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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MOÇAMBIQUE

FACULDADE DE DIREITO

DISCENTE:

Leonel Dionísio Jaime

SISTEMA NORTE-AMERICANO

NAMPULA

2024

1
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MOÇAMBIQUE

FACULDADE DE DIREITO

DISCENTE:

Leonel Dionísio Jaime

SISTEMA NORTE-AMERICANO

O presente trabalho é de carácter


avaliativo, da disciplina de Direito
Constitucional, no 2º ano, para apresentar na
Faculdade de Direito ao docente da cadeira.

NAMPULA

2024

2
Índice

Introdução 4

1. O FENÓMENO CONSTITUCIONALISMO 5

1.1. Origem e conceitos 5

1.2. CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA 6

1.3. O SISTEMA CONSTITUCIONAL 8

2. O SISTEMA CONSTITUCIONAL NORTE-AMERICANO 9

2.1. CARACTERÍSTICAS DO CONSTITUCIONALISMO AMERICANO 15

2.2. A Carta Magna americana tem sete artigos, cada um dividido em secções, 16

2.3. Organização político-administrativa da República Federal dos EUA 17

2.4. Poder Executivo 17

2.5. Poder Legislativo 18

2.6. Poder Judicial 19

Conclusão 21

Referência Bibliográfica 22

3
Introdução

O presente trabalho tem como tema sistema norte-americano. O nascimento


efectivo do Constitucionalismo está vinculado às Constituições escritas e rígidas
dos Estados Unidos da América, em 1787, após a Independência das treze Colónias,
e da França, em 1791, a partir da Revolução Francesa. Porém, encontramos o
esboço do Direito Constitucional em período preexistente, a partir de um processo,
ainda não aperfeiçoado, de integração dos componentes território, população e
governo, ou seja, a primeira noção de Estado. O objectivo deste trabalho é
caracterizar o constitucionalismo como um fenómeno político que emanam as
várias famílias constitucionais com o destaque para o constitucionalismo norte-
americano.

Julga-se ser pertinente a compreensão deste trabalho, visto que poderá permitir
a compreensão dos contextos que originaram o constitucionalismo do país em
estudo e ter-se uma noção em volta do modelo constitucional em voga nesse país,
no que tange a sua estrutura, composição assim como o sistema de governo em
vigor.

Para a realização do presente trabalho, recorreu-se a vários artigos publicados


na internet, confrontando-os com alguns livros que abordam sobre o
constitucionalismo americano conforme consta no fim do presente trabalho.

4
1. O FENÓMENO CONSTITUCIONALISMO

1.1. Origem e conceitos

O constitucionalismo é um movimento de carácter político, jurídico, de cunho


liberal e cultural que se desenvolveu desde a Idade Média, quando se deu a
conquista normanda. Na Inglaterra, deu-se pela primeira vez na era da aristocrática e
colonial, propagando-se em planos e práticas patriarcais e imperiais. Suas origens
encontram-se entre 1066 e 1087 na monarquia de Guilherme I, "O Conquistador".
Nesse período, foram postas em vigor novas leis com finalidade de ordenar o reino.
É nesse contexto que surge uma organização política formada por Barões e
membros do Clero. O Grande Conselho - como era denominada a organização - era
convocado periodicamente para deliberar acerca de questões governamentais.

Na França, o Constitucionalismo surgiu a partir das teorias iluministas e do


pensamento político que serve de base à Revolução Francesa de 1789,
desenvolvendo-se entre os finais do século XVIII e o término da Primeira Guerra
Mundial, tendo por objectivo o estabelecimento de Estado de direito baseado em
regimes constitucionais, isto é, fundados numa Constituição Democrática, que
delimita claramente a actuação do Poder Público, mediante a separação dos
poderes, e assegura ampla protecção aos direitos dos cidadãos, impondo o
exercício, no plano político, do chamado governo das leis e não o governo dos
homens.

De acordo com Carvalho (2005, p. 38), constitucionalismo é concebido como


um movimento jurídico de criação de um sistema normativo, uma Constituição, que
se encontra acima do Poder; e pelo movimento social que deu sustentação às novas
técnicas de limitação de Poder.1

1
CARVALHO, Kildare Gonsalves. Direito Constitucional. 15ed. Belo Horizonte: del rey, 2009. Pag. 38.

5
No entender de Canotilho (1997, p. 51), constitucionalismo é a teoria
(ideologia) que ergue o princípio do governo limitado indispensável à garantia dos
direitos em dimensão estruturante da organização política, social de uma
comunidade. Ele busca, pois, uma compreensão de conteúdo político e axiológico
ligado a normatividade que rege uma sociedade.2

Destes conceitos, pode perceber-se que o constitucionalismo, em uma


primeira acepção, é identificado com o movimento político-social que pretendia
limitar o poder arbitrário. Em uma segunda acepção, com a imposição de que
houvessem cartas constitucionais escritas. Assim, concluiu-se que
Constitucionalismo significa um ideal de Constituição; significa a vontade do povo
ser regido por uma norma fundamental que consagre em seu seio todos os anseios,
todas as aspirações, sejam políticas, ideológicas, valorativas, prevalecentes em um
dado momento histórico.

1.2. CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA

A criação da nação americana como nação republicana pautada por


princípios de liberdades, justiça, paz, bem-estar, desenvolvimento económico e
felicidade foi constituída entre os anos de 1776 e 1798. As treze colónias inglesas
na América, reunidas então na Convenção Constitucional, tinham como objectivo dar
ao Estados confederados uma lei que atendesse a seus princípios, propósito e fins,
tivesse um governo central forte, mas que respeitasse os direitos individuais e a
autonomia dos estados. Tarefa teoricamente difícil.

Muita discussão surgiu para elaborar uma Constituição que atendesse aos
anseios do povo americano. Muitas dúvidas pairavam sobre a forma republicana a
ser assumida pela União dos Estados Confederados. Como ter um governo central
forte sem o risco da tirania? Como respeitar as liberdades de cada Estado da

2
CANOTILHO, Jose Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Terioria da Constituicao. 4 ed. Coimbra
: Almedina, 1997. Pg. 51.

6
Federação e a participação do povo nas decisões?

A discussão em torno destas questões ocupou boa parte das discussões na


convenção, saber qual a forma democrática do povo participar? Alguns Países
Fundadores e alguns Estados defendiam a participação directa do povo, a chamada
democracia pura, mas esta também teria o risco de tornar-se uma tirania. Outros
países fundadores defendiam a forma da representação, neste grupo a voz que ecoa
é a de Madison. A democracia representativa foi traduzida no voto distrital. Destaca-
se que não foi uma decisão de consenso pacífico, a questão levou a discussão
quanto a legitimidade dos representantes, em decidir as leis constitucionais.

Outro aspecto a ser observado no constitucionalismo americano é de ordem


procedimental. Quando uma comunidade política quer que seus propósitos e fins
sejam alcançados procura definir formas, procedimentos e arranjos institucionais
para limitar o poder dos que governam a fim de não serem submetidos a uma tirania.
O constitucionalismo procura implementar na sociedade tais arranjos institucionais
e implementar uma concepção de justiça e direito político aos membros de sua
comunidade.

Observa-se que no constitucionalismo americano a característica mais


marcante foi sua aparente dependência dos textos escritos. Estes instrumentos
escritos legalmente ligavam e organizavam a organização do governo e fixava os
princípios e regras da operação do poder governamental. Essa forma foi introduzida,
pode-se dizer pela prática já existente no tempo da coroa inglesa, onde que para as
colónias eram comuns os escritos descrevendo os acordos firmados. Claro que,
para a construção da Constituição, essa forma teve muita evolução, pois se
tornaram mais sistemáticos e completos.

O constitucionalismo americano tratou de assuntos ligados a procedimentos


e organização da nação, mas inovou ao tratar das questões substantivas as
questões políticas. Não se preocupou somente em estabelecer limites ao governo

7
pelo temor a tirania, mas também se preocupou em estabelecer critérios e
elementos para promover a liberdade individual dos cidadãos da sociedade política
que estava se formando.

No aspecto que trata do poder percebe-se que, ao longo da história, o grande


problema não foi em criar o poder, mas sim em defini-lo e limitá-lo. O
constitucionalismo ocidental, segundo Belz, criou dois métodos para este fim. O
primeiro é o que trata da teoria e prática dos arranjos estruturais internos do
governo, de modo que o poder seja distribuído em equilíbrio. O segundo foi o de
sujeitar as acções do governo as limitações legais, ou a regra da lei. Para isto os
escritos constitucionais foram o grande mecanismo utilizado.

1.3. O SISTEMA CONSTITUCIONAL

Duas são as acepções de sistema constitucional admitidas pela doutrina: o


sistema externo ou extrínseco, e o sistema interno ou intrínseco. O sistema
extrínseco refere-se ao trabalho intelectual, cujo resultado forma um conjunto de
conhecimentos logicamente classificados, ou, na lição de Kant, em Crítica da razão
pura: “entendo por sistema a unidade dos diversos conhecimentos debaixo de uma
ideia”. Os requisitos do sistema extrínseco ou externo são de natureza puramente
formal. O sistema intrínseco ou interno cuida do conhecimento do objecto, da sua
sistematização, da sua estruturação jurídica. A Constituição escrita é sistematizada
através de um conjunto de normas referentes às mais diversas matérias e
finalidades buscadas pelo legislador constituinte. Tais normas, autênticas regras
jurídicas, são agrupadas em títulos, capítulos e seções, formando um todo que se
convencionou chamar de elementos constitucionais do Estado.3

3
MIRANDA, Jorge. Manual do Direito Constitucional. 2ed. Coimbra: Coimbra Editora, 1988.

8
2. O SISTEMA CONSTITUCIONAL NORTE-AMERICANO

A primeira Constituição formal, ainda hoje em vigor com algumas emendas, é


a americana, proclamada em 1787, após a independência das treze colónias (15 de
Junho de 1776) e da Declaração de Independência dos Estados Unidos da América
proclamada em 04 de Julho de 1776.
De acordo com Nascimento (2009, p.105), o constitucionalismo norte-americano
iniciou-se em 1620 com a carta política denominada Convenant , ora conhecida
como Pacto de Mayflower, assinada pelos primeiros colonizadores ingleses da
Virgínia. Através desta carta, os povos puritanos, com base na igualdade de todos
os indivíduos, estabeleceram o modo de organização jurídico-política nas colónias
da América do Norte.

A independência norte-americana, verdadeiramente cumpriu com o fim do


absolutismo. Criou-se primeiramente os Estados soberanos, depois, uma
Confederação de Estados e, por fim, o Estado Federal, cujo regimento deu-se pela
Constituição de 1787, marco do Constitucionalismo Moderno que consagra a
organização de governo pelos próprios governados.

Sobre este aspecto, Miranda (1988), lembra-nos que:

“O Direito constitucional norte-americano não começa apenas nesse ano.


Sem esquecer os textos da época colonial (antes de mais, as FundamentalOrders of
Connecticut de 1639), integram-no, desde logo, em nível de princípios e valores ou
de símbolos, a Declaração de Independência, a Declaração de Virgínia e outras
Declarações de Direitos dos primeiros Estados”, (p. 138).4

4
MIRANDA, Jorge. Manual do Direito Constitucional. 2ed. Coimbra: Coimbra Editora, 1988, Pg. 138.

9
A primeira contribuição foi a primeira Constituição escrita (1787), formal,
rígida e dotada de supremacia. É também o primeiro documento formal. Outra
característica é o surgimento do controle difuso de constitucionalidade (decisão
proferida em 1803, no caso Marbury VS. Madison, proferida pelo Presidente da
Suprema Corte, Marshal) – tal decisão foi a primeira a declarar a
inconstitucionalidade de uma lei e estabelecer as bases para o controle de
constitucionalidade. A terceira contribuição é o fortalecimento do Poder Judiciário.
Outra contribuição importante foi a experiência republicana em um país de grande
extensão e população. Criou-se também o federalismo e o presidencialismo. A
última contribuição foi a declaração do estado da Virgínia (Virgina Bill of Rights ), em
1776 – direitos e garantias fundamentais.

Cappelletti (1999), ressalta que muitas das Colónias inglesas da América


eram constituídas como companhias comerciais e regidas por cartas. Conforme o
autor:5
“Estas cartas podem ser consideradas como as primeiras constituições das
Colónias, seja porque eram vinculatórias para a legislação colonial, seja porque
regulavam as estruturas jurídicas fundamentais das próprias Colónias. Então, estas
Constituições amiúde expressamente dispunham que as Colónias podiam,
certamente, aprovar suas próprias leis, mas sob a condição de que essas leis
fossem razoáveis, e, como quer que seja, não contrárias às leis do Reino da
Inglaterra e, por conseguinte, evidentemente, não contrárias à vontade suprema do
Parlamento Inglês [...]”, (p. 61).

Pode-se dizer então que, nos Estados Unidos houve um poder constituinte
originário que produziu em 1787, um texto codificado, rígido e sintético com
aspectos essencialmente princípios lógicos e inicialmente políticos, incorporando a
declaração de direitos individuais fundamentais.

5
CAPPELETTI, Mauro. O Controlo Judicional de Constitucionalidade das Leis no Direito Comparado.
Tradução de Aroldo Clinio Gonsalves. 2ed. Porto Alegre: Sergio Antonio, Fabris Editora, 1999, Pg. 61.

10
Conforme Canotilho (1997, p. 70), no ordenamento político norte-americano
adquire centralidade política a ideia de um poder constituinte. A conhecida fórmula
preambular “we the people” indicia com clareza uma dimensão básica do poder
constituinte criar uma Constituição.6

As transformações na Constituição norte-americana ocorrem principalmente


através das suas mutações interpretativas, decorrentes da transformação dos
valores de uma sociedade em permanente conflito.

Miranda (2002, p. 84) afirma que, a Constituição norte-americana é


“simultaneamente rígida e elástica”. Rígida porque a alteração formal de seu texto é
complexa e diferenciada do processo legislativo de elaboração de uma lei ordinária.
Para alterar o texto ou promover emendas aditivas ou supressivas é necessária a
participação dos Estados membros da federação. Isto explica em parte o número
reduzido de emendas.7

Por outro lado, o motivo da existência de poucas mudanças formais no texto,


prende se ao facto deste texto ser sintético e princípio lógico o que permite
mutações interpretativas ou alterações na compreensão de seu sentido e dos
aspectos conceituais relacionados aos seus princípios, tornando desnecessário o
recurso a mudança do texto. Muda-se a Constituição mudando o seu sentido, a sua
compreensão, sem que seja necessário mudar o texto propriamente dito, daí a razão
de sua elasticidade. (Ibid; p. 84)

Ressalta-se que a mudança interpretativa tem limites impostos pela própria


Constituição. Assim, um texto sintético, com mais princípios que regras, possibilita
maiores mudanças interpretativas, que um texto com excesso de regras. Quanto
mais detalhado o texto, quanto mais regras, quanto maior a especificação, menor o

6
CANOTILHO, Jose Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Terorio da Constituicao. 4ed. Coimbra:
Almedina, 1997, Pg 70.
7
11 CAPPELETTI, Mauro. O controlo judicial de constitucionalidade das leis no direito comparado.
Tradução de Aroldo Plínio Gonçalves. 2ª ed. Porto Alegre: Sérgio António Fabris Editor, 1999. Pg. 61

11
espaço para as mudanças interpretativas.

Assim, a história constitucional norte-americana reforça a ideia de uma


Constituição dinâmica, viva, que se reconstrói diariamente diante da complexidade
das sociedades contemporâneas. Uma Constituição presente em cada momento da
vida. Uma Constituição que é interpretação e não texto. A experiência norte-
americana revela uma nova dimensão da jurisdição constitucional, presente em toda
a manifestação do Direito. É tarefa do agente do Direito, nas suas mais diversas
funções, dizer a Constituição no caso concreto e promover leituras
constitucionalmente adequadas de todas as normas e factos.

O sistema constitucional norte-americano estimula uma diversidade sadia de


políticas públicas adoptadas pelas pessoas nos vários Estados, de acordo com suas
condições, necessidades e desejos. Os Estados e os Governos locais
constantemente devem compreender os sentimentos do povo e governar de acordo
com eles:

 Uma efectiva política pública é frequentemente alcançada quando há


competição entre os vários Estados quando ao desenho de diversas
abordagens das questões; a busca de uma política pública inteligente é
frequentemente favorecida quando os Estados e os Governos locais são
livres para experimentar várias formas de enfrentamento de seus problemas,
em tema de políticas públicas;

 As políticas públicas do Governo federal devem reconhecer a


responsabilidade dos Estados, fomentando oportunidades para eles, bem
como dos Governos locais, associações privadas, vizinhanças, famílias e
indivíduos, no sentido de que se alcancem metas pessoais, sociais,
ambientais e económicas, mediante um esforço cooperativo.

Além desses princípios, a ordem executiva aqui estudada enunciou também


critérios que órgão e entes do Governo federal deveriam seguir, em suas relações
com as unidades federadas e instâncias locais:

 Deve haver uma absoluta aderência aos princípios constitucionais; órgãos e

12
entes deverão examinar criteriosamente as bases constitucionais e legais
que substancializam a acção do Governo federal, no sentido de que se tenha
algum limite para a discricionariedade dos Estados articularem a política
pública estudada, bem como devem também criteriosamente avaliar a
necessidade da acção;

 Órgãos e entes podem limitar a discricionariedade dos Governos estaduais e


locais para a formulação e implemento de uma política pública tão somente
depois de confirmar se há autoridade constitucional e legal para tal acção;

 No que se refere a leis e regulamentos federais cujo cumprimento seja


administrado pelos Governos estaduais e locais, o Governo federal deve
garantir a essas entidades federadas a maior discricionariedade possível.8

A Constituição escrita dos EUA, em mais de dois séculos de existência, é tema


actual de debates. Sua promulgação não foi fruto do acaso, nem fruto de ideais de
alguns poucos iluminados que pensavam obter o poder. Mas traz em seu bojo um
forte sentimento de patriotismo e elementos dos propósitos e fins dos cidadãos
estadunidenses.

Partindo dessa afirmação, passar-se-á a analisar como ocorreu o


desenvolvimento do constitucionalismo dos EUA, adentrando no seu processo
histórico, buscando demonstrar as tensões que existiram na construção da lei
suprema da Confederação dos Estados da América, também, analisar-se-á algumas
das tentativas de interpretar o constitucionalismo americano no decorrer destes
séculos.

Como referido, o processo de construção da Constituição e a interpretação que


se procurou dar em alguns momentos históricos será o objecto de estudo deste
breve trabalho. Para isto busca-se auxílio literário em alguns pensadores
americanos que se dedicaram a interpretar tal processo em suas diferentes fases.

8
TAVARES, André Ramos, Curso de direito constitucional. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

13
Discorrendo desde o uso do significado do termo constituição até seu
significado utilizado no período da Revolução Americana, que culminou na
construção de uma sociedade balizada sobre os princípios de liberdade individual,
bem-estar económico e felicidade da comunidade política.

Várias seriam as possibilidades de se estudar a Constituição Norte-americana.


Antes de optar por uma das formas, precisamos, inicialmente, entender por que
estudar o debate acerca da Constituição de 1787. A constituição de 1787 comporta
um emaranhado de elementos que conduzem ao seu produto final. Neste
emaranhado de elementos, o contexto histórico nos faz tomar consciência do
processo que se desenvolveu para a promulgação da Constituição norte-americana.

Apesar de que, já na antiguidade, se utilizava o termo constituição como forma


de descrever o exercício político de uma cidade-estado9, a ideia de Constituição,
adoptada pelos estadunidenses, é uma invenção do século XVIII. Esta compreensão
Moderna que se quer discorrer é, especificamente, sua permanência no tempo e
espaço e algumas formas de se interpretar o poder originário.

O constitucionalismo moderno trata do Estado em si, sua organização, sua


função, o poder político que comporta, bem como descreve a relação entre
governantes e governados, tendo estreita relação com o tema democracia. Este
tema merece atenção, pois se pode tratar da democracia pura ou parlamentar
representativa.

A democracia moderna tem estreita relação com a democracia representativa10.


No que concerne ao constitucionalismo americano, Madison afirma que os
representantes são indivíduos e não concepção jurídica que representa a totalidade

9
Aristóteles já usará para descrever o corpo político de Atenas. Quando escreveu sua obra A Política.
10
HOBBES. T. Tratado Sobre Representação. Esclarece o sentido do termo representação.

14
como entendia Hobbes11. Segundo Madison, os representantes atuam em nome dos
interesses dos indivíduos de uma parcela definida e limitada, conceito de voto
12
distrital.

Ao analisar o constitucionalismo dos EUA, Herman Belz, (doravante Belz) afirma


que este projeto americano visava em seu princípio estabelecer os propósitos e os
fins da comunidade política que surgia naquele período histórico. Deste modo, Belz
procura abarcar os vários sentidos de interpretação que se atribui a uma
Constituição.

Uma Constituição pode ser entendida como um conjunto de maneiras nas quais
as pessoas estabelecem e limitam o poder que os governa.13 Desse modo tem um
caráter normativo. Belz diz que a Constituição surge para limitar o poder dos que
governam uma comunidade política, pois essa comunidade possui fins e propósitos
os quais são definidos pela comunidade política.

Aristóteles já afirmava que “as pessoas se associam por que visam um bem”6,
ora não seria diferente com a sociedade americana que, naquele momento histórico,
buscava se formar uma nação. E a Constituição escrita representava uma forma, até
mesmo, de antever os acordos que foram firmados e tratava de colocar nos escritos
princípios e objectivos que os levariam a concretizar a luta por uma nação livre e
independente.

Enfim, a comunidade vai elencar na Constituição os princípios e os fins últimos


da vida política, estes podem ter questões da filosofia política e da filosofia moral.
Estas questões que são as definidoras dos princípios e fins de uma comunidade

11
HOBBES. T. Leviatã. Livro II. Do Estado. Traduzido por: Alex Martins. São Paulo: Martin Claret, 2006.
12
HAMILTON, Alexander; JAY, John; MADISON, James. O Federalista. Tradução, introdução e notas
de V. Soromenho-Marques e J. C. S. Duarte. Lisboa: Colibri, 2003.
13
BELZ, Herman. A Living Constitution or Fundamental Law? American Constitutionalism in Historical
Perspective. Lanham et al.: Rowman & Littlefield, 1998. (Introduction and chapter 1)

15
política, serão nos séculos XIX e XX, os grandes eixos de discussão para
interpretação da Constituição dos EUA.

Pois para os que viviam na América e que já sofriam com as amarras da coroa
inglesa não abriam mão da liberdade individual, ao tempo que precisavam da
unidade dos Estados para atender suas necessidades de bem-estar económico e
social e a felicidade da comunidade. Ao pensar desta forma pode-se afirmar que a
proposta do constitucionalismo americano foi liberal, mas nem por isso deixou de
lado o aspecto das regras morais para a convivência dos cidadãos. O que vai definir
se há divisão ou pode haver uma junção será a modo que se construiu a lei
constitucional.

2.1. CARACTERÍSTICAS DO CONSTITUCIONALISMO AMERICANO

O constitucionalismo americano tem duas características fundamentais: a noção


de Constituição e de sua superioridade sobre todos os demais actos da Federação e
dos Estados-membros e a autoridade reconhecida aos tribunais na sua
interpretação e concretização.

O princípio da legalidade, para os americanos, coincide com a supremacia da


Constituição, conforme declarada pelos juízes e tribunais, ao passo que, para os
ingleses, significa a vontade do poder legislativo, expressa nas leis votadas segundo
o princípio da maioria parlamentar.14

2.2. A Carta Magna americana tem sete artigos, cada um dividido em


secções, nomeadamente:

14
AZAMBUJA, Darcy. Teoria Geral do Estado. 1ª ed. Porto Alegre: Globo, 2008.

16
 O artigo I cuida do Poder Legislativo: a secção 2 trata da Câmara dos
Representantes; a secção 3 trata do Senado; secção 8 cuida da competência
do Congresso; a secção 10 traduz-se em vedações aos Estados;

 O artigo II regula o exercício do Poder Executivo;

 O artigo III o Poder Judiciário;

 O artigo IV trata de matérias referentes aos Estados;

 O artigo V disciplina o processo de emendas constitucionais;

 O artigo VI pró-estados da Constituição dos Estados Unidos da América.

A Constituição foi emendada vinte e sete vezes, sendo que as dez primeiras, que
constituem oBill of Rights do direito norte-americano.

As particularidades do constitucionalismo americano foram:

(i) Através da Revolução, os americanos pretenderam reafirmar os direitos


na tradição germânica medieval e da Revolução Gloriosa;

(ii) Por outro lado, para evitar a falta de representação de um parlamento


soberano, evitando a omnipotência do legislador, a Constituição devia
garantir ao povo instrumentos efectivos de representação. Assim, o
constitucionalismo americano afasta-se também do constitucionalismo
francês, uma vez que a Constituição americana, ao invés de terminar em
estado egocêntrico, serviu para constituir uma ordem política informada
pelo princípio do governo limitado. Além disso, no constitucionalismo
norte-americano alia-se um poder judiciário como verdadeiro defensor e
guardião da Constituição, e consequentemente dos direitos e liberdades
dos cidadãos.

2.3. Organização político-administrativa da República Federal dos EUA

17
A Constituição dos Estados Unidos garante aos seus cidadãos americanos sua
liberdade religiosa, a inviolabilidade de seus lares, a manutenção dos seus direitos à
privacidade, à defesa em um processo legal, bem como a um julgamento com júri,
assim como a proibição da utilização de penas torturantes.

Os Estados Unidos da América são uns Estado Federal, isto é, constituídos por
vários estados membros que fazem a união. O sistema do Governo em vigor nestes
Estados é Presidencial. Prima-se nestes Estados pelo princípio de separação de
poderes, onde, administrativamente, a confederação encontra-se organizada da
seguinte maneira:

(i) Poder executivo;

(ii) Poder legislativo formado pelo Senado e Câmara dos representantes;

(iii) Poder judicial; e

(iv) Os Estados confederados.15

2.4. Poder Executivo

O Poder executivo é confiado a um Presidente dos Estados Unidos da América.


Ele exerce as suas funções durante o período de quatro anos, e juntamente com o
Vice-Presidente, eleito pelo mesmo período, é escolhido da seguinte maneira: Cada
Estado indicará, segundo as regras determinadas pela sua respectiva legislatura, um
número de eleitores igual ao número total de Senadores e de Representantes ao
qual o Estado terá direito no Congresso. Mas nenhum Senador ou Representante, ou
pessoa que exerça uma função honorífica ou assalariada sob a autoridade dos
Estados Unidos, poderá ser indicado como eleitor.

Em caso de destituição, de morte, de renúncia ou de incapacidade do Presidente


para desempenhar os poderes e deveres do seu cargo, estes passarão ao Vice-

15
MIRANDA, Jorge. Manual do Direito Constitucional. 2ed. Coimbra: Coimbra Editora, 1988.

18
Presidente, e o Congresso poderá indicar, por uma Lei, em caso de destituição,
morte, renúncia ou incapacidade do Presidente e do Vice-Presidente, qual o
funcionário que exercerá a função de Presidente, e este funcionário preencherá o
cargo até à cessação da incapacidade ou eleição de outro Presidente.

O Presidente é o chefe supremo do exército e da marinha dos Estados Unidos,


assim como da milícia dos diversos Estados, quando estas forem chamadas ao
serviço activo dos Estados Unidos. O Presidente, o Vice-Presidente e todos os
funcionários civis dos Estados Unidos poderão ser destituídos das suas funções por
motivo de acusação, e condenação, por traição, suborno ou outros altos crimes e
delitos.16

2.5. Poder Legislativo

a) Câmara dos Representantes é composta de membros escolhidos em cada


dois anos pelo povo dos diferentes Estados, e os eleitores de cada Estado
devem possuir as qualificações exigidas para os eleitores do corpo mais
numeroso da legislatura do Estado. Não poderá ser um representante
ninguém que não tenha cumprido a idade de 25 anos, e não seja por sete
anos um cidadão dos Estados Unidos, e não esteja, quando eleito, residindo
no Estado pelo qual será escolhido.

b) O Senado é composto de dois Senadores de cada Estado, escolhidos para


um período de seis anos, e cada Senador tem direito a um voto. Os senadores
são divididos em três classes, nomeadamente da 1ª cujos seus assentos
cessam com o término do segundo ano; da 2ª cessam ao expirar do quarto
ano; e as da 3ª onde os seus assentos vagam no fim do sexto ano, de modo
que um terço do Senado seja renovado em cada dois anos; e caso ocorra
vaga por renúncia, ou qualquer outra causa, durante o recesso da legislatura

16
CANOTILHO, Jose Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Terorio da Constituicao. 4ed. Coimbra:
Almedina, 1997

19
de qualquer Estado, o Poder Executivo desse Estado poderá proceder a
nomeações temporárias, até à reunião seguinte da legislatura, a qual então
preencherá a vaga. Não poderá ser um Senador ninguém que não tenha
cumprido a idade de 30 anos, e não seja por nove anos um cidadão dos
Estados Unidos, e não esteja, quando eleito, residindo no Estado pelo qual
será escolhido. As épocas, lugares e modos de realizar eleições para
Senadores e Representantes serão prescritas em cada Estado pela respectiva
legislatura; mas o Congresso pode, em qualquer momento, através de uma
Lei, fazer ou alterar tais regulamentos, excepto quanto aos lugares de eleição
dos senadores.

2.6. Poder Judicial

O poder judiciário dos Estados Unidos é confiado a uma Corte Supremo e a


tantas cortes inferiores quantas o Congresso venha ordenar e estabelecer, de
tempos a tempos. Os juízes, tanto da Corte Suprema como inferiores, conservarão
as suas funções enquanto demonstrarem boa conduta e receberão pelos seus
serviços, em épocas determinadas, uma compensação que não poderá ser
diminuída durante o exercício das suas funções.

O julgamento de todos os crimes, excepto nos casos que atentam à soberania


dos Estados membros, deverá ser feito por júri, e ocorrerão no Estado onde os
referidos crimes tiverem sido cometidos; mas quando não cometidos em território
de nenhum Estado, o julgamento deverá ocorrer no lugar ou lugares que o
Congresso, por uma lei, houver indicado.

20
Deveres dos Estados Federados e dos seus concidadãos

Nenhum Estado poderá empenhar-se em tratados, alianças ou confederações;


conceder cartas de trânsito e represálias; cunhar moeda; emitir papel-moeda; dar
curso legal, em pagamento de dívidas, a outro valor que não ouro e prata; aprovar
qualquer decreto de proscrição, lei ex: post facto , ou lei que prejudique a força dos
contratos, ou conceder títulos de nobreza. Nenhum Estado poderá, sem o
consentimento do Congresso, estabelecer impostos ou direitos sobre importações e
exportações, excepto os que venham a demonstrar-se absolutamente necessários
para executar as suas leis de inspecção; e o produto líquido de todos os direitos e
impostos, exigidos pelo Estado sobre as importações e exportações, será colocado
à disposição do Tesouro dos Estados Unidos; e todas essas leis deverão ser
submetidas à revisão e controlo do Congresso.

Nenhum Estado poderá, sem o consentimento do Congresso, estabelecer


qualquer direito de tonelagem sobre os navios, manter tropas ou navios de guerra
em tempos de paz, concluir tratados ou convenções com outro Estado, ou com uma
potência estrangeira, ou se empenhar numa guerra, a menos em caso de invasão
presente ou de perigo iminente que não admita qualquer atraso.17

Os cidadãos de cada Estado terão direito a todos os privilégios e imunidades


dos cidadãos nos diversos Estados. Toda a pessoa acusada num Estado qualquer
de traição, felonia ou outro crime, e que tenha fugido à justiça e seja encontrada
noutro Estado, será, sob demanda da autoridade executiva do Estado do qual fugiu,
presa e removida para o Estado que tiver jurisdição sobre o crime. Nenhuma pessoa
empenhada num serviço ou trabalho num Estado, sob as leis deste Estado, e que se
refugie num outro Estado, poderá invocar qualquer lei ou regulamento do Estado sob
o qual se refugiou para se subtrair àquele serviço ou trabalho, mas deverá ser
entregue a pedido da parte à qual tal serviço ou trabalho possa ser devido.

17
ARTOLA, Miguel. Constitucionalismo en la historia. Barcelona: Crítica, 2005.

21
Conclusão

Ressalta-se que O constitucionalismo americano, nasceu calcado em ideais


de liberdade e igualdade, apostando na concepção atómica de indivíduo – conforme
faziam os iluministas - auxiliou na manutenção da desigualdade racial; nasce ainda
sob influência da teoria de Estado defendido por Montesquieu, foi decidido pela
organização de um poder legislativo - competência de um Congresso bicameral
formado pela United States Senate e United States House of Representatives - um
poder executivo - exercido pelo Presidente - e um Poder legislativo - desempenhado
pela Suprema Corte e outras cortes federais.

A nova organização - que consistia em uma "descentralização vertical do


poder"- assegurava a autonomia das Estados para legislar e organizar-se da melhor
forma possível de acordo com disposições próprias, convivendo harmoniosamente
com o poder federal, mas podendo intervir na União - se preciso fosse. Nesse
sistema federalista dual, no qual a esfera estadual e a federal têm competências
distintas e coexistentes, todo cidadão americano estava sujeito a duas estruturas de
poder, uma de sobreposição - tendo em vista que estavam sujeitos
simultaneamente a dois poderes políticos e dois ordenamentos constitucionais, o
federal e o estadual - e uma de participação - uma vez que o poder político central
era resultado da associação de poderes políticos dos Estados federados.

22
Referência Bibliográfica

Aristóteles já usará para descrever o corpo político de Atenas. Quando escreveu sua
obra A Política;

ARTOLA, Miguel. Constitucionalismo en la historia. Barcelona: Crítica, 2005;

AZAMBUJA, Darcy. Teoria Geral do Estado. 1ª ed. Porto Alegre: Globo, 2008;

BELZ, Herman. A Living Constitution or Fundamental Law? American


Constitutionalism in Historical Perspective. Lanham et al.: Rowman & Littlefield,
1998. (Introduction and chapter 1);

CAPPELETTI, Mauro. O controlo judicial de constitucionalidade das leis no direito


comparado. Tradução de Aroldo Plínio Gonçalves. 2ª ed. Porto Alegre: Sérgio
António Fabris Editor, 1999;

CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição.


4ª ed. Coimbra: Almedina, 1997. CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito
constitucional. 15ª ed. Belo Horizonte: del rey, 2009;

MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional. 2ª ed. Coimbra: Coimbra Editora,


1988;

TAVARES, André Ramos, Curso de direito constitucional. 8ª ed. São Paulo: Saraiva,
2010;

HAMILTON, Alexander; JAY, John; MADISON, James. O Federalista. Tradução,


introdução e notas de V. Soromenho-Marques e J. C. S. Duarte. Lisboa: Colibri, 2003;

HOBBES. T. Tratado Sobre Representação. Esclarece o sentido do termo


representação;

HOBBES. T. Leviatã. Livro II. Do Estado. Traduzido por: Alex Martins. São Paulo:
Martin Claret, 2006.

23

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