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INTRODUÇÃO

DO TERCEIRO MUNDO
AOS TERCEIROS MUNDOS:
AS ATRIBULAÇOES DE UM CONCEITO

I.O SURGIMENTO DE UM CONCEITO


A expressão Terceiro Mundo apareceu sob a pluma do demógrafo
A.Sauvy,que escrevia em 1952: «O conjunto daqueles a que chama-mos,em
estilo das Nações Unidas, os países subdesenvolvidos, este Terceiro Mundo
ignorado, explorado, desprezado, como o Terceiro Estado, também ele quer ser
alguma coisa» [26].
Mas se a palavra data de 1952, o conceito nasceu muito antes, no pós-
guerra, e concretizou-se desde 1949 quando o Presidente Truman anuncia o
seu plano de ajuda aos «países subdesenvolvidos». A ex-pressão é retomada
pela ONU que, no mesmo ano, desenvolve um programa de assistência a estes
mesmos países.
O «jogo de palavras» de Alfred Sauvy [26] fez sucesso nos anos
1960.Segundo Y. Lacoste, estabeleceu-se uma espécie de consenso para
reconhecer a estes países um certo número de caracteres comuns:
«Insuficiência alimentar, analfabetismo, doenças de massa,mortalidade
infantil, recursos negligenciados, mesmo até desperdi-çados, forte
proporção de agricultores com baixa produtividade, fra-ca proporção de
citadinos, fraqueza importante das classes médias,industrialização restrita
ou incompleta, hipertrofia ou parasitismo do sector terciário, fraqueza do
produto nacional por habitante, am-plitude do desemprego e do
subemprego, trabalho infantil, situação de subordinação económica,
desigualdades sociais muito violentas,estruturas tradicionais
desarticuladas, amplitude do crescimento demográfico, (...) tomada de
consciência da miséria» [25].

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II. A EVOLUÇÃO DO CONCEITO
Contudo, ainda que, num primeiro tempo, o conceito seja geral.menos
marcada. A OCDE cria, em 1957, a expressão mais optimista plesmente de
«países em desenvolvimento» [26].
Mundo unificado pela sua pobreza, pela sua dependência do Ocidente em
1955, e em seguida em Belgrado, em 1961, os países do Terceiro zando o
«não envolvimento»,chamado pouco depois o «não alinha-económica com
justa partilha das riquezas nacionais e a paz» [33].A vaga de independência
dos países africanos, no início dos anos 1960,reafirma esta ideia.
Todavia, a partir dos anos 1950, certos factos mostram que a frente do
Terceiro Mundo é menos unida do que parece. Além das relações que os
Estados da América Latina mantêm, de bom ou mau grado,com os Estados
Unidos, constata-se que desde 1952, a Turquia adere à OTAN e que, em
1954, a Tailândia, as Filipinas e o Paquistão en-tram na OTASE (Organização
do Sudeste Asiático). Pelo contrário,a China, a Coreia do Norte, o Vietname,
Cuba,etc., tendem para Leste.Os outros, como a Índia (mas que concluiu
acordos com a URSS) e a Jugoslávia, querem persistir num verdadeiro não
alinhamento.É assim que em 1979 se confrontam, em Havana, Castro, pró-
soviético,e Tito, verdadeiro não alinhado [33].
Ph.Moreau Defarges nota que «no momento da descolonização (anos
50 e 60) e depois do frente-a-frente Norte-Sul (...), o Norte e o Sul não
“podem ser vistos como blocos bem distintos”(...). Estas oposições
maniqueístas cristalizam-se em torno de um desafio -se uma vez a questão,
senão resolvida, pelo menos ultrapassada» [35].
como sair do subdesenvolvimento. Alguns copiam o modelo soviético na
industrialização e na colectivização. Outros optam por um desen-tura para o
mercado mundial e no apelo aos capitais exteriores. Ou-
tros, enfim, posicionam-se entre estes dois modelos rígidos, com mais
ou menos planificação, socialização e abertura.
Enfim, depressa se constata que as divergências de interesses de diversos países
do Terceiro Mundo se traduzem nos factos. Combates opõem por três vezes a Índia
e o Paquistão, entre 1947 e 1971.A Índia luta com a China em 1959-1960 e 1962.
Marrocos e Argélia confrontam-se directa ou indirectamente a propósito do antigo
Sara espanhol. Mesmo os Estados comunistas se dilaceram mutuamente,como a
Índia e o Vietname em 1979. Mais recentemente Irão e Iraque lançam-se, durante
nove anos, numa guerra atroz.
Os dois choques petrolíferos de 1973-1974 e 1979-1980 revelam um corte
profundo entre os países produtores de petróleo, que enri-quecem, e os outros que
vêem a sua factura petrolífera disparar de uma forma dramática. A subida em
potência, desde os anos 1960, dos quatro dragões do Sudeste asiático mostra
igualmente que alguns dos países do Terceiro Mundo, submetidos aos mesmos
condicio-nalismos mundiais que outros, com a agravante de não terem recursos
naturais, são capazes de sair rapidamente do subdesenvolvimento e de virem criar
dificuldades aos países desenvolvidos no seu próprio terreno. Coloca-se pois a
questão da unidade do Terceiro Mundo.

III. UNIDADE OU DIVERSIDADE DO TERCEIRO MUNDO?


No final dos anos 1970, começa-se a tomar consciência da diversi-dade do
Terceiro Mundo, sem no entanto contestar a validade do con-ceito... por exemplo,
emprega-se com muita frequência o termo «de-senvolvimento desigual» que, na
verdade, é geralmente empregue para opor o Norte e o Sul subdesenvolvido, mas
que também pode sê-lo para sublinhar as desigualdades de desenvolvimento no
interior do Terceiro Mundo.
Em 1978,o Banco Mundial classifica os 120 países que constitu-em então o
Terceiro Mundo em três categorias. A primeira apenas comporta sete, qualificados
de «países petrolíferos de capital excedentário», quer dizer, de escassa população
mas de forte produ-ção petrolífera, como o Koweit, os Emirados Árabes Unidos, etc.
Sub-desenvolvidos sob determinados aspectos, mas com um PNB de 2500a 15
000$, estima-se que eles possuem os meios para recuperarem o seu atraso,
investindo no estrangeiro.

INTRODUÇÃO-15

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de rendimento médio» (entre 400 e 2500$), compreende ao mesmo gões
asiáticos) e países exportadores de petróleo, mas com populaçāo todos uma
infra-estrutura industrial não negligenciável e em rápido tima o Banco Mundial,
esperar deles um certo desenvolvimento, não obstante um rápido crescimento
demográfico.
volvimento de baixo rendimento» (menos de 400$). Por razōes diver-sas, e
ainda que por vezes exportadores de petróleo como a Nigéria e a Indonésia,
ainda não conseguiram sair da pobreza. Os últimos 25da lista vão ser
qualificados pela ONU de «Países Menos Avançados».Estes PMA, pobres entre
os pobres, dispõem assim de menos de 200$por habitante, a sua indústria pesa
menos de 10% do PNB e a sua taxa de alfabetização é inferior a 20%.
O contrachoque petrolífero dos anos 1980 e a quebra do preço do dólar,
que amputam em 60% os rendimentos dos países petrolíferos,modificaram a
situação, sem a transformarem completamente. No-vas classificações foram
produzidas, mas as diferenças continuam a ser consideráveis, ainda que se
tenham reduzido um pouco. A ques-tão coloca-se pois então em relação à
validade do conceito de Terceiro Mundo.

IV. A MORTE DO CONCEITO


DE TERCEIRO MUNDO?

Esquematizando muito, três concepções se confrontam. Os ter-ceiro-


mundistas continuam a crer que existe um corte fundamental entre países ricos
dominantes e países pobres dominados. Segundo eles, é o domínio económico
e político do Norte desenvolvido sobre o Sul subdesenvolvido que, no essencial,
provocou (pelo colonialismo)e continua a provocar (pelo neocolonialismo e pela
deterioração dos termos de troca) o subdesenvolvimento do Sul, este com a
colabora-ção mais ou menos consciente dos poderes instalados nos países sub-
enriquecem às custas de uma periferia (o Sul) que empobrece,com a
cumplicidade dos oportunistas do Sul.

INTRODUÇAO-17
Em posição intermédia, outros admitem que o Terceiro Mundo nāo é tāo
unitário como se disse, mas que ele mantém determinados caracteres de unidade.
É a posição de Y. Lacoste que, depois de ter admitido a «muito grande diversidade
do Terceiro Mundo», escreve:«A gravidade dos conflitos no seio do Terceiro Mundo
(...) aniquila uma determinada concepção da sua unidade (...). O que desmorona
éapenas (e já é muito) a crença na unidade política do Terceiro Mundo;o que
desaparece é a ideia de que existe uma solidariedade funda-mental,natural entre
os numerosos Estados cujas populações sofre-ram o domínio colonial e continuam
a sofrer as suas sequelas (...).Mas não creio que por esse motivo se deva considerar
que o Terceiro Mundo não passa de um mito a atirar para os “caixotes do lixo da
História” (...). Hoje a situação em que se encontram os povos do Ter-ceiro Mundo
pode ser definida pela acentuação da distorção entre um muito rápido crescimento
das necessidades e o crescimento dos meios e dos recursos de que as populações
dispõem efectivamente para as satisfazer» [22].
Em Fevereiro de 1989, o jornal Le Monde publica um «cadernos e
documentos» intitulado «os Terceiros Mundos». No editorial pode ler--se: «Mais de
três decénios de tentativas, de esperanças e de fracassos transformaram a visão
monolítica de um Terceiro Mundo cujo sub-desenvolvimento constituiria o elo
profundo. Há sem dúvida hoje mais diferença entre o Brasil e o Mali do que entre a
Coreia do Sul e o Japão.» Mas o jornal prossegue: «Desigualmente repartidos, os
pro-gressos, mesmo até a real descolagem de alguns, nada retira contudo ao
conceito (...). São ainda quatrocentos milhões de seres humanos condenados à
sobrevivência num mosaico de Estados. A diversidade das evoluções merece
simplesmente um plural, para melhor compreen-der e talvez combater as
desvantagens maiores.»
Os antiterceiro-mundistas, quanto a eles, consideram que exis-tem não apenas
vários Terceiros Mundos, mas que o conceito em si jánão tem realmente
pertinência, ou pelo menos utilidade nos dias de hoje. Pensam igualmente que as
explicações através de factores es-sencialmente exógenos (colonialismo,
neocolonialismo, degradação dos termos de troca) são insuficientes. Na sua
perspectiva, intervêm tam-bém, e talvez sobretudo, factores endógenos, tais como:
«instabili-dade e imperfeição dos regimes políticos, corrupção dos
dirigentes,rigidez das estruturas sociais, inadaptação aos programas de desen-
volvimento» [9].
Em 1989, por exemplo, aparece sob a direcção de S. Brunel uma obra intitulada
«Terceiros Mundos» (no plural), com um subtítulo
mero de argumentos dos terceiro-mundistas [7]. No «O Estado do ceiro Mundo
tal como ele é), ressalta uma imagem muito contrastada modidade mas que é
plural e que comporta de facto hierarquias» [25].mundiais (...) torna pois
definitivamente obsoleta a noção de Terceiro relatório Ramsés de 1989, escreve
«que o Terceiro Mundo já nāo é o que era» e que a própria terminologia «se
revela desusada».
Determinados intelectuais do Terceiro Mundo abrandam eles pró-prios o
passo. D. Etounga-Manguelle, quadro camaronês (de um ga-binete americano,
é certo...) escreve: «A causa única (do desencontro entre democracia e
desenvolvimento em África), a que está na ori-gem de todos os desvios, é a
cultura africana, caracterizada pela sua auto-suficiência, pela sua passividade,
pela sua falta de ardor em ir ao encontro das outras culturas, antes de estas se
lhe imporem.»Segundo este mesmo autor «o bloqueio cultural essencial (é
consti-tuído por) a incompatibilidade entre a cultura africana e os objecti-vos
que se fixam os dirigentes do continente negro» (Le Monde 10.11.91).
Nos factos o Banco Mundial mostra, através das suas classifica-ções
estatísticas, que é cada vez mais difícil distinguir os países do Terceiro Mundo
dos outros. Constata-se que, nos países de baixo ren-dimento, não há apenas
Estados considerados tradicionalmente como sendo do Terceiro Mundo; com
efeito, cinco Repúblicas da ex-URSS encontram-se aí (quatro da Ásia Central e a
Geórgia), mais a Albânia.No que o Banco Mundial chama «a fatia inferior dos
rendimentos intermédios», figuram países da Europa considerados até aqui
como desenvolvidos (Roménia, Polónia, Bulgária,
Macedónia,Eslováquia,Croácia,todas as Repúblicas da ex-URSS, incluindo a
própria Rússia,encontram-se doravante nesta categoria). Na fatia superior
destes rendimentos intermédios, misturam-se países do Terceiro Mundo (12)e
Estados europeus (Hungria, Eslovénia, República Checa, Grécia).Entre os países
de rendimento elevado aparecem não somente dois pequenos países
produtores de petróleo (Emirados, Koweit), mas tam-bém Singapura,Hong-
Kong, Israel.
Enfim, durante as negociações do GATT, os países do Terceiro resses são
com frequência divergentes. Alguns deles, como o Brasil,

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agrícolas ocidentais. Além disso, uma áspera luta é travada entre for-necedores
de produtos tropicais, asiáticos e africanos. Enfim,são de produção que lhe
permitiriam manter o preço do petróleo.
É, portanto, antes de mais esta diversidade do Terceiro Mundo que iremos
analisar, antes de mostrar que não se trata de uma frag-mentação total, mas
que existem quatro Terceiros Mundos cujo espaço e tempo contribuíram para
definir os contornos.

INTRODUÇAO-19
PRIMEIRA PARTE

UM TERCEIRO MUNDO
FRAGMENTADO
1
A DIVERSIDADE DOS TERRITÓRIOS
E DAS POPULAÇOES

Dos 136 milhões de km2 que o conjunto dos continentes totaliza (excluindo o
Antárctico), o Terceiro Mundo ocupa 98 milhões, ou seja 72%. Esta imensidade indica, por si
só, que não se está a lidar, evi-dentemente, nem com um território, nem com uma
população homo-géneas.

I. A DIVERSIDADE DOS ESPAÇOS


Antes de acusar as sociedades (ocidentais ou locais) de serem a causa da existência do
subdesenvolvimento, admitiu-se durante muito tempo mais ou menos implicitamente que
o Terceiro Mundo coinci-dia com os territórios desfavorecidos pela natureza, que havia uma
espécie de maldição que se abatia sobre as terras demasiado quentes,demasiado húmidas
ou demasiado secas, muito pouco férteis ou de-masiado mal dotadas. Esta ideia não pode
ser afastada a priori, de resto ela continua a pairar no inconsciente colectivo e a aparecer
em certos manuais. Não será pois inútil voltar a ela.

A) CLIMAS MALDITOS?
Verificou-se desde há muito que o Terceiro Mundo coincide, pelo menos
aproximativamente, com o conjunto das terras equatoriais,tropicais e áridas. E é verdade
que ele inclui a imensa maioria dos espaços equatoriais e tropicais, embora estes
transbordem para o

A DIVERSIDADE DOS TERRITÓRIOS E DAS POPULAÇOES -23


Também é verdade que a grande diagonal árida, que rasga a
Afric e a n do, por exemplo a América Latina (Nordeste
brasileiro Magalhāes), em África (Calahari) e na Ásia
(deserto de Gobi).
esquemática! Antes de mais, o Terceiro Mundo está longe de ser do.eles o Sul
da América Latina (Sul do Brasil, Uruguai, uma parte do quia, o Norte da China e
da Coreia do Norte, que gozam de climas mais ou menos temperados.
relevos montanhosos que temperam as condições destes. O arco mon-tanhoso
que vai das Serras Madre mexicanas aos Andes meridionais proporciona a estas
regiões climas muito mais temperados do que o Oriental (e mais localmente da
África Ocidental e de Madagáscar),do Médio Oriente (Turquia, Irão), da Ásia
Central (Afeganistão, Norte da Índia, Nepal, Tibete), bem como dos arcos
montanhosos que se prolongam pelas penínsulas birmânica, malaia e
indochinesa,bem como pela Indonésia e pelas Filipinas. Não deixamos de ficar
sur-preendidos quando, depois de se ter deixado as praias sobreaquecidas do
Bali, nos encontramos a cerca de 1000 metros de altitude envoltos num
nevoeiro húmido e frio...
No sentido contrário, os espaços desérticos, semidesérticos e tro-picais
húmidos transbordam para países desenvolvidos, tanto na América
(semideserto do Sudeste dos Estados Unidos) como na Aus-trália. Poder-se-ia
no entanto argumentar facilmente aqui que, liga-dos a países desenvolvidos,
estes espaços podem beneficiar dos inves-timentos humanos e financeiros da
sua parte temperada. Não deixa de ser verdade que o problema se coloca. Os
condicionalismos do clima são um dos factores para o subdesenvolvimento?

Y. Trotignon, no «Os países em desenvolvimento perante o sé-são, com mais

frequêcia ainda, responsáveis pelo subdesenvolvimento.que os orlam (...). A

irregularidade do clima é porventura ainda mais e e ma dade constante

mergulha o homem num banho de humidade;

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ças debilitantes, tais como o paludismo. Multiplicam os parasitas,os
Seria dificil negar cabalmente as limitações provocadas por al-dade ser vencida
pela irrigação, mas a que custos? A Arábia Saudita faz nascer trigo em pleno
deserto, mas a preços de custo seis vezes mais elevados do que a média mundial.
Os desertos dos países desen-volvidos são eles próprios pouco povoados: pode-se
andar durante centenas de quilómetros no Arizona e no Novo México encontrando
pouco mais do que algumas bombas de gasolina... Mais controversa éa ideia de que
um calor muito forte baixa a produtividade humana.Segundo Y.Trotignon, se se der
à produtividade humana «o índice 100 a 22°, (esta produtividade) não está senão a
68 a 32°e 22 a 40°»[33]. Em suma, diminuiria três quartos entre 22 e 40°. Mesmo
que esta afirmação esteja sujeita a caução, não se pode ainda assim pôr
completamente de parte esta ideia.
Contudo, P. Gourou adverte para uma certa espécie de «deter-minismo físico»
frequentemente inconfessado. Ele afirma, por exemplo, que se os climas tropicais
são considerados insalubres, não é porque estes climas sejam mais insalubres do
que outros, mas antes porque a investigação sobre as doenças tropicais está
atrasada (por-que começou mais tarde) e porque faltam meios técnicos e financei-
ros para aplicar os resultados destas pesquisas nas populações locais.Quando estes
meios são postos em acção, doenças consideradas tropi-cais puderam ser
completamente erradicadas em certos países. Por exemplo, o paludismo já não
existe em Guadalupe e na Martinica,enquanto flagela o Taiti [19]. Mesmo na
Europa, o paludismo reinou em certas planícies pantanosas mediterrâneas até aos
anos 50.
Verificar-se-á igualmente que, se o calor pode ser uma desvanta-gem, é
também um enorme trunfo para a agricultura quando éconjugada com a água, quer
seja através da irrigação nas regiōes desérticas ou graças às chuvas nas regiões
tropicais e equatoriais.Com efeito, com o calor, a estação vegetativa prolonga-se e o
cresci-mento das plantas torna-se mais regular e mais rápido, permitindo culturas
temporãs ou fora de estação. O leque de produções alarga--se: nas baixas altitudes,
as espécies vegetais são seis a sete vezes mais numerosas do que nas médias
altitudes.
Enfim, importa sublinhar que os climas são muito variáveis com matizes infinitos
quando vistos em pormenor. Nas zonas áridas, por exemplo, deve-se distinguir
entre aridez verdadeira, que impede qual-

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quer actividade agrícola sem irrigação, e todas as cambiantes da menos
intensiva de culturas. Sabe-se também que certos desertos,tornaram faixas
animadas de uma intensa vida agrícola. Por outro lado,a definição das zonas
climáticas, quer sejam áridas, tropicais ou equatoriais, são modificadas por
perturbações devidas aos continentes (relevo,exposição, continentalidade),
bem como aos fluxos atmosfé-ricos e marinhos (oposição entre fachadas
ocidentais e orientais dos continentes) [15].
Finalmente, para além de uma certa aparência de uniformidade,o que
surpreende, pelo contrário, é a variedade dos climas do Terceiro Mundo. Se
se acrescentar aos climas equatoriais, tropicais e áridos,os climas temperados
existentes no Terceiro Mundo, não se contam,segundo G.Viers, menos de 23
tipos de climas indo do «norueguês» da Patagónia ao sariano, passando pelo
guineense, cantonês, etc. Com-preende-se nestas condições que as limitações
climatéricas estão longe de serem uniformes no conjunto do Terceiro Mundo.
O mesmo se poderá dizer em relação aos solos.

B) SOLOS INFÉRTEIS?
«O solo é frequentemente muito pobre. Nos países intertropicais a
laterite apresenta o aspecto, a cor... e a fertilidade do tijolo. Ela resulta em
geral do abuso dos fogos do mato que desguarneceram a terra da sua
cobertura vegetal protectora. Muitos outros solos são por natureza inférteis»,
escreve Y. Trotignon que exprime, uma vez mais a opinião habitual [33]. Como
para os climas, o diagnóstico émuito mais matizado.
Os solos desérticos não evoluídos ou pouco evoluídos não têm ou têm
pouco húmus; a subida da água prevalece sobre a percolação e favorece a
formação de crostas superficiais ou profundas. Os solos são evidentemente
inférteis. Pelo contrário, se a água doce é abun-dante (caso dos rios ou dos
ribeiros exógenos ou das nascentes), en-contramos solos moderadamente
férteis, os «tirs». A existência dos oásis prova que os desertos não são
forçosamente inférteis. Assim que a aridez se atenua, a vegetação adensa-se
e «dado que a biomassa é cinco a dez vezes mais abundante, o húmus é
menos raro e a crosta penetra em profundidade, daí ainda solos brunos de
estepe mas tam-bém solos castanhos de húmus suave em que a crosta está
profunda-mente enterrada»[15].

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cres. Nas regioes mais húmidas (clima equatorial ou tropical húmido),mas
rapidamente mineralizada por agentes muito activos que a de-lado,a água tépida e
abundante provoca uma rápida alteração dos terrânea. «Sob o solo vegetal, uma
grossa camada de alterite, com rochosas em decomposição, acolchoa a rocha» [15].
Os solos que com-portam espessas camadas de argila são, no entanto, cultiváveis e
sobretudo passíveis de melhoramento, na condição de serem prote-gidos por
vegetação em quantidade suficiente.
Conviria, aliás, distinguir, entre estes solos tropicais, os solos ferralíticos, os mais
pobres e os mais frágeis, formados debaixo da floresta densa, dos solos
ferruginosos formados debaixo da floresta seca, geralmente mais ricos porque a
lixiviação é menos intensa e outros tipos de solos devidos a condições locais
particulares: «solos cinzentos de mangue, solos pretos das terras baixas, solos
brunos das vertentes, todos eles melhores do que os precedentes» [15]. Muita
diversidade portanto, muito mais do que habitualmente se diz.
Nas regiões menos húmidas, em que se opõem fortemente uma estação húmida
e uma estação seca mais ou menos longa, e que correspondem, simplificando, à
zona das savanas, os solos são menos espessos do que os solos florestais e retêm
pior a água. São pois geral-mente pobres, mas não estéreis, como se afirma por
vezes, confun-dindo laterite (ou alterite) e couraça laterítica, a que tem o aspecto, a
cor e a fertilidade do tijolo. Os solos de couraça apenas se desenvol-vem em
condições locais particulares, que estão longe de se encontra-rem por todo o lado.
Segundo P. Gourou, na Africa tropical, apenas 1 a 2% dos solos são estéreis. Os
outros solos ou são férteis (1 a 2%),ou pobres, mas suficientemente móveis para
serem cultivados. «Desde que os solos sejam móveis, são cultiváveis» [18].
Acrescentemos que, ao lado destes solos muito esquematicamente zonais, a
topografia, a natureza da rocha-mãe, os contributos exterio-res criam localmente
uma infinita variedade de solos tropicais, sendo alguns deles muito férteis: regur
indiano, terra roxa brasileira,solos mediterrânicos, os solos de loesse ou brunos da
China do Norte, etc.capacidades técnicas, financeiras, culturais das sociedades que
culti-vam estes solos e pela antiguidade da valorização destes.

A DIVERSIDADE DOS TERRITÓRIOS E DAS POPULAÇOES - 27


Segundo P. Gourou, o mundo tropicalpluviosoapenas cultiva 4 000 000 k
㎡2, ou seja 11% da sua superficie.Como«a maior parte os se ia cultivar pelo
menos tres vees ms se ua ate e e esta, em condicoes naturais
aproximadamente a e er a e enero humano a mais vasta reserva de terras
cultivave e e emn gerar civilizaçoes densas e sas(...)se lhes forem aplicadas
boas ceiro Mundo detém igualmente, no seu subsolo,potencialidades
im.portantes, mas bastante mal distribuídas.

C)DESIGUALDADE DOS RECURSOS ENERGÉTICOS E MINERAIS


Os recursos energéticos e minerais estão repartidos de forma muito
desigual pelos países do Terceiro Mundo. Alguns dispõem de recur-sos
consideráveis, outros estão quase privados deles. Tomemos ape-nas alguns
exemplos, dado que teremos oportunidade de voltar ao assunto mais
adiante.
0 mais conhecido é o do petróleo. Nos 140 mil milhões de tonela-das de
reservas reconhecidas no mundo, dois terços são detidos pelo Médio
Oriente, dentre os quais mais de metade por quatro países (Arábia Saudita,
Iraque,Emirados Árabes Unidos, Koweit) e um quarto unicamente pela
Arábia Saudita. Dois Estados da América Latina (México e Venezuela)
dispõem de cerca de 10% das reservas mundiais. Se acrescentarmos a estes
seis países, três outros que dis-pōem de 2 ou 3 mil milhões de toneladas de
reservas (China, Líbia,cerca de trinta países do Terceiro Mundo possuem
petróleo. A África Médio Oriente) menos de 5%. Para a grande maioria do
Terceiro
O gás natural está um pouco mais bem repartido. Cerca de
vinte

(Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos,Qatar,Argélia,México,

Venezuela, Nigéria, Indonésia) 70%.. Quer dizer que,

outros, a porção é côngrua ou nula.

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As reservas de minério de ferro do Terceiro Mundo sāo detidas medida, pela
Venezuela, Chile, Libéria e pela Mauritânia. O mesmo Brasil,Índia, China,
Suriname e pela Guiana, com o cobre pelo estanho pelo Brasil, China,
Indonésia, Bolívia, Zaire, etc.
Como se terá verificado, tirando o Médio Oriente para o petróleo,surgem com
muita frequência os mesmos nomes: China,Índia,vastos Estados com recursos
variados, enquanto outros nunca apare-cem.
Mas,sabemo-lo bem, não se pode falar propriamente de recursos,de condicionalismos
naturais no absoluto. Condicionalismos e recur-sos são relativos às sociedades que deles
dispõem e elas dependem em grande parte dos meios de acção e de informação, bem
como das re-presentações dessas mesmas sociedades. A utilização dos recursos depende
pois, em parte, da dimensão e da população dos Estados que deles dispõem. Ora estas são
de uma extraordinária variedade.

II.A DIVERSIDADE DEMOGRÁFICA


A) ESTADOS ANOES E ESTADOS GIGANTES

1.UM PUZZLE INCONCEBÍVEL

O Terceiro Mundo encontra-se fragmentado em 134 Estados so-beranos, sem contar


com cerca de 60 países não independentes, como os departamentos e territórios do
ultramar francês e os territórios ligados de uma maneira ou de outra a uma metrópole,
sendo os mais célebres por diversas razões, as Bermudas, as Maldivas, Santa Helena (Reino
Unido),Porto Rico e Havai (Estados Unidos), Macau (Por-tugal). As superficies repartem-se
da seguinte maneira (quadro 1).
Um Estado em cada cinco estende-se por menos de 5000 k ㎡ 2, quer dizer que não
atinge o tamanho médio de um departamento francês.conhecido, outros são ainda mais
extraordinários. Tuvalu, arquipélago

1 Passou a ser, em Maio de 1997, República Democrática o Congo.

A DIVERSIDADE DOS TERRITÓRIOS E DAS POPULAÇOES - 29

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QUADRO 1
A superfície dos Estados

Superfície em km2 Percentagem dos Estados

20
Menos de 5000 18
5000 a 50 000 31
50 000 a 500 000 14
500 000 a 1 000 000 11
1 000 000 a 2 000 000 6
Mais de 2 000 000

Total 100

de nove ilhas do centro do Pacífico, independente desde 1978, cobre 26 km2.


A República de Nauru, uma ilha situada a 5000 km a nordeste da Austrália,
tem apenas 21 km2!
Um Estado em cinco, ou quase, tem uma superfície que oscila entre a de
um departamento e a de duas regiões francesas (cerca de 50 000 k ㎡2). Dois
Estados em cinco são portanto minúsculos ou mui-to pequenos. Outro terço
não excede o tamanho da França. Apenas um terço dos Estados do Terceiro
Mundo ultrapassa 500 000 km2: 15têm entre 1 e 2 000 000 km2, 7 ocupam
aproximativamente entre 2 e 2 800 000 k ㎡ 2 (Argélia, Arábia Saudita,
Argentina, Indonésia,México,Sudão, Zaire). A Índia (3,2 milhões de km2) e
sobretudo o Brasil (8,5)e a China (9,6), terceiro país do mundo pela sua
superfície depois da Rússia e do Canadá, estão nitidamente para além dos
demais. A China e o Brasil cobrem, só eles, um quinto do espaço do Terceiro
Mundo.

2. DE DAVID A GOLIAS

O Terceiro Mundo conta hoje aproximadamente 4,5 mil milhōes de


habitantes, mas esta população está dividida em Estados cujo le-que
demográfico é extraordinariamente aberto (quadro 2).
Um Estado do Terceiro Mundo em quatro abriga uma população inferior à
de uma aglomeração leonesa! Para retomar os exemplos acima citados, Tuvalu
tem apenas 9000 habitantes e Nauru ultra-passa-a por pouco com 10 000! Um
quinto dos Estados não vai além representa apenas, no total, 3% da sua
população e, juntando-lhes os dois terços dos Estados para 5% da população.
Neste intervalo situam-se cerca de quarenta países povoados com 10 a
50 milhões de pessoas, 7 entre 50 e 75 milhões (Etiópia, Egipto,Irão,
Turquia, Tailândia, Filipinas, Vietname), a Indonésia ultrapas-sando no seu
caso 200 milhões de habitantes.
Convém pois ter sempre presentes estas relações de dimensão: quan-
do se escreve, por exemplo «à excepção da China», não esqueçamos que
esta expressão atinge cerca de 30% da população do Terceiro Mun-do!
Convém lembrar igualmente que os 15 países de mais de 50 mi-lhões de
habitantes englobam só eles mais de três quartos dos habitantes do
Terceiro Mundo e os de mais de 10 milhões representam 95%.
Mesmo limitando-nos aos Estados com mais de 10 milhões de ha-
bitantes, constata-se que os contrastes entre as densidades de popu-lação
são consideráveis: passa-se de 9 hab./k ㎡ na Arábia Saudita a 828 no
Bangladesh e, mesmo entre os Estados com mais de 50 mi-lhões de
habitantes, o leque estende-se ainda dos 19 hab./k ㎡2 do Bra-sil aos 828
do Bangladesh. Mas esta constatação surpreende menos,finalmente, que a
da extrema diversidade das evoluções demográficas,muito raramente
sublinhadas.

B) DE UM EXTREMO AO OUTRO DA TRANSIÇÃO DEMOGRÁFICA

Uma opinião geralmente admitida pretende que o conjunto dos países


do Terceiro Mundo é atingido por um crescimento demográfico rápido.Y.
Lacoste escreve a propósito destes países que «é o seu forte crescimento
demográfico que aparece doravante como a sua principal característica
comum» [22]. Ora está longe de ser caso geral, quanto mais não seja pela
«excepção» chinesa.
Na figura 2, mesmo que só se tomem em consideração os Estados com
mais de 10 milhões de habitantes, as diferenças que desem-parceiram
estes países aparecem nitidamente. A natalidade oscila entre 52‰ no
Uganda e 17 em Cuba, ou seja aqui um número equi-valente ao dos
Estados Unidos. Mesmo entre os Estados com mais de 100 milhões de
habitantes, passa-se de 45‰ na Nigéria, a 18 na China e entre este último
país e o outro peso pesado do Terceiro Mundo, a Índia (29‰), a diferença
não é pequena.
As diferenças são mais nítidas ainda se se compararem os índices de
fecundidade, que eliminam o efeito da estrutura por idade. As mulheres
iemenitas têm em média duas vezes mais filhos do que as indianas, três
vezes mais do que as chinesas e quatro vezes mais do

32 -ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


que as cubanas! Apenas retendo os países com mais de 100 milhões de habitantes,
a diferença é ainda de um para três e meio, entre a Etiópia e a China (fig. 3).
As diferenças entre as taxas de mortalidadegeral são mais redu-zidas, quanto
mais não seja porque a população de todos estes países se mantém jovem, apesar
de um início de envelhecimento na América do Sul e na China. Mesmo pondo de
parte os países atingidos pela guerra (Afeganistão, Etiópia, Moçambique), as
diferenças vão do sim-ples ao quádruplo entre o Malávi (onde a mortalidade é mais
elevada)

FIGURA 2-A transição demográfica (1995).

A DIVERSIDADE DOS TERRITÓRIOS E DAS POPULAÇOES-33


e a Venezuela (onde ela é mais baixa), e a mais do dobro entre a Nigéria

e a China.
Os países do Terceiro Mundo estão pois em estádios muito dife-rentes da sua
transição demográfica (fig. 2). Um primeiro grupo si-tua-se em início de transição:
mortalidade em baixa (15 a 20‰), na-talidade quase natural (para lá de 40 e até
52‰ no Uganda).O crescimento é portanto forte (entre 2,5 e 3,5 por ano).
Encontramos aqui sobretudo países da África subsariana. Num segundo grupo,a
mortalidade baixou de forma mais acentuada (mantém-se entre 10 e 15‰),
enquanto a natalidade continua elevada (entre 30 e 45‰).O crescimento é pois
ainda forte (entre 2 e 3,5 por ano). Os Estados da África subsariana continuam a ser
ainda muito maioritários.
Num terceiro grupo a mortalidade é mais fraca do que nos outros grupos
precedentes (entre 4 e 10%), enquanto a natalidade continua elevada
(aproximadamente entre 30 e 40%). O crescimento continua pois elevado (entre 2,5
e 3,5% ao ano); refere-se a países da América Latina e do Mundo árabe-muçulmano.
No quarto grupo, a mortali-dade é equivalente à do precedente (entre 5 e 10‰),
mas é sobretudo a natalidade que é nitidamente mais baixa (entre 20 e 30‰).O
cres-cimento é pois relativamente fraco (1,5 a 2,5 % ao ano); este grupo inclui ao
mesmo tempo países da Ásia, entre os quais o mastodonte

FIGURA 3-Fecundidade (1992)

34-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


indiano, e da América Latina, bem como alguns Estados do mundo árabe-muçulmano
onde o planeamento familiar começa a dar os seus frutos. No quinto grupo, está-se
num nível de país desenvolvido:mortalidade inferior a 10‰, natalidade inferior a
20‰; é aqui que se situa a China. A transição demográfica está aqui concluída.
Estas evoluções induzem, e são ao mesmo tempo induzidas, por estruturas por
idade sensivelmentediferentes de país para país.A percentagem de jovens com
menos de 15 anos é duas vezes mais elevada na Costa do Marfim (49%) do que em
Cuba (23%), o que sig-nifica que a estrutura por idade cubana é semelhante à da
Rússia e da Europa de Leste. A própria China (ou seja cerca de 30% da popu-lação do
Terceiro Mundo) tem menos de 30% de jovens com menos de 15 anos (27%
exactamente).
Estes comportamentos demográficos só se compreendem repos-tos no seu
contexto social, no sentido amplo do termo.

III. A DIVERSIDADE DOS NÍVEIS DE VIDA


Hoje já não se pode admitir que a unidade do Terceiro Mundo se deva a uma
pobreza generalizada. Mesmo que já não se considerem os dragões asiáticos como
países do Terceiro Mundo (é o ponto de vista que defenderemos mais adiante) e
mesmo que eliminemos o caso especial dos pequenos produtores de petróleo, há
mais diferença de rendimento entre os mais ricos dos países do Terceiro Mundo e os
mais pobres, do que entre os mais pobres dos países desenvolvidos e os mais ricos
dos países do Terceiro Mundo.

A)JOB E CRESUS
Tradicionalmente, para medir o rendimento por habitante de um país, utiliza-se o
produto nacional bruto (PNB). Com este critério, as diferenças parecem enormes
entre os países do Terceiro Mundo. Que haverá de comum entre os 21 000$ por
habitante dos Emirados Ára-bes Unidos e os 120$ de Moçambique? Mesmo
eliminando os peque-nos países petrolíferos e, de forma mais geral, os países com
menos de 10 milhões de habitantes (bem como, recorde-se, os dragões asiáti-cos),
que diferença entre a Argentina (7 800$) e o mesmo Moçambique (120$)! A primeira
situa-se um pouco abaixo da Grécia e de Portugal,enquanto o outro aparece no
último lugar mundial. Mesmo compa-

A DIVERSIDADE DOS TERRITÓRIOS E DAS POPULAÇOES -35

36 -ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


rando apenas os países com mais de 50 milhões de habitantes as dife-renças
continuam a ser acentuadas (fig. 4). O PNB/habitante é 25vezes superior no
Brasil em relação ao que ele é na Etiópia. O brasi-leiro dispõe doravante de um
rendimento superior ao do russo (3590$contra 2600).

FIGURA 4-PNB por habitante (1995)

Notar-se-á igualmente que o leque dos rendimentos difere de país para país, pois
nem todos os países do Terceiro Mundo são tão díspares como frequentemente se diz
(quadro 3).
Na verdade, na medida em que podemos confiar nas estatísticas no que se refere
a um tal assunto, constata-se que no Bangladesh, na Índia, na Indonésia e em
Marrocos, as diferenças de rendimento são inferiores às da França ou da mesma
ordem. Com efeito, os 20% das famílias mais pobres partilham 7 a 9% do rendimento
nacional (França 6%) e os 20% mais ricos entre 38 e 46%, como em França. Pelo con-
trário, na América Latina (sobretudo no Brasil, na Colômbia, na Venezuela), bem como
na Malásia, as diferenças são particularmente elevadas: os 20% das famílias mais ricas
partilham mais de 50% do rendimento nacional e por vezes dois terços. (Brasil).
QUADRO 3
Percentagem do rendimento das famílias por fatias de rendimento

20% mais pobres 20% mais ricos

Bangladesh
9 38
Marrocos.. 7 46
43
Indonésia...... 41
Paquistāo......... 8 40
Filipinas........... 6 48
Venezuela......... 4 58
Malásia........................ 5 54
Peru......................... 5 50
Costa do Marfim...... 7 44
Colômbia.......................... 4
56
2
Brasil.................................. 67

França.......... 6 42

Não obstante, o PNB/habitante representa uma medida do rendi-mento ambígua.


Com efeito, «a utilização das taxas de câmbiooficiais,para converter em dólares os
números expressos em moeda nacional,não permite medir o poder de compra interno das
moedas» [5].O valor real do dólar não é pois o mesmo por todo o lado: com 4000dólares,
é-se pobre em Nova Iorque, mas em Bombaim pode-se pagar a cinco empregados
domésticos... este valor pode igualmente variar fortemente de um período para outro, em
função da política monetá-ria americana e da conjuntura internacional. No âmbito do
Projecto de Comparação Internacional, a ONU desenvolveu pois «medidas do PIB real
numa escala comparável ao nível internacional utilizando as paridades do poder de
compra, em vez das taxas de câmbio,como factores de conversão, e exprimiu-as em
dólares internacionais» [5].
Este PIB real dá uma melhor ideia do poder de compra dos habi-tantes. Em geral,em
relação ao PNB/habitante, reduz a diferença em relação aos países desenvolvidos (dado
que o nível de vida é aqui mais elevado) e permite classificar de novo os países do Terceiro
Mundo de uma maneira mais judiciosa. A China e a Índia, por exem-plo, dispõem de um
PNB/habitante relativamente semelhante (entre 330 e 600$); ora o PIB/habitante real da
China atinge 2350$, en-

A DIVERSIDADE DOS TERRITÓRIOS E DAS POPULAÇOES-37


quanto o da Índia mal ultrapassa 1200$. Veremos, mais adiante, atra-vés de um certo
número de critérios, que o nível de vida é efectiva-mente mais elevado na China do
que na Índia.
Em termos de PIB real, o leque entre os países do Terceiro Mundo reduz-se um
pouco (nem sempre, no entanto), mas continua muito largo. Se retomarmos os
países cujo PNB/habitante acima compará-mos, a diferença é ainda considerável
entre os emirados (5950$ de PIB real por habitante), a Argentina (5800) e
Moçambique (640$),da mesma forma que entre o Brasil (5500$) e a Etiópia (420).
Este fosso alarga-se entre o brasileiro e o etíope: este dispõe de menos 5000$ que
aquele (contra 3500$ menos em termos de PNB).
Todavia, PNB e PIB não levam em consideração nem a economia informal, nem o
autoconsumo, essenciais contudo nos países do Ter-ceiro Mundo. Eles nada dizem
sobre «os fins e as utilizações finais de um determinado produto» [5]. Em suma, estes
dois indicadores, e sobretudo o PNB, não dão uma ideia suficientemente precisa das
con-dições de vida de um país, quer dizer, de certas componentes do qua-dro de vida
dos indivíduos, tais como a educação, a saúde, o acesso a certos equipamentos
colectivos (água potável, por exemplo) e a certos serviços (transportes, actividades
de lazer, etc.).
Para o Terceiro Mundo apenas dispomos de uma panóplia restrita de indicadores
de condições de vida. Alguns apenas confirmam as indicações do PNB e do PIB real,
com alguns cambiantes por vezes.Por exemplo, a taxa de motorização (número de
habitantes por auto-móvel), é geralmente tanto mais fraca quanto mais medíocre for
o PNB (fig. 5). No entanto, os países comunistas, antigos ou actuais,são menos
motorizados do que deixa esperar o seu PNB (escolha po-lítica em favor do
transporte em comum) e os países petrolíferos são--no um pouco mais, em virtude
do preço módico do petróleo. Mais surpreendente é a relativa sobremotorização da
África subsariana em relação ao seu fraco PNB.
Por outro lado, outros indicadores relativos à educação, à alimen-tação, à
saúde, são mais do que um simples reflexo do PNB; eles for-necem indicações
complementares sobre a intensidade e a duração dos esforços desenvolvidos
localmente para melhorar as condições de vida das populações.

B) A DESIGUALDADE PERANTE A ESCOLA


As taxas de escolarização, quer dizer, a percentagem de inscritos nos
ensinos primário, secundário e superior em relação aos grupos

38 -ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


etários correspondentes, são muito heterogéneas nos países do Ter-
ceiro Mundo.
Estas taxas são na verdade para manusear com precaução.Com efeito, as idades que
correspondem ao ensino primário (geralmente 6a 11 anos), ao secundário (12 a 17 anos)
podem variar de país para país e logo repercutirem-se nas taxas de determinados países.
Por outro lado, o número semanal de horas de ensino pode igualmente variar uma vez que,
em certos países, as crianças vão à escola a meio--tempo, por falta de instalações e de
professores. Enfim, é muito evi-dente que as condições materiais e intelectuais deste
ensino podem ser muito dissemelhantes. Tal como aparecem, estas taxas dão no entanto
uma ordem de grandeza e permitem comparações pelo me-nos aproximativas.
É no ensino primário que as diferenças são mais fracas(fig. 6).Foram desenvolvidos
grandes esforços na maior parte dos Estados para escolarizar as crianças e, na globalidade,
a taxa de escolarização ganhou dois pontos em cinco anos (de 91 a 93%). Os resultados
conti-nuam no entanto desiguais.
Em sete países com mais de 10 milhões de habitantes menos de metade das crianças
estão escolarizadas, sendo o recorde detido con-juntamente pela Somália e pelo
Afeganistão, onde menos de 20% ape-

FIGURA 5-Motorização (1993)

A DIVERSIDADE DOS TERRITÓRIOS E DAS POPULAÇOES -39


nas das crianças vão à escola primária. Em sete outros ainda, menos de três
quartos das crianças são escolarizadas; entre os mais populo-sos encontra-se
o Paquistão, a Arábia e Marrocos. Pelo contrário, na maior parte dos Estados
da América Latina e do mundo árabe-mu-çulmano, bem como na China e na
Indonésia, a taxa ultrapassa os 90ou 95%.
A escolarização ao nível secundário, que é sinal de um esforço mais
prolongado em matéria de ensino, revela contrastes mais pro-nunciados (fig.
6). Sem que haja sempre uma correlação muito forte entre os ensinos
primário e secundário, verificamos contudo que a maior parte dos países que
escolarizam menos de 80% das suas crianças no primário recenceiam
geralmente menos de 20% no se-cundário. Mais precisamente, em sete países
com mais de 10 milhões de habitantes, um só jovem em cada dez vai ao que
nós chamamos, no nosso país, ciclos e liceus. Em seis outros, dentre os quais
alguns muito populosos como o Bangladesh e a Etiópia, apenas dois jovens
em cada dez frequentam o ensino secundário. Ao contrário, em cerca de
quinze Estados, dentre os quais alguns na América Latina, a taxa de escola-
rização secundária atinge ou ultrapassa os 60%, por vezes 75%
(Egipto,Filipinas, Cuba, Sri Lanka, África do Sul). Em suma, países sem verda-
deiro ensino secundário opõem-se a outros cujas taxas de escolarização
ultrapassam as de Portugal ou equivalem a de certos países desen-volvidos.
A situação é bastante análoga no ensino superior, pois existe uma bastante
boa correlação entre os dois tipos de ensino (fig. 6). Com efeito, os sete países
com mais de 10 milhões de habitantes que escolarizam mal no primário e
mediocremente no secundário, enviam igualmente poucosjovens para a
universidade. No total, cerca de trinta países contam menos de 10% de
estudantes grupos com idade de iràUniversidade: China, Bangladesh,
Paquistão, Indonésia situam-se neste caso, o Ruanda e a Tanzânia não
recenceiam, quanto a eles,nenhum estudante. Ao contrário, em oito países,
situados sobretudo na América Latina, a taxa ultrapassa os 20%, ou seja mais
do que em Portugal e tanto como no Reino Unido. A Argentina, com mais de
40% de estudantes, regista um melhor resultado do que o Reino Unido ou a
Itália.
Finalmente, a taxa de alfabetização da população adulta, reflecte a
antiguidade e a profundidade da escolarização, testemunha os mes-mos
contrastes (fig. 7). Em face de seis países (entre os quais o Afeganistão e a
Etiópia) onde menos de um terço da população sabe ler e escrever,colocam-se
cerca de uns vinte outros onde oito em cada

40 -ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


FIGURA 6-Escolarizaçāo (1993)

dez pessoas são alfabetizadas. A maior parte destes estão localizadas resultados são
comparáveis aos de países desenvolvidos ou pouco atra-sados como Portugal.
Os alimentos intelectuais estão pois mal repartidos no Terceiro Mundo. O mesmo
acontece com os alimentos terrestres.

C) VENTRES VAZIOS E VENTRES CHEIOS


O Terceiro Mundo não é uniformemente o mundo da carência ali-mentar e da fome
como repetem frequentemente os média. As situa-ções são na realidade extremamente
diferenciadas, mesmo sendo ne-cessário desconfiar das médias nacionais que podem
esconder situações regionais e sociais contrastadas.
Estima-se habitualmente que cada indivíduo tem necessidade de 2200 a 2500 calorias
por dia para viver, consoante a sua idade,a sua actividade e o clima sob o qual vive. Se
ficarmos pelo limite baixo das calorias, uma vez que o clima é em média geralmente
quente e a po-pulação geralmente jovem, constata-se que um quarto dos países do
Terceiro Mundo, e que representam 15% da sua população, se situam

A DIVERSIDADE DOS TERRITÓRIOS E DAS POPULAÇOES-41

42-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


% de adultos
alfabetizados

FIGURA 7-Alfabetização (1995)

abaixo deste limite. Tirando algumas excepções (Afeganistão,


Nepal,Bangladesh,Bolívia, Peru), todos estes países subalimentados per-tencem à
África Subsariana. A maior parte aproximam-se da barra das 2200 calorias, mas
nove continuam abaixo de 2000 entre eles a Somália,Moçambique, Etiópia, Peru,
Nepal, Afeganistão. Nestes países subalimentados, a parte da alimentação absorve
ainda assim 50 a 60 por cento do orçamento familiar.
Pelo contrário, 10% dos países do Terceiro Mundo, ou seja 16%dos seus
habitantes, dispõem de uma alimentação de país civilizado,uma vez que o seu
consumo ultrapassa as 3000 calorias por dia.A maior parte destes países,
exceptuando o México, fazem parte do mundo árabe-muçulmano, mesmo o Egipto
que, a verdade se diga,graças a uma forte ajuda alimentar internacional, consegue
alimen-tar correctamente a sua população. Nestes países, tirando o Egipto, a
alimentação não representa mais do que um terço do orçamento das famílias,isto
é, uma parte equivalente à das famílias portuguesas.
A maior parte do Terceiro Mundo situa-se entre estes dois extre-mos. Um
pouco mais de metade dos habitantes dispõem de 2300 a 3000 calorias por dia.
Figuram nesta categoria os outros Estados ára-be-muçulmanos, petrolíferos ou não,
a maior parte dos países asiáti-cos (Índia, Paquistão, Filipinas, Indonésia, China) que
conseguem
portanto, pelo menos globalmente, alimentar convenientemente a sua população. No
resto do Terceiro Mundo (ou seja, um bom terço dos seus habitantes), a ração
alimentar mal chega a ser suficiente (entre 2500 e 2300 calorias). A situação
alimentar é pois extremamente con-trastada, mesmo nos países com mais de 50
milhões de habitantes (fig. 8). Largas bolsas de subalimentação, e por vezes
localmente de fome,subsistem, sobretudo em caso de guerra. A mesma observação
pode ser feita a propósito do estado sanitário.

FIGURA 8-Situação alimentar (1992)

D) A DESIGUALDADE PERANTE A DOENÇA E A MORTE

A esperança de vida à nascença vai quase do simples ao dobro entre os 43 anos


dos habitantes do Afeganistão e os 76 dos habitantes da Costa Rica. Mesmo entre os
grandes países, as diferenças são con-sideráveis: o chinês vive em média mais 18 do
que o bengalês e ainda mais doze anos do que o indiano (fig. 9).
A taxa de mortaidade infantil (crianças com menos de um ano)deixa igualmente
transparecer enormes diferenças. Mesmo pondo de parte os países atingidos pela
guerra, onde a taxa ultrapassa os 150%,o leque vai de 146 em Moçambique a 14 em
Cuba, uma verdadeira

A DIVERSIDADE DOS TERRITÓRIOS E DAS POPULAÇOES - 43


FIGURA 9-Esperança de vida (1993)

taxa de país desenvolvido. Entre os países com mais de 50 milhões de


habitantes, a China distingue-se uma vez mais: a sua taxa de 30%,embora ainda
elevada, não tem no entanto termo de comparação com a do Bangladesh
(80‰) e sobretudo com a da Etiópia (120) (fig. 10).Não tendo a estrutura por
idade aqui nenhuma influência (quando éo contrário para a taxa de
mortalidade geral), são efectivamente as condições de higiene, de alimentação,
de escolarização das mães bem como o enquadramento médico que
desempenham o papel mais im-portante.
O enquadramento médico é, com efeito, extremamente díspar no interior
dos Terceiros Mundos. É na verdade preciso aqui conceder aos números uma
confiança limitada porque o nível profissional dos médicos e a definição que
deles é dada são heterogéneas. Assim, o bom enquadramento médico da China
é em parte devido ao facto de aí se contabilizarem os praticantes da medicina
tradicional. No en-tanto, as diferenças são tais que os meios estatísticos não
podem ex-plicar tudo.
Numa dúzia de países, cada médico trata, em média, pelo menos 20 000
pacientes e, nuns quinze outros, este número ultrapassa ainda por médico (fig.
11). Esta situação só diz respeito, no entanto, a 13%

44 - ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


da população do Terceiro Mundo. Ao contrário, um quarto dos sta-dos países

desenvolvidos (entre 300 e 700 habitantes por médico) ou por exemplo, têm

ainda um enquadramento razoável, com 1000 a 2000Tailândia, Indonésia

apenas contam um médico para 4000 a 10 000bem providos, dos mais

carenciados.

FIGURA 10-Mortalidade infantil (1994)

Concluiremos esta análise da diversidade demográfica e a heterogeneidade


dos níveis de vida com dois gráficos. Um relaciona o índice da fecundidade, que é
um bom indicador da atitude da popula-ção perante a procriação, e a mortalidade
infantil, que dá uma certa ideia das condições de vida (fig. 12). Constata-se que a
nuvem de pon-tos formada no gráfico prolonga-se desmesuradamente entre,por
um lado o Afeganistão, a Serra Leoa e Moçambique, onde a mortalidade infantil e
a fecundidade são extremamente elevadas e, por outro, para além dos Dragões, o
Chile, o Sri Lanka e Cuba, onde são extrema-mente baixas. Mesmo nos países com
mais de 100 milhões de habi-tantes, a diferença é considerável entre a China, com
um taxa de

A DIVERSIDADE DOS TERRITÓRIOS E DAS POPULAÇOES - 45

46- ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


focundidade baixa e com uma mortalidade infantil moderada, e o

onde a mortalidade infantil se mantém muito forte.

O segundo gráfico é o do Indicador do Desenvolvimento Humano.vam em


consideração o PIB real, a esperança de vida e a alfabetiza-um país (fig. 13).
Para um máximo teórico de 1000 pontos, o México entre os países com mais
de 50 milhões de habitantes, aproxima-se dos 900 pontos, o Brasil e a
Tailândia aproximam-se ou ultrapassam os 800, enquanto a Etiópia cai abaixo
dos 250 pontos e o Bangladesh e a Nigéria se situam entre os 350 e 400
pontos. O nível de vida do México é duas a três vezes mais elevado do que o
destes três últimos países e as diferenças são evidentemente ainda mais
severas entre os países de menor dimensão.
Estas diferenças devem-se evidentemente ao nível de rendimento mas
também ao contexto cultural, no sentido mais amplo do termo,no qual
vivem as populações. Ora, é evidente que este contexto é ex-
traordinariamente variado no interior do Terceiro Mundo. Dele ire-mos dar
uma ideia mais precisa através de três exemplos: a religiāo,o sistema
político e a urbanização.

FIGURA 11-Enquadramento médico (1990)

A DIVERSIDADE DOS TERRITÓRIOS E DAS POPULAÇOES -47


IV.A DIVERSIDADE CULTURAL
A) DE KRISHNA A ALÁ
A rápida descristianização dos países ocidentais deixou-nos pen-sar, um
pouco precipitadamente, que a religião se tornou um elemento secundário
na sociedade moderna. O crescimento dos integracio-nismos (muçulmano,
hinduísta, católico, ortodoxo,judeu), os conflitos religiosos e a multiplicação
das seitas mostram-nos que o sentimento religioso está de regresso e que
continua a ser uma peça essencial das estruturas sociais, mentais,
comportamentais e mesmo económicas de um país. «As religiões moldam as
mentalidades, as tradições, os géneros de vida e contribuem para a
formação das culturas» [28].
Voltaremos mais adiante às modalidades desta prevalência da re-ligião
sobre certas culturas. Contentar-nos-emos, por ora, em mos-trar os pesos
respectivos das grandes religiões neste Terceiro Mundo que, precisamente,
as viu nascer, e no qual elas estão mais presentes e mais impregnantes do
que em qualquer outro sítio.
Quatro grandes religiões partilham o Terceiro Mundo. A primeira é o
islão, com pelo menos 800 milhões de fiéis. Está quase inteira-mente
incluída no Terceiro Mundo, à excepção da Ásia Central ex--soviética, mas
que poderia eventualmente ser ligada a ele. O islão ocupa um vasto espaço
que vai do Senegal e da Mauritânia, ao Paquistão, ao Afeganistão, ao
Bangladesh, à Índia e à Indonésia, o Estado muçulmano mais povoado do
planeta.
Vem em seguida o hinduísmo, com 600 a 700 milhões de fiéis,localizados
essencialmente na Índia, mas também no Bali, por exem-plo. O catolicismo
coloca-se atrás com aproximadamente 400 milhões de crentes,
concentrados essencialmente na América Latina, nas Fi-lipinas e em espaços
africanos vastos mas pouco populosos, esten-dendo-se do Zaire e do Congo
à Namíbia. O budismo conta entre 300e 400 milhões de fiéis na Ásia do
Sudeste, no Tibete e na China, mas este número permanece impreciso e
certamente subestimado, dado que é difícil avaliar a sua importância na
China. O animismo conseva adeptos em certas regiões isoladas da América
Latina e da África,mas a sua diversidade é grande e o número dos seus
adeptos fraco.
Duas destas religiões são conquistadoras, o islão e o catolicismo,mas a
primeira mais do que a segunda que progride sobretudo devido ao aumento
da população latino-americana. O hinduísmo, durante muito tempo pouco
mobilizador, desperta na Índia face ao islão, como o testemunham os graves
conflitos que opõem os fiéis destas duas

48-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


religiões no Noroeste do país. O budismo, pelo contrário, insiste mais proselitismo,
dá menos que falar, excepto no Tibete onde os chineses giões, mas maior
diversidade ainda dos sistemas políticos.

B) DE CASTRO A HASSAN II
A carta política do Terceiro Mundo parece dominada por «regi-era uma
passagem obrigatória para as nações que saíam de uma de-pendência colonial.
Na realidade, se raciocinarmos em número de habitantes envolvi-dos e não em
número de países, os regimes autoritários só concernem,se é legítimo dizê-lo, cerca
de metade da população do Terceiro Mundo,o que continua ainda a ser enorme.
Localizam-se essencialmente na China,na Indonésia, no Vietname, bem como na
maioria dos países árabe-muçulmanos e africanos. Convém ainda notar que estes
regi-mes autoritários diferem na realidade muito uns dos outros: monar-quia
absoluta na Arábia Saudita ou mais temperada em Marrocos,poder autocrático no
Iraque, ditadura de partido único (China) por vezes incarnada por um homem
(Castro), omnipotência da armada (Nigéria, Birmânia) por vezes pontuado de
eleições presidenciais (Indonésia), poder teocrático (Irão), etc. Por outro lado, certos
pode-res têm vindo a ser fissurados. A democracia ganha terreno,embora com muita
dificuldade, na África subsariana. Os regimes socialistas recuam por todo o lado no
Leste, pelo menos no domínio económico,quando não desabam, como em África.
Aliás, todos os sistemas mais ou menos democráticos estão re-presentados,
sobretudo desde que os regimes ditatoriais desertaram quase completamente da
América Latina. A Índia mantém-se a maior democracia parlamentar do mundo,
apesar das apreensões que se possam ter relativamente à sua solidez actual.
Regimes mais ou me-nos presidenciais floresceram na América Latina, embora nos
possa-mos interrogar sobre o grau de democracia de alguns, do México, por
exemplo. Restam ainda monarquias parlamentares, como a Tailândia ou a Malásia e
todo o leque possível entre verdadeira democracia e poder autoritário com fachada
democrática...
me ainda com muita frequência que uma das características essenciais do
Terceiro Mundo reside na sua suburbanização.
C) DO MUITO URBANIZADO AO MUITO RURAL
Considerados globalmente, os países do Terceiro Mundo são ainda em média
menos urbanizados do que os países desenvolvidos (40% de citadinos contra 65%).
Mas esta média não faz muito sentido. Três países com mais de 10 milhões de
habitantes, todos latino-america-nos (Argentina, Venezuela, Chile) são urbanizados
em mais de 80%,e sete são-no ainda em mais de 70%, enquanto na outra
extremidade,sete são urbanizados em menos de 20%, e por vezes em menos de
15%,como o Malávi, a Etiópia, o Uganda, o Nepal. Nos países com mais de 50
milhões de habitantes, as diferenças continuam a ser ainda consideráveis entre a
Etiópia e o Brasil (fig. 14). A urbanização galopante dos últimos quarenta anos, no
decorrer dos quais ós países do Terceiro Mundo viram a população das suas
cidades quadruplicar,não reduziu sensivelmente as diferenças, pois um certo
número de Estados da Ásia e da África estão apenas no início da sua fase de
urbanização.
A comparação entre dois países de dimensão comparável, o Brasil e o
Bangladesh, mostra bem a extrema diversidade da situação.O primeiro, urbanizado
em três quartos, dispõe de duas aglomera-ções com mais de 10 milhões de
habitantes, sendo uma delas São Paulo, com ares de cidade americana, e de uma
dezena com mais de um milhão. No Bangladesh, pelo contrário, nenhuma cidade
ultra-passa os 10 milhões de habitantes: Dacca atinge os 5 milhões.Chittagong
apenas um milhão e as duas não são muito mais do que amontoados de bairros de
lata, exceptuando alguns edifícios moder-nos do centro da cidade.

CONCLUSÃO
O Terceiro Mundo aparece pois, de facto, até aqui como um mo-saico: um meio
contrastado e não sistematicamente constrangedor,Estados de dimensões
desiguais, comportamentos demográficos heterogéneos, rendimentos e condições
de vida díspares, culturas multiformes, níveis de urbanização dissemelhantes.
A diversidade do meio fisico, sociocultural e histórico local, bem como a
multiplicidade das formas regionais de relação ao sistema--mundo induziram um
mosaico económico aparentemente igualmente variegado.

A DIVERSIDADE DOS TERRITÓRIOSE DAS POPULAÇOES-51

A DIVERSIDADE ECONÓMICA - 53
2

A DIVERSIDADE ECONÓMICA

Para tentar sair do que se designava então o subdesenvolvimento,a maior


parte dos países do Terceiro Mundo implementaram, nos anos 1950-1960,
políticas de desenvolvimento, quer dizer, um conjunto de meios destinados a
aumentar de uma forma harmoniosa a sua produção e a elevar o nível de
vida do conjunto da população. Simpli-ficando muito, três modelos lhes eram
propostos: um socialista, ou-tro liberal, um terceiro intermédio.

I. OS MODELOS DE DESENVOLVIMENTO
A) O MODELO SOCIALISTA

Nos anos 1950-1960, a maior parte dos líderes africanos e asiáti-cos


desconfiam do sistema liberal, assimilado ao imperialismo e ao colonialismo.
São sensíveis aos argumentos da URSS que «se apre-senta ao mesmo tempo
como campeão dos países colonizados e como ex-país subdesenvolvido que
se tornou numa grande potência econó-mica, nomeadamente através da
indústria pesada» [7]. Tanto mais que a moda é então, mesmo nos países de
tradição liberal, para o reforço do papel do Estado (nacionalizações em
França, no Reino Unido, em Itália).
É pois um modelo soviético que a maior parte dos países atraídos pelo
modelo socialista vai escolher. Este modelo é autocentrado, uma vez que visa
desenvolver as capacidades de produção de um Estado utilizando
prioritariamente os recursos locais, privilegiando as rela-
cōes económicas internas e os mercados internos, em detrimento de ligações
económicas externas e de mercados externos. Preconiza pois a prioridade às
indústrias de base, susceptíveis de serem «industria-lizantes»arrastando na sua
esteira, graças às trocas interempresas,as indústrias de jusante (bens de
equipamento e a seguir bens de consumo). Implica limitar fortemente os
investimentos estrangeiros e reduzir as trocas exteriores, excepto com os
«países irmāos». Dá um lugar central ao Estado que controla e impulsiona a
economia atra-vés de uma planificação centralizada, através da nacionalização
ou da colectivização da maior parte dos sectores económicos e através da
fixação autoritária dos preços.
Poder-se-ia ter pensado que a termo, a implantação de estruturas
socioeconómicas semelhantes e por outro lado muito condicionado-ras, teria
dado pelo menos a esta parte do Terceiro Mundo uma certa unidade. Nada
disso se passou. Com efeito, se o modelo soviético in-teressou cerca de
quarenta países, foi seguido mais ou menos de perto,adaptado mais ou menos
bem, durou mais ou menos tempo.
Os autores do «Terceiro Mundo ou a fortuna de um jogo de pala-vras» [26]
dividem os países que escolheram num dado momento o socialismo, em quatro
grupos, que vão daqueles cuja economia é mais autocentrada e a empresa do
Estado mais forte, àqueles em que a economia é mais aberta e a empresa do
Estado tem menor peso. Dis-tinguem pois os países verdadeiramente
socialistas (China,Coreia do Norte, Camboja, Laus, Mongólia, Vietname, Cuba),
os países de orientação socialista confirmada (Angola,Etiópia,
Mocambique,Afeganistāo, Iémen do Sul, Nicarágua), os países de orientação
socia-lista declarada (Argélia, Benim, Congo,Guiné, Madagáscar,
Somália,Tanzânia,Birmânia, Iraque, Síria), enfim os países de orientaçāo
socializante (Cabo Verde, Egipto, Gana, Guiné-Bissau,Líbia,Mali,São Tomé,
Seychelles, Zâmbia, Zimbabué, Granada). Na realidade,em função das
condições locais, todos os cambiantes existem entre o socialismo puro, e a
simples orientação socializante.
A diversidade sempre foi pois grande entre estes países mais ou
menos socialistas e o seu ponto comum seria antes hoje as graves
dificuldades económicas em que o modelo as lançou. Com efeito, sa-
bemos o que aconteceu com o modelo soviético. Mesmo antes de ser
contestado e depois de se ter desmoronado na URSS, conheceu mui-tas
vicissitudes no Terceiro Mundo. A China havia-se desligado uma primeira
vez aquando da ruptura com a URSS, em 1960.Afastou-se Xiaoping, que
abriram o país ao exterior, descolectivizaram e

54-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD

A DIVERSIDADE ECONÓMICA-55
privatizaram uma grande parte da economia e instauraramum «so-cialismo
de mercado», ao ponto de a China surgir hoje mais como um modelo
económico intermédio.
. A maior parte dos países do Terceiro Mundo que seguiram esta via
socialista abandonaram-na hoje, total ou muito largamente, para irem no
sentido de uma certa forma de liberalismo económico. Na Ásia, mesmo entre
os melhores alunos, aqueles que foram classifica-dos de «países socialistas
de corpo inteiro», as deserções, parciais ou totais são inúmeras. A Coreia do
Norte, a Mongólia, o Vietname,o Camboja deixam uma parte cada vez mais
larga à economia de mer-cado. Apenas Cuba, ao mesmo tempo que se abre
ao turismo interna-cional, resiste, mas até quando, agora que lhe falta o
apoio maciço da ex-URSS que representava 40% do seu PNB, bem como 70%
da sua energia e da sua alimentação?
Entre os outros partidários do modelo, a grande maioria derivou agora,
mais ou menos claramente, mesmo aqueles que pareciam mais apegados a
ele, para uma economia de mercado. Na Tanzânia, durante muito tempo
considerada como uma modelo de desenvolvimento socialista africano, as
eleições de 1985 assistiram à derrota dos candi-datos marxistas e J. Nyerere
já não está no poder: foram privatizados certos domínios nacionalizados e
dá-se prioridade às culturas de ex-portação. A Argélia, que seguiu de perto o
modelo soviético (planifi-cação, nacionalização ou colectivização de uma
grande parte da eco-nomia, apoio sobre a siderurgia e os hidrocarbonetos
como indústrias industrializantes), orientou-se no sentido de uma via
reformista desde 1977: privatizações sobretudo na agricultura e no turismo,
desenvol-vimento e diversificação das exportações. Na Nicarágua, os sandi-
nistas foram afastados do poder. Em Madagáscar, deu-se uma vira-gem para
o liberalismo em 1986 com a privatização de empresas nacionais, a abertura
do sector bancário ao sector privado e a liberalização do comércio exterior.
Todos os países que haviam seguido mais ou menos de perto o modelo
soviético estão pois em diferentes estádios de evolução no sen-tido da
liberalização e da abertura da sua economia. Ei-los pois mais próximos dos
países que escolheram uma via intermédia entre socia-lismo e liberalismo
económico.

B) A VIA INTERMÉDIA
Como o seu nome indica, esta via intermédia colhe elementos dos dois
modelos rígidos que são o modelo soviético e o modelo liberal. Ao
o apoio prioritário aos recursos locais e ao mercado nacional, a cria-mentos
estrangeiros e das importações. Ela reserva ainda um lugar parte da economia
(energia, indústrias de base, transportes, bancos)e, por vezes, à reforma agrária.
produtos no mercado internacional. Visa-se igualmente diversificar as indústrias,
começando por aquelas que são susceptíveis de substi-tuírem produtos
importados por produtos nacionais; esta diversifica-ção é por vezes obtida
deixando o capital estrangeiro implantar-se em determinados segmentos
prioritários. A planificação apenas incide numa parte da economia e esta mantém-
se flexível. Largs sectores,geralmente os mais dispersos, escapam ao controlo do
Estado (pe-quena indústria, artesanato, comércio, agricultura) e, à excepção de
alguns produtos de base, os preços fixam-se livremente no mercado.As reformas
agrárias, quando se efectuaram, não resultaram na colectivização das terras, mas
antes na sua redistribuição em proveito de pequenos agricultores.
Esta via intermédia foi sobretudo seguida por Estados-continen-tes, dotados
de recursos naturais de primeira ordem, de um mercado interno de grande
dimensão e de um peso internacional indiscutível para poder opor-se às pressões
externas visando à abertura do mer-cado nacional. A Índia, a Indonésia, o México,
o Brasil, e numa certa medida a Argentina, foram até aos meados dos anos 1980 os
repre-sentantes mais eminentes desta via intermédia. Relativamente pouco
numerosos, contam no entanto cerca de 1400 milhões de habitan-tes, ou seja,
aproximadamente um terço da população do Terceiro Mundo.
O caso da Índia é particularmente demonstrativo. Até à chegada ao poder de
Rajiv Gandhi, em 1984, o estado desempenha um papel preponderante. Os planos
quinquenais aplicam-se simultaneamente,timo é particularmente invasor, uma vez
que atinge a energia (gás,rurgia, indústria petrolífera), as indústrias mais ou menos
estratégi-mo indústrias ligeiras como a electrónica e a máquina-ferramenta.de
indústrias pesadas industrializantes e de substituição de importa-

56-ROBERTCHAPUIS/THIERRYBROSSARD

A DIVERSIDADE ECONÓMICA -57


a terra dos grandes proprietários pelos pequenos exploradores, ela sófeudais
do que a uma verdadeira redistribuição das terras [7]. Por tura, de um sector
privado frequentemente dinâmico onde coexistem lado a lado as
multinacionais indianas e as PME da indústria, do comércio e dos serviços.
O Brasil aproxima-se da Índia pelo peso do Estado que realiza metade dos
investimentos, detém cerca de um terço das capacidades de produção e
controla uma parte equivalente do sistema bancário.Mas aqui o capital
nacional é nitidamente dominado pelas multinacionais estrangeiras que
controlam uma larga parte da in-dústria brasileira, exceptuando a energia, as
minas e os transportes.Além disso, nenhuma reforma agrária chega
verdadeiramente a ser levada a efeito. O caso do México é ainda um pouco
diferente. Se o peso do sector público é aproximadamente equivalente e se
as multinacionais aí têm um papel preponderante, a pressão dos Esta-dos
Unidos contribui para aí alterar os dados do problema, dado que dois terços
do comércio se fazem com o poderoso vizinho; além do mais, foi instaurada
uma verdadeira reforma agrária.
Em suma, também aqui cada um geriu a sua via à sua maneira,em função
dos dados económicos, sociais e espaciais locais. Mas esta via é hoje
criticada nos próprios países que a adoptaram.Denuncia--se a lentidão do
sector público, a fraqueza da sua produtividade, a rigidez da sua gestão, o
custo das suas sobrecapacidades, os danos provocados pelos seus défices, o
mau ajustamento dos preços, o es-trangulamento da iniciativa privada, o
carácter excessivo do seu pro-teccionismo...
Uma vaga de privatizações atinge pois, desde os meados dos anos 80, os
grandes países da América Latina. «A iniciativa aos america-nos», anunciada
em Junho de 1990 pelo Presidente Bush, que visa criar a prazo um «grande
mercado» contiental do Alasca à Terra de Fogo, vai provocar, se se
concretizar, uma tendência geral da América Latina em direcção ao
liberalismo económico. À data, os Estados Unidos assinaram com todos os
países, à excepção de Cuba, acordos--quadro destinados a suprimir os
obstáculos às trocas de produtos e aos movimentos de capitais. No México,
em particular, a integração do país na ALENA (Associação de Livre Troca
Norte-Americano) com os Estados Unidos e o Canadá coloca, mais do que
nunca, a questão do devir do modelo mexicano.
Na Índia, desde a sua chegada ao poder,R. Gandhi encoraja o sector privado
através de reformas fiscais, atenua o controlo estatal sobre a economia, liberaliza
em parte as importações, autoriza e en-coraja o investimento estrangeiro. Os seus
sucessores prosseguiram na mesma direcção: desvalorização da moeda para
favorecer as ex-portações, redução ou supressão de certas subvenções: subsídios,
pos-sibilidade de as multinacionais deterem mais de 50% do capital de uma
empresa, privatizações, etc. A Indonésia deixa cada vez mais espaço ao sector
privado e aos investimentos estrangeiros. Na Argen-tina,C.Menem vendeu empresas
públicas como a Aerolines Argenti-nas ao sector privado, suprimiu subsídios,
liberalizou o mercado de câmbios, etc.
Esta via intermédia, apesar de economicamente mais flexível do que a via
soviética, e sobretudo humanamente menos custosa,parece pois fazer uma viragem
mais ou menos rapidamente na direcção do liberalismo económico.

C) O MODELO LIBERAL
Este modelo é fundado sobre a economia de mercado, quer dizer,um sistema no
qual, pelo menos em teoria, a produção e a distribuição dos produtos e dos serviços
são assegurados por empresas em concor-rência e no qual igualmente a
confrontação da oferta e da procura determina o preço. A industrialização pode
fazer-se através de indús-trias não consideradas, no modelo precedente, como
industrializantes.Trata-se de indústrias de bens de consumo, mesmo tradicionais
como o têxtil, cujos produtos são na sua maioria exportados e que devem pois
encontrar um mercado internacional. Conta-se com o diferencial de salários entre
países desenvolvidos e países em desenvolvimento para atrair os investimentos
estrangeiros e para conquistar as partes de mercado mundial em alguns segmentos
bem visados.
Nos anos 50, este modelo, pelo menos no seu perfil puro, teve
relativamente pouco sucesso. Mesmo entre os futuros dragões asiáti-
cos,de quem se exalta com frequência o espírito liberal,o Estado
interveio largamente, pelo menos de início. Pratica então o que se
chamou um «intervencionismo liberal», quer dizer, de largas inter-
venções, mas no âmbito da economia de mercado. O Estado age atra-vés
de uma planificação flexível, indicativa e incitativa, bem como protecção
dos produtos nacionais, etc. Incita a uma política de substi-

58-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


tuição de importações e o «remontar de fileiras» que visam fabricar vez mais
sofisticados. A Coreia do Sul, por exemplo, desenvolveu pri-construção automóvel e
à electrónica. A abertura aos mercados externos, e aos produtos vindos do exterior,
só lentamente se foi efec-tuando.O modelo, nos seus começos, difere relativamente
pouco do modelo intermédio acima estudado.
Foi por conseguinte depois de uma partida muito tímida, que o modelo liberal alastrou
em mancha de óleo. Alargou-se inicialmente com a liberalização das trocas comerciais,
encetada em 1947 no qua-dro do GATT (General Agreement on Tariffs and Trade),
prosseguida pelo Kennedy Round, o Tokio Round e o Uruguay Round. Um certo número de
países do Terceiro Mundo foram sendo a pouco e pouco integrados, de boamente ou
forçados, sob a pressão dos Estados Uni-dos, do FMI e do Banco Mundial, num sistema
mundial de trocas e foram a pouco e pouco liberalizando a sua economia. A desagregação
do modelo socialista na Ásia e em África, a democratização em curso nesta mesma África
fizeram passar um bom número de países do Terceiro Mundo a um modelo intermédio ou
mesmo directamente a um modelo francamente liberal. Os Estados que haviam optado
por uma via intermédia voltam-se, também eles, para o liberalismo eco-nómico. A questão
é pois de saber se esta evolução irá dar uma nova unidade ao Terceiro Mundo ou se, pelo
contrário, irá diferenciá-los mais do que nunca.

D) LIBERALISMO ECONÓMICO E UNIDADE


DO TERCEIRO MUNDO

Os apoiantes da tese da independência, para quem «o subdesen-volvimento de uns é


uma necessidade para o desenvolvimento de ou-tros» (Destanne de Bernis) estimarão
provavelmente que uma nova unidade do Terceiro Mundo está em vias de se criar uma vez
que,graças ao liberalismo económico generalizado, os países desenvolvi-dos (o Norte)
poderão mais do que nunca dominar os países em de-senvolvimento (o Sul).
Na realidade, a situação é muito mais complexa. Antes de mais, se os países
desenvolvidos estão em posição de força, uma vez que de-têm poder económico,
financeiro e tecnológico, não formam uma frente unida face ao Terceiro Mundo. A lentidão
das negociações do GATT e

A DIVERSIDADE ECONOMICA -59


a guerra económica movida entre Estados Unidos, Japão e Europa
testemunharam isso, e esta situação corre o risco de durar.
Por outro lado, no processo de mundialização das trocas que se está a realizar
(multiplicação por três das trocas de mercadorias e por dez do comércio dos produtos
manufacturados desde 1960), o le-que das situações económicas vai alargar-se nos
países do Terceiro Mundo. Cada um vai ter de se inserir na divisão internacional do
trabalho em função dos recursos do seu território, da sua posição geoestratégica, das
suas práticas políticas, da massa da sua popula-ção, do nível de qualificação e de
salário da sua mão-de-obra, do dina-geralmente, das suas estruturas económicas.
Ora, a capacidade de resposta à pressão dos países desenvolvidos difere muito de
país para país. Por exemplo, China, Brasil, México,Índia, Indonésia e África do Sul, que
representam seis 60% da popula-ção do Terceiro Mundo e uma parte ainda mais forte
do seu PNB, pos-suem meios sem termo de comparação com os dos pequenos países
da América Central, das Caraíbas e da África subsariana. Além disso, a capacidade para
aproveitar ao máximo uma integração no sistema-mundo é extremamente desigual de
país para país, pois os próprios níveis de desenvolvimento económico são muito
dissemelhantes.

II.UM DESENVOLVIMENTO ECONÓMICO DESIGUAL


Os países do Terceiro Mundo diferenciam-se evidentemente por pesos
económicos muito díspares. O PNB de dois deles, a China e o Brasil, ultrapassa
ligeiramente 500 mil milhões $ e classifica-os em 7.°e 9.° posições mundiais, antes da
Espanha (fig. 15). A Índia e o México,com mais de 300 mil milhões $, segue-os de
perto, nos 12.° e 16.°luga-res, ultrapassados por pouco pela Rússia. Este grupo dos
quatro pesa,só ele, mais de metade do PNB dos países do Terceiro Mundo.
Vem em seguida um grande vazio, dado que o país mais bem colo-cado, a
Indonésia, só chega em 23.° lugar com 190 mil milhões $; a Turquia, a Tailândia, a
Indonésia e o Irão seguem-se-lhe com 100 a 200 mil milhões $. Entre os países com
menos de 50 milhões de habi-tantes, a Argentina classifica-se em 17.° lugar no mundo
(280 mil milhões $), a Arábia Saudita em 27.° e a África do Sul em 29.°(cerca de 130
mil milhões $).

60-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD

A DIVERSIDADE ECONOMICA -61


FIGURA 15-PNB total (1995)

Em face destes grandes ou destes quase grandes (pelo menos pelo seu PBN),
dezenas de Estados dispõem apenas de um PNB inferior a 5 mil milhões $ e, entre
eles, muitos não atingem mil milhões $.
Estas diferenças não se devem somente à massa da população,uma vez que o
PNB do Bangladesh (128 milhões de habitantes) não ultrapassa o de Porto Rico (4
milhões). Elas devem-se igualmente àprópria estrutura da economia destes países.

A) DO TOTALMENTE AGRÍCOLA AO POUCO AGRÍCOLA


Simplificando muito, pode-se dizer geralmente que quanto maior for a
proporção dos agricultores num país, mais o seu nível de desen-volvimento
económico é fraco. Ora só podemos constatar o quanto as situações são, deste
ponto de vista, contrastadas (fig. 16). Mesmo res-tringindo-nos aos países com
mais de 50 milhões de habitantes, veri-ficamos que a Etiópia ocupa ainda 79% dos
seus activos na agricul-tura, enquanto o México emprega apenas 23%, uma
percentagem inferior à dos países da Europa do Leste. Em quatro países, a propor-
ção dos agricultores atinge ou ultrapassa 60%, enquanto em dois ou-tros (México,
Brasil) não excede os 30%.

62-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


Como o sector agrícola é geralmente menos produtivo do que os que o da
māo-de-obra na população activa. As diferenças são pois Cuba, a agricultura cria
ainda mais de 60% do PNB, contra menos de 10% em países tão diferentes como
a Arábia Saudita, a Venezuela,o México e a África do Sul.
A intensividade e a produtividade da agricultura são também muito
desiguais. Se se medir a primeira pelo consumo de adubos por hectare,ela é na
China, no Egipto ou até no Bangladesh e na India dezenas de vezes superior ao
que é na maior parte dos países da Africa sub-sariana. Em média esta utiliza
doze vezes menos fertilizantes do que a Ásia e ainda quatro vezes menos do que
a América Latina.
As diferenças de produtividade são menos sensíveis, mas que di-ferenças,
no entanto, entre os agricultores com elevados rendimen-tos da Argentina, do
Uruguai ou mesmo do Punjabe indiano e a agri-cultura de subsistência de uma
boa parte da África subsariana ou de uma parte da Ásia. O produto bruto por
activo agrícola e por ano é,com algumas excepções, por todo o lado inferior a
400 $ na África subsariana e na Ásia, enquanto ele está frequentemente acima
de 1000 na América Latina, tirando as Caraíbas e a América Central.
É verdade que o valor do conjunto das produções agrícolas é muito desigual
dependendo dos Estados. A China e a Índia, só elas, assegu-ram mais de 30%.
Juntando a elas as produções do Brasil, da Indonésia, do Irão e do México,
atinge-se 50% do total. Em cada um destes países, o valor acrescentado
ultrapassa vinte mil milhões de dólares, enquanto raramente atinge mil milhões
nos países da África Subsariana.
Estes factos são geralmente bem conhecidos. Pelo contrário, nem sempre se
insiste suficientemente nas enormes diferenças de poten-cial industrial entre os
países do Terceiro Mundo.

B) DOS NPI AOS ESQUECIDOS DA INDUSTRIALIZAÇÃO


Conquanto uma agricultura sólida possa ser a base de um desen-
volvimento, e o petróleo ou o turismo possam ter participado na descolagem
económica de certos países, é ainda assim a indústria manufactureira que
continua a ser o motor do desenvolvimento.cultura e dos serviços e que
continua a ser portanto a chave do desen-

A DIVERSIDADE ECONOMICA-63
FIGURA 16-Repartiçāo da população activa por sectores económicos (1995)
(países com mais de 50 milhōes de habitantes)

volvimento. É através dela que se distinguem os países desenvolvi-dos. Foi


através dela que os quatro dragões se juntaram a estes últi-mos. É certamente
através dela que os outros NPI seguiram o seu rasto. Simplificando uma vez
mais, pode-se dizer que, postos de parte os países petrolíferos, quanto mais a
indústria tem peso no em-prego e no PNB de um país do Terceiro Mundo, mais o
seu nível de desenvolvimento é elevado. Ora, no interior do Terceiro Mundo, os
desfasamentos são consideráveis.
Nos países com mais de 50 milhões de habitantes, a proporção da população
activa empregada na indústria escalona-se de 7% (Etiópia)a 25-30% no México,
no Brasil (fig. 16), quer dizer números que se

64-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


sariana, a indústria ocupa menos de 10% da mão-de-obra, enquanto
ela ultrapassa frequentemente os 20% na América Latina.
As diferenças são ainda mais largas se se retiver o peso da indús-tria
(incluindo o sector energético) no PNB. Em aproximadamente quinze
países com mais de 10 milhões de habitantes, a indústria con-tribui com
menos de 20% para o PNB, e esta proporção cai a menos de 10% na
Somália e no Sudão. Ao contrário, em cerca de dez outros Estados, 40 a
50% do PNB provém do sector industrial e se para al-guns é o sector
energético que aumenta um pouco artificialmente o PNB,para outros,
como a China, é realmente o sector manufactureiro que cria o essencial
do PNB. Numa dúzia de outros países enfim,numerosos no Sudeste
asiático e na América Latina, varia ainda en-tre 30 e 40% da riqueza
nacional que são gerados pela indústria.
As diferenças tornam-se enormes se se comparar agora a capaci-dade
industrial global dos Estados do Terceiro Mundo. Em cerca de sessenta
países dos quais se conhece com bastante precisão o valor acrescentado
pela indústria manufactureira, quinze aproximadamente situam-se a
menos de 300 milhões de dólares. O sector industrial é aínulo ou quase
nulo e, quando existe, fica circunscrito ao agro-alimen-tar ou, no melhor
dos casos, ao têxtil. Entre os dez «grandes» do Ter-ceiro Mundo, pelo
contrário, ultrapassa os 20 mil milhões $. Sete den-tre eles situam-se
entre 20 e 50 mil milhões (Indonésia, Filipinas,Tailândia, Turquia, Irão,
México, África do Sul), os outros destacam--se nitidamente: a Índia para
70 mil milhões, o Brasil para 170 mil milhões e a China para perto de 320
mil milhões $. Estes últimos três países classificam-se em lugares muito
honrosos no mundo, pois são respectivamente 7.°, 8.° e 12.° potências
industriais mundiais. O va-lor acrescentado pela indústria chinesa
ultrapassa a do Reino Unido,a do Brasil aproxima-se da de Espanha.
Aproveitando-se de um forte diferencial de salários em relação aos países
desenvolvidos, atraindo tecnologias e investimentos estrangeiros e
utilizando da melhor for-ma os trunfos locais (recursos naturais e
humanos, posição em rela-ção aos grandes centros económicos, etc.),
alguns destes países, come-çam a ganhar importância no mercado
internacional e podem ser considerados como NPI.
Esta expressão de «Novos Países Industrializados» foi criada pe-países
desenvolvidos. Mas outros merecem agora este nome ou estão de um
vasto mercado interno e de meios suficientes para conduzir

A DIVERSIDADE ECONÓMICA -65


cessos e itinerários diversos, alcançar uma certa envergadura indus-
trial.

1.BRASIL E MÉXICO

Os dois Estados-continentes latino-americanos correspondem bastante


bem à definição dos NPI, conquanto a sua indústria,que tem antecedentes
desde a época colonial, tenha arrancado verdadei-ramente entre 1930 e
1950, quer dizer relativamente cedo. Mas o grande arranque data, na
verdade, sobretudo dos anos 1950.
a) O palmarés industrial do Brasil é particularmente impressio-nante uma
vez que o país se coloca nos cinco a doze no mundo no referente à produção
de aço (melhor do que a França), de fio de algo-dão, de navios (duas vezes a
tonelagem francesa), de cimento, de elec-tricidade, de automóveis. Em vinte
anos, a produção industrial foi multiplicada por quatro e desde 1988, as
exportações de produtos manufacturados prevalecem sobre as exportações
agrícolas.
A indústria agro-alimentar é aí uma das mais poderosas e uma das mais
desenvolvidas do mundo. Indústrias açucareiras e destila-rias, associadas à
primeira produção mundial de cana-de-açúcar, forne-cem não apenas açúcar
e álcool, mas igualmente 15 mil milhões de litros de etanol, destinados aos
três milhões de veículos que utilizam este carburante; deste ponto de vista, os
brasileiros têm pelo menos vinte anos de avanço relativamente a França.
Desde 1970, o país equi-pou-se com fábricas que transformam a soja em
bagaço e em óleo.O café já não é simplesmente torrificado no próprio local,
fazem cada vez mais café solúvel numa das fábricas mais modernas do
mundo, a Londrina, no Paraná. O cacau é utilizado na fabricação de produtos
chocolatados. O Brasil tornou-se num dos primeiros produtores mun-diais de
sumos de fruta. Produz ainda massas alimentares,tabaco,cerveja, conservas e
congelados.
O próprio têxtil, tradicionalmente disperso em estabelecimentos de
pequena dimensão e dotado de um material envelhecido, está a concentrar-
se e a modernizar-se rapidamente. Mas apesar da sua importância, agro-
alimentar e têxtil, sectores tradicionais dos países do Terceiro Mundo já só
contribuem para um quarto do valor acres-centado pela indústria dado que
esta é diversificada e reforçada.
O Brasil tornou-se o sexto mercador de armas mundial,vende não
somente aos países do Terceiro Mundo mas também aos países
desenvolvidos. Embraer, por exemplo, vendeu aviões à Royal Air Force [7] e o seu
modelo «bandeirantes», simultaneamente civil e mi-A indústria monta todos os anos 1
600 000 veículos e exporta apare-lhos de precisão, relógios e diversos equipamentos
mecânicos. O Brasil lançou, em 1985, o seu primeiro satélite de telecomunicações
(Brasilstat), desenvolvido conjuntamente com os canadianos. Enfim,a informática
nacional consegue cobrir 95% das necessidades do país,para grande tormento dos
americanos que gostariam de penetrar este mercado demasiado protegido,
confrontando-se ainda com a concor-rência do Brasil nos mercados do Terceiro
Mundo.
b) A indústria do México é muito menos poderosa que a do Brasil e também
menos autónoma. Por exemplo, 100% da construção auto-móvel e da farmácia, 70 a
80% do têxtil e da electrónica são controla-dos pelo capital estrangeiro,
essencialmente americano.As 1800maquiladoras, empresas concentradas nas zonas
francas coladas àfronteira dos Estados Unidos, dizem bastante da dependência do
México em relação ao seu poderoso vizinho, com o qual realiza dois terços do seu
comércio. Por outro lado, contrariamente à do Brasil, a indústria mexicana tem e terá,
com a integração do país na ALENA,cada vez mais dificuldades para desenvolver a sua
própria tecnologia.Enfim, a crise financeira que o país conheceu em Dezembro de
1994atingiu duramente a indústria: a produção diminuiu 8% em 1995 e o têxtil-
vestuário foi «sinistrado» [20].
Não obstante, a indústria mexicana não deixa de ser a décima--primeira do
mundo. As indústrias agro-alimentares e têxtil são me-nos poderosas do que no
Brasil, mas estão longe de serem apenas,também elas, actividades tradicionais.
Bebidas gasosas e cerveja são fabricadas em unidades muito modernas e o
têxtil, embora menos modernizado, exporta os seus produtos para os Estados
Unidos. Não sendo tão variada como a indústria brasileira, a do México aparece
mesmo assim por volta do décimo-segundo lugar no mundo para a produção de
automóveis, de têxtil sintético, de brinquedos,etc. No entanto, é na Ásia que se
encontram os NPI mais numerosos e mais dinâmicos.

2. A CHINA E A ÍNDIA

tura industrial, de que se tratará mais adiante, e pela sua importân-

66-ROBERTCHAPUIS/THIERRY BROSSARD

A DIVERSIDADE ECONOMICA-67
cia. Primeiro país industrial do Terceiro Mundo pelo valor da sua a qual
doravante será preciso contar. A indústria chinesa, que progride fornece
agora cerca de 80% das exportações do país.
aço triplicou entre 1974 e 1980, duplicou uma vez mais entre 1980 e A China
é hoje o quarto construtor de navios. A tradicional indústria têxtil moderniza-
se; coloca-se em primeiro lugar no mundo e faz uma dura concorrência aos
produtos ocidentais.
Certas indústrias, desenvolvidas por razões estratégicas, detêm um lugar
eminente. Desde 1964,a China tornou-se uma potência nuclear.É hoje o
quinto produtor de armas do mundo. Certas tecnologias, àpartida militares,
passaram para o sector civil. Graças ao seu foguetão «longa marcha», o país
tornou-se um concorrente aeroespacial dos Es-tados Unidos e da Europa:
paradoxo, seis satélites americanos de comu-nicação foram postos em órbita
por foguetões chineses em 1992.Quatro centrais nucleares foram
recentemente terminadas e uma dezena de-verá estar a funcionar no final
deste século. São inteiramente concebi-das por engenheiros nacionais e
Pequim vende inclusivamente a sua tecnologia aos estrangeiros: um acordo
de cooperação nuclear, em prin-cípio civil, foi assinado com o Irão.
Mas algumas indústrias de bens de consumo estão igualmente em grande
progresso. De níveis de produção quase nulos, passou-se numa boa dezena
de anos a recordes: cerca de 10 milhões de máquinas de lavar (1.° do
mundo), 8 milhões de televisores a cores (3.°), 8 milhões de frigoríficos,25
milhões de vídeos, rádios, relógios, jogos que ali-mentam em 50% as firmas
de Hong-Kong. A produção de compu-tadores arrancou em 1983 e se a sua
produção de automóveis parti-culares é ainda negligenciável, a dos veículos
utilitários é duas vezes superiores à da França. Toda esta produção está longe
de estar total-mente sob dependência estrangeira dado que as Zonas
Económicas Especiais, onde se investe o essencial do capital estrangeiro,não
re-presentam senão 1% da produção industrial e 4% das exportações.
b) A Índia não pode certamente comparar os seus desempenhos
industriais aos do Brasil, nem aos da China uma vez que só num sector, o
têxtil, se coloca em boa posição no palmarés mundial.Por outro lado, a
indústria indiana, durante muito tempo muito prote-gida, é ainda fracamente
produtiva: os seus produtos são pois de um preço elevado e de uma
qualidade medíocre.
Todavia, as sua fábricas são capazes de fabricar a quase totali-dade dos
produtos de consumo corrente. Em certos sectores de ponta,tência nuclear
militar e dispõe hoje, a seguir à China, do potencial conquistado um lugar na
aeronáutica (aviões, helicópteros),mento, em 1980, de um foguetão e de
satélites de fabricação nacional.
A indústria indiana está também presente no fabrico de máquinas--
ferramenta,de relógios, de automóveis, de camiões, de motorizadas,quer
seja com capitais estrangeiros (Suzuki disfarçada em Marutti),ou com
capitais locais. Outros segmentos se abriram. Muito tempo atra-sada por
desejo de não fazer apelo senão a tecnologias nacionais, a informática
arrancou desde que em 1985 o governo aceitou, através do sistema das
«joint ventures» (associação de uma empresa local a uma empresa
estrangeira com vista a uma actividade comum), transferir tecnologias
ocidentais. Sinclair, Commodore, Olivetti constroem doravante
computadores em associação com firmas indianas [26].Cer-tas firmas
tornaram-se verdadeiras multinacionais que se implanta-ram no Sudeste
asiático e em África; hoje os capitais indianos investi-dos no estrangeiro são
superiores aos capitais estrangeiros que o são na Índia. Enfim, ainda que o
país continue pouco exportador (5% do seu PNB), os produtos
manufacturados ocupam cada vez um maior lugar nas exportações e
atingem hoje cerca de 75% do total.
Atrás destes grandes dragões ascendem pequenos dragões (cha-mados
por vezes «tigres-bebés»...) de dentes afiados, muitas vezes mais dinâmicos
do que os próprios Estados-continentes e cuja indús-tria já realiza entre 20 e
50 mil milhões $ cada ano. Todos eles per-tencem à Ásia do Sudeste.

3. OS PEQUENOS DRAGOES DO SUDESTE ASIÁTICO


a) A Indonésia, devido à sua população (200 milhões de habitan-tes),
situa-se a meio caminho entre o Estado-continente (mas a ex-pressão
convém pouco a este arquipélago de mil e uma ilhas) e o pe-queno dragão. É
cosiderada frequentemente como um grande dragão em potência, dado que
a sua actividade manufactureira progride ao ritmo médio de 8% ao ano.
Ela dispõe de trunfos não descuráveis. Está bem dotada de recur-(13.°
produtor mundial com 75 milhões de toneladas) e gás natural

68-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD

A DIVERSIDADE ECONÓMICA- 69
cidades de exportações. Está situada no centro de uma zona econó-mica
próspera. A sua mão-de-obra de baixos salários, mas em rápida do
liberalismo económico: em 1989, mais de um terço das empresas públicas
foram privatizadas. A Indonésia vê pois serem investidos maciçamente
capitais vindos do Japão sobretudo, mas também de Taiwan, da Coreia do
Sul, países que desagradados com o aumento do custo da sua mão-de-obra,
procuram no exterior salários ainda bai-xos. Os ocidentais, e particularmente
os americanos e os alemães,procuram também aproveitar esta situação
interessante.
Só no ano de 1994, os estrangeiros investiram 23 mil milhões $,dos quais
três quartos foram para a indústria. Já hoje 15% da popula-ção activa
trabalha na indústria manufactureira (mais 5% nas mi-nas) e criam 20% do
PNB (mais 15% nas minas). Desde 1988, os pro-dutos manufacturados
representam mais de metade das exportações.
Até aqui os investimentos, nacionais ou estrangeiros, incidiram
preferencialmente sobre indústrias mais ou menos ligadas aos recur-sos
nacionais tais como a refinação de petróleo, a siderurgia, a fabri-cação de
alumínio (230 000 t), de estanho (2.° produtor mundial), de borracha ou de
certos produtos de base como o cimento, os fertilizan-tes, o papel, os
têxteis, etc. Mas um início de diversificação está em curso. Em suma, a
Indonésia está a sofrer uma evolução que os qua-tro dragões sofreram há
vinte anos, mas sobre bases um pouco dife-rentes. Em contrapartida, para
países como a Malásia ou a Tailândia,os processos são bastante semelhantes
aos que permitiram aos dra-gões descolar economicamente.
b) A Malásia é dos países do mundo onde a produção industrial aumenta
mais rapidamente (cerca de 15% ao ano) e onde os investi-mentos
estrangeiros são proporcionalmente mais importantes (dois terços do total).
Estes capitais são atraídos simultaneamente pelas riquezas minerais
(petróleo, gás, estanho), pelo bom nível escolar da população (que. tem
também a vantagem de falar em inglês), pela estabilidade política, por uma
política sistemática de criação dezo-nas francas e pela liberalização da
economia: a grande parte das agên-cias governamentais estão actualmente
privatizadas. Além disso, for-tes minorias chinesas (30% da população) e
indiana (10%) contribuem para dinamizar a economia local, apesar de uma
política favorável àetnia malaia.
Os capitais estrangeiros interessaram-se sobretudo pela refina-ção de
petróleo, pelas indústrias agro-alimentares, pela construção

70 -ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


automóvel (250 000 veículos), pela fabricação de aparelhos de ar con-primeiros
lugares mundiais, e pelos artigos de borracha. O país bene-borracha. Todos os
grandes da profissão aí se instalaram, entre eles Mapa, filial de Hutchinson;
mais de metade da produção mundial érealizada aqui.
Uma política de incitação à multiplicação de pequenas empresas (criação de
«nurseries» por exemplo) encoraja o investimento local em indústrias como o
têxtil oua transformação da borracha, mas também em segmentos menos
tradicionais como a electrónica.
Doravante, a indústria manufactureira, criando 30% do PNB (mais 15% para
as minas), supera a agricultura (18%). Enquanto em 1985,os produtos
industriais formavam um terço das exportações,hoje re-presentam 70%. A
Malásia é pois indiscutivelmente um NPI.É igual-mente o caso da Tailândia.
c) A Tailândia, à saída da guerra, apenas possuía no total e para tudo uma centena
de empresas com mais de 50 assalariados e a in-dústria não ocupava senão 2% da
população activa. Após um arran-que lento, o crescimento acelerou-se; desde os anos
70, este foi em média de 7%, com uma aceleração no fim do período (9%). Benefi-
ciando também ela de uma mão-de-obra barata mas bem escolarizada (apenas 6% de
analfabetos) e animada igualmente por uma colónia chinesa dinâmica, a Tailândia
encontrava-se bem colocada para rece-ber os investimentos do Japão e em seguida os
dos quatro dragões: sóno ano de 1994, 5 mil milhões $ foram assim injectados.
A indústria voltou-se naturalmente primeiro para o agro-alimen-tar
(conservas de ananás, de tomate, de camarão, de lagosta, etc.),para sectores
com forte utilização de mão-de-obra como o têxtil e o vestuário ou para
produtos que valorizam os recursos locais, como o estanho do qual a Tailândia é
o sexto produtor mundial. Em seguida,diversificou-se rapidamente para outros
sectores (calçado, artigos de desporto), e para alguns segmentos
tecnologicamente mais avança-dos: montagem de automóveis (400 000
veículos actualmente),fabri-cação de circuitos electrónicos e eléctricos, de
relógios, de brinque-dos,etc.
A indústria ainda só ocupa oficialmente 10% da população, na Ela
representa hoje 75% das exportações, enquanto era responsável tirem nos
países vizinhos menos desenvolvidos do que o seu,como a

A DIVERSIDADE ECONÓMICA - 71
Birmânia, a China e o Vietname: desde que a exploração da madeira

é interdita no seu país, arrasam as florestas birmanesas...

Tirando estes países que têm já potenciais industriais não negligenciáveis,


alguns outros começam a penetrar, ou deveriam játer penetrado se diversas
circunstâncias internas não os tivessem impedido. Estamos a pensar na
Argentina e na Venezuela na América Latina, nas Filipinas, na África do Sul, na
Turquia e em alguns países do mundo árabe-muçulmano. Examinemos três
casos.

4.OS PRETENDENTES

a) A Argentina, que havia começado uma verdadeira descolagem


industrial antes da guerra e em seguida no período peronista e no pós-
peronista, viu o seu progresso decair devido à sua instabilidade política e à
ditadura militar entre 1976 e 1983, coroada pela derrota das Maldivas. A
indústria está hoje longe de ser descurável pois ocupa 30% da população
(com as minas) e participa em igual proporção para o PNB.Mas, exceptuando
alguns equipamentos industriais e de trans-porte, bem como uma pequena
quantidade de aço que são vendidos ao exterior, ela contenta-se quase
exclusivamente com o mercado nacional. Abertura (no âmbito do
MERCOSUR) e privatizações fize-ram retomar rapidamente a marcha para
diante apesar da recessão de 1995, devida às repercussões da crise
mexicana.
b) Nas Filipinas, a indústria manufactureira fornece já um terço do PNB,
ou seja, mais do quea agricultura. Ao lado das indústrias agro-alimentares, do
têxtil e do cimento, alguns outros sectores como o automóvel, a electrónica,
a farmácia começam a ocupar uma certa posição. Mas a instabilidade política
do país, a guerrilha comunista,as mudanças de orientação económica
submeteram o país a uma su-cessão de «stop and go», pouco favoráveis ao
investimento local ou estrangeiro.Depois de ter atingido um ritmo de cerca
de 12% ao ano por volta dos meados dos anos 1980, o crescimento industrial
estápróximo do zero, no início dos anos 1990. A abertura para o estran-geiro,
as privatizações, a redução do défice orçamental permitiram de novo o
arranque do investimento, nomeadamente americano, e uma certa retoma
industrial (+ 1% ao ano).
c) Na Turquia, 31% do PNB provém da indústria manufactureira.Esta
apoia-se ainda essencialmente em algumas actividades de base como o
trabalho dos metais (aço, alumínio), o cimento, os fertilizan-tes, o agro-
alimentar e sobretudo o têxtil que por si só fornece um
química). Contudo, problemas internos (minorias curda e arménia,plenamente
as suas potencialidades, em particular de um nível de da na CEE foi uma vez
mais adiada em 1989, mas uma união adua-neira com a União Europeia entrou
em vigor em 1996.
ou pelo seu peso industrial ou pelo seu dinamismo ou pelas suas
potencialidades, quantos outros não estão praticamente desprovidos de
indústrias, não fosse a transformação de alguns produtos locais.

5. OS ESQUECIDOS DA INDUSTRIALIZAÇÃO

A maior parte destes esquecidos da industrialização localiza-se na África


subsariana. Com efeito, três quartos dos países que criam menos de 300
milhões de valor acrescentado industrial situam-se aí.O valor acrescentado da
África Subsariana (excluindo a Africa do Sul)é quase equivalente ao da Bélgica.
Os outros anões industriais (menos de 600 milhões $) são países da Ásia
como o Butão, o Nepal, o Laus. Uns quinze países de outros Estados realizam
pouco mais de mil milhões de valor acrescentado industrial. São as mais das
vezes países de pequenas dimensões,aqui sobretudo da América Latina
(Honduras, República Dominicana,Jamaica,Paraguai, Bolívia), mas também
alguns outros muito mais populosos.
1,1 mil milhões de $ de valor acrescentado industrial, se encontra mais ou
menos ao mesmo nível das Honduras, contudo, dez vezes menos povoado.
Este país, onde somente 14% da população activa trabalha no sector
secundário, nunca se industrializou verdadeira-mente, tirando algumas
actividades no agro-alimentar, nos curtumes e no têxtil. Cerca de trinta anos
de guerra civil quase ininterrupta,durante os quais o orçamento militar
absorveu 60% do orçamento nacional, bem como a nacionalização do conjunto
do sector impedi-ram qualquer desenvolvimento industrial.
Neste país de 120 milhões de habitantes, o valor acrescentado da in-
inferior à da Tunísia (contudo, treze vezes menos povoada) e do

72 -ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


lhoes de habitantes. Somente 18% da população activa tem um empre-ção tenha
arrancado sob o regime britânico e ainda que o regime Paquistão ocidental, hoje a
indústria contenta-se frequentemente em (algodão, camarão), exceptuando, no
entanto, os produtos manufac-turados à base de juta e do pronto-a-vestir.
Outros casos não deixam de surpreender, como o do Zaire. Apesar de um solo
que é um autêntico mealheiro (cobre,diamantes,ouro,cobalto) e um potencial
eléctrico considerado um dos primeiros de todos do mundo, a sua indústria
manufactureira cria menos de mil milhões $ de valor acrescentado, não emprega
mais de 10% dos acti-vos e só representa 8% do PNB. Mas a fortuna do ex-
presidente Mobutu está estimada em 20 a 30 mil milhões de francos... Voltare-mos
a estes problemas da industrialização da África subsariana.
Constata-se uma vez mais a diversidade do Terceiro Mundo.Ao lado de
potências industriais que podem por vezes fazer frente aos países ocidentais,
encontram-se os anões (não apenas nos pequenos Estados) e, neste intervalo,
países que com potencialidades e estraté-gias diversas tentam conquistar um lugar
ao sol. A mesma observa-çāo poderá ser feita a propósito das actividades terciárias
e da aber-tura económica para o mundo.

C) SERVIÇOS E COMÉRCIO: UM LEQUE MUITO ABERTO


Considera-se habitualmente que os países do Terceiro Mundo são ainda pouco
terciários. Globalmente este ponto de vista mantém-se válido uma vez que a
parcela da mão-de-obra ocupada neste sector éde 28% nos países do Terceiro
Mundo contra 60% nos países desen-volvidos.
Todavia, esta média tem pouco significado se se considerarem as grandes
diferenças que separam os países do Terceiro Mundo uns dos outros, mesmo só
retendo uma vez mais aqueles que ultrapassam 50milhões de habitantes (fig. 16).
Com efeito, entre estes, cerca de cinco em dez ocupam 30% da sua população
activa, ou menos, no comércio e nos serviços. Entre os mais populosos, apontam-
se a China (16%), a Índia (22%), o Bangladesh e o Paquistão (30%). Em
contrapartida,outros na América Latina, aproximam-se da barra dos 50%. No total

A DIVERSIDADE ECONÓMICA-73

74-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


de activos superior à da Grécia ou da Rússia, e mais ainda da Poónia,dos. Se
se for para os extremos, que margem entre os 60% da Argen-tina e os 11%
da Tanzânia.
sua parcela no PNB é relativamente grande comparada com a da po-fracas
embora continuem a ser sensíveis. Em oito países, a parte do sector terciário
no PNB não atinge ou com dificuldade atinge os 30%;é o caso nos países
comunistas (ou daqueles que o foram) como a China,Moçambique e Cuba
onde as funções de distribuição sã0 es-truturalmente reduzidas, mas
também no Uganda. Em quinze ou-tros, pelo contrário, a proporção do
terciário no PNB atinge ou ultra-passa os 50% e o México ultrapassa os 60%.
Entre os pequenos países,o limiar de 80% é atingido no Panamá.
A análise das trocas exteriores dá uma nova medida da diversidade dos
países do Terceiro Mundo. Aproximadamente um terço dos Estados com
mais de 10 milhões de habitantes continuam a estar relativamente pouco
implicados nas trocas internacionais, uma vez que as exportações
representam menos de 10% do seu PNB. Reco-nhece-se aqui a Índia, que
durante muito tempo procurou um desen-volvimento autocentrado, e
sobretudo os Estados que estruturalmente pouco têm para exportar ou
então que problemas actuais impedem de exportar (Bangladesh, Etiópia,
Tanzânia, Peru). Um outro terço dos Estados exporta o correspondente a
entre 10 e 20% do seu PNB.Trata-se da China, do Paquistão, das Filipinas, do
México, de Marro-cos,por exemplo.
Em contrapartida, um último terço está ainda mais implicado no
comércio internacional. Alguns exportadores de petróleo, como a Indonésia,
ou de produtos minerais diversos como a África do Sul, o Zimbabué, o Chile
exportam o equivalente de 20 a 30% do seu PNB.Outros estão mais abertos
ainda para o mercado mundial (entre 30 e 70% do seu PNB) tais como os
exportadores de petróleo, como a Arábia,a Nigéria, ou de matérias-primas
agrícolas ou minerais como o Zaire,Cuba ou a Malásia (80%).
O valor global das exportações discrimina ainda de forma muito queno
terço dentre eles exporta mais de 20 mil milhões de $.A China guem-se com
40 a 80 mil milhões simultaneamente países produto-

A DIVERSIDADE ECONÓMICA-75
res de petróleo (México, Indonésia, Arábia Saudita) e os NPI expor-Entre 20
e 40 mil milhoes $ vêm essencialmente os produtores de
se esperaria da sua população ou mesmo do seu peso económico. En-
Colômbia, as exportações incidem sobre menos de 10 mil milhões $:0ao
estrangeiro e a Etiópia 300 milhões. A China e o México exportam só eles
tanto como os cerca de trinta países mais mal posicionados.4 Enfim,as
exportações de serviços, indicador de um certo grau de sofisticação
económica, são também elas reveladoras das disparidades do Terceiro
Mundo. Antes de mais, um terço dos Estados não exporta nenhum serviço e
um outro terço exporta menos de mil milhões de $.No último terço, apenas
alguns ultrapassam os 10 mil milhões $:China, Tailândia, Turquia, Egipto,
Brasil, México, Arábia Saudita.·

D) ESTRUTURAS ECONÓMICAS CONTRASTADAS


, A heterogeneidade global das estruturas económicas dos países do
Terceiro Mundo manifesta-se claramente através da repartição da
população activa entre os diferentes sectores,(fig.16).Efectivamente,se nos
cingirmos aos países com mais de 10 milhões de habitantes,podem ser
destacados cinco tipos.
Um primeiro tipo inclui os países mais atrasados. Netes a agricul-tura
ocupa de 70 a 85% da população, contra 10% ou menos na indús-tria e 10 a
20% nos serviços. A economia permaneceu aqui estrutu-ralmente agrícola e,
mais ainda, uma agricultura pouco desenvolvida.Nove países entram nesta
categoria (Etiópia,Burkina Faso,Madagáscar, Nepal, Uganda, Sudão, Malavi,
Mali, Tanzânia). Verifi-caremos que todos,à excepção de um, são africanos.
O segundo tipo é menos agrícola, mas vê ainda mais de metade dos seus
activos trabalharem na agricultura, sem que a proporção ultrapasse os 70%.
O emprego industrial continua fraco (entre 10 e 20%) mas começa a ganhar
importância, sobretudo na China onde ultrapassa um pouco a barra dos
20%. O mesmo se poderá dizer dos serviços que se situam entre os 15 e
30%. Nove países africanos si-tuam-se neste grupo, pertencendo os outros
ao continente asiático,entre os quais os dois gigantes (China e Índia, e dois
outros Estados povoados com mais de 100 milhões de habitantes
(Indonésia,

76-ROBERTCHAPUIS/THIERRY BROSSARD
Bangladesh). Por si só, este grupo inclui perto de 60% da população
do Terceiro Mundo.

No terceiro tipo, os agicultores formam doravante menos da A proporção

dos activos do sector terciário ultrapassa a do tipo prece-países, o emprego

secundário ultrapassa os 20%; classificam-se aqui candidatos a este título que

se recrutam na Ásia (Indonésia, Malásia,Irão, Egipto, Marrocos, Turquia).


No quarto tipo, a agricultura começa a tornar-se marginal no emprego,sem
ser, no entanto, negligenciável (entre 10 e 30% dos activos).O peso da mão-de-
obra industrial lembra o tipo precedente (entre 20 e 30% dos activos). É
geralmente o terciário que mais bene-ficia com a marginalização do sector
agrícola. Com efeito,por todo o lado, à excepção da África do Sul, serviços e
comércio ocupam mais de 45% da mão-de-obra, muitas vezes mais de 50%, por
vezes 60% e mais (África do Sul, Arábia Saudita, Argentina, Venezuela). A estru-
mente da dos países desenvolvidos; podemos mesmo compará-la à de
Espanha, de Portugal ou da Rússia. À excepção da África do Sul, da Argélia, da
Arábia Saudita e da Síria, todos são latino-americanos.

III. VÁRIOS TERCEIROS MUNDOS?


Não há pois um só Terceiro Mundo. Doravante empregaremos a expressão
no plural para designar este conjunto de países dentre os quais alguns são sem
dúvida económica e socialmente atrasados (pelo menos se os compararmos às
normas ocidentais), enquanto outros jáatingiram um desenvolvimento que é da
mesma ordem, ou mesmo por vezes superior ao de certos países considerados
tradicionalmente como desenvolvidos (países do Leste, Portugal, Grécia). Uma
ques-tão se coloca: se existem vários Terceiros Mundo, quantos se podem
enumerar?

A)QUANTOS TERCEIROS MUNDOS?


guinte, existirão tantos Terceiros Mundos quantos os países classifi-

A DIVERSIDADE ECONÓMICA-77
cados, tal como faz o Banco Mundial, apenas em função do seu PNB fraco
rendimento (menos de 750$), as economias de rendimento in-tia superior
(3000 a 9000$), por fim as economias de rendimento ele-vado (mais de
9000$)?
Quem percorreu um bom número destes países e pôde pois compará-los
sente, mesmo de forma muito intuitiva, que o nível e a natureza do próprio
desenvolvimento diferem do México para a China, de Marrocos para o
Quénia, por exemplo. Apercebemo-nos então que a pertença a esta ou
àquela grande área de cultura deve ter de facto a sua importância. Estas
áreas culturais, moldadas por uma história e/ou uma língua e/ou uma
religião e/ou uma ideologia e/ou um meio comuns, contribuíram para
modelar os modos de pensar, de sentir e de agir, e portanto atitudes ou
talvez atitudes capazes de integrarem mais ou menos bem a cultura
tecnicista que conduz ao desenvolvimento, pelo menos tal como o entende o
Ocidente.
A nossa tese é pois que os Terceiros Mundos podem ser reagru-pados em
quatro conjuntos: a América Latina, o mundo árabe-mu-çulmano, a Africa
subsariana e a Ásia. Com efeito, cada uma destas áreas reagiu, e reage ainda
de maneira diferente aos modelos económicos,políticos, sociais e culturais
propostos ou impostos pelos países ocidentais (incluindo o Japão) seja
directamente, através da colonização por exemplo, seja indirectamente
através da mundia-lização das trocas de produtos, de serviços, de capitais, de
informa-ções e de homens.-Cada um destes Terceiros Mundos atingiu pois
um nível de desenvolvimento diferente e apresenta características de
desenvolvimento originais, ainda que cada um, como veremos, revele
facetas regionais matizadas. Forneçamos algumas provas, antes de levar
mais longe a análise com a apresentação de cada um dos Tercei-ros Mundos.

B) PORQUÊ QUATRO TERCEIROS MUNDOS?

Por várias vezes já, podemos verificar que estes quatro Terceiros Mundos
apresentam diferenças sensíveis. Pudemos constatar nomea-damente que a
sua transição demográfica era mais ou menos avançada

78-ROBERTCHAPUIS/THIERRYBROSSARD
(fig.2) e que as suas estruturas económicas estavam longe de serem

análise estatística vão permitir confirmá-lo (quadro 4).

Uma primeira constatação se impõe. Para cada um dos critérios o leque abre-se
amplamente entre os extremos: duas vezes mais acti-vos agrícolas em África do que
na América Latina, quatro vezes me-nos energia consumida, PIB/habitante quatro
vezes inferior, cerca de duas vezes menos adultos alfabetizados, mortalidade infantil
mais de duas vezes inferior, fecundidade duas vezes mais fraca. Há real-mente um
mundo entre estes dois Terceiros Mundos!
Segunda constatação. Do que ressalta do aspecto económico (os quatro
primeiros critérios), a classificação mantém-se quase sempre idêntica: a América
Latina à cabeça, seguindo-se o mundo árabe-mu-çulmano e a Ásia, por último a
África sempre na cauda; o mundo árabe-muçulmano'só se encontra à cabeça no
referente ao consumo alimentar e energético.
Terceira constatação, no que respeita aos aspectos demográficos e sociais, a
América Latina vem sempre à cabeça mas, atrás,a ordem inverte-se uma vez que a
Ásia passa adiante do mundo árabe-muçul-mano: alfabetização um pouco melhor
na Asia, mortalidade infantil equivalente, fecundidade muito mais baixa. Em suma, a
Ásia asse-melha-se mais à América Latina do que à África.
Mas uma questão se levanta: estas médias não ocultarão, na rea-lidade,
situações muito contrastadas, de um Estado para o outro, no interior de cada um
dos Terceiros Mundos? Para responder a esta

QUADRO 4
Alguns indicadores relativos aos Terceiros Mundos

África
América
Mundo árabe-
Latina Subsariana
Activos agrícolas (em %)........... 27 35 60 59
Consumo de energia/hab.
(em kg-equivalente petróleo).
954 1195 446 250
PIB real/habitante ($)................ 5082 4390 2016 1270
Consumo de calorias/hab/dia ... 2753 3026 2528 2091
Alfabetizaçāo (em %) ...... 85 64 69 55
Mortalidade infantil (em ‰) ....... 41 51 52 93
Filhos por mulher......·.......... 3,1 4,6 3,1 6,3

A DIVERSIDADE ECONOMICA - 79
seguidas de classificações hierárquicas ascendentes, primeiro sobre a países com
mais de 10 milhões de habitantes que são os únicos repre-sentados nos gráficos.

2. TRÊS ANÁLISES FACTORIAIS E TANTAS OUTRAS CLASSIFICAÇOES

Classificadas inicialmente em função do seu nível de desenvolvi-mento


económico, estimado ele próprio a partir de 12 variáveis 1, os 52 Estados
escalonam-se ao longo de uma parábola que vai dos países mais avançados, em
cima à direita, aos países menos avançados, em cima à esquerda (fig. 17). Estes
últimos caracterizam-se simultanea-mente pelo lugar preponderante ocupado na
economia pela agricul-tura (tanto no emprego como no PNB) em detrimento da
indústria e do sector terciário, por um fraco consumo de energia e de fertilizan-tes,
por uma densidade rodoviária muito baixa, por uma dívida consi-derável, enfim por
um PNB por habitante muito fraco.
Constata-se que os países africanos são os mais mal classificados:nove fazem
parte do grupo 1, o menos avançado,e oito ainda fazem parte do grupo 2, também
ele mal colocado. No total, 90% dos Esta-dos africanos posicionam-se nestes dois
grupos economicamente na cauda. Os menos avançados dos países asiáticos
(Afeganistão,Bangladesh,Birmânia, Vietname...) situam-se no grupo 2, à excep-ção
do Nepal, atrasado no grupo 1, mas os mais numerosos ocupam o grupo 3 e, entre
eles, os três mais povoados: China, Índia, Paquistão.Entre os Estados asiáticos, 85%
fazem pois parte dos grupos 2 e so-bretudo 3.
Os grupos 4e 5, os mais avançados e que têm características exac-tamente
inversas às dos grupos 1 e 2, são essencialmente formados por Estados árabe-
muçulmanos ou latino-americanos; estes últimos são no entanto maioritários no
grupo 5 e, em geral, um pouco mais avançados do que os primeiros. Aliás, apenas
três países latino-ame-ricanos (a Colômbia, o Peru, ea Guatemala) se encontram
atrasados

1 Percentagem da população activa que trbalha na agricultura, nas minas, na in-


económicos, energia consumida por habitante, fertilizantes consumidos por hec-
tare, PNB/habitante, dívida em % do PNB.
FIGURA 17-AFC:Nível de desenvolvimento económico (países com
mais de 10 milhões de habitantes)

no grupo 3, bem como quatro árabe-muçulmanos (Turquia,Marro-cos,


Egipto,Iraque).
a ordem constatada mais acima em função do grau de desenvolvi-

80-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD

A DIVERSIDADEECONÓMICA-81
A DIVERSIDADEECONÓMICA-81
mento económico: América Latina primeiro, seguindo-se o mundo um
do outro, os dois últimos estando bastante desfasados em relação um
ao outro.
A síntese relativa ao nível de vida, realizada com dois descodifi-cadores2,
fornece resultados bastante comparáveis. Os países organi-zam-se no gráfico
segundo uma parábola que vai dos países cujo nível de vida é menos elevado, em
cima à esquerda, em direcção àqueles em que ele é mais elevado, em cima à
direita (fig. 18). Os primeiros distinguem-se pelos seus maus resultados tanto na
sua escolarização (em todos os níveis de ensino) e alfabetização, como no seu
enqua-dramento médico, na sua alimentação, na sua taxa de motorização e
naturalmente no seu indicador do desenvolvimento humano e no seu PIB real,
como na sua fraca urbanização.
O grupo 1 apenas compreende, uma vez mais, países africanos,com excepção
de três Estados asiáticos penalizados nomeadamente por um crescimento
demográfico muito rápido (Bangladesh, Nepal,Afeganistão). O grupo 2 é 90%
africano. Os grupos 3 e 4 são maioritariamente asiáticos, sobretudo se levarmos
em consideração a população uma vez que os quatro países mais populosos
(China,Índia, Paquistão, Indonésia) dele fazem parte. O grupo 5,ligeiramente mais
bem colocado que o 4 é partilhado entre o mundo árabe-muçul-mano e a Ásia.
Enfim, os grupos 6 e 7 são a 85% latino-americanos.Encontramos pois
efectivamente aqui a ordem habitual que coloca a América Latina à cabeça,
seguida do mundo árabe-muçulmano, da Ásia, e finalmente a África.
Em contrapartida, a síntese demográfica, realizada a partir de oito
descodificadores 3 apresenta uma ordem modificada dado que,como iremos
constatar, a Ásia segue a América Latina de perto, en-quanto o mundo árabe-
muçulmano aparece aqui mais próximo da Africa.
Os 52 Estados com mais de 10 milhões de habitantes repartem-se novamente
por uma parábola que vai dos países onde a transição demográfica mal se iniciou
(em cima à esquerda), em direcção àque-

2 Indicador do desenvolvimento humano, PIB real/hab., percentagem de jovens nos


ensinos primário, secundário e superior, percentagem de adultos alfabetizados,consumo
de calorias/hab., número de habitantes por médico e por automóvel,percentagem de
citadinos.
3 Natalidade, mortalidade geral, mortalidade infantil, fecundidade, saldo
natural,esperança de vida, jovens, pessoas idosas.

82 - ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


FIGURA 18-AFC: Nível de vida (países com mais de 10 milhōes de

habitantes)

zam-se sobretudo por níveis muito altos de natalidade, de

fecundidade,vigoroso, e por uma forte percentagem de jovens, uma

A DIVERSIDADE ECONÓMICA- 83
fraca percen-

A DIVERSIDADE ECONÓMICA- 83
FIGURA 19-AFC: Demografia (países com mais de 10 milhões de habitantes)
tagem de pessoas idosas, ligada nomeadamente a uma esperança de dentemente
pelos seus desempenhos inversos.
avançada, é partilhado entre a América Latina e a Ásia, com uma

84-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


ligeira vantagem para a primeira, pelo menos pelo número de Estados.menos
avançado na transição demográfica, constatamos a ausência ainda aí
permanecem cinco asiáticos, entre os quais o Bangladesh.
Os Estados árabe-muçulmanos estão prioritariamente instalados mas
alguns, mais avançados (Egipto, Marrocos, Argélia) localizam-se já no grupo 5,
ao lado dos países asiáticos. Os países africanos estão todos, tirando duas
excepções (Quénia e África do Sul) nos grupos 1,2 e 3 onde a baixa da taxa de
mortalidade geral aparece como o único indicador de um princípio de
transição demográfica. Eles são acom-panhados contudo neste grupo por
alguns países asiáticos ou do mundo árabe-muçulmano que têm um nível de
vida muito fraco (Nepal,Afeganistão,Iémen).

CONCLUSÃO
O que se chama Terceiro Mundo é pois efectivamente um conjunto de
países cujo nível de vida e evolução demográfica formam um leque
extraordinariamente aberto. Que haverá de comum entre a
Etiópia,Moçambique e a Tanzânia por um lado, e a Argentina, o México e o
Brasil,por outro?
Mas, por outro lado, as análises precedentes indicam que se des-tacam,
globalmente pelo menos, quatro Terceiros Mundos no interior de cada um dos
quais os desempenhos económicos, as condições de vida, a evolução
demográfica aparecem como relativamente seme-lhantes, apesar dos matizes
regionais ou mesmo de algumas excep-ções notórias. São estes quatro
Terceiros Mundos que iremos agora analisar, por ordem do seu nível de
desenvolvimento económico. Amé-rica Latina e mundo árabe-muçulmano
seguem-se de bastante perto,mas a primeira assenta já um pé no
desenvolvimento enquanto a si-tuação do segundo é economicamente mais
frágil, apesar do petróleo,demograficamente mais inquietante, politicamente
mais incerta.namismo económico da primeira e a sua relativa sageza
demográfica subsariana decididamente está «mal lançada».
SEGUNDA PARTE

OS QUATRO
TERCEIROS MUNDOS
QUADRO 5
Os quatro mundos do Terceiro Mundo: indicadores

América Mundo
Latina árabe- África sub-
muçulmano sariana
Economia

Activos agrícolas (%) 28 35 60 59


Activos nas minas (%) 5 4 4 4
Activos na ind. manuf. (%) 20 14 10
Activos no terciário (%) 48 41 22 27
Agricultura no PNB (%) 12 18 28 37
Minas no PNB (%) 16 6 7
Indústria manufact no PNB (%) 24 20 30 14
Terciário no PNB (%) 54 46 36 42
PNB/habitantes (en $) 3099 2206 588 525
Dividas/PNB(%) 56 64 37 137
Consumo de fertilizantes/ha(1) 548 1118 1725 143
Consumo de energia/hab. (2) 954 1195 446 250
Km estradas/100 km2 (em km) 13 7 17 6

Demografia

Densidade populacional por km2 23 25 135 24


Saldo natural (% ao ano) +1,9 +2,5 +1,7 +2,9
Número de filhos/mulher 3,1 4,6 3,1 6,3
Mortalidade infantil (em ‰) 41 51 52 93
Esperança de vida (em anos) 68 65 65 52
Jovens(%) 34 41 32 46
Populaçāo (em milhōes) 480 339 3008 612
Evoluçāo 1960-1993 (em % ao ano) +2,4 +2,9 +2,1 +2,8
Evoluçāo 1993-2000 (em % ao ano) +1,7 +2,3 +1,6
Nível de vida
Alfabetizados (%) 85 64 69 55
Alunos no primário (%) (3) 96 72
Alunos no secundário (%) (3) 51 59 49 24
Estudantes na universidade (%)(3) 14 7 3

Número de habitantes/médico 1017 2031 2980 6068


Calorias por dia e por hab. 2753 3026 2528 2091
Número de habitantes/automóvel 28 40 436 427
Citadinos (% da pop.total) 73 56 27 30
PIB real (em $) 5082 4392 2016 1269
789 674 537 376
Indicador do Desenvolv. Humano

(1) Centenas de g.nutritivos/ha

(2) Em kg de equivalente petróleo


(3) % do grupo de idade

AAMÉRICA LATINA: UM PÉ NO DESENVOLVIMENTO-89


3

A AMÉRICA LATINA:
UM PÉ NO DESENVOLVIMENTO

A América Latina não goza de boa reputação junto da imprensa:golpes de


Estado, ditaduras, endividamento, favelas,droga,poluição urbana, meio ambiente
ameaçado, etc. Por outro lado, o crescimento económico promissor dos anos 60 e
do início dos anos 70 desacelerou ou estagnou mesmo durante cerca de quinze
anos.
Nem tudo é falso nestas constatações, ainda que os media tenham tendência
para generalizar a partir de casos por vezes muito parti-culares. Mas estes focos de
luz brutais fazem esquecer que a América Latina,pelo menos tomada globalmente,
tem já um pé assente no desenvolvimento simultaneamente pela sua economia,
pelo seu nível de vida e pela sua evolução demográfica.

I.A ECONOMIA MAIS DESENVOLVIDA


DOS TERCEIROS MUNDOS
A economia da América Latina está hoje muito mais próxima da dos países
desenvolvidos que a da Ásia e a fortiori da África.

A)UM SECTOR AGRÍCOLA ECONOMICAMENTE MARGINAL,MAS FORTE E


COMPETITIVO

doravante de maneira marginal. Ela subsiste nas regiões afastdas


por exemplo) e é apenas praticada por populações pouco numero-vem hoje
unicamente do consumo da sua própria produção. Quase regionais para
muitos deles, nacionais para alguns, internacionais para uns poucos.
Ao ter-se tornado um sector concorrencial, em que os menos pro-lho
noutro sector económico, a agricultura não emprega mais de são os Estados
onde esta proporção ultrapassa os 40% (mapa 2).Esta percentagem pode
comparar-se à da Polónia, da Roménia ou mesmo à da Grécia, países onde a
agricultura ocupa ainda entre 23e 25% dos activos. Estamos pois longe da
imagem habitual de um Terceiro Mundo com uma forte dominante agrícola.
Imagem tanto mais falsa uma vez que a agricultura cria somente 12% do PNB
global da América Latina e não participa com mais de 20% para o PNB a não
ser em apenas sete pequenos países e em Cuba (mapa 3).A agricultura
tornou-se pois economicamente, senão socialmente,marginal.
Mas marginal não significa atrasada. O valor acrescentado por agricultor é
quatro vezes mais elevado do que na Ásia e em África.A agricultura argentina,
com um pouco mais de um milhão de traba-lhadores realiza um valor
acrescentado igual ao da Nigéria, que tem mais de 20 milhões de
camponeses. Sem nos determos num exemplo tāo extremo, constata-se
todavia que os cerca de quinze milhões de agricultores brasileiros criam um
valor acrescentado igual ao dos quase quarenta milhões de camponeses
indonésios. A produtividade do agricultor brasileiro é quatro vezes superior
ao do seu homólogo indiano e ainda seis vezes superior ao do camponês
chinês. Podería-mos multiplicar os exemplos. O consumo de fertilizantes por
hectare,não sendo tão elevado como na Ásia, situa-se acima da média, salvo
caso excepcional, entre os grandes países, como a Argentina com uma
agricultura extensiva (mapa 4).
A agricultura latino-americana é, para certos produtos, extrema-
cado. Assegura perto de 60% da produção mundial de café, com um
(5%), um quarto desta de cacau e a Argentina detém o 5.° lugar entre os
exportadores mundiais de trigo.

90 -ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


Para além destes produtos tradicionais, a agricultura latino-ame-ricana
posicionou-se em segmentos mais recentes. Cultiva 30% da soja mundial, graças à
Argentina (10%) e sobretudo ao Brasil que é o 45 em cerca de vinte anos; detém 12%
do mercado mundial e faz uma Brasil que se coloca em 1.° lugar no mundo
simultaneamente para a que se coloca no 5.° lugar e a Argentina no 9.°; no total a
América Latina fornece três terços dos citrinos mundiais. Enfim, o Brasil caracola
ainda à cabeça dos produtores mundiais no referente à cana--de-açúcar (26%),
muito à frente de Cuba(3%) e da Colômbia (3%) e avizinha-se dos primeiros no
tocante às exportações de carne (2%) e à produção de algodão. As exportações agro-
alimentares doravante colocam o Brasil no 2.° e 3.° lugar do mundo (5 a 6% do total),
atrás dos Estados Unidos e praticamente ao mesmo nível da França.
Ousaremos finalmente falar de uma agricultura altamente com-petitiva e
rentável, a da folha de coca, fornecida a 90% pela Bolívia e pelo Peru, provindo o
resto essencialmente da Colômbia e do Equa-dor. Ela passou de cerca de sessenta
milhares de hectares em 1980, a mais de 150 000 hectares em 1988, e a tonelagem
colhida foi multipli-cada por dez, segundo G. Bataillon (He n.° 57). Estima-se que 230
000peruanos (ou seja 7 a 8% dos activos) e 375 000 colombianos (ou seja,um quarto
dos activos) cultivam coca. Compreende-se tanto melhor estes agricultores sabendo
que um hectare de coca rende sete vezes mais do que um hectare de bananas e 30
vezes mais do que um hec-tare de milho. No total, a coca renderia 10 a 12 mil
milhões de dólares aos quatro países andinos que a cultivam, aos quais seria
necessário juntar mil milhões que rende o cânhamo no México. G. Bataillon es-tima
que no total, 25 milhões de pessoas dependeriam mais ou menos directamente da
droga, mas os agricultores apenas recebem uma pe-quena parte desta mina de ouro,
indo o essencial como sempre para as mãos dos intermediários.
Não obstante este caso particular, que releva da agricultura tra-dicional..., a
agricultura latino-americana, apesar de muitas zonas de sombra, revela-se poderosa,
produtiva e competitiva, não somente em relação às outras dos Terceiros Mundos
mas também por vezes em relação às dos países desenvolvidos. Ela aparece pois
indiscuti-velmente como um dos sectores económicos que a diferenciam me-lhor
dos outros Terceiros Mundos. O mesmo se poderá dizer da in-dústria?

AAMÉRICA LATINA:UM PÉ NO DESENVOLVIMENTO-91


B) UMA INDÚSTRIA COM PESO
mente e o mais profundamente industrializado dos Terceiros Mundos.

1.POTENCIALIDADES NATURAIS MUITO MEDIANAS


mente dotada em recursos naturais, à excepção por vezes dos minérios.6% na
Venezuela e 5% no México. A sua produção, que representa México (150
milhões de t), pela Venezuela (140 milhões de t),pelo Brasil (36 milhões de t) e
pela Argentina (38 milhões de t). Cerca de metade desta produção é aliás
exportada, essencialmente, para os Estados Unidos. As reservas de gás natural
são mais reduzidas ainda (rondam os 5% do total mundial) e, os três, México,
Argentina e Venezuela fornecem menos de 80 mil milhões de m3.
As reservas de carvão parecem, até agora, extremamente fracas e a sua
produção continua a ser negligenciável: menos de 40 milhões de toneladas,
quer dizer cinco vezes menos do que a África do Sul.O potencial hidroeléctrico
em contrapartida é considerável, mas ain-da pouco utilizado à excepção do
Brasil, cuja barragem gigante de Itaipu suscitou muitas polémicas. A produção
total é equivalente àdo Canadá: aproximadamente 300 mil milhões de kWh,
dentre os quais dois terços no Brasil. As reservas de urânio (10% do total mun-
dial) pertencem quase inteiramente ao Brasil, mas a produção per-manece até
ao momento negligenciável.
A América Latina aparece, pelo contrário, muito mais bem dotada em
recursos minerais metálicos. Ela detém um quarto das reservas de minério de
ferro e delas extrai cada ano um quarto da tonelagem mundial,
essencialmente no Brasil (120 milhões de t). O Chile, o Peru e o México
permitem-lhe fornecer cerca de um quarto do cobre mun-dial, o Brasil, o Peru
e a Bolívia 30% do estanho. A América Latina extraí 28% da bauxite mundial.
Contudo, à excepção do petróleo, cuja extracção é antiga, a maior parte
destes recursos só recentemente foram utilizados e, fora alguns casos muito
particulares e bem localizados (siderurgia por exemplo),transformadora.
Foram outros factores, que analisaremos mais adiante,que deram nascimento
a uma indústria manufactureira poderosa.

92 -ROBERT CHAPUIS/THIERRYBROSSARD

A AMÉRICA LATINA:UM PE NO DESENVOLVIMENTO -93


2.A MAIS PODEROSA INDÚSTRIA MANUFACTUREIRA DOS TERCEIROS
MUNDOS

população activa, ou seja duas vezes mais do que a da África e ainda minas e
na energia, é um quarto dos latino-americanos que estão ocupados na
indústria no sentido amplo do termo.
Estes números poderiam ser apenas meios recobrindo uma reali-dade
contrastada. Não é isso que se passa. Em todos os países com mais de 10
milhões de habitantes, que representam 85% da popula-ção total, a indústria
(no sentido amplo) ocupa sempre pelo menos um quarto dos activos, à
excepção do Peru (22%)e da Colômbia (19%).Nestes mesmos países, o sector
manufactureiro emprega sempre mais de 14% da māo-de-obra e mesmo um
quarto na Argentina, uma pro-porção equivalente à da França (mapa 5).
Nos pequenos países, aliás, a situação não é diferente. Apenas o Belize, as
Honduras e o Panamá não ocupam mais de 15% dos seus activos na indústria,
sem contar com o Haiti que, com 10%, é deste ponto de vista como de muitos
outros, mais africano do que latino--americano. Ao invés, no Uruguai, na
Jamaica, em Trindade, mais de 30% dos empregos são fornecidos pela
indústria.
Evidentemente, o lugar detido pela indústria na criação de rique-zas
nacionais é muito superior ainda. Um terço do PNB provém da indústria no
sentido amplo, número aparentemente comparável ao do mundo árabe-
muçulmano, mas estruturalmente muito diferente:neste último, a indústria
manufactureira não participa senão com um pouco mais da metade (o resto é
fornecido pela extracção petrolí-fera) enquanto ela representa três quartos na
América Latina. Esta épois fundamentalmente mais industrializada do que o
mundo árabe--muçulmano que conta mais com os seus recursos naturais. Por
todo o lado, tirando quatro excepções, das quais Cuba e a Bolívia, a indús-tria
manufactureira participa com 15% pelo menos para o PNB, e frequentemente
muito mais (32% no Brasil) (mapa 6).
O valor acrescentado pela indústria manufactureira latino-ame-ricana
(38% do conjunto dos Terceiros Mundos) é equivalente ao da Asia sem os
quatro dragões (42%), mas não esqueçamos que a América tra 3000 milhões
na Ásia... O mundo árabe-muçulmano e a África sóceiros Mundos. Os mapas
elaborados por D. W. Curran fazem sobres-
sair nitidamente que a América Latina é campeã no que se refere ao Por todo
o lado este valor situa-se entre 400 e 1000$, salvo nos países andinos e na
América Central (que se coloca entre 200 e 400$,en-quanto noutros partes,
apenas a Arábia Saudita atinge este resul.tado e unicamente seis outros países
(essencialmente árabe-muçul-manos) se posicionam entre 200 e 400 $ por
habitante.
Outros índices confirmam a importância, pelo menos relativa,desta
indústria. Nas cerca de 600 firmas importantes que fazem par-te dos T'erceiros
Mundos, aproximadamente 30% são latino-america-nas, dentre as quais dois
terços brasileiras. O consumo de energia,muito em correlação com o consumo
industrial, é um pouco inferior àdo mundo árabe-muçulmano, mas duas a
quatro vezes mais forte do que a da Ásia ou da África. À excepção de alguns
pequenos países,bem como do Equador ou do Peru, o consumo ultrapassa por
todo o lado os 600 kg de equivalente-petróleo por habitante (mapa 7).
Já foram referidas, mais acima, as indústrias brasileiras e mexica-nas, para
se sublinhar nomeadamente a sua variedade; não voltare-mos a focar este
ponto. Aliás, a indústria é certamente menos variada e menos desenvolvida,
mas está longe de ser inexistente. Na Venezuela para além da refinação de
petróleo (16. capacidade mundial) e da petroquímica, uma política de
substituição de importações diversifi-cou a indústria para sectores como o
agro-alimentar (açúcar, leite), o tabaco, o papel, o têxtil, o alumínio, o material
eléctrico e de transpor-te (estaleiros navais). Na Colômbia, à utilização dos
recursos naturais (petróleo, gás natural, carvão, ouro), juntou-se uma indústria
compe-titiva no agro-alimentar (açúcar, café, cerveja), tabaco, o têxtil,a quí-
mica, o aço, o automóvel (Renault), os aparelhos electrodomésticos,etc. A
Argentina, apesar de ter falhado a sua descolagem económica,continua a ser o
sexto país industrial dos Terceiros Mundos.
Focos de menor envergadura existem aliás, no Chile, no Uruguai,na
América Central onde, paralelamente aos sectores agro-alimenta-res e têxtil
tradicionais, se desenvolvem, em parte graças a investido-res estrangeiros,
novas indústrias químicas, metalúrgicas, mecâni-cas mais dinâmicas: 80% das
trocas praticadas no âmbito do Mercado Comum Centro-Americano incidem
sobre produtos manufacturados.Nas Caraíbas, durante muito tempo apenas
emergia Porto Rico, onde os Estados Unidos haviam maciçamente investido na
petroquímica,na farmácia, na electrónica, bem como em Trindade, cuja
actividade as zonas francas multiplicam-se um pouco por toda a parte, a favor

94-ROBERTCHAPUIS/THIERRY BROSSARD
actualmente 300000 empregos na zona caraíba, entre os quais
dades. Veremos que ela contribuiu pesadamente para endividar a çāo selvagem de
certos recursos, tais como o minério de ferro na tria está igualmente muito
dependente do estrangeiro, sobretudo dos mentos estrangeiros directos efectuados
nos Terceiros Mundos. O caso multinacionais que acumulam 51% do emprego e 55%
do valor acres-rente, visto queuma boa parte do investimento diz respeito às céle-
fronteira americana, representam 15% do emprego mexicano ecria-ram um
emprego em quatro entre 1982 e 1990. A entrada do país na ALENA reforçou esta
tendência dado que, em 1995, 70% dos investi-mentos estrangeiros se efectuaram
nas maquiladoras que, além disso, assistiram à criação de 100 000 empregos.
Contudo, uma parte dos empréstimos contraídos foi desperdiçada.O essencial
serviu ainda assim para melhorar as infra-estruturas indis-pensáveis para a produção
a para a comercialização dos produtos indus-triais (vias de comunicação,
nomeadamente), bem como para inves-tir directamente nas minas, na energia e na
indústria manufactureira.
Por outro lado, os investidores estrangeiros, que durante muito tempo
suscitaram quase por todo o lado tanta desconfiança, são hoje cortejados: as bruxas
multinacionais transformaram-se hoje em fa-das benfazejas... [7]. Segundo A.
Debrusson e A.Vanneph, os benefǐ-cios das maquiladoras estão longe de serem
negligenciáveis. Com efeito, o México cobra uma taxa sobre o valor acrescentado,
vende a energia bem como certos serviços e aufere salários. Além do mais,depois de
uma primeira geração de empresas apenas interessadas na mão-de-obra feminina
«jovem, disponível, barata, sem reivindica-ções ou greves», uma segunda geração se
instala. Mais sofisticada (electrónica, automóvel), necessita de uma melhor
qualificação da mão-de-obra (logo salários mais elevados), ocasiona transferências
tecnológicas utilizáveis noutros lugares e permite, por conseguinte, o nascimento de
uma «cultura industrial».

AAMÉRICA LATINA: UM PÉ NO DESENVOLVIMENTO-95

96-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


C)UM SECTOR TERCIÁRIO DORAVANTE PREPONDERANTE
-O comércio e os serviços ocupam doravante quase metade da po-e
superior à dos países da Europa do Leste mais avançados (Repú--se
significativamente da Ásia e da África, onde o terciário tem meta-pequenos
países e da Bolívia, a proporção de activos empregados neste sector
ultrapassa sempre 35% (mapa 8).
O sector terciário assegura mais da metade do PNB e a América Latina
supera uma vez mais largamente os outros Terceiros Mun-dos, mesmo o
mundo árabe-muçulmano.Ele é por toda a parte domi-nante dado que, em
todos os países, excepto em Cuba,gera mais de 40% do PNB (mapa 9). Enfim,
a comparação com os países desenvol-vidos conduziria às mesmas conclusões
que vimos mais acima, istoé,a uma situação bastante semelhante à dos países
menos desenvolvidos entre si. Objectaremos que uma parte deste sector é
frequentemente considerada como parasita, mas como é ele exactamente?

1.DO PEQUENO OFÍCIO AO CARTEL DA DROGA

Uma parte do sector terciário está efectivamente formado por pequenos


ofícios muito pouco produtivos, tais como a revenda de pro-dutos em
pequena quantidade, a reparação de objectos correntes,a prestação de
serviços diversos como o engraxamento de sapatos, sem contar os serviços
domésticos. Esta parte informal do sector terciário faz viver, acrescentando-
lhe a parte informal do sector industrial que não é descurável, 100 milhões de
pessoas. Mas este sector informal será ele verdadeiramente parasita?
Na realidade, embora este sector seja pouco produtivo, está longe de ser
inútil. Segundo M. Penouil, constitui um autêntico circuito económico que
tem a vantagem de adaptar «a produção e os preços ao nível dos rendimentos
dos actores do (sector) informal e dos peque-nos assalariados do (sector)
moderno» (PE, n.° 2196). Ela desempe-nha um papel de estabilizador, de
regulador em caso de crise e a sua dinâmica é «uma das componentes do
desenvolvimento». Ele está fi-nalmente estreitamente ligado ao sector
formal, para o qual ele serve de escoadouro e serve, em suma, para «regular»
o mercado do traba-
lho. Os desempregados, com efeito, «reciclam-se» no sector infrmal,xas taxas de
desemprego do mundo (aproximadamente 7%) (H.L.Castano,PAL,1989).
O próprio Banco Mundial, durante muito tempo muito reservado,mostrou que
o sector financeiro informal desempenhava um papel vimento. Formado por
prestamistas, credores profissionais, comer-ciantes e associações populares, seu
interesse é, apesar dos custos usurá-rios dos empréstimos, colocarem de maneira
flexível e rápida dinheiro à disposição dos pequenos agricultores, dos artesãos,
dos revendedores,para «o financiamento a curto prazo dos stocks quotidianos, a
regulari-zação dos rendimentos de carácter flutuante e o financiamento a longo
prazo de investimentos de maior vulto»(PE n.°2158).
Neste sector informal, e desta vez francamente ilícito, encontra-mos tudo o
que gira em torno da droga. Segundo os autores da Géographie Universelle, ela
rendia entre 10 e 12 mil milhões $ a qua-tro países andinos: 5 à Colômbia (ou seja,
o equivalente a um sétimo do PNB oficial), 2,5 à Bolívia (ou seja, dois terços do
PNB), 1,5 ao Peru (4% do PNB) e outro tanto ao Equador (15% do PNB), enfim 1ao
México [8]. As quantias repatriadas teriam ascendido a mil mi-lhões $ na Colômbia
(cerca de 20% das exportações legais) e o equiva-lente na Bolívia (cerca de duas
vezes as exportações legais) bem como no Peru (40% das exportações legais). A
guerra antidroga empreen-dida em particular na Colômbia e no Peru coloca
actualmente enor-mes problemas aos camponeses produtores.
Este dinheiro é em parte reinvestido in situ; na Colômbia, nas indústrias agro-
alimentares ou farmacêuticas, na criação de gado extensiva, na banca, nos grandes
armazéns, nas linhas aéreas, no turismo, no futebol e por vezes nas habitações
populares; no Peru, no imobiliário, na construção de camiões, na compra de
empresas em dificuldade; na Bolívia nas IAA, a madeira preciosa.
Paradoxalmente,os narco-dólares teriam fornecido à Bolívia e à Colômbia os meios
para adoptarem as políticas monetárias liberais preconizadas pelo FMI e pelos
Estados Unidos, e evitar um endividamento tão pesado como o do México e do
Brasil. Vimos mesmo em 1984, o cartel da nidade (ibid.)! A Colômbia tornou-se
igualmente «um alto lugar de branqueamento de dinheiro sujo» [20].
Todavia, o sector terciário está longe de se reduzir às suas faces encobertas ou
subprodutivas.

A AMÉRICA LATINA: UM PÉ NO DESENVOLVIMENTO -97


2. DOS BANCOS ÀS BANDEIRAS DE CONVENIÊNCIA

Uma larga parte do sector terciário está na realidade constituído cos,


organismos financeiros, empresas de publicidade, estabelecimen-portes, etc.
Citaremos aqui dois exemplos, o da banca e dos transportes, mas
encontraremos outros mais adiante, como os dos sectores médicos e
escolares.
Dos doze primeiros bancos dos países em vias de desenvolvimento,quatro
estão localizados na América Latina: o Banco do Brasil, o Banco do Comércio
Exterior do México, o Banco Central do Chile e o Banco Central da Venezuela.
No Brasil, por exemplo, uma lei de 1964 «do-tou o país de um sistema
financeiro completo e coerente» onde coe-xistem o Banco do Brasil,
controlado a 75% pelo Estado, que desem-penha o papel de banco de
depósito e de banco de negócios, bancos comerciais dos Estados da União,
bancos públicos de desenvolvimento e caixas económicas, equivalentes às
nossas caixas de poupança.O sector privado é composto por bancos
comerciais, por bancos de investimento que financiam as empresas privadas e
os bancos«fi-nanceiros» especializados no crédito ao consumo 1.
No México, onde os serviços bancários são mais recentes, a ban-ca detém
um lugar considerável na economia. A prova está em que o Estado a
nacionalizu em 1982; Nacional Financiera, Banco Nacio-nal de Obras y
Servicios e o Banco Nacional de Comércio Exterior financiam o sector
industrial. Os principais estabelecimentos ban-cários abriram sucursais em
todas as cidades pequenas.Tal como nos outros lugares, desempenham o
papel de bancos de depósito e de investimento e praticam o crédito ao
consumo 2. A crise de De-zembro de 1994 afectou no entanto duramente o
sector bancário: os capitais estrangeiros mas igualmente os capitais nacionais
fugiram para o estrangeiro. Encontraríamos exemplos semelhantes para
outros grandes países como a Argentina, a Colômbia, a Venezuela,o Chile. De
mais a mai, um pouco por todo lado se privatiza o sector bancário.
Nos Estados de pequenas dimensões, a banca ocupa geralmente um lugar
menos relevante, à excepção no entanto dos numerosos

1 Gautier, Domingo J., Le Brésil.


2 Musset A., Le Mexique, Paris, Masson, 1990.

98 -ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD

AAMÉRICA LATINA: UM PÉ NO DESENVOLVIMENTO -99


ou menos sujo, com falta de aplicações discretas. As Antilhas são, sob

habitantes) nas ilhas Caimão (ex-ilhas da Tartaruga) povoadas com das 18 000

sedes sociais de sociedades (por vezes simples caixas de bancos mundiais;

40% do PNB provém das actividades financeiras.


Nassau, nas Bahamas, onde estão instalados 370 bancos e compa-nhias
financeiras, tornou-se o segundo lugar no mercado dos eurodólares, a seguir a
Londres. Nas ilhas Turkse Caicos (13 000habitantes), situadas ao Sul das
Bahamas, onde 10 000 empresas têm a sua sede social, 15% do PNB provém
da banca «offshore» [2]. En-contrar-se-iam outros exemplos, menos
espectaculares no entanto,nas ilhas Virgens, em Curaçau, que se tornou como
as Bahamas num centro internacional de transacções em eurodólares, em
Anguila, pos-tos em destaque pelos média pelo negócio da venda da American
Can em Pechiney. No continente, alguns Estados aproveitam-se igualmente
deste maná, como o Panamá que realiza 14% do seu PNB na banca e seguros.
Não obstante, o Panamá é mais conhecido por ser o asilo das ban-deiras
de conveniência que lhe dão, pelo menos teoricamente, a pri-meira frota do
mundo (110 Mtpl) e lhe rendem 1% do seu PNB. Da mesma forma, as
Bahamas vêem-se assim dotadas da 4.a frota mun-dial, equivalendo a três
vezes a frota da França.
A América Latina apresenta, felizmente, para os outros tipos de
transportes, uma situação menos artificial. Dispõe de 125 000 km de vias
férreas, muito díspares, é verdade, e não formando uma rede,mas cuja
densidade ultrapassa a dos outros Terceiros Mundos. A den-sidade da rede
rodoviária, um pouco inferior à da Ásia, é o dobro da do mundo árabe-
muçulmano ou da África. Não desce a menos de 5km de estrada para 100 k ㎡
2 em nenhum dos países com mais de 10milhões de habitantes (mapa 10).
A motorização doravante alcança também ela um nível relativa-mente
bom: em média um automóvel por cada 28 pessoas, ou seja, àroda de um por
cada cinco famílias; número superior ao do mundo árabe-muçulmano,
superior ao dos ex-países do Leste (1 automóvel para 35 pessoas na ex-URSS)
e sem termo de comparação com os da África e mais ainda da Ásia. Em todos
os países com mais de 10 mi-habitantes por automóvel nunca ultrapassa os 50
(mapa 11).A coe-
rência da rede rodoviária e a sua manutenção relativamente correcta
são um argumento de peso para o turismo.

3. UM TURISMO EM RÁPIDO CRESCIMENTO

Cidade do México, Rio de Janeiro, recebem alguns turistas privilegia-dos,


vindos principalmente dos Estados Unidos. Mas foi depois da última guerra que
o turismo ganhou uma amplitude sem preceden-tes. Hoje, a América Latina
recebe 24 milhões de visitantes para 17mil milhões $ de receitas.
As Caraíbas, cuja imagem mediatizada é bem conhecida (conquanto muito
encarecida!) aparecem à cabeça, com 10 milhões de turistas e 8mil milhões $
de receitas [34]. É também aqui que o turismo desem-penha o papel mais
importante nas economias nacionais. Porto Rico,Estado livre associado aos
Estados Unidos, recebe 2,5 milhões de tu-ristas, essencialmente americanos.
As Bahamas e os seus 273 000habitantes atraem só eles 3,5 milhões de
visitantes que proporcio-nam 43% do PNB. São Domingo recebe também mais
de 1 milhão de visitantes. Em Antígua, nas ilhas Virgens, o turismo assegura
perto de metade do PNB. Em muitas outras ilhas, esta proporção oscila entre
20 e 40%, como na Barbada, nas Caimão, em Granada,na Jamaica, em
Montserrat, Saint-Kitts e Nevis, Santa-Lúcia, etc. Em contrapartida, Cuba, e
mais ainda o Haiti, continuam a ser por ra-zões diversas anões turísticos,
apesar das suas dimensões, mas os vi-sitantes são cada vez mais numerosos
em Cuba (1 milhão em 1995).
No continente, a América Central e o México acolhem 7 milhões de
visitantes para 5 mil milhões de receitas, mas o México, vizinho dos Estados
Unidos e que oferece ao mesmo tempo praias e locais históricos, recebe só ele
mais de 3 mil milhões $. A América do Sul recebe tantos outros turistas, mas as
suas receitas são um pouco mais fracas (4 mil milhões $). Na Argentina, no
Peru, na Colômbia, na Venezuela, as receitas do turismo escalonam-se entre
400 e 600 mi-lhōes $,mas no Brasil, apesar do Carnaval do Rio, não
ultrapassam os 100 milhões.
A economia latino-americana é pois diversificada e, sob muitos aspectos,
nada tem a invejar à dos países europeus considerados ge-doxais ou extremos,
nomeadamente acontecimentos recentes, que a fazem ver sob um ângulo
muitas vezes pessimista.

100-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD

AAMÉRICA LATINA: UM PÉ NO DESENVOLVIMENTO-101


D) MALES E DESGRAÇAS DA ECONOMIA
A América Latina, tendo partido de um nível de desenvolvimento económico mais
elevado que os outros países, graças a uma industria-conheceu um forte crescimento até
ao início dos anos 80. Entre 1965e 1980, o PIB cresceu em média 6% ao ano e, fora alguns
casos isola-dos (Chile), o crescimento ultrapassou por todo o lado 3%, para subir até aos
9% no Brasil. Em cerca de trinta anos, o PNB do Brasil émultiplicado por seis, o do México
por quatro, o da Argentina por três, e estes três países representam só eles dois terços da
população total. Sinal de uma competitividade acrescida, na mesma altura a América
Latina abre-se aos mercados mundiais, uma vez que o seu comércio exterior foi
multiplicado por oito desde 1960.
É sobretudo ao longo deste período que a América Latina recupera uma parte do seu
atraso em relação aos países desenvolvidos. D. W.Curran efectivamente mostrou que,
entre 1968 e 1987, em todos os grandes países, à excepção da Argentina e da Venezuela,
o crescimento foi de 10 a 70% superior ao de um grupo de referência formado por
13países industrializados [14]. No México, no Brasil, na Colômbia, no Equador e no Peru,
os 70% foram ultrapassados.
Mas este crescimento abrandou fortemente nos anos 80. Entre 1980 e 1990, cai para
1,6% ao ano e é mesmo negativo em diversos países (Bolívia, Peru, Argentina). Este
afrouxamento do crescimento é acompanhado por um endividamento que aparece então
fenomenal pois vários países, tendo contraído empréstimos avultados, deixam de poder
reembolsar ou mesmo pagar os juros quando o crescimento diminui e os produtores de
petróleo vêem decair os preços do ouro negro. A dívida torna-se considerável
(aproximadamente 430 mil milhões $ em 1990, dos quais mais de 100 para o Brasil e para
o México), conquanto não se tenha verificado que, em relação ao PNB,ela é comparável à
da Europa (cerca de 40% do PNB), mais fraca do que a do mundo árabe-muçulmano (mais
de 50%) e sobretudo do que a da África (110%); só a Ásia apresenta um melhor
desempenho com uma dívida que ronda 30% do seu PNB.
A inflação, mal habitual da América Latina, agrava-se com o endividamento.
Entre 1970 e 1987, a sua taxa é multiplicada por 13na Argentina, 19 no Brasil, 30 no
México; entre 1980 e 1987, atinge respectivamente nestes três países: 300%, 170%
e 70%.
crescimento no decurso dos anos 90, na condição porém de restaurar
os grandes equilíbrios macroeconómicos, de eliminar o atraso das dívi-
igualitário, o que não é um modesto programa, a verdade se diga.
gurou esta melhoria. Entre 1990 e 1994, o PNB da América Latina gentina, no
Chile, na Venezuela, no México, para citar apenas os Es-México caiu novamente
no vermelho em 1995. Com frequência,sob a pressão do Banco Mundial, a
inflação tende a baixar. Entre 1989 e 1995, na Argentina caiu de 3000% para 3%.
Em muitos países, des-ceu abaixo da barra dos 20% mas ultrapassa ainda esta
cifra no Bra-sil, na Venezuela, na Colômbia e no Equador. O próprio
endividamento tem tendência para diminuir. Globalmente, equivale a um pouco
mais de metade do PNB, quer dizer, mais do que na Asia (um terço) mas menos
do que no mundo árabe-muçulmano (dois terços) e sobretudo do que em África
(135%). A dívida do México passou do equivalente a três quartos do seu PNB
para um terço. Tal como o Chile e a Venezuela,este país tinha voltado a ter antes
de 1995 um acesso nor-mal ao mercado de capitais; por outro lado, graças a
abatimentos das dívidas, de prazos e de reescalonamentos praticados no âmbito
do plano Brady, diversos países da América Central, assim como o Peru e o
Uruguai recomeçaram de situações menos dramáticas, senão nor-mais. Entre os
grandes países, exceptuando a Venezuela, por todo o lado a dívida representa
menos de 60% do PNB (mapa 12).
Segundo o jornal Le Monde «a América Latina faz doravante figura de
modelo, aos olhos dos organismos monetários internacionais.A maioria dos
Estados puseram em execução políticas de saneamento económico, saindo
progressivamente da armadilha do endividamento e atraindo investimentos
estrangeiros maciços. Do México àArgentina, passando pela Bolívia ou pelo
Chile, todos os governos colocam a recuperação económica no topo das suas
preocupações. Salvo uma única excepção, o Brasil» (3.03.93).
A América Latina deveria, portanto, simultaneamente retomar o processo
de recuperação do seu atraso em relação aos países desen-volvidos e conservar
o seu avanço relativamente aos outros Terceiros Mundos. De acordo com o
jornal Le Monde, «hoje, cada vez mais es-pecialistas são unânimes em
reconhecer que, entre os países emer-gentes, é provavelmente a América do Sul
que é chamada a ocupar o avanço económico, o seu nível de vida continua a ser
o mais elevado dos Terceiros Mundos.

102 -ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


II. O NÍVEL DE VIDA MAIS ELEVADO
A) UM RENDIMENTO SUPERIOR AO DA RÚSSIA
Com um PNB de 3100$ por habitante o latino-americano disporia mesmo
assim, o seu rendimento compara-se ao de um português no /hab. é superior ao
do mundo árabe-muçulmano, mas pelo menos cinco vezes mais elevado que o da
Ásia e da África.
Se utilizarmos o PIB real que, recordemo-lo, leva em conside-ração o poder
de compra, a comparação é igualmente lisonjeadora.Com 5100$ por habitante, o
rendimento da América Latina equivale a mais de duas vezes o rendimento
asiático, quatro vezes o da África,e ultrapassa o do mundo árabe-muçulmano;
coloca-a ao mesmo nível da Polónia. Excluíndo determinados pequenos Estados da
América Central e das Caraíbas, este rendimento ultrapassa sempre 1800$ e,na
maior parte dos casos, 3500$ (mapa 13).
Este rendimento está menos mal partilhado do que se pensa en-tre as diversas
categorias sociais, pelo menos a avaliar pelos números oficiais.
Escolhe-se geralmente o caso do Brasil para mostrar as enormes desigualdades
de riquezas na América Latina que, inegavelmente,são particularmente acentuadas
neste país. No entanto, o Brasil parece

QUADRO 6
Percentagem do rendimento das famílias
por fatias de rendimento na América Latina

Quinto
Primeiro quintil Segundo Terceiro Quarto
quintil
(o mais pobre) quintil quintil quintil
(o mais rico)

Brasil......... 2 5 9 17 67
Colômbia.. 4 8 13 20 55
Peru........... 5 10 14 21 50
Venezuela.. 4 7 12 19 58
França....... 6 12 17 24 41

AAMÉRICA LATINA:UM PÉ NO DESENVOLVIMENTO-103


país injusto.» (Presidente F. H. Cardoso) [20]. Na Colômbia, noPeru,da França.
Uma classe média que tanto falta aos outros Terceiros estimam que ela incide
sobre um terço da população no Cone Sul,assim como na Venezuela e no
Panamá, um quarto no México, e que é sigificativa no coração do Brasil, do
Peru e do Equador [8].
Mas é verdade que as desigualdades regionais são particularmente
acentuadas. Desigualdades entre regiões, singularmente no Brasil,entre
cidades e campos, e no interior das próprias cidades: mais de 30% dos
habitantes da Cidade do México e de Lima estariam alojados em bairros de
lata e, em 1984, metade dos assalariados da Grande Buenos Aires «ganharia
no máximo o equivalente a 1,2 vezes o salá-rio mínimo vital» [8]. Na
Argentina, um habitante em cada cinco vive abaixo do limiar de pobreza. No
Chile e no Peru, é o que acontece com um quarto da população, na Colômbia
com 40%. Tal como refere CL. Albagli, a América Latina sabe aumentar a sua
produção de bens e de serviços, mas não sabe distribuir equitativamente os
frutos do crescimento [1]. As mesmas observações poderiam ser feitas a
propó-sito dos outros elementos do nível de vida.

B) UMA SITUAÇÃO ALIMENTAR


GLOBALMENTE CORRECTA
Cada latino-americano dispõe em média de cerca de 2750 calorias por
dia, ração um pouco inferior à dos habitantes do mundo árabe--
muçulmano,mas superior à da Ásia e sobretudo da África. O nível mínimo dos
2200 a 2500 calorias por habitante e por dia é nitidamente ultrapassado. Aqui
ainda a média não é baseada sobre uma soma de situações completamente
díspares de país para país. Entre os gran-des países, apenas os habitantes do
Peru e da Bolívia dispõem de menos de 2200 calorias por dia (mapa 14). A
parte da alimentação nāo re-presenta senão um quarto do orçamento das
famílias, enquanto nos metade. A subnutrição infantil, enfim, é três vezes
inferior à média dos Terceiros Mundos.
Dito isto, este panorama geral necessita de matizes. Se a situação nos
Andes, com o Peru (1880) e a Bolívia (2100 calorias) e em certas regiões
colombianas. A situação é mais medíocre igualmente nas

104-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


determinados pequenos Estados da América Central, especialmente dentemente, a
subnutrição afecta igualmente os bairros da lata das etc.): quem viu os miúdos
precipitarem-se sobre os restos de comida deixados nos terraços dos grandes
restaurantes do Rio não tem quais-quer dúvidas. No entanto, se demasiadas
pessoas vivem na pobreza,relativamente poucas têm fome, e os mortos por fome
são, doravante,actualmente raríssimos: as sublevações ditas «da fome» são
sobretudo sublevações da pobreza.
Mais correntes, pelo contrário, são certas carências em vitaminas e em
prótidos, devido a uma alimentação muito pouco variada e tal-vez (nem toda a
gente estará de acordo), demasiado vegetariana.O consumo de origem animal
oscila em todos os grandes países (àexcepção uma vez mais do Peru) entre 15 e
20% da ração alimentar,contra 30% nos países desenvolvidos. Nos outros países no
entanto, àexcepção do mundo árabe-muçulmano, a percentagem cai para me-nos
de 15, e muitas vezes para menos de 10% como na Ásia.
O balanço alimentar é pois matizado mas globalmente melhor do que nos
outros Terceiros Mundos. Ele está obviamente relacionado com o balanço sanitário
da população que é, também ele,mais posi-tivo que nos outros sítios.

C) UM ESTADO SANITÁRIO PRÓXIMO


DO DOS PAÍSES DESENVOLVIDOS
Podemos avaliá-lo através de dois critérios: a mortalidade infantil e a esperança
de vida. A primeira desceu hoje a aproximadamente 40‰, contra 50 na Ásia e no
mundo árabe-muçulmano e mais de 90em África. A América Latina está pois
relativamente próxima da Europa (25‰). Em todos os países com mais de 10
milhões de habi-tantes, excepto Brasil e Bolívia, a mortalidade infantil é inferior a
50‰ (mapa 15). Com um esperança de vida à nascença de 68 anos, a -muçulmano
(em 4 anos) e ultrapassa a África em 16 anos! Os seus todos os outros países, a
esperança de vida ultrapassa 60 anos e fre-quentemente 70 (mapa 16).
A alimentação, globalmente correcta, como vimos,é em parte res-O acesso à
água potável, mesmo continuando a ser insuficiente,é

AAMÉRICA LATINA: UM PÉ NO DESENVOLVIMENTO-105


geralmente muito superior ao que é nos outros lados. Segundo o Banco vel» à
água potável, contra metade dos asiáticos e um bom terço dos dez têm «acesso
a meios sanitários de evacuação» na América Latina,isto verifica-se apenas para
um quarto dos asiáticos [29].
Foram igualmente realizados esforços para melhorar o meio médico.A parte
do PNB consagrada às despesas com a saúde passou de 1,2%nos anos 60, a 2%
hoje, o que, dado aumento do PNB durante o mesmo período, corresponde a
um crescimento apreciável em valor absoluto.O enquadramento médico
melhorou consideravelmente: o número de médicos duplicou entre 1965 e
1984, o dos enfermeiros triplicou.Com menos de 100 pessoas por médico, a
América Latina está duas vezes mais bem enquadrada que o mundo árabe-
muçulmano, três vezes me-lhor do que a Ásia e 16 melhor do que a África. Ela
situa-se aqui prati-camente ao nível da Europa (700 habitantes por médico) e a
Argentina,com 300, ao da França. As diferenças de um país para o outro são
rela-tivamente fracas: nenhum grande país, tirando a Bolívia, dispõe de menos
de um médico para 1500 habitantes (mapa 17).
A saúde de um país depende também do seu nível de
educação.Esquematizando, quanto mais bem escolarizado, mais facilmente se
recorre ao médico e mais bem assistidas são as pessoas.Ora o nível escolar da
América Latina aproxima-se do dos países desen-volvidos.

D) UM NÍVEL ESCOLAR PRÓXIMO


DO DOS PAÍSES DESENVOLVIDOS
Oitenta e cinco por cento dos adultos são alfabetizados, quase o mesmo
número que na Europa. Todos os outros Terceiros Mundos são desta vez
nitidamente superados uma vez que os mais bem colo-cados se situam na
ordem dos 65% e a África 55%. Praticamente por todo o lado dois terços pelo
menos dos adultos estão alfabetizados (mapa 18). As diferenças de
alfabetização entre homens e mulheres são ínfīmas (2%), enquanto elas são de
8% na Ásia, 10 em África e 17no mundo árabe-muçulmano.
e isto, em todos os países (mapa 19). Na realidade há bolsas de Central e nas
Caraíbas, bem como nos bairros de lata urbanos. Mas

106-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


mentalmente com a que encontramos noutros países, exceptuando
a África.
Mais significativa, em contrapartida, aparece a escolarização nos jovens em
idade de o fazerem, é quase tanto como no Mundo Árabe-África. Aproximadamente
um jovem em cada cinco está inscrito na Universidade (proporção da França em
1965), mas o Mundo Árabe--muçulmano é deixado para trás e mais ainda a Ásia e a
África. Nos dois tipos de ensino, a homogeneidade é bastante notória de país para
países da América Central e da Caraíbas: quase sempre, salvo nomea-damente no
Brasil, mais de 45% de jovens frequentam o ensino se-cundário (mapa 20) e mais de
10% vão à universidade (mapa 21).
Nestas condições, é óbvio que o IDH (Indicador do Desenvolvi-mento Humano
que, recordemo-lo, leva em conta o PIB real, a espe-rança de vida e a alfabetização)
é elevado. Ele atinge quase 800 pon-tos (nos 1000 possíveis), resultado muito
superior ao do Mundo Árabe-muçulmano e da Asia (respectivamente 670 e 540), e
evidente-mente ao da África (380 pontos). O mapa 22 é suficientemente indicativo
das enormes diferenças que separam a América Latina dos outros Terceiros Mundos
e a sua relativa heterogeneidade, tirando as excepções habituais, uma vez que em
todos os grandes países o índice 750 é ultrapassado, e alcança 880 na Argentina.
As condições de vida do latino-americano médio estão portanto,sob muitos
prismas, mais próximos dos nossos do que as dos africa-nos ou dos asiáticos. Ora,
como sabemos, as condições de vida influen-ciam profundamente o
comportamento demográfico de uma sociedade.Podemos pois esperar que a
transição demográfica esteja aí mais avan-çada dos que nos outros lugares.

III. RUMO A NORMAS DEMOGRÁFICAS OCIDENTAIS?


sição demográfica é, na maior parte dos países da América Latina,Latina estará ela a
adoptar normas demográficas ocidentais?

AAMÉRICA LATINA: UM PÉ NO DESENVOLVIMENTO - 107


A) UMA NATALIDADE EM FORTE BAIXA
baixado, estava ainda próxima dos 40%, Caiu agora para 26%, o que que da da
África (45); unicamente a da Asia se lhe pode comparar. No sa 30%, a América
Centra e as Caraíbas continuam a ser mais pro-líficas(mapa 23).
A fecundidade diminui mais rapidamente ainda do que a nata-lidade,
inflenciada no seu caso pela juventude da população: em menos de 30 anos,
foi quas dividida por dois visto que, no início dos anos 60, cada mulher punha
ao mundo em média 6 crianças,contra 3,1 (se assim se pode dizer...) hoje. É
ainda mais do que na América do Norte (1,8) mas muito menos do que no
mundo árabe-muçulmano (4,5) e sobretudo em África (6,3). Em todos os
países,à excepção da Bolívia, o índice de fecundidade caiu abaixo de 4(mapa
24).
A América Latina parece pois dirigir-se parao modelo ociden-tal da família
de dois filhos. Aqui, como noutras partes, intervie-ram vários factores. O
aumento do nível de vida, sobretudo nas classes urbanas, constitui um dos
elementos essenciais desta evo-lução. A urbanização igualmente, uma vez que
ela generaliza o trabalho das mulheres, restringe a extensão da família em
virtude da exiguidade do alojamento e favorece o acesso à informação,logo à
contracepção. Dentro da mesma ordem de ideias, os progressos da
escolarização, e especialmente a das raparigas, contribuíram para esta
evolução. Apesar da oposição de uma Igreja ainda que fortemente implantada,
um certo planeamento familiar, individual ou colectivo, conseguiu trilhar
caminho: o número de utilizadores de preservativos teria sido multiplicado por
10 nos últimos trinta anos e certos países praticam políticas oficiais de
planeamento fa-desde os anos 1970.
A fecundidade mantém-se no entanto muito mais forte n0 campo do que
na cidade (duas vezes mais no Peru, por exemplo) porque uma balho da
mulher fora dà família é mais raro e o acesso à informação uma força de
trabalho e uma «segurança social» para a velhice dos pais.

108 - ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


B) UMA MORTALIDADE GERAL BAIXA
Uma mortalidade geral (7‰) é inferior à da Ásia (9) e situa-se muito aquém da
da Africa (15). Em todos os grandes países latino-mente à da da Europa, mas
sabemos que estacomparação não faz por idade, e a da Europa está muito
envelhecida.
Em contrapartida, se a mortalidade é mais baixa do que nos Ter-ceiros Mundos,
não impede que a população latino-americana seja mais jovem. Bem pelo
contrário, a quebra da fecundidade começou a envelhecer ligeiramente uma
população doravante composta por 34%de jovens com menos de 15 anos, contra
41% no mundo árabe-muçul-mano e 46% em Africa; só a Ásia se lhe pode, deste
ponto de vista comparar, dado que ela também é atingida por uma baixa da
fecundidade. Localmente, os jovens não formam mais de 45% da po-pulação a não
ser nos pequenos países da América Central (mapa 26); na Argentina, pelo
contrário, não são mais do que 28%.
Se a taxa de mortalidade é mais baixa do que nos outros Terceiros Mundos, é
pois de facto porque aí as condições de vida são melhores do que nos outros
sítios. A mortalidade infantil, que não é influen-ciada pela estrutura por idade,
demonstrou-o igualmente, uma vez que constatámos mais acima que ela é mais
fraca do que em qualquer outro lugar. Istonão deixa evidentemente de ter a sua
influência na evolução global da população.

C) UM CRESCIMENTO DEMOGRÁFICO QUE SE MANTÉM CONTUDO


TENSO
Com efeito, o crescimento final mantém-se mais forte do que po-deríamos
esperar, pois a mortalidade decresceu ao mesmo ritmo que a natalidade. O saldo
natural na verdade diminuiu. Entre 1950 e 1960,a América Latina conheceu a mais
forte taxa de crescimento do pla-neta; em 1965 atingia ainda 2,8% ao ano; desceu
para 1,9% actual-mente, o que certamente não se compara à África (2,9%) e ao
mundo árabe-muçulmano (2,5%) mas que ultrapassa mesmo assim a Ásia (1,7%).
O crescimento continua particularmente vivo na América Central, bem como na
Bolívia e no Paraguai (mapa 27). Seja como for, o crescimento da população
passou a menos de 2% ao ano, limite a partir do qual se estima que a última fase
da transição demográfica é alcançada e logo que as normas ocidentais estão à
vista. Enquanto

AAMÉRICA LATINA: UM PÉ NO DESENVOLVIMENTO -109


entre 1960 e 1993, a população tinha aumentado ao ritmo de 2,4% ao 2000
(mapa 30).Ninguém duvida que esta evolução se faça combas.como uma
espécie de prolongamento do Ocidente.

IV. UMA TESTA DE PONTE DA CIVILIZAÇÃo OCIDENTAL


CL. Albagli qualifica a América Latina «Extremo Ocidente do mundo
industrializado» [1] e os autores da Géographie Universelle, a propósito desta
vez das Caraíbas, empregam a expressão «clonagem da civilização ocidental»
[8]. De facto, salvo excepções (os Andes índios,a Amazónia) a América Latina
desenraíza geralmente menos o euro-peu, sobretudo o do Sul, do que o
fazem a Ásia ou a Africa ou mesmo o mundo árabe-muçulmano. Ele encontra
imediatamente as suas mar-cas: o vestuário, a cidade, a praça, a igreja, a
língua falada com conso-nâncias latinas, a língua escrita facilmente
descodificada, etc. A Amé-rica Latina aparece pois, sob muitos pontos, como
uma testa de ponte da civilização ocidental.

A) UMA COLONIZAÇÃO PRECOCE E PROFUNDA


A América Latina foi o continente mais precocemente e profun-damente
colonizado pelos europeus. O ano de 1992 recordou-nos que tudo começou
há cinco séculos. Encetada desde o final do século xv, a colonização vai
«desabrochar» sobretudo entre 1530 e 1820. Os con-quistadores portugueses
no Brasil, espanhóis nos restantes países,puderam durante três séculos impor
sem restrições a sua civilização.
Este enxerto foi realizado tanto mais facilmente quanto os autóc-tones
foram massivamente dizimados pela própria conquista e mais ainda pelas
suas consequências dramáticas: derrocada dos sistemas políticos, sociais e
culturais tradicionais, devastações causadas pela varíola, pela rubéola, pelo
tifo sobre as populações não imunizadas,suítas para pouparem estes dramas
aos indígenas agrupando-os em indígenas, um século depois não existia mais
de dez milhões [8].

110 -ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


As emigrações sucessivas não modificaram profundamente a si-quais 3,5 ao
Brasil) que trouxeram elementos da sua cultura; mas as tribuiram, nas Caraíbas,
para a emergência do crioulo, língua que permaneceucomo marginal.O contributo
europeu, pelo contrário,reforçou-se no decurso do século xix e do primeiro terço do
século xx,excesso «exportável»; estima-se em cerca de doze milhões de
pessoas,levantou problemas, dado que mais de um terço dos chegados vinham
damente, tirando alguns grupos restritos, tais como os alemães do Sul brasileiro
que levaram tempo a abandonar a sua língua.
A cultura espanhola e portuguesa, efectivamente «duas variantes de uma
mesma cultura» [8], pode pois penetrar em profundidade atra-vés da língua que,
como sabemos, não veicula apenas palavras mas também maneiras de conceber o
mundo, de o representar, de o so-nhar e de o transformar, nomeadamente pela
técnica. Hoje, a língua dos conquistadores é falada por mais de 90% da população.
Apesar de um despertar índio nos anos 70, que permitiu um certo desenvolvi-
mento das emissões radiofónicas e da escolarização nas línguas indí-genas, estas só
são faladas por 20 a 30 milhões de pessoas: 10 a 15milhões para o quichua, a língua
dos Incas utilizada nos Andes,es-tando as outras sobretudo concentradas ao Norte
de Guatemala e no Sul do México (inahualt). Estas línguas só são predominantes
(apro-ximadamente 60%) nos pequenos países (Guatemala, Bolívia). Em países
andinos como o Peru e o Equador,elas só concernem um pe-queno terço da
população e, no México, um décimo [8].
Os conquistadores trouxeram igualmente uma religião. Mesmo que o
catolicismo seja por vezes pervertido pelas tradições indígenas (afri-canas nas
Caraíbas, pré-colombianas nos Andes), mesmo que flores-çam muitas confissões,
muçulmana, hinduísta, judaica ou cristã (a elei-mantém-se de longe como a religião
dominante. Foi ele que formou as seus laços antigos (através dos jesuítas
especialmente) e actuais com fera de influência do Ocidente,aguardando talvez que
Roma não caia ano 2000, a maioria dos católicos será latino-americana...

A AMÉRICA LATINA: UM PÉ NO DESENVOLVIMENTO -111

112-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


Os conquistadores implantaram finalmente as cidades. Elas nāo a fabulosa
Cidade do México dos Astecas, mas os conquistadores vão multiplicá-las.

B) A URBANIZAÇÃO TRIUNFANTE
A América Latina vai assistir, com efeito,à realização «do maior
empreendimento de urbanização da história (dado que) em três sé-culos foram
fundadas cerca de um milhar de cidades (...) No final do século xvıII, a América
Latina é a região mais urbanizada do pla-neta»[8].
Após uma certa acalmia, a urbanização reanima-se com mais vi-gor a partir
dos meados do século xx. Entre 1950 e 1980, a população citadina aumenta 4,1%
ao ano, quando a dos campos apenas progride 0,8%. Desde 1960, o número de
citadinos ultrapassa o dos rurais e hoje, com 73% da sua população nas cidades, a
América Latina dis-tancia-se muito do mundo árabe-muçulmano (56%) e mais
ainda do da Ásia (27%) e da África (30%). Ela conta com algumas das maiores
aglomerações urbanas do mundo: Cidade do México (19 milhões de habitantes e
30 para a região urbana), São Paulo (16), Rio de Janeiro (10), Buenos Aires (11),
Lima (8), Bogotá (6) e frequentemente mais de 40%o de citadinos residem na
capital. Uma pessoa em cada quatro reside numa cidade com mais de 500 000
habitantes. Em todos os grandes países à excepção do Equador, pelo menos dois
terços dos habitantes vivem na cidade. Apenas alguns pequenos Estados da
América Central, assim como a Bolívia e o Paraguai, são menos urbanizados (mapa
28).
Entre 1980 e 2000, o crescimento deverá prosseguir, ao mesmo tempo que
abranda um pouco: 2,9% ao ano, contra 0,4% nos campos.No final do período, 200
milhões de latino-americanos viveriam em aglomerações com mais de 500 000
habitantes e a Cidade do México poderia atingir uns trinta milhões, São Paulo 26,
Rio de Janeiro 19,Buenos Aires 12, mas desconfiaremos apesar de tudo das
previsōes,frequentemente excessivas, dos demógrafos da ONU...
Esta urbanização rápida ou até selvagem é geralmente
funesta.prostituição, delinquência, etc., acompanham-na as mais das
vezes.camente, foi a cidade que foi factor de progresso económico,
social,
verificado por vezes muito elevado, como na Inglaterra do século
xIx.
Com efeito, de um ponto de vista económico,a passagem do campo dário ou
terciário traduz-se, como dissemos, num ganho de produti-Uma vez na cidade, três
em cada quatro migrantes vêem os seus gan-Nordeste brasileiro triplica o seu salário
no Rio e um trabalhador agrícola do Nordeste. O migrante revela-se frequentemente
um ele-mento positivo para a cidade: verificámos que na Colômbia e no Brasil os
migrantes que residiam desde há longa data na cidade ti-nham frequentemente
rendimentos mais elevados do que os citadi-nos de nascença.
Enfim, o crescimento urbano dá lugar a economias de escala na produção e
fornecimento de água, de electricidade, de saúde, etc.Esquecemo-nos amiúde que as
condições de vida médias são bem melhores na cidade do que no campo. Por
exemplo, a percentagem de citadinos que têm acesso aos serviços de saúde e de água
potável éduas vezes mais elevado do que o dos rurais (cerca de 80% contra 40);para o
saneamento, é cinco vezes mais. A percentagem de população abaixo do limiar de
pobreza é quase duas vezes mais forte no campo do que na cidade. Em suma, a
pobreza urbana dá nas vistas e é provo-cadora, mas não maioritária; a pobreza rural é
discreta mas mais generalizada.
Cada partida para a cidade é igualmente benéfica para o campo.Este,por vezes já
superpovoado, continua a ver a sua população a aumentar apesar do êxodo rural.
Este contribui pois para limitar,nas regiões mais pobres, a miséria rural; ele
desempenha o papel de uma válvula de segurança.
Cada vez mais vozes se elevam para sustentar esta tese. P.Mauroy,durante um
congresso realizado em Lille, em 1991, sobre o tema«As cidades, trunfos ou freios do
desenvolvimento do Terceiro Mundo»afirmava: «A cidade dos países do Terceiro
Mundo aparece como um de todos os riscos sociais, de todos os ataques à dignidade
humana, ao do desenvolvimento económico, social e cultural dos países do Terceiro
Mundo» (Le Monde 10.12.91).

AAMÉRICA LATINA: UM PÉ NO DESENVOLVIMENTO-113

114-ROBERTCHAPUIS/THIERRY BROSSARD
Este discurso, proferido pelo Presidente da Cámara de uma grande
cidade francesa, poderá parecer pouco objectivo.Ele é no entanto Mundo.
Durante o mesmo congresso, M. Arcot Ramachandran, di.tempo de
abandonar a ideia de que a urbanização nos países em vias versível» e M.
Diagne, presidente da Câmara de Longa,no Senegal,cultura, uma
microeconomia para reanimar o nosso sector privado.sar dos males de que
padecem?»
Basta, de resto, constatar a correlação positiva entre o grau de
urbanização dos Terceiros Mundos e o indicador de desenvolvimento
humano para não se ter dúvidas de que a urbanização é actualmente um
trunfo para a América Latina e uma garantia de desenvolvimento para o
futuro.

C) FRAGMENTAÇÃO E RECOMPOSIÇÃO
A uma colonização antiga sucedeu uma descolonização precoce.Salvo
raras excepções (Guianas, algumas ilhas caraíbas), a indepen-dência foi
alcançada entre 1816 e 1825 ou, no pior dos casos no se-gundo quartel do
século xix. O Império Português mantém a sua uni-dade,para dar o Brasil,
enquanto o império espanhol se fragmenta em cerca de vinte pedaços.
Os generais que dirigiram as guerras de independência tomaram
frequentemente o poder («caudilhismo»). De igual modo, a estrutura social
presta-se à instalação de um clientelismo favorável ao poder pessoal: uma
oligarquia de proprietários de grandes domínios (fazen-das, haciendas,
estancias) domina uma massa de peones (trabalhado-res agrícolas sem
terras) e de minúsculos proprietários. São pois fre-quentemente os crioulos
que assumem o poder e que mantêm as estruturas coloniais e culturais
(língua, religião).
Mas esta estrutura não garante por si a estabilidade. A América Latina
vai tornar-se rapidamente terra de pronunciamentos e de lante entre
democracia e autoridade, de princípios democráticos mes o PRI mexicano no
poder há meio século), de generais-opereta e de
da imagem de um <liberalismo democrático idealizado [ que ue
1952 e 1962, e a Bolivia tantos presidentes quantos os anos
desde a e o ressurgimento de ditaduras militares em todos os
grandes paises
Ora, eis que a década de 80 transforma completamente a paisa-guidamente no

Peru (1980), na Bolívia (1982),na Argentina(1983),tar no Haiti, de onde o

presidente Aristides foi expulso em 1991 para a democracia seja reforçada pelo

estreitamento, actualmente em curso,dos laços interestados e dos laços com os

Estados Unidos.
Desde a independência, com efeito, as relações entre Estados fo-ram
restringidas e as cooperações mais ainda. Após um período de indecisão, cada um
deles, ao contrário, havia-se mais ou menos con-solidado em nação, a favor da
estabilidade das fronteiras. Dos trinta e três Estados-nação soberanos «dois em
cada três têm uma existên-cia institucional anterior à da maior parte dos Estados-
nação da ve-lha Europa» [8] e chegou-se mesmo a dizer que os países da América
Latina haviam sido o campo de experimentação do Estado-nação.
A partir do pós-guerra, e sobretudo a partir dos anos 60, manifes-tou-se uma
vontade de cooperação. Desde 1948, por iniciativa das Nações Unidas, a
Comissão Económica para a América Latina (CEPAL)reúne-se em Santiago, apesar
das reticências dos Estados Unidos. Ela estabeleceu como objctivo «a elevação do
nível de vida,da industrialização e da diversificação da economia americana e a
melhor distribuição do seu comércio internacional» [8]. A este jun-tar-se-ão, a
partir de 1954, a planificação do desenvolvimento, a re-forma fiscal e agrária, a
cooperação técnica e novas abordagens no investimento estrangeiro.
Algumas destas ideias são postas em execução, nomeadamente 1960 é

instituída a Associação Latino-Americana de Integração que fixam como objectiyo

«a integraçãodas economias nacionais no qua-Pacto andino lança a Colômbia, o

Chile, o Equador, o Peru, a Bolívia

AAMÉRICA LATINA: UM PÉ NO DESENVOLVIMENTO - 115

116-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


tores da mecânica, da petroquímica e do automóvel. Vêem em seguida e o
CARICOM (Mercado Comum dos Países Anglófonos das Caraíbas)em
1972[23].
Os objectivos estão longe de terem sido todos realizados, dadas as de
desenvolvimento e em seguida a crise financeira, mas eles indicam e de
cultura. A prova está em que, depois de um período de abranda.ras civis na
América Central e à multiplicação das ditaduras, a ideia de uma reactivação
destas instituições voltou à tona nos anos 80.
Este retorno ao espírito comunitário traduz-se em múltiplas ma-
nifestações. Redes de cooperação são constituídas em sectores de ponta
(Relabiotec para as biotecnologias, Remlac para a microelectrónica)[8]. Em
1987, é realizado um acordo de integração e de cooperação económica entre
os dois rivais tradicionais que são a Argentina e o Brasil. Em 1990, os países
do Pacto Andino decidem dar um novo impulso à sua cooperação. Em 1991,
cinco países da América Central e o México decidem formar, até 1997, uma
zona de livre-câmbio. Nes-te mesmo ano, o Brasil e a Argentina, o Urugua e o
Paraguai, projec-tam um Mercado Comum do Cone Sul (MERCOSUR) a partir
de 1995; o Chile juntou-se-lhes, pelo menos nos factos, em 1996.
Uma certa integração está igualmente a realizar-se por intermé-dio dos
Estados Unidos. Estes, cujo domínio económico e estratégico,simbolizado
pelo célebre «a América para os americanos» de Monroe (1823),tinham a
pouco e pouco substituído o dos colonizadores euro-peus, tentam fazer
arrancar novamente a economia da América Latina, simultaneamente
suavizando a dívida (plano Brady de 1989)e incitando ao reagrupamento. «A
iniciativa para os Americanos» do Presidente Bush, anunciada em Junho de
1990, visava constituir uma vasta zona de livre-câmbio do «pólo Nore à Terra
do Fogo».
Até à data, os Estados Unidos assinaram com todos os países,trocas de
produtos e aos movimentos de capitais. A decisãotomada Yankees, de formar
uma Associaçāo de Livre Troca Norte-Americana ria ser o primeiro elemento
de um mercado comum do conjunto do continente americano.

AAMÉRICA LATINA·UM PÉ NO DESENVOLVIMENTO -117


Nova forma de colonização económica dos Estados Unidos que utilizando as
potencialidades naturais e humanas da América Lae Seja como for, é a garantia
de uma abertura acrescida para o mercado plicado por dez a partir dos anos 50
e a América Latina faz em média É igualmente uma garantia de que estão bem
atracadas às econo-deveria pois tornar-se mais do que nunca uma testa de
ponte do mundo ocidental.
Todavia, num conjunto tão vasto como este, as culturas locais, o meio
regional, a posição geográfica, a dimensão dos territórios nacio-nais,as
tradições políticas, os acasos da história introduziram deter-minadas
diferenciações espaciais que já puderam ser referidos mais acima. Tirando
algumas excepções, que incidem geralmente sobre os pequenos Estados (Haiti,
por exemplo), e pondo de parte como sem-pre heterogeneidades internas,
trata-se geralmente de matizes mais do que de disparidades fundamentais.

V.CONJUNTOS REGIONAIS POUCO


CONTRASTADOS
Seguindo os autores da Géographie Universellle, distinguiremos,na América
Latina, cinco grandes áreas que serão estudadas por or-dem do seu nível de
vida: o Cone Sul, os dois Estados-continentes (Brasil e México), a América
Andina, as Caraíbas e as Guianas,a América Central.

A) O CONE SUL: ESPERANÇAS GORADAS, ESPERANÇA


REENCONTRADA?
Três dos quatro países do Cone Sul (Argentina, Chile, Uruguai)do quarto é

diferente. O Paraguai está, com efeito, atrasado em rela-sil do que aos seus

outros vizinhos. Agregá-lo-emos no entanto ao Uruguai, uma espécie de

Estado-tampão entre a Argentina e o Bra-

118 -ROBERT CHAPUIS/THIERRYBROSSARD


sil, Seja como for, a sua população (8% do Cone Sul) 6 tal que poucy
pesa nas médias.
No final do século xix e no infcio do século xx “oB Estados Unldos
nuais dos anos 50 faziam ainda desta última a quinta ou sexta potôncla
Sul eram considerados como tendo de se juntar rapidamente ao clube
truturas económicas não apareciam então fundamentalmente
diferen.tes, ultrapassaram a Argentina e juntaram-se ao grupo dos países
de.senvolvidos. O próprio Uruguai, durante muito tempo considerado
como a Suíça da América Latina e como um dos países do mundo
socialmente mais avançados, à imagem da Dinamarca e da Nova
Zelândia, não pode agarrar-se ao pelotão dos países mais avançados.
Diversas peripécias históricas abrandaram ou fizeram regredir,com
efeito, a marcha económica destes países. Para a Argentina, por
exemplo, os autores da Géographie Universelle incriminam antes de
mais as oportunidades perdidas: pampa confiscada mais do que
colo.nizada, revolução peronista que nada muda às estruturas,aceitação
pela democracia, em 1983, da «herança económica catastrófica deixada
pela ditadura». Questionam igualmente as mudanças de política e de
conjuntura que retardaram a modernização, assim como uma ausên-cia
permanente de pacto social.
Em termos mais gerais, a instabilidade política, com as suas
alternâncias de democracia mais ou menos populista e de ditaduras
(Argentina 1976-1983, Chile 1973-1989, Paraguai 1954-1989, Uru-guai
1973-1984) e a insegurança que daí resulta (guerrilha urbana dos
Tupamaros no Uruguai), não favoreceram o crescimento. Estes países
são pois a ilustração de que o subdesenvolvimento está longe de ser
sempre causado por acontecimentos exteriores
(colonização,dependência económica). Com efeito, em condições
bastante seme-lhantes, e em certos aspectos mesmo mais difíceis devido
ao seu afas-tamento, a Austrália e a Nova Zelândia são hoje considerados
como desenvolvidos, enquanto o Cone Sul deixou-se distanciar.
soube conservar do tempo da sua «belle époque» estruturas socio-
América Latina. Em suma, apesar de um mau período económico e sua
prosperidade passada, como um nobre que empobreceu mas que soube
conservar um certo nível.
de tipo desenvolvido (quadro 7). O sector terciário emprega mais de encontra em
Portugal e na Grécia, sem contar no entanto a produti-vidade.
O sector agrícola é resolutamente marginal: apenas uma pessoa maior (8%). O
que não significa que seja medíocre, pois temos aqui penho e que vendem no
mercado mundial trigo, milho,arroz,giras-Argentina é o quarto produtor mundial:
não é o Paraguai o primeiro produtor mundial de soja e de algodão por habitante?
Sem poder ser comparado, pelo seu peso, ao dos «grandes» da América Latina
(México e Brasil), o Cone Sul dispõe de uma indús-tria manufactureira com
importância na economia nacional. Ela emprega um quarto dos activos (quase duas
vezes mais do que a agri-cultura) e participa com cerca de 30% para o PNB. O seu
leque inclui simultaneamente a transformação dos produtos locais (IAA, refina-ção
de petróleo, metalurgia do cobre) e a fabricação de produtos di-versos,tais como o
aço na Argentina desde 1970 e no Chile, os têxteis tradicionais e sintéticos, os
automóveis e camiões.
Não obstante, contrariamente ao México e ao Brasil, e muito evi-dentemente
aos países desenvolvidos, a gama de produtos é relativa-mente limitada (faltam
sobretudo os sectores de alta tecnologia) e a sua competitividade reduzida. A
indústria, demasiado tempo prote-gida por uma política de substituição de
importações e seguidamente aberta de forma demasiado brusca, impõe-se
dificilmente nos merca-dos mundiais e fica restringida aos mercados internos.
O Cone Sul conta pois ainda muito com os recursos da sua agri-cultura e do
seu subsolo e por este facto conserva aspectos que reco-nhecemos
tradicionalmente aos Terceiros Mundos, ainda que o seu caso não seja
fundamentalmente diferente do da Austrália ou da Nova comercial destes países
que, de resto, estão muito abertos para o ex-contra 17% em França. A Argentina
classifica-se em quinto lugar
Devido ao facto de o subsolo do Cone Sul ser bastante dotado,cobre
chileno,estes produtos detêm um lugar significativo nas tro-

A AMÉRICA LATINA:UM PÉ NO DESENVOLVIMENTO -119


QUADRO 7
Os espaços regionais da América Latina: indicadores
Cone Estados- América
Caraíbas América
Sul -conlinentes Andina e Guianas
Central
Econ omia

Activos agrícolas (%) 14 27 27 33 46


6 7 3
Activos nas minas (%) 5 1
1

16
Activos na indústria manuf.(%) 23 20 17
50 45
Activos no terciário (%) 58 47 32 36
Agricultura no PNB(%) 8 10 13
Minas no PNB (%) 6 8 15 5 1
20 0
Indústria manufact. no PNB (%) 26 26 22
3

Terciário no PNB (%) 50 56 52 58


PNB/habitantes (em $) 6670 3193 1908 1680 1369
PIB real/habitante ($) 5600 5603 4758 2843 3265
Dívidas/PNB (%) 33 31 54 196 154
Consumo de fertilizantes/ha(1) 256 563 650 510 656
Consumo de energia/hab.(2) 1142 1016 882 1057 264
Km estradas/100 km2 (em km) 8 17 7 16 21

Demo grafia

Densidade de populaçāo ao/por km2 13 24 20 56 62


Saldo natural (% ao ano) +1,4 +1,9 +2,1 +1,6 +2,9
Número de filhos/mulher 2,8 3,0 2,9 4,6
Mortalidade infantil (em ‰) 21 48 35 35 40
Esperança de vida (em anos) 71. 68 67 69 67
Jovens(%) 30 34 35 31 42
Populaçāo (em milhōes) 57 255 100 35 33
Evolução 1960-1993 (em % ao ano) +1,7
Evoluçāo 1993-2000 (em % ao ano) +1,4

Nível d e vida

Alfabetizados (%) 95 86 86 81 70
Alunos no primário (%) (3) 100 100 98 98
Alunos no secundário (%) (3) 69 46 55 56 34
Estudantes na universidade (%) (3) 34 13 26 18 14
Números de habitantes/médico 570 764 1018 2543 2142
Calorias por dia e por hab. 2780 2955 2419 2520 2408
Número de habitantes/automóvel 13 12 40 80 83
Citadinos (% da pop. total) 83 76 72 58 47
Indicador do Desenvolv. Humano 868 814 780 636 632

(1) Centenos de g. nutritivos/ha.


(2) Em kg de equivalente petróleo.

(3) % do grupo de idade.

120 - ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD

AAMÉRICA LATINA: UM PÉ NO DESENVOLVIMENTO - 121


dial à frente dos Estados Unidos,o cobre assegura por si só perto
talvez reforçada com a descoberta, em 1988, da mais importante
cobriria assim cerca de metade das necessidades mundiais a partir
do ano 2000.
blinhámos, uma das principais originalidades do Cone Sul. A popula-
europeia, sobretudo espanhola, mas também italiana na Argentina,de os
índios, já pouco numerosos aquando da colonização, terem sido massacrados
ou rechaçados para o Sul, à excepção dos Guaranis do Paraguai, cuja etnia e
cultura foram miraculosamente conservadas pelos jesuítas, e de 130 000
índios que sobreviveram no Chile.Deve--se igualmente às características
temperadas do clima e à riqueza das terras (aliás pouco ocupadas) que
atraíram os europeus do Oeste e do Sul. Estamos pois a lidar aqui com uma
América Latina branca ou pouco mestiça.
O comportamento demográfico é praticamente de tipo
europeu:natalidade e fecundidade iguais às da França dos anos 50 (3 filhos
por mulher), mortalidade reduzida (7‰), e portanto um crescimento
relativamente lento (1,4% ao ano). A população envelhece, simulta-
neamente pela diminuição do número de jovens (menos de 30% da
população tem menos de 15 anos) e pelo aumento do das pessoas ido-sas
(praticamente o dobro da média dos Terceiros Mundos).
Ao invés, contrariamente à da Europa, a população, tendo chegado
tardiamente a um país quase vazio, ainda não teve tempo de se densificar.
Globalmente, o Cone Sul é um cone vazio. Uma população equivalente à da
França dispõe de um território oito vezes maior do que o nosso país. Vista da
Europa, nem sempre nos apercebemos de que a Argentina equivale a cinco
vezes a França e que o «pequeno»Paraguai é quase tão vasto como o nosso
país.
Este vazio parece ainda mais impressionante se considerarmos logo em

territórios muito exíguos, e mesmo mais precisamente quarto,e por vezes

mais de metade da população total. Na Argen-litana em Santa Fé, nos 500 km

do litoral amontoam-se metade dos

122-ROBERTCHAPUIS/THIERRYBROSSARD
34 milhões de argentinos» [8]. A região metropolitana de Buenos Aires
concentra sô ela 11 milhões do pessoas em 3800 km", ou seja, meio
departamento francês. No Chile cinco sextos estão urbanizados e um
chileno em cada três mora no Grande Santiago. Nove uruguaios em cada
dez moram na cidade, e mais de metade em Montevideo ou nos seus
subúrbios. Mesmo o Paraguai, onde os citadinos são ligeira-mente
minoritários, é afectado pela macrocefalia: a Grande Assunción ultrapassa
um milhão de habitantes num país que no total não conta mais de quatro.
Apesar da desclassificação económica que conheceu nas décadas de 70
e 80, o Cone Sul mantém o melhor nível de vida da América Latina. Com
um PIB real de mais de 5600$ por habitante (contra 5080 em média), uma
ração calórica por habitante equivalente à do Japão (2780 contra 2860), um
enquadramento sanitário análogo ao da França, uma alfabetização quase
total, uma escolarização de bom nível (aproximadamente 70% dos jovens
no ensino secundário,30%na Universidade), um IDH que se aproxima dos
900 pontos, o Cone Sul não tem nada a invejar, pelo menos globalmente a
Portugal, àGrécia e aos países do Leste.
No entanto, as disparidades espaciais e sociais, tradicionalmente menos
gritantes do que noutras partes, acentuaram-se de há duas décadas para
cá. Na Argentina, segundo os autores da Géographie Universelle, 22% da
população estava, em 1980, abaixo do limiar de pobreza e, em 1984,
metade dos assalariados da Grande Buenos Aires «ganhavam no máximo o
equivalente a 1,2 salário mínimo vital», situação que levou a sublevações
em 1989. Outros exem-plos foram dados mais acima. A retoma actual do
crescimento (cerca de 5% ao ano desde o início dos anos 90) deveria
reconduzir o Cone Sul a uma situação mais em conformidade com um
passado mais brilhante.

B) BRASIL E MÉXICO: DOIS GIGANTES TARDIAMENTE


CHEGADOS

Associaremos os dois Estados-continentes que são o Brasil e


0México para os compararmos aos países do Cone Sul. Se nos
referir-mos simplesmente ao PIB real por habitante, os dois
gigantes não se distinguem do Cone. Uma análise mais fina faz
aparecer algumas diferenças, mas que nunca são fundamentais.

AAMÉRICA LATINA:UMI PÉ NO DESENVOLVIMENTO -123


guem. Só eles dois, cobrem mais de 10 milhōes de km?, ou seja mais
pulaçao.Pelo seu poder económico, diferem igualmente dos outros sam no
total890mil milhões $, quase tanto, eles sozinhos, como o Reino
Unido(1010).Vimos mais acima que pelo seu peso industrial podem ser
considerados, sob este ponto de vista, como potências mé-dias à escala
mundial.
Este poder económico dá-lhes um papel internacional, e sobre-da
Argentina, mas que não é senão a décima-sétima potência mundial.a um
mercado interno relativamente vasto e que cresce sem cessar devido ao
desenvolvimento das classes médias.
As estruturas económicas deixam aparecer algumas divergências (quadro
6). A agricultura ocupa um lugar mais relevante no Brasil e no México do
que no Cone Sul, sobretudo no emprego (27% contra 14%), sinal da
persistência de bolsas agrícolas atrasadas (Yucatan mexicano, Amazónia e
Nordeste brasileiros). A indústria manufac-tureira ocupa aí um lugar um
pouco menor no emprego. Em contrapartida, é pela diversidade, pela
competitividade e pela tecnicidade da sua produção que o Brasil e o México,
verdadeiros NPI como mostrámos mais acima, estão a ganhar a dianteira ao
Cone Sul. A lentidão do sector agrícola deixa ao sector terciário uma parte
mais reduzida do que no Cone Sul,pelo menos no referente aos empregos.
Tardiamente chegados ao desenvolvimento económico, tendo cres-cido
rapidamente sem conhecer as mesmas inflexões que os países do Cone Sul,
Brasil e México recuperaram o seu atraso em termos de rendimento, mas
ainda não o conseguiram fazer em termos de condi-ções de vida. O seu meio
sanitário é mais medíocre, a escolarizaçāo menos avançada, particularmente
na Universidade, a alfabetização menos generalizada, a urbanização menos
extrema.
Tudo isto contribui para uma transição demográfica menos avan-çada:
fecundidade um pouco mais elevada e logo natalidade mais induz também
um IDH mais fraco (50 pontos a menos), mas que aparecem, ao lado dos
países do Cone Sul (excepto o Paraguai), como novos ricos.

124-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


C) OS PAÍSES ANDINOS: A AMÉRICA LATINA E ÍNDIA..
Os países andinos estendem-se da Venezuela à Bolívia, passando 100 milhões
de habitantes, ou seja 20% do total latino-americano e um lado à sua posição na
cordilheira dos Andes e, por outro, à «sua tas terras do Novo Mundo (...), ali onde
sobre as estruturas do Esta-do pré-colombiano se enxertaram nas da cultura
espanhola» [8]. De-masiado montanhosos, não interessaram, à excepção das
minas, as populações europeias que vieram embranquecer o Cone Sul. Trata--se
pois do espaço mais índio da América Latina.
A situação e evolução demográfica da América Andina estão pró-ximas da do
Brasil e do México, excepto que a fecundidade é ligei-ramente mais forte, bem
como o crescimento anual. Mas é sobretudo do lado da economia e do nível de
vida que é preciso procurar um certo desfasamento entre os dois conjuntos, e
mesmo assim não em todos os domínios. A América Andina aparece como um
pouco mais agrícola e um pouco menos industrial, não tanto pela proporção de
mão-de-obra ocupada em cada um destes sectores (em suma bastante próxima)
mas pelo seu peso no PNB. A sua indústria é igualmente menos diversificada e
tecnologicamente menos avançada. A estrutura das exportações denota
igualmente um certo atraso económico, uma vez que os produtos primários
(combustíveis, minerais e metais, pro-dutos agrícolas não transformados)
participam com 85%, contra 35%no Brasil e no México. O crescimento económico
foi mais lento entre 1960 e 1980 (5% contra 8%) e continuou a sê-lo nos anos
80;pelo contrário,nos anos 90, é sobretudo melhor nos países andinos do que no
México e no Brasil.
O mesmo desfasamento transparece nos rendimentos e nos níveis de vida. O
PIB real ultrapassa largamente os 4000$, mas é inferior em 15% ao dos dois
Estados-continentes. A alimentação situa-se no limite do suficiente, o
enquadramento médico é mais modesto, oindi-cador do desenvolvimento humano
um pouco inferior, a motorização mais medíocre, a rede rodoviária menos densa,
mas a urbanização progride rapidamente e o nível de alfabetização é idêntico.
Nesta América Andina, Colômbia, Equador e Peru situam-se sen-
sivelmente ao mesmo nível de desenvolvimento. A Bolívia,pelo con-um
IDH de menos de 580 pontos e um PIB real de 2500$, mas ela não
representa senão 8% da população total. A Venezuela, onde o efeito-
pelo contrário as mais das vezes à cabeça.

D) CARAÍBAS CHEIAS E GUIANAS VAZIAS


socioeconómico vêm, atrás da América Andina, as Caraíbas. Nestas de habitantes
(Cuba, República Dominicana, Haiti, Jamaica, Porto povoado (180 hab/km2),
exceptuando as Guianas quase vazias (ron-da um milhão de habitantes e menos de
5 hab/k ㎡ 2), mas só é habi-tada por 35 milhões de habitantes, ou seja 7% da
população total da América Latina; o Estado mais populoso (Cuba) ultrapassa com
difi-culdade o limiar dos 10 milhões de habitantes.
E, não obstante, esta América caraíba é muito mediatizada.Evoca ao mesmo
tempo paisagens de sonho e imagens de pesadelo:movimentos revolucionários e
contra-revolucionários aí se afronta-ram,ditaduras de direita e de esquerda aí
ocuparam e ocupam por vezesainda a primeira página dos jornais (os Duvallier no
Haiti, Cas-tro em Cuba, etc.), o pai castigador americano tenta com mais ou menos
êxito aí fazer reinar uma ordem que lhe convém: fracasso em Cuba em 1961,
sucesso em Granada em 1983, sucesso seguido de fra-casso no Haiti, com a eleição
do pai Aristídes seguida da sua deposi-çāo através de um golpe de estado, sucesso
novamente com o regresso deste em 1994,etc.
Apesar desta história caótica, a comparação com a América Andina nāo é
sistematicamente favorável a esta última (quadro 7). Por exem-plo, a transição
demográfica é mais avançada nas Caraíbas,uma vez América Andina) e crescimento
anual para 1,6%. A América Andina primários (agro-alimentares e mineiros)
representam num e noutro caso a quase totalidade das exportações (85%).
América Andina, quer o meçamos pelo PIB real (1900$ menos) quer
facto matizada vista ao pormenor uma vez que a alfabetização, a

A AMÉRICA LATINA: UM PÉ NO DESENVOLVIMENTO-125

126-ROBERT CHAPUIS/ THIERRY BROSSARD


médico e a motorização são mais medíocres nas ilhas.Tudo se bas oferecessem
condições de vida comparáveis às da América La.tina.
mas onde vivem menos de 2% de latino-americanos. Este país é ao mesmo
tempo o mais prolífico das Caraíbas(cerca de 5filhos por PIB real/hab.) e
aquele em que as condições de vida são piores (IDH Caraíbas.

E) UMA AMÉRICA CENTRAL NA CAUDA


Se a comparação entre a América Andina e as Caraíbas pode pres-tar-se a
comentários matizados, a comparação das Caraíbas e da América Central
aparece, com efeito, como a malha mais fraca da América Latina. Ela é-o pela
sua população (33 milhões de habitan-tes, ou seja, menos do que a Colômbia
sozinha por exemplo) e pela sua explosão política. Sete Estados partilham o
equivalente à super-ficie da França, para metade da população; o mais
populoso (a Guatemala) não ultrapassa os 10 milhões de habitantes. E, para
além da proximidade com os Estados Unidos, o que explica um domínio
americano quase sem restrições, à excepção da década sandinista na
Nicarágua que terminou em 1990.
Em quase todas as frentes, a América Central está na retaguarda (quadro
7). É uma realidade no plano económico: uma agricultura forte fornecedora de
empregos (quase metade do total dos activos)para uma parte fraca no PNB
(cerca de 20%), sinal de uma fraca produtividade, um sector industrial médio,
pelo menos como empre-gador, um consumo de energia muito fraco.
Continua a ser uma realidade para o nível de vida. O PIB real émais elevado
na verdade do que o das Caraíbas, mas a alfabetização émais fraca, a
escolarização mais medíocre sobretudo no ensino se-cundário,a alimentação
mais próxima do mínimo vital, o enqua-dramento médico mais fraco e o IDH
desce aqui aos 630. A transição fecundidade aproxima-se dos cinco filhos por
mulher, o crescimento dos 3% ao ano e a população aqui se mantém mais
jovem.
CONCLUSÃo
Existe pois, de facto, do Cone Sul à América Central, uma certa nhos do mais mal
colocado dos conjuntos regionais da América La-e da África. Tirando o.crescimento
demográfico, inferior na Ásia e da desempenho do que a Africa e melhor do que a
Ásia. As diferenças respeito ao nível de vida: mortalidade infantil duas vezes menos
forte,Central ao mais bem colocado dos conjuntos regionais da Ásia, ou temente na
retaguarda, nomeadamente com um PIB real e um IDH inferiores.
No total, não somente a América Latina se distancia largamente da Ásia e da
África pelo seu desenvolvimento económico e social, mas as suas regiões mais
avançadas se equiparam com muitos dos países considerados desenvolvidos e as
suas regiões mais atrasadas compa-ram-se ou mesmo superam as melhores dos
outros Terceiros Mundo,excepto o mundo árabe-muçulmano. A comparação com
este último ocasiona, com efeito, comentários mais matizados uma vez que os dois
Terceiros Mundos estão relativamente próximos um do outro,pelo menos em
determinados pontos.

A AMÉRICA LATINA: UM PÉ NO DESENVOLVIMENTO - 127


4

o MUNDO ÁRABE-MUÇULMANO:
ISLAO E PETROLEO

Os limites da América Latina não levantavam problemas, os do mundo árabe-


muçulmano merecem algumas explicações. Este nāo recobre evidentemente
todo o espaço islamizado. Se assim fosse, ter--se-ia de aí incluir um imenso
espaço estendendo-se do Senegal e da Mauritânia ao Paquistão e à Indonésia. O
mundo árabe-muçulmano tal como o entendemos aqui é um espaço ao mesmo
tempo islamizado e arabizado (salvo raras excepções), que vai do Magrebe ao
Irão e da Península Arábica à Turquia.
Se o Magrebe, a Líbia, o Egipto, a Península arábica (Arábia Saudita, Koweit,
Emirados Árabes Unidos, Oman, Iémen), os Esta-dos do crescente fértil (Iraque,
Líbano, Síria, Jordânia)não colocam problemas, as hesitações surgem a
propósito de outros Estados. São facilmente superadas pelo Irão, não arabizado,
mas islamizado e tra-dicionalmente incluído no Médio Oriente. Elas aparecem
mais fortes para a Turquia ligada à Europa mediterrânea pelo Banco Mundial,
àAsia pela FAO, mas que o islão e o seu nível de desenvolvimento apro-ximam
do mundo árabe-muçulmano no qual o incluiremos pois. Em contrapartida,
excluiremos o Afeganistão, apesar dos seus laços ul-turais evidentes, mas cujo
nível de vida e de desenvolvimento leva-grado no mundo indiano, pois a sua
pertença ao antigo império das
mento presente, do que o vínculo etnolinguístico.A Mauritânia, conquanto faça parte do
Magrebe árabe, enquadra-se

OMUNDO ARABE-MUÇULMANO: ISLAOE PETRÓLEO -129

130 -ROBERT CHAPUIS/THIERRYBROSSARD


que na area árabe-muculmana.O mesmo contece com
ouda
nível de vida e de desenvolvimento à África subsariana.

Israel e Chipre foram afastados do estudo.O primeiro,pela sua árabe-


muçulmano... Mas excluiremos igualmente paísesdoTerceiro
islamizado,Irael é hoje um país desenvolvido. E-o pela sua econo.mia
(perto de um terço da população activa naindústria,66% no um
enquadramento médico entre os melhores do mundo e por um IDH
superior a 900.
O mesmo se poderá dizer, ou quase, do Chipre. Com uma indús.detém
quase o mesmo lugar que o de Israel, o Chipre está doravante é aí mais
baixa do que em Israel (19‰) e todos os critérios de nível de vida indicam
o desenvolvimento: a esperança de vida, por exemplo,equivale à da
França.
Assim defiido, o mundo árabe-muçulmano compreende 16 esta-dos
com mais de um milhão de habitantes, povoados com aproxima-damente
340 milhões de habitantes, ou seja, sensivelmente menos do que os 480
milhões da América Latina. Mas, enquanto podemos jáconsiderar esta
como industrializada, pelo menos em relação aos ou-tros Terceiros
Mundos, o mundo árabe-muçulmano está, no seu caso,em vias de
industrialização.

I.PAÍSES EM VIAS DE INDUSTRIALIZAÇÃO


No respeitante ao emprego, o mundo árabe-muçulmano man-tém-se
fundamentalmente agrícola uma vez que a agricultura ocupa 35% dos
activos. Mas atendendo à riqueza produzida, já não o é,visto que a
agricultura não fornece mais do que cerca de 18% do PNB. Pelo
contrário,os cerca de 24% dos empregos assegurados pela indústria (no
sentido amplo) criam mais de um terço do PNB.Nada de comparável no
entanto com a América Latina, pois perto essencialmente do petróleo,
enquanto na América Latina não é senão um terço.

O MUNDO ARABE-MUÇULMANO: ISLÃO E PETRÓLEO- 131


O MUNDO ARABE-MUÇULMANO: ISLÃO E PETRÓLEO- 131
A) O REI-PETRÓLEO
base da riqueza do mundo drabe-mugulmano, simultaneamente pe
nais ou menes directamente e, como veremos mais tardo, pelas
apli.cações que sustentam.

dotoneladas de petróleo, ou seja um terço da produção

mundial. Como tém igualmente dois terços das reservas

mundiais e até mais se tiver-Saudita reavaliou, de uma só vez,

as suas em mais 50%! As descobertas na mesma altura as suas

reservas. No próximo século, os países do


Mas é verdade que se devem distinguir os países que vivem das
Saudita 425 milhões de toneladas, Irão, Koweit, Emirados Árabes Unidos,
entre 100e 200 de toneladas) posicionam-se alguns médios Líbia) e
pequenos (Bahrein, Qatar, Oman, Síria, Tunísia, Iémen:menos de 40
milhões de toneladas). Alguns,raros mesmo assim, não possuem nada,
como Marrocos e a Turquia.
As reservas estão igualmente mal repartidas. A Arábia Saudita
açambarca só ela um quarto das reservas mundiais; o Iraque, os Emirados,
o Koweit e o Irão detêm cada um deles 10%, a Líbia, a Argélia 1 a 2%. Os
outros possuem menos ainda e alguns absoluta-mente nada, pelo menos
no estado actual das pesquisas.
O gás natural pesa, até ao momento, muito menos do que o petró-leo.
Só fornece 5% da produção comercializável do mundo (cerca de 150 mil
milhões de m3). Mas ele opera, aqui como noutros lados, uma rápida
penetração. Foram realizados ou estão em curso grandes pro-jectos tanto
na Arábia Saudita (duplicação em quatro anos),como no Irão (duplicação
prevista em 10 anos) e na Argélia onde o aumento da capacidade de
liquefacção está em curso; a Argélia é, já presente-mente, o segundo
produtor de gás natural liquefeito do mundo, atrás dos Estados Unidos.
Atrás destes três países, que são os principais produtores (entre 30 e 60
mil milhões de m3), vêm, mas bastante ainda. As reservas estão
igualmente mal repartidas. O Irão detém
14% do total mundial, a Arábia Saudita,Abu Dhabie

Qatar aproxi-

Os hidrocarbonetos mantêm um peso considerável nas


exportagōes
do mundo árabe-muçulmano. Formam, com efeito,em média,três quar-

naLíbia,no

Irāo, na Argélia, na Arábia Saudita e nos Emirados Arabes Unidos.


o maná petrolífero foi, e continua a ser ainda um dos principais facto.res de
industrialização do mundo árabe-muçulmano.

B) UMA INDÚSTRIA MANUFACTUREIRA RECENTE,MAS QUE


COMEÇA A TER PESO
Antes da última guerra, alguns germes de industrialização ha-viam sido
semeados no Magrebe, sob dominação francesa, e no Egipto onde Mehemet
Ali havia começado, no início do século xix, a implan-tar uma indústria têxtil.
Mas, esterilizados pela concorrência e pela oposição das metrópoles, quase
não tinham dado frutos. A indústria de então consistia essencialmente numa
primeira transformação das matérias-primas, tais como os fosfatos do
Magrebe, o algodão do Egipto, o petróleo do Médio Oriente (descoberto no
Iraque em 1913)e a lã, utilizada no artesanato um pouco por todo o lado. Em
1965ainda, para além do Iraque, do Irão e da Tunísia, nenhum país da região
tinha mais de 17% da sua mão-de-obra empregada na indús-tria (A.
Dubresson e A. Vanneph).
A situação é hoje totalmente diferente. Com 20% da sua popula-ção
activa na indústria manufactureira, o mundo árabe-muçulmano vem ao
mesmo nível que a América Latina (19%),mas bastante àfrente da Ásia (14%)
e da África (10%). E não se trata de médias artificiais uma vez que, em todos
os grandes Estados, a mão-de-obra empregada na indústria manufactureira
ultrapassa 18% do total, para atingir de 20 a quase 30% na Argélia, na Arábia
Saudita, em Marro-cos, na Síria, no Iraque e na Tunísia (mapa 5).
A participação desta indústria manufactureira para o PNB man-tém-se,
contudo, modesta, e muito inferior à da América Latina (mapa 6), o que se
poderá considerar como o índice de uma actividade pouco diversificada e
menos produtiva. Os mapas elaborados por D. W.Curran revelam que o valor
acrescentado por habitante do mundo árabe-muçulmano é intermédio entre
o da América Latina, onde ul-trapassa geralmente os 400$, e o da Ásia onde
cai abaixo dos 200$, ou

132 -ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


dos
e . o nundo arabe-mugulimano die p r e un de capacidade mundial send o ee i ea e e e

trca de grandesprodutores sãotambém os mais importantes refinadores.mente em

Jubail, a mais vasta plataforma petroquímica do mundo;。caiu para menos de 20.


póem de um mercado interno apreciável, alçam-se ao nível dos gran-parte dos
outros produtores dotaram-se de capacidade de refinação alguns não produtores
ou fracos produtores implantaram mesmo ou porque eles estão bem colocados
para revenderem os produtos re-finados. A Turquia, que dispõe da quarta
capacidade da região, en-contra-se neste caso, do mesmo modo que, mas em
menor medida,Marrocos.Assim, uma dezena de unidades de refinação estão
instaladas ao longo das costas do Mediterrâneo, tanto no circuito do mar
Vermelho e do golfo Pérsico e mais uma dezena no interior, nomeada-mente na
proximidade das grandes aglomerações. A estes unidades,importa juntar as que
liquidificam o gás na Argélia, na Líbia e nos Emirados Árabes Unidos.
Esta dominação do petróleo é ilustrada pelo facto de, no Médio Oriente pelo
menos, das dez primeiras firmas da região, sete serem companhias que extraem
petróleo ou o refinam. São frequentemente uma indústria química mais fina. Na
Arábia Saudita, a petroquímica Pérsico) e Yanbu (mar Vermelho), na Líbia etileno e
polietileno,um

Outras indústrias só se puderam implantar graças à energia


ba-pela renda petrolífera. Estamos a pensar nas cimenteiras
que flo-e e e essarias de resto ae excepcional surto de
construção e de

O MUNDO ARABE-MUÇULMANO:ISLAO E PETRÓLEO - 133

134-ROBERTCHAPUIS/THIERRY BROSSARD
tamentos,etc.) que conheceram os pafses petroliferos entre a
subid
As fábricas de dessalinização da águn do mar multiplicaram-se os anos 100
milhoes de ma de água; nos Emirados Arabes Unides,existiam; uma outra funciona
em Oman. OKoweitdispõe de seis 150 milhōes de m. Várias zonas industriais e
portuárias viram a luz do dia no Irão, no Iraque, na Arábia Saudita.

Os petrodólares alimentaram por vezes projectos mais ambicio.base,


no âmbito de uma via de desenvolvimento autocentrado, e para
industrializantes». O caso mais conhecido é o da Argélia socialista
hidrocarbonetos e a cadeia petroquímica, mas também sobre a
side.cascata as indústrias a montante (metalúrgica, mecânicas,
eléctri.investimentos industriais, o que constituía um recorde mundial.
Esta política permitiu à Argélia tornar-se um pequeno produtor de
aço (aproximadamente 1 000 000 de toneladas), mas não desenvol.veu
senão um número limitado de indústrias de jusante, como a cons-trução
de máquinas agrícolas, de motores, de automóveis. O tecido industrial
manteve-se muito incompleto e estas indústrias indus-trializantes
tornaram-se abismos financeiros, simultaneamente aquando da sua
implantação, visto que necessitavam de técnicos e patentes estrangeiras,
e pelo seu funcionamento. Com efeito, o medío-cre domínio técnico do
pessoal local, a obrigação de comprar peças de substituição ao
estrangeiro, a inércia administrativa destas fábricas estatizadas, bem
como a estreiteza do mercado local não deixaram por vezes funcionar
estas dispendiosas «catedrais no deserto» a mais de 30 ou 50% da sua
capacidade. Fortemente capitalísticas, tinham o inconveniente
suplementar de criarem relativamente poucos empre-gos. A baixa do
preço do petróleo e a queda do dólar desferiram em seguida um golpe
muito duro ao conjunto do sistema e levantaram a questão de uma
privatização que acaba de arrancar com a abertura de jazidas
petrolíferas e de gás às companhias estrangeiras.
ciosas, viramo dia para criar uma indústria pesada não petrolífera,
no intuito de servir de apoio a indústrias mais diversificadas Na

bie ,e e eruído e que custou 12 mil milhoes $, trabalha o

minénegligenciavel(13 milhoe detoneladas), enquanto a

producão se mao milhões de toneladas ou menos).


prio local os recursos locais para criar um máximo de valor acrescen-derivados tais
como o ácido fosfórico, os fertilizantes químicos.das) e em alumínio (60 000
toneladas). Determinados países utilizam mas vindas de fora. O Egipto produz 180
000 toneladas de alumínio Emirados Árabes Unidos fornecem quase a mesma
quantidade e a bauxite australiana é tratada no Qatar.
Enfim,desde há muito sob uma forma artesanal, e desde há cerca de vinte
anos a uma escala mais industrial, o mundo árabe-muçul-mano assistiu ao
desenvolvimento de indústrias de bens de consumo fundadas, pelo menos à
partida, nas produções agrícolas locais. As indústrias agro-alimentares, que
ficaram frequentemente no estádio artesanal ou semiartesanal, são as mais
disseminadas: fabricação de farinhas, sémola, óleo, açúcar, tabaco, bebidas,
conservas de peixe,frutas e legumes, trabalho do couro, etc.
A indústria têxtil atingiu geralmente um estádio mais
industrial,nomeadamente graças aos industriais europeus que não querem ir
buscar demasiado longe uma mão-de-obra barata. Certos países ára-be-
muçulmanos tornaram-se temíveis concorrentes nos mercados in-ternacionais,
para a fabricação de fio, de tecidos, de vestuário.O conjunto do mundo árabe-
muçulmano produz cerca de 900 000 to-neladas de algodão (França 100 000),
dentre os quais dois terços no Egipto e na Turquia, assim como perto de 400 000
toneladas de fi-bras sintéticas (França 130 000).
Sinal de uma certa diversificação industrial, a parcela dos produ-atingir hoje

35% do total, cifra ainda modesta mas em rápido cresci-Tunísia, por 6 na Arábia

Saudita, por 9 em Marrocos e por 34 na de 40 a 4% e a dos produtos

manufacturados de 20 a 75%; no Egipto,

O MUNDO ÁRABEMUÇULMANO: ISLĀO E PETRÓLEO - 135


a parcela do algodão fibra desce de 60 para 10%, enquanto as dos produtos
industriais sobe de 20 para 40%; em Marrocos, as exporta-ções de produtos
primários passam de 95% do total a 45%, em bene-fício dos produtos
manufacturados.
Esta diversificação tem todas as possibilidades de ser prosseguida,graças às
zonas francas industriais que começam a instalar-se por exemplo no Bahrein e nos
Emirados Árabes Unidos, como também às privatizações. Com efeito, um pouco por
toda a parte, desde os países socialistas às monarquias mais ou menos absolutas,
pesadas regulamentações acorrentam a empresa privada. Hoje, de Marro-cos ao
Irão, passando pela Argélia, pelo Egipto, Iraque, Síria,Tur-quia e mesmo a Líbia,
flexibiliza-se a regulamentação, privatiza-se,procura-se investidores estrangeiros, e
até a rica Arábia Saudita contrai empréstimos para investir. O Koweit liberaliza os
preços, a Argélia faz explodir os cerca de vinte grandes combinats 1 em meio milhar
de empresas mais pequenas. Em Marrocos, onde já agora 80% do PNB é gerado pelo
sector privado, 75 empresas que empre-gam 40 000 assalariados foram privatizadas
entre 1992 e 1995.
O mundo árabe-muçulmano encontra-se pois em vias de indus-trialização, mas
o nível atingido ainda não é comparável ao da Amé-rica Latina. Os maiores
produtores de petróleo contam ainda essen-cialmente com este produto e com as
actividades por ele induzidas para se desenvolverem, mas a estagnação actual dos
preços retarda o processo de industrialização. Os outros, produtores médios mas
muito populosos, ou pequenos produtores ou mesmo não produtores esfor-çam-se
por criar ou por reforçar o seu tecido industrial valorizando o trunfo económico que
constituem os baixos salários distribuídos àsua mão-de-obra. Ao inverso de certos
países da América Latina,a todos falta uma verdadeira rede de empresas, mão-de-
obra local bem formada, quadros, engenheiros, indústrias de ponta. A indústria do
mundo árabe-muçulmano sofre igualmente por apenas dispor de um mercado
interno demasiado estreito devido à existência de uma massa de agricultores com
rendimentos limitados.

C) UM SECTOR AGRÍCOLA PREPONDERANTE NO EMPREGO MAS


POUCO PRODUTIVO
O sector agrícola, como vimos, continua a ser preponderante no
emprego, uma vez que 35% dos activos ainda aí trabalha. É muito

1 Na URSS, reunião de vários estabelecimentos industriais. (N.T.)

136-ROBERT CHAPUIS/THIERRYBROSSARD
menos do que na Ásia ou em África, onde seis activos em cada dez sāo todos os países

com mais de 10 milhōes de habitantes, à exclusão da 45% na Turquia. Apenas alguns

pequenos países (Emirados Árabes população activa no trabalho da terra (mapa 2).
Estes números são tanto mais surpreendentes que o mundo ára-be-muçulmano
corresponde, salvo raras excepções (litoral do Medi-terrâneo e do mar Negro, certas
montanhas), a um vasto conjunto de estepes e de desertos onde as culturas estão
submetidas a condições climatéricas fortes ou extremas que fazem oscilar a produção do
sim-ples para o dobro (ou mesmo pior) de um ano para o outro.
Apenas os países mais bem colocados (Magrebe, Turquia) ou aque-les que instalaram
uma rede de irrigação (Egipto, países do crescente fértil) conseguiram dotar-se, pelo menos
localmente e em certas ex-plorações modernas, de uma agricultura de bom nível,
simultanea-mente produtiva e competitiva. É o caso de Marrocos que exporta
citrinos,legumes de Inverno e flores, da Tunísia (azeite), da Turquia (passas, amêndoas), do
Egipto (algodão).
Os investimentos faraónicos de determinados países para irriga-rem o deserto e aí
cultivarem trigo resultam mais de um desejo de autonomia alimentar e de prestígio do que
de uma preocupação de eficácia e de rentabilidade. É o caso das obras levadas a cabo desde
1984 pela Líbia para realizar o Grande Rio artificial que deveria le-var as águas dos lençóis
freáticos do Sul para Tripoli e Benghazi, ao longo de 4000 km. Eles deveriam aumentar a
superfície irrigada em 160 000 ha e custar 25 mil milhões $. A Arábia Saudita, que realizou
grandes e dispendiosas obras nos seus desertos, dispõe agora de 430 000 hectares irrigados;
triplicou é verdade a sua produção de trigo, mas paga-o aos seus produtores três a cinco
vezes o preço mun-dial, e exporta, mas evidentemente a perder...
A agricultura é pois dual. Ao lado das explorações modernas sub-siste uma massa de
pequenas explorações arcaicas, ainda largamente autárcicas, e que se dedicam
essencialmente a culturas de subsistên-cia (trigo e cevada sobretudo) de fraco rendimento
(com frequência menos de 15 quintais por hectare).
Nos números pelo menos, a criação de gado parece ocupar um percorrem as
estepes da região, entre as quais 40% no Irão e na Tur-nos mesmos países, são criados
nas zonas mais húmidas. Mas trata-

O MUNDO ÁRABE-MUÇULMANO: ISLĀO E PETROLEO-137


mentos ultrapassam pouco mais de 700 litros por vaca no Irão,por exemplo,
contra 5000 em França.
Por exemplo, o valor acrescentado por agricultor turco é dez vezes infe.que o
do agricultor latino-americano. No total, a agricultura participa ou a Síria,
onde esta percentagem é em muito ultrapassada (mapa 3).
Não nos surpreenderemos pois que, apesar de fortes contingentes de
agricultores, todos os grandes países sofram de um desequilíbrio da sua
balança comercial agrícola, à excepção de Marrocos e da Tur-mundo árabe-
muçulmano acumulam um défice agrícola de cerca de vinte mil milhões $.
Este défice equivale a 5% pelo menos do PNB no Egipto,na Jordânia, na
Argélia e no Iémen. Apesar das obras espec-taculares a que acima se aludiu, o
deficite atinge 4% do PNB na Líbia.Noutros países, situa-se entre 1 e 3%. O
Egipto é o terceiro importa-dor mundial de trigo e de farinha.
Na maior parte dos casos, a agricultura passou, para além dos freios
ligados às mentalidades e às técnicas tradicionais, por políticas de
nacionalização ou de colectivização das terras e pela prioridade acordada aos
investimentos industriais. O caso da Argélia, que sacri-ficou a sua agricultura
sobre o altar da indústria e do socialismo, ésintomático uma vez que este
país, conquanto se encontre entre os mais bem dotados, apenas consegue
prover a 30% das suas necessida-des alimentares. O sector terciário sofreu
também ele com estas polí-ticas, mas conhece actualmente um rápido
desenvolvimento.

D) UM SECTOR TERCIÁRIO EM RÁPIDO


DESENVOLVIMENTO

Aproximadamente 40% da população activa trabalha doravante no sector


terciário. É um pouco menos do que na América Latina,mas muito mais do
que na Ásia e em África, onde comércio e serviços fornecem cerca de um
quarto dos empregos. Por todo o lado, salvo no Iémen, pelo menos um terço
dos activos trabalha no sector terciário (mapa 8). Em vários Estados, metade
dos activos estão aí emprega-60% é ultrapassado. O sector terciário cria
doravante perto de metade

138 - ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


do PNB e a Argélia e o Irão são os únicos países em que esta proporção
desce abaixo dos 40%(mapa 9).

informal e sobre o interesse económico de determinados empregos ristas, etc.), não


deixa de ser verdade que este sector parece bastante PNB. Um certo número de
actividades são relativamente desenvolvi-das,como a banca.

1.A BANCA: TRADIÇÃO E NOVIDADES


Certos Estados dão continuidade a uma velha tradição comercial e bancária do
Médio Oriente. Beirute desempenhou, até à guerra que a devastou, o papel de praça
bancária do Médio Oriente. Mas a banca conheceu sobretudo um extraordinário
desenvolvimento nos países que vivem das rendas do petróleo. Estes, depois do
primeiro e segun-do choque petrolífero que multiplicam por vinte os seus rendimen-
tos, investem nas empresas ou nos bancos estrangeiros e desenvol-vem o seu próprio
sistema bancário. Os países cujas reservas petrolíferas se arriscam a ficarem
esgotadas em menos de uma gera-ção são então os primeiros interessados uma vez
que, para eles, in-vestir no estrangeiro é uma garantia de rendimentos futuros. Os
seus bancos adquirem pois participações no imobiliário, no comércio, na refinação e
na distribuição do petróleo, da química, etc.; depositam fundos na Europa e na Ásia,
intervêm nos mercados financeiros in-ternacionais para reciclarem os petrodólares
que então abundam.
O Koweit, cuja renda petrolífera passa de mil milhões $, em 1970,a 20 em 1981,
constitui um «fundo de reserva para as gerações futu-ras» (KIO) avaliado em 100 mil
milhões $ e que lhe rendem, antes da invasão, tanto como o petróleo [1]. Ele detém
então 14% da Daimler--Benz (RFA), da BP e do Milands Bank (RU), 10% da Hoecht AG
(RFA) e 5% dos vinte primeiros bancos americanos. O Bahrein trans-forma-se na maior
praça financeira do Médio Oriente, em substitui-ção de Beirute, e atrai sedes sociais
como a da Gulf Air.Dez bancos do Médio Oriente apresentam um balanço de mais de
8 mil milhões $em 1989, entre os quais três na Arábia Saudita e dois no Bahrein.bai
torna-se num dos grandes mercados mundiais do ouro. «Os ban-e a assegurar funções
que se reservavam, até ao momento presente,as instituições ocidentais» [32].

O MUNDO ARABE-MUÇULMANO: ISLÃO E PETRÓLEO - 139

140 -ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


guerra do Golfo viram ruir ou pelo menos vacilarcertosimpérios tade do

Deserto» custaram 70 mil milhões $ aoKoweit,à Arábia da ordem dos 300

mil milhões $ para os seis paísesdoConselho de e Bahrein). Consequência, o

mundo árabe-muçulmano, de credor que gir mais de 130 mil milhões $

hoje, o equivalente de metade do seu vezes mais elevada por habitante do

que a do Brasil) que Saddam Hussein quis pôr a mão na mina de ouro

koweitiano.
Pode-se no entanto pensar que, para além do Iraque ainda sujeito às
sanções da ONU, a saúde dos países produtores de petróleo,e logo a
dosbancos, deveria melhorar rapidamente, à semelhança dos poços de
petróleo koweitiano que foram postos em funcionamento duas vezes mais
depressa do que o previsto e da reconstituição dos haveres do Koweit no
estrangeiro, já realizada pela metade em 1996...
Os transportes beneficiaram igualmente, durante o período de euforia,
de um rápido crescimento. Os países petrolíferos do Médio Oriente, e em
menor medida os outros, investiram muito nas estra-das, auto-estradas, nos
aeroportos, nos portos. Em toda a Península Arábica, os portos foram
modernizados; Dubai é considerada como a «Roterdão do Golfo de tal
modo a sua actividade é importante» [32].Fizeram o mesmo na Argélia e em
Marrocos. Viu-se por vezes dema-siado grande,e os imensos cais para os
superpetroleiros de 500 000toneladas estão frequentemente desertos. Os
Emirados Árabes Uni-dos contam seis aeroportos internacionais.
Mas a circulação rodoviária e auto-rodoviária desenvolveu-se ainda
mais. Doravante, com um automóvel por cada 40 habitantes, o mundo
árabe-muçulmano é ultrapassado pela América Latina, mas ultra-passa de
longe a África e a Ásia (mapa 11). A densidade média das imensos, mas ela
é relativamente boa nos territórios habitados.O turismo deveria ficar assim
favorecido.

2. O TURISMO:POTENCIALIDADES INSUFICIENTEMENTE UTILIZADAS


incontestáveis. 350 milhões de europeus, que são os principais candi-
neses), encontram-se a algumas horas de voo, e quase sem diferença profusão.
Paisagens extraordinárias (montanhas de Marrocos, da nio fabuloso legado pelos
Faraós, pelos Persas, Roma, Bizâncio, pelo islāo, etc., poderiam ser oferecidos aos
turistas.
Mas a guerra, as tensões internas ou externas, as incompreensões e os
integracionismos impedem a valorização destas imensas potencialidades. O
mundo árabe-muçulmano apenas recebeu,em 1990,14 milhões de turistas, dentre
os quais mais de metadena África do Norte, para menos de 6 mil milhões $;
estamos longe dos desempenhos da América Latina (24 milhões de visitantes e 17
mil milhões $). As receitas estão em recuo, e não somente depois da guerra do
Golfo. Cerca de 80% vão para a Turquia, para a Tunísia, para Marrocos e para o
Egipto.
Na Tunísia, as receitas representam 7% do PNB e cerca de 10%da população
vive mais ou menos directamente do turismo. Em Mar-rocos, que recebe um
pouco mais de visitantes do que a Tunísia, mas cujo PNB é mais elevado, o turismo
cria 4% das riquezas nacionais.A Turquia joga, também ela, esta carta. Este país,
que já fascinava os intelectuais europeus do século xix, dispõe de tesouros
acumulados ao longo de quatro civilizações (hitite, grega antiga, bizantina e mu-
çulmana), extraordinárias paisagens anatolianas e litorais solarengos do mar
Negro e do Mediterrâneo. Capitais locais e estrangeiros são aíinvestidos nos
hotéis, nos complexos balneares, de que beneficiam directa ou indirectamente a
construção, o artesanato, o comércio. Os visitantes são aí praticamente tão
numerosos como na Tunísia mas,como o PNB é mais elevado, as receitas turísticas
não representam mais do que 3% do total. Por outro lado, a pressão turca pode
hipote-car o futuro do turismo internacional.
No Médio Oriente, é o Egipto com os seus fabulosos vestígios fa-raónicos que
recebe o essencial do maná turístico (5% do PNB), se exceptuarmos pelo menos o
turismo especial representado pelos pe-regrinos de diversas confissões que fazem
a peregrinação aos lugares santos (Meca: dois milhões de peregrinos, Jerusalém).
Noutros paí-ses, nota-se menos o papel desempenhado actualmente pelo turismo
do que ele poderia ocupar nas economias regionais. O Irão, o Iraque,a Arábia
Saudita são imensas jazidas turísticas que a guerra aberta ou larvar, bem como os
rigorismos ou os integracionismos locais im-pedem de colocar realmente em
valor: não se pode, para já, senão

O MUNDO ARABE-MUÇULMANO:ISLĀO E PETRÓLEO-141


sonhar em visitar as ruínas da Babilónial A contrario, quando estas como
acontece no Líbano, na Síria, no Iémen ou no Bahrein: desde o sauditas
vêm aqui buscar, nos restaurantes,nasdiscotecas e nas praias, os
prazeres interditos no seu país, mas que um certo liberalismo
Finalmente, se incluirmos no sector terciário todos os rendimen-
levados a sublinhar o papel considerável desempenhado pelos direi-tos
de passagem e os rendimentos dos emigrantes.

3.FLUXO DE HOMENS E DE BENS:


RENDIMENTOS PRECÁRIOS
Intermediários entre a Europa, a Ásia e a África, entre os produ-tores e os
consumidores de petróleo, alguns países do Médio Oriente aproveitam a sua
situação para cobrar direitos de passagem pelo seu território.
Estamos a pensar evidentemente no Egipto que joga com o Canal do Suez,
desde a sua nacionalização em 1956, como com uma aposta estratégica e como
uma fonte de lucro considerável. Apesar de todos os imprevistos que o canal
conheceu, com o seu fechamento entre 1967 e 1975 e o desvio de rota dos
superpetroleiros pelo Cabo, o Egipto ainda consegue 5% do seu PNB. Os oleodutos
são igualmente um meio de cobrar direitos não negligenciáveis. A Jordânia e o
Egipto recebem direitos sobre o petróleo sudanês que passa pelo seu territó-rio. A
Turquia e a Síria tinham o mesmo tipo de práticas quando os oleodutos e gasodutos
levavam o petróleo iraquiano para o Mediter-râneo; é provável que quando as
sequelas da guerra do Golfo estive-rem sanadas, estes dois países beneficiem de
novo destes direitos de passagem. A própria Arábia tem captado a pouco e pouco a
maior parte das canalizações petrolíferas do Golfo.
chamadas 《 remessas») dos emigrantes são mais complexas de analisar

Determinados fluxos provêm do exterior do mundo árabe-muçulmano dos países

mais desfavorecidos em petróleo e os mais populosos e limi-dos emigrantes

magrebinos e turcos na Europa do Oeste, e particular-

142 - ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


mantiveram no país viverem e aos próprios emigrantes investiroso

de artesao,numa casa, como fazem por exemplo os berberes de

Cabilia longo dos últimos dez anos; apesar das limitações que

surgiram depois milhões de turcos estariam actualmente instalados

na Alemanha.
nao enriquecem globalmente o mundo árabe-muçulmano,mas se assim se pode

dizer. Segundo o jornal Le Monde (26.03.91), do qual 7,5 milhões de estrangeiros

viviam nos países do Golfo, para uma -muçulmano, o outro terço era originário do

mundo indiano, das Fili-pinas ou da Indonésia.


Nos países receptores, essencialmente os produtores de petróleo,uma boa
parte dos activos eram estrangeiros: 40 a 50% na Arábia Saudita, contudo
relativamente povoada, 50% no Bahrein, 75% no Koweit (e mesmo 98% na
construção civil). Os minúsculos Emirados teriam visto passar 2,5 milhões de
estrangeiros e, mais espantoso, no momento mais forte da guerra entre o Irão e o
Iraque, 2 milhões de estrangeiros, essencialmente egípcios, teriam substituído os
iraquianos na frente da batalha.
Os principais países árabe-muçulmanos fornecedores de mão-de--obra, e logo
os principais beneficiários das remessas dos seus emi-grantes, eram o Egipto, a
Síria, o Iémen, a Tunísia e, em menor medida,a Argélia e Marrocos: 2 a 4 milhões
de egípcios teriam assim deixado o país, entre os quais 900 000 só para o Koweit e
mais de 1000000 para o Iraque. O caso da Jordânia era particularmente
surpreendente. Me-tade da sua população trabalhava no estrangeiro, sobretudo
em traba-lhos qualificados graças a uma boa formação da sua mão-de-obra, en-
quanto ela própria acolhia indianos, paquistaneses ou árabes de outros países
para ocuparem os empregos menos qualificados.
As remessas dos emigrantes representavam por vezes uma forte de um quarto
do PNB na Jordânia e o equivalente de duas vezes as rável para um país com mais
de 50 milhões de habitantes.

O MUNDO ARABE-MUÇULMANO: ISLĀO E PETRÓLEO - 143


à queda dos preços do petróleo e em seguida à guerra do Golfo, que todos
os países emissores. A Arábia Saudita rejeita 50 000 trabalha-trabalhadores
cujo contrato de trabalho expira. O Egipto assiste ao Koweit e na Jordânia.
Esta última, sancionada já antes da guerra do as suas remessas divididas por
dois, com o retorno dos seus nacio-nais. Depois que, em 1990, o Iémen se
absteve de votar na ONU san-çōes contra o Iraque, 900 000 dos seus
trabalhadores são enviados para o seu país. No total, passou-se de 7,5
milhões de estrangeiros em 1981, para 5,8 em 1984, para 3 em 1986.
Outra consequência da baixa dos rendimentos perolíferos e da guerra, a
ajuda que os produtores de petróleo forneciam aos «países irmãos» em
nome da «umma» (a solidariedade entre muçulmanos)foi bruscamente
reduzida. Contraindo por vezes eles próprios em-préstimos, obrigados a
reduzirem os seus ambiciosos projectos de de-senvolvimento nacionais e por
vezes desejosos de sancionarem certos «espíritos rebeldes», os grandes
produtores de petróleo diminuem as suas ajudas um pouco por todo o lado e
por vezes suprimem-nas com-pletamente. A Arábia, principal providente de
fundos, diminuiu a sua ajuda para metade e deverá prosseguir nesta via.
Consequen-temente, a Jordânia, cujo PNB era alimentado em 50% por uma
ajuda exterior, vê esta ajuda diminuir em mais de metade; o Iémen é de igual
modo sancionado pelas petro-monarquias.
O período de intensa redistribuição de riquezas, mais ou menos
voluntária entre os países árabe-muçulmanos está pois praticamente
encerrado. Mas contribuiu incontestavelmente para igualizar os ren-
dimentos entre os países mais ricos e os mais pobres, para ajudar estes
últimos a investir, a modernizarem-se, e logo a criarem crescimento.
O conjunto dos países árabe-muçulmanos conheceu,com efeito,entre
1965 e 1980, o mais forte crescimento dos Terceiros Mundos.América Latina
e da Ásia (entre 6 e 7%) e nitidamente da África (um mais baixo dos Terceiros
Mundo, com 0,5% ao ano entre 1980 e 1990,2%) e muito atrás da Ásia que
caracola à cabeça com 7% de cresci-mento ao ano aproximadamente.

144 -ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD

OMUNDO ÁRABE-MUÇULMANO: ISLĀO E PETRÓLEO - 145


Contrariamente ao que se passa na América Latina, não se pode nos
países que contam essencialmente com os hidrocarboretos para o var
novamente à subida dos preços (mas estes mantiveram-se mode-parece
mais aberto para os não produtores ou para os pequenos pro-Marrocos, a
Síria, a Turquia e cujo crescimento anual se situa entre 3entanto,
timidamente retomado para o conjunto do mundo árabe--muçulmano(+ 2%
ao ano).
O período de euforia dos anos 70 permitiu todavia ao mundo ára-
Latina,em matéria de nível de vida. Foi demasiado curto, todavia,para que a
recuperação fosse total.

II. UM NÍVEL DE VIDA INFERIOR


AO DA AMÉRICA LATINA
A)UM RENDIMENTO UM POUCO MAIS FRACO
Se nos cingirmos ao PNB, o habitante do mundo árabe-muçulmano
continua em média menos rico do que o latino-americano (900$ a me-nos).
Mas sabemos que este critério não dá conta do custo de vida. Em termos de
PIB real igualmente, os países árabe-muçulmanos vêm atrás dos da América
Latina com cerca de 4400$ por pessoa, contra 5100.
Mas esta média parece esconder, à primeira abordagem,disparidades
consideráveis. Com efeito, o rendimento iemenita, em termos de PIB real, é
apenas de 1600$, contra os 5650 por habitante dos Emirados. Não obstante,
se tomarmos apenas em consideração os Estados com mais de 10 milhões
de habitantes que representam 92% da população e se pusermos de parte o
Iémen, as diferenças di-minuem: o saudita, que dispõe do rendimento mais
elevado, vive com nāo sāo mais do que de 1 para 2 aproximadamente. Os
próprios pe-vamente homogéneo, pelo menos em comparação com os
outros Ter-ceiros Mundos (mapa 13).
deráveis. Na maior parte deles, as diferenças são amplas entre uma débil
agricultura ou de rendimentos incertos dos pequenos trabalhos dois, no
entanto, a ascensão de uma pequena burguesia urbana, cons.dros médios
ou superiores, profissões liberais, é inegável, especial.Líbano, onde a vida
retomou um curso quase normal. Esta classe contrapeso às minorias que
detêm o poder político, militar ou econó-mico, mas está longe de ser
negligenciável.
Em Marrocos, por exemplo, de acordo com os números oficiais,a
repartição das riquezas não seria muito diferente do que ela é em
França,uma vez que os 20% das famílias mais ricas deteriam cerca de 46%
das riquezas (em França 42) e os 20% mais pobres, 7% (França 6%); os 60%
restantes partilhariam pois entre eles 50% das riquezas.Mesmo que se deva
manusear estes números com prudência, já que sabemos que a família real
marroquina possui uma boa parte do pa-trimónio económico do país, eles
parecem indicar que uma classe média se está a robustecer.

B)UMA ALIMENTAÇÃO GLOBALMENTE SATISFATÓRIA


Como podemos presumir, atendendo ao seu nível de rendimento,a
situação alimentar do mundo árabe-muçulmano é globalmente razoá-vel
(3030 calorias por dia e por habitante), e mesmo superior à da América
Latina (2750). Nos próprios países desenvolvidos, o consumo calórico oscila
entre as 3000 e as 3600 calorias. A alimentação é também globalmente
equilibrada, no sentido em que, nestes países de criação de gado, há menos
falta de prótidos do que noutros sítios e que o défice alimentar nacional é
compensado por maciças importações de cereais.
No interior do mundo árabe-muçulmano, as diferenças são fracas de país
para país (mapa 14). Tirando o Iémen, onde os habitantes não dispõem de
mais de 2200 calorias e do Iraque (2100), todos os outros Estados estão
acima do limiar das 2500 calorias e frequente-mente muito acima, como a
Síria, a Turquia, o Egipto onde os habi-sumo alimentar no orçamento das
famílias, mais forte do que a da América Latina, é inferior à dos dois outros
Terceiros Mundos.

146-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


tares são raras e conjunturais, as camadas sociais mais pobres estio e

etea el ee de uma má organizacão dos circuitos de producao sem

emprego fragiliza igualmentea alimentação dos mais desfavorecidos.

(na realidade certamente mais), 20% dos egípcios, 10% dos

turcos.1981, 1984 e 1990, a Tunísia em 1978, 1984 e 1987, e a

Argélia em feita a propósito do enquadramento sanitário e escolar.


C) UM MEIO SANITÁRIO E ESCOLAR EM GRANDE PROGRESSO
As despesas com a saúde cresceram rapidamente desde há cerca de trinta anos
para cá: passaram de 0,9% do PNB em 1965 para 2,0%em 1986 e estabilizaram
desde então. Como, no intervalo, o PNB aumentou em valor absoluto, as despesas
foram multiplicadas ainda mais. O número de médicos duplicou pois, o dos
enfermeiros triplicou e, nos países do Golfo, os cuidados médicos são hoje
gratuitos. As despesas com a saúde ultrapassam agora as da América Latina, que só
lhes consagra 1,6% do seu PNB, e mais ainda as da Ásia e da África (cerca de 1%).
Não obstante, como o mundo árabe-muçulmano tinha um grande 'atraso, o seu
enquadramento médico continua abaixo do da América Latina (aproximadamente
2000 habitantes por médico contra 1000),mas acima da Ásia. Mas a maior parte dos
países estão relativamente bem dotados e, entre os grandes Estados, como
Marrocos, o Iémen,o Irão, raros são aqueles em que um médico tem de se ocupar
de mais de 1500 pessoas em média. Em compensação, outros dispõem de um
Saudita (700) (mapa 17). Compreende-se nestas condições, que a mor-um pouco
mais de 80% hoje, o que continua a ser muito, mesmo em senão no Iémen e em
Omã (map 15). A esperança de vida também (mapa 16) mas fica um pouco aquém
da da América Latina.

O MUNDO ÁRABE-MUÇULMANO: ISLĀO E PETRÓLEO - 147

148-ROBERTCHAPUIS/THIERRY BROSSARD
Aanálise do nível escolar conduz às mosmas constatações

matiza.anos, a alfabetização progrediu por todo o lado, mas o atraso

continua recente, a implementaão de um sistema oscolar generalizado

foi tar.Latina, e as mulheres são ainda menos, dado que apenas 45%

sabem mano é, deste ponto de vista, bastante homogéneo (mapa 18).


Os progressos foram igualmente rápidos no referente a
escolarização dos jovens. A proporção dos alunos escolarizados no
ensino secundário e superior aumentou três quartos desde há 25
anos,mas mantém-se uma diferença de 4 a 8 pontos em relação à
América Latina, tanto para o ensino primário, como para o secundário
e supe.rior. No interior do mundo árabe-muçulmano, as diferenças são
rela-tivamente fracas, que o Médio Oriente, incluindo o Egipto, está
ge.ralmente mais bem colocado do que o Magrebe e do que o Iémen
(mapas 20 e 21).
Apesar destes progressos, o mundo árabe-muçulmano continua a
estar pois, do ponto de vista escolar e universitário, um pouco aquém
e, do ponto de vista da alfabetização, muito aquém da América La-tina.
É indiscutivelmente uma das suas fraquezas económicas. Ti.rando
alguns pequenos Estados mais bem alfabetizados e mais bem
escolarizados (Jordânia, Líbano antes da guerra civil e em certa me-
dida o Egipto), carece de mão-de-obra qualificada, de quadros,de
empresários, de investigadores. A obrigação de fazer apelo a uma
mão--de-obra estrangeira (veja-se o papel que desempenharam
durante muito tempo os cooperantes franceses no Magrebe) colocou-o
numa situação de dependência simbolizada pela fábrica chaves-na-
mão.
Mais do que em qualquer outro lugar, porventura, constatamos que
não basta possuir capitais para haver desenvolvimento social e
económico. São também necessários homens formados e
empreende.feros como os outros vai obrigá-los a utilizarem melhor os
seus recur-PIB real que é mais do dobro do da Ásia, o indicador do
desenvolvi-um quarto. O que significa que não oferece à sua população
condi-ções de vida em conformidade com o seu conteúdo.
são os únicos em causa neste desfasamento entre rendimento e con-
dmento demográfico ainda não completamente controlade.

NÃO CONTROLADO
A) UM CASO MUITO PARTICULAR
muito ligado ao seu rendimento. Geralmente, à medida que o nível passa. O
mundo árabe-muçulmano permanece,juntamente com a em África), exibe uma
fecundidade superior em 50% à da América Latina e da Asia. Que se passa então?
Afastemos a ideia com demasiada facilidade admitida da poliga-mia.Em parte
nenhuma ela ultrapassa os 10% das famílias; é atéinferior a 3% na Argélia, no
Egipto e na Síria (Ph. Fargues,PS,n.°198) e não é certo que ela seja, em si mesma,
factor de fecundidade.Como noutros países, a família numerosa é considerada ao
mesmo tempo uma força de trabalho e uma segurança para a velhice. Em país
muçulmano, junte-se a ideia de que a contracepção não é compa-tível com a
religião. No entanto, este tipo de crença exista na América Latina, mas ele não
impediu a fecundidade de aí baixar rapidamente.
A razão essencial deve-se pois ao facto de, no mundo árabe-mu-çulmano, a
religião se ter mantido mais impregnante do que noutros sítios e a organização
tradicional da família ter resistido melhor. Se-gundo Ph. Fargues, três tradições-
chave explicam a manutenção desta fecundidade: o dote,«a endogamia da
patrilinhagem» e a condenação anos de poupanças, reforça o poder do homem
sobre a mulher.asamento precoce e reforça o poder da família sobre o indivíduo.
Por Juta,tanto para o homem como para a mlher». Desejo de familia

do celibato, favorecem uma


forte fecundidade.terminados
Listados do Golfo, querendo
aumentar a população nacio-
O MUNDO ÁRABE-MUÇULMANO:ISLÃO E PETRÓLEO - 149
merosas. Mesmo no Iraque, durante a guerra contra o Irão,
anúncios olhos do adversário.» Depois do quarto filho, um
casal tinha direito a de um ano pago a 100% (P. David, PB n.°
2196).

B) UMA EVOLUÇÃO DIFERENCIADA MAS REAL


Egipto e na Turquia, a fecundidade desceu abaixo das 4 crianças por mulher
(mapa 24). Intervieram aqui à vez factores gerais e factores locais. Entre os
primeiros, a escolarização das jovens é um indiscutí-vel travão à fecundidade.
«Pelo simples facto de subtrair a rapariga ao universo familiar ao qual a tradição
muçulmana a destinava estri-tamente, a escola mesmo que frequentada
brevemente,representa com efeito uma ruptura com o costume (...). Atenuando,
por outro lado, a hierarquia dos sexos, a hierarquia de hoje introduz um pouco de
igualdade nos casais de amanhã» (Ph. Fargues).
Consequência, aqui como noutros lugares a fecundidade da mu-lher é por
geral inversamente proporcional ao seu nível escolar. No Magrebe, em 1987, a
fecundidade das mulheres analfabetas era de 6,1 filhos, a das mulheres que
receberam uma educação primária descia a 4,1 e a que tinha frequentado um
curso secundário era de 2,9. Onde a escolaridade das mulheres é menos
avançada, quer dizer,onde a tradição se manteve mais estrita, a fecundidade
manteve-se elevada, como na Arábia Saudita, em Omã e no Iémen onde ultrapas-
sa as 6 crianças por mulher. Pelo contrário, na Tunísia e na Turquia onde, desde
1965, mais de dois terços das raparigas eram escolarizadas,a fecundidade está
agora próxima das 3 crianças por mulher.
Ligadas mais ou menos à escolarização, três outros factores inter-vêm neste
início de quebra da fecundidade: o retardamento do casa-mento das jovens, o
trabalho das mulheres e a utilização de meios contraceptivos modernos. A
frequência escolar, sobretudo a da escola para diminuir o período de
fecundidade. O trabalho das mulheres fora mulheres que,segundo Ph. Fargues,
«fornece um excelente testemunho fecundidade.Onde a taxa de actividade das
mulheres é mais fraca (8%),

150 -ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


e,a fe un didade e meais ba i e de e s
tua-se em

todernos esta mais ou menos ligade tea e ele e s e eptiv


e e eas politicas, raras ainda em palses mte e utorizando a venda e a publicidade
de contraceptivos desde 1961°muito mais tarde, mas empreendeu uma campanha
muito activa: a contraceptivos modernos, contra 45% das argelinas e 35% das
familiar é levada a efeito pelo Centro de Informação, de Educaçāo e confirmam a
legalidade da contracepção. Estima-se que hoje mais de 60% das mulheres do
Cairo utilizam métodos contraceptivos moder-nos. Nos Emirados Árabes Unidos,
bem como no Koweit, estes méto-dos são também mais utilizados do que nos
outros países.
Pode-se pensar que, apesar da subida do integracionismo que in-cita a um
regresso à tradição (preconizando por exemplo o retorno da mulher ao lar) e que
pretende a anulação das políticas de planea-mento familiar, a fecundidade deveria
continuar a baixar sob acção das tendências pesadas que são a urbanização, a
escolarização das mulheres e a terciarização da economia que multiplica os
empregos femininos.
Mas este recuo é mais lento do que na América Latina ou na Ásia,e traduz-se
num abrandamento do crescimento mais lento ainda, pois a população é jovem, a
mais jovem dos Terceiros Mundos, depois da Marrocos e do Egipto, a proporção
dos jovens com menos de 15 anos Latina; apenas a África subsariana, uma vez
mais, consegue ter um com algumas excepções habituais (Tunísia, Turquia, Egipto,
Marro-

Como a mortalidade geral diminuiu para metade desde 1965,


em e ie eedieo e se mantem hoje por todo o lado (excluindo o
Iémen)

O MUNDO ARABE-MUÇULMANO: ISLAO E PETRÓLEO-151


da ordem dos 2,5% ao ano, inferior no entanto ao daÁfrica.Entre os
seriamente o seu crescimento (mapa 27), o que levou a ONUa rever lhões
de habitantes em 2025 contra os 130 previstos).
Todavia,embora já nāo haja «explosão»,o controlo demográfico mano.
Será necessário tempo para que se registe um nítido abran.crescimento
demográfico se elevou a 2,9% ao ano entre 1963e 1993,continuarão
elevadas (mapas 29 e 30). Num período de crescimento abrandado e de
redução drástica da emigração, quer para a Europa quer para os países
petrolíferos, o problema vai colocar-se cada vez com mais acuidade e corre-
se o risco de desestabilizar ainda mais uma região que já o é singularmente.

IV. UNIDADE CULTURAL E DIVISOES POLÍTICAS


Paradoxalmente, o mundo árabe-muçulmano aparece simulta-
neamente como dotado de uma incontestável unidade cultural, que se deve
ao islão e à língua árabe, mas profundamente dividido po-liticamente,
embora comande um dos espaços mais sensíveis do planeta.

A) A UNIDADE PELO ISLÃO

Tendo partido da Arábia, que se converteu ao islão desde 630,a religião


de Maomé espalhou-se a uma velocidade surpreendente,gra-interessa aqui.
Desde 712, a autoridade dos Omíadas e, portanto,0ao actual Paquistão.
Apenas a Anatólia vai resistir até ao século bem como um coto do Império
Bizantino,,até 1453,data da queda de Constantinopla.
Mais tarde, sobretudo a partir do século xrv, o islão vai-se propa-gar
graças aos missionários, aos negociantes,aos marinheiros, aos caravaneiros
e aos notáveis que os colonizadores ocidentais favorece

152-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD

O MUNDO ÁRABE-MUÇULMANO:ISLAOEPETRÓLEO-153
ram. Vai alcangar a Asia central a norte, a fndia e a Indonésin a leste
m undo rabe na e enão um dos cinco espaços islamizados,negro-
africano[28].. Mas ele tem esta originalidade de ser o coração do islão.

1.0 CORAÇÃO DO ISLÃO


pregnado pela religião desde há pelo menos doze séculos. É aqui que
muçulmanos: Meca e Medina na Arábia Saudita, Jerusalém em Israel.Outras
não são santas a não ser para os xiitas; Najaf e Kerbela no Iraque, Qom,
Mechhed,Kadhimain no Irão. É lá também que se situam os centros de
cultura do islão, em particular as suas mais cé-lebres universidades: de Fez (a
Karaouine) em Marrocos,em Mechhed no Irão, passando por Damas, Tunis,
Ancara, para acabar na mais prestigiosa, a de Al Azhar no Cairo. É daqui que
os livros e os meios não é uma espécie de «Hollywood-do-Nilo» cujos filmes
são distribuí-dos pela totalidade dos países árabes?[32].
É aqui que esta religião é mais exclusiva. Praticamente por todo o lado, é
adoptada por pelo menos 95% da população. Apenas umas minorias muitos
fracas se mantiveram. Os cristãos apenas ocupam um lugar apreciável no
Líbano (40%) e só têm alguma importância no Egipto (Coptos), na Síria
(Gregos ortodoxos),no Iraque (Caldeus)e entre os palestinos [24].
Evidentemente, o islão não é unitário. O islão sunita, que admite mais

facilmente as evoluções sociais, é muito dominante. Mas o

xiismo,émaioritário no Irão, no Iraque, no Líbano, no Bahrein. É minoritário

pregna o islão dos alauitas sírios e dos druses do Líbano e da Síria na vida

quotidiana e por comportamentos um pouco diferentes em


relação ao poder político.

erente,o islao nao é apenas uma fe e um ritual, mas também


uma

154-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


de leis,uma moral,um

modo de vida, todo um conjunto de conceitos, de práticas,de institui-

pois uma marca profunda que se exprime pelo poder dos


lacos famlie
relações entreprimos, etc.),

elo espaço restrto reservado às mulheres, pelo menos na vida pi.


blica, etc.
no Líbano e na Síria, onde, no entanto, o ChefedeEstado deve ser Mas nos
regimes laicos e socializantes que tentaram separar fé e po para não
confrontarem directamente o sentimento religioso das po.subida do
islamismo, por reduzir o peso da religião. Os regimes que se diziam
revolucionários apresentavam os seus princípios como sendo baseados na
justiça social corânica e o modernismo económico como fiel aos princípios
islâmicos.
No Egipto, quando o governo preconiza o planeamento
familiar,esforça-se por mostrar que este não contradiz os fundamentos da
re-ligião, e fá-lo dizer pelos ulemas de Al Azhar [32]. Os dirigentes, mes-
mo os mais laicos, não se privam de tocar a corda religiosa quando os seus
interesses estão em jogo, pois o islão conserva um poder emocio-nal e
mobilizador considerável. Durante a guerra entre Irão e Iraque,cada um
dos dois adversários esforçava-se por se apresentar como o campeão do
islão. Foi em nome de valores islâmicos que os dirigentes tunisinos
apelaram à defesa do Iraque durante a guerra do Golfo e o próprio
Saddam Hussein pediu ajuda em nome da «oumma», a comuni-dade dos
crentes, embora tivesse diante de si soldados muçulmanos.
Mesmo na sua luta contra a subida do islamismo, os dirigentes,quer
sejam laicos ou rigoristas religiosos, tomam muito cuidado para não
confundirem a massa dos crentes e dos militantes. Eles conde-nam estes
últimos em nome do Alcorão: os ulemas de Al Azhar,por exemplo,
censuram-nos por quererem «combater o pecado e impor a virtude pela
violência, quando o islão é a religião do diálogo e não da violência» (Le
Monde, 5.04.89). Em suma, «o cordão umbilical nunca foi cortado entre
Estado e religião» [32] e a laicidade dificilmente se mantém ali onde foi
instaurada nos factos, senão mesmo na lei (Ar-gélia, Síria, Iraque).
parte,o conjunto do mundo árabe-muçulmano a pouco e pouco se ia

O MUNDO ÁRABE-MUÇULMANO: ISLÃO E PETRÓLEO - 155


Este parecedever-sesimultaneamente ao fracasso do nacionalismo
talizaçāo, uns modernismos acusados de rasgarem o tecido social, cul
integracionismo, que preconiza um respeito intransigente da tradi-(a lei
canónicaislâmica), este retorno da religiosidade faz-se sentir um pouco por
toda a parte.
0 mundo árabe-muçulmano cobre-se, como fizera o Ocidente na
regresso à prática religiosa é evidente, mesmo em países muito direito a
cobrirem-se com o lenço islâmico, quepassa a ser sinal de oposição aos
princípios laicos do Estado e, em 1996, foi um islamista boa parte das
mulheres adoptou o véu e os vestidos amplos, que se tornaram objecto de
moda, deixou de banhar-se em fato de banho (...) e os homens, menos
numerosos, deixaram crescer a barba e usam o djellaba»(Le
Monde,5.04.1989).A reislamização é igualmente ní-tida no Magrebe. Na
Tunísia, a rádio e a televisão lançam apelos re-gulares à oração. Na Argélia,
o golpe de estado só provisoriamente bloqueou a subida da Frente Islâmica
de Salvação que move uma verdadeira guerra no interior do governo. Em
Marrocos, o rei,enquanto comendador dos crentes, impõe a oração nas
escolas para tentar neutralizar o discurso islamita. Não é surpreendente,
enfim,que um dos primeiros actos da resistência afegā, ela própria iniciada
em parte por uma recusa do ateísmo comunista, tivesse proibido a
minissaia e que recentemente se tivessem proibido as mulheres de
trabalharem.
Este regresso da religiosidade é tanto mais essencial que, para o islão, a
religião está no centro da vida colectiva, seja ela política, eco-nómica ou
urbana.

2.0 ISLÃO NO CORAÇÃO

xistir com a sociedade civil pois «não há no islǎo o


equivalente da de Deus”. O islão é simultaneamente deste
mundo e do outro. Tem
além» (Le Monde, 14.04.1989). Para os islamitas,2democracia nāo pre
tenha havido arranjos com o céu, isto pode explicar a dificuldade
Hoje ainda, no mundo árabe-muçulmano, o islão e a democracia
sucesso, sobretudo se são apoiados em considerações religiosas. Isto
estado) à monarquia autoritária e rigorista (Arábia Saudita) ou com
(Irão,Afeganistão) e repúblicas multipartidárias mais ou menos au-
toritárias (Tunísia, Egipto).
Nāo é pois surpreendente que, como vimos mais acima, a maior parte
dos regimes tenha querido dirigir a economia, quer seja atra-vés de
nacionalizações, colectivizações ou através de um controlo com
frequência minudencioso da economia, relaxado apenas com o
rebentamento da vaga da liberalização destes últimos anos. Mas o islão
desempenha também indirectamente um papel económico, difǐ-cil de
precisar é certo, mas incontestável.
A ideia geralmente avançada é de que o islão foi um freio ao de-
senvolvimento.Segundo J. P. Langellier: «Para o islāo, ao contrário do
Ocidente, toda a novidade é vista como nefasta - é mesmo um pecado-até
prova em contrário (...). O islão, de longa data, perdeu a audácia de
inventar. Não rejuvenesceu nem a sua visão do homem e do mundo, nem
o seu projecto de sociedade» (Le Monde,4.04.1989).
Todavia, isto é válido tanto para o islão como para outras reli-giões,
tudo depende da maneira como ele é recebido. O próprio J.P.Langellier
insiste no facto de que «a culpa cabe mais às práticas de uma outra época
do que ao conteúdo da mensagem corânica (...) e este temor da inovação
é o legado de uma tradição islâmica entorpecida, desde a decadência dos
grandes impérios orientais, por séculos de imobilismo cultural». Quando o
espírito empreendedor existia ou quando as circunstâncias facilitaram o
processo, determi-nados muçulmanos souberam inovar, quer fosse
contornando as pres-crições do islão, quer interpretando-o a favor da
novidade, apresen-tando por exemplo o progresso técnico como uma
conquista do islão [32]. A interdição do empréstimo a juro não
impediu,como sabemos,o desenvolvimento de grandes bancos, mesmo
em países como a Arábia Saudita que se reclama de um islão integral,
senão mesmo integracionista, e onde se aplica a charia. O islão também
não impe-

156 -ROBERTCHAPUIS/THIERRY BROSSARD


e o islão, pelo menos na práticn, pn n
dos turcosotomanos,uma parte da sua capaciade para inovar ou

alto nível
astronomia, as matemáticas, a geografia,a medicina,a
agricultura.

Por outro lado,0islão constitui igualmente um travão ao desen-demográfico


preconizando uma natalidade quase natural, mesmo se,seja fácil de estabelecer.
O crescimento demográfico contribui incon-vens, e para tragar uma boa parte do
crescimento económico nos países com piores desempenhos.
Enfim, a escola corânica parece igualmente um freio económico,e isto por uma
dupla razão. Ela não é, como a escola privada dos países ocidentais, portadora de
valores modernistas, e particularmente tecnológicos. Ela aparece antes como
uma mensageira de valores re-ligiosos e culturais tradicionais. Foi o que levou os
regimes laicizantes a abrirem escolas não corânicas, à imagem das escolas que os
coloni-zadores tinham implantado para os seus próprios concidadãos. É igual-
mente uma das razões que levaram o governo argelino a integrar na Educação
Nacional, em 1976, todos os estabelecimentos confessionais.
O segundo freio relativo à escola provém do facto de o islão, pelo menos na
sua interpretação mais conservadora, não ser favorável àescolarização das
mulheres. Os países árabe-muçulmanos são aque-les em que as diferenças entre
homens e mulheres são maiores, tanto no que respeita à alfabetização dos
adultos como à escolarização dos homens; a escolarização das raparigas é 15%
inferior no ensino pri-veis. Na Arábia Saudita, cujo PIB real por habitante é, no
entanto 70% no secundário. Este atraso da escolarização feminina contribui e
para o refreamento directo da economia pela falta de qualicação
da mão-de-obra feminina.

e e e e a elo e nee a praticn historicn destes últimos sé.


O MUNDO ARABE-MUÇULMANO: ISLAO E PETRÓLEO- 157
tos sobre a fecundidade, constitui um freio senão ao crescimento ee tante.
Em compensação, a urbanização, geradadesde oinício pelo tor favorável ao
desenvolvimento económico.

3. A CIDADE NO CORAÇÃO

O islāo propagou-se pela «aliança dos citadinos, dos nómadas, dos


acompanhada de uma urbanização muito rápida. Segundo Cl. Chaline,volta
do ano 1000, «o mundo árabe constitui o conjunto mundial mais
urbanizado; aí se enumerariam já seis a oito cidades com mais de 100 000
habitantes (...).A difusão do islão é balizada por um número
impressionante de criações urbanas» [10], que se juntam às aglomerações
pré-islâmicas, cuja integração fca terminada nos finais do século xI.
Ainda que um certo número de traços se encontrem noutras cida-des
medievais, a cidade árabe tradicional caracteriza-se, segundo Cl.Chaline,
pela casa baixa, com pátio central e com paredes exteriores cegas, que
permite preservar a vida familiar em geral, e a da mulher em particular.
Distingue-se igualmente pela estrutura em cacho das casas, a oposição
total entre espaço público e espaço privado (sendo este essencial), a
segregação em quarteirões homogéneos, a aparente desordem urbana
nascida da ausência inicial de poder municipal ca-paz de impor um
verdadeiro direito de urbanismo. A cidade vive en-tão do comércio, do
artesanato, dos rendimentos da terra, eventual-mente da pesca e das
transacções.
Após um longo declínio, iniciado no século xII e que durará, muito
embora com matizes e excepções, até ao século xix, as potências colo-niais
vão trazer um pouco por todo o lado (excepto na Península Ará-
construindo ao lado das cidades árabes bairros à europeia, escavando de
urbanização, uma vez que se registam cidades com mais de Chaline, a
cidade conserva até então «em conformidade com a marca

158 - ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD

O MUNDO ARABE-MUÇULMANO:ISLAO E PETRÓLEO-159


mas exteriores do que nos comportamentos e práticas do espaco
potente: de25% de citadinos nesta época, passa-se a 56% hoje. Este icea
Latina,coloca actualmente o mundo árabe-muçulmano no se-(73%), mas
nitidamente à frente da Ásia (27%) e da África (31%).Foi pela imigração estrangeira.
No final dos anos 70, em Dubai City e em tes eram estrangeiros. A baixa da renda
petrolífera e a guerra do Golfo ocasionaram um refluxo importante.
Mas o crescimento urbano continua rápido (frequentemente 5%ao ano) e em
todo o lado superior ao crescimento nacional. Ele é igual-mente geral. Afecta todos
os tipos de cidades, mas particularmente as pequenas que registam taxas recorde,
o que é sinal de uma urbani-zação em profundidade, bem como as metrópoles
nacionais. Se se re-gista um certo afrouxamento em Tunis, no Cairo e em
Casablanca, o crescimento prossegue a um ritmo de 10% ao ano em Riade,
Aman,Bagdade e Argel.Esta urbanização deverá prosseguir nos próximos decénios,
uma vez que se prevê que a população registe 60% de cita-dinos por volta do ano
2000 e 70% por volta de 2020.
Este crescimento urbano propaga-se, aqui também e apesar dos meios
financeiros não negligenciáveis, de forma muito desordenada.É verdade que os
casos de expansão urbana organizada não sāo inexistentes. Na Arábia Saudita, um
plano director foi efectivamente aplicado em Riade e duas cidades novas postas
em estaleiro: Yanbu no mar Vermelho e Jubail no golfo Pérsico. Planos directores,
foram aplicados em Tunis, Damas, Koweit City, cidades novas previstas àvolta do
Cairo.
Mas, as mais das vezes, a expansão realizou-se nas franjas urba-nas sem plano
preestabelecido, inicialmente sob a forma de bairros estão actualmente em vias de
extinção ou de reestruturação» segun-espontâneo, não regulamentado, construído
pela família ou por um construtor nã é o proprietário. Mas é geralmente
construído em pe-

2 Gourbi: nome dado às habitações precárias dos árabes. (N.T.)

160-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


consoante as aglomeraçoes, um terço (Marrocos) a três quartos (o
Cairo) dos novos alojamentos.
ao mesmo

tempo adaptando-os, caracteres específicos: concentração do


comércio
e do artesanato na zona do bazar e na dosSuques,densidade das

manutenção dos símbolos religiosos do islão no coração da


cidade.
gas, a cidade conserva pois uma indiscutível originalidade, devida

gua árabe reforça esta impressão de unidade.

B) A UNIDADE PELO ÁRABE


A originalidade do mundo árabe-muçulmano é justamente aliar islamização e
arabização, o que o distingue dos outros espaços islamizados. Na verdade, o islão
não recobre todo o espaço de língua árabe. As duas grandes excepções são a
Turquia, essencialmente turcófona, e o Irão que fala maioritariamente o persa.
Existem igual-mente numerosas minorias etnolinguísticas, dentre as quais as mais
notáveis são as curdas e os berberófonos. Contam-se 11 milhões de curdos na
Turquia (20% da população), 6 milhões no Irão (12%),4milhões no Iraque (25%) e
um milhão na Síria [24]. Os berberófonos,que resistiram à primeira arabização do
século viI e em seguida àsegunda no século xI, ocupam espaços não
negligenciáveis na Argélia (cabilas, mozâbitas, tuaregues) e no Nordeste de
Marrocos [24].
Noutros lugares, fala-se o árabe por todo o lado, mas com varian-tes dialectais
numerosas, entre as quais as mais importantes são as da Península arábica, da
Mesopotâmia, do Médio Oriente, do Egipto e do Magrebe. Nem todos estes
dialectos são compreendidos por todo o lado, no entanto o filme e a canção têm
tendência para os homo-geneizar, nomeadamente sob a influência dos filmes
egípcios que dão elites. É simultaneamente a língua literária, cultura e numa certa
prensa, a rádio e a televisão (pelo menos para as informaçōes), os utilizado nas
grandes ocasiões, nos discursos destinados a ultrapas·sar as fronteiras nacionais
[32].

O MUNDO ARABE-MUÇULMANO: ISLAO E PETRÓLEO - 161


O árabe é também, e sobretudo, a língua litúrgica. Deste ponto de
que era simultaneamente língua litúrgica e língua de comunicação
arabófonas conhecem frequentemente o árabe literário e participam
zado à escola e a política de arabização praticada pelos países onde a
Marrocos) contribuem para aumentar ainda mais a irradiação do árabe
literário e culto.
O árabe estabelece pois o elo entre o religioso e o cultural e, numa o
islão, como a base do pan-arabismo, doutrina e movimento que tende a
reagrupar, neste espaço nevrálgico, nações árabes divididas.

C) UM ESPAÇO COBIÇADO E DIVIDIDO


O mundo árabe-muçulmano ocupa uma posição única no xadrez mundial,
porque ele é ao mesmo tempo espaço de passagem e espaço petrolífero.
Espaço de passagem, é-o duplamente. Situa-se antes de mais «na charneira de
três continentes» [14]: a Europa, a Ásia e a África. E se os contactos com a África
foram frequentemente limitados, sem se-rem nulos, devido à existência do deserto
do Sara, os contactos com a Europa e a Ásia foram historicamente essenciais. O
mundo árabe--muçulmano está igualmente em contacto com três espaços maríti-
mos: o oceâno Índico, o Mediterrâneo e o mar Negro. As relações entre oceano
Índico e o Mediterrâneo, as mais intensas, são natural-mente facilitadas pela
existência do mar Vermelho que penetra pro-fundamente entre a África e a Ásia,
para vir morrer junto ao Medi-terrâneo. O golfo Persa abre igualmente uma brecha,
entre a Península arábica e o Irão, que dá acesso à Mesopotâmia. O mar Ne-

Este espaço, considerado como nevrálgico desde há


milénios,re-que fez saltar a rolha entre o mar Vermelho e o
Mediterrâneo, e em cordemos que aqui se extrai um terço do
petróleo mundial, que aqui vas aí jazem actualmente e que
serão provavelmente 85% do próximo
ecersificaçao dos recursos que sucedeuo primeiro oque perolie endente do
mundo árabe-muçulmano,e logo concede,e concedera undo.Tanto mais
vital que esta está profundamente dividida, ape.sar das múltiplas tentativas
de unificação.
Com efeito, desde o Império Romano,esteespaço oscilou entre de
Teodósio em 396,entre o Império do Ocidente e o Império do Oriente,dade
uma vez que, em 712, o mundo árabe-muçulmano actual estáunificado sob
a autoridade dos Omíadas. Mais tarde, vai oscilar entre períodos de
fragmentação e períodos de unificação, pelo menos parci-ais, com os
Abácidas, os Seljúcidas, e por fim os turcos otomanos que,à excepção de
Marrocos e da Pérsia, vão restaurar a unidade.
É o declínio deste Império, a partir do século xvIII, que vai permi.tir aos
franceses implantarem-se no Magrebe, e aos ingleses actua-rem da mesma
forma no Egipto e em seguida no Médio Oriente.A partir de 1919, a Grã-
Bretanha e a França impelem a uma balcani-zação do Médio Oriente, no
momento em que Mustafa Kemal pro-clama a república na Turquia (1923) e
suprime o Califado, símbolo da unidade da comunidade. O Império vai ser
recortado pelas gran-des potências em função dos seus próprios interesses.
A unidade polí-tica está pois morta.
Hoje em dia, esta fragmentação traduz-se ao mesmo tempo pela
diversidade de regimes políticos, a que nos referimos mais acima, e pela
amplitude dos conflitos que ensanguentaram a região. Estão em causa,
antes de mais, conflitos internos, incidindo sobre problemas de fronteiras
provenientes do retalhamento do Império Otomano, mas também sobre
querelas étnicas, religiosas ou político-religiosas.O genocídio do povo curdo
perpetrado, em diferentes épocas, tanto e que devastou esta «Suíça do
Médio Oriente», assim como o conflito
totalmente terminado hoje, são os exemplos mais tristemente célebres.ras
israelo-árabes de 1948, 1956,1967 (Guerra dos Seis Dias) e 1973entregaram
e que matou um milhão de pessoas, sem esquecer evi-

162 -ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


dentemente a última, a guerra do Golfo, para citar apenas os casos
mais conhecidos.

Nāo é de espantar que o mundo árabe-muçulmano continue a ser sas


militares tenham diminuido muito desde há uma dezena de anes tra 3,2% no
mundo e 40% das armas do mundo são aqui entregues.parcela do PNB
consagrado à defesa ultrapassa a média mundial.16% na Árabia Saudita, em
Oman, na Síria, no Koweit e no Iraque.Índia, para o desenvolvimento de armas
nucleares [16] e não se te-nham dúvidas de que o Iraque fará o mesmo no
futuro.
Múltiplas tentativas foram feitas para reconstituir, em torno do islão e da
arabidade, a unidade perdida. Foi em torno do arabismo,movimento que tende a
reagrupar as nações de língua e de civiliza-ção árabe, que se cristalizou a
oposiçãoaos turcos. Foi em seu redor que se realizou a oposição aos
colonizadores e depois a Israel. É em nome da «nação árabe» que as populações
(mas nem sempre os seus dirigentes) apoiaram a acção de Nasser ou mesmo de
Saddam Hussein recentemente.
Esta ideia de uma comunidade dos povos árabes e muçulmanos traduziu-se
também por resultados mais tangíveis, como a criação da Liga Árabe em 1945 e
da Organização da Conferência Islâmica em 1971. Esta última, iniciada pela
Arábia Saudita, e destinada a esta-belecer uma cooperação política, económica e
cultural entre os países árabes, funcionou pelo menos parcialmente para ajudar
os países não produtores afectados pelos dois choques petrolíferos. Mais
recente-em 1981 do Conselho de Cooperação do Golfo que reagrupa as mo-vai
de Marrocos à Líbia e inclui igualmente a Mauritânia) sublinham preferência
sobre bases regionais, que assinalam matizes locais que se trata agora de
analisar.

V.OS CONJUNTOS REGIONAIS


enorme renda ainda que esta tons a cnido vertiginosamente desde ha

O MUNDO ARABE-MUÇULMANO:ISLAOE PETOLEO-163


vamente homogéneo no mundo árabe-muçulmano. Podem ser distin.Egipto)
cujo nível de desenvolvimento é mais baixo, e o Médio Oriente conjunto
constatar-se-á que, contrariamente ao que seria de esperar,os grandes
produtores de petróleo não estãosistematicamente em vantagem em relação
aos outros.

A) OS PEQUENOS PAÍSES PETROLÍFEROS


À primeira abordagem, os Emirados Árabes Unidos, o Koweit,a Líbia e
Omā parecem muito diferentes dos outros países, com um PIB real por
habitante 40 a 50% superior ao dos países do Médio Oriente e da África
Setentrional (quadro 8). Evidentemente, o petró-leo detém aqui um lugar
excepcional, uma vez que só ele cria mais de um terço do PNB, contra um
quarto nos grandes países petrolíferos e uma parte fraca nos outros. O maná
petrolífero permitiu melhorar mais do que em qualquer outra parte o
enquadramento médico e,portanto, baixar um pouco mais a mortalidade
infantil, que cai aqui cerca de 40%, bem como a esperança de vida. A
alimentação melho-rou mais do que em qualquer outro sítio (3200 calorias
por habitante),da mesma forma que a alfabetização. A motorização é aí
nitidamente mais forte do que nos outros lugares, tal como o IDH.
Verifica-se no entanto que estes Estados estão apenas povoados com
uma dezena de milhões de habitantes e que só representam pois 3% da
população total do mundo árabe-muçulmano: são pois, de facto,excepções,
em todos os pontos de vista. Constata-se, por outro lado,que, para além dos
rendimentos e das condições sanitárias, as dife-renças relativamente aos
países do Médio Oriente continuam a ser diminutas. O nível de escolarização
é da mesma ordem, do ensino primário à Universidade. A esperança de vida
não é aí superior. Fi-do da América Andina, abaixo do do Brasil e do México,
muito atrás dos países do Cone Sul.
diferentes, apesar do peso do petróleo. Os activos agrícolas são me-gamente
desérticos, e portanto a indústria manufactureira e sobre-

164-ROBERTCHAPUIS/THIERRYBROSSARD
tudo o sectorterciáriodetêm um maior lugar no emprego. Em omelhante ao
dos outros patses do Medlio orien te sen d e e
rudo se passa como se estes pequenos países nao tivessem anda
tido tempo,,ou vontade,

e e e e e e e e e e sociais, Faltou-lhes, entre outras coisas,


ho
este países fizeram apelo a uma mão-de-obra estrangeira para
utili.
ria fazer ao comparar os países petrolíferos e não petrolíferos do Médio
Oriente.

B) O MÉDIO ORIENTE
Poder-se-ia esperar, no Médio Oriente, uma diferenciação notável entre os
grandes países petrolíferos por um lado (Arábia Saudita,Irão, Iraque antes da
guerra do Golfo) e os outros países pouco provi-dos ou mesmo desprovidos de
petróleo (Jordânia, Líbano, Síria, Tur-quia, Iémen). Ora, não é de facto o que
sucede. Excluindo o Líbano,devastado pela guerra, e o Iémen, cujo atraso
tradicional foi agrava-do por problemas internos, os Estados não petrolíferos
fazem boa figura perante os bem providos.
Os primeiros compensaram a sua falta de petróleo com uma in-dustrialização
mais avançada. A parcela da indústria manufactureira no PNB é 50% mais
elevada do que nos produtores (quadro 8).Recordemo-nos que a Turquia
aparece agora como um verdadeiro pretendente ao título de NPI e a própria Síria
industrializa-se rapi-damente. O sector terciário é mais desenvolvido nos países
não pe-tário é até melhor nos países não petrolíferos. A transição demográfica
filhos por mulher desceu aí para 4,5 (5,4 nos países petrolíferos). Nǎo

Com menos meios, mas graças a uma industrialização um pouco


mento familiar, os países não petrolíferos atingem finalmente um
nível idos, o caso da Africa Setentrional nāo é fundamentalmente
dife-rente, embora seja mais complexo.

O MUNDO ARABE-MUÇULMANO: ISLAO E PETRÓLEO- 165

166-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


QUADRO 8
Os espaços regionais do mundo árabe-muçulmano: indicadores

Médio
Pequenos Grandes Oi
Estados Estados
rente

ã África
petroliferos petroliferos
o

Sentrional
petrolifero

Econo
mia

Activos agrícolas (%) 18 34 41 33


Activos nas minas(%) 7 5 3 5
Activos na ind. manuf.(%) 21 4 17 21
Activos no terciário (%) 54 39 41
Agricultura no PNB (%) 5 17 17
Minas no PNB (%) 37 8 12
Indústria manufact. no PNB (%) 15 17 24 20
Terciário no PNB (%) 43 36 51 51
PNB/habitante (em $) 9752 2711 2180 1153
Dívidas/PNB (%) 29 44 73 76
Consumo de fertilizantes/ha (1) 1323 911 528 1742
Consumo de energia/hab.(2) 4281 1938 635
Km estradas/100 km2(em km) 2 6 23 4

Demo grafia

Densidade da populaçā ao km2 5 24 53 28


Saldo natural (% ao ano) +3,1 +2,1
Número de filhos/mulher 5,7 4,5 3,8
Jovens(%) 42 45 38 39
População (em milhōes) 10,6 98,6
Evoluçāo 1960-1993 (em % ao ano) +5,2
Evoluçāo 1993-2000(em % ao ano) +2,8

Nível d evida

Alfabetizados (%) 69 67 74 53
Alunos no primário (%) (3) 92 96 95 91
Alunos no secundário (%)(3) 53 60 55 61
Estudantes na universidade (%) (3) 11 15 15 14
Número de habitantes/médico 942 2437 1623 2102
Mortalidade infantil (‰) 42 46 62 48
Esperança de vida (em anos) 63 68 64 63
Calorias por dia e por hab. 3202 2694 3195 3158
Número de habitantes/automóvel 9 34 45 43
Citadinos (% da população total) 63 64 58 48
PIB real(em $) 5831 5070 3794 4169
Indicador do Desenvolv. Humano 798 726 659 633
(1) Centenas de g. nutritivos/ha.
(2) Em kg de equivalente petróleo.
(3) % do grupo de idade.
C) A ÁFRICA SETENTRIONAL

Este conjunto de 125 milhoes de habitantes está,estruturalmente,ao activa pelos

diferentes sectores de actividade mostra-se comparáa náo ser o da indústria

manufactureira que é mais apreciável na efeito em todo o Magrebe, bem como no

Egipto (quadro 8).


Não obstante, em muitos aspectos, a África Setentrional asseme-fecundidade
está aí bem iniciada e, portanto, o crescimento foi niti-damente abrandado (cerca de
2% ao ano). Se a alfabetização conserva um certo atraso na África Setentrional, a
situação é semelhante no ensino primário, secundário e na Universidade. O
enquadramento médico, a mortalidade infantil, a esperança de vida, a
motorização...são bastantes comparáveis. Em suma, apesar de um PNB real muito
tempo inferior ao dos países não petrolíferos do Médio Oriente, a África Setentrional
está agora quase ao nível destes. Dever-se-á ver aí um efeito da emigração para a
Europa e para o Médio Oriente que contribuiu para alimentar em divisas as
economias nacionais?

CONCLUSÃO
O Terceiro Mundo árabe-muçulmano encerra pois efectivamente em si uma
originalidade evidente. A unidade dada pelo islão e pela língua árabe é reforçada
pela implementação de um tipo de desenvol-vimento fundado geralmente sobre o
petróleo, quer este seja vendido cou frequentemente a agricultura. Contudo, este
desenvolvimento,frágil. É-o tanto mais que um crescimento demográfico ainda
bastante volvimento social. Deste ponto de vista, o mundo árabe-muçulmano certos
aspectos, do que a Ásia, como iremos ver agora.

O MUNDO ARABE-MUÇULMANO:ISLĀO E PETRÓLEO- 167


5

A ÁSIA:
UM TERCEIRO MUNDO BEM LANÇADO

Poder-se-á falar de um Terceiro Mundo asiático, quando determi-tural


deste espaço? F. Godement, por exemplo, considera que: «pela diversos
conjuntos distintos» [24] e distingue uma Ásia continental,uma Ásia indo-
muçulmana, os quatro dragões e o Japão.
Do ponto de vista que aqui nos interessa, o do nível de desenvolvi-mento económico
e social, não é paradoxal afirmar que o Terceiro Mundo asiático apresenta uma certa
unidade, ainda que grandes con-juntos regionais possam ser aí distinguidos, como
mostraremos mais adiante. Mas é preciso antes de mais formular uma hipótese. Poder--
se-á ainda considerar os quatro dragões (Coreia do Sul, Hong-Kong1,Singapura, Taiwan)
como países do Terceiro Mundo? A resposta énão, e a demonstração é fácil.
Em todos os critérios que utilizamos habitualmente, os quatro dragões estão muito
mais próximos dos países desenvolvidos do que dos países do Terceiro Mundo.
Economicamente, é evidente. A agri-cultura detém um lugar pouco importante no
emprego (12%) e me-(Hong-Kong e Singapura). A indústria ocupa mais de um quarto da
prega 60% e cria dois terços do PNB. O consumo de energia é quatro

1 Hong-Kong está integrada na China desde o 1.° de Julho de 1997.

AÁSIA: UM TERCEIRO MUNDO BEM LANCADO-169


vezes superior ao da mnédia asiática. Taivan tornou-se num dos
gran
servas mundiais em divisas, a seguir ao Japão.

As exportações de mercadorias representam60%do PNB dos dra-

75 milhõesde habitantes expor-

etodo o resto da Asia. o se u i global é praticamente


equivalente
esul (13.°Estado do mundo pelo seu PNB)pesa quase tanto
como a

De igual forma, os dragões são confrontados agora com proble.rativa que


fez a sua força: o baixo custo de mão-de-obra e a sua eram apenas políticas,
mas também sociais. Como qualquer país de-dade de mão-de-obra para a
Indonésia, a Malásia e a Tailândia, onde os salários continuam baixos.
Têm pois de passar de uma indústria de mão-de-obra intensiva e de
tecnicidade fraca, para uma economia de capital intensivo e de alta
tecnologia. O abrandamento actual do seu crescimento é oíndice desta
passagem para o campo dos países desenvolvidos. Os Estados Unidos não
estavam enganados quando, desde 1988, lhes suprimi-ram as vantagens
tarifárias que concediam aos países em vias de de-senvolvimento.
O crescimento económico acarretou profundas mudanças sociais e
demográficas. Com 5850$ de PIB real por habitante, o rendimento agora é
apenas um terço inferior ao de países como a Grécia. A raçāo alimentar
(3200 calorias) supera de longe as normas mínimas.A alfabetização e a
escolarização estão dentro das normas francesas (43% de jovens estão na
Universidade). A mortalidade infantil caiu para 9‰, a esperança de vida
atinge os 72 anos e o índice de desen-volvimento humano (890 pontos)
ultrapassa o de Portugal. Enfim,mesmo excluindo Singapura e Hong-Kong, a
taxa de urbanização atinge 74%.
A transição demográfica está tão bem concluída que o renovamento
mundo, em média, menos de duas crianças. O crescimento da popula-(6‰),
mas o envelhecimento acelerado (24% de jovens apenas) deve-

170-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


dia fazer baixar rapidamente a natalidade. Excluímos pois os quatro

dos em consideração nas estatísticas.

I.UM NIVELDEVIDA AINDA FRACO


O nível de vida geral da Ásia continua fraco. Mas, para além de
(rendimento, alimentação) e zonas de luz (velada, é certo...) que fa-ora para
o lado da América Latina ou do mundo árabe-muçulmano.

A) UM RENDIMENTO AINDA BAIXO,MAS EM RÁPIDO PROGRESSO


Com um rendimento que ultrapassa os 2000$ por pessoa (em ter-mos de PI real), a
Ásia supera bastante nitidamente a África (apro-ximadamente 1270$) e situa-se pois em
cerca de metade do rendi-mento Árabe-muçulmano. Na própria Ásia, os desvios a esta
média apresentam-se antes fracos, sabendo-se que não se vive duas vezes melhor com
1500$ do que com 750, mas apenas um pouco melhor. Se exceptuarmos a Malásia e a
Tailândia (aproximadamente 5800$), que só representa 3% da população asiática, o
rendimento oscila entre os 3300$ da Indonésia e os 650 da Birmânia. Os desvios à média
mos-tram-se pois relativamente fracos, sobretudo se se souber que os ou-tros grandes
países (mais de 100 milhões de habitantes) não estão muito afastados desta média:
Índia 1250$, Paquistão 2160, Indonésia 1660,Bangladesh 1290, China 2300 (mapa 13).
Existe pois, de facto, na Ásia, um vasto conjunto de mais de três mil milhões de
indivíduos, cujo rendimento é bastante comparável.em média, cerca de 4% ao ano entre
1965 e 1995 (ou seja mais do que uma duplicação), e mesmo perto de 6% na China.
mento não estaria muito mais mal partilhado do que em França.
Com e en to nacional(França 6%) e os 20% mais ricos de 38 a 48%
(França e nas Filipinas que seria mais considerável.

AASIA: UM TERCEIRO MUNDO BEM LANÇADO - 171


lação, parecem ocultar uma realidade menos igualitária.Um pouco sombria

pode coexistir lado a lado com a riqueza mais louca. Na In.têm fortunas

colossais que chocam tanto mais por se exibirem,em A China, mais igualitária

na pobreza antes da liberalização económica,frequentemente escandalosas,

dado que permitidas por uma corrup.ção que tende a generalizar-se.


O aumento dos rendimentos, no entanto, não beneficiou unica-mente os
ricos. Uma classe média, formada por quadros de empresas públicas ou
privadas, por funcionários, por pequenos patrões que con-seguiram triunfar
no artesanato, na indústria, no comércio e nos ser-viços, agricultores médios
que beneficiaram da revolução verde, estáa subir em poder um pouco por
toda a parte. Doravante forma uma massa, longe de ser negligenciável, que
começa a ter um acesso mais ou menos fácil ao consumo, já não apenas de
primeira necessidade,tal como rádio, televisão, frigorífico, máquina de lavar,
bicicleta, mo-torizada ou mesmo carro para os mais ricos.
Na Índia, estima-se que é uma massa de 150 a 200 milhões de pessoas, ou
seja 15 a 20% da população que tem acesso a este nível de consumo. Na
China, a produção de bicicletas quadruplicou em dez anos, a das televiões foi
multiplicada por 30, a das máquinas de lavar por 90. Ainda que uma parte
desta produção seja exportada, e ainda que tivesse arrancado, excepto para as
bicicletas, de um nível muito baixo, os números indicam bem que uma parte
não negligenciável de chineses (10%? 20%?) começa a aceder a um estádio
mínimo da socie-dade de consumo. Na Indonésia, no Paquistão, e mais ainda
nas Fili-pinas, na Tailândia, na Malásia, encontraríamos esta ascenção de uma
classe média de mira consumista que representa, consoante os casos,de 15 a
30% da população.
Ainda que as diferenças aumentem entre categorias sociais, a pobreza tem
tendência para recuar na maioria dos países. Na China,370 $) teria passado de
20 a 3% entre 1985 e 1990, nomeadamente permitiram elevar o nível de vida
dos campos. Na Índia e no Sudeste cerca de 50 a 25% e na Indonésia de 60% a
menos de 20% [27].Mes-

172-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


rência quantitativa de alimento) afecta ainda determinados países.pela FAO,
da mesma forma que o Paquistão e o Vietname. Mas é so.em ano normal, a
ração por habitante cai para as2000calorias,ou seja, nitidamente abaixo do
limiar (mapa 14).O Nepal,o Butão, as aí oscila entre 2000 e 2200 calorias
aproximadamente.No interior nadas camadas sociais vivem quase
constantemente no fio da nava.chegados recentemente do campo,
deficientes diversos,etc.:o espectáculo aterrador de Calcutá aí está para o
lembrar.
Mas a malnutrição está ainda mais disseminada. Enquanto em França,
mais de um terço da alimentação é de origem animal (mas não será de
mais?), na Ásia a proporção desce sempre para entre 4 e 10%, salvo no
Paquistão e na Malásia onde os 10% são um pouco ultrapassados[3].
A situação alimentar da Ásia estabilizou-se pois, globalmente,um pouco
acima do mínimo, graças aos progressos agrícolas e àdesaceleração
demográfica. A prova está em que a Ásia, embora seja de longe o mais
populoso dos Terceiros Mundos, é o que recebe a ajuda alimentar por
habitante mais fraca, mais fraca do que a da América Latina. Não obstante, o
equilíbrio é frágil e o problema ali-mentar continua a ser essencial para as
famílias, uma vez que a alimentação absorbe entre 55 e 60% do orçamento,
excepto na Malásia e na Tailândia. Tudo isto pesa muito evidentemente no
estado sani-tário da população.

C) UM ESTADO SANITÁRIO QUE MELHORA,


MAS AINDA MEDIOCRE
sideravelmente desde há cerca de vinte anos. Para nos limitarmos 85% da
população), constata-se que entre 1970 e 1990, o número de minuiu de 40
para 50% e a esperança de vida aumentou, consoante os países, entre 9 e 14
anos!
mente o enquadramento médico da Ásia (aproximadamente 3000

174-ROBERTCHAPUIS/THIERRY BROSSARD
pessoas pormédico)

outrosTerceiross Mundos visto que, embora seja menos denso que o

de da Arica subsariana Se se observer ais de e to


en e e
e e e e e e e pouco realista se soubermos que o equivis dos jovens chineses

acedem à Universidade. A razāo é que os médicos sideravelmente, pelo

menos nas estatísticas, o enquadramento médico,pois a China, que

representa 40% da população asiática, os resulta-realidade, cada médico tem

a seu cargo mais de 4000 pessoas em média.acima da média, o Bangladesh, a

Indonésia, as Filipinas nitidamente abaixo (mapa 17).


A mortalidade infantil, que é um bom índice do estado sanitário do país,
vem corroborar estas observações. Com uma taxa de aproxi-madamente
50%, a Ásia tem um desempenho aparentemente tão bom como o mundo
árabe-muçulmano. No entanto, se excluirmos a China, cujos números estão
sujeitos a caução (haveria nomeadamente uma sobremortalidade das
raparigas por infanticídio), a mortalidade na Asia atinge os 70‰, quer dizer,
acima dos países árabe-muçulma-nos, o que continua a ser muito honroso
em comparação com o nível de vida destes últimos. Se nos referirmos a esta
média, notaremos que todos os grandes países se situam entre os 70 e 90%,
à excepção da Indonésia, onde esta mortalidade é um pouco inferior, e de
alguns países médios onde ela desceu para um nível nitidamente mais baixo
(Malásia, Tailândia, Filipinas) (mapa 15).
uma vez mais equivalente à do mundo árabe-muçulmano, e
muito países mantêm-sem contudo, sensíveis: China,
Filipinas, Malásia,anos, quando a Índia, a Indonésia, a
Birmânia, o Bangladesh e o
Finalmente, o indicador de desenvolvimento humano está
abaixo mas muito acima do da Africa (375). Esta média esconde
no entanto

AASIA: UM TERCEIRO MUNDO BEM LANÇADO-175


disparidades sensíveis entre o mundo indiano, que sedesgarra niti.

certos países como a Malásia, o Sri Lanka e a Tailandia onde o indie


aÁsia,com um rendi.

nento muito mais fraco, consegue pois resultados apenas um poueo

masdisparidades mais

acentuadas do que nos outros Terceiros Mundos se desenham aqui.

amplitude, do lado da escolarização e da alfabetização.

D) UM NÍVEL DE INSTRUÇÃO BASTANTE BOM


Com as precauções de utilização, sobretudo no que diz respeito ao ensino
primário, constata-se uma vez mais que o nível da Ásia se passa pois em muito o
da África. A Ásia escolariza tanto como a área árabe-muçulmana no ensino
primário, mas um pouco menos bem no ensino secundário e envia menos
estudantes para a Universidade.Os seus desempenhos são sempre muito
superiores ao da África.
Enormes esforços de escolarização foram desenvolvidos na maior parte dos
países da Ásia onde, mais do que noutros lugares talvez, os estudos são
considerados, a nível colectivo como um meio de sair do subdesenvolvimento (à
semelhança do Japão) e, a nível individual como um meio de ascensão social.
Entre os grandes países, excep-tuando o Bangladesh e o Paquistão, todos
escolarizam a quase totali-dade dos seus jovens no primário (mapa 19), na teoria
pelo menos uma vez que, de acordo com certas fontes oficiosas, dois terços dos
jovens indianos abandonariam a escola antes de terem terminado a sua
escolaridade.
Na Índia, na Indonésia e no Paquistão a percentagem dos jovens dos 12 aos
17 anos escolarizados duplicou entre o início dos anos 70 e o final dos anos 80,
mas esforços mais antigos resultaram numa me-lhor escolarização secundária na
Malásia, nas Filipinas,no Sri Lanka,enquanto o Bangladesh e o Paquistão ficam
uma vez mais na cauda inferior a 10%, excepção feita às Filipinas e à Tailândia
(mapa 21).
mais forte do que no mundo árabe-muçulmano, prova de que se tomou jovens.
Nos últimos vinte anos, a percentagem de analfabetos recuou

176 -ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD

AASIA: UM TERCEIRO MUNDO BEM LANÇADO- 177


entre 15 e 20 pontos na Índia e no Paquistão, mas o atraso
destes par Esta alfabetização e esta escolarização, de um nível
bastante bom
asia ja sabe,e saberá cada vez mais utilizar, ao contrário da Africa,250 000

engenheiros e homens de ciência e não é já uma reserva de no Silicon Valley)

como europeus: Thompson,Alcatel,Dassault,Nestlé,informáticos na Índia» ou

deslocam para lá o seu serviço informático


Vemos, pois, a posição original da Ásia entre os Terceiros Mun-dos. Bastante
mal colocada devido ao seu rendimento e alimentando convenientemente a sua
população, assegura, no entanto, aos seus habitantes um meio sanitário ainda
medíocre e desigual, mas bem melhor do que o da África, bem como um
enquadramento escolar suficientemente correcto para representar um trunfo
incontestável para o seu desenvolvimento futuro. Com relativamente poucos
meios,sai-se muito melhor do que a África e quase tão bem como o mundo
árabe-muçulmano, mas a verdade é que este progride rapidamente.
Uma parte deste sucesso deve-se ao facto de a Ásia ter tomado consciência
da necessidade de abrandar o crescimento demográfico e de se ter dotado dos
meios de o conseguir.

II. UMA TRANSIÇÃO DEMOGRÁFICA BASTANTE AVANÇADA


A Ásia, contrariamente ao mundo árabe-muçulmano, situa-se na segunda fase
da sua transição demográfica. A mortalidade geral bai-xou muito desde os anos
50. Só nos anos 60, foi reduzida para metade sido mais precoce, diminuiu um
terço. Mas hoje em dia a mortalidade partida, a fecundidade, que tinha inflectido
lentamente até aos anos 70,pôs-se a retroceder mais rapidamente.

A)UMA BAIXA MORTALIDADE


nível de país desenvolvido. Excluindo o Bangladesh (entre os grandes
Estados) que conservou uma mortalidade de cerca de 12%o todos os fraca taxa já só
parcialmente é devida à juventude da população, dado terço de jovens com menos de 15
anos); são aliás os países mais jo-vens que realizam os piores resultados.
devida a uma melhoria da alimentação e das condições sanitárias que que aludimos mais
acima. Esta, recordemo-lo, inflectiu para cerca de metade, no decurso dos últimos vinte
anos, nos países com mais de 100 milhões de habitantes. Como ainda é relativamente
forte,con-tinuam a ser possíveis melhoramentos. Esta diminuição da mortalidade foi em
parte compensada por uma baixa da fecundidade,durante a segunda fase da transição
demográfica que está em curso.

B) UMA INFLEXÃO SENSÍVEL,MAS DESIGUAL DA FECUNDIDADE


Com uma média de 3,1 filhos por mulher, a Ásia exibe uma fecundidade igual à da
América Latina e muito inferior à do mundo árabe-muçulmano (4,6) e da África (6,3). Desde
o início dos anos 70,a fecundidade caiu mais de metade na China (mas os números são
pouco seguros) e na Tailândia, um terço na Indonésia e no Vietname,um quarto na Índia e
na Malásia. Todavia, em certos países de tradi-ção muçulmana, como o Paquistão, esta
evolução foi consideravel-mente travada uma vez que a fecundidade baixou menos de 10%
desde o início dos anos 70 e se situa hoje ainda em cerca de 6 filhos por mulher; em
compensação, diminuiu mais no Bangladesh (um pouco mais de 4 filhos por mulher).

vida,tal como noutros sítios, à melhoria dos rendimentos e da ção de citadinos duplicou.

Não obstante, nestas regiões em que o apego islamizado (estamos a pensar particularmente

na China), esta evolu-vindo directamente para instaurar um planeamento familiar.


ção voluntária dos nascimentos, em nome do princípio: «Um homem

178- ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


é uma boca, mastambém
iaping, assustado com una taxa de crescimen to u e ult e e
ultar numa so crianga por casal Retarda se idade e e
e
anos para asmulheres,

e e e a e e s infractores do filho único. Os contratos dee


o
aafectações afastadas para separar os casais. As autoridades
planifi-
Em caso de necessidade recorre-se ao aboro. Por outro lado,
uma
diversas vantagens às famílias que aceitam ter um só filho. Mesmo

altura das expectativas, a China conseguiu fazer retroceder, em me-


nos de uma geração, o número de crianças por mulher de 6 para 2,0.
A Índia foi um país pioneiro em matéria de planeamento familiar,uma vez
que aí se preconiza um controlo do crescimento demográfico desde 1952. Aí
se desenvolve uma campanha antinatalista que preco-niza contracepção e
esterilização, sendo esta encorajada através de prémios às mulheres que
aceitam submeter-se a uma operação. Como os resultados se revelam pouco
significativos, Indira Gandhi toma,em 1976, medidas autoritárias
(retardamento do casamento legal em três anos, penalização dos pais de pelo
menos três filhos que não re-correm à esterilização) ou mesmo coercitivas:
«Vasectomias e liga-ções das trompas são praticadas sem discernimento»
[1].Após a morte de Indira Gandhi, voltou-se a medidas mais incitativas. Os re-
fazer descer o crescimento para 1,2% ao ano no ano 2000 não seráMas os
resultados estão longe de serem negligenciáveis quando se A fecundidade
passou, com efeito, de 6 para 4,3 crianças por mulher

ea e itado o nascimento de 130 milhões de indianos desde

180-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


1960.dia uma política de incitação a um melhor controlo dos

nascimentos e ipinas, as fam ias ouco numerosas tém direito a

abatimen-tos fiscais e a subsídios.

he en ode e e e e a sla, a excepgtio do


Paguistio
AÁSIA: UM TERCEIRO MUNDO BEM LANÇADO - 179

180-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


filhos por mulher; baixou para menos de 4 na Malásia,
para menos de detido pela China (mapa 24). Daqui
resulta uma desaceleração sensí.vel do crescimento
demográfico.
C)UM CRESCIMENTO DEMOGRÁFICO ABRANDADO
O saldo natural da Ásia é doravante o mais fraco dos Terceiros
enquantoo da América Latina está lá perto, e o dos dois outros atinge ou
ultrapassa 2,5%.
Não obstante, importa distinguir, por um lado,o caso da China,cujo
crescimento oficial caiu para 1,1% ao ano (na realidade certa-mente um
pouco mais), ao qual se pode juntar a Tailândia e o Sri Lanka (1,3 a 1,5% ao
ano) e, por outro lado o dos outros Estados asiáticos cujo crescimento se
mantém próximo ou superior a 2% e que se encontra pois
aproximativamente ao nível da América Latina (mapa 27). Regionalmente, a
Ásia do Leste, essencialmente a China,deveria estabilizar a sua população
por volta de 2030 na ordem dos 1,7 mil milhões de habitantes, enquanto a
Ásia do Sul deveria espe-rar 2075 e atingir então 1,3 mil milhões de pessoas.
Este crescimento natural está próximo do da população total. Com
efeito,a Ásia não tem a sorte de poder contar, como a Europa do século xix
no decurso da sua transição demográfica, com uma emigra-ção maciça que a
aliviaria de uma parte do seu excedente. A emigra-ção existe, de facto, mas
é limitada. Apresentaremos mais adiante a diáspora chinesa disseminada
por toda a Ásia, bem como pela América do Norte. Notamos igualmente que
os países petrolíferos do Médio Oriente haviam acolhido numerosos
trabalhadores provenientes da Índia, do Paquistão, do Bangladesh, do Sri
Lanka e das Filipinas. Na véspera do contrachoque petrolífero, três a quatro
milhões de asiáti-lados. Lembramo-nos que muitos regressaram ao seu país,
pressio-igualmente nas boat people, que fugiram do Vietname, na partida
dos mentos não dizem respeito, num período de 10 a 20 anos, do que a
comparado com um crescimento natural que dá cada ano à Ásia mais de 50
milhões de bocas suplementares.
para absorver una parte do sen e s i e te de e
ee
ara melhorar o seu nivel de vidar ageo e
demográfico é mais fraca do que nos outros lugares, inclusive
no
América Latina.
é muito mais rápido do que nos outros países, o futuro afigura-se
relativamente promissor.

III.UM CRESCIMENTO ECONÓMICO PROMISSOR


As estruturas económicas da Ásia continuam aparentemente muito
arcaicas. Basta constatar simultaneamente o peso enorme do sector
agrícola e a parcela reduzida dos sectores secundário e terciário, pelo
menos em termos de emprego, para se ficar persuadido. Contudo,por trás
das aparências de atraso, a Ásia esconde bolsas sectoriais e espaciais já
desenvolvidas e o seu ritmo de crescimento deixa, pelo menos na
globalidade, igualmente augurar o seu futuro.

A) UM SECTOR AGRÍCOLA AINDA CONSIDERÁVEL E POUCO


PRODUTIVO,MAS EM RÁPIDO PROGRESSO
1.0 PESO DA TRADIÇÃO

Na Ásia, seis activos em dez trabalham ainda na agricultura; é o tina.

Continuam a haver pois 1,8 mil milhões de pessoas que vivem Ihas

civilizações agrícolas, e mais precisamente rizícolas, que só tardia-as duas

guerras, com frequência de facto apenas nos anos 50. Por tura. Os dois

gigantes, a China e a Índia, encontram-se ombro a om-


Sem embargo, se a Asia continua muito agricola em termos
de e e e e de 30% parao PNB, enquanto 60%

AÁSIA: UM TERCEIRO MUNDO BEM LANÇADO -181

182-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


182-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD
pouco produtiva. Recordemos que o valor
acrescentado o eeri e e asileiré duas vezes mais
produtivo do que o indonei e e e ea eon ina lare e
ee adicional. Ela é constituid
mnuito trabalho,vivendo em semiautarciae praticando algumas cul.tre as
quais o arroz (geralmente irrigado),o trigo,a soja, a mandioca,trigo e o arroz
ocupam cerca de 30% das superfícies, o milho 20%,que vem à cabeça com
mais de um terço das superfícies.Mas quase um terço e metade da
Superfície Agrícola Útil (SAU), como na Indonésia,na Tailândia, nas Filipinas,
no Vietname. Na Índia ocupa um quarto da SAU, à frente do trigo e do
milho miúdo. Apesar de uma forte utilização de fertilizantes (três vezes mais
por hectare do que a América Latina), os rendimentos continuam a ser
entre baixos e médios: 20 quintais por hectare para o arroz da Índia, e outro
tanto para o trigo, 50 na China para o arroz e 30 para o trigo.
A criação de gado não está ausente, mas evitou-se multiplicar o efectivo
bovino que, com a sua carne, fornece sete vezes menos calo-rias por
hectare do que os vegetais. Voltou-se preferencialmente para os pequenos
animais que se podem criar em terras não utilizadas pelas culturas. A China
encontra-se assim com o 1.° efectivo de suí-nos do mundo, o 2.° de ovinos,
a Índia com o 5.° de ovinos. Os bovinos lho, sendo o caso da Índia
totalmente particular. A imensidade do não teve igual senão o seu fraco
valor económico (dá leite e bosta gressos consideráveis, graças a um preço
elevado do leite e à introdu-

Mas a esta trama geral muitos pormenores foram


acrescentados.se-lo. A colonização havia trazido a grande
plantação, que ainda se -na em seguida transposto para as
suas próprias terras, e continua-
quatro sáoasiáticos, a Índia e aChina fornecem só elas metade da

produçáo.A

pgdo de cana de actcar a China, a e landin e o a uist a e e


e e total) e a China, s fndia e o pa be

Indonésia e a Tailándia fornecem só elas três quartos da borracha

quartos da produção na Índia e no Bangladesh), o tabaco (China à

posiçoes desde há algumas décadas para cá. Todavia, os progressos

parte das produções e às explorações mais dinâmicas.

2.NA CHINA:DESCOLECTIVIZAÇÃO E PROGRESSO.


O caso da China é particularmente espectacular. Neste país, fo-ram realizadas
enormes obras (milhares de quilómetros de diques e de canais, barragens, etc.),
sob o governo de Mao Zedong, ao longo dos grandes rios (Huang-He, Yangzijiang)
para proteger as terras agrícolas das enchentes devastadoras e para estender a
irrigação. As superfícies irrigáveis duplicaram desde 1965 e atingem hoje 50 mi-
lhões de hectares. Elas permitem ao mesmo tempo um melhor do-mínio da planta
e sobretudo uma dupla, ou até mesmo uma tripla colheita.
A descolectivização, que repartiu as terras entre os camponeses que autorizou os

agricultores a possuírem animais de tiro e alfaias libertou as energias e as iniciativas

individuais a partir de 1978.tempo do colectivismo. A subida dos produtos agrícolas

(20 a 50% nos nivel de vida dos campos e um início de motorização:o país conta

notocultivadoras, as bombas multiplicam-se e vê-se mesmo aparecer


por ora,,cerca de um quarto das

e e a elee e ee metade da produção. Parece

AÁSIA: UM TERCEIRO MUNDO BEM LANÇADO - 183


(sementes seleccionadas, fertilizantes químicos, pesticidas,

pequena oice,sach à máo) e que permitirá utilizar, mas

apenas em parte, a -obra rural está subempregada, a

modernização liberta braços. Em.quenta milhoes de

camponeses teriam abandonado a sua aldeia para

consequências sociais desta modernização da agricultura

(que nos vida nenhuma, muito benéficas.


Com efeito, a produção «aumentou mais entre1978 e 1984 do que durante os
vinte anos precedentes» [32]. Entre 1974 e 1990, a produ.çāo de arroz e de
algodão aumentou dois terços, a de amendoim du-ovinos aumentaram mais de
metade. Entre 1980 e 1990,globalmente a produção quase duplicou, e desde
então a progressão continua.No respeitante ao outro «grande» do mundo asiático,
a Índia, os progres-sos são menos espectaculares, uma vez que não houve
recuperação depois da colectivização, mas estão longe de poderem ser
negligencia-dos.

3.A REVOLUÇÃO VERDE:NA ÍNDIA E NOUTROS PAÍSES

Na Índia, atéaos anos 70, os progressos são lentos, entrecortados mesmo por
regressões dramáticas. Subsiste ainda na nossa memória a última fome a que o
país assistiu em 1966, e no decurso de um mau ano como o de 1979, não se
colhem mais cereais do que em 1971 [1].Verificaram-se mesmo assim progressos
bastantes notáveis. Desde 1974, a produção de chá e de milho aumentou 50%, a
do trigo, do arroz,da borracha e da juta duplicou, a da batata e do açúcar
triplicou,a da seda quadruplicou. Os ovinos aumentaram 40%. Estes progres-sos
são tanto mais interessantes que, durante esse tempo, a popula-ção não
aumentou (se assim se pode dizer) mais de um bom terço, o que permitiu pois
aumentar a alimentação.
《 revolução verde». Ela consiste na introdução de novos métodos de esta ainda
não existia, utilização mais massiva de fertilizantes e de

184-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD

AÁSIA: UM TERCEIRO MUNDO BEM LANÇADO - 185


Para o trigo, e para o arroz nas Filipinas, O arroz
hibrido IR s, de de arroz no mundo e es ecialmente na
Índia, entre 1974 e 1989.
ee e a d o o e randes exploradores (mais de 10 hectares geralmente),o têm

possibilidades financeiras mais avultadas. Atingiu somente cer-do Ganges, e o

Tamil Nadu no Sul. Não obstante,se como se diz por por isso empobreceu os

pobres. Permitiu sobretudo à Índia atingir a que o crescimento da produção foi

superior ao da população, alimen-ção ao ritmo de 2 milhões de hectares por ano,

ao ponto de cerca de cinquenta milhões de hectares estarem hoje irrigados.


Tais evoluções podem ser seguidas igualmente em países como o Paquistão e a
Indonésia. No primeiro, a irrigação, desenvolvida des-de a época colonial,
estendeu-se desde os finais dos anos 60 na Bacia do Indo (Punjabe, Sinde) graças
a barragens, canais e bombeamentos na toalha. Ganharam-se perto de 4 milhões
de hectares em cerca de vinte anos e hoje aproximadamente 80% das terras
cultivadas no Paquistão são irrigadas. Foi nestas terras que se realizou a revolução
verde que permitiu ao país duplicar a sua produção de trigo (para a qual o país é
agora auto-suficiente) e aumentar a de milho em meta-de ao longo destes últimos
quinze anos. Por outro lado, a produção de algodão duplicou, a do açúcar e dos
citrinos triplicou. Mas espera-se agora, ao que parece, um limite, devido à
salinização da toalha freática do Sinde.
É igualmente graças à revolução verde, que foi encorajada atra-vés de
subsídios e de um apoio aos preços (duas vezes a cotação mun-cada por 2,5 e
que os rendimentos atingem 60 quintais/ha [1]. Em cerca de trinta anos.
Enquanto o consumo de arroz por pessoa au-guem exportar uma parte da sua
produção. Com menos de um hec-e pesticidas, uma família pode doravante
usufruir de condições de vida decentes.
Tailândia, onde o aumento da produção está ligado ao
arroteamento mentou 40% desde 1974, a de milho e de cana de
acúcar duplicou, a ser vendedor em 1982. A Tailândia elevou-se
ao nível de primeiro destinada à cultura do arroz estende-se pela
costa Este da península tornou-se o terceiro exportador de arroz
do mundo, graças ao acrés.irregular.
Continuam a haver, na verdade, buracos negros na Ásia. O maior de
todos continua a ser o Bangladesh, sobrepovoado, e que vive sob a ameaça
constante de inundações catastróficas e de ciclones. O de Maio de 1991
matou 125 000 pessoas, deixou 1 000 000 sem abrigo, des-truiu a colheita
de arroz do Sudeste e salgou milhares de hectares de terras cultiváveis [20].
A colheita de arroz aumentou na verdade três quartos desde 1974, mas o
crescimento demasiado rápido da popula-ção só com muita dificuldade
permite ao país atingir a auto-suficiência,e a maior parte das outras
produções só lentamente aumentam. Ou-tros países, felizmente menos
populosos, continuam por ora singu-larmente atrasados. É o caso do Nepal,
isolado pelas suas montanhas e pela Índia, o seu grande vizinho. Mas a
Birmânia, que exporta arroz e cuja economia estava bloqueada numa quase
autarcia por um regime marxista brutal, o Camboja e o Laus, martirizados
pela guer-ra, poderiam relançar rapidamente a sua produção com a actual
in-trodução de um certo liberalismo.
No total,apesar destas excepções, e apesar do peso da tradição,como as
superfícies cultiváveis são imensas, os resultados da Ásia em termos de
produção são espectaculares. As superfícies rizícolas mun-diais estão 90%
delas localizadas na Ásia, e os dez primeiros produto-vem à cabeça,
seguindo-se a Índia,a Indonésia o Bangladesh,°(19% da produção), a Índia o
2.°, o Paquistão o 9.° A China coloca-se no 8.,a Indonésia no 10.°
Encontraríamos ainda a China em 1."posi-ção para as batatas, em 2." para a
soja...
mentares de base, salvo excepções regionais ou sectoriais: a China

186-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD

AASIA: UM TERCEIRO MUNDO BEM LANÇADO -187


portar

e portadora de produto e ea d o
e e e e e e e e ao da
o nar-se igualmente tanto um NPI como um NPIA, o que
signi ea
Em resumo, se se raciocinar pelo menos ao nível dos Estados,a
espectaculares: modernização técnica, aumento dos rendimentos,nacionais.
Por todo o lado, excepto na Coreia do Norte e no Nepal, a res) é beneficiária,
geralmente pouco mas por vezes muito, como na uma franja de países,
povoados com cerca de 200 milhões de habi-tantes (menos de 10% da
população total), fica de fora deste movi-mento geral de desenvolvimento
agrícola. Progressos, mais espec-taculares ainda, foram realizados no sector
industrial, mesmo fora dos quatro dragões que, recordemo-lo, não são tidos
em consideração neste estudo.

B) UM ESPAÇO AINDA POUCO INDUSTRIALIZADO,MAS EM


CRESCIMENTO ACELERADO
1.UMA SUBINDUSTRIALIZAÇÃO PATENTE

no sector industrial, incluindo o sector mineral e energético. É

pois,quarto), e do que no mundo árabe-muçulmano, mas mais

do que em de vista, como pouco indusrializada, mesmo tendo

como referência a indústria oscila entre 12% e 20% (mapa 5).


Mas certos países 30%), bem como a Malasia; pelo contrário a

India,com 15%,encon
confirma, à primeira abordagem, uma constataçāodesubindus-

Tudo isto

trialização generalizada da Asia.


como sempre,a algumas

ral e energética só contribuem com um sexto para esta


produção in.
África e no mundo árabe-muçulmano, em mais de um quarto
ainda
na América Latina. Em suma, os outrosTerceirosMundos contam

mais do que a Ásia com os seus recursos naturais.Localmente,só a

Malásia e a Indonésia realizam mais de 10% do seuPNBnas suas

riquezas minerais ou energéticas.


para o PNB (mapa 6). A China situa-se acima desta barra com cerca indiano
está abaixo (20% no Bangladesh), a Birmânia e o Nepal muito abaixo. Na
Índia, aproximadamente um quarto do PNB é fornecido pelo sector
secundário.
Em valor absoluto, a Ásia, com 40% da produção industrial dos Terceiros
Mundos equipara-se com a América Latina e deixa muito para atrás o mundo
árabe-muçulmano e sobretudo a África. Por outro lado, dos doze países cujo
valor acrescentado industrial ultra-passa 20 mil milhões de dólares, seis são
asiáticos (China, Índia,Filipinas, Malásia, Indonésia e Tailândia) contra dois
latino-ameri-canos.
Mas, como sabemos, a massa da mão-de-obra industrial é cinc0vezes
mais numerosa na Ásia do que na América Latina, o que indica
evidentemente uma produção muito inferior na primeira. Os mapas do valor
acrescentado das indústrias transformadoras elaborados por W. Curran
sublinham bem esta fraqueza [14].Seja onde for na Asia,o valor acrescentado
desce a menos de 200$ por habitante, excepto e a Tailândia se situam entre
100 e 200$, descendo o resto da Ásia a menos de 100 . O consumo de
energia por habitante, na medida em este prognóstico: a Ásia consome duas
vezes menos por habitante do
-muçulmano. Só a África tem pior desempenho.Tudo isto dá uma impressão de
fraqueza industrial que a medio-cridade dos recursos naturais parece confirmar.

AÁSIA:UM TERCEIRO MUNDO BEM LANÇADO-189


188-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD

AÁSIA:UM TERCEIRO MUNDO BEM LANÇADO-189


2.POTENCIALIDADES NATURAIS MODESTAS
As indústrias minerais e energéticas, como vimos, existem mas lidades em
petróleo: 5% das reservas do mundo (para mais de metade quinto na
Indonésia. A produção actual é inferior a 10% do total para a Indonésia. O
conjunto da imensidade da Ásia produz menos da sua produção, pelo
contrário, as disponibilidades da China, devido a um consumo mais forte, são
mais diminutas (15 a 20%).
As reservas de gás natural são tão limitadas como as de petróleo,os países mais
favorecidos (Indonésia, Malásia, China) detêm apenas 1 a 2% da tonelagem
mundial. A produção actual é à semelhança das reservas: cerca de 190 mil milhões
de m3 (um pouco mais do que só o Canadá), dos quais cerca de um terço para a
Indonésia.
Em compensação, os gigantes asiáticos estão bem dotados em car-
vão,combustível infelizmente pouco prático e poluente, senão sem-pre caro. A
China situa-se no primeiro lugar mundial, com 35% da produção total, à frente dos
Estados Unidos. A Índia vem em terceira posição, mas evidentemente muito atrás
(aproximadamente 6%). Os outros produtores asiáticos são negligenciáveis,
excluindo a Coreia do Norte e a Indonésia.
As disponibilidades em electricidade hidráulica, em compensação,são
consideráveis uma vez que determinados países dispõem ao mesmo tempo de água
e de declives. As melhores potencialidades estão situadas portanto na montanha, as
mais das vezes longe dos centros de consumo, naqueles países em que a população
se concentra fre-quentemente na planície. Só o Nepal disporia de 3 a 4% das
potencialidades mundiais (cerca de 400 mil milhões/kWh) e a barra-gem de Karnali
poderia fornecer o equivalente de Itaipu, no Brasil,enquanto o país inteiro produz
actualmente menos de mil milhões/lhōes/kWh),ou seja, praticamente o equivalente
da do Brasil, reflecte fraqueza dos investimentos concedidos pelos grandes estados
mais bem dotados (Índia, China).
Os recursos minerais aparecem também eles bastante
reduzidos,essencialmente da China e da Índia), de estanho (60%)
fornecido so-
bretudo pela China e pela Indonésia.Mesmo abauxite, apesar 10% do total
mundial). A imensa Índia é apenas o 8.° pais do munde pelo valor da sua
produção mineral.
cimento geológico das jazidas. Em 1989, por exemplo,as reservas de sta
reavaliação poderia aliás continuar e fazer passar as reservas de que a China
é mesmo assim a terceira potência mineral do mundo,que as suas
exportações de petróleo representam20%das suas ex-concluir que as
potencialidades naturais da Ásia são modestas. Na era possível a
industrialização sem bases naturais nacionai. Não deixa de ser verdade que
estas potencialidades podem facilitar um arran-que, como vimos no mundo
árabe-muçulmano ou mesmo na América Latina. O desempenho asiático é
pois tanto mais meritório uma vez que a indústria já não conta apenas com
os tradicionais segmentos dos países em vias de desenvolvimento que são
as indústrias agro--alimentares e o têxtil.

3.UMA INDÚSTRIA MANUFACTUREIRA DIVERSIFICADA

A indústria têxtil e as indústrias agro-alimentares (IAA) não de.têm o


lugar que se espera habitualmente deste tipo de actividade nos Terceiros
Mundos. Os IAA não criam senão 15% aproximadamente do valor
acrescentado da indústria manufactureira da Ásia. Este lu-gar modesto
deve-se a dois factores muito distintos. O primeiro deriva semiautarcia e,
portato, os produtos serem consumidos sem trans-local.O segundo factor
deve-se ao facto de o desenvolvimento de ou-absoluto) o lugar dos IAA.
Este lugar é particularmente reduzido na nua a ultrapassar um quarto deste
valorno Bangladesh, no Paquistão tradicionais, trabalham para o consumo
loal, mas um certo número,

190-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


e riente multiplicar vindos do
esportações de produtos agro-alimentares (que podem incluir e a nae
balanca com ercial na ailan de e e te por-e e toes de orraceaee ee mo na
China. Noutros paises, asae exportações totais,como naÍndia e no
Bangladesh que vendem es-sencialmente o seu chá.
Tradicionalmente, afirma-se também que a indústria têxtil mento. Ora,
constatamos que na Asia, se isso foi outrora verdadeiro,15%do valor acrescentado
da indústria manufactureira asiática. Cons-tata-se isso na maior parte dos grandes
países onde esta proporção oscila entre os 10 e 20%, à excepção do Bangladesh,
onde este ramo cria um terço de valor acrescentado e, ao contrário, da Malásia e
das Filipinas onde ela intervém apenas com menos de 10%.
0 que não significa que em valor absoluto a produção do ramo têxtil-vestuário
tenha diminuído, bem pelo contrário. Desde 1974,a produção de algodão da Índia
e do Bangladesh aumentou mais de 40% e a do Paquistão mais que duplicou.
Durante o mesmo período, a Índia multiplicou a sua produção de têxteis sintéticos
por 20, a China por 30 e a Índia, tendo partido do nada, produz por ano quase
cinco vezes mais do que a França. Sabemos que, neste sector, a Ásia tem um
grande peso no mercado mundial. É com efeito neste continente que se produz
mais de metade do algodão do mundo (53%), dos quais detêm quase o monopólio
da juta. O lugar da Ásia no mercado mundial aido progresso, contrariamente ao da
maioria dos países desenvol--se entre os principais fornecedores da Europa.
estimentos em materiais muito sofisticados, realizados por
firmas equipamento e as teenicas te um ou dois tempos de
atraso e

AÁSIA: UM TERCEIRO MUNDO BEM LANÇADO-191


çāo aos países desenvolvidos. Determinados equipamentos são
ainda

países desenvolvidos a parte das fibras químicas nototaldas fibras

utilizadas ultrapassa os dois terços, ela desce para30% naChina e na


o baixo níveldos salários e

dos encargos sociais permitem fazer uma cerrada


concorrência, pelo
japonesas. Com custos horários de trabalho que equivalem a
9 francos
vemos muito bem como resistir na Europa a esta concorrência, a não
ser no âmbito de acordos como o «multifibra».

Apesar destes progressos, o sector do têxtil-vestuário viu o seu tores a


que se fez alusão mais acima (minas, energia, IAA) o total dução se
diversificou, se equipou tecnologicamente, se sofisticou. Ci-temos alguns
exemplos.

4.0 PESADO DRAGÃO CHINÊS


O rosto industrial da China é múltiplo, como já pudemos consta-tar. Aí
coexistem, com efeito, simultaneamente empresas arcaicas,cujo
equipamento, organização e gestão traduzem 20 ou 30 anos de atraso,
empresas de alto nível tecnológico que rivalizam com as dos países
desenvolvidos e toda uma gama intermédia, composta de em-presas mais
ou menos bem equipadas, organizadas e geridas.
As primeiras encontram-se sobretudo, mas não unicamente, no mundo
rural. Para além dos produtos agrícolas e alimentares evoca-dos mais
acima, estas empresas fabricam os produtos de consumo lios,ferramentas,
etc. São elas que fazem com que, doravante, meta-1989, 18 milhões de
empresas, que ocupam 100 milhões de pessoas à falência quando o crédito
se apertou, provocàndo aliás um gigan-igualmente o espírito
empreendedor dos chineses, desde que lhes dêem a oportunidade de se
exprimirem.
que provêm quer de sectores desenvolvidos no passado por razoes
192-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD
estrategicas,guer sectores di e rses pe e e ti e e
trangeiro

e e vocndo mais acima. Lembrare mo e


e e e e e s e s e e e e e e e mente aos pnas
em adaptada.A diversificação veio tambem da implantacão de est

coreanas, taiwanesas, bem como por chineses do ultramar e de


Hong-
-Kong.
Estes estabelecmentos instalaram-se geralmente em territórios Quatro foram
criadas em 1980 e uma quinta juntou-se-lhes em 1988Taiwan, portas pelas quais
passam capitais e produtos 2. Estas ZES lucros é nitidamente mais fraco do que
nos outros sítios. Os chineses fornecem o terreno e a mão-de-obra, os
investidores estrangeiros a tecnologia e os capitais, no quadro de joint-ventures.
Catorze cidades costeiras foram igualmente abertas aos investimentos
estrangeiros,bem como um certo número de zonas de exploração
económica(ZEE),mas com um estatuto menos favorável do que o das ZES.
De acordo com as autoridades chinesas, 25 000 empresas ter-se--iam
instalado nas ZES e os investimentos estrangeiros atingiram 72mil milhões $ no
total só no ano de 1995. É em parte graças a estas implantações que a indústria
chinesa se pôde diversificar e produzir os milhões de televisores, frigoríficos,
máquinas de lavar a roupa, a que nos referimos mais acima. Notaremos, no
entanto, que os produ-tos continuam a ser frequentemente medíocres, visto que
metade dos relógios e um quarto das bicicletas não teriam, por este motivo,
venda.
Entre os sectores arcaicos e os sectores modernos situa-se um le-que de
indústrias diversas mais ou menos modernizadas, mas que participam, também
elas, na diversidade do sector secundário.A China produção numa quinzena de
anos, mas os produtos continuam a ser riam por vender. Uma parte do material
é, com efeito, obsoleta: seria

2 Hong-Kong tornou-se ela própria uma destas ZES desde que foi integrada na China.

AASIA:UM TERCEIRO MUNDO BEM LANÇADO -193

194-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


preciso substituir os velhos fornos Martin por conversores a
osig e
A produçãode cimento

e e e eme e e gressão, mas com um certo abrandamento


no
e e a de ene de eeee e e eojectos.A produgio de
vefculo
e e e me a in estir, mas a produção de automóveisé dez vezes
inferios
à da França.
progride rapidamente ao mesmo tempo na diversidade, na tecnicidade

pelas suas importações de bens de equipamento (máquinas

diversas,mundial e de matérias-primas destinadas à indústria têxtil e

química.de diversos produtos de consumo corrente (em metal, em

borracha,em rotim, etc.), de produtos químicos, sem contar o petróleo.


No total, o comércio externo, que incide em 80% sobre produtos
destinados à indústria ou utilizados por esta, equivale agora a 20%do PNB e
representa 3% do comércio mundial (França 6%). À data, a China beneficia
de um saldo da sua balança comercial beneficiária em 10 mil milhões $.
Tornou-se o primeiro fornecedor de sapatos dos franceses (cerca de
sessenta milhões de pares). Apesar do afrouxa-mento devido às sequências
dos acontecimentos da Praça de Tie An Men, o comércio chinês conhece um
rápido crescimento. Passou da 36." posição no mundo, em 1979, para 10.a
em 1995. A China situa-se praticamente ao mesmo nível de Taiwan e da
Coreia do Sul, mas com uma população que não é evidentemente
comparável. Posiciona-se muito à frente da Índia, que não participa no
comércio mundial se-não com o equivalente a 9% do seu PIB.

5. ÍNDIA: O PIOR E O MELHOR

Embora a Índia tenha escolhido um modelo de desenvolvimento um


pouco diferent do da China, a sua estrutura industrial é afinal ao mesmo
tempo um importante sector público, baseado em podero-mitiu que
coexistissem estruturas de ponta, sectores arcaicos e toda
uma gama de sectores intermediários; cada ramo vê, lado a lado, em-
lam-se extremamente diversos.
Os sectores que ficaram mais arcaicos são, como na China, os IAA e as
indústriastêxteis.Encontramos aqui uma boa parte das PME que fornecem quatro
quintos dos empregos industriais indianos. Tra-xima do artesanato, fracamente
produtiva e usufruindo de uma re-fragmentada e esta fraca produtividade confinam-
na aos bens de con-Fortemente protegidas, as empresas deste sector têm a
vantagem de um emprego a um máximo de indianos. Uma boa parte de entre elas
(1300 000 de acordo com certas estimativas) pertenceriam ao sector informal e
forneceriam metade da produção total indiana [1]. Mas estes produtos fabricados
nestas empresas são geralmente de quali-dade muito medíocre e, portanto,
invendáveis nos mercados interna-cionais.
Ao lado deste vasto conjunto mal conhecido, a Índia dispõe, tanto no sector
público como no sector privado, de empresas de forte rendimento cujos produtos se
colocam nos mercados internacionais ou pelo menos nos mercados dos países em
vias de desenvolvimento, especialmente do Médio Oriente. Aliberalização da
economia, a partir de 1985, a abertura acrescida para o estrangeiro e a criação de
três zonas francas (entre as quais Bombaim e Madras) contribuíram para reforçar
estas empresas de elevado rendimento e para criar outras novas.
Vimos que a Índia se tornou uma potência a nível militar e civil,que lançou os seus
próprios satélites com os seus próprios foguetões.Ao lado de velhos modelos de
automóveis, datando por vezes de hácerca de quarenta anos, saem doravante
veículos modernos: camiões Tata, motorizadas Baja, automóveis Suzuki (baptizadas
aqui Maruti).Na sequência de um acordo com a France-Ébauches, a firma HMT
fabrica seis milhões de relógios por ano e Tata, por seu turno, dois milhões. A Índia
constrói computadores de todas as dimensões,má-quinas-ferramenta e 90% dos
medicamentos consumidos são ali fa-bricados. Nos sectores mais clássicos, a
produção indiana progrediu igualmente muito. A capacidade de refinação de
petróleo, ainda fraca nos meados dos anos 70, ultrapassa agora 50 milhões de
toneladas, e a produção de cimento e alumínio triplicou.

AÁSIA:UM TERCEIRO MUNDO BEM LANÇADO - 195


de futuro tais como a informática, a electrónica, as telecomunicaçoes
Tata,investem na Ásia do Sudeste (Indonésia, Tailândia) e em África geiras na
Ásia, no Médio Oriente e na Europa. A venda com chaves.nos países em vias
de desenvolvimento tornou-se uma especialidade indiana.
Tal como na China, toda uma gama de sectores se encontram em situação
intermédia, aliando à vez estabelecimentos arcaicos e fábri-cas modernas. É
este o caso, por exemplo, da siderurgia, onde coexis-tem simultaneamente
unidades antigas ou utilizando técnicas pouco rentáveis herdadas da
cooperação soviética, e estabelecimentos mais modernos. A Índia é hoje o
décimo produtor de aço do mundo, muito atrás da China na verdade,
enquanto por volta de 1950 os dois países se situavam ao mesmo nível.
Em suma, a Índia, à semelhança de Tata, sabe fabricar tudo,dos foguetões
aos cosméticos, dos aviões às panelas mas, salvo excepção,ainda não sabe, ou
antes ainda não pode vender muito ao exterior.Ela situa-se na cauda do
pelotão, entre os países industrializados da Ásia, para a exportação de
produtos manufacturados. Como os capi-tais estrangeiros hesitam a aí
investirem (aproximadamente mil mi-lhões de $ de investimento em 1995),
apesar das propostas que lhe são feitas (controlo possível de uma empresa até
40%), a Índia, salvo mudança brutal de política, continuará a reforçar o seu
lugar de NPI, mas ao seu ritmo e contando mais com o seu mercado interno
do que com o mercado internacional.

6.E ALGUNS OUTROS...

Os dois gigantes asiáticos não são os únicos, como sabemos, a in-


dustrializarem-se. Todos os Estados com mais de 100 milhões de ha-bitantes, à
excepção do Bangladesh, encetaram há mais ou menos tempo um processo
de industrialização.
A Indonésia é frequentemente considerada como um dragão em leo, gás,
bauxite, etc.) e beneficiando, como se sabe, da cuidada aten-trializou-se
rapidamente desde há cerca de vinte anos. As indústrias

196 -ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD

AÁSIA:UM TERCEIRO MUNDO BEM LANÇADO - 197


veram-se prioritariamente relinacao de petrole e epe
eee
-

e e e e e nho (2.° produtor mundial), de aco, de borma i i


Mas a
e r a es essen iais,o fraco custo da sua mão-de-obra. Os
capitais

nais participam igualmente nesta industrialização. O grupo


Nurtiano,
por exemplo,

capitais do Estado, a poupança apenas permite investimentos mo-

cada três trabalhariam nas «cottages industries», mas forneceriam


apenas 13% do PNB [11].
O sucesso do Paquistão é menos evidente. A indústria era quase
inexistente em 1947 e, tal como noutras lugares, começou por se de-
senvolver primeiro nos sectores do têxtil e do agro-alimentar.A indústria
pesada, essencialmente a siderurgia de Karachi, chegou mais tardiamente,
bem como as refinarias de petróleo e a central nuclear. Mas, na sequência
da política de liberalismo económico do general Zia, de B. Bhutto e do seu
sucessor que, em seis meses privatizou 160 empresas de Estado, a
industrialização acelerou-se.Empresas coreanas transferiram para aqui
algumas das suas indús-trias que trabalhavam o têxtil e o couro. Os
japoneses têm projectos de montagem de automóveis. O tecido industrial
diversifica-se e ro-bustece-se: desde 1980, a produção industrial cresceu ao
ritmo de 7 a 8%,mas abrandou nestes últimos anos.
A situação paquistanesa continua no entanto frágil. O país sofreu as
consequências negativas da guerra do Golfo (2 mil milhões $ que deixaram
de ser ganhos na sequência do regresso de 100 000 emi-grantes) e está
altamente endividado. A situação política é incerta,nomeadamente devido
aos islamitas que pedem a interdição do em-mais evidente para o
Bangladesh, cujos sucessos na indústria textil e mentos dos quatro dragões,
sendo contudo os outros sectores indus-
É entre os países de menor dimensão que seria preciso ir
buscar suficiente, mais acima, os dos dragoes em potência que
sāo a Tailândia tar ao assunto. Contentar-nos-emos em
acrescentar que o Sri Lanka
Pondica a sua independencia,estivesse regulado, Com efeito,embora
momento da guerra do Golfo, a indústria desenvolveu-ie a ur
precocemente.A indústria do têxtil-vestuário, em particular, conhe ceu uma
explosão extraordinária.
A indústria de outros paísesfoi,em contrapartida sinistrada an
trita de planificações autoritárias e por guerras exteriores ou
inter.muito pouco industrializdos ou dotados de indústrias
completamente para o exterior em curso poderiam conduzir a uma
recuperação, como por exemplo no Vietname.
Com efeito,conquanto as opiniões estejam divididas, alguns não hesitam
em ver no Vietname um futuro dragão, graças à sua posição vantajosa no
Sudeste asiático, ao seu petróleo e ao seu gás natural que lhe asseguram uma
autonomia energética, a um mercado de 70milhões de pessoas e à qualidade
da sua mão-de-obra (trabalho,disci-plina, adaptabilidade, criatividade e
baixos salários...). Verificámos,nos Estados Unidos, que bastam dois anos para
que o rendimento de um vietnamita supere o de um americano médio e que
os estudantes deste país monopolizam os lugares de honra nas
universidades.A data, japoneses, franceses (Total, Indosuez, Alcatel e outros),
aus-tralianos, chineses, americanos e dragões investem no Vietname ou
preparam-se para o fazer, quer na prospecção petrolífera e nos IAA quer na
indústria de transformação, nomeadamente a farmácia. Entre 1985 e 1995, a
produção industrial mais do que duplicou e, em cinco anos, 350 000
empresas, nem todas industriais, evidentemente,fo-ram criadas. O presente
continua todavia, difícil, em particular para as empresas de Estado que,
embora tenham obtido uma certa auto-nomia, estão mais de metade delas
em dificuldade.
Contando com as qualidades da sua mão-de-obra e do seu baixo custo,
com o dinamismo dos empresários locais atordoados pela liberalização
económica e acolhendo os capitais exteriores,a maior parte dos países da
Ásia estão a industrializar-se, cada um à sua ma-delinear-se: no Japão, as
altas tecnologias, nos NPI os bens duradou-gres e dragōes rugirão pois sem
cessar mais alto às nossas fronteiras.

198-ROBERT CHAPUIS/ THIERRY BROSSARD


ainda na infância, sobretudo nos países comunistas ou que ficaram
marcados por este sistema.

C)UM SECTOR TERCIÁRIO MUITO DEFICIENTE


O sector terciário aparece, até agora, como o parente pobre da economia
asiática. Ocupa um escasso quarto dos activos (22%), ou aos outros Terceiros
Mundos, a Ásia encontra-se muito longe da América Latina ou do mundo árabe-
muçulmano (aproximadamente duas vezes menos) e ao nível da África. O peso do
sector terciário no PNB atinge apenas 35%, quer dizer menos, uma vez mais, do que
nos dois Terceiros Mundos mais desenvolvidos e praticamente em igual-dade com a
África.
O fenómeno é geral. Por todo o lado, excepto na Malásia e nas Filipinas,
comércios e serviços empregam menos de um terço dos activos e esta proporção cai
mesmo para 26% na península indochi-nesa (mapa 8). O seu peso não ultrapassa, e
por pouco, metade do PNB a não ser na Tailândia. Na Índia, na Indonésia, é de 40% e
desce a 28% na China e na Birmânia (mapa 9).
É aparentemente uma verdade de La Palice afirmar que é a enor-midade do
sector agrícola que limita a posição dos outros dois secto-res, e especialmente a do
terciário. Já não será tanto assim se nos lembrarmos que a agricultura é também um
sector que induz geral-mente menos serviços do que os outros, muito menos aqui
que, ape-sar de incontestáveis progressos, esta actividade se conserva ainda
tradicional e até bastante autárcica. A montante desta agricultura (comércio de
fertilizantes, fungicidas, pesticidas, materiais, máqui-nas, etc.) criam-se poucos
empregos, da mesma forma que a jusante (marketing,venda transportes). Os
produtos não consumidos na ex-ploração são geralmente vendidos pelo próprio
camponês nos merca-tam pelos circuitos regionais, nacionais ou internacionais, logo
criadores de empregos induzidos.
A própria indústria, geralmente grnde criadora de empregos deste que ela é, em
parte, nomeadamente na China e na Índia, mais semi-induz pois menos empregos
do que nos países desenvolvidos.

AÁSIA: UM TERCEIRO MUNDO BEM LANÇADO - 199

200 -ROBERT CHAPUIS/THIERRYBROSSARD


dos mais pequenos, quase não favoreceram o desenvolvimento do
see.indochinesa) onde o terciário durante muito tempo foi considerado
volvimento do comércio e dos serviços, fora do enquadramento
político.dilatar o sector terciário destes países como acontece no Vietname
mente, o sistema de planificação rígida da indústria teve de contri.noutras
partes, uma larga parte do comércio e dos serviços (vendedo-res e
revendedores, prestatários de serviços pessoais, etc.) escapa àestatística e
logo a cifra real é certamente superior.
O que é certo é que os serviços de alto nível, como a banca, os seguros, a
Bolsa, o marketing, o conselho, a investigação são parti-cularmente
deficientes. Não que estes serviços não existam. Temos numerosos exemplos
deles. A Índia, segundo Cl. Albagli, seria o ter-ceiro cérebro do mundo, uma
sociedade como Tata intervém ao mesmo tempo na banca, nos seguros e no
marketing [1]. As Filipinas seguem-lhe o rasto e o mercado bolsista de
Manila ganha extensão.Os pequenos dragões sucedem-nos, tal como o Sri
Lanka com a Bolsa de Colombo. Apesar disso, estas actividades continuam a
ser modes-tas relativamente ao peso económico da Ásia.
,O sector dos transportes é também ele geralmente deficiente. As re-des
modernas de comunicação continuam escassas, senão inexistentes, e só
admitem uma circulação lenta. A China, com uma superficie equiva-lente a
17 vezes a França, dispõe de uma rede ferroviária apenas duas vezes mais
longa e de um rede rodoviária de um comprimento ligeira-mente superior,
na qual a circulação automóvel é modesta dado que se dispõe apenas de um
automóvel por cada 430 pessoas. A maior parte dos países da Ásia estão
menos bem ou pouco mais bem favorecidos (mapa 10). Apenas emergem as
Filipinas, o Sri Lanka, a Tailândia e sobretudo a Índia onde os ingleses
deixaram uma infra-estrutura ferroviária e ro-doviária que fazem dela um
dos países mais bem providos da Ásia: den-mais elevada, parque automóvel
duas vezes mais importante do que a relativos se os compararmos aos dos
países desenvolvidos de grande di-seja medíocre, é duas vezes mais densa
do que na Índia.

AÁSIA: UM TERCEIRO MUNDO BEM LANÇADO - 201


O turismo permanece, salvo excepções, como o parente pobre das da França. O
afastamento dos principais pólos de emissão de turistas comunistas viverem quase
fechados (apesar de uma melhoria recente)lizados fluxos à altura das
potencialidades da Ásia: civilizações pres-melhorou, e continua a fazê-lo
rapidamente, pois determinados Es-tados vêem no turismo um apreciável meio de
angariar divisas: a China recebeu 23 milhões de turistas (sobretudo chineses da
diáspora) em 1995 (França: 60).
Não obstante, o atraso asiático continua patente. Só quatro paí-ses atingem
receitas turísticas de mais de mil milhões de $ por ano: a Indonésia, a Malásia e a
China (entre 3 e 5 mil milhões), mas o turis-mo só detém um lugar honroso na
economia nacional na Tailândia,onde as receitas atingem 6 mil milhões $, ou seja
4% do PNB. Único grande país verdadeiramente equipado para receber
satisfatoriamente um turismo de massa, aproveita a fundo a atracção ao mesmo
tempo cultural e sexual que exerce sobre os ocidentais e os japoneses. Mas a sida
deixa pairar uma ameaça séria sobre uma parte pelo menos desta actividade. Não
deixam de haver imensas jazidas turísticas que per-manecem pouco utilizadas na
China, na Índia, na Indonésia, nas Fi-lipinas e noutros países. Não temos dúvidas de
que o serão um dia.
Consideráveis mutações esperam ainda estes países da Ásia no que respeita ao
sector terciário, na sequência da modernização e do esvaziamento dos efectivos da
sua agricultura e da diversificação da sua indústria, evoluções que são garantias de
crescimento do seu comércio e dos seus serviços. Tanto mais que eles conhecem
geral-mente um crescimento e uma solidez que os outros Terceiros Mun-dos lhes
podem invejar.

D)SOLIDEZ ESTRUTURAL E CRESCIMENTO ECONÓMICO

A solidez económica da Ásia pode ser apreciada através de três critérios: a


inflação, o endividamento e as exportações. Apesar de pe-conhece as taxas de
inflação vertiginosas que sofreram certos países 20% desceu para os15%. Na Índia,
a taxa oscilou muito tempo entre

202-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


Indonésia,no Bangladesh, no Paquistão, na Tailándia e
nas Filipi
nava por volta dos 700% em 1988, cai-se para
aproximadamente 15%.
abaixo dos 10%,
prova de que aí se evitou os excessos da América Latina.

ainda pouco endividada. As qualidades de poupança dos asiáticos e


temente com o autofinanciamento para assegurarem o seu desenvol-sem
fazer apelo maciço ao empréstimo estrangeiro, fosse ele público ou privado.
Esta abertura para o exterior, que se tornou necessária devido à escolha de
uma industrialização voltada para a exportação,orientou o desenvolvimento
para indústrias de mão-de-obra menos capitalísticas, logo exigindo, pelo
menos à partida, investimentos menos pesados. Por outro lado, os asiáticos
geralmente evitaram lan-çar-se em projectos industriais colossais, para se
dotarem de uma in-dústria pesada por exemplo. A moda das indústrias
industrializantes durou aí menos tempo do que nos outros Terceiros
Mundos.
Enfim,à semelhança da China, a Ásia quis geralmente «cami-nhar com as
suas duas pernas», ou seja, quis conservar uma base agrícola forte, ao
mesmo tempo que se industrializava. O caso da Indonésia é, relativamente a
estè assunto, esclarecedor. Enquanto se negligenciavam os investimentos
agrícolas na maior parte dos países petrolíferos, tanto no Irão como no
Iraque, no México como na Nigéria,a Indonésia deu sempre uma prioridade
à agricultura. Ela sofreu pois menos com os choques petrolíferos, endividou-
se menos e pode adquirir a sua auto-suficiência em arroz, enquanto noutros
países a dependência alimentar se agravou e o buraco da dívida se tornou
mais profundo.
No total, entre os doze países em vias de desenvolvimento mais
endividados em 1995, três são asiáticos: a Índia (96 mil milhões $), a
Indonésia (102 mil milhões $), a China (110 mil milhões $). A dívida PNB,
contra 56% na América Latina e 137% na África Subsariana.
competividade de primeira ordem. Viu sucessivamente elevarem-se nos
anos 50-60, depois os dragões desde os meados dos anos 60, atéao

AÁSIA: UM TERCEIRO MUNDO BEM LANÇADO - 203


-bebés. É verdade que a balança comercial dos países asiáticos tem vada pelas
importações de petróleo, às quais a maior parte dos países to. Por exemplo, um
terço das importações da China, da Indonésia,mentos industriais e de
transporte,necessários à industrialização.duplicou entre 1970 e 1990 (alcança
agora 80%), triplicou na Tailândia (75% actualmente) e passou de 2 a 50 % na
Indonésia; para o conjunto da Ásia do Sudeste passou-se de 27 a 65%, sinal de um
aumento con-siderável da competitividade.
Nestas condições, não é surpreendente ter sido a Ásia a ter conhe-cido, de
todos os Terceiros Mundos, o crescimento mais rápido desde os meados dos anos
60. Com efeito se, entre 1965 e 1980, o cresci-mento do seu PIB segue pouco mais
ou menos o mesmo ritmo que o dos Terceiros Mundos (6 a 7% ao ano), à excepção
da África que já ia ficando para trás, desde esta data manteve este ritmo,
enquanto nou-tros lados o crescimento caía bruscamente para passar a 1 ou 3 %
ao ano apenas a partir dos anos 80. E esta diferença corre o risco de se agravar.
Com efeito, caso as projecções a longo prazo se realizem, o Banco Mundial prevê
que a Ásia (incluindo os dragões, deveria quase decuplicar o seu PNB daqui até ao
ano 2030, enquanto o da América Latina e do mundo árabe-muçulmano deveria
quintuplicar ou sextuplicar e o da África sariana mal duplicar [5].
A evolução do PNB por habitante é evidentemente menos favorá-vel, mas
prevê-se na mesma um crescimento de 5% ao ano, contra 2,2na América Latina,
1,6 no mundo árabe-muçulmano e uma quase estagnação em África. O
rendimento deveria duplicar daqui até 2030,sem no entanto apanhar o da América
Latina e do mundo árabe--muçulmano cujo avanço é muito considerável, mas em
contrapartida nitidamente ultrapassar o da África que estagnaria. A Ásia tem pois
um futuro, enquanto a África não o tem, pelo menos a médio prazo.ria eram os
dois símbolos associados a uma Ásia em relação ao futuro subpovoada, rica em
recursos naturais inexplorados, um futuro muito mais sorridente.
os grandes, à excepção do Bangladesh, estāo a ser bem sucedidos, em
graus diversos, na passagem de uma sociedade agricola
tradicional a e e portacaoepara «o controlo da modernizacão da
agricultura edo o êxodo rural em proporção das capacidades de
acolhimento das cida.des e o emprego das indústrias» [16].
A que se deve este sucesso? Porque é que aÁsia,densamente po-
trito,está a ser bem sucedida onde a Africa falhou e onde os outros
questāo,como é óbvio,à qual só podemos fornecer alguns elementos de
resposta.

IV. VELHAS CIVILIZAÇOES EVOLUTIVAS


Este sucesso parece dever-se a três factores maiores: estruturas de
enquadramento sólidas, no sentido em que o entende P.Gourou,a
existência de grupos dinâmicos e a situação numa área dinami-zada
primeiro pea presença do Japão e, em seguida, pelos quatro dragões.

A) ESTRUTURAS DE ENQUADRAMENTO SÓLIDAS


Estas estruturas apareceram e reforçaram-se no quadro de uma
verdadeira civilização do arroz, e cristalizaram-se no âmbito de Esta-dos as
mais das vezes antigos, por vezes recentes, mas geralmente sólidos.

1.UMA CIVILIZAÇÃO DO ARROZ

Pode-se falar, com efeito, de uma verdadeira civilização do


arroz,difundiu-se para o Japão, para os grandes deltas da península
mente.se sublinhou, «o arroz exige a cooperação: trabalho em entreajuda
nos períodos de ponta (repicagem, ceifa) que facilita a flexibilidade do
calendário dos trabalhos»[11].

204-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD

AÁSIA:UM TERCEIRO MUNDO BEM LANÇADO - 205


rez que a China do
Norte e do Leste
escaparam , m a
des colectivas, de
disciplina,de
obediencia de e
partilhados e
devem
certamente muito
a hábios
milenares.As
fortee rigada do
206-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD
arroz (é preciso
três vezes mais
trabalho para um
hectare hábitos
colectivos. Pode-
se pois pensar
que um certo
número destas
gas horas de
trabalho por um
baixo salário.
Esta iniciativa pôde bloquear as iniciativas em certos momen-China entre
os séculos xve xix, ou quando os colonizadores contri-buíam para o bloqueio
social e económico. Mas a Ásia soube evoluir e inventar em determinadas
épocas. A repicagem do arroz é intro-duzida por volta do ano mil, em seguida

206-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


a importação de um arroz precoce de Annam permite fazer duas colheitas no
ano e multiplica pois as potencialidades alimentares [11]. São emigrantes
chineses que introduzem a cana-de-açúcar nas Filipinas, em Java. A Ásia
inventa a bússola, a imprensa, o papel, etc. Após a Segunda Guerra Mundial,a
libertação controlada da iniciativa privada vai permitir o crescimento e a
diversificação económica dos quatro dragões e,em seguida, de países como a
Malásia, a Tailândia, a Indonésia, a Índia, enfim,a China.
A Ásia soube pois ao mesmo tempo conservar a sua cultura, as suas
tradições e usá-las na competição internacional, ao mesmo tempo
assimilando e utilizando a tecnologia ocidental. Soube industriali-zar-se, uma
vez mais timidamente, conservando uma agricultura só-desenfreadamente.
Com 27% de citadinos apenas, a Ásia está muito mano (56%); mesmo a África
é mais urbanizada. Entre os países com taxa de urbanização superior a 50%
(mapa 28). A rede urbana éTailandia, onde Banguecoque se desenvolve de
uma forma especta-e ene eae mo angai,Pequim,Calutá, Jacarta,Tiansin); uma
dezena

206-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


modesto visto as massas em presença.
movimento,mas Xangai e Pequim, que se pensava poderem ultra.girão. A
Ásia vai conservar por muito tempo ainda densas populações rais continua a
aumentar. Com efeito, entre 1965 e 1985, a população em 110,na Indonésia
e no Paquistão em cerca de trinta milhões cada ao ano. O êxodo rural é pois
aqui, mais do que em qualquer outra parte ainda,necessário nestes países
em que a exploração agrícola éna maioria das vezes minúscula.

2.ESTADOS SÓLIDOS

Nas estruturas de enquadramento, os Estados ocupam um lugar


essencial.Ora constata-se que alguns deles são os mais antigos do mundo.
Estamos a pensar na China, evidentemente, mas também na Coreia,
unificada a partir do século vII, e na Tailândia. Os outros,embora com
frequência provenientes da descolonização, conseguiram conservar a sua
unidade e a estabilidade das suas fronteiras, como a Indonésia e as Filipinas,
a Malásia, a Birmânia, embora por vezes com dificuldade (secessão de
Singapura na Malásia, guerrilhas locais noutros sítios). Uma grande excepção,
todavia, a Índia.
Este país, que havia conhecido unicamente alguns séculos de uni-dade
sob o domínio dos Maurias, dos Guptas e dos Mongóis, e em limites
variáveis, vai ver esta unidade realizar-se sob a autoridade férrea dos ingleses
que os dotam de uma administração, uma armada e uma rede de vias de
comunicação. Esta unidade reencontrada não vai resistir à independência,
uma vez que em 1947 o Paquistāo islâmico Lanka e, em 1971, o do
Bangladesh que deixa o Paquistão, sem contar de fronteira são permanentes
entre a Índia e o Paquistão a propósito do Caxemira.
independentistas agitaram ou agitam o Assam, o Caxemira e °

AASIA:UM TERCEIRO MUNDO BEM LANÇADO-207


Punjabe,do qual os Sikhs querem fazer um Calistão independente.tencáo
o coracáo do prGprio país. As tendéncias autonomistan dos tram entre
os mais populosos do planeta: o Uttar Pradesh, corn os Bihar (cerca de
100 milhões)é tanto como o México; o Maharashtra e A todos estes
factores de divisão é preciso acrescer a multiplícidade das línguas, das
religiões, etc.
E, no entanto, a Índia mantém a sua unídade graças a uma admi-des
partidos nacionais como o Congresso, aínda que este esteja a
emjogo,contribui para os neutralizar e as novas gerações, mais aber-tas
para o exterior, são talvez menos sensíveis aos problemas inter-nos[24].
Um pouco por toda a Ásia, mas sobretudo no Norte marcado pelo
pensamento confucionista,reinam os Estados fortes,frequentemente
muito autoritários (Bangladesh, Indonésia, Tailândia) ou mesmo fran-
camente despóticos (Birmânia), sem contar os países comunistas,em
que o partido único é ainda a regra, apesar da liberalização econó-mica
(China, Península Indochinesa). Somente a Índia, o Paquistão,as Filipinas,
e a Malásia jogam, em graus de resto diversos, o jogo da democracia.
Quase por todo o lado o Estado interveio fortemente na economia.
Nos países comunistas, como sabemos, o Estado tentou controlar o
essencial, senão a totalidade da economia e só recentemente aliviou a
pressão, como na China, onde «o socialismo de mercado» deixa um
lugar à iniciativa dos indivíduos e das empresas. Mesmo nos países não
comunistas, o Estado quis dirigir ou pelo menos controlar a ecO-quis
escolher uma via de desenvolvimento indiana, quer dizer, uma ção
indicativa ou incitativa à ocidental. Um sector público
poderoso,essenciais foi implementado, enquanto o sector privado era
estreita-

que foi objecto de uma reforma


agrária modesta.eob regimes
muito diferentes, Na Indonésia,
o autoritarismo estatal
durante cerca de trinta anos com Sukarno primeiro e, em seguida,
aMalásia for-
necem outros exemplos de uma certo comando do Estado sobre a

economia.

A diminuição do controlo do Estado na economia mostra os limi-


continuidade do poder tiveram alguns efeitos negativos (liberdades
desempenharam, nos períodos sempre difíceis de arranque, um pa-
contrasta aí com as mudanças frequentemente violentas que afecta-ram
a América Latina. A liberalização económica, que vai permitir às energias
exprimirem-se, deveria poder realizar-se sem explosão do quadro
político,como acontece na China.

B) O DINAMISMO DE CERTOS GRUPOS


Certos grupos, frequentemente minorias religiosas e étnicas, ha-viam-se
manifestado pelo seu dinamismo muito antes da liberalização económica, nos
locais onde tinham subsistido espaços de liberalismo.Na Índia são os Parsis,
descendentes de Persas de religião masdeísta que, tal como a família Tata,
contribuíram para lançar a indústria indiana antes de esta ser tomada em mãos
pelo Estado; mas também os Sikhs, os Jaines, os Gujaratis se lançaram na aventura
comercial e industrial. Menos dependentes do sistema das castas que parece um
freio à mobilidade social (embora esta ideia seja controversa), crendo noutros
valores que não os do hinduísmo que parece conduzir a uma certa passividade
social (outra ideia também ela controversa...), es-tas minorias conseguiram
penetrações económicas e sociais mais ou menos espectaculares e mais ou menos
espalhafatosas.
O caso da diáspora chinesa é ainda mais sintomático. Depois de se ter
disseminado em três vagas sucessivas (xIv, xvī e nos anos 30), os chineses são hoje
cerca de vinte milhões a estarem instalados na Ásia (dentre os quais 18 no Sudeste
asiático), sem contar todos aqueles que, fora da China continental, estão
implantados em territórios off-À excepção da Malásia, onde formam um terço da
população, eles são menos de 2% nas Filipinas e na Birmânia), mas o seupeso
económico

208-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


náo tem relaçāo com o seu número (6% da população do Sudeste
asiático).
Desde os séculos xvI e XVII, eles criam fora da China plantações cinturas
hortifrutícolas em redor das grandes cidades, exploram o Actualmente,controlam
pelo menos metade das empresas priva-
Singapura.NaTailândia, detêm o essencial do sector privado (e no-meadamente o
Bangkok Bank) e «monopolizam a maioria dos luga-Indonésia como nas Filipinas,
souberam aproveitar «o proteccionismo,vado filipino resistiu melhor a estes
assaltos do que o indonésio, que dos em rede na base do seu lugar de origem:
«Um sólido tecido transnacional foi criado na base do eixo Hoquien (província do
Fujian)na zona de Singapura-Malásia-Indonésia, que beneficia igualmente de
contactos privilegiados com certos grupos taiwaneses.» Um outro eixo hoquien
liga as Filipinas e o Taiwan. Estes hoquiens controlam a borracha, o comércio
grossista e o sector bancário na Malásia. Os Teochew, vindos de Guangdong, estão
sobretudo instalados na Tailândia, no Vietname e no Camboja onde detêm o
sector alimentar e controlam o Bangkok Bank. Quanto aos cantoneses,
«concentra-ram-se no comércio de retalho, vestuário, jóias, artesanato, restaura-
ção»(ibid.).
O seu peso económico e o seu hábito de viverem em circuto fe-chado
contribuíram para atitudes de rejeição por parte das popula-ções e das
autoridades locais. Na Malásia, foram tomadas medidas para favorecer o acesso
dos autóctones (os «bumiputras», o que signi-fica os filhos do sol) aos comandos
económicos, em detrimento dos chineses considerados demasiado influentes; a
«nova política econó-mica» visa reduzir a parcela do capital chinês nas empresas
privadas a 40% do total. Na Indonésia, onde se estima que os chineses detêm dois
terços das actividades económicas privadas, as autoridades ten-tam proteger as
indústrias autóctones e ajudá-las concedendo-lhes facilidades bancárias ou dando-
lhes a prioridade para participações tamente trabalho a 130 000 pessoas que
tanto trabalham na Indonésia prova do dinamismo desta diáspora chinesa e um
exemplo, entre

AÁSIA: UM TERCEIRO MUNDO BEM LANÇADO - 209


muitos outros, da rede de laços que unem doravante a quase totali-
dade dos países asiáticos.

C) UMA ESFERA DE CO-PROSPERIDADE

No período entre as duas guerras, os japoneses haviam começado talhar


pacificamente ou pela força, um verdadeiro império na Ásia do Nordeste
(Manchúria, Coreia) e do Sudeste (Taiwan). Beneficindo então de um a priori
extremamente favorável no Sudeste asiático,dizem querer criar «uma esfera de co-
prosperidade», centrada no Japão industrial e reunindo o resto da Ásia [11].
A guerra vai permitir-lhes realizar pelo menos o Império, senão a co-
prosperidade... De 1941 a 1942, os japoneses ocupam sucessiva-mente a
Malásia, Hong-Kong, as Filipinas, Singapura, as Índias neerlandesas. A derrota
fá-los perder tudo. A paz vai permitir-lhes recomeçar, embora de outra forma,
a realização desta esfera de co-prosperidade. Erguido das suas ruínas, o Japão
vai partir de novo à conquista, económica desta vez, da Ásia.
As testas de ponte são primeiro Hong-Kong e Singapura, que os capitais
japoneses contribuem para industrializar, depois a Coreia do Sul e Taiwan. Veio a
seguir a vez da Malásia, das Filipinas, da Tailândia e da Indonésia, onde os dragões
investem por seu turno. Quando a China, a partir de 1979, e seguidamente a Índia se
abrem, dragões e japoneses aí se arriscam, por vezes ainda com pezinhos de lã,
como o Japão na China, pelo menos até ao presente. Alongam agora a vista pelo
Vietname, que liberaliza a sua economia, em breve pelo Laus e pelo Camboja,
quando a paz aí tiver totalmente regressado.
Foi assim que se teceu,na Ásia, e especialmente no Sudeste asiático,uma meada
muito entrelaçada de relações, meada cujos fios mais sóli-dos são os que o Japão
soldou um pouco por todo o lado, da China àIndonésia e nas Filipinas. Mas ele é
seguido de muito perto pelos dra-gões e por vezes ultrapassado, como na China,por
Hong-Kong.
O exemplo da Tailândia é demonstrativo. Os investimentos japo-neses
representam aí só eles perto de metade do total; Singapura vem em 4.° lugar atrás
dos Estados Unidos e do Reino Unido. Mas reconhece-se aqui igualmente
investimentos malaios, indianos,filipinos.
O exemplo da Tailândia não é isolado. As firmas japonesas parti-cipam, atrás de
Singapura, na implantação de indústrias (petroquí-mica, electrónica, têxteis) e de
serviços na zona franca criada pela

210-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


Indonésia na ilha de Batao, ao largo de Singapura (Le Monde,7.05.1)e e e
Japáo (..) que englobaria o Extremo Oriensa fachada ocidentall do
Japāo»(Monde diplomatique,07.91).

on se da Coreia do sul e do dapao mas a 'Tailândia que «se conside.

(espera que)

Indochina se torne um prolongamento da sua econo-


mia interna»(ibid.).O Japão esteve muito tempo menos bem im-

çāo japonesa entre 1941 e 1944. Mas os laços foram oficialmente

dos investimentos estrangeiros são agora japoneses.


De forma mais subtil, mas mais eficaz ainda a prazo, o Japão in-tervém na formação
das elites asiáticas. Em 1991, mais de 70 000estudantes asiáticos frequentavam uma
formação no Japão, entre os quais mais de metade em escolas especializadas. Prevêem-
se 100 000ou mais por volta do ano 2000. Os mais numerosos são os chineses (metade),
em seguida os coreanos do Sul e os malaios, todos mais ou menos incentivados pelo seu
governo a irem frequentar estudos no arquipélago. Estes estudantes são depois as mais
das vezes recruta-dos pelos japoneses para povoarem as suas filiais asiáticas e servem
de intermediários para assegurarem seguidamente a promoção do ensino que
receberam (Monde diplomatique, 01.91).
A mundialização da economia passou portanto muito, pelo menos para os países que
nos interessam aqui, por uma regionalização em que o Japão continua a ser, sem
contestação, o líder. Mas os dragões podem fazer frente localmente e os países mais
activos (Tailândia,Malásia) ou os mais importantes (Índia, China) começam a deter uma
certa posição. Esta 《 fertilização cruzada», para retomar uma expres-são na moda, é
provavelmente um dos mais sérios trunfos da econo-mia asiática.

mias mais do que entre os Estados. Fora da ASEAN (Associação das

multilateral foi criada. E quando, em 1991, o primeiro-ministro malaio

Comum Europeu, a tentativa falhou, sob a pressão, é verdade, dos gionais

que são mais visíveis aqui do que noutros Terceiros Mundos.

AÁSIA: UM TERCEIRO MUNDO BEM LANÇADO - 211

212-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


V. A CHINA, A ÍNDIA E OS OUTROS...
fosse porque os seus dois gigantes, que pesam só eles mais de dois de
desenvolvimento. Sem embargo, existem diferenças,que podem lidades
diversas, a uma marca histórica particular, a uma abertura ou menos forte,
etc. Nalguns casos, mas que incidem sobre Estados relativamente pequenos,
os desvios à média já não poderão ser consi-derados como matizes. Assinalá-
los-emos oportunamente.
Três grandes áreas podem ser reconhecidas na Ásia, que correspondem,
pelo menos em parte, a áreas culturais. Seguindo F. Godement,
distinguiremos «uma Ásia continental, rural e marcada pela tradição do
confucionismo de Estado: é a China (...), a Coreia do Norte« [24] às quais
juntaremos, na nossa análise, a Mongólia,de cultura diferente, mas também
ela marcada pelo comunismo.A segunda área é a da «Ásia indo-muçulmana»,
reunindo, em torno da Índia e do Paquistão, o Bangladesh, o Sri Lanka e os
Estados himalaios, mais particularistas. A estes acrescentaremos o Afega-
nistão, culturalmente próximo ao mesmo tempo do Médio Oriente e do
Paquistão, mas que o seu nível de vida liga mais ao segundo do que ao
primeiro. Enfim, a terceira grande área é formada por uma Ásia do Sudeste
insular e peninsular, onde o islão e o hinduísmo se encontram, mas que uma
tradição de abertura para o mundo ou que circunstâncias políticas recentes
estão a fazer descolar econo-micamente.
Colocámos à parte quatro Estados, para fazer deles uma área de
Birmânia, marcados como a China pela tradição burocrática do
confucionismo de Estado mas onde «comunismo ou socialismo au-toritários
redobraram o efeito das tradições autárcicas», bem como do Camboja ou do
Laos que são «marcados pelo hinduísmo e pelo budismo e onde o Estado é
essencialmente uma criação colonial,não obstante os precedentes
monárquicos» [24]. Estes quatro Esta-dos,traumatizados pelo comunismo e
pela guerra exterior ou civil são postos de parte por ora, mas não há dúvidas
de que um retorno ção rápida do seu atraso e uma reintegração na sua área
cultural normal.

AASIA:UM TERCEIRO MUNDO BEM LANÇADO-213


A.e e es ECONOMICOS E CONTRASTES SOCIAIS ÁREA
INDIANA EÁREA CHINESA:

o Mundo indiano, 110 no Munds ta

damente420mil milhões $ para o primeiro e 800 para o segundo

Portodo o lado,

mens trabalha ainda a terra (ronda os 60% da população activa)

chinesa, simultaneamente pelo seu lugar no emprego (16% contra

maior no mundo indiano do que no mundo chinês.


É evidentemente a consequência de escolhas de desenvolvimen-China,
Coreia do Norte e Mongólia haviam escolhido uma via colectivista
estrita,quase não deixando espaço ao sector privado, inteiramente feita em
torno da produção agrícola e industrial e limitando as tro-cas. A via indiana
do socialismo e as vias escolhidas pela maior parte dos Estados vizinhos
deixava pelo contrário um espaço à empresa privada, particularmente no
sector terciário, o que permitiu a este senão expandir-se, pelo menos
crescer regularmente. A liberalização em curso na área chinesa, tal como na
área indiana aumenta rapida-mente comércios e serviços.
Em compensação, o sector industrial pesa mais no mundo chinês do que
no mundo indiano, tanto pela mão-de-obra empregada (21contra 15%)
como pelo lugar no PNB (48 contra 26%). Deve ver-se aqui o resultado dos
esforços de industrialização realizados em cir-cuito fechado na época
comunista ortodoxa,e seguidamente em circuito aberto desde, os anos 80.
O consumo de energia é três vezes perdício seja mais elevado na primeira
do que na segunda. E, se a go, a intensividade da agricultura é muito
superior no mundo chinês crescimento do PIB, já a favor da área chinesa
entre 1965e 1980uma vez que o crescimento é aí agora igual a duas vezes
pelo menos o do mundo indiano.

AASIA: UM TERCEIRO MUNDO BEMLANCADO-215


Sem embargo, as diferenças entre os dois mundos devem-se afi-nos
ativermos estritamente ao ponto de vista do PNB/habitante, os um pouco mais
bem dotado (cerca de 610$ contra 350). Se utilizar-mos o instrumento mais
fiável do PIB real, a classificação confirma--se: o mundo chinês passa a 2340$
contra 1360 no mundo indiano.Os outros critérios confirmam um certo avanço
do primeiro sobre o se-gundo: os alfabetos são aí mais numerosos, os jovens
mais escola-rizados no primário e no secundário, o enquadramento médico
mais denso, a mortalidade infantil menos elevada, a alimentação mais bem
assegurada. O mundo indiano só vem à cabeça no que toca ao número de
automóveis por habitante, à densidade da rede rodoviária e à per-centagem de
estudantes nas universidades.
A demografīa revela diferenças significativas. Enquanto o mundo chinês está
na última fase da transição demográfica (ainda que os números oficiais sejam
de rever um pouco em alta), o mundo india-no encontra-se no meio do
caminho. No primeiro, a natalidade caiu,pelo menos oficialmente para 18‰ e a
mortalidade geral para 7%,o que lhe dá um crescimento natural de 1,1% ao ano,
enquanto no segundo a natalidade ultrapassa ainda os 30‰, o que, apesar de
uma mortalidade geral superior, lhe dá um crescimento natural de 2,1%. A
fecundidade é dois pontos inferior no mundo chinês, na se-quência das
medidas draconianas tomadas pelo governo. Não es-queçamos contudo que o
mundo indiano iniciou largamente a sua transição demográfica e que a sua
situação, ainda que menos inve-jável que a do mundo chinês, é nitidamente
melhor do que a da África ou mesmo da América Latina: a natalidade, por
exemplo pas-sou de 45‰ em 1965, para 30 em 1990 e a fecundidade é dois
pon-tos inferior à da África.
Sob estruturas socioeconómicas bastante semelhantes, conquanto os
sistemas não sejam os mesmos, despontam pois níveis de vida e evoluções
demográficas um pouco diferentes, mesmo tendo em conta o facto de as
estatísticas fornecidas pela administração chinesa exagerarem as diferenças.
Poder-se-ia dizer do mundo chinês o que foi relevado a propósito da Ásia no seu
conjunto, quer dizer,com meios bastante semelhantes, tem tendência para
superar o mundo indiano. É, provavelmente, a par com um pesado passivo,um
dos aspectos positivos de um regime comunista que fez enormes esforços pela
educação, pelo enquadramento médico ou pelo pla-neamento familiar.

216-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


B) O SUDESTE ASIÁTICO

A terceira área, a das ilhas e das penínsulas do sudeste asiático área


indiana. A economia liberal reina aí teoricamente, mas, na reali-mente a
economia, ou pelo menos, enquadrou-a. Também a protegeu nal,antes de a
abrir mais largamente. O peso, tanto no emprego como sumo de energia é aí
duas vezes mais forte e o crescimento mais rápido (7 a 8% ao ano contra 5 no
mundo indiano), excepto nas Filipinas (5%).
Em contrapartida, a dívida é aí mais forte, pois estes países abri-ram-se
mais cedo e, logo, endividaram-se mais ao exterior para inves-tirem. O seu
lugar no comércio internacional não tem termo de com-paração com o seu
peso económico. Enquanto a Asia do Sudeste étrês vezes menos populosa do
que as duas outras áreas asiáticas, ela exporta duas vezes mais do que a área
chinesa e 4 vezes mais do que a área indiana.
As estruturas e as evoluções demográficas colocam o Sudeste asiá-tico em
posição intermédia entre áreas indiana e chinesa,mas mais próximo desta
última, tanto pela fecundidade como pela esperança de vida. O nível
alimentar está mais próximo da área chinesa do que da área indiana. O
mesmo é válido para o rendimento, a alfabetiza-ção dos adultos e a
escolarização dos alunos no ensino primário e secundário. O enquadramento
médico, em contrapartida, mantém--se medíocre e a mortalidade ressente-se
disso. Mas o indicador do desenvolvimento humano é superior ao da área
indiana e mais pró-ximo do resultado chinês. Não obstante, neste grupo, o
mais heterogé-neo,a Malásia coloca-se quase constantemente à cabeça, com
uma transição demográfica mais avançada, um menor peso da agricultura,um
nível de vida mais elevado, enquanto a Indonésia se situa geral-mente na
última posição. Em suma, é a Indonésia que, pelo seu peso demográfico, baixa
os desempenhos globais da região.
A Ásia do Sudeste é, por outro lado, a única a ter assegurados os laços
oficiais entre Estados desde que, em 1977, a Indonésia, aMalásia,as Filipinas,
a Tailândia e Singapura criaram o ASEAN. Este orga-nismo estabeleceu como
objectivo promover a paz, a estabilidade e «acelerar o crescimento
económico, o progresso social e o desenvolvi-rentes domínios e uma
colaboração nos transportes e nas comunica-ções, na indústria e no
comércio» [30]. Um pouco esquecida durante
muito tempo,a cooperação económica acaba de ser reactivada no 15 anos,para menos de
5%, os direitos aduaneiros no interior da ASEAN sobre os produtos industriais e os capitais
[16].

C) PENÍNSULA INDOCHINESA E BIRMÂNIA


Este conjunto, castigado pelo comunismo e pela guerra, é margi-nal pela sua população
senão em valor absoluto (135 milhões de habi-tantes), pelo menos em relação ao resto da
Ásia. Traumatizados por um comunismo ortodoxo, devastados pela guerra, muito tempo
cor-tados do mundo exterior, Vietname, Laos, Camboja e Birmânia, inicia-ram, pelo menos
para alguns, uma convalescença. Mas a sua situação actual é ainda dramática. Pela sua
estrutura económica, assemelham-se à área indiana, à excepção do peso do terciário que é
mais fraco.O mesmo é válido para a demografia uma vez que a fecundidade se mantém
elevada e a população ainda jovem, assim como para a maior parte dos elementos do nível
de vida. Tudo se passa como se estes países,bloqueados ao nível indiano por
acontecimentos internos ou externos, tivessem as capacidades (em particular pelo seu nível
esco-lar e pela sua tradição chinesa) de tornar a juntar rapidamente, des-de a segurança
regressada, o nível da Ásia do Sudeste.

CONCLUSÃO
A Ásia está em andamento. Atada por razões diversas (em parti-cular por escolhas de
desenvolvimento autocentrado) a um nível eco-nómico muito fraco, assistiu entre 1965 e
1980 a um crescimento rápido (cerca de 6% ao ano). Entre 1980 e 1990, este crescimento
em média acelerou-se mais ainda (mais de 7% ao ano), em particular gra-ças à China, e
apesar da estagnação das Filipinas, ainda perturbadas por problemas internos. Vai ainda
continuar a acelerar-se nos anos vindouros, como vimos mais acima.
Apesar de um aumento ainda rápido da sua população, excepto na China, o
crescimento do seu PIB/habitante melhorou constantemente:2,5% ao ano entre
1960 e 1970, 3,1% entre 1970 e 1980,ainda na ordem nos anos 50 como os
condenados do Terceiro Mundo, os asiáticos mos-Os africanos fizeram a mesma
demonstração mas em negativo.

AÁSIA: UM TERCEIRO MUNDO BEM LANÇADO - 217


6

A ÁFRICA:
UM TERCEIRO MUNDO 《MAL LANNÇADO》

Qualquer que seja a análise, a África subsarina, que chamare-mos simplesmente


Africa uma vez que a África Setentrional foi estu-dada juntamente com o mundo árabe-
muçulmano, é sempre o conti-nente dos recordes, mas dos recordes negativos... R.
Dumont poderia hoje retomar, sem o mudar, o título de um livro que faz agora 30anos:
A Africa negra está mal lançada. Esta, com efeito, continua mal lançada,a ter um
comportamento negativo, tanto na demografia,como na sua economia, na sua
sociedade e no seu meio. É claro que teremos de matizar este panorama
extremamente sombrio. Reconhe-ceremos aqui e ali, e principalmente no Sul, pontos
mais fortes, pelo menos na dimensão económica. Mas o que impressiona mesmo assim
é uma notável uniformidade no subdesenvolvimento, pois aqui pode-mos
efectivamente empregar este termo.

I. O CRESCIMENTO DEMOGRÁFICO
MAIS FORTE DOS TERCEIROS MUNDOS
A África consegue a proeza de ter ao mesmo tempo a mais forte

demográfico do mundo. Quer dizer que ela está na primeira fase da ainda

não baixou verdadeiramente, onde a mortalidade, que já dimi-crescimento

atinge o seu nível máximo.

AÁFRICA:UM TERCEIRO MUNDO-MAL LANÇADO.-219

,220 -ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


A) UMA FECUNDIDADE QUASE NATURAL
quer dizer quase duas vezes mais do que as do mundo árabe-muçul.tro
vezes mais do que as mulheres europeias! E a situação é homogé.África
Austral, onde se está mesmo assim ainda perto de cinco, e atin.ge-se 6,6 na
África Ocidental onde a Costa do Marfim detém o re.corde absoluto com
mais de sete filhos por mulher (mapa 27).
Contrariamente ao que se passa nas outras regioes do mundo,a situação
pouco evoluiu desde os anos 1950. Actualmente, os africa-nos não são em média
mais do que 15% a praticarem os métodos modernos de contracepção. Quando
muito sente-se um ligeiro estre-mecimento, exceptuando os casos particulares da
ilha da Reunião e da ilha Maurícia, na África do Sul (igualmente na população
negra)onde se desce para quatro crianças por mulher. Políticas de planea-mento
familiar só timidamente são abordadas em alguns raros países como a Nigéria, o
Uganda, a Zâmbia e o Quénia, onde «metade das mulheres e dos maridos
interrogados (no âmbito de um inquérito feito pelo Ministério da Saúde) querem
limitar a sua progenitura» e onde «a fecundidade estaria a baixar ligeiramente»
(Le Monde,27.03.1990). Entre 1988 e 1993, a fecundidade teria globalmente pas-
sado de 6,5 para 6,3 filhos por mulher.
Nāo é, no entanto, sempre por falta de conhecimento dos métodos
contracepcionais modernos pois neste mesmo Quénia 90% das mu-lheres
conhecem um destes métodos, mas apenas 27% os utilizam.No Uganda são 80%
das mulheres que conhecem estes métodos, mas fecundidade:subescolarização
das raparigas (4 em cada 10 não vāo àrosa, que representa simultaneamente uma
segurança para a velhice através dos casamentos, de diversificar as actividades
económicas da à escola ou a abandona cedo. Acresce a isto, em toda a parte
setentrio-nal, a pressão do islão.
forte mortalidade, apenas possibilitava um crescimento demográfico
ríodo colonial durante o qual se difundiam «doenças até então locali-

AÁFRICA:UM TERCEIRO MUNDO-MAL LANÇADO-- 221


zadns ou mesmo desconhocidas» (ibid.). Já não é o que sucede hoje

mais forte do que em qualquer outro sftio.

B) UMA MORTALIDADE EM BAIXA MAS AINDA RELATIVAMENTE FORTE

Desde os anos 20, e sobretudo nos anos 50, a difusão de produtos e de


métodos terapêuticos modernos fez descer a mortalidade de uma sar destes
progressos, a mortalidade continua ainda a ser a mais forte do mundo.
Com efeito, apesar da extrema juventude da população (46% de jovens
com menos de 15 anos contra 32 na Ásia e 34 na América Latina), a África
conserva uma mortalidade superior à dos outros Terceiros Mundos que
passaram todos abaixo do limiar de 10‰. Ape-nas a África Austral se
aproxima deste limiar; em qualquer outra parte se está acima dos 15, ou
mesmo 17‰ como no Sahel (mapa 25).
Esta sobremortalidade constata-se melhor no caso da mortalidade infantil
que não é influenciada pela estrutura por idade. A mortali-dade infantil baixou
muito na verdade, uma vez que ela atingia apro-ximadamente 160‰ há 25
anos. Mas ela está ainda a um nível sem equivalente nos outros Terceiros
Mundos: enquanto a taxa ultrapas-sa pouco mais de 50%o aqui, atinge 93 na
África subsariana, ou seja perto do dobro da taxa latino-americana. Uma
criança em cada seis não atinge os cinco anos e «as grandes causas da
mortalidade não mudaram fundamentalmente ao longo das duas ou três
últimas déca-das; continuam-se a encontrar as doenças diarreicas, a rubéola,
as infecções respiratórias agudas, o tétano, o paludismo sempre pre-sente...
tudo isto sobre um fundo de má nutrição crescente» (ibid.).
Uma vez mais, à excepção da África Austral (onde a mortalidade infantil cai
para cerca de 60%), constata-se uma forte homogeneidade regional visto que
a taxa se situa por toda a parte entre 85 e 115,detendo o Sahel o recorde. À
escala dos Estados, e sempre fora da África Austral, raros são aqueles que, tal
como o Quénia,descem abaixo da barra dos 75% (mapa 15).
Conquanto a mortalidade continue aí a ser forte, sobretudo entre
nal, conservar um crescimento que faz dela uma verdadeira «bomba
demográfica».
C)UMA BOMBA DEMOGRÁFICA
A população africana aumenta ao ritmo excepcional de 3% ao
ano,ao longo destas últimas décadas, uma vez que passou de 2,7% ao
ano et al. «terá tendência para acelerar ainda durante
aproximadamente Ihões de habitantes, deveria atingir 700 milhões no
ano 2000, dupli-de 2030! De 7% da população mundial em 1950,
deveria passar a 17%em 2025,se pelo menos não ocorrer nenhuma
catástrofe até lá, como o faz recear a excepcional difusão da sida. Com
efeito, o flagelo afecta 14 milhões de pessoas e há repercussões na
mortalidade infantil que aumenta em determinados países como o
Zimbabwé. Em todas as regiões, excepto na África Austral, o
crescimento anual situa-se en-tre os 2,9 e 3,1% (mapa 27).
Comparando com outros Terceiros Mundos, o crescimento anual da África é 1,3
ponto superior ao da Ásia e 1 ponto ao da América Latina. Apenas o mundo árabe-
muçulmano é um pouco comparável,mas as capacidades de resposta da economia
e da sociedade sāo aímuito mais fortes!

II. A ECONOMIA MAIS ATRASADA


DOS TERCEIROS MUNDOS
Tendo em consideração as suas potencialidades, nos anos 1950fazia-se da
África uma das esperanças do Terceiro Mundo,enquanto a Ásia sobrepovoada era
antes considerada como mal encaminhada.Ora foi a África que ficou na cauda. A
sua agricultura detém ainda um lugar considerável na economia, se bem que não
consiga alimen-tar a população. A sua indústria continua ainda na infância, salvo
raras excepções, enquanto as suas potencialidades naturais são insu-ficientemente
ou mal exploradas. O sector dos serviços é fraco,pouco diversificado e
artificialmente dilatado.
A África está hoje mais do que nunca em crise. Em 1992, nas Images
économiques du monde podia-se ler: «Os Camarões atraves-blica Centro-
Africana sofre de uma doença económica, social e política Marfim é o fim do
milagre (...). Na Etiópia, a guerra continuou a

222-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD

AÁFRICA: UM TERCEIRO MUNDO -MAL LANÇADO.- 223


devastar o país (...). No Gabão, depois de cinco anos difíceis, o relnce Guiné a

situação é pouco satisfatória (...). A Mauritânia acabou de situação de assegurar o

funcionamento normal da sua administração a situação económica é catastrófica»

[20].A situação melhorou um Etiópia, na Guiné, etc.; as últimas estatísticas da

Organização Mun-também é verdade que subsistem problemas estruturais.

A) UM PESO RECORDE DA AGRICULTURA


Dos quatro Terceiros Mundos, é a África que, juntamente com a Ásia, ocupa
proporcionalmente mais activos na agricultura: 6 em cada 10 trabalham neste
sector, ou seja, duas vezes mais do que a América Latina. Esta actividade cria um
terço das riquezas, sinal de uma fraca produtividade por trabalhador. Com efeito,
esta agricultura per-manece ainda, apesar do papel das culturas de exportação no
comér-cio externo, fundamentalmente uma agricultura de subsistência.

1.CULTURAS DE SUBSISTÊNCIA ESSENCIAIS MAS INSUFICIENTES


a) Agricultura extensiva e défice alimentar
A agricultura africana mantém-se largamente voltada para as culturas de
subsistência destinadas ao autoconsumo ou à venda nos mercados locais. Mandioca,
inhame, banana, arroz, milho, milho miúdo, sorgo e legumes diversos em torno das
cidades, detêm, con-soante os climas e os hábitos alimentares, um lugar essencial
na agri-cultura camponesa.
Esta utiliza as mais das vezes técnicas tradicionais: baixa meca-nização, mesmo
nas plantações, utilização de animais de tiro quase nula, continuando a ser a enxada
a alfaia essencial. As excepções mais marcantes encontram-se nos altos planaltos da
África Oriental onde se pratica a cultura com o gado como força de tracção e nas
terras dos agricultores brancos da África Austral. Esta agricultura é igualmente rica
Latina, oito vezes menos do que o mundo árabe-muçulmano e

224-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


pouco ou mal utilizado, uma vez que os próprios cultivadores rara-serve
directamente para as culturas. Por outro lado, as técnicas agr.culturas
itinerantes sobre queimadas são práticas correntes. Os ren.cereal da África
(um terço da tonelagem) tem rendimentos 50% infe-riores à média mundial.
A criação de gado é igualmente muito extensiva. É certo que o eles só
concernem a África do Sahel, oriental e meridional. Todavia,as mais das
vezes nas mãos de criadores nómadas ou seminómadas,são também
pouco produtivos quer em carne quer em leite,repre-sentando mais que
nada um elemento de prestígio para os seus pro-prietários, como na África
Austral ou em Madagáscar. Apenas o efec-tivo pecuário da África do Sul
(10.°lugar mundial para os ovinos) são apascentados com técnicas
modernas e são objecto de um comércio significativo fora da África. Este
efectivo foi duramente atingido pela seca, entrecortada todavia de
interrupções, que afectou o Sahel a partir de 1968 e que obrigou os
criadores a recuarem para Sul onde se con-frontam com os agricultores
sedentários. A seca vem igualmente afec-tar a África Austral e fez perder 2
milhões de bovinos e um milhão de ovinos na África do Sul.
,"Nestas condições, a África consegue ser ao mesmo tempo o mais agrícola
dos Terceiros Mundos e o que sofre do défice alimentar mais elevado.
Enquanto nos anos 1960, conseguia prover minimamente às suas
necessidades, o seu défice alimentar situa-se hoje à roda dos 20%.Durante os
anos 1980-1990 apenas, este défice agravou-se em 6%, enquanto o saldo era
positivo em 6% na América Latina e em quarto de século, «27 dos 42 países
com mais de um milhão de habi-suas produções de subsistência» [1]. O
índice de produção alimentar;tar, regrediu 20% desde 1980, enquanto
progrediu em média 22% nos Terceiros Mundos.
ajuda alimentar tão importante como os 3000 milhões de asiáticos.
Desde 1975, esta ajuda foi multiplicada por 3, enquanto a que foi cereais
duplicaram. Nos Camarões, por exemplo, as importações agricultura só satisfaz
10 a 15% das necessidades alimentares.

b)O meio elou os homens?

As razões desta situação são numerosas. Estamos a pensar evi-dentemente


nas pressões que o meio exerce sobre pelo menos uma parte da África: aridez ou
semiaridez na parte Norte e Este (excluindo as montanhas) e no Sudeste, solos
muito medíocres (mas com largas excepções) e frequentemente sensíveis à
erosão. As superfícies efec-tivamente cultivadas são reduzidas. Na maior parte
do subcontinente,menos de 7% da superfície (excluindo as zonas desérticas)
proporcio-nam efectivamente colheitas todos os anos. Apenas a Costa do Mar-
fim,o Gana, o Burkina Faso e o Níger ultrapassam esta proporção (7a 15%) e só
excepcionalmente se vai para além disto: entre 15e 35% na Nigéria e nos altos
planaltos da África Oriental. A FAO estima que a Mauritânia, o Níger, a Nigéria, o
Senegal, a Etiópia, a Somália, o Uganda, o Quénia, o Ruanda, o Burundi, e o
Malávi care-cem efectivamente de terras atendendo à sua população actual e
que alguns destes países continuariam a carecer mesmo com métodos mais
modernos.
Mas o meio não explica tudo: assim a FAO estima igualmente que o Congo e a
República Centro-Africana poderiam fazer viver uma população 20 vezes mais
numerosa sem mudar fundamentalmente as técnicas agrícolas. Segundo peritos
israelitas, a Etiópia teria um potencial agrícola que lhe permitiria alimentar todo
o continente afri-cano! (Le Monde, 15.12.92). P. Gurou mostrou que nos meios
tropi-cais pluviosos semelhantes, no Zaire, na Tanzânia e na Zâmbia vi-vem de 3 a
5 hab/km2, enquanto, do outro lado do Oceano Índico, na região tâmul, «mesmo
os planaltos menos dotados ultrapassam os 200 hab/km2»[19].
É que as técnicas de produção, de organização do espaço e o enquadramento
dos homens diferem muito. Na região tâmul, uma irrigação milenária, técnicas
intensivas (estrumes e plantas de eleva-dos rendimentos), uma administração
muito antiga (um cadastro com 10 séculos de antiguidade) reestruturada pelos
ingleses, a proprie-dade privada, redes de trocas nacionais e internacionais
permitiram

AÁFRICA: UM TERCEIRO MUNDO -MAL LANÇADO.-225


desenvolver uma agricultura muito intensiva e portanto alimentar
uma população rural extremamente densa.
ções como a dos Bamileques dos Camarões, as técnicas rudimentares
inexistência de irrigação, uma administração pouco eficaz, uma pro-e o facto de
uma grande parte do trabalho ser deixado às mulheres,apesar de já
sobrecarregadas com as crianças e as lides domésticas,apenas consentiram
uma agricultura extensiva, permitindo apenas alimentar uma população rural
dispersa que, de resto, é a presa das doenças tropicais. Nestas condições, não é
de estranhar que a revolu-ção verde, que colocou a Ásia afastada da carência
alimentar, tenha penetrado tão lentamente em África, se alguma vez chegou a
pene-trar...
A outra razão fundamental para o défice alimentar é o aumento quase
exponencial da população. Com efeito,a produção agrícola ape-sar de tudo
progrediu. Nos últimos 15 anos, a do arroz aumentou dois terços e a do milho
um quinto. Segundo o Banco Mundial, a pro-dução total teria aumentado 2%
ao ano no decurso dos últimos 25anos e, no entanto, simultaneamente, as
importações alimentares cresceram 7% ao ano.
Seria pois necessário uma agricultura mais sofisticada, ou pelo menos mais
intensiva, para seguir e se possível preceder um cresci-mento da população de
3% ao ano. É possível pois num país como o Ruanda, cuja população atinge 280
hab/km2, «uma agricultura cada vez mais intensiva permitiu à produção de
subsistência aumentar mais depressa do que a população» (P. Barrot, M. A.
Leplaideur, PE,n.°2245). Mas, por ora, a procura de uma diminuição do défice
ali-mentar passa também por uma desactivação da bomba demográfica.A estes
factores fundamentais, importa acrescentar factores mais conjunturais.
A urbanização, e o seu corolário «a ocidentalização», contribuí-ram para
transformar os hábitos alimentares e para fazer preferir aos produtos
tradicionais produtos importados tais como o trigo, a farinha, produtos
diversos transformados, etc. Em muitos países igual-mente, sacrificou-se mais
ou menos, depois da independência, a agri-cultura de subsistência à indústria e
às culturas de exportação.
Com efeito, «os camponeses têm então de abastecer a cidade de forma
barata e financiar o equipamento industrial» [1]. O Estado prefere por
conseguinte comprar no mercado mundial cereais a baixo

226-ROBERT CHAPUIS/THIERRYBROSSARD
vendida ao desbarato (os pedaços inferiores de carne de vaca da CEE chegavam por
vezes aos portos africanos a 4 F o quilo...) e fixar os baixo preço possível, o que não
incita os agricultores a produzirem.O agricultor é, em suma, o garante da paz
urbana e do enriqueci-mento dos protegidos do poder.
Nos países produtores, o petróleo sinistrou por vezes a agricul-tura. Na Nigéria,
no final dos anos 60, a agricultura representa 55%do PNB e assegura 65% das
receitas de exportação. Em 1980 caiu-se para um terço do PNB e para 3% das
exportações; as importações cerealíferas absorvem então 20% das receitas
petrolíferas. Os inves-timentos públicos voltaram-se essencialmente para o sector
industrial.Recorreu-se pois maciçamente às importações alimentares e à polí-tica
de manutenção artificial da moeda nacional a um nível elevado desencorajou as
veleidades de exportação. Hoje a balança agrícola apresenta um défice de cerca de
mil milhões $.
O investimento público na agricultura é geralmente negligenciado.No Congo,
representa no início dos anos 80 apenas 1,2% dos investi-mentos totais realizados
pelo Estado, enquanto 40% da população trabalha neste sector [32]. O Congo é
apenas um exemplo entre os muitos destas políticas de efeitos desastrosos. De
igual modo apenas 5% dos fundos de ajuda pública internacional ao
desenvolvimento vão para as culturas de subsistência pluviais, base da alimentação
local. A investigação agronómica incide prioritariamente sobre as culturas de
exportação e muito pouco sobre as plantas de subsistên-cia locais como o milho
miúdo. O investimento privado é também ele restrito pois os agricultores,
demasiado pobres, não têm como pou-par para se modernizarem.
Os efeitos destas políticas inadaptadas foram agravados quando foram levadas a
cabo tentativas de colectivização forçada (fazendas de Estado, reagrupamento das
populações em aldeias, controlo esta-tal dos mercados) por regimes de inspiração
marxista: Angola, Burkina Faso, Madagáscar, Moçambique, Quénia, Zâmbia e
Etiópia, sofreram particularmente disto. Estes três últimos países foram particular-
mente vítimas de uma política de reagrupamento em aldeias («aldeização») que
deslocou 10 milhões de pessoas só na Tanzânia e
Todos os Estados que tentaram esta experiência já abandonaram tónica na
necessidade de uma agricultura que satisfaça tanto quanto

AÁFRICA:UM TERCEIRO MUNDO-MAL LANÇADO.-227


alteados para encorajarem os agricultoresa produzirem e a investi-rem, na
medida pelo menos em que este aumento seja compatível com os planos de
ajustamento estrutural aos quais o Banco Mundial e o FMI submetem muitos
Estados africanos. Estes planos preconi-zam, com efeito, uma abertura das
fronteiras que aguça a concorrên-cia de outros países e não favorece a subida
de preços.
Em certos casos, igualmente, o desenvolvimento da agricultura de
subsistência chegou a ser perturbada por uma política de encora-jamento às
culturas de exportação (preços garantidos, ajudas diver-sas) que tinha
dissuadido os agricultores a continuarem a praticar culturas de subsistência. O
problema é que hoje a maior parte destas culturas de exportação atravessam
dificuldades.

2.CULTURAS DE EXPORTAÇÃO EM DIFICULDADE

A África havia sido especializada pelos seus colonizadores na pro-dução de


produtos agrícolas tropicais. Nos anos 60, fornecia uma forte proporção da
produção mundial de cacau, de amendoim, de café, etc.Ora a maior parte
destas produções estagnou ou mesmo regrediu,pelo menos em valor relativo,
desde há uma dezena de anos. Em 1974,a África produzia ainda perto de dois
terços do cacau mundial, em 1990 um pouco mais da metade apenas. Ao
mesmo tempo, a parcela do café caiu de 20 para 17%, a dos amendoins de 25
para 18%, a da borracha natural de 7 para 5% e a produção de algodão e de
citrinos baixou em valor absoluto. Ora, durante estes mesmos quinze anos,o
Brasil duplicou a sua produção de cacau, da mesma forma que a Colômbia, o
México, a Indonésia para o café e a China para os amen-doins. Como durante
este mesmo tempo os preços baixaram (-50%em média para o cacau, - 25%
para o café, - 25% para os amendoins),as entradas de divisas baixaram
vertiginosamente. A actual subida de certos produtos (amendoins, café por
exemplo) está muito aquém do que se poderia ter ganho.
É tanto mais grave que a maior parte dos países africanos são muito
dependentes de um ou dois produtos. Por exemplo, o café e o cacau
representam aproximadamente 50% das exportações dos Ca-Gana. A baixa
destas exportações fez cair o PIB da Costa do Marfim porventura comparado
com determinados países do Sahel que não

228-ROBERTCHAPUIS/THIERRY BROSSARD

AÁFRICA: UM TERCEIRO MUNDO -MAL LANÇADO.-229


têm praticamente nenhum produto agrícola para exportar, excepto o bando) ou aos países
do Golfo, para aqueles que estão mais próximos deles.
Finalmente, ainda que a balança comercial agrícola africana fosse mente 5 mil milhões
$. Cerca de metade dos Estados têm uma ba-do Marfim (1,5 mil milhões $), a África do Sul
(1,2),o Quénia, o Zimbabwe (0,9).
A agricultura africana permanece pois numa situação medíocre ou má, salvo raras
excepções. A mediocridade actual paga-se com uma insuficiente auto-satisfação alimentar
e com uma baixa das exporta-ções agro-alimentares. Há pois grandes esforços a
desenvolver para estender a irrigação, desenvolver uma utilização judiciosa dos adu-bos e
dos produtos fito-sanitários, criar e assegurar a manutenção dos equipamentos de
armazenagem, de transporte e de distribuição,desenvolver a formação e a investigação e
implementar políticas que favoreçam o desenvolvimento das culturas de subsistência,
evitando simultaneamente desflorestamentos intempestivos (cerca de 5 mi-lhões de
hectares cada ano actualmente).
Em suma, a África tem simultaneamente demasiados agriculto-res, que pesam sobre a
sua produtividade e o seu meio, e escassez de agricultura, uma vez que esta não consegue
alimentar a sua popula-ção. Ora a indústria ainda não está preparada, e não estará ainda
durante muito tempo, para a revezar, tanto para ocupar a mão-de--obra agrícola
excedentária como para revezar as exportações agríco-las em dificuldade.

B) UMA INDÚSTRIA NA INFÂNCIA

À excepção da África do Sul, pode-se dizer, sem forçar a carica-minas, o que só deixa

um activo em cada dez aproximadamente na rica Latina. Se exceptuarmos a África do Sul e

os seus satélites manufactureira, a indústria ocupa um lugar marginal do ponto de vista do

emprego (mapa 5).


A indústria é menos marginal se se tiver em consideração o seu lugar no
PNB (um pouco menos de um terço). Mas esta situação deve-mais importante
do que nos outros Terceiros Mundos (excluindo o considerável: o sector
secundário cria aqui 42% do PNB, enquanto noutros países africanos representa
menos de um terço e por vezes menos de um quinto (mapa 6). Esta fraqueza
industrial é à primeira vista surpreendente, dado que a África está longe de ter
sido desfavorecida pela natureza.

1.UM POTENCIAL NATURAL NÃO NEGLIGENCIÁVEL

A África não está dotada por igual em recursos energéticos.A principal


carência é a do petróleo. A lacuna não é total mas os re-cursos conhecidos são
limitados. A África apenas dispõe de 3% das reservas mundiais e estas estão
mal repartidas uma vez que a Nigéria detém três quartos delas. A produção
actual atinge apenas 160 mi-lhões, ou seja 5% do total mundial. Só a Nigéria
extrai 60% do petró-leo, o que mostra a fraca participação dos outros
produtores (Cama-rões, Congo, Gabão), todos abaixo de 15 milhões de
toneladas, tirando Angola (31 milhões t). Mas há esperanças, nomeadamente
no Chade e no Mali.
As reservas de gás natural são fracas, à excepção da Nigéria,9.°do mundo,
mas que de momento só produz 4 mil milhões de m3. Os centros de consumo
estão com efeito muito afastados e a venda de gás liquefeito não é previsível
antes do ano 2000. Entre os outros países, unicamente a África do Sul, os
Camarões e a Costa do Marfim dispõem de algumas disponibilidades.
A situação é melhor para o carvão, pelo menos globalmente,dado que a
desigualdade é ainda muito maior do que para o petróleo.A África produz cerca
de 210 milhões de toneladas decarvão,ou seja 6% da produção mundial, mas a
África do Sul extraí só ela 95%da África do Sul, apenas o Zimbabwe aparece
realmente nas estatís-lidades são com certeza importantes, pois a plataforma
cobre vas-este último dispõe só ele de 5 mil milhões de toneladas de reservas
de carvão ainda inexploradas.

230-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


Em contrapartida, as potencialidades hidroeléctricas são conside-de rios exógenos
como o Níger e o Nilo. Estas potencialidades sāo os rios têm débitos abundantes e são
cortados por cachoeiras e que-das que são outras tantas rupturas de declives
favoráveis à criação de barragens. Só o Zaire dispõe de um potencial de 600 mil
milhões de kWh (10 vezes a produção hidráulica da França) e o lugar de Inga poderia
produzir só ele metade. A Guiné tem possibilidades que ultrapassam os 60 mil milhões
de kWh. É o caso de muitos outros países na zona mais húmida e mesmo fora
dela,uma vez que na Etiópia o lugar de Malka Wakana poderia produzir 2,5 mil milhões
de kWh [2].
A África inteira não fornece pois senão 45 mil milhões de kWh de electricidade
hidráullica, ou seja, menos do que França. Actualmente,os únicos produtores não
negligenciáveis (entre 4 e 8 mil milhões de kWh) são a Zâmbia, o Zaire e o Zimbabwe.
O que são precisos, para equipar quedas e transportar a corrente eléctrica pesados
investi-mentos que a maior parte dos países não puderam realizar, por falta de meios
financeiros locais ou estrangeiros, ou por falta de uma ver-dadeira vontade política.
Quando as barragens existem, dá-se o caso de elas não funcionarem na sua plena
capacidade ou de não funciona-rem mesmo: assim, a grande barragem da Cahora
Bassa, no Zambeze,que produzia 13 mil milhões de kWh em 1980, já não funciona,
devi-do ao facto de as linhas que transportavam a electricidade para a África do Sul
terem sido destruídas durante a guerra civil [2]; a pro-dução deveria recomeçar em
1997 depois da reconstrução das linhas.
As reservas de urânio são potencialmente enormes, visto que equi-valem a perto
de 20% do total mundial. Estão situadas cerca de meta-de na África do Sul e um terço
no Níger; o resto encontra-se sobre-tudo na Namíbia (12%), no Gabão e na República
Centro-Africana.A África produz 23% do total mundial, fornecidos 41% pelo Níger, em
seguida pela Namíbia e pela África do Sul. Como o abrandamento da produção de
electricidade nuclear nos países industrializados e os fizeram baixar os preços para
metade, a produção seguiu o mesmo caminho: entre 1990 e 1994, caiu 20%.
metálicos ou não. Neste cofre-forte brilham evidentemente ouro,ca de 650 toneladas
de ouro, ou seja, um quarto do total mundial,

AÁFRICA:UM TERCEIRO MUNDO -MALLANÇADO.- 231

232-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


mas só 90% provêm da África do Sul, o resto vindo principalmente do
vizinho Zimbabwe, bem como do Gana e do Zaire.
ção a África é o primeiro fornecedor mundial de diamantes.O Zaire,produtor africano
(é superado pela Austrália), seguido pelo Botsuana,pela África do Sul, pela Namíbia, e
depois por vários pequenos pro-dutores como a Serra Leoa, a Libéria, a Costa do
Marfim, o Gana,Angola, a República Centro-Africana, a Tanzânia. Esta «mina de
ouro»está pois aqui mais bem partilhada, mas não beneficia sempre tanto quanto
seria necessário os países produtores. Com efeito,a extracçāo encontra-se
frequentemente nas mãos de companhias estrangeiras;por outro lado, não é raro
dirigentes locais aproveitarem para se en-riquecerem pessoalmente; enfim,
organizou-se em torno destas ri-quezas um contrabando desenfreado; no Zaire,
estima-se que 80% da produção é exportada de forma fraudulenta. Na Serra Leoa, a
produ-ção eleva-se oficialmente a 200 000 carats, mas ela seria com efeito mais do
dobro e na República Centro-Africana mais do triplo. Estes recursos representam
mesmo assim uma parte não negligenciável do PNB de certos países: cerca de 35% no
Botsuana, 15% na República Centro-Africana.
A África dispõe também no seu subsolo de outros produtos, me-nos prestigiosos,
mas igualmente úteis. Fornece 5% do cobre mundial,graças à Zâmbia, ao Zaire e à
África do Sul, e 14% da bauxite, graças à Guiné (segundo produtor mundial), à Serra
Leoa e ao Gana. Produz também minério de ferro, sobretudo na África do Sul e na
Mauritânia,mas também muitos outros, mais ou menos estratégicos, como o cobalto
(30% do total mundial, essencialmente no Zaire e na Zâmbia),o cromo (metade do
total, sobretudo na África do Sul e no Zimbabué),o manganés (um quarto da
produção do mundo, na África do Sul ainda e no Gabão), sem contar com o níquel, o
estanho,etc.
Este tesouro poderia ter servido de base ao desenvolvimento de uma indústria de
transformação. Raramente foi o caso, uma vez que a indústria manufactureira
africana é de muito longe a última entre as dos Terceiros Mundos.

2.UMA INDÚSTRIA MANUFACTUREIRA SUBDESENVOLVIDA

balmente, está subdesenvolvida, mesmo em relação às dos outros


Terceiros Mundos. Este valor acrescentado não representa senão 7%do dos Terceiros
Mundos, ou seja, cinco ou seis vezes menos que a do mundo árabe-muçulmano. Só a
Bélgica realiza um valor acrescen-tado industrial superior ao da África.
A indústria só tem uma certa importância em alguns raros paí-ses.O seu valor
acrescentado atinge 40 mil milhões na África do Sul,mas apenas entre 0,5 e 2,5 mil
milhões na Nigéria, na Zâmbia, nos Camarões, no Zimbabué, no Zaire, na Costa do
Marfim, e noutros países ainda menos. O México com uma população inferior à da
Nigéria, cria uma valor acrescentado industrial 25 vezes superior!A África do Sul é a
única verdadeira potência industrial que se pode comparar às dos outros Terceiros
Mundos. Classifica-se em 4.°lugar atrás da China, do Brasil, do México, mas à frente
da Turquia, da Tailândia e da Indonésia. Só ela realiza um valor acrescentado indus-
trial superior ao de todos os outros países da África reunidos. Sem ela,toda a indústria
africana não chega a ultrapassar a da Tailândia...
Também ao nível da sua própria estrutura a indústria africana ésubdesenvolvida.
Mais de metade do valor acrescentado provém de actividades que se podem
considerar, pelo menos nestes países, como tradicionais, quer dizer as indústria agro-
alimentares e o têxtil. Uma vez mais, se exceptuarmos a África do Sul e os seus
satélites económicos (Lesotho, Zimbabué), bem como o Quénia e a Nigéria,são quase
sempre cerca de dois terços do valor acrescentado industrial,e por vezes mais, que
são produzidos pelos IAA e o têxtil.
Os próprios IAA consistem as mais das vezes apenas numa pri-meira
transformação dos produtos, tal como a trituração dos oleagi-nosos, a torrificação e a
secagem do café, do cacau, a preparação da mandioca, o tratamento da cana-de-
açúcar, o abate de animais, etc.A fabricação de produtos um pouco mais sofisticados é
rara; quando existe (moagem,laticínios, cervejaria), faz-se frequentemente com
produtos importados [32]. A indústria têxtil, que trabalha a lã e so-bretudo o algodão,
só tem alguma importância na África do Sul, no Senegal, na Costa do Marfim, nos
Camarões, no Quénia e na ilha Maurícia.
As outras indústrias são igualmente a maior parte das vezes in-dústrias de
primeira transformação, minérios desta vez, mas tam-bém aqui, são de amplitude
limitada. No Zaire, metade do cobre érefinado no próprio país pela ex-União mineira
do Alto-Catanga, na-cionalizada em 1966, que emprega 40 000 pessoas. Nos
Camarões a central hidroeléctrica de Edea transforma a alumina da Guiné em
alumínio (cerca de 90 000 toneladas), mas a produção de alumínio

A ÁFRICA: UM TERCEIRO MUNDO-MAL LANÇADO.-233


está em baixa por causa da falta de electricidade. As capacidades de refinação
do petróleo são fracas, menos de 50 milhões de toneladas,quer dizer menos
do que as da França e estão situadas na sua quase totalidade na África do Sul
e no Nigéria. Uma indústria do cimento,frequentemente muito reduzida,
existe numa dezena de países.Das dez primeiras empresas da África, uma só
(tirando a África do Sul)fabrica objectos manufacturados (a firma zambiana
Zimco), as ou-tras são empresas petrolíferas, de extracção mineira, têxteis ou
em-presas de comércio e de transporte.
As outras indústrias de transformação são raras, excluindo a África do Sul que,
para além de uma potente indústria de tratamento de recursos do seu subsolo, é
capaz de fabricar todas as espécies de pro-dutos de consumo corrente e de bens de
equipamento. O caso da ilha Maurícia é totalmente excepcional. Aí se fez a escolha
de manter a cana-de-açúcar, tratada nas fábricas locais e exportada, de conservar as
actividades tradicionais (conservas, massas, sabão) e de atrair,em zonas francas,
indústrias que procuram uma mão-de-obra hábil e barata, tais como a óptica, a
relojoaria, o têxtil. Perto de 30% da mão--de-obra trabalha aí no sector secundário.

3.OS RESPONSÁVEIS PELA SUBINDUSTRIALIZAÇÃO:OS AFRICANOS E OS OUTROS...

As razões desta situação são complexas. Para além dos factores exógenos que
perturbaram, e por vezes perturbam ainda a industria-lização dos países em vias de
desenvolvimento (sequelas do sistema colonial, organização actual dos mercados,
papel das multinacionais,etc.),factores que não são particulares à África, um certo
número de outros factores, que lhe são específicos, podem explicar o seu atraso
industrial, ou pelo menos o de algumas das suas regiões.
Pode-se pensar na desigual repartição dos recursos do subsolo.Estes são
globalmente apreciáveis, mas mal repartidos, com regiões menos bem dotadas do
que outras. É o que acontece com os países do Sahel que quase não dispõem do
minério de ferro da Mauritânia e dos fosfatos do Senegal, mas também com a África
Oriental,ainda menos bem provida. Mas há muito que se sabe que os trunfos natu-
rais e o desenvolvimento industrial não vão forçosamente a par. Vários países
africanos dão o exemplo disso. O pior é o imenso Zaire, quatro vezes o tamanho da
França, povoado com 40 milhões de habitantes,dispondo de verdadeiros tesouros
no seu subsolo, mas cujo valor acres-

234-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


Mauricia. O melhor exemplo é justamente esta ilha minúscula (um
recursos que não sejam o seu solo e a sua mão-de-obra, que
consegue $. Exemplo para os homens políticos africanos meditarem.
plo, é ao mesmo tempo insuficientemente formada, devido ao atraso ceiros
Mundos: no Quénia, os salários horários eram, em 1983,duas A. Vanneph, op. cit.). E
os salários são mais elevados ainda na Zâmbia e no Zimbabwe. As actividades com
grande abundância de mão-de-obra (têxtil, montagem de automóveis, de
componentes electrónicos,etc.) interessaram-se, por conseguinte, relativamente
pouco pela Áfica.Tanto mais que este continente afigurava-se, aos capitais japoneses
e americanos que procuravam deslocalizar-se nos anos 50 e 60, ou como demasiado
longínqua ou como um couto privado europeu. Esta mão--de-obra afigurava-se
igualmente, com razão ou sem ela, como pouco trabalhadora, dificilmente
adaptável, pouco disciplinada.
Empresários locais poderiam ter aproveitado este período de de-senvolvimento
que a África conheceu nos anos 70. Ora se existiam,em particular entre os
emigrantes indianos, libaneses, etc., que esta-vam instalados por vezes há longa
data, tratava-se mais de comer-ciantes do que industriais e eram mesmo assim
pouco numerosos,nestes países pobres em que a poupança era rara. Veremos mais
adiante que o sistema social africano que incita à redistribuição, mais ou menos
voluntária, dos ganhos pela família ou pelo clã, não favorece a acumulação de
capital.
Enfim, em todos os regimes que se quiseram marxistas ou socia-listas em
diversos graus, a propriedade privada dos bens de produção era mal aceite e sempre
mais ou menos sancionada. Nestes mesmos países, o Estado quis tomar em mãos a
industrialização para fazer des esforços de investimento, com frequência à custa da
agricultura,punções na agricultura, tiveram de contrair empréstimos e endivida-ram-
se.
grandiosos (uma fábrica de aço no Togo, por exemplo), eram
sobredi-

AAFRICA:UM TERCEIRO MUNDO -MAL LANÇADO.-235


mensionados para mercados locais geralmente estreitos. Eram igual-gavam
uma mão-de-obra demasiado pletórca, para operarem uma penetração no
mercado internacional. Alguns não foram pois com-pletamente ao seu termo,
outros funcionam hoje muito aquém da sua capacidade.
Longe de criarem novas riquezas, estas políticas empobreceram a África
dado que impediram outros investimentos, mais úteis, na agri-cultura por
exemplo. De acordo com Cl. Albagli, que cita um estudo da ONUDI, «as
empresas públicas representam 15% da sua produção,25% do investimento e
25 a 30% do emprego assalariado na África negra» e são com demasiada
frequência uma oportunidade para os dirigentes «rechearem os bolsos» da sua
família, do seu clã e da sua clientela [1]. Desde os anos 80, com a descida das
entradas de divisas e com os planos de reajustamento aos quais foram forçados
a maior parte dos países, os investimentos caíram ainda mais. Enquanto a taxa
de investimento se elevava a 25% em 1981, caiu para 15% em 1984 e para cerca
de 10% actualmente.
A África tem portanto mais do que nunca necessidade de ajuda e de
investimentos estrangeiros. Ora, desde a explosão do bloco comu-nista, deixou
de aparecer como uma peça essencial no xadrez inter-nacional. Os seus
governantes deixaram de poder fazer o jogo da maromba com os dois blocos
para obterem a máxima ajuda. A África receia pois agora ser abandonada, em
benefício da Europa de Leste ou de outros países mais promissores. Quanto ao
sector terciário, este não pode tirá-la do mesmo marasmo.

C) UM SECTOR TERCIÁRIO
EXTREMAMENTE DEFICIENTE

O sector terciário emprega, em África, cerca de um quarto da po-pulação


activa. É aproximadamente tanto como a Ásia, mas é duas vezes menos do que
a América Latina e igualmente quase duas vezes menos do que no mundo
árabe-muçulmano. Em percentagem do PNB alcança-se um pouco mais de 40%
em África, contra mais de 50% na América Latina; a Ásia encontra-se, desta vez,
na última posição. Na medida em que o lugar ocupado pelo sector terciário na
economia éum índice do nível de desenvolvimento, mede-se de novo o atraso
da África. Mas, a verdade é que este sector terciário é simultaneamente
pletórico e insuficiente.

236-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


1.UM SECTOR TERCIÁRIO PLETÓRICO
Pletórico antes de mais porque, tal como noutros países, é dila-tado por toda a
espécie de pequenos ofícios artesanais e comerciais muito úteis, mas pouco
produtivos. Estes colocam à disposição de consumidores pobres produtos simples,
em pequena quantidade e baratos, comprados noutras partes ou fabricados pelo
próprio arte-são. B. Maison indica que na Reunião fornecem cigarros, produtos
alimentares, sabões, ferramentas, chapéus, cestos, tecidos, etc.; pres-tam serviços
pouco dispendiosos tais como transportes de pessoas e de mercadorias, limpezas,
roupa lavada e engomada, cabeleireiro, foto-grafia, animação musical, redacção de
cartas e de processos, etc., e consertam aparelhos electrodomésticos, rádios,
relógios, calçado, bi-cicletas, material agrícola ou até automóveis (COM, 89).
Este sector informal é duplicado aqui também por todo um sector ilegal; a droga,
em que Lagos por exemplo seria uma plataforma gira-tória, a venda fraudulenta de
ouro e de diamantes (veja-se o que se passa no Zaire), o contrabando de gasolina
entre a Nigéria e os seus vizinhos, de carne entre os países do Sahel e os seus vizinhos
do Sul,de arroz, etc. «A venda de arroz na Nigéria e a compra de gasolina neste país
vizinho alimenta um mercado negro considerável que ajuda a curto prazo o Benim,
mas que a longo prazo o desequilibra» [2];o comércio informal com a Nigéria
representaria pelo menos 70% da actividade económica do Benim.
A administração, quer seja a do Estado propriamente dita oua das empresas
públicas, é com muita frequência pletórica. As despe-sas do Estado absorvem perto
de um terço do PNB e só o vencimento dos funcionários representa quase 10% do
PIB. Em determinados países a obtenção de um diploma dava imediatamente direito
a um emprego na administração, ainda que este não oferecesse um inte-resse
evidente. Por isso, uma das primeiras etapas dos planos de ajus-tamento estrutural é
precisamente reduzir este excesso de funcioná-rios. Esta redução foi realizada no
Burkina Faso, na Gâmbia, na Guiné-Bissau, no Uganda onde um funcionário em cada
três foi des-pedido, bem como na Guiné onde perto de metade foram despedidos.O
que é seguramente bom para as finanças públicas, mas que coloca enormes
problemas políticos (aumento do número de descontentes)e sobretudo sociais, se
pensarmos que um só emprego público permite frequentemente várias famílias
viverem.
Pletórico nas suas actividades tradicionais e administrativas, o sector terciário
está, em contrapartida, muitíssimo pouco guarnecido nas suas actividades mais
modernas.

AÁFRICA: UM TERCEIRO MUNDO-MAL LANÇADO.-237


2. UM SECTOR TERCIÁRIO INSUFICIENTE

Os transportes, o turismo e a banca servirão de exemplos. Os trans-portes


primeiro. Nos quatro Terceiros Mundos, a África é, juntamente com o mundo
árabe-muçulmano que se encontra em desvantagem devido às imensas
superfícies desérticas, aquele que dispõe da mais fraca densidade de estradas:
menos de 6 km para 100 k㎡2, ou seja 2vezes menos do que a América Latina e
3 vezes menos do que a Ásia.
A África apenas dispõe, no total, de 72 000 km de vias férreas, ou seja, o
dobro da rede francesa, mas para uma superfície 50 vezes su-perior. A rede
instalada pelas potências coloniais não cresceu, salvo excepção como o
Transgabonês, terminado em 1986. Pelo contrário,até se degradou. A linha
Norte Etiópia foi desafectada em 1978 e os corredores ferroviários que
permitem ao Malávi, à Suazilândia e ao Zaire atingirem os portos de
Moçambique não funcionam senão a 20% da sua capacidade, em virtude da
insegurança e da má manuten-çāo das vias.
Estas vias férreas estão muito mal repartidas. A África do Sul possui, só ela,
um terço e quase metade com os seus vizinhos da África Austral. A rede é muito
pouco densa nos países do Sahel: o Chade,duas vezes a França em tamanho,
não tem um único quilómetro de vias. É pouco densa igualmente numa espécie
de vasto oval que vai da República Centro-Africana à Namíbia. Noutras partes,
mais do que uma verdadeira rede, são antes vias coloniais, que unem o interior
aos portos, mas que raramente estão ligadas entre si. O tráfico é ge-ralmente
limitado e lento. Estas debilidades sentem-se particular-mente nos países sem
abertura para o oceano, que dependem pois da boa vontade dos seus vizinhos.
As infra-estruturas de transporte aéreo continuam bastante sumárias, tirando
algumas excepções. Esta insuficiência dos meios de transporte é
particularmente prejudicial ao turismo.
A África dispõe de trunfos turísticos de primeira ordem: sol abun-dante,
praias imensas, natureza grandiosa, culturas diferentes, ne-nhuma ou pouca
diferença horária e relativa proximidade da Europa,primeiro emissor mundial
de turistas. Ora a África subsariana rece-be apenas 6 milhões de visitantes, ou
seja menos do que a África do Norte (perto de 8 milhões) e dez vezes menos do
que a França. Ela sóbeneficia de 1,5% das receitas do turismo mundial. Estes
resultados modestos são devidos às insuficiências das infra-estruturas de trans-
portes, às quais se junta a mediocridade de alojamento e dos equipa-mentos de
acolhimento que os meios financeiros locais mal permi-

238 - ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


risco é de criar enclaves que só marginalmente beneficiam o país re-

igualmente a que uma parte da clientela fuja.


A África Oriental e Austral recebem só elas três quartos dos turistas,Sul, o Quénia, o
Zimbabué e o Botsuana vêm nitidamente à cabeça;menos de 50 000 [34]. Os
progressos da frequentação turística são tem tendência para diminuir. É sinal de que a
África não sabe ainda atrair uma certa clientela desafogada que receia o desconforto e
as incertezas do seu acolhimento.
O caso dos bancos é sintomático Estes são geralmente pouco nu-merosos porque,
no período que se seguiu à independência, determi-nados bancos privados foram
nacionalizados e os bancos estrangei-ros repatriaram as suas filiais. Os bancos de
Estado, mediocremente geridos, e carecendo de capitais em virtude da penúria de
poupança,eram e continuam a ser fragéis. No Benim, em 1989, último ano do regime
marxista, os bancos de Estado (o Banco Comercial do Benim e o Banco de
Desenvolvimento do Benim), os dois na falência, tinham fechado os seus balcões [2].
Os bancos privados de origem local são raros, tirando a África do Sul. Os bancos
privados são geralmente filiais de bancos ocidentais, franceses, por exemplo, no nosso
antigo Império colonial. Estes bancos são frequentemente frágeis, tal como as
economias dos países onde eles estão instalados. Em 1991, quatro de entre eles
entraram em falência nos Camarões, entre os quais o Paribas Camarões, e pôde-se
falar, na mesma época, de uma verda-deira implosão do sistema bancário africano (Le
Monde, 5.03.91).
A fraqueza do sector terciário foi durante muito tempo simbo-lizado pela
mediocridade da urbanização. Ainda hoje, a África éum continente muito pouco
urbanizado, com 30% de citadinos, um pouco mais do que a Ásia (27%) e sobretudo
menos do que o mundo dia esta situação evolui rapidamente, não tanto pelo
crescimento do da sua aldeia pela pobreza ou atraídos pela esperança, amiúde go-
abrigavam 14% da população total. Esta proporção duplicou pois em 30 anos.

AÁFRICA: UM TERCEIRO MUNDO -MAL LANÇADO.- 239

240 -ROBERTCHAPUIS/THIERRY BROSSARD


de 7 a 10% ao ano são frequentes. No ano 2000 haverá dez vezes mais
os rurais. 14 aglomerações ultrapassam já um milhão de habitantes.país
não está longe dos 5 milhões. Kinshasa, no Zaire, ultrapassa os 4Cartum,
no Sudão, conta 2,5 milhōes de habitantes e Abijā está pró-xima dos 2
milhões.
Muitas destas cidades são à semelhança de Lagos onde «as orgu-lhosas torres
dos grandes bancos dominam pequenos mercados sór-didos, as moradias com
piscina confinam com os bairros de lata,e os automóveis de alta cilindrada salpicam
de lama os estropiados que mendigam na beira da estrada» (Le Monde
Diplomatique,07.92).Elas simbolizam também a fragilidade e a dependência das
economias afri-canas.

D) FRAGILIDADE E DEPENDÊNCIA ECONÓMICAS


A África é duplamente dependente, ou seja dependente comercial e
financeiramente.

1.UMA DEPENDÊNCIA COMERCIAL

Dos quatro Terceiros Mundos, a África é simultaneamente o me-nos importante


(1,5% do comércio mundial) e o mais aberto para o mercado mundial. Ela só realiza
1,5% do comércio mundial, mas as suas exportações equivalem a cerca de um
quarto do seu PNB.
Nāo é forçosamente um defeito em si, uma vez que os dragões asiáticos
asseguraram o seu crescimento através de uma ampla aber-tura sobre o mercado
mundial. Infelizmente para a África, aproxi-madamente 90% das suas vendas são
constituídas por produtos pri-mários (agrícolas e minerais), contra dois terços na
América Latina e menos de metade na Ásia. Apenas o mundo árabe-muçulmano de-
Ora,os produtos primários que a África vende estão sujeitos a varia-ções de preços
consideráveis, devido a uma ausência de acordos sobre dutores e ao
desenvolvimento de produtos de substituição pelos paí-

AÁFRICA: UM TERCEIRO MUNDO-MAL LANÇADO--241


dāo, a fibra óptica é preferida ao cobre e o plástico aos metais.
vezes espectaculares entre 1965-1970 e, seguidamente, entre 1975-anos 60.

Tiveram de novo tendência para subir nos anos 90. Por exem-reencontra o seu

ponto de partida cinco anos mais tarde! O café, o mo assim extremamente

sensíveis, sem contar o petróleo que concerne e fazem variar o PNB de uma forma

espectacular.
O problema agrava-se quando um país exporta quase exclusiva-quente nos
Terceiros Mundos já estudados é, em contrapartida, muito é demonstrativo. Com
efeito, aproximadamente 50% das suas expor-tações são fornecidas pelo café e pelo
cacau de que vimos mais acima as variações de preços. Graças, entre outras coisas,
ao aumento das exportações destes dois produtos, assim como de óleo de palma e
de algodāo,em 20 anos o país tinha multiplicado o seu PIB por 10 e o rendimento
por habitante progredia 3% ao ano, apesar de um rápido aumento da população. A
partir de 1981, com a queda dos preços do cacau e do café, o país viu o seu PIB
baixar,primeiro lentamente,depois rapidamente: entre 7 e 9% ao ano de 1988 a
1990. Tendo con-traído muitos empréstimos no momento do crescimento, foi-lhe
im-possível reembolsar a sua dívida em 1987 e 1988 e esta foi reescalonada. A
recuperação está em curso, houve uma retoma do crescimento a partir de 1994 e a
Costa de Marfim conserva um PIB real superior à média.
O caso da Nigéria é também ele instrutivo. Depois de ter conhe-cido, como
todos os produtores de petróleo, um extraordinário cres-cimento desde 1973,
sofreu duramente os contrachoques petrolífe-ros que se seguiram, provindo 97%
das suas exportações do ouro do petróleo». A inflação ultrapassa os 50% ao ano.
Apesar de um ainda 30 mil milhões $ actualmente, ou seja, praticamente o equi-
país, classificado algum tempo pelo Banco Mundial entre os países

242-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


com rendimento intermédio, voltou a cair nas economias de fraco
rendimento.
Entre os países dependentes em mais de 50% de um ou de dois produtos
exportados, podemos citar Angola, que depende a 96% do petróleo, os
Camarões (petróleo e café), a Etiópia (café), o Gana (cacau), a Guiné (bauxite e
alumina), o Quénia (café e chá),Madagáscar (café e baunilha), Moçambique
(camarão e cajú), o Níger (urânio), o Uganda (café), o Ruanda (café e chá), a
Tanzânia (café e algodão), o Zaire (cobre), a Zâmbia (cobre)... Esta dependência
comer-cial é agravada por uma dependência financeira e
portanto,indirectamenta política.

2.UMA DEPENDÊNCIA FINANCEIRA E POLÍTICA

A África é dependente financeiramente áo mesmo tempo por causa da sua


dívida, da ajuda que recebe e, pelo menos para certos países,do seu sistema
monetário.
Vários factores se conjugaram para endividar a África. A baixa dos preços dos
produtos exportados e oaumento das importações ali-mentares desequilibraram
a balança comercial. As despesas dos Es-tados foram consideráveis: subsídios aos
produtos de primeira neces-sidade, vencimentos de funcionários e de
empregados de empresas públicas pletóricas, investimentos por vezes
sumptuários. A subida das taxas de juro aumentou muito as saídas de capitais.
Consequen-temente, a balança de pagamentos, positiva até 1970, passa em se-
guida para o vermelho para atingir um défice igual a 10% do PIB dez anos mais
tarde. É deficitária hoje em cerca de vinte mil milhões $,ou seja o equivalente a
25% das exportações de bens e serviços. Hoje,apenas três países têm uma
balança de pagamentos positiva: a África do Sul, a ilha Maurícia e o Gabão.
A África viu pois a sua dívida avolumar-se dramaticamente, sem que esta
fosse mediatizada como a da América Latina pois, dado o fraco peso económico
do continente, não representa senão 10% dos créditos internacionais. A dívida
foi mesmo assim multiplicada por dez em vinte anos. Atinge os 55 mil milhões de
$ em 1980, 155 em 1988. Ultrapassa então o valor do PIB, e por vezes muito
mais como [1]. Apesar de reestruturações diversas, a África está ainda endivi-
excluir a África do Sul, que não está endividada, a uma soma superior

AÁFRICA:UM TERCEIRO MUNDO-MAL LANÇADO.-243


em um quarto ao seu PIB. O Banco Mundial estima que 30 países estão
sobreendividados. A dívida da Nigéria é um terço da da China cuja população é doze
vezes superior. A África está pois, na realidade,três ou quatro vezes mais endividada
do que a dos outros Terceiros Mundos.
Desde 1985,a África dá mais aos seus credores do que recebe de-les. Estes não
lhe concedem pois mais empréstimos a não ser a con-ta-gotas e em contrapartida de
planos de reajustamento draconianos.O da Nigéria, anunciado em 1985, dá disso
uma boa ideia. Este país tem então de desvalorizar a sua moeda em 70%, e esta
perde a seguir mais 20% do seu valor. Os salários são congelados, os preços liberali-
zados, os produtos como o trigo, o milho, o arroz, os tecidos, os cigar-ros interditos à
exportação, as despesas orçamentais reduzidas de forma drástica, da mesma forma
que os subsídios públicos; é instau-rado um programa de privatização. Os grandes
desequilíbrios foram assim sendo, a pouco e pouco, reestabelecidos, a produção e os
produ-tos agrícolas aumentaram, o défice foi reduzido, mas ao preço de muito
pesados sacrifícios impostos à população, do abandono ou da inter-rupção de certos
projectos, como o da capital Ajuba, e de uma perda de independência económica.
Uma boa parte da África está assim sob tutela do FMI e do Banco Mundial.
A ajuda pública de que beneficia a África representa uma outra forma de
dependência. A África é de longe o Terceiro Mundo mais ajudado: dez vezes mais do
que os outros, o equivalente a 12% do seu PNB, contra um pouco mais de 1% para o
conjunto dos outros Tercei-ros Mundos. A ajuda atinge ou ultrapassa 30% do PNB na
Somália,na Tanzânia, no Burundi e atinge dois terços em Moçambique.Em dois terços
dos países africanos, ultrapassa 10 e frequentemente 20%do PNB. Um bom número
de países do Sahel e da África Oriental não sobrevive senão pela assistência
internacional.
Mas esta ajuda esconde uma intenção estratégica ou económica.Ela torna-se
evidente quando é militar, como a da França no Chade,por exemplo. É menos visível,
mas igualmente real, quando se trata de uma ajuda financeira ou económica. As
antigas potências coloniais apoiam prioritariamente os países que faziam parte do
seu Império.África. Ela beneficia assim de um mercado privilegiado para os seus bens
e os seus serviços, de uma fonte prioritária de matérias--primas e de meios de
pressão sobre a política exterior dos seus obri-Com efeito, os treze Estados africanos
da zona franca beneficiam de
franco francês e o franco CFA (que vale 0,02 FF), transferências de cobertos
pela França, moedas locais garantidas sem limite pelo Te-souro francês e, por
conseguinte, garantias de estabilidade susceptí-veis de tranquilizarem os
eventuais credores ou investidores estran-geiros. Em contrapartida, os bancos
africanos devem depositar pelo menos 65% das suas reservas de câmbio junto
do Tesouro francês e o sistema favorece a fuga de capitais. Em termos gerais,
este dá à França um meio de controlar a economia das antigas colónias (Le
Monde,10.11.92). A desvalorização em 50% do franco CFA em 1994 subli-nhou
esta dependência, mas permitiu aos países da zona franca começar de novo
sobre bases mais sãs.
Todas estas fraquezas traduzem-se num dinamismo económico inferior ao
dos outros Terceiros Mundos.

3.UM CRESCIMENTO LENTO E INSUFICIENTE

Dos quatro Terceiros Mundos, foi a África que, desde há um quarto de


século, conheceu o crescimento mais fraco. Entre 1965 e 1980,enquanto o PIB
africano aumentava um pouco mais de 4% ao ano, o crescimento estava
próximo dos 6% na Ásia e dos 7% no mundo ára-be-muçulmano e na América
Latina. Entre 1980 e 1990, com um cres-cimento um pouco inferior a 2% ao
ano, a África está, é certo, a par da América Latina e do mundo árabe-
muçulmano, mas a Ásia ga-nhou o largo com uma progressão de 7% ao ano.
Enquanto a Ásia continua actualmente embalada no seu anda-mento (+ 6 a
7% ao ano entre 1990 e 1994) e houve uma retoma do crescimento na
América Latina (entre 3 e 4%), a África continua enviscada no seu marasmo. O
seu PIB cresceu apenas cerca de 1%,mas o crescimento fulgurante da
população provocou um recuo de 1% do rendimento por habitante. Para
ocupar a sua mão-de-obra, a África deveria criar perto de 100 milhões de
empregos entre 1990 e o ano 2000! De acordo com o Banco Mundial, a
agricultura poderia absorver 50, mas o sector moderno (secundário e terciário)
criaria apenas um só [1]. Comoé evidente, o sector informal não
poderáengendrar por si só os restantes 49 milhões de empregos.
um continente cujo nível de vida já está nitidamente desgarrado do dos outros
Terceiros Mundos.

244 -ROBERTCHAPUIS/THIERRY BROSSARD

AÁFRICA: UM TERCEIRO MUNDO -MAL LANÇADO.- 245


III. O NÍVEL DE VIDA MAIS FRACO
DOS TERCEIROS MUNDOS
Dos 46 países menos avançados (PMA) do planeta, 31 encontram--se em
África, ou seja dois terços. Entre os 33 países que dispõem de um PNB inferior a
500$, 25 são africanos. Nestas condições, com-preende-se que a África esteja
sempre no fim da lista em todos os indicadores de nível de vida.

A) UM RENDIMENTO DESASTROSO
Se nos ativermos unicamente ao PNB/ habitante, a África sub-sariana está
um pouco menos bem colocada do que a Ásia, com 525$contra 590. No
entanto, duas observações se impõem. Se se retirar a África do Sul que, com os
seus 42 milhões de habitantes e os seus 3100$ por habitante tem um peso
extremamente pesado, o PNB mé-dio da África cai para 400$, quer dizer,
nitidamente abaixo do da Ásia.Por outro lado, sabemos que o PNB/hab é um
indicador muito medío-cre do nível de vida. Se atendermos ao PIB real, a
vantagem vai desta vez nitidamente para a Ásia, onde os preços são muito mais
baixos.A África não atinge senão 1270$ por habitante, enquanto a Ásia
estáacima de 2000. Se pusermos à parte os países da África Austral, em que o
PIB real ultrapassa 2 500$ todas as outras regiões estão entre os 800 e 1600$. À
escala dos Estados com mais de 10 milhões de habi-tantes, e continuando a pôr
à parte a África Austral, apenas o Gana e a Costa do Marfim ultrapassam um
pouco os 1500$, bem como os Camarões e a Nigéria cujos PIB são aumentados
um pouco artificial-mente pelo petróleo (mapa 13).

B) UMA SUBNUTRIÇÃO GENERALIZADA


Apesar de uma forte ajuda alimentar, a África, com uma ração calórica média
inferior a 2100 calorias por habitante e por dia, sofre maciçamente de
subnutrição e de malnutrição. Recordemos que, nos outros Terceiros Mundos,
tais carências apenas se encontram local-da África. Em todas as regiões
africanas,a ração calórica situa-se nível continua fraco (2420 calorias) (mapa 14).
Por todo olado,igual-mente com a mesma excepção, a alimentação representa a
metade do orçamento das famílias.
No conjunto do Sahel e da África Oriental a ração desce a 2000calorias ou
menos. Em vários Estados, a ração desce abaixo das 1800calorias. Trata-se a
maior parte das vezes de países que foram, ou são nados por regimes de
inspiração marxista (Etiópia, Somália,Moçambique, Angola), ou que fizeram más
escolhas económicas, como a Serra Leoa. Ao contrário, só dois países
ultrapassam as 2500 calorias:a África do Sul e o Gabão, onde «o efeito
petróleo» parece ter-se di-fundido melhor do que nos Camarões uma vez que
este, apesar de um PIB/hab.relativamente favorável, não atinge as 2000
calorias.
A longo prazo a situação não tem tendência para melhorar,bem pelo
contrário. Em 1970, cerca de 100 milhões de pessoas sofriam de malnutrição,
ou seja 35% da população. Hoje, se a percentagem de pessoas mal nutridas se
modificou muito ligeiramente (33%), o seu número total passou para 170
milhões, em virtude do crescimento fulgurante da população. Ao longo dos
últimos dez anos, a produção alimentar progrediu 2% ao ano, enquanto a
população aumentou 3,2%cada ano.
Esta situação é agravada por um estado sanitário muito deficiente.

C) UM ESTADO SANITÁRIO CALAMITOSO


A mortalidade infantil e a esperança de vida, como sabemos, são bons
índices do estado sanitário de uma população, são um e outro muito piores em
África do que nos outros Terceiros Mundos.
A mortalidade infantil regrediu é certo, dado que ela ultrapassava os 150%
em 1965, mas atinge ainda o triste recorde de 93‰;uma criança em cada dez
morre pois antes de um ano, enquanto no mais mal colocado dos três outros
Terceiros Mundos, a Ásia, é uma criança em cada vinte, e no mais bem
colocado, a América Latina, uma em vinte e cinco. Em todas as regiões, à
excepção da África Austral, o índice ultrapassa 80‰ e atinge o recorde de 113
no Sahel, dentre o qual 125 no Mali (mapa 15).
As diferenças são igualmente grandes para a esperança de vida.À nascença
o africano não pode esperar viver mais do que 52 anos,enquanto o asiático
pode esperar viver 13 anos mais, e o latino-ame-ricano mais 16. A Africa Austral
marca ainda excepção, com uma esperança de vida de 59 anos. Nas outras
regiões, esta situa-se à volta dos 50 anos ou abaixo, descendo os países do
Sahel a níveis quase medievais: 48 anos em média, 46 no Mali (mapa 16).

246 - ROBERT CHAPUIS/THIERRYBROSSARD


Se a malnutrição e a pobreza individual explicam uma boa parte destes
resultados desastrosos, outros factores intervêm. Por exem-plo, apenas um africano
em dois tem um acesso rápido à água potá-vel. Os outros não têm acesso senão a
água mais ou menos poluída e ou mais ou menos longínqua, e portanto a uma
higiene forçosamente aproximativa, sem contar que esta situação obriga as mulheres
a in-termináveis e penosos carregamentos de água.
A mediocridade do enquadramento sanitário é também responsá-vel pelo mau
estado da saúde da população. A África apenas dispõe de 1 médico para mais de 16
000 pessoas, quer dizer, cinco vezes menos do que a Asia, oito vezes menos do que o
mundo árabe-muçulmano e quinze vezes menos do que a América Latina. Se
excluirmos a África Austral (1 médico para 7000 habitantes), os números são
absoluta-mente catastróficos: se a África do Oeste e a África Central estão
praticamente na média ou um pouco abaixo, está-se a 1 médico para mais de 21 000
habitantes na África Oriental e 1 para mais de 24 000no Sahel (mapa 17). E a
mediocridade da escolarização não deixa pre-ver rápidos sucessos neste domínio.

D) A ESCOLARIZAÇÃO: PROGRESSOS, MAS AINDA MUITO POR FAZER


Indiscutíveis esforços foram desenvolvidos para escolarizar os jo-vens
africanos.Em 1965, apenas 40% das crianças eram escolarizadas no ensino primário;
hoje são 72% (com as reservas que sabemos a propósito destes números). Na mesma
época, só eram 4% a frequen-tar o ensino secundário; hoje são 24%. O número dos
estudantes es-tava próximo de zero; hoje é de 3%.
Estes progressos são incontestáveis; deixam no entanto a África muito longe dos
outros Terceiros Mundos, simultaneamente porque ela partiu com muito atraso,
porque a preocupação em escolarizar foi menos prioritária e porque os meios
implementados são mais fracos do que noutras partes. Por exemplo, em 1965,
estava-se já próximo de uma escolarização primária total na América Latina, estava-
se perto dos 80% na Ásia e a 60% no mundo árabe-muçulmano, contra 40% em
África.
A verdade é que hoje o atraso continua patente. Enquanto nou-tras
partes a quase totalidade das crianças frequenta, pelo menos a tempo
parcial, a escola primária, o mesmo não acontece com três nos são
relativamente duas vezes menos numerosos em África doque

AÁFRICA: UM TERCEIRO MUNDO ·MAL LANÇADO.-247

248 -ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


uma classe etária são estudantes em África, Bão 7% na Ásia, 14% no
mundo árabe-muçulmano e 19% na América Latina.
A situação é contudo relativamente contrastada de região para região, pelo
menos no referente à escolarização primária: muito máno Sahel onde uma
crança em cada três vai à escola; nitidamente melhor no resto da África onde
oito crianças em cada dez vão à escola e particularmente na África Austral onde
a quase totalidade das crian-ças frequenta a escola primária (mapa 19).
Os progressos da escolarização, que incidem sobre as gerações jo-vens,
ainda não fizeram aumentar sensivelmente o número dos adul-tos
alfabetizados: um pouco mais de cinco africanos apenas em cada dez sabe ler e
escrever. Há um quartó a mais na Asia e no mundo árabe-muçulmano, e 50% a
mais na América Latina. É o Sahel que faz baixar o nível uma vez que aí apenas
um adulto em cada três sabe ler e escrever, contra 50 a 70% nas outras partes
(mapa 18).
A África encontra incontestavelmente nesta subalfabetização e nesta
subescolarização um dos mais sérios obstáculos ao seu desen-volvimento
económico: uma mão-de-obra pouco qualificada, sobretudo tecnicamente, não
encoraja nem o investimento local, nem o investi-mento exógeno. Depara-se
igualmente com um considerável obstá-culo para o abrandamento do seu
crescimento demográfico: a subalfabetização das mulheres (apenas um terço
sabe ler e escrever)e a subescolarização das raparigas (45% menos numerosas
do que os rapazes a irem à escola primária) que é devida, entre outras coisas,à
sua entrada precoce no mercado do trabalho, auguram mal uma desactivação
rápida da bomba demográfica africana. Em termos mais gerais, se se admitir
que a escolarização dos jovens, e particular-mente das raparigas, é o melhor
dos trunfos para o desenvolvimento,a África e os que a ajudam têm grandes
esforços a desenvolver neste domínio.
Subalfabetização, esperança de vida muito fraca, rendimento muito baixo,
está pois tudo reunido para que o índice de desenvolvi-mento humano seja, de
muito longe, o mais fraco dos Terceiros Mun-dos. Rondando os 375 pontos, a
África está nitidamente distanciada pela Ásia que atinge quase 540, pelo mundo
árabe-muçulmano (675)e pela América Latina que, com cerca de 800 pontos, se
encontra a África está por todo o lado entre 260 e 400 pontos, distinguindo-se
o Sahel uma vez mais no mau sentido, com 265 pontos apenas (mapa 22).

AÁFRICA: UM TERCEIRO MUNDO-MAL LANÇADO.-249


Afectada por um crescimento demográfico desvairado, que um
crescimento económico modesto e caótico não consegue acompanhar,presa a
um nível de vida muito baixo, a África aparece pois como um continente
desconjuntado.

IV. UM CONTINENTE DESCONJUNTADO


Uma história longa (pois não é a África o berço da humanidade?)e
complicada deixou a este continente um certo números de marcas que
entravam o seu desenvolvimento, pelo menos tal como tem sido concebido até
hoje.

A) OS LEGADOS DA HISTÓRIA PRÉ-COLONIAL

1. FAMÍLIA E ETNIA

Tradicionalmente, descrevem-se as sociedades africanas como for-madas


por comunidades rurais de base, unidas por laços de linhagem ou pessoais.
Estas comunidades agrupar-se-iam por etnias que te-riam a sua própria língua
e o seu próprio território, utilizado mais ou menos colectivamente. A realidade
é, ao que parece, mais complexa.Segundo J. F. Bayart, a África «era de
preferência organizada em ca-deia de sociedades, estas mesmas sociedades
reagrupadas em espaços subcontinentais de natureza política e guerreira, mas
também cultu-ral, económica e monetária (...). As zonas de difusão das
diferentes línguas autóctones transcendiam as fronteiras étnicas (...). As deli-
mitações destas sociedades transformavam-se sem cessar (...) do mesmo
modo que a sua implantação territorial, por influência de migrações
constantes» [32].
Seja como for, desta história movente e complexa a África conser-vou o
sentido de comunidade, seja ela a família, a linhagem, a etnia ou a tribu. «O
indivíduo africano não é um átomo isolado mas um actor pertencendo a um
grupo alargado, o de uma comunidade (...).O mais grave que pode acontecer a
um africano é a orfandade social,a destruição dos laços com a sua
comunidade(...). Solidariedade,entreajuda constituem processos de regulação
necessários à sobrevi-vência de todos os membros da rede» (Le Monde,
3.10.90).
Esta comunidade, de geometria variável, desempenha um grande papel
social e económico. Serve de segurança social para os pais, de

250-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


seguro de desemprego para os adultos e de estrutura de socialização cie
consideráveis entre indivíduos, entre cidade e campo, entre espa-ços vizinhos.
Deste ponto de vista favorece uma certa repartição das riquezas, mas tem
efeitos perversos.
Com efeito, paternalista, hierarquizada e sexista, a comunidade
égeralmente um factor de conservadorismo social, particularmente em
relação à contracepção: os seus modelos, culturais tendem mais a manter o
statu quo do que a modificá-lo. É igualmente um freio eco-nómico, no sentido
em que o indivíduo que trabalha não tem apenas de manter a família, no
sentido restrito do termo, mas tem também de repartir os seus rendimentos
mais ou menos voluntariamente pe-los inumeráveis parentes e «primos», sob
pena de ter de suportar a vergonha reservada aos ingratos ou a afastarem-se
da comunidade.Moralmente este comportamento é louvável, mas
economicamente torna difícil a poupança e portanto o investimento.
Este elo comunitário tem uma outra consequência capital.«A maior parte
dos conflitos são vividos em termos de pertença tribal,mesmo quando
recobrem desníveis sociais e culturais mais comple-xos» [32]. É o caso das
guerras civis que enlutaram os Camarões,o Zaire, a Nigéria, o Chade, o
Burundi, o Uganda, o Ruanda, Angola.No Burundi, por exemplo os confrontos
étnicos entre Hutus (Nilo--hamíticas) e Tutsis (Bantos), que são agravados por
uma concorrên-cia entre cultivadores e criadores, provocaram 100 000
mortos em 1972 e dezenas de milhares mais recentemente, sem contar 2 500
000 refugiados. A guerra do Biafra teria feito só ela dois mi-lhões de vítimas. E
sabemos que a guerra civil na Somália se deve largamente a estes conflitos
étnicos. Em suma, o subdesenvolvimento mantém e por vezes reforça as
solidariedades tradicionais, e estas contribuem para manter o
subdesenvolvimento.
O outro legado da época pré-colonial tem um peso menor, mas não deixa
de ser um problema sério para a África: trata-se da multiplicidade das línguas.

2. O CONTINENTE DAS 1300 LÍNGUAS

Uma história movente e fragmentada deixou à África um emara-nhado


extraordinário de cerca de 1300 línguas vernáculas que se es-tendem sobre
espaços de dimensão extremamente variada. Nos Ca-marões, exemplo
extremo é certo, 14 milhões de habitantes, falam-se
230 línguas e cada um deve ter uma prática pelo menos aproximativa
de várias delas [32].
Se bem que existam algumas grandes línguas locais veiculares,comerciais,
compreende-se bem que esta dispersão não favorece a comunicação entre os países e
as etnias. Estas línguas estão igual-ou industriais, outra desvantagem para os africanos,
numerosos no mundo rural, que não falam uma língua europeia. «Um dos princi-pais
fracassos para a exportação das novas tecnologias é devida ao facto de os países
ocidentais nunca terem querido fazer o esforço de propor instruções, manuais de
utilização ou simplesmente etiquetas para os produtos de consumo em línguas
acessíveis aos interessados,contentando-se com o francês ou o inglês» [32].
A estas línguas tradicionais virão juntar-se as línguas europeias,trazidas pela
colonização.

B) OS LEGADOS DA COLONIZAÇÃO
Paradoxalmente, a colonização trouxe para a África simultanea-mente elementos
de estruturação e fermentos de desestruturação.

1.ELEMENTOS DE ESTRUTURAÇÃO

As línguas não são o menor contributo do exterior dado a África.Já antes do início
da colonização, a zona do Sahel havia sido progres-sivamente islamizada e tinha pois
adoptado a língua árabe, parcial ou totalmente como no Sudão. O próprio suaíli, de
base banto, havia--se «enriquecido de milhares de influências de origem árabe» [32].
O contributo exógeno essencial veio contudo das línguas europeias,mais ou menos
impostas pelos colonizadores, em particular pelos fran-ceses que, em nome de uma
política de assimilação, impuseram a sua língua como língua oficial, associada
eventualmente a línguas africa-nas ou ao árabe, em todas as antigas possessões
francesas e belgas,Sahel ao Zaire. O mesmo acontece com o inglês no Sul e no Este da
português em Angola e Moçambique, sem contar o africânder na África do Sul.

AÁFRICA:UM TERCEIRO MUNDO -MAL LANÇADO.-251

252-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


Estas línguas contribuíram também para estruturar a África para
aeroportos, telecomunicações permitiram aos povos da África comu-nicarem
melhor entre eles e com o exterior. Implantou igualmente mesmo
reforçaram. Mas alguns destes elementos, e outros, trazidos igualmente pela
colonização, contribuíram para abalar a estrutura da África tradicional.

2.FERMENTOS DE DESESTRUTURAÇÃO
O tráfico dos negros levado a cabo pelos europeus foi muito certa-mente
um dos elementos mais desestruturantes para a Africa. Tanto mais que o
havia precedido um tráfico árabe: praticado sobretudo na África Oriental,
este teria incidido sobre efectivos porventura tão importantes como o tráfico
europeu. Já antes da chegada dos euro-peus, o Sul da Etiópia e a região dos
Grandes Lagos haviam sido es-vaziados pelos mercadores árabes que
vendiam os escravos no Médio Oriente e a escravatura só foi suprimida na
Etiópia em 1936, à che-gada dos italianos! O próprio tráfico europeu,
praticado frequente-mente com a participação dos chefes locais, atingiu
milhões de indi-víduos e contribuiu para esvaziar o Oeste africano e para
desestruturar as sociedades locais.
O outro acontecimento, mais capital ainda para a época recente,foi o
retalhamento da África pelas potências coloniais, oficializada pela
conferência de Berlim em 1885. Este recorte arbitrário, que ignorava os
dados locais, reagrupou por vezes em unidades factícias etnias concorrentes,
culturas diferentes; por vezes, pelo contrário,separou por uma fronteira
artificial entidades que tinham tido até aíuma realidade colectiva, quer ela
fosse cultural, étnica ou histórica.
A Nigéria é o verdadeiro exemplo destas construções artificiais: ao lado
dos Haussas, dos Iorubas e dos Ibos, que formam 55% da popula-ção,
encontra-se uma massa de outros povos diferentes e concorrentes.Outro
caso, os Camarões onde, à complexidade linguística referida mais acima, se
sobrepõe uma extraordinária complexidade étnica (uma cen-tena de etnias)
e religiosa: o islão coexiste com o animismo e com ou-tras religiões. Alguns
destes povos camaroneses transbordam para ládas fronteiras e reencontram-
se no Gabão e no Congo.
se tivesse havido reestruturações no momento das independências.Mas
estas não foram realizadas.
C) A INDEPENDÊNCIA: UMA BALCANIZAÇÃO ACEITE
Foi em 1963 que a Organização da Unidade africana (OUA), que acabava de
nascer, proclamava «a intangibilidade das fronteiras her-dadas da descolonização». O
medo de uma multiplicação das reivindi-cações territoriais e portanto de inevitáveis
guerras civis ou exterio-res foi mais forte do que o desejo de novo recorte que
poderia ter reconhecido os direitos de certas etnias maltratadas pelas delimita-ções
coloniais.
Esta decisão fez pois da África um puzzle de 47 Estados sobera-nos, dos quais 6
totalizam menos de 1 milhão de habitantes, 18 mais de 10 milhões e apenas dois
mais de 50 (Etiópia e Nigéria). Nestas condições, os mercados locais, já limitados
pelos baixos rendimentos,são ainda amputados pela dimensão reduzida das
populações nacio-nais. As economias da maior parte dos países africanos
dificilmente podem contar com um mercado interno que as estabilizaria, mas são
obrigatoriamente dependentes ou dos seus vizinhos ou dos mercados mundiais. Esta
dependência económica é acompanhada por uma de-pendência política de que já
vimos o exemplo com a zona franca.Para limitar esta dependência económica e
política, os Estados africanos criaram efectivamente estruturas de colaboração e de
cooperação,mas estas apenas tiveram, até à data, resultados limitados.
A mais conhecida destas organizações é a OUA que fixa como objectivo reforçar a
unidade, a solidariedade e a estabilidade dos Es-tados africanos independentes.
Vimos que uma das primeiras medidas consistiram em imobilizar os Estados dentro
das suas fronteiras coloniais. Desde então, a sua acção foi relativamente limitada, em
virtude dos interesses divergentes dos diferentes Estados e dos regi-mes
contrastados de que África se dotou, uma vez que estes iam do «socialismo
científico» etíope ao Império de Bokassa na República Centro-Africana. O seu papel
parece no entanto vir a afirmar-se desde há alguns anos para cá.
Menos conhecidas são as instituições que visam promover a integração e a
cooperação regionais. São numerosas, cerca de 200,mas a sua eficácia é limitada
devido ao facto de os poderes públicos,em delegar qualquer poder e em cumprir as
obrigações financeiras que daí decorrem.
Os melhores resultados foram obtidos pela CEAO (Comunidade Faso,
pela Costa do Marfim, pela Mauritânia, pelo Níger e pelo

AÁFRICA:UM TERCEIRO MUNDO-MAL LANÇADO.- 253

254-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


Senegal. Ela conseguiu uma melhor integração e uma certa especiali-zação das
economias, facilitando por exemplo os movimentos de mão--de-obra do Sahel
(Burkina Faso e Mali) para os países mais ricos do litoral(Costa do Marfim,
Senegal). As transacções progrediram,ainda que não representem hoje mais
de 10% do comércio total. Estes pro-gressos foram facilitados pelo facto de os
países da CEAO perten-cerem à UMOA (União Monetária Oeste-Africana), que
está ela própria ligada à zona franca.
Determinadas instituições, destinadas a regular problemas parti-culares,
foram relativamente bem sucedidas, como o programa de luta contra a
oncocercose (parasitose que atinge a pele e os olhos) ou a criação de centros
de formação e de investigação regionais.
A SADC (em francês: Comunidade de Desenvolvimento da África Austral)
que tinha por objectivo, à partida, reduzir os elos económicos dos vizinhos da
África do Sul com este país, conheceu igualmente algum sucesso. Tinha
estabelecido como objectivo a rea-lização de projectos concretos nos sectores
da indústria e dos trans-portes, reforçando, por exemplo, os eixos Este-Oeste,
enquanto os eixos tradicionais vão sobretudo na direcção da África do Sul. Mas
a SADC,materialização da «linha de frente» contra a África do Sul racista,
reorientou a sua acção com o fim do apartheid, a normaliza-ção das relações
entre negros e brancos na África do Sul com a to-mada do poder por Mandela
em 1994 e a eliminação dos regimes socialistas de Angola e de Moçambique. A
normalização das rela-ções com a África do Sul deveria trazer o início de uma
era de rápido desenvolvimento para toda a África Austral. Agrupa dez
Estados,que vão de Angola e do Malávi à África do Sul, conta 140 milhões de
habitantes e, desde já, «domina economicamente o continente subsariano»
[20].
As outras tentativas de cooperação foram muito menos frutuosas.A
CEDEAO (Comunidade Económica dos Estados da África do Oeste), criada em
1975 e que conta hoje 15 Estados que vão do Níger e da Nigéria à costa
ocidental, não fez nenhum progresso e até regrediu,uma vez que em 1981 è
1983 a Nigéria expulsou mais de 1 milhão de trabalhadores do Gana que, no
entanto, aderia a esta organização.Quanto à Comunidade da África do Leste
abrandou a sua actividade nos finais dos anos 1970 na sequência das
divergências políticas e dos conflitos de interesse entre Quénia, Uganda e
Tanzânia. A ZEP,África Austral, que se estende do Corno da África ao Zimbabué,
tem dificuldade em arrancar. O mesmo se passa com a Comunidade Econó-
mica dos Estados da África Central e com a Comunidade Económica
dos países dos Grandes Lagos.
O balanço global é finalmente decepcionante uma vez que o peso mesmo que há
20 anos atrás. Entre a SADC e o resto da África sub-e 11% das exportações da SDAC
[20]. A democratização em curso permitirá estreitar os laços políticos e económicos
entre os Estados africanos?

D) A«PRIMAVERA DA ÁFRICA»?

Uma das outras consequências da independência foi ter-se assis-tido ao


florescimento, sobre as ruínas do regime colonial, de um can-teiro de regimes
pessoais, autoritários, apoiados em partidos únicos,todos mais ou menos camuflados
sob os ouropéis marxistas, socialis-tas,nacionalistas ou mesmo imperiais. Pensava-se,
tanto em África como na Europa, que era preciso passar por regimes autoritários para
assegurar a cada país a independência política, a recuperação e a au-tonomia
económica, a justiça social, a unidade contra os riscos de explosão internos devidos à
diversidade étnica. Consequência: «o chefe governa sem restrições. Não há segundo,
nem delfim. Herança da tradição dos reinos, resposta às necessidades de uma época-a
in-fância dos Estados pós-coloniais - o culto do chefe infalível,oferecido à adulação
popular, do guia de destino traçado pela providência(...)não desaparecerá de
imediato» (Le Monde, 27.05.90).
Sabemos o quanto esta situação foi utilizada para criar clientelas,avolumar
fortunas pessoais, fazer despesas de prestígio. A imensa catedral de Yamassoukro, na
Costa do Marfim, inaugurada pelo papa em 1991 é, deste ponto de vista, duplamente
simbólica uma vez que se trata de um investimento pesado, economicamente pouco
útil e paga em boa parte do cofre pessoal do presidente, o que deixa suben-tender
que o cofre estava bem recheado. Os chefes infalíveis não ti-nham de resto
assegurada uma estabilidade definitiva, dado que se contaram nada menos do que
oitenta golpes de estado em 30 anos!
Em 1990, apenas cinco países em 47 eram verdadeiras democra-cias: Botsuana,
Gâmbia, ilha Maurícia, Namíbia e Senegal.Quatro destes países tinham menos de 1,5
milhão de habitantes e, no total,não representavam senão 2% da população africana!
Em 1990, na Conferência de Arusha (Tanzânia) consagrada ao programa das Na-

AÁFRICA: UM TERCEIRO MUNDO -MAL LANÇADO.-255

256-ROBERT CHAPUIS/THIERRYBROSSARD
çōes Unidas para a recuperação económica da África, um delegado da pois
da independência, devemos render-nos à perturbadora evidên-
contribuição importante para as orientações nacionais. Os direitos estão
cada vez mais ausentes da cena africana»(Le Monde, 13.03.90).
No entanto, a partir 1989-1990, «a África passou pelo “efeito Gorbatchev”e pelo
“efeito Ceausescu” conjugados para a sua salva-ção: o primeiro liberta a palavra,
restaura a verdade, reanima a de-mocracia; o segundo acusa as ditaduras familiares,
fragiliza os pode-res pessoais, faz reflectir os chefes» (ibid.). E não apenas os
chefes...Mas também os estudantes, os citadinos das classes médias e popula-res que
reclamam a reunião de «conferências nacionais». Estas, espé-cies «de Estados gerais à
africana congregam partidos, Igrejas, asso-ciações e sindicatos» e reclamam liberdade,
multipartidarismo e economia de mercado. O Benim deu o exemplo em 1990, seguido
pelo Gabão, Congo, Mali, Níger, Zaire, etc. Mais de vinte Estados têm cons-tituições
que reconhecem o multipartidarismo e organizaram as elei-ções. Uma dezena de
ditadores caíram. Raros são os Estados que es-capam, pelo menos provisoriamente a
uma questionação de um poder presidencial autoritário. No entanto, a situação está
longe de estar estabilizada. «Assiste-se a reviravoltas contra dirigentes eleitos, que não
cumpriram as suas promessas, ou que não souberam afrontar as dificuldades (...)
golpes de Estado no Níger, insurreições na República Centro-africana, na Guiné.» [20].
Poder-se-ia acrescentar: guerra civil no Zaire. Na Nigéria, as promessas dos militares
não foram mantidas:estes continuam a dispor do poder.
Esta«segunda independência» da África não decorre pois sem turbu-lências. Ela
também não resolverá de uma vez só todos os problemas,não mais do que a primeira
não o tivesse feito. Os riscos de explosões internas e de fricções externas são
evidentes. O dogma da integridade territorial dos Estados saídos da descolonização
começa a ser contes-tado, como na Somália onde o Movimento Nacional Somali
proclamou uma《República da Somalilândia» e na Etiópia onde a Eritreia obteve a sua
independência em 1993. Cerca de vinte países estão sob a amea-tários têm contido
até aqui ou utilizaram em seu beneficio.
nifesta em África é infelizmente a de uma pobreza generalizada,salvo raras
excepções.

AÁFRICA: UM TERCEIRO MUNDO -MAL LANÇADO.- 257


V.OS ESPAÇOS REGIONAIS:
A ÁFRICA AUSTRAL E O RESTO...
A África, como tivemos frequentemente ocasião de notar, apre-senta traços
comuns incontestáveis ao mesmo tempo na sua evoluçāo demográfica, no seu
desenvolvimento económico, no seu nível de vida e no seu comportamento
sociocultural. Tirando uma excepção, na verdade, e que é significativa, da África
do Sul e, num menor grau, de alguns dos seus vizinhos que reagrupámos numa
África Austral.

A) A ÁFRICA AUSTRAL: O 《 CENTRO» SUL-AFRICANO E A


SUA《PERIFERIA》
1. A ÁFRICA AUSTRAL:
GLOBALMENTE DIFERENTE, MAS COM MATIZES
Incluiu-se na África Austral, a África do Sul, assim como o Lesoto e a
Suazilândia, encaixados no seu território, e os Estados que lhe estão
economicamente mais estreitamente ligados, quer dizer,o Botsuana, a Namíbia,
o Zimbabwe, a Zâmbia. Juntámos-lhe Angola,tradicionalmente incluída na África
Austral, mas cujo desenvolvi-mento actual está muito aquém do dos outros
países.
Tomado globalmente, este conjunto com mais de 70 milhões de habitantes é
diferente do resto da África num certo número de pon-tos (quadro 10). Nas suas
estruturas económicas antes de mais.A agricultura, que se tornou marginal no
PNB (menos de 10%), nāo emprega mais do que um pequeno terço dos activos.
A indústria,pelo contrário, ocupa 50% mais trabalhadores do que em qualquer
outra parte da África e, juntamente com as minas, fornece perto de metade do
PNB (entre os quais 26% só para as indústrias manufactureiras).O sector
terciário ocupa perto de metade da mão-de-obra e gera cerca de metade do
PNB. Esta África Austral, além disso forte consumidora de fertilizantes (5 vezes a
média africana) e de energia (20 vezes a média), bem dotada de estradas, pouco
endividada, forte exportadora de produtos transformados (aproximadamente
três quartos do total das exportações) e usufruindo de um PNB de mais de
2200$, apre-senta, em suma, uma estrutura económica próxima da da América
Latina e, logo, dos países desenvolvidos da parte inferior do quadro.
As diferenças de nível de vida, em relação ao resto da África, são menos
nítidas mas são-no indubitavelmente para os rendimentos reais que são três
vezes mais elevados do que noutros lados, para a motorização que é doze vezes
superior, para o enquadramento médico
que é duas vezes melhor. O índice de desenvolvimento humano ultra-nos. A melhor
alfabetização ultrapassa a média, a escolarização é aímelhor do que nas outras regiões
africanas e a ração calórica supera sensivelmente a média africana.
Enfim, a estrutura e a evolução demográficas estão ainda mais próximas da média
africana. A fecundidade, inferior à média, man-tém-se no entanto elevada (cerca de 5
filhos por mulher), da mesma forma que a mortalidade infantil (60‰), e a população
continua a crescer quase tão rapidamente como a média africana pois a mortali-dade
geral baixou mais do que em qualquer outra parte. Apenas a esperança de vida
ultrapassa nitidamente a média.
Estes resultados, geralmente pois melhores do que no resto da África,devem-se
evidentemente à África do Sul, potência dominante da região, cujos desempenhos
aumentam as médias de toda a África Austral. Todavia, vamos constatar que o
desenvolvimento sul-afri-cano difundiu-se em seu redor e que os seus vizinhos
também têm,frequentemente, um melhor desempenho do que a média africana.

2. A ÁFRICA DO SUL:«PROA DO ANTIGO MUNDO》 (V.PRÉVOT)

A África do Sul constitui um caso à parte no continente. Lugar de encontro dos


Bantos vindos para aqui no século xv, dos colonos africânderes calvinistas chegados a
partir do século xvII e dos capita-listas anglo-saxões, sem contar os Indianos, é
plenamente africana pelos três quartos da sua população. Mas é também uma espécie
de «proa do Antigo Mundo», pela sua cultura tecnicista sem equivalente em África,
pela parte europeia da sua populaçāo (15%) e pela posição estratégica que ocupa
enquanto guardiā da rota marítima do Cabo,produtor de ouro, de diamantes e de
minérios estratégicos.
A África do Sul é igualmente a única verdadeira potência econó-mica do continente
negro, mas uma potência frágil devido às seque-las deixadas por décadas de apartheid
e pelas incertezas que pairam sobre o futuro, apesar da chegada ao poder de Mandela.
Com mais de Etiópia. Mas o seu poder económico não tem termo de comparação três
vezes mais povoada, e além do mais, produtora de petróleo.Com da Nigéria e equivale
a mais de metade do do resto da África. O seu

AÁFRICA:UM TERCEIRO MUNDO-MAL LANÇADO.-259


poder é simbolizado por grandes firmas como De Beers, Anglo--American
Corporation, etc., onde entram para um bom terço capitais americanos,
ingleses, franceses e belgas. Estas duas grandes firmas lançaram, em 1988, a
maior OPA da história da City de Londres (6mil milhões $) sobre um grupo
mineiro e a De Beers controla 90% da produção mundial de diamantes (L. J.
Grégoire, PE, n.° 2205).
A África do Sul é um verdadeiro NPI, bastante comparável ao Brasil, ao
México, à Coreia do Sul ou a Taiwan. Foi, até aos anos 30,essencialmente um
produtor de matérias-primas. Continua a sê-lo ainda hoje pois é o 1.°
produtor do mundo de ouro (23% do total),de platina (90% das reservas
mundiais), de crómio (mais de metade das reservas), 3.° de manganés (80%
das reservas), 5.° de diamantes (um quarto das reservas) e de carvão (3.°
exportador mundial), 8.° de urâ-nio (20% das reservas) etc. Ela produz mais
electricidade do que a Espanha e o México.
Desde os anos 30, e sobretudo nos anos 60 e 70, o Estado,as em-presas
privadas nacionais e internacionais beneficiaram da mão-de--obra barata para
praticar uma política de substituição de importa-ções, no intuito de satisfazer
antes de mais o mercado nacional e,em seguida, de conquistar posições nos
mercados dos países vizinhos.
As sanções aplicadas pelo mundo ocidental a partir de 1983 e que
provocaram uma fuga de capitais (um terço das empresas estrangei-ras
deixaram o país a partir de 1985), a perda de 500 000 empregos e 15%
aproximadamente que se deixou de ganhar, segundo L. J.Grégoire, obrigaram,
em contrapartida, a Africa do Sul a acentuar a sua política de substituição de
importações. Por exemplo, desenvol-veu um processo que lhe permite
produzir carburante sintético a partir de carvão e do gás natural e satisfazer
assim 40% do seu consumo.Teve igualmente de desenvolver uma indústria de
armamento e, de fortemente importadora, passou a ser exportadora.
Multiplicou igual-mente os seus investimentos no estrangeiro numa dezena
de anos.Desde 1994, os investimentos estrangeiros estão de volta, em parti-
cular nas minas.
A África do Sul dispõe, portanto, hoje, de uma gama bastante com-pleta
de sectores industriais: o agro-alimentar (14% do valor indus-trial), a química
(13%), a construção automóvel (9%), o têxtil, o cal-çado, a informática, a
electrónica... Produz igualmente 9 milhões de toneladas de aço (o equivalente
de metade da França), 170 000de toneladas de alumínio (metade da
produção francesa), cobre,chumbo, níquel, etc.
Um quarto da mão-de-obra trabalha na indústria e nas minas e estas duas
actividades criam mais de 40% do PNB. Os serviços ocupam

260 - ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD

AÁFRICA: UM TERCEIRO MUNDO-MAL LANÇADO.-261


60% da mão-de-obra e criam mais de metade do PNB, números dig-nos de países
desenvolvidos. A parte do sector agrícola detida pelos brancos apresenta um
desempenho bastante bom. Permite satisfa-zer as necessidades internas e vender
excedentes ao exteriortais como os vinhos, citrinos, milho e naturalmente a lã de
que o país é um dos grandes produtores mundiais. Aagricultura no seu conjunto não
ocupa mais do que 14% da população e não fornece senão 5% do PNB.
Economicamente, a África do Sul é pois uma potência importante no xadrez
mundial e o levantamento das sanções internacionais, se-guida da abolição do
apartheid em 1991, e da eleição de Mandela vol-tam doravante a conectá-la
inteiramente no sistema-mundo. A data,as exportações representam 20% do seu
PNB, e a sua balança comer-cial é beneficiária. Mas as consequências sociais e
políticas do apartheid não estão perto de estarem apagadas dado que os bons de-
sempenhos económicos não beneficiaram senão uma margem da po-pulação.
Com efeito, se o PNB/hab. do conjunto da população era de cerca de 2500$ em
1990, estimava-se o dos brancos em 7500$, o dos asiá-ticos em 3250$, o dos
mestiços em 1650$ e, por fim, o dos negros em 650$. Mesmo tendo em conta o
facto de que o sector informal,não contabilizado, estar nas mãos dos negros, o
rendimentos destes últi-mos deve ser dez vezes inferior ao dos brancos.
Actualmente ainda o salário médio das famílias negras é 18 vezes mais fraco do que
o das famílias brancas e o desemprego é cinco vezes mais elevado. Em suma,apenas
um quarto da população beneficiou verdadeiramente com o progresso económico.
A população negra couberam mesmo assim al-gumas migalhas: o seu rendimento
representa cerca do dobro do da população das outras regiões africanas e parece
que as diferenças de salário entre brancos e negros se estreitam actualmente. Mas 7
mi-lhões de negros vivem ainda em squats e em bairros de lata.
Esta pobreza da população negra pesa sobre a maior parte dos critérios
demográficos e sociais da África do Sul: fecundidade que continua forte (mais
de 4 filhos por mulher) e logo aumento ainda rápido da população (2,2% ao
ano), mortalidade infantil elevada (50‰), alfabetização ainda baixa (80%).
Apesar de tudo estes resul-tados continuam a ser, ainda neste caso, melhores
do que nos ou-tros países. Da mesma forma a esperança de vida é
nitidamente bastante superior,bem como a ração calórica. O índice de
desenvol-vimento humano, que atinge 650 pontos, ou seja, duas a três vezes o
das outras regiões africanas, confirma que o nível de vida da pró-pria
população negra é ligeiramente mais elevado do que nas outras
beneficiado um pouco economicamente da sua vizinhança com a
África do Sul.

3.A PERIFERIA SUL-AFRICANA

As infra-estruturas que ligam a África do Sul aos seus vizinhos são


incomparavelmente mais densas do que as que os ligam aos seus vizinhos do
Norte. Apesar das tentativas para isolar a Africa do Sul,as relações entre esta e
os seus vizinhos prosseguiram. Há pois uma verdadeira integração das
economias da África Austral. Não fale-mos da Namíbia, que as estatísticas sul-
africanas contabilizavam nos números nacionais antes da independência e que
continua pois fortementee integrada, mesmo depois da sua independência.O
mesmo acontece com o Lesoto e a Suazilândia, incluídos no territó-rio sul-
africano, que realizam com este entre 80 e 100% do seu co-mércio exterior. O
Botsuana, embora não seja um enclave, encontra-se numa dependência
económica equivalente. O Zimbabwe, ex-Rodésia do Sul, onde se mantém uma
minoria branca, exporta ainda dois ter-ços dos seus produtos para o grande
vizinho e dele importa metade das suas necessidades. Para o Malávi, os
números são ainda de 60%para as exportações e de 40% para as importações e
para a Zâmbia,ex-Rodésia do Norte, respectivamente de 40 e 10%.
Esta integração económica beneficiou de forma desigual os países vizinhos.
Teve efeitos benéficos para o Lesoto e a Suazilândia,que trabalhadores
empregados nas minas: metade dos rendimentos do Lesotho proviriam das
remessas dos emigrantes. A Suazilândia be-neficiou indirectamente com as
sanções tomadas relativamente a África do Sul, dado que foram instalar-se
lámultinacionais para con-tinuarem a comerciar, sem furarem oficialmente o
embargo... A in-dústria detém pois aí uma certa posição e o nível de vida é mais
elevado do que nos outros países (IDH de 580 pontos e PIB real superior a
2900$). O caso do Zimbabwe, que possui a mais desenvolvida e diversificada
indústria depois da África do Sul, é bastante compará-vel; o mesmo acontece
com o Botsuana, embora este deva muito às suas minas de diamantes, de
níquel e de cobre. A Zâmbia está um pouco atrasada economicamente. Em
contrapartida, Angola, arrui-nada pela guerra, faz figura de parente pobre que,
do ponto de vista do nível de vida, liga-se de preferência ao resto da África.

262-ROBERTCHAPUIS/THIERRY BROSSARD

AÁFRICA: UM TERCEIRO MUNDO ·MAL LANÇADO.-263


B) O RESTO DA ÁFRICA: A UNIFORMIDADE NA POBREZA

O quadro 10 mostra bem a uniformidade dos desempenhos das outras regiões


africanas. Por toda a parte, à excepção da África Oci-dental, seis activos pelo menos
em cada dez são agricultores, contra um apenas na indústria manufactureira que
nunca cria mais do que 20% do PNB. Por todo o lado se verifica um PNB/hab. inferior a
360$,um consumo de energia inferior a 150 kg de equivalente petróleo e uma dívida
sempre pelo menos equivalente ao PNB. Por todo o lado ainda uma fecundidade
quase natural (mais de 6 filhos por mulher),uma criança em cada dez
aproximadamente que morre antes de um ano, uma esperança de vida de cerca de
cinquenta anos no máximo.Por todo o lado, enfim, uma escolarização medíocre, uma
subnutrição generalizada, um enquadramento médico insuficiente, um índice de
desenvolvimento humano particularmente fraco.
Mas no meio deste panorama sombrio, uma brecha ainda mais som-bria, os países
do Sahel, nos quais incluímos não somente aqueles que habitualmente fazem parte
dele (Burkina Faso, Gâmbia, Mali,Mauritânia, Níger, Senegal e Chade), mas também
aqueles que, na África Oriental lhes podem ser comparados pelo clima por vezes, pelo
nível de vida sempre, quer dizer Djibuti, a Etiópia, a Somália e o Sudão.Em todos os
pontos de vista, estes países do Sahel alargado estão cons-tantemente em atraso em
relação aos seus vizinhos no entanto já bas-tante mal dotados. As diferenças são
particularmente acusadas por certas características demográficas (mortalidade infantil
que ultrapassa 110%, esperança de vida de 48 anos) e por certos critérios de nível de
vida: escolarização muito fraca, sobretudo no ensino primário,enquadramento médico
catastrófico (1 médico para mais de 24 000pessoas), IDH ultrapassando por bastante
pouco os 250 pontos...
As guerras, a instabilidade política, as más escolhas económicas,os preços
erráticos de certos produtos juntaram-se aos condicio-nalismos naturais que pesam
sobre estes países geralmente mal do-tados em recursos naturais e aventurados às
margens de um deserto que,desde 1968, parece expandir-se para Norte na sequência
de uma série excepcional de anos secos. Neste conjunto, apenas o Senegal,numa
posição de transição entre a estepe e a savana, sai-se geral-mente melhor do que os
outros, como prova o seu PIB real por habi-tante que atinge os 1700 $. Em
contrapartida, a Etiópia e a Somália registam sistematicamente resultados
catastróficos.
Entre as três outras regiões que foram definidas, é a África Oriental que apresenta
o nível de desenvolvimento mais medíocre.
Raramente supera o Sahel. Tão agrícola e tão pouco terciária como uma
densidade de população mais elevada, uma mortalidade infantil nos
desesperante. O próprio nível de vida é geralmente ligeiramente mais elevado
(100 pontos a.mais no IDH), mas não sistematicamente,uma vez que as rações
calóricas são idênticas e o PIB real quase se-melhante aos do Sahel.
As diferenças entre os países da África Oriental são fracas, tirando os casos
particulares da Reunião, sustida através de subsídios pela metrópole, e da ilha
Maurícia, cuja população, 70% de origem indiana,consegue através de uma
habilidade política económica atingir um PNB/hab. de 3600$. Entre os outros
países, o Quénia vai-se salvando,em particular graças ao turismo. Devido à sua
população (28 milhões de habitantes), e a um certo poderio económico (5.° PNB
da África)e ao seu prestígio internacional, faz figura de líder nesta parte da
África.
A África Ocidental e Central estão muito próximas uma da outra,sendo a
segunda muito mais bem dotada do que a primeira em petró-leo e em minas
diversas. Um e outro são menos agrícolas do que as regiões precedentes e o
peso das minas e da energia é aí mais conside-rável. A sua estrutura e a sua
evolução demográfica são totalmente comparáveis e os seus níveis de vida
bastante próximos. As diferen-ças entre Estados são todavia um pouco maiores
do que nas regiões precedentes.
Na África Ocidental, a Guiné, a Libéria e a Nigéria distinguem-se pelo papel
que desempenha o petróleo e as minas na sua economia, a Costa do Marfim por
uma relativa industrialização e um PIB real sensivelmente mais elevado do que
nos outros países (1600 $),en-quanto o Gana e a Serra Leoa se distinguem no
sentido contrário.Na Nigéria, graças à massa da sua população (127 milhões de
habitan-tes) bem como ao seu petróleo (perto de 100 milhões de toneladas)
e,em menor medida, a Costa do Marfim aparecem como as potências
dominantes da região.
Na África Central, estaríamos à espera de ver o Zaire dominar a região pela
sua massa demográfica (44 milhões de habitantes) e eco-nómica, uma vez que é
um dos países mais bem dotados da África.Ora a economia do Zaire,
desarticulada, tem-se arruinado.O PIB real (300$ por habitante), o
enquadramento médico e o IDH encontram--se entre os mais baixos da África e,
portanto, do mundo. Belo exemplo de potencialidades desperdiçadas. É pois
antes o Gabāo que faz

264-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD

AÁFRICA: UM TERCEIRO MUNDO-MAL LANÇADO.-265


figura de país rico graças ao seu petróleo e a uma população relativa-mente
bem escolarizada. Com um PIB real que ultrapassa 3860$ c um IDH de mais e
550 pontos, supera bastante nitidamente os seus vizinhos.

CONCLUSÃO
Incontestavelmente, «a África negra está mal lançada».Em certos casos,
perguntamo-nos mesmo se ela alguma vez chegou a lançar-se.Noutros casos,
depois de um arranque nos anos 60 e no início dos anos 70, estancou a meio do
caminho, vítima ao mesmo tempo dos outros e de si própria.
O desastre não é geral pois determinados países conseguem sair--se um
pouco melhor. E alguns elementos permitem ter esperança.Depois de ter vivido
acima dos seus meios, a África volta a ter mais rigor na gestão da sua economia,
mas na verdade ela paga caro este retrocesso e num momento de viva
concorrência internacional.A África compromete-se na democracia e na
economia de mercado;serão trunfos incontestáveis, na condição de não cair
nem na anar-quia, nem num liberalismo selvagem. Na África Austral, se a trans-
missão de poder da minoria branca para maioria negra continuar sem
demasiados sobressaltos e se as facções negras não se dilacera-rem
mutuamente, poderia desenvolver-se uma esfera de co-prosperi-dade em torno
da potência económica da África do Sul. Após uma cura de austeridade, a
produção voltou a arrancar em vários países desde 1994, assim como vimos
mais acima.
Mas a África terá necessidade de ser ajudada directamente: assis-tência em
alguns dos seus esforços (escolarização, formação, irriga-ção, etc.), aliviamento
da sua dívida, apoio concedido aos preços de certos produtos (como no âmbito
dos acordos de Lomé com a CEE),bem como à sua moeda (exemplo da zona
franca), etc., mas a África terá também de se ajudar a si mesma tentando, tal
como fizeram certos países da Ásia, conciliar valores tradicionais (em particular
o sentido de solidaridade) e eficácia económica, tentando, em suma,ser mais
eficaz sem no entanto perder a sua alma.

CONCLUSĀO GERAL-267
CONCLUSÃO GERAL

No termo deste estudo, podemos colocar-nos quatro questões.


O Terceiro Mundo tem ainda uma unidade? A causa parece hoje largamente
admitida: a resposta é negativa.
Quantos Terceiros Mundos recensear? Em certa medida cada país é um caso à
parte, mas se quisermos proceder a agrupamentos geográficos coerentes, quatro
Terceiros Mundos pelo menos parecem impor-se, com todos os matizes e por vezes
mesmo todas as excepções que foram sendo assinaladas oportunamente. Quatro pelo
menos,porque a Ásia, em virtude da sua própria massa e das suas grandes divisões
culturais, poderia ser rapidamente separada em três conjun-tos (Mundo chinês, Mundo
indiano, Sudeste asiático) derivando a di-ferentes velocidades, sem contar os dragões que
vogam já ao largo dos países desenvolvidos.
Outros países e outros conjuntos não seriam de anexar doravante ao T'erceiro
Mundo tradicional? Poder-se-á ter dúvidas relativamente à Ásia central ex-soviética, que
poderia ser ligada a um conjunto com-preendendo o Afeganistão e sobretudo o Irão. No
que diz respeito àEuropa de Leste e à ex-URSS não muçulmana, em plena decomposi-
çāo/recomposição, a sua cultura tecnicista permitir-lhes-á certamente juntarem-se mais
rapidamente ao pelotão dos países desenvolvidos do que os Terceiros Mundos a que aqui
fazemos referência, à excep-ção porventura da América Latina.
A noção de Terceiro Mundo, mesmo que a expressão seja posta no plural,terá ainda
sentido? Não seria preferível, doravante, partir da constatação de que o mundo está
dividido numa dezena de áreas geo-gráficas (compreendendo aí a Europa ocidental, a
América anglo-

268-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


-saxónica, o Japão e a Austrália) no pleno sentido do termo geográ-fico,isto é,
de áreas produzidas por sociedades inscritas num espaço e filhas de uma
história? Que estas áreas são economicamente mais ou menos desenvolvidas,
é uma evidência. Que elas dispõem de um poder de dominação económica
desigual, não se pode negar. Mas a imagem de um mundo dividido entre um
Norte desenvolvido e domi-nante, e um Sul subdesenvolvido e dominado
afigura-se cada vez mais sumária. A realidade é muito mais complexa, e sê-lo-á
mais ainda no futuro.

268-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


BIBLIOGRAFIA

AS PRINCIPAIS OBRAS CITADAS OU DIRECTAMENTE UTILIZADAS:

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[19] GOUROU, P.,Terres de Bonne Espérance, le monde tropical, 1982, Paris, Plon.
[20] Images économiques du monde, 1996-1997,Paris, Sedes.

BIBLIOGRAFIA-269
[21] KAYSER,B.,Géographie: entre espace et développement,1990,Toulouse,Presses Universitaires
du Mirail.
[22] LACOSTE,Y.,Contre les anti-tiers mondistes (et contre certains tiers-mondistes),1986,Paris, La
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[23] Le nouvel état du monde: bilan de la décennie 1980-1990, 1990, Paris, la Découverte.
[24] L'état du monde, 1997, Paris, La Découverte.
[25] L'état du tiers monde, 1989,Paris, La Découverte.
[26] Le tiers monde (ou la fortune d'un jeu de mots), 1988, APHG, Pays de la Loire.
[27] MESSAROVITCH, Y., VALLAUD P. (dirigido por), L'économie internationale en
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[30] SOPPELSA,J. (dirigido por), Léxique de géopolitique, 1988, Paris, Dalloz.


[31] Sortir du tiers monde, 1991, Espaces Temps 45/46.
[32] Théma,Encyclopédie régionale, 1992, Paris, Larousse.
[33] TROTIGNON,Y.,Les pays en dévéloppement face au XXe siècle, 1987, Paris Dunod.
[34] VELLAS, F., Le Tourisme, 1992, Paris,Economica.
[35] LEONARD, Y. (dir.), Les Tiers Mondes, 1995, Paris, Les Cahiers français,n.°270.

PRINCIPAIS JORNAIS E REVISTAS

Cahiers d'Outre-Mer (COM)


Hérodote (HE)

Le Monde
Le Monde Diplomatique
Problèmes d'Amérique latine (PAL)
Problèmes économiques (PE)

Revue Tiers Monde

270-ROBERT CHAPUIS/THIERRY BROSSARD


ÍNDICE DOS QUADROS

1 - A superficie dos Estados 30


2 - População dos Estados em 1995 31
3 - Percentagem do rendimento das famílias por fatias de rendimento .. 37
4 - Alguns indicadores relativos aos Terceiros Mundos .................... 78
5 - Os quatro mundos do Terceiro Mundo: indicadores 87
6 - Percentagem do rendimento das famílias por fatias de rendimento na América Latina. 103
7 - Os espaços regionais da América Latina: indicadores. 120
8 - Os espaços regionais do mundo árabe-muçulmano: indicadores...166
9 - Os espaços regionais na Ásia: indicadores 214
10 - Os espaços regionais em África: indicadores 258

INDICE DOS QUADROS-271

ÍNDICE DAS FIGURAS -273


ÍNDICE DAS FIGURAS -273
ÍNDICE DAS FIGURAS

1 - População (1995) 31
2 - A transição demográfica (1995) 33
3 - Fecundidade (1992) ..344 - PNB por habitante (1995)
..36
5 - Motorização (1993) 39
6- Escolarização (1993) 41
7 - Alfabetização(1995) 42
8 - Situação alimentar (1992) 43
9 - Esperança de vida (1993) 44
10 - Mortalidade infantil (1994) 45
11 - Enquadramento médico 46
12 - Fecundade e mortalidade infantil(1995) 49
13 - Indicador do desenvolvimento humano (1993) 50
14 - População urbana (1992) 50
15 - PNB total (1995) 61
16 - Repartição da população activa por sectores económicos (1995) 63
17 - AFC: Nível de desenvolvimento económico. 80
18 - AFC: Nível de vida 82
19 - AFC:Demografia. 83

ÍNDICE DAS FIGURAS -273


ÍNDICE DAS FIGURAS -273

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