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Resumo
Já em 1915, Alberto Torres indicava a formação de uma consciência nacional como uma das
tarefas mais urgentes a ser realizada pelos intelectuais3. A idéia do desenvolvimento do
sentimento de identidade nacional espalhou-se pela sociedade brasileira por meio da formação
de associações, como a Liga de Defesa Nacional, dirigida por Olavo Bilac, de literatura e de
publicações como a Revista do Brasil, além de fundamentar movimentos políticos como o
tenentismo e culturais, como o modernismo. As idéais sobre a formação da consciência nacional
que vicejavam no período entendiam que esta necessariamente deveria passar pela consciência
das elites.
As listas de conteúdos, sua distribuição pelas séries da escola secundária, as orientações para
o trabalho pedagógico elaborados pelas instituições educacionais durante o período em que
Vargas governou, traduziam a preocupação oficial e as discussões que perpassavam os meios
intelectuais brasileiros. Mais do que isso, eram um instrumento ideológico para a valorização de
um corpus de idéias, crenças e valores centrados na unidade de um único Brasil, num processo
de uniformização, no qual o sentimento de identidade nacional permitisse a omissão da divisão
social, a direção das massas pelas elites e a valorização da "democracia racial", que teria
homogeneizado num povo branco a população brasileira.
Desde 1925, ano da Reforma Rocha Vaz, os programas de ensino secundário eram formulados
pelos professores catedráticos e aprovados pelas congregações do Colégio Pedro II e dos
estabelecimentos estaduais de ensino secundário, que haviam obtido a equiparação àquele,
após o cumprimento de uma série de formalidades. As escolas equiparadas deviam adotar, sem
nenhuma modificação, a seriação de matérias estabelecidas para o Pedro II, cabendo-lhes
apenas a elaboração de programas próprios.
A Reforma Francisco Campos, de 1931, estendeu a equiparação aos colégios mantidos pelos
municípios, associações ou por particulares. Os programas e métodos de ensino, porém, seriam
produzidos pelo próprio Ministério. Eliminava-se desse modo a atribuição dos ginásios estaduais
de elaborassem seus próprios programas, acentuando a centralização uniformizadora do ensino
secundário. Paralelamente, foi organizado um sistema de inspeção federal do ensino
secundário, aprofundando ainda mais o controle exercido pelo governo central. Os programas e
as respectivas orientações metodológicas foram organizados por comissões formadas pelos
órgãos públicos educacionais e, segundo Guy de Hollanda, são até hoje desconhecidos os
nomes dos que elaboraram os programas de História13.
Neles, o conteúdo estava disposto por série e procurava abranger a História Geral, do Brasil e
da América. Tais programas vigoraram até 1942, quando reforma promovida por Gustavo
Capanema, novo ministro da Educação, mudou a grade curricular atribuindo uma maior carga
horária às matérias do campo das humanidades.
No entanto, a relação dos conteúdos distribuídos pelas cinco séries do curso secundário
fundamental e posteriormente diminuídas para quatro séries, demonstravam um interesse
profundo nas instituições administrativas e nas formas utilizadas por Portugal para organizar a
Colônia, considerado o primeiro momento da formação do sentimento nacional brasileiro.
Os programas eram periodizados fazendo uso das épocas consagradas pela historiografia
clássica; no caso da História Geral e quanto à História do Brasil a periodização era a mesma
que o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro havia estabelecido a partir das sugestões de
seus sócios que discutiam como deveria ser escrita a História do Brasil. Considerando a História
como a genealogia da nação, esta se iniciava com a História da formação de Portugal e os
grandes descobrimentos, que incluíam o Brasil no processo civilizatório. Nas Instruções
Metodológicas, que acompanhavam os Programas e orientavam os professores para o exercício
de sua prática pedagógica, destacava-se a importância da História como um instrumento para o
desenvolvimento do patriotismo e do sentimento nacional. Esse fato fica bastante evidenciado
nos livros didáticos publicados de acordo com os programas oficiais, sobretudo nos capítulos
que tratavam especificamente da formação do sentimento nacional brasileiro.
Desde os programas do Colégio Pedro II alguns fatos que evidenciavam a preocupação com a
formação nacional ocupavam lugar destacado no ensino de História. Três pilares alicerçavam a
unidade nacional brasileira: unidade étnica, unidade administrativa e territorial e unidade cultural.
Os eixos em torno dos quais os programas se estruturavam tinham significados relacionados à
formação do Estado Nacional: a formação do "povo brasileiro", a organização do poder político e
ocupação do território brasileiro.
O tratamento dispensado pelos programas e pelos livros didáticos a temas que enfatizavam a
formação do sentimento nacional e aos heróis que construíram a nação é sintomático da
importância do assunto. Ao lado da unidade geográfica, construída pelos conquistadores
portugueses em diferentes momentos, em diversas regiões da faixa litorânea e pelos
bandeirantes, que levaram o poder colonial português para as regiões do interior, impunha-se a
formação de uma "população diferente, mesclada, fruto de três elementos diversos que se
aceitaram e se confundiram"14, como ensinavam os livros didáticos. Assim, os assuntos
indígenas, compreendidos como estudos etnográficos, abriam, na maior parte das vezes, os
volumes de História do Brasil.
A busca das origens do povo brasileiro, personificação da nação, articula a referência a uma
comunidade singular, com aspectos que lhe são característicos e que se origina de três outros
povos, dos quais a base seria formada pelo português, com quem no Brasil teria aportado a
civilização. O "silvícola brasileiro" era apresentado ainda com os traços que o Romantismo havia
lhe dado: um aspecto heróico, de um povo que já havia desaparecido, a quem os manuais se
referiam exclusivamente no passado: "Apreciavam os adornos, (...) e cobriam seu corpo (....)
andavam nus"15. Dispensava-se ao índio, um dos vértices do triângulo étnico do Brasil, um
tratamento que eliminava a sua existência contemporânea.
O índio, objeto dos livros didáticos, era ainda o nativo encontrado pelos portugueses no século
XVI, não o índio degradado pela conquista européia, que persistia em sobreviver, nos séculos
posteriores. Esse índio não poderia ser uma das raízes, mas poderia simbolizar as nossas
origens do "bom selvagem", mitificado nas páginas de José de Alencar, Gonçalves Dias e de
outros escritores indianistas. Esse "selvagem" com código de honra medieval, de físico
semelhante ao homem branco, seria o índio de quem os livros didáticos falavam, como se já
estivesse completamente desaparecido e sem nenhuma relação com seus vilipendiados
descendentes, nossos contemporâneos.
O componente de nobreza da nossa formação viria do índio, que não teria aceito a escravidão,
que enfrentava bravamente os obstáculos da floresta e os inimigos. Historiadores de renome,
como Alfredo Ellis Jr., professor catedrático de História do Brasil na USP, afirmavam que no
Planalto de Piratininga, onde se localiza São Paulo, havia se formado uma "sub-raça superior, a
planaltina", resultante do cruzamento entre portugueses e índios16. Essa sub-raça superior tinha
por oposição a mestiçagem "híbrida" do Nordeste, onde, do cruzamento dos senhores de
engenhos com suas escravas, havia surgido uma sub-raça inferior, constituída de mulatos que
tendiam a desaparecer, pois enquanto híbridos, eram pouco prolíficos. Resta lembrar que
Alfredo Ellis Jr. foi autor de livros didáticos...
Por isso tudo, os livros didáticos, de acordo com a orientação dos currículos, dedicavam
significativo espaço aos primeiros habitantes, abordando o tema inspirados nas linhas das
publicações de Instituto Histórico e Geográfico do Brasil. Os textos davam grande importância
às origens dos habitantes da América pré-colombiana, à distribuição dos grupos pelo Brasil e ao
seu estágio cultural no momento do encontro com os portugueses. Procurava-se valorizar a
produção indígena encontrada na pesquisa arqueológica, "que mais parecem produto da
indústria adiantadíssima de povos civilizados do que artefatos de bárbaros"17.
(...) segundo Roquette Pinto (...) a constituição antropológica do povo brasileiro era:
Brancos ...............51%
Mulatos ...............22%
Caboclos .............11%
Negros.................14%
Índios.....................2%.19
Ao buscar a unidade étnica, tratando como majoritariamente branco o povo brasileiro, ignorando
a presença dos africanos, presença esta que nos tornaria inferiores, de acordo com as teorias
racistas que se estenderam pelo mundo na primeira metade deste século, o ensino de História,
nos programas e nos textos didáticos, procurava satisfazer o pensamento de nossas elites e
contemplar o primeiro e mais importante dos elementos com os quais formaríamos a nossa
identidade: a formação do povo brasileiro. Nessa perspectiva, enfatizava-se, ainda, a influência
que os africanos e índios teriam exercido na nossa formação cultural, isto é, na língua, na
culinária e nas "superstições", como os livros chamavam as religiões de origem africana.
Os livros didáticos destacavam a importância da catequese, que dera aos índios, ao mesmo
tempo, o cristianismo e a civilização européia, ao alfabetizá-los na língua portuguesa. Pandiá
Calógeras em sua Formação Histórica do Brasil celebrava a "colaboração cordial do poder civil
com a Igreja"22, o que era visto também pelos livros didáticos como um fato altamente benéfico.
Considerava-se que se Cabral havia descoberto o Brasil, os jesuítas o haviam fundado, pois
Mais ainda, os jesuítas teriam salvado a "civilização" ao conseguir, com seus aliados, rechaçar
os tamoios confederados e firmar a paz de Iperoig, evitando assim que os índios destruíssem
vilas portuguesas, já instaladas nas terras conquistadas.
Essa concepção pragmática da História como disciplina escolar, servia à formação do cidadão
ideal para o estado centralizado, que tinha como um dos seus objetivos neutralizar o poder das
oligarquias regionais, formando o sentimento nacional brasileiro. Sentimento este que teria como
fundamento a raça, a língua e a religião, e um território com uma única administração.
RESUMO EM TÓPICOS
Contexto Histórico e Educação Nacional:
● Desde o século XX, a construção da identidade nacional brasileira foi
uma preocupação presente na produção intelectual e política do país.
● Intelectuais e educadores, especialmente ligados aos órgãos
educacionais públicos, buscaram utilizar a História como ferramenta
para fortalecer ideias de identidade nacional.
Nacionalismo e Autoritarismo:
● O nacionalismo e o pensamento autoritário estavam intimamente
ligados no Brasil, com o liberalismo sendo visto como uma ideia
estrangeira e o Estado sendo responsabilizado pela formação da
nacionalidade e pela orientação das massas.
● Francisco Campos, Ministro da Educação durante o governo Vargas,
defendia a influência das ciências e das artes na transformação da
sociedade.
Papel da Educação na Formação Nacional:
● Os intelectuais acreditavam na liderança das elites na formação da
consciência nacional, priorizando a educação das camadas dirigentes.
● Os órgãos de instrução desempenharam um papel fundamental na
formação da consciência nacional, com a História sendo vista como a
disciplina central na formação dos cidadãos.
Reformas Educacionais e Controle Estatal:
● As reformas educacionais, como a de Francisco Campos em 1931,
visavam centralizar e uniformizar o ensino secundário, aumentando o
controle estatal sobre o currículo e os programas educacionais.
● Os programas de História elaborados pelo Ministério da Educação
refletiam as preocupações e ideologias do período, buscando
fortalecer a identidade nacional brasileira.
Abordagem da História nos Programas e Livros Didáticos:
● Os programas e os livros didáticos enfatizavam a formação do povo
brasileiro, a unidade territorial e administrativa do Brasil, assim como a
unidade cultural.
● Havia uma idealização da formação étnica brasileira, destacando o
papel do índio e do português na construção da identidade nacional,
enquanto a contribuição africana era minimizada.
● A religião católica e a colonização portuguesa eram apresentadas de
forma positiva, como elementos unificadores da sociedade brasileira.
● Os programas de História valorizavam os feitos dos bandeirantes e a
expansão territorial brasileira como fundamentais para a integridade
territorial do país.
Conclusão:
● O ensino de História durante a Era Vargas refletia a preocupação do
Estado em promover uma identidade nacional unificada,
fundamentada na história oficial e na valorização de elementos étnicos
e culturais específicos.