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Índice
Introdução...................................................................................................................................3
_Toc101546870Claridade e Certeza.............................................................................................8
Conclusão..................................................................................................................................12
Bibliografia...............................................................................................................................13
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Introdução
Recriar a representação do homem e do mundo que o acolhe e onde ele procura realizar-se é
um dos objectivos de toda a literatura de orientação estética realista. Refazer a relação do
homem com o seu espaço vital, é também o propósito da literatura cabo-verdiana em geral e
da de Manuel Lopes em particular.
A nós interessam os caminhos encetados pelo autor no que respeita à sua obra poética
enquanto construção do homem crioulo na sua figuração moral e humana e, bem assim, a
criação de espaços de identidade próprios. Porque pretendemos analisar o pendor estético
realista deste autor e compreender até que ponto esse ideário está presente na sua obra,
centramos o nosso estudo sobretudo nos poemas do livro “Falucho Ancorado”, incorporados
no capítulo “Cais de Quem Ficou”. Porém, abordaremos também os restantes, não só para
estabelecermos pontos de contacto entre os vários ciclos poéticos de Manuel Lopes, mas
também para analisar com mais densidade de pormenores o seu percurso criativo
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Conhecendo Cabo verde
Cabo Verde é um arquipélago situado a mais de 500 quilómetros da costa africana, possui 10
ilhas, sendo Praia sua capital (situada na Ilha de Santiago). A grande característica climática
deste país é a irregularidade de chuvas, o que leva a grandes períodos de seca. Com isso a
população é dizimada, levando os sobreviventes a emigrarem para fugir da fome e da seca,
mostrando grande semelhança ao nordeste brasileiro.
O arquipélago tem uma peculiaridade, não era habitado quando, em 1456, os portugueses
chegaram. Portugal, quando realizava o tráfico de escravos, deixava nas ilhas os escravos
revoltosos ou doentes, já que as ilhas ficavam no caminho entre Portugal e as colónias,
gerando, então, uma comunidade formada por várias tribos, uma grande variedade étnica. A
partir disso surge a noção de “terra trazida” definida por Manuel Ferreira (1972).
A partir da necessidade de se comunicar, surge o crioulo, língua nacional dos cabo-verdianos,
apesar de a língua oficial ser o português. Cabo Verde, assim como os demais países africanos
de língua portuguesa, só teve sua independência em 5 de julho 1975. Ou seja, foram séculos
de dominação, que repercutiram e repercutem na forma de viver e ser do africano. A
identidade cabo-verdiana se constitui de um temperamento morabe, ou seja, os cabo-
verdianos possuem uma política de “boa vizinhança”. Possuem um temperamento amorável,
pacífico e solidário. Com isso, aos poucos a administração colonial foi sendo passada para
suas mãos, até porque Portugal não tinha muito interesse económico nas ilhas, já que não
havia como fazer grandes plantações e nem explorar diamantes, como em Angola, por causa
do clima e do solo da região.
Esse processo Manuel Ferreira explica em seu livro Literaturas africanas de expressão
portuguesa “A colónia, a partir da segunda metade do século XIX, havia já adquirido feição
própria: a posse da terra e os postos da Administração, a pouco e pouco transferiam-se para as
mãos de uma burguesia cabo-verdiana” (FERREIRA, 1987, p. 26). Faz parte também dessa
identidade nacional o dilema do cabo-verdiano: ter de partir querendo ficar e o querer partir
tendo de ficar.
A população cabo-verdiana enfrenta grandes períodos de seca, gerando muita fome e
desgraças. Para muitos a única solução é sair de sua região natal em busca de melhorias, por
isso a necessidade de ‘ter de partir mesmo querendo ficar’. Alguns não têm como buscar um
local melhor para viver e acabam permanecendo onde moram, sofrendo muito e até levando
alguns a morte. Nesse caso o que move as pessoas é o ‘querer partir tendo de ficar’. Isso se
deve a dificuldade de sobrevivência nas ilhas, fazendo com que se perceba a viagem, o mar,
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como a única forma de melhorar de vida. A literatura propriamente cabo-verdiana surge na
década de 30, antes a literatura era baseada em uma “cópia” do que vinha de Portugal.
Cabo Verde foi o primeiro país em que floresceu uma literatura que rompia com os padrões
portugueses. Sobre este período, Benjamin Abdala Júnior relata que Ocorrem a partir da
década de 30 circunstâncias políticas, sociais, históricas e literárias que levaram a literatura
cabo-verdiana a se preocupar com sua identidade, uma identidade regional, que viria a
evoluir, a partir da Segunda Guerra Mundial, para a identidade nacional. Nesse momento, a
intelectualidade cabo-verdiana passou a olhar para a literatura brasileira. Ela via em nossa
literatura um imaginário muito próximo da maneira de ser dos cabo-verdianos. (JUNIOR,
1994, p. 112) A partir dessa preocupação com a sua identidade, o que é o cabo-verdiano, que
surge a moderna literatura cabo-verdiana. Para isso usou-se como inspiração a literatura
brasileira, já que se identificavam com a forma de ser dos brasileiros e com a seca que o
nordeste enfrentava. Autores como José Lins do Rego, Jorge Amado, Manuel Bandeira, Eriço
Veríssimo foram muito lidos pelos intelectuais cabo-verdianos. Em 1936 surge uma
importante revista, a Claridade, que trouxe uma enorme renovação na escrita e na temática da
literatura cabo-verdiana. Com isso surgiu um movimento chamado Caridoso. Considera-se
que só depois dessa época que surge a verdadeira literatura cabo-verdiana. Seu ideário era de
conhecer e falar sobre a realidade cabo-verdiana, com a seca, fome, o mar como um caminho
mítico, pois além dele existe uma vida melhor, mas também como prisão, a insularidade do
arquipélago, o que leva a um sentimento de solidão, o dilema do cabo-verdiano. Nesse
sentido, a Claridade representou, então, um clarão de consciência, recusando a tradição
portuguesa e centrando-se em motivações de raiz cabo-verdiana. Mas, segundo Manuel
Ferreira, “Não é ainda, globalmente, uma política posição anticolonial. Não é ainda algo que
pressuponha a idéia de independência política ou nacional.” (FERREIRA, 1987, p. 43
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Também aí Orlanda Amarílis, a produtora ilhoa que mais atenção tem recebido do espaço
académico, assinou o seu primeiro texto tornado público; como ela, há muito tempo na
diáspora lisboeta, Nuno de Miranda é outro dos intelectuais cabo-verdianos revelados no
início dos anos quarenta. Não se trata, contudo, nem de figuras nem de obras cujo vulto e
projecção exterior esteja ao nível dos clássicos claridosos Jorge Barbosa, Manuel e
Baltasar Lopes.
Claridade e Certeza
No livro No livro Hora di Bai se percebe claramente dois momentos. No primeiro o cabo-
verdiano é considerado pacífico, calmo, aceita sua realidade e tenta conviver com ela, e
quando isso não é mais possível ele parte. São relatadas viagens de barco, pessoas morrendo
de fome, meninas se prostituindo por não terem mais como sobreviver. Isso perdura por quase
toda a narrativa, demonstrando o sofrimento do povo. Apesar de tudo que o aflige, o cabo-
verdiano não se revolta. Já no segundo momento o cabo-verdiano se revolta, arromba um
armazém para conseguir comida, resolve ficar na sua terra, mesmo que sofrendo algumas
coisas, e combater aquilo que os oprime. Há a mudança do cabo-verdiano pacífico para o
lutador. Então, ocorre, segundo Jane Tutikian, um “alargamento da visão cabo-verdiana e a
posição de resignação, apesar da “amor habilidade”, substituída pela posição de luta, de
transformação da realidade” (TUTIKIAN, 1999, p. 60). Essa luta para conseguir algo melhor
pode se dar de diferentes maneiras: de forma mais violenta, como a invasão da casa de
Sebastião Cunha, ou de maneira mais simbólica, ficando em Cabo Verde para ajudar o país a
enfrentar a seca. Cada um desses momentos se relaciona com a idéia defendida por um dos
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movimentos literários. Na primeira parte, quando se relata o sofrimento dos caboverdeanos
que são obrigados a ir para São Vicente, Portugal, São Tomé, aproxima-se muito do ideário
da Claridade, com sua denúncia das mazelas e a necessidade da evasão. A partir do momento
em que o povo se revolta, invade o armazém, resolve lutar para melhorar de vida e ficar na
sua terra, há a passagem para o movimento Certeza. Agora o caboverdeano não é mais
pacífico, que aceita sua realidade, mas sim um povo que se revolta e busca melhoras. Para
Maria Aparecida Santilli, se o primeiro momento da narrativa centra-se na viagem, no trânsito
para procurar algo melhor, na individualização de pessoas, que o que as une é a fome,
mostrando um caboverdeano pacífico que renuncia, o segundo momento relata a vida na ilha,
mostrando uma coletividade que luta a favor dos flagelados, mostrando um caboverdeano
revoltado, que resiste. Então “o caminho da história vai, assim, desviando-se da mentalidade
de renúncia que caracteriza o primeiro movimento, para a de resistência que descreverá o
segundo” (SANTILLI, 1980, p.15). Terminar o romance Hora di Bai com um caboverdeano
que se revolta, luta, não evade para tentar melhorar de vida não deve ter sido apenas uma
forma de encerrar a narrativa, mas pode ser o que o próprio autor, pertencente à Certeza,
acreditava e defendia. Sendo, portanto, o que ele mesmo espera que ocorra com seu país.
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Conclusão
Todos os elementos que compõem a identidade caboverdeana, a língua crioula, a morna, o
temperamento morabe e dilema caboverdeana, estão presentes em todo o livro. Ocorrem, sim,
algumas mudanças em como eles aparecem. O crioulo é assumido no final por nha Venância,
junto com a decisão de ficar em Cabo Verde, assumindo as idéias da Certeza. A morna
aparece no segundo momento como incentivo a revolta do povo, onde eles assumem um
temperamento diferente, agora lutam para tentar melhorar de vida. É possível concluir,
portanto, que o movimento Claridade se aproxima da idéia de abandono das ilhas para a
tentativa de obter uma melhor condição de vida, condição representada na primeira parte do
livro Hora di Bai, ao passo que o movimento Certeza apresenta uma ligação com aqueles que
decidem ficar na sua terra para lutar por melhores condições sociais, representado no final da
narrativ
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Bibliografia
.JUNIOR, Benjamin Abdala. Imagens da identidade e a diferença: Manuel Lopes e o
despertar da caboverdianidade. In: Anais do XIV Encontro de Professores Universitários
Brasileiros de Literatura Portuguesa. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1994.
.LARANJEIRA, Pires, “Formação e Desenvolvimento das Literaturas Africanas de Língua
SANTILLI, Maria Aparecida. Manuel Ferreira: A História de um Novelista e suas Histórias
da “Terra Trazida”. In: FERREIRA, Manuel. Hora di Bai. 1ª Ed. São Paulo: Ática, 1980.
(Coleção de autores africanos, 6). p. 3-15.
TUTIKIAN, Jane Fraga. Inquietos Olhares: A construção do processo de identidade nacional
nas obras de Lídia Jorge e Orlanda Amarílis. São Paulo: Arte & Ciência, 1999.
________________. Velhas identidades novas: O pós-colonialismo e a emergência das
nações de língua portuguesa. Porto Alegre: Sagra Luzzatto, 2006.
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