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MODIFICAÇÃO DO CONTRATO DO TRABALHO1

João Olímpio Fatinho2

Octávio Alfredo Tarieque3

Universidade Alberto Chipande

RESUMO: Modificar o contrato de trabalho é promover a modificação das cláusulas e tudo que
foi alinhado por ocasião da contratação, que pode consistir, por exemplo, na transferência do
empregado para outra localidade ou filial ou, ainda, na alteração da jornada e horário de trabalho,
dentre diversas outras hipóteses. Nos casos em que não há modificação da essência do contrato
de trabalho, entende-se que não há efetiva alteração, mas mero exercício do poder diretivo do
empregador. A alteração do contrato de trabalho, para ser válida, deve atender dois requisitos
cumulativos fundamentais: ela deve provir de mútuo consentimento, ou seja, o empregado
também deve concordar com a alteração pretendida pelo empregador, e não pode implicar em
prejuízo ao trabalhador, de modo que de nada adiantará a concordância deste se a modificação
lhe resultar prejuízos diretos ou indiretos. 4A vedação quanto à alteração contratual que implique
em prejuízo ao empregado encontra fundamento no próprio caráter protetivo do Direito do
Trabalho, que tem por finalidade reduzir, na esfera jurídica, a desigualdade econômica que existe
na relação entre patrão e empregado.

PALAVRAS - CHAVES: Contrato, Modificação, Trabalho, Empregado.

ABSTRACT: Modifying the employment contract means modifying the clauses and everything
that was aligned at the time of hiring, which may consist, for example, in transferring the
employee to another location or branch or, even, changing the working hours and working hours.
work, among several other hypotheses. In cases where there is no change to the essence of the
employment contract, it is understood that there is no effective change, but merely an exercise of
the employer's directive power. The change to the employment contract, to be valid, must meet
two fundamental cumulative requirements: it must come from mutual consent, that is, the

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Este artigo tem como objectivo analisar como e feita a modificação de contratos segundo a legislação vigente em
Moçambique.
2
Licenciado em contabilidade e Auditoria pela Escola Superior de Economia e Gestão - ESEG.
3
Licenciado em Ciências Policias; Mestre em Ciências Jurídicas Público-Forenses; docente de Mestrado em
Ciências Jurídicas Público-Forenses na Universidade Alberto Chipande.
4
Lei n.º 23/2007, de 1 de Agosto.

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employee must also agree with the change intended by the employer, and it cannot result in harm
to the worker, so that the latter's agreement will be of no use if the modification results in direct
or indirect losses. The prohibition regarding contractual changes that result in harm to the
employee is based on the protective nature of Labor Law, which aims to reduce, in the legal
sphere, the economic inequality that exists in the relationship between employer and employee.

KEYWORDS: Contract, Modification, Work, Employee.

1. INTRODUÇÃO

O presente artigo visa fazer uma abordagem acerca da “Modificação do contrato de trabalho”. O
contrato de trabalho apresenta vicissitudes, as ocorrências que, não integrando o programa de
execução normal do contrato de trabalho, afectam o seu desenvolvimento. Aplicando a
classificação tradicional da teoria geral do negócio jurídico, que distingue entre factos jurídicos
modificativos e extintivos, classificamos as vicissitudes do contrato de trabalho em duas
categorias: As vicissitudes modificativas, que decorrem de eventos que interferem no programa
normal de execução do contrato de trabalho, introduzindo uma alteração substancial e estável
num dos seus elementos; As vicissitudes extintivas, decorrentes de um evento que põe fim ao
contrato de trabalho; estas vicissitudes remetem-nos para a temática da cessação do contrato de
trabalho.

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2. CONTRATO NO TRABALHO

O contrato é considerado lei entre as partes (pacta sunt servanda) e, desde que estipulado
validamente, torna-se intangível e imutável, somente podendo ser alterado por vontade de ambas
as partes (e, mesmo assim, dentro de certos limites) ou por força maior ou caso fortuito. 5Tal
princípio assegura aos contratantes o direito de exigirem o cumprimento do que foi pactuado,
buscando, inclusive, a intervenção estatal se assim for necessário para assegurar a execução das
obrigações.

2.1.Caracterização
1. Condições de trabalho: correspondem as clausulas contratualmente estipuladas e que se
encontram em plena vigência.
2. Mútuo consentimento: essa característica leva à diferença entre alteração unilateral e
alteração bilateral. Em relação a primeira, como ato emanado do empregador, existe a
presunção absoluta de ilicitude. As alterações bilaterais, ao contrário, revestem-se de
presunção relativa de licitude, entendendo o legislador que, se a modificação originou-se
do mútuo consentimento das partes, será válida, a menos que se comprove que dela
resultou prejuízo ao empregado.
3. Prejuízos ao empregado: podem ser diretos ou indiretos, podem ser ou não de natureza
econômica, mas devem ser efetivos, ou seja, realmente devem ser verificados.
4. O prejuízo resultante da alteração do contrato de trabalho não necessariamente precisa
implicar em dano patrimonial (atinge o salário), mas também pode ser de natureza
funcional (atinge a função) ou, ainda, de natureza moral ou psicológica.
5. A nulidade das alterações prejudiciais ao empregado deve ser analisada levando-se em
conta o fato de que ninguém aceitará livremente modificações das condições contratuais
quando esta for contrária aos seus interesses.
2.2.Alteração Do Contrato De Trabalho X Jus Variandi Do Empregador
2.2.1. Jus Variandi
• Variações procedidas pelo empregador de forma unilateral dentro do âmbito
contratual.

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MARIA DO ROSÁRIO PALMA RAMALHO. Situações laborais individuais. Parte ii. Edições almedina, sa. Lisboa. 2006

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• É o poder de direção do empregador exercido nos espaços brancos do contrato, ou
seja, em relação aquilo que não foi pactuado previamente.
• Não atinge o conteúdo básico do contrato de trabalho, mas apenas aspectos
circunstanciais que o envolvem. Caso contrário, não se estará mais diante do jus
variandi, mas no campo das alterações contratuais.
• Limites: os limites do jus variandi encontram- se exatamente nas clausulas essenciais
do contrato de trabalho e em necessidades reais da empresa, coibindo-se seu uso
indiscriminado e abusivo. Outro limite imposto é o chamado jus resistentiae, isto é, o
poder de resistência que é conferido ao empregado para preservação de sua
dignidade.
2.2.2. Alteração Do Contrato
• São modificações de seu conteúdo essencial, daquilo que decorre do ajuste
preliminar entre empregado e empregador e de clausula que são obrigatoriamente
inseridas no contrato por força de lei ou de norma coletiva.
• As cláusulas básicas do contrato de trabalho não podem ser modificadas porque
são revestidas de obrigatoriedade que asseguram as partes uma segurança jurídica.
• Quando determinadas unilateralmente pelo empregador, importam em violação do
contrato e, quando ajustadas bilateralmente e não tragam prejuízo para o
empregado são consideradas válidas.
2.2.3. Alteração De Função

• REGRA: com base na legislação, serão lícitas as alterações de função quando forem
bilaterais e não acarretarem prejuízo ao empregado. As modificações unilaterais somente serão
toleradas quando realizadas no exercício estrito do jus variandi.

Espécies:

1) Alteração no sentido horizontal


2) Alteração no sentido vertical
• Ascendente
• Descendente
3) Alteração qualitativa imperativa

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2.2.3.1.Sentido Horizontal
• Aquela pela qual o empregado passa a exercer outra função, mas dentro do mesmo
nível hierárquico. Ex.: alteração funcional de aproveitamento que ocorre quando o
empregado é deslocado de um serviço para outro ou para outro setor sem que isso
afete de forma significativa a sua situação funcional.
• Esse tipo de alteração, desde que justificada, é permitida. Será ilícita se acarretar
prejuízo ao empregado e, ainda, se comprovada a alteração por mero capricho ou
perseguição do empregador.
2.2.3.2.Sentido Vertical
• Alteração vertical ascendente: é verificada quando o empregado tiver elevado o seu
nível hierárquico dentro da empresa. Ex.: promoção.
• Alteração vertical descendente: é a alteração que implica no exercício de função que
se encaixa em nível hierárquico inferior ou da função anteriormente ocupada.
Engloba 03 (três) situações:
1) Rebaixamento de função: alteração que implica na imposição ao empregado de
retorno a função anteriormente ocupada. Nem por mútuo consentimento o
rebaixamento pode prevalecer, eis que o prejuízo é evidente, seja pelo aspecto
patrimonial ou moral.
2) Retrocessão: é caracterizada quando ocorre o retorno do empregado de um cargo
efetivo mais alto para um cargo efetivo mais baixo. O que o distingue do
rebaixamento é que nesse caso o retrocesso tem caráter punitivo. Também não é
tolerado pela legislação trabalhista.
3) Retorno ou Reversão: é o retorno ao cargo efetivo anteriormente ocupado após ter o
empregado exercido função de confiança. É medida absolutamente legítima, sendo
autorizado nos casos expressamente previstos pela lei.
3. MODIFICAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO EM MOÇAMBIQUE

Um dos princípios basilares do Direito do Trabalho é o da inalterabilidade do contrato de


trabalho, também denominado de princípio da condição mais benéfica, sendo que “este princípio
importa na garantia de preservação, ao longo do contrato, da cláusula contratual mais vantajosa

5
ao trabalhador, que se reveste de direito adquirido. 6No entanto, o contrato de trabalho, por ser de
trato sucessivo, tende a sofrer várias alterações durante sua vigência que podem levar à alteração
de funções na empresa, alterações salariais, alteração do horário etc. Assim, o contrato de
trabalho tende a ser maleável para que possa ir se adaptando às novas circunstâncias.

Embora pareça que o empregador está restrito a qualquer alteração do contrato, caso este
mantenha a essência do contrato de trabalho, há modificações contratuais que são possíveis,
ainda que a vontade seja exclusiva do empregador.

A modificação do contrato de trabalho pode decorrer do acordo das partes, nos termos gerais da
liberdade contratual (art. 406.° n.° 1 do CC) e desde que tal alteração respeite as normas legais e
convencionais imperativas que caibam ao caso. Assim, com os limites já indicados a propósito
do estudo de cada uma destas matérias, as partes podem acordar na mudança do objecto
contratual, na alteração da categoria do trabalhador, na alteração da retribuição, na mudança do
tempo ou do local de trabalho;

3.1.Fundamentos Da Modificação

Nos termos do artigo 71 da lei do trabalho, a modificação das relações de trabalho pode fundar-
se em:

a. Requalificação profissional do trabalhador decorrente da introdução de nova


tecnologia, de novo método de trabalho ou da necessidade de reocupação do
trabalhador, para efeitos de aproveitamento das suas capacidades residuais, em
caso de acidente ou doença profissional;
b. Reorganização administrativa ou produtiva da empresa;
c. Alteração das circunstâncias em que se fundou a decisão de contratar;
d. Mobilidade geográfica da empresa;
e. Caso de força maior

Por fim, no âmbito das vicissitudes do contrato de trabalho que decorrem de um facto atinente ao
trabalhador ou da sua iniciativa, cumpre distinguir as seguintes categorias de situações:

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MARIA DO ROSÁRIO PALMA RAMALHO. Situações laborais individuais. Parte ii. Edições almedina, sa. Lisboa. 2006

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• Modificação do contrato por motivo atinente ao trabalhador: assim, a alteração
do tempo de trabalho, pela passagem ao regime de tempo parcial, pela aplicação do
regime do trabalhador estudante, ou por motivos atinentes à tutela da maternidade e
da paternidade, bem como a redução do tempo de trabalho no contexto da figura da
reforma parcial;7
• Suspensão do contrato por impedimento do trabalhador em geral: no elenco das
situações de suspensão do contrato por motivo atinente ao trabalhador, a lei destaca a
concessão de licenças e, relativamente às licenças por motivo atinente à maternidade
e à paternidade, ainda , o regime da reforma, a suspensão do contrato por motivo de
adesão do trabalhador à greve, e ainda a suspensão do contrato requerida pelo
trabalhador com fundamento no incumprimento do dever retributivo do empregador.
• Modificação ou suspensão do contrato por motivo de acidente de trabalho ou doença
profissional.

A lei do Trabalho trata as vicissitudes modificativas do contrato de trabalho em capítulo


específico do título que dedica à disciplina do contrato de trabalho (o Capítulo VIII, arts. 70.°
ss.), seguindo um critério diverso do que se abordou, uma vez que apresenta, sucessivamente, o
regime da mobilidade hierárquica, funcional e geográfica (arts. 70.° a 75.°), o regime da
transmissão da empresa e do estabelecimento (arts. 76° a 77.°), o regime da cedência ocasional
(art 78° e seg.).

3.2.Modificações do contrato inseridas pela A Lei do Trabalho


I. Mudança da categoria do trabalhador (art. 72.°): apesar da epígrafe da norma, a lei
ocupa- se apenas da colocação do trabalhador em categoria inferior, que deve ser
motivada em estrita necessidade do trabalhador ou da empresa.
II. Mobilidade funcional ou jus variandi, i.e., a mudança da função do trabalhador a
título provisório e com fundamento num interesse de gestão (art. 73.°).
III. Mudança do local de trabalho do trabalhador, com fundamento num interesse de
gestão, e que pode ser a título definitivo (é a figura que a lei identifica como
mobilidade geográfica e que disciplina no art. 74.°, distinguindo ainda neste contexto
a mudança individual, reportada a um trabalhador, e a mudança colectiva, reportada

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XAVIER, Bernardo da Gama lobo. Iniciação ao direito do trabalho. 3ª edição. Editorial Verbo. Lisboa – São Paulo. 2005

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aos trabalhadores de um estabelecimento ou de uma secção da empresa) ou a título
provisório (é a denominada transferência temporária, disciplinada no art. 76.°).

Na medida em que envolvem uma alteração estável (que pode ser definitiva ou transitória) de um
dos aspectos do conteúdo do contrato de trabalho (a função, a categoria ou o local de trabalho),
as figuras enunciadas correspondem, efectivamente, a vicissitudes modificativas do contrato, em
sentido próprio.

Por outro lado, à excepção da mudança de categoria, que exige o acordo do trabalhador e que
pode também ter como fundamento uma necessidade deste, as restantes figuras correspondem a
uma modificação unilateral do contrato por iniciativa do empregador e com fundamento num
interesse de gestão. Estas vicissitudes evidenciam, pois, a lógica peculiar do vínculo laboral, para
a qual chamámos oportunamente a atenção, que contemporiza regularmente com o sacrifício do
acordo contratual em nome dos interesses de uma das partes (em claro desvio ao princípio geral
pacta sunt servanda).

4. CONCLUSÃO

Contudo, apesar do rigor formal da qualificação desta figura como vicissitudes do contrato de
trabalho, o facto de ocorrerem com alguma regularidade e normalidade ao longo da vida do
contrato de trabalho, permite que as reconheçamos como desvios normais e não excepcionais ao
programa contratual, justamente por força da dinâmica específica de desenvolvimento do vínculo
laboral que se conhece. Já pelo contrário, e de acordo com o mesmo critério substancial de
apreciação, as restantes vicissitudes modificativas do contrato correspondem a desvios anormais
do programa contratual, ou pela sua importância e carácter definitivo ou por se basearem numa
alteração superveniente e imprevisível das circunstâncias em que se baseou o contrato (assim, a
mudança do empregador, a crise da empresa ou a verificação de um impedimento prolongado do
trabalhador para a prestação da actividade laboral).

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5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. MARIA DO ROSÁRIO PALMA RAMALHO. Situações laborais individuais. Parte ii.
Edições almedina, sa. Lisboa. 2006
2. XAVIER, Bernardo da Gama lobo. Iniciação ao direito do trabalho. 3ª edição. Editorial
Verbo. Lisboa – São Paulo. 2005

Legislação:

1. Lei de trabalho de moçambique (Lei n.º 23/2007, de 1 de Agosto);

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