olhos azuis seriamente, e

o danado cai na gargalhada quando eu me agacho ao seu lado e tiro a panela de

sua mão, guardando-a no armário.


— Meu amor, não pode fazer isso. Aqui é uma área proibida para você, tá

bom?

Sob o olhar curioso de Miguel, guardo as outras panelas e fecho o armário.

— Vejo que alguém está se divertindo essa manhã e deixando a mamãe de

cabelos brancos.

Quase caio para trás quando ouço a voz sexy de Victor. Olho para o

homem e o encontro piscando para mim enquanto se aproxima de nós.

— Bom dia — cumprimento-o, sorrindo e pegando Miguel no colo.

Coloco na ilha a mamadeira que estava jogada no chão.

— Bom dia, Safira — diz Victor, espirituoso. — Bom dia, filhão.

Meu coração quase erra a batida quando ele pega as mãozinhas de Miguel

e beija, deixando o garoto agitado em meus braços, doido para se jogar para o

pai, que logo nota e pega o filho.

— Pode ficar com ele enquanto preparo a mamadeira? — peço.

Victor assente e sorri para Miguel, que já está com a cabeça encostada em

seu ombro e com a mão na boca fazendo uns barulhinhos estranhos.


— Vou ficar com ele na sala até que você termine aqui.

— Certo. Não vou demorar muito — aviso. Ele me encara por longos

segundos, parecendo pensativo, mas logo volta a si e assente com a cabeça. —

Victor? — chamo-o antes que se vá.

— Sim?

Sinto um nó se formar em minha garganta.

— Iremos falar com Vitória ainda hoje?

— Sim. Assim que ela chegar, nós iremos conversar. Não se preocupe,

tudo irá se resolver — afirma, e eu respiro aliviada.

— Tudo bem, só estou um pouco inquieta — justifico.

Victor sorri, se aproxima de mim e rouba um selinho, me fazendo arregalar

os olhos.

— Não se preocupe, nada vai me fazer mudar a decisão de assumir o nosso

filho. — Ele leva uma mão ao meu rosto e o acaricia. — Eu preciso de vocês

comigo e os terei — diz, com uma certa possessividade.

Não falo nada, apenas balanço a cabeça e o deixo ir, então volto a preparar
a mamadeira. Em poucos minutos estou com a mamadeira de Miguel pronta.

Sorridente, lavo os utensílios que sujei e sigo para a sala. Travo os pés ao ver a

cena linda na minha frente — Victor está com Miguel sentado em seu colo

enquanto conversa com a criança de uma maneira tão engraçada e fofa, que meu

coração se enche de amor. Aproveito que nenhum dos dois notou a minha

presença para os observar um pouquinho.

— A mamãe me deixou te pegar no colo hoje sem ficar brava, você viu? E

ela ainda sorriu. Acho que ela acha que somos lindos juntos — diz Victor,

enquanto continuo admirando-os. Miguel olha para o pai com curiosidade.

— Hum-hum... — pigarreio para chamar a atenção dos dois homens da

minha vida.

Homens da sua vida? De onde tirou isso, Safira? Meu subconsciente me

condena por alguns segundos.

Meu Deus. Acho que a cena de pai e filho juntos deixou meu cérebro um

pouco bugado.

— Olha quem chegou, garotão — diz Victor, ajeitando Miguel em seu

colo, que estende as mãos em minha direção e fica abrindo e fechando os


dedinhos, como se estivesse me chamando.

— Tetê, mamã! — diz meu menino animadamente, ainda mexendo os

dedinhos enquanto me aproximo.

— O que é tetê? — A voz de Victor soa curiosa.

Sorrio assim que me sento ao lado deles.

— É um apelido carinhoso que eu e Miguel arrumamos para a mamadeira

dele — falo e logo escuto uma gargalhada.

— Agora entendi a agitação toda dele — profere, divertido, sem tirar os

olhos de mim.

O azul profundo dos seus olhos me causa sensações estranhas — meu

coração acelera e um maldito frio na barriga aparece. Quanto mais próximos

estamos mais minhas pernas tremem. Parece que o espaço ao nosso redor não é

suficiente para nós dois, porque minha respiração fica ofegante, como se eu

precisasse de uma quantidade absurda de ar para encher os meus pulmões.

Dizem que esses sintomas são de pessoas apaixonadas, que estão amando, mas

eu me pergunto se é mesmo isso ou apenas uma atração.


— Sim, ele adora a tetê dele — falo, disfarçando minha timidez por ter os

olhos de Victor sobre mim por muito tempo. Coloco a mamadeira nas mãos de

Miguel e não demora para que ele comece a sugar seu mingau.

— Ele já toma sozinho? — pergunta, parecendo impressionado.

— Aham, ele faz algumas coisas sozinho, tenta até passar a escova no

cabelo de uma maneira desajeitada — falo, rindo.

Victor deita nosso menino no colo e fica o observando mamar, as

expressões que Miguel faz são gostosas de olhar.

— O que decidiu sobre o trabalho que Lucas te ofereceu? — Sou pega de

surpresa ao ouvir sua pergunta.

— A proposta é muito boa. Não preciso ficar o dia todo na rua, então

posso dar atenção ao meu filho. — Passo a mão nos fios loiros do cabelo de

Miguel. — Vou trabalhar com vocês.

— Fico feliz. Você pode usar o meu escritório para trabalhar se quiser, lá

tem tudo o que precisa — sugere, me surpreendendo mais uma vez.

— Claro. Obrigada. — Sorrio, agradecida. Volto a fixar meus olhos em


Miguel, que parece estar alheio a nós. Já parecendo mais confortável, Victor

pega na mamadeira e ajuda o filho a mamar.

Minutos depois de conversas e risadas, ouvimos a campainha tocar

insistentemente. Levanto-me para atender, mas logo o arrependimento me atinge

quando vejo ninguém menos que Alessandra na minha frente, com o semblante

carregado de ódio. Seus olhos estão quentes de raiva, ela não esconde o quanto

me odeia.

— Bom dia — cumprimento-a e dou espaço para que ela entre.

Sou ignorada com sucesso pela mulher, que passa por mim com o nariz

empinado. Ela segue para a sala e eu vou atrás, louca para pegar o meu filho e

subir para o meu quarto. Não quero nem ver a confusão que a naja vai provocar.

— Vejo que nem esperaram tanto para começarem a brincar de casinha. —

A voz dela é ácida, amargurada.

Tento pegar Miguel, mas Victor me impede ao murmurar que está tudo

bem. Alessandra está a poucos metros de distância dele, com as mãos na cintura

e um olhar soberbo.
— Alessandra, o que faz aqui? — pergunta Victor, pacientemente, ainda

sentado no seu lugar.

Mas a mulher não parece disposta a ter uma conversa civilizada.

— Vim para conversarmos. — Ela olha para mim com desdém e depois

para o meu filho. — Mas parece que não esperou nem um dia para me substituir

por essa vagabunda e pelo filhinho bastardo.

Respiro fundo e fecho os punhos. No fundo, sei que ela está certa, mas não

aceito que me ofenda dessa maneira, está sendo dura demais.

— Alessandra, peço que se controle e retire o que disse sobre meu filho.

Ele não é nenhum bastardo! — fala o homem, elevando o tom de voz.

— Quem te garante que essa garota não saiu dando para vários homens e

engravidou de um qualquer, para depois vir atrás de você como uma mosca

morta só para que você assumisse o filho dela? Me responda, Victor! —

Alessandra se altera mais uma vez.

Para evitar mais problemas, pego Miguel dos braços do pai.

— Esfrie a cabeça e depois conversamos. Por favor, não vá tão longe com
suas palavras, ninguém aqui é criança. Volte para sua casa e quando estiver mais

calma nós conversamos — Victor pede, impaciente.

Eu poderia revidar as suas provocações, mas seria errado. Ela é uma

mulher magoada, está com raiva, eu a entendo. Para evitar que essa discussão se

prolongue, eu me viro para subir. Mas não saio do lugar quando Alessandra se

coloca na minha frente. Rapidamente, Victor se levanta, vai até a porta e a abre.

— Vá para casa, Alessandra, quando estiver mais tranquila você me

procura — diz, apontando a saída para ela, mas Alessandra o ignora.

— Com licença — peço, tentando passar por ela.

Alessandra dá um sorriso maldoso e balança a cabeça negando.

— Vou te ensinar que não se envolve com homem comprometido.

Mal tenho tempo de assimilar suas palavras quando sua mão atinge meu

rosto com força. Sem equilíbrio por ter sido empurrada em seguida, aperto meu

filho nos meus braços para protegê-lo e coloco a mão em sua cabeça para que

não se machuque quando caio no chão. Com o susto, Miguel dá um grito e

começa a chorar.
— SAIA DA MINHA CASA AGORA! AGORA! — O grito furioso de Victor é

assustador.

Sento-me e vejo o homem vir a passos largos até a ex e pegá-la pelos

braços.

— Me solte, Victor! Está vendo o que essa rata fez? Ela me provocou! Ela

é a culpada de tudo isso! — grita, descontroladamente, enquanto Victor a

arrastada até a saída.

Com o coração acelerado e assustada, começo a soluçar, ainda no chão.

Miguel ainda chora enquanto olho cada parte do seu corpo para ver se não se

machucou com a queda. Por muito pouco não caímos em cima da mesa de centro

de vidro. Essa mulher é louca, preciso manter distância dela. Quase nos feriu

gravemente.

— O que está acontecendo aqui, posso saber?

Minha alma quase sai do corpo quando a minha amiga entra na casa com

Lucas ao seu lado. Ambos arregalam os olhos quando me veem no chão, com

Miguel aos prantos.


— Shhh, já passou, meu amor. — Soluço, com os olhos ardendo ao tentar

me levantar. Meus braços latejam um pouco, minhas pernas estão trêmulas e

minha visão embaçada. Por sorte não me machuquei, mas estou um pouco

dolorida.

— O QUE ESTÁ ACONTECENDO AQUI? — Vitória grita, correndo em minha

direção.

— Vamos, querido, fale para a sua filhinha o que está acontecendo! Fale

para ela o que você e a amiguinha sonsa andaram aprontando pelas costas dela!

Com as mãos na cabeça, Victor se afasta de Alessandra.

Pronto, ferrou. Tudo perdido. Vitória nunca irá me perdoar.

Olho para a minha amiga e vejo que ela olha para o pai e depois para mim.

Lucas permanece ao seu lado, pálido e calado.

— Cale a sua boca, Alessandra, não se envolva — Victor rosna e tenta

colocar Alessandra para fora, mas ela se debate.

— Não me toque, não saio daqui até dizer tudo o que está entalado!

Vamos, conte a Vitória que você está brincando de casinha com a melhor amiga
dela. Aproveita e fala também que esse menino supostamente é seu filho, que

vocês se conhecem faz tempo! Fala para ela que essa criança foi feita no dia em

que a morte da sua esposa estava completando três anos. Conta que você estava

em um bar enchendo a cara, seduzindo essa cadela. — Alessandra solta tudo de

uma vez.

Cada palavra que sai da boca dela estraçalha o meu coração. Era para

Victor e eu contarmos, íamos fazer isso, mas agora Vitória recebeu os fatos

distorcidos.

Sentindo-me humilhada, deixo as lágrimas caírem. Olho para a minha

melhor amiga e a encontro com a cabeça baixa, parecendo pensativa. Enquanto

ela permanece assim, a sala fica em completo silêncio.

De repente, Vitória se afasta de mim e eu sinto o vazio, o abandono. Fecho

os olhos com força e abraço Miguel, desejando que tudo não passe de um sonho.

Eu sei que Alessandra está magoada, mas ela não tinha esse direito. Ela foi baixa

demais.

— Saia da nossa casa, Alessandra. — Vitória se aproxima da ex-madrasta

e fica de frente para ela.


Aproveito que Miguel já está mais calmo para me levantar. Eu o coloco

sentado no sofá e permaneço ao seu lado.

— O quê? Como assim? — O tom surpreso na voz da venenosa é nítido.

Quando os olhos de Vitória se viram para mim, eu baixo a cabeça,

envergonhada.

— Não que seja da sua conta, mas eu sempre soube do meu pai e da Safira.

Estou feliz por ele ter encontrado uma mulher que realmente o ame, e que não

esteja somente atrás do dinheiro dele. Que não seja igual a você. Então, saia da

nossa casa e não volte nunca mais, aqui não tem espaço para você. Nunca teve,

já deveria ter percebido isso! O que você fez foi muito baixo, foi cruel.

O discurso de Vitória deixa todos surpresos. Eu nunca esperei por isso. Ela

já sabia? Como?

— Vocês todos são podres! Pensei que tivesse encontrado uma família,

pessoas decentes, mas não. Estou decepcionada! — A mulher chia, furiosamente.

— E eu estou orgulhosa por meu pai finalmente ter aberto os olhos e visto

que Safira é a mulher certa para ele. — Minha amiga fixa seus olhos em mim e
sorri com cumplicidade, então a vontade de chorar vem com força total.

Meu Deus, ela sempre soube. Sempre.

— O que essa menina tem para oferecer a um homem como Victor? Sexo?

Apenas isso! Já eu, tenho uma profissão, sou uma mulher renomada, madura,

eficiente...

Mas antes que Alessandra termine de falar, Victor a puxa para fora.

— Amanhã vá ao restaurante pegar as suas coisas. Você está demitida! —

Victor diz alto e bom som. — Não chegaríamos a esse ponto se você não tivesse

feito essa merda toda. Você quase machucou Safira e a criança, Alessandra. Que

tipo de pessoa você é? — Sem dar tempo de ela responder, ele fecha a porta na

cara dela.

— Melhor eu ir embora, mais tarde eu volto. Vocês precisam conversar —

o amigo de Victor finalmente se manifesta antes de sair rapidamente.

— Filha, íamos te falar hoje, mas aconteceu isso tudo e... — Victor está

preocupado, sei disso. Mesmo que Vitória tenha dito que está tudo bem, nada

está bem.
— Quando eu disse que estava tudo bem era sério, pai. — Minha amiga

vai até Victor e o abraça. Assim que eles se afastam e ela olha para mim e

Miguel, eu me sinto melhor ao notar que não há mágoa nela. — Sei de vocês

desde o dia que estavam discutindo porque você estava com Miguel no colo. Eu

estava descendo a escada, mas quando os ouvi falando alto esperei para ver o

que estava acontecendo, e acabei escutando demais.

— Vitória, me desculpe por não ter sido sincera desde o início, juro que

essa não era minha intenção. Eu fiquei com medo da sua reação — digo com

sinceridade.

— Eu sei que não queriam esconder nada de mim, entendo. Até mesmo os

perdoo por terem deixado que a Alessandra me contasse essa novidade que já era

velha para mim. — Ela sorri e revira os olhos. — Já sabia de tudo, até mesmo

que estavam trancados no escritório na madrugada passada. Meu Deus, essa

parte nem quero imaginar. E quando forem aprontar tomem banho depois, o seu

perfume estava impregnado na Safira, papai.

— Vitória, por favor! — Victor fica envergonhado e repreende a filha.

— Calma, pai, estava brincando. Quero deixar claro que quando as minhas
suspeitas foram se confirmando, confesso que fiquei perplexa. Fiquei chocada ao

descobrir que meu afilhado na verdade é meu irmão caçula. No início eu quase

surtei, mas deixei para questionar vocês no momento certo. Eu ia chamar os dois

hoje para saber toda a história, não aguentava mais guardar as coisas para mim.

Mas quando cheguei encontrei a Alessandra dando aquele show, então eu deixei

para ver até onde ela ia.

Minha amiga me surpreende mais uma vez. A vida é uma caixinha de

surpresas.

— Como se sente ao saber que Miguel é seu irmão? — pergunto, meio

nervosa.

— Estou bem com isso, afinal, já sabia. Só não podia sair falando por aí,

estava tomando coragem para conversar com vocês para que abrissem o jogo —

ela diz, dando de ombros. — Amiga, ainda posso ser a dinda do meu irmão,

certo?

— Claro que sim. — Lágrimas caem dos meus olhos. Emocionada, olho

para Victor e o encontro sorrindo, posso ver que está mais tranquilo do que eu.

No fundo, ele sabia que a sua filha seria compreensiva.


— Oh... meu lindinho, vem com a irmã. Quero te mimar mais ainda! O seu

pai e sua mãe que lutem, porque a partir de agora você é meu único amor, meu

crush supremo! — Ela vai até o irmão e o pega no colo.

Miguel já está animado, batendo as mãozinhas uma na outra. Ele cai na

gargalhada quando a irmã o deita no sofá e começa a fazer cócegas em sua

barriguinha. Vitória o beija e morde de leve, e os gritinhos do meu filho aquecem

meu coração. Ele está feliz depois de um belo susto.

Nada como um dia após o outro. Me sinto mais leve por saber que Vitória

me aceita. Nunca esperei que ela reagisse dessa maneira, eu a subestimei, pensei

que fosse me odiar e que não me quisesse mais por perto. A maneira como foi

compreensiva e madura me fez perceber que nunca conhecemos cem por cento

as pessoas e que a qualquer momento podemos ser surpreendidos, seja de uma

forma positiva ou negativa.


VITÓRIA

Depois da confusão que aconteceu essa manhã, eu subi para o quarto e


passei a tarde toda trancada. Estava chateada, mas não com o relacionamento do

meu pai e da minha amiga, e sim com algo pessoal que me irritava muito.

“Não deveria ter feito aquilo, você disse que não ia contar. Pelo menos
você foi sensata?”

Releio a mensagem de Lucas e o ignoro. E irei ignorá-lo pelas próximas


semanas também. O desgraçado ousou trazer uma das suas amiguinhas para a

minha casa, e como acompanhante dele.

“Não é da sua conta e vá para o inferno. Você e a sua amiguinha, seu


babaca de merda. Nem pense que a conversa que tivemos pela manhã vai aliviar

a sua cara, seu conquistador barato! Você está lidando com Vitória Guterres!”

Digito com raiva, e não demora muito para eu ter a resposta.

“O que queria que eu fizesse? Te levasse como minha acompanhante? Seu

pai me mataria, porra.”

Filho da puta.

Jogo meu celular ao meu lado na cama e decido de uma vez o ignorar. Ele

está revoltado porque eu abri o jogo para o meu pai e a Safira. Eles estavam tão

nervosos por eu ter ouvido tudo daquela maneira, que nem perceberam que

menti uma boa parte da história.

Eu já tinha a confirmação do envolvimento deles, e quem o fez foi o

melhor amigo do meu pai. Obriguei Lucas a me contar depois de eu ter ouvido a

conversa deles em uma manhã no escritório do papai quando fui até lá para

questionar a liberdade que Alessandra estava tendo em nossa casa.

Esperei Lucas ir embora da minha casa para sair à procura dele e colocá-lo

contra a parede. Ele abriu o jogo, mas me fez prometer que eu não falaria nada.
Concordei com sua condição, claro, então o ouvi atentamente.

As farpas trocadas quando papai estava com Miguel no colo na sala eram

muito íntimas para duas pessoas desconhecidas. Ainda me lembro perfeitamente

daquele dia, fiquei parada no meio da escada ouvindo cada palavra dita.

Confesso que na hora eu quis ir até eles e exigir toda a história, porém, por

amar muito meu pai e Safira deixei-os à vontade, me fiz de desentendida por

semanas. Aos poucos fui juntando as coisas e não deu outra, estava mais do que

confirmado que eu tinha um irmãozinho.

Levei um grande susto, quase surtei de início. Mas por que eu os julgaria,

sendo que minha mãe havia partido há três anos quando se conheceram? Meu

pai tinha que ser feliz, ele merece ser feliz, e eu não o impediria, mas teria que

ser com alguém que o amasse de verdade, e Safira com certeza é essa pessoa.

Sim, muitas vezes fui imatura, mas só de ter que aturar aquela cobra

namorando o meu pai me fazia agir de cabeça quente, como uma garota mimada.

Aquela mulher nunca mereceu o meu pai, ela jamais será boa o suficiente para

ele.

Eu não vou muito com a cara da Alessandra, e não é por ter medo de ela
tomar o lugar da minha mãe — sei que uma mãe nunca pode ser substituída na

vida de um filho —, mas por saber que ela é mentirosa. Um dia eu a peguei

falando com o antigo contador do Bella Flor, a conversa deles era muito íntima

para uma pessoa comprometida. Ela dizia a ele que em breve se tornaria a

proprietária da empresa e que muita coisa mudaria. Alessandra se achava a dona

do local, era nítido o interesse que ela tinha nos negócios do meu pai. Meu ódio

por ela começou a nascer nesse dia.

De repente, ouço algumas batidas à minha porta e autorizo a pessoa a

entrar.

— Podemos conversar? — Meu pai entra e pergunta. Ele se aproxima e se

senta ao meu lado na cama, ficando por um longo tempo em silêncio.

Meu pai me trata como se eu ainda fosse uma criança, ele precisa perceber

que eu cresci, sou uma mulher adulta. Não sou tão inocente como ele acha, sei

de coisas que ele nem imagina, coisas que ele tem medo de me contar pensando

que vou ficar magoada ou que irá me partir ao meio.

— Ainda está pensando em tudo o que aconteceu? — indago, passando os

braços ao redor dos seus ombros.


— Tem certeza de que está tudo bem com você? Não está magoada? Com

raiva de mim por ter mentido? — Faz várias perguntas e eu dou risada.

— Sr. Guterres, tenho sangue quente. Acha que se eu estivesse com raiva

já não teria colocado essa casa de cabeça para baixo? — falo, bem-humorada.

— Não sei, filha, faz tanto tempo que não temos um momento assim... que

não nos sentamos para conversar. Normalmente é só um bom dia, boa tarde, boa

noite que damos para o outro, ou quando estamos fazendo nossas refeições

juntos trocamos algumas palavras — diz, meio pensativo. — A sua atitude me

surpreendeu, não imaginei que aceitaria tão bem, ainda mais do jeito que ficou

sabendo. Você já sabia mesmo sobre mim e Safira? Ou só falou tudo aquilo para

Alessandra para não ficar por baixo?

— Quer saber mesmo? — pergunto.

Ele se acomoda melhor na cama e bate a mão na coxa para que eu deite a

minha cabeça.

— Sim, querida — fala, passando a mão em meu cabelo.

— Eu já sabia, pai, é verdade. Estava esperando que vocês viessem falar


comigo, esperando que estivessem preparados para isso. Eu adoro a Safira, ela é

como uma irmã, e acho que vocês se conhecerem foi coisa do destino. Assim

como eu conhecê-la quando ela mais precisou — digo e ele sorri. — Quando eu

soube sobre vocês, confesso que fiquei doidinha para encher vocês dois de

perguntas e meio irritada por não terem me dito que já se conheciam quando se

reencontraram, mas eu não sou louca de virar as costas para a minha melhor

amiga sabendo que vocês se conheceram antes da minha amizade com ela, e de

tudo o que aconteceu. Quando a Alessandra começou a falar aquelas

barbaridades da Safira, eu a quis pegar pelo cabelo e jogá-la na rua, mas deixei

que o senhor a mandasse embora. Era um direito seu fazer isso, pegar a vadia

pelos braços e a tirar da nossa casa.

— Estou orgulhoso de você e muito surpreso com a sua atitude. Nunca

imaginei que aceitaria tão bem assim — afirma, meio sem graça.

— E quem não aceitaria uma criança fofa daquelas como irmão e uma

melhor amiga como boadrasta? Mais do que aceito os dois na minha vida, já

pode marcar a data do casamento.

— Engraçadinha você. — Ele gargalha e aperta o meu nariz.


— Estou falando sério. — Faço uma careta. — O senhor pretende levar a

sério a minha amiga, não é? Não me decepcione, sr. Victor. — Semicerro os

olhos.

— Ainda estamos nos conhecendo e gosto dela, acho que até estou

apaixonado. Fazia tempo que não me sentia assim, e pretendo descobrir até onde

iremos chegar — diz, me deixando esperançosa.

— Sei que irão chegar ao altar. Ah, pai, vocês podem se conhecer melhor

depois de casados, para que esse rodeio todo? — falo, brincalhona.

— Nem começamos a namorar e você já quer que eu leve Safira para o

altar? Que animação é essa, mocinha? — Sua voz é calorosa.

— Minha amiga merece as melhores coisas do mundo, sr. Guterres. Trate

de pedir Safira em namoro ou em casamento logo. O senhor vai se ver comigo se

maltratar o coração dela. Qualquer vacilo que der com ela irá se ver comigo —

aviso-o, enquanto o encaro.

— Prometo que serei maravilhoso para ela. — Consigo sentir a verdade

em suas palavras. — Vitória, preciso te contar algo sobre a sua mãe... esclarecer

coisas do passado que ainda me perseguem... e te pedir perdão por nunca ter tido
coragem de te contar... fiquei com medo de partir o coração da minha garotinha.

Você cresceu e eu não percebi isso... — diz, meio pensativo e inseguro.

Estou mais do que pronta para escutar o que ele tem a dizer. Sempre o

ouvia comentar com o Lucas que precisava me contar como era a minha mãe de

verdade, mas nunca entrava em detalhes, só afirmava que não se sentia pronto.

— Pode falar, estou pronta. — Meus olhos ardem e minha voz sai

embargada. Nem sei do que se trata, mas o seu tom deixa claro que não é nada

bom.

— No dia em que sua mãe morreu... bem, ela... ela estava fugindo com um

homem, estava nos deixando. Mesmo eu tendo dado tudo a ela, acho que nunca

foi o suficiente, porque ela colocou um desconhecido que se passava por seu

irmão dentro da nossa casa. Ela me fez sustentar o seu amante por anos. — Meu

coração se estraçalha. Meu pai fala meio rancoroso enquanto acaricia meus

cabelos, e eu deixo as lágrimas caírem. — Aline nunca foi uma boa mãe, ela te

maltratava por causa do Marcelo, brigava com você por causa dele. Me lembro

como se fosse hoje, quando a vi gritando com você, com a própria filha, porque

o desgraçado do amante dela havia arrumado uma namorada e a levou a nossa


casa para nos apresentar. Por causa dele ela se transformou, destruiu o nosso lar.

Sua mãe deveria ter sido sincera comigo, deveria ter aberto o jogo, poderíamos

terminar o nosso relacionamento amigavelmente. Mas ela preferiu nos dar as

costas e acabou cavando a cova dela e do amante.

“Por anos me senti sufocado por ser covarde e não contar a você que a

mulher que tanto admira foi um monstro. Por isso que todo ano, no dia da morte

dela, eu me afastava, fugia para não olhar em seus olhos e... eu não tinha

coragem suficiente para te falar o que tanto me incomodava. E eu também não

queria te magoar, afinal, sua mãe já estava morta... do que adiantaria te contar?

Apagar a imagem boa que você tinha dela? Machucar seu coração por algo que

já tinha passado? Na minha cabeça era desnecessário trazer o passado de volta,

mas então percebi que errei por não ter sido sincero, por ter ocultado durante

anos a verdadeira face da sua mãe. Aquela mulher nunca mereceu o seu amor e a

sua admiração. Eu só não me arrependo de ter conhecido a Aline, porque ela me

deu você, Vitória, o meu orgulho, a minha vida, o meu tudo. Quando você for

mãe vai entender o meu sentimento de proteção. Quando somos pais e amamos

nossos filhos somos capazes de tudo por eles.”


Assim que meu pai termina de falar, fico em silêncio por longos minutos,

apenas choro enquanto ele limpa meu rosto banhado pelas lágrimas. Acabo me

recordando de alguns fatos, principalmente da minha mãe gritando comigo sem

motivo algum, as lembranças passam em minha cabeça como um filme.

Confesso que estou surpresa, mas ao mesmo tempo nem tanto. Uma vez eu

a vi discutindo com o meu suposto tio no corredor, ela tentou bater no rosto dele,

mas quando me viram tentaram disfarçar e ela me mandou voltar para o meu

quarto.

Por muitos anos eu a venerei, sofria com a sua ausência em minha vida,

sofri quando meu pai começou a namorar a Alessandra, sofria todo ano, quando

ele desaparecia ao completar mais um ano da morte dela. Para mim, meu pai

nunca a tinha amado, e eu o julguei cruelmente. Meu pai só tentava amenizar a

minha dor, enquanto eu o crucificava em silêncio. Se eu disser que neste

momento tenho raiva da minha mãe estarei mentindo. Sim, ela errou, mas não

sou igual a ela, sou muito melhor, não consigo ter raiva das pessoas que eu amo

e, apesar de tudo, Aline é uma delas. Sempre será minha mãe, ela me deu a vida

e agradeço a ela por isso.


— Me perdoa por não ter sido sincero desde o início? — Sua voz sai

arrastada.

Balanço a cabeça negando, levanto-me e o abraço fortemente.

— Por que eu teria raiva do meu pai? O senhor só quis me proteger, não há

nada para perdoar. — Beijo seu rosto e o abraço mais forte. Ficamos assim por

alguns minutos. — Sr. Guterres, eu te amo, te admiro muito, o senhor é um

paizão, meu porto seguro... meu melhor amigo. Você me criou, me amou, me

deu tudo do bom e do melhor, o que mais eu poderia exigir? Nada. Você fez o

que achou que era necessário, e eu entendo. Não há rancor, não há nada, apenas

amor. Eu te amo, pai, e jamais viraria as costas para você por ter agido como

qualquer pai que ama seu filho. Vamos esquecer o passado, vamos viver o

presente, as coisas ruins devem ser deixadas para trás.

— Está certa. Eu também te amo, filha — diz, carinhosamente.

— O senhor pode ficar mais um tempo comigo? Está tão bom ter um

momento só nosso.

— Claro.
Agradeço mentalmente e volto a deitar a minha cabeça em seu colo,

fechando os olhos quando o sono me domina enquanto ele acaricia os meus

cabelos.

— Descanse um pouco, quando acordar ainda estarei aqui.

**

Acordo e me pergunto se tudo não passou de um sonho, mas então olho

para o lado e vejo meu pai sentado me observando. Ele me dá um pequeno

sorriso e eu retribuo. Papai realmente ficou até que eu acordasse.

— Dormi por muito tempo? — pergunto, me espreguiçando.

— Só duas horas. — Sorri ainda mais.

Só? Coitado, deve estar com as costas doendo por ter velado meu sono.

— O senhor ficou mesmo esse tempo todo aqui? — Arregalo os olhos e

meu pai assente.

— Promessa é dívida. — Pisca para mim.

— Obrigada. — Agradeço, dando um enorme sorriso.

— E, você? O que tem feitos nos últimos dias? Está namorando algum
rapaz?

Suas perguntas me pegam de surpresa, não esperava ter essa conversa tão

cedo.

— Sim, estou saindo com um cara e ele é mais velho. Eu gosto dele, mas

não sei se me leva a sério, já que acha que sou a garotinha do papai, mimada

demais, coisas assim — confesso, com um pouco de insegurança e sem coragem

para olhar para o meu pai.

— Ele é mais velho quanto, Vitória? E quem é? Eu o conheço? — Ele me

enche de perguntas.

— Acho que alguns bons anos, uns treze, talvez doze — declaro e mordo

os lábios. — E sim, o senhor o conhece...

— Ótimo! Traga-o aqui para que possamos conversar, preciso saber quais

as intenções dele com a minha filha.

Arregalo os olhos quando noto a sua voz autoritária.

— Pai, por favor. Respeite o meu tempo, pode ser? Eu não sei se irá dar

certo e nem... se ele quer algo sério comigo. Não me ouviu dizendo que ele me
acha mimada, filhinha de papai? — digo com pesar.

— Se ele acha isso, então não a merece. Larga esse cara e arruma alguém

decente que a ame e a valorize, e não um mané que te chama de filhinha de papai

e mimada. Você tem que ter alguém que diga todos os dias que a ama e que a

trate como uma rainha.

Fico emocionada com as palavras dele, estava sentindo muita falta desse

lance de pai e filha que sempre tivemos. Aquela vadia estava conseguindo

afastá-lo de mim.

— Obrigada, papai. Agora me fala, por que perguntou a idade dele?

Será que desconfia de algo?

— Só queria ter certeza de que não está namorando um vovozinho —

provoca e eu dou risada. — Brincadeira, filha. Você me disse que ele é mais

velho, fiquei curioso. Só quero saber quem é meu genro.

Se o senhor souber, tenho certeza de que vai mudar de ideia e me envia

para um convento. Se bem que não me aceitariam lá, não sou mais virgem, muito

menos inocente.
— Quando eu me sentir à vontade para falar mais sobre ele, pode ter

certeza de que o senhor será o primeiro a saber. — Sento-me na cama.

— Espero que sim, dona Vitória — diz, com seriedade.

— O senhor pode me dar licença agora? Preciso atender essa ligação —

peço, tentando não demonstrar o quanto estou nervosa quando meu celular

começa a tocar.

Lucas é um desgraçado insistente.

— Claro, pode conversar com o seu namoradinho, já estou de saída — diz,

bem-humorado, e sai do quarto.

Quando estou para atender à ligação meu pai entra novamente no quarto.

— Vitória? — Ele dá um sorriso para mim, mas eu não entendo o motivo.

— O quê? — Arqueio a sobrancelha e o encaro.

— Use camisinha, sou muito jovem para ser avô. — Ele faz uma careta.

— Pelo amor de Deus, pai, é nojento conversar essas coisas com o senhor!

— Meu rosto fica vermelho. Pego um dos travesseiros da minha cama e jogo na

direção dele. Por fim, ele sai gargalhando.


Levanto-me e o sigo pelo corredor, rindo alto por ter conseguido me

desestabilizar. Olho para o meu aparelho e noto que Lucas desistiu da ligação,

então, frustrada, afundo meu rosto no colchão.

**

Mais uma ligação perdida. Olho para o celular e vejo as várias ligações

perdidas de Lucas. Não estou a fim de me estressar com um cara que não sabe o

que quer. Quando ele parar de colocar empecilhos no nosso relacionamento nós

podemos ter uma conversa civilizada, enquanto isso não acontece vai ter que

ficar de molho.

Estou terminando de pentear meu cabelo quando ouço a voz de Safira e

algumas batidas à minha porta.

— Pode entrar. — Ajeito minha roupa na frente do espelho.

— Vamos jantar? — Ela entra e se senta na minha cama, então me viro

para ela e sorrio.

— Já estava descendo, mas obrigada por ter vindo me chamar. Quero falar

com você antes. E cadê minha gostosura? — pergunto por Miguel.


— Está com o Victor. — Rio quando suas bochechas ficam avermelhadas.

— Sobre o que quer falar?

— Amiga, estou megachateada porque não vamos poder conversar sobre

os nossos homens. Quer dizer, você não vai — provoco-a.

— E por que não? — Arqueia a sobrancelha.

Oh, Jesus, como é lesada.

— Acha que vou querer saber como é o sexo com meu pai? Eca, que nojo!

— Faço um movimento com o dedo na garganta, só então ela se liga e cai na

gargalhada.

— Você é terrível!

— Agora é sério, preciso te contar algo, mas promete que não vai pirar? —

Aproximo-me dela e me sento ao seu lado.

— Conta logo, estou curiosa! E não me peça para não pirar, não vou

prometer se nem sei sobre o que se trata. — Safira está toda animadinha.

— Sabe o cara que estou saindo? — Minha voz quase sai inaudível. —

Então, falei ao meu pai sobre ele, mas não quem é. Acho que ele vai pirar
quando souber que estou saindo com o melhor amigo dele... o mesmo que ele

vive dizendo que vai ser o meu padrinho.

— Meu Deus, Vitória. Como isso aconteceu? — Chocada, Safira

rapidamente leva a mão à boca.

— Faz mais ou menos seis meses. Eu estava em um bar com alguns

amigos da faculdade e encontrei Lucas bebendo sozinho, até achei estranho um

cara como ele, bonito e gostoso, sem companhia, então decidi ir cumprimentá-lo.

Por fim acabamos em uma conversa muito interessante, e naquele momento a

minha paixonite de adolescente que eu sentia pelo amigo do meu pai voltou —

esclareço, mordendo os lábios, nervosa. — Clichê, não é?

— Não mais clichê do que se envolver com o pai da melhor amiga — diz e

rimos. — Mas o que seria de nós sem os clichês da vida? Enfim, fale mais da sua

aventura. — Minha amiga encosta a cabeça em meu braço.

— Desde que eu era adolescente tenho uma queda por Lucas, mas ele

nunca me notou, e naquele dia no bar enquanto conversávamos acabei

investindo, joguei todo meu charme, porque eu sabia que ele nunca tinha me

visto como a sua afilhada. Meu pai que colocou na cabeça que seu melhor amigo
será o meu padrinho, mas graças a Deus nunca fui batizada, jamais aceitei essa

loucura. — Suspiro. — Aquela noite foi um momento só nosso, único, e não

rolou nada de mais, ele foi bem respeitoso, um gentleman. Depois disso a gente

ficou trocando mensagens por alguns meses, e um dia cansei e decidi tomar a

iniciativa, eu sabia que o Lucas tinha medo de se abrir comigo, provavelmente

tinha receio por causa do meu pai. Acredita que fui eu que tomei a iniciativa de

beijá-lo? Só então ele começou a se soltar, e o tempo foi passando e estamos

nessa enrolação. Ficamos escondidos porque o idiota tem medo de dizer ao meu

pai que estamos saindo.

— Uau... Uau, estou chocada, confesso. — Ela me encara, a surpresa

estampada em seu rosto.

— E eu decepcionada com aquele cachorro. Ele disse que só trouxe aquela

cadela para o jantar da Alessandra para que o meu pai não desconfiasse de nada,

e blá-blá-blá. Se o Lucas me irritar muito, ficar nessa de não termos algo mais

porque meu pai é seu melhor amigo, e que isso e aquilo, eu o largo e arrumo

outro muito melhor e mais corajoso. É assim que as coisas vão funcionar agora

— digo, cansada dessa situação.


— Diga exatamente isso para ele, tenho certeza de que o Lucas vai querer

até te pedir em casamento — diz Safira, brincando. — Os homens só correm

atrás quando veem que as mulheres não estão para brincadeira. Alguns gostam

de viver perigosamente, e se virem que têm concorrência correm para ser o

primeiro da fila.

— Até que é uma boa ideia, e Lucas parece ser desse tipo. Imbecil gostoso

— resmungo, revoltada. — Mas se ele não tomar uma atitude logo vai acabar

perdendo, eu sou do tipo que me apego rápido e esqueço mais rápido ainda.

— Tenho até dó dele. — Safira ri. — Vamos descer?

— Sim, vamos. Safira, depois você me conta como conheceu o meu pai?

Fiquei curiosa, quero saber tudo, tudinho. Quer dizer, nem tudo, a parte sexual...

Eca, eca...

— Conto sim — ela ri mais uma vez —, mas agora vamos, seu pai deve

estar nos esperando. — Ajeita o vestido e sorri para mim.

Falo para ir na frente, pois vou mandar uma mensagem para o Lucas.

Decido fazer um ultimato: ele decide o que quer, ou tudo estará acabado entre

nós, vou voltar para a pista. Vou à procura de um homem de verdade, que não
seja covarde como ele.

Assim que eu mando a mensagem desligo meu celular, pois sei que

receberei muitas ligações dele nas próximas horas. Desço e encontro a minha

nova família reunida ao redor da mesa. Feliz, sento-me com eles e preparo o meu

prato. Logo começamos a comer, vez ou outra trocamos algumas palavras, e

depois de um tempo já estamos saboreando a sobremesa, enquanto o Miguel nos

faz rir — todo lambuzado de pudim, a colher foi substituída pela mãozinha.

— Olha o nervoso dele para comer — falo, sorrindo. Noto que meu pai

tem um certo brilho nos olhos. Durante o jantar eu o vi várias vezes olhando para

a Safira e para o filho.

Quem não notaria esses dois? Só de olhar dá para perceber o clima que

rola entre eles.

— Filho, vai com calma. — Minha amiga pega o guardanapo e limpa a

boca de Miguel, que faz careta.

— Deixe-o, amiga. Está gostoso, não é, meu amor? — brinco com meu

irmão, que me olha com curiosidade e sorri.


— Com licença, tenho que resolver algumas coisas no escritório — meu

pai se manifesta e se levanta. Ele se aproxima e beija a minha testa, depois segue

até a Safira, deixando-a sem ação e envergonha, e por último vai até o nosso

sapeca, que coloca a mãozinha toda melecada no rosto do papai, causando um

pequeno estrago.

Acabamos rindo da cena segundos antes de papai sair, nos deixando

sozinhos.

— Vitória, aconteceram tantas coisas que nem deu tempo de falar. Decidi

trabalhar para o Lucas, como atendente de telemarketing do restaurante, pois não

vou precisar me deslocar de casa, terei mais tempo para ficar com o Miguel. Ele

me disse que são seis horas de trabalho e cinco dias na semana, que eu achei

ótimo — diz minha amiga, animada. — Você pode, por favor, agradecer ao seu

amigo e recusar a proposta de trabalho dele?

— Claro. Que ótimo, amiga, estou feliz por você. E será muito bom ficar

perto do seu filho, ele ainda é pequeno e precisa de você, e trabalhando em casa

estará mais presente. — Demonstro minha satisfação. — Pode deixar que

amanhã mesmo falo com o Gustavo. Ah, se precisar do meu notebook para
trabalhar é só pegar no meu quarto, o.k.?

— O Victor me ofereceu o escritório dele... — Ela morde os lábios e sorri.

— Olha, que patrão prestativo, ele já ganhou pontos comigo! — brinco, e

Safira finge me ignorar.

— Pode ficar com o Miguel enquanto eu lavo a louça? A dona Joana já foi

embora, ela arrumou a mesa e saiu, precisava resolver um assunto pessoal —

diz, levantando-se com Miguel no colo.

— Podemos fazer melhor. Eu lavo e você limpa esse porquinho. —

Levanto-me e começo a recolher os pratos.

— Tudo bem. — Safira assente, então seguimos para a cozinha.

A noite foi maravilhosa, única, fazia muito tempo que eu não sentia tanta

harmonia. Espero repetir sempre momentos como esse.


SAFIRA

Os dias seguintes passaram rapidamente, quando percebo já faz dois meses

que eu estou morando na casa de Victor. O que era para ser algo provisório

acabou se tornando mais do que eu poderia imaginar.

Minha vida mudou por completo, muitas coisas boas e ruins aconteceram

comigo, e eu não posso deixar de agradecer ao destino pelas surpresas que ele

me proporcionou. Hoje, meu filho não só leva meu sobrenome, mas o do pai

também — Miguel de Andrade Guterres. Sim, Victor registrou o nosso filho há

quase um mês, e nesse meio tempo ele tem sido uma pessoa incrível, um homem
atencioso, um pai carinhoso e um ótimo parceiro.

Ele está cumprindo o que me prometeu, e está me conquistando dia após

dia. Victor me surpreende diariamente com alguma coisa, e faz questão de

demonstrar os seus sentimentos por mim na frente de todos.

Estamos dormindo no mesmo quarto, dividindo a cama e o guarda-roupa.

O quarto passou por uma reforma, ele trocou a cama, a decoração, substituiu o

guarda-roupa por um maior; tudo que tinha antes já não existe mais, é novo e

nosso. Victor também montou um quarto para o Miguel, com direito a decoração

infantil e tudo. Até contratou profissionais para montar um pequeno parque na

área externa da casa, achei meio exagerado, no entanto, ele disse que estava

recompensando o tempo que passou longe do filho e que não era nada de mais

dar a Miguel o que era seu por direito.

— Restaurante Bella Flor, bom dia. Meu nome é Safira, como posso te

ajudar? — Neste momento estou atendendo as ligações dos clientes do

restaurante no escritório que antes era só de Victor, mas que agora divido com

ele. — Reserva para o dia vinte? Um minuto. Estamos lotados neste dia, mas

posso agendar para o dia vinte e dois às dezenove horas. Ah, claro, entendo. Irei
ver o que consigo fazer e retorno para o senhor. Como é uma data especial,

tentarei atender ao seu pedido. Por favor, me informe, por gentileza, dois

telefones de contato... Sim, sr. Ferrari, dentro de algumas horas retorno para o

senhor. Tenha um bom dia.

Fico meia hora atendendo aos telefonemas, até que dá o horário de

preparar o almoço do Miguel. Levanto-me da cadeira, alongo o corpo e me viro

para pegar o meu filho. Fico assustada quando encontro vazio o espaço em que

ele estava, somente seus brinquedos estão ali. Corro para a sala e não o encontro,

então me desespero ao ver a porta entreaberta.

Senhor, como eu não o vi saindo do escritório?

Com as pernas trêmulas, saio da sala a passos largos e sigo para a copa.

Levo as mãos à cabeça enquanto sinto meu corpo tremer, meu coração está

apertado e eu só penso no pior. Apesar de ele já andar para todos os lados, a casa

tem muitos lugares ainda perigosos para ele.

— Miguel! Filho! — grito, desesperada.

Rapidamente a dona Joana surge, com os olhos arregalados.


— O que aconteceu, menina? — a senhora pergunta.

— A senhora viu o meu filho? — Começo a chorar. — Eu estava no

escritório... e... — Não consigo completar a fala, estou tão nervosa.

— Eu não o vi. Só saí da cozinha para atender a campainha. A senhora

Alessandra esteve aqui faz pouco tempo, disse que o sr. Victor pediu para ela

pegar um documento no escritório de...

— Era mentira dela. A Alessandra não trabalha mais para o Victor, não era

para ela estar aqui. — Soluço, imaginando o que essa mulher pode estar

aprontando.

— Eu não sei nada da vida dos patrões, minha filha, e não achei que fosse

mentira. Achei que a senhora Alessandra não vinha mais aqui por causa da

menina Vitória. — Dona Joana está pálida. — Procure o garoto lá fora, enquanto

eu vou procurar pela casa, talvez ele esteja em algum canto.

Não digo nada a ela, só saio correndo porta afora.

— Miguel! — grito e puxo meus cabelos para trás, chorando. Vasculho a

frente da casa, o jardim e nada do meu filho, nada de ouvir um “mamã” ou um


choro por ter se perdido. — Miguel, meu amor, cadê você?

Meu Deus, que eu não esteja imaginando coisas. Alessandra não pode ser

tão cruel a ponto de ter levado o meu filho para longe só para me prejudicar, ela

não seria tão má assim. Me sento na grama e choro copiosamente.

— Amiga, o que aconteceu? — A voz de Vitória me deixa ainda mais

desesperada.

Atordoada, levanto o rosto e percebo que ela está com Victor. Ele me lança

um olhar preocupado e corre em minha direção, abraçando-me assim que se

aproxima. Sem forças para ficar em pé ou falar, eu me apoio contra ele.

— Safira, o que aconteceu? Por que está chorando? — Victor toca em meu

rosto e eu o abraço com força.

— O Miguel... meu filho... a Alessandra... ela esteve aqui... e... — Não

consigo formular uma frase coerente. Vitória se aproxima e me abraça também,

tentando entender o que está acontecendo.

— Safira, não encontrei o menino em lugar algum. — Dona Joana aparece,

com a voz desesperada.


— Ele sumiu? E o que a Alessandra tem a ver com isso? — A voz de

Victor sai como um trovão.

Sem conseguir explicar o que está acontecendo, eu o abraço e choro

pensando no pior. Será que aquela mulher sequestrou meu filho por vingança?

Ela está usando uma criança para isso? Alessandra seria tão louca a ponto de agir

assim?

— Sr. Guterres, a s... Meu Deus! — dona Joana grita e logo ouço o choro

alto do meu filho.

Afasto-me de Victor e olho na direção de onde vem o choro. Sinto um frio

na espinha ao ver a Alessandra com a criança no colo, ambos molhados. A

mulher está com os olhos avermelhados, assim como meu filho, que chora alto e

chama por mamá e papá.

Rapidamente corro até eles e tiro o meu pequeno dos braços dela. Olho

bem para o meu filho e vejo que seus olhinhos estão extremamente irritados, o

nariz avermelhado e ele funga e tosse.

— Shhh... meu amor, mamãe está aqui. — Tento acalmá-lo, muito

assustada. — Não chore.


Trêmulo, Miguel esconde o rosto na curva do meu pescoço. Beijo seu

rostinho, aperto-o nos meus braços e começo a chorar de alívio. Não demora

muito para que a mulher se manifeste.

— Está vendo, Victor? — fala, com a voz embargada. — Esse o resultado

da mãe incrível que você escolheu para ter um filho. — A megera chora

falsamente enquanto aponta para mim, me deixando sem ação. — Além de

abrigar essazinha aqui ainda é conivente com as merdas que ela faz a esse pobre

garotinho. Graças a mim ele não morreu afogado naquela piscina.

Vitória me abraça e beija a testa do irmão. Levanto o rosto e olho para

Victor, que está com seus olhos gélidos sobre mim. Desvio o olhar e foco em

Miguel, que agora está mais calmo.

— Safira, onde você estava que não viu Miguel saindo? — A pergunta de

Victor sai ácida, e meu coração fica apertado.

Espero que ele não acredite nessa mulher. É impossível meu filho ter

conseguido chegar sozinho à piscina. Não quero ser leviana, mas a maneira

como Alessandra está me acusando de ter sido descuidada com meu filho é

muito suspeita.
— Eu estava no escritório, fiquei um tempo no telefone conversando com

alguns clientes e... — Respiro fundo ao sentir Miguel apertar meu pescoço com

seus bracinhos.

— Amiga, respira... você está muito nervosa. Alguma explicação tem, e eu

tenho certeza de que você não foi descuidada com o nosso pequeno. — Minha

amiga me defende, e eu fico aliviada.

— Não saia daqui até que eu volte — ordena, olhando para a ex, que

assente e finge chorar.

Victor olha com seriedade para mim, pega o celular do bolso e se afasta.

Nervosa, ajeito Miguel em meu colo e o analiso para ver se não tem algum

machucado.

Se algo tivesse acontecido com o meu filho eu jamais me perdoaria. Talvez

a mulher realmente esteja falando a verdade, Miguel é uma criança muito esperta

e... Não, ele não conseguiria chegar à piscina, conheço bem o meu filho.

— Você acha que ela o levou para lá? — Vitória pergunta baixinho e eu

assinto. — Vagabunda — rosna e passa a mão nos braços do meu filho que está

tremendo de frio.
Olho para a porta e não vejo mais a dona Joana. Mesmo que ela não queira

se envolver nos assuntos do patrão, ela vai ter que contar a Victor o que

realmente aconteceu. De relance, olho para Alessandra que sequer consegue me

encarar. Desconfiada, fico focada nela por alguns minutos, mas desvio a minha

atenção para a minha amiga quando ela oferece o seu casaco para cobrir o irmão.

Cubro meu filho e o nino em meus braços. Eu quero entrar na casa, no entanto,

só saio daqui depois que as coisas forem esclarecidas.

— Alessandra, venha aqui. — A voz de Victor sai em um tom calmo e ao

mesmo tempo assustador. Seus olhos têm fogo, seus dentes estão cerrados e sua

mão está em punho.

A loira se aproxima do ex, que estende o celular dele para ela. Do nada, ela

dá um passo para trás e fica pálida, porém, o homem a segura pelos pulsos para

que não se afaste mais.

— Que porra você tem na cabeça? Queria matar meu filho, uma criança

inocente? Por quê? Você está louca? — vocifera, chacoalhando o braço da

vagabunda.

Vitória corre até o pai e pega o celular da mão dele. Ela olha para a tela e
desliza o dedo, então seus olhos se arregalam. Minha amiga leva a mão à boca e

vem até a mim.

— Olha isso, Safira. Essa mulher é um monstro! — exclama, horrorizada.

Vitória mostra um vídeo em que a Alessandra surge na área da piscina com

Miguel no colo. A mulher olha para todos os lados e quando vê que não está

sendo observada entra na água e afoga meu filho por alguns segundos. Eu não

suporto ver o restante da cena, meu estômago embrulha e uma fúria me invade.

Como ela foi capaz de mexer com uma criança inocente? O que ganharia

matando o meu filho? Mesmo sem ter coragem para continuar olhando tamanha

barbaridade, decido que é melhor ver o vídeo completo. A mulher sai da piscina

com Miguel, e quando ele abre a boca para chorar ela o chacoalha com

brutalidade.

— Isso não vai ficar assim, Alessandra. Você foi longe demais. — Victor

larga a mulher e leva as mãos à cabeça. — Eu errei com você, peço perdão por

não ter sido sincero, só que a gente não manda no coração e eu me apaixonei por

outra pessoa. Não planejei isso. Só que você passou dos limites quando tentou

matar o meu filho e tentou culpar a Safira de ter sido negligente! Vou chamar a
polícia agora mesmo, você não vai sair dessa tão fácil. — Assim que ele termina

de falar, Alessandra tenta se soltar dele, mas falha miseravelmente. — Vitória,

ligue agora para a polícia.

Vitória assente e caminha até o pai, pegando seu celular e fazendo a

ligação antes de se afastar. Poucos minutos depois ela volta e nos avisa que a

polícia está a caminho. Passo o Miguel para os braços dela e peço para ela trocar

as roupas dele para que não pegue um resfriado. Só então vou até Victor, que

ainda grita com a mulher. A descarada está dizendo que o ama e não pode viver

sem o amor dele, que eu engravidei de propósito para prendê-lo e que tudo foi

feito de caso pensado para eu tomar o lugar dela na vida dele. Diz tanta bobagem

para ver se consegue comovê-lo, para tentar se safar de algo que está mais do

que claro que ela foi a causadora.

— Poderia ter mexido comigo, mas com o meu filho não — declaro,

sentindo meu corpo fervilhar. Aponto o dedo para ela e continuo. — Você não é

mãe e não entende o quanto fiquei desesperada. Você tem noção de como me

senti ao ver Miguel nos seus braços, todo molhado e chorando? Por que tanta

maldade? Me responda! — Empurro-a, dominada pelo ódio.


— Meu amor, só pode ter sido armação... eu nem sabia que existia uma

câmera ali... e eu jamais faria algo ruim para o seu filho, para o filho do homem

que eu amo. Elas podem ter armado, deve ser uma armação esse vídeo! Acredite

em mim, por favor — Alessandra implora para Victor, que ri com amargura e a

solta com brutalidade.

Ele está se segurando para não cometer uma loucura, mas eu posso e vou.

Agora quem vai colocá-la no lugar dela sou eu. Alessandra atraiu o meu pior

lado. Como ousa dizer que foi armação?

— Só uma pessoa doente faria esse tipo de coisa. Meu Deus! — falo,

transtornada. Jamais prejudicaria o meu filho para conseguir a atenção e o amor

de um homem. — Estou tão furiosa com você, que eu seria capaz de te matar.

Mas não vou descer ao seu nível, Alessandra! Espero que fique com a sua

consciência pesada por ter usado uma criança inocente em seus planos

maléficos. Você é podre, isso já está mais do que claro, e tenho certeza de que irá

pagar pelas suas maldades. Essa é a segunda vez que tenta prejudicar a mim e ao

meu filho — conforme vou falando, lágrimas descem por minhas bochechas.

— A minha vida estava ótima sem você e o seu filho. Meu relacionamento
era maravilhoso, mas então chega uma desconhecida que tira tudo de mim. Para

provar que sou inocente, vou ficar até a polícia chegar, porque sei que isso foi

uma armação! — A mulher insiste na mentira, na cara dura.

Eu perco a paciência e lhe dou um tapa no rosto, deixando a marca dos

meus dedos em sua bochecha. A ex de Victor tenta revidar, mas eu seguro os

seus pulsos.

— Seja mulher e admita que errou, fale a verdade. Fez isso para me

prejudicar na frente de todos, mas felizmente não conseguiu. Eu jamais faria mal

a uma criança, não sou como você — grito, com raiva. Logo sinto os braços de

Victor ao redor da minha cintura.

— Se acalme. A polícia acaba de chegar, ela pode te acusar de agressão —

ele diz perto do meu ouvido.

Com as mãos ainda segurando Alessandra, olho de relance para os dois

policiais que se aproximam. Eles conversam entre si e um deles balança a

cabeça, concordando com algo.

— Que você apodreça na cadeia. Se acha que essa encenação toda vai te

livrar de uma condenação está enganada. — Cuspo as palavras e a solto.


— Recebemos uma denúncia de tentativa de homicídio há alguns minutos.

Poderiam nos explicar o ocorrido? A senhora que fez a denúncia estava muito

nervosa e não soube nos dizer o que de fato aconteceu — o policial mais velho

fala enquanto olha para mim e Victor, em seguida, para a Alessandra.

Victor explica tudo, em seguida, falo o que aconteceu desde o sumiço do

meu filho até a parte em que vi o vídeo da gravação das câmeras, reforçando a

versão do Victor. Quando Alessandra percebe que está encurralada tenta fugir

dos policiais, que sem violência a algemam.

— A senhora tem o direito de permanecer calada, tudo o que disser poderá

ser usado contra você no tribunal — diz o policial para Alessandra, que chora e

grita.

— Eu quero chamar o meu advogado! Acham que se eu fosse culpada teria

ficado? Que tipo de ser humano eu seria para tentar prejudicar um anjinho! Isso

foi armação, fale para eles, Victor! — a loira grita.

Fico pensando se ela realmente acredita no que está dizendo ou acha que

agindo assim vai se safar de tudo. Mas Victor não vai permitir que a pessoa que

tentou matar nosso filho saia impune.


— Senhores, eu tenho os vídeos no meu celular e a minha funcionária vai

testemunhar também, assim como minha filha e eu. Eu e Alessandra rompemos

faz pouco tempo, mas parece que ela não aceita muito bem — Victor declara.

Alessandra tenta se defender novamente, mas é levada pelo policial. Olho

a cena, ainda sem acreditar que essa mulher, que diz ter tanta classe, fez uma

coisa dessa. Estou horrorizada.

— Vocês são os pais da criança, certo? — A autoridade me tira dos meus

pensamentos.

— Somos sim — Victor e eu respondemos antes de ele entrelaçar os

nossos dedos.

— Vou pedir que me acompanhem para que possam apresentar a denúncia

na delegacia. Peço que levem também o celular que tem a gravação da senhora

afogando a criança.

— Sim, iremos fazer isso — fala Victor, em um tom sério.

O policial assente e nos dá as costas, seguindo para longe de nós. Não

esperamos nem um segundo para seguir os policiais até a delegacia. Só entramos


na casa para Victor pegar o celular com a Vitória. Aproveito para pedir para a

minha amiga tomar conta do irmão até nós voltarmos, e digo à dona Joana que

ela deve ir com a gente para dar o seu depoimento, afinal, foi ela que recebeu a

Alessandra.

**

Depois de alguns minutos chegamos à delegacia e somos levados por um

dos policiais até a sala do delegado. Lá nos deparamos com Alessandra sentada

em um canto, em momento algum ela nos olha. Fico incrédula ao vê-la bem

plena, completamente relaxada, como se nada tivesse acontecido.

— Senhores, sentem-se, por favor. — O delegado aponta para as três

cadeiras desocupadas, então nos sentamos.

Victor diz que viemos prestar queixa contra a ex dele que tentou afogar o

nosso filho na piscina para me incriminar. Ele narra também que ela queria que

eu saísse como uma mãe irresponsável. Meu coração aquece ao vê-lo me

defender.

— No meu celular temos a prova de que não houve armação, como a

Alessandra insiste em mencionar. E foi Joana, a minha funcionária — Victor fala


e aponta para a dona Joana, que assente —, quem a recebeu na minha casa.

Alessandra deu a desculpa de que eu havia pedido para ela ir buscar um

documento, mas não nos vemos há um bom tempo. Ela trabalhava como gerente

em meu restaurante, mas depois que terminamos e ela foi demitida eu não a vi

mais. — Sua voz exala revolta.

A autoridade pede para ver o celular e Victor não demora para mostrar a

gravação, logo em seguida, dona Joana dá o seu depoimento.

— A menina Safira estava trabalhando no escritório do sr. Guterres quando

a sra. Alessandra chegou dizendo que meu patrão pediu para que ela pegasse um

documento no escritório dele. E como não é da minha conta a vida dos patrões...

eu não sabia que o seu Victor não namorava mais a sra. Alessandra, então eu a

deixei entrar e voltei para meus afazeres. Um tempo depois escutei a Safira

gritando pelo filho e corri para a sala para ver o que estava acontecendo.

Chegando lá vi a menina desesperada me perguntando sobre o filho Miguel e...

— dona Joana conta tudo detalhadamente.

Passamos um bom tempo na delegacia. O vídeo e o que a funcionária de

Victor falou foram suficientes para manter Alessandra presa. Ela acreditou que
ficaria impune por ter influência e bons advogados, que poderia pagar fiança,

mas nada disso aconteceu. A mulher só começou a depor após a chegada dos

seus advogados que não puderam fazer muito por ela, já que tínhamos como

provar a nossa versão dos fatos. O mais interessante foi ver que Alessandra não

elevou a voz em momento algum, se manteve educada e refinada, como costuma

ser quando está usando sua falsa máscara de boa mulher.

Deixamos o local à noite, mas Alessandra permaneceu com seus

advogados. Eles tentaram contornar a situação, mas tenho certeza de que ela irá

a julgamento, Victor acionará seus advogados na nossa volta para casa. Então em

breve teremos notícias do caso, mas no momento o que eu mais quero é chegar a

nossa casa, abraçar meu filho e cuidar dele.


VICTOR

Depois de passarmos algumas horas na delegacia, enfim chegamos a nossa

casa. No caminho liguei para os meus advogados e deixei que assumissem as

coisas, quero ter certeza de que a mulher não vai sair impune, eu não permitirei

uma coisa dessas, e para isso tenho os melhores profissionais trabalhando para

mim. Alessandra terá que pagar pelo que fez com meu filho, uma criança

inocente que não tem nada a ver com o que aconteceu entre nós.
Acho que na cabeça louca da minha ex ela seria polpada, afinal, tivemos

um relacionamento, porém, se enganou. Ela pôs a vida de Miguel em risco, agiu

cruelmente, e o seu atrevimento em querer culpar Safira por suas ações doentias

fez meu sangue ferver. Por muito pouco não cometi uma loucura, mas graças a

Deus fui racional, agi com sabedoria e, no final das contas, deu tudo certo.

Existe aquele ditado “mexa comigo, mas não com meus filhos”, e a partir do

momento em que Alessandra ousou mexer com um deles, perdi de vez a

consideração que sentia por ela. Na verdade, já havia acabado no dia em que

derrubou Safira e Miguel no chão.

Às vezes as pessoas dizem que o amor é cego, que quando amamos

alguém não conseguimos ver como a pessoa realmente é, mas eu não posso dizer

que isso aconteceu comigo para não ter notado a mulher suja que a Alessandra é.

Agora sei que o nosso relacionamento era por conveniência. Ter Safira ao meu

lado, vendo-a todos os dias me confirmou que eu jamais daria certo com uma

mulher tóxica como Alessandra. Sim, não fui nenhum santo, errei, mas nada

justifica as suas ações. Faz mais de um mês que terminamos, no entanto, a sua

insistência em me prejudicar permanece.


— Amor, o que o deixou tão pensativo? Eu pedi a chave da casa cinco

vezes para você. — Safira toca no meu ombro e eu sorrio, sem graça, saindo dos

meus pensamentos distantes.

Estamos em frente a nossa casa, sim, nossa casa, que muito em breve será

de Safira oficialmente, mas ela ainda não sabe. Pretendo tê-la em meu futuro, e

para que isso aconteça vou quebrar uma das minhas promessas.

— Desculpe, aqui está. — Entrego as chaves para ela e passo um braço ao

redor da sua cintura, puxando-a para mim. Beijo seus cabelos loiros antes de

ouvir a sua risada doce.

— Você está tão distante, está tudo bem? — indaga, ao abrir a porta.

— Tudo ótimo. Só estou cansado, passamos tanto tempo naquele lugar —

falo e entrelaço nossos dedos, guiando-a para dentro comigo.

Assim que saímos da delegacia passamos na casa de Joana para deixá-la.

Não demorou muito para que a minha filha me ligasse avisando que pediu ao dr.

Edgar, o seu ex-pediatra, para atender Miguel. Faz anos que o médico não vai à

nossa casa, quando Vitória chegou à adolescência as suas visitas se tornaram

bem menos frequentes.


— Antes de ver nosso filho preciso de um banho, assim posso dar total

atenção a ele pelo resto da noite. Só fiquei um pouco mais tranquila porque

Vitória me disse que o doutor o examinou e está tudo bem — Safira diz e passeia

os olhos pela sala, que está apenas com o abajur de canto aceso.

— Queria muito te acompanhar, mas tenho que ligar para o Lucas. Fiquei

de fazer isso mais cedo para acertamos a contratação do novo gerente, mas...

Me calo ao ouvir passos próximos e risadas vindas do andar de cima. Olho

em direção à escada e vejo meu melhor amigo vestindo a camisa e a minha filha

passando as mãos nos cabelos... molhados.

Sem notar a minha presença e de Safira, Lucas puxa Vitória pela cintura e

a beija. Transtornado, fecho os punhos e penso em dar alguns passos até eles,

mas a mão gelada de Safira se fecha ao redor do meu pulso.

— Que porra é essa? Ainda na minha casa? — urro com toda a fúria que

há em mim.

Vitória se assusta e se desequilibra na escada, só não cai porque o fodido

que se dizia meu melhor amigo a segura. Lucas está pálido e com os olhos

arregalados.
— Pai... pai? — minha filha gagueja.

Sem machucar Safira, eu me solto dela e sigo até o pretenso casal que está

me encarando como se eu fosse um fantasma. O miserável tenta falar, mas eu

sou mais rápido e o puxo pela gola da camisa e o jogo no chão da sala. Lucas

urra de dor e pragueja, mas não move um dedo para se defender.

— Victor, por favor, pare com isso! — Safira pede, preocupada.

Olho para ela como que dizendo “sinto em te decepcionar, meu amor”. Me

agacho ao lado de Lucas e seguro mais uma vez em sua camisa, esmurrando o

desgraçado no rosto e no estômago. Estranho o fato de ele apenas tentar se

esquivar, em momento algum tenta revidar.

— Pai, você irá matá-lo! — Minha filha se coloca atrás de mim e tenta me

puxar, mas eu lanço um olhar mortal para ela.

— Você está transando com a minha filha pelas minhas costas, seu

escroto? Como pôde fazer isso comigo? Pensei que fosse meu amigo, porra.

Você esteve saindo com Vitória esse tempo todo, e bancando o meu melhor

amigo? Você dizia estar preocupado com as saídas dela, mas na verdade queria

saber o que ela andava fazendo — grito quando paro de esmurrá-lo.


Lucas está com o supercílio machucado e a boca sangrando. Estou tão

cego de raiva que nem enxergo mais Safira e Vitória na minha frente, meu foco é

o safado.

— Pare com isso, cara! Me deixe explicar, você está entendendo errado...

Tudo errado — ele fala, gemendo de dor.

— Pai — Vitória se manifesta com a voz trêmula.

Eu a ignoro antes de ouvir Safira pedindo para que ela se acalme e nos

deixe resolver sozinhos, e parece que surte efeito, pois Vitória não diz mais nada.

— Não me diga que o Miguel vomitou na sua camisa e que a Vitória a

levou para a lavanderia para dar um jeito. Depois o garotinho vomitou de novo,

mas dessa vez foi no cabelo da irmã e ela teve que lavar o cabelo — narro com

deboche uma desculpa bem esfarrapada. Lucas empalidece ainda mais. — Vai se

foder, Lucas! Quantas vezes você me disse para sempre falar a verdade,

independentemente das consequências? Você é um hipócrita do caralho. Estava

transando com a minha filha, na minha casa, e ainda tem a coragem de dizer que

pode explicar! — Afasto-me dele, me levanto e limpo meus punhos sujos de

sangue na camisa. Não demora para que ele se levante e tente se aproximar de
mim, mas eu recuo.

— Você está certo. — Lucas desvia os olhos dos meus e fixa em Vitória,

que está chorando nos braços da amiga. — Eu e Vitória estamos saindo há um

tempo sem você saber.

Cerro os punhos ao ter a sua confirmação.

— E aquela história de afilhada? Era tudo mentira? — pergunto, alterado.

— Vocês dois não se envergonham de terem feito isso nas minhas costas?

— Pelo menos me escute, caralho. Eu nunca disse que a considerava como

afilhada, e se ela realmente fosse jamais chegaria perto, seria nojento. Quem

sempre tentava ir adiante com essa história era você, e não eu, irmão. Agora me

acusa como se eu fosse o pior ser da face da Terra — Lucas urra e eu rio com

escárnio. — Eu gosto de Vitória, gosto do que temos e não pretendo me separar

dela por você não aceitar o que temos.

— Você é um filho da puta mulherengo, não serve para a minha filha... sei

que vai acabar magoando a Vitória. — Aponto o dedo para ele, furioso. Sinto a

veia do meu pescoço pulsar. — Eu odiaria ter que terminar a nossa amizade de

anos por conta do seu relacionamento com ela. Mas sei que no final a Vitória
sairá machucada.

— Pai, pare com isso! Sou adulta e sei fazer as minhas escolhas! O senhor

está falando sobre algo que não sabe e está me magoando com suas palavras

duras. — Assusto-me com o grito de Vitória, então me viro e a vejo limpando as

lágrimas do rosto. Ao seu lado já não encontro mais Safira, provavelmente nos

deixou para ver nosso filho. — Eu nunca vi o Lucas como padrinho, sempre tive

sentimentos por ele e...

— Não fale mais nada, Vitória, vamos conversar depois que ele for embora

— rosno, fuzilando Lucas com olhar enquanto o idiota resmunga. — Saia da

minha casa, não quero te ver aqui tão cedo! — Expulso-o, apontando para a

porta.

Lucas tenta se defender, mas o olhar de advertência que lanço a ele diz que

não estou brincando.

— Eu não aceito isso, papai, que vergonha está me fazendo passar —

Vitória fala, com a voz embargada. — Você fica, Lucas, Victor tem que entender

que eu posso decidir o que quero! — Minha filha começa a ir em direção a

Lucas, porém eu a seguro pelo pulso.


— Vitória, se você tem um mínimo de respeito por mim, que sou o seu pai,

me escute. — Olho bem em seus olhos, que estão lacrimejados, ela me ignora e

se desvencilha da minha mão.

— Vitória, seu pai está certo, depois nos falamos. — O miserável ousa se

aproximar e beijar a bochecha dela, mas geme de dor quando seus lábios

machucados tocam a pele dela.

Lucas sai da minha casa sem olhar para trás. Respiro com pesar antes de

me virar para Vitória, que me encara com rancor e decepção.

— Quando o senhor me pediu apoio para o seu relacionamento com minha

melhor amiga eu o apoiei, não o julguei, só desejei que fosse feliz. Agora que o

Lucas vem atrás de mim, se declara e diz que está disposto a me ter como

namorada dele, o senhor aparece e estraga tudo! — Ela soluça, causando uma

dor no meu coração. — Percebe o quanto é egoísta? Está assim por que ele é

mais velho do que eu? É isso?

— Não distorça as coisas, minha filha, a minha situação e a sua são

completamente diferentes. Apesar de ter errado com Alessandra ao ter me

envolvido com Safira antes de terminar o nosso namoro, eu sou muito diferente
do Lucas — defendo-me, revoltado. — Lucas é um homem livre, nunca teve um

relacionamento sério, nunca levou nenhuma mulher a sério. Durante todos esses

anos convivendo com ele eu o vi trocar de mulheres mais do que troca de roupa.

Ele brinca com o coração das mulheres com quem sai. Você sabe que não estou

mentindo, também o conhece desde que nasceu. Não estou querendo te privar de

amar alguém, viver um amor, mas eu o conheço, filha, ele é meu melhor amigo

desde criança, crescemos juntos, conhecemos a personalidade um do outro. Eu

tenho medo de vê-la pelos cantos chorando... Não me importo com a idade, você

sabe que não é isso, só me preocupo com o seu coração, com seus sentimentos

— desabafo, com medo de ver a minha garotinha ser machucada por um cara

que já saiu com mais mulheres do que se imagina.

— Eu sei o quanto se preocupa comigo, mas eu quero arriscar, e se eu

quebrar a cara vai ser uma lição, não é? Tudo nessa vida é aprendizado, e eu

estou disposta a viver com o Lucas, descobrir o que seremos um para o outro, e

se eu me machucar...

— Se ele te magoar eu o mato — eu a interrompo e dou as costas para ela.

— Quero deixar claro que não apoio o seu namoro, não confio no Lucas como
seu namorado. Ele não te merece, eu sou homem e conheço o tipo dele.

— O senhor não tem esse direito. Eu vou ficar com ele sim, essa é a minha

decisão — diz Vitória, contrariada.

Antes ir em direção à escada, viro-me para ela novamente.

— Só se for por cima do meu cadáver! Não vou permitir que você seja só

mais uma na listinha dele. Não vou te dizer mais nada, querida, porque tudo que

sai da nossa boca de ruim é maldição, então, espero que possa refletir mais um

pouco. — Antes que ela se manifeste, dou-lhe as costas e sigo para meu

escritório, preciso esfriar a cabeça.

Depois de tantos dias de paz, o caos retorna com tudo. A minha ex tentou

afogar meu filho, o meu melhor amigo, que considero como irmão, é o cara de

quem minha filha falou dias um tempo atrás. Nunca imaginei que seria traído por

Lucas e Vitória.

**

Depois de quase meia hora trancado no meu escritório, decido subir. Ainda

com a cabeça doendo, entro no meu quarto e encontro Safira de banho tomado.
— Vou tomar banho, depois conversamos — falo, e começo a me despir.

Fico pensando no quanto magoei Vitória, vi em seus olhos a decepção, mas é

necessário abrir os olhos dela, é meu dever como pai.

— Tudo bem, eu o espero — diz e me dá um sorriso fraco.

Ela está de pé, perto de onde nosso pequeno está dormindo. Noto que ela

também ficou triste com meu comportamento, suspeito que Safira sempre soube

do envolvimento de Vitória com Lucas.

Não complique mais as coisas, Victor. Safira é melhor amiga da sua filha e

não tem motivo algum para te contar uma história que não é dela, diz meu

subconsciente.

— Ele está bem mesmo? — pergunto, meneando a cabeça para afastar os

maus pensamentos.

— Está sim. Não tem febre e dorme tranquilamente. Vitória sabe cuidar do

irmão — diz, admirada. — Mais tarde vou conversar com ela, quero saber o que

o doutor disse sobre Miguel. Agora vá tomar seu banho para descansar um

pouco.
Assinto e sigo para o banheiro, com a cabeça fervilhando e ainda me

sentindo culpado por ter feito minha filha chorar. Espero não estar errado em

relação ao Lucas, mas o meu pressentimento de pai me diz que alguém vai sair

machucado dessa história, e eu sei que Vitória é o lado mais fraco.

Um tempo depois volto para o quarto e encontro Safira deitada em nossa

cama, me esperando. Pensei que ela estaria dormindo, já que parecia estar

chateada comigo, talvez seja só impressão. Seu semblante está tranquilo e

quando me aproximo ela sorri.

— Posso te perguntar uma coisa? — Analiso seu rosto bonito antes de me

sentar ao seu lado, sentindo o colchão macio afundar um pouco.

— Deve. — Continua sorrindo e eu não resisto, sorrio também.

— Está chateada comigo? Acha que peguei pesado com Vitória? —

indago, com meus olhos fixos nos dela.

— Amor... Não tenho motivo algum para ficar chateada com você, mas

confesso que fiquei com dó da minha amiga. Vocês são pai e filha, devem

resolver isso sozinhos. Não posso ficar do lado de ninguém, porque amo os dois.

— Ela toca em meu rosto com uma mão e a outra leva ao meu peitoral molhado,
fazendo com que eu feche meus olhos de prazer.

— Repete. — Abro meus olhos e vejo um brilho diferente em seu olhar.

— O quê? Que eu amo vocês? — Ri bem-humorada e morde os lábios.

— Sim, isso. — Levo uma mão ao seu rosto e acaricio seus lábios com

meu polegar. Safira morde a ponta do meu dedo levemente, causando arrepios

em meu corpo.

— Eu te amo, Victor, amo muito. Não sei se ainda é cedo para te dizer

isso, mas... eu te amo — declara com convicção.

Eu me aproximo mais dela e roubo um beijo dos seus belos lábios doce.

Com a boca de Safira ainda grudada na minha, tiro a toalha que está enrolada ao

redor do meu corpo e fico completamente nu, enquanto ela desliza uma mão

livre por meu ombro.

— Nunca é cedo para se declarar, meu amor.

De relance, olho para o berço e me certifico que o nosso filho ainda dorme,

só então puxo minha loirinha para o meu colo, que geme ao sentir meu pau

enrijecido contra o tecido fino da calcinha de renda. Sem paciência para esperar
mais, tiro a camisola de Safira e jogo a peça longe, em seguida, lambo os lábios

com a visão que tenho — seus seios lindos me fazem ter pensamentos deliciosos

e impuros. Levo uma mão ao quadril da minha mulher, enquanto a outra seguro

um dos seus mamilos que estão muito convidativos. Aperto-o e o belisco de

leve, arrancando gemidos de dor e ao mesmo tempo de prazer de Safira.

— Acho que ainda estou com muita roupa, sr. Guterres — ela diz,

manhosa, e tremula os cílios, me fazendo rir.

— Mas não por muito tempo — depois de dizer isso, abocanho um seio e

depois o outro. Chupo, lambo, mamo esfomeado, fazendo com que seus mamilos

fiquem completamente duros.

— Aiii... Victor, continua... — pede, entre gemidos. Safira rebola de

maneira provocante, roça sua boceta quente e molhada no meu pau. Sinto sua

respiração ofegante contra meu rosto quando Safira o puxa e me beija

apaixonadamente.

— Quero te foder, fazer amor com você e depois cuidar de cada pedacinho

do seu corpo. — Um desejo incontrolável invade o meu corpo, e eu já não sou

mais capaz de me segurar, preciso tê-la por inteira.


Tiro-a do meu colo, mesmo sob seu protesto, e a deito na cama de costas,

com os olhos atentos a mim. Levo as mãos à sua calcinha e desço a peça

lentamente pelas suas pernas. Meu coração estremece com a cena maravilhosa

— a mulher que é dona dos meus pensamentos e coração completamente nua só

para mim, com seus fios loiros e longos espalhados no travesseiro e com um

belo sorriso. Fico por alguns minutos a admirando, até que me posiciono entre

suas pernas.

Início uma trilha de beijos por seu rosto, depois em seus lábios

entreabertos e vou descendo até seu queixo. Em pouco tempo estou mordendo e

chupando o seu pescoço cheiroso. As mãos de Safira passeiam pelas minhas

costas, suas unhas me arranham e eu solto um uivo de satisfação. Vou deslizando

a língua até seu colo e dou beijo antes de seguir até seios. A minha língua

molhada e quente deixa Safira toda arrepiada.

Desço uma mão até sua boceta e introduzo dois dedos em sua entrada

encharcada. Movimento meus dedos em seu clitóris e intensifico a cada gemido

baixo e sensual que consigo arrancar dela.

Em um movimento rápido, coloco Safira deitada de bruços no colchão,


com a bunda empinada em minha direção. Lambo os lábios ao olhar para sua

vagina encharcada, ela está tão excitada quanto eu. Safira choraminga quando

abro os lábios da sua boceta com os dedos e enfio a língua, faço movimentos

como se estivesse a fodendo com o meu pau, então ela rebola na minha cara e

suja meu nariz com a sua lubrificação.

Abocanho seu clitóris ao mesmo tempo que enfio dois dedos na sua gruta

de prazer. A cada movimento meu, Safira se contorce na minha boca enquanto

sua respiração fica cada vez mais ofegante, então percebo que está quase

alcançando o seu clímax. Ela está tão perto de ter um orgasmo, que suas pernas

ficam bambas, mas eu não deixo de castigá-la com a minha língua e dedos até

que ela goza. O líquido do seu gozo escorre e eu chupo seu sumo até a última

gota.

— Me faça sua, Victor — pede com doçura quando beijo cada lado da sua

bunda.

— Você já é minha, meu amor. — E isso é realmente verdade. Desde o dia

em que a possui ela é minha. Louco para me enterrar em Safira, coloco-a deitada

de frente para mim e abro as suas pernas, então, cuidadosamente, deito meu
corpo sobre o dela, beijo seu pescoço, o mordisco e o acaricio com a minha

língua, depois levo a mão ao meu pênis ereto e roço em sua entrada melada.

Em poucos segundos a penetro com facilidade. Safira geme de satisfação

quando movimento meus quadris e arremeto nela com mais velocidade. As

estocadas se tornam cada vez mais duras e prazerosas.

Safira puxa meus cabelos e me arranha e morde meu ombro, enquanto

aperto a carne da sua coxa com força e deslizo para dentro da sua boceta,

lentamente de início e investindo com mais vigor logo em seguida. A mãe do

meu filho agarra os meus ombros enquanto faço movimentos de vaivém sem

parar, com o suor deslizando por minha pele quente. Só ouvimos os sons dos

nossos gemidos e do nosso corpo se chocando um contra o outro. Nossos lábios

vão de encontro ao outro e nos beijamos apaixonadamente. Uivo ao sentir a

vagina dela apertar meu pau, então grudo nossas testas e a beijo conforme vou

entrando e saindo dela lentamente.

— Goze, amor, goze para mim. — Sinto o corpo de Safira amolecer e

percebo que está chegando ao limite. Faço questão de olhar em seus olhos

durante sua libertação, quando ela morde o lábio com tanta força que quase o
machuca.

Depois de gozar, ela se abre mais para mim e leva as mãos à minha bunda

e a aperta. Dou uma última estocada antes de encontrar o meu deleite, então,

exaurido, me jogo ao seu lado e a puxo para os meus braços.

— Você me esgotou — diz, bem-humorada. Safira apoia suas costas em

meu peito e eu aproveito para beijar seus cabelos.

— Mal começamos. Está pedindo arrego? — provoco-a, soando divertido.

— Mas é folgado! — Ela finge ficar brava e me dá uma cotovelada de

leve.

— Estou brincando, minha linda — gargalho —, também estou cansando.

Tivemos um dia de cão, mas quando ficamos sozinhos tudo se torna melhor, ao

seu lado encontro a verdadeira paz — falo em seu ouvido.

Ela boceja e fala algo ininteligível, em poucos segundos minha mulher está

dormindo em meus braços, e não demora muito para que minhas pálpebras

fiquem pesadas.

**
— Miguel, você vai me deixar de cabelos brancos antes da hora!

Assusto-me com o grito de Safira assim que termino de arrumar a minha

gravata. Saio da frente do espelho e me viro para ver o que está acontecendo, me

deparo com nosso filho tentando subir em nossa cama sozinho, que é alta demais

para ele. Danadinho.

Estamos acordados desde as sete e meia, nosso filho nos acordou chorando

e chamando por “papai”. Safira e eu ficamos alertas, e antes de ela descer para

preparar a mamadeira dele, deu a ele algumas gotas de um medicamento

receitado pelo pediatra.

— Filhão, assim você assusta a sua mamãe e ela não vai querer te dar um

irmãozinho — falo ao me aproximar dele, que puxa o lençol para fora da cama.

Pego o espertinho no colo e ele se debate, querendo voltar para o chão.

— Ele está impossível. — Safira bufa, irritada.

— Ele só estava se divertindo um pouco, não é? — Rio e beijo a bochecha

dele, que logo acha graça e dá uma risada gostosa.

— Ele quer me enlouquecer, isso sim. Me dê esse pequeno bagunceiro,


pode deixar que assumo daqui. — Ela se aproxima de nós, já sorrindo.

Passo o braço ao redor da sua cintura e a beijo, depois beijo a testa do

nosso menino. A cada dia me apaixono mais por ela, tão linda, sorridente,

distinta.

— Safira... — chamo-a e ela fixa seus olhos claros nos meus, esperando

que eu fale.

— O quê? — Sorri, com a sobrancelha arqueada, aparentemente curiosa.

— Eu já disse que te amo? — declaro sem tirar meus olhos dos dela.

— Não — sussurra, com os olhos brilhando.

— Eu te amo. O seu sentimento é recíproco, meu amor. — Dou mais um

beijo nela, mesmo sob o protesto de Miguel, que puxa meu cabelo e solta alguns

gritinhos. Afasto-me da mãe dele e saio do quarto, satisfeito por saber que mexi

com ela ao ter declarado o meu amor.

Quando descemos para tomar café não encontramos Vitória à mesa. Dona

Joana me diz que a minha filha tinha tomado café mais cedo e que saiu

carregando duas malas enormes. Até me pergunta se ela tinha ido viajar.
No mesmo instante pego meu celular e ligo para Vitória, mas sou

ignorado, ela simplesmente recusou a ligação depois de chamar duas vezes.

Era só o que faltava, Vitória foi embora de casa.


SAFIRA

Faz alguns dias que Vitória saiu de casa, e nem ela e muito menos o pai
dão o braço a torcer. Minha amiga por ainda estar chateada com atitude da

pessoa que tanto ama, e Victor pelo simples fato de ter saído de casa sem avisar

e ter se mudado para a casa que era dos avós, proveniente de uma herança.

Já não suporto mais ver os dois brigados, uma hora ou outra terão que se

resolver. Não sei se estarei me intrometendo muito, mas decidi que hoje pai e

filha irão se encontrar para que possam ao menos ter uma conversa civilizada.

Eles são a minha família e essa situação não pode continuar, não é saudável para
ninguém.

— Deveria comer um pouco. — Olho para o café dele que ainda não

tocou. Todas as manhãs Victor dá uma passada no quarto da filha e sai de lá com

o semblante triste.

— Já bebi um copo de suco. — Victor dá um sorriso fraco e desvia o seu

olhar para o nosso filho que está sentado em sua cadeirinha, se melecando com

as frutas. — Fui tão ruim assim, para ela nem mesmo ter me ligado para dizer

onde está? Tudo o que eu disse foi para o bem dela, jamais a privaria de viver

um amor, mas tenho medo de que ela saia machucada. Eu sou homem, conheço

bem essa raça, e principalmente o Lucas. — Sua voz demonstra o quanto está

magoado.

Ficamos sabendo para onde a minha amiga foi depois que ela me ligou

para dizer que está bem e passar seu novo endereço. E como ela não me disse

para não falar nada ao Victor, eu contei sobre o telefonema e onde ela está.

Fiquei um pouco chateada com ela, não achei certo ela ter saído sem dizer nada,

deixando o pai extremamente preocupado.

— Mas você precisa comer, meu amor. — Coloco minha mão por cima da
dele e a acaricio. — Eu disse que não ia me intrometer, mas preciso dar o meu

ponto de vista. Não acho que você errou, mas talvez não tenha se expressado

direito. A maneira como descobriu o envolvimento deles foi até... traumática.

Você se deixou levar pela raiva e disse coisas que a magoou muito.

Normalmente os filhos esperam apoio dos pais, sabe? Nós, filhos, mesmo que

tenhamos cometido o maior erro da nossa vida, sempre desejamos que nossos

pais nos apoiem, não importa a circunstância.

“E eu sei que Vitória esperou de você, ela queria seu apoio ou ao menos

compreensão no relacionamento dela com Lucas. Amor, ela só queria que o pai a

apoiasse mesmo que o seu coração saísse machucado no fim de tudo, mesmo que

ela se decepcionasse. Eu sei que não posso me intrometer na vida de vocês, mas

acredito que você deve deixá-la viver, deixe-a amar, se magoar, quebrar a cara,

ter o coração partido, ser amada, ser feliz. Apenas deixe a Vitória viver e

conhecer a vida. Vá atrás da sua filha e diga que a ama, que aceita o

relacionamento dela. Apenas esteja do lado dela, dê sua bênção, o resto vai se

resolvendo. Vitória é adulta e se está decidida a ter uma relação com alguém que

ela conhece muito bem, só faça a sua parte.


“Victor, eu aprendi nessa vida que o que não nos mata só nos fortalece —

falo o que estava entalado há muito tempo, mesmo sob o olhar de Victor, que

não é de raiva, mas sim de admiração e surpresa. — Pare de ver a sua filha como

uma criancinha, ela cresceu, é uma mulher adulta que é capaz de decidir o que é

bom ou ruim para ela. Sei que ama a sua filha, e que no momento o orgulho está

falando mais alto, mas você está morrendo de saudades dela e deseja tê-la ao seu

lado. Eu tomei a liberdade de fazer algo que não sei se você vai gostar muito,

mas fiquei satisfeita só por ela ter aceitado — sorrio para ele, que está

boquiaberto com minhas palavras.

— Safira, eu...

Victor para de falar quando uma voz conhecida chega aos nossos ouvidos.

— Joana, eu já tomei café e não emagreci coisíssima nenhuma, são seus

olhos! Só vim aqui para ver o meu irmão e a minha...

A voz divertida de Vitória desaparece assim que seus olhos assombrados

vão parar na mesa onde Victor, eu e Miguel estamos neste momento.

— Bom dia, amiga. — Sorrio para ela, que recua parecendo incerta. Dona

Joana percebe a tensão no ar e pede licença baixinho antes de nos deixar a sós.
— Acredito que vocês tenham muito o que conversar. Precisei armar um

encontro entre duas pessoas cabeças-duras que estão deixando o orgulho falar

mais alto. — Pisco para Victor e noto que se remexe na cadeira.

— Safira. — O tom de Vitória é de repreensão, só então reparo que ela tem

olheiras e o olhar está triste.

— Nada de Safira. Eu os conheço muito bem e sei que neste momento

precisam ficar sozinhos. Se for para me esganar faça isso depois, agora estou

subindo com Miguel para preparar o banho dele. — Levanto-me da cadeira e

sigo até o meu filho, que já terminou de comer as frutas do seu pratinho. —

Vamos, meu amor? O papai e sua irmã precisam conversar. — Pego meu

pequeno no colo e ele sorri animadamente.

— Amiga, eu vou com você. — Vitória dá alguns passos em minha

direção.

— Filha, não vá — ela para e se vira —, quero conversar com você, por

favor — diz Victor, decidido e cheio de saudade.

Olho para os dois, que agora estão se encarando com muita emoção, e

acabo deixando uma lágrima cair. É nítido que os dois estão loucos para se
reconciliarem, eu só dei um empurrãozinho. De fininho, eu saio da sala e sigo

para o quarto com Miguel.

**

VICTOR

Encaro Vitória enquanto peço para conversar comigo. Há dias não temos

contato, ela rejeitou as minhas ligações e não me contou onde estava, me privou

de saber se ela estava bem. O comportamento dela me magoou. Eu a amo e só

quero vê-la bem.

Fiquei furioso ao saber do envolvimento deles, conheço Lucas bem até

demais, estava apavorado e chateado por terem ocultado de mim algo tão

importante. Não sou ninguém para julgá-los, mas Lucas foi hipócrita, ele sempre

me aconselhou a falar a verdade mesmo que houvesse consequência. Ele saiu

com outras mulheres mesmo estando com a minha filha? É esse tipo de homem

que a minha filha quer para a vida dela? E onde fica o respeito nessa história

toda? Em lugar nenhum. Ele devia ter sido sincero comigo.

— O que o senhor quer? — minha filha pergunta, com a voz embargada.


Não digo nada, somente me levanto e vou até ela, abraçando-a fortemente

assim que a alcanço.

As palavras de Safira me fizeram analisar as minhas ações, percebi que o

meu medo de ver a minha filha se decepcionar não é tão importante assim. A

vida é dela, a decisão sobre o que fazer quem tem que tomar é ela, e se ela ama o

Lucas, o que posso fazer?

A gente não manda no nosso coração, e se Vitória quer viver um

relacionamento com ele, por que eu vou impedir? Sim, estou apavorado, mas é

um risco que ela quer correr, e só me resta estar sempre do seu lado, apoiando-a

no que for preciso.

— Como você está? Tem se alimentado direito? O que tem feito esses

dias? — Solto uma pergunta atrás da outra, com meus braços ao redor do seu

corpo enquanto ela permanece imóvel.

— Estou bem, pai — só então ela retribui o meu abraço e soluça. — Senti

falta disso. — Chora e eu quase a acompanho.

Que saudade eu estava de ouvi-la me chamando de pai.


— Volte para casa, minha filha, por favor. — Afasto-me um pouco, beijo

sua testa e acabo deixando uma lágrima cair. — Nunca fiquei tanto tempo sem te

ver, estava com saudades, querida. Você é a minha vida... Não quero que se

afaste de mim. — Aperto-a mais em meus braços.

— Pai, eu continuo com o Lucas e o s...

— Shhh — eu a interrompo. — Não importa. Você o ama? — indago,

mesmo já sabendo a resposta.

— Sim, amo... muito, e não quero ter que escolher um dos dois — declara,

chorando, antes de encostar a cabeça em meu peito.

— E quem disse que você precisa escolher, se pode ter os dois? — falo,

bem-humorado, passando a mão em seu cabelo longo.

— Quer dizer que... — Ela levanta o rosto e me olha emocionada.

— Não estou bravo por que está namorando o meu melhor amigo, aquele

miserável, mas porque o conheço bem e sei que você pode se machucar. E se

isso acontecer, a nossa amizade vai acabar — confesso, com pesar. Vitória

morde os lábios, parecendo apreensiva. — Lucas é como um irmão para mim,


mas entre ele e você, eu sempre te escolheria, minha filha.

— Pai, eu errei em não te contar sobre Lucas, mas fiquei com medo de que

o senhor não recebesse bem a notícia. E você só o encontrou aquele dia aqui em

casa porque ele veio trazer um medicamento para o Miguel. Você e Safira

estavam na delegacia, então pedi a ele para comprar e me trazer e... ele acabou

ficando para me fazer companhia, logo o senhor chegou com a Safira e...

aconteceu aquilo tudo. O Lucas pretendia conversar com senhor, mas então a

maluca da Alessandra aprontou tudo aquilo e o senhor chegou e acabou tirando

conclusões precipitadas. Aquele dia realmente não estávamos fazendo nada além

de tomar conta do meu irmão.

“Sr. Guterres, quero que saiba que sei lidar com o Lucas, fique tranquilo.

Ele não tem mais aquela lista enorme de contatinhos. Acha que iríamos namorar

se ele continuasse tendo contato com outras mulheres? Não que ele não possa ter

amigas, claro que pode, mas não as que ele já dividiu a cama. Eu amo o Lucas,

mas antes de tentar algo sério eu o coloquei contra a parede, eu o deixei de

molho para que pudesse entender que não sou nenhuma idiota. — A maneira

dela de falar me faz gargalhar.


Senti falta dessa garota. É tão bom ver o seu sorriso e ouvir sua voz

quando tudo está sob controle.

— Então quer dizer que você colocou o grande Lucas na coleira? —

Arqueio a sobrancelha quando ela empina o nariz.

— Sim, senhor. Ele que vacile comigo... eu já disse que arrumo outro num

piscar de olhos. Pai, pode ficar tranquilo, tudo nessa vida é aprendizado, não é?

Apenas confie em mim, não fique com medo de eu me magoar, porque se isso

acontecer vai ser por minha culpa, o.k.? Sou jovem, preciso conhecer mais a

vida, e acho que chegou a hora — fala, me deixando ainda mais orgulhoso.

— Você está certa. — Dou um sorriso. — Quer dizer que agora eu tenho

um genro? — provoco-a e ganho um tapa no ombro.

— Aham, tem sim, seu Victor. O seu melhor amigo agora é seu genro —

me atiça de volta e eu rio.

Ela sai do meu abraço e eu já sinto sua falta, então se senta em uma das

cadeiras e fica me encarando, parecendo mais feliz, satisfeita.

— Tenho que aprender a conciliar essas duas coisas. — Finjo pensar,


fazendo ela rir e revirar os olhos.

— Obrigada, pai. Agradeço por me apoiar, e me perdoe por não ter

atendido as suas ligações, eu estava chateada — se explica, já com os olhos

lacrimejados.

— Filha, nós dois erramos, então não temos que pedir perdão — falo,

sorrindo, e ela assente.

— Agora que já estamos bem novamente, vou ver meu gostoso lá em

cima. Estava morrendo de saudades de todos vocês. Vou lá abraçar a minha

amiga por ter tomado uma atitude que deveríamos ter tomado faz tempo, não é?

— diz e levanta-se.

— Vitória, você não me disse se vai voltar para casa. — Sinto um nó se

formar na garganta.

— Pai, temos o dia todo para conversar, o.k.? Tenho uma novidade, mas

vou deixar para contar mais tarde. — Sorri e pisca para mim, me fazendo suar

frio.

— Ah meu Deus, vou ser avô! — Passo a mão na testa e arregalo os olhos.
— Se controla! Não estou grávida, é muito cedo! — Gargalha, levando a

mão à barriga para tentar conter a risada.

— Ufa, pensei que teria que marcar mais um pouco a cara do Lucas —

falo, ficando um pouco mais calmo.

— Tadinho dele... o senhor fez um verdadeiro estrago. — Ela me olha

divertida.

— Se eu o convidar para almoçar com a gente acha que ele vai querer

revidar? — Sondo-a, com os olhos semicerrados.

— Acho que não, ele tem que conquistar o sogro, certo? — Ela dá de

ombros.

— Chama aquele desgraçado para vir aqui em casa, diga a ele que quero

fazer um acordo de paz.

Vitória se alegra, vem em minha direção e me abraça.

— Está sendo muito importante o seu apoio — diz, com a voz embargada.

— Te amo, pai, muito.

— Também te amo, princesa, e se for para te ver feliz, faço qualquer coisa
— digo com sinceridade. — Chame o Lucas para vir, eu até o chamaria, mas

acho que ele vai me xingar muito até decidir ceder.

— Pode deixar, ligo para ele mais tarde.

Hoje não vou trabalhar, quero passar o dia com a minha família. Estou

ansioso para a chegada do Lucas, vai ser divertido vê-lo depois de tantos dias.

**

Estamos na sala há um tempo, aguardando a chegada do nosso convidado,

quando Vitória recebe uma mensagem dele avisando que havia chegado. Ela está

tão apaixonada, que sequer deixou dona Joana atender a porta, ela mesma se

adiantou e foi abrir para o namorado.

Olho para o casal que se aproxima de mãos dadas, ainda receoso e

estranhando ver meu melhor amigo e minha filha grudados. Passo a mão no

pescoço e disfarço com um breve sorriso para Lucas, que me lança um olhar

mortal. Não contenho a risadinha ao ver que ainda tem algumas marcas da surra

que dei nele.

— Pai, aqui está o seu convidado — Vitória diz, bem-humorada.


Meço Lucas da cabeça aos pés, com os olhos semicerrados, e ele faz o

mesmo, com a expressão fechada.

— Não vai cumprimentar o seu sogro, Lucas? Já perdeu ponto comigo por

ser mal-educado — provoco-o.

— Vá se foder, Victor! — ele resmunga, me fazendo gargalhar enquanto

jogo a cabeça para trás.

— Ei, não fale palavrões com meu filho aqui! — Safira reclama enquanto

tapa os ouvidos de Miguel, que ri sem entender nada. Amo a inocência das

crianças.

— Desculpe, Safira, mas Victor me tira do sério. — Lucas olha meio sem

graça para Vitória parecendo pedir desculpas com o olhar, e depois faz o mesmo

com a minha mulher.

— Dá para vocês dois pararem com isso? Está ficando feio. — Vitória se

manifesta, irritada. — O senhor convidou o Lucas para ficarem discutindo, é? —

questiona.

— Não, querida, só estava querendo me divertir um pouco. E consegui. —


Dou de ombros ao mesmo tempo em que Lucas dá alguns passos em minha

direção. Levanto as mãos em modo de rendição.

— Muito engraçadinho você — meu amigo resmunga e fala um palavrão

baixo.

— Será que podemos conversar a sós? — pergunto, sério.

Lucas assente. De relance, vejo as duas mulheres trocando um olhar

preocupado.

— Não nos olhem assim, Lucas e eu nos conhecemos há anos, o mínimo

que vai acontecer é um quebrar a cara do outro e depois tudo volta ao normal. —

Assim que falo elas arregalam os olhos.

— Vamos logo, Victor, você está me fazendo perder tempo — o imbecil

ousa me provocar ao passar por mim e seguir para o corredor do meu escritório.

— Pai, prometa que não vai assustar o coitado — pede minha filha, meio

apavorada.

— Filha, Lucas e eu não somos mais moleques, vamos ter uma conversa

civilizada, preciso saber quais as intenções dele com a minha princesa — digo.
Antes de ter a resposta dela, sumo pelo corredor.

Entro na minha sala e encontro Lucas espalhado no sofá. Ainda bem que

ele nem imagina o que eu e Safira já fizemos no móvel. Com o semblante

fechado, fico de frente para ele, até que o filho da mãe me encara com um

sorrisinho.

— Achei que não ia me convidar para vir à sua casa, sogrão — diz e

gargalha.

Desgraçado!

— Estou pensando seriamente em quebrar a promessa que fiz à minha

filha em te deixar sair vivo da minha casa — falo, raivoso, fechando os punhos.

— Você me bateu e eu nem revidei, mas não pense que vai ficar por isso

mesmo. — Ele passa a mão na barba e arqueia a sobrancelha. — Não era você

que estava todo engraçadinho minutos atrás?

— Você mereceu cada porrada. Vamos logo acabar com essa merda,

Lucas, me diga de uma vez o que quer com a minha filha. Não vou permitir que

ela seja mais uma das suas aventuras. Nos conhecemos desde criança, sempre
fomos próximos, temos uma história juntos e você não é um dos melhores

homens da face da Terra para se comprometer com alguém — falo com

seriedade.

Lucas engole em seco, fica tão mexido que se ajeita no sofá e respira

fundo.

— Tenho sentimentos por Vitória, Victor. — Fixa seus olhos sérios em

mim.

— Que sentimentos são esses? Seja mais claro, preciso tranquilizar o meu

coração. Você sabe muito bem que eu viro uma fera quando o assunto é a minha

filha. — Aponto o dedo para ele, que concorda.

— Eu amo a sua filha, cara. — Abaixa a cabeça, me deixando perplexo

com tamanha intensidade que declara. — Nunca gostei de mulheres mais novas,

você sabe disso, mas... Vitória é diferente.

Ela me conquistou com simples gestos, sorrisos... aquela garota é como fogo e

eu...

— Me poupe esses detalhes — interrompo-o, constrangido.


— Eu a amo. E mesmo que você não acredite em mim por conhecer todo o

meu passado, quero que saiba que estou disposto a tudo para ter Vitória ao meu

lado — fala com determinação e sinceridade. — Vitória não é qualquer uma para

mim, é diferente de todas as mulheres que eu já tive. Ela alegra meus dias, me

faz sorrir, me deixa bobo com qualquer coisa que faz. Amigo, eu estou

apaixonado por sua filha.

— E aquele papo de que ela é muito mimada? — pergunto, cruzando os

braços.

— Ainda não mudei muito a minha opinião, mas sei que ela é uma pessoa

incrível, e me surpreende a cada dia. Victor, eu só aceitei o convite de Vitória

para vir conversar com você porque é meu melhor amigo e não pretendo mudar

isso, porque, além de sermos amigos, eu o respeito e sei que tem medo de ver a

sua família magoada. Pode ter certeza de que eu darei o meu melhor para cuidar

de Vitória enquanto ela estiver comigo. — Posso ver nos olhos dele que

realmente a ama.

— É, você a ama. — Avalio-o por alguns segundos e ele assente.

Aproximo-me dele e estendo a minha mão, Lucas sorri e a pega, então damos
um aperto de mão e eu o puxo para um abraço. — Bem-vindo à família, não que

você já não fosse, mas agora é diferente. — Dou uma risada e ele me

acompanha.

— Obrigado, irmão, fico feliz por termos nos entendido — diz e se afasta.

— Irmão não, mais respeito. Agora sou seu sogro — falo com a expressão

fechada, mas depois caio na risada e ele me segue. — Vamos logo, antes que as

nossas garotas venham atrás da gente pensando que nos matamos.

— Victor, já que você me chamou aqui para esclarecer tudo, eu quero te

dizer uma coisa.

— O que é?

— Vitória vai morar comigo. Eu pedi para ela se mudar para a minha casa

e ela aceitou, espero que não...

— Minha filha não é mais uma criança, e se essa é a decisão dela tenho

que aceitar. Logo ela fará vinte e três anos, não posso tê-la sempre debaixo das

minhas asas. — Sinto minha garganta queimar e meu coração se apertando.

Tenho que aceitar o fato de que Vitória já é uma mulher.


— Então você aceita? — indaga, curioso.

— Não tenho que aceitar nada, a vida é de vocês. Desejo que sejam

felizes.

Por breves segundos o silêncio toma o ambiente, até que ouvimos algumas

batidas à porta.

— Vocês estão vivos? — É Vitória.

Lucas e eu nos entreolhamos antes de seguirmos até a porta. Quando eu a

abro me deparo com a minha filha nos analisando, provavelmente está

procurando algum machucado em nós.

— Estamos bem. — Pisco para ela, que sorri.

— Victor? — Lucas me chama e eu me viro para ele, mas não tenho tempo

de responder antes de o filho da puta me dar um soco no rosto. — É o mínimo

que merecia por ter me batido.

— Lucas, está maluco? — Vitória exclama, revoltada. Ela vem até a mim e

olha para o meu rosto que arde e lateja. — Pai, está doendo muito? — pergunta,

preocupada, enquanto ignora o namorado que diz que logo vou ficar bem.
— Estou bem, querida. — Levanto meu rosto e olho para o imbecil que

sorri de lado. — Não se preocupe comigo, Lucas e eu agora estamos quites. O

que importa é que eu o deixei pior.

— Meu Deus, quando vocês se juntam ficam insuportáveis. Agora entendo

o porquê de serem amigos há tantos anos. — Ela me solta, nos dá as costas e

segue para a sala.

Lucas e eu nos olhamos e rimos, então a seguimos para nos juntar a nossa

família.
SAFIRA

Depois de Victor ter se reconciliado com o melhor amigo e a filha tudo

voltou ao normal em casa, agora somos novamente uma família unida. Hoje

iremos jantar no Bella Flor, Victor nos convidou após o almoço de anteontem.

Agora a minha amiga está me ajudando com a maquiagem, enquanto Miguel

está lá embaixo com o pai e Lucas nos esperando.

— Pronto, terminei! — Abro os olhos ao ouvi-la falar. — Você está muito


linda, amiga — diz Vitória.

Sorrio quando ela sai da minha frente, me dando a visão do meu reflexo no

espelho. Meus olhos estão delineados e meus cílios bem alongados, minha amiga

usou uma sombra marrom chocolate com um brilho bem discreto e para finalizar

um lindo batom vermelho. Estou realmente muito bonita, e o vestido midi preto

de renda com modelagem justa e de alças completou perfeitamente o look.

— Obrigada! — agradeço-a, dando uma voltinha. — Hoje parece que é

meu dia de princesa. — Olho para o penteado elegante e ela ri.

— Não, minha amiga, hoje é o seu dia de rainha — fala com a voz

empolgada demais para o meu gosto. — Acho que podemos descer, não é?

Assinto, maravilhada. Vitória também está linda com seu vestido branco e

longo sereia, com detalhes simples e uma fenda na lateral. Seu cabelo está preso

em uma trança longa. Lucas é um homem de sorte por tê-la. Minha amiga tem a

personalidade muito forte, é uma garota inteligente, tem muitas qualidades, e é

um ser humano incrível. Eu a admiro demais.

Descemos e nos deparamos com os rapazes sentados no sofá nos

esperando. Provavelmente estão impacientes, porque Victor olha para o relógio


em seu pulso e balança a cabeça, enquanto Lucas faz o mesmo. Minha amiga me

cutuca e pigarreia para chamar a atenção do seu namorado e depois do pai. Os

dois homens se levantam e nos encaram boquiabertos, admirados.

— Demoramos um pouco, mas foi por uma boa causa! — diz Vitória ao

descermos os últimos degraus da escada.

Victor e Lucas vem em nossa direção, ambos sorridentes e elegantes

dentro dos seus ternos.

— Você está linda! — Victor diz ao se aproximar. Ele pega a minha mão e

deposita um beijo carinhosamente, e assim como eu, ele não consegue desviar o

olhar.

— Obrigada, você também está — digo, com o sorriso largo.

— Missão dada, missão cumprida, sr. Victor! Sua amada está pronta e

lindíssima para sair com o senhor — declara Vitória, atraindo a minha atenção.

Estranhando suas palavras, eu olho para ela, mas a encontro encarando

Victor, rindo em cumplicidade.

— Como assim, amiga, vocês não irão com a gente? — Fico sem entender
quando Victor me abraça pela cintura e beija meu rosto.

Vitória sorri para mim e balança a cabeça negando.

— Safira, essa noite será muito especial para você e para o meu pai.

Espero que curtam. Podem ficar tranquilos, vou cuidar muito bem do meu irmão

até que voltem — diz Vitória.

Então me lembro de ter visto pai e filha cochichando pelos cantos da casa

o dia todo, e quando eu aparecia sempre disfarçavam. Aquilo estava me

incomodando, mas deixei para perguntar mais tarde e acabei me esquecendo.

Agora tenho certeza de que estavam tramando alguma coisa.

O que será que Victor está aprontando?

Boquiaberta, olho para a minha amiga sem acreditar que ela passou a

manhã toda falando como estava animada para o jantar dessa noite. Nem em

meus melhores sonhos imaginaria que por trás de toda a sua animação havia uma

pequena mentira. Estou me perguntando se ainda haverá o jantar no restaurante,

ou se Victor tem outros planos para nós. Decido não perguntar nada, vou me

permitir ser surpreendida por ele.


— Uau, por essa não esperava. — Rio ao olhar para o meu filho, que está

sentado no sofá brincando animadamente com os brinquedos novos que ganhou

do pai.

— Surpresa, amor — diz Victor, antes de beijar o meu pescoço.

— Vão, divirtam-se! Não se preocupem com nada, apenas curtam a noite,

sejam felizes. Só não me deem outro irmãozinho tão cedo — diz minha amiga,

sem filtro. Seu namorado a cutuca, mas ela dá de ombros ignorando-o e ele fecha

a cara.

Balanço a cabeça e sorrio ao avaliar Vitória. A safada me enganou

direitinho, se arrumou toda e vai ficar tomando conta do meu filho. Tudo não

passou de uma farsa.

— Boa sorte, meu amigo — finalmente Lucas se manifesta. Ele se

aproxima de Victor e dão um breve abraço.

Não entendo o motivo de ele desejar sorte ao Victor, tenho certeza de que

aí tem coisa.

Após darmos um beijo em nosso filho, saímos da casa e seguimos para o


carro. Assim que entramos no veículo colocamos o cinto de segurança e Victor

dá partida, seguindo para o nosso destino.

— Ainda vamos para o Bella Flor? — questiono minutos depois. Estava

decidida a não perguntar nada, mas a minha curiosidade fala mais alto.

— Vamos sim — diz, concentrado no trânsito. Ele não me olha, mas leva

uma das suas mãos até a minha e entrelaça nossos dedos enquanto conduz o

carro com uma mão só.

**

Depois de um tempo chegamos ao local. Victor estaciona o carro em uma

das vagas do estacionamento do restaurante, abre a porta do lado do condutor e

sai, logo em seguida abre a porta para que eu possa sair.

— Que cavalheiro, sr. Guterres. Obrigada! — digo, sorrindo com doçura.

Victor pisca para mim e coloca a mão na minha cintura, me conduzindo até

o restaurante que parece estar pouco movimentado essa noite. De onde estou

consigo ver o lindo salão com grandes janelas de vidro do chão até o teto, a vista

de quem está de fora é tão boa como quem está na parte de dentro. Adentramos
no local e eu só tenho a confirmação do pouco movimento quando um dos

funcionários se aproxima para nos cumprimentar.

— Boa noite, senhores. Senhor Victor, estávamos à sua espera — diz um

rapaz alto e jovem, com o uniforme do Bella Flor.

Olho ao redor e estranho ao ver que no lugar não tem clientes, somente o

rapaz que veio nos receber, dois garçons perto do balcão, eu e Victor.

— Boa noite, Caio — Victor o cumprimenta, sorridente. — Já está tudo

pronto? — pergunta.

Caio assente alegremente e nos pede para segui-lo. Somos levados a uma

mesa afastada, meu coração erra a batida a cada passo que dou até ela. Fico

maravilhada com a visão que tenho — o chão está com pétalas de rosas

vermelhas, a mesa decorada com rosas da mesma cor e velas que deixam o

ambiente ainda mais romântico. Meu peito dá um salto enquanto meus olhos

localizam o champanhe e as duas taças, meus olhos ardem com a emoção que

me domina. Constato que hoje iremos comemorar algo que ainda não é do meu

conhecimento.

— Sente-se — Victor pede e eu assinto. Ele afasta um pouco a cadeira


para que eu me sente, em seguida, faz o mesmo do outro lado da mesa. Estava

tão distraída que nem percebi a saída do funcionário que estava há poucos

instantes ao nosso lado.

— Vamos comemorar alguma coisa e eu não sei? — Fixo meus olhos nos

do meu acompanhante, que me olha com adoração e sorri enquanto balança a

cabeça.

— Tenho uma proposta para te fazer, mas primeiro vamos comer. Preciso

alimentar a minha mulher — fala de maneira sexy e pisca para mim.

Sinto meu ventre esquentar quando ele morde os lábios, ainda com seus

lindos olhos em mim.

— Estou ansiosa — confesso, passeando meus olhos pela bela mesa.

Em poucos minutos o ambiente é tomado por uma música baixa e

romântica. Sinto como se estivéssemos em uma daquelas cenas de livros onde o

mocinho prepara um jantar romântico para conquistar o coração da amada.

— Me concederia uma dança?

Fico surpresa com o pedido do homem da minha vida. Ficando em pé,


Victor estende sua mão para mim e eu sorrio quando a aceito rapidamente. Ele

me puxa para perto do seu corpo, coloca a mão em minha cintura e logo estamos

dançando lentamente enquanto descanso o rosto em seu peito e fecho os olhos.

Ficamos bons minutos assim, nos deixando levar, até que Victor me gira e me

traz de volta para ele. Coloco a mão em seu peito e aproximo meu rosto do seu,

roçando meu nariz no dele em um gesto carinhoso.

— Se queria me surpreender, pode ter certeza de que conseguiu muito

mais. — Sorrio, com o rosto ainda muito próximo ao dele.

— Bom saber que fui além da sua expectativa.

Sinto seu hálito quente contra minha pele. Victor roça seus lábios nos

meus, e, em poucos segundos, estamos nos beijando apaixonadamente.

Aprofundamos o beijo com tanta intensidade que gememos com as nossas bocas

grudadas. Ao me lembrar que não estamos sozinhos, encerro o nosso beijo com

pequenos selinhos. Tímida, olho em direção ao balcão do restaurante e noto que

ninguém está nos observando, mesmo assim, afundo meu rosto no pescoço de

Victor, que solta uma gargalhada.

— Que vergonha, devíamos deixar as pegações para quando chegarmos a


nossa casa — murmuro, sem saber onde pôr a cara.

— Não tem ninguém nos olhando, Safira — ele diz, bem-humorado,

quando me afasto dele.

— Você deveria ver o estrago que meu batom fez na sua boca. — Risonha,

tento limpar a marca que deixei na boca dele. Aposto que a minha também não

está numa situação muito melhor.

Victor se afasta e vai até a mesa, pega o guardanapo e me ajuda a limpar os

cantos da minha boca, depois o ajudo também. Voltamos a nos sentar e ele

chama um dos funcionários, logo estamos sendo servidos com um prato especial.

Comemos, conversamos animadamente, até que chega a hora da sobremesa.

Estou mais do que satisfeita, então recuso, assim como ele. As horas passam e os

funcionários de Victor vão embora e nos deixam para fechar o local.

— Ainda estou sem acreditar que deixou de abrir o restaurante para que

pudesse me fazer essa surpresa — digo, passando a mão no cabelo e sorrindo.

— Quero que tudo seja especial na noite do pedido. — Assim que termina

de falar, ele se levanta e vem até a mim.


— Pe-di-do? — gaguejo, pensando em mil coisas, com as pernas bambas.

Victor assente e coloca a mão no bolso da calça, tirando dali uma caixinha

de veludo .

— Eu já cheguei a dizer que nunca mais me casaria, mas você

simplesmente entrou na minha vida e a virou de cabeça para baixo, conseguiu

fazer comigo o que nenhuma mulher com quem já estive foi capaz de fazer —

discursa. Fico tocada com suas palavras. — Com você eu descobri o que é ser

amado de verdade por uma mulher, e também aprendi a amar, Safira. Sou um

homem de trinta e oito anos e você tem vinte e cinco, mas em alguns momentos

me dá lições de vida que me faz te admirar ainda mais.

“Eu te acho uma mulher incrível, uma mãezona, cuidou do nosso filho

sozinha por muito tempo. Você poderia ter tentado me encontrar, mas não o fez,

seguiu em frente. Só que o destino quis que nos encontrássemos de novo e aqui

estamos nós, juntos e apaixonados, vivendo uma vida maravilhosa ao lado do

outro. Safira, jamais imaginei que a minha vida mudaria, ou que algum dia eu

pudesse amar alguém tão loucamente... Eu sei que não sou perfeito, tenho meus

defeitos, não sou nenhum santo, às vezes você vai querer me matar e depois me
encher de beijos.

“Estou há alguns anos com a aliança de casamento que foi da minha mãe

guardada, e nunca pensei em dar a nenhuma mulher, pois não tinha encontrado

alguém que realmente a merecesse. — Ele abre a caixinha. Sinto meus olhos

marejarem quando me levanto e vou até Victor, mas antes que eu fale alguma

coisa, ele se ajoelha na minha frente e pega uma das minhas mãos. — E agora

que te encontrei, sei que você é a pessoa que merece ter essa aliança, que tem um

valor inestimável para mim.

— Você... Você... — Estou tão nervosa, que não consigo formar uma frase.

— Safira de Andrade, você aceita se casar comigo? Aceita ser a senhora

Guterres? — Seus olhos brilham ao me fazer o pedido.

— Sim, sim, sim, um milhão de vezes sim, Victor! — Depois da minha

resposta, ele coloca a aliança em meu dedo. Ajoelho-me com ele e me jogo em

seus braços, chorando de tanta emoção. Ao notar o meu nervosismo, Victor me

abraça com força. — Claro que eu aceito me casar com você — sussurro em seu

ouvido e beijo seu rosto.

— Iremos nos casar amanhã — comunica. Afasto-me bruscamente dele e


me levanto meio desajeitada, fazendo Victor gargalhar ao ficar em pé também.

— Estou brincando, querida. Nos casaremos quando você quiser, o importante é

que eu já tenho uma noiva. — Pisca para mim e eu fico sem graça com a minha

reação.

— Podemos nos casar daqui a alguns meses? — pergunto, pensando nos

preparativos. Não desejo nada exagerado, quero algo único, só nosso.

— Eu já disse que pode ser quando você quiser. Agora vamos para casa,

quero fazer amor com a minha noiva, que em pouco tempo se tornará minha

esposa. — Abraça-me e rouba um beijo, que não demoro pra retribuir.

Com certeza eu me lembrarei de agradecer a Deus, porque é ele que nos

permite viver as coisas. O Senhor é o responsável por ter colocado na minha

vida novamente Victor Guterres, o homem desconhecido que apareceu no bar

onde eu trabalhava para afogar as mágoas na bebida, e acabou me fazendo um

convite para o acompanhar aquela noite, e eu, encantada por seu belo sorriso, por

aquele charme, aceitei. Por fim, disso resultou uma gravidez que me levou ao

céu e ao inferno, mas, no final, eu entendi que Deus escreve certo por linhas

tortas. E a minha história e de Victor é exatamente assim. Começamos errado,


mas agora estamos tendo a oportunidade de fazer as coisas certas, e eu não vejo

a hora de dizer sim para o homem da minha vida, diante do juiz e de todos que

vão estar presentes em nossa cerimônia.


VICTOR

Safira me pediu alguns meses para que pudéssemos nos casar. Por mais

que eu estivesse ansioso para ela se tornar a minha esposa, eu aceitei a sua

decisão.

E hoje é o grande dia, cinco meses depois do pedido. Ansiei tanto para que

esse dia chegasse e agora estou mais do que nervoso, nem mesmo meu melhor

amigo está conseguindo me acalmar com suas palavras reconfortantes, em

poucos segundos já lhe lancei vários olhares mortais.


— Você está me deixando aflito, cara, só relaxa! — diz Lucas, tocando no

meu ombro.

Olho para o juiz de paz e ele sorri para mim. Estou me sentindo tão

sufocado que nem consigo retribuir.

— Quando chegar a sua vez você vai me entender — resmungo e ele ri.

Lucas e minha filha estão morando juntos há alguns meses, e o que eles

têm é realmente sério, consigo ver isso agora. Meu amigo se tornou outro

homem, está tão diferente que nem parece o mesmo cara de um ano atrás. Ele

está cumprindo o que prometeu, está respeitando o relacionamento deles e

fazendo bem para Vitória.

— Sua testa está até suada. Fique calmo, aquela sua ex maluca não vai

aparecer aqui para sequestrar a sua noiva — brinca.

Bufo. Claro que a minha ex não virá ao meu casamento. Ela pegou uns

bons anos de prisão pelo que fez ao meu filho, o julgamento aconteceu na

semana passada. Nem mesmo os bons advogados que ela tinha foram páreos

para os que contratei para mantê-la onde estava desde aquele dia — atrás das

grades.
— Nem vou te responder — falo, olhando para as horas no relógio em

meu pulso.

Apreensivo, viro-me para a casa e mordo os lábios. Caralho, talvez eu

esteja exagerando, mas como não sentir esse turbilhão de sentimentos? Vou me

casar com a mulher que eu amo, a mãe do meu filho, minha melhor amiga. E o

que mais eu poderia pedir? Nada.

Imaginei muitas vezes dar esse passo tão importante com ela, e agora que

estamos quase lá, meu coração está prestes a sair pela boca.

Safira e eu optamos por uma cerimônia simples e íntima, então decidimos

que seria aqui, na área da piscina. As únicas pessoas presentes são a minha filha,

o namorado dela e a dona Joana, que está com Miguel no colo.

Passo a mão na cabeça e me viro para o juiz, respirando fundo pela

milésima vez para tentar me acalmar.

— E lá vem ela! — declara Lucas.

Viro-me rapidamente e vejo a noiva com um pequeno buquê na mão,

caminhando lentamente ao lado da minha filha. Safira está linda com seu vestido
branco de alcinha e a barra rendada na altura dos joelhos. Seu cabelo está solto e

ela usa uma tiara de flores branca na cabeça. Admirado, eu a analiso e quase

acabo babando. Ela sorri tão abertamente que me perco no seu sorriso.

Dois passos finais e tenho Safira comigo. Ela entrega o buquê para a

amiga, então seguro as suas mãos.

— Cuidem bem um do outro e sejam muito mais felizes do que já são.

Amo vocês! — diz Vitória. Sem esperar por uma resposta, ela caminha na

direção de Lucas.

— Você está linda — elogio-a, depois beijo suas mãos e ela sorri quando

volto olhá-la.

Nós nos viramos para o juiz e ele começa a discursar. Minutos depois

Safira e eu fazemos nossos juramentos e, em seguida, recebemos o

consentimento para trocar algumas palavras.

A cerimônia é rápida e tranquila, como queríamos. Após o juiz nos

declarar marido e mulher, não espero um segundo sequer para tomar os lábios da

minha esposa e lhe dar um beijo intenso e cheio de promessas e amor.


Enfim casados.

Enfim posso dizer que Safira é oficialmente minha.

— Agora vamos comer e beber um pouco, já que somos os únicos

convidados — Vitória se manifesta animadamente, nos fazendo rir.

**

— Amor, me ajuda, por favor? — pede minha esposa de costas para mim.

Me posiciono atrás dela e levo a mão ao zíper do vestido, mas antes de

descê-lo coloco seu cabelo para o lado e beijo o seu pescoço antes de mordiscar

levemente a sua pele cheirosa, fazendo com que ela gema em apreciação.

— Se a gente sumir por algumas horas vão sentir a nossa falta? —

pergunto e começo a beijar suas costas conforme vou descendo o zíper

lentamente.

— Hum... Não sei, mas se sentirem podemos inventar uma desculpa... —

diz, entre gemidos, quando subo minha boca e deixo uma mordida no seu ombro.

— Qualquer desculpa vai servir, ninguém vai se importar, estão distraídos

comendo e brincando com Miguel — murmuro, virando-a para mim e me


ajoelhando diante dela. Puxo o vestido para baixo e sou presenteado com a visão

deliciosa dos seus mamilos enrijecidos e sua boceta bem depilada. Umedeço

meus lábios e fixo meus olhos nos seus, que brilham de malícia.

— Ops. Acho que esqueci de pôr a calcinha... — diz, mordendo os lábios.

— Fico grato com o seu esquecimento, querida. — Dou um sorriso safado

e seguro em seus quadris com firmeza.

Sem dar oportunidade para que Safira se manifeste, passo a língua em sua

virilha, cheiro suas coxas, beijo, lambo e mordo. Instintivamente, ela se abre

para mim e eu levo dois dedos ao seu clitóris, fazendo movimentos leves e

depois vou estimulando com mais velocidade. Minha mulher geme, ansiosa por

mais, porém não pretendo deixá-la gozar na minha boca e nem nos meus dedos.

Com meu amigo e meus filhos lá embaixo só dá tempo para uma rapidinha,

então quero aproveitar cada segundo.

— Vá para a cama — peço ao me levantar.

Safira atende ao meu pedido e se senta na beirada, pronta para me receber.

Livro-me das minhas roupas e logo estou com ela em meus braços, tocando seu

rosto, acariciando. Ao tomar sua boca em um beijo quente, minha esposa arranha
meu peitoral com as unhas antes de deitá-la no meio do colchão macio.

Seguro uma das suas pernas, encaixo meu pênis na sua entrada e a penetro

fundo. Gememos alto quando nossos corpos estremecem com o contato, então

começo a me movimentar em círculos e ao mesmo tempo levo minha boca a um

dos seios de Safira e o abocanho. Ela geme tão alto que tenho certeza de que

todos da casa ouviram.

Grunho quando ela também move os quadris, saio e entro nela

enlouquecido de prazer. Quando começo a estocar fundo, Safira crava as unhas

em meu ombro e começa gemer o meu nome baixinho, aproximando-se do

clímax.

— Victor... amor... — diz entre gemidos.

Largo seu mamilo e vou para sua boca, chupando sua língua e vez ou outra

mordendo seus lábios em um beijo voraz e selvagem. Safira enrola suas pernas

ao redor da minha cintura quando o êxtase a atinge, segundos antes de eu

encontrar o meu prazer também, deixando meu gozo quente a preencher.

Me jogo ao lado da minha esposa, que se aninha em meus braços com a

respiração irregular. Aproveito para beijar seu rosto e passar a mão em seus
cabelos.

— Se continuar me olhando assim não vamos sair tão cedo do quarto —

falo.

— O senhor terá que esperar nossos convidados irem embora. — Pisca

para mim e morde os lábios, provocando-me.

— Ou eu poderia mandá-los embora — sugiro e recebo um tapa no ombro.

— Victor, está louco? Claro que não! — diz, fingindo estar brava. —

Daqui a pouco a Vitória e Lucas vão para casa. A minha amiga vai levar o

Miguel com ela, e amanhã bem cedo irá trazê-lo.

— Então quer dizer que essa noite seremos somente eu e você? Podemos

aproveitar para dar ao nosso filho uma irmãzinha, ou um irmãozinho — sugiro,

agarrando-a pela cintura e beijando seu pescoço. Acabo lhe fazendo cócegas,

porque ela ri alto.

— Nada de irmãozinhos para o Miguel, um só já me deixa de cabelo em

pé. Contente-se com o seu garotão! — diz, rindo.

— Bebês só daqui a alguns anos, então? — indago, quando paramos de rir.


— Se você fizer por merecer, sim. — Ela tem um certo brilho nos olhos.

— Pode ter certeza de que vou. A partir de amanhã, Miguel e eu teremos

uma conversa de homem para homem — digo, bem-humorado.

Para quem não acreditava mais no amor, ao lado dessa mulher, que amo

demais, até suas risadas são como músicas para meus ouvidos.
VICTOR

Ando de um lado para o outro impacientemente, esperando alguma notícia

da minha esposa, que está na sala de parto. Faz algumas horas desde que a Safira

deu entrada no hospital depois da sua bolsa ter estourado. Quando Safira disse

que as contrações estavam aumentando, eu dirigi como um doido até chegarmos

ao hospital.

— Pai, o senhor vai fazer um buraco no chão — afirma Vitória, tão

impaciente quanto eu.


Estava tão nervoso quando chegamos, que o médico me pediu gentilmente

para sair da sala de parto por estar deixando a minha mulher ainda mais nervosa.

Até parece que nunca passei por isso antes, tenho uma filha já adulta, mesmo

assim, cada situação é diferente da outra.

— Meu amigo, vai dar tudo certo. — Lucas toca no meu ombro e tenta me

confortar, mas eu apenas assinto.

Passo a mão no cabelo e o puxo para trás, mordo os lábios com tanta força

que quase o machuco. Será que houve alguma complicação no parto? Faz tanto

tempo e ainda não nos deram notícia. O tempo passa e a minha agonia só

aumenta, então tento entrar na sala, mas meu amigo e minha filha me impedem.

Sento-me na cadeira, abaixo a cabeça e inspiro profundamente. Pouco

tempo depois, ouço alguns passos se aproximando, então levanto a cabeça e

encontro o médico sorridente, a sua expressão me passa um pequeno alívio.

— Senhor, a sua filha nasceu. É uma garotinha muito saudável, meus

parabéns — diz o doutor.

Meu coração saltita de emoção. Sorrio e olho para minha filha e Lucas,

que estão abraçados e sorrindo para mim.


— Obrigado. E a minha esposa, doutor, está bem? Quando vou poder ver

as duas? — pergunto, encarando-o.

— Elas estão bem. — Meu coração se acalma, faz tanto tempo que estou

aqui que cheguei a pensar no pior. — Elas serão levadas para o quarto, e assim

que estiverem instaladas vocês poderão vê-las.

O médico nos pede licença e sai, logo minha filha se aproxima e me

abraça, assim como Lucas, me parabenizando.

Estou louco para ver as mulheres da minha vida.

Pouco tempo depois nos deixar ver a Safira, quando entro no quarto, me

deparo com a cena mais linda — minha esposa amamentando a nossa filha. Fico

bobo logo de cara ao ver que a bebê tem o cabelo escuro igual ao meu. Minha

mulher sorri quando nos vê.

— Se aproximem mais, venha ver como a nossa princesa é linda — diz

Safira, orgulhosa, com um sorriso lindo.

— Oh, ela tem os cabelos do meu pai, amor — diz Vitória, olhando

encantada para a irmã e depois para o namorado.


— Ela é linda, parabéns — diz meu amigo.

Olho para a minha esposa e a encontro sorrindo em agradecimento.

— Ela é mais do que linda — declaro ao me aproximar de Safira, que

segura a minha mão e a acaricia.

— Acho que ela vai ficar bem parecida com você, Victor — diz, deixando-

me abobalhado.

A emoção que estou sentindo não cabe no peito. Tenho mais um filho com

Safira, e dessa vez será diferente, vou poder participar de tudo na vida da nossa

filha, diferente de como foi com Miguel.

— Posso pegá-la? — pergunto, com os olhos fixos na bebê.

— Claro que sim.

Cuidadosamente, pego a nossa menina nos braços e fico todo derretido

quando passeio meus olhos pela criança.

— Você é linda demais. Papai te ama muito. Seja bem-vinda ao mundo,

minha pequena Sofia. — Toco o seu narizinho e depois os dedinhos brancos.

Minha filha fica nos meu braços até Vitória pegar a irmã e dizer que está
ansiosa para vê-la correndo pelos jardins da nossa casa. Acabamos caindo na

risada quando digo para Vitória que a criança acabou de nascer e isso vai

demorar um pouquinho. Um pouco inseguro, meu amigo se aproxima e pega a

afilhada nos braços. Sim, dessa vez é oficial, Lucas será o padrinho da minha

filha, ele e Vitória.

Eles ficam mais um tempo e se despedem para ir embora, restando

somente eu, Safira e nossa filha no quarto.

— Amor, olha para os olhos dela, são iguais aos seus. Já não bastava ter os

cabelos? — Minha esposa finge estar brava quando a nossa bebê abre os olhos,

nos deixando finalmente descobrir a cor deles. Estávamos curiosos, já que a

nossa criança parece ser um pouquinho dorminhoca.

— Oi, filhona. A mamãe está com ciúmes, mas não liga não, tá? — falo,

com a voz mansa, olhando para Sofia.

— Ei, não estou com ciúmes coisíssima alguma. Só acho injusto ter

carregado a nossa filha por nove meses e ela ser a sua cópia. Não puxou nadinha

a mim. — Faz careta, mas não deixo de perceber que o sorriso está presente em
seus lábios.

— Se quiser, daqui a alguns meses podemos tentar ter um bebê com a sua

cara. — Provoco-a e aproximo meu rosto do dela, beijando-a em seguida.

— Só se for no seu sonho, Victor. Fechei a fábrica. — Me dá um selinho e

eu rio.

— Então se contente com as minhas mini cópias em casa. — Fixo meus

olhos em nossa filha que voltou a cochilar.

— O que posso fazer, não é? — Safira passa o dedo levemente nas

mãozinhas de Sofia.

Minhas. Penso ao admirar minhas garotas. Meu coração fica balançado

cada vez que olho para elas.

O tempo vai passando e cada vez eu tenho mais certeza de que Safira foi a

minha melhor escolha. Hoje tenho um lar de verdade, uma família linda e o amor

de uma mulher incrível, que é a mãe dos meus filhos.

**

Alguns anos depois...


— Parabéns pra você, nesta data querida, muitas felicidades, muitos anos

de vida — Safira cantarola.

Lentamente, abro os olhos.

— Bom dia, querida — falo, ainda com o rosto afundado no travesseiro.

— Acorda, papai, hoje é seu aniversário, a mamãe fez bolo! — diz Miguel,

pulando nas minhas costas e me fazendo gemer.

— Miguel! — a mãe o repreende.

Ele se desculpa e eu aproveito e o agarro, me virando para encará-los. Jogo

meu filho no colchão e começo a fazer cócegas nele, que grita pedindo para eu

parar.

— Papai, se levanta, vamos comer bolo! — diz meu filho, todo sorridente.

Olho para a mãe dele, que está nos encarando com uma certa admiração.

— Já vou, garotão, antes preciso de um banho e escovar os dentes — digo,

piscando para ele, que fica emburrado. — Nem me lembrava que hoje é meu

aniversário — minto e minha esposa bufa.

Estou completando mais um ano de vida, e fico feliz por ser final de
semana, assim posso curtir o dia ao lado da minha família.

— Aham, sei. Feliz aniversário, marido. — Ela se aproxima de mim e me

dá um beijo na boca.

— Eeeeecaaa — Miguel se manifesta. — O papai nem escovou os dentes,

mamãe!

Caímos na risada.

— Filho, vá ficar com suas irmãs e o tio Lucas, seu pai e eu já descemos

— Safira pede e ele a obedece. Quando Miguel sai do quarto, ela se senta na

beirada da cama e sorri para mim. — Nem preciso dizer, certo? Você sabe que te

desejo tudo de bom na vida. Você é um pai excelente, marido, amigo, patrão e

muito mais... Então, meus parabéns, amor, que você tenha muitos anos de vida,

paz e muita sabedoria para saber lidar com algumas coisas.

— Obrigado. Obrigado por todos esses anos juntos, obrigado por ter me

dado uma linda família. — Sento-me na cama e passo a mão em seus cabelos

loiros, que agora estão na altura dos ombros. O visual da minha esposa mudou

muito nos últimos anos, e sempre para melhor.


— Eu que agradeço. — Seu sorriso aumenta. — Agora vá se preparar,

porque temos um aniversário para comemorar. Eu te espero lá embaixo com os

outros. Vê se não demora.

— O seu pedido é uma ordem, sra. Guterres. — Pisco para ela e me

levanto, então sigo para o banheiro, mas antes de fechar a porta eu a chamo. —

Safira?

— Sim? — diz, me encarando.

— Te amo — falo, sorrindo.

— Eu sei que sim — ela sorri —, eu também te amo — declara e sai porta

afora.

Nem todas as histórias têm um final feliz, mas a minha teve na medida

certa. Não acredito no felizes para sempre, mas enquanto durar vou aproveitar

cada segundo ao lado daqueles que amo.


Primeiramente, sempre agradeço a Deus por ter me fortalecido em um

momento tão duro como o que estou passando. Perdi uma pessoa muito especial

e ainda estou devastada, mas graças a Ele estou um pouco mais fortalecida e

consegui terminar este livro. Obrigada, Senhor. Obrigada, Isis e Scarllat por
terem betado Acaso Perfeito. Agradeço a todos os meus amigos que ficaram ao

meu lado quando me vi sem chão, sem forças para nada.

Agradeço a você, Andrea, uma profissional incrível, uma revisora

maravilhosa que está sempre junto comigo, me apoia e embarca nas minhas

loucuras. Sou grata por ter te conhecido! Quero que saiba que te admiro muito,

de coração.

Quero agradecer também a você, leitor, que chegou até aqui e leu a história

de Victor e Safira. Eles são especiais para mim por um motivo muito forte, e

saber que você os conheceu me deixa imensamente grata. Agradeço a

oportunidade!
Jessica Santos nasceu em fevereiro de 2001, na Bahia. Em 2014, surgiu o
gosto pela leitura, e em 2015 para 2016 ela decidiu que escreveria o seu primeiro
romance e não quis mais largar a escrita. Já tem lançado alguns livros na
Amazon, entre contos e novelas, e atualmente está trabalhando na série
Herdeiros da Máfia, um de seus maiores sucessos que vem conquistando os
leitores nas plataformas on-line.
Minha página no Facebook
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Link do meu grupo privado para falar sobre meus projetos futuros:
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Meu e-mail - autorajessicasantos@gmail.com
Instagram: autorajessicadsantos
Acesse o site: https://www.wattpad.com/user/AutoraJessicaSantos
KILLZ (Herdeiros da máfia Livro 1)
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Tudo que um verdadeiro herdeiro da máfia precisa ter, Killz James Knight
tem.
O mais velho de cinco irmãos, Killz é o chefe da máfia londrina, mas seu maior
interesse pelo cargo mais importante nos negócios ilícitos da sua família não é o
poder, e sim um avassalador desejo de vingança.

Um lobo em pele de cordeiro. É assim que as pessoas que o conhecem o


definem.

Superficialmente calmo e apreciador da prática da boa vizinhança. Intimamente.


um verdadeiro monstro autoritário, possessivo e sedento por violência.
Para o azar do rival acusado de matar seus pais e alvo do novo líder dos Knight,
pois Killz tem um plano arquitetado para destruir o temido mafioso e pretende
usar sua filha, a doce e inocente Aubrey, para conseguir o que quer. Custe o que
custar.

De um lado, um homem em busca de vingança. Do outro, uma mulher alheia às


maldades que cercam sua vida. Entre eles, um sentimento desconhecido para
ambos que pode mudar completamente o rumo dessa história.

Em um perigoso jogo de sedução, mentiras e sexo, a máfia inglesa nunca foi tão
excitante.

(+18) Contém cenas de sexo explícito.


Este livro contém palavreados de baixo calão e cenas de violência.
AXL : (Herdeiros da máfia Livro 2)
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Segundo livro da série Herdeiros da Máfia.
Obs: para entender a história, deve-se ler a série em ordem.

Axl James Knight está agora em um grande impasse se deve cumprir o acordo
firmado por Killz e Conan ou não.

Casar-se com Alessa, a segunda herdeira de Conan Russell, é o único meio


encontrado para selar um acordo entre as duas maiores organizações mafiosas de
todos os tempos. É seu dever.

Será que ele cumprirá mesmo amando outra mulher? Axl está disposto a tornar a
vida da sua prometida um inferno. Porém, ele vai perceber que quebrar a
princesa da máfia será mais difícil do que imagina, e que o amor e o ódio podem
se entrelaçar nesse jogo sádico.

(+18) Contém cenas de sexo explícito.


Este livro contém palavreados de baixo calão e cenas de violência.
Pedaços de Amor (Pais Alencastro Livro 2)
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Cada ser humano precisa lutar suas batalhas de cabeça erguida.

Assim era Alex, que vivia a dura realidade de ser um pai solteiro que tinha
sido abandonado pela esposa. Mesmo sob a pressão da responsabilidade, ele se
dedicou bravamente à missão de ser pai solo. Sua pequena Alícia se tornou a sua
única prioridade e ele não tinha planos de mudar essa equação.

Jade era uma jovem com um passado marcado por violência e muitos
traumas. Ela não tinha nenhum interesse em se envolver emocionalmente com
alguém, e muito menos chamar a atenção para si. Contudo seus planos foram
postos à prova quando conheceu a pequena Alícia, uma garotinha de seis anos, e
seu pai encantador.

Sentimentos se afloraram, mas Jade se negava a vivenciá-los até ser capaz


de abrir seu coração novamente para o amor.

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