Você está na página 1de 72

K A TE N ESBIT T

Introdução
PARTE I: A NECESSID ADE DA TEORIA

A teoria d a arq u ite t u ra é u m d isc u rso sobre a p rá t ica e a p ro d u ç ão da d isc ip li n a, q ue


a p o n ta p a ra seus gr a n d es d esafios. Tem p o n tos em co m u m ta n to co m a h ist ó r ia
da a rq u i t e t u ra, q u e est u d a as o b ras do p assa d o , co m o co m a cr í t ic a , esta a t iv id a d e
esp e c ífic a de ju lga m e n t o e i n t e rp re t aç ão de o b ras existe n tes seg u n d o os c r i t é r ios
assu m id os p e lo c r í t ic o ou p e lo arq u iteto. M as a teoria d a a rq u ite t u ra se d ist i n g u e
dessas d u as a t iv id a d es, po is oferece soluções a ltern a t ivas a p a r t ir d a o b se rv a ç ã o da
si t u aç ão corre n te da d isc ip li n a e p ro p õ e n ovos p a ra d ig m as de p e n sa m e n to p a ra o
tra ta m e n to de seus p ro b le m as. A n aturez a esp ec u la t iva, a n tec ip a tória e c a t a lisa d o ra
da a t iv id a d e teórica d ist i n gu e-a da h istór ia e da crít ica. A teoria trab a l h a em v á r ios
n íveis de a bst raç ão , a v a lia n d o a arq u ite t u ra co m o p rofissão, as i n te n ções d os a r q u i
tetos e sua re levâ n c ia c u lt u ral em geral. Ela se o c u p a ta n to d as asp iraç õ es da p ro f is
são co m o de su as realiz ações p rá ticas.
É p ossív e l i d e n t if ic a r ao lo n go d a h ist ó r ia d a a r q u i t e t u r a a r e c o r r ê n c ia de
ce r t as p ro b le m á t ic as q u e d e m a n d a m so lu ç õ es tan to co n c e i t u a is co m o físic as. A s
q u est õ es físic as são r eso lv i d as à lu z da t ec t ô n ic a , e n q u a n to as q u est õ es c o n c e i
t u ais ou i n te lec t u a is são p ro b le m a t i z a d as pela filoso fia. E n tre os assu n tos t eó r ic os
p e r m a n e n t es est ão os d as o r ige n s e li m ites da a rq u i t e t u ra , de sua re la ç ã o co m a
h ist ó r ia e os p ro b le m as re la t ivos ao seu sig n ific a d o e e x p r essã o c u l t u ra l. N o v as
t eo rias su rge m p a ra o ferecer u m a e x p lic aç ão aos asp ec tos n ão ex a m i n a d os ou n ão
e x p l ic a d os da d isc ip li n a .
U m a v isão geral da teoria da arqu itetura nos ú ltim os trin ta anos m ostra que uma
m u ltip licid ad e de qu estões tem d isp u tado a atenção dos estu d iosos. D e fato, u m a das
carac teríst icas do p e río d o plu ralista im precisam e n te d esign ado de pós-m oderno é a
in existê n cia de um tópico ou de um pon to de vista predom inan te. Todas as ten dências
co n tra d itó rias coexiste n tes no p ós-m o d er n ism o m ostra m claram en te um desejo de
u ltrap assar os lim ites da teoria modernista, inclusive do for m alism o e dos p rin c íp ios
do fu n c io n a lism o (“ a form a segue a fu n ção” ), a necessidade de u m a “ ru p tu ra ra d ic al”
co m a h istór ia e a exp ressão “ h on esta” da estru tura e do m aterial. De m odo geral, a
teoria p ós-m o d e r n a da arqu itetura trata de u m a crise de sentido na d isciplin a. D esde
m ead os dos a n os 6o, a teoria vem se caracteriz an do pela in terd isciplin aridade e pelo
rec u rso a u m a m plo espectro de p arad igm as críticos. Este livro, cu jo título origin al é

15
T heoriz ing a N ew A genda fo r A rchitecture [T eori z a n d o u m a n ova age n d a p a r a a a r q u i
t e t u ra],1 p ro p õ e-se faz er u m a rev isão do m o d e r n is m o e p a r a isso re c o r r e a d iv e rsas
abord agens: políticas, éticas, li n gu íst icas, estéticas e fe n o m e n o lógic as.
E m b o ra o ter m o “ p ós- m o d e r n is m o ” so m e n te seja m e n c io n a d o n o t í t u lo d o p r i
m eiro cap ít u lo, é este o ob jeto ce n tral e o p o n to de referê n c ia de to d o o livro . E sp e ro
d e ixar b e m claro qu e o p ós- m o d e r n is m o n ão é u m est ilo si n gu lar, m as, a n tes, a p e r
cepção de in tegrar u m p e r ío d o m arca d o p elo p lu ra lism o . R e fle t i n d o essa i n c li n a ç ã o ,
os ensaios teóricos i n c lu íd os n esta a n tologia são re p rese n ta t ivos de u m a d iv e rsid a d e
de pon tos de v ista e não de u m a irrealista v isã o u n ifica d a. E m certos c asos, esta I n t ro
d u ção m e n cio n a p e rsp ec t ivas n ão rep rese n tad as na a n to logia, de m o d o a a m p l ia r o
con texto d a disc ussão.
P ro c u re i c o n s t r u ir u m d isc u rso coere n te a p a r t i r de t ex tos f r ag m e n t á r io s m e
d ia n te a a d oção, no l iv ro , de u m a est r u t u ra te m á t ic a e p a r a d ig m á t ic a . O s q u a to r z e
cap ít u los e as in tro d u ções aos 51 e nsa ios serve m p a ra co n text u a li z ar o tra ta m e n to de
u m m a terial h e terogê n eo e p a ra fac ilit ar o en te n d im e n to d as c o m p le x id a d es d o p ós-
-m o d e r n ism o . O p tei p o r n ão u sar u m a est r u t u ra c ro n o ló g ic a , q u e p o d e r ia ser ú til
para registrar a seq u ê n cia h istórica de p u b licação dos ensaios, p orq u e p referi esta b e le
cer as co n exões en tre as tem áticas e as p osições dos d iversos au tores, p a íses e d éca d as.
O s tem as e p a ra d ig m as teó ricos esco lh id os p a ra d a r títu lo aos ca p í t u los são o b je tos
recorren tes nos est u d os sobre o p ós-m o d e r n o . C erta m e n te h á in ter-relações, e m u itos
e nsaios b e m c a b eria m so b m a is de u m títu lo. E m co n ju n to, os tem as e p a r a d ig m as
escolh idos pre te n d e m t ra ç a r u m p erfil do a m b ien te in telect u al p re d o m i n a n t e na a r
quitetura desde 1965 e fac ilitar a co m p araç ão en tre diferen tes v isõ es h ist ó r ic as so b re
as m esm as p rob lem áticas.
N a segu n da p arte desta In tro d u ção, voltarei a tratar dos im p or ta n tes tem as e p a r a
d igm as p ós-m o d er n os que orga n iz a m os cap ít u los. N esta p ri m eira parte, a d isc ussão
sobre os vários tipos de teoria e sobre a fin alid ad e geral dos tratados tem o o b je t ivo de
situar as co n tribu ições m ais recentes dos autores ao corp o h istórico da teoria.

PARTE 1 A: TIPOS DE TEORIA

As teorias p o d e m ser c a rac t e ri z a d as p elas v á r ias m a n e ir as de a p rese n t ar seu o b je to:


na m aior p arte das ve z es, elas são p resc ri t iv a s , p rosc r i t iv as , a fir m a t iv a s o u crí tic as.
N e n h u m a assu m e u m a p ost u ra d esc r i t iv a “ n e u tra” . U m h ist o r ia d o r c o n v e n c io n a l,
por exe m plo, po d e m u ito b e m m ost ra r co m o o u t ros a b o r d a r a m as q u est õ es r e le
vantes do m om en to sem d efe n d er exp lic ita m e n te u m a p osiç ã o em p a r t ic u la r. E sse
tipo de h istór ia d esc rit iva p o d e às ve z es p ro p o r ex p l ic a ç õ es p a ra os f e n ô m e n os
com base na correlação estrita en tre fatos, p o r exe m p lo, a i n t ro d u ç ão de n o v as t e c
n ologias p ro d u z in d o m u d a n ças na c o n c e p ç ão d os p ro je tos. O l iv r o d e N i k o la u s

Ifi
P e vs n e r O s p io n e ir o s do d ese n h o m o d e r n o 2 é u m b o m e x e m p lo d e a b o r d ag e m d e s
c r i t iv a c o n v e n c io n a l.
A t e o r i a p r e sc r i t iv a o ferec e n o v as so lu ç õ es, ou ressu sc it a a n t igas so lu ç õ es, p a ra
p ro b le m as esp e c ífic os, estab elec e n d o n ovas n o r m as p ara a p rá t ica; ela p ro p õ e p a d rõ es
p osi t iv os e, i n c lu siv e , às ve z es, u m a n ova m e to d o logia d e p roje to. Esse t ip o d e t eoria
p o d e se r c r í t ic o (e m es m o ra d ic a l) ou c o n f ir m a r o sta tus quo (isto é, c o n se r v a d o r ) .
E m a m b os os c asos, te n d e a assu m ir u m tom p o lê m ico . A s p ro p osiç õ es d e M ic h a e l
G r a v es, e m “A rg u m e n t os em favo r d a a rq u i t e t u ra fig u ra t iv a” (cap. 1) , e d e W illia m
M c D o n o u g h , e m “ O s p r i n c í p io s d e H a n n o v e r” (cap. 8), são c la ra m e n t e p r esc r i t iv as.
E n q u a n to o p r i m e iro e n sa io sugere u m a volta aos id eais h u m a n istas, o seg u n d o é u m
m a n ifesto ec o lógico .
A teoria p rosc r i t iv a se asse m el h a m u ito à p rescrit iv a, m as se d ist i n gu e d esta p o r
q u e seus p a d rõ es estab elece m o q u e deve ser ev itad o n o projeto. E m ter m os p rosc r it i-
vos, a b o a a rq u ite t u ra o u o bo m u rb a n ism o são aq ueles q ue se d efin e m pela a usência
de a trib u tos n egativos. N esse sen tido, o z on eam en to fu n c io n al é u m exe m p lo de teoria
p rosc r i t iv a , co m o ta m b é m o é o c ó d igo de co n str u çõ es da cid a d e de Seasid e, F ló ri d a,
ela b o r a d o p e lo esc r i t ó r io de arq u ite t u ra de A n d rés D u a n y e E li z abet h P la t e r-Z y b er k .
C aso t íp ico de teoria instru m e n tal co n se rva d o ra, esse có d igo d isp õe sobre a q u alid ad e
ad eq u a d a, li m ita n d o as escolh as de m ateriais e de estilos, o a lin h a m e n to e a volu m e tria
d as ed ificações.
A t eo ria c r í t ic a , m a is ab ra n ge n te q u e as a n teriores, avalia o m u n d o c o n s t r u í d o
e su as re la çõ es co m a so c ie d a d e a q u e serv e. D e n a t u re z a t ip ic a m e n te p o lê m ic a , a
teoria c r í t ic a m u itas ve z es co n té m u m a o r ie n t aç ão p o lít ic a ou é tica ex p líc i t a e tem
a i n t e n ç ão d e est i m u la r m u d a n ç as. E n tre as m u itas o r ie n t aç õ es p ossív e is, a teoria
c r í t ic a p o d e f u n d a m e n t a r-se id eo logic a m e n t e n o m a rx is m o ou no fe m i n ism o . U m
b o m e x e m p lo é o “ r egio n a lis m o cr í t ico” do arq u iteto e e nsaísta K e n n e t h F ra m p to n ,
q u e p ro p õ e u m a resistê n c ia à h o m oge n e i z a ç ã o do a m b ie n te v isu a l p elo resp eito às
p e c u lia r i d a d es d a t ra d iç ão c o n st r u t iva local. A teoria crít ica é esp ec u la t iva, q u est io-
n a d o ra e às ve z es u tó p ica.

PARTE I B: A FIN ALID ADE DO TRATADO TEÓRICO:


DEFINIR 0 ESCOPO DA DISCIPLIN A

Os tratados teóricos se ocu pam fundamentalmente das origens de uma prática ou de uma
arte. Por exe m p lo, u m tratado sobre edificações pode situ ar as origens do ato de co n s
tr u ir na n ecessid ad e de ob ter abrigo. U m tratado sobre arquitetura pode sit u ar as o r i
gens d a p rá t ica d isc ip li n a r na im it ação da natureza ( tnimese) e na asp iração inata do
h o m e m a a p erfe iço á-la. E m seu D a arquitetura , V itrü vio form ula a h ipótese de que o
H o m e m , p o r ter “ u m a natureza im itativa e educável (...) evoluiu progressivam en te da

17
constru ção de ed ifícios para ou tras artes e ciên cias” .3 Portan to, na visão de V itr ú vio,
a arquitetura é a fonte e a m atriz das belas-artes. A lé m de post u lare m u m a orige m
legitim adora, os tratados às vezes estabelecem u m a clara d istin ção en tre a arqu itetura,
a m atem ática e as dem ais ciências no intuito de determ in ar a au ton om ia da p rim eira
com o disciplina.
A lém do problem a das origens, o objeto fu n dam en tal dos tratados de arq u itetura
pode ser classificado em fu n ção dos seguin tes aspectos:

í. Os atributos de personalidade, form ação e experiên cia profission al que um arquiteto


deve possuir. E m m eados do século xv, A lberti defin iu “ o que é que p er m ite ser um
arquiteto. C ham arei de A rquiteto àquele que souber, p or m eio de correta e m a ra v i
lhosa A rte e M étodo, com o Pensamen to e a Inven ção co n ceber e, com a E xec u ção,
levar a cabo todas aquelas obras que [...] com gra n d e Beleza, p o d e m a co m o d ar-se
aos usos dos hom ens” .4
2. Os atributos exigidos da arquitetura. Por exem plo, desde a red escoberta da obra de
V itrúvio, no Renascim en to, sua célebre “ tríade” - firm eza, co m od id ad e e p ra z e r5 - é
usada com o critério para a arquitetura. A tríade de V itrú vio tem se m ostra d o difícil
de substit uir ou de superar.
3. U m a teoria do projeto ou do m é to do de co n str u ção , co m p ree n d e n d o su as t éc n i
cas, p artes co n stit u tivas, t ip os, m a teriais e p ro c essos. O Essay su r V A rchitecture
(i753)> do A bad e Laugier, é u m desses tra tad os qu e e n fa t iz a m a c o m p osiç ã o a d e
quada das partes.
4. Exem plos do cânon e da arqu itetura, cuja seleção e aprese n tação revelam a posição
do autor com relação à h istória. O uso p o r Rob er t V en turi de exe m p los t íp icos da
arqu itetura b arroca e m a n eirist a em C om plex idade e con tradição em a rquitetu ra
(1966) foi execrado na época, n ão obstan te a força dos argu m e n tos usad os no livro.
5. U m posicion am en to a respeito das relações en tre teoria e p rá tica. O s arq u itetos Ber-
nard Tschu mi e V ittorio G regotti represen tam duas v isõ es d isti n tas sobre esse tem a
fu n dam en tal. Para T sc h u m i,“ a arquitetura não é u m a arte ilustrativa; ela n ão ilustra
teorias” .6 Seus ensaios sugerem que o papel da teoria é o de i n terp retar e p rovocar.
G regotti, por sua vez, insiste em co nsid erar a “ p esq u isa teórica co m o fu n d a m e n to
direto da ação” 7 no projeto arquitetôn ico.

Uma questão muito controvertida é se a teoria deve ser um “con hecim en to ú til” , aplicável,
e se ela deve determ in ar resultados previsíveis para o projeto arquitetôn ico. Se a teoria
deve produzir resultados previsíveis, então a única aceitável é a de natureza prescritiva ou
sua face inversa, a teoria proscritiva. ( N ão é por acaso que m uitos dos que b uscam obter
resultados previsíveis se filiam a concepções n eotradicio nais da cidade e da arquitetura.)
As duas faces dessa proposição são contestadas por teóricos pós-m o d ern os, co m o A lberto

18
Perez-G om es, para quem “ a crença [m oderna] de que a teoria tin ha de ser validada por
sua aplicabilidade [...] acabou redu zindo a verdadeira teoria à con dição de u m a ciência
aplicada. (...) Essa ‘ teoria* esquece o mito e o verdadeiro con hecim ento e se preocu pa ex
clusivam en te com o controle eficiente do m u ndo material” . 8
E m um ensaio sobre a obra do arquiteto e educador John H ejduk, Perez-Gom es d e
fende a eficácia crítica do projeto não construído, da “paper architecture ” [arquitetura no
papel]. D aniel Libeskin d e Z ah a H adid são outros arquitetos con tem porâneos cujos d e
sen hos ch am aram a atenção para seus autores (devido às novas características espaciais
im plícitas nos seus projetos). Exem plos mais antigos de projetos arquitetônicos de gra n
de sign ificação são a monumental “ arquitetura de som bras” de É tien ne-Louis-Boullée e a
série dos Cárceres de Piranesi, que confirm am a tese da pujança da ideia desen hada. De
maneira geral, porém , o papel do projeto teórico na disciplina, e inclusive a possibilidade
de entendê-lo com o parte da arquitetura propriamente dita, é controverso.
A lé m de d efin ir as origens e o escopo da d isciplin a, a teoria lida com os seguin tes
tem as, todos a bord ad os nos ensaios reu n idos nesta an tologia: o sign ificado, as teorias
da h istór ia, a n aturez a, o lugar, a cidade, a estética e a tec n ologia. A Segu n d a Parte
desta I n tro d u ção apresen ta um breve exa m e de cada um desses tem as e q u estões, se
gu id o de u m a d isc ussão m ais detalh ada do p eríodo p ós-m o d er n o e de sua p ro b le m á
tica específica.
O s prob le m as relacion ados ao sign ificad o da arqu itetu ra e à defin ição de sua es
sên cia e lim ites são ineren tes à questão das origens. Por exem plo, é com u m d i zer que
a fu n ç ão, isto é, o uso p rogra m á t ico do abrigo, singu lariz a a arq u itet u ra e, p o r t a n
to, defin e seu sign ificad o. O u tros, con tudo, alegam que a fu n ção de aco m o d aç ão (no
sen tido literal da palavra) é a essên cia da construção , e não da arquitetura , cu ja ga m a
de in tenções é m ais am pla e co m porta u m a fu n ção sim bólica. Essa d isti n ção é fu n d a
m en tal para d iversas defin ições das fron teiras da d isciplin a bem com o para a co n st i
t u ição da arqu itetura co m o arte, ciên cia, ofício e atividade in telectual.
A pro d u ção de sen tido na arquitetura tem sido frequentemente exa m in ada à luz da
“ a n alogia lingu ística” . C o m p arações com a operação da linguagem suscitam as segu i n
tes i n d agações: que estru t u ras possib ilitam co m pree n der u m a form a de expressão?
O sign ificad o não d epen d e de um processo de repetição do que é fam iliar? Se assim
for, co m o o sign ificad o pod e ser m an tido quan do há invenção e in ovação? Pode haver
sign ificad o na form a ou ele só está presente no conteúdo? Q ue con teúdo é apropriado
para a arquitetura?
E m v ir t u d e d a d u ra b ilid a d e das co nstru ções, o teórico da arq u itetu ra está se m
pre esb a rra n d o n u m co n d icio n a n te h istórico: a observação sim ultân ea de obras que
d a ta m de é p o c as m u ito d ista n tes no tem po. Isso i m põe u m a reflexão sobre nossa
relação co m a tra d iç ão da arq u itetu ra. Q ue uso dar às exp eriê n c ias p assadas de p ro
je to e co n st r u ç ão? A im i taç ão é o m elh or ca m in h o para ch egar a u m a arq u itetu ra

19
b e la e co m u n ic a t iva? O u será q u e os p a d rõ es de b ele z a e p e r c e p ç ã o d a fo r m a se m o
d ific a r a m ta n to q u e a m im ese so m e n te é c a p a z d e p r o d u z ir fo r m as m u d as? Q u al a
i m p o r t â n c ia d o estilo? C o m o as m u d a n ç as t e c n o lóg ic as a fe t a m o u so d e m o d e los
tra d ic io n a is de co nstru ção?
A teoria tam bém trata da relação entre arqu itetura e n atureza co n for m e ela se m a
nifesta na construção do local. Q uan to a isso, as atitu des têm varia d o h istorica m en te de
u m a relação de harm on ia, com u n h ão e in tegração com a natureza a u m a post u ra de h os
tilidade e exploração. A m an eira com o o arquiteto con cebe o território da sua a tividad e,
o m odo com o o trabalho do projetista converte a natureza (o er m o) em paisagem (u m
artefato cultural) são em boa parte influenciados p or p arad igm as filosóficos e cien tíficos.
O que a paisagem , en tendida nu m a acepção am pla para inclu ir situações urban as, su b u r
banas e rurais, deve representar enquanto lugar do h om em na natureza?
C o n vém igualm en te refletir sobre o lugar de u m a ob ra arq u ite tô n ic a no co n texto
urbano. O que há de diferen te em co n stru ir na cidade? Q ual o p ap el e a co n t rib u iç ão
do arquiteto na co n cepção do projeto p a ra u m a cid ad e, e n te n d id a co m o e n t id a d e f í
sica, política, eco n ô m ica e social? N a esfera p ú b lica, há u m a n o ç ão de q u e cab e à a r
quitetura o papel represen tacion al, isto é, de en co n trar u m a exp ressão si m b ó lica para
as instit uições que defin em a sociedade. F ram p to n escreveu que “ a evolu ção do p o d e r
legítim o sem pre se baseou na existê n cia da pólis e de u n id ad es co m p aráve is de form a
institucional e física” .9 Q ue form as seria m essas? N o p roc esso de si m b o li z aç ão estão
presen tes ideias sobre a relação en tre o i n d ivid u al e o coletivo, m u itas vez es sugerid as
por d ispositivos de escala e pelo em prego de u m a m u ltiplicid ad e de ele m en tos si m i la
res nu m a construção.
M edian te a p rojeção do co rp o h u m a n o (sí m b olo da p erfe ição da n at u rez a) em
suas form as, a arq u itetu ra alcan ça u m a h ar m o n ia de p ro p o rçõ es q ue rem ete à q u es
tão da escala e do in d ivíd u o. Tanto na teoria re n asce n tista co m o no M o d u lo r de Le
C orbusier, o corp o forn ece u m sistem a de m ed id as co m p ara t ivas in ter-relac io n a d as
que propicia u m a exp eriê n c ia arq u itetô n ica sign ificativa. Será que esses siste m as de
proporções, desenvolvidos abstratam en te, são de fato perceptíveis?
A estética p ro p orc io n a c r it érios de b elez a, en tre os q u ais a p ro p o rç ão , a o r d e m ,
a u n idade e a a d eq u ação. E m D e re a ed ific a to ria , A lb e r t i a fir m a q u e a a rq u i t e t u ra
deve em ular a natureza de m o d o q ue n e n h u m a de su as p artes p ossa ser re t ira d a ou
acrescen tada sem co m p ro m e ter a q u a lid a d e do todo. Essa d e c la raç ão é u m e x e m
plo das do u trin as estéticas que ca rac t e ri z a m a teoria da arq u it e t u ra e su sc it a m as
seguintes i n d agações: co m o se deve d efi n ir a belez a na a t u alid ad e? Q u e p a p e l têm
o orn am en to e a d ecoração na belez a? O or n a m e n to foi d ifa m a d o p o r a lg u n s p u
ristas m o d er n os, co m o A d o lf L oos, q ue o co n sid erava u m ele m e n to d ec a d e n t e e
wum crim e” . T erão o orn a m en to, a estru t u ra e os m a teriais fu n çõ es i m p or t a n t es na
construção do sentido?

20
C o m o a fir m e i ao d isc u t ir a in c lusão do m é to d o n os tra tad os, o d ese n vo lvi m e n to
das t éc n icas e os a v a n ç os tec n o lógicos são tem as teóricos h istorica m e n te i m p o r t a n
tes n a a rq u i t e t u ra. O s arq u ite tos do m ov i m e n to m o d e r n o ali m e n tava m gra n d es es
p e ra n ç as q u a n to às p ossib ili d a d es de t ra n sfo r m a r a so c ie d a d e m ed ia n te a p ro d u ç ão
em m assa d e o b je tos e m o ra d ias ec o n ô m ic as. A teoria m o d er n a d e p osito u u m a fé
ili m it a d a na c o n t r i b u iç ão d as revo lu ções cien tifica e in d ustria l p ara o b e m -est a r da
h u m a n id ad e. H oje, p a r t i n d o de n ossa p ersp ec t iva p ós-m o d e r n a , n os p ergu n ta m os se
a h istór ia realm e n te ju st ifico u u m a fé tão absolu ta na técn ica e na tec n ologia.
Essa b reve d esc r iç ão d o o b je t ivo geral e do co n teú do d os tra tad os teóricos já n os
dá u m a ideia da co m p lex id a d e da teoria no p erío d o p ós-m o d er n o . M in h a in te n ção ao
exa m i n á-la foi a de co n text u a li z ar os e nsaios reu n idos nesta an tologia, que co nstit u e m
as m ais recen tes co n t rib u iç õ es ao d isc u rso da arq u itet u ra. Passo agora a e x a m i n a r o
p ós-m o d er n ism o .

PARTE II: 0 QUE É 0 PÓS-M O DERNISMO?

M u itos liv ros e lo n gos e n sa ios ten tara m resp o n d er a essa p ergu n ta, e é ev id e n te qu e
o t er m o c o m p o r t a d ifere n tes sig n ific a d os em d ifere n tes co n textos. N ã o faz p a r t e
d os o b je t iv os d o m eu e n sa io a p rese n t ar u m a a n álise cr ít ica ou a p ro fu n d a r- m e no
est u d o d essas d e fi n içõ es. E m vez d isso, a segu n d a p ar te d esta I n t ro d u ç ã o exa m i n a
o p ó s- m o d e r n is m o na a rq u it e t u ra so b três e n fo q u es: co m o u m p e r ío d o h ist ó r ic o
q ue m a n té m u m a re lação esp ec ífic a co m o m o d e r n is m o ; co m o u m a v a r ie d a d e de
p a r a d ig m as re leva n tes [m a rcos teóricos) p ara a re flexão so b re o b je tos e q u estõ es
c u lt u ra is; e c o m o u m g r u p o de tem as. A s p ró x i m as seções d a I n t ro d u ç ã o se so b r e
põe m u m as às o u tras, m as, a p esa r d isso, aju d a m a traçar as lin h as gerais do p ó s- m o
d e r n ism o co m o p e r ío d o e co m o m o d o de i n vestigação de a lgu ns tem as recorre n tes.
O s e n sa ios fo ra m re u n id os em c a p ít u los o rga n i z a d os seg u n d o esses m esm os p a r a
d igm as e tem as.

II A: 0 PÓS-MO DERNISMO COMO PERÍODO HISTÓRICO

0 C O N T E X T O HIST Ó RIC O

E m que co n texto ocorre u a crise do m od ern ism o? O teórico da cultura Frederic lam e-
son respon d e do seguin te m odo:

Os a n os 1960 fora m , de m uitas m an eiras, o p erío do-c h ave da transição, um p e


río d o no qual a nova ord em in tern acion al (n eocolo n ialism o, Revolu ção V erde,
d issem in ação do uso do com pu tador e inform ação eletrônica) ao mesmo tempo se

21
estabeleceu e foi abalad a e co n t u rb a d a p o r su as p ró p r ias c o n t ra d iç õ es i n ter n as e
pela resistê n cia ex t e r n a.10

Essa n ova ord e m é d esign a d a de d iversas m a n e iras, co m o c a p i t a lism o ta rd io , c a p i t a


lism o m u ltin acio n al, pós-i n d ustria li z ação ou so c ie d a d e de c o n su m o .11
É m ais fácil de ter m in ar o in ício do p erío d o p ós- m o d e r n o d o q u e seu fim , ao qual
provavelm e n te ain d a n ão ch ega m os. O a t iv ism o est u d a n t il em p rol d os d ire itos h u
m a n os, d a lib erd ad e e d a pro teção do m eio a m b ie n te co i n c id i u co m o su rgi m e n to
d a cu lt u ra da d roga, do roc k e do p acifism o. A ex p lo ra ç ã o d o esp a ço c ós m ic o , q ue
se in ic io u gloriosa m e n te na d écad a de 1960, m a logro u v i n te a n os d e p o is q u a n d o os
aciden tes desastrosos de T h ree M ile Isla n d (1979) e C h e r n o b i l (1986) d est r u íra m as
esp era n ças d e positad as na ex p lo raç ão segu ra da e n ergia n uclear. O i n d iv id u a lism o
radical se chocou com o fu n d am en talism o religioso repressivo.
A pesar da sucessão de con flitos m ilitares locali z ad os ( m o t iva d os p o r d isp u tas em
torno de petróleo, et n icidade e religião) que ec lod ira m logo d epois da Segu n d a G u erra
M u n dial, de m a n eira geral a paz reinou no O ciden te d u ra n te ci n q u e n ta a n os. A p o p u
lação m u n dial cresceu enorm em e n te e o co m u n ism o se d esin tegro u co m o força p o l í
tica sign ificativa na E uropa O ciden tal, ten do co m o m arco esp e tac u lar a d e m o lição do
M uro de Berlim em 1989.

OBJEÇÕES AO MOVIMENTO MODERNO NA ARQUITETURA

Em m eados dos anos 1960, as objeções à id eologia do m ovim en to m o d er n o e a u m a a r


quitetura m od ern a degradada e ban aliz ada avolu m ara m -se e proliferara m r a p id a m e n
te, vin d o a constitu ir 0 que se d e n o m in o u de crítica p ós-m o d er n a. C o m o F ra m p to n
observou, “ não há d ú vid as de que, em m eados da década de 1960, estáva m os cada vez
mais carentes de uma base teórica realista sobre a qual fu n d ar o n osso trabalh o” . 12
Em “ Place-form an d C u lt u ral I d e n tity” , F ram p to n fala sobre su a cresce n te c o n
vicção de que era preciso im p rim ir novo sen tido ao m o d er n ism o:

Já entendíamos nossa missão como a de reconstituir em certa medida o vigor criati


vo de um movim ento que nos anos anteriores se acomodara form al e program atica-
mente [...]. De qualquer forma, nós fomos a última geração de estudantes a alim en tar
0 projeto de criar modelos urbanos utópicos, tanto num sentido form al com o num
sentido programático.13

A demolição do conju nto habitacional de Pruit t-Igoe, em St. Louis, M isso u ri, em 1972,
é geralmente reconhecida como o marco do fracasso de uma con cepção m o d er n ista de
habitação social. Um “subproduto an tiutópico, que ao m esm o tem po inspira e m erece

22
a d e s t r u iç ã o ” , u m a “ i n t e r p r e t a ç ã o b u r o c r á t ic a ” re a li z a d a p o r M i n o r u Y a m asa k i d os
so n h os d e L e C o r b u sie r, H i lb e rse i m e r e o u t r o s,14 q u e a p o p u laç ão d e b a ix a re n d a d e
testo u e se e n c a r r ego u d e d es t r u ir p e lo v a n d a lism o e pela n egligê n c ia. A d e m o liç ã o
d e lib e ra d a e esp e t ac u la r d essa o b ra d a a rq u ite t u ra m o d er n a (tão ce leb ra d a q u a n d o de
su a i n a u g u r a ç ã o ) foi u m c laro si n a l de a lerta p a ra os arq u itetos.
A fé q u e a ge r a ç ã o d e F ra m p to n d e p osi to u na co n t i n u id a d e d o p ro je to m o d e r n o
foi ta m b é m a b a la d a pela a p ro p r ia ç ã o d a estética m o d e r n a co m o sí m b o lo de i n o v a ç ã o
na a rq u i t e t u ra d as gr a n d es c o r p o r a ç õ es e m p resaria is. D esp o ja d a de seu p rogra m a s o
cial, a a rq u i t e t u ra m o d e r n a d a d é c a d a de 1950 re d u z i u -se a u m estilo re itera d a m e n te
u t ili z a d o n as á reas c o m e rc ia is d as c id a d es. Esse fato n ão c h ego u a p r e o c u p a r m u ito
os a rq u ite tos n o r t e-a m e r ic a n os. R e fe r i n d o-se aos “ N e w York F ive” , 15 C o li n Ro w e a fir
m o u q u e “ a a rq u i t e t u ra m o d e r n a e u ro p e ia foi i m p o r t a d a p a ra a A m é r ic a se m o seu
co m p o n e n t e i d e o ló g ic o ” . 16 N os a n os 19 60 , a liás, já se sab ia q u e os e u ro p e u s n ão t i
n h a m sid o m u ito b e m -su c e d i d os na im p le m e n tação de sua age n d a so c ia l, e u m c l i
m a de fr u st r a ç ã o co m as re fo r m as so c ia is tom ou con ta da p rofissão. A o rga n i z aç ão de
e x p osiç õ es e de p u b lic a ç õ es, b em co m o a c r iaç ão de i nst it u içõ es d e d ic a d as à teoria,
de certo m o d o p arece resp o n d er a essa crise profissio n al. A referên cia a exe m p los sig n i
ficativos d essas i n ic ia t ivas vai d efi n ir o p e r ío d o em pau ta, de 1965 a 1995.

I NSTITUT OS ESPECIALIZ A D OS EM TE ORIA DA ARQ UITETURA! NOVA YORK, VENEZA, LONDRES

A i n st i t u c io n a l i z a ç ã o d a t eoria a rq u i t e tô n ic a se ev id e n c ia na f u n d aç ão de d o is c e n
t ros de est u d os i n d e p e n d e n t es em N o va York (19 67-85) e V en e z a (19 6 8 -), a m b os
resp o n sá v e is p o r in te nsa a t iv id a d e ed ito ria l. C o m u m a m issão se m elh a n te à da a a -
L o n d o n A rc h i t ec t u ra l A sso c ia t io n , fu n d a d a em 1847, o cosm o p o li t a i a u s - I nstit u te
fo r A r c h i t e c t u r e a n d U rb a n S t u d ies, de M a n h a t t a n , o rga n i z o u c u rsos, p a lest r as,
si m p ósios, m esas-r e d o n d as e e x p osiç õ es. Tal co m o a a a e o Instit u to de V eneza, o
i a u s foi c r i a d o p o r u m a c o m issã o de a rq u ite tos (p resid id a p o r Peter E ise n m a n )
c o n t r á r ios ao siste m a v ige n te de e nsi n o de arq u ite t u ra, q u e na I nglaterra e na Itália
é es t a t a l.17 O i a u s p u b lic o u u m b o le t i m i n fo r m a t ivo , S k y lin e , d u as rev istas, O ppo-
sitions e O c tobe ry e u m a série de liv ros co m o selo da O ppositons.]H Fez p a r te d es
sa série d e v i d a c u r t a a i n flu e n te tra d u ção p ara o inglês de L A rch it e t t u ra delia cit t à ,
de A ld o Rossi em 1982 (o o r ig i n a l ita lia n o data de 1966). A forte ên fase do Institu to
n o d isc u rso e d isse m i n a ç ã o da teoria foi típica do p e río d o p ós-m o d er n o . ( O c i a u -
C h ic ago I nstit u te for A rc h itec t u re a n d U rba n ism [Institu to de A rq u itet u ra e U rb a n is
m o de C h ic ago] ressuscito u o m o d elo do i a u s , en tre 1987 e 1994, q u a n d o as fontes de
fi n a n c ia m e n to m i n g u a ra m .) U m a das co n trib u ições m ais im portan tes do i a u s foi ter
a p rese n tad o ao p ú b lico n o r t e-a m e ric a n o arqu itetos e teóricos eu ropeus, m uitos dos
q u ais i n flu e n c ia d os p o r p a ra d igm as li n gu íst icos.19 A p esar de o i a u s não ter n en h u m a

23
apareceu pela prim eira vez em 1983, com um nú m ero dedicado à análise do R i t u a l , e o
volu me 1 da Pratt J ournal o f Architecture> intitulado Architecture a nd Abstraction (1985),
con trapôs a ascensão da representação h istoricista p ós-m o d er n a à abstração m o d er
nista. A lgu ns periódicos adotaram um enfoque tem ático, co m o a revista C en t er (da
U niversidade do Texas em A ustin), que desde 1985 se dedica a questões gen ericam en te
relacionadas ao estudo da arquitetura norte-am ericana.
A seriedade com que os editores, alu nos e professores tratam os assu n tos (a h is
tória, a cidade, a monumen talidade, a paisagem , a tectôn ica, a ética etc.) in d ica a p ro
fundidade da percepção da crise. Os arquitetos pós-m od ern os usaram a palavra esc ri
ta para selecionar problemas com plexos com a m esm a frequência com que se voltaram
p ara 0 projeto teórico. A imensa atividade editorial acadêm ica nesse p erío d o é um i n
dicador do impacto recente e acessibilidade da editoração eletrôn ica em m ercados não
comerciais. M as também é um reflexo da escassez do trabalho de pra n ch eta en tre os
arquitetos, principalm en te na fase de desaceleração da atividad e co nstru tiva p rec ip i
tada pela crise energética e o em bargo do petróleo de 1973, e pela subsequen te recessão
da indústria de construção civil ao longo das décadas de 1980 e 1990. E m p erío d os de
decréscimo de suas atividades profissionais, os arquitetos desviam o seu in teresse para
a elaboração de textos e projetos teóricos.
Passemos agora a exam in ar m ais detalhadam en te algu ns livros e ar t igos e m b le
máticos. O leitor também poderá orien tar-se pela d iscussão dos tem as e p arad igm as
teóricos contida nas próxim as seções, bem com o pelas in trod uções de cada ensaio, nas
quais são fornecidas mais inform ações de contexto.
As objeções levantadas na década de 1950 à ortodoxia do m ovim en to m o d er n o
culm inaram em meados dos anos 1960 com a publicação de d iversos tratados m uito
significativos, além dos já mencionados A arquitetura da cidade e C om plexidade e con
tradição em arquitetura (1966). Entre eles incluem-se Intentions in A rchitecture (1965),
de C hristian Norberg-Schulz, Notes on the Synthesis o f Form (1964)» de C h ristop h er A lc-
xander, e II Território dellA rchitetíura (1966),25 de Gregotti. Este último não foi trad u z i
do na íntegra para 0 inglês, mas é citado com frequência por autores não italianos (cap.
7). Os livros de N orberg-Sch ulz e de Rossi serão discutidos na p róxim a seção, que trata
da questão do lugar e da teoria urbana (caps. 9,6 e 7).
O livro de Robert Venturi Complexidade e contradição em arquitetura p u b licado
pelo Museu de A rte M oderna de N ova York e tradu z ido para dezesseis id io m as, p re
coniza a im portância de levar em conta e aplicar a h istória da arqu itetura no projeto
con temporâneo (cap. 1). Essencialmente um manifesto em prol do ecletism o h istoric is
ta, 0 livro privilegia o prim eiro termo, an tim oderno, das oposições b in árias, h íbrido /
puro, distorcido/sím plificado, am bíguo / claro. Venturi trata da co m u n icação de sig n i
ficados em distintos níveis e se vale de associações com u ns com a h istória da a rq u i
tetura. De modo semelhante, A prendendo com Las Vegas (1972)26 acen tua o va lo r do

26
d ad o co m u m , d a c u lt u ra si m p ló r ia da S trip, ou co rred or co m erc ial às m arge ns das
a u to est ra d as (cap. 6). A teoria i n c lusiva do “ tan to... co m o” ( bo t h / a n d ), for m u la d a
em C o m p le x id a de e con t radiç ão , reco n h ece fu n ções exp lícitas e im p líc itas, literais e
si m b ó lic as, e a d m ite m ú lt ip las in terp retações. A o afir m ar sua preferên cia pela “d i f í
cil ord e m de i n c lusão” (co m todas as tensões que dela resu ltam ), V en turi d e m o nstra
a i n flu ê n c ia de d iv e rsos p a ra d ig m as de pe nsa m e n to: a se m io logia, a psic o logia da
G esta lt e a teoria li t erá ria de W illia m E m pso n , em S even Types o f A m bigu i t y.27 As
ú ltim as p ági n as do livro sugerem a d ireção que as in vestigações de V en turi v ir ia m a
to m ar: ao d e c la rar q ue a M ai n Street a m erica n a é “q uase correta” , ele p ropõe q ue “ tal
vez se p ossa co l h er na p aisage m co t id ia n a, v u lga r e desd e n h ad a, a ord em co m p lexa
e c o n t ra d itó ria, q u e é legítim a e vital para nossa arqu itetu ra co m o um todo u rb a n ís
tico” .28 U m arq u iteto qu e celebra no m eio am bien te o “ feio e ord i n ário” é certa m en te
revo lu c io n ário , m as a m u d a n ça será p ara m elhor? Estará con tida nesta celeb ração a
p osição p op u lista que ele alega represen tar?
Ph ilip Jo h nso n (u m dos m en tores de Ven turi) recorda a i m portân cia de C om ple
x id a de e contradição para o pós-m o d er n ism o arquitetônico, q uan do escreve que:

T udo começou com o livro de Bob Venturi. Nós - Venturi, [Robert A. M.) Stern, [Mi-
chael] Graves e eu - percebemos que devíamos nos ligar mais à cidade e às pessoas. E que
devíamos ser mais contextuais: que devíamos prestar atenção nos velhos edifícios.29

O n ze a n os d epois de p u b licad a, a in flu ê n cia da teoria de Venturi já era gra n d e. Em


1977, Rob er t Stern , o ed itor da revista Perspecta que, em 1965, reprod u z iu pela p r i
m eira vez um excerto de C om plexidade e contradição , escreveu uma in terpretação da
ten dên cia historicista pós-m odern a . (Para d isti ngu ir o estudo de Stern do p ós-m o d er-
n ism o em geral, d e n o m i n o-o de h istoricism o pós-m o d er n o.) N esse ensaio, i n tit u la
do “ N ovos ru m os da arqu itetu ra m od ern a norte-am erican a: pós-escrito no lim iar do
m o d er n ism o” , Stern iden tifica três focos de interesse: a cidade, a fachada e a ideia de
m e m ória cu lt u ral (cap. 1). E, adem ais, estabelece algu ns prin cíp ios com o corolários:
o ed ifício é um fragm en to de um todo m aior (con textualism o); o ato arqu itetôn ico é
u m a resposta h istórica e cu ltural; e o sign ificado dos ed ifícios se desenvolve ao longo
do te m po.30 E m b ora o “ p ós-esc rito” de Stern tivesse a in tenção de assin alar o fim do
m o d er n ism o e de a n u n c iar o co m eço da era p ós-m o d er n a, não se apresen ta com o
um m a n ifesto, tal qual o livro de Venturi de 1966. O ensaio apresen ta o p ós-m o d er
n ism o na form a de u m a crítica, que Stern iden tifica com uma tentativa de acabar com
a d iv isão m o d er n a en tre o “ racio n alism o” (com preen den do a fu n ção e a tecnologia)
e o “ realism o” (a h istória e a cu lt u ra). É interessante notar que fu n ção e tecnologia
são justa m e n te os asp ectos que Peter E isen m an associa com a represen tação “ realista”
do m ovim e n to m o d er n o em “ O fim do clássico” (cap. 4). Stern alega que as form as

27
arquitetônicas pós-m od ern as são “ reais” e não abstratas, e que têm 4co n sc iê n c ia de
seu propósito e materialidade, de sua h istória, do con texto físico em que são co n st r u í
das e do ambiente social, cultural e político de que se o r igi n ara m ” .31 Stern apresen ta
nos seguintes termos a sua posição quan to ao papel social da co n st r u ção: “ O s e d ifí
cios são projetados para sign ificar algum a coisa [...] não são objetos h er m e tica m e n te
fechados” .32 C on trapon do-se à confiança na co m u n icação e na acessib ilid a d e, os d e
fensores da responsabilidade social da arquitetura criticara m a arq u itet u ra h istoricis-
ta pós-m odern a como um m od ism o elitista.33
N o m esm o ano de 1977, C harles Jen cks p u blicou T he L a ngu age o f Post-M odern
Architecture , em que classificou o novo m ovim en to co m o u m estilo d o ta d o de certas
características previsíveis. Jencks popu larizou a p alavra “ p ós- m o d e r n is m o ” (q u e vem
do final da década de 1940) na arquitetura, de on de ela se p ro p ago u p ara as d e m a is
artes. E m sua obra teórica, Jam eson e o filósofo Jü rge n H ab er m as ad o ta m a acep ção
de pós-m od ern ism o arquitetônico cu n h ada por Je n cks [a qual d e n o m i n o de h ist o r i
cism o pós-m oderno) para se referirem a u m a série de q uestões c u lt u rais e so c ie tárias
mais gerais.
Em 1969, um grupo de arquitetos, que se autodenom in avam c a se ( C o n fere n ce o f
Architects for the Study o f the E nviron m en t), reu n iu-se no mo ma - M useu de A rte
M oderna de N ova York. U m resultado in direto do encon tro foi a p u b licação em 1972
do livro Five Architects, que exibiu a obra abstrata e de insp iração m o d er n ista de Peter
Eisenman, M ichael Graves, C harles G wath m ey, Joh n H ejdu k e Rich ard M eier, arq u ite
tos que se tornaram con hecidos com o “ Os C in co de N ova York” . C o m u m a a p rese n
tação escrita em parceria por A rt h u r D rexler (en tão c u ra d or do mo ma e d ire to r do
setor de Arquitetura e D esign), C olin Rowe e Ken neth Fram p ton, e in clu in d o um pós-
-escrito assinado por Joh nson, a obra dos cinco adq u iriu im ediata cred ib ilid ad e en tre
os patronos da arquitetura. Represen tan do u ma ten dência abstracio n ista co n t rá ria à
causa de Venturi, Stern e Jencks em favor da im portân cia do sign ificad o, o livro teve
enorme influência entre os arquitetos. N o prefácio, D rexler defin e o tom ao d escrever
a obra ali apresentada como “apenas arquitetura, não a salvação da h u m a n id ad e ou a
redenção do m undo: [...] Todos nós estam os in teressados [...] na refor m a so c ia l [...).
Os jovens europeus ainda não com preen deram que a arquitetura é o i nstru m e n to com
menor chance de fazer a revolução, mas nos Estados U n idos isso já é u m fato” .3‘
O solo com um entre os cin co era o for m a lism o: o in teresse pela a rq u i t e t u ra do
jovem Le C orb usier e pelas p ossib ilid a d es não ex p e ri m e n ta d as de t r a n sp o r p a ra a
arquitetura as ideias dos pin tores cu b istas. D esde en tão, cad a um seg u i u o seu c a
m in ho, mas todos con tin uam a ser figu ras im p orta n tes nos m eios a c a d ê m ic os e no
m undo profissional.
Em 1976, Rowe publicou uma coletânea dos ensaios que escreveu desd e o fin al da
década de 1940, com o título de The M athem atics o f the Idea l Villa a n d O ther Essays.

28
M u itos textos h av ia m c irc u lad o in for m alm e n te antes da p u b licação, e o livro se tor
n ou u m c lássico, in c lusive o in flu e n te ensaio “ T ra nsp are n cy: Literal a n d Ph e n o m e-
n a l” , esc rito em p a rc e ria co m Ro b er t Slu t z ky.35 O livro Collage C ity (1978), em co-
a u toria co m F red K oetter, será a n alisad o m ais adian te no â m b ito de u m a d isc ussão
sobre a cid a d e. O ca p í t u lo 6 reed ita u m a versão desse texto, que foi p u b lica d a no
form ato de ar t igo em 1975.

EXPOSIÇÕES

U m a série de i m p or t a n t es ex p osiç õ es deu su p orte à d ifusão da teoria a rq u i t e tô n i


ca p ós- m o d e r n a . A m esm a sim u lta n e id a d e de m eios carac teriz ou o p e río d o do alto
m o d e r n ism o d as d éca d as de 1920 e 1930 na E u rop a, com as suas n ovas revistas ra d i
cais e as freq u e n tes ex p osiç õ es de p ro tó t ip os h ab itacio n ais. N os E stad os U n idos, a
p ri m e ira te n d ê n c ia da arq u itet u ra m o d er n a foi lan çad a em N ova York, pelo M useu
de A rte M o d e r n a (p o r in ce n tivo de Jo h nso n ), com a realiz ação da ex p osiç ão sobre o
Estilo I n ter n ac io n a l em 1932. Esta m ostra sem in al teve a sua versão no p e río d o pós-
-m o d er n o q u a n d o o mo ma orga n iz o u três im portan tes exposições que m ap eara m as
m u d a n ças de r u m o na arq u ite t u ra. A p ri m eira, a E xp osiç ão B e a u x- A r ts, de 1975, e
seu vo l u m oso ca tálogo (qu e ain d a se p o d ia avistar nas m esas dos estu dan tes de Yale
d u ra n te os a n os 1980) in flu e n c iara m grafica m e n te a arqu itetu ra p ós-m o d er n a com
suas d e lica d as aq u are las de proje tos n eoc lássicos da A cad e m ia F ran cesa. A s plan tas
exib id as ta m b é m m ostrava m exe m p los do em prego clássico da proc issão, dos eixos,
da h iera rq u ia, d os esp a ços em poch é e da p ro p orç ão. Q u atro a n os d ep ois, a e x p o
sição “ T ra n sfo r m a t io n s” reu n iu trab a lh os realiz ados a p a r t ir de 1969, in clu in d o um
re p er tório sem elh a n te àquele aprese n tado por Je n cks em A linguagem da arquitetura
pós-m ode r n a .3Ó
A terceira ex p osiç ão orga n iz ad a pelo moma no p eríodo p ós-m o d er n o, com a
cu radoria con ju n ta de Joh nson e M ark W igley, foi “ D econstructivist A rchitecture” , em
1988.37 N ela, os cu radores tentaram fazer o mesmo tipo de reorientação da profissão, o
m esm o tipo de cod ificação de um “ m ovim en to” , tal com o realizado pelas im portantes
exposições que a precederam . A pesar de atrair algum a atenção, a exposição não lan
çou nen h u m a ou tra tendência significativa. A discrepância entre o aspecto exterior das
obras e as in tenções dos arquitetos fez o conju n to parecer forçado. M ary M cLeod, em
“A rchitecture and Politics in the Reagan Era: From Postmodern ism to D econstructivism” ,
sugere que algu ns dos arquitetos que haviam rejeitado o título de “desconstru tivistas”
quiseram p articip ar da exposição.38 Ao que parece, o nome “desconstru tivism o” servira
mais com o um rótulo estilístico para a exibição de obras provocativas do que talvez para
assin alar m aiores afin idades intelectuais entre elas. Termo ambíguo, o “desconstru tivis
m o” (usado som en te na arquitetura, pelo que sei) reflete expressamente duas fontes de

29
influência sobre o tipo de obra pós-m odern a ali exibida: a desco nstru ção filosófica de
Jacques D errida (ver a discussão sobre a teoria lingu ística) e o co n st r u t iv ism o russo.
Rem Koolhaas e Zaha H adid, que trabalharam ju n tos, são talvez os arquitetos que mais
fizeram explorações form ais baseadas no constru tivism o. D o gr u p o de arq u itetos que
participou da exposição, Peter Eisen man e Bernard Tschu mi são os que m ais se a p roxi
mam de uma postura desconstrucionista, com sua ênfase na crítica e na d issolu ção das
fronteiras disciplinares. M as Fran k Gehry, Steven H oll e o C oo p H im m elb lau não têm
muito em comum com os outros arquitetos citados; o que os ap roxi m a é um m étodo
de trabalho que parte da intuição e das propriedades sensoriais dos m ateriais. G e h ry e
Holl representam uma forte contratendência ao h istoricism o p ós-m o d er n o , adota n do
um enfoque quase metafísico das coisas concretas. E m seus trabalhos e nos de ou tros
arquitetos desse período há um fundam ento fenom enológico, nem sem pre articu lad o
conscientemente, mas que se faz muito presente como subtexto.
Em 1980, a G aleria Leo C astelli de N ova York p ed iu aos m a is i m p o r t a n t es a r
quitetos in tern acionais que m an dassem projetos de resid ê n c ias p a r t ic u la r es, n u m a
prova do recon hecim en to da crescente p op u larid ad e da arq u ite t u ra en tre o gra n d e
público. Os oito projetos visio n ários reu n idos na m ostra “ H o uses F or Sa le” foram
expostos como obras de arte e rapidam en te ve n d id os.39 A G a le ria M ax Pro tec h , ta m
bém de N ova York, mon tou exposições regu lares de arq u itet u ra d u ra n te to d a a d é
cada de 1980.
A seção de arquitetura da Bienal de V eneza de 1980 foi o rga n i z a d a p o r Paolo
Portoghesi em torno do tema “A presença do passado” . E m seu livro Post m odern: The
Architecture o f the Postindustrial S ocie ty , Portogh esi assim descreveu o fe n ô m e n o ali
retratado:

A linguagem do pós-modernismo [...] trouxe para 0 dom ín io da cidade co n te m porâ


nea um componente imaginário e humanista e pôs em circulação fragm en tos e m éto
dos da grande tradição histórica do mundo ocidental. [...] Introduziu uma nova força
e um novo grau de liberdade no mundo do arquiteto, no qual, por décadas, a estagna
ção criativa e uma extraordinária indolência haviam tornado inoperante a herança do
movimento moderno.40

A exposição suscitou polêmica: uns a consid eraram saudosista e “ce n ográfica” , o u tros,
como o curador, como uma in jeção de ân im o na arquitetura. Jü rge n H a b er m as ficou
tão chocado com a visita à exposição que redigiu u m a con ferên cia p ara p ro testar c o n
tra aquela “ vanguarda de fachadas retroversas” .4' Publicado sob o título “ M o d e r n i d a
de - um projeto inacabado ,42 seu ensaio in d ign ado torn ou-se um m arco de co n v e r
gência dos arquitetos preocupados em salvaguardar os aspectos válidos do p rogra m a
da arquitetura moderna.

30
II B: PARADIGMAS TEÓRICOS DEFINIDOS PELO PÓS-MODERNISMO

A lé m d a m u l t ip lic a ç ã o d e p u b lic a çõ es d e d ic a d as à teoria arq u itetô n ica, de ce n tros de


est u d os esp e c ia l i z a d os e d as ex p osiç õ es, o p ós- m o d e r n is m o se carac teri z a em geral
p e la p r o l ife r a ç ã o d e p a r a d ig m as t eó r icos ou de e n q u a d ra m e n tos i d eo lógicos, qu e
est r u t u ra m os d eb a tes t e m á t icos. I m p o r t a d os de o u tros ra m os do co n h ec im e n to, os
p r i n c ip a is p a r a d ig m as q u e m o d e la m a teoria arq u itetô n ica são a fe n o m e n ologia, a es
tética, a teoria li n gu íst ic a (se m ió t ic a, estru t u ra lism o, p ós-estru t u ra lism o e d esco nstru -
c io n ism o ), o m a rx is m o e o fe m in ism o.

PRIM E IR O p a r a d ig m a : a f e n o me n o l o gia

U m asp ec to d essa i n te rd isc ip li n arid a d e é o papel cen tral na teoria da arq u itetu ra do
m é to do filosófico co n h ec id o co m o fe n o m e n ologia. A existê n cia desse fu n d am en to fi
losófico na b ase das atitu des p ós-m o d er n as com relação ao sítio, ao lugar, à paisagem
e à ed ificação (esp ec ialm e n te a tec tôn ica) passa m uitas vezes despercebida, n ão su sc i
ta n do i n vestigação. A teoria arq u itetô n ica recente a p roxi m o u -se da reflexão filosófica
ao p ro b le m a t i z ar a i n teração do corp o h u m an o com seu am bien te. Sensações visu ais,
táteis, olfativas e au d itivas constituem a parte visceral da apreensão da arquitetura, um
veíc u lo que se d ist i n gu e p or sua presen ça trid im e nsion al. N o p erío d o p ós-m o d er n o,
a relação co rp o ra l e in conscien te com a arquitetura voltou a ser um objeto de estudo
para a lgu ns teóricos p o r m eio da fe n o m e n ologia. A fen o m e n ologia h usserlia n a, e n
q uan to “ u m a in vest igação sistem ática da consciên cia e de seus objetos” , 1' serviu de
base para o trabalho de filósofos posteriores.
Estim u lada pela facilidade de acesso a traduções de obras de M artin H eidegger e
Gaston Bachelard da década de 1950,^ a reflexão fenomenológica sobre a arquitetura co
m eçou a tom ar o lugar do form alismo e a preparar o terreno para o surgimento da estética
con tem porânea do sublime. H á um retardamento característico da teoria da arquitetura
em relação à teoria da cultura, e a assim ilação da fenomenologia não foi uma exceção.
A crítica fe n o m e n ológica da lógica da ciên cia, que o pensam en to positivista (“o o t i
m ism o acerca dos b e n efíc ios que a d ifusão do m étodo cien tífico haveria de p ro p o r
c io n ar à H u m a n id a d e” ) ’^ elevara acim a do Ser desvaloriz ado, atraiu bem m enos o
e n t usiasm o d os p ós-m o d er n ist as engajados na reconsideração das con tribu ições da
tec nologia para a m od ern id ad e.
H e id egger (1889-1976) estu dou filosofia com E d m u n d H usserl. Seus a li n h a m e n
tos polít icos d u v id osos d u ra n te a Segu n d a G u erra M u ndial provocaram uma áspera
recep ção de sua ob ra no m eio filosófico. N ão obstan te, a influência de H eidegger é
evide n te no d esco n st r u c io n ism o de D errida e nas teses sobre o corpo dos teóricos
p ós-m o d er n os.

31
Os escritos de H eidegger são m otivados p or sua p reoc u p ação com a i n capacid ad e
do hom em m od ern o de refletir sobre o Ser (ou a existê n cia). E isso é cr u c ia l, d iz ele,
porque essa reflexão é que define a con d ição h u m ana. U m dos trab a l h os fen o m e n oló-
gicos de m aior influência na arquitetura é “ C o nstru ir, habitar, p e n sa r” , em que H eide
gger analisa a relação entre o constru ir e o habitar, Ser, edificar, c u lt ivar e co nsid erar.46
Investigan do a etim ologia da palavra alemã bauen (“co nstru ir” ), H eid egger redescobre
antigas conotações e sign ificados m ais am plos que exp ri m e m a riq u e z a poten cial da
existência. H abitar é defin ido com o “ um perm an ecer [ou estar] com as co isas” . Q u a n
do as coisas (os elementos reunidos na natureza quád ru pla de terra, céu, seres m ortais
e seres divin os) são nom eadas pela prim eira vez, afirm a o filósofo, elas são reco n h eci
das. H eidegger sustenta ao longo do ensaio a ideia de que a lingu agem m o d ela o p e nsa
mento, e que o pensamento e a poesia são necessários ao habitar.
C hristian N orberg-Sch ulz interpreta o conceito heideggeriano de habitar com o es
tar em paz num lugar protegido. Isso o leva a defender o potencial da arqu itetura para
dar suporte ao habitar: “ O objetivo prim ordial da arquitetura, portan to, é fazer um m u n
do visível; ela o faz como uma coisa, e o m undo que ela torna presen te consiste naquilo
que ela reúne” .47 O crítico norueguês tornou con hecida a ideia de u m a co n exão entre a
arquitetura e o habitar numa série de publicações in iciada em 1971 com Existence , Space
and Architecture. U m interesse anterior pela experiên cia das coisas “co n cretas” está ex
presso em “ Intenções na arquitetura” (1965), em que já se an u ncia a fu tura d ireção de
seus estudos. N orberg-Sch ulz é m uito citado atualm en te e é tido co m o o prin cipal
defensor de uma fenomenologia da arquitetura que se preocu pa com “ a con cretiz ação
do espaço existencial” mediante a form ação de lugares. O aspecto tectôn ico da arq u i
tetura tem um papel nisso, principalm en te no que diz respeito ao detalhe con creto que,
nas palavras de N orberg-Sch ulz ,“explica o ambiente e exprim e seu caráter” .4H
A abordagem fenom enológica da arquitetura requer u m a aten ção c u id a d osa ao
modo de fazer as coisas. A trib u i-se a M ies a frase: “ D eus está nos d e tal h es” . Essa i n
fluente escola de pensamento não somente recon heceu e exaltou os elem en tos básicos
da arquitetura (parede, chão, teto etc., com o horizon tes ou lim ites), m as reavivo u o
interesse pelas qualidades sensoriais dos m ateriais, luz, cor, e pela sign ific aç ão si m b ó
lica e tátil da junta.
Perez-Gomes propõe am pliar o conceito h eideggerian o da h ab itação p ara in clu ir
uma “orien tação existencial” , u m a id en tificação cu ltural e u m a relação co m a h ist ó
ria.49 Fixando para si um “ ponto de apoio” existencial n u m a arqu itetu ra “ au tê n tica” , o
homem pode lidar com a m ortalidade pela transcen dência da “ h ab itação” .50
Inspirado na fenom enologia de H a ns-G eorg G adam er, Pere z-G o m e z a fir m a que
a apreensão do significado da arquitetura requer u m a “d i m ensão m e tafísica” . Essa d i
mensão “ revela a presença do Ser, a presença do invisível no in terior do m u n d o c o t i
diano” . O sentido do invisível deve exprim ir-se numa arquitetura sim bólica. A ê n fase

32
que Pere z -G o m es d á ao h ab itar é sem elhan te à de N orberg-Sch u lz, m as o p rim eiro é
m ais p rescritivo na exigên cia da represen tação: “ U ma arquitetura sim bólica é a que re
presen ta, que p o d e ser recon h ecid a com o parte de nossos son hos coletivos, com o um
lugar co m p le ta m e n te h ab itado” .51 É possível, no entanto, ao m esm o tem po reco n h e
cer a p o tê n c ia do co n ceito de h ab itar e con testar a afir m ação de Pere z-G o m es sobre
a n ecessid ad e de m eios represen tativos, sim bólicos, de con cretiz á-lo. D e fato, algu ns
teóricos argu m e n ta m que a abstração é m ais aberta a in terpretações e, portan to, m ais
u n iversalm en te sign ificativa.
U m fe n o m e n ólogo fin la n d ês, Ju h a n i Pallasm aa, estuda a apreensão psíq u ica da
arq u itet u ra (cap. 9). E le fala de u m a “ abertu ra da visão para u m a segu n d a realidade
de percepção, so n h os, im agi n ação e vivê n cias esquecidas” .52 Em seus trabalhos, essa
abert u ra é realiz ad a p or u m a abstrata “ arquitetura do silên cio” .53 Se as pesq u isas de
Pallasm aa sobre o in conscien te pode m ser com parad as às pesquisas freu dian as sobre
o “estra n h a m e n te fa m i lia r” (u n ca n ny )” ,54 a sua arquitetura do silên cio faz eco ao su
blim e no pe nsa m e n to con tem porân eo.

SE G U N D O p a r a d igm a : a es t é tic a do s u b l ime

C o m o a fe n o m e n ologia, a estética é um parad igm a filosófico que se refere à prod ução


e à recepção de u m a obra de arte. Esta seção apresenta proposições relacionadas com
u m a das m ais im portan tes categorias estéticas do período pós-m od ern o. Por sua fu n
ção co m o exp ressão característica da m od ern id ad e,55 o sublim e é a principal categoria
estética su rgid a no p e río d o p ós-m o d er n o. O súbito ressurgim en to de um interesse
no su b lim e se exp lica em parte pela ênfase recente no con h ecim en to da arquitetura
através da fe n o m e n ologia. O p arad igm a fen om e n ológico destaca uma questão f u n
dam en tal da estética: o efeito que u ma obra de arquitetura prod u z no observador. No
caso p art ic u lar do sublim e, a experiên cia estética é visceral.
A s d efin ições m ais recentes do sublim e (com o 0 grotesco e o “estran ham en te fa
m iliar” ) co n figu ra m o d isc u rso estético m odern ista e coincidem com o pensam en to
p ós-m o d e r n o . O s teóricos co n te m porâ n eos que estudam o sublim e rein terpretam
u m a trad ição que rem on ta ao século prim eiro d.C . e que foi desenvolvida pelo Ilum i-
n ism o. N o a lvorecer da m o d er n id ad e, E d m u n d Burke e Im manuel Kant são im p or
tantes fontes setecen tistas.™ U m a revisão do conceito de sublim e nos ajudará a situar
o d isc u rso arq u itetô n ico e a dar um passo além do form alismo.
N a arq u itetu ra do sécu lo x x , toda m enção ao sublim e ou ao belo parece ter sido
d eliberada m en te re p rim id a por teóricos e projetistas ansiosos por se desvin cularem
do passado recente. A “ ru p tura rad ical” com a história da disciplina que o m odern ism o
alm ejava im p u n h a u m a m u da n ça nos prin cípios adotados pela teoria estética. A re
tórica a n terior foi su pla n tada por um debate de ideias acerca da necessidade de fazer

33
tabula rasa da estética (assim ilada à abstração)57 e de adotar p ri n c íp ios cien tíficos no
projeto arquitetônico. A ênfase positivista na racion alidade e na fu n ção d eixo u de lado
a beleza e o sublim e enquanto questões subjetivas da arqu itetu ra. O resgate p ós-m o-
derno do sublime (e de seu recíproco, o belo), que delin eam os nesta seção, con trib u iria
para uma considerável expansão da teoria.
Tomando como modelo a psicanálise e o d esco nstru cio n ism o, vá r ios teóricos sus
tentam que a melhor estratégia para revitaliz ar a arquitetura é d esve n d ar seus aspectos
reprim idos. Pesquisan do o material escon dido, m uitas vezes se d escob re m p ressu p os
tos discutíveis acerca dos fu n dam en tos da disciplin a. Para A n t h o n y V id le r e Peter Ei-
sen man, os aspectos estranhamente fam iliares [ uncanny] e grotescos do su blim e foram
reprim idos (cap. 14). Segu n do V id ler,“ nesse contexto, o estra n h a m e n te fa m ilia r é [...]
o retorno do corpo a u m a arquitetura que reprim iu a co nsciên cia de sua p rese n ça” .58
D iretamente relacionado a ele é a concepção do grotesco em E isen m a n: “A co n d ição do
sempre presente ou do que já está contido, que 0 belo na arqu itetura tenta re p ri m ir” .39
As ideias desses dois autores com eçaram a defin ir o su blim e no p e nsa m e n to co n te m
porâneo sobre a arquitetura.
Na definição de Sigm u nd Freud, o uncanny é a redescoberta de algo fa m ilia r que
foi previa m en te rep rim id o; é a in qu ietan te se nsação da p rese n ça de u m a ausê n cia.
A combinação do con hecido e fam iliar com o estran ho está presen te na p a lavra alemã
equivalente a uncanny , unheim liche , cuja trad u ção literal para o inglês p o d e ria ser o
aunhom ely \ N um recente estudo sobre The Architectural U ncanny , V id ler o bse rva que
um tema frequente é a ideia do corpo h u m an o d esp ed açad o.60 Para ele, o “est ra n h a
mente fam iliar” [uncanny], por conseguin te, é o lado apavoran te do su blim e, e o m edo
refere-se à privação da in tegridade do corpo. V id ler locali z a “ na teoria p ós-m o d e r n a
uma deliberada tentativa de lidar com a con d ição do corpo h u m an o” , cuja n ecessidade
se deve ao fato de q u e “o corpo em desin tegração é u m a im agem bastan te co n creta da
ideia hum anista do progresso desordenado” .61 A fragm en tação é um tem a im portan te
na arquitetura h istoricista e desconstru cion ista p ós-m o d er n a, e a ra z ão d isso talvez
esteja na rejeição da corporificação a n tropom órfica.62
Concen tran do seus estu dos fenom enológicos no estran h am en te fam iliar, V id ler
espera descobrir “0 poder de interpretar as relações entre a psiq ue e a h abitação, o cor
po e a casa, 0 in divíd uo e a m etrópole” .63 Ele nota que m uitos arquitetos escolh era m
0 estranhamente fam iliar como “ uma poderosa m etáfora para u m a co n d ição h u m ana
fundamentalmente insuportável” : a do desam paro.64 O papel do estran ham en te fam iliar
numa agenda estética para a arquitetura é 0 de identificar e exa m in ar criticam en te algu
mas das mais importantes questões contem porâneas, com o a da im itação, da repetição,
do simbólico e do sublime, por meio da conexão estabelecida com a fe n o m e n ologia.63
V idler reconhece a prática desfam iliariz adora das “ in versões das n or m as estéticas
[e] das substituições do sublim e pelo grotesco” com o estratégias for m a is de va ngu ar-

34
da p ara lid a r co m a alie n ação.66 Isso talvez explique a investigação de E isen m an sobre
o grotesco co m o “ m a n ifestação do incerto no físico” .67 Ele alega que o grotesco desafia o
p re d o m í n io co n t i n u a d o do belo, que desde o Ren ascim en to o reprim e. E isen m an
co nsid era o m ovi m e n to m o d er n o com o parte de um longo e in in terrupto período de
cin co séc u los que ch a m a de “o clássico” (cap. 4).
N os est u d os de E ise n m a n e em ou tras teorias recentes, a beleza ressurge no con tex
to da o p osiç ão ao su blim e (grotesco). Ele propõe u m a “con tenção dentro de si” [“ con-
taining w i t h in ” ] em vez de u m a inversão da h ierarquia vigen te, de form a que um ter
m o (o gro tesco) co n tin u e a re p rim ir o ou tro (o belo).68 Essa alternativa à exclusão de
categorias op ostas recon h ece que o grotesco está presente no belo: “a ideia do feio, do
d isfor m e e do su posta m e n te a n tin atu ral” .69 A utilidade dessa categoria estética ex p a n
dida é a de levar adian te a agen da habitual de E isen m an: ele concebe a possibilidade de
deslocar a arq u itet u ra e sua d epen d ên cia de ideais h um anistas, com o o de beleza, por
m eio dessa co m p lexid ad e.
T alvez se p ossa usar o m od elo proposto por D iana Agrest sobre a relação entre a
teoria e a prática arq u itetô n ica para repensar a articu lação entre essas duas categorias
estéticas: se o belo é o d isc u rso “ n orm a tivo” da estética, o sublim e poderia ser visto
co m o um “ d isc u rso a n alítico e exp lora tório” ,70 por oposição ao da beleza. O sublim e
já foi d efin id o co m o “ u m d isc u rso au to tra nsform ad or” que influenciou a constru ção
do su jeito m o d e r n o .71 Esse caráter processual do sublim e talvez expliq ue em boa m e
d ida por que ele sed u z tanto os pós-m od ern istas.
A i m p or tâ n c ia do su blim e no século x x está finalmente sendo recon hecida pela
literatura crítica, in icialm e n te especializad a em artes plásticas e em literatura. Os co n
torn os do su b li m e co n te m p orâ n eo vêm se delin ean do, quer seja com o um fe n ó m e
no m o d er n o p assível de u m a crítica social, quer seja com o um aspecto do encon tro
psicológico. N ele se in clu i a defesa de Jea n -F ra n çois Lyotard e de E isen m an da des-
co nstru ção da d isc ip lin a e da in d eter m in ação da abstração. Sob a rubrica do uncanny
arq u itetô n ico, o su b lim e in clui ain da a proposta fenom enológica de Vidler. Essas for
m u lações teóricas oferecem solu ções para desm ascarar a repressão vanguardista que
nos im p ed iu de ver a arqu itetu ra com o um diálogo constante entre 0 sublime e 0 belo.
A ên fase d ad a p o r V id ler e E isen m a n à experiên cia espacial do sujeito hum ano desafia
u m a recepção for m a lista e não experien cial da arquitetura.

T ERCEIR O P A R A D I G M A ! A T E ORI A LI N G UÍS TI C A

A reestr u t u raç ão d o p e nsa m e n to em p arad igm as linguísticos provocou também uma


m u d a n ça n as p r e o c u p a ç õ es da crítica cu ltu ral pós-m o d er n a. A sem iótica, o estru-
t u ra lism o e esp e c ia l m e n t e o p ós-est r u t u ra lism o (in clusive o desco nstru cio n ism o)
re m o d e la ra m m u itas d isc ip li n as, en tre as quais a literatura, a filosofia, a a n trop olo

35
gia e a so c io logia , b e m co m o a a t ivid a d e c r ít ica em gera l. E m 19 6 6 , a Jo h n s H o p k i ns
U n iversity foi p a lco de u m even to q u e se rv i u p a ra a p rese n t a r ao p ú b l i c o n o r t e - a m e
r ic a n o a teo r ia d a E u ro p a co n t i n e n t a l. E n t re os c o n fe r e n c is t a s d o I n t e r n a t io n a l
C o llo q u i u m o n C r i t ic a i L a n gu ages a n d the Sc ie n ces o f M a n [ C o ló q u io I n t e r n a c io
n al so b re L i n gu age n s C r í t ic as e as C iê n c ias do H o m e m ], est a v a m Ja c q u es D e r r i d a ,
Ro la n d B art h es e Jacq u es L a c a n .72
Esses p arad igm as, que tivera m gra n d e in flu ê n c ia n o p e n sa m e n to d a d é c a d a de
1960, aco m pa n h ara m u m a re n ovação do in teresse p elo sig n ific a d o e p e lo si m b o lism o
em arquitetura. O s arquitetos estu d ara m co m o o sign ific ad o é t ra n sm i t id o pela li n gu a
gem e aplicaram esse con h ecim en to à arq u itetu ra, p o r m eio d a “ a n a logia li n gu íst ic a” .
E les se p ergu n taram até que po n to a arq u itet u ra é u m a co n v e n ç ã o , c o m o a l i n g u a
gem , e se o p ú blico leigo em arqu itetu ra co m p ree n d e de q u e m a n e ira as co n ve n ções
da disciplin a são responsáveis pela co nstru ção do sign ificad o. D ia n a A grest e seu cola
borad or M ario G a n delson as, em “ Sem iótica e arqu itetu ra” , e G e o ffr e y B ro a d b e n t , em
“ U m guia pessoal desco m plicado da teoria dos sign os em a rq u ite t u ra” , c o m eç a ra m a
in dagar se existe um “con trato socia l” na arqu itetura (cap. 2). Q u est io n a n d o o fu n c io
nalismo m oderno com o determ inan te da form a, esses ensaios a d o tara m u m a p e rsp ec
tiva linguística para argu m en tar que os objetos arq u itetô n icos n ão têm u m sign ific ad o
inerente, mas podem desenvolvê-lo p or in term éd io de co n ve n ções c u l t u ra is.73

A semiótica

A teoria linguística é um im portan te parad igm a para a a n álise de u m a q u estão que p re


ocupa a m aioria dos pós-m od ern os: a da criação e apreensão de sign ific ad os. A se m ió
tica e o estruturalism o estudam , em especial, o m odo pelo qual a lingu age m , co n ceb ida
como um sistema fechado, com unica.
A sem iótica, o term o escolh ido por C h arles San d ers Peirce, ou a se m io logia, p a
lavra usada por F erdinan d de Saussure, é o estudo cien tífico da li ngu age m co m o um
sistema de signos que tem u ma dim ensão estru tural (sin tática) e ou tra de sign ific aç ão
(semântica). Relações estru turais vin c u la m os sign os e seus co m po n e n tes (sign ifica n -
te/significado) e relações sin táticas se estabelecem entre os sign os. A s relações se m â n
ticas têm a ver com os sign ificados, isto é, são relações entre os sign os e os objetos
que eles denotam. As prim eiras pesquisas de Peirce e Saussure, realiz ad as em fins do
século x ix e início do século x x , fixaram alguns prin cípios.
As aulas de semiologia proferidas entre 1906 e 1911 pelo linguista suíço F erdinan d de
Saussure foram traduzidas do francês para o inglês em 1959, e fizeram renascer o in teres
se por sua obra. A principal con tribuição de Saussure foi o estudo sincrônico da lingu a
gem (isto é, de seu uso corrente) e a análise de suas partes constitutivas e in ter-relações.71
Saussure foi o criador dos conceitos de significante e significado , cujas relações estru turais

36
co nst it u e m o signo lin gu íst ico. T ã o im p or ta n te q u a n to os d ois co m p o n e n tes d o sig n o é
a id eia d e q u e “ a li n gu age m é u m siste m a d e ter m os i n terdepen d en tes em q u e o v a lo r de
cad a ter m o d eco rre exc lusiva m e n te d a p rese n ça sim u ltân ea d os d e m a is” .75
N os a n os 19 6 0 m u l t i p l ic a r a m -se as a p lic a ç õ es d a t eo ria se m ió t ic a a o u t r as d isc i
p li n as, p r i n c i p a l m e n t e n a A m é r i c a d o N o r t e e d o Su l, n a F ra n ç a e n a Itália. U m b e r t o
E co , ro m a n c is t a , c r í t ic o e es t u d ioso d a se m ió t ic a , esc reve u so b r e a a rq u i t e t u ra c o m o
u m sist e m a se m ió t ic o d e sig n ific a ç ã o . E m “ F u n c t io n a n d Sig n : S e m io t ics o f A rc h i t e c -
t u re” , E c o su st e n t a q u e os sig n o s a rq u i t e t u ra is (o u m o r fe m as) c o m u n ic a m f u n ç õ es
p ossív e is p o r i n t e r m é d io d e u m sist e m a d e c o n v e n ç õ es o u c ó d ig o s.76 O u so literal ou
a f u n ç ã o p r o g r a m á t ic a é o sig n if ic a d o p r i m á r i o d a a rq u i t e t u ra . P o r t a n to , os s ig n o s
de n o t a m f u n ç õ es p r i m á r i a s e conot a m f u n ç õ es se c u n d á r ias. Se u e n sa io “A C o m p o -
n e n tial A n a lysis o f t h e A r c h i t e c t u r a l Sig n / C o l u m n ” d e m o n st ra q u e u m ú n ic o o b je to
a r q u i t e t ô n ic o (n o c aso , a co l u n a) p o d e ser p o r t a d o r d e u m sig n if ic a d o e c o n st i t u ir,
p o r isso, u m a u n id a d e se m â n t ic a p e r t i n e n t e .77
M a r io G a n d e lso n as c o m p a ra , em O n R e a d in g A rchitec ture (1972), i m p o r t a n t e p es
q u isa se m ió t ic a p u b lic a d a n u m a co n c e it u a d a revista p ro fissio n a l (Progressive A rchitec-
ture), a o b ra e n fa t ica m e n te sin tá tica de E ise n m a n co m os tra b a l h os forte m e n te se m â n
ticos de G raves. D e m a n e ir a gera l, a teoria e a p rá t ica de A grest e G a n d e lso n as receb e m
i n flu ê n c ia d a l i n g u íst ic a; a m b os e n c o n t ra m na se m ió t ic a u m a v ia p a r a a le it u ra da
arq u itet u ra co m o u m c a m p o de p ro d u ç ão de co n h ec i m e n tos. O livro de G a n d e lso n as,
T he U rban Text , é u m exe m p lo d esse tipo de a n álise.

0 estruturalismo

O e s t r u t u r a l is m o é u m a m e t o d o lo g ia seg u n d o a q u a l “ p o d e -s e d i z e r q u e a v e r d a
d e ir a n a t u r e z a d as c o isas n ã o está n as c o isas em si, m as n as re la ç õ es q u e c o n s
t r u í m o s e d e p o is p e r c e b e m os en tre e las” .78 O m u n d o é c o n s t r u í d o p e la li n g u age m ,
q u e é u m a es t r u t u r a d e re la ç õ es s ig n if ic a t iv as e n tre s ig n o s a r b i t r á r io s. A ss i m , os
es t r u t u r a list as a fir m a m q u e os sist e m as l i n g u íst ic os co n tê m a p e n as d ife re n ç as, se m
t e r m os p o s i t i v o s.79
O est r u t u ra lism o locali z a os có d igos, as co n ve n ções e os p roc essos resp o nsáveis
pela in te ligib ilid a d e de u m a ob ra, isto é, sua m a n eira de p ro d u z ir um sign ific a d o s o
cialm e n te in teligível. C o m o m e to dologia, o estru t u ra lism o não se oc u p a do co n teú do
tem ático, m as das “co n d ições da sign ificação” .80 A p esar de ter raízes na lingu ística e na
a n tro p o logia, o estru t u ralism o é u m a in vestigação tra nsd iscip li n ar

da relação de um texto com estruturas e processos particulares, sejam eles linguísticos,


psicanalíticos, metafísicos, lógicos, sociológicos ou retóricos. Linguagens e estruturas,
em vez do sujeito autoral ou da consciência, são as principais bases da explicação.81

37
A in clin ação do estru t u ra lism o p a ra a ra c io n a li z a ç ã o d a a r q u i t e t u r a , se s u b s t i t u ir
m os obra literária por ob ra arq u itetô n ica, revela-se c la ra m e n t e n a seg u i n t e e x p l ic a
ção do m étodo:

O estruturalismo toma a linguística como modelo e tenta d ese n vo lver “ gra m á ticas”
- inventários sistemáticos de elementos e suas possib ilidades de co m b i n ação - que
explicam a forma e o significado das obras literárias.82

0 pós-estruturalismo

Segundo o crítico cultural H al Foster, a transição do m o d er n o ao p ó s- m o d e r n o pode


ser assinalada por meio de duas ideias tom adas de e m p rést i m o ao c r í t ic o lit erá rio e
cultural Roland Bart hes (m orto em 1980). Para ele, as ideias de obra e de texto de Bar-
thes refletem a m udança de foco na prod ução artística ou literária, de u m a co n c ep ç ão
modern a de criação de um todo ou u n idade para a v isã o p ó s- m o d e r n a da c r iaç ão
d e uum espaço m ultidim ensional” 83 ou de u m “ca m po m e to d o lógico” .84 A p esa r de al
guns autores85 afirmarem que é difícil separar o estru t u ralism o do p ós-est r u t u ra lism o ,
Foster também se vale da obra e do texto para fazê-lo. E m seu e nsaio “ (Post) M o d er n
Polemics” , Foster associa a obra estruturalista à estabilidade dos co m p o n e n tes do sig
no, enquanto 0 texto pós-estru turalista “ reflete a dissolu ção co n te m p orâ n ea do sign o
e o movimento livre dos significantes” .86 Escritos posteriores de B art h es sugere m que
0 significante tem um potencial para o jogo livre e as in fin d áveis d ife re n c iaç õ es de
significado, resultantes de uma cadeia infinita de m etáforas.
Assim, o pós-estruturalism o funda a “crítica do signo” ao i n d agar se o sign o real
mente se compõe de apenas duas partes (significante e sign ificado) ou se ele não d e p e n
de também da presença de todos os outros significantes, que ele não ativa e dos quais
se diferencia. O teórico marxista da literatura T erry Eagleton m ostra que, en q u a n to o
estruturalismo separa o signo do referente (o objeto a que o signo se refere), o p ós-es
truturalismo dá um passo adiante e separa o significante do sign ificado.87 Essa lin ha de
pensamento conclui que “a significação não está diretamente presente em um sign o” .88
Uma outra form a de m arcar a passagem do estru tu ralism o p ara o p ós-es t r u t u
ralismo, que se deu em torno de 1970, foi a substitu ição de u m a visão o b je t iva da li n
guagem (como objeto independente de um sujeito h um ano) para a co n cep ção de que
a linguagem é o discurso de um sujeito ou indivíd uo. “ O d isc u rso” , exp lica E agle to n ,
“diz respeito à linguagem apreendida como elocução” ou “com o prática” , é o reco n h e
cimento pós-estruturalista da conexão entre os papéis do orador e da a u d iê n c ia, do
importante papel do diálogo na com unicação linguística.89
Antes do estruturalism o, o ato de in terpretação visava d esco b rir o sig n ific a d o
que coincidia com a intenção do autor ou do orador, sign ificado este que se tom ava

38
c o m o d e fi n i t ivo . O es t r u t u r a lis m o n ã o p re te n d e a t r ib u i r u m sig n ific a d o v e r d a d e iro à
o b r a ( p a r a a lé m d e su a est r u t u ra ) n e m a v a lia r a o b ra n a re fe rê n c ia ao c â n o n e. O p ós-
-est r u t u r a l is m o a fir m a q u e o sig n ific a d o é i n d e t er m i n a d o , fu g i d io e in esgo táve l.
D a d a a irre lev â n c ia d o p ro je to c r ít ico t ra d ic io n a l, B ar t h es fo r m u la, em “ D a o b ra ao
tex to” , as seg u i n t es id e ias so b r e o q u e d e v e r ia ser a c r í t ic a p ós-es t r u t u r a list a . E m p r i
m e iro lugar, a p r o c u r a d os cr í t icos d e fon tes e in flu ê n c ias ca p a z es d e fu n d a m e n t a r su as
i n t e r p re t a ç õ es d e u m o b je to faz co m q u e seu tra b a l h o i n c o r r a n o “ m ito d a filiaç ão” .90
N a te n ta t iva d e si t u a r as o b r as d e ar te ou d e a rq u it e t u ra m o d e r n as em u m co n t e x to
h ist ó r ic o , os c r í t ic os se re c u sa m a a c e i t a r a n o ç ã o m o d e r n is t a d e q u e t u d o d eve ser
o r ig i n a l e su rg ir d e u m a t abu la rasa. A t it u d e m e lh or, d i z B a r t h es, é aq u e la e m q u e “ o
c r ít ico execu t a a o b ra” , em a m b os os se n t id os da p a la v ra . O d u p lo se n t id o d i z resp eito
à ex e c u ç ã o d as f u n ç õ es i n te rp re ta t ivas usu a is d o c r í t ico e a lu d e aos seus se n t i m e n tos
e d ip ia n os em re lação à litera t u ra d o p assa d o. B ar t h es q u er q u e o c r í t ico ou o leitor em
geral assu m a u m p ap el a tivo co m o u m p ro d u to r de sign ific a d o .
F ost e r a fir m a em “ (Post) M o d e r n P o le m ics” q u e o p a r a d ig m a p ó s- e s t r u t u r a l is
ta leva n ta d u as q u estõ es fu n d a m e n t a is p e r t i n e n tes à a rq u it e t u ra p ó s- m o d e r n a : a do
esta t u to d o su je ito e su a li n gu age m e a d o esta t u to d a h ist ó r ia e su a re p rese n t aç ão .
A m b os são c o n st r u ç õ es m e n tais m o d elad as pelas re p rese n tações q u e a so c ie d a d e tem
delas. D e fato, o o b je t ivo da c r ít ica p ós-est r u t u ra list a é d e m o n st ra r q u e a re a lid a d e é
to ta lm e n te const it u ída ( p ro d u z id a e suste n tad a) p o r su as re p rese n t aç ões, a n tes q u e
refle tida p o r elas. A h istór ia, p o r exe m p lo, é u m a n arra t iva q u e co n té m i m p lic aç õ es de
su b je t iv id a d e, do ficc io n al. Por isso, o p ós-est r u t u ra lism o ad m ite u m a m u lt ip lic id a d e
de h ist ó r ias n a rra d as a p a r t ir de o u tros po n tos de vista alé m d os de elite e d o po d er.
Essas n a rra t ivas su bstit u e m a versão “ receb id a” de u m a “ h istór ia d os v e n c e d o res” .91
O p e n sa m e n t o p ós-es t r u t u r a list a p ro b le m a t i z a igu a l m e n t e o su je ito c o m o a u to r
e p õ e e m q u est ã o seu sta tus e p o d e r, em a n á lises c o m o a de B a r t h es, em “A m o r t e
d o a u t o r” (19 6 8 ), e d o filóso fo M ic h el F o u c a u lt, em O q u e é um a u to r (19 6 9 ) .92 A m
b os su ge r e m q u e a s i n g u la r i d a d e e a c r ia t i v i d a d e d o a u to r n ão p assa m de fic ç õ es
c u l t u r a is co n v e n ie n t es se c o n fro n t a d as co m o p a p e l se le t ivo e re d u to r q u e os a u t o
res e fe t iv a m e n t e d ese m p e n h a m q u a n d o a b o r d a m u m n ú m e ro l i m i t a d o d e q u estõ es.
N a v is ã o p ó s-es t r u t u r a lis t a d e B a r t h es e F o u c a u lt , a m p la m e n t e acei ta n os d ias de
h o je , esse “ i n d iv í d u o ” é, de fato, si t u a d o em u m sist e m a de c o n v e n ç õ es q u e “ fala
p o r seu i n t e r m é d io ” .
A id eia “ do artista ro m â n t ico” co m o “gê n io” cr ia d o r é cr it ica d a en q u a n to c o n st r u
ção id eo lógic a, se m elh a n te à de autor, já que a rep rese n tação da so c ie d a d e en tra em
co n flito co m a fu n ç ão do artista. Tal co m o o autor, a ideia do artista é u m a celebração
exagera d a do i n d iv id u a lism o . F oucau lt (m orto em 1984) preferiu co n sid era r o au tor
co m o u m a “ f u n ç ão [...] carac teríst ica do m o d o de existê n c ia, c irc u laç ão e f u n c io n a
m e n to de d e t er m i n a d os d isc u rsos no in terior de u m a so c ie d a d e” .93 Essa p ersp ec t iva

39
p er m ite-lh e for m u lar p ergu n tas m ais i m p o r t a n t es d o q u e as d a c r í t ic a t ra d ic io n al,
com o, por exem plo: “ Q uais são os m o d os de ex istê n c ia d este d isc u rso? O n d e tem sido
usado, com o circula e quem p o d e ap ro p riar-se d ele?” .94
M uitos influen tes arquitetos e professores de arq u it e t u ra ac e i t a m as p osiç õ es pós-
-estru turalistas. A teoria arq u itetô n ica p ós- m o d e r n a ve m assi m se d e d ic a n d o ao ree-
xam e das origens disciplin ares da arq u itet u ra m o d e r n a (i n c l u siv e a n o ç ã o d e tabula
rasa) e suas relações com a h istória (que p o d e ria m ser d esc rit as co m p ro p r ie d a d e pela
expressão que H arold Bloo m usou no título de seu livro A ngúst ia d a in flu ê n c ia [ 1973]),
a ênfase m odern ista na in ovação e a n oção do arq u iteto “ h e ró i” i n d iv id u a list a .
A reorien tação p ós-m o d er n a das p riorid a d es d a cr ít ica, a m u d a n ç a d e foco do seu
objeto de estudo, coin cide com a aplicação de p r i n c íp ios p ós-es t r u t u r a list as a ou tras
disciplin as. Por exem plo, a a n álise de F oucau lt sob re o i m p ac to d e v á r io s d isc u rsos
estim ulou u m in teresse sociológico pelo papel d as i n st it u içõ es n a so c ie d a d e; a crítica
psicanalítica de Jacques Lacan e Julia K risteva é p er m ea d a p elas teses p ós-estr u t u ra lis-
tas; no caso de K risteva, é tam bém em basad a no pe nsa m e n to fe m i n ista.

Desconstrução

U m a das mais im portan tes m a n ifestações do p ós-est r u t u ra lism o é a d esco n st r u ção .


Prática filosófica e lingu ística, a d esco nstru ção exa m i n a a f u n d a m e n t a ç ã o “ logocê n -
trica” 95 do pensamento, bem com o os fu n d am en tos de d isc ip li n as co m o a arqu itetu ra,
jacques D errida, 0 filósofo fran cês cu ja ob ra é m ais estreita m e n te asso c ia d a ao des-
construcionism o, analisa as operações retóricas (co m o a m e táfora) p a ra d e m o n st ra r
a suposta base ou fun dam en to da argu m e n tação, m ostra n d o co m o ca d a co n c eito foi
construído (cap. 3). Especula, por exem plo, sobre o que co nstit u i “ a a rq u ite t u ra da ar
quitetura” e pergunta: se a arquitetura, a tectôn ica e o projeto u rb a n o são usad os com o
metáforas fundam en tais para outros sistemas de pe nsam en to co m o a filosofia, em que
então se apoia a arquitetura?96
D errida descreve seu trabalho da seguin te m aneira:

A desconstrução analisa e questiona pares conceituais com umente aceitos com o natu
rais e evidentes por si mesmos, como se não tivessem sido institucionalizados em algum
momento preciso. [...] Por serem aceitos como óbvios, eles limitam o raciocín io.9'

A desconstrução age nas margens para revelar e desmontar as oposições e pressu postos
vulneráveis que estruturam um texto.98 Em seguida, procura fazer um deslocam en to mais
geral do sistema, verificando o que a história da disciplina pode ter ocu ltado ou excluído,
pela via da repressão, a fim de constituir sua identidade. Essa estratégia é fu n dam en tal
para a crítica feminista. (Veja adiante a discussão sobre o fem inismo nesta In trodução.)

40
O o b je t iv o d a d esc o n s t r u ç ã o é d eslo c a r ce r t as c a t ego r ias f i losó fic as e te n ta t ivas
d e su p r e m a c ia q u e p r iv i leg ia m u m t e r m o em re lação a o u t ro em o p o siç õ es b i n á r ias,
c o m o a u sê n c ia / p r ese n ç a.99 O s b i n a r is m os h ierá rq u icos n ão são t id os c o m o p ro b le m as
iso la d os o u p e r ifé r ic o s, m as sist ê m icos e re p ressores. Para D e r r i d a , a a rq u i t e t u ra v isa
c o n t ro la r os se tores d e c o m u n ic a ç ã o e t ra n sp o r t e d a so c ie d a d e , assi m c o m o a e c o n o
m ia. A d esc o n s t r u ç ã o faz p a r t e d a c r í t ic a p ó s- m o d e r n a ; seu o b je t iv o é a c a b a r co m o
p ro je to de d o m i n a ç ã o d a a rq u ite t u ra m o d e r n a .100
A d efi n ição de Tsch u m i do o b jetivo da arqu itetu ra é m u ito p ró x i m a d a de D errid a:

[realizar a co nstru ção das] co n d ições que deslocarão os aspectos m ais trad icio n ais e
regressivos de nossa sociedade e sim u ltan eam en te reorga n iz arão esses elem en tos da
form a m ais lib ertadora p ossível.101

A o testar os li m ites d a d isc ip li n a, d esc o b r ir as su as m arge ns, c o n fro n t á-la co m o u t ras


d isc ip li n as e su b m e ter su as p re m issas a u m a cr ítica ra d ical, T sc h u m i é a c o n t ra p a r t id a
de B ar t h es e D e rr i d a na a rq u i t e t u r a .102 E le se in teressa p elo texto a rq u it e tô n ic o co m o
a lgo p o te n c ia lm e n te ili m ita d o , n ão c o m p ree n d id o n o i n te rio r d as d isc ip li n as e gê n e
ros tra d ic io n a is, m as, ao co n trário, a travessa n d o as fro n teiras d as d isc ip li n as.
E ise n m a n ta m b é m ap rese n tou p ro p ost as (na teoria e no p roje to) p a ra a a rq u i t e
tura e n q u a n to texto (cap. 4), e a p u b licação de seus n u m erosos d iá logos co m D erri d a
tem sid o útil p ara a d iv u lgaç ão do d esco n st r u c io n ism o en tre os arq u itetos.
N o p e r ío d o p ós- m o d e r n o , o co rr e u m a evo lu ção do foco est r u t u ra list a , no q u al
o sig n ific a d o é c r ia d o p or m eio das relações en tre sig n os e co m p o n e n t es de sig n os,
p ara a co n c lusão p ós-estru t u ra lista e d esco nstru cio n ista, de que a d e ter m i n aç ão de um
sig n ific a d o p rec iso é i m p ossíve l. M u itas q u estões in teressan tes leva n tad as pela teoria
li n gu íst ica ta m b é m afetam o faz er arq u itetô n ico, a teoria da arq u itet u ra e a sua rece p
ção crítica. A b usca de sign ific ad o é algo i n óc u o ou n ostálgico? Se a i n terp retação dos
artefatos n ão é u m exercíc io crítico válid o, qual a fin alid ad e da crítica? E sq u a d r i n h a r
id eologias? E screver com cr iativid ad e? C o n st r u ir u m a n arrativa p aralela qu e n ão re i
v i n d iq u e n e n h u m a a u torid ad e especial sobre um artefato?
A p reo c u p aç ão da arq u itetu ra com o lugar e o sign ificad o sofre, porta n to, a a m e a
ça de certas n oções p ós-estru t u ralistas, co m o a arb itraried ad e do sign o co m u n ica tivo.
Se n ão há co m o co n fiar na in terpretação dos sign os, facilm en te in terpretáveis de várias
m a n eiras sim u ltân eas, co m o p o d e a arqu itetura ex p ri m ir um senso co m p ar t ilh ad o de
co m u n id ad e? E se a lingu age m não é con fiável, p o d e h aver algu m acord o q u an to ao
sign ific ad o da “ lingu age m ” arqu itetôn ica? M ais ain da, a perda das gra n d es n arrativas
h istóricas post u lad a pelos pós-estru t u ralistas apon ta para a im p ossib ilid ad e de a tingir
u m co nse nso passível de ser represen tado na arquitetura sign ificativam en te.

41
QUART O p a r a digm a : o ma r xism o

O parad igm a m arxista é basta n te in flu e n te n o est u d o d a a rq u i t e t u ra n o p e r ío d o pós-


-m o d e m o, especialm en te n o exa m e d a c id a d e e d e su as i n st i t u iç õ es. A c r í t ic a u rban a
pós-m o d er n a em gra n d e m e d id a se a p o ia na re v isão ge ra l d as q u est õ es p o lí t ic as e m
preen dida pelos in telectuais e p e nsad ores m a rx istas.
As análises m arxistas da h istória e da teoria d a a rq u ite t u ra (esp ec ia l m e n t e en tre os
escritores italian os da “ E scola de V e n e z a’ ) p ro b le m a t i z a m as re la çõ es e n tre a luta de
classes e a arquitetura. O h istor iad or M a n fre d o T afu ri ex p lic a d a seg u i n t e fo r m a suas
in tenções na con clusão de Projeto e U topia (19 73):103

U m a crítica marxista coerente da id eologia da arq u itetu ra e do u rb a n ism o não po


deria senão desmistificar realidades con tingen tes e h istóricas [...] que se ocultam por
detrás das categorias u nificadoras dos termos arte, arquitetura e cidade, (cap. 7)

T afuri define “ a crise da arqu itetura m o d er n a [co m o] u m a c r ise d a f u n ç ão id eológica


da arquitetura” . Isto é, o m ovim en to m o d er n o na a rq u ite t u ra fr a c asso u na d esejada
transform ação da ordem social porq u e apen as u m a crítica de classe d a arq u ite t u ra é
possível. U m a arquitetura de classe não p o d e p ro d u z ir u m a re vo lu ç ão geral porq u e
depende dessa revolução geral, à qual está su bord in a d a. T afu ri o b se rv a q u e a arq u ite
tura m oderna não pode nem m esm o p ro p orc io n ar u m a im age m da a rq u ite t u ra para
u m a sociedade livre sem fazer u m a revisão dos seus ele m en tos co n st it u t ivos: li n gu a
gem, método e estrutura.
E nquan to T afuri parece exclu ir a p ossib ilid a d e d a m u d a n ça p o r m e io da a rq u i
tetura, Ja m eson é m ais otim ista quan to às po te n c ialid ad es da “ teoria m a rx ist a do en-
clave” para a resistência pop u lar [grass-roots resistance] ao status q u o . W4 Essa teoria
propõe que gru pos m argin alizados, operan do grad u alm en te nas m arge n s da so c ie d a
de, podem construir u ma posição de enclave crítico e d ar in íc io à m u d a n ça. E xe m p los
disso são as revoluções estudan tis de m aio de 1968, “ os aco n t ec i m e n tos” n os quais
estudantes e trabalhadores europeus (sobretu do fra n ceses) ju n tos te n tara m d e r r u
bar o sistema capitalista e instalar o m arxism o. Os estudan tes, co m o as m u lh eres e os
negros, abraçaram a necessidade de se orga n iz ar em gr u p os ra d ic ais. A h ip ó t ese de
Eagleton é que a in capacidade dos revolucion ários de d eslocar o gove r n o e n t r i n c h e i
rado pode ter con tribuído para a adesão à crítica pós-estru t u ralista da li n g u age m .103 A
teoria do enclave deu origem a u m a série de m an ifestações arq u itetô n icas, in clusive a
do já citado regionalismo crítico, que será exam in ado adian te (cap. 11).
As críticas à estrutura do poder político receberam um reforço p o r p a r te de in te
lectuais franceses como o pós-estru turalista M ichel Foucault (“ O f O t h er Sp aces and
H eterotopias” ) e da influente Escola de F ran k fu rt, cu jos in tegran tes assu m ira m uma

42
v e rsã o m o d i fi c a d a d o m a r x is m o . A s id e ias d e F o u c a u l t t iv e ra m e n o r m e i n flu ê n c ia d e
v i d o à a b r a n gê n c ia d e su as a n á lises re la t ivas à est r u t u ra d as d isc ip li n as e d as p ro fissõ es,
so b a p e rs p e c t iv a d a a rq u eo log ia e d a ge n e a log i a d o sab er. Su a a b o r d ag e m i n t e r d isc i-
p l i n a r f u n d e filoso fia , h ist ó r ia , p sic o lo g i a e p o lí t ic a n o q u e ele d e n o m i n a d e u m a “ ta-
x o n o m i a d os d isc u rso s” . O s l iv ros d e F o u c a u lt A h istória d a lo u c u r a , A s p a l a v r a s e as
coisas e V igia r e p u n i r 106 d e ix a m cla ro q u e as i n st i t u iç õ es (e as fo r m as a r q u i t e t ô n ic as
q u e as a b r iga m ) exe rce m u m a f u n ç ã o d e co n tro le n a so c ie d a d e . A u to p ia a rq u i t e tô n ic a
é i n c lu siv e o b je to d e u m a b reve a n á lise e m seu e n sa io “ O f O t h e r Sp ac es: U to p ias a n d
H e t e ro t o p ias” (19 67). A lé m d o est u d o d as i n st i t u içõ es, F o u c a u lt id e n t ific a o p a p e l do
ja rg ã o p ro fissio n a l n a c r ia ç ã o d e u m d isc u rso a u tô n o m o , legi t i m a d o r e exc lu d e n te. Sua
a n á lise i n sp iro u e favo rece u a c r í t ic a p ó s- m o d e r n a às est r u t u ras d e p o d e r n o fin al d a
d é c a d a d e 19 60 e na d e 1970.
A c h a m ad a teoria cr ítica da Escola de F ra n k fu r t é ob ra de u m gr u p o de i n telectu ais
liga d os ao I nstitu to de Pesq u isa Socia l da U n iversid ad e de F ra n k fu r t , en tre os q u ais M ax
H o r k h e i m er ( m o r to em 1973), T h e o d o r A d o r n o (m or to em 1969), q u e fora m d iretores
da inst it u ição, e H erb ert M arc use (m o r to em 1979), que p e r m a n ece u n os E sta d os U n i
d os d e p o is da re i n st alaç ão do I nstitu to na A le m a n h a, n os a n os 1950. A a b o rd age m in-
t e r d isc ip li n ar desses p e n sa d ores, tal co m o a de F ou cau lt, co m b i n a filosofia, h ist ór ia e
psicologia n u m esforço c u id a d oso de d escriç ão dos fe n ô m e n os da c u lt u ra no co n texto
da so c ie d a d e e da eco n o m ia p olítica. Seus est u d os sobre a asce nsão do a u to ri t arism o
e da b u ro c rac ia, da n aturez a ca m b ia n te das relações soc ia is e dos laços da c u lt u ra c o n
te m porâ n ea com a vid a co tid ia n a ten cio n avam co n trib u ir p ara a luta co n tra a d o m i n a
ç ã o .107 Esses p e nsad ores tiveram e co n tin u a m a ter gra n d e i n flu ê n cia en tre est u d an tes
e p e n sa d ores p rogressistas. W alter B e n ja m i n (m orto em 1940), a p esar de ter sid o um
m e m b ro de im p or tâ n c ia sec u n d ária no Instituto, é hoje um dos seus in tegran tes m ais
co n h ec id os. Seus ensaios sobre cu ltura, de ob jetivos sem elhan tes aos de Bart h es, são c i
tados com freq u ên cia na teoria arqu itetôn ica desde o final da década de 1970.

Q UI N T O p a r a d i g m a : o f e m i n i s m o

O a t iv ism o p o lít ico dos a n os 1960 ch a m o u a aten ção p ara a p riv aç ão de d ireitos c ivis
em so c ie d a d es p re te nsa m e n te d e m o c r á t ic as de v á r ios gr u p os d e fi n id os p o r gê n ero,
raça e orie n t aç ão sexu al. M ais recen tem en te, esse fato tem sido e n fa tiz ado p o r jove n s
in te lec t u a is, m u itos deles m u lh eres ou h o m ossexu a is. Est u d os cr ít icos qu e r e iv i n d i
ca m u m tra ta m e n to igu a litár io, a in clusão e o fim dos preco n ceitos, co m p ree n d id os
na r u b ric a “ a crít ica do O u tro” , vê m a m p lia n d o o debate sobre a arq u itet u ra e ou tros
c a m p os da arte, de u m a ên fase na form a (que p redo m in o u na ú ltim a fase da teoria e
d a crít ica m o d er n ista) para a esfera da cu ltura, da h istória e da ética. U m im p ortan te
exe m p lo dessa crítica do O u tro é o fem in ism o.

43
0 fem in ism o su rgiu d u ra n te o p e r ío d o p ó s- m o d e r n o c o m o u m p r o g r a m a político
de resistência à d o m i n aç ão m asc u li n a. O m o v i m e n t o fe m i n ist a a v a n ç o u a p assos lar
gos em direção à eq u id ad e socia l, ob te n d o d esd e a ex t e n sã o d as o p o r t u n i d a d e s de ed u
cação e em prego até a i n d ep e n d ê n c ia ju r í d ic a e fi n a n c e ira d as m u l h e res. N os Estad os
U nidos, o direito de co n trolar o p ró p r io d est i n o, i m p líc ito n essas q u est õ es, tem com o
em blem a a luta perm an en te em favor do d ireito ao ab o r to .
As mulheres que, de m an eira geral, tin h am sido até en tão i m p e d i d as de p articip ar
plenamente da força de trabalho, da política e da atividad e aca d ê m ica, n os a n os 1970 con
seguiram desafiar as m anobras e operações exclu den tes das d isc ip li n as e de o u tras insti
tuições. Rejeitar a d iscrim in ação de fu n do sexista exige fo r m u la r o gên ero co m o antina-
tural, arbitrário e irrelevante. E, para m ostrar que o gê n ero é u m a co n st r u ç ão de controle
social que privilegia alguns m em bros da sociedade em d e trim e n to de o u tros, as fem in is
tas se valem de paradigm as críticos, entre os quais o p ós-estr u t u ra lism o, o m a rx ism o e a
psicanálise. O gênero tem sido usado h istoricam en te para isolar ou id e n t ificar “o ou tro” .
A teórica C hris W eedon assim descreve as origens e im p licações do gê n ero:

A psicanálise oferece uma teoria u niversal da constru ção psíq u ica da id en tid ad e de
gênero baseada na repressão (de uma parte da b issexu alid ad e da cria n ça). [...] Ela
proporciona uma referência teórica a partir da qual se pode co m p ree n d er o fem in ino
e o masculino, e uma teoria da consciência, da linguagem e do sign ific a d o .11'*

A n n Bergren, estudiosa da arquitetura, afir m a que “ o gê n ero [...] é u m a m á q u i n a para


pensar o significado da diferença sexu al” .109 E la nota que certos id io m as, c o m o o inglês,
prescindem de diferenciações de gênero. Essas o bservações levara m B ergre n a co n c lu ir
que o gênero “ é subje tivo nos dois sen tidos da p a lavra, e, p o r isso m esm o , re tórico
e político” . E m consequência, as fem in istas vê m e m p ree n d e n d o u m ex a m e d a n oção
logocên trica de diferença, que se origin a do gênero, e de seu i m p ac to i n c o n fesso sobre
o mundo construído.
De fu ndam en tal im portân cia para a reco nsid eração de certas c o n st r u ç õ es c u lt u
rais com o o gênero, é a form u lação de F oucault qu an to ao “su jeito co m o p u ra ex t e
rioridade, produto da inscrição das relações de p o d e r” .110 E m o u t ras p a la v r as, o i n
divíduo é m an ipulado por estru turas políticas explícitas e c ó d igos so c ia is im p líc itos
para aderir a determ in ados padrões com portam en tais. Essas estru t u ras e c ó d igos são
justamente os alvos da crítica fem inista.
A crítica fem in ista da arquitetura tem a in tenção de e ngajar a teoria e a p rá t ica
na realidade sociopolítica. Inspiran do-se em análises freu d ian as e d e rr id ia n as, A grest
supõe que o “sistema” da arquitetura (a teoria renascen tista resp onsável p elo c lassic is
mo que integra a “ tradição ocid en tal” herdada) se defin e tanto pelo q ue in clu i co m o
pelo que exclui ou reprime. Em seu ensaio “A arquitetura por su b tração: co r p o , lógica,

44
sexo” , ela c o n sid e ra seu p ró p r io c o r p o e o d as m u lh eres em geral co m o ex c lu íd os d es
se sist e m a “ f a lo c ê n t r ic o ” (cap. 13). O co n c e ito p sic a n a lí t ic o de “ re p ressã o ” ( n ega ç ã o
d o i m p u lso se x u a l q u e c o n d u z à n e u rose) a d q u ire u m a co n o t a ç ã o esp a c ia l q u a n d o
ela d esc reve u m “ i n te r io r d e re p ressão” , d e fi n id o pela m u l h e r e seu c o r p o , e o siste m a
m a n t id o p e la re p ressão d o c o r p o fe m i n i n o. E la t ra n sfo r m a em va n t age m a d esv a n t a
ge m d a exc lu são q u a n d o escreve:

Esse “ lado de fora” é um lugar de onde se pode tomar distância com relação ao sistema
fechado da arquitetura e a partir daí assu m ir (...) uma atitude de investigação dos m e
can ism os [arquitetônicos] de confinamento, de seus instrumentos ideológicos de filtra
gem, de modo a apagar as fronteiras que separam a arquitetura de outras práticas.111

M as A grest ta m b é m se d á con ta do risco a q ue se ex p õ e u m a m u l h e r q u a n d o assu m e


u m a p osiç ã o exterior, de n ão co n fo r m id a d e co m a ord e m so c ia l: ser ro t u lad a a través
d os te m p os de a lu c i n a d a, b r u xa, h istérica etc. A grest sugere qu e u m a atit u d e ex t ra d is-
c ip li n ar p ro fíc u a p ara a o bse rv a ç ã o da arq u itet u ra e do u rb a n ism o é a do c i n e m a, qu e
c o m p a r t i l h a co m a a rq u ite t u ra certos ele m e n tos de tem po e esp aço. A v isã o c r ít ic a
q ue A grest instit u i na teoria p ro p õ e re in tegrar o co r p o fe m i n i n o na arq u ite t u ra p ós-
-m o d e r n a , e n os faz le m b rar qu e a t ra d iç ão do a n t ro p o m o rfism o foi n eglige n c iad a na
arq u itet u ra m o d er n a. O u tros detalh es sobre esse co n ceito e n co n tra m -se na d isc ussão
p osterior sobre o tem a do corp o.

II C. TEMAS ARQ UITETÔ NICOS PÓS-MODERN OS

E n tre os te m as ge ra is q u e c o m p õ e m o u n iv e rso de q u estõ es da t eoria c u l t u ra l p ós-


- m o d e r n a estão o da h istór ia (o p rob le m a da t ra d iç ão d isc ip li n a r), do sig n ific a d o , da
resp o n sa b i li d a d e so c ia l (co m p ro m isso ético em o p osiç ã o a u m a p rá t ica a u tô n o m a)
e o d o c o r p o . N o c aso d a teoria p ós- m o d e r n a da arq u it e t u ra, u m a p osiç ã o i m p o r
tan te é t a m b é m fo r m u la d a co m relação à c id a d e co m o artefa to c u lt u ra l, e ao lug a r ,
n o se n t id o fe n o m e n o lógico . E m b o ra a m a io ria d esses tem as ta m b é m c a ra c t e r i z e a
teo r ia a rq u i t e t ô n ic a do p e r ío d o a n terior, p o d e -se d i z e r qu e as q u estõ es do c o r p o
e d o l u ga r n ão fo ra m reco n h ec id as pelo m ov i m e n to m o d e r n o d e v id o ao seu foco
n o co le t ivo em d e t r i m e n to do i n d iv id u a l, o qu e se exp ressava em u m a li n gu age m
d e u n iv e rsa lid a d e , a u m só tem po tec n ológica e abstra ta. A ce leb ração da m áq u i n a
co m o m o d e lo fo r m a l, p o r exe m p lo, exclu iu o co rp o . A arte d ese m p e n h a um papel
m a is im p or t a n t e na arq u itet u ra p ós-m o d e r n a do que a tec n ologia, já que o p ê n d u lo
vo lto u a osc i la r en tre u m a ên fase na arq u itet u ra co m o arte e na arq u itet u ra co m o
e n ge n h aria. V id le r afir m a:

45
A questão da arte da arquitetura, que a ética fu n cio n al deu p o r e n c errad a, po d e muito
bem ser reaberta, com todas as suas im p licações p er t u rb a d o ras, p o r esse esforço no
dom ín io das ideias [...] A té bem recen tem en te os arq u itetos [estavam ) m ais in teres
sados em desenvolver m áquinas de m orar do que em e n fre n tar as d ific u ld ad es p ró
prias de uma arte. A u topia positivista da arqu itetu ra m o d er n a b aseo u -se, portanto,
na repressão da morte, da decadência e do “ p rin cíp io do p ra z er” .112

M uitas vezes tem os a im p ressão de q ue, no p e r ío d o p ó s- m o d e r n o , as id e ias fo r m a is se


torn am claras p rim eira m e n te na arte (qu e n ão está su jeita às c o m p lic a ç õ es d a habita-
bilidade, da colaboração e do fin a n c ia m e n to), e só d e p o is flu e m p a r a a arq u it e t u ra. Por
exem plo, Foster descreveu co m o a arte p ós- m o d e r n a c r ia u m c a m p o e u m ob jeto de-
sestru turados, u m sujeito h u m an o desce n trado (ao m esm o te m p o a r t ista e esp ec tador)
e p rovoca u m a erosão da h ist ó r ia.113 A s teorias recen tes so b re o c o r p o na arq u itet u ra
ressaltam essas ideias.
H á u m i m e nso e n trecru z a m e n to de q u estões e n tre a a r t e e a c r í t ic a d e ar te pós-
-m od ern as e a teoria arq u itetô n ica, em gra n d e p ar te d e v i d o à i n flu ê n c ia d os m esm os
parad igm as teóricos (n otad am e n te o p ós-est r u t u ra lism o ) n as d u as d isc i p l i n as. E n tre
as questões com u ns in clu i-se a co nstelação de id eias acerca d a c o n s t r u ç ã o d o artista,
tais co m o a defin ição de seu p apel co m o p ro d u to r n a so c ie d a d e e a re c e p ç ã o da obra
de arte. Estes problem as relacionados ao fazer pode m ser sin teti z ados em três asp ec tos:
o da autoria, o da au toridade e o da au te n ticidade. O c u r a d o r de a r te co n t e m p o râ n ea
H oward Fox o bserva que

no mundo da arte da década de 1970, a autoridade de determ in ad as ideias que cos


tumamos associar ao modernismo com eçou a erodir: origin alid ad e, gên io artístico,
virtuosismo artesanal, a noção de sacralidade do objeto de arte.1 N

M uitas das ideias que hoje estão sen do qu estion adas (rem a n esce n tes d as co n c ep ções
românticas do século x i x sobre o artista) são as m esm as que fora m pela p ri m e ira vez
postas em xeque pela obra dos surrealistas, já nos a n os 1910 . O s re adym ades de M ar
cei D uchamp, sobretudo, suscitaram questões pert u rbadoras, rad icais, en tre os artistas
sobre o caráter ratificador, com o que alqu ím ico, da assin at u ra do ar t ist a; o p ap el da
mão na manufatura; as noções de origin al e de autên tico; e o status p r iv ileg ia d o dos
locais de exposição. A apropriação e exibição por D uch a m p do ob jeto p ro d u z id o em
série como objet d ' art an tecipa o ensaio de 1936 de W alter B e n ja m i n , in tit u lad o “A obra
de arte na era de sua reprodutibilidade técnica” ,115 que recon hece a t ra n sfo r m aç ão das
condições de produção e fruição da arte na era in dustrial.
O teórico da arquitetura catalão Ignasi de Solà-M orales Rubió afirm a que o su rrea
lismo fez a crítica mais consistente do movim ento moderno, o que explica o seu fascín io

46
e n tre os a r t ist as e arq u ite tos p ó s- m o d e r n o s.1,6 O u tra ge ração de ar t istas e teó ricos (en tre
os q u a is, R o b e r t M o r r is, G o r d o n M a t t a- C lar k , A la i n Ro b b e-G r i lle t) co m eço u a ex p lo r a r
o lega d o su rre a list a em m e a d os d os a n os 19 60. N a arq u ite t u ra, Rossi foi d os p r i m e iros
a re fle t ir e a a d e r ir a esse m o v i m e n to , se n d o segu id o , n as d é c a d as d e 1970 e 1980, p o r
o u tros e n tre os q u a is T sc h u m i, K oo l h aas, E li z abe t h D iller e R ic a rd o S c o f i d io .117
U m a d as est ra t égias d os p ó s- m o d e r n o s p a ra co m b a t er o co n c e ito d e o r ig i n a l i d a d e
é a a p r o p r ia ç ã o : t o m a r e m p rest a d o - e m esm o , re p ro d u z ir li tera l m e n te - a o b ra d e o u
tre m co m a i n t e n ç ão d e re c o n t ex t u a li z á-la ou d e re ap rese n tá-la em u m n o vo co n texto.
E n tre as fe m i n ist as, a a p r o p r ia ç ã o d e o b ras fa m osas d e a r t ist as d o sexo m asc u l i n o é
u m a fo r m a d e c h a m a r a a t e n ç ão p a ra a m a rg i n a l i z a ç ã o d as m u l h e res na h ist ó r ia d a
arte, u m m o d o p o lê m ic o d e q u est io n a r o v a lo r q u e a so c ie d a d e a trib u i à o r ig i n a lid a d e .
N o t ra b a l h o d e S h e rr ie L e v i n e , a a p ro p r ia ç ã o e a re ap rese n tação d e gr a v u r as d e W al k er
E v a n s a d v e r t e m p a ra o asp ec to m e c â n ic o e serial d a fo togra fia , e, p o r t a n t o , p a r a su a
re lação a n ô m a la co m o t ra b a l h o m a n u al tra d ic io n al em o u tras artes.

P RI M E I R O T E M A ! A H I S T Ó RI A E 0 H I S T O RI C I S M O

O fato de ter sid o possível leva n tar essas q u estões m ostra qu e o m o d e r n is m o p erd e u o
d o m í n io fir m e e u n ivale n te sob re o c a m p o da arte e da arq u ite t u ra, o q u e ab riu esp a ço
p a ra u m a m u l t ip lic i d a d e de p e rsp ec t iv as teó ricas e fo r m as de ex p ressão . E sses q u es
t io n a m e n tos ta m b é m c h a m ara m a a ten ção p ara a n aturez a a u toco nsc ie n te, a n alít ic a e
d i r ig id a à im age m do p e r ío d o p ós- m o d e r n o , na q u al a p re o c u p a ç ã o d os a r t ist as e a r
q u itetos se volto u p ara “ u m a h istór ia das i n flu ê n c ias” . A s teses p ós- m o d e r n as c o n c la
m a m a u m a reflexão, q u a n d o n ão a u m a aceitação plen a da h istória da d isc ip li n a q u e
a t eoria m o d e r n a h avia rejeitado. A a p ro p r ia ç ã o é u m a for m a agressiva de lid a r co m
o p assa d o. O u tra p ossib ilid a d e é ad o tar u m a atitu de de plen a co nsc iê n cia do presen te
co m o m o m e n to h ist ór ico d isti n to, o que leva à “ p e r io d i z a ç ã o” , isto é, à segregaç ão de
o b ras e even tos em ca tegorias c ro n o lógic as ou estilísticas sep arad as.
A p e r io d i z a ç ã o é u m a o p eraç ão típica da v isão historicistn da h istória, que a defin e
co m o ten tativa de e x p r i m ir o Z ei tgeist , ou o esp írito da ép oc a, co n sid era d o ú n ico e
exc lusivo no tem po presen te, e co m o tal ex igi n d o a e laboraç ão de um estilo si n gu la r
(cap. 4). A co n c e p ç ão m o d er n a de estilo se baseia n at uralm e n te nessa v isão da teoria
da h istória. Por isso, a cu lt u ra h istoricista b usca d esco b rir na natureza um “ ideal e m er
gen te” , em co n t ín u a m u d a n ça, co nsoa n te com o m od elo de evolu ção ou crescim e n to
o rgâ n ic o na n a t u re z a.118 Essa teoria da h istória, típica do séc u lo x i x , está na base do
rela tivism o da m o d er n id ad e cu ltural, especialm en te das ideias va ngu ard istas acerca da
n ecessid ad e de u m a “ ru p t u ra ra d ic al” com o passado.
E m “ Três tipos de h istoricism o” , A lan C olqu hou n observa que

47
na vanguarda arquitetônica isso significou a contínua invenção de novas form as sob o
impulso do desenvolvimento social e tecnológico, bem com o a represen tação simbó
lica da sociedade por intermédio dessas form as (cap. 4).

Colquhoun, um crítico pós-m odern o, assin ala dois asp ectos p a ra d oxa is no h istoricis
mo. O primeiro é que a tentativa de exprim ir o Zeitgeist con den a o artista a u m padrão
de incessante m udança. H aberm as aprofu n d a o p arad oxo ao su sp e it a r qu e “o valor
atribuído [pelo m odernismo] ao transitório, fugid io e efêm ero [...] revela um anseio
por um presente estável, puro e im aculado” .119O segu n do aspecto é que o m od ern ism o
substituiu os ideais fixos e a “ lei natural” da visão de m u n do clássica por u m a “ fuga para
0 futuro” , uma inevitável sucessão (positivista) de expressões relativa m en te válidas de
épocas diversas. Para Colqu hou n, o paradoxo está em que u m a coisa p o d e ser ao mes
mo tempo inevitável e relativa. Entre outras in dagações acerca do h istoricism o inclui-se
a de saber como se pode identificar o Zeitgeist de den tro da h istória. N a o p i n ião de Ei-
senman, em “ O fim do clássico” (cap. 4), esse problem a lógico sugere a n ecessidad e de
descobrir um novo propósito para a arquitetura.
O h istoricism o ain d a tem d u as o u tras d e fi n içõ es re le v a n t es p a r a u m a d isc u s
são sobre a arq u itet u ra p ós- m o d e r n a . C o lq u h o u n p r o p õ e as seg u i n t es: (1) u m a
atit ude de in teresse p elas t ra d içõ es a n teriores e (2) u m a p r á t ic a a r t ís t ic a q u e faz
uso de form as h istóricas. O s arq u itetos h istor ic istas p ó s- m o d e r n o s u t i l i z a m -se de
elem en tos do estilo c lássico e de o u tros est ilos do p assa d o p o r m e io d e p rá t ic as
artísticas co m o a colagem , o p ast ic h e ou v e r d a d e iras r e c o n s t r u ç õ es, si n a l de que
co nsid era m essas for m as su p erio res às co n t e m p o râ n e as em f u n ç ã o d as a ss o c i a
ções e sign ificad os que co m p orta m .
Um dos acon tecim en tos im portan tes da h istória da arq u ite t u ra rece n te é a rea
valiação das obras que não se am oldam ou não se in clu em nas esco las d o m i n a n tes
do movim en to m oderno. A ideia de que a arqu itetura m o d er n a n ão é a lgo singu lar,
mas se com põe de uma m ultiplicidade de ten dên cias d istin tas, c a rac te ri z a o trabalh o
dos historiadores italianos M an fredo Tafuri e F rancesco D al C o. Estes h ist or ia d o res da
arquitetura de orien tação m arxista op taram p or u m a abord age m “d ia lé t ic a” q u e e n
fatiza a natureza dísp ar das obras m od ern as, apresen tadas co m o u m a p lu ra lid a d e de
histórias. A rquitetos e edifícios até então m argin aliz ados [com o a b e rraçõ es] são desse
modo prom ovidos por com paração com Le C orb usier e M ies va n d er Ro h e co m o v a
liosas exceções à hegemonia do fu n cion alism o do Estilo In tern acio n al (e n fat ica m e n te
patrocin ado pelo mo ma e por h istoriadores com o G ie d io n ). A rev isão p ós- m o d e r n a
também procura detectar con tin uidades com obras a n teriores e se m ost ra cé t ica com
relação à noção va nguardista de “ ru p tu ra rad ical” : tra tava-se de u m a m e ta v á li d a e
exequível? Teria ela se concretizado no século x x?
Atitudes pós-modernas com relação à modernidade

O asp ecto m ais co n fuso da teoria p ós-m o d er n a talvez seja a m ultiplicidade de term os e m
pregados p ara descrever os seus varia d os posicio n a m e n tos em face da co n d ição m o d e r
na. A s p ró x i m as p ágin as ten tam sim p lificar o leque de possib ilid ad es e p roc u ra m evitar
o uso de ter m os co n trad itórios ou que rem etem a acepções diferen tes fora da disciplin a
da arqu itetura. A s duas prin cip ais atit udes p ós-m o d er n as p o d e m ser classificad as co m o
a n tim o d ern as ou p ró-m o d er n as. D en tro dessas categorias básicas, en co n tra m -se teorias
críticas e reiterativas, reacion árias e de resistência, progressistas e conservadoras.

Teorias antimodernas

A s teo rias a n t i m o d e r n as b usc a m u m a “ r u p t u ra r a d ic a l” co m a m o d e r n i d a d e e p r o


p õe m a lte r n a t ivas tan to o rie n ta d as p ara o fu t u ro ( n ovas v isõ es c r ít icas) co m o v o l t a
das p ara o p assa d o (rev ivesc ê n c ias re ac io n árias d a tra d iç ão). E n q u a n to as p r i m e iras
p o d e m ser vistas co m o u m a “ n eova n gu a rd a” em luta p o r u m a n ova ex p ressão de u m
tem po p ós- m o d e r n o co nsc ie n te m e n te d efi n id o, as ú ltim as in c lu e m p ro p ost as de a r-
rière-ga rde (de re tagu ard a) qu e d e ixa m de lad o a m o d e r n id a d e e re tor n a m a c o n d i
ções p ré-m o d e r n as ou p ré-i n d ustria is.
A p osição de re tagu ard a p redo m in a n te co n c la m a a um retor n o da h istória. Reflete
u m a v isã o cética q u an to ao alcan ce real da ação dos artistas e arq u itetos m o d e r n os a
p a r t ir da tabula rasa que a fir m a m estar em sua orige m , e um ce ticism o q uan to ao va lo r
da orige m e n q u a n to tal. M u itas vezes ch a m ad o de p ós-m o d er n ism o “ n eo c o n se rv a d o r” ,
o retor n o ao classicism o e sua au ten ticação co m o tra nsistórico (n ão sujeito à m u d a n ça
h istórica) são u m exe m p lo de post u ra a n t i m o d er n a. Essa ten d ên cia reac io n ária c o r
resp o n d e aos d esd o b ra m e n tos da política co nservad ora na década de 1980, com suas
p la tafor m as p a r t id á r ias ce n trad as no t ra d ic io n alism o e nos “ valores da fa m ília” . Na
arq u itetu ra, os valores estéticos clássicos, co m o a im itação, foram a dvogados p o r essa
corren te co n trária ao m od ern ism o.

Teorias pró-modernas

A abord agem p ós-m o d er n a oposta às an teriores é a progressista, que deseja esten der
ou co m pletar a trad ição cultural m odern a. Os progressistas dão co n tin u idade a m u i
tas ideias do m o d er n ism o num esforço para transform á-lo. D efensores dessa linha de
pensam en to, co m o Foster, acham que opositores políticos reacion ários ren u nciaram à
“cu ltura constestatória” das va nguardas do século x x na in tenção de manter o controle
so c ia l.120 Essa estratégia de ataque dos conservadores baseia-se na iden tificação do m o
dern ism o em geral com a dou trin a estética do form alismo. Redu zir o m odern ism o ao

49
form alism o, à posição de “ autonom ia oficial” , é d esco n sid e ra r o p o t e n c ia l m odern ista
de crítica social. A lém disso, Foster con corda com a o p i n ião de G re e n b e rg de que o m o
d e r n ism o1^ um program a autocrítico [...] e m p e n h ad o em m a n ter a alta q u alid ad e da
arte do passado na prod ução atual” e em p reservar a estética co m o u m v a lo r .121
H aberm as, cu ja obra prolo nga as teses d a E sco la d e F r a n k f u r t , é u m d os mais
im portan tes defensores desse ra m o do p ós-m o d e r n ism o . E le co n testa os argu m e n tos
dos conservadores que acusam o m o d er n ism o cu lt u ral de ser resp o n sáve l p elos males
da sociedade, afirm an do (com o Fram p ton) que, na verd a d e, é a m o d e r n i z a ç ã o eco n ô
mica e social que causa a alienação:

O n eoco nservador não revela as causas ec o n ô m ic as e so c ia is d a m u d a n ç a de ati


tudes relativam en te ao trabalho, ao co n su m o, à re ali z aç ão e ao la z er. Por co nse
guinte, ele atribui todos os seus efeitos - o h e d o n ism o , a falta de id e n t id a d e social,
a falta de obediência, o n arcisism o, o ab a n d o n o da co m p e t iç ão p o r sta tus e reali
zação pessoal - ao cam po da c u lt u ra.122

Para confirm ar a distin ção estabelecida por H ab erm as en tre os efeitos d a m o d er n i z a


ção e do m odernism o, pode-se citar a frustran te in eficácia da a rq u ite t u ra m o d er n a na
solução dos problemas sociais. C o m o o m o d ern ism o cu lt u ral p o d e r ia ser responsável
pelo mal-estar social se não é capaz de in flu ir na m u da n ça? N u m c o m e n t á rio de viés
m arxista, H aberm as recom enda a resistência ao “sistem a ec o n ô m ico a u tô n o m o” pelo
desenvolvimento de obstáculos e con trapesos.
H aberm as argumenta que o projeto ilu m in ista e seus va lores lib era is n ão devem
ser arquivados, mas sim renovados m edian te esforços p ara i n t egra r as três esferas
autônomas da razão - arte, ciên cia e m oral - en tre si e co m a v id a. A p ro p osta de
reconciliação entre arte e vida, que os surrealistas ten taram realiz ar sem su cesso, tem
a intenção de conduzir à em ancipação pessoal e so c ia l.123
Um outro pós-m oderno progressista, Jean-F ran çois Lyotard, cita explicitam en te a
obra teórica de H aberm as, ao lado da Teoria estética , de A d o r n o ,124 e de A m iséria da
filosofia e A sociedade aberta e seus inimigos , de K arl Pop per,125 co m o ten tativas de dar
continuidade ao projeto m oderno nas esferas específicas da arte e da p o lítica. N os de
bates publicados entre eles, Lyotard discorda da asp iração de H ab er m as ao consenso
e põe em dúvida a capacidade da arte de “ vencer o hiato en tre os d isc u rsos cogn itivo,
ético e político [e de abrir] cam in ho a uma unidade da exp eriên cia” . 126 Lyotard iden ti
ficou o papel das grandes narrativas , ou metanarrativas , que são usad as para legitim ar
as estruturas de poder; ideias como as da herm enêu tica do sen tido, da e m a n c ip ação
do trabalhador (narrativa marxista) e da criação de riqueza (cap italism o), da just iça e
da verdade.127 Seus esforços para recuperar um m odern ism o crítico desacred itara m as
metanarrativas, mostrando que elas servem para consolidar o poder. D e acord o com

50
Lyo tard , a t ec n o logia já se a p o d e ro u d e to d as as p osiçõ es d e p o d er. Para ele, assi m co m o
p a ra o u t ros in te lec t u a is p r e o c u p a d os co m o id eal d e lib erd a d e, so m e n te os pe tits récits
(os “ p e q u e n os re la tos” ) e u m a m u l t ip lic i d a d e d e sig n ific a d os co n t i n u a m a o p e r a r no
p e r ío d o p ós- m o d e r n o . O c o la pso d as m e t a n a rra t ivas m a rca, p o r ta n to , o fim d a era m o
d e r n a e d o co n se nso . A tarefa d o p ós- m o d e r n is m o de Lyotard é lu tar co n tra a to ta lid ad e
(e co n tra os esq u e m as i n telec t u ais to taliz adores) e ev i t a r a n osta lgia d o todo.

SEGUNDO TEMA! 0 SENTIDO

A arqu itetura extrai seu sign ificado das circu nstân cias de sua criação; e isso pressu põe
que o que lhe é exterior - o que se pode d e n o m in ar im p recisam e n te de seu co n ju n to
de fu n ções - tem u ma im portân cia vita l.128

Forma/conteúdo: o tipo, a função, a tectônica

F u n d a m e n ta l à d isc u ssã o p ós- m o d e r n a acerca do se n tid o é a d e fi n ição da essê n c ia da


a rq u ite t u ra, so b re a q u al n ão há m u ito co nse nso. T rês ele m e n tos são freq u e n te m e n te
co n sid era d os i n d isso c iáve is da arq u itet u ra: o tipo, a fu n ç ão e a tec tô n ica. N ã o é d ifíc il
co rr e lac io n á-los à tríad e v i t r u v ia n a: p ra z er (belez a ou for m a id ea l), co m o d id a d e ( u t i
lid ad e ou a d eq u ação) e firm e z a (d u rab ilid ad e).
O t ip o é m u it as ve z es asso c ia d o aos o u t ros d o is t e r m os: à f u n ç ã o , q u a n d o se
tra ta d e t ip os b ase a d os n o uso, e à tec tô n ic a, q u a n d o se refere a t ip os b ase a d os em
sist e m as est r u t u r a is (cap. 5). A t ip o logia t a m b é m p o d e ser c a r a c t e r i z a d a c o m o u m
c a t á logo d e so lu ç õ es ge ra is p a ra p ro b le m as de c o m p osiç ã o a rq u i t e t ô n ic a, id e a li z a
d o até o m a is alto n ível d iagra m á t ic o . A ssi m d efi n id o , o t ipo talve z c o n st it u a o q u e
D e r r i d a c h a m o u de “ a a rq u i t e t u ra da a rq u i t e t u ra” , ou o eq u iv a le n t e da est r u t u r a
p ro f u n d a na li n gu age m .
A co m u n ic ação de sign ific ad o tam bém é parte do tipo d evid o à red u n d â n cia nele
d a fo r m a, seja e n q u a n to re p e t ição de for m as b ásicas, seja de ele m e n tos in varia n tes
(a rq u é t ip os). Perceb id o de m o d o co nscien te ou in conscien te, o tipo cria u m a c o n t i
n u id ad e co m a h istória, o que con fere in teligib ilidade a ed ifícios e cidades no in terior
de u m a cu ltu ra.
N a o p i n ião de algu ns p ós-m o d er n os, a aceitação da existê n cia de um inven tário a
p r io r i de t ipos p assíveis de ser tra nsfor m a d os em m od elos d isp ensa a escolh a en tre a
im itação e a in ve n ção co m o orige m da form a. D ado que os tipos são ge n éricos dem ais
(e d estit u ídos de estilo) para ser im itados, a invenção assu m e um papel m aior no p ro
cesso de projeto. A ssi m , o tipo é “ a estru tu ra in terior de u m a form a ou (...) um p r i n
cíp io que con tém u m a p ossib ilid ad e in fin ita de variação form al e de even tual m o d ifi
cação da estru t u ra d o ‘tipo’ em si m esm o” .129 O tipo proporcio n a uma origem racional,

51
sem valor próprio (p or oposição à escolh a fu n d a d a n os c r i t é r io s d e p re c e d ê n c ia h is
tórica de um edifício específico), co m a qual se p o d e a r t ic u la r u m m é t o d o d e tra nsfor
m ação na prática do projeto.
Os escritos do teórico ilu m in ista Q u atre m ère de Q u i n c y f u n d a m e n t a m o pe nsa
mento pós-m od ern o acerca da tipologia, co m o o d os n eo r r a c io n a l ist as ita lia n os:

As bases do neorracionalismo residem na sua co n cepção do p ro je to arquitetôn ico,


cujos limites já estão estabelecidos na tradição arq u itetôn ica e c u jo ca m p o de ação é
logicamente delimitado pelo constante retorno de tipos, plan tas e ele m en tos básicos:
todos entendidos sincronicamente como perm anen tes e im u táveis, e n raiz ados na tra
dição e na história.130

A tarefa do arquiteto é transform ar o ideal ou a essê n c ia, q u e co n st i t u i o tip o, em um


modelo físico. Solà-M orales Rubió d e n o m in a esse p ro c esso de “ fig u r a ç ã o d o projeto”
(design figuration) e observa que no trabalho de Rossi o t ip o é m e d ia d o p o r sua su b
jetividade poética e pela inspiração no su rrealism o. O u tros fu n d e m o ideal t ipológico
com a pragm ática das técnicas constru tivas, que, p o r ve z es, está b ase a d a no ed ifício
vernacular regional. G iu lio C ario A rga n , cuja teoria p ossib ili ta o d ese n vo lv i m e n to de
novos tipos, propõe u m a poderosa fusão entre o tipo e a t ec tô n ica a fim de c r ia r um
“ ponto de origem” inevitável para o projeto (cap. 5).
A com unicação da função é 0 principal dilem a exp ressivo do m ov i m e n to m oderno.
A função é vista como racional e científica, jam ais gratuita ou m eram en te estética. A prio
ridade atribuída à função com o con teúdo sugere que ela é co n sid e ra d a a essê n c ia da
arquitetura moderna. A hipótese de que a form a na arq u itet u ra d e r iv a d a fu n ç ão , ou
a deixa “ transparecer” , im plica a possibilidade de u m a c o rr esp o n d ê n c ia d ire ta entre
formas específicas e funções específicas. Essa corresp o n d ê n cia req u er a lg u n s cód igos
para criar significado, pois este não é inerente às form as, m as cu lt u ra lm e n te co nstru ído.
Todas essas questões e proposições são reexam inadas no p erío d o p ó s- m o d e r n o em en
saios como “ N eofu ncionalismo” , de G a n d elso n as,“ Pós-fu n c io n a lism o” , de E isen m a n
(cap. 1) ,“ Função e signo: a sem iótica da arquitetura” , de E co, e a série “A rq u it e t u ra e
limites” , de Tschumi (cap. 3).
Eisenman afirma que a função tem sido um assunto constan te na teoria da arqu ite
tura desde 0 Renascimento e que essa relação fundam en tal com o h u m a n ism o im pede
a adesão da disciplina ao modernismo. “ Na realidade” , afir m a E ise n m a n , o fu n c io n a
lismo “ não passa de uma fase tardia do h um an ism o” . E exorta o leitor a “ reco n h ecer
que a oposição forma/função não é necessariamen te in trínseca a n e n h u m a teoria ar
quitetônica (...) e a reconhecer a diferença crucial entre m o d er n ism o e h u m a n ism o” .
O pós-modernismo dá mais valor à form a que à fu n ção, in verte n d o d e lib era d a e
polemicamente a máxima modernista de que a form a segue a fu n ção. A v isã o form a-

52
lista suste n ta q u e a fo r m a em si é a essê n c ia ou o co n te ú d o d a arq u ite t u ra. E ssa ê n fase
n a fo r m a c o m o sig n ific a d o e n c o n t ra p a ra le lo em a lgu n s d esd o b ra m e n t os d a l i n g u ís
tica n o est r u t u r a lism o e n o p ós-est r u t u ra lism o . E m p a r t ic u la r, o q u est io n a m e n to d a
n o ç ã o d e q u e a li n g u age m esp e l h a a re a lid a d e e n c o n t ra u m co rr e la to t eó r ico na a r
q u i t e t u ra a u to rr e fe re n c ia l. Se a p i n t u ra m o d e r n a d e ixo u de re p rese n t a r i m age n s r e
co n h ec ív e is na v i d a , p o r q u e a arq u ite t u ra d ever ia p re n d e r-se à a p rese n t aç ão de algo
ex t e r io r a ela? E sse ra c io c í n io é su bjace n te à v isã o de a u to n o m ia q u e ch ega até m esm o
a c o n sid e ra r a fu n ç ão co m o algo ex t e rio r à arq u itet u ra.
D ebates se m el h a n tes são vee m e n tes q u a n to à ce n tra lid a d e da tec tô n ica p a ra a a r
q u ite t u ra (cap. 12). A lg u n s a u tores a fir m a m q u e so m e n te a o b ra c o n st r u íd a p o d e ser
co n sid e ra d a arq u ite t u ra, e n q u a n to o u tros d efe n d e m q u e a m era p rese n ça física n ão é
ga ra n t ia de co isa a lg u m a. M as p a ra q u e u m p roje to seja c o n st r u íd o é p rec iso e n fr e n
tar a q u estão da tec tô n ica, o q u e m ais u m a vez ressalta a d ist i n ç ã o en tre co n st r u ç ã o
e a rq u ite t u ra. A s d u as p rá t ic as têm em co m u m a n ec essid a d e de e m p regar siste m as
est r u t u ra is e de so lu c io n a r o p ro b le m a da ju n ç ã o de m a teriais; se n d o assi m , o q u e
torn a a a rq u ite t u ra su p e r io r à co nstr u ção? Segu n d o o arq u iteto D e m e tri P o r p h yr ios,
a “ m e d iação im i ta t iva” na m a n ip u laç ão de m a t érias-p ri m as é o q u e d ist i n gu e a a r q u i
te tu ra, e a a usê n cia d essa m e d iação ex p lic a p o r que o m o d e r n is m o p ro d u z iu a p e n as
co n str u ção . N esse sen tido, o o b je t ivo da arq u itet u ra d everia ser “co n st r u ir u m d isc u r
so tec tô n ico q u e, a p esar de vo ltad o p ara a p ragm á t ic a do abrigo, p u d esse ao m esm o
te m po rep rese n tar a sua p ró p ria tec tô n ica co m o m ito” . 131 N a o p i n ião de P o r p h yr ios,
tal a fir m aç ão p er m ite co n c lu ir que o classic ism o é a via n ecessária p ara a gra n d e a r
q u itet u ra, dad a a sua ca p ac id ad e de m itificar a co nstru ção vern ac u lar.
Para o u t ros, a t ec tô n ica em geral é u m a fon te r iq u íssi m a de sig n ific a d os. E sse
p o n to d e v ist a p o r ve z es está re lac io n a d o a u m i n teresse fe n o m e n o lógic o pela “coi-
sid a d e” d a arq u it e t u ra, em su a c a p a c id a d e de congregar (co n d e n sa r sig n ific a d os no
a m b ie n te). E m p arte, esse “ re tor n o às co isas” , à co n st r u ç ão co m o u m p ro c esso de v ir
a ser é u m tem a p ós- m o d e r n o . Por exe m p lo, o Pin ecote Pavilio n de Faye Jo n es p ossu i
u m a co b er t u r a p arcialm e n te revestid a que p er m ite en trever as ca m a d as su cessivas de
seu p ro c esso de co n str u ção .
A ê n fase tec tô n ica é u m asp ec to im p or ta n te da crítica p ós- m o d e r n a , seja com
relação a u m m o d er n ism o estéril, d egrad ado, seja à su p erfic ialid ad e do h istoricism o
p ós-m o d er n o . A lgu n s arqu itetos co nstroe m u m a n arrativa usan do os m ateriais e os
detalh es. A n arrativa às vezes é extravagan te (no uso de e m p réstim os ecléticos, pasti-
ches e apliq u es); ou tras vezes é pragm ática (ao usar o detalhe com o m eio de expressão
tec tô n ica). O apelo de G regotti a u m a revaloriz ação do detalhe com o problem a arq u i
tetô n ico foi ap o iad o por M arco F rascari e Fram p ton nos artigos que os três p u b lica
ram sobre o assu n to en tre 1983 e 1984. As ideias expostas em “ T he-T elI-the-T ale D etail”
[ O d etalh e n arrativo, em trad u ção livre], “ Rappel à Vordre: argu m e n tos em favor da

53
tectônica” e “ 0 exercício do detalhe” (cap. 12) t ivera m gr a n d e r e p e r c u ssã o en tre os ar
quitetos. E m sua busca do essen cial, F ra m p to n sugere “q u e d e v e m os v o l t a r à u n idade
estrutural com o essência irredu tível da for m a a rq u it e tô n ic a” . U n i d a d e est r u t u ra l, na
visão de Fram pton, remete à co n exão en tre co m p o n e n tes t e c t ô n ic os - a ju n t a - que é
o “ nexo em torno do qual 0 ed ifício tom a form a” e “ se a r t ic u la c o m o u m a p rese n ça” em
termos fenom enológicos.

Representação e historicismo pós-modemo

0 debate que acabo de resu m ir sobre a o p osição en tre fo r m a e c o n t e ú d o faz parte da


reflexão pós-m od ern a acerca do sign ificado. Re p rese n taç ão e fig u r a ç ã o são tam bém
aspectos essenciais dessa tem ática. O s artistas p ós- m o d e r n os r e i n t ro d u z ira m em seus
trabalhos a figura h u m ana e ou tras form as reco n h ecíveis, e n c e r r a n d o o lo n go rein ado
da abstração, que se in iciou com 0 cu b ism o, o co n st r u t iv is m o e o su p re m a t ism o . Na
arquitetura pós-m od ern a, 0 uso de estilos h istór icos ou frag m e n tos id e n t ificáveis de
estilos específicos tem a m esm a in tenção: cr iar fo r m as q u e co n t ê m asso c ia ç õ es, ch e
gando inclusive a constru ir u m a n arrativa. M as G rego t ti o b se rv a em seu ed itorial so
bre 0 detalhe que 0 aparecim en to da citação estilística co i n c id e co m u m a c r ise da lin
guagem arquitetônica. N o entanto, sustenta que a citação h istor ic ista (d esp rop osi tad a,
radical) não é um substituto apropriado ao detalhe tec tô n ico q u e a r t ic u la a téc n ica de
construção como um com ponen te expressivo da lingu age m a rq u ite tô n ic a.
As obras de G raves de 1976-77 em dian te ilustram seu in teresse pela “ arq u itetu ra
figurativa” , expressão pela qual ele se refere a u m a a rq u ite t u ra q u e m a n t é m u m a re
lação de associação com a natureza e com a trad ição clássica (cap. 1). O uso sugestivo
de fragmentos h istóricos no prédio da Prefeit ura de Port la n d ligo u seu n o m e a uma
imagem ou vocabu lário form al recon hecível, que fiz era m dele u m a rq u it e to m uito
apreciado pelas agências de publicidade. C o n form e salien tou M c L eo d , a p reoc u p ação
com 0 status que marcou a década de 1980 fez com que os arq u ite tos fosse m m uito
procurados para desen har e autenticar in ú m eros prod u tos, de c h a le iras a sa p a t os.132
Os anos 1980 foram glam ourosos para os arquitetos, e u m a so c ie d a d e rica e p rós
pera podia se dar ao luxo de constru ir “ed ifícios assi n a d os” . M as o p reço p ago para
contar com um mercado de massa e um estilo im itável foi a m e rc a n t ili z a ç ão da im a
gem do arquiteto e o fenôm eno do “ m arasm o” arq u itetô n ico. E m p resas i n c or p o ra-
doras e construtoras de cadeias de shopping centers fizeram i m i tações su p erfic ia is do
estilo e da paleta de Graves, mas que fugiam com pletam en te ao esp ír i to da “ arq u ite
tura figurativa” . Todo e qualquer com ponente crítico do o r igi n a l estava a use n te das
versões comerciais de seus projetos.
Esses projetos e sua assimilação pelo mercado sugerem algu m a v a lid a d e na tese de
que a arquitetura pode funcionar como um sistema sem iótico. Prin c ip alm e n te no caso

54
d e p ro je tos p r e o c u p a d os co m a d i m e n sã o est ilíst ic a d a a rq u it e t u ra, seja d e i n sp ira ç ã o
c lássic a, seja d e i n sp ir a ç ã o ve r n ac u la r. U m b o m ex e m p lo é o p o r t fó lio d e resid ê n c ias
n eo t ra d ic io n a is d e Stern p a ra a su a clie n tela a b astad a e c o n se rv a d o ra. O s p roje tos c a p i
taliz a m as asso c iaç õ es d os est ilos a rq u ite tô n ic os d o séc u lo x i x co m a riq u e z a, o status e
os est ilos d e v id a a rist o c rá t ic os. N a v isã o d e Ster n , q u e segu e Rossi, a co m p ree n são do
sig n ific a d o d e u m a fo r m a cresce co m o te m p o p o r efeito d a m e m ó r ia c u lt u ra l. Isso n ão
q u er d i z e r q u e h aja o u tras se m el h a n ças n o t ra b a l h o d esses arq u itetos.
U m a est ra t égia t íp ic a d a c o m p osiç ã o h ist o r ic ist a p ó s- m o d e r n a é o p ast ic h e, a c i
t ação ec lé t ic a d e e le m e n tos h ist ó r ic os frag m e n t á r ios. [ H a l] F oste r a n a liso u esse fe n ô
m e n o c o m o u m a a p ro p r ia ç ã o d o p assa d o p a ra fins at uais. A p rese n t a n d o-a co m o u m a
c r ít ica ao m i n i m a l is m o tac it u r n o , q u est io n a se u m a h ist ó r ia d e frag m e n tos e m b le m á
ticos d esco n t ex t u a li z a d os será m ais acessível q u e a abstração . O p ast ic h e ge ra lm e n te é
a c o m p a n h a d o de u m a a tit u d e p a ró d ic a co m relação aos frag m e n tos h ist ó r icos, o q u e
co n tra d i z u m a a tit u d e ge n u í n a de resp eito p e lo p assa d o. O E d ifíc io da at &t d e P h illip
Jo h nso n (1978) ilustra b e m os jo g o s de iro n ias usa d os p e los a rq u ite tos h ist o r ic ist as
p ós- m o d e r n os, n esse caso, e x p lo d i n d o a escala de u m a p e n tea d eira c h ip p e n d a le p ara
t ra n sfo r m á-la em um a rra n h a-c é u de M a n h a t ta n . Q u e sig n ific a d o d ev e r ía m os reter de
u m e d ifíc io a t avia d o à m a n eira de u m a peça de m ob ília?
Stern c h a m o u a a ten ção p ara a te n d ê n cia “o r n a m e n t a l” da arq u itet u ra h istoricista
p ós- m o d e r n a , qu e se va le da su p erfíc ie d e co ra d a d as p ared es p ara t ra n sm i t ir sig n if i
ca d o (ca p 1). Esse co m e n t á r io sugere q u e a fac h a d a p ó s- m o d e r n a , co m o u m a m á s
cara d issi m u la d o ra , su bst it u i a eleva ç ão m o d er n ist a q u e d e ixa e n trever o in terior. (A
m o d ific a ç ã o t e r m i n o lógic a p ara d esign a r a su p erfíc ie fron tal d os p ré d ios é u m a i n d i
cação do in teresse p ós- m o d e r n o pela tra d iç ão B e a u x - A r ls.) Rece n tem e n te, o ím p eto
d ecora t ivo ta m b é m se voltou p ara o uso dos m ateriais e dos detalh es co m o e p isó d ios
exp ressivos de u m ed ifício.
C o m o era de se esp erar, algu ns dos crít icos do h istor ic ism o p ós- m o d e r n o fo c a li
zam o tem a p roe m in e n te da represe n tação. Re tirar fragm e n tos estilísticos do seu c o n
texto h istór ico leva ao q ue F ra m p to n e o u tros c h a m ara m de efeitos ce n ográ ficos de
u m a arq u itetu ra desistoriciz ad a. A lé m do “clássico fingid o” , Porp h yrios id en tifica duas
ou tras m a n ifestações arq u itetô n icas p ós-m o d er n as: o “ high-tec fingid o” e a “ tra n sgres
são” da d esco nstru ção. Seu artigo “A pertin ên cia da arq u itetura clássica” critica toda a
“c u lt u ra” p ós-m o d e r n a p or asse n tar-se n u m terreno instável co m posto pelo p ri m ad o
do con texto e pela “ retórica do estilo” , u m a atit ude eclética de en carar os estilos com o
d isp osit ivos de co m u n ic ação (cap. 1). A arqu itetura h istoricista p ós-m o d er n a que d a í
resulta é o kitsch ce n ográfico, co n d ensado pelo “galpão d ecorad o” de Robert Venturi e
D en ise Scott Brow n .
N a o p i n iã o de P o r p h y r ios, a p a ró d ia e o p ast ic h e n ão são rec u rsos a d eq u a d os
à i n v est iga ç ã o a rq u i t e tô n ic a. U m a alter n a t iva seria ressusc ita r o clássico a u tê n tico,

55
c u jo sig n if ic a d o d e r iv a d a ló g ic a d a c o n s t r u ç ã o e su a m i t i f i c a ç ã o . P o r p h y r i o s m e n
c io n a a e c o lo g ia , o u r b a n is m o e a c u l t u r a c o m o o u t r as j u s t i f i c a t i v a s p a r a u m r e t o r
n o ao c lassic is m o .
A lgu ns teóricos, co m o D ia n e G h irard o, alega m q u e a a rq u it e t u ra h ist o r ic ist a p ós-
-m o d ern a tende a faz er u m a in terpretação eq u ivocad a e seletiva d a h ist ó r ia , e a ig n o ra r
suas responsabilidades sociais, ecológicas e políticas m ais a m p las. C r i t ic a essa a b d ic aç ão
justificada pelo form alism o. C o m o exem plo, G h irard o evoc a a atit u d e d os arq u ite tos d e
sem pregados nos Estados U n idos da década de 1970, que, em ve z de se d e d ic a re m a p ro je
tar utopias sociais, refugiaram -se no fetiche de u m a “ arqu itetura n o p a p e l” (cap. 8).
C o n trasta n d o co m a a p ro p riação , m u itas ve z es su p e rfic ia l, d e i m age n s t ir a d as da
h istór ia da arq u itet u ra p o r p ar te d os h ist or ic ist as p ó s- m o d e r n o s, o u t r o s a rq u i t e t os
ressaltara m em seus escritos e p roje tos os va lo res p osi t iv os d a a b s t r a ç ã o . O v o l u m e
in augu ral do Pra tt J o u r n a l , p o r exe m p lo, ap rese n tou v a r ia d as d isc u ssõ es e m t o r n o da
p erm a n ê n cia do va lo r da abstração. D e m o d o a n á logo , o su b li m e c o n t e m p o r â n e o de
Lyotard con testa a n oção de q ue a a bst raç ão carece de c o n t e ú d o , o fe r e c e n d o co m o
exe m plo as ten tativas de art istas m o d e r n os de “ a p rese n tar o i n a p r ese n t á v e l” d o u n i
verso das ideias.

T ERCEIR O T E M A ! 0 LUGAR

Nas últimas décadas tem se tornado cada vez mais claro que essa abord age m p ragm á
tica [o fu ncionalismo] con d u z a um am bien te esquem ático e d escarac teriz a d o, sem
grandes possibilidades para a habitação h um ana. D aí a i m p or tâ n c ia assu m id a pelo
problema do significado na arquitetura.133

Homem, arquitetura e natureza

A relação do hom em com a natureza é u m an tigo prob le m a filosófico sa lie n t a d o por


fenomenologistas com o N orberg-Sch u lz . A co n cepção da n aturez a co m o “ o o u t ro” da
cultura é um tema duradouro no pensam en to ocid en tal. Por exe m plo, a luta do h om em
contra uma natureza am eaçadora caracteriz a as ideias ilu m in istas acerca do su blim e.
D esde a Revolução In d ustrial, o p rogresso tec n o lógico d i m i n u iu a n ec essid a d e
dessa luta pela sobrevivên cia. Os d esco nstru cio n istas c h egara m a d i z e r q u e a a n tiga
oposição entre natureza e cu ltura h avia sido su p erad a e se to r n a d o irre lev a n t e com
todas as demais oposições bin árias. Se isso é verdade, terá sido ta m b é m e li m i n a d a a es
trutura binária? Para alguns, depois da con qu ista da natureza, o d esafio p a ra a cu lt u ra
proviria agora do polo oposto do espectro: do co n h ecim e n to h u m a n o e de su a for m a
instrumentalizada, a tecnologia. C o m o progresso das tec n ologias, a H u m a n id a d e i n s
talou uma crise ambiental global.

56
A a rq u ite t u ra d o m i n a, literal e si m b o lic a m e n t e, as fo rças d a n a t u re z a p a ra p rove r
abrigo. N o p e r ío d o p ré-i n d u st r ia l, a p ro d u ç ão de se n tid o n a arq u ite t u ra b ase ava-se em
referê n c ias estr u t u ra d as e asso c iaç õ es co m a n aturez a. A arq u ite t u ra m o d e r n a ab raço u
a a n a logia d a m á q u i n a em lu gar d a a n a logia o rgâ n ic a. A i n d a q u e as m á q u i n as seja m
m u itas ve z es p ro je t a d as co m b ase n os siste m as n a t u rais, o seu uso co m o m o d e lo fo r
m al i m p e d iu a arq u ite t u ra de re fe rir-se d ire ta m e n te à n a t u re z a. Isso é u m p ro b le m a,
p orq u e, a d esp eito d os ava n ç os tec n o lógicos, u m a d as a t rib u içõ es da arq u ite t u ra c o n
tin ua a ser a si m b o li z ação da p osiç ão do h o m e m n o i n terior do m u n d o n at ural.

Lugar e genius loci

A lb e r t E instein d efin e o lugar “co m o u m a p e q u e n a p o rç ão d a su p e rfíc ie da T erra q u e


se p o d e id e n t ificar p o r u m n o m e (...) u m a esp éc ie de o rd e m d os o b je tos m a teria is e
n ada m a is” . 134 O h ist or ia d o r da a rq u ite t u ra Peter C o lli n s aceita essa d e fi n iç ão e a p r o
fu n d a su as im p licações:

O ra, este é precisam en te o tipo de espaço im plicado no projeto arqu itetôn ico, e é p os
sível dizer que um “ lugar” [place, em inglês) (pla z a , pia z z a) é a m aior extensão do
espaço com que um arquiteto é capaz de lidar com o obra de arte u n ificad a.135

As teorias do luga r , que se o r igi n a m da fe n o m e n o logia e da geogra fia f ísic a ,13* e n fa t i


zam a esp ecific id ad e da exp eriê n c ia esp acial e, em a lgu ns c asos, a id eia do gen ius loci ,
ou esp írito específico do lugar. O lugar forn ece u m m o d o de resistir ao re la tivism o das
teorias m o d er n as da h istória pelo e ngaja m e n to do c o rp o e sua ca p ac id ad e de verificar
as q u alid ad es especiais de um sítio.
M u itos arq u ite tos e t eó ricos co n t e m p o râ n eos, e n tre eles G rego t t i, R a i m u n d
A b ra h a m , T adao A n d o e N orb erg-Sc h u l z , p a r t il h a m da p ro p osiç ão de H e id egger de
que a relação com a naturez a é fu n d a m e n tal p ara o e n r iq u ec i m e n to da exp eriê n c ia
h u m an a. N orb erg-Sc h u lz afir m a que é resp o n sab ilid a d e do arq u iteto d esco b rir o g e
nius loci e fazer projetos de u m m o d o tal (criar o lugar) que dê con ta dessa presen ça
si n gu lar (cap. 9). E m o u tras p a lavras, N o rb e rg-Sc h u l z p reco n iz a a in terve n ç ão do
h om em para in te nsificar os a trib u tos n aturais da sit u aç ão local. Os fe n o m e n ólogos
en alteceram certos elem en tos sign ificativos da arq u itetu ra co m o “ m a terializ ações da
diferen ça” : “ F ron teiras e soleiras são elem en tos constitu tivos do lugar. Fazem parte de
u m a figura que revela a espacialidad e em questão” .
Para G regotti, criar o lugar é o ato prim ord ial da arqu itetura, sua origem ; asse n
tar u m a pedra no terreno é o in ício de “ m o d ificações” que tra nsform a m o lugar em
arquitetura (cap. 7). Ele afir m a que a arquitetura é constit uíd a por relações estruturais
(especialm en te diferenças) no am biente, as quais, tal com o a estru tura na linguagem ,

57
tornam possível compreendê-lo. Essa noção de diferença explica a ê n fase de G regotti na
mensuração de in tervalos em vez da presença de objetos isolados. A tarefa do arquiteto
é revelar a natureza, situan do e utilizando a paisagem . O in teresse atual em co nstru ir o
local137 reflete o desejo de criar um lugar, como propugn am N orb erg-Sc h u lz e G regotti.

Confronto e habitação

A inscrição no local a que se refere A brah am m ostra clara m en te u m a a tit u d e de in ter


venção agressiva na paisagem . D escreven do esse processo em “ N egação e reco n c ilia
ção” , A braham afirma:

É a conquista do local, a transformação de sua natureza topográfica, que evidencia as


raízes ontológicas da arquitetura. Projetar é apenas um ato secu n dário e subsequente,
cujo propósito é reconciliar as consequências da in tervenção inicial, da colisão e da
negação, (cap. 10)

O trabalho teórico e prático de A braham revela um co m pro m isso com o p ri n c íp io do


engajamento entre a arquitetura e a paisagem . Talvez existam m é to d os m e n os v io le n
tos de conceituar e realizar essa in teração, de tal form a que o p rocesso de projeto seja
mais que uma rem ediação da “conquista” . O u tros arqu itetos p ós- m o d e r n os, com o
A ndo, por exemplo, preconiz am um papel mais defin ido p ara o p roc esso do projeto
do que o sugerido por A braham .
O ensaio de H eidegger “ C onstruir, habitar, p e nsar” propõe u m a relação resp o n
sável com respeito à natureza em seu conceito de poup a r , ou c u id ar da terra. Pou par
libera alguma coisa à sua própria essência. Pode ter o sen tido de lim p ar u m lugar para
ser habitado, ou respeitar um lugar do jeito com o é encon trado. T adao A n d o sente “a
necessidade de descobrir a arquitetura que o terreno b usca p or si só ” , p orq u e “ a pre
sença da arquitetura - independentemente do seu caráter au tossuficien te - cria in evi
tavelmente uma paisagem” (cap. 10).
A rqu itetos e p a isagistas co n te m p o râ n eos têm o u t ra m a n e ir a d e es t a b e le c e r
uma relação resp o nsável com a n a t u re z a: p r o p o r c io n a n d o , co m seu t r a b a l h o ,
uma m old u ra à a p ree nsão esp ir i t u a l da n a t u re z a, o q u e é c o n s i d e r a d o e ss e n
cial a u ma existê n c ia sig n ific a t iva. N u m a r t igo rece n te, i n t i t u la d o “ P o r n o v os
horizon tes na arq u itet u ra” , A n d o frisa o p a p el p r i m o r d ia l de su a a r q u i t e t u r a
em possib ilitar a presen ça da naturez a na v id a u rb a n a m o d e r n a . P r o p õ e q u e “ a
arquitetura se torn e um lugar on de as p essoas e a n a t u re z a se c o n fr o n t e m sob
um senso tolerável de tensão [ . . .] que d esp er t a rá as se n sib i l i d a d es es p i r i t u a is
latentes no hom em co n te m p orâ n eo” . Isso n os tra z de n ovo à m e n te a n o ç ã o
heideggeriana do habitar.

58
Lugar e regionalismo

Parcialm e n te i n sp ira d o na fe n o m e n o logia, o regio n a lism o c r ít ico de F ra m p to n p r o c u


ra a p ossib ili d a d e do h ab itar n u m a arq u itet u ra q u e ten ha m a is sig n ific a d o de e x p e r iê n
cia (cap. 11) . C o m p a r t il h a d o reco n h ecim e n to da co n st r u ç ão regio n al, ver n ac u lar, e sua
p e c u lia r se n sib ilid a d e à lu z, ao ve n to e às co n d içõ es t ér m icas, q u e d ita u m a resp osta
arq u ite tô n ic a a d a p tad a ao lugar esp ecífico. O regio n a lism o c r ít ico p ro p õ e a n o ç ã o de
que proje tos clim atica m e n te d efi n id os o b terão b o ns resu ltados estéticos e ec o lógicos e
serão cap a z es de resistir às p ressões h o m oge n e i z a d oras do ca p ita lism o m o d er n o . C o n
cord a n d o co m H eidegger, F ra m p to n resiste a essas forças u n iversaliz a n tes d e li m ita n d o
u m recin to segu ro na terra e sob o céu. O s seus m o d e los gera lm e n te se ca rac te ri z a m
p or u m a abord age m arq u itetô n ica qu e en fatiza a to p ografia do local.
O u tro asp ecto co m u m aos regio n alistas cr íticos é u m a atitu de crít ica em relação ao
uso de m ateriais de co n str u ção p ro d u z id os em série. Sem a p rego ar um re tor n o a m é
todos co nstr u t ivos p ri m it ivos, F ra m p to n evoca a v isão poé t ica de Se m p e r sob re as d i
feren ças in eren tes aos sistem as co nstru tivos do esqueleto (aéreo) e da p ared e p orta n te
(“ telú rica” , ligada à terra) (cap. 12). A riq u e z a que p o d e resu ltar do co n traste en tre os
dois sistem as e a ar t ic u lação de sua ju n ç ão é fu n d am en tal p ara a co m u n ic ação tec tô n i-
ca. E m vez de im age ns ce n ográficas, é possível co m u n ic ar u m a n arra t iva plen a de sig
n ificados por in term éd io dos elem en tos co nstru tivos e de sua art ic u laç ão c u id ad osa.
N em to d os os teóricos da arq u itet u ra co n cord a m q u a n to à i m p or t â n c ia do lugar.
P ere z -G o m es, p o r exe m p lo, a p esar de seus e nsa ios suger ire m u m a o rie n t aç ão fe n o-
m e n o lógica, crit ica a n oção de gen ius loci co m o “ um si m u lac ro p ós- m o d e r n o va z io,
in cap a z de revelar algo m ais p ro fu n d o” no con texto de n ossas c id ad es ch eias de shop
p in g centers e redes v i á r i a s.138 P ere z -G o m es p ro p õe, ao co n trá rio , q ue se rein ven te o
sítio co m o u m esp aço aberto e liberador.
A lgu n s teóricos da c u lt u ra p ós-i n d u st ria l tam bém ave n tara m a p ossib ilid a d e de
a co n c ep ç ão fe n o m e n ológica do lugar ser sau d osista e u ltrap assad a. Jean B a u d rillard ,
C h r ist i n e B oye r e E llen D u n h a m -Jo n es, en tre o u tros, a n a lisara m os p ro b le m as da
t ra n sfo r m aç ão e d esm a teria li z ação do m u n do físico pela n ova m íd ia ele tró n ica. E n
co n tros co m o “ Betw een D igital Sed u c t io n an d Salva t io n ” (Pratt, 1992) e “ B u ild i ngs
an d Reality: A Sy m p osiu m on A rch itec t u re in the A ge o f In for m a t io n ” ( U n iversity o f
T exas, 1986), ofereceram op ort u n id a d es para u m a reflexão sobre o sign ificad o dessas
m u d a n ças. Tal co m o afir m a Peter E isen m a n em “ V isões que se d esd o b ra m : a a rq u i
tetura na era da m íd ia ele trô n ica” : “ O p a ra d igm a ele trô n ico i m põe um form id ável
desafio à arq u itet u ra, porq u e defin e a realid ad e em term os de m íd ia e sim u lação, e
va lori z a m ais a ap arê n cia do que a existê n cia” (cap. 13). N ossa atit ude peran te o lugar
tende a ser afetada pela su bstit u ição da exp eriê n c ia tátil e espacial do corp o por um
p arad igm a de exp eriê n c ia virtu al.

59
Essas críticas apontam para um dos problem as em ergen tes na teoria d a arquitetura:
a variação das definições da realidade. A dem arcação ou co nstru ção de u m lugar físico,
expressivo de um dom ín io público ou privado orden ado, será no fu t u ro irrelevan te, re
dundante ou retórica? Q ual será o efeito da desm aterialização eletrôn ica da co m u n icação
sobre a arquitetura, cuja produção simboliza solidez, perm a n ên cia e co m u n h ão cultural?
Q uais serão suas consequências sobre o paisagismo, que é efêm ero, tem poral e dinâm ico?
A “ aldeia global” eletrônica é u m a ameaça para o lugar e o sign ificado? E m u m artigo re
cente, o arquiteto E zra E hrenkrantz previu drásticas consequên cias eco n ô m icas e sociais
para as cidades norte-americanas estruturadas com base em u m a p op u lação de recep to
res em dispersão na supervia da in form ação.139 As suas p reocu pações seriam reforçadas
por uma série de teorias urbanas que surgiram quan do os arquitetos p ó s- m o d er n os re-
descobriram a cidade com o um terreno para a atividade arqu itetôn ica em d iversos n í
veis: socioeconômico, político, histórico, form al, poético e artístico.

QUARTO T EMA! A TE ORI A URB A N A

Na década de 1960, a renovação urbana e as in tervenções m o d er n istas rad icais haviam


dilacerado o tecido urbano a pon to de torn á-lo irrecon h ecível. O s arq u itetos, que h a
via quarenta anos vin h am se preocu pa n do exclusivam en te com a c r iaç ão de “o b jetos”
isolados (como 0 M useu G uggen heim e o E d ifício da Seagra m em N ova York ), co m e
çaram a perceber que não havia m ais nen h u m a referência básica p ara a leitu ra desses
objetos. Seus edifícios, ao con trário, flutuavam em um “espaço aberto” m o d er n ista, ili
mitado e indiferenciado. A transform ação de terrenos em paisagens ou ja r d i n s h avia
sido negligenciada ao longo do século x x , retardan do a evolu ção p rogressiva de q u a
trocentos anos de uma tradição paisagística. C rio u-se, além d isso, u m co nse nso em
torno da declaração de Rowe e Koetter de que “ a cidade da arq u itet u ra m o d er n a [...]
ainda não foi construída. A pesar de toda a boa von tade e das b oas i n te n ções de seus
protagonistas, a cidade continuou a ser um projeto ou um aborto” .140
Essa situação de crise é percebida seja por planejadores seja por arquitetos, que muitas
vezes responsabilizam os primeiros pela má implementação de boas ideias. O zoneamento
funcional, por exemplo, (estabelecido pela primeira vez em 1916, em N ova York) é alvo de
criticas ferozes dos pós-modernistas por seu tratamento negativo da plan ificação urbana.
Regulamentando juridicamente a divisão dos usos diferenciados do solo urbano uns dos
outros, 0 zoneamento visa proteger o valor das propriedades e os seus ocupantes de confli
tos de uso prejudiciais. Mas o zoneamento também amplia as distâncias entre as residên
c ias^ comércio e outras necessidades da vida cotidiana, aumentando, em consequência, a
dependência da sociedade em relação ao automóvel. Por outro lado, os padrões de plane
jamento do sistema viário privilegiam o fluxo de carros, quase sempre em detrim en to da
circulação dos pedestres e do sentimento de vizinhança.

60
N os E st a d os U n i d os, a asp ir a ç ã o à c asa p ró p r i a u n ifa m i lia r, e ao a u to m óv e l p a r t i
cu lar, tem c o n t r ib u íd o p a ra o esp ra ia m e n to d as m ega ló p o les à m e d id a q u e v ã o s u rg i n
d o n ovas áreas d e co m érc io va rejist a p a ra a te n d er aos m e rc a d os resid e n c ia is e m e rge n
tes. F i n al m e n te, áreas d e esc r i t ó r ios co m eç a m a ser co n st r u íd as n os s u b ú r b io s141 p a ra
d i m i n u ir o te m p o d e v iage m d e c asa até o t ra b a l h o e m lo c a li d a d es c o n gest io n a d as e
sem tra n sp o r t e colet ivo. O s p ro b le m as d o esp ra ia m e n to [sp r a w l] 142 - d ese n vo lv i m e n to
se m id e n t id a d e, p e rd a d o co n ta to co m a n a t u re z a, d eso r ie n t a ç ã o - e a p ro b a b ilid a d e
de q u e os su b ú r b ios e as c i d a d es se ex p a n d a m até se c o n f u n d ir fo ra m p re v istos p e lo
ro m a n c ista í t a lo C a lv i n o em su a d esc r iç ão das c id a d es “co n t í n u as” :

V ocê avan ça p or horas e não sabe com certeza se já está no m eio da cid ad e ou ain da
fora dela. [...] fora de Pen tesileia existe um lado de fora? O u, p or m ais que você se
afaste da cidade, n ada faz além de p assar de um lim bo para o u tro sem ja m a is c o n
segu ir sair d a li?143

A d esc riç ão de C a lv i n o se ap licaria p erfeita m e n te à costa leste dos E sta d os U n id os e a


su a s “ Bos- W ash m ega ló p o les” [de Bosto n a W ash ingto n].
O s jo r n a lis t a s ta m b é m a d e r ira m à c r í t ic a p ó s- m o d e r n a d a c i d a d e . São d esse
p e r ío d o liv ros q ue a taca m o u rb a n ism o m o d er n o . M ort e e v id a n as gr a n des c idades
(19 6 1) ,144 de Ja n e Jacobs, lan ça u m ap elo à rev isão dos m o d e los de re n ov aç ão u rb a n a.
Segu n d o Jaco bs, o p la n eja m e n to inst it u c io n a li z a d o n ão d e m o nstro u ser ca p a z de p r e
ver os resu ltados de su as ações. D e seu po n to de vista, é evid e n te que o p la n eja m e n to
p ro d u z a d egra d a ç ã o do a m b ien te, o q ue p o d e ser talvez a trib u íd o à falta de ate n ção
d os arq u ite tos à c id a d e “ re a l” . C erc a de vin te a n os d e p o is, Ja m es H ow ard K u nstler,
au tor de T he G eography o f N owhere (1993), in vestiu co n tra o p a d rão n o r t e-a m e ric a n o
de uso do solo que n ão se m o d ifico u desde a Segu n d a G u erra M u n d ial: ex p a n são su
b u rb a n a d esord e n ad a e crescim e n to das áreas co m erc iais ao lo ngo das ro d ovias. Em
suas p alestras, ele insiste na ad oção do u rb a n ism o n eo tra d icio n a l co m o um an tídoto
aos m ales u rb a n os co n te m porâ n eos, m u itos dos qu ais ele atrib u i ao au to m óvel. K u ns
tler afir m a que a so lu ç ão para a alie n ação, o c r i m e e a d egra d aç ão a m b ien tal são as
p eq u e n as co m u n id a d es co n stru íd as nos m oldes da cid ad e z in h a n orte-a m e ric a n a de
M ain Street, em que se respeitam os pedestres.
A crítica da cidade m odern a, iniciada na década de 1960, se estende aos projetos u tó
picos, às “ reconstru ções” em gran des proporções, às teorias prescritivas e cod ificações da
form a u rban a e às defesas de objetivos urban ísticos m od ern os não concretiz ados. Entre
as in ú m eras p ropostas, esta an tologia apresenta três co n cepções u rban ísticas p ós-m o-
dern as, escolh idas por sua influência ou pertin ência nos Estados U nidos: o con textualis-
mo, represen tado por Rowe, Koetter e T h om as Sch u m acher; o “ pop u lism o” , ou a M ain
Street a m erican a, representada por Venturi, Scott Brown e Steven Izenour (do escritório

61
de arquitetura v s b a ); e um m odelo de “cidade co n tem porân ea” glo b al, rep rese n tad o pela
proposta de Koolhaas (cap. 6). A lém de discu tir essas três p ersp ec t ivas, esta In trod u ção
apresenta as linhas gerais do neorracion alism o europeu, dos có d igos n o r te-a m eric a n os
de desen ho urbano e da aplicação da sem iologia à cidade.
Pode-se dizer que tanto o contextualismo com o o pop u lism o se dese n volvera m nos
meios universitários, já que nasceram do trabalho coletivo de professores e alu n os interes
sados no estudo da cidade e na elaboração de propostas para novas estratégias de desenho
urbano. O ra analisando as pia z ze romanas, ora a S trip de Las Vegas, os estudan tes de arqui
tetura de Yale e Cornell contribuíram para a form ulação de teorias de gra n d e influência,
que foram posteriormente publicadas pelos professores. D e fato, Sch u m acher, u m dos alu
nos de Rowe, publicou um artigo sobre o método da “colagem” no desen h o u rb a n o antes
do seu professor.
A brilhante e provocadora in terpretação de M an hattan feita p or K oo lh aas em Deli-
rious New York (1978,1994) também contou com a ajuda de seus alu n os no 1a u s . M enos
uma crítica do que u ma exaltação da “cultura do co ngestion am en to” de N ova York, 0
livro adota um tratamento da cidade semelhante ao que o gru p o v s b a usou com relação
a Las Vegas. A obra de Koolhaas é “ um manifesto em prol de u m a nova era do ‘ manhat-
tanismo’, desta vez na form a de uma doutrin a explícita que transcen de a ilha origin al e
reivindica para si um lugar entre os urbanismos con tem porâneos” .145 A in tenção do livro,
como foi a de Aprendendo com Las Vegas, é a de refu tar as op in iões arrasadora m e n te
negativas sobre N ova York que predom in am entre os arquitetos. A a n álise de K oolhaas
sobre as características formais que definem a cidade ilustra bem sua abord agem :

A malha [grid] é, antes de tudo, uma especulação conceituai; [...] em sua indiferença
pela topografia, pelo que existe, ela declara a superioridade da construção mental sobre
a realidade. Por meio da demarcação de suas ruas e quarteirões, [a malha] proclama que
a subjugação, quando não a obliteração, da natureza é sua verdadeira a m b ição.140

O fascínio de uma cidade q u e“ afastou seu território para tão longe do n atural quan to é
humanamente possível” evidencia-se nos projetos e sequências n arrativas o n íric as que
Koolhaas apresenta em seu livro. Na década de 1980, ele esten deu seu o t i m ism o aos
estudos urbanos das uedge cities” de Atlanta, Seul e da periferia de Paris.

Contextualismo

O artigo seminal de Rowe e Koetter, intitulado “ C ollage C i t y” (1975), descreveu as in


fluentes estratégias analíticas e projetuais ainda hoje ensin adas em algu m as fac u ld ad es
de arquitetura. O artigo começa por Roma:

62
aqui p roposta co m o u m a espécie de m odelo que pode ser im agin ado co m o u m a alter
nativa ao desastroso urban ism o da engen haria social e do projeto total (...) as estru tu
ras física e política de Ro m a proporc io n a m o que talvez seja o m elh or exem plo gráfico
de ca m pos coliden tes e ruín as in tersticiais, (cap. 6)

A ên fase especial na relação en tre figu ra e fu n d o e nos m ap as de Ro m a de [G ia m bat tista]


N olli, b em co m o n a V ila A d ria n a, co n feriu -lh es u m a d i m e n são e m b le m á t ica no p e r ío
d o p ós-m o d e r n o . A s si m ila rid a d es da v ila co m a orga n i z aç ão for m a l da Ro m a do sé
cu lo x v i i levara m “ àq uela in extricável fusão de i m p osiç ão e aco m o d aç ão (...) que é ao
m esm o tem po u m a d ialética de tipos ideais so m a d a (...) a um co n texto e m p írico” . Essa
co n ju n ç ão de o p ostos, que se a m plia no livro de Row e e K oetter p ara in c lu ir ou tros p a
res, co m o o rd e m / d esord e m , sim p les/ co m p lexo, p riv a d o / p ú b lico , in ovaç ão / t ra d iç ão , é
sim ilar em form a e in tenção (que p o d e ría m os resu m ir na exp ressão “ aco m o d aç ão e c o
existê n cia” ) à argu m e n tação de V enturi em C om plexidade e contradição. Row e, K oetter e
V enturi foram todos in flu e n ciados pela co n cepção positiva da a m b ivalê n cia na teoria da
G estalt, que perm ite u m a m u ltiplicidade de leituras. (Row e tam bém en fatizou a a m b iva
lência no artigo acim a citado “ T ra nsparên cia: literal e fen o m ê n ica” .)
A Ro m a i m p erial é um exe m p lo do que Row e e K oet ter c h a m a m de “ m e n talid ad e
da b rico lage m ” , u m a p ro p e n são às m esclas assiste m áticas, n ão cie n tíficas, qu e resistem
a to do im p u lso to taliz a n te do p la n eja m e n to u rb a n o. E n tre o u t ros fe n ô m e n os, esses
autores crit ica m a ten tativa de a p licar a lógica p osit ivista a algo tão i m p rec iso q u an to
a arq u itet u ra e o d ese n h o u rban o. Eles citam as Notes on the S ynthesis o f Forni, de A le-
xa n d er, p o r seu ad m iráve l m as in atingível esforço de e li m i n ar va lores e p reco n ce itos
p essoais do p roc esso de projeto a fim de assegu rar u n iversalid ad e. A p osição a n titotali-
tária que p revalece no d isc u rso de Rowe e K oetter a p o ia-se nos escritos p ró -d e m o c r á
ticos de K arl Pop per; eles defen de m um posicio n a m e n to m ais ge n u i n a m e n te pop u lista
do que o do A prendendo com Las Vegas, dos arqu itetos do v sb a .
Ro w e e K o e t t e r d ist i n g u e m a b r ic o lage m (t e r m o q u e to m a m e m p rest a d o de
C la u d e L é v i-S t r a u ss) da co lage m , na q u al “ o b je tos e e p isó d ios são i n c o n v e n ie n t e
m en te i m p o r t a d os e, a p esa r de co n se rvare m os i n d íc ios de su as o rige ns e fon tes, a d
q u ire m u m efeito in teira m e n te n ovo d ev id o à m u d a n ça de co n texto” . O in teresse da
colage m co m o u m a téc n ica u rb a n íst ic a p ós- m o d e r n a p o d e ser avalia d o p o r sua d e fi
n iç ão co m o “ u m m o d o de c o n ferir in tegrid ad e a u m a m ist u ra co n fusa de referê n cias
p l u ra list as” , q u e “ p e r m it e tra tar a U top ia co m o im age m e em frag m e n t os” . A s téc
n icas grá fic as de leit u ra d ese n vo lv id as p or Row e e a escola de C or n ell forn ece m um
v o c a b u lá r io (b asea d o em relações sólid o / va z io) e u m a sin taxe q ue ain d a p er m a n ece
vá lid a p a ra d escrever e co m p ree n d er a cidade.
Row e e K oet ter n ão usara m a p alavra “co n text u a lism o” : foi Sc h u m ac h er quem
a em p rego u p ara referir-se ao trabalho deles em seu ensaio de 1971, in titu lado “ C o n -

63
textualism: U rban Ideais and D eform ations” . D esde en tão, co n t e x t u a lism o passou a
significar pouco mais que “ u m a adequação às co n d ições existe n tes” , de acord o com
Ric hard Ingersoll, que o qualifica com o u m a “ id eo logia teflo n ” . 147 Recen tem en te,
Schumacher escreveu um artigo no qual analisa as d istorções so fr i d as p elo conceito:

Depois da chamada revolução pós-moderna, o termo “ co n text u alism o” passou a ser


associado a certas manifestações estilísticas - como acontece com a m aioria das ideias
cooptadas pela arquitetura. Referia-se a prédios de tijolos verm elhos construídos em
bairros de tijolos vermelhos, enfeite barato sobre enfeite b ara to.148

As teorias da leitura e do significado

A partir de ensaios como o de Roland Barthes in titu lado “ Se m io logia e u rb a n ism o” , de


1967, a semiologia também teve um im pacto na percepção da cid a d e no p e río d o pós-
-moderno. Nesse texto, Bart hes sugere um processo de leitu ra da c i d a d e co m o texto,
que aplica um modelo linguístico do sign ificado d erivado d as relações estru t u rad as
entre objetos na cidade. Assim , escreve Barthes:

Uma cidade é um tecido [...] de elementos fortes e elementos neu tros [não acentua
dos] [...] (sabe-se que a oposição entre 0 signo e a ausência de signo, entre o grau
pleno e 0 grau zero, é um dos principais processos na elaboração do se n tid o).1

Os arquitetos pós-modemos abraçaram a linguística como uma maneira de codificar em um


sistema 0 significado arquitetônico. Mas, evidenciando um movim ento em direção ao pen
samento pós-estruturalista, Barthes assinala nesse ensaio a “erosão da noção de léxico” , que
prometia estabelecer uma correspondência biunívoca entre significantes e significados, na
qual se assentava a ideia de simbolismo. Apesar dessa erosão, diz Barthes, a cidade continuará
a significar. A seguinte analogia sintetiza sua concepção da condição urbana:

Toda cidade é construída, feita por nós, um pouco à imagem do navio A rgo, cujos
pedaços foram sendo substituídos com 0 passar do tempo, mas que perm aneceu para
sempre 0 Argo, isto é, um conjunto de significados bem legíveis e iden tificáveis.1'0

Agrest e Gandelsonas investigaram a aplicação dessas ideias estru t u ra listas e pós-es-


truturalistas ao desenho urbano. O modelo in terdisciplin ar de crítica for m u la d o por
Barthes também é evidente em seus escritos, especialmen te nu m a série de e nsaios de
Agrest sobre urbanismo. É interessante notar que Agrest e Tschum i p rop õe m o estu do
da representação no cinema e 0 uso das técnicas cin em atográficas co m o for m as de
abordar a experiência da arquitetura na cidade. C onform e Agrest:

64
N o com eço deste século, o referen te [artístico] da arqu itetura era a pin tura. Esse refe
rente não é m u ito p rod u tivo qu an do abord a m os a arqu itetura a partir do u rban o. U m
referen te m ais fecu n do é o cinem a, um sistem a co m p lexo que se desen rola no tem po
e no esp aço.151

T sc h u m i p referiu e n fa t i z a r u m o u tro asp ec to d a d isc u ssã o de B ar t h es so b re a c id a d e:


a p o u c o le m b ra d a “ d i m e n sã o eró t ic a” q u e B ar t h es id e n t ific a c o m o o m o t ivo d a a t r a
ção d a p e rife ria p elo ce n tro d a cid a d e. O e n sa io de T sc h u m i “ O p ra z e r d a a rq u ite t u ra”
(cap. 13) é c lara m e n te i n flu e n c ia d o p o r “ Se m io logia e u r b a n is m o ” e “ O p ra z e r d o t ex
to” de B art h es.

A imagem da ci da d e

É in teressan te co m p a ra r essas id eias de ler a cid a d e co m o u m texto co m as do u r b a n is


ta K evin Lyn ch . E m seu livro A im agem da cid a de (19 6 0 ), ele a n alisa co m o as p esso as
se orie n ta m no a m bien te. U m d os p r i m e iros c r ít icos da c id a d e do p ós-g u e r r a , Lyn ch
insiste na n ecessidad e de u m a ord em visu al no e n tor n o h u m a n o cap a z de ser gu ard a d a
na m e m ória. A im agibilidade ou legib ilid ad e da for m a se tor n ara m im p or ta n tes a t r ib u
tos a lm eja d os p o r arq u itetos e p roje tistas u rb a n os p re o c u p a d os co m a q u estão da c o
m u n icação do sign ificad o. D e acord o co m Lyn ch , o sen tido se locali z a na p ossib ilid a d e
de d ist i n gu ir ca m i n h os, lim ites, n ó d u los,152 b airros e po n tos de referên cia na p aisage m .
N a o p i n ião de B art h es, Lyn c h foi q u em “ m ais se a p ro xi m o u d os p ro b le m as de u m a
se m â n tica u rb a n a” , m as o bse rv a que sua “co n c e p ç ão da c id a d e p e r m a n ece m ais ‘ges-
táltica do que estr u t u ra l” . A s ideias de Lynch são usad as p o r N o rb e rg-Sc h u lz e o u tros
fe n o m e n ólogos para defen d er a relevân cia do lugar.

0 urbanismo europeu: n eorracion alismo e tipologia

Rossi ta m bém reco n h ece em Lynch a i n sp iração para sua tese de que a orie n tação es
pacial na cid ad e prové m da exp eriê n c ia de ep isó d ios sign ific a t ivos, co m o os recin tos
m o n u m e n tais. A ideia estru t u ralista de que a cid ad e se torna legível pela rep etição de
co m po n en tes elem en tares (irred u tíveis, arq u etíp icos), aos quais a m e m ória coletiva dá
sen tido, defin e a leitura poética da cidade para Rossi. Ele tam bém estu da a fu n ção do
tipo na cid ad e eu ropeia co m o repositório da m e m ória coletiva e co m p ara a op eração
desses ele m en tos u rb a n os p erm a n en tes à fu n ção das estru t u ras li ngu ísticas fixas de
F erd in a n d de Saussure. E m A arquitetura da cidade (1982), Rossi explica sua in tenção
de escrever u m m a n ifesto sobre a tipologia e o desen ho u rb an o co m o u m a reação co n
tra a cidade m od ern ista. Ele trata a cidade co m o um artefato, um objeto que nasce do
trabalho h u m an o, e co m o u m a represen tação dos valores culturais.

65
A le m b ra n ça, em Rossi, d o q u e a c id a d e si m b o li z a foi e x t r e m a m e n t e i m p o r t a n t e
p ara p ô r de n ovo em foco a id eia de faz er a rq u ite t u ra em u m co n t e x t o u r b a n o : “ O c o n
traste en tre o p ar t ic u lar e o u n iversal, o i n d iv id u a l e o c o le t ivo , e m e rge d a c i d a d e e de
sua co nstru ção, sua arqu itetura” .153
Rossi ta m b é m re in tro d u z iu a n o ç ã o d e t i p o log ia c o m o u m a fe r r a m e n t a a n a lí t ic a
e co m o base racio n a l p ara u m p ro c esso p ro je t u a l d e t r a n sfo r m a ç ã o . A o s u b l i n h a r q ue
“o t ip o é a id eia m esm a d a a rq u ite t u ra, o q u e m a is se a p r o x i m a d e su a ess ê n c i a ” , 134
Rossi revela sua cre n ça na id eia su bjace n te d e leis fixas, d e t i p os a p r i o r i , q u e h av ia m
sid o d esq u a lific a d os n o p e r ío d o m o d e r n o . E le c o n t r as t a c e r t o s a s p e c t o s u r b a n o s
per m a n e n tes, co m o os esp aços h ab it ac io n a is e os m o n u m e n t os, c o m e le m e n t os “c a
talisadores” p ri m ários, q ue “ re tard a m ou acelera m o p ro c esso d e u r b a n i z a ç ã o ” . 13" Por
suas a tividad es co m o ensaísta, p ro fesso r e a u tor d e i m p o r t a n t es o b r as a r q u i t e t ô n ic as,
co m o o T eatro dei M o n d o , o Segrate T ow n C e n t e r e o C e m i t é r io d e M o d e n a , Rossi
é co nsid erado o líd er do m ov i m e n to n eo rr ac io n a list a i t a li a n o , L a T e n de n z a . N a sua
in tro d u ção a A arquitetura da c id a d e , E ise n m a n re fu ta u m a r e c e p ç ã o d as id e ias de
Rossi co m o con textu ais:

À luz do recente desenvolvim en to de um ch am ado u rb a n ism o co n text u a i, que veio


a dom inar a teoria urbana cerca de quin ze anos depois da prim eira p u b licação deste
livro, o texto de Rossi pode ser visto com o uma argu m en tação a n tecip atória e p reve n
tiva contra o “ form alismo va z io” do con texto redu zido a u m a sim p les relação entre
figura e fu n do.156

O arquiteto Leon K rier tem u m a visão diferente da gam a de tipos d isp o n íve is, em bora
concorde em princípio com Rossi sobre a im portân cia deles na co nst it u ição do espaço
urbano. K rier vai buscar seus tipos no neoclassicism o ilu m in ista e na cid a d e p ré-i n d u s
trial do século x v i i i . Usando uma taxonom ia de tipos de constru ção u rban a (que incluem
espaços, edifícios e métodos construtivos) e um repertório d eliberad a m e n te lim itado e
racionalizado de materiais de construção, K rier pretende re in tro d u z ir o rigo r na arq u i
tetura e no urbanismo. A recriação do dom ín io público requer lugares e m o n u m e n tos
significativos, que precisam apoiar-se num tenso entorno de constru ções em “ tabric” . 1"
Enquanto Rossi se preocupa antes de tudo em fazer uma in terven ção no con texto da
cidade, Krier dedicou-se a uma ampla reconstrução da cidade europeia co m o um projeto
crítico. De fato, ele defendeu firmemente que o projeto não co nstru íd o é o m o d o m ais
responsável de engajar o pensamento arquitetônico nas atuais co n d ições so c io eco n ô m i-
cas: “ Nesse exato momento, a reflexão arquitetônica só pode ser em p ree n d id a p o r m eio
de um exercício prático, seja na forma de uma crítica, seja na de um projeto crít ico” . I5H
Para Krier, a possibilidade de um trabalho visio nário utópico con tin ua aberta, e é, aliás,
imposta pela degradação do urbanismo contemporâneo. K rier se ocu p a prin cip alm e n te

66
da reconstitu ição de espaços p ú b licos exteriores abertos e bem d elim itados - a rua, a praça
etc. - co m o “ p arte de u m a v isão in tegral da socie d a d e [...] p arte de u m a luta política” .159
O lugar pú b lico sim boliz a as responsabilidades éticas do cidadão.
K r ie r t a m b é m d isc u t e o m ito m o d e r n is t a d e q u e a i n d u s t r ia l i z a ç ã o d o p ro c esso
co n st r u t ivo v ir i a a l ib e r t a r o trab a l h a d or. Por iro n ia, d i z ele,

A in d ustrializ ação não criou nem técn icas de co nstru ção m ais ráp ida nem u m a tec
n ologia constru tiva m elhor. Longe de m elh orar as co n d ições físicas do trabalho, ela
redu ziu o trabalho m anual a u m a experiên cia e m bru tecedora e escravizan te, que d e
gradou um ofício m ilen ar e digno a um exercício socialm en te alie n an te.160

Foi isso q u e deu b ase à d ec isão de K r ie r de n ão co n str u ir, d ec isão d a q u al volto u atrás
q u a n d o teve a o p o r t u n i d a d e de c o n s t r u ir su a p ró p r i a casa em Se asid e , n a F ló r i d a .
N esse p roje to, ele se d ec id i u p e lo e m p rego de m a t eria is i n d u s t r ia l i z a d os co m u m a
exagera d a se n sib ilid a d e tec tó n ica, q u e p re te n d ia r e c u p e r a r a m i t ific aç ão da c o n s t r u
ção exp ressa n os d e talh es clássicos.

A prend endo com a li nguíst ica

E n q u a n to C o m ple x idade e con tradição em arquitetura rem ete a p reced e n tes e u ro p e us,
A p re n de n do com Las Vegas aceita co m o u m d a d o o d ese n vo lv i m e n to d a “ h igh w a y
st rip” n or te-a m e ric a n a e d efen d e um po n to de vista m ais ab erta m e n te p o p u lista. E m
A p re n de n do com Las Vegas, V en tu ri, Scott B ro w n e I z e n o u r (do esc r i t ó r io vsba ) fo
ram ta m bém in flu e n ciados pela teoria da co m u n ic ação, esp ecialm e n te pela se m ió t ica.
A d isc ussão dos autores sobre as co nstr u çõ es dos tipos “ pato” e “ga lp ão d e co ra d o” 1*1
co nsiste, em essên cia, em um argu m e n to acerca da re i n co rp o raç ão da fu n ç ão si m b ó
lica na fu n ção literal co m o um m om e n to n ecessário da arq u itetu ra. A q u estão passa a
ser en tão a de co m o realiz ar a sim b o li z ação: p o r sua exp ressão na form a tr id i m e n sio
nal do “ sign o co m o ed ifíc io” (o “ pato” fu n c io n alista m o d er n o) ou p or u m a placa b i
d i m e nsio n al pregada na tachada do préd io (o “galp ão” p ós-m o d er n o)? É preciso que
se note ta m bém que os asp ectos sim b ó licos da arq u itet u ra m o d er n a n ão eram reco
n h ecidos naquela ép oca, posto que a teoria fu n cio n alista susten ta que a arqu itetura se
lim ita a o p erar p or m eio da a n álise cien tífica do p rogra m a para d e ter m i n ar e a c o m o
d ar as n ecessidad es do clie n te.162 A fir m ar que m uitas das ob ras-p r i m as da arqu itetura
m o d er n a são “ patos” é u m a grave acusação desses teóricos p ós-m o d er n os.
D ada a im portân cia do automóvel no estudo do vsba sobre Las Vegas, muitas d eci
sões foram tom adas do ponto de vista dos veículos que trafegam pela rodovia. A ssim , os
autores defin em que letreiros de enorm es dim ensões funcionam muito bem para co m u
nicar m ensagens de con teúdo tanto com ercial com o cívico (“ Eu sou um m onu m en to” ),

67
em estradas com limite de velocidade de 8o km / h. Eles tam bém p riv ilegia m um dos
elementos da tríade vitruviana, a comodidade, que inclui a ideia de conven iên cia, e que,
além disso, reforça a escolha do letreiro sobre o galpão decorado. Venturi e colaboradores
insistem em dizer que o letreiro pregado nas paredes da “caixa bru ta” (a dumb box) é a
forma mais econômica, e, portanto, mais honesta e adequada de com unicar.
Esse argumento - baseado na aceitação das con d ições existen tes da eco n o m ia de
mercado e dos métodos usuais de construção e do u rb a n ism o (m el h or dito, da falta
deles) - não é neutro, mas reafirma o status quo em d ese n vo lvi m e n to nos Estados
U nidos do final do século x x ; portanto, é um ponto de vista co nservad or. A lé m disso,
a visão da teoria arquitetônica, ou a “ filosofia” do projeto do gr u p o v s b a su rge por
demais utilitarista e prescritiva: isto é, só é útil aquilo que “ aju d a a re lacio n ar form as
com os requisitos” .163 Um exemplo da função apologética do livro é a d isc ussão sobre
o “ pato” versus o “galpão decorado” , que resu m e o pon to de v ist a co n fo r m ist a dos
autores. Eles avaliam a reação dos n orte-am erican os ao am b ien te c o n st r u íd o e con
cluem que não há demanda para um padrão de qualidade su p erior ao kitsch. Supõem ,
portanto, que as pessoas estão satisfeitas com as con d ições existen tes e que a sua abor
dagem da cidade deve refletir esse sentimento. E m co m p aração co m o arq u iteto “ he
rói” , arrogante, do movimen to m oderno, o aporte do v s b a é bastan te m od esto. Mas,
apesar de tentarem claramente corrigir a visão do m u n do e de seus o b je tos fra n c a
mente negativa do movimen to m oderno, a sua abordagem acrít ica ta m b é m errou o
alvo. Estabelecer uma com paração entre dois extre m os igu alm e n te a bsu rd os é uma
estratégia retórica que o grupo tem usado com sucesso em d iversas o casiõ es. Q uanto
à Stripy é possível que o seu verdadeiro objetivo fosse o de e n co n trar u m m e io-ter m o
entre a rejeição total e a aceitação total.

As "edge cities":164 o padrão cont emporâneo de desenvolviment o

Os ensaios teóricos recentes de K oolhaas ta m bém aceitam ge n erosa m e n te as co n d i


ções atuais de expansão desordenada e prod ução ilim itada de n ão lugares. Ele busca
descobrir as virtu des em meio a esta sit uação nas fra n jas p e r ifé r ic as da c i d a d e, que
outros ignoraram em beneficio do centro urbano m ais bem defin ido. N o a r t igo “ Ru mo
à cidade contemporânea” , Koolhaas faz questão de d ist i ngu ir sua p esq u isa de ou tras
tendências usuais, pós-modernas, enquanto uma “alternativa p a ra m o d e r n a” . K oolhaas
também defendeu a adoção de uma estratégia diferen te no p la n e ja m e n to d o projeto
habitacional da i b a (International Building Exh ibition) em B erlim . O u tros arqu itetos
viram na i b a uma oportu n idade de reconstrução m assiva da c id a d e, seg u n d o as li
nhas neotradicionais propostas por Krier. K oolhaas, no en tan to, suger iu d e ix a r que a
cidade devastada pela guerra continuasse a m ostrar sua h istória e p ro p ôs “ fa z er dela
uma espécie de arquipélago territorial - um sistema de ilhas arq u it e tô n ic as cercad as

68
p o r flo restas e lagos, e m q u e as i n fr a est r u t u r as p u d esse m f u n c io n a r se m c a u sa r d a
n os” (cap. 6). Tal co m o os teó ricos h istor ic istas p ós- m o d e r n os, K o o l h a as é favorável à
n o ç ã o d o séc u lo x i x d e “ re m o d e la r sem d est r u ir a c i d a d e p reexiste n te” . A s d ife re n ç as
a p a re c e r ia m na esco lh a d o q u e e de co m o ed ificar. A su a estra tégia b ásic a c o n sist ir ia
em i n te nsific ar e t o r n a r claras as co n d içõ es existe n tes m e d ia n te u m co n traste e n tre o
esp aço a b e r to e a e d ific aç ão d e nsa.
K o o l h a as p ro v a v e l m e n t e a p ro v a r ia o tra ta m e n to d a d o p o r Steve n H oll às edge
cities n o r t e-a m e r ic a n as.165 H oll p roje to u p a ra a c id a d e de P h o e n ix u m co m p lexo aéreo
p ro u n -i nsp ir ed , q u e ele c h a m a de “ b a r r as esp a c ia is re te n toras” , e i m agi n o u p a ra a c i
d a d e de C le v e la n d t r iâ n g u los in te nsa m e n te e d ific a d os e n t r e m e a d os p o r t r iâ n g u los
a r b o r i z a d os. Esses p ro je tos, q u e resiste m ao esp r a ia m e n t o u rb a n o p e la d e l ib e ra d a
co n st r u ç ã o de fro n te iras, são coere n tes co m o in teresse fe n o m e n o lógic o d e H oll na
esp e c ific id a d e d o lugar, a lgo p resen te em seu liv ro A n c h o r in g [ A n c o r ag e m ] (19 89 ).
A i m p o r t â n c ia d as fro n teiras assi n a la d a p o r H e id egger to r n o u -se f u n d a m e n t a l p ara
re p e n sa r o esp a ço m o d e r n o (ver H a rr ies, cap. 8). O v a lo r a t r ib u í d o ao esp a ç o c a r
tesia n o a n ó n i m o e i n i n te rr u p to , u m a ex p ressã o de lib erd a d e, d eve ser c o n sid e r a d o
no co n fro n to co m a n ecessid a d e h u m a n a do fa m i lia r e da seg u r a n ç a p ro p o rc io n a d a
pelos lim ites. O s proje tos de gra n d e escala de H oll, assim co m o os de i n teriores m ais
ín tim os (a d isp osiç ão flexível dos a p ar ta m e n tos do co n ju n to resid e n c ial de F u k u o k a:
“o esp aço d o b ra d o ” ), reafir m a m essa d ialé t ica. Projetos co m o o d os “setores esp ira la-
d os” para a c id ad e de D allas con têm u m a crítica q ue se d esd o b ra em vá r ios n íveis: ao
pla n o d iretor, à d e p e n d ê n c ia atual do au to m óvel e aos p ro b le m as a m b ie n ta is q u e d a í
d ecorre m , à h ege m o n ia do so n h o b u rgu ês com a v id a n os su b ú rb ios de classe m éd ia,
e aos m é to d os e m ateriais de co nstru ção existen tes.

0 novo urbanismo a mericano: os códi gos do desenho

U m a d as m a n ifest aç õ es teó ricas recen tes e r ro n ea m e n t e asso c ia d as ao co n t e x t u a lis-


m o é a d os “ n eo t ra d ic io n a list as” , qu e se re ú n e m regu lar m e n te no C o n gr esso p ara o
N ovo U r b a n is m o .lf>6 Esses teóricos u rb a n os p ós- m o d e r n os p reco n i z a m que os a r q u i
tetos d eve m resist ir ao d o m í n io da edge city co n t e m p o râ n ea. A re d ação de c ó d igos
p resc rit ivos p ara n ovas cid a d es, q ue carac teri z a o trab a l h o do gr u p o A n d rés D u a n y
e E li z abet h Pla te r-Z y b er k A rq u itetos A sso c ia d os ( d p z ), reco n h ec id as lid era n ç as d es
se m o v i m e n to , asp ira a u m a c o e rê n c ia estilíst ic a (freq u e n te m e n te asso c ia d a a um
id eal v i t o r ia n o ) e u m a h ar m o n ia de rec u os, ga b ari tos e a li n h a m e n tos, e en tre tipos
de e d ificação. A co m u n id a d e p arcia lm e n te co n st r u íd a de Seasid e p rovoco u ao m es
m o te m po a d m ir a ç ã o e p esa d as c r ít icas, e acab o u o b r iga n d o os arq u itetos r esp o n
sáveis p elo p roje to a a d o ta r u m a a titu de defe nsiva com relação às su as im p lic ações
ec o lóg ic as, so c ia is e es t i l ís t ic as.167 E m b o ra o d p z a fir m e qu e seu trab a l h o não diz

69
respeito ao estilo, a m aior parte dos seus a d m ira d o res p ro v é m d os a r q u i t e t os histo-
ricistas pós-m od ern os. E eviden tem en te dos i n c o r p o ra d o res d e m u i tos E st a d os, que
não cessam de en com en d ar projetos de n ovas cid a d es e m á reas s u b u r b a n as ao d pz

e a seus colegas do cn u. Esses em pree n d im e n tos i m o b i l iá r ios tê m o p o d e r d e des


pertar o paradoxal e nostálgico desejo dos n o r t e-a m e r ic a n os p o r u m si m u la c ro de
tradição (e seus valores correlatos), ain da que estejam m o r a n d o e m u m a casa novi-
nha em folha construída com as m ais recentes i m i tações de m a t e r ia is d e co n st r u ç ão
produzidas pela in d ústria petroquím ica.

QUINTO t e m a : a g e n d a s é t i c a s e p o l í t i c a s

A crítica urbana pós-m oderna espelhou-se na disc ussão de gra n d es q u estõ es políticas
e éticas entre os teóricos da arquitetura. N o cen tro do debate está o p ro b le m a de que
tipo de papel a arquitetura, como disciplin a, deve d ese m p e n h ar na so c ie d a d e . D e saí
da, me vêm à mente quatro possibilidades: (1) a arq u itet u ra p o d e ser in d ifere n te às
preocupações sociais e a seus m odos de expressão e rep rese n tação; (2) a arq u itetura
pode colocar-se a favor do status quo e aceitar as co n d ições existe n tes; (3) a arq u itetu
ra pode guiar pacificamente a sociedade para um n ovo r u m o; (4) a a rq u ite t u ra pode
fazer uma crítica radical e reconstru ir a sociedade. A escolh a de u m a d essas p ossi
bilidades depende da resposta que se dê à seguinte pergu n ta b ásic a: a arq u itet u ra é
primordialmente uma arte ou um serviço profission al? A s d iversas o p i n iõ es repre
sentadas nesta seção por uma série de artigos escritos desde 1975 se insere m no debate
ético e político que vem se intensificando na teoria da arqu itetura.
A questão do papel social da arquitetura é geralm en te tra tad a do p o n to de vista
da possibilidade e da qualidade moral de uma posição au tô n o m a. T em a o n ipresen te
na literatura desse período, a autonomia pode ser in terpretada de vá rias m a n eiras, ora
como neutra, ora como crítica, ora como reacionária, e é geralm en te asso c ia d a a um
discurso interno e autorreferencial de criação da form a. N esse ú ltim o sen tid o, au tono
mia é quase sinônimo de form alismo, en tendendo-se por for m a lism o a p re p o n d erâ n
cia de uma preocupação com as questões form ais e a exclusão dos tem as socioc u lt u rais
e históricos, inclusive os que dizem respeito a materiais e m étodos de co nstru ção. Essa
atitude autônoma pode ser a do criador da obra ou a de um o b se rv a d o r ou in térpre
te. O objeto arquitetônico que dela resulta geralm en te é abstrato e de n aturez a não
representacional. Para identificar uma posição de au ton om ia, a teoria arq u itetô n ica
pós-moderna esforça-se por definir quais são os elem en tos in ter n os ou exclusivos
do discurso: a forma, a função, a materialidade ou o tipo serão esse n ciais? Será que
uma arquitetura que versa sobre arquitetura é algo com u n icável a u m a co m u n id ad e
mais ampla? Poderá ela ser crítica desta maneira? Segu n do T sc h u m i, a arq u itetu ra
nunca pode ser totalmente autorreferencial. Em “A rch itecture an d T ra nsgressio n ” ele

70
a fir m a q u e ,“ a a rq u ite t u ra [...] se fortalec e exa ta m e n te p o r su a p osiç ã o a m b ígu a en tre a
a u to n o m ia c u lt u ra l e o co m p ro m isso , en tre a co n te m p laç ão e o h áb ito” . 168 E n q u a n to o
ob je to d e arte é co n te m p lad o em si n o a m b ie n te ar t ific ia l d a ga leria, a a rq u ite t u ra c o m
p õe u m p a n o de fu n d o p a ra a v id a. T sc h u m i certa m e n te está se re fe ri n d o ao c o m e n t á
rio de W alter B e n ja m i n sob re a recep ção d a arq u itet u ra em “esta d o de d esa te n ção” , q u e
é o m o d o co m o n o r m a l m e n te a ve m os n a c id a d e m o d er n a.
M as T sc h u m i t a m b é m p o d e est a r p e n sa n d o e m o u t ro m e m b r o d a E sc o la d e
F r a n k f u r t , A d o r n o , e su a tese so b r e a a r t e e n g a ja d a , a ar te p rogressist a e fra n c a m e n t e
p o lí t ic a . N e o m a rx is t a , A d o r n o a fir m a, e m seu e n sa io “ E n ga ja m e n t o ” (19 62), q u e só a
a u to n o m ia p e r m i t e resist ir p o li t ic a m e n t e e m arte. So m e n t e r e t ir a n d o -se d a lu ta, c o
lo c a n d o -se fora d as c o n d iç õ es n o r m a is d a re p rese n taç ão , o a r t ista p o d e r á est a b e lec er
u m c a m p o d e resistê n c ia. O tra b a l h o a u tô n o m o d a arte o r ie n t a-se p o r su a est r u t u ra
in ere n te, n ão pela m a n e ir a c o m o é receb id o. So m e n te assi m a f u n ç ã o c r í t ic a p o d e r á
resist ir p o r m a is tem po. A d o r n o rejeita a arte e n gaja d a, p o rq u e ela é m a is fac il m e n t e
a bso rv ív e l ou “c o o p t á v e l” p e los c o n se rv a d o res. A arte p o li t ic a m e n t e e n gaja d a a fir m a-
se n o t erre n o d o fa m i lia r e, p o r t a n to , n u m a fo r m a de “ a lia n ç a ” co m o m u n d o . E la
p o d e ser usad a p o r to d a sorte de p a r t id os, em a m b os os p o los d o esp e c t ro p o lí t ico , o
q u e t a m b é m e n fra q u ec e o seu po te n c ia l cr ít ico. Seg u n d o A d o r n o : “ N a arte, a n o ç ão
d e ‘ m e n sage m ’ , m esm o q u a n d o p o lit ic a m e n t e ra d ic a l, já co n té m em si u m a a c o m o
d a ç ã o co m o m u n d o [...] ” 1M N esse se n tid o, acre d ita q u e u m a a tit u d e de silê n c io , q u e
n ão seja a da “ b usca da arte pela arte” do este ticista, revelará ser o m e io de resistê n cia
m ais p roveitoso.
A arq u itet u ra, p or naturez a, está socialm e n te e n raiz ad a e sua ex p e riê n c ia vem do
hábito, e n ão de u m a escolh a d eliberad a. É p or isso que as id eias de A d o r n o n ão são
facilm en te a p licáveis à arq u itet u ra, u m a vez que ela ev id e n cia essa a lia n ça p ro b le m á
tica com o m u n do. Será que se p o d e d e ixar de lado as co n ve n ções da rep rese n tação
na d isc ip li n a p ara cr iar u m a arq u itetu ra de resistên cia? A o p i n ião de T adao A n d o é
que a abstração e a a usteridade de m eios haverão de d esp ertar o esp ec tad or para u m a
exp eriê n c ia m ais conscien te da arqu itetura e para sua esp irit u alid ad e. Essa é a base da
p osição a u tô n o m a e crítica de sua arquitetura.
O u tros t eó ricos, in c lusive os ed itores de V I A 1 0 , Ethics a n d A rchi tec t u re , p o s i
c io n a m -se co n tra a a u to n o m ia ao a fir m are m : “ U m a vez q ue a arq u ite t u ra asp ira a
ser co m p ree n d id a e usad a pela soc ie d a d e, não p o d e ser a u tô n o m a e ao m esm o te m
po m a n ter sua re levâ n c ia. A arq u itet u ra, n esse sen tido, ja m a is p o d erá ser isen ta de
va lo res” .1/0 E m o u tras p a lavras, a arq u itet u ra tem de c o m u n ic a r e o arq u iteto deve
ter co n h ec i m e n to dos va lores co n tid os no co n teú do da co m u n icação. Para esse fim,
os ed itores da revista post u la m um retor n o ao estu do da ética, que “d iscu te o que é
a p ro p r ia d o e, m ais im p or ta n te ain d a, co m o d e ter m i n a m os o que é a p ro p r ia d o” . 171
Tal a sua d efi n ição de ética:

71
A ética é o estudo dos problemas e juízos morais que constituem as bases da conduta
em sociedade. Um conjunto consistente de juízos morais nos permite determ inar um
objetivo e, dessa forma, agir intencionalmente. [...] O conhecimento ético, a compreen-
são desses valores, é obtido pela prática e pela ação no campo da cultura.172

O artigo do arquiteto Philip Bess põe a mesma ênfase no conhecim ento da ética ao
afirmar que há uma “relação genuína e intrínseca entre a arquitetura e a ética”, no sen-
tido de que os edifícios e as cidades encarnam uma ética, seja ela com unitária ou indi-
vidualista (cap. 8). Bess fala principalmente sobre a necessidade de valores com parti-
lhados para o bom funcionamento da comunidade, e afirma que o desenvolvim ento da
personalidade narcisista triunfou sobre a socialização (pelo m enos nas sociedades de-
mocráticas), o que resultou na formação de uma cultura do individualism o nietzschia-
no radical. Ele responsabiliza a falta de sentimento com unitário no m undo contem po-
râneo pela influência poderosa do individualismo. Se é verdade que o individualismo
faz parte do Zeitgeist moderno, também se pode alegar que seus fundam entos gerais
se encontram no positivismo científico, no capitalismo e na “m entalidade de frontei-
ra” da sociedade norte-americana. Observando que a cidade tradicional simbolizava a
autoridade legítima e as virtudes cívicas, Bess afirma que as com unidades atuais pre-
cisam ressuscitar a noção do “bem comum” e representá-la na arquitetura. (A crença
no bem comum é essencial para o êxito do movimento ambientalista, que conclama a
mudanças voluntárias de comportamento, provavelmente difíceis ou incôm odas, a fim
de promover o aperfeiçoamento global.)
Uma questão política urgente para as perspectivas éticas que acabo de m encionar
é a viabilidade de um consenso societário que possa ser representado pela arquitetura.
Dada a diversidade social, para muitos teóricos o consenso parece ser um objetivo
ilusório e ingênuo; para outros, totalitário e ameaçador.

A ética profissional

O Código de Ética e Conduta Profissional da a i a (1993) é im p or ta n te p ara a questão


do consenso. Ele estipula para seus mem bros um con ju n to frac io n a d o de reco m e n
dações de conduta, que todos se com prometeram a acatar. O alca n ce do doc u m e n to
sugere objetivos tão amplos quanto: o cuidado com o im pacto social e a m b ien tal das
atividades da arquitetura (por exemplo, evitar d isc ri m i n ações); o resp eito e a co n
servação da herança cultural e ambiental; o em penho na m elh oria do m eio am bien te
e da qualidade de vida; a defesa dos direitos hum anos, e a p a r t ic ip aç ão n os assu n tos
cívicos. O fato de a adesão a todos esses objetivos ser desvin c u lad a m ost ra q ue eles
são os mais difíceis de definir, de impor, e sobre os quais desenvolver u m co nse nso na
comunidade arquitetônica.

72
O u t ro r a m o d a é t ica na t eoria a rq u i t e tô n ic a p ó s- m o d e r n a p ro p u g n a e n gaja m e n to
n o c a m p o d a p o l í t ic a , so b fo r m as d iv e rsas. E n t re elas, o e m p e n h o n a r essu r r e iç ã o d e
u m p a p e l d e b e m -es t a r so c ia l p a ra a a rq u i t e t u ra , c o m o o q u e a d isc i p l i n a c u m p r ia na
fase ta rd ia d o m o d e r n is m o . E m b le m á t ic os d esse id e a lism o d o p assa d o são os S e id lu n -
g e n , c o n ju n tos h a b i t a c io n a is p ro je t a d os p e los m a io res a rq u it e tos d a d é c a d a d e 1920 e
c o n st r u í d os n a A le m a n h a e n a H o la n d a. D e a c o r d o co m G h ir a r d o , re v iv e r essa m o d a
lid a d e d e e n gaja m e n to p o lí t ic o e ético é u m a fo r m a d e resga tar a a rq u ite t u ra.
O s e n sa io s m a is rec e n t es d e G h i r a r d o , c o m o “A a r q u i t e t u r a d a f r a u d e ” , l e v a n
ta m d ú v i d a s so b r e se o p a p e l p r i m o r d i a l d a a r q u i t e t u r a é a a r t e o u o se r v i ç o . G h i
r a r d o se c o lo c a n it id a m e n t e a fa v o r d este ú l t i m o e a d o t a u m p o s ic i o n a m e n t o c r í t ic o
q u e c o n c la m a à r esp o n sa b i li d a d e p o l í t ic a e so c ia l. E la i n sist e e m d i z e r q u e os a r q u i
tetos d e v e r ia m p e sq u isa r as es t r u t u r as d e p o d e r d a so c i e d a d e , q u e p ro t ege m a su a
c lie n tela aflu e n t e, e m ve z d e se re c o l h e re m a u m a p o s t u r a q u e p r iv i le g i a a “ p u r e z a ”
d a ar te d a a rq u it e t u ra.
O b se r v a n d o q u e o m u n d o c o n s t r u í d o n ão é i n d e p e n d e n t e d a e c o n o m ia d e m e r
c a d o , G h i r a r d o c u i d a d e “ d isc e r n i r a re la ç ã o e n t re i n t e n ç õ es p o l í t ic a s, r e a l i d a d es
so c ia is e a c o n s t r u ç ã o ” (ca p . 8). E m o u t r as p a la v r a s, ela su ge r e q u e os a r q u i t e t os
q u est io n e m as p o lí t ic as d a c o n s t r u ç ã o : q u e m c o n s t ró i o q u ê, p a r a q u e m e p o r q u e
p reço. N ã o q u es t io n a r a a u t o r i d a d e , p r o sseg u e G h i r a r d o , é se r c ú m p lic e d o st a t us
quo. E em face d a c a rê n c ia h a b i t a c io n a l, d o r a c is m o e d o se x is m o , d i z ela, essa c u m
p lic i d a d e n ão é ética.
E sse t ip o de a n á lise d as m a n ifest a ç õ es físic as d as es t r u t u r as d e p o d e r se m p re
a t ra i u o i n teresse d os p la n e ja d o r es u r b a n os e d os c r í t ic os m a r x is t as. N o p e r ío d o
p ó s- m o d e r n o , ele ta m b é m a p arece n os esc ritos e p ro je tos de arq u ite tos so c ia l m e n t e
r esp o n sá v e is. O m o d e lo de e n gaja m e n to é t ico e p o l í t ic o de G h ir a r d o o ferec e u m a
a lt e r n a t iv a c o n v i n c e n t e às a b o r d age n s “ h ist ó r ic as d a ar te t r a d ic io n a l” , q u e sa l i e n
ta m as q u estõ es to r m a is e exc lu e m to d as as d e m a is, a m e a ç a n d o d ege n e r a r n u m a
p o lê m ic a so b re estilos.
G h ir a r d o ta m b é m leva n ta susp e it as so b re o d ese n vo lv i m e n t o i n c o n sc ie n t e da
id eo logia p o r p a r t e de o u tros cr í t icos e so b re as ten tativas re ac io n á r ias de d e n eg r ir
o u to p ism o da va n gu ar d a arq u ite tô n ica do séc u lo x x . E m b o ra reco n h ec e n d o q u e os
so n h os e p roje tos de va n gu a r d a q u an to à m u d a n ça socia l era m falh os e i ngê n u os, ela
a p la u d e o e n gaja m e n to o t i m ist a e e n é rgic o d os arq u ite tos m o d e r n os nas q u estões
so c ia is, p o lí t ic as e ec o n ô m ic as. É exa ta m e n te esse e n gaja m e n to q u e lh e p arec e fa l
tar em to d os os estilos de arq u itet u ra p ós-m o d e r n a . G h ira r d o co n clu i qu e “so m e n te
q u a n d o os arq u itetos, c r ít icos e h istoriad ores aceitare m a resp o nsab ilid a d e pela c o n s
t r u ção - em to d as as suas ra m ificações - p o d e re m os nos a p ro xi m ar de u m a a rq u ite
tu ra da su bstâ n cia” .

73
A ética ambiental

U m a agenda política emergente é representada pelo m ovim e n to d a “ arq u itet u ra verde” ,


que defende a necessidade de u m a ética am bien tal da co n st r u ç ão . E ssa teoria recen
te pretende instituir uma relação m enos an tagôn ica com a n aturez a, p ro p o n d o resistir
ao espraiamento urbano pela elaboração de projetos de co n st r u ç ão de alta de nsidade
e pelo emprego de materiais renováveis, não poluen tes e recic láveis. O m ovi m e n to da
“sustentabilidade” apoia-se na noção fenom enológica de que u m a relação com a n ature
za é essencial para a plena realização das poten cialidades h u m a n as no plan eta.
W illiam M c D onough, arquiteto e am bien talista, afir m a q ue as i m p lic aç õ es éticas
do trabalho arquitetônico incluem o recon hecim en to dos d ireitos d as fu t u ras gerações
e das outras espécies a um meio ambiente saudável. M c D o n o u gh co n sid e ra com m u i
ta seriedade as diretrizes éticas da a ia e acha que o prestígio da p ro fissão a u m e n tará se
houver uma visão mais ampla dos serviços que os arqu itetos presta m à soc ie d a d e. Tal
como muitas outras perspectivas éticas, o am bien talism o ex p ri m e u m a cr ít ica tanto à
arquitetura moderna como às con dições m ateriais da m o d er n id ad e.
Para M c D onough, prosseguir com os h ábitos e p rá t icas usu a is da a rq u ite t u ra é
assumir uma atitude negligente em face do recon h ecido cará ter tó x ico d os m ateriais
e processos constru tivos atualmente em uso. Essa p osição ra d ic al ex ige n ovas defi
nições de prosperidade, prod u tividade e q u alid ad e de v i d a , e isso co m eç a com a re
conciliação do hom em com seu lugar no m u n do n atural. A co m p re e n sã o de que a
natureza não é imutável requer u m a atitude de in tegração e co m p ro m e t i m e n to com
a renovação e a recuperação da terra e de seus sistemas de vid a.

SEXTO t e m a : o c o r p o

O corpo e a natureza, dois sistemas orgânicos, am bos m an tiveram u m a relação an tagô


nica com o modernismo. Entre os modernistas, Le Corbusier foi um dos ú n icos que pro
curaram estabelecer um sistema de proporções baseado na escala h u m an a, o M odulor.
A maioria dos arquitetos funcionalistas negligenciou a relação entre o corp o e a arquitetu
ra, exceto no que se referia à acomodação pragmática da form a h u m an a no abrigo. Uma
outra rota pós-moderna para uma arquitetura revitalizada converge, assim , para o corpo
humano como o terreno da arquitetura. O atual interesse pelo corpo aparece sob diferen
tes formas e orientações: fenomenológica, pós-estruturalista e fem inista.

Corpo, sujeito e objeto

O corpo é a substância física do ser hum ano, e muitas vezes é retratado co m o oposto
à mente ou ao espírito. A lgu ns filósofos defin em a “ p essoa” ou o “e u ” c o m o u m a

74
entidade constituída de corpo e alm a.173 O com ponente psíquico, visto com o o sujeito,
é estud ado pela m o d ern a psicologia, psiquiatria e pela epistem ologia. D o ponto de
vista epistem ológico, o sujeito é um indivíduo “que conhece”, um ego ou um ato
de consciência. Em outros cam pos de conhecim ento, o sujeito é um “indivíduo su b -
m etido à observação”.174É com um encontrar essa acepção, com seus m atizes políticos,
na obra dos pós-estruturalistas, inclusive em Foucault, que dá a seguinte definição:
“Há dois sentidos para a palavra sujeito’: sujeito subm etido a outro pelo controle e
pela dependência e sujeito ligado à sua pró p ria identidade pela consciência ou pelo
conhecim ento de si”.175

0 corpo na arqui t e t ura c l á ssi c a : pro j e çã o e an t ropomorfismo

N a arq u ite t u ra clássica, o c o r p o h u m a n o fu n c io n a co m o u m m ito de o rige m e é usad o


na p ro je t aç ão co m o m o d e lo figu ra t ivo e p ro p o r c io n a l p a ra a o rga n i z a ç ã o d a p la n ta,
d a fac h a d a e do d e talh e. V id le r afir m a q u e a i m age m d o c o r p o p o d e ser “ m a t e m a t ic a
m e n te i n sc r i t a ” p o r m e io de p r o p o r ç õ es e t éc n ic as d e esc a la , ou p o d e se r “ p i c t o
ric a m e n te e m u la d a” . 176 O c o r p o rep rese n ta m e to n i m ic a m e n t e a n a t u re z a em gera l e
seu fin o m o d o de o rga n i z ar fu n çõ es co m p lexas.

0 fim da pro jeçã o humanist a

E n tre os d esafios p ostos à visão de m u n d o a n tro p o cê n tr ica clássica e à co n st r u ç ã o do


su jeito h u m a n o está a n oção existe n c ialista de que a p rova da existê n c ia do h o m e m se
e n co n tra no m u n do m aterial e dele depen d e. Jea n -Pa u l Sartre afir m a em O ser e o n ada
(i959) q u e o c o r p o tom a co nsc iê n c ia de si a p a r t ir d os ob je tos no m u n do. E ise n m a n
exp lica que o que carac teriz a a p assage m do h u m a n ism o p ara o m o d er n ism o é

[...] um deslocam en to do homem para íbra do centro do seu m u ndo. E leja não é mais
visto com o um agente origin ário. Os objetos são vistos com o ideias independen tes do
hom em . N esse con texto, o homem é uma função discursiva em meio a sistem as de
linguagem prévios e com plexos, (cap. 1)

V i d le r a rgu m e n t a q u e, d esd e o fim da tra d iç ão c lássic a, tem h av id o u m co nsta n te


d ist a n c ia m e n to do c o r p o co m re lação ao e d ifíc io. O p ro c esso , q ue tem co m o c o n
seq u ê n c ia a “ p erd a do c o r p o co m o fu n d a m e n to de a u to rid a d e p ara a a rq u i t e t u ra” ,
c a r a c t e r i z a-se p o r três c e n á r ios, que vê m se to r n a n d o cad a vez m ais a bstra tos, de
p ro je ç ã o c o r p o r a l: o e d ifíc io é u m c o r p o; o e d ifíc io represe n ta ou “c o r p o r ific a ” es
t a d os do c o r p o ou da m e n te; o a m b ie n te tem a trib u tos o rgâ n ic os ou c o r p o r a is .177
Essa te n d ê n c ia de d ista n cia m e n to no m o d er n ism o tam bém se exp lica p or um desvio

75
eviden te da figu ração em d ireç ão a u m a age n d a d e a b s t r a ç ã o , o q u a l fo i cer t a m e n t e
estim u lado pela in d ust ria li z aç ão d a co n st r u ç ã o .

A renovação pós-moderna do corpo

O tratamento m odern ista do corp o suscitou diferen tes re aç õ es p ó s- m o d e r n a s. A obra


h istoricista de G raves constitu i u m co m e n tário ac erc a d a p e r d a d e s ig n if ic a d o que
resultou da morte do ideal h u m an ista de a n t ro p o c e n t r ism o . N o es p a ç o co n t í n u o do
m odern ism o, diz ele, o hom em perde a se nsação de c e n t ra lid a d e, m es m o n u m a obra
exemplar como o Pavilhão de Barcelon a, que não d ife re n c ia co m c lare z a os v á rios ele
mentos, como chão, teto, parede e ja n ela. E m “A rg u m e n t os e m fa v o r d a arq u itetu ra
figurativa” , Graves escreve o seguinte:

O movimento moderno baseou-se, sobretudo, na expressão técnica - a linguagem inter


na - e a metáfora da máquina dominou sua forma de construção. Rejeitan do a represen
tação humana ou antropomórfica da arquitetura do passado, o m ovim en to moderno
minou a forma poética em favor de geometrias abstratas não figurativas, (cap. 1)

A função da linguagem poética da arquitetura é proporcion ar u m a orie n tação no am bien


te. Na ausência dela, “o efeito cu mulativo da arquitetura n ão figu ra tiva é o desm em bra
mento de nossa linguagem cultural arquitetônica an terior” . A arqu itetu ra de G raves quer
restabelecer o antropomorfismo com o em prego de recursos clássicos sign ificativos que
instituem e simbolizam a relação do homem com a natureza e o cosm os.
Perez-Gomes desenvolve u m a proposta fe n o m e n o lógic a p a ra a “ r e n ov aç ão do
corpo” como “ nossa posse in divisa, que perm ite o acesso à re a lid a d e” (d e fi n id a como
o continuum corpo-m u n do) e dá ao m u ndo sua a p arê n cia p o r m e io d a p rojeção. Ele
observa que as grandes obras da arquitetura m o d er n a to m a m n ec essa r ia m e n t e por
referência uma imagem do corpo diferente da da arq u itetu ra c lássica, a q u al se basea
va num “corpo unitário objetivado” . U ma form a p ós-m o d er n a de re fe rê n c ia, com o a
praticada por H ejduk, chama a atenção, ao co n trário, p ara “ as q u a lid a d es da carn e” .
Perez-Gomes explica sua proposta da seguinte m aneira:

A imagem renovada que temos do corpo somente pode ser co m pree n d id a por analo
gia, indiretamente, por meio dos próprios instrumentos e objetos que fazem a media
ção entre o corpo e o mundo, captando os rastros da consciência corp orifica d a.178

Perez-Gomes conclui dizendo que “ um interesse genuíno pelo sign ific a d o arq u itetô n i
co em nosso tempo deve ser acompanhado por uma re n ovação co nsc ie n te ou in cons
ciente do corpo” .

76
Vim os anterio rm en te que a contribuição de Vidler à discussão sobre o co rpo é
um estudo acerca do u n c a n n y (o estranham ente fam iliar), que “revela os inquietantes
problem as da identidade do eu, do outro, do corpo e de sua ausência”.179 Ele m ostra
que a experiência do estranham ente familiar, com o o “ b o d y i n g fo r t h ” (a figuração ou
encenação) de Perez-Gomes, é a projeção do estado m ental do indivíduo que “suprim e
as fronteiras entre o real e o irreal para provocar um a am biguidade p ertu rb ad o ra”.180
C om o ferram enta crítica, Vidler recorre ao “estranham ente fam iliar” para p ô r em foco
a corporificação antropom órfica, o gênero e o O utro. O fim da expressão antro p o m ó r-
fica na arquitetura levou a um a sensação estranham ente fam iliar de presença de um a
ausência e à “construção na d o r”.181
Tsch u m i ta m bém co m en ta a a usê n cia do corp o. E m “A rq u ite t u ra e lim ites” , ele c r i
tica “ a habitual exc lusão do c o rp o e sua ex p e riê n c ia de todo o d isc u rso [co n te m p o râ
neo] sobre a lógica da form a” co m o u m a característica das in terpretações red u cio n istas
(form alistas) da arqu itetura (cap. 3). A fuga, e m esm o repressão, ao c o rp o é um asp ecto
do p u rita n ism o que Tsch u m i tam bém detectou na arq u itet u ra m o d er n a. E m lugar da
redução, Tschu m i oferece um “excesso” d ion isíaco e a tra nsgressão dos lim ites racio n ais
para torn ar eviden te a excessiva e (decid ida m en te) in ú til eroti z ação do espaço. A lgu n s
asp ectos do seu ensaio “ O pra z er da arqu itetu ra” rescen dem a in flu ê n cias fe n o m e n oló-
gicas: por exem plo, q u a n d o ele descreve a orie n tação do corp o em co n d ições esp ac ia l
mente diferentes do plano e da caverna, da rua e da sala de estar, e ad m ite que, “ levado ao
extrem o, o prazer do espaço inclina-se para a poética do inconscien te” (cap. 13).

N o çõ es p ós-est ru t uralist as do corpo como sítio

O u tros teóricos que rejeitara m o a n tro p o ce n tr ism o p reten d em estab elecer u m a c o m


p ree nsão p ós-est r u t u ra list a das relações en tre o co rp o e o a m b ien te físico. E m o p osi
ção ao co n ceito de p rojeção da in terioridade (o estado m en tal do su jeito), co lo ca m -se
os d esafios pós-estru t u ra listas à ce n tralid ade do hom em no cosm os que essa i n t e rio ri
dad e pressu põe. O ideal h u m an ista do hom em c r ia d o r da ord em no m u n do pela p ro
je ç ã o da sua i m age m c o rp o ra l é in vertido pela n oção de ex t e rio rid a de em F oucau lt:
o m u n do ex terior das instit u ições e co n ve n ções que de term in a o h om e m . A ideia da
p rojeção da in teriorid ad e en tra assim em colapso.
A tese de A grest de que o “sistem a” da arquitetura reprim e o corpo da m u lher já foi
m e n cio n ad a na d isc ussão an terior de seu ensaio “A arqu itetura por su b tração: corpo,
lógica e sexo” . Vale a pena exa m in ar o m ecan ism o de ap rop riação sim bólica pelo qual
a repressão do corp o fem in ino é realizada. Agreste explica-o da seguinte m aneira:

Por meio de uma série bastante com plexa de operações metafóricas que perpassam
todos esses textos [renascen tistas], o gênero do corpo e suas funções sexuais são

77
intercambiados num movimen to de tra nsexualidade qu e en ce n a a etern a fan tasia de
procriação dos homens.(cap. 13)

A ssim , 0 u m bigo, com o cen tro do corp o h u m a n o (fe m i n i n o o u m a s c u l i n o ) ,“ torn a-se


um objeto m eton ím ico ou u m altern ador ou em brea n te ( sh if t e r ) c o m re laç ão ao gê n e
ro” . A grest tom a em prestado ao lingu ista r u sso R o m a n Ja k o b so n o c o n c e i t o de em
breante ou alternador “ um sign ifican te que se abre p a ra o u t ros sist e m as” . 182 O resgate
do corpo da m ulher com o elem en to ce n tral p a ra a a rq u i t e t u ra e x ig e a b r i r o sistem a,
perm itin do-se, por exem plo, que o altern ad or t r a n sfo r m e o c o r p o e m ge o m e t r ia; e a
natureza (associada ao fem in ino), em arqu itetura. A s fe m i n ist as têm i m p o r t a n t e papel
na reinserção do corpo na teoria.
U ma visão pós-hu m anista da relação corp o / m u n d o está i m p líc ita n os proje tos das
arquitetas D iller e Scofidio. N o artigo “ B o d y T roubles” , Ro b er t M c A n u lt y m e n cio n a as
últimas pesquisas teóricas das duas autoras sobre as estru t u ras esp ac ia is e os costu m es
sociais que ordenam nossos corpos, tais com o os h áb itos de d o m est ic id a d e. M c A n u lty
escreve: “ D efrontamos aqui outra vez com u m m od elo do esp aço seg u n d o o qual a im
portância do corpo não é a de ser u m a fonte figurativa de p ro jeção m i m é t ic a, m as a de
campo das inscrições do poder” .183 Basean do-se nesse trabalh o crítico, M c A n u lty sugere
a reformulação do corpo em “ termos espaciais, de i n scrição e sex u a is” em substitu ição
aos termos “ figurativos, projetivos e an im ísticos” dos fen o m e n ólogos.
Eisenman levanta uma questão semelhante à projeção do corp o, q ue ele afir m a se dar
por intermédio de nossa faculdade prim ordial, a visão (cap. 13). A a n álise de E isen m an
sugere que a visão determinou o desenho arquitetôn ico, esp ecialm e n te a p ersp ec tiva, e
que as convenções do desenho, por sua vez, lim itaram as id eias de esp aço. Perez-G om es
concorda com Eisenman em que “o principal pressuposto [que precisa ser repensado] é
que os desenhos arquitetônicos são necessariamente p rojeções” .184 L e m b ra n d o um tema
familiar, Eisenman afirma que a arquitetura jam ais consegu irá su p erar a v isão de mundo
renascentista se não puser em questão a represen tação.185 Ele busca u m n ovo tipo de de
senho não projetivo capaz de se opor à tendência an tropocên trica da c u lt u ra ocidental.
Eisenman preconiza, além disso, que a arquitetura problem atiz e a v isão a fim de criticar
0 seu predomínio e chegar a uma nova com preensão do espaço.

Conclusão: a necessidade da teoria pós-moderna

A despeito de seus aspectos confusos, há muitas razões para est u d ar a teoria p ós- m o
derna. Os escritos do período entre 1965 e 1995 abra nge m u m ric o c o n ju n to de te
mas arquitetônicos em oldurados por fascinan tes p arad igm as t eóricos. E les p o r certo
ajudam a iluminar a heterogênea prod ução arquitetôn ica dos ú lt i m os trin ta a n os e a
explicar a sua relação com a arquitetura modern a.

78
A teoria p ós-m o d ern a é crítica, otim ista e intelectualizada; desafia e exalta a ca-
pacidade do espírito hum ano e proporciona m odelos de pensam ento crítico e ético.
A esse respeito, a teoria pode d em onstrar didaticam ente a análise com parativa das
posições dos autores e da lógica dos seus argum entos. O com ponente ético tam bém
estabelece um m odelo de com portam ento responsável para o arquiteto e sublinha a
conexão entre sua atividade profissional e a sociedade.
Os ensaios pós-m odernos reunidos nesta antologia ligam-se à grande tradição da
teoria arquitetônica devido à continuidade de certos temas, com o o problem a do signi-
ficado da arquitetura e suas relações com a natureza, a cidade, a tecnologia e a história.
A cuidadosa po n de r a ç ã o desses problem as e as posições m anifestadas quanto à rela-
ção da arquitetura com tais temas distinguem esses ensaios das em preitadas teóricas
anteriores. Essa diferença se deve à influência de poderosos paradigm as externos no
interior da disciplina arquitetônica. A ideia de que a teoria pode agir com o um elem en-
to catalisador da m udança social, por exemplo, inspira-se no m arxism o e na crítica
neom arxista da Escola de Frankfurt.
Esta an tologia tenta aprese n tar u m a v isão eq u ilib rad a das m ais im p or ta n tes id eo
logias p ós-m o d er n as; n en h u m a escola de pe nsa m e n to em p a r t ic u la r foi, n em p o d eria
ser, escolh ida para represen tar um p erío d o tão pluralista. A o co n trário, os autores dos
ensaios são in tro d u z id os e au tori z ados a debater en tre si. Essa me parece ser a m a n e i
ra m ais honesta de retratar a situação co n tem porân ea. A lgu ns escritores aparecem com
m ais frequên cia no livro, m as isso se deve, sobretu do, à u biquidade de seu en volvim en to
com a arqu itetu ra: ora co m o ed itores, ora co m o professores u n iversitários, ora co m o
reitores ou cu radores. E em todos os casos, escreven do. O gên ero escolh ido foi o ensaio,
“que é u m a a m ostra, um exem plo, uma experiên cia prática, u ma tentativa, u ma d isser ta
ção não m uito longa sobre um assu n to específico, ou parte de um assun to, que o rigi n a l
mente não se pretende defin itiva” .186
O resu ltado de toda a flu idez na p rofissão d u ra n te esses a n os é um d isc u rso ao
m esm o tem po p rovoc ad or, a n tecip atório, esp ec u lativo e sem lim ites. O s seus efeitos
são varia d os e im p revisíveis. A orie n tação crítica de boa parte da N ova A gen d a decorre
da a t m osfera social da ép oca, que incluiu a m ilitâ n cia política pela exte nsão dos d ire i
tos das m u lh eres, dos n egros, dos gays e até de espécies a n im ais a m eaçad as. A resis
tência a todas as estru t u ras, institu ições e m o d os de pe nsar totalizan tes foi o grito de
gu erra dos a n os 1960 e 70. E m bora a escala das causas defen did as pareça ter se restrin
gid o na d écada de 19 8 0 ,0 â n im o crítico persistiu. A crítica p ós-m o d er n a à arqu itetura
m o d er n a foi assu m id a pelos que oc u p a m posições de p o d er nas institu ições e pelas
vo z es do “ O u tro” m argin aliz ado.
T rês tem as da teoria crítica parecem d espo n tar em m eados da década de 1990: o
fe m i n ism o e o p rob le m a do corp o na arqu itetu ra, a estética co n te m porâ n ea do s u
b li m e e a ética a m b ien talista. A ssu m in d o posições de fora e de den tro do d isc u rso

79
dominante» e tomando como ferramenta de trabalho o e nsaio frag m e n tá rio , os teóri
cos pós-m odernos abordam os temas recorrentes e em ergen tes d a arq u itetu ra.

I. Mantivemos um título próximo do original, uma vez que o term o “agenda” na acepção de “ pauta”
ou “ ternário em discussão” já é de uso comum no meio acadêm ico e na im prensa brasileira, [ n . h.)
Z Nikolaus Pevsner, Os pioneiros do desenho m oder n o: de W illi a m M o r r is a W al t er G ro p i us , trad.
João Paulo Monteiro. São Paulo: Martins Fontes, 1980.
3 . M arcus V itruvius Pollio, T he Ten Boo ks o f A rch i t ect u re. N ova Yor k: D over, 19 6 0 , pp. 39-40.
M arco V itrúvio Polião, D a A rqu i t e t u r a , trad. e notas M arco A u ré lio L ago n egro. São Paulo:
H ucitec/ Fundação para a Pesquisa A mbiental, 1999.
4 . Leon Battista Alberti, The Ten Books o f Architect ure. Lon dres: T iran ti, 1965, p. 1 x.
5 . Os termos originalmente usados por V itrúvio para defin ir sua tríade são f i r m i t a s , co modi t as e
venustasy que são traduzidos de diferentes maneiras por diferen tes autores, co m o solidez ou es
trutura, conveniência ou funcionalidade e beleza ou form a ideal.
6. Bernard Tsch um i,“Six Concepts” , in Archi t ect ure a n d D isj u nc t io n. C a m b ridge: mit Press, 1995,
P- 25 9 -
7 . Vittorio Gregotti,“ The Necessity o f T h eory” , C asabella n. 494, set. 1983, p. 13.
8. Alberto Perez-Gomes,“ The Renovation o f the Body: Joh n H ejd u k an d the C ultu ral Relcvance of
Theoretical Project” , A A Files 13, n. 8, out. 1986, p. 29.
9 . Kenneth Frampton, “ Towards a C riticai Regionalism: Six Poin ts for an A rc h itec t u re ot Resis-
tance” , in Hal Foster (org.), T he A n t i-Aest he t ic: Essays on Post m o de r n C u l t u re. Port Townsend,
w a: Bay Press, 1983, p. 25.
10. Frederic Jameson,“Postmodemism and Consumer Society” , in The An t i-Aesthet ic, op. cit., p. 113.
II. Ibid.
12. Kenneth F ram p ton ,“ Place-form and C ultural Iden tity” , in Joh n T h ac k ara (org.), D esign after
Modernism: Beyo nd the Object. Nova York: T ham es and H udson, 1988, pp. 51-52.
13. Ibid.
14. Colin Rowe e Fred Koetter,“ Collage C ity” , a r n. 942, v. 158, ago. 1975, p. 72.
15 “ New York Five é uma expressão usada em fins dos anos 1960 e in ício d os 70 p ara design ar 0

grupo de cinco arquitetos estabelecidos em N ova Yo r k - Peter D. E ise n m a n , M ich ael Graves,
Charles Gwathmey, John H ejduk e Richard M eier - , cujo trabalho foi ob jeto de u m a exposição
no moma em 1969 e posteriormente publicado no livro F ive A rch i t ects (1972). N a época, esses
arquitetos tinham em comum a adm iração pelas form as e teorias d ese n volvid as p or Le C orbusier
nas décadas de 1920 e 30. ( n . t .]
16. Colin Rowe,“ Introduction” , in Five Architects. Nova York: W ittenborn 2 C om pany, 1972, p. 15.
17. Sobre a missão da a a , veja 0 folheto da associação que afirm a: “A A sso c iaç ão de A rq u itetos foi
fundada em 1847 para se opor a um sistema de educação con trolado pela C oroa. Foi cria d a com 0
objetivo de democratizar 0 exercício da arquitetura e cultivar a im agin ação das p essoas median te
uma educação independente” . Um artigo em C asabella n. 35 9 -36 0 ,19 71, p p .10 0 -10 2 , define a mis
são do i a u s. David Stewart fala sobre 0 cenário italiano: “A briga entre o gover n o e as escolas de
arquitetura culminou em 1970-71 com a demissão de Rossi e outros professores de suas atividades
docentes na Politécnica de M ilão” . “ T he Expression o f Ideological Function in the Architecture o f
A ldo Rossi” , A+u n. 65, mai. 1976, p. 110.
18. A revista O pposi t ions foi publicada regularmen te desde o volu m e 1, de setem bro de 1973» ao volu
me 26, de 1984. Ver Joan O c k m a n ,“ Resurrecting the A van t-G arde: T h e H istory and Program o f
O pposi t ions',' in Beatriz C olo m in a (org.), A rch i tect u re Product io n. N ova York: Prin ceton A rch i-
tectural Press, 1988, pp. 181-19 9 .
19. A óbvia coincidência de professores do i a u s e do corpo docente de Princeton talvez se explique
pelo fato de Peter Eisen m an, diretor do Instituto, tam bém ensin ar em Princeton.
20 . Ver Ignasi de Solà- M orales Rubió, “ N eo-Ratio n alism and F iguration” , A rch i t ect u r a l D esign 45,
n. 5-6 ,19 84 , pp. 15-20.
21 . Joan O ck m an, Archi tect ure C ul t ure 1943-1968, N ova York: Riz zoli, 1993 >P* 440.
22 . G regot ti,“ T he N ecessity o f T h eo ry” , op. cit., p. 13.
23 . Ibid.
24 . O ck m an, Archi tect ure C u l t u re , op. cit., pp. 457-458.
25 . V it torio G regotti, Ter r i t ór io d a a rqui t et ur a, trad. Berta W ald m an-V illá e Joan V illá. São Paulo:
Perspectiva, 1975.
26 . Robert V en turi, D en ise Scott Brow n e Steven Izenour. A p re n de n d o com L as Vegas, trad. Pedro
M aia Soares. São Paulo: C osac Naify, 2003.
27 . Ven turi cita E m pson em Co m pl ex i t y a n d Co n t r a dict io n in Archi tect ure. N ova York: M useu m o f
M odem A rt, 1966, p. 22.
28 . Ibid., p. 104.
29 . Jo A n n L e w is,“ It’s Post m odern an d i f You D on’t Get it, You Get it” , W ashi ng ton Post, 27 mar.
1 9 9 4 , p- G7.
30 . Robert A. M . Ster n ,“ N ew D irections in M odem A m erican A rch itecture: PostScript at the Edge o f
M odern ism ” , Archi tect ur al Associ a t io n Q u a r t erly 9, n. 2-3 ,19 71, p. 67-68.
31 . Ibid.
32 . Ibid., p. 69.
33 . D iane G h irar d o ,“ Past or Post M odem in A rchitectural Fashion” , Jou r n a l o f A rchi tect u r a l E d u c a-
tion 39, n. 4 verão de 1986, pp. 2-6.
34 . “ Preface” , in F ive A rchi tects, op. cit., p. 1.
35 . “ Transparency: Literal and PhenomenaT, (1955-56), publicado originalmente em Perspecta (1963).
36 . No m o m a , 1979. C itado por Frampton em “ Place-form ” , op. cit., p. 53.
37 . Veja catálogo com o m esmo nome.
38 . M ary M cLeod, “A rch itecture and Politics in the Reagan Era: From Post m odern ism lo D econs-
tructivism ” , Assem bl a ge 8 ,19 8 9 , p. 44.
39 . A exposição “ H ouses for Sale” realizou-se de 18 de outubro a 22 de novembro de 1980. A lgu m as
im agens foram reprod u z idas em Paolo Portoghesi, Post moder n: T he Archi tect ure o f the Post in-
dust r i a l S ocie t y , N ova York: Riz zoli, 1983, pp. 110 -111.
40 . Ibid., p. 6.
41 . Jürgen H ab er m as,“ M odern ity - A n Incomplete Project” , in the A n t i-Aest he t ic , op. cit., p. 3.
42 . Em p o r t u gu ês,“ M odern idade - um projeto in acabado” , trad. M árcio Su z uki. In: O tília A rantes
e Paulo E d u ardo A ran tes, Um po n t o cego no projet o m oder n o de Jü rgen H ahern uis, São Paulo:
Brasiliense, 1992, pp. 99-123.
43. Antony Flew, A Dictionary of Philosophy. Nova York: St. Matin’s Press, 1984, p. 157.
44. Gaston Bachelard, The Poetics of Space, trad. Maria Joias (Boston: Beacon Press, 1969), e Martin
Heidegger, “ Building Dwelling Thinking” , extraído de Poetry, Language, Thought, trad. Albert
Hofstadter. Nova York: Harper &Row, 1971, pp. 145-229.
45. Flew, A dictionary, op. cit., p. 283.
46. A importância deste ensaio pode ser medida pela sua publicação simultânea em inglês e italiano
em Lotus v. 9, fev. 1975, pp. 205-210.
47. Christian Norberg-Schulz, “ O pensamento de Heidegger sobre arquitetura” , Pe rspect a 20,1983,
p. 67 (cap. 9 desta coletânea).
48 . C hristian N orberg-Sch ulz , ‘T h e Ph enom eno n o f Place” , A r c h i t ec t u r a l A sso c i a t es Q u a r t e r ly 8,
n. 4 , 1976 , p. 5 -
49. Alberto Perez-Gomes, “Architectural Representation in the Age o f Sim ulacra” S k a l a 2 0 , 1990,
p.42.
50. Perez-Gomes, “ The Renovation of the Body” , op. cit., pp. 27-28.
51. Perez-Gomes,“Architectural Representation” , op. ci t., p. 42.
51 Juhani Pallasmaa, “ The Social Commission and the Autonomous Architect” , H a r v a r d Archi tec-
ture Review 6,1987, p. 119.
53. Frase do arquiteto numa palestra na Universidade da Virgínia, 1993.
54. Em alemão Uu nheimlichen. Quanto à proposta de tradução do termo ver o e nsaio da psicanalista
Maria Rita Kehl em Giovanna Bartucci (org.). Psica n á lise, li t er a t u r a e est é t icas d a sub je t ivaçã o ,
Rio de Janeiro: Imago, 2001. Adiante a autora desenvolve uma d isc ussão so b re o adjetivo e 0
conceito freudiano de unca nny. [ n . r . t .]
55 . Jean-François Lyotard,“ The Sublime and the Avant-garde” , A r t F o r u m 20 , n. 8, abr. 1982, p. 38.
Ver também “Presenting the Unpresentable: The Sublime” , A r t F o r u m 22, n. 8, abr. 1984, e “Ap-
pendix”, in T he Post modern Co ndi t io n: A Repor t on K n ow ledge, trad. G e o ffr e y Ben n ingto n e
Brian Massumi. Minneapolis: University of Minnesota Press, 1984.
56 . Edmund Burke, A n I nqu i ry into ou r Ide as o f the S u bli me a n d t he B e a u t i f u l ( N ova York: O xford
University Press), e Immanuel Kant, O bserva t ions on the Feeli ng o f t he B e a u t i fu l a n d t he S ubli me ,
trad. John T. Goldthwait. Berkely: University of Califórnia Press, 1981.
57. Ideia modernista de que,“para ser do seu tempo” , tudo na prática artística deve ser origin al, para
além da história, isto é, começar de uma t abul a rasa.
58. Anthony Vidler, T he Archi tect ural Unca nny. Cambridge: m i t Press, 1992, p. 79.
59. Peter Eisenman,“En Terror Firma: In Trails o f Grotextes” , in For m , Bei ng, A bse n ce: Archi tect ure
a nd Philosophy, Prat t Jour n al o f Archi tect ure 2. Nova York: Rizzoli, 1988, p. 114.
60. Anthony Vidler, “ Theorizing the Unhomely” , Newsli ne 3, n. 3,1990, p. 3. A psico logia lacan iana
mostrou que as crianças não se percebem imediatamente como seres integrais. M as, q uan do se
veem como um corpo único (na fase do espelho), a ideia do corpo fragmentado ou “despedaçado”
é expulsa para o inconsciente. Esse conhecimento escondido, quando reencontrado, explica o efei
to dos filmes de terror e as fantasias de desmembramento.
61. Vidler, The Architectural Uncanny, op. cit., p. 79.
81 Ibid., ix.
63. Vidler, “Theorizing” , op. cit., p.3. 0 texto citado aqui repete as ideias do capítulo sobre “ T h e H ouse”
no clássico de Bachelard, Poetics o f the Space.

82
64 . V idler, T he Archi t ect ur al Uncanny, op.cit., p. x.
65 . Ibid. p. 12.
66. Ibid., p. 13.
67 . E isen m an ,“ En Terror Firma” , op. cit., p. 114.
68. Ibid., p. 115.
69 . Ibid., p. 114.
70 . D iana I. A grest, A rch i t ect u re f r o m W it hou t: T heore t ica l F r a m i ngs f o r a C r i t ic a i Pr act ice. C am -
bridge: mit Press, p. 1.
71 . Peter de Bolla, T he D iscou rse o f l he S u bli me: Re a d i ngs in H istory, Aest het ics, a n d the S ubject.
N ova York: O xford U niversity Press, 1989, p. 12.
72 . Josüe H arari, Text u al S t ra tegies: Perspect ives in Post-S t r uct ur alist C ri t icism. Ithaca: C orn ell U n i
versity Press, 1979, p. 444.
73 . D iana Agrest e M ario Gandelsonas,“Semiotics and Architecture” , Oppositions 1, verão de 1976, p. 97.
74. Terence Hawkes, Structuralism a nd Semiotics. Berkeley: University o f Califórnia Press, 1977, p. 20.
75 . Ferdinand de Saussure, Course in General Linguistics. Nova York: M cGraw H ill, 1966, p. 114. [ Curso
de linguística ger al , trad. A ntonio Chelini et al. São Paulo: C ultrix, 1988)
76 . U mberto E c o ,“ Function and Sign: Sem iotics o f A rch itecture” , in Broadbent, Bunt, Jencks, (org.)
Signs, S ymbols a n d Archi t ect ure. Nova York: John W iley, 1980, p. 11-70 . O rigin alm en te publicado
em 1973 .
77 . U mberto Eco, “A C om ponential A nalysis o f the A rch itectural Sign / C olu m n /” , in Signs, Sy mbols
a n d Archi tect ure , op. cit., p. 232.
78 . H awkes, S t ruct uralism a n d Semiot ics, op.cit., p. 17.
79 . Jonathan C uller, O n D eco nst r uct io n: T heo ry a n d C ri t icism af ter S t r uct u r a lism. Ithaca: C ornell
U niversity Press, 1982, p. 28.
80 . Ibid., p. 20.
81 . Ibid., p. 21.
82 . Ibid., p. 22.
83 . Hal Foster,“ (Post) M odern Polemics” , Perspect a 21,19 8 4 , p. 150.
84 . Roland Barthes, “ From W ork to Text” , in I m age M usic Text , trad. Stephen H eath. N ova York:
H ill and Young, 1977 >P - 157 - (“ Da obra ao texto” , in O r u mor da língua, trad. L. Perrone-M oisés.
São Paulo: Brasiliense, 1988, pp. 71-78].
85 . Culler, O n D econstr uction, op. cit., p. 25.
86. Foster,“ (Post) M odern Polemics” , op. cit.
87 . T erry Eagleton, Li t er a ry T heory: A n I nt roduct ion. M in neapolis: U niversity o f M in nesota Press,
1983» P- 128. l Teoria d a li t era t ura: u m a in trodução. Trad. W altensir D utra. São Paulo: M artins
Fontes, 1983.]
88. Ibid.
89 . Ib id.,p p. 114-115.
90 . Bart h es,“ W ork” , op. cit., p. 160.
91 . Foster, (Post) M odern Polemics, op. cit., p. 146.
92 . Roland B art h es,“ T he D eath o f the Au thor” , in I mage M usic Text, op. ci t., pp. 142-148 (“A morte
do au tor” , in O r u m o r d a lí ngu a, op. cit.], e M ichel Foucault, “ W hat is an A u thor?” , in H arari,
Text ual S trategies, op. cit., 141-16 0 (O que é o a u t or ? Lisboa: Passagens, 1992].
93 . F oucault,“ W hat is an Author?” , op.cit., p. 148.
94. Ibid., p. 160.
95. Tendência da filosofia metafísica a buscar um fundamento ou uma origem. O pensamento logo*
cêntrico estabelece oposições binárias, como presença/ausência, que privilegiam um dos termos.
Culler afirma: “ O logocentrismo, portanto, pressupõe a prioridade do primeiro termo (associado
com identidade e presença) e imagina o segundo, relativamente a este, como um complicador,
uma negação, uma manifestação, ou uma ruptura com o primeiro.” Culler, O n D econst ruct ion ,
op.cit, 92-93.
96. Jacques Derrida,“Point de folie - Maintenant 1’architecture”, A A F iles n. 12, verão de 1986, p. 65.
97. Jacques Derrida, entrevista a Eva Meyer, “Architecture Where Desire Can Live” , D o m us n. 671,
abr. 1986, p. 18.
98. Eagleton, Li terary Theory, op. cit. p. 133.
99. Culler, O n Deconst ruct ion , op. cit., p. 85.
100. Ibid, p. 24.
101. Tschumi,“Six Concepts”, op. ci t., p. 260.
102. Anthony Vidler,ttThe Pleasure of the Architect” , a + i /, n. 288, set. 1988, p. 17.
103. Manfredo Tafuri, Project o e U t opi a: a r qu i t ect u r a e dese n v o l v i m e n t o d o c a p i t a l ism o . Lisboa:
Presença, 1985.
104. Frederic Jameson, A rch i tect u re C r i t icism Ideo lo gy. Princeton: Princeton Architecture Press,
1985, p. 70.
105. Eagleton, Li terary T heory , op. cit., p. 142.
106. Michel Foucault. H ist óri a da loucura. São Paulo: Perspectiva, 1978; Idem, A s p a l a v r a s e as coisas,
Lisboa: Portugália, 1968; Idem, V igia r e pu n i r, Petrópolis: Vozes, 1977.
107. David Held, In t roduction to C r i t ica i T h eor y. Berkeley: U niversity o f Califórn ia Press, 1980,
PP-33-39*
108. Chris Weedon, Femi ni ne Practice a n d Poststruct uralist T heo ry. Cambridge: Black w ell Publishers,
1987, P-43. 46 .
109. Anne Bergren, “Architecture Gender Philosophy” , in S t r a t egies in A r c h i t ec t u r a l T h in k ing.
Cambridge: m i t Press, p. 12.
110. Robert McAnulty,“Body Trouble”, in Strategies in Archi tect ur al T h i n k i n g , op. cit., p. 191.
111. Agrest, Architecture fro m Without, op. cit., p. 3.
112. Anthony Vidler, introdução ao artigo de Tschumi “Architeture and Transgression , O pposi t ions
7, inverno de 1976, p. 55.
113. Foster,“(Post) Modern Polemics” , op. cit., p. 151.
114. Lewis,“ It’s postmodern . . .”, op. cit., G6.
115. Walter Benjamin,“A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica” , in M a g i a e técnica, arte
e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. São Paulo: Brasiliense, 1985, pp. 165-196.
116. Solà-Morales Rubió,MNeo-Rationalism”, op. cit., p. 19.
117. Ver “ a d Profile 11: Surrealism and Architecture”, Archi tect ur al D esign 48, n. 2-3 ,1978> que con
tém artigos de Tschumi, Frampton e Koolhaas. Ver também meu artigo sobre a influência de
Duchamp entre os arquitetos contemporâneos: “Construction/ Demolition, O bjecl/Process’ , in
Proceedings o f the 1991 a c s a Southeast Regional Conference, Charlotte: University of North Caro-
lina, 1992, pp. 42-47.
118. Ver Alan Colquhoun,“ Três tipos de historicismo" (cap. 4 desta coletânea).

84
119. H aberm as,“ M odern ity” , op. cit., p. 5.
120. Foster, MPreface’\ in T he An ti-Aest he tic, op. cit., i x - x v i .
121. Foster,“ (Post) Modem Polemics” , op. cit., p. 151.
122. Habermas,“ Modernity”, op. cit, p. 7.
123. Ibid.,p. 11.
124. T heodor Adorno. Teoria estética. Lisboa: Edições 70/ São Paulo: M artins Fontes, 1988.
125. Karl Popper. A sociedade abert a e seus inimigos. Belo H orizonte: Itatiaia/ São Paulo: e d u s p , 1977;
Idem. A misér ia do historicismo. São Paulo: C ultrix, 1987.
126. Lyotard, T he Post modern Condit ion, op. cit., p. 72.
127. Ibid.,p. xxiii.
128. Alan C olq u h ou n ,“ Postmodern ism and Structuralism” , in M ode r n i t y a n d the Classical Tradi tion.
C ambridge: mit Press, 1989, p. 254.
129. G iulio C ario A rg a n , MO n the T ypology o f A rch itecture” , Archi tect ur al D esign , n. 33, dez. 1963,
p. 565.
130. Solà-M orales Rubió,“ N eo-Rationalism” , op. cit., p. 18.
131. D emetri Porp hyrios,“ Classicism is Not a Style” , Archi tect ural Design n. 5-6,1982, p. 56.
132. M cLeod,“Architecture in the Reagan Era” , op. cit. p. 43.
133. Norberg-Sch ulz ,“ H eidegger’s T hin k ing on A rchitecture” , op. cit., p. 68.
134 . Peter C o lli n s, C h a n g i n g I de a is in M o d e r n A r c h i t ec t u r e 175 0 -19 5 0 . L o n d res: F ab er an d
Faber, 1965, p. 289.
135. Ibid.
136 . D. W. M ein ig (org.), T he í n terpre t a t ion o f O rd i n a r y L a ndsc a pes: Geogr a ph ica l Essays. N ova
York: O xford U niversity Press, 1979.
137. Carol B u rns,“ O n Site: Architectural Preoccupations” , in A ndréa Kahn (org.), D r a wi ng/Bu ildi ng/
Text: Essays in Architectural Theory. Nova York: Princeton Architectural Press, 1991, pp. 146-168.
138. Perez-Gom es,“Architecture Representation” , op.cit., p. 43.
139. Ezra Ehrenkrantz,“Superhighways Urban Dangers” , Architecture 84, n. 5, maio 1995, pp. 51,53,55.
140. Colin Rowe e Fred Koetter, Coll age City. Cambridge: m i t Press, 1978.
141. S ubu rbs , nos Estados U nidos, não são necessariamente os “arrabaldes” habitados por uma p o
pulação majoritariam en te de baixa renda, como no Brasil. O conceito de subiirb referc-se a co
m unidades principalm ente residenciais, socialm en te hom ogêneas, situadas fora dos limites de
uma cidade, que se distinguem dos centros urbanos pela baixa densidade de moradias e pela alta
in tensidade de translados de casa para o trabalho nas áreas comerciais ou in dustriais. Há um
termo genérico, sub u r bi a , sem equivalente em português, que, além de se referir aos suburbs e
aos seus moradores coletivamente, como classe cultural, designa os aspectos culturais ou sociais
da vida nos suburbs. [ n . t .]
142. S pr a wl ou u rb an spr awl são conceitos que dizem respeito à expansão desordenada, não pla
nejada e irregu lar de construções nos arredores de uma cidade, às vezes associada a processos
semelhan tes nu ma cidade vi zin ha, em que se constituem áreas residenciais e pequenos centros
comerciais e industriais. T raduzirei p o r“espraiamento urbano” , ( n . t .)
143. ítalo C alvino, Invisible Cities. Nova York: H arcourt Brace Jovanovich, Inc., 1974, pp. 156- 158. \ As
cidades invisíveis, trad. D iogo Mainardi. São Paulo: Companhia das Letras, 1991, pp. 142-143).
144. Jane Jacobs, M or t e e vid a de gr a ndes cidades. São Paulo, Martins Fontes, 2 0 0 0 . ( n . r . t .)
145. Rem Koolhaas, D elir ious N e w York: A Re t ro act ive M a n ifest o f o r M a n h a t t a n . Nova York: Mona-
celii Press, 1994, p. 10.
146. Ibid., p. 20.
147. Richard Ingersoll, Design Book Rev iew 17, inverno de 1989, p. 3.
148. Thomas L Schumacher, trabalho não publicado, maio de 1995.
149. Roland Barthes,“Semiology and Urbanism” , in S tr uct ures I mplicit a n d E x p l i c i t , v i a 2,1973, p. 155.
150. Ibid., p. 157.
151. Agrest, Architecture fro m Wi t hout , op. cit., p. 4.
151 No original, n ode t que se refere a pontos primordiais de atração, como locais de parada de um
meio de transporte, cruzamento ou convergência de caminhos ou, de modo geral, onde há mu
dança de uma estrutura para outra, [ n . t .)
153. Aldo Rossi, The Architect ure o f the Ci t y. Cambridge: m it Press, 1982, p. 21.

154. Ibid, p. 41.


155. Peter Eisenman,“ Introductiorí\ in T he A rchi tect ure o f t he C i t y , op. cit., p. 6.
156. Ibid.
157.0 programa paisagístico do final do século xv n i encorajava a composição dos jardins com pe
quenas edificações simbólicas o u uf a br ic ksn, ruínas gregas e medievais, cabanas rústicas e solares
inteiros, que suplementavam a paisagem poética idealizada. Segundo Hitchcock, o termo “f a-
brick” foi tomado de empréstimo aos pintores paisagistas, sobretudo dos italianos e holandeses
do século anterior, que introduziram tais elementos arquitetônicos em suas telas. I lenry-Russell
Hitchcock Jr, M od e m Archi t ect ure: Ro m a n ticism a n d Rei n t eg r a t i o n. Nova York: Da Capo Press,
1993, p.8. [ n . r . t .]
158. Leon Krier,uThe Reconstruction of the City” , in R a t io n a l A rch i t ect u re: T h e Reco nst r uct io n o f the
European City. Bruxelas: Archives of Modern Architecture Editions, 1978, p. 38.

159. Ibid, p. 39.


160. Ibid, p. 41.
161. Categorias discutidas por Venturi em Apre nden do com L as Vegas. A primeira, a construção do
ú p o “ duck” (apelido inspirado num galpão de beira de estrada em Long Island, construído na
forma de um pato), é um edifício cujo formato exterior manifesta expressivamente sua função. A
segunda, denominada de “ decorated shedn (0 “galpão decorado” ), caracteriza-se pela aplicação
ostensiva na fachada das construções de sinais e ornamentos, como anúncios e letreiros lumino
sos, que indicam a função do edifício, [ n . t .]
161 Alan Colquhoun, “Sign and Substance: Reflections on Complexity, Las Vegas and Oberlin”, in
Essays in Architectural Cri ticism: M oder n Archi tect ure a n d H ist o r ica l C h a n ge (Cambridge Op-
positions Books and mi t Press, 1985), pp. 139-151*
163. Denise Scott Brown,“ On Ducks and Decoration”, in Archi t ect ure C u l t u re , op. cit., p. 447.
164. Edge cities são aglomerações que geralmente se desenvolvem por um processo de fragmentação do
meio urbano nos arredores das grandes cidades norte-americanas e em algumas metrópoles euro
peias, nas quais equipamentos e serviços urbanos (centros comerciais e esportivos, restaurantes, ci
nemas etc.) se estabelecem como segmentos separados ou como grandes enclaves monofuncionais,
às margens das rodovias, e atraem a formação de conjuntos residenciais, como os condomínios

66
fechados. Esse processo de urbanização, também chamado nos Estados Unidos de “ urbanização
sem cidades” , é referido de várias maneiras na literatura urbanística brasileira: “cidades limítro
fes” , “cidades de contorno” , “cidades externas” , “cidade dentro da cidade” . Mantenho a expressão
em inglês de edge ci t ies, já que me parece não haver uma categoria consensual em português que
expresse a ideia, [ n . t .]
165. Kate Nesbitt, “Cities of Desire/Boundaries of Cities” , in Arquitectura, n. 288, ago. 1991, pp. 116-121.
166. Primeira reunião em 8 de outubro de 1993, citada em Peter Katz, T h e N e w U rb a n ism . Nova York:
McGraw-H ill, Inc., 1994, p. 241.
167. “Seaside and the Real World: A Debate on A merican Urbanism” , A r c h i t ec t u r e N e w Yor k , n. 1,
jul.-ago. 1993.
168. Bernard Tschumi, “Architecture and Transgression” , Opposiíions 7,1976, p. 6.
169. Theodor A dorno,“ Commitment” , in Andrew Aratoe Eike Gebhardt (org.), T h e Esse n t i a l F r a n k
f u r t Scho ol Re a der. New York: Urizen Books, 1978, p. 317.
170. “ PostScript” , E t h ics a n d A rch i t ect u re, v ia 10, John Capeli, Paul Naprstek, Bruce Prescott (org.),
1990, p. 164.
171 . Ibid.
172 . Ibid.
173 . Runes, A D ic t io n a ry, op. cit., p. 54.
174 . Ib id., p. 320.
175 . M ichel F o u c a u lt,“ T h e Subject and Pow er” , Brian W allis (org.) A r t a f t er M od e r n ist n. N ova York:
N ew M useu m o f C o n tep orary A rt, 1984, p. 420.
176 . V idler, T he A rch i t ect u r a l U n c a n n y , op. cit., p. 69.
177 . Ibid., p. 70.
178 . Pere z-G o m es,“ Renovation” , op. cit., p. 29.
179 . V id ler,“ T h eori z ing the U n h o m ely” , op. cit., p. 3.
180 . Ib id., p. 3.
181 . A c itação é o títu lo de u m a p alestra de V id ler m e n cio n a d a p o r M ac N u lty, “ B o d y T ro u b les” ,
op. cit., p. 196.
182 . D iana A grest,“ D esign versus N o n - D esign ” , in A rch it ect ure f r o m W i t hou t , op. cit., p. 55.
183 . M c A n u lty,“ Bo d y T roubles” , in S tra tegies in A rch i t ect u r a l T h i n k i n g , op. cit., p. 196.
184 . Pere z-G o m es,“A rch itectural Represen tation” , op. cit., p. 40.
185 . E ise n m a n ,“ V isões que se desdobram ...” (cap. 13 desta coletânea).
186 . T h e C o m p a c t E d i t io n o f the O xfor d E ngl ish D ic t io n a ry. N ova York: O xford U n iversity Press,
1984, p. 896.

87
© Cosac Naify, 2006
Publicado originalmente nos Estados Unidos pela Princeton Architectural Press

COLEÇÃO FACE NORTE

C o o r d e n aç ão ed itorial c r i s t i n a f i n o
Projeto gráfico l u c i a n a f a c c h i n i e e l a i n e r a m o s
C ap a LUCIANA FACCHINI
Revisão técn ica j o s é t a v a r e s c o r r e i a d e l i r a e j o a n a me l l o
Revisão CARLA MELLO MOREIRA, MARIA CLÁUDIA MATTOS e RAUL DREWNICK
ín d ice re m issivo m a r i a c l á u d i a m a t t o s
Pro d u ção gráfica s i r l e n e n a s c i m e n t o

2'\ edição, -f. reimpressão, 2013

Nesta edição, respeitou-se o novo


Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.

Dados I n tern acionais de C atalogação na Publicação ( c i p )


(C âm ara Brasileira do Livro, s p , Brasil)

Uma nova agen da para a arqu iletura: an tologia teórica (1965-1995)


T ítu lo origin al: Thcorizing a New Agenda for Architecture:
an Anthology of Architectural Theory; 1963-1995
O rgan ização: Kate Nesbitt
Tradução: Vera Pereira
São Paulo: C osac N aify, 1 . ed rev., 2013
672 pp., 16 ils.

is i i N 978-85-7503-599-3

1. A rq uitetura - T eoria 2. A rq uitetura m odern a - Século 20


3. A rquitetura p ós-m o d er n a 1. N esbitt, Kate.

06-1770 CDD 720.1

índices para catálogo sistemático:


1. Arquitetura: Teoria 720,1

COSAC NAIFY
rua General Jardim, 770 ,2V andar
01223-010 São Paulo sp
cosacnaify.com.br [11] 3218 1444
atendimento ao professor 111] 3218 1473
professor@cosacnaify.com.br

Você também pode gostar