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@ROBSONZANETTI

A “HOLDING FAMILIAR” É
INVÁLIDA? CRÍTICAS AO
POSICIONAMENTO DOS
ILUSTRES PROFESSORES
FLÁVIO TARTUCE E
MAURÍCIO BUZAR QUE A
CONSIDERAM INVÁLIDA

Li dois artigos dos ilustres professores Flavio Tartuce no site


Migalhas, parte 1 e 2 onde sustenta a invalidade das “Holdings
Familiares”, porém, será que a “Holding Familiar” é inválida?

Os ilustres professores, com o devido respeito, se equivocam ao


tratar da “Holding Familiar” porque sustentam sua invalidade
partindo de um conceito sobre Holding, porém, o abandonando
para falarem de forma vaga sobre simulação, desconsideração da
personalidade jurídica e fraude, sem detalhar os motivos pelos quais
a Holding Familiar seria inválida e sequer sem citar um exemplo
prático. Muito menos dizem ou explicam o que seria a Holding
“familiar”.

A SEGUIR
MINHA OPINIÃO
@ROBSONZANETTI

Holding é uma sociedade que participa de outras detendo


participações societárias com a finalidade de as controlar.
Entendo que é familiar aquela sociedade que é controlada por
parentes até o grau.

Esse autor se limitará nas críticas aos artigos dos ilustre professores,
os quais sustentam por exemplo que as “Holdings Familiares” não
têm empregados. As Holdings não são obrigadas a ter empregados
e normalmente elas não têm atividades operacionais, é o caso da
Holding Gerdau, por exemplo.

Os artigos, a meu ver, estão mais para texto bíblico, sujeito a várias
interpretações do que para ser aplicado na prática jurídica.
Os autores divagam nas suas explicações misturando vários
institutos jurídicos: simulação, fraude, anulação, desconsideração da
personalidade jurídica, buscando através desses meios, atingir seu
fim, dizer que a “Holding Familiar” é inválida. Se a Holding Familiar
fosse anulada, hoje a Gerdau não existiria!

Os professores sustentam que com a “Holding Familiar” haveria


fraude a lei, sendo esse o primeiro problema apontado. Porém, não
dizem onde estaria a fraude na prática e afirmam que “por ser ato
ilícito que gera a nulidade absoluta do negócio jurídico, nos termos
do citado art. 166, inc. VI, do Código Civil.”

A sustentação da nulidade absoluta da “Holding Familiar” não é


sustentável porque os autores partem de uma premissa equivocada
ao atribuírem personalidade jurídica a “Holding Familiar”. A Holding
não tem personalidade jurídica, logo, você não pode anular a
personalidade jurídica de alguém que não a tem!
@ROBSONZANETTI

O segundo problema apontado pelos professores é que “a


constituição dessas pessoas jurídicas envolve a integralização de
capital que não traduz a realidade” e que esse seria um caso de
simulação. Com o devido respeito aos professores, é óbvio que não é
caso de simulação e sim de responsabilidade direta dos sócios.
Exemplo está na sociedade limitada, tipo mais usado no Brasil, pois
o artigo 1.055, §1º do CCiv. estabelece a consequência do capital
social não traduzir a realidade que é responsabilidade direta dos
sócios e não que o ato é simulado.

No segundo artigo, os professores sustentaram que as “holdings


familiares” seriam invalidas devido ao desvio de finalidade ou
utilização disfuncional da personalidade jurídica.
Os ilustres professores confundem a nulidade da pessoa jurídica
com a desconsideração da personalidade jurídica. Se há desvio de
finalidade ou utilização disfuncional, a personalidade jurídica não é
nula, ela continua a existir, não é invalidada e sim é desconsiderada
para atingir os sócios e ou administradores (art. 50, “caput” do CCiv.),
ou seja, ela continuar a existir.

O direito alemão é claro ao afirmar que a


“Existenzvernichtungsshaftung não tem lugar sempre que seja
possível e suficiente a reparação dos prejuízos causados a GmbH
(equivalente a nossa sociedade limitada) à luz das normas do
ordenamento jus-societário, assim, fala-se no caráter subsidiário
deste modelo de responsabilidade, o que significa que a
desconsideração da personalidade jurídica só seria aplicável quando
outra norma societária não pudesse ser aplicada e como exemplo
cito a própria fraude contra credores. Se é possível aplicar o instituto
da fraude contra credores, para que desconsiderar a personalidade
jurídica? Essa é vista de forma subsidiária e no direito brasileiro isso
também está legalizado, basta ler o artigo 137 do CPC para ver que
ele diz para tornar ineficazes os atos realizados com abuso da
personalidade jurídica e não responsabilizar os sócios e ou
administradores.
@ROBSONZANETTI

A responsabilidade pessoal do sócio ou administrador assume papel


subsidiário, assim, só quando não for possível o patrimônio retirado
da sociedade voltar a ela haveria a responsabilidade pessoal do sócio
e ou administrador.

O patrimônio social é a garantia dos credores e se o sócio e ou


administrador indenizou esse prejuízo nos limites dos danos
causados, não há lógica em se falar que suas responsabilidades
iriam além do dano causado. O Código Civil é claro e como estamos
tratando de responsabilidade civil de sócios e administradores, sua
responsabilidade não pode ir além do dano que causou, segundo os
arts. 186 cc 944 do CCiv. Assim, deixo claro que se um sócio desviou
100 mil reais do patrimônio da pessoa jurídica para seu patrimônio
pessoal, o que seria o caso de desvio de finalidade (art. 50 “ caput “
do CCiv.) e a sociedade deve para um pessoa 1 milhão, é irracional e
desproporcional afirmar que ele responde por 1 milhão.

Esse caráter subsidiário da aplicação das normas sobre a


desconsideração da personalidade jurídica é defendido na
Alemanha por Jan Wilhelm, Zurück zur Durchgriffshaftung das “
KBV” – Urteil des II. Zivilsenats des BGB vom 24.06.2022, in NJW,
2003, p. 178 e ss.; Barbara Dauner-Lieb, Die
Existenzvernichtungshaftung – Schluss der Debatte?, in DStR, 2006,
p. 2.039.

Esse é o mesmo posicionamento da professora Maria de Fátima


Ribeiro, in Tutela dos Credores da Sociedade por Quotas e a
“Desconsideração da Personalidade Jurídica”, Almedina, p. 63, 2009
a qual afirma que “o patrimônio social constitui a única garantia dos
credores sociais; pelo que a tutela desse patrimônio, e todas as
formas de reintegração ou ressarcimento dos prejuízos que lhe são
causados, vai redundar, necessariamente, na tutela dos credores da
sociedade.”
@ROBSONZANETTI

Os professores citaram doutrinadores alemães com teorias


ultrapassadas de 1.955 dizendo que são dominantes na Alemanha,
as quais se referem a desconsideração da personalidade jurídica e
não a invalidade da personalidade jurídica sustentada pelos autores
para dizer que é inválida a “ holding familiar”.

Ainda os professores afirmaram que a “teoria da desconsideração


para fins de imputação permite que se analisem as características
reais da pessoa jurídica em questão, funcionando como mecanismo
eficiente de combate à fraude à lei, a simulação e a negócios
jurídicos indiretos ilícitos”. Data máxima vênia, o direito alemão não
diz nada disso!!!

O que o direito alemão fala é que existem na Alemanha três grandes


grupos de casos para tratar da desconsideração da personalidade
jurídica que são: a) a descapitalização material da sociedade
(originária ou superveniente); b) controle da sociedade por um sócio
e c) a confusão patrimonial. Os alemães não falam nada de
mecanismo de fraude à lei, a simulação e a negócios jurídicos
indiretos. Isso segundo Walter Stimpel, Durchgriffshaftung bei der
GmbH, p. 606 e ss.; Thomas Raiser, Die Haftungsbeschränkung ist
keine Wesensmerkamal der juristischen Person, p. 644 e ss.; Volker
Emmerich, §13, Juristiche Person; Handelsgesellschaft, p. 677 e ss. Na
Itália tem essa visão Vincezo Franceschelli/Michael Lehamann,
Superamento della personalità giuridica e societá collegate.., p. 103.

Como a discussão deve ser sobre a anulação da “holding familiar” e


não sobre desconsideração da personalidade jurídica, me limito
aqui para falar sobre a desconsideração da personalidade jurídica
porque os nobre professores confundem desconsideração da
personalidade jurídica com invalidade da personalidade jurídica,
pois se sustentam a invalidade da personalidade jurídica a
chamando de “Holding familiar”. Algo invalidado que não existe não
se desconsidera.
@ROBSONZANETTI

Os professores citam um julgamento do STJ, REsp 1.424.617/RJ,


Terceira Turma, Relª Ministra Nancy Andrighi, DJE 16/06/2014) em
seu segundo artigo forçando uma interpretação para sustentar a
invalidade da “Holding Familiar”. Basta ler o julgamento e ver que
em nenhum momento foi reconhecida a invalidade daquela
Holding Familiar.

O caso se refere a uma pessoa que “teria sido vítima de simulação


levada a efeito por determinadas pessoas, as quais, por intermédio
de operações societárias, teriam proporcionado substancial redução
do patrimônio pessoal daquela, notadamente a sua nua-
propriedade sobre quotas sociais da GB ARMAZÉNS.” E no caso foi
requerido “entre outras coisas, a declaração de nulidade do ato
societário que viabilizou a simulação e a condenação do recorrido
GILBERTO BUFFARA, usufrutuário das quotas sociais, ao pagamento
dos danos emergentes e lucros cessantes suportados pela
recorrente.” Não tem nada a ver com a nulidade da Holding Familiar
e sim com prejuízos financeiros!!!

Quanto ao ato ilícito (art. 50, §2º do CCiv.) praticado pelos sócios que
usam a personalidade jurídica de forma abusiva, o Código Civil
prevê a desconsideração da personalidade e não sua anulação,
porém, os ilustres autores mencionaram o artigo para invalidar a
“Holding Familiar”. O artigo é claro, a personalidade jurídica nesse
caso não é anulada e sim desconsiderada, ou seja, afastada para
responsabilizar sócios e ou administradores (art. 50, “caput” do
Código Civil). A personalidade jurídica continua existindo, não é
anulada.
@ROBSONZANETTI

Os professores afirmaram que as “holdings familiares” são voltadas


para o esvaziamento patrimonial, porque, em regra, essas pessoas
jurídicas constituídas, sobretudo as sociedades, não exercem
atividade empresária de nenhum tipo e não estimulam nenhum
empreendimento. A Holding pura não exerce atividade mesmo e
isso é absolutamente legal, ela simplesmente detém participações
societária e é comprando essas participações que elas são
empreendedoras, exemplo é da Holding LVMH controlada por
Bernard Arnould que começou comprando a Cristian Dior, depois,
sem necessariamente seguir a ordem, comprou a Möet Chandon,
Louis Vuitton, TAG HAUER e outras.

Também os autores afirmaram que elas não geram emprego. A


Holding não é obrigada a gerar emprego, ocorre que suas
controladas, coligadas e sociedades onde participam geram. Dizem
ainda que não geram tributação e são usadas também para elidir
tributos ou mesmo para fraudes fiscais. Claro que geram tributos, as
sociedades operacionais geram e no caso da Sociedade Civil
Imobiliária os tributos recaem sobre as locações. Dizem que não
geram renda. Como não? Renda de locações ou da atividade
produtiva de suas “filhas”. Dizem ainda que essas pessoas jurídicas
sequer celebram contratos, “não tendo credores e nem devedores”,
como não? Contrato de locação, por exemplo, deixou de ser
contrato?

O que o direito exige é que o objeto social seja lícito (art. 977, II do
CCiv.). Sequer poderia ser registrada uma sociedade sem objeto
social lícito, pois está é uma norma de ordem pública. Sendo o
objeto social lícito, não há que se falar em invalidade da pessoa
jurídica uma vez cumpridos os demais requisitos legais previstos no
art. 977 do Código Civil no caso da constituição de uma sociedade
limitada, por exemplo. Qual seria o objeto social de uma sociedade
simplesmente utilizada para planejamento sucessório? A lei exige
objeto.
@ROBSONZANETTI

O que acontece nas mídias sociais é que as pessoas acabam se


passando por “professores” e “especialistas”, sem ter conhecimento
suficiente de Holdings, estão vendendo “gato” por “ lebre”, dizendo
que é preciso abrir uma Holding normalmente “familiar” ou
“patrimonial” para economizar impostos com locações e realizar um
planejamento sucessório. Isso não tem nada a ver com Holding,
nesse caso, o que as pessoas precisam é de uma Sociedade Civil
Imobiliária (SCI), como corretamente fazem os franceses ao não
misturarem essas duas estruturas jurídicas:

“Dans leur grande majorité, les sociétés civiles ont pour objet l
´acquisition et la location de biens immobilières, la gestion d´un
portefeiuille de valeurs mobilières et la prise de participation dans d
´autres sociétés. Dans ce dernier cas, nous sommes em présence d
´une société civile holding”. Tradução livre no espírito do texto:
“Na maioria dos casos, as sociedades civis têm como objeto a
aquisição e a locação de bens imóveis, a gestão de uma carteira de
valores mobiliários e a participação em outras sociedades. Nesse
último caso, estamos na presença de uma sociedade civil holding.”
La société civile, Instrumet majeur de la gestion de patrimoine.
Michel Brillat, 2è édition, Gualino Lextenso édition.

Os professores Flávio Tartuce e Maurício Bunazar sustentaram que


tem advertido que “existem sérios problemas de invalidade que
acometem essas constituições negociais, sobretudo no caso do
modelo que busca o total esvaziamento patrimonial dos bens dos
membros da família e sua destinação para essas pessoas jurídicas.”
Onde estão os “sérios problemas”? Qual o problema dos familiares,
sem fraudar credores e execução, sendo o objeto lícito transferirem
seus bens para uma pessoa jurídica e através dela gerirem seus
bens imóveis, os locando e realizando um planejamento sucessório
como fazem os franceses com a sociedade civil imobiliária
perfeitamente aplicável no Direito Brasileiro? Onde está o
problema?
@ROBSONZANETTI

Até 2009 na França já haviam sido constituídas mais de 1.000.000 de


Sociedades Civis Imobiliárias com a finalidade principal de locar
imóveis e realizar planejamento sucessório.

O problema, como vejo, está em confundir Holdings com Sociedade


Civil Imobiliária e não saber como usar esses institutos jurídicos, uns
dizendo que estão fazendo Holding para economizar impostos com
locações e fazer um planejamento sucessório e outros sustentando
que a pessoa jurídica que faz isso é inválida. Nenhum dos dois lados
a meu ver está certo.

A Holding é normalmente usada para aquisição de participações


(quotas e ações) societárias de outras sociedades, já a Sociedade
Civil Imobiliária (SCI) para locação de bens imóveis (eventual venda
de imóvel) e planejamento sucessório, é preciso saber como usá-las.

Abaixo estou trazendo um organograma de uma Holding


Familiar para você entender: a da Família Berlusconi:
@ROBSONZANETTI

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ROBSON
ZANETTI
Advogado com experiência a mais de 28 anos,
PHD Université de Paris 1 Pantheon-Sorbonne
DEA em "Droit des affaires" na Université de
Paris IX e "Corso Singolo" em Direito na Itália
junto a Universitá Statale degli Studi e agora
seu professor e mentor!

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