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DIREITO

FALIMENTAR:
RECUPERAÇÕES
JUDICIAL E
EXTRAJUDICIAL

Bruno Baldinoti
Efeitos da falência
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Definir os direitos e deveres atrelados à esfera da pessoa do falido.


„„ Analisar os contratos celebrados, especialmente em relação aos bens
do falido.
„„ Identificar os direitos dos credores.

Introdução
Quando o ativo do devedor empresário ou sociedade empresarial não é
o suficiente para resolver o passivo, fica caracterizada a sua insolvência.
Assim, surge a possibilidade da decretação da falência do empresário ou
da sociedade, podendo ser por solicitação própria, autofalência ou por
pedido dos credores, caso cumpram os requisitos.
Entende-se que a garantia dos credores é o patrimônio do falido,
devendo os titulares do crédito constituir uma única massa dentro do pro-
cesso de falência para uma execução coletiva ao devedor. Para garantir a
todos os credores o direito de igualdade na oportunidade de recebimento
do crédito, ao ser decretada a falência pelo juízo, são implicados efeitos
aos credores e aos falidos e seus contratos, que passam a ter direitos e
obrigações frente ao processo falimentar.
Neste capítulo, você vai estudar os efeitos da falência. Vai ver quais são
os direitos e deveres da pessoa do falido e dos credores, assim como quais
são os contratos celebrados, especialmente em relação aos bens do falido.

1 Direitos e deveres da pessoa do falido


Ao ser decretada a falência, determinados efeitos são imediatos em relação
à pessoa do falido. Tais efeitos estão disciplinados no rol do art. 104 da Lei
n.º 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, denominada Lei de Recuperação Judicial
e Falências.
2 Efeitos da falência

A referida lei estabelece que é dever do falido, após a decretação da falên-


cia, assinar o termo de comparecimento, com sua qualificação devidamente
completa. Ainda deve declarar as causas que determinaram sua falência, se o
pedido foi requerido por credores. Para a sociedade falida, do mesmo modo,
no termo de comparecimento deve constar os nomes e qualificação de todos
os sócios, acionistas controladores e diretores/administradores, apresentando,
ainda, o contrato ou o estatuto social, o comprovante de registro e suas alte-
rações, caso tenha.
O art. 104 da Lei de Falências ainda traz que o termo de comparecimento
deve conter o nome do contador encarregado da escrituração dos livros obriga-
tórios; a indicação do nome e endereço do mandatário e o objeto do mandato,
em caso de existência de mandatos outorgados; bem como, caso algum sócio
faça parte de outra sociedade, o respectivo contrato para sua comprovação.
Ainda, seus bens imóveis e móveis que não se encontram no estabelecimento
devem ser indicados no termo de comparecimento. Por fim, também devem
ser apresentadas as contas bancárias, aplicações, títulos em cobrança e os
processos em andamento em que o falido for autor ou réu.
Outro dever estabelecido pela Lei de Falências é o depósito em cartório dos
livros obrigatórios no momento da assinatura do termo de comparecimento,
para que o administrador judicial possa averiguá-los, após serem encerrados
por termos assinados pelo juiz da falência. A mesma lei ainda traz que, salvo
exista procurador habilitado, o falido não pode ausentar-se da comarca que
tramita o processo de falência sem a comunicação e justificativa ao juízo,
e também deve comparecer a todos os atos da falência, pessoalmente ou por
procurador, quando sua presença não for dispensável.
Também é dever do falido a entrega de todos os bens, livros, papéis e
documentos ao administrador judicial, indicando ainda, caso haja, os bens
que se encontrem em poder de terceiro, sendo também obrigação do falido
prestar as informações solicitadas pelo juiz, administrador judicial, credor ou
Ministério Público (MP) sobre as questões que interessam à falência.
Além de auxiliar o administrador judicial, o falido ainda deve examinar
as habilitações de crédito que forem apresentadas na falência, assistir ao
levantamento, ao exame dos livros e à verificação do balanço patrimonial,
apresentar a relação de credores e, por último, examinar e fazer um parecer
sobre as contas do administrador judicial, bem como manifestar-se quando
o juiz determinar. A Lei de Falências ainda determina, no parágrafo único
do art. 104, que, no caso de descumprimento de qualquer dever do falido,
Efeitos da falência 3

estabelecido por lei, será imputado a ele o crime de desobediência. Ademais,


também enquadrado como uma consequência da decretação da falência é
o afastamento do devedor de suas atividades empresariais, ficando ainda
impedido de dispor e administrar seus bens.

Apesar de o devedor perder a disponibilidade e administração de seus bens, o falido


não estará impedido de administrar os bens de terceiros sob sua responsabilidade.

Já no caso da sociedade empresária, seus sócios não vão à falência, apenas


a sociedade. Assim, dependendo do tipo de sociedade, os bens particulares
de determinados sócios poderão ser atingidos com a decretação da falên-
cia apenas se eles tiverem responsabilidade ilimitada e forem solidários.
Os sócios de responsabilidade limitada não poderão ter seus bens atingidos
pela decretação da falência, salvo em caso de configuração de desconsideração
da personalidade jurídica.

A desconsideração da personalidade jurídica ocorre nos casos em que se observa


um prejuízo aos credores pelo uso deturpado da personalidade jurídica, podendo
assim uma dívida atingir o patrimônio do sócio ou, em caso de desconsideração da
personalidade jurídica inversa, a dívida da pessoa física atingir a pessoa jurídica.

Portanto, se o falido é uma sociedade empresária, os responsáveis pelo


cumprimento dos deveres da falência são os administradores. Desse modo,
faltando ao cumprimento de qualquer dever imposto, após intimado pelo juiz,
o administrador responderá por crime de desobediência.
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Outrossim, não obstante aos efeitos da falência, dispostos anteriormente,


a Lei de Falências ainda traz, em seu art. 77, que, a partir da falência, todas
as dívidas do falido e dos sócios solidários e de responsabilidade ilimitada
terão seus vencimentos antecipados:

Art. 77. A decretação da falência determina o vencimento antecipado das


dívidas do devedor e dos sócios ilimitada e solidariamente responsáveis, com
o abatimento proporcional dos juros, e converte todos os créditos em moeda
estrangeira para a moeda do País, pelo câmbio do dia da decisão judicial, para
todos os efeitos desta Lei (BRASIL, 2005, documento on-line).

Outra consequência é que, no momento da decretação da falência, consi-


deram-se encerradas todas as contas correntes do devedor, e o saldo deverá
ser arrecadado para formação da massa falida. Ainda, com a decretação da
sentença, o falido ou o administrador da sociedade falida fica impedido de
exercer cargos de administração comercial, como também de exercer ativi-
dades de comércio.
No mais, que com a decretação da falência, os sócios de responsabilidade
ilimitada também são considerados falidos, e não apenas a sociedade. Vemos
essa disposição no art. 81 da Lei de Falências:

Art. 81. A decisão que decreta a falência da sociedade com sócios ilimita-
damente responsáveis também acarreta a falência destes, que ficam sujeitos
aos mesmos efeitos jurídicos produzidos em relação à sociedade falida e, por
isso, deverão ser citados para apresentar contestação, se assim o desejarem.
§ 1º O disposto no caput deste artigo aplica-se ao sócio que tenha se retirado
voluntariamente ou que tenha sido excluído da sociedade, há menos de 2
(dois) anos, quanto às dívidas existentes na data do arquivamento da alteração
do contrato, no caso de não terem sido solvidas até a data da decretação da
falência. […]
Art. 190. Todas as vezes que esta Lei se referir a devedor ou falido, com-
preender-se-á que a disposição também se aplica aos sócios ilimitadamente
responsáveis (BRASIL, 2005, documento on-line).

A Lei de Falências dispõe não apenas de deveres do falido, mas também


traz no parágrafo único do art. 103 alguns direitos do falido, sendo eles:
o falido poderá promover a fiscalização da administração da falência, reque-
rendo as providências necessárias para a conservação de seus direitos ou dos
bens arrecadados, bem como intervindo nos processos em que a massa falida
seja parte ou interessada, defendendo seus interesses e interpondo recursos.
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Ademais, o falido poderá acompanhar a arrecadação e a avaliação de seus


bens, conforme preceituado pelo parágrafo segundo do art. 108 da Lei de
Falências. O ordenamento jurídico brasileiro ainda traz que são incorporados
ao processo de falência para a massa falida os bens penhoráveis do falido e
dos sócios ilimitados, com exceção dos bens absolutamente impenhoráveis.

Para todos os efeitos da falência, o administrador judicial representa o falido em todos os


aspectos patrimoniais, ficando garantida ainda a representação de seus direitos pessoais.

Por fim, o falido continua responsável por todas as dívidas da falência até
a conclusão de pagamento ou a prescrição dos mesmos, tendo seus direitos
garantidos, porém devendo cumprir com suas obrigações impostas pela Lei
de Falências.

2 Contratos em espécie da sociedade falida


A princípio, a decretação da falência, por si só, não resolve os contratos da
falida. Os contratos unilaterais, ou os bilaterais que não tenham sidos exe-
cutados por nenhuma das partes, podem ser rescindidos ou não. Com esse
posicionamento, Fábio Ulhoa Coelho ensina:

Os contratos bilaterais da falida que não tenham ainda sua execução iniciada
por nenhuma das partes e os unilaterais podem ser rescindidos pelo adminis-
trador judicial autorizado pelo Comitê, se isso for do interesse da massa de
credores, ou seja, se o cumprimento do contrato reduzir ou evitar o aumento
do passivo ou revelar-se necessário à manutenção do ativo (COELHO, 2012,
p. 225).

Cabe ao comitê de credores a autorização ou recusa do cumprimento do


contrato, em face da proposta efetuada pelo administrador judicial. Já no caso
de inexistência do comitê, a decisão caberá individualmente ao administrador
judicial, visando ao maior benefício para a massa falida.
6 Efeitos da falência

Comitê de credores é um órgão facultativo tanto para a falência quanto para a


recuperação judicial, sendo, em regra, composto por um representante mais dois
suplentes de cada classe de credores (trabalhista; com direitos reais de garantia ou
privilégios especiais; quirografários e com privilégios gerais; microempresas e empresas
de pequeno porte). Entretanto a falta de representante ou suplente não prejudica sua
formação. O comitê de credores tem atribuições como fiscalizar, zelar, comunicar ao
juízo, requerer convocação para a assembleia-geral de credores, entre outras, que
protejam os benefícios dos credores.

Na possibilidade de os contratos bilaterais que tiveram sua execução ini-


ciada por uma das partes antes da falência, em regra, não terem sua resolução
pela simples decretação da falência, sendo uma exceção, o caso do cumprimento
integral do contrato causa prejuízo aos credores. Assim, se qualquer uma das
partes tiver cumprido, total ou parcialmente, as obrigações do contrato, ele não
será resolvido pela decretação da falência; consequentemente, irá prosseguir
para o recebimento do crédito se for o credor ou, no caso de configurar como
devedor, terá que habilitar a outra parte no processo da falência.
Fábio Ulhoa Coelho também ensina sobre a mesma disposição:

Atenção particular deve-se ter, no exame desse assunto, para a cláusula ex-
pressa de resolução por falência. Nos contratos interempresariais, costuma
constar do instrumento a expressa previsão de resolução na hipótese de falência
de um ou qualquer dos contratantes. Se as partes pactuaram cláusula de reso-
lução por falência, esta é válida e eficaz, não podendo os órgãos da falência
desrespeitá-la. […] O direito falimentar, como capítulo do direito comercial,
tem normas contratuais de natureza supletiva da vontade dos contratantes;
seus preceitos sobre obrigações contratuais só se aplicam se as partes não
convencionaram diferentemente (COELHO, 2012, p. 225–226).

Desse modo, o Direito Falimentar traz como regra geral que os contratos
bilaterais e que ainda não foram executados, de forma integral ou parcial, não
se resolvem pela decretação da falência, salvo em caso de cláusula resolutiva
por falência expressa, que prioriza a vontade das partes. Além da cláusula
resolutiva por falência que pode constar nos contratos, a Lei de Falências
também estabelece regras específicas definidas nas celebrações de determi-
Efeitos da falência 7

nados contratos, conforme dispõe o rol dos contratos em espécie do art. 119
do referido texto legal, em sua maioria, interferindo nos bens do falido.

Para os contratos de compra e venda mercantil, é importante estabelecer o polo


do falido no contrato, sendo que há a variação dos direitos dependendo de suas
circunstâncias.

Em relação aos contratos de compra e venda mercantil, quando o falido


for o comprador, o Direito Falimentar traz quatro hipóteses do direito do
vendedor, dependendo do momento da entrega da mercadoria, vejamos a seguir.

„„ No caso dos contratos de mercadorias não entregues e não pagas, total ou


parcialmente, caberá ao comitê analisar e decidir sobre a continuidade
ou encerramento do referido contrato.
„„ No caso de o vendedor ter conhecimento do pedido de falência do
comprador após o despacho do produto, existe a possibilidade de o
vendedor bloquear a entrega de mercadoria que ainda não foi paga.
„„ No caso de a entrega das mercadorias ocorrer dentro dos 15 dias an-
teriores ao pedido de falência do comprador, é garantido o direito de
restituição dos produtos ao vendedor, desde que não tenha ocorrido a
alienação dessa mercadoria, incluindo as vendas judiciais. Neste caso,
é necessária a restituição em dinheiro.
„„ No caso de a entrega das mercadorias do contrato de compra e venda
mercantil ter ocorrido fora do prazo dos 15 dias anteriores ao pedido
da falência, a única solução é a habilitação do crédito.

Nos contratos de compra e venda mercantis em que ocorre a falência do


vendedor, o comprador pode pedir perdas e danos, habilitando no processo
falimentar o crédito reconhecido na ação indenizatória. Quando se tratar de
coisa móvel vendida à prestação, pode o administrador resolver o contrato,
prosseguindo com a habilitação do crédito do comprador no valor das pres-
tações já quitadas.
8 Efeitos da falência

Nos contratos de compra e venda mediante reserva de domínio do vende-


dor, tratando-se de coisa móvel, o administrador judicial deverá decidir sobre
a continuidade ou não do contrato, independentemente dos valores já pagos,
podendo haver a restituição ao vendedor. Ainda, nas hipóteses dos contratos
de compra e venda a termo de bens com cotação em bolsa ou mercado,
o contratante ou a massa prestará a diferença entre as cotações do dia do con-
trato e da liquidação. Quanto aos compromissos de compra e venda de imóveis
ou lotes, o administrador judicial não pode rescindir o contrato, fazendo com
que, no caso de falência do vendedor, o compromisso seja cumprido e, no
caso de falência do comprador, seus direitos sejam arrecadados e liquidados.
A decretação da falência também não resolve o contrato de locação.
Na hipótese de o falido ser o locador, o pagamento do aluguel deverá ser
incorporado à massa falida, continuando assim o locatário no imóvel. Ainda,
se executada a venda judicial do imóvel, o novo proprietário poderá decidir
na continuidade ou não do contrato de aluguel. Já na hipótese de o falido ser
o locatário, caberá ao administrador judicial decidir ou não pela continuidade
do aluguel, visando ao melhor benefício para a massa, devendo assim, ser
cumpridas todas as obrigações do contrato caso decida continuar no imóvel.
Vale salientar que, a qualquer momento, é permitido ao administrador judi-
cial denunciar o contrato de locação a fim de rescindi-lo, caso o falido seja
o locatário.

Em se tratando de contas correntes, elas deverão ser encerradas no momento da


declaração da falência, apurando-se o saldo, que deverá ser habilitado na falência
caso contenha crédito.

Nos contratos de alienação fiduciária com garantia, o fiduciário poderá


pedir a restituição do imóvel, caso o falido seja o fiduciante. Ainda não sendo
encontrado o imóvel na posse da sociedade, a restituição deverá ser efetuada
em dinheiro. Nos contratos de câmbio ou em moeda estrangeiras, os cré-
ditos serão convertidos com a cotação do dia em que for decretada a falência,
correspondendo esse ao direito do credor. No caso de falência do vendedor,
a instituição financeira terá direito à restituição do dinheiro adiantado.
Efeitos da falência 9

O Superior Tribunal de Justiça já pacificou, na Súmula 36, que “A correção monetária


integra o valor da restituição, em caso de adiantamento de câmbio, requerida em
concordata ou falência”.

Fábio Ulhoa ensina um ponto importante a se observar quanto aos contratos


em moeda estrangeira, observe:

A regra especial do direito falimentar não é aplicável se do contrato celebrado


em moeda estrangeira resulta crédito em favor da sociedade empresária falida.
Pois bem, nesse caso, o administrador judicial da massa falida da instituição
financeira exigirá do financiado devedor o pagamento, em moeda nacional,
pela taxa de câmbio do dia (COELHO, 2012, p. 232).

Quanto aos contratos de depósitos em armazéns, quando falir o deposi-


tante, o armazém é obrigado a entregar todas as mercadorias ao administrador
judicial da massa falida, assim que forem reclamadas.
Ao ser decretada a falência, a Lei de Falências determina que, no caso de
existência de patrimônios de afetação, deverá apenas ser recolhido o saldo,
se houver, pelo administrador judicial, após o prazo de separação patrimonial
ou cumprimento da finalidade. Assim, sem essas condições, a atividade deve
continuar separadamente, como se não tivesse sido decretada a falência.
Não especificamente quanto aos bens do falido, mas sim quanto aos contratos
de consumo, como o Código de Defesa do Consumidor não dispõe de um capítulo
específico para o assunto, salvo exceção do art. 28, que traz a possibilidade de
desconsideração da personalidade jurídica em caso de falência, deve-se aplicar
a regra geral trazida para os contratos bilaterais do falido que não tiveram sua
execução iniciada, ou seja, não rescinde apenas com o pressuposto da decretação
da falência de uma das partes. Fábio Ulhoa traz que, com a omissão do código
consumerista, prevalece o maior interesse para a massa, vejamos:

Não havendo norma específica na legislação tutelar dos consumidores, tam-


bém em relação aos contratos de consumo (bilaterais e não cumpridos ou
unilaterais) a palavra final sobre a integridade ou a dissolução do vínculo
contratual é exclusiva dos órgãos da falência, intérpretes dos interesses da
coletividade dos credores (expressa pela busca dos efeitos de redução ou não
elevação do passivo ou de preservação do ativo) (COELHO, 2012, p. 231–232).
10 Efeitos da falência

Em relação aos contratos de trabalho, estes não são rescindidos com a


decretação da falência, mas sim com o fim das atividades empresariais. Isso
ocorre quando, por ordem judicial, a empresa é autorizada a continuar suas
atividades provisoriamente. Assim, os contratos de trabalho continuam vigentes
até a cessação das atividades, devendo o administrador judicial providenciar
todos os encargos trabalhistas e fiscalizar o cumprimento regular da jornada
dos trabalhadores.

Os empregados contratados pelo administrador judicial não fazem parte dos contratos
de trabalho dos trabalhadores da empresa falida, assim, as despesas com esses em-
pregados não concorrem na classe dos créditos trabalhistas — elas são consideradas
despesas extraconcursais.

Como uma exceção da regra geral dos contratos do falido estão os contratos
administrativos. Após ser decretada a falência, a administração pública pode
rescindir tanto os contratos de fornecimento de bens ou serviços — autori-
zados pelo inciso IX do art. 78 da Lei n.º 8.666, de 21 de junho de 1993, que
regulamenta os contratos de licitações —, quanto os contratos que se referem à
exploração de serviços públicos. A extinção da concessão está autorizada pelo
inciso VI do art. 35 da Lei n.º 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, que dispõe
sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos.
Isso ocorre porque, uma vez que os contratos realizados entre um ente
público e um particular são tratados como forma de licitação, consequente-
mente, submetem-se ao regime administrativo. Desta forma, toda vez que
um empresário tiver um contrato com a administração pública e ele falir,
seu contrato será rescindido, pois se sobressai o interesse público da relação
contratual.
Por último, quanto aos contratos que produzem efeito nos bens do falido,
a lei falimentar, em regra, proíbe a compensação de créditos transmitidos
aos credores do falido após a decretação da falência, ou até mesmo antes
da decretação, quando o estado da crise já era conhecido pelas partes. Essa
proibição também ocorre quando ocorre fraude ou dolo na transferência.
Em contrapartida, Fábio Ulhoa Coelho (2012, p. 235–236) afirma que “Ressalva
da proibição apenas os créditos transmitidos após a decretação da falência
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em razão de sucessão negocial ou por morte”, como é o caso de incorporação


de sociedades, podendo assim, ser admitida a compensação após decretada
a falência.
Dessa forma, entende-se que o Direito Falimentar estabelece que a decre-
tação da falência não enseja na automática extinção do vínculo contratual de
negócio jurídico, desde que seja disposição de contrato bilateral e que não
haja cumprimento parcial ou total antes da falência, salvo os casos acima
especificados e as disposições dos contratos em espécie.

3 Efeitos da decretação da falência


em relação aos credores
A fase da administração da falência tem início assim que a falência é decretada.
Ela tem como efeito imediato o afastamento do devedor de suas atividades,
além da formação da massa de credores, da suspensão das ações individuais,
da suspensão condicional da fluência de juros, da exigibilidade antecipada dos
créditos contra o devedor e sócios de responsabilidade ilimitada, da suspensão
da prescrição e da arrecadação dos bens do devedor.
Inicialmente, os credores têm direito ao recebimento total dos débitos
devido pelo falido. Para isso, o credor poderá executar o patrimônio do falido
para satisfazer o seu crédito. Nesse processo, é criada a massa subjetiva,
ou seja, a massa de credores.

Os credores podem executar todos os bens do falido para a quitação de seus débitos,
inclusive após o processo de falência, com o surgimento de novos bens.

Quanto à massa subjetiva, Fazzio Júnior (2016, p. 663) ensina que “A ex-
pressão massa falida comporta duas acepções: subjetiva, quando designativa
dos credores; objetiva, quando pertinente ao patrimônio colocado sob regime
falimentar”. Assim, todos os credores comuns do devedor falido obrigam-se a
comparecer ao juízo universal e concorrer ao ativo do devedor, pelo montante
de seus créditos, para que, então, haja a partilha dos bens de forma equitativa,
bem como em conformidade com a classificação dos créditos.
12 Efeitos da falência

Os credores, ou a massa subjetiva, concorrerão para o recebimento de seus


créditos por meio da disponibilização dos bens do falido. O exercício dos
direitos dos credores ocorrerá da maneira compreendida pelo ordenamento
jurídico. Desse modo, a concorrência dos credores pelos bens disponibilizados
é de maneira universal, ou seja, as ações de execução individuais deverão
ser suspensas e, portanto, continuar de modo coletivo por meio da massa de
credores.

Existem três exceções que devem ser observadas em relação às ações suspensas: as
ações que demandam quantias ilíquidas, isto é, aquelas em que ainda não se obteve
o título judicial necessário à liquidação; as ações e execuções por créditos que não são
sujeitos ao rateio; e as ações referentes às obrigações personalíssimas.

Após a decretação da falência, outro efeito existente é a suspensão da


incidência de juros, ficando garantido a correção monetária até o recebimento
da dívida. Entretanto, se a massa falida for o suficiente para o pagamento total
da dívida principal, poderão ser exigidos os juros, tanto os legais quanto os
contratuais.
Ademais, a sentença que decreta a falência também determina o venci-
mento antecipado das obrigações do devedor e dos sócios ilimitadamente
responsáveis, fazendo com que as dívidas tenham seus vencimentos imediatos.
Neste contexto, Ricardo Negrão (2005) ensina o motivo de o credor não ter
que esperar até o vencimento da dívida: no caso de concurso de credores,
a insuficiência econômica do devedor é evidenciada, assim, o ordenamento
jurídico traz a possibilidade da junção de todos os credores para dividirem
entre si, verificando as ordens de preferência, os bens do devedor insolvente.
A Lei de Falências, em seu art. 6º, dispõe que, durante o processo de
falência, fica suspenso o curso da prescrição relativa à obrigações de respon-
sabilidade do devedor. De acordo com o art. 157, após o trânsito em julgado
da sentença de encerramento do processo falimentar, voltará a fluir o prazo
prescricional das obrigações do devedor que foram suspensos em razão da
decretação da falência.
Efeitos da falência 13

Outrossim, a arrecadação de bens do devedor é um dos efeitos provocados


pela decretação da falência. Com a arrecadação de bens, o falido não detém a
propriedade de seus bens, porém, perde a disponibilidade e a administração
destes.

Com a arrecadação de bens do devedor, o mesmo não pode sofrer alteração, no tocante
à perda, em sua conjuntura patrimonial existente na data da decretação da falência.

Desse modo, é com a arrecadação de bens do devedor que se constitui a


massa falida objetiva, sendo esta gerida, a partir de então, pelo administra-
dor judicial. Por massa falida objetiva entende-se todo o ativo do devedor,
tudo aquilo que tiver valor econômico, com exceção dos bens absolutamente
impenhoráveis, como, por exemplo, o único imóvel da família, entre outros
estabelecidos por lei.
Já no tocante aos órgãos que representam os interesses e direitos dos
credores, Fazzio Júnior traz em seu Manual de Direito Comercial o seguinte:

A LRE cria dois órgãos representativos de interesses e direitos dos credores:


a assembleia-geral de credores e o Comitê de Credores. Na verdade, esses dois
colegiados se confundem no contexto do diploma legal. Por exemplo, compete
ao Comitê de Credores requerer ao juiz a convocação da assembleia-geral de
credores. Contudo, compete à assembleia-geral de credores a constituição do
Comitê de Credores, a escolha de seus membros e sua substituição. Assim,
a assembleia-geral de credores constitui o Comitê de Credores, e este requer
ao juiz a convocação da assembleia sempre que necessário (FAZZIO JÚNIOR,
2016, p. 664).

Ainda sobre os órgãos representativos dos direitos e interesses dos credores,


o mesmo autor (FAZZIO JÚNIOR, 2016) dispõe que é atribuição do comitê
de credores fiscalizar e examinar as atividades e contas apresentadas pelo
administrador judicial, bem como representar ao juiz caso haja algum fato
que viole o direito ou que traga prejuízo aos interesses dos credores.
14 Efeitos da falência

Já quanto à assembleia-geral de credores, Fazzio Júnior (2016) ensina


que é de sua atribuição toda matéria que afetar, em geral, os interesses dos
credores, especialmente, quanto à deliberação sobre a substituição do admi-
nistrador judicial. Por fim, salienta que todos os direitos processuais das partes
de um processo também são constituídos pelos credores, uma vez que a Lei
de Falências não dispõe especificamente dos direitos dos credores, podendo
assim o Código de Processo Civil ser utilizado subsidiariamente.

BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Consti-
tuição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e
dá outras providências. Brasília: Presidência da República, 1993. Disponível em: http://
www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8666cons.htm. Acesso em: 19 jul. 2020.
BRASIL. Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995. Dispõe sobre o regime de concessão e
permissão da prestação de serviços públicos previsto no art. 175 da Constituição Fe-
deral, e dá outras providências. Brasília: Presidência da República, 1995. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8987compilada.htm. Acesso em: 19 jul. 2020.
BRASIL. Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005. Regula a recuperação judicial, a extrajudicial
e a falência do empresário e da sociedade empresária. Brasília: Presidência da República,
2005. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/
l11101.htm. Acesso em: 19 jul. 2020.
COELHO, F. U. Curso de Direito Comercial. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. v. 3.
FAZZIO JÚNIOR, W. Manual de Direito Comercial. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2016.
NEGRÃO, R. Aspectos objetivos da Lei de Recuperação de Empresas e de Falências. São
Paulo: Saraiva, 2005.

Leituras recomendadas
BRASIL. Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Brasília: Presidência
da República, 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/
l10406.htm. Acesso em: 19 jul. 2020.
BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Brasília: Presidência
da República, 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-
2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em: 19 jul. 2020.
Efeitos da falência 15

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