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endocrinologia

Cortisol Salivar

1. Introdução
A Síndrome de Cushing é caracterizada clinicamente por alterações resultantes
do excesso de cortisol. O diagnóstico de hipercortisolismo e o diagnóstico
diferencial da Síndrome de Cushing (SC) permanecem como um dos maiores
desafios diagnósticos dentro da Endocrinologia. Características clínicas tais como
obesidade, hipertensão arterial e depressão são manifestações comuns em
estados de pseudo-Cushing cuja avaliação bioquímica pode ser, eventualmente,
não esclarecedora (1).
A perda do ritmo circadiano é considerada uma das características marcantes
no diagnóstico da SC. O cortisol plasmático matinal nas pessoas normais
apresenta uma ampla faixa de variação e suas concentrações sobrepõem-se
àquelas dos pacientes com SC (2). Trabalhos utilizando a dosagem do cortisol
plasmático colhido à meia-noite demonstraram a excelente performance desse
teste para o diagnóstico de hipercortisolismo (3,4). No entanto, a necessidade de
hospitalização para a coleta do cortisol torna esse exame de difícil utilização na
prática diária.

2. O Cortisol Salivar
O cortisol salivar representa a fração livre do cortisol e mostra boa correlação
com o cortisol sérico total e excelente correlação com o cortisol sérico livre (1,5).
O cortisol salivar é cerca de um terço mais baixo do que o cortisol sérico livre.
Essa diferença se dá, provavelmente, devido à conversão parcial do cortisol em
cortisona durante a passagem pelas glândulas salivares (6). As concentrações do
cortisol na saliva são independentes do fluxo salivar e das flutuações da
transcortina (1,6,7). Um aumento no cortisol sérico se reflete no cortisol salivar
dentro de poucos minutos (6,7). Dessa forma, ao obtermos uma amostra de saliva
num período de 2 a 3 minutos estaremos reproduzindo a concentração do cortisol
sérico livre durante o mesmo período de tempo (7). A concentração do cortisol
salivar mostra o esperado ritmo circadiano, com concentrações mais altas pela
manhã e mais baixas à noite (6). Concentrações muito altas de cortisol sérico
trazem aumentos desproporcionais no cortisol salivar (8). Os idosos apresentam,
em média, concentrações mais altas de cortisol salivar (9). Pacientes em uso de
estrogenioterapia podem apresentar níveis elevados de cortisol salivar. O cortisol
salivar mostra-se estável à temperatura ambiente por um período de até sete dias
(2,7).
Há várias maneiras de se coletar o cortisol salivar. Uma das mais acessíveis é a
utilização de tubos plásticos com algodão específicos para a coleta salivar. As
pessoas são orientadas a colocar o algodão sob a língua ou mastigá-lo
gentilmente para estimular o fluxo salivar, por um período de 2 a 3 minutos. O
volume de saliva obtido com esse procedimento está, usualmente, entre 0,5 a 2 ml
(2,7).

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Atualmente, encontram-se disponíveis ensaios de ELISA para a dosagem do


cortisol salivar. No entanto, a maioria das publicações apresentam adaptações do
RIA para a medida do cortisol (2,5,10,11).

3. A Utilidade Clínica do Cortisol Salivar


O cortisol salivar tem sido utilizado para o diagnóstico da SC. A saliva é
facilmente obtida, mesmo em casa. É um método de coleta não invasivo e não
estressante. Sua utilidade assemelha-se à do cortisol sérico já tendo sido
demonstrada no estudo do ritmo circadiano (2,5,7,10,11,12), no teste de estímulo
com cortrosina (15,16) e nos testes de supressão com dexametasona (1,12,14).
A tabela abaixo mostra a sensibilidade e especificidade do cortisol salivar
coletado às 23 horas (tabela 1).

Tabela 1 – Performance do cortisol salivar para diagnóstico de SC quando


coletado às 23 horas (2)
Sensibilidade* Especificidade**
Cortisol < 3,6 nmol/L 92% 100%
Cortisol < 2,7 nmol/L 97% 77%
*Sensibilidade é a porcentagem de resultados positivos pelo teste na população de doentes.
**Especificidade é a porcentagem de resultados negativos pelo teste nos indivíduos saudáveis.

Avaliação posterior desse grupo de pacientes permitiu confirmação da


acurácia do teste, mostrando sensibilidade e especificidade de 95%. A faixa de
cortisol que vai de 2,2 a 5,7 nmol/L, às 23 horas, mostrou ser uma faixa de
possíveis valores falso-negativos e falso-positivos (faixa “cinza”) (7).

O Instituto de Patologia Clínica dispõe:


Dosagem de Cortisol Salivar
Método: Radioimunoensaio
Material: saliva
Valor de referência:
08:00 HORAS: 3,5-32 nmol/L
23:00 HORAS: < 3,6 nmol/L

4. Referências Bibliográficas
1. Castro M, Elias PCL, Quidute ARP et. al. Out-Patient Screening for Cushing’s Syndrome: The
Sensitivity of the Combination of Circadian Rhythm and Overnight Dexamethasone
Suppression Salivary Cortisol Tests. J Clin Endocrinol Metab 1999;84:878-882.
2. Raff H, Raff JL, Findling JW. Late-Night Salivary Cortisol as a Screening Test for Cuhsing’s
Syndrome. J Clin Endocrinol Metab 1998;83:2681-2686.
3. Papanicolaou DA, Yanovski JA, Cutler GB et. al. A Single Midnight Serum Cortisol Measurement
Distinguishes Cushing’s Syndrome from Pseudo-Cushing States. J Clin Endocrinol Metab
1998;83:1163-1167.
4. Newell-Price, Trainer P, Perry L et. al. A single sleeping midnight cortisol has 100% sensitivity
for the diagnosis of Cushing’s syndrome. Clin Endocrinol 1995;43:545-550.
5. Martinelli Jr. CE, Sader SL, Oliveira EB et. al. Salivary cortisol for screening of Cushing’s
syndrome in children. Clin Endocrinol 1999;51:67-71.
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cortical function than serum cortisol. Ann Clin Biochem 1983;20:329-335.

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7. Raff H. Salivary Cortisol: A Useful Measurement in the Diagnosis of Cushing’s Syndrome and
the Evaluation of the Hypothalamic Pituitary-Adrenal Axis. The Endocrinologist 2000;10:9-17.
8. Tunn S, Möllmann H, Jürgen B et. al. Simultaneous Measurement of Cortisol in Serum and
Saliva after Different Forms of Cortisol Administration. Clin Chem 1992;38:1491-1494.
9. Raff H, Raff JL, Duthie EH et. al. Elevated Salivary Cortisol in the Evening in Healthy Elderly
Men and Women Correlation With Bone Mineral Density. J Gerontol A Biol Sci Med Sci
1999;54:479-483.
10. Gafni, Papanicolaou DA, Nieman LK. Nightime salivary cortisol measurement as a simple,
noninvasive, outpatient screening test for Cuhsing’s syndrome in children and adolescents. J
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Diagnosis of Cushing’s Syndrome. J Clin Endocrinol Metab 2002;87:4515-4521.
12. Evans PJ, Peters JR,Dyas J et. al. Salivary Cortisol Levels in True and Apparent
Hypercortisolism. Clin Endocrinol 1984;20:709-715.
13. Reynolds RM, Bendall HE, Whorwood CB et. al. Reproductibility of the low dose
dexamethasone suppression test: comparison between direct plasma and salivay cortisol
assays. Clin Endocrinol 1998;49:307-310.
14. Barrou Z, Guiban D, Marouli A et. al. Overnight dexamethasone suppression test: comparison
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