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LIVRO II – DOS BENS

Artigos 79 ao 91 do Código Civil

1. BEM X COISA

Os conceitos de BEM e COISA, como objeto de direito, não são


pacíficos na doutrina clássica, havendo uma série de definições.

Caio Mário da Silva Pereira, por exemplo, dizia que: "Bem é


tudo que nos agrada" e diferenciava: "Os bens, especificamente considerados,
distinguem-se das coisas, em razão da materialidade destas: as coisas são
materiais e concretas, enquanto que se reserva para designar imaterias ou
abstratos o nome bens em sentido estrito". Para esse doutrinador, os bens seriam
gênero e as coisas espécies.

Para Silvio Rodrigues, coisa seria gênero, e bem seria espécie. Para
ele, "coisa é tudo que existe objetivamente, com exclusão do homem". Os "bens são
coisas que, por serem úteis e raras, são suscetíveis de apropriação e contêm valor
econômico".

Em resumo, segundo Silvio Rodrigues, bens são coisas com


interesse econômico e/ou jurídico. Ao passo que coisa é tudo que não é humano.

Segundo professor Flávio Tartuce, a última diferenciação teria sido


adotada pelo Código Civil de 2002.

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2. CLASSIFICAÇÃO DOS BENS:

2.1. BENS CORPÓREOS E INCORPÓREOS:


a) Corpóreos (ou Materiais): são aqueles que têm existência material,
podendo ser tocados, isto é, percebidos por nossos sentidos, como bens móveis e
imóveis em geral. Exemplos: livros, carros, terreno, casa.
b) Incorpóreos (ou Imateriais): possuem existência abstrata, não podendo
ser tocados fisicamente pelos seres humanos. A existência dos bens incorpóreos
é fruto de determinação jurídica. Ex.: direito autoral; hipoteca, penhor.

Obs.: enquanto os bens “corpóreos” são alienados onerosamente por


meio de COMPRA E VENDA (ex.: compra venda de um imóvel), “os
incorpóreos” somente se transferem pelo contrato de CESSÃO (ex.:
cessão de direitos autorais).

2.2. BENS MÓVEIS E IMÓVEIS:

a) IMÓVEIS: de acordo com a natureza, bens imóveis são aqueles que não podem ser
transportados, sem destruição (alteração de sua substância), de um lugar para outro.
Ex.: terreno. Ao definir imóveis o CC dispôs tratar-se do solo e de tudo quanto lhe for
incorporado de maneira natural ou artificial (art. 79, CC).

Espécies de bens imóveis:

a.1. Bens Imóveis por NATUREZA: aqueles que foram incorporados por força
natural. Ex.: solo, árvore que nasce naturalmente, frutos pendentes, espaço aéreo, o
subsolo.

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a.2. Bens Imóveis por ACESSÃO FÍSICA ARTIFICIAL (INDUSTRIAL): são
aqueles que foram incorporados pelo homem, permanentemente, ao solo. Ex.: semente
lançada ao solo, plantações, edifícios e construções.

a.3. Bens Imóveis por determinação legal (art. 80, CC): A lei diz que é imóvel.
(aqueles que são considerados imóveis para receber uma proteção jurídica maior). São
eles:

I. “os direitos reais sobre bens imóveis” ; (por esta razão há uma
grande formalidade na lavratura de uma hipoteca, por exemplo);

Obs. hipoteca (direito reais sobre imóvel, portanto, também imóvel consoante a regra
supra exposta) embora consistente em garantia real em regra incidente sobre bens
imóveis, nem sempre consistirá bem imóvel, haja vista que na especifica hipótese da
hipoteca incidente sobre navio e aeronaves (reprise-se, bens móveis para fins de
classificação) será considerada bem móvel.

II. “o direito a sucessão aberta”.

(o direito à sucessão aberta é o direito à herança. O direito à herança possui


NATUREZA IMOBILIÁRIA. Esse dispositivo explica porque para ceder o direito à
herança deve haver a lavratura de uma escritura pública, e para grande parte da
doutrina, até mesmo outorga uxória ou marital).

b) MÓVEIS: são aqueles que podem ser movidos de um local para outro, por força
própria (bens semoventes: animais) ou alheia (móveis propriamente ditos: uma
cadeira), sem que seja alterada a sua substância ou destinação econômico-social (art. 82,
CC).

Espécies de bens móveis:

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b.1. Bens móveis por natureza: aqueles que podem ser transportados (ou se
transportar) de um local para outro, sem que se destruam. Ex.: os materiais de uma
construção que ainda não foram utilizados na obra; um livro; um animal de estimação;
cadeira; etc.

b.2. Móveis por antecipação: Segundo Tartuce, "são os bens que eram bens
imóveis, mas que foram mobilizados por uma atividade humana. Exemplo típico é a
árvore cortada, que se transforma em lenha, para alguma finalidade".

Para ROSENVALD e CHAVES FARIAS, são "àqueles bens que, embora imóveis
pela sua natureza, foram mobilizados pela vontade humana, em face de sua função
econômica". Os autores citam o exemplo de uma safra ainda não colhida ou a árvore
destinada ao corte. Verifica-se nestes exemplos, que embora incorporados ao solo, há
destinação prévia de sua mobilização.

b.3. Móveis por determinação legal (art. 83, CC): a lei determina que o bem é
móvel (são tratados como móveis para receber uma proteção jurídica menor). São eles:

I. As energias que tenham valor econômico (ex.: energia elétrica);

Obs.: Por esta razão há furto de energia elétrica. Furto recai apenas sobre bens
móveis.

II. os direitos reais sobre móveis;

Exemplo: penhor - cidadão faz empréstimo na CEF e dá seu relógio como garantia,
por penhor. O indivíduo deste modo empenha o relógio (CUIDADO! NÃO DIZER
NUNCA “PENHORANDO” O BEM MÓVEL EM GARANTIA, MAS
SIM “EMPENHANDO” O BEM MÓVEL EM GARANTIA, neste caso). A garantia de
penhor é um direito real sobre bem móvel.

III. os direitos pessoais de caráter patrimonial (ex.: direitos


autorais).

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DANGER:

Obs1.: o material de construção é bem móvel antes de se aplicar à construção;


enquanto está empregada na construção é bem imóvel. No entanto, quando o material é
retirado da construção pode ser móvel (se for fruto de demolição – art. 84, CC) ou
imóvel (se for retirado provisoriamente para reempregar – art. 81, II, CC).

Obs2.: a "venda de casa entregue a domicilio" (comum nos E.U.A.), que


enquanto unidade é transportada em um caminhão e entregue. Embora num primeiro
momento possamos pensar que é um bem móvel, o art. 81 do CC trata a presente
situação como bem imóvel. Caso fosse tratada como bem móvel, estaríamos aplicando
àquela casa um regime jurídico muito frágil.

Obs3.: Navios e aeronaves, embora sejam transmitidos da mesma forma que


os imóveis, admitindo, inclusive, hipoteca, são bens móveis especiais.

2.3. BENS FUNGÍVEIS E INFUNGÍVEIS:

Art. 85, CC São fungíveis os móveis que podem substituir-se por


outros da mesma espécie, qualidade e quantidade.

a) Fungíveis: são os bens que podem ser substituídos (SUBSTITUÍVEIS) por


outro da mesma espécie, qualidade e quantidade. Ex.: café, arroz, milho, dinheiro, etc.

b) Infungíveis: são os bens que não podem ser substituídos (INSUBSTITUÍVEIS)


por outro de mesma espécie, ou seja, determinados em razão de qualidades individuais.
Ex.: obra de arte, imóveis, cachorro de estimação.

A infungibilidade é característica dos bens imóveis, mas também se


encontra presente em alguns bens móveis, como por exemplo, os veículos automotores
(em razão de sua identificação pelo número do chassi).

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Obs.: Esta classificação tem importância nos contratos de empréstimo, referindo-se o
mútuo (empréstimo de consumo) ao empréstimo de bens fungíveis (ex.:
empréstimo de dinheiro), e o comodato (empréstimo de uso) ao empréstimo de
bens infungíveis (ex.: empréstimo de casa, carro, etc.).

Atenção: é possível que um bem fungível se torne infungível. Um exemplo é um livro


de Direito Civil autografado e dedicado em meu nome por Silvio de Salvo Venosa.

2.4. BENS CONSUMÍVEIS E INCONSUMÍVEIS:

a) Consumíveis: são os bens cujo uso gera a destruição imediata de sua


substância (consumíveis de fato/ consuntibilidade de fato ou natural) –
(exemplo: um sanduíche, um combustível, etc.), e aqueles que são destinados à
alienação (consumíveis de direito/consuntibilidade de direito ou jurídica)
– exemplo: livro em uma loja; carro em uma concessionária) (art. 86, CC).

Obs.: o livro e o carro citados no exemplo são inconsumíveis, porém, se estes


estiverem destinados à alienação (venda) são consumíveis, em razão do disposto na
parte final do art. 86 do CC.

b) Inconsumíveis: são os bens cujo uso não gera a destruição imediata da


própria substância. Ex.: um carro, um livro, uma roupa.

Art. 86, CC - São consumíveis os bens móveis cujo uso importa


destruição imediata da própria substância, sendo também
considerados tais os destinados à alienação.

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2.5. BENS DIVISÍVEIS E INDIVISÍVEIS:

a) Bens divisíveis: segundo o art. 87 do Código Civil, "bens divisíveis são os que se
podem fracionar sem alteração na sua substância, diminuição considerável de
valor, ou prejuízo do uso a que se destinam".

Ex.: se repartirmos uma saca de café, cada metade conservará as qualidades


do produto, podendo ter a mesma utilização do todo, pois nenhuma alteração
de sua substância houve. Apenas se transformou em duas porções reais e
distintas de café em menor proporção ou quantidade, mantendo cada qual a
mesma qualidade do todo (Maria Helena Diniz).

Interessante e ilustrativo é o exemplo de Moreira Alves: se dez


herdeiros receberem um brilhante de 50 quilates, qualquer deles, ao exigir sua divisão,
poderá prejudicar os demais, visto que haverá uma considerável diminuição no seu
valor, pois dez brilhantes de 5 quilates valem menos do que um de 50 quilates.

b) Bens indivisíveis – São os bens que não podem ser divididos porque a divisão
acarreta alteração na substância, diminuição do valor ou prejuízo da utilidade.
Ex.: um cavalo vivo dividido ao meio deixa de ser semovente; um veículo; etc.

Obs.: Essa indivisibilidade pode ocorrer por determinação legal (Ex.: herança que é
indivisível até a partilha; a servidão) ou pela vontade das partes.

Art. 87, CC - Bens divisíveis são os que se podem fracionar sem


alteração na sua substância , diminuição considerável de valor , ou
prejuízo do uso a que se destinam .

Art. 88, CC - Os bens naturalmente divisíveis podem tornar-se


indivisíveis por determinação da lei ou por vontade das partes .

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2.6. BENS SINGULARES E COLETIVOS:

a) singulares (individuais): "são singulares os bens que, embora reunidos,


consideram-se de per si, independente dos demais" (art. 89, CC). Ex.: um livro.

Os bens singulares podem ser SIMPLES ou COMPOSTOS:

1) Bens singulares SIMPLES: quando os componentes do bem


fazem parte do bem pela própria natureza. Exemplo: uma árvore, um cavalo.

2) Bens singulares COMPOSTOS: quando a coesão de seus


componentes decorre do engenho humano. Exemplo: um avião, um relógio.

b) coletivos (universais): são aqueles que se encontram agregados a um todo. Os


bens coletivos são constituídos por várias coisas singulares, consideradas em
conjunto e formando um todo individualizado, pela própria vontade da pessoa.

Os bens universais podem decorrer de uma vontade fática ou


jurídica:

b1. Universalidade de fato – são bens de propriedade de uma pessoa e, por sua
vontade, são tratadas coletivamente. Exemplo: um rebanho, uma boiada, uma biblioteca;
pinacoteca (quadros), etc. (art. 90, CC).

b2. Universalidade de direito – é uma ficção jurídica. São tratados de forma


coletiva por uma determinação legal. Exemplo: o patrimônio, a herança, massa falida.
(art. 91, CC).

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2.7. BENS PRINCIPAIS E ACESSÓRIOS:

a) Bens Principais (independentes): aqueles que têm sua existência


independentemente dos demais, ou seja, existe sobre si mesmo, abstrata ou
concretamente (art.92, CC). Ex.: solo.

b) Bens Acessórios (dependentes): são aqueles em que a sua existência


depende da existência do bem principal. Ex.: casa em relação ao solo;
janela em relação a casa; a pedra em relação ao colar.

Obs.: Em regra, o acessório segue a sorte do principal, é o que chamamos de


“princípio da gravitação jurídica”, mas existem exceções, as pertenças (que
estudaremos adiante não seguem o bem principal).

São espécies de bens acessórios:

1º) FRUTOS (art. 95, CC) são bens acessórios que têm origem no bem principal; é
uma utilidade RENOVÁVEL, cuja percepção NÃO ESGOTA a substância da
coisa principal (SE REGENERAM). Os frutos podem ser:

a) Frutos Naturais: são aqueles que decorrem da essência (se regeneram por
natureza) da coisa principal. Ex.: frutos de uma árvore (maçã, laranja, etc.).
Também o bezerro é fruto, já que não impede que a vaca possa dar outras crias.

b) Frutos Industriais: decorrem de uma atividade humana (força do homem).


Ex: material produzido por uma fábrica (lápis, caneta, borracha).

c) Frutos Civis: originados de uma relação jurídica ou econômica, de natureza


privada, também denominada “rendimentos”. Ex.: rendimentos de aluguel.

2º) PRODUTOS: são bens acessórios que saem da bem principal, diminuindo sua
quantidade ou substância, ou seja, é uma utilidade NÃO RENOVÁVEL e cuja
percepção ESGOTA a coisa principal (NÃO SE REGENERAM).

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Exemplos: petróleo é uma utilidade que não se renova; o carvão mineral em relação à
mina do qual foi retirado também é um exemplo de produto.

Obs.: apesar de ainda não separadas do bem principal, os frutos e


produtos podem ser objeto de negócio jurídico.

3º) BENFEITORIAS: são acréscimos (obras) introduzidos pelo HOMEM (que não é
proprietário), na estrutura de um bem móvel ou imóvel, com o propósito de
CONSERVÁ-LO, MELHORÁ-LO, ou EMBELEZÁ-LO, conforme artigos 96 do
Código Civil. Enquanto os frutos e produtos (já estudados) decorrem do bem principal,
as benfeitorias são nele introduzidas.

As benfeitorias classificam-se em (art. 96, CC):

a) Benfeitorias Necessárias: tem por finalidade CONSERVAR o bem


principal ou evitar que o mesmo se deteriore. Ex.: troca de encanamento
enferrujado; reforço na fundação de um prédio; troca das telhas quebradas, etc.

b) Benfeitorias Úteis: são as que aumentam ou facilitam o uso do bem,


tornando-as mais útil. Ex.: construção de uma garagem; instalação de uma
grade na janela de uma casa.

c) Benfeitorias Voluptuárias: são as de mero deleite, enfeite, recreio,


de mero luxo, que não facilitam a utilidade do bem, mas apenas torna mais
agradável o seu uso. Ex.: construção de uma piscina ou uma quadra de tênis em
uma casa.

TODA benfeitoria é produto do HOMEM. Nenhuma benfeitoria é


natural (art. 97, CC).

Uma das importâncias na distinção das benfeitorias é saber se estas


serão passíveis de indenização, no caso de litígio envolvendo a posse

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do bem. Para tanto, será necessário analisar se o possuidor estava de boa-fé ou má-fé.

Possuidor de boa-fé: terá direito a indenização e retenção das benfeitorias


necessárias e úteis. Já pelas as benfeitorias voluptuárias, o possuidor terá
direito de ser indenizado, ou de levantá-las, mas não terá direito de retenção (art.
1.219, CC).

Possuidor de má-fé: terá direito a ser indenizado apenas pelas benfeitorias


necessárias, não havendo direito de retenção ou de levantamento das úteis e
voluptuárias (art. 1.220, CC).

4ª) PERTENÇAS (art. 93, CC): são bens acessórios destinados, de forma
duradoura, a servir a um bem principal, atendendo aos seus fins, ou seja, destinados
ao seu uso, serviço ou aformoseamento. Ex.: ar-condicionado colocado em uma casa na
praia; máquinas utilizadas em uma fábrica.

DANGER:

Obs1.: só será pertença se o bem for incorporado de forma duradoura. Se for


incorporado de forma temporária ou transitória, não será pertença.

Obs2.: se for parte integrante (indispensável) do bem não é pertença. Ex.:


o pneu do carro (pois faz parte da essência/ integrante do bem – não existe carro sem
pneu).

Obs3.: As pertenças, apesar de serem bens acessórios, em regra, não seguem o


destino do principal (portanto, não se aplica o princípio da gravitação jurídica neste
caso. É uma exceção a regra!), salvo se o contrário dispuser da lei, da vontade das partes
ou das circunstâncias do caso (art. 94, CC). Ex.: vendo um carro, mas aparelho de som
não está nele incluso;

O GPS ou aparelho de som em relação ao carro é uma


pertença?

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Resposta: Segundo a doutrina mais respeitada sim, é uma pertença, ressalvada a
hipótese do GPS ou parelho de som estar integrado no automóvel desde a fábrica,
quando será considerada parte integrante do principal. A pertença se acopla ao
todo, mas jamais será parte dependente do todo.

Segundo TARTUCE, o que diferencia as benfeitorias das pertenças é


que as primeiras são introduzidas por quem não é proprietário, enquanto às últimas
(pertenças) por aquele que é o proprietário.

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3. BEM DE FAMÍLIA

3.1. Introdução

No direito brasileiro não se admite a responsabilização pessoal do


devedor pelas dívidas que contraiu, respondendo, portanto, apenas com o seu
patrimônio presente e futuro - princípio da responsabilidade patrimonial (FARIAS;
ROSENVALD. 2019, p. 616).

No entanto, essa regra de responsabilização patrimonial, contém


exceções, dentre elas o “bem de família”.

O bem de família representa uma proteção jurídica ao patrimônio


mínimo (direito ao mínimo existencial) do sujeito. É proteção a uma parte do
patrimônio do ser humano, assegurando a dignidade da pessoa humana.

Existem dois tipos de bem de família:

- O bem de família Voluntário ou Convencional (art.


1.711/1.722, CC) e;

- O bem de família Legal ou Involuntário (Lei 8.009/90).

3.2. Bem de família Legal (Involuntário):

Previsto na Lei 8.009/90, protege o bem imóvel residencial da


família, para fins de moradia. Dessa forma, o referido bem é automaticamente
IMPENHORÁVEL, não respondendo por qualquer tipo de dívida civil,
comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, salvo nas hipóteses previstas na
lei (art. 1º da Lei 8.009/90)

Obs.: a jurisprudência atual não se restringe às modalidades de família previstas na


Constituição Federal (matrimonial, informal e monoparental), podendo abranger
qualquer outra forma de família. Aliás, a jurisprudência evoluiu tanto sobre o tema que
a Súmula 364 do STJ prevê a proteção do

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bem de família aos solteiros, divorciados e viúvos, com base no art. 6º da CF
(direito à moradia).

O instituto do bem de família protegerá apenas um único imóvel.


Se a pessoa possuir mais de um imóvel, será considerado como bem de família o bem
de menor valor, por inteligência do parágrafo único do artigo 5º da Lei nº. 8.009/90.

Inexiste no texto da lei limitação de valor do imóvel em


relação ao bem de família legal.

Obs.: Em alguns casos concretos o STJ tem admitido, excepcionalmente, o


desmembramento de parte do bem para efeito de penhora, especialmente em áreas
residenciais muito extensas abrangendo áreas de lazer.

É importante destacar que a proteção do bem de família legal


abrangerá o imóvel sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as
benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso
profissional ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados
(essenciais/indispensáveis para a família), conforme art. 1º, parágrafo único, da Lei
8.009/90.

Excluem-se da proteção: os veículos de transporte, as obras de


arte (exemplo: quadros) e os adornos decorativos (exemplo: uma fonte decorativa), que
podem ser penhorados (art. 2º, da Lei 8.009/90).

DANGER: A Súmula 449 do STJ não considera como bem de família a vaga de
garagem com matrícula própria, que pode sofrer os efeitos da penhora.

DANGER: Segundo a súmula 486 do STJ, é impenhorável o único imóvel residencial


do devedor que esteja locado a terceiros, desde que a renda obtida com a locação seja
revertida para a subsistência ou a moradia da sua família.

O STJ sedimentou entendimento de que é impenhorável a renda


proveniente de imóvel (bem de família) locado da qual a família sobrevive
(RESP 439.920/SP, AGRG no RESP 975.858/SP).

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3.3. Bem de Família Voluntário ou Convencional

Previsto no artigo 1.711 e seguintes do Código Civil, o bem


de família voluntário é aquele que pode (nasce de um ato de vontade) ser instituído
pelo cônjuge ou entidade familiar, mediante escritura pública ou testamento,
registrada no Cartório de Registro de Imóveis (art. 167, I, 1, LRP). Da mesma forma,
poderá o terceiro instituir bem de família mediante testamento ou doação (art.
1.711, parágrafo único, CC).

A grande diferença entre o bem de família LEGAL (involuntário) e o


voluntário, é que, o segundo, além de ser IMPENHORÁVEL (por dividas futuras), é
INALIENÁVEL, até que ambos os cônjuges ou companheiros venham a falecer e até
que todos os filhos atinjam a capacidade (Art. 1.722, CC).

Portanto, ante a característica da inalienabilidade do bem de família


voluntário, a sua venda, em regra, dependerá de autorização judicial, ouvido o
Ministério Público.

Obs.1: a dissolução da sociedade conjugal (divórcio) ou da união estável não


extingue o bem de família voluntário (art. 1.721, CC).

Obs.2: dissolvida a sociedade conjugal pela morte de um dos cônjuges, o


sobrevivente poderá pedir a extinção do bem de família, se for o único bem do
casal (art. 1.721, par. Único, CC).

Assim, repita-se, são características do bem de família convencional a


impenhorabilidade e inalienabilidade.

Outra grande característica do bem de família voluntário é a


possibilidade de ESCOLHA, mediante escritura pública, do bem em que deverá
recair a proteção do bem de família. Esta escolha é muito importante para as
pessoas que possuem mais de um imóvel, uma vez que, inexistindo a
instituição do bem de família voluntário, serão aplicadas as regras da Lei.

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8.009/90 (bem de família involuntário), ou seja, havendo mais de um imóvel, a
proteção recairá sobre o de menor valor.

Ex.: João possui um imóvel no valor de R$ 300.000,00, bem como, outros quatro
imóveis no valor de R$ 150.000,00. Poderá João instituir o imóvel mais valioso como
bem de família, porém, caso assim não faça, a proteção a ser aplicada é a da Lei
8.009/90, razão pela qual, será protegido o bem de menor valor, ou seja, um daqueles
cujo valor é de R$ 150.000,00.

No entanto, o bem de família voluntário não poderá ser instituído


por mais de 1/3 do patrimônio liquido existente ao tempo da instituição.

Ex.: se João possui dois imóveis, sendo um de R$ 500.000,00 e, outro de R$


100.000,00. Neste caso, João não poderá instituir o imóvel de R$ 500.000,00 como bem
de família, tendo em vista a limitação já estudada.

É importante ressaltar que a limitação de 1/3 só se aplica ao


bem de família voluntário, não se aplicando ao involuntário (legal). Assim, se tenho
um único imóvel no valor de um milhão de reais, este bem é impenhorável.

O bem de família voluntário, em regra, será administrado por ambos


os cônjuges, e na morte deles passará ao filho mais velho, se for maior (art. 1720, CC).

3.4. Hipóteses de admissão da penhora do bem de família voluntário


ou involuntário

A regra geral de proteção do bem de família não é absoluta, mas


relativa, sendo possível a penhora em casos restritos, onde não haverá a proteção
do bem de família, nas seguintes situações (art. 3º, Lei 8.009/90):

Atenção: O inciso I do art. 3º da Lei 8.009/90 que tratava de uma das


hipóteses de penhorabilidade do bem de família foi revogado

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expressamente pelo art. 46 da Lei Complementar 150/2015 (Nova Lei do
Trabalho Doméstico).

1. Pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à


aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do
respectivo contrato;

2. Pelo credor de pensão alimentícia, resguardados os direitos, sobre o bem, do seu


coproprietário que, com o devedor, integre união estável ou conjugal, observadas as
hipóteses em que ambos responderão pela dívida (alterada pela Lei 13.144/2015).

3. Para cobrança de impostos, predial ou territorial (exemplo: IPTU e ITR), taxas e


contribuições devidas em função do imóvel familiar. (dívida de condomínio – c.f.
jurisprudência do STF);

4. Para a execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal
ou pela entidade familiar;

5. Na hipótese de ter sido adquirido como produto de crime (Ex.: improbidade


administrativa);

6. Por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

Obs.: É muito controvertido o tema (fiança), havendo alguns doutrinadores que


entendem que tal hipótese é inconstitucional, sob o argumento de que o contrato de
fiança, como espécie de contrato acessório, não poderia trazer mais obrigações do
que o contrato principal (o locatário não perde o bem de família, enquanto o fiador
perde), sendo, portanto, desproporcional. Contudo, o STF já se manifestou pela
constitucionalidade da norma (RE 407.688/SP – 08/02/06), sob a argumentação
de que o fiador quando assume a obrigação sabe (ou deveria saber!) que pode perder o
bem de família. No mesmo sentido da Suprema Corte, o STJ editou a súmula 549
(É válida a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação).

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Obs.: BEM DE FAMÍLIA OFERTADO = O STJ já pacificou o entendimento de que
as restritas hipóteses de penhorabilidade do bem de família são previstas em lei,
consideradas normas cogentes (norma que não admite convenção pelas partes), não
sendo admitida a penhora de bens fora das hipóteses previstas em lei, mesmo que o
devedor o queira. Assim, não é possível a renúncia à impenhorabilidade do
bem de família.

7. A MP 871/2019 (“MP do pente fino”) devedor que recebeu de forma indevida


benefício previdenciário/assistencial mediante dolo coação ou fraude;

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