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Conhecimento- Agostinho e Tomás - Copia
Conhecimento- Agostinho e Tomás - Copia
O conhecimento em Santo Agostinho (354-430 d.C.) é um tema que deve ser abordado
por meio de uma vasta pesquisa em sua obra, pois esse pensador cristão não se deteve em
elaborar uma obra específica que tão somente tratasse dessa questão. À guisa de introdução,
comecemos por afirmar que o fundador da Patrística produziu toda a sua obra como um
movimento entre o homem e Deus: aquele somente encontra a felicidade Neste, que é a
Verdade, cujo conhecimento só é possível mediante a Graça.
Como podemos perceber, Agostinho sempre parte de intuições, entretanto, estas jamais
são infundadas ou simplesmente movidas na direção das emoções; ao contrário, baseiam-se na
colaboração fundante entre a fé e a razão.
Conforme Costa, “depois de um belíssimo diálogo com a natureza, onde procura e não
encontra Deus no mundo exterior, Agostinho chega à conclusão de que Deus, ou a verdade,
habita no interior do homem” (1998, p. 485). Esse pensador cristão - lembremos que a sua
base teórica consiste tanto nas obras de caráter platônico, sobretudo as de Plotino, quanto nas
Sagradas Escrituras - compreende que todas as coisas são criaturas de Deus, pois foram por
ele “chamadas” à existência do nada. Porém, por causa do pecado original, não só o homem,
imagem e semelhança de Deus, mas toda a criação fora corrompida. Consequentemente, o
homem se distanciara de uma semelhança com o divino, embora ainda fosse imagem de seu
Criador, haja vista ser dotado de vontade (mesmo que distorcida pelo pecado), liberdade
(Agostinho a diferencia de livre arbítrio) e razão. Em outras palavras, Deus habita no âmago
do homem, isto é, em sua alma imortal; basta que ele se abra, mediante a fé, à ação
restauradora da Graça para que possa conhecer as verdades nela (na alma) contidas, passando
do sensível ao espiritual.
A partir desse ponto, podemos entender o motivo pelo qual, segundo o santo doutor,
conhecer-se é o primeiro e fundamental passo de volta para si mesmo e para Deus. O homem,
ao buscar a felicidade e, portanto, a Verdade, que é Deus, deve desprender-se das coisas
materiais e voltar-se para si, para a sua alma, pois é lá onde estão as verdades. A partir delas e
munido pela Iluminação Divina - sem a qual o homem, somente com a razão, não pode dar
nem sequer mais um passo -, ele pode dar um salto ainda maior, só que em direção à Verdade,
na qual as verdades espirituais (intelectuais) encontram o seu fundamento, ou seja, o encontro
com Deus. Podemos dizer, inclusive, que Agostinho resgata o “conhece-te a ti mesmo”
socrático, só que em uma chave de leitura cristã, ou seja, a passagem do conhecimento
sensível ao conhecimento espiritual se dá, primeiramente, com a permanência em si mesmo,
ou melhor, com o reclinar do homem sobre si mesmo.
No concurso da razão, Agostinho, a fim de contestar a sentença cética “Deus não existe”,
empreendeu um esforço para encontrar uma verdade unicamente no âmbito da razão e, a partir
dessa certeza, passar a uma verdade maior, com o concurso da fé. Para o nosso pensador essa
verdade racional era que o homem existe, vive e pensa: existe porque, inclusive, pode se
enganar; ora, como é evidente que existe, então, igualmente é evidente que vive, caso
contrário, tal verdade não lhe seria tão clara; e, se para o homem, é evidente tanto que existe
quanto que vive, isso só lhe é possível porque pensa, a mais importante das evidências.
Partindo dessas três verdades – vale lembrar que elas foram encontradas fazendo uso
unicamente da intelecção -, e adotando como guia a fé, o santo doutor chegou à certeza da
existência de Deus.
Realça, ainda, Costa (1998, p. 490) que, Agostinho não é tão dualista como é caricaturado,
pois, para o filósofo cristão, o homem é alma e corpo, sendo aquela a sua substância espiritual
(parte superior), e este a sua substância corporal (parte inferior), e não um mero acidente, nem
tampouco um mal em si, apesar de ofuscar a alma. Dessa forma, Agostinho compreende duas
luzes no homem, a saber, uma corporal (própria dos sentidos externos), e outra espiritual
(própria da alma ou sentido interno), a qual é responsável por possibilitar que a luz corporal
veja os objetos.
Agostinho, no entanto, adverte que a alma só atingirá a razão ou ciência se e somente se,
mediante um esforço humano somado a um concurso da Graça, desprender-se dos sentidos
externos, transcendendo-os. Somente dessa forma, poderá conhecer as verdades universais.
Para além de toda essa exposição, o nosso pensador ainda considera o homem um ser
individual. Sendo assim, os sentidos externos e as sensações não são as mesmas para todos.
Consequentemente, com as sensações só podemos adquirir conceitos efêmeros,
conhecimentos submetidos ao sabor do devir, e, assim, com os sentidos não podemos alcançar
as verdades universais.
Segundo o santo doutor, os homens possuem três sentidos, dos quais apenas o terceiro não
é compartilhado com os animais. Ele está se referindo aos sentidos: externo, meio pelo qual o
corpo é afetado pelos objetos sensíveis e também pelo qual a alma se manifesta; interno, que é
a faculdade da alma responsável por produzir as sensações correspondentes aos objetos, ou
seja, por ele sensoriamos tanto os objetos, por meio dos sentidos externos, quanto os próprios
sentidos externos; e a razão que é o sentido superior por meio do qual podemos inteligir.
Dos três sentidos que possuímos, ou das três realidades que compõem o processo do
conhecimento, a mais importante é a razão, ou seja, a faculdade do pensar, do inteligir, pois
por meio dela é que podemos saber que existimos e que pensamos. Como vimos, as sensações
são “verdades particulares”, isto é, variam de indivíduo para indivíduo, pois os sentidos
(externos e internos) são particularizados, e não algo universal e comum a todos; as verdades
racionais, por outro lado, são universais, transcendentais, pois estão presentes em todos os
seres racionais.
A Iluminação Divina é uma luz interior que nos possibilita conhecer as verdades eternas,
imutáveis e universais. É por participarmos dessa luz que somos inteligentes (inteligimos).
Dessa forma, a razão é superior à própria alma, na medida em que não pode dar sequer um
passo sem a luz divina. O que está acima da alma e da razão é justamente aquela natureza que
dota a alma de razão e que a ilumina para que possa conhecer. Essa natureza a que nos
referimos é Deus mesmo, que nos dá a capacidade de julgar, torna-nos conscientes de que
somos superiores àquilo que julgamos, mas inferiores a Ele e que, logo, não podemos tecer
nenhum julgamento sobre Ele.
A alma forma com o corpo o homem mesmo, estando ambos interligados durante toda a
vida humana. Como já vimos, a alma produz as sensações e utiliza os sentidos corporais para
se manifestar face aos objetos externos, ou seja, a alma está diretamente ligada ao corpo e aos
seus sentidos. Dessa forma, a razão pode ser dividida em duas partes ou atividades (razão da
ação ou ciência e razão da contemplação): uma inferior, a qual se aplica sobre as coisas
sensíveis e temporais para entende-las, e cujo tipo de conhecimento Agostinho denomina de
ciência; e uma superior, que se aplica à contemplação e pela qual conhecemos as verdades
eternas e podemos vir a conhecer Deus. Todavia, a ciência e sabedoria são, para o nosso
pensador, dois tipos de conhecimento distintos: o primeiro diz respeito ao conhecimento
racional das coisas temporais, enquanto o segundo consiste no conhecimento intelectivo das
verdades eternas.
À guisa de conclusão, podemos afirmar que a verdade é tanto algo que está presente no
interior (na parte mais elevada da alma, a mens ou mente) de cada homem, mas é também
transcendente, pois é universal, e não particular. Vale ainda realçar que Agostinho expõe a
necessidade de, mediante a fé revelada e a Graça, buscarmos continuamente a purificação da
alma para que possamos nos desprender do que é efêmero e mutável e, iluminados,
alcançarmos as verdades eternar e, somente assim, chegarmos à contemplação daquele que é a
Verdade.
A razão, conforme já vimos, é superior à alma, mas Deus é superior à razão. Portanto,
para alcançarmos a Verdade (Deus mesmo) temos de transcender a razão, e isso só é possível
por meio do reconhecimento de que, sozinhos, somos incapazes de contemplar a Deus, e que
temos de ser assistidos pela Graça, e não somente pela razão. Em outras palavras, o nível de
perfeição do conhecimento é a contemplação da Verdade absoluta, ou seja, Deus mesmo, mas
a esse conhecimento nenhum homem alcança senão por meio da Iluminação Divina (que já
auxiliara a razão a ter acesso às verdades imutáveis), a qual Deus concede, em grau máximo, a
quem O busca de coração contrito e humilde.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
O Século XIII, faça-se saber, foi igualmente o período de grandes debates em torno dos
Universais, da difusão dos saberes, das disputas entre averroístas e antiaristotélicos. Não há
como estudar o “século das sínteses” sem investigar a vida e a obra de um frade mendicante
integrante da Ordem fundada por Domingos de Gusmão (1170-1221) e que será conhecido
pelo epíteto de “o boi mudo” e, após sua canonização (1323), ganhará os títulos de Doctor
Angelicus, Doctor Communis e Doctor Universalis. Tomás de Aquino é filho de seu tempo,
ou seja, é herdeiro de toda uma dialética motora da história que traz consigo um rico
arcabouço cultural, pois, graças à Igreja Católica, o imenso cabedal intelectual que durante
toda a Antiguidade Clássica havia sido conquistado não sucumbira às invasões e saques
bárbaros.
Devido a uma inteligência aguçada, amor às letras e à Igreja e por ter subido em “ombros
de gigantes”, como Aristóteles e Alberto Magno (seu admirável mestre), Tomás galgou os
altos patamares da especulação filosófica, tratou com esmero a relação entre a fé e a razão,
considerando haver certas verdades acerca de Deus que a razão não pode conhecer, mas
apenas demonstrar que não são impossíveis; mas, por outro lado, defendeu não existir nenhum
obstáculo entre a razão natural e a fé, pelo contrário, pelo exercício daquela, é possível
encontrar os fundamentos desta.
Justamente nesse ambiente de cultivo do conhecimento, desenvolveu-se um método de
ensino e aprendizagem baseado, sobretudo, em duas práticas escolásticas, a saber, a lectio e a
disputatio. Brevemente, apresentá-las-ei por entender que tais práticas foram de importância
capital para o aprimoramento do conhecimento; para a elaboração de questões influentes, não
só em teologia e filosofia, mas também em política; muito utilizadas por Tomás de Aquino
para a composição de suas sínteses; além de terem influenciado em demasia a constituição do
modelo de educação ocidental, cujos traços centrais podem ser encontrados ainda hoje nas
universidades.
A lectio consistia na leitura, sob a orientação dos mestres, das obras essenciais em cada
uma das disciplinas; enquanto a disputatio era o debate constituído de cinco momentos: a
proposição do problema, a hipótese, as objeções e a solução juntamente com a resposta às
objeções. A concentração do conteúdo produzido durante o cumprimento dessas cinco etapas
dava origem ao Artigo, e a reunião de Artigos que tratavam do mesmo tema originava as
Questões. Dessa formas as Questiones eram sempre temáticas, por exemplo, a obra De
Veritate ou Questões disputadas sobre a verdade (composto entre 1256 e 1259) é um
conjunto de Questiones Disputatas que versavam sobre a verdade.
A capacidade sensitiva divide-se em duas partes, a saber: uma externa, própria dos órgãos
dos sentidos, que captam as sensações dos objetos externos; e uma interna, que consiste na
imaginação e está relacionada com a parte sensível da alma, além de ser responsável por
agrupar as várias sensações e formar uma imagem correspondente do objeto. As sensações, ao
serem recebidas na parte sensível da alma, sofrem a ação da faculdade imaginativa
(capacidade sensitiva interna), a qual as reúne e as converte em uma imagem (ou fantasma) da
coisa sensível.
O processo de abstração realizado pelo intelecto agente sobre o fantasma dá origem a uma
espécie inteligível, que é a primeira coisa que o intelecto conhece, pois com ela passa a
conhecer as características mais gerais das coisas, aquilo que nelas é universal. Uma
advertência fundamental do Aquinate é que não existem, de maneira inata, espécies
inteligíveis na mente, pois estas só são produzidas mediante a ação do intelecto sobre o
fantasma, abstraindo deste a quididade, ou seja, extraindo-a e despojando-a dos traços
materiais singularizantes. Em outras palavras, é o intelecto agente que atualiza a quididade,
transmudando-a de potencialmente inteligível para atualmente inteligível.
O intelecto agente imprime a espécie inteligível no intelecto possível que, após recebê-la,
entra em ato, ou seja, intelige ou conhece. O intelecto possível, como podemos perceber até a
presente exposição, antes de receber a espécie inteligível, é puramente potencial. Entretanto,
após recebê-la, passa ao ato, isto é, àquilo que acima denominamos de intelecção, produzindo
os conceitos, os quais, por serem a expressão mental da essência abstrata ou determinação
inteligível da coisa, exprimem de modo universal a quididade extraída dos fantasmas. Tomás
de Aquino deixa claro que tanto a apreensão e a atualização da quididade (realizada pelo
intelecto agente) quanto a produção de conceitos (pelo intelecto possível) são a primeira
operação do intelecto.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA