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DIREITO EMPRESARIAL II

Bárbara Mota Souto (201910697)


Henrique Veríssimo Silva ( 201911322)
Lucas Emmanuel de Carvalho Santos Ferreira (201821069)

01 – Você, como advogado respeitado que é, foi procurado por Pedro, credor de uma
Nota Promissória da sociedade empresária de responsabilidade limitada Armazém do
Campo que lhe narrou o que segue:

i) A sociedade em questão possui 3 sócios – Manoel, Joaquim e Raul – todos com a


mesma participação no Capital Social; ii) Manoel é o sócio-administrador da pessoa
jurídica; iii) Os sócios Manoel e Joaquim, nos 3 últimos exercícios sociais, votaram pela
distribuição de R$100.000,00 em dividendos para cada sócio. Contudo, a sociedade
operou em prejuízo em todos os 3 exercícios sociais; iv) Raul, embora tenha recebido os
dividendos no período citado, absteve-se de votar todas as vezes no que tocava a
distribuição dos dividendos; v) seu cliente foi receber o crédito junto à Sociedade, mas
não logrou êxito. Além disso, ele sabe que a sociedade está em crise financeira e terá
dificuldades de pagar o crédito; vi) o Contrato Social é silente sobre a regência supletiva
da sociedade.

Pedro, então, sujeito pretencioso que pesquisou no Google o que fazer antes de te
procurar, deseja que você entre com uma ação de cobrança com pedido de
desconsideração da pessoa jurídica com base no artigo 50 do Código Civil, uma vez que
existe fraude dos sócios.

Sabendo disso:

a) Julgue a estratégia de Pedro como CORRETA ou ERRADA e fundamente a sua


resposta. Proponha, então, eventuais alternativas para satisfazer o interesse de seu
cliente.
ERRADA.

Não é necessário recorrer à desconsideração da pessoa jurídica apenas com base na


existência de lucros fictícios. No entanto, no cenário descrito, a distribuição de dividendos em
detrimento do credor constitui um ato ilícito. De acordo com o art. 1.059 do código civil, os
sócios estão obrigados a reembolsar os lucros e os valores retirados, independentemente de
autorização contratual, quando tais distribuições prejudicam o capital da empresa. Isso
demonstra a clara responsabilidade dos sócios em manter a integridade do capital social.

Vale ressaltar, que a medida de desconsideração da pessoa jurídica surge de forma


excepcionalíssima, pois a regra é que prevaleça a autonomia patrimonial, sendo a
desconsideração, portanto, uma exceção. Nesse sentido, a aplicação da desconsideração da
personalidade jurídica deve ser excepcional, sendo a regra a preservação da autonomia
patrimonial, devendo ser deferida quando presentes os requisitos do art. 50 do Código Civil.
O ordenamento jurídico adotou a teoria maior da desconsideração da personalidade jurídica a
qual exige prova do desvio de finalidade da sociedade ou a confusão patrimonial entre o
patrimônio dos sócios e o da sociedade empresária.” Portanto, mesmo sendo um ato ilícito o
lucro fictício por si só não é suficiente para encaixar em fraude, mas isso não significa que
dependendo da situação e agravantes não possa ser interpretada como um desvio de finalidade
da pessoa jurídica que poderia justificar a desconsideração de sua personalidade, se
necessário, para proteger os direitos dos credores.

Dessa forma, como vimos no art. 1.056, se os sócios retirarem lucros da empresa de
maneira que isso diminua o capital social a um nível insuficiente para cobrir as dívidas e
obrigações da empresa, eles são responsáveis por repor esses valores, assegurando que a
empresa mantenha sua saúde financeira e seja capaz de cumprir suas obrigações. Portanto,
esse artigo estrutura uma alternativa para solução Pedro, que obriga os sócios a repor o lucro
indevido que tenha recebido. Ademais, caso Pedro tenha sido lesado em decorrência da falta
pagamento seu crédito que era devido, ele poderá exigir os seus direitos e colocar a sociedade
no polo passivo de uma ação. Vale ressaltar que mesmo pelo fato de Raul se abster de votar no
que tocava a distribuição dos dividendos, ele terá que fazer a reposição do dinheiro que
recebeu. Ademais, caso tenha acontecido algum prejuízo a Pedro, por exemplo, algum dano
moral ou material, Raul poderá abrir uma ação legal de regresso contra seus sócios.
b) Explique o instituto Desconsideração da Pessoa Jurídica, suas teorias, aspectos
processuais e a chamada desconsideração inversa.
A Personalidade Jurídica se inicia com a criação da pessoa jurídica, isto é, com a
inscrição dos atos constitutivos em registro competente, vide art. 45 do Código Civil. Esse
instituto atribui autonomia patrimonial, funcionando como um escudo para os bens do sócio,
evitando que atinja seus bens pessoais. O Código Civil prevê essa proteção e a independência
patrimonial da pessoa jurídica, consoante artigo 49-A, ao separá-la da figura dos seus sócios,
associados, instituidores e administradores.
Entretanto, a blindagem patrimonial supracitada já foi instrumentalizada para
finalidades diversas daquelas definidas em lei e permitindo a ocorrência de fraudes em
benefício do sócio e desproteção de seus credores. A partir deste cenário, foi concebido o
instituto da desconsideração da personalidade jurídica, sendo possível alcançar os bens do
sócio e administradores para responder pelas obrigações adquiridas perante os credores.
Todavia, tal incidente é utilizado apenas excepcionalmente em casos de fraude ou abuso de
direito, conforme o art. 50 do Enunciado 07 da Jornada de Direito Civil do Conselho da
Justiça Federal. Em suma, a desconsideração da personalidade jurídica da sociedade se aplica
quando os sócios se valem da personalidade jurídica para cometer fraudes e abusos de
direitos, vide o artigo 50, §1 e §2 do Código Civil. Nesse seara, a desconsideração da
personalidade jurídica impede o uso indevido da pessoa jurídica, impossibilitando que a
separação patrimonial possua propósitos ilícitos.
A desconsideração da Personalidade Jurídica possui duas teorias, sendo a Teoria
Menor e a Teoria Maior. A primeira, adotada pelo Código de Defesa do Consumidor,
verificada pelo art. 28, refere-se a obstaculização do ressarcimento de prejuízos por parte dos
consumidores. Nesse sentido, aplica-se a desconsideração da pessoa jurídica havendo alguma
dessas situações: abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito dos
estatutos ou contrato social, falência, estado de insolvência ou encerramento ou inatividade da
pessoa jurídica em razão de má administração.
A segunda regra geral do sistema jurídico brasileiro, fundamenta-se no art. 50 do
Código Civil, defende que quando há abuso da personalidade jurídica, ilustrado por desvio de
finalidade - teoria subjetiva da desconsideração- ou por confusão patrimonial - teoria objetiva
da desconsideração-, o juiz pode desconsiderar os bens particulares dos administradores ou
sócios beneficiados pelo abuso. Salienta-se que a interpretação dos requisitos é restrita,
observando o art. 50 do CC, em concordância com o Enunciado 146 da II Jornada de Direito
Civil.
Há também previsão da desconsideração da personalidade jurídica na Lei de Crimes
Ambientais , disposto em seu art. 4º, que poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre
que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento dos prejuízos causados à qualidade do
meio ambiente. Ademais, a Lei Antitruste defendia a desconsideração da personalidade
jurídica quando constatar abuso de direito, excesso de poder, infração da lei ou fato ou ato
ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social, falência, estado de insolvência,
encerramento ou inatividade da pessoa jurídica, provocados por má administração.
Outrossim, o procedimento da desconsideração da personalidade jurídica está prevista nos
artigos 133 a 137 do CPC. Destaca-se, acerca dos aspectos processuais, que o recorrente será
encarregado de demonstrar a existência dos requisitos legais para a desconsideração da
personalidade jurídica, vide art. 134, §4º do CPC, sendo atribuído o ônus da prova para quem
alega. Ainda, necessita-se da citação do sócio ou da pessoa jurídica para apresentação das
provas, respeitando, assim, a garantia do contraditório. Por fim, quando for pleiteado a
desconsideração da personalidade jurídica na petição inicial, poderá o juiz julgar por meio de
decisão interlocutória, caso haja provas satisfatórias nos autos, ou por meio de sentença, após
a fase de instrução.
Acerca da desconsideração inversa, trata-se da hipótese do sócio se valer da pessoa
jurídica, ilicitamente, com objetivo de ocultar ou desviar bens pessoais em prejuízo a
terceiros. Nesse sentido, os sócios usufruem da Pessoa Jurídica para blindar seu próprio
patrimônio, para tanto, atinge-se a personalidade da PJ para executar dívidas pessoais do
sócio. Assim sendo, a personalidade jurídica age como defesa do sócio frente às execuções
que são cabíveis a ele, à exemplo do sócio que transfere a titularidade de seus imóveis a sua
empresa com finalidade de resguardar seus bens em uma ação de partilha matrimonial.
Nota-se que nestes casos também é possível verificar fraudes e confusão patrimonial e por
esta razão, admite-se a desconsideração inversa da personalidade jurídica para coibir tais
práticas.

02 – Carla, sócia-administradora da sociedade empresária NeoQuímica LTDA, te


procura em seu escritório para a auxilie em um problema com um de seus sócios,
Henrique. Quando da constituição da sociedade, há 2 anos, Henrique subscreveu 30%
do Capital Social. No ato de assinatura, integralizou 10% em moeda corrente nacional;
ficando o restante para integralizar no dia 15 de maio de 2023, há um mês. Contudo, não
o fez, causando prejuízo à sociedade, na medida em que esta havia se planejado
financeiramente para a entrada desse recurso e agora não tem caixa suficiente para
efetuar quaisquer pagamentos. Diga à Carla as opções da sociedade neste caso. Afirme,
inclusive, quem deva figurar como parte autora das medidas judiciais e extrajudiciais
porventura cabíveis.

Com base no caso exposto, a primeira questão que deve ser levantada refere-se ao
caráter da responsabilização dos sócios da sociedade. Como explica o parágrafo 1⁰ do artigo
1.055 do Código Civil de 2002, todos os sócios respondem solidariamente pela exata
subscrição do capital social da sociedade. Pelo fato da empresa NeoQuímica se tratar de uma
sociedade limitada, em regra, a responsabilidade de seus sócios deve ser limitada. Contudo, o
fato de Henrique, enquanto sócio, não ter integralizado totalmente o valor que ele subscreveu
no momento da constituição da sociedade faz com que o capital social não esteja totalmente
integralizado, motivo pelo qual, conforme o artigo mencionado, a responsabilização de todos
os sócios se torna ilimitada em caráter solidário pelo período de cinco anos. Nessa situação,
Henrique, por ter deixado de cumprir com a integralização que lhe estava atribuída, se em
mora, torna-se então um sócio remisso.
Ainda sobre a matéria, o artigo 1.004 do mesmo Código determina a vinculação
obrigatória dos sócios às respectivas contribuições subscritas no contrato social, vez que, a
sua inadimplência, observados os prazos previstos, constitui em mora, nos 30 dias seguintes
da notificação realizada pela sociedade, o sócio remisso, que passa a ficar responsável pelo
que não integralizou e pelos danos inerentes à mora. Em virtude das atribuições deste
dispositivo e observando os fatos do caso em questão, é possível auxiliar Carla
primeiramente da possibilidade de realizar a notificação da mora de Henrique, visto que, após
o prazo estipulado na data de 15 de maio de 2023, este não cumpriu com sua obrigação de
integralizar o restante da sua subscrição. Após realizada a notificação, Henrique terá o prazo
de 30 dias para regularizar a situação, e decorrido esse prazo, ele, por força do artigo 1.004,
poderá ser responsabilizado pelo que não integralizou e pelos danos que sua ação ocasionou.
Ainda dentro das opções da sociedade, uma vez decorridos os 30 dias, caso Henrique
não integralize o restante do valor subscrito, a sociedade poderá optar pelas opções previstas
no parágrafo único do artigo 1.004. Diante dessas possibilidades, a sociedade pode optar por
ser indenizada, por excluir o sócio remisso ou por mantê-lo reduzindo a sua participação no
capital social pelo valor que efetivamente ele integralizou. Diante disso, em todas essas
hipóteses, os demais sócios poderão também optar por suprirem o valor da quota referente à
não integralização para impedir a redução do capital social, por força do parágrafo primeiro
do artigo 1.031 deste Código, que positiva essa possibilidade.
Carla também deve ser orientada da forma como a dissolução parcial relativa ao sócio
remisso pode ser dada. Pelo contexto, a hipótese de exclusão não seria a mais viável, visto que
a sociedade não possui reserva de caixa e teria que restituir a Henrique o valor que ele já
havia integralizado. Contudo, caso opte pela exclusão de Henrique, a sociedade pode dar
seguimento com o procedimento tanto pela via judicial quanto pela extrajudicial. Seguindo
pela via extrajudicial, a exclusão prevista no artigo 1.004 deverá observar a vontade da
maioria dos demais sócios. Ainda pela via extrajudicial, pode optar pela dissolução das quotas
do excluendo pela hipótese de justa causa. Para isso, o artigo 1.085 define como requisitos a
previsão no contrato social para esse tipo de exclusão, o oferecimento de risco à atividade
empresária decorrente das ações do excluendo, a realização de assembleia ou reunião de
sócios convocada para esta finalidade e o consentimento da maioria absoluta do capital social,
isto é, mais de 50%. Caso haja previsão no contrato da sociedade NeoQuímica para justa
causa, a sociedade poderá proceder com essa exclusão mediante o consentimento do quorum
mencionado durante a realização de assembleia ou reunião, visto que as ações de Henrique
provocaram significativo prejuízo às atividades da sociedade, inviabilizando o caixa para a
realização de quaisquer pagamentos.
Caso decida proceder pela via judicial, de acordo com o artigo 1.030 do Código Civil,
a sociedade poderá excluir o sócio remisso por falta grave desde que tenha aprovação da
maioria dos sócios. A falta é entendida como o descumprimento dos deveres de sócio, sendo a
integralização do capital subscrito um dever societário. Henrique, ao não realizar a
integralização total, não cumpriu com seu dever de sócio, configurando assim a hipótese de
falta grave. Assim, em ambos os casos, a sociedade NeoQuímica LTDA é quem deve figurar
como parte autora, vez que o interesse de agir é da sociedade e não dos sócios.

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