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“Falar com estranhos? Nem pensar! Não consigo olhar nos olhos dos outros.
Parece que vão me engolir ou que vão perceber que estou nervosa, que vão me
criticar! Não falo em reuniões de trabalho. Procuro evitar. Mas se sou chamado e
tenho que falar, me dá aquele “branco”, e parece que meu coração vai sair pela boca,
a voz fica trêmula.”
Estes são alguns relatos que escutamos no consultório quando atendemos os
fóbicos sociais.
As situações temidas são enfrentadas com intenso desconforto ou há
esquiva, o que acarreta problemas nas várias áreas de suas vidas, como abandono de
emprego, isolamento social e, empobrecimento da vida amorosa (Barros Neto e
Gebara, 2011). Há um medo intenso de ser o centro das atenções. Dentre as
principais situações temidas de contato interpessoal podemos ressaltar: falar com
estranhos, participar de pequenos grupos, flertar, ir a festas, falar ao telefone. As
situações de desempenho caracterizam a fobia social circunscrita. São elas falar em
público, escrever, beber ou comer na frente dos outros, usar banheiro público,
participar de reuniões, lidar com autoridades.
Vários sintomas físicos podem estar presentes, como palpitações, sudorese,
tremor, boca seca, tensão muscular e a ruborização. Os sentimentos de vergonha e
humilhação, a autodepreciação, a antecipação negativa e o medo da avaliação
negativa são os sintomas psíquicos mais frequentes. (Gebara et al., 2014)
O curso do transtorno é crônico e se não for tratado adequadamente, não há
remissão dos sintomas.
A terapia cognitivo-comportamental vem sendo utilizada com eficácia no
tratamento da FS. É de suma importância a psicoeducação sobre o transtorno e sobre
as técnicas que serão utlilizadas.
A reestruturação cognitiva tem como objetivo modificar as crenças
disfuncionais e manter respostas de comportamento mais adequadas. Ao identificar os
pensamentos distorcidos e crenças disfuncionais, os pacientes identificam, também, a
relação destes com seus sintomas e emoções, conseguindo ter maior autocontrole e
autoconfiança perante a vida. (Blanco et al., 2010)
A técnica de exposição é um dos tratamentos mais eficazes para tratar a
fobia social. (Heimberg et al., 1990). Uma hierarquia é construída pelo paciente
juntamente com o terapeuta com as situações temidas e evitadas. A exposição se
inicia da cena que causa menos desconforto em direção às que causam mais
desconforto. Quando um determinado item da hierarquia não eliciar mais ansiedade ou
houver uma diminuição de 50% ou mais, passa-se ao item seguinte da hierarquia. As
Unidades Subjetivas de Desconforto devem ser utilizadas para ajudar na avaliação da
ansiedade social. A exposição deve ser feita de forma repetida e prolongada, pois isto
leva à habituação.
A exposição aos estímulos temidos pode ser feita ao vivo ou na imaginação.
A exposição na imaginação, na qual o terapeuta narra as cenas para o paciente
imaginar, pode ser feita antes, para facilitar a exposição ao vivo, ou mesmo viabilizá-
la.
É importante ressaltar que a exposição tem algumas limitações. Uma delas é
a importância de verificar a viabilidade da situação que será enfrentada na exposição
ao vivo, pois algumas dessas situações podem ter um tempo muito curto de
exposição, impossibilitando a habituação; por exemplo, assinar um cheque. Outra
limitação é a esquiva do paciente das situações sociais que pode ser determinada pela
falta de habilidades sociais, dificultando seu engajamento na exposição ao vivo. A
dificuldade de visualização na exposição na imaginação também pode ser outra
limitação.
A exposição à realidade virtual vem preenchendo estas lacunas e vem sendo
respaldada por diversos estudos no tratamento da fobia social. (Klinger et al. 2005;
Wallack et al. 2009; Lister et al. 2010; Anderson et al. 2013; Gebara et al. 2016)
O Programa Realidade Virtual para tratar Fobia Social- Programa RVFS, foi
idealizado e utilizado em um estudo no AMBAN (Programa Ansiedade do IPq- HC
FMUSP). Observou-se uma diminuição significativa da ansiedade social dos
participantes, e os resultados se mantiveram ao longo de seis meses pós-tratamento.
Além disto, foi observada boa adesão ao tratamento. (Gebara et al. 2016). O
Programa RVFS possui um sistema mais simples do que os capacetes virtuais, o que
possibilita o clínico ter em seu consultório. Além da versão em português, há também
as versões em inglês e espanhol. O sistema é constituído de um notebook 2D
acoplado por um cabo a uma TV 3D ou um notebook 3D. Os óculos esterioscópicos
passivos costumam vir com a TV. É preciso um fone de ouvido para maior imersão,
como também um teclado auxiliar para o terapeuta inserir as respostas dos
personagens, o que confere a característica de interação. O software em 3D possui
cenas com personagens reais inseridos em cenários virtuais. As cenas compilam a
maior parte das situações que os fóbicos sociais temem, por exemplo, pedir
informação a um estranho na rua, entrar em uma festa e ser o centro das atenções,
dialogar com uma pessoa desconhecida ou que seja hierarquicamente acima, fazer
um discurso.
Como se pode ver, existem diversas técnicas para se tratar a fobia social e a
escolha de uma ou várias depende de cada caso. Com o tratamento adequado é
possível proporcionarmos uma diminuição da ansiedade social e consequentemente
melhor qualidade de vida para os portadores da fobia social.
Referências
Anderson PL, Price M, Edwards SM, Obasaju MA, Schmertz SK, Zimand E, Calamaras
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controlled trial. J Consult Clin Psychol. 2013 Oct;81(5):751-60.
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organizadores. Clínica Psiquiátrica. Barueri: Manole, 2011, v. 1, p. 771-7.
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disorder. Arch Gen Psychiatry. 2010 Mar;67(3):286-95.
Gebara CM, Barros Neto TP, Angelotti G. Realidade Virtual e Terapia Cognitivo-
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Heimberg RG, Hope DA, Dodge CS, Becker RE. DSM-III-R subtypes of social phobia.
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Kabat-Zinn, J.; Massion, A. O.; Kristeller, J.; Peterson, L. G.; Fletcher, K. E.; Pbert, L.;
Lenderking, W. R. & Santorelli, S. F. (1992). Effectiveness of a meditation-based stress
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