Você está na página 1de 5

EMBARGOS DE TERCEIRO

1. CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES:
 Além da intervenção de terceiros no processo pela oposição, pela nomeação à autoria, pela
denunciação da lide, pelo chamamento do processo e pela assistência, poderá ainda
ocorrer a hipótese de um terceiro, totalmente estranho à relação processual, intervir na
contenda, embora nada tenha a ver com o direito das partes em litígio. Essa interferência
se dá por meio de um verdadeiro processo interventivo, o qual se denomina EMBARGOS
DE TERCEIRO.
 Limites subjetivos da lide e responsabilidade patrimonial do devedor: O processo é
uma relação jurídica que envolve o autor, o réu e o Estado-juiz. Nesse sentido é que a
prestação jurisdicional não pode ultrapassar os envolvidos, ou seja, a sentença não pode
obrigar terceiros que não participaram da lide. Da mesma forma, na execução, são os bens
do devedor que deverão ser usados para satisfação do crédito do credor, à exceção da
hipóteses previstas no art. 592 do CPC.
 Esbulho judicial: Assim, atingidos os bens de quem não é sujeito do processo, comete o
poder jurisdicional esbulho judicial. Daí a lei põe à disposição os embargos de terceiro a
quem, não sendo parte no processo, sofre apreensão judicial, tais como a penhora, arresto,
sequestro, arrecadação, busca e apreensão, imissão na posse, etc. (o rol do art. 1046,
CPC, é meramente exemplificativo).

2. CONCEITO:
 Portanto, podemos definir os embargos de terceiro como sendo o remédio jurídico-
processual que o embargante utiliza para tutelar uma posição jurídica material autônoma,
distinta e incompatível com aquela que envolve os primitivos litigantes, ou no dizer de
ENRICO TULLIO LIEBMAN, e a "ação proposta por terceiro em defesa de seus bens contra
execuções alheias."

3. OBJETIVO:
 Importante ressaltar que nos embargos de terceiro o objetivo visado não é o direito das
partes em litígio, mas fazer cessar o ato estatal do juiz que indevidamente constringiu ou
ameaçou constringir bem de quem não era parte no processo e não possuía
responsabilidade patrimonial. Esta, inclusive, é a diferença com as modalidades de
intervenção de terceiros (oposição, assistência, etc.), porquanto estas últimas atacam
justamente o direito disputado em juízo pelas partes.

4. HIPÓTESES ESPECIAIS DE EMBARGOS DE TERCEIRO:


 O art. 1047 do CPC prevê duas hipóteses especiais de embargos de terceiro: I - para a
defesa da posse, quando, nas ações de divisão ou de demarcação, for o imóvel sujeito a
atos materiais, preparatórios ou definitivos, da partilha ou da fixação de rumos; II - para o
credor com garantia real obstar alienação judicial do objeto da hipoteca, penhor ou
anticrese.
 A primeira delas descreve a hipótese em que o sujeito não participa do processo de divisão
e demarcação, mas toma ciência de que a fixação dos rumos do imóvel objeto daquela
demanda lhe causa ou ameaça causar esbulho judicial. Não é necessária a efetiva fixação
dos rumos demarcatórios, bastando que sejam realizados os trabalhos de campo pelos
arbitradores, ameaçando a posse do terceiro, para que este possa se valer dos embargos
de terceiro prevenindo uma futura constrição judicial.
 Na segunda hipótese, os embargos de terceiros configuram instrumento para que o credor
com garantia real de hipoteca, penhor ou anticrese evite que o bem gravado com tais ônus
reais seja alienado em execução na qual se cobra um crédito quirografário e da qual o
credor com garantia real não é parte. A matéria arguida pelo credor com garantia real,autor
de embargos de terceiro, limita-se à comprovação da existência de outros bens do devedor
que possam responder pelo crédito quirografário cobrado na execução.

5. LEGITIMIDADE ATIVA:
 De acordo com o art. 1046 do CPC, tem legitimidade ativa para a demanda o terceiro que,
não sendo parte no processo e nem possuindo responsabilidade patrimonial, sofre turbação
ou esbulho na posse de seus bens, por ato de apreensão judicial (penhora, depósito,
arresto, seqüestro, alienação judicial, arrecadação, arrolamento, inventário). O terceiro é
aquele que não pode ser atingido diretamente pelo resultado da demanda, porquanto não
há direito seu sendo discutido no processo principal.
 Nos casos de responsabilidade patrimonial de terceiros expressamente previstos em lei
(art. 592 do CPC), tais terceiros, ainda que não participem do processo, não poderão
opor embargos de terceiro para defesa de sua posse contra ato de constrição judicial.
 De acordo com a Súmula n° 84 do STJ, “é admissível a oposição de embargos de
terceiro fundados em alegação de posse advinda de compromisso de compra e venda
de imóvel, ainda que desprovido de registro”.
 Equipara-se a terceiro a parte que, mesmo figurando no processo, defende bens que pela
sua natureza ou qualidade em que os possuir, não podem ser atingidos pela apreensão
judicial. (Ex: bens de família).
 Idem, o cônjuge que defende a posse de bens dotais, próprios, reservados ou de sua
meação. Nesses casos, entende o STJ que o cônjuge devidamente intimado da
constrição, poderá se valer da defesa típica do devedor ou dos embargos de terceiro.
Importante frisar que, em casos tais, não se retira a constrição judicial, mas apenas se
preserva a meação do cônjuge insurgente.

6. LEGITIMIDADE PASSIVA:
 Não necessariamente o polo passivo dos embargos de terceiro será composto por todas as
partes do processo onde foi determinada a medida judicial constritiva. Se apenas uma das
partes foi responsável pela indicação do patrimônio do terceiro à constrição judicial, apenas
tal parte foi responsável pelo esbulho judicial e, portanto, só ela integrará o polo passivo da
relação processual estabelecida no procedimento especial de embargos de terceiro.

7. MOMENTO DA INTERPOSIÇÃO:
 Os embargos de terceiro podem ser oferecidos a qualquer tempo no curso do processo de
conhecimento, desde que a sentença nele proferida não haja ainda transitado em julgado;
do processo cautelar e, ainda, na execução. Neste último caso a parte terá de exercitá-los
no máximo até cinco dias depois da arrematação ou da adjudicação, conquanto que o faça
antes de ser assinada a respectiva carta (art. 1048 do CPC).
 Importante ressaltar que o instituto da remição foi extirpado do CPC pela Lei nº
11.382/2006, a qual acabou por revogar os arts. 787 a 790 do referido Código. Atualmente,
o cônjuge, ascendente ou descendente do executado, que queira a permanência do bem
garantidor da execução no patrimônio familiar, terá que proceder à sua adjudicação, nos
atermos do art. 685-A do CPC. [Sobre o assunto, ler artigo de FREDIE DIDIER JUNIOR
intitulado “Direito de adjudicar e direito de remir: confronto do art. 685-A, § 2º, Código
de Processo Civil, com o art. 1.482 do Código Civil”].
 Ainda não tratada especificamente pelo art. 1048 do CPC, a apreensão judicial decorrente
da execução para entrega de coisa certa também pode ser atacada por embargos de
terceiro. Diverge a doutrina acerca do início do prazo de cinco dias para sua interposição:
se do último ato de satisfação do credor (HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, CÂNDIDO
RANGEL DINAMARCO); ou se do ato da efetiva turbação/esbulho da posse do terceiro
sobre o bem (LUIZ GUILHERME MARINONI, DANIEL MITIDIERO, STJ. AgRg nos EDcl no
Ag 812.823/PE1 e REsp 974.249/SP2).

8. JUÍZO COMPETENTE:
 Dispõe o art. 1.049 do CPC: “Os embargos serão distribuídos por dependência e correrão
em autos distintos perante o mesmo juiz que ordenou a apreensão”. Em que pese o
dispositivo legal falar em distribuição o juiz, deve-se sempre ter em mente que a
competência para processar e julgar um processo é do juízo, e não do juiz. Trata-se de
critério de competência funcional e, portanto, absoluta.
 Processo principal em trâmite no tribunal: Os embargos de terceiro deverão ser
interpostos no primeiro grau, haja vista que não se pode criar regra de competência
originária de tribunal sem expressa previsão legal, bem como porque os atos materiais de
constrição são efetivados por um juízo de primeiro grau no cumprimento de carta de ordem
expedida pelo tribunal.
 Embargos de terceiro interpostos pelos entes previstos no art. 109, I, CRFB/88,
quando processo principal tramita na Justiça Estadual: Nesse caso, será competente
para os embargos a Justiça Federal, continuando a ação principal perante a Justiça
Estadual, só que suspensa enquanto se aguarda o julgamento dos embargos, a fim de se
evitar decisões contraditórias entre si (STJ. CC 93.969/MG3).
1
“PROCESSUAL CIVIL. PRAZO PARA OPOSIÇÃO DE EMBARGOS DE TERCEIRO. TERMO INICIAL. DATA DO
CONHECIMENTO DO ATO DE TURBAÇÃO. 1. Conforme jurisprudência pacífica do STJ, o prazo para a oposição de Embargos
de Terceiro é contado a partir da data em que se configurou a turbação da posse. 2. Agravo Regimental provido.” (STJ. AgRg nos
EDcl no Ag 812.823/PE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/03/2009, DJe 27/03/2009).
2
“EMBARGOS DE TERCEIRO. ART. 1.048, DO CPC. TERCEIRO QUE NÃO TEVE CONHECIMENTO DO PROCESSO DE
EXECUÇÃO. PRAZO PARA AJUIZAMENTO. CINCO DIAS DA DATA EM QUE MANIFESTADA A TURBAÇÃO DA POSSE. 1. A
jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que o prazo de cinco dias para o terceiro-embargante,
que não teve ciência do processo de execução, ajuizar os embargos de terceiro conta-se da data da efetiva turbação da posse e
não da arrematação. 2. Recurso especial provido.” (STJ. REsp 974.249/SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA,
QUARTA TURMA, julgado em 12/02/2008, DJe 19/05/2008).
3
“CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUSTIÇA COMUM ESTADUAL E JUSTIÇA FEDERAL. AÇÃO DE EXECUÇÃO
AJUIZADA PERANTE A JUSTIÇA ESTADUAL. EMBARGOS DE TERCEIRO OPOSTOS PELA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL.
INEXISTÊNCIA DE CONEXÃO. AÇÃO DE EXECUÇÃO SOBRESTADA NA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM. EMBARGOS
 Constrição em cumprimento de Carta Precatória: A competência para processar e julgar
os embargos de terceiro poderá ser do Juízo Deprecante (aquele que enviou a Carta
Precatória) ou, em determinadas situações, do Juízo Deprecado (aquele que recebe e
cumpre a Carta Precatória).
 Será conservada a competência do Juízo Deprecante se foi este que ordenou a
constrição de coisa certa, referindo-se expressamente a um determinado bem que
supostamente integrava o patrimônio de uma das partes, mas que, na verdade, era do
terceiro.
 Se o Juízo Deprecante apenas solicita a constrição de bens indeterminado e o Juízo
Deprecado, em cumprimento à solicitação, especifica os bens a serem constritados e
estes integram o patrimônio do terceiro, será do Deprecado a competência para os
embargos de terceiro.
 Trata-se de interpretação da Súmula 33 do extinto TFR (Tribunal Federal de Recursos),
a qual ainda é aplicada pela doutrina e pela jurisprudência. Eis a sua redação do
verbete sumular: “O juízo deprecado, na execução por carta precatória, é o competente
para julgar os embargos de terceiro, salvo se o bem apreendido foi indicado pelo juízo
deprecante”. (STJ. CC 53034/GO4; REsp 1.033.333/RS5).

9. ASPECTOS PROCEDIMENTAIS:
 Petição inicial: A petição na qual os embargos de terceiro devem ser materializados
deverá ser feita obedecendo-se rigorosamente às exigências do art. 282 e do art. 1050,
ambos do CPC. Isto é, nela o embargante deve expor com clareza os fatos, indicar as
provas, anexar-lhe a prova da apreensão judicial do bem que der motivo aos embargos,
mormente a de ser ele terceiro e possuidor. Deverá oferecer desde logo os documentos
que tiver e arrolar as eventuais testemunhas (art. 1.050, caput, CPC).
 Por serem os embargos de terceiro verdadeira ação mandamental negativa, a eles deve
ser dado valor igual ao do bem que se pretende excluir da demanda.
 Em se tratando de posse que só possa ser comprovada mediante depoimento de
testemunhas, deverá solicitar do Juiz que designe audiência preliminar de justificação
de posse para produzi-la (Art. 1.050, § 1º, do CPC). Com sua posse direta, o possuidor
direto pode alegar o domínio alheio (Art. 1050, § 2º, do CPC).

DE TERCEIRO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. I. A reunião de processos por conexão, como forma excepcional de
modificação de competência, só ocorre quando as causas supostamente conexas estejam submetidas a juízos, em tese,
competentes para o julgamento das duas demandas.II. É competente a Justiça Federal para o julgamento dos embargos de
terceiro opostos pela Caixa Econômica Federal, devendo ser sobrestada na Justiça Estadual, a ação de execução, até julgamento
dos referidos embargos, pela Justiça Federal, para evitar prolação de decisões conflitantes. Conflito de competência conhecido
declarando-se competente para o julgamento dos embargos de terceiro o Juízo Federal da 24ª Vara da Seção Judiciária do Estado
de Minas Gerais, ora suscitante.” (STJ. CC 93969/MG, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 28/05/2008,
DJe 05/06/2008)
4
“CONFLITO DE COMPETÊNCIA. EXECUÇÃO FISCAL. CARTA PRECATÓRIA. ATOS EXECUTIVOS PRATICADOS PELO
JUÍZO DEPRECADO. EMBARGOS À ARREMATAÇÃO. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DEPRECADO. 1. De nosso sistema
processual civil retira-se o princípio segundo o qual compete ao juízo em que se praticou o ato executivo processar e julgar as
causas tendentes a desconstituí-lo. Assim o é para os embargos à execução por carta (CPC, art. 747) e para os embargos de
terceiro (CPC, art. 1.049). Precedentes do STJ e do STF. (...).” (STJ. CC 53034/GO, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI,
PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/06/2006, DJ 01/08/2006 p. 342).
5
“(...). Em princípio, o juízo que determinou a prática de um ato executivo é o competente para conhecer dos inconformismos daí
decorrentes, tal como ocorre nos embargos à execução por carta (art. 747 do CPC) e nos embargos de terceiro (art. 1.049 do
CPC). De fato, em tese, seria descabido atribuir tal competência para outro juízo, que não ergueu os fundamentos jurídicos do ato
executivo impugnado. 2. Ao juízo deprecante compete apreciar os embargos de terceiro opostos contra penhora de imóvel por ele
indicado (Súmula n. 33 do extinto Tribunal Federal de Recursos - TFR). (...)”. (STJ. REsp 1033333/RS, Rel. Ministro MASSAMI
UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/08/2008, DJe 05/09/2008).
 Deferimento liminar dos embargos: O Juiz pode deferir liminarmente os embargos se
julgar suficientemente provada a posse, ocasião em que determinará a expedição de
mandado de manutenção ou de restituição em favor do embargante; mas, nesta hipótese,
para poder receber os bens o embargante deverá prestar caução e comprometer-se a
devolvê-los com todos os seus rendimentos, no caso de vir a decair dos mesmos, isto é,
deles virem a ser julgados improcedentes a final (art. 1051, CPC).
 Suspensão do processo principal: Só quando os embargos versarem sobre todos os
bens objeto da apreensão é que o Juiz determinará a suspensão do curso do processo; se
versarem apenas sobre alguns deles, o processo principal seguirá o seu caminho em
relação aos demais bens não embargados (art. 1052 do CPC).
 Citação e resposta do embargado: O embargado será citado pessoalmente. Segundo o
STJ, não é possível a citação na pessoa do advogado (STJ. REsp 782.889/SP 6), embora
esta pareça mais econômica e seja defendida por parcela da doutrina (ALEXANDRE
FREITAS CÂMARA, DANIEL AMORIM ASSUMPÇÃO NEVES, COSTA MACHADO,
HUMBERTO THEODORO JÚNIOR). O prazo para a parte embargada apresentar resposta
aos embargos é de 10 dias, contados a partir do primeiro dia útil subsequente ao da juntada
aos autos do mandado de citação devidamente cumprido. Poderá apresentar contestação,
exceções de impedimento e suspeição (não cabe reconvenção,em razão da
incompatibilidade procedimental, tampouco exceção de incompetência, já que a
competência é absoluta).
 Sentença: Contestados os embargos e produzida a prova por que houverem protestado as
partes, os autos serão conclusos ao Juiz para a respectiva sentença, que será
desconstitutiva (constitutiva negativa), se os julgar procedentes, já que não se limita a
declarar a posse ou o direito do embargante e reconhecê-la em seu prol, mas a desfazer as
conseqüências da apreensão judicial; será meramente declaratória se apenas julgar os
embargos improcedentes.

6
“RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. CITAÇÃO PESSOAL DA EMBARGADA.
NECESSIDADE. CITAÇÃO NA PESSOA DO ADVOGADO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Esta Corte entende necessária a citação
pessoal no processo de embargos de terceiro, não sendo suficiente a citação feita na pessoa de um dos advogados da
embargada. Precedentes. 2. Recurso especial conhecido e provido.” (STJ. REsp 782889/SP, Rel. Ministro FERNANDO
GONÇALVES, QUARTA TURMA, julgado em 12/12/2005, DJ 01/02/2006 p. 571).

Você também pode gostar