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DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NA

RECUPERAÇÃO JUDICIAL E FALÊNCIA

A Desconsideração da Personalidade é um incidente processual decorrente de


uma decisão judicial que tem por objetivo atacar os bens dos sócios por
obrigações de responsabilidade da sociedade, que pode ser invocado pelo
prejudicado com o objetivo de denunciar uso indevido da personalidade jurídica,
por fraude ou abuso de direito quando os sócios utilizam-se desta para benefício
próprio e em prejuízo de terceiros.

O que se busca com a desconsideração da personalidade jurídica é afastar a


divisão existente entre os bens da sociedade e os bens pessoais dos sócios e
considerá-los como uma universalidade de bens que deve responder pelas
obrigações contraídas pelos sócios em nome da sociedade com o intuito de
fraude, passando o sócio que praticou tais atos a responder com seu patrimônio
pelas dívidas societárias.

A Lei 11.101/05, que regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do


empresário e da sociedade empresária em recente alteração, sofreu mudanças
significativas e uma delas foi a inserção do artigo 82-A, parágrafo único, vedado
a extensão dos efeitos da falência aos sócios ou administradores da sociedade
falida, bem como regulamentando a desconsideração da personalidade jurídica
no âmbito da falência.

Assim, a introdução do artigo 82-A na Lei 11.101/2005, ao estabelecer requisitos


objetivos para a desconsideração da personalidade jurídica da sociedade falida
tem por objetivo trazer a previsibilidade necessária para que o empresário tenha
clareza na tomada de decisões estratégicas para gestão do seu negócio.

Segundo o dispositivo, a desconsideração da personalidade jurídica da


sociedade falida, para fins de responsabilização de terceiros, grupo, sócio ou
administrador por obrigação desta, somente pode ser decretada pelo juízo
falimentar com a observância do artigo 50 do Código Civil desde que
comprovada configuração do abuso da personalidade jurídica, mediante desvio
de finalidade ou confusão patrimonial e também deve respeitar os ditames dos
artigos 133 a 137 do CPC, que instaurado o incidente de desconsideração da
personalidade jurídica, este correrá na jurisdição da falência ou recuperação
judicial e restará garantido amplo contraditório e ampla defesa aos terceiros,
sócios ou administradores que possam ser atingidos com a medida, não se
aplicando, porém, a suspensão de que trata o §3º do artigo 134 do CPC.

O art. 6-C, da Lei 11.101/05, reforça a premissa de que não pode haver
atribuição de responsabilidade a terceiros em decorrência de mero
adimplemento, afastando as outras hipóteses de desconsideração do Código de
Defesa do Consumidor, direito ambiental e também da justiça do trabalho.

No procedimento de recuperação judicial a desconsideração da personalidade


jurídica deve ser aplicada com cautela, podendo ser levada a assembleia de
credores mas decidida pelo magistrado, sendo competente o juízo universal
depois de iniciado o incidente nos autos recuperacionais, pois ao contrário da
aplicação do instituto na execução comum, que visa o recebimento de certa
quantia, na recuperação judicial é usado para apurar responsabilidade dos
sócios, ficando longe da possibilidade de satisfação de um credor em especifico.

É possível, ademais, que a desconsideração seja requerida logo na petição


inicial, ocasião em que o sócio ou a pessoa jurídica (no caso de desconsideração
inversa) deverão ser citados, desde logo, como réus, formando-se um
litisconsórcio passivo com o devedor principal. É o caso de se constatar, já no
início do processo falimentar, indícios de formação de grupo econômico que
tenha sido usado de maneira fraudulenta para prejudicar credores.

Na doutrina e na jurisprudência, é comum haver certa confusão entre


desconsideração da personalidade jurídica da empresa falida, ação de
responsabilidade de sócios e, até mesmo, extensão dos efeitos da falência aos
sócios.

Legitimidade para instauração do incidente

Só as partes interessadas podem pedir a desconsideração da personalidade


jurídica: o devedor, o credor e o terceiro interessado.
Art. 133. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica será
instaurado a pedido da parte ou do Ministério Público, quando lhe couber intervir
no processo.

Não há possibilidade de atuação jurisdicional sem o requerimento da parte ou do


Ministério Público; ou seja, é vedado ao juiz, de ofício, determinar a inclusão do
sócio ou do administrador no polo passivo da demanda, para fins de
desconsideração da personalidade jurídica. O art. 133 do CPC está em
consonância com o art. 50 do CC, que também prevê o expresso requerimento
do interessado ou do Ministério Público, não se podendo cogitar de atuação ex
officio.

O Ministério Público só pode requerer a instauração do incidente nas causas em


que atuar, seja como parte, ou como fiscal da lei (hipóteses do art. 178, do CPC).

Como fazer blindagem patrimonial dos sócios?

A forma de blindagem patrimonial a ser utilizada dependerá de diversos fatores,


e deve ser realizada por técnicos competentes, sempre se atentando para
utilização de métodos legais. A ideia é essa blindagem não fraudar credores ou
burlar o fisco, mas sim permitir que a responsabilidade dos sócios seja
efetivamente limitada ao montante atribuído por ele ao capital social da
sociedade, não estando seu patrimônio pessoal sujeito aos riscos do negócio.

De qualquer maneira, existem medidas legais que podem ser adotadas pelo
empresário para evitar que seus bens particulares sofram riscos desnecessários.
Algumas delas são:

1 – Criação de empresa patrimonial

Também chamada de holding, o empresário pode constituir uma empresa com


o objetivo de abrigar seu patrimônio. Dessa maneira, ele separa seus bens
pessoais, dos bens da empresa operacional.

2- Doação de bens com reserva de usufruto


O empresário faz a doação de seus bens, mas permanece com o usufruto, isto
significa dizer que ele transfere a propriedade dos bens, mas permanece com a
administração deles. Dessa maneira, fica afastada a possibilidade de que as
dívidas alcancem seu patrimônio pessoal.

Vale lembrar que o usufruto tem validade até a morte, portanto fica impedido
que o que foi doado em usufruto seja liquidado para pagar dívidas.

3 – Doação de bens para herdeiros

O empresário pode doar, em vida, seu patrimônio, aos herdeiros, o que também
é chamado de antecipação de herança ou, ainda, planejamento sucessório.
Deste modo, extinta a possibilidade de que dívidas empresariais alcancem esses
bens.

4 – Realização de auditorias de riscos

As auditorias são necessárias para buscar uma boa governança corporativa e


competitividade no mercado, além disso, ela previne erros e demonstra os
pontos fracos da sua empresa.

Os auditores trazem apontamento de profissionais especializados em cada área


de atuação. Se a empresa fica livre de problemas fiscais, trabalhistas,
previdenciários, por exemplo, afasta também a possibilidade de que no futuro
dívidas nesse sentido atinjam o patrimônio pessoal dos sócios.

A blindagem patrimonial é rodeada de muitas regras complexas e procedimentos


burocráticos, por isso, é sempre recomendável que o empresário conte com uma
assistência jurídica empresarial e tributária, a fim de garantir a eficiência da
blindagem jurídica.

COELHO, Fábio Ulhôa. Comentários à lei de falências e de recuperação de


empresas – 11. Ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2016.
ALMEIDA, Amador Paes de Manual das sociedades comerciais (direito de
empresa) - 20. ed. rev. e atual. - São Paulo: Saraiva, 2012.

______. Lei 11.101, de 9 de fevereiro de 2005. Regula a recuperação judicial, a


extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária. Brasília, DF,
fev. 2005

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