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nen, Kubo, & Botomé, 2013; Cortegoso & Co- lítico-Comportamental” no Brasil. Há autores
ser, 2011; Kubo & Botomé, 2001). que defendem o uso da expressão para fazer re-
ferência a um modelo terapêutico típico do Bra-
Ensino de Terapia sil, caracterizado pelo uso da análise funcional
Analítico-Comportamental do comportamento como instrumento de avalia-
ção e intervenção terapêutica (Leonardi, 2015).
A expressão “Terapia Comportamental” é Apesar disso, outros terapeutas passaram a in-
utilizada para fazer referência a diversas prá- cluir em suas práticas estratégias terapêuticas
ticas terapêuticas (Moskorz, Kubo, De Luca, de modelos de terapia de terceira “onda”. Isso
& Botomé, 2012). Particularmente no Brasil, tem sido possível devido às modalidades tera-
a Terapia Comportamental foi desenvolvida pêuticas que tradicionalmente são referencia-
desde seu início, no final da década de 1960, das como de terceira “onda” serem caracteri-
por meio da adesão aos princípios de aprendi- zadas pelo retorno aos pressupostos da Análise
zagem skinnerianos e da utilização de técnicas do Comportamento e do Behaviorismo Radi-
do paradigma respondente (Leonardi, 2015; cal (Leonardi, 2015; Rafihi-Ferreira, dos San-
Rafihi-Ferreira, dos Santos, Carvalho, & So- tos, Carvalho, & Soares, 2016). Nesse sentido,
ares, 2016). Nos Estados Unidos da Améri- a expressão “Terapia Analítico-Comportamen-
ca, por sua vez, apesar da Terapia Comporta- tal” é utilizada neste trabalho para fazer refe-
mental ter começado a ser desenvolvida antes, rência a terapias baseadas na Análise do Com-
ela passou por uma “revolução cognitiva” em portamento e Behaviorismo Radical, incluindo
1960, quando terapeutas desenvolveram a Te- terapias de terceira “onda”.
rapia Cognitiva e se distanciaram dos pressu- O ensino de Terapia Analítico-Comporta-
postos analítico-comportamentais. Assim, foi mental pode ocorrer de diversas formas, como
apenas entre o final da década de 1980 e o iní- treinamentos teóricos (participação de aulas
cio da década de 1990 que a clínica analítico- expositivas, leitura de textos), workshops e
comportamental voltou a ser desenvolvida de supervisão clínica. A supervisão clínica é con-
maneira expressiva, constituída por diferentes siderada um dos momentos mais importantes
modelos terapêuticos baseados, em algum grau, da capacitação do terapeuta em formação (Be-
na Análise do Comportamento e Behaviorismo ckert, 2002), sendo papel do supervisor propi-
Radical (Leonardi, 2015; Rafihi-Ferreira, dos ciar mudanças de comportamento do terapeu-
Santos, Carvalho, & Soares, 2016). Essas mo- ta-aprendiz em relação ao cliente (Silveira et
dalidades terapêuticas são conhecidas como de al., 2009; Starling, 2002). Para tanto, a manei-
terceira “onda” da Terapia Comportamental. ra mais comum é a orientação verbal do super-
Entre elas, estão: a Terapia Comportamental visor em relação ao relato do aluno acerca de
Dialética (Linehan, 1993), Psicoterapia Ana- seu atendimento, o que pode ser problemático
lítico-Funcional (Kohlenberg & Tsai, 1991), considerando que “relatar sobre a intervenção”
Terapia Comportamental Integrativa de Casais e “intervir” são comportamentos diferentes (Bi-
(Jacobson & Christensen, 2002), e Terapia de tondi, Ribeiro, & Sétem, 2012). Outra variável
Aceitação e Compromisso (Hayes, Strosahl, & que complexifica a supervisão clínica é que o
Wilson, 1999), dentre outras (Lucena-Santos, relato do aprendiz pode estar sob controle de
Pinto-Gouveia, & Oliveira, 2015). duas contingências diferentes: a da sessão re-
Essa diversidade na história da Terapia Com- alizada, o que possibilitaria melhor análise e
portamental resultou também em uma diversi- supervisão do caso, ou da própria supervisão
dade no que hoje é entendido por “Terapia Ana- (Beckert, 2002).
lo dos estudos, sendo selecionados aqueles que instrumentos, ambientes e procedimentos de en-
pareciam fazer referência ao ensino de Terapia sino necessários); 8. Realização do ensino; 9.
analítico-comportamental. Quando o título do Avaliação de ensino; 10. Resultados do ensino.
estudo não era claro o suficiente para ser inclu- No processo de seleção dos estudos, os cri-
ído ou excluído, o resumo (ou parte do estudo, térios de exclusão foram: (a) artigos relativos a
quando não tinha resumo) foi lido até que fos- modalidades terapêuticas não fundamentadas no
se possível classificá-lo. Behaviorismo Radical e Análise do Comporta-
A identificação dos artigos nos periódicos e mento, (b) artigos de Psicologia Clínica em ge-
bases de dados foi realizada entre os dias 30 de ral, não fundamentada na Análise do Comporta-
maio a 9 de junho de 2018, tendo sido selecio- mento; (c) estudos sobre formação do psicólogo
nados artigos em português de qualquer data até em áreas que não a clínica; (d) estudos relativos
o dia da recuperação dos estudos. Foram sele- ao ensino do profissional acompanhante tera-
cionados artigos em português devido ao objeti- pêutico, mesmo que fundamentado na Análise
vo de avaliar o ensino de Terapia analítico-com- do Comportamental, (e) estudos sobre efeitos
portamental especificamente no Brasil, sendo a da Terapia Comportamental com determinados
maior parte da produção publicada em periódi- tipos de populações e (f) estudos sobre ensino
cos nacionais (Rafihi-Ferreira, dos Santos, Car- de behaviorismo ou Análise do Comportamento.
valho, & Soares, 2016).
O critério de inclusão
foi o estudo fazer referên-
cia a qualquer variável do
processo de ensino (Kubo
& Botomé, 2001) de Te-
rapia Analítico-Compor-
tamental. As variáveis
observadas foram: 1. Situ-
ações que o aprendiz de-
verá lidar após ensino; 2.
Resultados esperados das
ações do aprendiz após
ensino; 3. O que o apren-
diz deverá estar apto a fa-
zer para lidar com situa-
ções e o que deverá estar
apto a produzir após o en-
sino (comportamento-ob-
jetivo); 4. O que o apren- Figura 1. Fluxo da informação com as diferentes fases da revisão sistemática rea-
diz precisará aprender lizada. Adaptado de “Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Me-
ta-Analyses: The PRISMA Statement”, de Moher D, Liberati A, Tetzlaff J, Altman
(comportamentos inter- DG, The PRISMA Group, 2009, PLoS Med, 6(7), p. 3.
mediários); 5. Recursos e
repertórios que já existem; 6. Sequências e par- A identificação e seleção dos artigos foi re-
tes em que é apropriado dividir e organizar o gistrada em um fluxograma adaptado do mo-
conjunto de comportamentos (mapeamento do delo da plataforma PRISMA. Nesse fluxogra-
ensino); 7. Planejamento do ensino (recursos, ma, apresentado na Figura 1, está registrada a
rência a “dificuldades da criança”, no caso de rização dos resultados esperados, por exemplo,
terapia infantil, e dois são referentes a dificul- que é possível propor comportamentos-objetivo
dades com as quais o terapeuta irá lidar, como que, se apresentados, podem produzi-los. Em
dificuldades pessoais e sentimentos aversivos adição, como ensinar o aprendiz a caracterizar
gerados pelo cliente. Nos outros estudos, as in- a realidade com a qual ele irá lidar, um com-
formações são diferentes em cada um, sendo portamento relevante para a efetividade da in-
algumas: dificuldade em relacionamento inter- tervenção, sem informações referentes a essa
pessoal, dificuldades com habilidades sociais, realidade? (Carvalho, Silva, Kienen, & Mello,
Transtorno Borderline etc. Em apenas três estu- 2014; Cortegoso & Coser, 2011; Kubo & Bo-
dos essa variável é apresentada de forma mais tomé, 2001; Botomé, 1981).
específica. Um exemplo é um estudo onde são Em complemento, há pouca ênfase em re-
citadas as situações: cliente com contradições lação aos “resultados esperados das ações do
em seu comportamento, problemas do cliente aprendiz após ensino”, já que foram identifi-
e das condições a eles relacionadas, condições cadas informações referentes a essa variável
aversivas produzidas pelo cliente, aspectos da em 23 dos 36 estudos analisados, sendo apenas
vida do cliente, diversidade de repertórios com- 13 referente aos estudos em que houve realiza-
portamentais entre diferentes, respostas agres- ção de ensino. Do total de estudos em que foi
sivas do cliente, resistência do cliente em mu- identificada essa variável, 10 foram por meio
dar um padrão rígido de comportamento de de alguma das seguintes expressões genéricas:
fuga e esquiva, cliente tentar estabelecer re- “mudança”, “melhora”, “bem-estar do clien-
lação de amizade com terapeuta etc. (Barbo- te” ou “sucesso na terapia”. Em outros estu-
sa, Dutra, & Ferreira, 2017). Esses dados in- dos foi identificada, como resultado esperado
dicam que, com poucas exceções, constam na das ações do aprendiz após o ensino, “cliente
literatura informações referentes às “situações identificar contingências das quais seu com-
com as quais o aprendiz irá lidar”, mas de ma- portamento é função”, o que parece constituir
neira pouco clara. A falta de clareza sobre es- importante resultado a ser alcançado na tera-
ses aspectos, que devem adquirir em contex- pia, mas insuficiente por não necessariamente
to terapêutico a função de classes de estímulos propiciar mudança terapêutica. Apenas em dois
antecedentes a controlar o comportamento do estudos é acrescida a informação que o clien-
terapeuta, pode dificultar a elaboração de con- te precisa aprender a “manipular as variáveis
tingências em contexto de ensino para que o que controlam seu comportamento” (Bitondi,
terapeuta-aprendiz passe a ficar sob controle Ribeiro, & Sétem, 2012; Mayer, Nascimen-
dessas variáveis. Além disso, pode implicar em to, Sartor, Sabbag, Barbosa, Brandengurg, et
pouca clareza do terapeuta em relação a quando al., 2014), o que parece consistir um resultado
apresentar um comportamento específico e di- mais significativo do que apenas a identifica-
ficuldade ou falta de clareza por parte dos pro- ção dessas variáveis e, portanto, um resultado
fessores na proposição dos resultados a serem mais promissor para o cliente. Outras informa-
alcançados após realização do ensino, já que ções identificadas mais específicas são: cliente
a identificação das “situações com as quais o desenvolver “comportamentos de intimidade”
aprendiz irá lidar” é condição para essa propo- (Almeida, Runnacles, & Silveira, 2016) e “au-
sição (Cortegoso & Coser, 2011; Kubo & Boto- mento de CRB2s e O2s” (Lepienski & Silveira,
mé, 2001). Esse processo tem efeito em todas 2017). Em geral, portanto, a literatura acerca
as outras etapas relativas à construção de um do ensino de Terapia Analítico-Comportamen-
programa de ensino, pois é a partir da caracte- tal apresenta pouca clareza em relação aos re-
sultados esperados das ações do aprendiz após cesso de ensino (os comportamentos a serem
ensino, sendo insuficiente para caracterizar es- desenvolvidos nos e pelos aprendizes) e o que
ses resultados e orientar a atuação profissional. consta na literatura consultada a respeito des-
Essas informações não correspondem com os sa variável. Foram raras, por exemplo, indica-
conhecimentos analítico-comportamentais a ções de objetivos de ensino que se referiam a
respeito dos processos de ensinar e aprender e informações. Essa correspondência, entretan-
suscita questões a serem investigadas em pes- to, pode ser aprimorada, dado que grande parte
quisas futuras, como: sob controle de quais re- das informações referentes a aspectos do com-
sultados o terapeuta orienta sua própria atuação portamento restringem-se à ação a ser apresen-
profissional? Como avaliar se a terapia foi efe- tada pelo aprendiz, não explicitando, na maio-
tiva? Quais resultados tornam a terapia efeti- ria das vezes, as situações nas quais o aprendiz
va? Os terapeutas estão sendo capacitados para deve apresentar essa ação e quais as prováveis
avaliarem os resultados de seus atendimentos? consequências dela (Botomé, 2001, 2013), além
Como já citado, informações sobre “com- de alguns objetivos de ensino serem descritos
portamentos-objetivo” foram identificadas em de forma vaga ou ambígua.
10 estudos, enquanto “comportamentos-inter- Foram identificadas informações, nos estu-
mediários”, em 32. As informações referentes dos analisados, em relação a aspectos dos com-
a essas variáveis foram as relacionadas a clas- portamentos a serem apresentados pelo tera-
ses de comportamentos, ações e itens listados peuta no contexto do “aqui e agora” da sessão
nos estudos como referentes aos comporta- e também de comportamentos a serem desen-
mentos a serem ensinados aos aprendizes de volvidos como pré-requisitos. Destes, o prin-
terapeuta analítico-comportamental. Essas in- cipal aspecto identificado é referente ao apren-
formações, portanto, não são necessariamente diz buscar desenvolver seu autoconhecimento
classes de comportamentos, em termos analí- (e.g. Berri & Wruck, 2010; Wielenska, 2009,
tico-comportamentais. Algumas informações, 2010). Prevendo e controlando seu próprio com-
por exemplo, são referentes a itens ou temas portamento, o que envolve autoconhecimento
relevantes sobre o comportamento do terapeu- e – obviamente – autocontrole, maior a proba-
ta, como contato visual (Ulian, 2002; Ireno, & bilidade de o terapeuta-aprendiz identificar as
Meyer, 2009), postura e apoio (Ireno, & Meyer, variáveis controladoras da relação terapêutica
2009) e a comunicação e enfrentamento (Bol- e do comportamento do cliente, o que aumen-
soni-Silva, & Matsunaka, 2017). Outras infor- ta a possibilidade de “sucesso” na terapia. Dis-
mações, identificadas na maioria dos estudos, so decorre a ênfase em alguns estudos sobre a
fazem referência a alguma ação ou atividade a importância de o aprendiz também fazer tera-
ser realizada pelo terapeuta, como “terapeuta pia, uma vez que esta tende a aumentar seu ní-
concorda” (Moreira, 2003), “terapeuta repro- vel de autoconhecimento (e. g., Heller, 2006;
va ou discorda de ações do cliente” (Zamigna- Otero, 2004). Outras informações referentes a
ni, Meyer, 2011; Chagas, & Bessa, 2017), “dar habilidades pré-requisito a serem desenvolvi-
instrução” (Mayer, Nascimento, Sartor, Sa- das foram: conhecimento teórico (e. g., Almei-
bbag, Barbosa, Brandengurg, et al. 2014), “li- da, Runnacles, & Silveira, 2016; Ulian, 2002),
dar com diferenças” (Barbosa, Dutra, & Fer- ampliar as habilidades para lidar com fatores
reira, 2017), “elogiar” (Tozze & Bolsoni-Silva, estressores na relação interpessoal com o clien-
2018) etc. Esses dados indicam haver corres- te (e. g., Barbosa, Dutra, & Ferreira, 2017; Mo-
pondência entre o conhecimento em Análise do riyama, Escaraboto, Koeke, 2009) e submeter-
Comportamento sobre o objetivo de um pro- -se a avaliação de outros profissionais a fim de
são, enquanto os recursos utilizados foram di- tualização do ensino realizado. Os aprendizes
versos, como: gravação de sessões de terapia nas experiências de ensino realizadas são, na
e de supervisão, solicitação ao aprendiz de re- maioria dos estudos, graduandos. O que pode
latório de atendimentos clínicos, análise do re- ser decorrência da própria exigência de super-
lato do aprendiz, observação ao vivo de atendi- visão do aprendiz graduando, concretizada pela
mentos terapêuticos realizados pelo aprendiz, Lei 4.119 que fundamenta a profissão do psi-
role-play, atendimento dos aprendizes em du- cólogo (Brasil, 1962). Em complemento, nove
pla, software e registro cursivo, além da utili- estudos foram realizados para ensinar aprendi-
zação de instrumentos como o IHS, o FIAT-T zes já formados, o que indica preocupação dos
e a FAPRS2. Esses dados indicam a existência pesquisadores a respeito do ensino de Terapia
de recursos diversos que podem ser usados no Analítico-Comportamental na formação conti-
ensino de Terapia Analítico-Comportamental. nuada dos terapeutas. Porém, ao serem obser-
Nesses estudos, constituídos por relato de vados os resultados do processo de ensinar e
experiência de ensino, são citados diferentes aprender, em 10 estudos foi utilizada observa-
tipos de participantes do processo de ensino- ção direta do comportamento dos aprendizes e
-aprendizagem (Figura 4). Como em um úni- em 15 estudos foi realizada observação indireta,
co estudo pode ter sido citado diferentes tipos sendo nove por meio de relato, três por meio de
de participantes, a soma de ocorrência dos ti- instrumentos e, também três, por meio de rela-
pos de participantes é maior do que a quanti- to e instrumento. Isso sugere a necessidade de
dade total de estudos. realização de mais estudos em que os resulta-
dos do processo de en-
sinar e aprender sejam
observados por meio de
observação direta, au-
mentando ainda mais
a fidedignidade deles
(Matos, 2001).
A “avaliação do en-
sino” foi citada em 21
estudos. Em nove de-
les, entretanto, esse
Figura 4. Quantidade de estudos em que são apresentados cada tipo de participante. processo foi feito de
maneira geral, apenas
De acordo com a Figura 4, os clientes são ci- por meio de citação ou ilustração de algum
tados como participantes em 19 dos 22 estudos. procedimento ou recurso de avaliação, como
Apesar de citados nos estudos, o comportamen- “interpretação dos relatos dos aprendizes” e
to dos clientes nem sempre foram observados “identificação do controle de estímulos do com-
como variáveis críticas em relação ao processo portamento do aprendiz”, sugerindo escassez
de ensinar e aprender, mas apenas como contex- de informações que, se usadas, aumentariam a
probabilidade de uma avaliação mais acurada
2 Inventário de Habilidades Sociais IHS-Del Prette do desenvolvimento de comportamentos cons-
(Del Prette & Del Prette, 2001); Functional Idio- tituintes da atuação do terapeuta analítico-com-
graphic Assessment Template (Callaghan, 2006);
Functional Analytical Psychotherapy Rating Scale portamental. Foram identificadas informações
(Callaghan & Follette, 2008). a respeito do delineamento do estudo apenas
em sete estudos: AB (em dois estudos), linha portamental. Tal correspondência é, entretanto,
de base múltipla (em dois estudos), pós teste relativa ou parcial, ao serem consideradas cada
(em dois estudos), e um com testagem em três uma das variáveis constituintes de um processo
momentos do ensino (antes, no meio, e após), de ensino. Os comportamentos-objetivo inter-
o que sugere preocupação de, pelo menos, par- mediários, por exemplo, raramente foram pro-
te dos pesquisadores com a demonstração fi- postos com base em conteúdos, mas nem sem-
dedigna dos efeitos das contingências de ensi- pre eram propostos com a clareza exigida pelos
no sobre os comportamentos dos aprendizes. próprios analistas do comportamento (Botomé,
Apesar de os clientes terem sido citados em 2001/2013; Kubo & Botomé, 2001). Além dis-
19 dos estudos constituídos por relato de ex- so, algumas variáveis são citadas, mas descri-
periência, apenas em dois deles foi avaliado o tas de forma por demais genérica, como as si-
efeito dos comportamentos dos aprendizes so- tuações com as quais o aprendiz (o terapeuta)
bre os clientes. Esse dado parece pouco coeren- irá lidar em contexto clínico e os resultados a
te com os conhecimentos produzidos por analis- serem produzidos pelo e no processo terapêu-
tas do comportamento a respeito dos processos tico. Ademais, é possível concluir certas ten-
de ensinar e aprender, uma vez que a função da dências com base no exame da literatura con-
atuação do terapeuta analítico-comportamen- sultada, como a integração de profissionais de
tal é produzir mudança no comportamento do diferentes regiões e instituições de ensino na
cliente e a observação dessa variável, ainda que produção de conhecimento a respeito do en-
influenciada por dificuldades metodológicas, é sino de Terapia Analítico-Comportamental e,
aquela que mais consistentemente configura- sobretudo, maior especificidade das informa-
ria a eficácia do ensino de Terapia Analítico- ções relacionadas a esse ensino e maior quan-
-Comportamental. Descobrir se esta mudan- tidade de variáveis citadas nesses estudos, mais
ça está sendo realizada implica na necessidade recentes. O aumento da relação entre os pres-
de avaliação dos efeitos da atuação terapêutica supostos da Análise do Comportamento a res-
sobre os comportamentos do cliente. Essa ca- peito dos processos de ensinar e aprender e a
racterística geral de imprecisão das avaliações formação de terapeutas analítico-comportamen-
nos relatos de experiência implica também em tais, a partir da proposição de comportamen-
descrições dos resultados do ensino de maneira tos-objetivo (geral e intermediários) a serem
genérica. Via de regra, as informações são refe- desenvolvidos pelos futuros terapeutas, da es-
rentes a resultados produzidos acerca do desen- pecificação dos resultados terapêuticos a serem
volvimento de comportamentos nos aprendizes, produzidos etc., parece constituir recurso im-
em especial, no contexto de ensino (gradua- portante para maximizar a capacitação de no-
ção). Parece haver, entretanto, uma tendência vos terapeutas analítico-comportamentais, tor-
dos pesquisadores a considerarem uma quan- nando-a cada vez mais coerentes com o próprio
tidade maior de variáveis no processo de pla- conhecimento da Análise do Comportamento.
nejamento de ensino e maior clareza em rela-
ção aos processos envolvidos nessas variáveis. Referências
Em síntese, o exame da literatura consulta-
da possibilita concluir que há correspondência Referências precedidas de um asterisco in-
entre o conhecimento produzido por analistas dicam estudos incluídos na revisão da literatura
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