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DIREITO

CONSTITUCIONAL
SOFIA ALVES CUNHA

FDUL

2019/2020
Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Universidade de Lisboa
Faculdade de Direito

Direito Constitucional II
2º Semestre 2019/2020

Docente: Jorge Reis Novais

Sofia Alves da Cunha

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 2


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Apontamentos realizados no ano letivo de 2019/2020 por Sofia Cunha, Turma C na


regência do Professor Doutor Jorge Reis Novais e assistência da Professora Doutora
Raquel Castro.

Os apontamentos foram realizados essencialmente com base nas aulas teóricas, com
apoio nos manuais aconselhados pela regência, contudo não dispensam a leitura dos
mesmos.

Manual de Direito Constitucional, Tomo V, 4º Edição (2010) do Professor Doutor Jorge


Miranda para a primeira parte da matéria que se prende com os atos legislativos e o
processo de elaboração dos mesmos por parte dos órgãos competentes.
E para auxílio da matéria relacionada com a fiscalização da constitucionalidade
encontramos como auxílio o livro do Professor Doutor Jorge Reis Novais, Sistema
Português de Fiscalização da Constitucionalidade Avaliação Critica, 2º Edição (2019).

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PROGRAMA DA CADEIRA DE DIREITO CONSTITUCIONAL II

REGENTE JORGE REIS NOVAIS

Introdução às funções do estado e à função legislativa em especial

1. As funções do Estado. O sentido jurídico da distinção de funções em Estado de Direito.

2. Função política (função de governo e função legislativa), função administrativa e


função jurisdicional. A distinção material e a caracterização geral de cada função.

3. A função legislativa. Os sentidos de lei. A lei em sentido material. A generalidade e


abstracção enquanto elementos da caracterização material da lei. O artigo 18º, 3, da
Constituição e o alcance da exigência de generalidade e abstracção nas leis restritivas.

A função legislativa na constituição de 1976

1. Os actos legislativos na Constituição portuguesa. O princípio da tipicidade dos actos


legislativos. Os órgãos com competência legislativa. A competência legislativa genérica
de Assembleia da República e governo. A competência limitada das assembleias
legislativas regionais.

2. A relação entre leis e decretos-leis.

Artigos da Constituição: 112º, 1 e 5; 161º, c); 198º, 1, a); 112º, 4; 227º, 1, a); 232º, 1;
112º, 2

3. O sentido e alcance da competência legislativa genérica, própria e reservada de


Assembleia da República e Governo.

4. A evolução histórica das competências legislativas dos executivos na passagem do


estado de Direito liberal para o Estado de Direito social.

5. O sentido e justificação de uma reserva de competência legislativa alargada da


Assembleia da República. Os diferentes tipos de reserva de competência legislativa da
Assembleia da República e o sentido de uma reserva limitada de competência legislativa
do Governo.

Artigos da Constituição: 161º, c; 198º, 1, a); 161º, 164º, 165º; 198º, 2; 161º, d); 166º, 3;
112º, 2, segunda parte

6. A competência legislativa das Regiões Autónomas. O sentido da evolução


constitucional sobre competência legislativa regional desde 1976 até à revisão
constitucional de 2004.

7. Os actuais limites da competência legislativa regional e as dúvidas suscitadas pelo


Tribunal Constitucional a propósito do "âmbito regional" da legislação regional.

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8. A repartição de competências normativas entre o Governo e a Assembleia legislativa


regional. As competências exclusivas da Assembleia Legislativa Regional no domínio da
função legislativa e da competência regulamentar.

9. As relações entre os actos legislativos emanados dos órgãos de soberania e os decretos


legislativos regionais.

Artigos da Constituição: Art. 112º, 4; art. 227º; art. 232º, 1.; Art. 228º, 1 e 2

10. A competência legislativa da Assembleia da República.

11. A distinção entre leis constitucionais e leis ordinárias e o vício de


inconstitucionalidade.

12. A distinção entre leis de valor reforçado e leis comuns e a figura da ilegalidade dos
actos legislativos ou inconstitucionalidade indirecta.

13. Vários tipos de leis ordinárias reforçadas: as leis reforçadas pelo procedimento (leis
orgânicas e leis aprovadas por maioria qualificada) e as leis pressuposto normativo
necessário de outras leis (leis de autorização legislativa e leis de bases).

14. Os estatutos político-administrativos das regiões autónomas enquanto leis reforçadas


de alcance e vinculação gerais.

15. As características especiais das leis orgânicas.

Artigos da Constituição: Art. 280º, 2; art. 112º, 3; art. 166º.; Art. 116º, 2; art. 168º, 5 e 6.;
Art. 112º, 2, segunda parte.; Art. 226º.

16. As leis de bases e os decretos-leis de desenvolvimento. As leis de autorização


legislativa e os decretos-leis feitos no uso de autorização legislativa.

Artigos da Constituição: art. 112º, 2 e 3; art. 198º, nº 1, b) e c), e nº 3; art. 161º, d) e e);
art. 165º, nºs 2, 3, 4 e 5

17. As leis de enquadramento ou leis-quadro (exemplo da lei de enquadramento do


Orçamento em relação com a lei do Orçamento)

Artigos da Constituição: Art. 112º, nº 3; art. 106º, nº 1; art. 161º, g)

18. O processo legislativo parlamentar. A competência de iniciativa.

19. A iniciativa legislativa: os limites da iniciativa legislativa dos deputados, Governo e


assembleias regionais. A cláusula-travão.

20. A discussão e votação.

21. A promulgação e a assinatura do Representante da República nas Regiões Autónomas.


O regime do veto.

22. A referenda e a publicação.

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Artigos da Constituição: art. 167º; art. 168º, art. 116º; art. 134º, b), art. 136º, art. 233º; art.
137º; art. 140º, art. 119º

23. A competência legislativa do Governo e a apreciação dos decretos-leis por parte da


Assembleia da República.

24. A primazia legislativa da Assembleia da República relativamente ao Governo.

25. A competência legislativa das assembleias regionais e a apreciação de decretos


legislativos regionais por parte da Assembleia da República.

Artigos da Constituição: art. 198º, art. 162º, c), art. 169º; art. 227º

A garantia da constituição: as alterações da constituição

1. A garantia da Constituição: Constituição rígida e alteração da Constituição.

2. Os diferentes tipos de alteração da Constituição. Ruptura e reforma da Constituição.

3. As rupturas: a revolução e a ruptura não revolucionária.

4. As reformas: a revisão e a transição constitucional.

5. Introdução ao estudo da revisão constitucional: categorização dogmática e histórico,


seu regime na Constituição portuguesa e seus limites procedimentais.

6. Os limites de revisão constitucional. Conceito e tipos.

7. Os limites materiais de revisão.

Artigos da Constituição: Arts. 284º, 285º, 286º, 288º, 289º

8. As revisões constitucionais ocorridas durante a vigência da Constituição de 1976.

A garantia da constituição: a fiscalização da constitucionalidade

1. Introdução ao estudo da fiscalização da constitucionalidade: conceito, matrizes e tipos


e inserção na Constituição portuguesa como garantia da Constituição.

2. Fiscalização da constitucionalidade: órgãos competentes para fiscalizar a


constitucionalidade na Constituição portuguesa.

3. Fiscalização preventiva: função constitucional e pressupostos processuais. Regime das


decisões de provimento e não provimento.

4. Fiscalização sucessiva abstracta: função constitucional, pressupostos e tramitação


processuais.

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5. Fiscalização sucessiva abstracta: decisões de provimento e de não provimento,


incluindo limitação de efeitos ao abrigo do artigo 282.º/4 da Constituição e breve
referência à problemática das decisões interpretativas, redutivas, aditivas e substitutivas.

6. A fiscalização concreta de constitucionalidade e de ilegalidade. O art. 204º e o acesso


directo dos juízes comuns à Constituição, reflectindo-se em decisões judiciais de
aplicação ou de recusa de aplicação de normas em vigor. O art. 280º da Constituição e a
Lei Orgânica do Tribunal Constitucional e o regime de recursos para o Tribunal
Constitucional.

7. O art. 281º, nº 3, da Constituição e o sentido da ligação entre a fiscalização sucessiva


abstracta e concreta.

8. A fiscalização da inconstitucionalidade por omissão e os seus limites (art. 283º da


Constituição).

Artigos da Constituição: Art. 204º, 278º279º, 280º, 281º, 282º, 283º

Avaliação do sistema português de fiscalização em confronto com os modelos


vigentes em direito comparado

1. Avaliação global do sistema português de fiscalização da constitucionalidade enquanto


fiscalização dirigida exclusivamente à apreciação da constitucionalidade de normas.

2. Os défices de protecção evidenciados pelo sistema português de fiscalização sempre


que a lesão de direitos fundamentais é praticada através de actos individuais e concretos
(administrativos ou judiciais) e não através de normas.

3. A tentativa de o Tribunal Constitucional superar esses défices de protecção através do


alargamento do conceito de norma sujeita a fiscalização.

4. A fiscalização concreta e a ampliação que o Tribunal Constitucional faz do conceito


de norma para efeitos de fiscalização: benefícios e desvantagens.

5. A comparação com o modelo europeu com recurso de amparo.

6. Ausência de protecção nas situações de violação dos direitos fundamentais por


omissão.

7. Ausência de protecção dos direitos fundamentais nas relações entre privados.

8. Os riscos de insegurança e desigualdade na admissão de recursos por parte do Tribunal


Constitucional.

9. A irracionalidade da possibilidade de arguição temporalmente irrestrita de


inconstitucionalidades orgânicas e formais.

10. A possibilidade de utilização indiscriminada do sistema de fiscalização para fins


inapropriados.

11. A comparação com o modelo americano e com o modelo europeu que acolhe o recurso
de amparo e o reenvio prejudicial.

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AS FUNÇÕES POLÍTICAS DO ESTADO

As funções do Estado têm que ver com os vários fins que o Estado de Direito tem e
assume, como por exemplo, a proteção e realização dos direitos fundamentais. Todos
esses fins são desenvolvidos pelo aparelho de Estado através de atividades que
designamos pelas várias funções do Estado.
1
Assim a função do Estado pode ser encarada em duas ascensões, como um fim ou como
uma atividade.
Quando encarada como um fim a função do Estado traduz-se num princípio de
legitimação do exercício do poder e pode ser prosseguido tanto pelos órgãos como por
grupos e entidades civis. Podemos ver a sua consagração constitucional no Artigo 9º, que
já foi suscetível de diversas revisões devido à complexidade das funções devido ao
alargamento das necessidades humanas.
A função entroncada nos atos e atividades do Estado pretende definir o modelo de
comportamento para prosseguir o fim do Estado. Têm em vista tipificar o exercício do
poder pelo que vem tutelada nas normas que se prendem com a organização do poder
político. A função no sentido de atividade é especifica, duradoura e globalizada.

Função política

Nesta função definem-se as políticas que o Estado vai desenvolver, a natureza e o


conteúdo dessas políticas ou as escolhas das políticas públicas que se desenvolvem.
O Estado, em função dos diferentes governos que ocupam o aparelho de Estado, com
programas e perspetivas diferentes e dependendo dos resultados eleitorais, define a
política em geral e as políticas concretas que vai desenvolver (que em princípio colocou
no seu programa eleitoral).
Assim, esta é uma função criativa, de definição primária, onde se fazem as primeiras
escolhas.

Dentro desta função podemos encontrar outras duas funções:

o Função Governativa
Corresponde ao Governo e à governação quotidiana. O Governo assume a direção da
política do Estado e faz as opções de natureza política que se colocam nos diferentes
setores. Esta função é suscetível de ser levada a cabo sem uma definição jurídica estável,
pública ou conhecida de quais são as opções fundamentais do Estado, quais os objetivos
que este pretende prosseguir ou as regras que a sociedade deve seguir. Por vezes, existem
questões fraturantes na sociedade, que esta discute, surgem várias perspetivas políticas e
posições diferenciadas e depois há a aprovação de uma lei que naquele domínio específico
regula os direitos, os deveres e as obrigações a que os cidadãos estão sujeitos e passam a
ser titulares ou destinatários. Esta é uma função de escolha, de definição primária, através
de regras com natureza, em princípio, geral, abstrata e de carácter inovatório.
Geral no sentido em que se aplica a toda a categoria de pessoas que está envolvida naquele
domínio; regras abstratas no sentido em que se aplicam a todos os casos naquele domínio,
e com um conteúdo inovatório no sentido em que uma nova lei altera o regime anterior.

1 Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, Tomo V, Coimbra, 4º Edição 2010, páginas 7 a 12

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o Função legislativa
É uma função de natureza política que se traduz na feitura de leis gerais, abstratas e de
carácter inovatório. É uma função primária que está sujeita à Constituição, visto que toda
e qualquer lei tem que respeitar a Constituição. Em Portugal, quem faz lei, os órgãos que
têm competência legislativa são a Assembleia da República, o Governo e as Assembleias
Legislativas Regionais (das Regiões Autónomas).

Função administrativa ou executiva

Nesta função executam-se as leis que foram previamente aprovadas. É aqui que, em
termos materiais, o Estado desenvolve uma atuação permanente e quotidiana de prestação
de bens, de serviços públicos, de resolução de problemas que, por vezes, surgem, mas fá-
lo sempre de acordo com a lei. O Estado, os seus funcionários e os vários serviços
administrativos desenvolvem a sua atividade praticando atos administrativos na resolução
de problemas pontuais e concretos que surgem, sempre no cumprimento da lei, de acordo
com o princípio da legalidade da administração. Conclui-se então que esta função está
sujeita à lei.
Este princípio é fundamental porque em Estado de Direito os cidadãos sabem com o que
é que podem contar, visto que a lei é feita de uma forma pública, os cidadãos conhecem-
na e sabem que tudo aquilo que a administração faz tem de ser de acordo com a lei. Se os
poderes constituídos contrariarem a lei, falamos em ilegalidade.
Nota: Inconstitucionalidade é quando os poderes constituídos contrariam a Constituição.
Existe uma cadeia normativa hierárquica composta por Constituição, Lei e Ato
Administrativo.
O Tribunal Constitucional e os tribunais é que fiscalizam a constitucionalidade das leis.

Função jurisdicional ou judicial

Esta função completa um sistema racional, de alguma complexidade, mas perfeitamente


articulado.
A Constituição define um quadro, define quais são os direitos, como é que se formam os
vários órgãos de exercício do poder e como é a separação de poderes entre eles; depois,
no exercício da atividade estatal, temos as diferentes funções.
Caso hajam conflitos ou questões jurídicas a resolver, os tribunais são chamados a
intervir.
Esta função surge com uma natureza diversa, no sentido em que tem uma posição de
maior independência funcional relativamente aos outros poderes, que estavam articulados
numa relação hierárquica.
Em Estado de Direito e, sobretudo, depois da segunda metade do século XX, o poder
judicial foi ganhando uma importância extraordinária.
O poder judicial tem competência para verificar e resolver todos os conflitos jurídicos da
mais diferente natureza ou problemas de constitucionalidade ou de legalidade que
envolvam os outros poderes.
Assim, os tribunais de Estado de Direito têm de ser independentes, não podem estar
subordinados a outros poderes, apenas à lei em geral.
Antes dizia-se que para um juiz ser verdadeiramente independente, ele tinha de ser a boca
que pronuncia as palavras da lei. Contudo, com a evolução do Estado de Direito,
verificámos que isto não se passa bem assim, por um lado, porque a própria lei está sujeita
à Constituição e, por outro lado, porque a função judicial é muito mais complexa do que
simplesmente dizer as palavras da lei.

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Atualmente, a função judicial tem um peso e uma força muito diferentes do que tinham
início do século XX e o juiz quando aplica a lei deve-se também preocupar com os
princípios constitucionais.

Exemplo: Caso de uma senhora do Porto que quer engravidar através de inseminação
artificial com o esperma do marido morto, contudo, há uma lei que proíbe a inseminação
artificial post mortem.
Portanto, com o objetivo de cumprir e respeitar os princípios constitucionais, o juiz
chamado a apreciar o caso pode e deve recusar-se a aplicar a lei em nome dos princípios
constitucionais.
As pessoas hoje em dia não estão reféns da lei de forma cega, se a lei for contra algum
princípio constitucional, a pessoa pode recorrer aos tribunais.

Quadro Síntese:

Funções C. Materiais C. Formais C. Orgânicos


Definição Liberdade máxima,
primária e global contudo Órgãos e colégios em
do interesse subordinada à conexão direta com a
público; Constituição; forma de governo e o
Política Interpretação dos Liberdade de sistema de governo
(governativa e fins do Estado e escolha quanto ao Havendo pluralidade de
legislativa) escolha dos conteúdo, tempo e órgãos, ausência de
meios adequados circunstâncias ou hierarquia e apenas
para os atingir; não tendo liberdade relação de
Direção do tem ausência de responsabilidade política
Estado sanções jurídicas
Dependência funcional,
com sujeição, no interior
Satisfação
de cada sistema a ordens
constante e
Iniciativa e instruções
quotidiana das
Parcialidade na Coordenação e
Administrativa necessidades
prossecução do subordinação, com mais
coletivas;
interesse publico ou menos centralização e
prestação de bens
concentração ou
e serviços
descentralização ou
desconcentração
Independência de cada
Declaração do
órgão, sem prejuízo de
direito; decisão
recurso a órgãos
de questões
Passividade superiores
Jurisdicional jurídicas, seja em
Imparcialidade Em princípio a atribuição
concreto perante
a órgãos específicos, os
situações da vida,
tribunais, formados por
seja em abstrato
juízes

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ATOS LEGISLATIVOS

As características da lei e da função legislativa são:

o Generalidade
Geral porque a lei é aplicável a todas as pessoas que se encontram na sua previsão, a todas
as pessoas que estejam ou possam vir a estar naquela situação. Geral contrapõe-se a
individual, no sentido em que uma lei individual aplica-se só a uma pessoa ou a várias
pessoas que podem ser concretamente determinadas, ou seja, a lei não é aplicada a todas
as pessoas, mas sim só aquelas pessoas.

o Abstração
Abstrata tem que ver com os casos a que a lei vai ser aplicada, ou seja, quando nós não
conseguimos determinar à partida quais são as situações em que aquela lei vai ser
aplicada.

o Sentido inovatório
No entanto, estas características são apenas uma tendência, ou seja, podemos ter leis que
não têm estas características. Contudo, há uma nítida distinção entre o que é a função
administrativa e a função legislativa. A função administrativa traduz-se, sobretudo, na
realização de atos pontuais e concretos.

Quando falamos em “Lei”, isto pode ter vários sentidos ou significados:

Sentido Orgânico
Lei enquanto ato legislativo com designação precisa de lei

Sentido Formal
Tem que ver com os atos legislativos que a ordem jurídica reconhece.

Sentido Material
Falar em lei com um sentido simplesmente de Direito; quando dizemos “a lei não permite
isto”, não estamos a falar de nenhuma lei concreta, mas sim nas normas jurídicas em
geral, naquilo que o Direito permite ou não.

CRP: Artigo 112º/1


Em Portugal, os atos legislativos são:
• Leis
• Decretos-leis
• Decretos legislativos regionais

CRP: Artigo 112º/1+5


Princípio da tipicidade
A tipicidade das formas de lei é o primeiro princípio enunciado no artigo 112º: um
preceito-chave da Constituição quanto à modelação concreta do princípio da separação
de poderes a respeito dos principais atos normativos.

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Dele decorrendo desde logo o seguinte:


• O princípio da fixação da competência legislativa pela Constituição, que submete
os correspondentes atos a um cuidadoso e articulado regime.

• Na Constituição da República Portuguesa, são atos legislativos os atos emanados


da Assembleia da República, do Governo e das Assembleias Legislativas
Regionais que revistam forma de lei, independentemente do seu conteúdo.

• Na Constituição, a forma geral de “lei ordinária” compreende apenas três formas


especificas de lei (caracter taxativo das formas de lei): a lei o decreto lei e o
decreto legislativo regional.

• Estando reservada à constituição a definição das formas de lei, nenhum ato


legislativo- e, por maioria de razão, nenhum outro ato do poder político (salvo a
lei de revisão constitucional), pode criar outras formas de lei CRP: artigo112.º/5,
1ªparte

• Pelo menos no que constitua domínio da reserva de lei (e sem prejuízo de outras
dificuldades), nenhum ato legislativo pode conferir a atos de outra natureza o
poder de, com eficácia externa, interpretar, integrar, modificar, suspender ou
revogar qualquer dos seus preceitos (CRP: 112/5, 2º parte), razão pela qual a
regra é a de que- salvo por exceções diversas previstas na CRP um ato legislativo
só pode ser afetado por outro ato legislativo.

CRP: Artigo 161º, c)


Compete à Assembleia da República fazer leis sobre todas as matérias.
Os atos legislativos aprovados pela Assembleia da República são as leis.

CRP: Artigo 198º/1, a)


Decretos-leis são os atos legislativos aprovados pelos Governo.

CRP: Artigo 112º/4


Os decretos legislativos aplicam-se só nas regiões autónomas.

CRP: Artigo 227º/1, a)


Este artigo diz que as regiões autónomas têm poder legislativo, mas não diz quem é que
nas regiões autónomas têm o poder de fazer decretos legislativos regionais.
Sabemos que nas regiões autónomas há dois órgãos de governo próprio, os governos
regionais e as assembleias legislativas regionais, mas só um deles tem o poder de fazer
decretos legislativos.
CRP: Artigo 232º/1
Nas regiões autónomas quem tem competência para legislar são as Assembleias
regionais.

Em Portugal, os órgãos legislativos são:


• Assembleia da República
• Governo
• Assembleias Legislativas Regionais das Regiões Autónomas

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Naturalmente que não é tudo igual, os decretos legislativos regionais têm um âmbito
regional e só se aplicam na região autónoma, enquanto que as leis e os decretos-leis, em
regra, têm âmbito nacional.
Em todo o caso, se uma lei e um decreto-lei dispuserem em sentido contrário, prevalece
aquele que for mais recente.

CRP: Artigo 112º/2


Indica-nos que ambos os atos legislativos têm igual valor, por isso, como o critério da
hierarquia não resolve o problema, prevalece o critério temporal.
Exemplo: Decreto-lei de 2020 prevalece sobre uma lei de 1976 – “lei posterior revoga lei
anterior”.

CRP: 112º/2, 1º parte


Decorre o princípio da paridade hierárquica entre a lei e o decreto-lei, que se traduz na
possibilidade de, nas matérias da área concorrencial e no respeito pelas relações de
subordinação a certas leis, lei e decreto lei se interpretarem, suspenderem e revogarem
mutuamente.

CRP: 112º/2, 2º parte


Resulta que certos atos legislativos (os decretos leis autorizados e os decretos leis de
desenvolvimento) se encontram numa relação de subordinação especifica relativamente
a outras categorias de atos legislativos parlamentares (leis de autorização e leis de bases),
por estes serem dotados de parametricidade (primariedade ou hierarquia) material,
devendo os decretos leis de desenvolvimento respeitar as leis de bases do Parlamento,
versem estas sobre matéria da competência reservada da Assembleia da República ou
sobre a matéria concorrencial

CRP: Artigo 161º, c)


A Assembleia da República tem uma competência genérica, pode legislar sobre todas as
matérias, exceto as que estão reservadas ao Governo.

CRP: Artigo 198º


Indica-nos quais são as matérias em que o Governo pode legislar.

CRP: Artigo 198º/2


Indica-nos as matérias de exclusiva competência do Governo.

Caso Prático:
Atendo ao caso do Marega, a Assembleia da República faz uma lei de combate ao racismo
no desporto, estabelecendo que o Governo deve criar uma secretaria geral dedicada ao
racismo.
Quid iuris?
Isto não é possível pois segundo o artigo 198º/2, apenas o Governo pode legislar a cerca
de aspetos respeitantes à sua própria organização e funcionamento.

CRP: Artigo 198/1, a)


O Governo só pode legislar em matérias que não estejam reservadas à Assembleia da
República.

CRP: Artigos 161º e 164º


São da reserva absoluta da Assembleia da República.

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CRP: Artigo 165º


São da sua reserva relativa, ou seja, a Assembleia da República pode autorizar o Governo
a legislar sobre essas matérias.

A matéria reservada à Assembleia da República é bastante mais que a matéria reservada


ao Governo. A Assembleia da República legisla maioritariamente sobre tudo o que
respeita a direitos fundamentais, liberdades e garantias e sobre questões políticas mais
importantes.

A Assembleia da República é o principal órgão legislativo porque tem uma legitimidade


democrática direta, o Governo também tem legitimidade democrática, mas depende da
Assembleia, por isso, as matérias mais importantes são atribuídas à Assembleia da
República.

Isto acontece não só por uma questão de legitimidade, mas também de publicidade e
democracidade. Publicidade porque toda a gente sabe aquilo que a Assembleia faz e
democracidade porque na Assembleia da República estão presentes as várias correntes
políticas.

Apesar de o Governo legislar bastante mais que a Assembleia da República, as matérias


mais importantes são atribuídas à Assembleia da República. É por isso que, apesar de ter
havido uma evolução da função legislativa no sentido de atribuir competências
legislativas aos governos, ainda assim há diferenças.

No século XIX só as Assembleias legislavam, mas nos séculos XX e XXI os Governos


adquiriram também essa função e passaram mesmo a legislar mais que os Parlamentos,
seja qual for o sistema de governo. Porquê?
Porque é o Governo que se confronta em primeira linha com os problemas dos cidadãos
e precisa de dar respostas imediatas.
Exemplo: corona vírus.

Por vezes o Governo depara-se com situações em que não pode legislar sobre determinada
matéria, nesses casos, pode pedir autorização à Assembleia da República ou, se for
mesmo da reserva absoluta da Assembleia, pode enviar para ela uma proposta de lei.
Exemplo 1: O Governo apresenta na Assembleia da República uma proposta de lei sobre
a eleição dos órgãos de soberania. Pode o Governo fazer isto visto que o artigo 164º, a)
CRP diz que essa é uma matéria da reserva absoluta da AR? Pode, porque o Governo não
está a legislar sobre essa matéria, está apenas a propor à AR uma forma de legislar.
Exemplo 2: O Governo pode apresentar à AR uma proposta de lei sobre uma matéria não
reservada à AR, mas não faz muito sentido porque o próprio Governo pode legislar

Tanto o Governo como a Assembleia da república têm competência legislativa genérica,


ou seja, podem legislar sobre tudo menos o que esta reservado ao outro órgão:

• Assembleia da República pode legislar sobre todas as matérias menos organização


e funcionamento do governo, pois esta é de exclusividade legislativa do Governo.

• O Governo pode legislar sobre todas as matérias menos as que estão reservadas á
Assembleia da República.

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CRP: Artigo 164º, 165º e 161º


Reserva da Assembleia da República

As Assembleias Legislativas Regionais não podem legislar sobre matérias reservadas à


Assembleia da República e ao Governo
Tem competência legislativa limitada, só podem legislar sobre a matérias que estiverem
especificamente enumeradas no respetivo estatuto político administrativo regional

CRP: Artigo 112º/ 4


Os decretos têm âmbito regional

O estatuto das regiões pode se quiser enumerar todas as matérias possíveis e foi o que fez
o estatuto dos Açores, pode legislar sobre todas porque todas lá estão, o que dá uma
competência praticamente total.

Quando uma lei viola a Constituição há́ inconstitucionalidade, caso um decreto-lei ou lei
viole uma lei, há́ ilegalidade , porém, pode ser chamado de inconstitucionalidade indireta,
pois, apesar do decreto não violar diretamente a Constituição, a mesma não permite que
haja violação de leis; portanto, há́ uma violação indireta.

Inconstitucionalidade indireta
Mesma coisa que a ilegalidade. É uma violação indireta da Constituição.
Exemplo: quando uma lei de valor inferior viola uma lei de valor superior, o vício é a
ilegalidade, porém, essa lei tem um valor superior à outra pois isto está definido na
Constituição. Logo, a ilegalidade é uma inconstitucionalidade indireta, pois a base legal
que é violada é a Constituição, pois quem definiu que a lei X é superior à lei Y foi a
Constituição.

Inconstitucionalidade material
Conteúdo da lei contraria o conteúdo da Constituição;

Inconstitucionalidade orgânica
Aprovada por órgão que não tinha competência;
Exemplo: Greve dos enfermeiros, o Governo resolve alterar a legislação do direito a
greve, pode ele legislar sobre essa matéria?
Pode, desde que o Assembleia autorize o Governo a legislar sobre, de acordo com o
Artigo 165º/b). O Governo, então, faz um decreto-lei sobre essa matéria em maio no setor
público, e em junho, faz outro decreto de lei sobre greve no setor privado e alterou
algumas disposições sobre o primeiro decreto de lei.

CRP: Artigo 165º/3 Não poderia ter feito isso, uma vez que o Governo não pode utilizar
a mesma autorização mais de uma vez, esse, pode legislar em partes, porém, voltou atrás
e legislou sobre uma matéria que já tinha sido legislada (no segundo decreto, alterou o
primeiro). CRP: Artigo 165º/2 A autorização legislativa tem requisitos, é necessário
dizer o objecto, o sentido, a extensão e a duração da autorização legislativa, caso não
obedeça essas questões, há uma Autorização de lei branca, gerando um
inconstitucionalidade orgânica.

Inconstitucionalidade formal

Processo não seguiu os requisitos previstos na Constituição (exemplo: aprovar lei sem
maioria absoluta exigida por lei).

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 15


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TIPOS DE LEIS EMANADAS

É claro para todos que as Leis emanam da Assembleia da república e os decretos leis do
Governo. Vamos agora focar-nos na legislação especificamente realizada pela
Assembleia da República.

CRP: Artigo 166º


Há diferentes tipos de atos aprovados pela Assembleia da República:

CRP: 166º / 1
Leis que alteram a constituição, as revisões são aprovadas pela assembleia, mas tem um
valor próprio pois estão no plano da constituição.
Lei ordinal contraria a lei constitucional; inconstitucionalidade

CRP: 166º / 2
Leis orgânicas

CRP: 166º / 3
Outros atos legislativos em forma de lei

CRP: Artigo 168º / 5


Leis que carecem de uma maioria absoluta, como as leis orgânicas

CRP: Artigo 168º / 6


Leis que carecem de 2/3 para serem aprovadas

CRP: Artigo 112º / 3


Várias modalidades de leis de valor reforçado, devem ser respeitadas por outras leis, se
uma lei ordinária não respeite uma lei que deve respeitar há uma invalidade designada
ilegalidade. Ilegalidade é o vicio imediato, mas também há inconstitucionalidade indireta
pois foi a constituição que estabeleceu a superioridade no artigo 112º/3.

Perante esta disposição, é possível descortinar a distinção entre leis comuns e leis
reforçadas:
Dentro das leis ordinárias temos leis com valor reforçado:
o Leis orgânicas
o Leis que são pressupostos normativo necessários a outras:
• Leis de base
• Leis de autorização legislativa Lei Reforçada
o Outras que a constituição designe:
Ilegalidade
• Estatuto das Regiões Autónoma
• Leis de Enquadramento Lei Ordinária
o Leis que carecem de aprovação de maioria de 2/3

Se estas são as leis de valor reforçado todas as outras são leis comuns

Sendo diversos critérios que presidem à identificação das leis reforçadas, o único traço
de união entre elas é o de que as mesmas deveriam servir como parâmetro de controlo da
validade de outras leis, paralelo ao controlo da constitucionalidade.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 16


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Dito isto uma vez que vigora nesta matéria ma verdadeira reserva de constituição, os 3
critérios relevantes para uma lei de valor reforçado são:
• Procedimento agravado
• Função de pressuposto normativo (a qual Gomes Canotilho designa de
parametricidade especifica)
• Parametricidade material.

Sendo evidente a aproximação entre o segundo e o terceiro dos critérios, agora referidos,
podemos no final, acompanhar a posição acompanhada na doutrina a qual postula que os
critérios enunciados no artigo 112/3, se podem reconduzir a dois critérios:
• O da atribuição de valor reforçado a leis que, em razão do seu procedimento
especial, ostentam uma maior rigidez ou força passiva;
• O da atribuição de valor reforçado as leis que, por foça da Constituição sejam
pressupostos necessário ou parâmetro material de ouras leis, devendo por estas
ser respeitadas.

Leis de Valor Reforçado pelo Procedimento

O primeiro grupo de leis reforçadas compreende as leis orgânicas e as leis (ou disposições
de leis) aprovadas por maioria de 2/3, leis essas que pelo facto de serem da reserva do
Parlamento e exigirem maiorias qualificadas na sua aprovação, preenchem determinadas
finalidades politicas, como a da proteção das minorias, a do reforço do Parlamento na sua
relação com o Governo, bem como a da estabilização, através de um consenso alargado,
de um conjunto de regimes jurídicos em matérias ais sensíveis do ponto de vista politico-
constitucional.

o Leis orgânicas
As leis orgânicas são 12 leis
CRP: Artigo 166º/2
taxativamente indicadas, com o título formal de leis orgânicas
CRP: Artigo 112º/3
às quais a constituição confere expressamente a qualificação de leis reforçadas

As leis orgânicas são leis que devem esgotar o tratamento da matéria sobre que incidam,
não podendo delegar para leis não orgânicas nada que corresponda ao seu âmbito
material, vigorando aqui uma reserva de densificação total.
Exceção: CRP: Artigo 264º d), 2ª parte
As matérias sobre as quais podem incidir as leis orgânicas são muito variadas, envolvendo
desde as relativas a eleições, ao referendo, ao estado de sítio e ao estatuto dos titulares
dos órgãos políticos, à organização e ao funcionamento do Tribunal Constitucional e à
organização da defesa nacional, até ao regime da nacionalidade, das associações e
partidos políticos e ao sistema de informações, bem como ao regime das finanças das
regiões autónomas e à lei de criação das regiões administrativas.

Mais uma vez vigorando o princípio da tipicidade dos atos não há matérias de lei orgânica
fora do âmbito do 166/2.
Nota: Outra lei orgânica, para não fazer confusão, é a de organização e funcionamento do
governo

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 17


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As leis orgânicas emanadas pela Assembleia apresentam algumas especificidades:

CRP: Artigo 168º / 5


São aprovadas por maioria absoluta em efetividade de funções

CRP: Artigo 116º / 3


Normalmente não é assim que ocorre, geralmente a maioria exigida é a maioria relativa.

Neste artigo encontramos uma distinção entre:


• Maioria relativa: mais votos a favor que contra
• Maioria absoluta: mais de 50 %, de quê? Depende do que a constituição disser,
pode ser dos deputados em efetividade de funções, 116, ou dos deputados
presentes

CRP: Artigo 136º / 2


Regime de veto politicado/qualificado

A regra geral é que para superar o veto é maioria absoluta, contudo por vezes é necessária
maioria de 2/3. Quando o Presidente da República veta um diploma correspondente a uma
lei orgânica tem de haver maioria absoluta de 2/3 desde de que superior à maioria dos
deputados em efetividade de funções.

CRP: Artigo 278º


Fiscalização preventiva

Geralmente quem pode pedir a fiscalização preventiva da constitucionalidade é o


Presidente da República, contudo, nas leis orgânicas a fiscalização pode ser requerida
também pelo Primeiro Ministro e por 1/5 dos deputados.

CRP: Artigo 278º/7


Promulgação vedada

O Presidente da república, devido a tal, está impedido de promulgar (e por ventura


também de vetar) o correspondente decreto sem que decorra o prazo de oito dias após a
respetiva receção ou, tendo havido fiscalização preventiva, antes de o Tribunal
Constitucional se ter pronunciado.

o Leis (ou disposições de leis) aprovadas por maioria de 2/3


Enunciadas no CRP: Artigo 168º/6

CRP: 168/6, a), b), c)


Podemos estar diante de “leis autónomas”, ao passo que nas demais alíneas se estará
apenas diante de disposições inseridas em leis de diversa natureza.

Uma vez que a constituição não distingue quais as votações em que se requer a maioria
de 2/3 dos deputados presentes, desde que superior à maioria absoluta dos deputados em
efetividade de funções, o interprete deve partir do principio de que essa maioria é
requerida nas três votações, apesar de haver ai discussões doutrinais, especialmente no

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 18


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caso das “disposições de leis” por alegadamente revelar ai apenas a votação na


especialidade.

Em caso de veto politico, uma vez que a CRP nada prevê a respeito da maioria necessária
para a respetiva superação, poderia em tese admitir-se quer a alternativa de estar afastado
o veto politico, por falta de previsão, quer a alternativa mais condizente com o principio
da adequação funcional e com o argumento de maioria de razão , de essas leis serem
submetidas ao regime do veto qualificado artigo 136º/3.

As leis reforçadas pela parametricidade material

No segundo grupo de leis reforçadas, encontram-se as leis que têm uma capacidade de
vincularem o conteúdo de outras leis, havendo a referir entre as principais subcategorias-
onde não se deve incluir o Regimento, por não se tratar de um ato legislativo, as leis de
bases, as leis de autorização legislativa e as leis de enquadramento.

o Leis Bases
São leis que são pressupostos normativo necessário de outras.
Têm força especial relativamente aos decretos-leis feitos para a desenvolver.

As Leis de base tocam em temas como saúde, ensino, segurança social etc, contudo não
conseguem esgotar todo o regime daquele sector. Limitam-se a estabelecer as bases, os
grandes princípios. Logicamente em qualquer destes domínios será necessário que haja
outros atos legislativo que preencham, dê densidade aos grandes princípios, estamos a
falar de decretos leis de desenvolvimento.

As leis de bases correspondem a uma subcategoria relativamente autónoma de leis que


definem as opções politico-legislativas fundamentais ou as traves mestras de um
determinado regime jurídico, fixando um conjunto de princípios carecidos de posterior
desenvolvimento a fazer por legislação complementar a elas subordinada.
Trata-se de leis impulsionadoras, diretivas, incompletas e pouco densas, que traçam as
linhas orientadoras que devem obrigatoriamente ser seguidas pela legislação de
desenvolvimento. A supremacia das leis de bases sobre as leis de desenvolvimento
verifica-se em todos os tipos de matérias, não apenas nas da reserva da Assembleia da
Republica.

Quanto à competência para a feitura destas leis, em tese geral, todos os órgãos legislativos
as podem aprovar.

A questão que se põe, no entanto, é de saber se as leis de bases aprovadas por órgãos que
não a Assembleia da República são verdadeiras leis reforçadas ou apenas leis que
autolimitam e racionalizam a produção normativa dos órgãos de que provém.

Na verdade, além da própria designação (leis de bases), alem do precedente histórico


vindo da Constituição de 1933 e além do que é possível extrair dos trabalhos preparatórios
da revisão constitucional de 1982, o texto e a estrutura da Constituição depõem no sentido
de que apenas as leis de bases da Assembleia da República (e as do Governo emitidas ao
abrigo de Lei de Autorização Legislativa) se devem ter por leis de valor reforçado pela
sua parametricidade material pelas seguintes razões:

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 19


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• CRP: Artigo 112º/2 alude expressamente à subordinação dos decretos-leis às


“bases gerais dos regimes jurídicos”, sendo que a CRP apenas se refere a bases
gerais no âmbito da competência da Assembleia da República
• CRP: Artigo 227º/1 c) aponta no mesmo sentido ao permitir as regiões
autónomas o desenvolvimento dos princípios ou das bases gerais dos regimes
jurídicos contidos em lei que a ele se circunscrevam.
• Subjacente à ideia de leis de bases parece ter estado a intenção de assegurar a
intervenção legislativa primaria da Assembleia da República permitindo ao
Governo e às Assembleias Regionais legislar sobre a mesma matéria, uma vez
fixadas as bases gerais através de uma lei do parlamento. Com isto se preserva o
primado do Parlamento e uma adequada divisão do trabalho legislativo.
• Quanto à estrutura da Constituição, a supremacia das leis de bases da Assembleia
da República sobre os decretos-leis do Governo foi afirmada na revisão
constitucional de 1982 com o fim de restringir os poderes legislativos do Governo,
cuja latitude nos termos da redação primitiva do texto de 1976 foi reconhecida
como pouco compatível com o Estado de Direito Democrático e demasiado
influenciada pelo regime constitucional de 1933, na opinião de Gomes Canotilho.

O desenvolvimento de leis de bases tem de ser feito necessariamente por ato legislativo,
com exclusão do regulamento administrativo.

Estes estão subordinadas as respetivas leis de base. CRP: Artigo 112º / 2


Caso o decreto contrarie a respetiva lei de base diz-se ilegal, parece do vicio de
ilegalidade.
Sabemos que um decreto lei é de desenvolvimento pelo próprio conteúdo, que no fundo
desenvolvem as bases, mas por outro lado não fica duvida nenhuma porque

CRP: Artigo 198º / 3


Os decretos devem dizer expressamente qual a lei de base que estão a desenvolver.

Nem o Governo nem as Assembleias Legislativas regionais podem invadir ou inovar na


matéria de leis de bases reservada à Assembleia da República nem contrariar os princípios
fixados em previa lei de bases, embora a Assembleia da República o possa fazer , uma
vez que esta pode fazer leis sobre todas as matérias, não esta inibida ela mesmo de
proceder ao desenvolvimento e leis de bases, nem tem a obrigação de invocar as bases
cujo desenvolvimento proceda, ao contrario do que sucede com o Governo e as ARL.

O Governo pode teoricamente revogar uma lei de bases da área concorrencial, ainda que
isso possa trazer custos políticos inerentes a essa descortesia.
Segundo a doutrina, a lei de bases da área concorrencial tem um valor reforçado
enfraquecido.
A revogação de uma lei de bases não determina a caducidade da legislação de
desenvolvimento que ao seu abrigo tenha sido editada.
AS leis de bases da Assembleia da República podem se vistas como um instrumento de
prevalência do Direito do Estado relativamente aos decretos regionais, mas igualmente
como um instrumento de supremacia legislativa da Assembleia da República sobre o
Governo.
O surgimento ou a alteração de uma lei de bases implicam ilegalidade superveniente da
legislação complementar com ela colidente.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 20


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o Leis de autorização legislativa

CRP: Artigo 161º e 164º


Reserva absoluta da competência legislativa da Assembleia da República

CRP: Artigo 165º


Reserva relativa da competência legislativa, ou seja, o Governo pode legislar sobre estas
matérias com autorização da AR, mas essa autorização é dada através de que ato?

Exemplo: O Governo quer legislar em matéria de quarentena, devido ao coronavírus. A


quarentena implica restringir a liberdade de circulação, logo é uma matéria de reserva
relativa da Assembleia da República, relativa a direitos, liberdades e garantias, como
indica o CRP: artigo 165º/1, b). Assim, a Assembleia da República pode autorizar o
Governo a fazê-lo. Qual será a forma deste ato?

CRP: Artigo 161º, d)


Compete à Assembleia da República conferir autorizações ao Governo.

CRP: Artigo 166º/3


A Assembleia da República confere autorização legislativa ao Governo através de uma
lei: a Lei de Autorização Legislativa (que é uma lei de valor reforçado).

As leis de autorização são leis reforçadas pela parametricidade material, na medida em


que a CRP impõe expressamente a subordinação dos decretos-leis autorizados às
correspondentes leis de autorização (112/2), exigindo ainda que a lei de autorização
defina expressamente o sentido, vinculativo para o futuro decreto-lei.

As LAL são prova da divisão e interdependência de poderes, mas também da afirmação


da supremacia do Parlamento no exercício da sua função legislativa, que não só preserva
o poder de modificar, suspender a LAL, como também o poder de modificar, suspender
ou revogar o decreto-lei o o decreto legislativo autorizado, em processo legislativo ou em
processo de apreciação.

CRP: Artigo 165º/2


A respeito do regime das LAL, este é o ponto de partida nos termos do qual as LAL
devem definir o objeto, sentido, a extensão e a duração da autorização, preceito que tem
justamente a função de garantir o respeito pelo principio da separação e interdependência
de poderes vedando autorizações implícitas ou em branco, limitando a discricionariedade
do Governo e acautelando a existência de um conjunto de limites previamente definidos
e passiveis de controlo.

O objeto da lei de autorização traduz-se na definição das matérias sobre as quais pode
incidir o diploma autorizado, ou seja, traduz-se na indicação de uma matéria ou, se for
caso disso de mais do que uma das matérias enunciadas no artigo CRP:165º/1.

O sentido da lei de autorização traduz-se no conjunto de princípios orientadores,


diretrizes, fins a prosseguir pelo decreto-lei autorizado, constituindo por isso parâmetros
materiais subordinantes do conteúdo legislativo a produzir.

A extensão é um conceito mais difícil de recortar, que tanto pode consistir na delimitação
do objeto (especificando a parta da matéria sobre a qual pode incidir a autorização), como

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 21


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

do programa legislativo a estabelecer (traçando determinadas balizas às soluções


legislativas) e até mesmo da previsibilidade das soluções

A duração da LAL consiste no período dentro do qual o decreto autorizado pode ser
emitido.

CRP: Artigo 110º/2


Se a Assembleia da República não definir na LAL os elementos referidos no artigo CRP:
165º/2, a LAL padecerá de inconstitucionalidade material, por desvio de poder, do mesmo
vicio padecendo os decretos leis autorizados a título consequencial.

Já a infração a cada um desses elementos por parte dos decretos leis autorizados tem
consequências distintas: o desrespeito do sentido da lei de autorização implica
ilegalidade, na medida em que o diploma autorizado não respeitou os parâmetros da lei
subordinante a que estava vinculado (CRP:112º/2), ainda que o Tribunal Constitucional
tenda a convolar em inconstitucionalidade orgânica a violação desses parâmetros na
medida em que o diploma autorizado acabara por exorbitar da matéria que tinha recebido
competência.

CRP: Artigo 198º/3


Do ponto de vista formal, os atos autorizados têm necessariamente de revestir a forma de
Decreto Lei ou Decreto Lei Regional, tendo de indicar além disso a lei de autorização sob
pena de inconstitucionalidade formal.

CRP: Artigo 165º/3


As Autorizações legislativas cessam com a sua utilização ou revogação, segundo a CRP
as autorizações não podem ser utilizadas mais de uma vez, vigorando nesta matéria um
princípio da irreversibilidade, nos termos do qual, uma vez aprovado o diploma
autorizado, só mediante nova autorização o mesmo pode ser modificado ou alterado pelo
órgão delegado.

CRP: Artigo 165º/ 4 + 5


Há caducidade das autorizações legislativas com o decurso do prazo fixado para a sua
utilização, mas também com o termo da legislatura, com a dissolução da AR ou com a
demissão do Governo, sem prejuízo das regras aplicáveis às autorizações orçamentais.

A Assembleia da República pode fazer cessar a autorização legislativa revogando a lei de


autorização antes da sua utilização, significando com isso chamar a si a plenitude do
poder legislativo (avocação de poderes).

Por último, relativamente à prática parlamentar, embora essa obrigação constitucional só


esteja estabelecida para as Assembleias Legislativas Regionais (227/2), também se tornou
habitual o Governo fazer acompanhar o pedido de autorização legislativa de um
anteprojeto de decreto-lei a autorizar.

Caso o Governo precise de legislar sobre uma matéria, pede autorização à Assembleia da
República e ela autoriza, definindo estes vários limites. No entanto, como é o Governo a
pedir autorização, quando este faz a proposta de lei, enumera logo o que pretende fazer,
e se a Assembleia da República concordar, autoriza o Governo a fazê-lo. Este fará depois
um decreto-lei no uso da autorização legislativa; voltamos, então, ao artigo 198º/1, b)
CRP.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 22


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Caso prático: Imaginemos que em Portugal já havia uma lei de 1980 sobre quarentena.
Agora, o Governo quer fazer um decreto-lei sobre a mesma matéria, devido à situação
atual do coronavírus. Pode um decreto-lei de 2020 revogar uma lei de 1980?

Sim pode, porque o decreto-lei tem o mesmo valor que a lei, nos termos do artigo 112º/2,
1ª parte CRP. Além disso, o decreto-lei está subordinado à lei de autorização legislativa,
nos termos da 2ª parte do mesmo artigo, logo, pode revogar a lei de 1980.

Sub-hipótese: Imaginemos que na lei de autorização legislativa, a AR dizia que só podem


ser sujeitas a quarentena pessoas relativamente às quais se tem provado que estão
contaminadas com covid-19. O Governo, tendo em conta a urgência da situação, decreta
que ficavam também sujeitas a quarentena as pessoas que vêm de países como a Itália,
por exemplo, independentemente de estarem ou não contaminadas com o vírus. Pode o
Governo fazê-lo?

Não pode. Se o fizer, é uma norma ilegal, porque contraria uma disposição da LAL,
quando não o pode fazer, nos termos do artigo 112º/2, 2ª parte CRP, que diz que os
decretos-leis estão subordinados às leis de autorização legislativa.

Caso prático: O Governo pede autorização à AR para legislar sobre a epidemia do covid-
19, para impor algumas restrições a direitos, liberdades e garantias, nomeadamente no
que toca à circulação. A AR autoriza o Governo a legislar.
O Governo faz um decreto-lei sobre imposição de quarentena a pessoas que estejam
contaminadas. Durante o tempo da autorização, o Governo conclui que a situação se
agravou, faz um segundo decreto-lei sobre imposição de quarentena a quaisquer pessoas
e aproveita para alterar algumas disposições contidas no 1º diploma.
Pode o Governo fazer um novo decreto-lei? Pode fazê-lo com esse conteúdo?

O Governo pode fazer o primeiro decreto-lei porque obteve autorização da AR.


Relativamente ao segundo decreto-lei, o Governo pode repartir a matéria, não precisa de
concentrar tudo num único diploma, é a chamada “execução parcelada” – artigo 165º/3
CRP. Contudo, não pode utilizar a mesma autorização duas vezes e não pode alterar o
conteúdo do diploma.

Sintese dos limites, que se não forem observados a lei de autorização é inconstitucional2

Limites Formais
• A autorização legislativa tem de ser explicita e autónoma;
• O ato autorizado tem de revestir a forma de decreto lei ou de decreto legislativo
regional;
• O ato autorizado tem de se reportar a determinada lei de autorização,
expressamente invocada;
Limites Subjetivos
• Só pode haver autorização legislativa da AR ao Governo ou à AL, não a qualquer
outro órgão;
• A autorização legislativa só pode ser concedida por uma Assembleia na plenitude
de funções, não por uma assembleia dissolvida (art. 172);
2 Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, Tomo V, 4º Edição (2010)

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 23


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• Não pode ser exercida e pedida por um Governo demitido nem por uma
Assembleia Legislativa dissolvida;
• A autorização implica uma relação entre Assembleia e Governo, é de certa
Assembleia e de certo Governo. Por isso, não apenas cessa com o termo da
legislatura, a dissolução e a demissão como não se transmite ou renova
automaticamente com a nomeação de novo Governo ou a eleição de nova
Assembleia Legislativa;
• Não há sub-delegação, ou seja, o Governo e a Assembleia não podem autorizar
outro órgão a servir-se da autorização legislativa;
Limites Temporais
• A autorização legislativa não pode ser para todo o tempo ou por tempo
indeterminado, sob pena de destruir a regra da reserva de competência, tem de ser
a termo certo final e não para esta ou aquela circunstância ou sob condição;
• A autorização tem de ser, pelo mesmo motivo, por tempo relativamente curto,
pelo tempo adequado e necessário, e, se esse tempo não for o suficiente, poderá
ser prorrogada, por meio de nova lei;
• Não há autorizações legislativas retroactivas, a autorização é para o futuro e só
assim é possível ao Parlamento definir o seu sentido e a sua duração;

o Leis de Enquadramento ou Leis Quadro


Podem definir-se como os atos legislativos de existência necessária que são pressupostos
e parâmetro normativo dos posteriores atos legislativo de execução e concretização.
Lei como qualquer outra que dispõem sobre o processo de feitura e o conteúdo de outras
leis, que tem que as respeitar sobre pena de ilegalidade.

CRP: Artigo 106º /1


A lei de enquadramento do orçamento diz de que forma a lei do orçamento deve ser feita.

CRP: Artigo 164º n)


Lei de criação de autarquias locais
Deve haver uma lei sobre como se cria e os respetivos requisitos
CRP: Artigo 236º / 4
Divisão administrativa estabelecida por lei

CRP: Artigo 227º/1 i)


Lei quadro de adaptação do sistema fiscal nacional às especificidades regionais

CRP: Artigo 255º e 256º


Criação de Regiões administrativas
Criação legal da região administrativa e a sua instituição em concreto que se deve fazer
de acordo com a primeira.

CRP: Artigo 293º


Lei quadro das reprivatizações
Trata-se de um conjunto de leis de reserva do Parlamento, dotadas de densidade variável,
mas em medida superior às leis de bases, e que devem cumprir a função especifica que
constitucionalmente lhes foi atribuída.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 24


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Ainda que se possa admitir a existência de outras leis-quadro fora da reserva da


competência da Assembleia da República, as mesmas não são de valor reforçado, por não
serem impostas pela constituição (CRP: 112º/3), cumprindo apenas uma função de
autolimitação e racionalização da produção normativa, registando-se, todavia, neste
domínio uma duvidosa praxis legislativa.

As leis de enquadramento consagradas na CRP, são leis constitucionalmente necessárias,


cuja não edição ou insuficiente densidade é geradora de inconstitucionalidade por
omissão.

A sua concretização salvo no caso do CRP: Artigo 293º, é feita nos moldes diretamente
requeridos pela Constituição, ora por leis, ora por decretos-leis, ora por decretos
legislativos regionais, podendo por isso competir à AR., ao Governo ou às Assembleias
das RA.

Leis duplamente reforçadas

As leis duplamente reforçadas são os estatutos político-administrativos das regiões


autónomas, as leis das grandes opções dos planos, a lei do orçamento do estado e a lei
quadro das reprivatizações.
Em qualquer destas espécies, por razoes diversas, cumula-se o critério do procedimento
agravado ora pela maioria (lei quadro das reprivatizações) ora pela existência e uma
reserva de iniciativa (nos demais casos), com o critério da parametricidade material

o Estatutos das regiões autónomas


Segunda a constituição estes devem ser respeitados por todas as outras leis pois são leis
reforçadas com alcance geral.

CRP: Artigo 166º / 3


Revestem a forma de Lei

Os estatutos político administrativos são leis reforçadas pelo procedimento:


CRP: Artigo 226º/1
Existência de uma reserva de iniciativa confiada às Assembleias Legislativas Regionais,
a quem cabe em exclusivo a elaboração do projeto de estatuto

CRP: Artigo 226º/2


Exigência complementada de um parecer obrigatório, na hipótese da AR rejeitar o projeto
ou lhe introduzir alterações
CRP: Artigo 168º/6 f)
Além disso apesar de os estatutos serem aprovados por maioria simples certas disposições
carecem de aprovação de 2/3 dos deputados presentes, desde que superior à maioria
absoluta dos deputados em efetividade de funções.

Por outro lado, são leis dotadas de parametricidade material:


CRP: Artigo 280º/2 b) e c) + 281º/1 c) e d)
Serem leis de vinculação genérica, na medida em que os estatutos devem ser respeitados
por quaisquer leis regionais ou nacionais.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 25


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o Leis das grandes opções dos planos nacionais


Alguns autores hesitam em qualificar como leis reforçadas.

CRP: Artigo 105º/2


São leis dotadas de um nível mínimo de parametricidade material, na medida em que as
leis orçamentais com elas se devem harmonizar.

CRP: Artigo 161º g)


O procedimento agravado resulta da existência de uma iniciativa reservada ao governo.

o Lei do Orçamento de Estado


A Lei do orçamento do Estado é uma das leis mais complexas e mais relevantes da vida
da comunidade politica como um todo, sendo objeto não só de regulação constitucional,
como também de uma especifica lei de enquadramento (106/1), devendo ainda
harmonizar-se com as seguintes diretrizes definidas na lei das grandes opções do plano,
estando por isso vinculada, em cadeia, à Constituição e a diversos atos legislativos, para
não referir a vinculação a normal do Direito Europeu.

A Lei do OE é duplamente reforçada:

CRP: Artigo 167º/2 + 3


Pelo facto de incorporar, além de outras vinculações legais, limites ao poder do
Parlamento na edição de leis que no ano económico em curso pretendam aumentar a
despesa ou diminuir a receita

CRP: Artigo 161º g)


Devido à reserva de iniciativa governamental, a lei do OE é igualmente uma lei reforçada
pelo procedimento, traduzindo se neste caso a correspondente rigidez no facto de o
Orçamento apenas poder ser alterado por iniciativa do governo.

o Lei Quadro das reprivatizações


Prevista na CRP: Artigo 293º
Dotada de parametricidade material em virtude de ser uma lei de enquadramento,
estabelecendo e concretizando os princípios, os critérios e os procedimentos a que devem
obedecer os decretos-leis que procedam à reprivatização dos bens nacionalizados depois
do 25 de abril, advindo lhe procedimento agravado na exigência de aprovação por maioria
absoluta dos deputados em efetividade de funções.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 26


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Esquema Síntese Leis de valor Reforçado


(Resolução Casos Práticos)

Leis Valor Reforçado

Procedimento
Facto de serem da reserva do Parlamento e exigirem maiorias qualificadas na sua
aprovação, preenchem determinadas finalidades políticas, como a da proteção das
minorias, a do reforço do Parlamento na sua relação com o Governo, bem como a da
estabilização, através de um consenso alargado, de um conjunto de regimes jurídicos
em matérias ais sensíveis do ponto de vista politico-constitucional.

Leis Orgânicas CRP: 112º/2


Domínio CRP: 166º/2
Matérias politico-institucionais de âmbito nacional; Disciplina de direitos fundamentais
de natureza política; Matérias relativas à autonomia territorial, natureza eleitoria,
financeira e organizativa

Reserva Absoluta da AR
Exceção: CRP:226º/4 Reserva de iniciativa do ALR

Aprovação
Votação Especialidade CRP: 116º/3 Maioria Simples
Exceção: CRP: 168º/5 2º parte Maioria absoluta dos deputados em efetividade
de funções (delimitação territorial das regiões)
Votação Final Global: CRP: 168º/5 Maioria absoluta dos deputados em efetividade de
funções

Promulgação vedada
CRP: 278º/7 Só pode promulgar ao fim de 8 dias da receção para dar tempo às entidades
de requerer a fiscalização preventiva
Caso seja requerida não pode promulgar sem a decisão do TC

Veto Qualificado
CRP: 136º/3 Para que seja confirmada é preciso 2/3 P > 1/2 F3

Fiscalização Preventiva
CRP: 278º/4 Alargamento quem pode requerer (+ PM e 1/5 deputados)

Leis Aprovadas por maioria de 2/3


Enunciadas no CRP: Artigo 168º/6

CRP: 168/6, a), b), c)


Podemos estar diante de “leis autónomas”, ao passo que nas demais alíneas se estará
apenas diante de disposições inseridas em leis de diversa natureza.

Uma vez que a constituição não distingue quais as votações em que se requer a maioria
de 2/3 dos deputados presentes, desde que superior à maioria absoluta dos deputados em

3 Voto favorável da maioria de dois terços dos deputados presentes, desde que superior à maioria absoluta dos
deputados em efetividade de funções

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 27


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efetividade de funções, o interprete deve partir do principio de que essa maioria é


requerida nas três votações, apesar de haver ai discussões doutrinais, especialmente no
caso das “disposições de leis” por alegadamente revelar ai apenas a votação na
especialidade.

Em caso de veto politico, uma vez que a CRP nada prevê a respeito da maioria necessária
para a respetiva superação, poderia em tese admitir-se quer a alternativa de estar afastado
o veto politico, por falta de previsão, quer a alternativa mais condizente com o principio
da adequação funcional e com o argumento de maioria de razão , de essas leis serem
submetidas ao regime do veto qualificado artigo 136º/3

Parametricidade Material
Têm uma capacidade de vincularem o conteúdo de outras leis, havendo a referir entre
as principais subcategorias- onde não se deve incluir o Regimento, por não se tratar
de um ato legislativo, as leis de bases, as leis de autorização legislativa e as leis de
enquadramento.

Leis de Bases CRP: 112º/2


Categoria legal que contém princípios e directrizes genéricas, que traçam as opções
politicas primárias e fundamentais de um determinado regime jurídico, cuja disciplina
carece de ser desenvolvida e concretizada por legislação subordinada de carácter comum:

1) São normas primárias de carácter incompleto (não revestem carácter auto-


aplicativo, carecendo de mediação e desenvolvimento por parte de legislação
subordinada);

2) São normas dotadas de uma supremacia hierárquica material, ou seja, vinculam


os decretos-leis de desenvolvimento de leis de bases;

Aprovação
A AR dispõe da faculdade de emitir leis de bases:
CRP: 164º d), i) No âmbito de duas matérias de reserva absoluta
CRP: 165º/1 f), g), n), t), u), z) No âmbito da reserva relativa de competência
CRP: 161º/1 No âmbito da competência de concorrencial com o Governo e com as ALR

O Governo pode fazer leis de bases:


CRP: 198º/1 b) + 165º Mediante autorização legislativa, na esfera de reserva relativa de
competência legislativa da AR
CRP: 198º/1 a) No âmbito da concorrência alternada com a AR e com as ALR

Quanto às ALR, podem aprovar mediante autorização legislativa, decretos legislativos


regionais de bases nas matérias respeitantes a bases gerais previstas na reserva relativa de
competência da AR, com exclusão de um conjunto determinado de matérias mencionadas
CRP: 227º/1 b)

Desenvolvimento
É opinião maioritária que o Governo e as ALR podem desenvolver leis de base
Quanto à AR existe divergência doutrinária:
Paulo Otero: Defende tratar-se de uma reserva total de desenvolvimento, ou seja,
o Governo teria competência reservada para o desenvolvimento de bases gerais relativas
a matérias situadas no universo concorrencial do Parlamento, a qual não prejudicaria a

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 28


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apreciação parlamentar dos decretos-leis que procedessem a esse desenvolvimento, só o


G poderia desenvolver leis de bases.
Blanco Morais: A reserva do Governo incide sobre matérias do âmbito do CRP:
164º e 165º
Jorge Miranda: Entende que a reserva do Governo sobre concorrenciais, nome de
uma ideia de divisão de tarefas entre o Parlamento e o Governo.
TC: Não existe qualquer reserva, tanto o Governo como a Assembleia da
Republica podem desenvolver bases.

CRP: 198º/3 A densificação de uma lei de bases só poderá ser feito através de um ato
legislativo. Será, deste modo, inconstitucional o desenvolvimento de princípios e de bases
gerais dos regimes jurídicos mediante regulamento administrativo.

Relações entre leis de base e legislação complementar


Se uma lei de bases nova revogar substituitivamente ou alterar uma lei de bases
precedente, na esfera concorrencial entre a AR e o Governo, a lei de bases oriunda, de
um ou de outro órgão, pode revogar quer a legislação que substitia antes mesmo de
existirem bases gerais sobre a matéria, quer leis complementares da lei de bases revogada.

A substituição de uma lei de bases por outra sem revogação da legislação complementar,
entende-se que o legislador ou os legisladores responsáveis pela aprovação da legislação
subordinada devem conformar esta com a nova lei-parâmetro, na medida em que existam
desconformidades entre ambas, sob pena de ilegalidade superveniente do ato legislativo
subordinado.
Gera-se assim uma nova relação de complementaridade entre a nova lei de bases e a
legislação complementar pré-existente que, não tendo naturalmente de invocar a primeira
para subsistir em vigor, deve ser constrangida a daptar o seu conteúdo a esse ato
legislativo-parâmetro no caso de se registarem desconformidades substanciais.

As alteração não determinam a caducidade das normas legais de desenvolvimento, mas


obrigam à alteração destas ultimas de forma a assegurar a conformidade com os
parâmetros, sob pena de ilegalidade superveniente.

Leis de Autorização Legislativa


São leis reforçadas pela parametricidade material, na medida em que a CRP impõe
expressamente a subordinação dos decretos-leis autorizados às correspondentes leis de
autorização (112/2), exigindo ainda que a lei de autorização defina expressamente o
sentido, vinculativo para o futuro decreto-lei.

Conteudo necessário
CRP: 165º/2
Objeto: Este consistirá na enumeração da matéria sobre a qual a mesma delegação
irá incidir e que se reporta a uma área expressamente prevista no artigo 165º/1
Extensão: Especifica os aspectos da disciplina jurídica da matéria onde irá incidir
a autorização, podendo incidir sobre a totalidade da matéria ou apenas sobre uma parcela
Sentido: referir os fins estruturantes que devem ser prosseguidos pela lei delegada
com um mínimo de objectividade
Duração: consiste no período dentro do qual o decreto autorizado pode ser
emitido.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 29


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Consequência da LAL não referir: inconstitucionalidade material, por desvio de poder,


do mesmo vicio padecendo os decretos leis autorizados a título consequencial.

Consequência dos Decretos autorizados não respeitare: ilegalidade, na medida em que o


diploma autorizado não respeitou os parâmetros da lei subordinante a que estava
vinculado

Cessação da autorização Legislativa


Utilização CRP: Artigo 165º/3
Utilização plena: acarreta a cessação da vigência desta ultima. As autorizações não podem
ser utilizadas mais de uma vez, vigorando nesta matéria um princípio da irrepitibilidade,
nos termos do qual, uma vez aprovado o diploma autorizado, só mediante nova
autorização o mesmo pode ser modificado ou alterado pelo órgão delegado.
Autorização modo parcelado: o âmbito material da autorização pode ser dividido em
várias parcelas.
A regulação dessas áreas pode ser operada por distintos atos legislativos autorizados ou
emitidos em tempos diferentes.

Revogação
A Assembleia da República pode fazer cessar a autorização legislativa revogando a lei de
autorização antes da sua utilização, significando com isso chamar a si a plenitude do
poder legislativo (avocação de poderes).

Se a AR aprovar uma lei sobre o objecto da autorização, antes dessa ter sido utilizada,
entende- se que revogou tacitamente a lei delegante.

A AR pode revogar o diploma autorizado ou submete-lo a apreciação parlamentar.

Se a AR modificar uma lei de autorização antes da sua utilização, as alterações vinculam


os atos futuros que venham a ser emitidos. No caso das alterações serem introduzidas
após a utilização da autorização legislativa, os diplomas autorizados não terão de se ater
a novos limites uma vez que a autorização cessou. Situação diferente ocorre se a
autorização for utilizada de modo parcelado. Neste momento, vincula atos futuros.

Se a lei de autorização for inconstitucional, esta inconstitucionalidade propaga-se, a título


consequente, aos diplomas por ela habilitados.

Caducidade
Se os decretos-leis que não forem aprovados, promulgados e referendados dentro do
prazo- limite para a sua utilização, como a lei caduca não pode ser mais autorizado, caso
venham a ser publicados a consequência será a inconstitucionalidade orgânica.
CRP: 165º/5 No caso das autorizações legislativas orçamentais que se encontram
contidas na lei de Orçamento de Estado, sempre que incidam em matéria fiscal, as
mesmas só caducam no termo da legislatura

Leis de Enquadramento
Atos legislativos paramétricos de outras leis que estabelecem vínculos normativos de
densidade variável às normas legais que as desenvolvem ou concretizam e fixam regras
procedimentais que dispõem sobre aspectos de produção das segundas.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 30


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Materialmente paramétricas de outras, de natureza análoga à das leis de bases mas que,
em tese, podem assumir um conteúdo mais pormenorizado do que estas, quando definem
a moldura de um regime jurídico que deverá ser, a titulo sub-primário, desenvolvido,
integrado e concretizado por atos legislativos habilitados e subordinados às primeiras.
Aprovação
Ainda que se possa admitir a existência de outras leis-quadro fora da reserva da
competência da Assembleia da República, as mesmas não são de valor reforçado, por não
serem impostas pela constituição (CRP: 112º/3), cumprindo apenas uma função de
autolimitação e racionalização da produção normativa, registando-se, todavia, neste
domínio uma duvidosa praxis legislativa.

Desenvolvimento
Feita nos moldes diretamente requeridos pela Constituição, ora por leis, ora por decretos-
leis, ora por decretos legislativos regionais, podendo por isso competir à AR., ao Governo
ou às Assembleias das RA.
Exceção: CRP: Artigo 293º

Relação entre a lei quadro e as que esta regula


A revogação não substitutiva de uma lei-quadro não tem como efeito a caducidade da
legislação dela dependente, em regra, impõem modificações nos diplomas legais delas
dependentes, sob pena de ilegalidade superveniente dos segundos, dado que a atribuição
de valor reforçado destas leis corre, por identidade de razão, nos mesmo termos das leis
de bases.

Contudo, existem situações que não pressupõem a alteração, por exemplo na Lei de
Orçamento de Estado.

CRP: Artigo 106º /1


A lei de enquadramento do orçamento diz de que forma a lei do orçamento deve ser feita.

CRP: Artigo 164º n)


Lei de criação de autarquias locais
Deve haver uma lei sobre como se cria e os respetivos requisitos
CRP: Artigo 236º / 4
Divisão administrativa estabelecida por lei

CRP: Artigo 227º/1 i)


Lei quadro de adaptação do sistema fiscal nacional às especificidades regionais

CRP: Artigo 255º e 256º


Criação de Regiões administrativas
Criação legal da região administrativa e a sua instituição em concreto que se deve fazer
de acordo com a primeira.

CRP: Artigo 293º


Lei quadro das reprivatizações
Trata-se de um conjunto de leis de reserva do Parlamento, dotadas de densidade variável,
mas em medida superior às leis de bases, e que devem cumprir a função especifica que
constitucionalmente lhes foi atribuída.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 31


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Leis duplamente reforçadas


As leis duplamente reforçadas são os estatutos político-administrativos das regiões
autónomas, as leis das grandes opções dos planos, a lei do orçamento do estado e a lei
quadro das reprivatizações.
Em qualquer destas espécies, por razoes diversas, cumula-se o critério do
procedimento agravado ora pela maioria (lei quadro das reprivatizações) ora pela
existência e uma reserva de iniciativa (nos demais casos), com o critério da
parametricidade material

Estatutos das Regiões Autónomas


Procedimento
CRP: Artigo 226º/1
Existência de uma reserva de iniciativa confiada às Assembleias Legislativas Regionais,
a quem cabe em exclusivo a elaboração do projeto de estatuto

CRP: Artigo 226º/2


Exigência complementada de um parecer obrigatório, na hipótese da AR rejeitar o projeto
ou lhe introduzir alterações
CRP: Artigo 168º/6 f)
Além disso apesar de os estatutos serem aprovados por maioria simples certas disposições
carecem de aprovação de 2/3 dos deputados presentes, desde que superior à maioria
absoluta dos deputados em efetividade de funções.

Parametricidade material
CRP: Artigo 280º/2 b) e c) + 281º/1 c) e d)
Serem leis de vinculação genérica, na medida em que os estatutos devem ser respeitados
por quaisquer leis regionais ou nacionais.

Conteúdo necessário
A natureza da entidade e os princípios estruturantes que formam o regime
autonómico de uma região;
Delimitação do âmbito geográfico das regiões, pois o conceito “âmbito regional”
comporta uma componente espacial que limita o exercício dos poderes regionais.
Os direitos e as obrigações das regiões (art.227);
Os órgãos de governo próprio, respectivas competências e regras fundamentais
relativas
ao respectivo funcionamento, bem como o modo de designação dos titulares desses
órgãos;
Aspetos procedimentais inerentes à aprovação de atos-jurídicos autonómicos;
Regras estruturantes de organização e funcionamento interno da administração
regional.

Consequência de não incorporarem estes conteúdos é inconstitucionalidade por omissão.

Lei das Grandes opções dos planos nacionais


CRP: Artigo 105º/2
São leis dotadas de um nível mínimo de parametricidade material, na medida em que as
leis orçamentais com elas se devem harmonizar.

CRP: Artigo 161º g)


O procedimento agravado resulta da existência de uma iniciativa reservada ao governo.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 32


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Lei do Orçamento de Estado


Parametricidade material
CRP: Artigo 167º/2 + 3
Incorporar, além de outras vinculações legais, limites ao poder do Parlamento na edição
de leis que no ano económico em curso pretendam aumentar a despesa ou diminuir a
receita

Procedimento
CRP: Artigo 161º g)
Reserva de iniciativa governamental, a lei do OE é igualmente uma lei reforçada pelo
procedimento, traduzindo se neste caso a correspondente rigidez no facto de o Orçamento
apenas poder ser alterado por iniciativa do governo.

Conteúdo
Núcleo orçamental: que é composto pelas receitas necessárias para cobrir as
despesas do Estado e da Segurança Social;
Reserva potestativa de orçamento: trata-se de matérias financeiramente
importantes, como é o caso da fixação de taxas e benefícios fiscais nos diversos impostos.

Lei-Quadro das reprivatizações


Prevista na CRP: Artigo 293º
Parametricidade material em virtude de ser uma lei de enquadramento, estabelecendo e
concretizando os princípios, os critérios e os procedimentos a que devem obedecer os
decretos-leis que procedam à reprivatização dos bens nacionalizados depois do 25 de
abril.
Procedimento agravado
Exigência de aprovação por maioria absoluta dos deputados em efetividade de funções.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 33


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Quadros de comparação: Leis Quadro, Base e de Autorização Legislativa

LEI DE ENQUANDRAMENTO LEI DE BASES

Pode versar quer sobre matéria reservada à


Versa sempre sobre matérias de reserva, absoluta Assembleia da República, em reserva absoluta
ou relativa, da Assembleia da República. ou reserva relativa, quer sobre matéria
concorrencial.

Quando haja reserva de competência, a


Assembleia deve fazer a lei ou (caso de reserva
A Assembleia da República está adstrita a fazer
relativa) conferir autorização legislativa ao
a lei, nominativamente indicada pela
Governo, mas não havendo reserva de
Constituição (lei-quadro, etc.)
competência, A Assembleia não está sujeita a
nenhum dever de legislar.

Só há inconstitucionalidade por omissão em


A falta de lei envolve inconstitucionalidade por qualquer caso, quando se trate de matéria
omissão objeto de norma constitucional não exequível
por si mesma.
A Assembleia só é obrigada a densificar,
A Assembleia deve densificar a lei
quando se trate de matéria a ela reservada
A lei de enquadramento pode (ou deve) conter
normas procedimentais, normas sobre a prática
A lei de bases é apenas lei substantiva
dos actos jurídico-públicos que prevê ou
prescreve

A lei de enquadramento não dispensa acto


A matéria da lei de bases pode ser objeto de
legislativo subsequente, não pode substituir-se-
uma única lei mais ou menos exaustiva. Não é
lhe ou consumi-lo (v. g., a lei de enquadramento
necessário o desdobramento e, se este ocorrer,
orçamental não substitui o orçamento, nem a lei
bem poderá, supervenientemente, uma única lei
de regime de criação de autarquias locais a lei de
absorver toda a matéria
criação de certa autarquia local)

A lei de enquadramento não revoga acto


legislativo complementar feito à sombra de lei de A lei de bases revoga acto legislativo de
enquadramento anterior (v. g., uma desenvolvimento anterior contrário
reprivatização ou uma lei orçamental)

A concretização ou complementação legislativa


O desenvolvimento cabe sempre ao Governo
tanto pode caber a órgão diferente da Assembleia
quando a matéria seja concorrencial (ou mutatis
da República como à própria Assembleia (caso
mutandis às Assembleias Legislativas
do orçamento ou de leis de instituição concreta
regionais)
de regiões)
O acto legislativo de desenvolvimento é
O acto legislativo pode, no limite, ser lei-medida
naturalmente lei geral e abstrata

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 34


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LEI DE AUTORIZAÇÃO LEGISLATIVA LEI DE BASES

A lei de autorização legislativa é de iniciativa


A lei de bases é de iniciativa reservada à
reservada ao Governo, ou, após 2004, a uma
Assembleia ou de iniciativa concorrencial
Assembleia Legislativa regional
A lei de bases é de aplicação imediata, ainda
que a sua exequibilidade, pelo menos em
A lei de autorização legislativa não é lei de
parte, dependa ou possa depender de decreto-
aplicação imediata; é sobretudo acto-condição
lei ou de decreto legislativo de
desenvolvimento

A lei de autorização não incide sobre situações


da vida, por conseguinte (embora o sentido tenha A lei de bases pode incidir sobre situações de
caráter normativo, só se projeta aí através do ato vida
legislativo subsequente
A lei de autorização possui eficácia interna, A lei de bases tem ou pode ter eficácia
esgota-se nas relações entre orgãos de poder externa, eficácia sobre os cidadãos
A lei de autorização não revoga diplomas sobre A lei de bases revoga lei anterior contrária
matérias da autorização (seja ou não outra lei de bases)
A violação de lei de bases em matéria não
A violação da lei de autorização determina
reservada só acarreta ilegalidade; e em
inconstitucionalidade orgânica (quanto ao objeto,
matéria reservada também
à extensão e à duração) e ilegalidade (quanto ao
inconstitucionalidade orgânica (mas só quanto
sentido
ao objeto
Se a lei de bases for modificada e o decreto-
Se o sentido da lei de autorização for
lei ou o decreto legislativo regional não for,
modificado, só produzirá efeitos para o futuro
verificar-se-á a ilegalidade superveniente
A lei de autorização está sujeita a caducidade e,
O decreto-lei (ou o decreto legislativo de
portanto, o decreto-lei (ou o decreto legislativo
desenvolvimento) não está sujeito a prazos
regional) autorizado está sujeito a prazos
A autorização legislativa só pode versar uma vez Pode haver sucessivos desenvolvimentos,
sobre a mesma matéria com revogação possível, da lei de bases
A revogação da lei de bases não impede a
emissão ou a subsistência do decreto-lei ou do
A revogação da lei de autorização antes da
decreto legislativo de desenvolvimento se,
emissão de decreto-lei ou de decreto legislativo
acaso, ela for substituída por outra de idêntica
regional autorizado impede a emissão deste
orientação ou se for repristinada lei de bases
anterior

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 35


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ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA

PRIMAZIA DA COMPETÊNCIA LEGISLATIVA

É certo que este três órgão tem competência legislativa, mas temos razões que explicam
a predominância da Assembleia da República, fazendo dela o órgão legislativo por
excelência: Legitimada, Democraticidade e Publicidade

Não são equiparadas pela matéria que legislam, pois, a reservada ao Governo é muito
limitada (sua organização e funcionamento) enquanto que a matéria reservada à
Assembleia da República é muito extensa, o que mostra o predomínio legislativo da
Assembleia da República perante o governo.
Sendo estas matérias de responsabilidade da Assembleia mais importantes, mais
decisivas. Existindo a possibilidade de a ar autorizar outros órgãos a legislar.

CRP: Artigo 161º d) e e)


Verificamos o papel dominante da Assembleia da República se traduz na autorização
legislativa da mesma perante os outros órgãos.

CRP: Artigo 112º/2 parte 2


A Assembleia da República autoriza, mas fixa os termos da autorização que tem que ser
respeitados.

CRP: Artigo 112º/2 parte 1


Confere o igual valor a leis e decretos leis

CRP: Artigo 136º


Assembleia da República promulga a lei, esta é enviada ao Presidente da República que
tem a possibilidade de a promulgar ou vetar, caso o Presidente vete a lei esta retoma à
Assembleia que a pode confirmar com a votação.

Caso Prático:
Votação sobre lei da eutanásia recebe 117 votos a favor e 113 votos contra num total de
230 deputados. Como não houve 2/3 a lei não foi confirmada.
Começamos no artigo 166º para averiguar a forma dos atos da assembleia, saber se é Lei
orgânica ou não. A Lei sobre despenalização da eutanásia, exige a maioria absoluta
porque não vem mencionado do nº3 do artigo 136º, quando a matéria vem mencionada
no artigo 136º/3 é necessária a votação a favor de 2/3 dos deputados para confirmar a lei.
Isto manifesta a supremacia da Assembleia da República pois pode ultrapassar o veto do
Presidente da República.

Em suma podemos observar manifestação da supremacia Assembleia da República nos


seguintes pontos de ação:

o Matéria mais extensiva


o Matéria mais importante
o Autorização Legislativa
o Estipulação dos termos da autorização
o Possibilidade de confirmação após veto do Presidente da república
o Possibilidade de alterar ou fazer cessar decretos-leis.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 36


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COMPETÊNCIA LEGISLATIVA

Competência Genérica

CRP: Artigo 161º c)


Permite à Assembleia da República legislar sobre todas as matérias, exceto as reservadas
pela Constituição ao Governo.
Assim sendo, a competência genérica fundamente essencialmente o poder da Assembleia
em legislar sobre as matérias não discriminadas na Constituição e que compõem o
domínio concorrencial alternado com o Governo.

A mesma competência significa que o Parlamento pode legislar para todo o território,
sendo que nas regiões autónomas tem prevalência aplicativa, à luz do princípio da
especialidade, a legislação regional.
Os dois órgãos fazem incidir a sua competência sobre a mesma matéria mas com âmbitos
espácias de aplicação diferentes, num caso o continente, noutro caso a região autónoma.

Competência Reservada

o Reserva Absoluta de Competência Legislativa


CRP: Artigo 164º e parte do 161º
Supõe a faculdade exclusiva da Assembleia da República legislar sobre um conjunto de
matérias, com a exclusão total dos demais órgãos legislativos, compreende as questões
mais relevantes e de maior essencialidade político.

o Reserva Relativa de Competência Legislativa


CRP: Artigo 165º/2
A reserva relativa de competência da Assembleia da República integra matérias
relativamente às quais o Parlamento pode legislar a todo o tempo mas, também, pode
conceder uma autorização legislativa. Porem, sendo o órgão competente pode avocar, a
todo o tempo, o exercício da competência que delegou, mediante revogação do diploma
de autorização.

Enquanto o Governo pode ser autorizado a legislar em todas as matérias do artigo 165, as
Assembleias legislativas Regionais, nos termos do artigo 227/1 só pode legislar nos
assuntos de interesse regional.

Densidade Reguladora

Leis que fixam uma disciplina primaria com normas de grande generalidade e abstracção
têm um baixo grau de densidade reguladora, enquanto que aquelas que editam regimes
pormenorizados e disciplinas especiais de obejto detalhe ostentam um elevado grau, em
termos de densidade reguladora.

Nalgumas matérias de reserva, designadas esferas de reserva parlamentar integral existe


igualmente uma reserva de densificação total, ou seja, a lei parlamentar terá de consumir
a integridade do respectivo âmbito, não podendo reparti-lo com decretos-leis e decretos
legislativos regionais.
Já noutras normas, o Parlamento poderá reduzir-se a uma disciplina de reduzida
densidade, na medida em que as leis parâmetro devam apenas ocupar o domínio reservado

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 37


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de carácter primário relativo a uma dada matéria, podendo a restante ligação ser feita por
órgãos que estejam subordinados às directrizes da primeira ler (por exemplo, lei de bases).

o Nível Integral de uma reserva de densificação operada por leis da AR

CRP: Artigo 164º a, b, c, h, j

Implica que toda a dimensão inovadora de uma disciplina normativa que recai sobre uma
matéria tenha de ser consumida por lei da Assembleia da República. Trata-se de um
campo exclusivo de densificação normativa integral imposta pela CRP à lei parlamentar,
e que envolve algumas matérias de alta essencialidade política de reserva absoluta.

Não é, portanto, permitida a emissão de leis de bases e de leis de autorização legislativa


pelo que são organicamente inconstitucionais atos legislativos de outros órgãos que
regulem essa matéria que não assumam conteúdo intrinsecamente administrativo. O
próprio conteúdo do regulamentos de execução dessas leis deve ser rigorosamente
regulado de forma a impedir qualquer hipótese de inovação operada por via
administrativa.

o Nível Relativo de uma reserva parlamentar de densificação total

CRP: Artigo 165º/1 a, b, o

Trata-se de uma situação em que a lei parlamentar ou o ato legislativo governamental ou


regional autorizados pelo Parlamento devem consumir e esgotar toda a dimensão primária
ou inovadora de matéria ou domínio material inscrito na reserva relativa de competência
da AR.

Neste âmbito as matérias sujeitas a uma densificação total inscrevem-se na reserva


relativa e já não na absoluta, pelo que a consunção dessas matérias, pode não caber,
apenas, à lei parlamentar, mas também a decretos-leis ou decretos legislativos regionais
autorizados pela AR.

o Nivel de Generalidade na regulação de matéria da reserva parlamentar

CRP: Artifo 164º r) + 165º/1 d, e, h

A reserva parlamentar da regulação primária de uma matéria inscrita na sua reserva


absoluta ou relativa restringe-se, neste nível de regulação, a normas de conteúdo geral,
podendo o propiro parlamento ou outros órgãos legislativos, como o Governo, adotar
disciplinas igualmente inovadoras, mas de natureza especial, contidas em normas mais
densas e pormenorizadas.

o Nivel Básico ou de Enquadramento de Reserva Parlamentar

CRP: 164º d, i, n + 165º f, g, u, z

Compreende a disciplina menos densa da legislação parlamentar, carcater incompleto e


vinculante do conteúdo de outras leis complementares muito mais densas, sejam ou não
da AR.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 38


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PROCESSO LEGISLATIVO PARLAMENTAR4

Procedimento legislativo é a sucessão encadeada de atos ou fases tidos como


juridicamente necessários para a produção e revelação de uma norma legal, por parte de
um órgão competente para o efeito. Cada forma legal pressupõe um procedimento
próprio.

O processo legislativo parlamentar encontra-se regulado na Constituição sobretudo a


partir do artigo 167º e no Regimento da Assembleia da República no artigo 118º e
seguintes.

O regimento distingue quatro tipos de processo legislativo:


• Processo legislativo comum
É a regra básica, pelo que é o que é aplicado caso não esteja designado um regime
específico. Esta regra vale igualmente para o processo de revisão constitucional.

• Processo legislativo especial


Este processo é utilizado nas seguintes circunstâncias: aprovação dos estatutos das
regiões autónomas, retificação do estado de suspensão do exercício de direitos,
autorização para declaração de guerra e autorizações legislativas.

• Processo das leis de planos e do orçamento


Previsto RAR: Artigo 215º e seguintes

• Processo de urgência
Previsto no CRP: Artigo 170º e RAR: Artigo 284º e seguintes

A violação das normas constitucionais acerca dos processos legislativos dá lugar a


inconstitucionalidade prevista na CRP: Artigo 277º e seguintes.

O processo legislativo é composto por diversas fases e cada uma delas deve ser analisa
como que um processo em si pois integra as suas próprias subdivisões. Assim, a validade
dos atos de cada fase é condição necessária para a validade do ato final.

Há vários critérios de divisão das fases do processo, contudo nós iremos adotar a seguinte:
• Iniciativa
• Apreciação
• Deliberação (discussão e votação)
• Controlo de mérito

CRP: Artigo 115º/2, 4, 5 e 10 + Artigo 167º/4


Um processo legislativo está sujeito às vicissitudes provocadas pelo referendo.
Nomeadamente obrigação de aprovação caso a resposta emanada do referendo seja
positiva e encerramento do processo caso a resposta por sua vez seja negativa.

4 Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, Tomo V, página 258 a 334

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 39


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Fase da iniciativa legislativa

CRP: Artigo 167º

A iniciativa é o momento de iniciação ou instauração do procedimento legislativo


parlamentar. Consiste no momento em que os titulares da assembleia ou outras entidades
investidas constitucionalmente desse poder de iniciação legislativa, colocam em marcha
o procedimento mediante a apresentação naquele órgão parlamentar de um projecto ou
proposta de lei, tendo em vista a sua discussão e eventual aprovação como ato legislativo.

De acordo com o regimento da Assembleia Legislativa, a apresentação de um ato de


iniciativa não supõe nenhuma garantia efectiva da sua ulterior discussão e, muito menos,
a sua aprovação. Isto porque o Presidente da Assembleia pode rejeitar ou indeferir
projectos ou proposta de lei que sejam inconstitucionalmente evidentes.

É importante começar por distinguir iniciativa legislativa de competência legislativa:

o Competência Legislativa
Falamos de competência legislativa quando discutimos quem pode aprovar o ato
legislativo, em que matéria cada órgão pode legislar. Diz respeito sempre à aprovação do
ato legislativo.

o Iniciativa Legislativa
Falamos de quem tem o poder de abrir, desencadear o processo legislativo vem
esclarecido no artigo 167º.

No procedimento legislativo parlamentar, os sujeitos a quem é atribuído o poder de


iniciativa não são, necessariamente, os mesmos que intervêm no exercício da
competência legislativa para aprovação das leis da AR.

CRP: Artigo 167º / 1


Falamos aqui da capacidade de abrir processo legislativo de uma Lei.
Há que distinguir dois tipos de iniciativa quanto aos atos da Assembleia da República:

o Iniciativa Interna: Quando a iniciativa parte do interior do órgão designa-se por


projeto lei.
Þ Deputados
Þ Grupos Parlamentares

o Iniciativa Externa: Quando a iniciativa parte do exterior do órgão designa-se por


proposta lei.
Þ Governo
Þ Grupos de cidadãos eleitores (Não tem muita relevância pratica, o
pluralismo partidário acaba por retirar algum peso a possibilidade de
grupos tomarem iniciativa, quando um tema é importante há sempre um
grupo de deputados a tomar iniciativa)
Þ Assembleia Legislativa Regional
Esta distinção traduz-se terminologicamente no projeto lei e proposta lei. O processo
depois é o mesmo a única distinção é de onde surge a proposta e a designação dada.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 40


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Iniciativa Iniciativa Reserva Reserva


Proposta Projeto
Genérica Especifica Absoluta Relativa
CRP: CRP:
Deputados X X
164º 165º
CRP: CRP:
Grupos X X
164º 165º
CRP:
Governo X X
198º/2
CRP:
AL Regionais X X
227º
Cidadãos X X

Quando a matéria é reservada à Assembleia há a confusão de pensar que nessas matérias


só o governo não tem competência para aprovar, mas pode apresentar proposta sobre
matéria.

CRP: Artigo 161º / 4 e 5


Na prática o governo apresenta propostas de leis só sobre matérias que não pode legislar.

Ao contrário do que se pensa nas matérias de reserva absoluta quem apresenta propostas
é o governo porque ele próprio não pode legislar.

Os deputados em geral pode apresentar um projeto lei sobre qualquer matéria.


Contudo na prática vemos que há algumas em que isso não acontece.

o Lei do orçamento
Não são os deputados que tomam iniciativa de criar a lei do orçamento que cabe
exclusivamente ao governo, que sabe que politica quer desenvolver e que instrumentos
financeiros precisa, por isso é o governo que apresenta na assembleia. Os deputados
discutem fazem alterações, mas por natureza é o governo que toma a iniciativa.

o Lei de autorização Legislativa


Não têm iniciativa legislativa para aprovar uma lei de autorização legislativa
Não faria sentido que fosse o deputado a pedir autorização legislativa ao governo. É o
governo que pretendendo legislar sobre matéria exclusiva da assembleia que pede
autorização através de uma proposta de lei a assembleia.

o Estatutos da Região Autónoma


Os estatutos das regiões autónoma são aprovados pela Assembleia da República, mas são
as Assembleias Legislativas regionais que têm iniciativa.

Igualmente o Governo não pode apresentar iniciativa de projeto lei sobre todas as
matérias:

o Estatuto da região autónomas

o Revisão constitucional
Exemplo: No caso da quarentena obrigatória, o Governo não tem iniciativa de pedir
revisão constitucional para permitir internamento compulsivo

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 41


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CRP: Artigo 285º


A iniciativa compete aos deputados

CRP: Artigo 167º / 2


Designado de Clausula travão.

Todas as entidades, menos o governo, não podem apresentar propostas que aumentem ou
diminuem as despesas e receitas previstas no orçamento.
Depois do orçamento ser aprovado para aquele ano as despesas feitas e as receitas
cobradas definem a margem de ação que o governo terá no ano de ação. E esse quadro é
estável. O governo tem o quadro que lhe foi indicado e aprovado pela assembleia e esse
não se pode alterar.

Esta lei impede se possa alterar o orçamento e faz com que seja cumprido.

Se o governo sentir necessidade de o alterar, podem fazer uma proposta de alteração do


orçamento.
Propostas e projetos de leis que alterem as despesas e receitas serão consagradas no
orçamento seguinte e não valerão no orçamento em curso.

o Processo de iniciativa
RAR: Artigo 120º/1
Não são admitidos projetos ou propostas que infrinjam a Constituição.

O processo de iniciativa legislativa comporta diversas fases, nomeadamente:

1) A entrega
RAR: Artigo 125º/1
Tem de ser entregues à Mesa da Assembleia para admissão do Presidente e publicação
no Diário da República.

2) A admissão
RAR: Artigo 125º/2
Em 48 horas o Presidente da Assembleia tem de comunicar ao autor se admitiu ou rejeitou
a proposta.

RAR: Artigo 126º/1


Caso o projeto seja aceite é comunicado à Assembleia.

RAR: 126º/2
Até ao fim da reunião seguinte qualquer deputado ou conjunto de deputados pode
requerer à mesa a decisão do Presidente

3) Envio à comissão competente em razão da matéria


RAR: Artigo 126º/3
Interposto o recurso o Presidente envia à comissão para apreciar no prazo de 48horas.

4) Eventual recurso para Plenário


RAR: Artigo 126º/4
Após elaborado o parecer da comissão o projeto é votado em assembleia plenária.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 42


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o Vicissitudes da iniciativa
O objetivo de um projeto ou proposta é que após a iniciativa prossiga para a fase de
discussão e aprovação, contudo há quarto vicissitudes que podem impedir que o processo
avance:

• Não tiver havido votação até ao termo da sessão legislativa


CRP: Artigo 167º/5

• Renovação da iniciativa
CRP: Artigo 167º/4
Os projetos rejeitados não podem ser renovados na mesma sessão legislativa

• Cancelamento da iniciativa
CRP: Artigo 122º/1
A proposta ou projeto pode ser retirado até à sua votação na generalidade.

CRP: Artigo 122º/2


Caso a proposta ou projeto retirado seja aproveitado por outro deputado inicia-se um novo
processo legislativo.

• Caducidade
CRP: Artigo 167º/5
Caducam com o termo da legislatura

CRP: Artigo 167º/6


As propostas lei do governo caducam com a demissão deste

CRP: Artigo 167º/7


As propostas lei das Assembleias regionais caducam com o termo da legislatura desta

CRP: Artigo 160º


Os projetos apresentados por deputados caducam com o termo do mandato ou
desagregação de um grupo parlamentar (partido).

Fase de Apreciação

A fase instrutória visa recolher dados, pareceres e outros elementos cognitivos que
permitam aos decisões apreciar a oportunidade e o conteúdo da iniciativa legislativa.

Pode implicar um exame puramente interno, realizado em comissão parlamentar e,


adicionalmente, a realização de audições externas a entidades publicas e privadas.

Apreciação Interna Apreciação Externa


Desenvolve-se no seio do Parlamento, A que se realiza noutros órgãos
através do exame da comissão. constitucionais ou em organizações da
É uma apreciação genérica pois dá-se em sociedade civil.
todos os casos, todos os projetos e Só se dá quanto às matérias previstas.
propostas de lei

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 43


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o Apreciação Interna
A apreciação em comissão constitui uma forma de instrução interna e implica a
elaboração de um parecer sobre as iniciativas legislativas pela comissão especializada em
razão da matéria. A comissão pode proceder a estudos, requerer informações, pareceres
e audição de peritos e especialistas, requisitar documentos e efectuar missões de
informação ou estudo.

RAR: Artigo 35º a) + Artigo 129º/1


O exame em comissão é realizado pela comissão competente para aquela matéria.

RAR: Artigo 129º/3


O exame pode ser realizado por uma comissão eventual quando a especialidade do projeto
ou da proposta o justifiquem.

RAR: Artigo 132º/1


Após admitido o projeto ou proposta o seu autor pode apresentá-lo perante a comissão

RAR: Artigo 136º/1


A comissão tem 30 dias para aprovar o parecer e enviá-lo ao Presidente da Assembleia.
RAR: Artigo 136º/2
É possível a pedido do Presidente da Assembleia o alargamento do prazo para mais 30
dias.

RAR: Artigo136º/3
Caso a comissão não aprove o curso do processo legislativo continua na sua naturalidade

RAR: Artigo 138º/1


A comissão pode emitir dois pareceres distintos casos o segundo seja submetido até
metade do prazo, ou seja, até 15 dias após a apresentação do primeiro.

CRP: Artigo 167º/8 + RAR: Artigo 139º/1


A comissão pode apresentar textos de substituição na generalidade ou na especialidade.

RAR: Artigo 102º


Participação de membros do Governo (CRP: 177º/3) e outras entidades

RAR: Artigo 103º


Poderes das comissões parlamentares

o Apreciação Externa
A Assembleia da República procede em consultas obrigatórias ou facultativas de
entidades externas:

CRP: Artigo 54º/5


Direito das comissões de trabalhadores em participar na elaboração da legislação do
trabalho e dos planos económico-sociais que contemplem o respectivo sector

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 44


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CRP: Artigo 56º/2


Direito das associações sindicais em participar na elaboração da legislação do trabalho

CRP: Artigo 60º/3


Direito das associações de consumidores e das cooperativas de consumo

CRP: Artigo 63º/2

CRP: Artigo 65º/5

CRP: Artigo 67º/2

CRP: Artigo 77º/2


Participação das pais, alunos e professores na definição da política de ensino

CRP: Artigo 80º g)


As organizações representativas dos trabalhadores e das atividades económicas
participam na definição das principais medidas económicas e sociais.

CRP: Artigo 92º


O conselho Económico e Social tem de ser consultado no domínio das políticas
económicas e sociais e participar na elaboração dos planos de desenvolvimento das
respetivas matérias.

CRP: Artigo 98º


Trabalhadores rurais e agricultores

CRP: Artigo 249º


Consulta prévia dos órgãos das autarquias abrangidas por atos de criação ou de extinção
de municípios

CRP: Artigo 229º/2


Audiçaos dos órgãos de governo regional pelos órgãos de soberania relativamente às
questões da competência dos segundos

CRP: Artigo 226º/2


Em caso de rejeição ou alteração de projecto de alteração do EPARA

CRP: Artigo 274º


O Conselho Superior de Defesa Nacional deve ser consultado para os assuntos relativos
à defesa nacional e à organização, ao funcionamento e à disciplina das Forças Armadas.
Compete-lhe emitir parecer sobre a legislação atinente a estas matérias.

Fase de discussão e votação

CRP: Artigo 168º

A aprovação da lei exprime a sua fase constitutiva, a qual se prende à manifestação de


um ato de vontade normativa pelo parlamento, do qual resulta a expressão do seu
consentimento na formação de um ato legislativo materialmente perfeito ou completo e,

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 45


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como tal, apto a produzir alterações jurídicas no ordenamento, volvida a sua promulgação
e publicação.

CRP: Artigo 116º / 2


Corão de presenças, número mínimo para a assembleia poder funcionar e deliberar.

CRP: Artigo 116º / 3


A regar geral é a da maioria simples, maioria relativa, mais votos a favor que contra, por
defeito essa é a lei geral. Contudo a lei pode exigir uma maioria própria, criando exceções
à regra geral:

CRP: Artigo 168º


As leis orgânicas carecem de votação por maioria absoluta não basta maioria simples terá
que ser maioria absoluta

CRP: Artigo 168º / 6


Maioria de 2/3 desde que superior à maioria absoluta.
Requisitos cumulativos
Maioria absoluta dos deputados em efetividade de funções e maioria de 2/3 em deputados
presentes.

CRP: Artigo 168º/1


Os atos ou atos de iniciativa são objecto de debate, através de uma discussão realizada
pelos deputados sobre a sua forma e conteúdo, a qual pode ser realizada em plenário ou
em comissão.

o Discussão e Votação na Generalidade


CRP: Artigo 168º/1 + RAR: Artigos 147º a 149º
Versa sobre cada projeto e proposta.

RAR: Artigo 147º


A discussão na generalidade, em sessão Plenária pressupõe um debate que incida sobre
os princípios e o sistema do ato de iniciativa, ou seja, sobre o espírito e estrutura interna
do ato pré- legislativo.

RAR: Artigo 145º


Este debate compreende a apresentação da iniciativa pelo seu autor ou autores, pedidos
de intervenções de cada grupo parlamentar, de deputados não inscritos e de deputados
únicos representantes de um partido.

RAR: Artigo 144º


Os projectos e propostas de lei devem ser distribuídos aos grupos parlamentares antes de
serem discutidos em Plenário e devem ser previamente publicados no Diário da
Assembleia da Republica com uma antecedência mínima de cinco dias, salvo caso de
urgência.
Em caso de urgência pode a conferencia de lideres, por maioria de dois terços, reduzir a
antecedência mínima de cinco dias, para quarenta e oito horas, no mínimo.

RAR: Artigo 149º


A discussão e a votação devem ter lugar, em regra, no prazo de dezoito reuniões plenárias
a contar da data de aprovação do parecer na comissão especializada.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 46


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CRP: 168º/3 + RAR: 148º


Após a discussão, cada projecto ou proposta de lei é votado em plenário, sendo certo que
uma votação favorável apenas garante que o ato de iniciativa será objecto de votação na
especialidade, não indicando a sua aprovação nem nessa fase subsequente, nem no estádio
de vocação final.

CRP: Artgo 116º/3


A deliberação parlamentar correspondente a esta fase de votação processa-se por maioria
simples.

Exceções:
CRP: 169º a) e b)
Disposições de leis referidas no mesmo número que consumam todo um diploma
legislativo.

o Discussão e Votação na Especialidade


CRP: Artigo 168º/1 + RAR: Artigos 150º a 154º
Versa sobre cada artigo, número e alínea pela seguinte ordem: propostas de eliminação,
propostas de substituição, propostas de emenda, etc

RAR: Artigo 154º/1


Ordem de votação é a seguinte:
• Propostas de Eliminação;
• Propostas de Substituição;
• Propostas de Emenda;
• Texto discutido, com alterações eventualmente já aprovadas;
• Propostas de aditamento ao texto votado;

RAR: Artigo 154º/2


Havendo duas ou mais propostas da mesma natureza, elas serão sujeitas a votação pela
ordem da sua apresentação

CRP: Artgio 168º/3


O órgão da Assembleia da Republica onde se realiza a discussão votação na especialidade
é o Plenário.
Isto porque, se o mesmo Plenário não deliberar expressamente que essa discussão e
votação se processa em comissão especializada (comissão competente em razão da
matéria), decorre do referido preceito constitucional que será o Plenário a realizar essa
tarefa.

RAR: Artigo 150º


Estabelecer uma regra geral em sentido contrário (regra que determina que, salvo num
conjunto de exceções, a discussão e votação se processam em comissão) não parece
harmonizar-se com o referido do CRP: 169º/3.

Mas o facto é que a prática parlamentar, que alguns autores designam de costume contra
legem, caminha no sentido do disposto no regimento, ou seja, a de que a grande maioria
dos diplomas são discutidos e votados na especialidade nas comissões, sem prejuízo de o

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 47


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Plenário poder, a todo o tempo, avocar a si a votação na especialidade a requerimento de,


pelo menos, dez Deputados CRP: 169º/3 + RAR: 151

O artigo refere que, caso a Assembleia não delibere, a discussão será feita no Plenário.
O facto de no regimento estar que na maioria das vezes será na comissão não é ilegal,
muito menos inconstitucional, a constituição possibilita e permite que isso ocorra.

Existe um conjunto de atos legislativos que integram a reserva de Plenários, ou seja, são
objecto de necessária votação na especialidade em sessão plenária:

CRP: Artigo 168º/4


Correspondem à grande maioria das leis orgânicas, embora haja algumas destas ultimas
que se situam fora da reserva de plenário

CRP: Artigo 168º/5


Criação de regiões administrativas: que carece de ser votada na especialidade por maioria
absoluta;

CRP: Artigo 168º/6 a) e c)


Devem ser aprovadas por maioria de dois terços dos deputados presentes, desde que
superior à maioria absoluta dos efectivos;

CRP: Artigo 168º/6 b), d) e f)


Devem, igualmente ser aprovadas por maioria de dois terços.

Enquanto as primeiras e a segunda integram a reserva explicita de plenário, as segundas


e terceiras integram a reserva implícita.

A reserva de Plenário constitui uma exigência de transparência na discussão e votação,


norma a norma, de diplomas que vertam sobre matérias dotadas de especial sensibilidade
política ou que revistam alguma complementariedade em relação à própria Constituição.

o Votação final global


CRP: Artigo 168º/2 + RAR: Artigos 155º a 158º
Não é precedida de discussão, são realizados votos orais ou escritos.

CRP: Artigo 164º/1


Finda a discussão e votação na especialidade, a Assembleia da República em sessão
plenária procede à votação final global.

Trata-se do momento culminante da fase constitutiva que inere à aprovação da lei, já que
é por meio da votação final que o processo aprovatório originário se encontra concluído
e que a Assembleia da República exprime uma manifestação definitiva da sua vontade
normativa, com a forma de decreto, sendo o mesmo enviado para promulgação do
Presidente da República, de modo a ganhar existência jurídica como lei, na medida em
que seja promulgado e referendado ministerialmente.

Nesse sentido, a falta de votação final global afeta irremediavelemente a imputação da lei
ao Parlamento e supõe a ausência de vontade declarada, pelo que, uma lei que seja apenas
aprovada na generalidade e especialidade deverá ser tida como juridicamente inexistente.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 48


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RAR: Artigo 155º/2


Quando aprovado em comissão, o texto é enviado para Plenário para votação final, na
segunda reunião posterior à sua publicação no Diário da Assembleia da Republica ou a
sua distribuição avulsa aos grupos parlamentares.

RAR: Artigo 155º/3


Diferentemente dos estádios prévios de votação que são antecedidos por uma discussão,
a votação final global não é precedida de discussão, podendo, no entanto, cada grupo
parlamentar fazer uma declaração de voto oral

Nesta altura no caso da assembleia encerra-se o processo legislativo.


Após disto apenas se retifica os aspetos finais de redação.

o Redação Final
RAR: 156º
Finda a votação final global, a comissão competente em razão da matéria procede à
redacção final dos atos aprovados, não podendo alterar o pensamento legislativo, mas
apensa a perfeiçoar o estilo e a sistematização do texto, sem que se possam registar votos
contra.

Assim, se um preceito alterar objectivamente o sentido da norma aprovada em votação


final global, deve considerar-se que o mesmo enferma de inexistência jurídica, por falta
de imputação ao órgão competente para exprimir uma vontade constitutiva e que é o
Plenário.

RAR: Artigo 156º/2


Não, são, portanto admissíveis, a pretexto de correcções de estilo, alterações que
modifiquem minimamente o pensamento legislativo.

RAR: Artigo 156º/3


A redacção final tem lugar no prazo que a Assembleia da Republica ou o Presidente da
mesma estabeleçam, ou, na sua falta, no prazo de 5 dias.

Depois de concluída a elaboração do texto, este é publicado no Diário da Assembleia da


Republica, podendo qualquer deputado reclamar de inexactidões, até ao terceiro dia útil
após a data de publicação no DAR do texto da redacção final, competindo ao Presidente
decidir, no prazo de vinte e quatro horas, sobre reclamações.

RAR: Artigo 157º e 158º


Fica definitivo o texto sobre o qual não haja reclamações

Fase de Controlo de Mérito

Esta etapa reporta-se ao momento em que o ato legislativo é aprovado pela Assembleia
da República e é remetido sob a forma de decreto ao PR para promulgação.

O Chefe de Estado exerce o controlo político sobre um ato produzido pelo órgão
parlamentar.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 49


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O Presidente da República aprecia, livremente, o conteúdo do diploma e formula um juízo


de oportunidade positivo ou negativo, o qual se designa por controlo de mérito.

o Fiscalização Preventiva
CRP: Artigo 136º/1
O Presidente da República dispõe de vinte dias, contados desde a data de receção de
qualquer diploma da AR, para usar da sua faculdade de promulgar ou vetar.

CRP: Artigo 278º/1 + 3


Se tiver duvidas sobre a conformidade do ato com a Constituição pode, no prazo de oito
dias sobre a data de receção do decreto, suscitar a fiscalização preventiva da sua
constitucionalidade junto do Tribunal Constitucional.

CRP: Artigo 279º


Se a decisão do Tribunal Constitucional consistir pela inconstitucionalidade, o Presidente
da República deve vetar o decreto, assumindo este veto por inconstitucionalidade a
natureza de veto vinculado ou translativo, tendo o mesmo uma natureza distinta da do
veto político.
O diploma é, subsequentemente, devolvido ao Parlamento

CRP: Artigo 136º/1


Se a pronuncia do Tribunal Constitucional for pela não inconstitucionalidade, o
Presidente da República terá um prazo de vinte dias, contados da data de publicação dessa
decisão jurisdicional, para usar a sua faculdade de promulgar ou vetar politicamente

Em suma, o PR deve exercer o controlo de constitucionalidade de um ato legislativo em


formação, antes do controlo político. Na medida em que opte por exercer um controlo de
mérito, promulgando ou vetando o ato, já não fará sentido o seu controlo preventivo:
• Se promulga, a norma legal passa a ser juridicamente existente e enviada para
publicação, restando ao presidente exercer a fiscalização sucessiva da
constitucionalidade da lei (CRP: 281/2)
• Se veta politicamente, o diploma será precludido da sua existência jurídica e
devolvido ao Parlamento que, se o confirmar, forçará o Presidente a promulga-lo,
neste caso, um controlo preventivo seria inadmissível, dado que assumiria a
natureza de um obstáculo politico do Presidente, do qual poderia resultar um
longo processo de pronuncias, reenvios e confirmações.
Caso o diploma seja reformulado pela Assembleia da República tal ato modificativo
equivalerá à edição de um novo diploma e o PR poderá vetá-lo, mesmo que o mesmo
exiba um conteúdo sensivelmente igual ao ato anterior.

A fiscalização preventiva é a mais politica das fiscalizações da constitucionalidade.


Em caso de pronuncia pela não inconstitucionalidade, a posição politica do Presidente da
República pode, em certas circunstâncias, vir a ficar enfraquecida se pretender
posteriormente vetar o decreto.

De qualquer forma, se o juízo de mérito for positivo o PR promulga o diploma e este


passa a ser juridicamente existente, nos termos do CRP: 137.
Se for negativo, o PR veta o decreto e solicita à AR, em mensagem fundamentada, que
reaprecie o diploma (CRP: 136/1).

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 50


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

o Promulgação
O ato de promulgação não significa uma codecisão ou uma corresponsabilização do
Presidente pelo ato legislativo do Parlamento. Significa apenas que na ponderação entre
as hipotéticas valorações positivas e negativas do ato feita pelo Chefe de estado, as
primeiras superaram as segundas.

Em termos de conteúdo, pode distinguir-se:

• Promulgação Simples

• Promulgação com Reservas


Chefe de Estado faz acompanhar o ato promulgatório de uma mensagem onde exprime
preocupações, objeções sobre o ato e aspetos mais delicados em relação à sua
concretização legal e aplicação.
No plano estritamente político a promulgação com reservas procura tornar claro o
distanciamento presidencial em relação à lei que promulga, intentando para o efeito:
1) Dar conta de que o ato é insatisfatório e o PR nele não se revê, mas promulgou- o por
respeito a uma vontade parlamentar amplamente maioritária;

2) Tornar presente que os aspetos positivos do ato superam um pouco os atos negativos e
que são suscetíveis de criar situações disfuncionais que preocupam o PR e o levam a fazer
advertências cautelares;

3) Evidenciar distancia em relação à situação encontrada, tornando claro aos adversários


da lei que o Chefe de estado não foi insensível aa alguns dos seus reparos.

Sobretudo em cenários de coabitação, o PR não pode vetar todos os diplomas com os


quais discorde, sob pena de criar uma situação insustentável nas relações politico-
institucionais, a mensagem permite ao Chefe de estado alertar para disfunções de ordem
jurídica e politica e para impactos negativos futuros desconsiderados pelo legislador.

O princípio base é da promulgação livre, ou seja, o Presidente da República pode deliberar


que atitude pretende tomar:
o Promulgar (cumprindo os prazos)
o Vetar por inconstitucionalidade (quando haja interferência do Tribunal
Constitucional em sede preventiva) CRP: 134º g), 136º/ 5 e 278º/1
o Vetar politicamente CRP: 136º/1

Contudo nem sempre a promulgação é totalmente livre, nesses casos podemos estar
perante uma promulgação vedada ou obrigatória.

Casos de promulgação vedada:

• Leis orgânicas
CRP: Artigo 278º/7
A promulgação é vedada quando estamos perante uma lei orgânica pois o Presidente da
república tem que aguardar 8 dias até poder promulgar.
CRP: Artigo 278º/4

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 51


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Tal ocorre para dar tempo às restantes entidades poderem requerer a fiscalização
preventiva junto do Tribunal competente.

• Fiscalização Preventiva
CRP: Artigo 278º/7 2ª parte
Enquanto se aguarda a decisão do Tribunal Constitucional a lei não pode ser promulgada.

CRP: Artigo 279º


Quando o Tribunal se pronuncie pela inconstitucionalidade da norma, tendo esta de ser
devolvida ao órgão que a emanou, que por sua vez o aprove, contudo, o Presidente não a
promulgue dentro do prazo.

Casos de promulgação obrigatória:

• Leis de Revisão Constitucional


CRP: Artigo 286º/3

• Passado os prazos para exercer o poder de veto

• Quando após exercido o veto político a norma venha novamente a ser confirmado
CRP: Artigo 136º/2 e 3

Vamos deixar algumas notas sobre a posição do Presidente da República perante a


promulgação de um diploma.

O Presidente da República não pode alterar a qualificação do decreto que lhe chega.

A promulgação é necessariamente da totalidade do documento, pelo que não pode retirar


uma norma e promulgar o resto do documento.

CRP: Artigo 137º


A falta de promulgação ou assinatura por parte do Presidente da República implica a
inexistência jurídica do diploma em questão.

Um ato jurídico só passa a ter existência jurídica após a aprovação até la temos decretos
a espera que sejam promulgados como lei ou decretos leis.

É o ato de promulgação que confere a existência jurídica ao ato legislativo

Assembleia aprova um decreto para que seja aprovado e promulgado como lei pelo
Presidente da República. Os atos legislativos, leis e decreto-lei, denominam-se decretos
até serem promulgados.

Quando está um ato legislativo perfeito ou completo?

Quando a Assembleia da República autoriza o Governo a legislar indica o prazo que o


governo tem para utilizar a autorização legislativa.

Exemplo 1: A Assembleia da República autoriza até fim de Maio, o Governo aprova o


decreto a 20 de Maio e envia-o ao Presidente da República para que seja promulgado e

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 52


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

publicado como decreto-lei. O Presidente da República tem o prazo de 40 dias para


promulgar atos legislativos e por consequente só o irá promulgar em Junho.
Aí o Governo já não tem autorização? Em princípio teria que ser renovado o período de
autorização legislativa.

Exemplo 2: A Assembleia da República autoriza até fim de Maio. O governo legisla em


Abril, aprova em conselho de ministros em Abril e envia ao Presidente da República que
veta e devolve o diploma ao governo. Pode o governo fazer um novo diploma? Tem
autorização até ao fim de Maio mas não pode utilizar a autorização legislativa mais que
uma vez. Será que já a usou ou só se considera quando o ato for promulgado, sendo que
só no ato de promulgação é que o decreto passa a existir.
Não chegando a existir ainda não usou a autorização podendo fazer um novo diploma.

o Veto
É a recusa, o impedimento, a fiscalização de um órgão a outro, a impossibilidade de um
ato produzir efeitos por ação de um órgão exterior à competência para a sua prática.
O veto tem diversas classificações:

Quanto à matéria:
• Constitucional, quando incide sobre leis constitucionais
• Legislativo, quando incide sobre leis ordinárias
• Governativo, quando incide sobre atos políticos ou do governo

Quanto aso seus fundamentos:


• Jurídico ou ilegalidade lato sensu, quando é fundado em desconformidade com a
constituição
• Político ou de mérito, quando é fundado em motivos de conveniência ou
discordância política

Quanto às condições de exercício:


• Livre, o órgão competente o exerça por vontade própria
• Obrigatório, o órgão competente o realiza por força de uma norma constitucional

Quanto à forma:
• Expresso, quando manifestado por declaração de vontade
- Formal, exige um ato específico solene
- Informal, não está sujeito a forma especifica
• Tácito, quando pode surgir do silêncio ou da inércia com o passar do prazo
Quanto à inserção no processo:
• Suspensivo
• Resolutivo

Quanto à projeção nas relações interorgânicas:


• Simples, quando o processo se confina a só um órgão
• Translativo, quando o processo exige a articulação de mais de um órgão

Quanto ao objeto:
• Total, quando envolve todo o documento
• Parcial, quando incide só sobre uma parte

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 53


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Quanto aos efeitos:


• Relativo ou suspensivo, quando é capaz de ser suprido por uma manifestação de
vontade do órgão que o emanou
§ - Simples, basta uma deliberação com teor semelhante à primeira
§ - Qualificado, exige um processo de deliberação com requisito
mais severos
• Absoluto ou definitivo, quando tal não seja possível

Em caso de veto, o qual assume uma natureza suspensiva, o ato é reapreciado pelo
Parlamento, instituição que pode assumir 3 condutas:

o Desistência do Diploma
Seja porque a bancária maioritária não possui a maioria suficiente para a confirmação,
seja porque prefere não afrontar o Presidente da República com essa confirmação e não
encontra sentido útil numa reformulação, ou até mesmo, porque acaba por dar razão às
objeções presidenciais;

o Confirmação do Diploma com superação do veto:


1) Por meio da regra geral que envolve o voto favorável da maioria absoluta dos
deputados em efetividade de funções CRP: Artigo 136/2: legislação comum e algumas
categorias de leis reforçadas não orgânicas;

2) Por força da regra especial que impõe maioria de dois terços de deputados presentes,
desde que superior à maioria absoluta dos deputados efetivos, se se tratar de diplomas
que devam ser promulgados como leis orgânicas ou se incidirem sobre as matérias
previstas no CRP: Artigo 136º/3: Relações externas; Limites entre setores económicos;
Regulamentação de atos eleitorais que não revestem a forma de lei orgânica;

o Reformulação do Diploma Vetado com a introdução de alterações


Tendo em vista a reapreciação do ato do PR.

RAR: Artigo 169º


O diploma vetado é reapreciado a partir do décimo quinto dia contado a partir da receção
no parlamento da mensagem fundamentada, por iniciativa do Parlamento ou de um
décimo dos deputados, para efeito de eventual confirmação ou reformulação.
No que concerne à desistência, se a Assembleia da República não confirmar o diploma,
a iniciativa legislativa não pode ser renovada na mesma sessão legislativa, salvo nova
legislatura.

Quanto à confirmação, o veto pode designar-se:

o Veto Simples
Sempre que incide sobre uma lei que suponha a reversão do mesmo veto pelo voto da
maioria absoluta dos deputados efetivos;

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 54


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o Veto Qualificado
Quando incida sobre um ato legislativo que reclame uma maioria mais onerosa, de dois
terços.

O Presidente da República exibe um importante poder de impedimento, será muito pouco


provável que se reúna uma maioria absoluta ou uma maioria que qualificada que confirme
o diploma, principalmente em países onde existe uma grande fragmentação partidária,
como é o caso de Portugal. Em caso de confirmação realiza-se, apenas, uma votação.

No de a lei se inscrever nos atos legislativos sujeitos a votação final global por maioria
de dois terços., pese a existência de uma lacuna constitucional sobre a maioria adequada
de superação, entende-se, que, por identidade de razão com as leis orgânicas (art 136/3),
esses decretos carecerão de ser confirmados por idêntica maioria parlamentar a qual é
igual à da sua aprovação originária.

No caso de o decreto vetado conter disposições em relação a matéria de relações externas,


limites entre setores económicos e regulamentações de atos eleitorais excluídos de reserva
de lei orgânica, coloca-se o problema de saber se, caso o fundamento do veto não recair
sobre essas normas, mas sobre outras disposições do ato, a maioria de superação de dois
terços prevista nas alíneas b) e c) do artigo 136 CRP se aplica nessa situação.

São possíveis dois entendimentos:


• Um primeiro, de ordem substancial, ligaria necessariamente o fundamento do veto
à norma reguladora da matéria, não incidindo sobre matéria que exija uma maioria
qualificada, seria suficiente uma maioria absoluta para ultrapassar o veto.

• Um segundo entendimento, de ordem eclética, parte do pressuposto que a maioria


de superação operada por dois terços se funda em critérios objetivos:
1) O da onerosidade da maioria de aprovação (devendo a maioria de superação
ser superior ou pelo menos igual à primeira);
2) Ou da presença de matérias qualificadas no conteúdo da lei, sendo irrelevante
saber se todo o diploma ou pelo menos parte dele dispõe essas matérias;
A fundamentação do PR seria relevante, para o efeito, já que a mensagem fundamentada
do veto, consistindo uma exigência constitucional, não revela juridicamente quanto ao
seu conteúdo, que é politico e exprime uma relevância essencialmente político-
institucional, não podendo a justiça constitucional avaliar ou escrutinar as razoes que
acompanham os atos não normativos de caracter politico.
O professor Blanco de Morais acompanha a segunda posição.
CRP: Artigo 136º/2
Se a Assembleia da República confirmar o decreto o Preside da República deverá
promulga-lo no prazo de oito dias a contar da data de receção .
É proibido, implicitamente, o veto de bolso, mas se o presidente incumprir com a
obrigação constitucional criar-se-á um impasse jurídico e politico, pois não se prevê
nenhum órgão que possa substituir o PR na atividade promulgatória, sendo inexistente o
ato sem promulgação.

RAR: Artigo 160º


determina que se forem apresentadas propostas de alteração, a votação incide sobre os
artigos objetos de propostas.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 55


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O diploma alterado em segunda deliberação é enviado ao PR para promulgação , sendo


regido pelo ordenamento como se de um novo diploma se tratasse, pelo que repetirá o
processo de controlo previsto no CRP: Artigo 136º.

O poder inerente ao veto pressupõe um efeito jurídico de preclusão da existência do


decreto e a devolução deste ao Parlamento.
Da mensagem fundamentada pode-se extrair varias categorias de veto:

o Veto-sanção
Supõe a discordância absoluta o PR em relação ao mérito global do diploma, devendo
essa oposição resultar do teor de uma mensagem que se limita a explicar genericamente
as razoes da discordância;

o Veto-Construtivo
Implica uma discordância parcial ou condicionada em relação à oportunidade do diploma,
especificando a fundamentação do veto as matérias onde recaem essas objeções e
podendo, ainda, a mesma, aponta explicita, ou implicitamente, algumas pistas para a
ultrapassagem do impedimento presidencial em sede de reformulação parlamentar.

O veto por inconstitucionalidade e o veto politico distinguem-se em razão:


• Do Objeto: o veto por inconstitucionalidade sanciona atos pré-normativos
inconstitucionais e o veto politico bloqueia a existência jurídica de atos pré-
normativos relativamente aos quais o PR se limita a discordar da sua
oportunidade;
• Da Natureza: o veto por inconstitucionalidade é um veto vinculado a uma
pronuncia do TC pela inconstitucionalidade de um ato e o veto politico é, invés,
um controlo negativo, livremente exercido pelo Chefe de Estado.
Será admissível que o PR vete politicamente por razoes de inconstitucionalidade?

Se o PR tiver dúvidas de constitucionalidade deve promover a fiscalização preventiva e


não exercer o veto politico, o qual exprime um juízo de discordância relativamente ao
mérito, mas não há legitimidade constitucional do diploma. Dai que se invocar
explicitamente razoes de constitucionalidade para vetar politicamente, o Chefe de Estado
poderá incorrer em inconstitucionalidade material por desvio do poder.

Essa inconstitucionalidade não comporta, contudo, consequências jurídicas, na medida


em que respeita ao veto como ato político o qual, dada a sua natureza não normativa, não
pode ser objeto de fiscalização da sua constitucionalidade pela Justiça Constitucional,
pelo que, pese a sua potencial desconformidade com a CRP, ele dispõe da faculdade de
produzir os seus efeitos de obstaculização da existência da norma vetada.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 56


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Referenda Ministerial

Trata-se de um controlo politico do Governo sobre os atos do PR e que é oriundo da CRP


de 1933. Traduz-se na assinatura do Primiero-Ministro e dos ministros competentes em
razão da matéria

CRP: Artigo 140º


Alguns atos praticados pelo Presidente da República carecem de referenda ministerial,
confirmação por parte do governo, entre estes vem mencionado o artigo 134º b), ou seja,
o ato de promulgação deve ser referendado pelo governo.

CRP: Artigo 140º / 2


A falta de refenda determina a inexistência judicial do ato legislativo.

Aparentemente o ato de refenda parece ser um ato decisivo.


Pois confere existência jurídica ao ato de promulgação do Presidente da República e sem
promulgação não há ato legislativo.

E se o Governo recusar, ou seja, se a lei chega ao governo e não é referendada?


Ficaria nas mãos do Governo a aprovação de leis por parte do Parlamento e isto não faz
sentido, dar a este artigo uma interpretação segundo a qual o Governo tinha o poder de
referendar ou não.
Apesar do governo ter competência legislativa é a Assembleia da República o órgão
legislativo por excelência. Não podíamos atribuir ao ato de referendo a potencialidade de
confirmar ou rejeitar uma lei da Assembleia.

Este ato é meramente formal, como que se a assinatura do Presidente da República fosse
atestada pelo Primeiro Ministro.

A ocorrência da recusa da referenda em sede de promulgação de lei só faria sentido em


situações extremas, como seria o caso da promulgação de leis inconstitucionais de
excecional gravidade (reinstaurarão da pena de morte, por exemplo) ou da adoção de
outros atos presidenciais inválidos ou ilegítimos que pusessem em perigo a ordem
constitucional democrática, fazendo aí sentido que o Governo obstasse à sua entrada em
vigor, mediante a referida recusa.

Já a recusa da referenda como controlo ordinário de um Governo minoritário sobre a


promulgação presidencial de leis parlamentares de que o Executivo discorde não é
compatível com o nosso sistema de governo, implicaria um conflito politico de alta
intensidade entre o mesmo Governo, de um lado, e o Presidente e o Parlamento por outro
lado, sendo claro que, nesse conflito, o Governo seria o elo mais fraco, na medida em que
poderia estar em causa o “regular funcionamento das instituições democráticas”

Fase da publicação

A regra jurídica destina-se, em principio, a estabelecer um critério de conduta. Só pode


ser norma de conduta se for do conhecimento dos seus destinatários. Por esta razão se
compreende que a publicação condicione a entrada em vigor da lei.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 57


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

A falta da publicação tem como consequência a ineficácia jurídica do ato. Pese o facto de
o mesmo ato poder ter sido juridicamente perfeito, ele não produzirá quaisquer efeitos
jurídicos se não for publicado.

CRP: Artigo 119º/1 e 2


D atos normativos referidos têm de ser publicados no jornal oficial sob pena de ineficácia.

Por conseguinte, a observância de qualquer outro modo de publicação, por exemplo


através da imprensa ou dos meios de radiodifusão, é irrelevante para a eficácia da lei. O
jornal oficial é o Diário da República.

CRP: Artigo 119º/3


Determina as formas de publicidade dos atos que a Constituição não sujeita a publicação
no jornal oficial e as consequências da falta de publicidade.

CRP: Artigo 119º + Lei nº 74/98


Estão sujeitos a publicação no Diário da República os atos legislativos, os atos
regulamentares da AR e das Assembleias Regionais, os atos regulamentares do Governo
e dos seus membros e os decretos regulamentares regionais dos Governos das Regiões
Autónomas

Embora a fórmula do CRP: 119º/2 possa não abranger todas as leis em sentido material
amplo, deve entender-se que a publicação é um requisito de eficácia de todas as leis. Se
a lei não estabelece a forma de publicação terá de lhe ser dada a publicidade que permita
o conhecimento pelos seus destinatários: seja a notificação dos interessados, seja a
afixação na sede, seja qualquer outra forma.

CRP: Artigo 8º/2 + 119º/1 b)


A eficácia na ordem interna das normas de Convenções internacionais que vinculam
internacionalmente o Estado português depende de publicação no Diário da República

CRP: Artigo 8º/3


Já não estão sujeitas a publicação no Diário da República as normas emanadas de
organizações internacionais de que Portugal seja parte ao abrigo dos respetivos tratados
institutivos

CRP: Artigo 8º/4


Os atos normativos dos órgãos da União Europeia são publicados no Jornal Oficial da
União Europeia.

Entrada em Vigor

A entrada em vigor da lei é o culminar de um processo que passa pela verificação de


certos pressupostos de existência da lei (a sua criação), e ainda pela satisfação de certos
requisitos de validade e eficácia, dos quais referi, em último lugar, a publicação.

A respeito da entrada em vigor da lei é usual tratar-se do problema da determinação do


momento a partir do qual o ato normativo produz os seus efeitos.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 58


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

O problema da “localização” temporal não se limita à determinação do começo e da


cessação da vigência da lei, engloba também outros problemas, designadamente o da
delimitação do domínio recíproco de aplicação da lei nova e da lei antiga, que
estudaremos ulteriormente no capítulo dedicado à aplicação da lei no tempo.

O intervalo que decorre entre a publicação e a entrada em vigor de uma lei designa-se
vacatio legis. Por conseguinte, podemos desde já formular esta regra: a lei publicada
começa a vigorar na data que ela própria fixar.

CRP: Artigo 119º/2 + CC: 5º/1


A data fixada por uma lei sobre a sua entrada em vigor não pode ser anterior à data da
publicação, uma vez que a eficácia da lei depende da sua publicação.

Poderá a lei fixar a sua entrada em vigor na data da publicação?

Esta possibilidade era geralmente admitida antes da entrada em vigor


Lei nº 74/98: Artigo 1º e 2º
Esta veio estabelecer que a lei não pode entrar em vigor no dia da publicação. Mas esta
determinação só tem de ser observada pelas leis de valor hierarquicamente inferior.

Ora, a menos que se entenda que a Lei nº74/98 é uma lei com valor reforçado, o que
oferece muitas dúvidas, ou que tem caráter materialmente constitucional, tal lei tem o
mesmo valor que as outras leis da Assembleia da República, que os Decretos-Leis do
Governo ou que os Decretos Legislativos Regionais.

A lei também pode subordinar a sua entrada em vigor à verificação de um evento futuro,
por exemplo, a publicação de um diploma regulamentar

Lei nº 74/98: Artigo 2º/2


Na falta de disposição da lei sobre o momento da sua entrada em vigor, esta verifica-se
no quinto dia após a sua publicação

Lei nº 74/98: Artigo 2º/4


Este prazo conta-se a partir do dia imediato ao da sua disponibilização no sítio da internet
gerido pela Imprensa Nacional-Casa da Moeda
Exemplo: a lei X disponibilizada no dia 10 entra em vigor no dia 15, na falta de disposição
em sentido diferente contida na própria lei.

Por força do art. 296.o CC, na contagem de prazos de vacatio fixados em dias, semanas,
meses ou anos deve atender-se ao disposto no art. 279.o CC.

CC: Artigo 279º b)


Assim, os prazos fixados em dias contam-se a partir do dia seguinte à publicação diploma

CC: 279º c) 1ªparte


Os prazos fixados em semanas, meses ou anos, a contar de certa data, terminam às 24
horas do dia que corresponda, dentro da última semana, mês ou ano a essa data

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 59


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Exemplo: a Nova Lei da Arbitragem Voluntária (Lei nº 63/2011), entrou em vigor três
meses após a data da sua publicação. Uma vez que o diploma foi publicado em 14 de
Dezembro de 2011, deve entender-se que entrou em vigor em 15 de Março de 2012.

CC: 279º c) 2ª parte


Caso o prazo tenha sido fixado em meses a contar de certa data e não exista no último
mês dia correspondente, o prazo finda no último dia desse mês.

Exemplo: se a lei foi publicada em 31/3 e fixou a sua entrada em vigor um mês depois da
publicação, o prazo finda às 24 horas do dia 30/4 e a lei entra em vigor no dia 1/5.

Ao editar as leis, o legislador deve ponderar, perante o seu conteúdo e face ao


circunstancialismo social existente, se os prazos normais de vacatio legis são adequados,
se é necessário que a lei entre em vigor logo que seja publicada, ou se, pelo contrário, é
conveniente estabelecer um intervalo mais longo.

Assim, por exemplo, quando se trate de leis extensas e complexas, como é normalmente
o caso dos códigos, justifica-se um período dilatado de vacatio. Quando estejam presentes
considerações de urgência pode justificar-se uma redução ou supressão da vacatio.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 60


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Esquema Síntese do Processo Legislativo da Assembleia da República


(Resolução Casos Práticos)

Identificar o ato
(saber qual o regime de maiorias a ser aplicado)
Forma do Ato CRP: 166º + 112º/3

Iniciativa legislativa
Constitucionalidade da iniciativa CRP:167º e RAR:118º

Forma da iniciativa: RAR: 119º


Interna: Deputados5 e grupos parlamentares
Externa: Cidadãos6, ALR e Governo

Se a iniciativa for de referendo, referir: a partir da revisão constitucional de 1989, os


deputados, os grupos parlamentares e o governo podem ter iniciativa de referendo

Limites da Iniciativa:
CRP: 161º g) Lei de Orçamento de Estado, competência da AR, sob proposta do Governo
CRP: 161º g) Lei das Grandes Opções dos Planos Nacionais, competência da AR, sob
proposta do Governo;
CRP: 161º b) + 226º/1 Estatutos (EPARA) e Leis Eleitorais das Regiões Autónomas
CRP: 285º Leis de Revisão Constitucional, a iniciativa de revisão constitucional compete
aos deputados;
CRP: 167º/2 Alteração do Orçamento: cláusula travão, após a aprovação do orçamento
é levantada uma barreira que impede que outras entidades que não sejam o governo o
alterem. NOTA: A AR pode aprovar uma lei que reduz os impostos para valer para o ano
seguinte, o que não pode acontecer é que essa lei tenha vigência no próprio ano
económico.

Competência Legislativa
Reserva absoluta AR CRP: 164º +161º
Relativa da AR CRP: 165º
Reserva absoluta do Governo CRP: 198º/2

Se não couber em nenhum destes artigos, é de competência concorrencial pelo que todos
podem

Nos casos de reserva relativa a AR necessita de dar uma autorização legislativa:


Hierarquia quando aos demais atos: CRP:112º/2
Requisitos: CRP: 165º/2
Especificidades: CRP: 165º/3, 4, 5
Se for ao Governo CRP: 161º d), 198º/1 b)
Se for às Assembleias Legislativas das Regiões autónomas CRP: 161º, e) + 227º/1, b)
Especificidades: CRP: 227º/2, 3, 4

5 Em regra, têm iniciativa genérica, mas na prática à algumas que não fazem sentido: Lei do Orçamento, LAL e
estatutos das regiões
6 Torna-se difícil a existência de 20000 cidadãos eleitores a realizar uma proposta de lei e a iniciar o processo. Se
existem 20000 cidadãos eleitores a defender a existência de determinada lei, com grande, probabilidade também
existem deputados que o defendam. Basta um deputado para que se inicie o processo.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 61


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

NOTA: Quanto a matéria de reserva relativa, o Governo, também, pode apresentar


proposta mas é mais provável que peça uma autorização legislativa porque, desta forma,
pode ser ele próprio a controlar o processo.

Em relação à matéria não reservada ou matéria concorrencial, o Governo, também pode


apresentar proposta mas, uma vez que pode legislar, o mais certo que vá acontecer é que
seja o próprio Governo a legislar porque desta forma controla todo o processo, não há
necessidade de apresentar proposta.

A esmagadora maioria dos casos em que é apresentada uma proposta é em matéria de


reserva absoluta, porque é a respeito desta matéria que o Governo não pode legislar, se
se tratar de matéria de reserva relativa, como já referido, pode pedir uma Lei de
Autorização Legislativa, se for matéria concorrencial, o próprio Governo pode legislar,
não necessitando de qualquer autorização para tal.

Fase de Debate
Verificar se há quórum deliberativo exigido pelo CRP: 116º/2, isto é, 116 deputados
presentes visto que artigo CRP: 148º sem o quórum a votação não pode ter lugar RAR:
58º/2

Votação na generalidade CRP: 168º/2 RAR: 147º/1


Regime Geral maioria simples CRP: 116º/3
Maioria qualificada:
Maioria de dois terços dos deputados presentes desde que superior à maioria
absoluta dos deputados em efetividade de funções: CRP: 168º/6 a) e c)

Votação na especialidade7 CRP: 168º/2 RAR: 152º/1


Ocorre, em regra geral, nas comissões parlamentares CRP: 168º/3 RAR: 150º/1
Exceto quando a votação constitui uma reserva de plenário
CRP: 168º/4 + 168º/5 2ªparte (explicita) + CRP: 168º/6 (implícita devido à
maioria exigida)
Regra geral maioria simples CRP: 116º/3
Maiorias qualificadas:
Maioria absoluta dos deputados em efetividade de funções: CRP: 168º/ 5 2ªparte
Maioria de dois terços dos deputados presentes desde que superior à maioria
absoluta dos deputados em efetividade de funções: 168º/6

Votação Final Global8 CRP: 168º/2 RAR: 155º


Regra Geral maioria simples CRP: 116º/3
Maiorias qualificadas:
Maioria absoluta de deputados em efetividade funções CRP: 168º/5 1ªparte
Maioria de dois terços dos deputados presentes desde que superior à maioria
absoluta dos deputados em efetividade de funções: CRP: 168º/6 a) e c)

7 A lei será discutida e votada artigo a artigo


8 Nesta altura no caso da assembleia encerra-se o processo legislativo. Após isto apenas se retifica os aspetos finais de
redação

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 62


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Fase de Controlo Presidente República


Após aprovada em votação final na AR envia-se para o PR
Regra geral tem até 20 dias para agir CRP: 136º/1
Leis orgânicas são uma exceção pelo que tem que esperar 8 dias para agir CRP: 278º/7

Promulgação CRP: 134º, b)


Referenda Ministerial CRP: 140º, 197º/1, a)

Veto Político CRP: 136º/1


Devolução à AR:
Confirmação por parte da AR CRP: 136º/2
Regra geral maioria absoluta dos deputados em efetividade de funções CRP:
136º/2
Maioria qualificada, maioria de dois terços dos deputados presentes desde que
superior à maioria absoluta dos deputados em efetividade de funções: CRP: 136º/ 3
Reenvio para o PR, promulgação 8 dias CRP: 136º/2

Reformulação – reinicia-se o processo

Abandono do diploma

Devolução ao Governo com comunicado escrito CRP: 136º/4

Enviar ao Tribunal Constitucional (fiscalização preventiva) CRP: 136º/5


O PR tem 8 dias para enviar CRP: 278º/3
O TC tem 25 dias para se pronunciar CRP: 278º/8

Pronuncia-se Inconstitucionalidade
Veto Jurídico – Devolução à AR CRP: 279º/1
Confirmação por maioria de dois terços dos deputados presentes
desde que superior à maioria absoluta dos deputados em efetividade de
funções CRP: 279º/2 – PR promulga - RM
Expurga a norma inconstitucional CRP: 279º/2 – PR - RM
Reformulação CRP: 279º/3 – reinicia-se o processo
Abandono do diploma

Pronuncia-se pela não inconstitucionalidade CRP: 136º/1


Pode ser veto político ou promulgação

Referenda Ministerial
CRP: 140º+197º/ a)

Publicação
CRP: 119º

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 63


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

GOVERNO

COMPETÊNCIA LEGISLATIVA DO GOVERNO

As necessidades funcionais inerentes ao intervencionismo do Estado social de Direito


conduziram à extensão da função legislativa aos Governos, terminando o dogma da
“centralidade” legislativa dos parlamentos.

CRP: Artigo 198º


O Governo é titular de quatro competências legislativas distintas:

Competências Concorrenciais Alternadas

CRP: 198º a) + 161º c)


Faculdade de legislar sobre todas as matérias, menos as reservadas pela CRP ao
Parlamento.

Há que destacar a existência de um vasto campo de confluência de matérias não


enumeradas constitucionalmente, onde os dois órgãos podem simultaneamente legislar e
que se denomina de área de competência concorrencial.

O tipo de concorrência em presença assume natureza alternada: os dois órgãos podem, a


todo o tempo, legislar e aplica-se às relações entre os atos legislativos que, nos termo do
artigo 112º/1 detêm igual hierarquia formal, o critério cronológico, nos termos do qual, o
ato legislativo posterior revoga ou suspende o anterior.

CRP: Arito 228º/2


Com as assembleias legislativas regionais a situação já é distinta, o Governo desenvolve
uma concorrência paralela, ou seja, pode emitir diplomas para vigorarem em todo ou em
parte do território, porém, se colidirem com os decretos-legislativos regionais, estes vão
ter uma aplicação preferencial, na qualidade de leis de conteúdo especial, assumindo os
atos do Governo uma natureza supletiva.

Competência Exclusiva

CRP: 198º/2
Exclusiva competência do Governo legislar sobre a matéria respeitante à sua organização
e funcionamento (as impropriamente chamadas “leis orgânicas”).

O modo de estruturação do Governo, do Conselho de Ministros e de cada Ministério


reflecte uma opção politica intrinsecamente governativa, própria de um programa de
Governo, implicando como tal a sua integração na reserva exclusiva do Governo.

Os decretos-leis reportados a este domínio não podem ser submetidos a apreciação


parlamentar e, se vetados pelo PR, o Governo não os pode transformar em propostas de
lei, na medida em que ao Parlamento está vedada a faculdade de legislar sobre a
organização e funcionamento do Governo.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 64


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Competência Complementar

CRP: 198º c) e a)
A competência complementar expressamente prevista na alínea c) e implicitamente
presente na alínea a)
Esclarecem que compete ao Governo aprovar decretos-leis em matérias de reserva
relativa de competência da AR, mediante autorização desta, formalizada em lei.

CRP: Artigo 198º/3


Indicar expressamente a lei de autorização e de base. Permite nos saber se esta no uso
concorrencial ou dependente

Competência Legislativa do Governo em Gestão

CRP: Artigo 186º/5


Os governos em gestão não se encontram limitados em razão do conteúdo dos atos ou do
exercício das funções que a CRP lhe comete, sendo o critério decisivo para aferir a
validade jurídica desses atos a observância pelos mesmos do parâmetro da “estrita
necessidade” na sua prática.

O critério da estrita necessidade comporta uma margem muito grande de incerteza e supõe
o preenchimento de dois sub-critérios ao abrigo dos quais o Executivo deve fundamentar
os mesmo atos:
• Inadiabilidade (dimensão temporal de urgência);
• Proporcionalidade (dimensão material – a resposta deve estar numa relação direta
da causalidade com a situação relevante a resolver).
O Governo não está inibido de praticar atos com conteúdo inovatório, como atos políticos
e legislativos conquanto os fundamente nos dois princípios já referidos.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 65


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

PROCESSO LEGISLATIVO

Iniciativa

O estádio de impulsão consiste no conjunto de operações jurídicas metodológicas e


técnicas que concorrem para a colocação em marcha da iniciação do procedimento
legislativo.

Como decisão de legislar o impulso deve, em tese, ser condicionado por um conjunto de
pressupostos fácticos e requisitos de ordem técnica e metodológica, alguns dos quais
necessariamente o precedem:

o Perceção e definição do problema impulsionante (factores impulsionantes do ato


legislativo)
O impulso legislativo é previamente determinado por um pressuposto autónomo, que
consiste no reconhecimento da existência de um problema potencialmente condicionante
da necessidade de uma decisão legislativa. Este fator pode ser definido como “problema
impulsionante”.

O problema impulsionante, em regra, resulta de uma realidade insatisfatória que requer


solução.

o Formação da estratégia da decisão


Definido o problema, importará, muito brevemente, conceber um plano integrado que
implique a determinação de objectivos, a identificação dos recursos necessários para os
atingir, a escolha da solução não normativa ou normativa pertinente e nesta, da opção
mais adequada para enfrentar o referido fator problemático de impulsão legislativa. Trata-
se da estratégia de decião.

o Conceção do diploma
A “decisão de legislar” ou o impulso em sentido estrito implica a expressão de um ato
publico de vontade por força do qual o decisor coloca em marcha os trabalhos
preparatórios de elaboração de um ato legislativo.
O impulso traduz-se na decisão que desencadeia um procedimento normativo, a partir da
prévia escolha, pelo decisor, da alternativa legal que julgou mais adequada para preencher
os objectivos operacionais destinados a dar solução a um determinado problema.

Do impulso em sentido estrito inicia-se a tarefa de conceção do diploma, ou seja, na


feitura do texto normativo do diploma e respectiva nota justificativa.

Pode englobar a mesma fase as seguintes operações:


• Redacção preliminar do anteprojecto de diploma;
• Elaboração de anteprojecto da nota justificativa que acompanha o diploma com
• propósitos instrutórios;
• Consulta formal a entidades interessadas;
• Atividades de controlo endoprocedimental;
• Redação final do diploma e respectiva nota justificativa;

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 66


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A nota justificativa é um documento interno de natureza técnica política desprovido de


carácter normativo, que enquadra a natureza, o regime e os efeitos do diploma bem como
fundamenta as razoes que presidiram a sua elaboração.

o Formalização da Iniciativa
A formalização da iniciativa legislativa interna traduz-se na remissão ao Secretário de
Estado da Presidência do Conselho de Ministros de um projecto de Decreto-Lei ou um
projecto de proposta de lei assinado pelo membro do Governo proponente e acompanhado
pelos elementos instrutórios, tais como o formulário electrónico, pareceres, documentos
comprovativos de audições e consultas e fichas de avaliação prévia de impacto.

Fase Instrutória

A fase de instrução desdobra-se nos seguintes estádios procedimentais:


o Saneamento e Acompanhamento
O secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros realiza uma apreciação
preliminar do ato e pode submeter os projectos de diploma a um controlo de validade e
qualidade normativa formal e material. Essa faculdade compreende o poder de determinar
a sua devolução se os vícios de que o diploma padecer não puderem ser desde logo
reparados. Poderá ainda articular com o proponente, novas alterações do projecto, na
sequência da reunião de Secretários de Estado.

o Circulação pelos Gabinetes Ministeriais


Trata-se de uma actividade destinada, preferencialmente, a promover o acesso aos
diplomas e a suas eventuais avaliações de impacto por todos os Ministros, permitindo que
se firmem consensos, que se evitem conflitos de competência e que se auxilie a
preparação da Reunião de Secretários de Estado.

o Reunião de Secretários de Estado


Os projectos de diploma podem ser objecto de aprovação para agendamento com ou sem
alterações ou adiados.

Compete ao Secretário de Estado da Presidência, em articulação com o membro do


Governo proponente, promover a introdução de alterações na redacção dos diplomas
aprovados e correcções de ordem legistica, quando tal seja determinado na reunião de
Secretários de Estado.

o Audição das Regiões Autónomas


De acordo com o RCM, a Presidência do Conselho promove a audição das regiões
autónomas sobre diplomas de competência do governo que lhes respeitem.

Fase de Aprovação

CRP: Artigo 200º c), d)


O Conselho de Ministros é o órgão que, aprova os decretos-leis do Executivo, bem como
as propostas de lei que o Governo apresenta junto à AR.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 67


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CRP: Artigo 116


O Conselho de Ministros é um órgão colegial, aplicando-se o disposto para a deliberação
de órgãos dessa natureza.

CRP: Artigo 201º/1 a), b)


O poder de liderança governamental do Chefe de Governo, aliado a uma praxis
consolidada, faz com que o Primeiro Ministro imponha, até certos limites, a sua vontade
quanto à aprovação de diplomas normativos em Conselho.

Se em Governos de coligação essa vontade é mitigada, podendo, no limite, proceder a


votações, já nos Governos de composição homogénea não se procede por regra, a
qualquer votação, cumprindo ao Primeiro Ministro liderar a formação de compromissos
ou, no limite, impor politicamente a sua vontade, mesmo contra a Maioria dos Ministros,
fazendo aprovar ou reprovar um determinado diploma.

Daí que a doutrina fale na Colegialidade Imperfeita do Conselho de Ministros (a


colegialidade resulta da Constituição e do Regimento, mas não é assumida pela prática
politica, exceto quando se impuser pela natureza das coisas, por exemplo uma coligação).

o Modalidades de Aprovação
A aprovação de diplomas respeita, em regra, as prioridades que constarem da agenda do
Conselho de Ministros.
Sempre que na reunião de Secretários de Estado inexistam objeções ao diploma agendado
para aprovação em Conselho de Ministros, o diploma é aprovado por Consenso.
Noutras circunstâncias pode haver debate, mas a regra é a de que o PM induz a obtenção
de consenso.

CRP: Artigo 201º/3


Volvida a aprovação, o decreto do Governo colhe as assinaturas do PM e dos Ministros
em razão da matéira

Controlo de Mérito

CRP: Artigo 136º/1


Decreto aprovado pelo Conselho de Ministros e pelos ministros competentes em razão da
matéria é remetido ao PR para promulgação.

O chefe de Estado deve, no prazo de 40 dias contados da receção desse decreto ou da


publicação da decisão de não inconstitucionalidade pelo Tribunal Constitucional
promulga-lo ou exercer o direito de veto político.
O Presidente deve comunicar por escrito o sentido do veto, o que constitui uma forma de
fundamentação, não sendo a publicidade deste ato uma formalidade obrigatória.

O veto politico é insuperável, tendo, portanto, caráter absoluto, devendo o PR comunicar


por escrito ao Governo o seu sentido.
Sem prejuízo de ser admissível que o Governo, atenta a motivação do veto, aprove um
novo decreto-lei com disposições idênticas às do diploma vetado, mas onde constem
alterações nas normas antes objectadas pelo Chefe de Estado (Reformulação).

Questão discutida pela doutrina surge quanto à aprovação de um novo decreto, de


conteúdo idêntico, ao que foi vetado em momento anterior pelo PR.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 68


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Esquema Síntese do Processo Legislativo do Governo


(Resolução Casos Práticos)

Identificar a competência legislativa governamental


Competência Concorrencial Alternada CRP: 198º/1 a)
(Reservas da A.R. 161.º, 164.º e 165º)

Competência Exclusiva CRP: 198º/2


(“Leis Orgânicas” do Governo)

Competências Complementares CRP: 198º/1 c).

Competências Delegadas CRP: 198.º/1 b) e 165.º


Verificar se Lei de Autorização Legislativa preenche os requisitos necessários
(objeto, sentido, extensão, duração da autorização e se não houve motivo de
caducidade) CRP: 165.º/2, 3, 4 e 5.

Governo em Gestão CRP:186º/5

Processo Legislativo9
Iniciativa de um membro do governo (Ministro/os usualmente) competente em razão da
matéria.10

Envio para o Secretario de Estado da Presidência do Conselho de Ministros (apreciação


parlamentar).

Circulação pelos Gabinetes Ministeriais.

Apreciação em Reunião de Secretários de Estado.

Possíveis Audições às Regiões e a outros.

Envio para Conselho de Ministros.

Aprovação em Conselho de Ministros CRP: 200º/1 c), d)


Usualmente, por consenso (sem necessidade de votação), podendo ocorrer por votação –
colegialidade imperfeita.

Assinatura pelo Primeiro-Ministro e pelos Ministros competentes CRP: 201º/3

Controlo de Mérito
Envio para o P.R. CRP: 134º/ b)

Promulgação (40 dias) CRP: 136º/4


Referenda Ministerial (140.º) - Publicação.

9 Desde a Iniciativa até à fase de envio para Conselho de Ministros, o procedimento assume pouca importância para a

resolução de casos práticos, encontrando-se regulado no Regimento do Conselho de Ministros.


10 Note-se a possibilidade de o Primeiro-Ministro propor diplomas diretamente em Conselho de Ministros.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 69


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Veto Político (insuperável) (40 dias) CRP: 136º/4


Fim do Diploma
Possibilidade de submeter à A.R. ou reformular

Envio para Fiscalização Preventiva (8 dias) CRP: 136.º/ 5, 278.º e 279.º


Inconstitucionalidade
Veto Jurídico CRP: 279º/1

Fim do Diploma
Possibilidade de submeter à A.R. ou reformular CRP: 279º/3

Não inconstitucionalidade
Promulgação (40 dias) CRP: 136.º/4.

Veto Político (40 dias) CRP: 136.º/4.


Fim do Diploma
Possibilidade de submeter à A.R. ou reformular

Apreciação Parlamentar CRP: 169.º


Decreto-Lei não pode ter sido aprovado no uso da Competência Exclusiva do
Governo CRP: 169.º/1.

Iniciativa mínima de 10 deputados, dentro dos 30 dias após aprovação do Decreto.

Caducidade após 10 reuniões plenárias e por revogação do diploma pelo governo


RAR: 169.º/3 e 197.º/1

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 70


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APRECIAÇÃO PARLAMENTAR

O Instituto de Apreciação Parlamentar tem a sua origem na Carta Constitucional


portuguesa, encontra-se previsto no CRP: Artigo 169º

A apreciação parlamentar constitui uma manifestação da supremacia da AR sobre os


restantes órgãos constitucionais, no que respeita ao exercício da função legislativa. Essa
manifestação traduz-se na faculdade da AR, no respeito de certos limites temporais e
circunstanciais, poder apreciar o mérito da grande maioria dos decretos-leis bem como
dos decretos legislativos regionais autorizados, tendo em vista a sua eventual cessação de
vigência e modificação, a qual pode ser procedida por uma suspensão da sua eficácia.

CRP: Artigo 162º c)


Fiscalização da Assembleia da República perante o Governo.
Assembleia da República pode chamar os diplomas a apreciação parlamentar, salvo os da
competência exclusiva, e pode fazê-lo para dois fins, ou alterar ou fazer cessar a sua
vigência.

Exemplo: Parcerias público privadas. Coligação negativa, os partidos das oposições em


conjunto rejeitaram um decreto.

Atos Sujeitos a Apreciação

Encontram-se sujeitos ao regime de apreciação parlamentar:

o Todos os decretos-leis, salvo os aprovados no exercício da competência


legislativa exclusiva do Governo CRP: Artigo 169º/1
o Os decretos legislativos regionais que tenham sido objecto de uma autorização
legislativa da Assembleia da República CRP: Artigo 227º/4

Pressupostos, Iniciativa e Admissão

CRP: Artigo 169º/1


A apreciação parlamentar pode ser requerida por um mínimo de 10 deputados, para
efeitos de cessação de vigência ou de alteração, nos 30 dias subsequentes à publicação do
ato legislativo eu dela é objecto, descontados os períodos de suspensão do funcionamento
da Assembleia da República.

Votação

RAR: Artigo 205º/1


A votação na generalidade incide sobre a cessação da vigência

RAR: Artigo 208º/2 e 5


A votação na especialidade incidirá sobre as propostas de alteração, as quais podem ser
objecto de votação final global

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 71


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Caducidade

CRP: Artigo 169º/5


Se não se registar pronuncia parlamentar sobre o pedido de cessação de vigência ou, no
caso de se ter deliberado introduzir emendas e a respectiva lei não ter sido votada até ao
termo da sessão legislativa em curso, desde que decorridas 15 reuniões plenárias, deve o
processo de apreciação parlamentar considerar-se encerrado

Se o Governo ou as ALR revogarem o decreto-lei ou o decreto legislativo regional em


apreciação, o processo de apreciação parlamentar fica encerrado.

Formas de Apreciação Parlamentar

o Forma da Alteração
CRP: Artigo 112º/ 2 e 5
Todo o tipo de modificações ou emendas introduzidas em diplomas legais no contexto da
apreciação parlamentar devem revestir a forma de lei

Procedimento

O procedimento encontra-se previsto no artigo RAR: 196º

Suspensão da Vigência

Se for submetido a apreciação de um decreto-lei autorizado e se forem apresentadas as


propostas de alteração a Assembleia da Republica pode aprovar uma resolução que
suspenda, no todo ou em parte, como medida cautelar, a vigência do decreto-lei até à
publicação da lei que o venha a alterar ou até à rejeição de todas as propostas de alteração.
Evita-se que o diploma produza efeitos jurídicos precários, potencialmente prejudiciais e
geradores de situações de desigualdade desnecessária em relação ao regime legal que seja
definitivamente aprovado depois de operadas as eventuais alterações.

CRP: Artigo 169º/2 e 3


A suspensão caduca decorridas 10 reuniões plenárias sem que a Assembleia da Republica
se tenha pronunciado a titulo final

Apreciação Parlamentar para Efeito de Cessação de Vigência

o Forma do Ato de Cessação da Vigência


CRP: Artigo 169º/4
Forma de resolução da Assembleia da Republica

No caso de ser aprovada a cessação de vigência do decreto-lei, este deixará de vigorar,


como se tivesse sido revogado, desde o dia em que a resolução for publicada no Diário
da República e não poderá voltar a ser publicado no decurso da mesma sessão legislativa
Não se tem por admissível que a resolução que determina a cessação da eficácia produza
efeitos retroativos.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 72


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Repristinação

A resolução deve especificar se a cessação de vigência implica a repristinação das normas


revogadas pelo diploma em causa, de modo a evitar a ocorrência de lacunas.

Quando a Assembleia da República faz cessar a vigência é a Assembleia da República


que exclusivamente manda no procedimento porque o aprova através de uma resolução e
estas são publicadas sem a necessidade de promulgação do Presidente da República que
não se pode opor nem enviar para o Tribunal Constitucional.

E se o governo voltar a aprova um decreto lei? E se andarmos num ciclo de decreto lei
decreto?

Indo pelo processo legislativo normal haveria esta possibilidade

CRP: Artigo 169º/4 2ª parte


Podem andar a revogar mutuamente sem fim

Contudo não podem publicar outro decreto após cessação por parte da Assembleia.

O que é que este instituto trás de novo relativamente aquilo que já sabíamos?
Já tínhamos visto que leis e decretos tem o mesmo valor
Mesmo que os artigo 162º c? e 169 não existissem a Assembleia continuava com
autorização para legislar. O que adiante este instituto? Qual a vantagem da assembleia
recorrer a este instituto?

Vantagens do procedimento de chamar diplomas a apreciação

o Prioridade no agendamento parlamentar


o Quando a Assembleia chama um decreto a atenção do publico aumenta
o Em caso de cessão o diploma deixa de vigorar desde o dia da publicação da sua
cessação
CRP: Artigo 169º/4
• As resoluções são publicadas independentemente da promulgação
CRP: Artigo 166º/ 6

Esquema Síntese sobre a Apreciação Parlamentar

Competência da AR CRP: 162º c)


Procedimento CRP: 169º
A AR pode fiscalizar os atos legislativos de outros órgãos que são realizados ao abrigo da competência exclusiva.
Requisitos:
Requerimento 10 Deputados
Nos 30 dias seguintes à publicação do ato legislativo
Objetivos:
• Alterar o diploma
• Suspender a vigência dos decretos-leis feitos no uso de autorização legislativa
• Fazer cessar a vigência do diploma

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 73


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ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DAS REGIÕES AUTÓNOMAS

CRP: Artigo 6º/1


O Estado Português é definido como um Estado unitário que respeita, na sua organização e
funcionamento, o regime autonómico insular.

CRP: 6º/2
Regime jurídico que só compreende dois arquipélagos, o dos Açores e o da Madeira,
regiões dotadas de autonomia político-administrativa, com órgãos de governo próprios e
regidas por estatutos autónomos.

O Estado português é unitário, na medida que, sob um ponto de vista constitucional


pressupõe uma só fonte de poder constituinte e uma só Constituição, tendo as regiões
autónomas autonomia politico-administrativa disciplinadas no plano organizativo e
funcional por leis estatutárias. Trata-se de uma categoria de lei ordinária com valor
reforçado. Os estatutos são uma lei reforçada da competência da AR sob proposta das
Regiões Autónomas.

Os princípios da unidade e solidariedade nacional CRP: 225º/2 garantem na ordem


jurídica portuguesa um mínimo denominador comum no processo de decisão politico-
legislativo dotado de relevo imediato para todos os cidadãos, o qual pode ser assegurado
por um conjunto de atos legislativos qualificados pelo Estado (por exemplo, as leis de
bases e lei de autorização legislativa) e pela exigência que os órgãos locais não
ultrapassem a sua competência.

O Estado Português é um Estado Regional e um Estado Unitário de Regionalização


Parcial e Periférica dado que as únicas parcelas territoriais regionalizadas politica e
administrativamente, se referem aos arquipélagos atlânticos.

Os Estados Regionais são sempre unitários, na medida em que supõe a unicidade do poder
constituinte.
Porem, trocar, através de uma revisão constitucional a expressão “Estado unitário” por
Estado Regional não faz muito sentido, tanto mais que não retractaria com exactidão a
realidade portuguesa: o Estado Português não se encontra regionalizado no seu território
continental, mas apenas no espaço de duas regiões periféricas, não fazendo sentido adotar
denominações reducionistas, em que o todo seja definido em razão das partes, sobretudo
quando estas representam uma pequena parcela do território e da população. Por outro
lado importa evitar injectar na Constituição conceitos doutrinais pouco amadurecidos ou
pautados por fraco consenso político e jurídico.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 74


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PODERES LEGISLATIVOS REGIONAIS

O Governo regional não tem competência legislativa > CRP: Artigo 232º

O órgão regional com a função legislativa é a Assembleia Legislativa da região autónoma


que legisla a matéria estipulada nos estatutos fixados pela Assembleia da República. Deu-
se uma evolução constante na atribuição de poderes às regiões autónomas, estes foram
aumentando:

Anteriormente Atualmente

Apenas legislavam matéria de interesse Para ser matéria de sua competência


específico. legislativa basta que esta esteja numerada
Exemplo: Salários de professores no estatuto.
regionais

Quando legislavam os decretos tinham de Este princípio desapareceu ficando apenas


estar submetidos às leis gerais da estipulado que não poderia violar os
República. princípios gerais

Na revisão de 2004 ficou claro que as regiões autónomas podem legislar sobre as
matérias desde que estas não estejam reservadas aos órgãos > CRP: Artigo 112º/4

A expressão “apenas âmbito regional” não tinha significado até intervenção o Tribunal
Constitucional. Neste caso o Tribunal Constitucional considerou que o abito regional se
referia ao a nível territorial e também ao sentido da matéria, ou seja, se esta for mais
adequada para outros órgão o limite regional era violado.

Nota: Em caso de dúvida e conflitos o Tribunal Constitucional é contra a região


Autónoma

Contudo as regiões autónomas detêm uma arma suplementar nas revisões constitucionais
pela Assembleia da República assim como na aprovação dos estatutos.

Os partidos nacionais têm representação regional, os partidos regionais chegam a acordo


entre eles sobre propostas e decisões e os os partidos do continente não querem ir contra
para não criar problemas internos e as regiões internas ganham com as propostas que
fazem.

Decretos Leis Regionais

Partimos do princípio que as leis e decretos leis nacionais têm o mesmo valor. Onde
entram os decretos regionais, emanados pela Assembleia Legislativa regional, nesta
hierarquia?

A Assembleia Regional pode emanar decretos leis regionais em matéria que não seja
reservada aos órgãos de soberania e seja enunciada no estatuto da região como sendo da
sua competência.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 75


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

As regiões autónomas legislam no âmbito regional um decreto regional.

CRP: Artigo 232º


Competência legislativa da Assembleia Regional para fazer decretos leis regionais

Caso Prático: O governo regional tem competência regulamentar?


A assembleia faz um decreto que depois tem que ser regulamentado, quem tem
competência para o regulamentar? A assembleia ou o governo?

CRP: Artigo 232º / 1 remete para CRP: Artigo 227º, d)


A alínea d) tem duas partes:
Primeira Parte: Regulamentos de legislação regional
Segunda Parte: Regulamentos de legislação emenda de órgãos de soberania

O regulamento referido no exemplo entra na primeira parte por isso não é de competência
da assembleia, mas sim do governo. Assim o governo tem competência regulamentar.

Caso Prático:
Assembleia da República faz uma lei aplicável às Regiões Autónomas e a assembleia
regional legisla em sentido contrário.
Quid Iuris?

A Assembleia Regional Legislativa pode legislar contrariando um diploma emanado de


um órgão de soberania

CRP: Artigo 228º / 2


Havendo legislação regional é essa que se aplica, apenas se aplica a nacional na falta de
legislação regional.
Dai a autonomia regional

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 76


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

COMPETÊNCIA LEGISLATIVA DAS REGIÕES AUTÓNOMAS

CRP: Artigo 232º


Quando falamos em competência legislativa regional estamos a falar da competência
legislativa da Assembleia Regional Legislativa. Os governos só têm competência
regulamentar.

A Assembleia Regional só pode legislar sobre a matéria que venha nos estatutos político
Administrativos Regionais aprovados pela Assembleia da República. A Assembleia da
república define através do estatuto sobre que matérias as regiões podem legislar, a
Assembleia da República no fundo remete para a Assembleia regional praticamente todas
as matérias que elas tenham interesse, a enunciação é muito vasta pelo que em termos
práticos não funciona como um limite. O limite negativo de grande importância, não pode
legislar sobre matéria reservada aos órgãos de soberania, governo e Assembleia da
República. Pode legislar sobre matéria que está nos estatutos e que não esteja reservada
a outros órgãos. Pode ainda pedir autorização à Assembleia da República.

CRP: Artigo 227º


Encontram-se estabelecidos os poderes das regiões autónomas
CRP: 227º/1
Diferentes dimensões da competência legislativa
CRP: 227º/1 a)
Genérica
CRP: 227º/1 b)
Autorizada
Muito semelhante aquilo que se passa com o governo, contudo a última parte do artigo
mostra que não tem autorização para legislar sobre todas as matérias.
A matéria do artigo 165º b) enuncia a matéria de reserva relativa, mas à matérias que as
regiões autónomas não podem mesmo que Assembleia da República autorize, como os
direitos garantias e liberdades.

Recentemente este limite teve um significado prático relevante.


A quando a pandemia provocada pelo vírus covid-19 os Governos Regionais introduziram alguns
limites de relevo à liberdade de circulação e deslocação: estabelecendo que cidadãos que
entrassem e não fossem residentes da região autónoma em questão teriam de ficar sujeitos a uma
quarentena de 14 dias.
Podem as regiões autónomas legislar sobre esta matéria?
Regente Jorge Reis novais considera não o podiam ter feito, pois praticam um ato de natureza:
• Inconstitucionalidade natural, ao descriminar residentes e não residentes
• Inconstitucionalidade orgânica, pois não lhes compete legislar sobre liberdade de
deslocações nas regiões
CRP: Artigo 227º/1 b)
Matéria reservada à Assembleia da República e sobre a qual não pode haver autorização.
Este tipo de legislação é inconstitucional, pois não há competência regional para decidir
sobre este tipo de matéria. Não entra em nenhum das Competências: genérica, uso de
autorização e de desenvolvimento.
A legislação realizada no uso da competência legislativa autorizada pela Assembleia da
República no fundo tirando a diferença de não abranger todo o artigo 165º em termos
globais há um paralelismo com o que o governo pode fazer.

CRP: Artigo 233º Os atos legislativos são enviados e assinados ou vetados pelo do
representante da República

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 77


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Distribuição Horizontal de Competências

Em termos do modelo de repartição de competências entre o Estado e as Regiões


conservou-se com a revisão de 2004 a manutenção de duas “listas” constitucionais de
poderes, respectivamente estaduais e regionais. Passou-se, com esta revisão, a atribuir
expressamente aos Estatutos, um papel central na discriminação de matérias de
competência regional nas quais incidirão os poderes legislativos autonómicos de tipo
comum.

Foi, deste modo, conservada na Constituição:


• Uma listagem por via remissiva de matérias de competências legislativas
regionais com carácter:
• Delegado CRP: 227º/1 b) através de uma lei de autorização legislativa;
• Complementar CRP: 227º/1 c) desenvolvimento de bases;

• E, ainda, uma remissão importante das restantes matérias de virtual competência


autonómica para uma terceira lista regional de natureza infraconstitucional
inscrita nos estatutos CRP: 227º/1 a) e 228º/1 a qual coexiste num universo
concorrencial paralelo com competências dos órgãos de soberania integradas
numa reserva móvel. É neste domínio de concorrência paralela que conflui em
binários diferentes dentro de uma mesma matéria, o exercício das competências
regionais comuns e o exercício de poderes soberanos. Há, contudo, que nela
separar, uma esfera de poder regional e outra esfera atribuída aos poderes do
Estado.

Taxatividade da Enumeração das Matérias Respeitantes à Competência


Legislativa Regional Comum ou Primária

A taxatividade imposta da enumeração constitucional e estatutária dos poderes


legislativos das regiões decorre:

CRP: 227º “Poderes das Regiões Autónomas”


CRP: 228º “A autonomia legislativa das Regiões Autónomas incide sobre as matérias
enunciadas no respectivo estatuto politico-administrativo que não estejam reservadas
aos órgãos de soberania”

Semelhante fórmula não deixa grande margem para o exercício de poderes legislativos
de tipo comum fora do limite positivo e negativo do estatuto.

Supressão da antiga alínea o) do artigo 228º que permitia expressamente legislar fora das
listagens constitucional e estatutária.

Um ato legislativo que não se encontre previsto nas alíneas b) e c) ou que se encontre fora
da previamente definida como de âmbito regional de estatuto será organicamente
inconstitucional.

Com a revisão constitucional de 2004 a alínea a) do 227º/1 conjugada com o nº1 do artigo
228º passou a remeter para os estatutos o elenco de matérias de âmbito regional
submetidas ao exercício da competência regional comum ou primária eliminando-se a

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 78


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

regra que conferia carater exemplificativo à enumeração estatutária e ficando pressuposta


a sua taxatividade.

Blanco de Morais considera inconstitucional a inclusão, no estatuto, de uma cláusula


aberta, ou seja, de uma norma que habilitasse a região a legislar sobre outras matérias
indeterminadas não previstas no elenco estatutário. Seria inconstitucional porque as
regras estruturantes de repartição de competências legislativas entre o Estado e as regiões
repousam na Constituição e não nos estatutos
CRP: 110º/2 “A formação, a composição, a competência e o funcionamento dos órgãos
de soberania são os definidos na Constituição”

CRP: Artigo 227º/1


Os estatutos definem o objecto, a extensão material dos poderes legislativos regionais
previstos na própria constituição (configurando e densificando o âmbito e até aspectos da
extensão especifica do exercício desses poderes) mas não estão constitucionalmente
autorizados a aditar novas normas retoras da distribuição de competências que não
derivem da Lei Fundamental.

CRP: Artigo 228º/1


Determina que a autonomia legislativa regional incide sobre as matérias enunciadas no
estatuto, não podem as leis estatutárias ultrapassar a sua função normativa de fixação e
de definição de âmbito dessas matérias, para passarem a arrogar-se à função de norma
habilitante do exercício de poderes legislativos regionais sobre matérias indeterminadas,
à semelhança do que fazia a antiga alínea o) do artigo 228º, suprimida na ultima revisão
constitucional.

Uma norma deste tipo seria inconstitucional por padecer do vicio de desvio do poder. Por
outras palavras, ao assumir-se como uma norma habilitante do exercício da competência
regional comum sobre matérias indeterminadas do universo constitucional e não como
norma dotada da função de especificação dessas mesmas matérias (tal como é imposto
pelos artigos 227º/1 e 228º) essa disposição violaria o fim constitucional preciso que estas
normas constitucionais assinam aos estatutos quanto ao exercício desse tipo de
competência regional, prosseguindo sem credenciação apropriada, fins públicos de ordem
diversa. E, ainda seria de questionar a própria teleologia do artigo, tendo em conta que
essas normas seria meramente exemplificativas qual seria a necessidade de aprovação por
maioria de dois terços (168º/6 f)) das normas que as consagram?

Em relação a uma questão semelhante, o Tribunal Constitucional determinou que “...pelo


seu teor irrestrito e indeterminado, com total omissão de qualificações materiais
delimitadoras, ela não atinge o grau de densificação constitucionalmente exigível.
Temo-la ferida por inconstitucionalidade, por violação do disposto nos artigos CRP:
112º/4, 227/1 a) e 228/1”.

O estatuto completa, assim, o quadro constitucional de distribuição de competências


tendo, na enumeração de matérias da competência regional que não sejam atribuídas na
CRP caráter taxativo.

Em sentido oposto está a posição adotada pelos professores Jorge Miranda e Rui
Medeiros, que julgam a dita “clausula residual” constitucional.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 79


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

CRP: Artigo 227/1


As competências complementares, delegadas e mínimas devem ser definidas nos
estatutos. Considera-se, contudo que a sua caracterização constitucional é
suficientemente precisa para serem imediatamente exequíveis, independentemente de
figurarem ou não em normas estatutárias. Por conseguinte, estima-se que a regra do artigo
228/1, devendo ser conjugada com as primeiras alinhas do no1 do 227 CRP, valerá
exclusivamente para as competências comuns, as quais não se encontram enumeradas na
Constituição. E que, se as competências complementares e delegadas previstas em
“listagem constitucional” não forem reproduzidas nos estatutos, tal não obstará a que
sejam exercidas a partir das normas constitucionais que as consagram (112/4 CRP).

Eliminação Oportuna das Leis da República

O regime instituído pela revisão constitucional de 2004, permite concluir que as matérias
do hemisfério concorrencial paralelo que incidiam sobre domínios enumerados nos
estatutos como sendo de âmbito regional continuam a ser disciplinadas por decretos
legislativos regionais ao abrigo de competências legislativas comuns. Só que, no plano
qualitativo, o exercício dessas competências comuns, alterou-se no sentido do reforço da
liberdade conformadora do legislador regional, ampliando-se a densidade reguladora, a
capacidade inovatória das leis autonómicas e o “quantum das matérias disponíveis”.

Cláusulas Gerais: “Âmbito Regional” e Reserva Móvel de Competência dos


Órgãos de Soberania

Para o efeito dessa separação ou delimitação, torna-se relevante o uso de limites À


competência regional sediados em cláusulas gerais (“âmbito regional”, “reserva de
competência dos órgãos de soberania” na sua variante móvel ou expressa).

Através de um critério material, e no respeitante às competências comuns ou “primárias”,


existe no ordenamento português uma listagem explicita de matérias reservadas aos
órgãos soberanos do Estado (e vedada ao exercício de competências regionais, salvo
algumas respeitantes a matérias delegáveis) e um domínio de matérias remanescentes
integradas numa esfera concorrencial paralela, na qual as regiões podem legislar em
determinados “âmbitos materiais” previstos na constituição ou elencados nos estatutos.

Será neste âmbito material paralelo que se insere uma cláusula geral valorativa, que nada
mais é do que uma cláusula de competência móvel para a repartição de poderes
legislativos entre o Estado e as Regiões em relação a cada matéria: de um lado sedia-se
um domínio material respeitante ao âmbito regional; de outro, um âmbito material
integrado numa reserva implícita dos órgãos de soberania.

Negar a existência de uma repartição horizontal, será negar no ordenamento português a


existência de uma arquitectura constitucional de repartição de poderes legislativos entre
o Estado e as regiões, o que seria inverosímil.

A Substituição do “Limite Especifico” por “Interesse Regional”

A revisão de 2004 extinguiu este conceito, cessando um conceito indeterminado que


permitia à Justiça Constitucional invalidar diplomas regionais que não dispusessem sobre

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 80


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

matérias que apenas ocorressem na região ou que aí tivessem uma especial configuração.
A grande maioria das declarações de inconstitucionalidade fundaram-se no vicio da
inconstitucionalidade orgânica por violação do interesse especifico.

Doravante, as regiões passam a legislar de acordo com o interesse regional como novo
critério de delimitação competencial.

Entre lei geral do Estado e uma lei especial da região que, no universo das matérias
concorrenciais, vier disciplinar a mesma matéria, a administração autonómica deve dar
preferência aplicativa, em nome do principio da especialidade, à lei regional.

O conceito “Interesse Regional” comporta um elemento espacial e um elemento


substancial, dado aludir fundamentalmente à projecção de uma matéria no âmbito
geográfico ou espacial de uma região.

Por exemplo, legislação relacionada com o turismo, deve decompor-se, sob um ponto de
vista legislativo, numa esfera geral de incidência estadual e numa esfera especial de
caráter regional, sendo as mesmas reguladas por leis distintas. Apenas se a lei regional
for revogada sem substituição ou se ostentar lacunas é que a lei geral aprovada pelo
Estado poderá aplicar na região, já que é aí que vigora supletivamente CRP: 228º/2

Esta solução visa tutelar bens jurídicos dos cidadãos locais, pelo seu caráter de
especialidade. Pode ser necessário invocar o principio da unidade e solidariedade
nacionais CRP: 225º/2 quando esta protecção do interesse regional se projecta
indiretamente no plano nacional em prejuízo dos princípios da unidade e solidariedade
nacionais, comprometendo nomeadamente, o gozo ou fruição desses mesmo bens pelos
cidadãos residentes noutras partes do território.

Para tentar densificar cláusula geral de “interesse regional” o TC esclareceu:


• Que se relaciona com as matérias que digam respeito às regiões autónomas;
• Que é definido em função de especial configuração que as matérias assumem na
respectiva região;
• Que o critério geográfico deveria ser completado por um critério material, ou seja,
as leis regionais não podem afetar a ordem jurídica nacional “atenta as pessoas
envolvidas e os interesses e valores em jogo”.
Por outras palavras, mesmo que o ato legislativo regional se aplique apenas na região, de
acordo com o critério geográfico, violará o limite configurado pelo âmbito regional caso
se projecte sobre interesses e fins qualificados de ordem geral e unitária prosseguidos
pelos órgãos de soberania, sendo para o efeito irrelevante que a matéria não figure
expressamente na reserva de competência dos mesmos órgãos.

O Limite da Reserva de Competência Implícita dos Órgãos de Soberania

CRP: 227º/1 a)
Veda às regiões o poder de legislarem sobre matérias reservadas aos órgãos de soberania.

Ficam fora da competência regional matérias que abarquem o interesse unitário/nacional.


Desta forma, mesmo atos legislativos regionais que incidam em matérias de interesse
regional mas que indirectamente se projectem no interesse nacional, serão
inconstitucionalmente orgânicos.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 81


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Relativamente a cada matéria da esfera de uma concorrência paralela ou complementar,


entre Estado e Regiões, existem dois âmbitos, um Estadual e outro Regional, cuja
delimitação é operada através do recurso à convocação e harmonização de medidas de
valor como o conceito de âmbito regional e os princípios da unidade e solidariedade
nacionais que sustentam o recorte da reserva soberana. E, na verdade se uma dada
disciplina exceder os limites espaciais ou materiais do âmbito regional enfermará de
inconstitucionalidade orgânica por invasão de uma reserva (móvel) de competência dos
órgãos de soberania cujas fronteiras são recortadas por Cláusulas Gerais fixadas na
Constituição.

Por outras palavras, não há só uma reserva expressa da competência dos órgãos de
soberania, existe, também, uma reserva implícita, onde se apela a um critério material e
ao principio da solidariedade e unidade.

Esquema Síntese do Modelo de Repartição Horizontal de Competências Vigente

O modelo apresentado é de tal modo complexo e indeterminado que se torna muito difícil
delimitar os poderes legislativos entre os órgãos de soberania e as regiões.

São de destacar alguns pontos:

• Listagem
Verifica-se a existência de 3 listas de enumeração de matérias sobre as quais recaem
competências legislativas:

• Lista Constitucional de competências expressas da AR


CRP: 161º, 164º e 165º
• Lista Constitucional de matérias de competência regional necessariamente
enumeradas nos estatutos politico-administrativos previstas em várias
disposições do CRP: 227º
• Uma terceira lista de matérias de competência regional necessariamente
enumeradas nos estatutos politico administrativos CRP: 227/1 a) e 228/1

• Concorrência Paralela
Concorrência paralela entre os órgãos de soberania e as regiões autónomas, em que cada
poder regula um âmbito da mesma matéria, valendo, em regra as leis autonómicas para o
espaço regional. Essa concorrência paralela opera igualmente no desenvolvimento de leis
de bases de órgãos de soberania por parte das regiões.

• Cláusulas Gerais
Existe uma insuficiência de listagem. É, por isso, necessário recorrer a cláusulas gerais
de competência, onde se destaca o âmbito regional e a supletividade do direito estadual.

• “Âmbito Regional” (cláusula competencial móvel)


A competência Legislativa não se tem por adquirida se um diploma autonómico incidir
sobre as matérias atinentes à alínea c) do no1 do art.227 ou às matérias enumeradas nos

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 82


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

estatutos. Se a lei regional exceder o limite geográfico ou incidir sobre interesses gerais
de relevo para todos os cidadãos ou interesses ou bens jurídicos atribuídos a outros entes
não regionais ela será organicamente inconstitucional.

• Supletividade da Lei Estadual


As leis da esfera concorrencial paralela dos órgãos soberanos da República podem
aplicar-se a todo o território regional, pese o facto de nas regiões essa aplicação ser
supletiva (CRP: 228º/2), o que significa que nesse espaço autonómico os diplomas
regionais, desde que existam, têm aplicação preferencial sobre as leis estaduais que rejam
a mesma matéria.

Definição Vertical de Competências Legislativas Regionais

A distribuição vertical de poderes reporta-se às modalidades de competências legislativas


que as regiões podem exercer numa relação de observância com os limites de natureza
unitária que as vinculam.

Verifica-se, por um lado, os parâmetros da legislação autonómica que se retiram do


processo de distribuição horizontal dos poderes e que se combinam com outros limites
próprios da distribuição vertical e eu resultam da projeção da hierarquia material de certas
leis estaduais.

Assim, cada competência legislativa regional encontra-se pautada por limites gerais (por
exemplo, o âmbito regional) e por limites específicos (por exemplo, o respeito por leis
parâmetro).

Competência Legislativa Comum


CRP: 227º/1 + 228º/1 + 112º/4

Os decretos legislativos regionais aprovados ao abrigo deste tipo de competência devem


incidir sobre matérias enumeradas nos estatutos politico-administrativos, devem conter-
se no âmbito regional e devem, ainda, respeitar a reserva explicita ou implícita de
competência dos órgãos de soberania.

A competência legislativa comum ou primária exerce-se respeitando os seguintes


critérios:
• As regiões podem legislar apenas no “âmbito regional” (CRP:112/4)
decantado nas matérias enumeradas no correspondente estatuto politico-
administrativo;
• Essas matérias disponíveis à regulação regional não podem invadir a
reserva de competência dos órgãos de soberania;
• Existindo fenómenos de confluência legislativa em domino territoriais e
substanciais da mesma matéria, verifica-se que os decretos legislativos
regionais disciplinam um domínio parcelar da mesma, que corresponde ao
âmbito regional;
• A situação descrita tanto pode implicar uma sobreponibilidade material,
em que a mesma questão é regulada na região por lei regional e no
Continente por lei estadual como pode supor uma situação em que só possa

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 83


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

ser regida por lei Estadual, pelo facto da situação regulada deter relevância
imediata para todos os cidadãos ou repercutir-se sobre entes ou interesses
não regionais;
• Se é certo que a forma concreta como o âmbito de uma dada matéria
atribuída ao poder legislativo regional por se encontrar definida no estatuto
pode assegurar uma maior da garantia do exercício dos poderes regionais
contra legislação estadual excessivamente densa ou intrusiva, certo é,
também, que essa densificação estatutária deverá, ela própria, ser
compatível com a noção constitucional de “âmbito regional”, não
consistindo a enumeração estatutária uma salvaguarda absoluta em relação
à contenção de cada diploma no limite positivo representado pelo referido
âmbito;
• As leis do Estado podem dispor em geral para todo o território, não sendo
por esse facto organicamente inconstitucionais com fundamento em
invasão de domínios reservados à competência regional, devendo, antes,
aplicar-se nas regiões, como direito supletivo ou subsidiário CRP:228/2

A aplicação subsidiária do direito dos órgãos de soberania terá lugar:


• Sempre que as assembleias legislativas regionais não fizerem uso do seu poder
legislativo;
• Caso se verifique a revogação não substitutiva ou a caducidade de diplomas
regionais em domínio que requeiram regulação;
• Sempre que numa dada disciplina legislativa regional se registarem vários vazios
regulatório e lacunas em leis regionais.
Se é um facto que um decreto legislativo regional comum que incida numa matéria de
âmbito regional enumerada num estatuto passa assumir em caráter tendencialmente
primário ou inovatório (deixando de respeitar as normas interpostas conformadas pelos
póstumos princípios fundamentais de leis gerais da República e limitando-se a observas
a Constituição) o facto é que essa primariedade, em tese, pode vir a ser posta em causa
por uma lei de bases editada supervenientemente pelo Governo ou pela AR.

CRP: Artigo 227º/1 c)


Constitui competência da ALR desenvolver par ao âmbito regional os princípios e as
bases gerais.

CRP: Artigo 112º/2 e 3 + 281º/1 b)


Na opinião do professor Blanco de Morais, caso a AR aprove uma lei de bases para todo
o território, em matéria concorrencial entre o Estado e as coletividades insulares, os atos
legislativos regionais deverão observar essas bases gerais sob pena de ilegalidade

A haver um decreto legislativo regional que colida com bases gerais em legislação
estadual superveniente, o legislador autonómico deve alterá-lo de forma a harmonizar o
seu conteúdo com as normas paramétricas dessa lei subordinante, desaparecendo nessa
coexistência material de disciplinas normativas estadual e regional, o caráter primário ou
exclusivo da lei autonómica.

A doutrina diverge quanto a esta questão. Num sentido diverso do exposto, há quem
defenda que, no caso das bases da esfera concorrencial, as assembleias legislativas das
regiões poderiam optar entre invocá-las e desenvolvê-las numa relação subordinada ou,

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 84


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ao invés, prescindir delas e assumir no âmbito regional, a totalidade da regulação da


correspondente matéria (solução semelhante à que ocorre com o G).

O professor Blanco Morais coloca algumas reservas, na medida em que:


• A concorrência legislativa entre o Parlamento e o Governo é de tipo alternado (ato
legislativo posterior derroga lei anterior) enquanto que a concorrência entre os
órgãos legislativos do Estado e das regiões é paralela (as respetivas leis fluem na
mesma matéria em âmbitos distintos e móveis que se lhes encontram
implicitamente reservados, não se podendo revogar ou derrogar reciprocamente)
pelo que a analogia não parece ser admissível.
• CRP: 198º/1 a) faculdade do Governo emitir decretos-leis de bases ou revogar
leis de bases. CRP: 227º/1 c) A competência regional de desenvolvimento de
bases não se centra em disposição igual à desse artigo, que não distingue as
reservas de base parlamentar em relação às bases da área concorrencial.
• O Governo quando legisla numa matéria onde pontifiquem bases gerais da AR
num domínio de concorrência alternada, pode validamente revoga-las no todo ou
em parte e ignorá-las editando um regime de conteúdo diverso; já ás regiões, está
vedada a revogação de lei do Estado, tao pouco a possibilidade de as inobservar
na medida que tal parece contrariar o CRP: 227/1/c) + 112/2, o qual impõe aos
diplomas regionais uma vinculação aos princípios e bases gerais dos regimes
jurídicos sem exceção (o preceito não distingue as bases de reserva parlamentar
das da esfera concorrencial);
O EPARAA esclareceu no seu artigo 38 que a “Assembleia Legislativa pode optar por
desenvolver, para o território regional, os princípios ou as bases gerais dos regimes
jurídicos neles contidos, nos termos do presente artigo ou, em alternativa, exercer a
competência legislativa própria”

Isto significa que a legislação regional poderá optar por invocar uma lei de bases estadual
da área concorrencial para a desenvolver ou, em alternativa, não a invocar e dispor de
forma contrária ao âmbito regional.

Na opinião do professor Blanco de Morais, o estatuto excedeu o seu escopo de norma de


definição do objeto e âmbito das matérias de competência regional comum, violando a
reserva de estatuto.

Competências Delegadas

• Objeto das Autorizações Legislativas das Regiões


Os pressupostos constitucionais das autorizações legislativas permitem às regiões aceder
a algumas matérias da reserva relativa de competência da AR prevista CRP: 165º,
mediante a delegação legislativa parlamentar, o que, na generalidade, representou um
acréscimo de poderes, sobre matérias de indiscutível relevo politico.

Estas autorizações legislativas permitem a disponibilização às regiões de algumas áreas


de competência expressa dos órgãos de soberania.

Contudo, muitas das matérias integradas na reserva relativa da AR não se encontram


disponibilizadas às regiões.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 85


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

CRP: Artigo 227º/ b)


Remissão para o artigo 165, excluem-se um conjunto de alíneas deste mesmo artigo que
não podem ser objecto de autorização legislativa.

• Inclusão de Bases Gerais Reservadas à Assembleia da República no Objeto da


Autorização Legislativa
O legislador acabou por optar pela inclusão de certas matérias de função unitária e
servidas por leis de escopo soberanista no campo dos domínios que são passiveis de
delegação legislativa nas regiões.
Exemplo, das bases sobre a protecção da natureza (alínea g) ou bases da politica agrícola
(alínea n).

Se as assembleias legislativas das regiões, ao abrigo da alínea c) do 227/1, dispõem da


competência para o desenvolvimento dessas bases e regimes gerais, contidos em leis dos
órgãos de soberania, qual o sentido de poderem, elas próprias, aprovar bases gerais sobre
essas matérias, mediante “decretos legislativos regionais dos princípios” autorizados e
circunscritos ao âmbito regional? Qual o sentido de os parlamentos regionais aprovarem
leis regionais de bases que elas próprias irão desenvolver?

Na opinião do professor Blanco de Morais esta situação parece ser chocante porque as
bases constituem um denominador comum unitário de uma politica publica.

À luz do principio da especialidade, uma norma contida na lei de bases estadual aplicável
a todo o território, apenas poderá revogar um decreto legislativo regional de bases
autorizado e não um decreto-legislativo, feito no uso de autorização legislativa, de bases.

A haver leis de bases aprovadas pelas Assembleias Legislativas Regionais tem de ser em
matéria reservada (Estatutos nada dizem sobre a questão).

Situações de insegurança jurídica crítica podem ocorrer no caso dos decretos legislativos
regionais de bases regularem, de acordo com o objecto da lei de autorização, apenas
algumas das matérias regidas primitivamente por uma lei estadual que aprove as bases
gerais dos regimes jurídicos. Ter-se-á, assim, o mesmo decreto legislativo regional de
desenvolvimento a concretizar leis de bases estaduais e leis de bases regionais vigentes
sobre a mesma matéria.

Parece muito pouco inteligível que o Estado se despoje de um instrumento importante de


realização positiva do principio da unidade e solidariedade nacional, “amigo das
autonomias”.

Dir-se-á que o Estado logra conservar a sua proeminência através das leis de autorização
legislativa cujos limites podem ser, em tese, ainda mais detalhados e precisos do que as
directrizes das leis de bases. Se isto acontecer vai haver uma cadeia imensa, as leis de
autorização legislativa passam a atuar como verdadeiras leis de bases que vinculam outras
leis de bases (regionais) e estas os diplomas regionais de concretização. A existência de
dois níveis de parametricidade complica em vez de agilizar e aumenta a hipótese da
existência de vícios no plano da invalidade normativa.

É, ainda, de questionar a razão de ser da existência de decretos legislativos regionais de


bases em territórios de reduzida dimensão como os arquipélagos insulares, em que o

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 86


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

próprio órgão que aprova as base (ALR) é o mesmo que procede, necessariamente, ao seu
desenvolvimento.

• Trâmites e Vicissitudes da Autorização Legislativa


CRP: Artigo 227º/2
Integra o critério da clausula da junção, ou seja, as propostas e lei de autorização devem
ser acompanhadas de um anteprojecto do decreto legislativo regional a autorizar, o que
representa um forte condicionamento do processo de delegação.

CRP: Artigo 165º/ 2 e 3


As leis delegantes devem conter os mesmos requisitos típicos das leis de autorização
legislativa

Deste modo, considera-se que o legislador não se encontra vinculado a editar uma
normação legal idêntica à do anteprojecto, contanto que o diploma legal por si aprovado
se contenha nos limites da autorização. O anteprojecto constitui apenas uma formalidade
instrutória de natureza obrigatória que permite ao legislador estadual balizar os
parâmetros da delegação legislativa requerida pela região.

CRP: Artigo 127º/3


As autorizações caducam com o termo da legislatura ou a dissolução da AR ou da
assembleia legislativa da região a que tenham sido concedidas

CRP: Artigo 169º


Os decretos legislativos regionais autorizados devem invocar a correspondente lei de
autorização e podem, ainda, ser sujeitos a apreciação da AR, para efeitos de cessação da
vigência.
Considera-se que não seria admissível que a apreciação parlamentar envolva alterações,
já que tal implica uma intromissão constitutiva do Estado no exercício de uma
competência reservada às regiões, devendo entender-se que a aplicação do artigo 169º às
leis regionais delegadas, ao operar com “necessárias adaptações” envolve a exclusão da
possibilidade da apreciação parlamentar com emendas.

Sendo a AR o órgão normalmente competente e titular primário das competências


delegadas nas regiões e sendo o presente instituto uma autorização legislativa e não uma
transferência de poderes, entende-se que o Parlamento pode alterar a lei de autorização
antes de a mesma ter sido esgotada e revogar o diploma autorizado, no quadro de uma
avocação de poderes, idênticas ao que sucede com as autorizações legislativas do
Governo.

Considera-se, no entanto, que não poderá alterar o diploma regional. Na verdade, uma
coisa será avocar os poderes delegados e proceder ao seu exercício pleno e outra,
modificar o diploma regional, descaracterizando-o e procedendo a uma estatização
parcial de uma disciplina jurídica regional. O modelo de distribuição e repartição de
competências entre o Estado e regiões revela ser incompatível com leis mistas, editadas
pelas regiões no âmbito regional e alteradas pelo Estado no uso de uma espécie de tutela
correctiva.

Se a AR revogar os decretos legislativos regionais por ela autorizados, deve fazê-lo


expressamente, a simples emissão de legislação geral pela mesma Assembleia que seja

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 87


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

superveniente não supõe a revogação deste, nos termos do principio da especialidade que
determina que lei geral não revoga lei especial. Pode é assumir natureza de normação
legal supletiva.

Competência Complementar

CRP: Artigo 227º/ 1 c)


Refere a competência para o desenvolvimento de leis de bases e leis de enquadramento.

É possível, em abstracto, o desenvolvimento para o âmbito regional de qualquer base


geral, sem aceção de matéria, abrangendo em tese, quer as áreas concorrenciais quer os
domínios da reserva absoluta ou relativa da AR, quer ainda matérias cobertas por decretos
legislativos regionais de bases.

Haverá a considerar as seguintes leis parâmetro:


• Leis de bases da reserva dos órgãos de soberania de alcance geral e aplicáveis a
todo o território nacional;
• Leis de bases respeitantes a matérias não reservadas aos órgãos de soberania, com
âmbito geral;
• Decretos Legislativos regionais de bases, nomeadamente os habilitados por uma
lei de autorização legislativa.
O artigo mencionado permite o desenvolvimento de bases em todas as matérias
relativamente às quais estas sejam passiveis de edição, nomeadamente, as matérias de
reserva absoluta.

O professor Blanco de Morais refere que se deve ter alguma atenção quando o
desenvolvimento de uma lei de bases coloca em causa o “âmbito regional” (por exemplo,
no caso das “bases gerais da organização, do funcionamento, do reequipamento e da
disciplina das Forças Armadas”.

Competências Residuais ou Mínimas

CRP: Artigo 227º/1


Trata-se das faculdades legislativas directamente exercitáveis a partir de diversas alíneas

Competência Relativa à Transposição de Diretivas Comunitárias

CRP: Artigo 112º/8


Permite às regiões transpor mediante decreto legislativo regional, directivas situadas em
matérias fora da reserva de competência dos órgãos de soberania que sejam reconhecidas,
através das listagens constitucional e estatutária, como fazendo parte do âmbito regional,
não garante a transposição regional de todas as directivas sujeitas a transposição na ordem
jurídica portuguesa.

As directivas podem ser transpostas no âmbito da:


• Competência Legislativa Regional Comum (matérias estatutárias);
• Competência Mínima (matérias avulsas enumeradas na Constituição);

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 88


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

• Competência Delegada (dependem de LAL);


• Competência Complementar (não é frequente);

Síntese Sobre as Relações Entre Atos Legislativos

Os tribunais devem, de acordo com o critério da especialidade articulado com o critério


da competência, dar aplicação preferencial, nas regiões autónomas, à lei que contenha
uma disciplina particular e cuja esfera de aplicação se circunscreva necessariamente ao
âmbito das regiões, sendo essa lei, o decreto legislativo regional.

Em consequência, a lei do Estado terá a sua eficácia bloqueada ou suspensa nas regiões
sempre que tiver preferência um decreto legislativo regional sobre a mesma matéria.

CRP: Artigo 228º/2


Contudo a lei estadual vigorará supletivamente nas regiões e poderá ser aplicável na falta
de legislação regional (caso de não emissão de legislação autonómica, caducidade,
revogação puramente supressiva ou declaração de invalidade sem repristinação de
diplomas regionais antecedentes).

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 89


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

GARANTIA DA CONSTITUIÇÃO

Entramos numa nova parte da matéria sobre a garantia da constituição: permanência,


subsistência e garantia da supremacia da mesma.

Iremos desenvolver esta matéria em dois domínios:


• Vicissitudes da Constituição
• Fiscalização da Constitucionalidade

VICISSITUDES DA CONSTITUIÇÃO

ADAPTAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO

Todas as constituições quando aprovadas têm a intensão de durabilidade, permanência,


intenção de permanecer durante muito tempo. Quanto mais tempo dura e se encontra em
vigor mais se reforça a estabilidade da ordem jurídica.
Procura-se aprova uma constituição para sempre.
Se a intenção é a de estabilidade e permanência é obvio que com as alterações na
sociedade, na tecnologia, na política uma constituição não fosse capaz de se adaptar não
tinha condições de durar.

Assim as alterações constitucionais feitas servem para adaptar a constituição à nova


realidade

Tácitas
Revisão
Alterações Reformas
constitucionais Transição

Expressas
Não Revolucionária

Roturas Revolucionária

Revolução

Isto é feito através de dois tipos de alterações constitucionais:

Tácitas
Mutações Constitucionais

Manter o texto altera-se a interpretação dos enunciados e dos princípios.


Neste caso o comando normativo vai mudando mantendo o mesmo texto. A alteração da
norma constitucional é feita sem alterar o texto propriamente dito. Uma norma
constitucional pode se alterar sem que haja alteração do texto constitucional.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 90


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Exemplo: Na Constituição do EUA o princípio da igualdade foi sofrendo mutações.

No século XIX a igualdade era compatível com a escravatura, a descriminação entre


negros e brancos e hoje não é assim. Estamos perante o mesmo enunciado normativo,
mas descriminações assim são inconstitucionais.
Mudando a interpretação desse texto pois a sociedade muda o entendimento opera a
possibilidade da adaptação a novas realidades sem haver necessidade de alteração do
texto constitucional.

Expressas

Há uma mudança do próprio texto. Os artigos são alterados. Permanece a mesma


constituição e pretende permanecer e para isso precisa de ver o texto moldado para se
adaptar-se às novas realidades para corrigir enunciados que estão desajustados.

Exemplo: Atualmente por causa do Covid-19 verifica-se que eventualmente o governo


pode necessitar de determinar uma quarentena geral, para a proteção da saúde publica e
determinar que as pessoas não possam sair das suas residências.

Se lermos o artigo 27º verificamos que muito dificilmente de acordo com o texto
Constitucional é possível o governo fazer isto. Assim sendo haverá a necessidade de uma
revisão constitucional para adaptar o texto.
Não fazendo isso o governo não pode declarar quarentena ou internamentos compulsivos.
Esta dificuldade constitucional que pode ser superada com os estados de exceção
constitucional, estado de sítio e de emergência, onde durante um período se suspende o
direito consagrado no artigo 27º.

Modalidades de alterações expressas da Constituição:

Reforma da Constituição Rotura da Constituição

Alterações feitas à margem do processo


Alterações feitas de acordo com o
legislativo que a Constituição prevê.
processo que a Constituição prevê
Não Revolucionária, Revolucionária e
Revisão e Transição
Revolução.

• Reforma da Constituição
É uma alteração Constitucional feita de acordo com o processo que a Constituição prevê.
A Constituição prevê a ocorrência deste processo e regula o que fica designada a alteração
como reforma.
No processo política verificam-se alterações com o processo por ela previstos.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 91


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Podemos ainda distinguir dentro das reformas de acordo com o alcance material da
alteração, considerando-as muito ou pouco significativas:

• Revisão Constitucional
Alteração parcelar da constituição que altera vários aspetos, mas mantêm o sentido geral
da chamada constituição material. Verifica-se uma alteração de aspetos parcelares, mas a
constituição permanece a mesma
A nossa constituição já teve várias revisões constitucionais, mas continua a ser a de 1976.

• Transição Constitucional
Quando a constituição muda de uma para outra. Distingue-se da revisão pelo facto de esta
ser tão importante, profunda e extensa que podes dizer que depois de ela ocorrer a
constituição já não é a mesma.
Não é uma revolução porque tudo é feito de acordo com o processo previsto na própria
constituição.

Ambas são alterações que se processam de acordo com as regras estabelecidas na


Constituição, mas as consequências que produzem na ordem jurídica são
substancialmente diversas: a revisão constitucional conserva a Constituição vigente, a
transição constitucional dá origem ao surgimento de uma nova Constituição mas em
ambos os casos é feito de acordo com o modo previsto na Constituição.

Exemplo: caso Espanhol e Português, ambos viviam sob um regime ditatorial, o processo
como se chegou ao Estado de Direito foi distinto, Portugal foi pela via revolucionária,
Espanha foi através de uma transição constitucional (reforma da Constituição é feita com
uma alteração tao profunda que altera os seus elementos essenciais, é feito de acordo com
as normas previstas).

Imagine-se que em 1980 não tinha sido aberto o processo de revisão constitucional, não
havendo revisão os militares iriam ser mantidos no poder (deixaria de ser transitório para
passar a ser permanente).

Existiria, neste caso, uma transição democrática mesmo sem ter havido uma revisão do
texto constitucional.

• Rotura da Constituição
As alterações feitas em rotura não obedecem ao processo estipulado pela constituição.
É possível distinguir vários tipos dependendo do seu alcance:

• Não revolucionária
Não se obedece ao processo previsto, mas o significado do alcance é mínimo em termos
materiais.

É um rutura parcial na ordem constitucional, mas que não produz alterações sensíveis na
Constituição material vigente, e, como tal, não dando origem a uma nova Constituição,
pelo menos uma nova Constituição em sentido material.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 92


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

• Revolucionárias
Alterações significativas pontos importantes a nível material sem obedecer ao processo.

É uma ruptura parcial da ordem constitucional, afectando, pelo menos, alguns aspectos
relevantes da Constituição material até então em vigor, podendo dar ou não origem a uma
nova Constituição.

• Revolução
Não meramente político, mas jurídico-político.
Quando no processo revolucionário se aprova nova constituição que origina a nova ordem
constitucional com alteração radical a toda a ordem jurídica.

Considerada aqui como fenómeno jurídico, é uma ruptura global da ordem constitucional,
com substituição integral, tendencialmente violenta, da Constituição formal e material
por uma nova Constituição.

Exemplo: revolução do 25 de Abril houve uma Rutura Constitucional, havia uma


constituição, a Constituição de 1933 que dispunha da forma como podia ser alterada e foi
feita uma alteração de acordo não com o que nela estava previsto (ou seja, a CRP deixou
de vigorar por uma rutura e não pelo processo previsto).

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 93


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PROCESSO DE REVISÃO CONTITUCIONAL

Nenhuma Constituição deixa de regular a sua revisão seja expressa seja tacitamente.
Em geral, é regulado de maneira expressa, ora em moldes de rigidez ora em moldes de
flexibilidade.

O processo de revisão pode ou não ser idêntico ao primitivo processo de criação da


Constituição. Se é uma assembleia legislativa ordinária a deter faculdades de revisão,
exerce-as, na maior parte das vezes, com recurso a uma maioria qualificada ou com outras
especialidades.

Há que destacar que apesar do processo ser em moldes mais gravosos e exigentes que o
processo normal de aprovação de uma norma ou lei ordinária, o poder de revisão é menor
diante o poder constituinte ordinário, um poder derivado, subordinado.

Sendo a democracia moderna essencialmente representativa, a revisão é quase sempre


obra de um órgão representativo, de uma assembleia politica representativa.

Outro requisito normalmente constante para que se procedam a revisões tem que ver com
o tempo: a revisão pode realizar-se a todo o tempo, a todo o tempo verificados certos
requisitos ou apenas em certo tempo.

Problema conexo vem a ser o dos limites circunstanciais da revisão: o da impossibilidade


dos atos de revisão em situações de estado de necessidade, correspondentes ou não a
declaração de estado de sitio ou de emergência, ou outras circunstâncias excecionais.

A iniciativa, por regra, cabe ao órgão competente para fazer a lei de revisão ou a quaisquer
dos seus membros. Mas não se confunde a iniciativa do processo de revisão e a iniciativa
de modificações constitucionais.

Em suma, pode sistematizar-se as diferentes formas de revisão constitucional no âmbito


da legitimidade democrática da seguinte forma:

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 94


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Nem todas as constituições tem limites de revisão, ou seja, há constituições em que a


alteração se faz segundo o processo de feitura de uma lei ordinária. São estas consideradas
as constituições flexíveis.
Constituição Rígida: Para serem alteradas prevêem alguns processos/requisitos (limites
de revisão) – requisitos que se exigem não são os mesmos para aprovar uma lei ordinária.
Constituição Flexível: Revisões são feitas através do processo normal de aprovação de
uma lei no Parlamento, não há distinção entre lei constitucional e ordinária.
A nossa é considerada rígida, pois a revisão tem um processo próprio diferente do
normalmente utilizado para uma lei ordinária. Este processo especial consiste na
observância dos limites de revisão constitucional estipulados no artigo 284º e seguintes.
Deste processo legislativo saem as Leis Constitucionais.

Limite trata-se de um requisito mais exigente do que os requisitos normalmente exigidos


para se fazer uma lei ordinária e são eles que estipulam a diferença entre uma lei ordinária
e uma lei constitucional. Há vários tipos de limites não tem todos a mesma natureza:
temporal, formais, circunstanciais e materiais.

A verificação dos requisitos de qualificação compete ao Presidente da Republica através


da promulgação.
Se o PR considerar que falta um dos requisitos, deverá não promulgar, quando o ato
provier d Parlamento à margem das regras de competência. E deverá não promulgar e
devolver o decreto à Assembleia, nas demais hipóteses (não se trata de atribuir o poder
de veto mas a possibilidade de solicitar uma nova deliberação nos termos constitucionais).
Na opinião do professor Jorge Miranda, apesar do PR usufruir deste poder, nem por isso
fica precludida a fiscalização, concreta e abstracta da constitucionalidade nos termos
gerais, mesmo relativamente aos requisitos de qualificação.
Uma orientação diferente entende que o PR quando entendesse não estarem preenchidos
os requisitos de qualificação do decreto lei de revisão, qualificá-lo-ia como lei ordinária
(e daí poderia ser possoivel a fiscalização preventiva e o veto politico).
Porem, o professor Jorge Miranda refuta que o poder de qualificação inerente à
promulgação envolve a recusa da qualificação pretendida pela AR não a de,
positivamente, atribuir uma qualificação não querida pela Assembleia.

Órgão Competente CRP: 161º a) + 284º


Só a AR pode fazer leis de revisão, e não qualquer outro órgão

Tempo de Revisão
CRP: 284º/1 A AR só pode fazer a revisão decorrido o prazo de cinco anos sobre a
publicação anterior lei de revisão ordinária
CRP: 284º/2 Antes de decorrido, quando tenha assumido poderes de revisão por maioria
de quatro quintos dos deputados em efetividade de funções

Anormalidade Constitucional CRP: 289º


Não pode ser praticado nenhum ato de revisão constitucional na vigência do estado de
sitio ou de estado de emergência, ou seja, com desrespeito de limites circunstanciais de
revisão e, por conseguinte, fora do pleno exercício de direitos, liberdades e garantias

Maioria de Revisão CRP: 286º/1


As alterações da Constituição têm de ser aprovadas por maioria de dois terços dos
Deputados em efetividade de funções

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 95


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A nossa é uma muito rígida pois consta com todos estes tipos de limites que tem que estar
preenchidos cumulativamente:

Limites Temporais

CRP: Artigo 284º/1


Estípula quando se pode fazer uma revisão constitucional.
Uma revisão ordinária pode ser realizada de 5 em 5 anos, ou seja, tem que haver um prazo
de 5 anos entre revisões ordinárias.
Exemplo: A última (sexta) revisão foi em 2004, pelo que, atendendo apenas a este limite
se podia realizar uma nova revisão a partir de 2009.

Ordinariamente revisões podem se fazer passado 5 anos da revisão anterior. Deu-se em


2004 uma revisão ordinária, contudo em 2005 surge uma situação que exigia nova
revisão, mas não podiam ser ordinárias não havia nenhuma possibilidade de alterar a
Constituição? Há a Revisão Extraordinária para estes casos, mas exige um requisito
especial.

CRP: Artigo 284º/2


A Assembleia da República pode assumir poderes extraordinário de revisão caso se reúna
o acordo de uma maioria de 4/5 dos deputados em efetividade de funções.
É uma maioria difícil de obter, mas se obtiver não é necessário esperar os 5 anos para
realizar uma nova revisão.
Exemplo: Foi o que aconteceu em 2005 e a Assembleia de República assumiu poderes de
revisão extraordinária.

Limites Formais

O processo tem de respeitar a forma, exigências de natureza formal mais difíceis de reunir
mais exigente dos que são normalmente colocada a feitura da lei ordinária.

Para as leis ordinárias não são só os deputados que tem iniciativa legislativa, há várias
outras entidades com poder de desencadear processo legislativo.

CRP: Artigo 285º/1


Na revisão constitucional só os deputados podem ter a iniciativa.

Isto é uma forma de localizar, concentrar todo o processo de revisão na Assembleia da


República sem interferência de outros órgãos, começando pela exclusiva iniciativa
parlamentar. O mesmo acontece com o processo de promulgação.

CRP: Artigo 286º/3


O Presidente da República não pode vetar, a promulgação é um mero protocolo.

CRP: Artigo 285º/2


É apresentado um projeto revisão por um partido e inicia-se o processo. Após isso todos
os outros que queiram participar terão que apresentar o seu projeto no prazo de 30 dias.

CRP: Artigo 286º/1


Cada uma das alterações é aprovada por maior de 2/3 de deputados em efetividade de
funções.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 96


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

É uma maioria qualificada muito exigente para dar estabilidade à constituição. Aqui
vemos que para se dar uma revisão constitucional tem que haver um acordo entre
esquerda e direita só um dos lados não consegue fazer revisão porque nunca aconteceu
ter 2/3 dos deputados.

Por vezes confundem-se as duas maiorias exigidas durante o processo de revisão


constitucional, a de 3/4 e a de 2/3.

Apresenta-se uma revisão extraordinária, há 4/5 dos deputados de acordo? Se for


aprovado a Assembleia da República assume poderes constituintes, pode fazer revisão
extraordinária. Se não houver 4/5 acabou o processo.
Depois apresenta-se um projeto de revisão e todos os outros deputados podem apresentar
mais projetos no prazo de 30 dias. Os projetos são discutidos e parte-se para a votação
das alterações individualmente. E é nesta votação que surge a nova maioria, pois a
alteração tem que ser votadas por maioria de 2/3.

Em suma:
• A maioria de 4/5 é exigida para a assembleia assumir poderes constituintes
CRP: 284º/1
• A maioria de 2/3 é exigida para aprovação das alterações na votação
CRP: 286º/1

Tantos os limites temporais como os limites formais são usuais em diversas constituições.
A nossa constituição apresenta os limites que já são mais escassos entre as restantes
constituições.

Limites circunstâncias
CRP: Artigo 289º

Um partido apresentou projeto de revisão constitucional, contudo na situação que


vivemos hoje não pode haver revisão porque estamos em estado de emergência. Apenas
quando cessar o estado de emergência se pode continua ou abrir um novo processo de
revisão constitucional.

Não é aceitável nesta situação em que não temos a plenitude dos nossos direitos, em que
os órgãos não funcionam na normalidade se dar uma alteração na constituição, pois
seriam alterações feitas em circunstância de turbulência nada ordinárias, não era garantido
um processo de ponderação e deliberação.

• Contexto Estado de Emergência que atualmente vivemos:


Não se dava importância a este limite porque é a primeira vez que ocorre Estado
Emergência que até agora se encontrava apena consagrado na constituição. Os próprios
órgãos têm dificuldade em orientarem-se nestas situações, devido a tal temos assistido à
prática de alguns atos que são dificilmente aceitáveis. Vejamos como se procedeu a
implantação deste estado de exceção. O Presidente da República mal declarou o estado
de emergência suspendeu alguns direitos mas não o mais afetado, não mexeu no direito
de ?? No caso das restantes suspensões deu ao governo a capacidade de introduzir
limitações, assim o Governo vai concretizar o estado emergência, mas não o faz através

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 97


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

de um ato legislativo, não aprovou um decreto para introduzir estas restrições. Estamos
perante uma matéria tão importante e é o governo que vai dizer o que se pode e não fazer?
Porque não aprovou um decreto-lei e legislou como se de um mero ato administrativo se
tratasse? Devido a esta situação a Assembleia da república não pode chamar o ato a
apreciação parlamentar. Em seguida verificamos que o Presidente da República promulga
o decreto. Como sabemos, vem estipulado na constituição que o Presidente da República
promulga decretos-lei e regulamentas e por sua vez assina outros atos como este. No dia
seguinte sai uma retificação do documento dizendo que o presidente não promulgou, mas
sim assinou.

Esta confusão compreende-se por ser a primeira vez no estado de emergência e justifica
o limite circunstancial.

Limites materiais
CRP: Artigo 288º

As alíneas neste artigo apresentadas que têm que ser respeitadas. Aqui encontramos as
matérias que a constituição considera as mais importantes e que não podem ser afetadas
por revisões constitucionais.
Este conceito de ter que respeitar é indefinido pelo que deu origem a diversas discussões
na feitura da constituição. Já foi visto como um artigo muito celebre, mas hoje damos-lhe
menos importância.

Na prática estas matérias enumeradas acabam por não ter grande significado ao contrário
do que se pensava na primeira parte da vigência da constituição.
Na altura dava se grande importância às matérias aqui estipuladas devido ao contexto em
que foi criada, em 1976. A Constituição era ideologicamente muito marcada e quem se
oponha tinha o receio de que nunca seria possível fazer alterações significativas por causa
do artigo 288º (290º na altura). Acreditava-se que as revisões não podiam incidir sobre o
principal só aspetos marginais.

Desenvolveu se um grande confronto entre teorias da relevância jurídica destes limites:

• Relevância dos limites (imprescindíveis)


Doutrina que defende que eles tinham uma relevância absoluta, nunca poderiam ser
alteradas dando-lhes uma relevância absoluta nas revisões.

Estes argumentos são extraídos do conceito de poder de revisão e do principio da


identidade da Constituição Material.
O poder de revisão, enquanto criado e regulado por ela quanto ao modo de se exercer tem
de se compreender dentro das bases dos seus parâmetros, não lhe compete dispor contra
as opções fundamentais do pode constituinte originário.
A revisão deve garantir a identidade e a continuidade da Constituição considerada como
um todo, a revisão não é a faculdade de fazer uma nova constituição.
Por outro lado, a constituição formal está ao serviço da constituição material. Revê-la
implica respeitar esta Constituição material e, desde logo, respeitar os preceitos que,
explicitados numa proibição, denotam a consciência da ideia de Direito, do projecto ou
do regime que corporiza.
Toda a Constituição tem uma lógica e uma ordenação e uma lógica sistemática que não
pode ser prejudicada, e isso não apenas num plano formal mas, muito mais, no aspeto da

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 98


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

intima conexão material que lhe dá sentido e que não pode ser ultrapassada nas reformas
do texto. Segundo esta perspectiva, a geração que adotou a Constituição tem o direito de
vincular minimamente todas as gerações posteriores por forma a impedir que cada uma
delas vincule maximamente a que imediatamente se segue.

• Irrelevância dos limites


Apesar do que a constituição consagra neste artigo no fundo tinha apenas carácter
simbólico a que o legislador atribuía mais importância, mas não mais que isso. As
revisões não seriam materialmente limitadas traduzindo-se na irrelevância destes limites.

Quem defende esta tese justificam-na na inexistência de uma diferença de raiz entre o
poder constituinte originário e o poder de revisão: ambos expressão da soberania do
Estado e ambos exercidos por representantes eleitos; e inexistência de uma diferença entre
normas constitucionais originárias e supervenientes: inseridas no mesmo sistema
normativo: e a inexistência de uma diferença entre normas constitucionais, todas elas
constantes da mesma Constituição formal.
O poder constituinte de certo momento não é superior ao poder constituinte de um
momento posterior. Pelo contrário, deve aplicar-se a regra geral da revogabilidade de
normas anteriores por normas subsequentes.

• Duplo processo de revisão constitucional


Sustentada pelo Professor Jorge Miranda, defende que há limites materiais, mas alguma
flexibilidade sobre estes.
Como qualquer artigo o 288º tem que ser respeitado, mas tem que ser respeitado enquanto
tiver na constituição se deixar de existir ou for modificado a normatividade desaparece
ou é alterada.
Agora vem lá enunciada aquela matéria, mas nada obriga que o 288º permaneça
inalterado pelo que pode ser alterado.

Afirma-se a validade dos limites materiais explícitos, mas, ao mesmo tempo, entende-se
que as normas que os prevêem, como normas de Direito Positivo que são, podem ser
modificadas ou revogadas pelo legislador da revisão constitucional, ficando, assim,
aberto o caminho para, num momento ulterior, serem removidos os próprios princípios
correspondentes aos limites. Nisto consiste a tese da dupla revisão e do duplo processo
de revisão.

As cláusulas dos limites materiais são possíveis, é legitimo ao poder constituinte decretá-
las e é forçoso que sejam cumpridas enquanto estiverem em vigor. Todavia, são normas
constitucionais como quaisquer outras e podem elas próprias ser objecto de revisão, com
as consequências inerentes.

Podem ser modificadas ou removidas mediante processo de revisão.

Porque a função constituinte e a função de revisão se encontram no mesmo plano, os


eventuais limites textuais devem ser tomados como auto-obrigações que o legislador
constitucional se impõe a si próprio e que, por isso, valem até serem removidos por uma
ulterior manifestação igual e contrária.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 99


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

De uma maneira geral, o professor Jorge Miranda defende:


• Que a natureza do preceito é declarativa e não constitutiva (ele declara, não cria
limites materiais de revisão, estes decorrem da coerência dos princípios
constitucionais);
• Que a sua função é de garantia;
• Que respeita a princípios e não a preceitos;
• Que é uma norma constitucional como outra qualquer, obrigatória enquanto
vigorar mas revisível;
• Que não é a revisão do artigo 288o que afeta os limites materiais de revisão, o que
os afeta é atingirem-se os princípios nucleares da Constituição;

Exemplo:
CRP: Artigo 288º h)
Estipula o princípio da representação proporcional

Se se quisesse alterar o sistema eleitoral à partida não poderia ocorre porque esta
exigência de proporcionalidade vigorava como matéria que as leis de revisão teriam que
respeitar. Tudo bem é assim, mas o próprio artigo 288º numa revisão constitucional como
qualquer outro pode ser alterado.

Altera-se a alínea h) do 288 e suprime-se a última parte o que significa que depois dessa
revisão existe outra reação que não faz referência à proporcionalidade.
Nesta primeira revisão mexeu-se no 288º mas não no 149º porque com a anterior redação
do 288º não se podia altera o 149º.
5 anos depois de alertar o 288º, após deperecer o limite material inicia-se um novo
processo de revisão tendo em vista a alteração do 149º.
Neste processo de dupla revisão é preciso que haja uma primeira revisão com 2/3 dos
deputados a favor e uma segunda com igualmente 2/3 dos deputados a favor.

Esta questão foi muito debatida e revolveu-se na prática de uma forma simples e à
margem desta discussão muitas das matérias são consensuais não são questionais nunca
haverá um consenso de 2/3 para alterar as que ali estão. Teoricamente podemos imaginar
quem queira alterar mas obviamente não vai acontecer não haverá um consenso
constituinte.

Exemplo: É possível alterar as matérias estipuladas no artigo 288º d) porque a matérias


está em constante evolução. O que é necessário hoje pode não ser igual daqui a 30 e 40
anos devido à evolução das concessões já houve revisões em que foi alterado e assim será
sempre. Assim em suma esta artigo confere identidade à constituição, mas não mais que
isso tem uma função simbólica de delimitação do núcleo da matéria. Mesmo que o
Presidente da República ache que não respeita os limites materiais é obrigado a promulgar
porque a competência é exclusiva da Assembleia da República.
Hipótese Académica:
E se o Presidente da República receber uma lei de revisão que não for aprovada pela
Assembleia da República ou que foi mas não teve 2/3 de aprovação ou que foi elaborada
fora do tempo ou em situação de estado de sitio, ainda é o Presidente da República
obrigado a promulgar? Situação diferente porque aí não existiria uma lei de revisão
constitucional. O Presidente da República não se mete no processo só tem que apreciar e
ver se estão reunidos requisitos que o permitem identificar se é revisão. Reunidos os
requisitos tem que promulgar apesar da opinião pessoal.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 100


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

o Necessidade de Limites Materiais de Revisão


O problema dos limites materiais de revisão reconduz-se, no fundo, ao traçar de fronteiras
entre o que vem a ser a função própria de uma revisão e o que seria já conversão em
Constituição diferente.

Estes limites são tao mais importante em constituição flexível do que numa constituição
rígida. Aí, a revisão pode dar-se quase inominadamente, mais necessário se torna aí tomar
consciência, e m cada instante, de quais os princípios vitais insuperáveis e elimináveis da
ordem jurídico-politica.

Em inteiro rigor, os limites não deveriam qualificar-se de explícitos e implícitos.


Todos os limites materiais deveriam ter-se ao mesmo tempo como explícitos e implícitos.

• Por explícitos enquanto só podem agir efectivamente quando explicitados em


cada revisão constitucional em concreto
• Por implícitos, na medida em que o critério básico para os reconhecer é o
perscrutar do sistema constitucional como um todo
Não traduz isto uma desvalorização das cláusulas de limites materiais, das cláusulas que
se destinam, à partida, a explicitar limites implícitos na Constituição.

Estas cláusulas possuem uma dupla utilidade:


• A de externar os princípios constitucionais, evitando ou pondo termo a incertezas
que possam formular-se acerca da constituição material;
• A de reforçar a sua garantia, pois a revisão constitucional é um instrumento de
garantia da constituição.
As normas constitucionais, como quaisquer outras estão sujeitas estão sujeitas a uma
interpretação evolutiva. É o entendimento que venha a ser prestado aos princípios que há-
de determinar o entendimento de tais normas, não o inverso; é na adesão da consciência
jurídica aos princípios da Constituição que reside a força dos limites, não nas normas de
limites em si, isoladamente.

Os limites materiais porque dirigidos a leis de revisão, são violáveis por açao, por
contradição dessas leis com os princípios a que correspondem.

Podem, também, ser violados por omissão. No Direito Português, inconstitucionalidade


por omissão da revisão constitucional teria sido a não extinção do Conselho da Revolução
na primeira revisão constitucional. O conselho da Revolução não poderia ter existido mais
do que em curto período sem brigar com a estrutura democrático-representativa do poder
politico instituído pela Constituição de 1976, e, se viesse a ficar para além dessa revisão,
tudo seria como se tal estrutura e, portanto, a Constituição material se transformasse
noutra.

As normas de limites expressos não são logica e necessárias, necessários são os limites.

Estas normas são revisíveis do mesmo modo que quaisquer outras normas, são passiveis
de emenda, aditamento ou eliminação e até podem vir a ser suprimidas através de revisão.
Não são elas próprias limites materiais de revisão.
• Se forem eliminadas cláusulas concernentes a limites ao poder constituinte
originário ou limites de revisão próprios do primeiro grau, ou seja, limites que se

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 101


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

impõem pelo próprio espirito do sistema e que são reconhecido numa cláusula,
nem por isso estes limites deixarão de se impor ao futuro legislador de revisão.
Porventura, ficarão eles menos ostensivos e, portanto, menos guarnecidos, por
faltar, doravante, a interposição de preceitos expressos a declará-los. Mas somente
haverá revisão constitucional se continuarem a ser observados;
• Se, ao invés, forem eliminadas cláusulas de limites impróprios ou de segundo
grau, como são elas que os constituem como limites, este ato acarretará, porém,
automaticamente, que os correspondentes princípios, já, em próxima revisão, não
terão de ser observados. É, a este respeito que se fala em dupla revisão.

Intervenção do Tribunal Constitucional

Vejamos agora se faz sentido que o Tribunal Constitucional intervenha no processo de


revisão Constitucional no sentido de declarar a revisão inconstitucional.

o Sede Preventiva
Antes da lei ser publicada a intervenção é feita a pedido do Presidente da República e o
tribunal pronuncia se sobre a inconstitucionalidade obrigado a vetar no caso de declarada
a inconstitucionalidade da lei e dando-lhe a possibilidade de escolha se a lei for
Constitucional.
Na revisão constitucional o Presidente da República não pode recusar a promulgação pelo
que a intervenção do Tribunal Constitucional fica condicionada.
Em suma, em sede preventiva não pode existir intervenção do Tribunal Constitucional
porque o Presidente da República tem de promulgar, dando exclusividade à Assembleia
da República no processo.

o Sede sucessiva
Nunca aconteceu e provavelmente nunca irá acontecer por um facto simples. Aquilo que
o Tribunal Constitucional faz é verificar a inconstitucionalidade tomando como
parâmetro a Constituição em vigor, contudo qual a constituição que se devia usar como
parâmetro?
A anterior à revisão, ou a Constituição que já se encontra em vigor com a alteração que
por sua vez está a ser avaliada?
Na altura que o Tribunal fosse fazer o juízo a que já estava em vigor era a com alterações,
ou seja com a alteração que ele foi chamado a apreciar só pode fazer comparação com a
constituição em vigor e quando fosse chamada já era outra que tava em vigor e era essa
que tinha de ser apreciada.

Porem, para que a lei de revisão seja qualificada como tal ela tem de cumprir certos
requisitos. Se o PR verifica que falta um destes requisitos pode dizer que não é uma
verdadeira lei de revisão e, neste momento, não fica obrigado a promulgar. O que o artigo
286/3 diz é que o PR não pode recusar a promulgação da lei de revisão.
Mas têm de estar em causa limites objectivos, o PR não pode recusar a promulgação por
achar que viola um direito fundamental, a matéria e a regulação não são limites de
qualificação da lei, são opinião jurídica. Não pode incidir sobre o conteúdo, quando está
em causa apenas o conteúdo e todos os demais requisitos são respeitados o PR está
limitado.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 102


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Regras do procedimento

A abertura do processo requer, em revisão ordinária, um ato de iniciativa, a apresentação


de um projecto de revisão (ou seja, não basta que passem os 5 anos, se os deputados nada
fizerem o processo não se inicia)

Uma coisa é a iniciativa da assunção de poderes de revisão outra coisa é a abertura do


processo. A abertura do processo requer a apresentação de uma ou mais propostas de
alteração.
São coisas distintas, uma coisa é a aprovação de uma resolução que atribui poderes
extraordinários de revisão à AR outra completamente diferente á o inicio do processo de
revisão constitucional.

CRP: Artigo 285º/1 + 156º a)


A iniciativa pertence exclusivamente aos deputados, individual ou colectivamente
Não aos grupos parlamentares, nem ao Governo, nem às ALR, nem a determinado
numero de cidadãos, também por isso parece que o PR não possa convocar a AR para
efeitos de revisão constitucional.
Estamos perante reserva absoluta da AR no domínio de revisão constitucional

RAR: Artigo 120º/1 b)


Não são admitidos projetos que não definam concretamente o sentido das modificações
a introduzir na Constituição.

CRP: Artigo 285º/2


Apresentado um projecto de revisão constitucional, quaisquer outros terão de ser
apresentados num prazo de 30 dias
Descontados os períodos de suspensão por analogia com o 169º/1

Como dia da apresentação conta-se o dia de admissão do projecto

Até ao termo da discussão podem ser apresentados por quaisquer deputados propostas
de alteração aos projectos de revisão ou aos textos de substituição

Ao contrário do que acontece com a lei ordinária, não há a necessidade de ouvir


entidades cuja matéria lhes diga respeito;

CRP: Artigo 229º/2 Execeção


A AR não está sujeita a um dever de audição dos órgãos de governo próprio regional
acerca do estatuto.

A discussão dos projetos e a sua votação fazem sempre e necessariamente na


especialidade.

Tal votação e discussão ocorre necessariamente em plenário (só aí se consegue a maioria


de dois terços dos deputados em efetividade de funções).

No caso da revisão extraordinária quando não seja aprovada nenhuma norma preclude-
se a competência de revisão da AR porque a assunção de poderes de revisão aparece
funcionalizada a um resultado positivo e, se este não se obtém, tal assunção fica
desprovada de sentido.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 103


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Pelo contrário, no caso da revisão ordinária, a não aprovação não determina a preclusão,
CRP: 284º/1
Porque a AR pode rever a Constituição decorridos cinco anos após a data de publicação
de qualquer lei de revisão ordinária e podem voltar a ser formulados projets de revisão,
embora, se forem com as mesmas alterações propostas, apenas na sessão legislativa
seguinte, salvo nova eleição da AR.

CRP: Artigo 286º/2


As alterações da Constituição que forem aprovadas serão reunidas num único decreto de
revisão.

CRP: Artigo 287º/1


Serão inseridas no lugar próprio da Constituição, mediante as substituições, as supressões
e os aditamentos necessários.

CRP: Artigo 286º/3


A lei de revisão é publicada pelo PR
CRP: Artigo 119º/1 + 166º/1
como lei constitucional

O PR não pode recusar a promulgação da lei de revisão: atribuição exclusiva ao


Parlamento do poder de revisão e, depois, do regime de alterações

A constituição não fixa um prazo de promulgação, a lacuna deve ser suprida com recurso
ao 136º/2, segunda parte (promulgação obrigatória): o prazo deve ser de oito dias;

A promulgação não carece de referenda ministerial;

CRP: Artigo 287º/2


A constituição, no seu novo texto, é publicada conjuntamente com a lei de revisãoo.

CRP: Artigo 289º


Não pode ser praticado nenhum ato de revisão constitucional durante a vigência do
Estado de Sitio ou do Estado de Emergência

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 104


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

HISTÓRIA DAS REVISÕES CONSTITUCIONAIS

Deram-se sete revisões constitucionais desde 1976, sendo que apenas três foram revisões
extraordinárias. De certa forma 7 revisões constitucionais é significativo. Há algumas
constituições que quase nunca sofreram alterações, a de Espanha praticamente nunca
sofreu revisões e é da mesma altura.
Todas as nossas ocorreram até 2005, depois desse ano não houve mais revisões.
Delimitamos aqui dois ciclos um primeiro até 2005 um segundo que abriu em 2005 que
não sabemos quando termina. Porquê a divisão tão notória?
Devido ao confronto político em termos da constituição, designados a querela
constitucional. A constituição de 1976 foi elabora após o período ditatorial grande
controversa ideológica e digamos que mal foi aprovada se desenvolveu a grande luta de
natureza política e torno da subsistência, supressão etc da constituição. No período que
se segui isto estava e permaneceu na ordem do dia.
Ainda hoje as pessoas de mais ideia não têm ideia do que diz a nossa constituição.
Exemplo: Há uns anos quando houve o período de crise a constituição estava nas
primeiras páginas porque as leis aprovadas nos orçamentos de autoridade e eram várias
vezes consideradas inconstitucionais e havia muita gente que na altura achava que a nossa
constituição não era como as outras, não era de estado de direito. Neste clima um antigo
ministro das finanças disse publicamente nos EUA que era um Constituição comunista
por isso é que havia tantos problemas, o que é totalmente fora da realidade.
A nossa constituição é típica de Estado de Direito Social Democrático, contudo durante
muito tempo isto não era visto assim era objeto de uma grande discussão.

No fundo a ideia dos limites temporais de 5 em 5 anos era visto como obrigação de fazer
revisão decorrido aquele prazo. Daí que durante este primeiro ciclo continuamente se
tivessem feito as 7 revisões.
Questiona-se se eram necessárias. As duas primeiras, 1982 e 1989, eram absolutamente
necessárias. O nosso regime não seria o mesmo se não tivessem sido feitas.

1º: Revisão Constitucional 1982


Revisão Ordinária

A versão originária tem diferenças significativas, mas é a mesma constituição e só é assim


porque desde logo a primeira revisão pós termo ao período de transição em que os
militares através do conselho de resolução permaneciam no exercício do poder. Se isto
não tivesse sido feito não podíamos falar de uma Constituição de Estado de Direito.
Convém referir para além das questões de organização de poder político era também uma
constituição ideologicamente muito marcada. Quando se lê o texto do artigo 1º e 2º vê-se
que é muito diferente da termologia que hoje utilizamos havia expressões com grande
carga ideológica que foram eliminadas na revisão de 1982.

Assim a revisão 1982 foi absolutamente necessária, traduziu-se em suma:


• Extinção dos poderes do conselho de revolução
• Expropriações só com justa indeminização
• Estipular os poderes de cada órgão e as relações entre eles como consequência
inevitável da extinção do conselho de revolução, dando a estes legitimidade
democrática plena e fazendo o Estado de Direito funcionar normalmente.
• Extinção de expressões ideologicamente fortes

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 105


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

2º: Revisão Constitucional 1989


Revisão Ordinária

Esta revisão mostra-se igualmente indispensável para a construção da sociedade que


temos hoje.
Em 1986 dá-se a adesão de Portugal à comunidade Europeia dando-se a necessidade de
adequação do texto Constitucional na questão económica.
Para além da revisão terminar com referências que ainda tinham permanecido, como
“transição para socialismos”, “sociedades sem classes” etc.
Mas foi no plano da organização económica que houve mutações essenciais, dando termo:
• Princípio da irreversibilidade das internacionalizações
• Princípio da propriedade coletiva dos principais meios de produção
• Fim do monopólio estatal da televisão

De certa forma se não tivesse havido mais revisões a constituição seria a mesma que
temos hoje, pelo que esta revisões fizeram as alterações essenciais, mas hou mais 5
revisões que já não era absolutamente necessária.

As revisões de1982 e de 1989 foram as duas principais porque deram corpo e definiram
a ordem constitucional que temos hoje. Comparando com o texto originário foram as
revisões que fizeram as maiores mudanças, mas houve mais cinco revisões
constitucionais e algumas delas muito extensas, mas do ponto de vista de matéria no plano
geral se nos tivéssemos ficado pela revisão de 1989 nada seria substancialmente muito
diferente hoje.
Nestas cinco revisões distinguimos entre extraordinárias e ordinárias devido aos limites
temporais.
Depois e 1989 tivemos três revisões extraordinárias e duas revisões ordinárias.
As revisões extraordinárias foram a terceira, em 1992, a quinta em 2001 e a sétima em
2005. Estas foram muito pontuais e disseram respeito a circunstâncias do momento, são
marcadas com a integração europeia.
A quarta e a sexta revisão, realizadas no ano de 1997 e 2004 foram revisões ordinárias.

3º: Revisão Constitucional 1992


Revisão Extraordinária

Pode ser considerada redundante e contraditória porque tocou em muitos artigos e quando
se procurou saber o que trouxe em concreto é muito difícil de saber.
A Assembleia da República sentiu uma necessidade pontual de alterar a constituição
devido ao tratado de Maastricht. As alterações realizadas foram nomeadamente:
• Integração das normas Europeias no Direito Nacional
CRP: Artigo 7º/6
Portugal assume em conjunto o exercício em comum de poderes de soberania
necessários à construção da união europeia. Sem esta revisão seria inconstitucional a
integração de normas europeia no nosso ordenamento.

• Fim do monopólio do Banco de Portugal para a adoção do Euro

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 106


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Alterou-se o artigo sobre o banco de Portugal que até então tinha a exclusividade da
produção da moeda e foi necessário alterá-lo no sentido de prever esta perda de
monopólio para a adoção do euro.

4º: Revisão Constitucional 1997


Revisão Ordinária

É difícil de sintetizar, ao contrário de todas as outras, pois quase que altera todos os
artigos, por vezes realizando apenas melhorias no texto por outras fazendo-se alterações
com dúvidas do sentido normativo, por exemplo no que toca às regiões autónomas.
Deu-se uma alteração de toda a numeração isso pode parecer de somenos, mas não é
porque uma constituição precisa de estabilidade e a numeração interioriza-se na
consistência consequentemente a sua alteração gera instabilidade.
No fundo esta alteração é motivada por uma ideia orientadora que é a reforma do sistema
político. Desde o início até hoje que os políticos quando não têm muito que dizer acontece
que a fuga é realizar uma alteração da constituição com a desculpa de que é preciso
melhorar o sistema político, mas é uma ilusão. Pois mudar a constituição não vai alterar
o comportamento dos políticos nem dos eleitores, dando a estas revisões um caracter
supérfluo. As alterações neste sentido foram nomeadamente:
• Permissão de Candidaturas autónomas à autarcia
Foi feita em grande parte com a ideia de motivar maior participação dos cidadãos com as
candidaturas autónomas à autarcia.

• Possibilidade da criação de círculos uninominais


Foi implantada com o objetivo de melhorar a ligação entre deputados e eleitores. Foi vista
como uma alteração de enormes consequências, contudo até hoje nunca foram
implantados. Jorge Reis Novais não vê necessidade desta alteração e acha que traz
prejuízos.

Outras alterações importantes foram no mandato dos juízes do Tribunal Constitucional.


• Aumento dos anos de mandato
• Impossibilidade de reeleição

Atualmente o mandato é de 9 anos e não pode ser renovado a importância desta alteração
é que o juiz pode exercer com total independência o seu cargo.
Quem elege os juízes é a Assembleia da República (maioria de 2/3) por vezes estes são
criticados por gerar dependência relativamente a quem os elegeu. A alteração vem cortar
esta dependência teoricamente porque o juiz não tem interesse nenhum em agradar a
quem o elegeu porque já não pode ser reeleito, já não tem essa preocupação para garantir
a renovação do seu cargo. O que acontecia antes da revisão é que durante o mandato de
6 anos os juízos tentavam não ofender o partido de que necessitava para ser reeleito para
um segundo mandato.

Deram-se ainda alterações nesta revisão que se prendiam com os poderes legislativos:
• Maior atribuição de liberdade legislativa às regiões autónomas
No domínio da regionalização política das Regiões Autónomas aqui no domínio da
função legislativa a atribuição de um maior poder as regiões autónomas. Sintetizando os
decretos regionais apenas ficam sujeitos aos princípios fundamentais da República

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 107


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

podendo passar a legislar contra as leis gerais da República desde que respeitados os
princípios.

Por sua vez também os Direitos Fundamentais sofreram algumas alterações


• Extradição de cidadãos portugueses
• Desenvolvimento da personalidade
CRP: Artigo 26º
Direito que garante em geral a liberdade de se poder fazer tudo o que não está proibido.

• Possibilidade de internamento compulsivo de doentes do forro psiquiátrico


CRP: Artigo 27º
Na altura não foi permitido o internamento de doentes portadores de doença contagiosa
daí a dificuldade que hoje se sente com o Covid-19.

5º: Revisão Constitucional 2001


Revisão Extraordinária

Realizada numa altura que ainda não tinham decorrido os 5 anos, contudo as
circunstâncias fizeram com que a Assembleia da república achasse necessário realizar
alterações em duas áreas especificas:
• Possibilidade da jurisdição do Tribunal Penal
CRP: Artigo 7º/7
É motivada pela criação do Tribunal Penal Internacional e era necessário para Portugal
conhecer a jurisdição deste tribunal para com os seus cidadãos.

• Alterações nos Direitos Fundamentais


CRP: Artigo 34º e 35º
Época marcada pelos atos terroristas aproveitou-se para fazer umas alterações no domínio
dos direitos fundamentais.

6º: Revisão Constitucional 2004


Revisão Ordinária

Questionamo-nos para que foi realizada? O que introduziu? E é com alguma dificuldade
que respondemos a estas questões.
Em geral serviu para o esclarecimento de que questão que se prende com a integração na
União Europeia: relação entre Direito Europeu e Nacional sobretudo Constitucional.
Na logica da Jurisprudência dos órgãos Europeus o Direito Europeu prevalece no entanto
houve sempre dúvidas acerta dessa supremacia relativamente as normas constitucionais
que aqui ficaram esclarecidas com a seguinte modificação:
• Supremacia do direito Europeu
CRP: Artigo 8º/4
Prevê de forma clara a supremacia do Direito da União Europeia também relativamente
à Constituição.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 108


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

O Direito da União Europeia diz em que termos prevalece e a Constituição reconhece tal
supremacia só com uma ressalva, desde que Direito Europeu respeite os princípios
fundamentais do Estado de Direito Democrático.

• Alterações com significado muito importante também no domínio das regiões


autónomas no sentido de lhes aumentar os poderes legislativos até ao modo como
os conhecemos hoje.
No domínio dos Direito Fundamentais há algumas alterações:
• Proibição da descriminação com base na orientação sexual
CRP: Artigo 13º/2
Proibido a descriminações em função vários fatores sexo religião etc. Nesta revisão
acrescentou-se a orientação sexual. Foi uma alteração controversa na altura porque
achava-se que não era preciso pois a enumeração não é taxativa pelo que estava implícito,
mas agora ficou expresso. Esta alteração teve peso no casamento gay.

7º: Revisão Constitucional 2005


Revisão Extraordinária

Desenvolveu-se nesta altura uma discussão sobre a possibilidade dos cidadãos serem
chamados a referendar sobre a matéria da União Europeia, como desde a nossa adesão a
medidas dos tratados. Havia dúvidas se era possível chamar em refendo segundo o CRP:
Artigo 115º
Para esclarecer as dúvidas sobre a possibilidade de requer um referendo nacional sobre a
união Europeia fez-se esta revisão que introduz o 295º que prevê esta possibilidade.
Acabaram por não ser chamados mas constituição prevê a possibilidade.
• Possibilidade de referendo nacional sobre União Europeia
CRP: Artigo 295º

Tendo percorrido as várias revisões podemos fazer um balanço global com base na
distinção dos dois ciclos. Primeiro ciclo até 2005 marcado por grande instabilidade e
agitação resultando em sete revisões. Abriu-se em 2005 um novo ciclo de estabilidade
constitucional que não sabemos até quando perdurará.

o Primeiro Ciclo
É possível ver no primeiro ciclo que as duas primeiras revisões (1982 e 1989) foram
indispensáveis para a formação da ordem jurídica como hoje temos.
Criou-se neste ciclo a sensação que tinham que haver as revisões de 5 em 5 pelo que
vivíamos sobre uma querela constitucional permanente.
No início entendia-se pela forte ideológico controversa politica, mas isso ficou resolvido
nas duas primeiras revisões contudo a querela Constitucional e ainda é visível nos nossos
dias de tempos a tempos ouvimos a expressão “a culpa disto e da constituição”.
A nossa constituição não tem nada de extraordinário é típica do Estado Social de Direito
se não se faz ou se se faz e mal não é por culpa da constituição.
Voltando ao frenesim Constitucional, tirando as revisões extraordinárias que foram
marcadas por coisas específicos as grandes alterações da outras passa pelas alterações
sobre regiões autónomas no sentido de um aumento dos poderes ao longo da varias
revisões.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 109


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Pelo que vemos um crescente poder legislativo das regiões autónomas ao longo das
Revisões Constitucionais:

• Constituição de 1976
Ter que haver interesses específico e respeitar as leis gerias da República, sendo assim
uma competência muito limitada.

• Constituição 1982
Clarifica que são apenas as leis gerais da República que em termos materiais tem
aplicação a nível nacional.

• Constituição 1989
Permite-se que a próprias leis gerias de república com um já podem ser contrariadas com
a autorização da Assembleia da República.

• Constituição 1997
As regiões autónomas passam a ter que respeitar apenas os princípios fundamentais das
leis gerais, assim podem contrariar mesmo sem autorização da Assembleia da República
desde que não vá contra princípios fundamentais.

• Constituição 2004
Criou o sistema que temos hoje. A supressão do limite do interesse especifico era o que
mais se discutia ate então. Desparece a necessidade de respeito da leis gerais da republica,
discussão toda que houve evapora-se.
As regiões autónomas passam a poder legislar não estando a matéria reservada aos órgãos.
Por sua vez os órgãos não podem legislar sobre matéria se as regiões já tiverem legislado.
Surge a possibilidade de autorizações legislativas e desenvolvimento leis base.

o Segundo Ciclo
No segundo ciclo há necessidade ou não há? Inevitavelmente terá de haver?
Este período em que passamos por uma pandemia evidenciou a necessidade uma alteração
pontual no artigo 27º permitindo o internamento compulsivo de doentes contagioso.
O acesso aos metadados já foi considerado inconstitucional pelo Tribunal duas vezes, em
grande parte dos pais Europeus seria possível, em Portugal exige uma alteração da
constituição.
Podemos dizer que alterações de ordem estrutural nunca vão ser feitas. Mas podemos
considerar que o sistema da fiscalização de que forma careceria de uma alteração
profunda que com grande probabilidade não vai ser feita.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 110


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

FISCALIZAÇÃO DA CONSTITUCIONALIDADE

O nosso sistema de fiscalização da constitucionalidade é algo complexo, pode não parecer


à primeira vista e durante muito tempo era encarado como se fosse perfeitamente normal,
comum. Isto porque, em Portugal antes de 1976, no regime anterior, não havia
fiscalização porque não havia uma verdadeira constituição normativa. Assim quando
surgiu o sistema havia a ideia que era normal porque não conhecíamos, pensamos que
seria semelhante ao que existe noutros países Europeus. Mas não é.
O sistema português é especialmente diferente do modelo Europeu da fiscalização da
constitucionalidade e também diferente do modelo americano de fiscalização da
constitucionalidade.

Em termos gerais podemos distinguir dois sistemas de fiscalização muito diferentes,


Americano (Sul, Norte e Centro) e o Europeu. 11
Os fins que se procuram são os mesmo, a constituição tem força normativa suprema e os
atos normativos têm que respeitar a constituição quando alguma entidade suscita dúvidas
vai verificar-se se aquilo que os poderes constituintes fizeram está ou não de acordo com
a constituição fazendo-se assim a verificação da constitucionalidade.
O que as distingue é a forma como a fiscalização se processa, quem tem competência para
tal.

o Sistema Americano
Em termos históricos na América praticamente desde a revolução americana o Supremo
Tribunal de Justiça e os tribunais comuns começaram a fazer a fiscalização.
Na América quem desempenha o papel de fiscalização da constitucionalidade são os
tribunais comuns que decidem os outros casos jurídicos e depois o Supremo tem a última
palavra é a estruturação orgânica do processo.

o Sistema Europeu
Na Europa só muito tarde se adotou este instituto, foi no século XX, mais concretamente
após a Segunda Guerra Mundial. A Europa chegou tarde a desenvolver a função do estado
e atribuiu-a a um órgão especial criado para o efeito, a um Tribunal Constitucional, por
influência Kelsiana. Depois da Segunda Guerra muitos países Europeus, democráticos de
estado de direito criaram este órgão.

o Sistema Português
Depois da Revolução 25 de abril 1979 aprovou-se a Constituição e inclui-se esta função
e criou-se igualmente o Tribunal Constitucional.
Como vimos numa primeira fase a função era atribuída ao Conselho de Revolução.
Com a Revisão de 1982 extingue-se o conselho de revolução e cria-se o Tribunal
Constitucional à semelhança dos restantes países Europeus. Assim, aparentemente como
seria expectável Portugal consagraria um sistema muito próximo ao dos restantes países
Europeus, como Espanha. Contudo como referido anteriormente, Portugal tem uma
situação particular na Europa e no Mundo, pelo que levanta sempre problemas. Isto
porque podemos sempre questionar-nos quem está errado, ou menos bem? Portugal ou
todo o resto do Mundo? Se ter um sistema original é bom ou mau?

11NOVAIS, J. REIS, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade, Avaliação critica, AAFDL Editora,
2019 2ª edição, páginas 63 a 64

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 111


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Jorge Reis Novais considera não e bom, no geral é mau. Mas há coisas boas, o facto de
beneficiar, uma vez que chegou tardiamente (1976), de poder adotar vários mecanismos
já conhecidos e desenvolvidos noutro países. Em termos de traços gerais existem todos
os institutos e modalidades que tinham sido desenvolvidas noutros países,

Em Portugal o instituto de fiscalização surge n com a Revolução Republicana de 1910. A


proximidade de Portugal e do Brasil levou a que os constitucionalistas de 1911 adotassem
um sistema de fiscalização próximo ao do Brasil. Instituído se assim, na constituição de
1891, o sistema Americano que atribuída a todos os tribunais a competência de não
aplicarem leis com fundamento em inconstitucionalidade. Assim tinham que verificar se
uma lei observa ou não as regras constitucionais se não observar não a aplicam
considerando na inconstitucional.

Com a adoção deste instituto em 1911 apresentamos uma grande vantagem temporal
perante os restantes países europeus.
Como é típico em Portugal enquanto a constituição dizia isto os tribunais não o faziam,
houve alguns casos, mas situações raras. Ou seja, na prática não se verificava uma
verdadeira fiscalização da constitucionalidade por parte dos tribunais.
Apesar do modelo estar nas constituições só a partir de 1976 é que foi colocado em
prática, primeiro com o conselho e a comissão Constitucional e depois com a inauguração
do Tribunal Constitucional. Assim apesar de nos livros estar previsto este instituto com o
sistema Americano na prática acontecia o mesmo que nos restantes países Europeus, não
havia fiscalização.

Em 1976 e depois 1982 criou-se o Tribunal Constitucional pelo que seria normal que
igual aos europeus o tribunal se encarregasse disso, mas como já existia antes aos
tribunais comuns aconteceu que ao mesmo tempo que se criou um Tribunal
Constitucional manteve-se nos Tribunais Comuns a competência de continuarem a fazer
a fiscalização.

Em síntese, no sistema americano todos os tribunais comuns e depois o tribunal supremo


realizam a fiscalização, e no sistema europeu essa função está restrita a um Tribunal
Constitucional. Em Portugal verificamos como que uma junção de ambos os sistemas,
pois tanto o Tribunal Constitucional como os comuns têm a competência de realizar a
fiscalização.

CRP: Artigo 204º


Impõe aos tribunais agir segundo a seguinte atitude: enquanto estão a julgar um caso e
vão aplicar normas essas têm de ser conforme à Constituição, pelo que não as podem
aplicar se forem inconstitucionais.
Mas para saberem se contrariam a Constituição tem que fazer fiscalização da
constitucionalidade, competência de o fazer. Se considerarem que qualquer norma em
contrarie os princípios não a podem aplicar o que significa que fizeram fiscalização e se
recusaram a aplicá-la.

Exemplo: O tribunal de Almada, tal como o de Leiria ou de Tondela podem recusar-se a


aplicar uma norma por considerarem inconstitucional.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 112


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

A decisão de um tribunal comum não é definitiva é passível de recurso para tribunais


superiores. É introduzido de novo que se permite e por vezes se impõe que se faça um
recurso para um tribunal Constitucional destes casos de dúvida da constitucionalidade de
uma norma durante a resolução de um caso concreto.

Podemos dizer que o sistema português foi buscar aos sistemas Europeus a competência
de um Tribunal Constitucional e ao sistema Americano o poder de recorrer de tribunais
comum a um Tribunal superior.

Americano Europeu Português


Surge inicialmente em 1911, mas
Surge com a Surge após a
sem aplicação prática
História Revolução Segunda
Sobre alterações em 1976 e em
Americana Guerra
1982
Quem 1911-1976
desempenha o Função da competência dos
papel da É criado nos Tribunais Comuns
fiscalização Estados um 1976-1982
são os Tribunal Função do conselho da revolução
Aplicação/
Tribunais Constitucional e da comissão constitucional
Competência
Comuns e o que detêm o 1982
Supremo monopólio de Criação do Tribunal
Tribunal, com fiscalização Constitucional que acumula a
uma palavra competência com os Tribunais
final Comuns

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 113


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

MODALIDADES DE FISCALIZAÇÃO12

Na Fiscalização Abstrata o que o Tribunal Constitucional faz é ter uma norma para
apreciar, verificar se é compatível com a constituição, e vai fazê-lo de uma forma abstrata,
independentemente da aplicação da norma a um caso concreto. Não há conflito jurídico
há apenas a norma em abstrato. O tribunal não toma a iniciativa de fazer a fiscalização
está sujeito à iniciativa de outra entidade, que alguém lhe peça para intervir.
A fiscalização abstrata é em suma olhar só para a norma independente da aplicação num
caso concreto e pode ser sucessiva ou preventiva.
Esta distinção tem haver com o tempo, com o momento em que se realiza a fiscalização
da constitucionalidade. Nem todos os países tem as duas costuma existir só a sucessiva.

A Fiscalização Preventiva ocorre antes da promulgação de uma normal e é requerida


pelo Presidente da República ou antes da sua assinatura por parte do Representante da
República13 junto do Tribunal Constitucional.
Se estas entidades têm dúvida da constitucionalidade é bom que sejam esclarecidas antes
da norma entra em vigor, quem vai verificar é o Tribunal Constitucional se têm as dúvidas
razão de ser ou não. Assim, é uma fiscalização feita para prevenir a entrada de normas
com o vício de inconstitucionalidade.

A Fiscalização Sucessiva é realizada depois da norma entrar em vigor, depois de


publicada no Diário da República.

Por sua vez na Fiscalização Concreta tudo nasce no julgamento de um caso concreto, de
um conflito jurídico entre particulares. Assim na resolução num tribunal comum alguém
suscita o problema da eventual inconstitucionalidade de uma norma, alguém uma das
partes ou o juiz.
Temos um caso a ser decidi e suscita-se o problema da constitucionalidade de uma norma.

Outras duas modalidades de fiscalização prendem-se com quantos órgãos intervêm o


processo, ou seja, quantos órgãos tem competência para realizar a fiscalização da
constitucionalidade de uma norma.

Quando estamos perante um Fiscalização Difusa, muitos tribunais podem fazer a


constitucionalidade, mas pode haver um momento que quem decide é apenas um órgão o
Tribunal Constitucional e aqui falamos de Fiscalização Concentrada.

A seguinte distinção prende-se com a forma de violação da constituição, ou seja, se há


uma inconstitucionalidade por violação dos princípios da Constitucionalidade ou se pela
não realização de um órgão de uma ação que lhe é atribuída pela constituição.

Estamos perante uma Fiscalização por Ação na hipótese de termos uma norma, um ato
relativamente ao qual levantamos dúvidas se é inconstitucional ou não. O que se sucede
é que alguém praticou o ato relativamente ao qual levantamos dúvidas de
constitucionalidade.

Estamos perante uma Fiscalização por Omissão quando não há dúvidas de


constitucionalidade por ação mas sim por omissão, ou seja quando os órgãos não fazem

12Jorge Reis Novais, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade, Avaliação critica, AAFDL
Editora, 2019 2ª edição, páginas 17 a 33
13O sistema de fiscalização continental reproduz-se igualmente nas regiões autónomas, pelo que sempre que referido

apenas Presidente da República podemos considerar que o mesmo ocorre com o Representante da República.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 114


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

as suas funções. Esta fiscalização é muito reduzida contestável e de efeito duvidosos, o


instituto é em si louvável, contudo a forma adotada é ineficaz.

Exemplo: Se o governo estabeleceu limites à circulação das pessoas e não podia, a norma
que a estabeleceu é inconstitucional por ação.
Se o governo assistisse impávido à possibilidade de cidadãos afetarem outros tava a omitir
a proteção que deve ao direito à saúde aos outros sendo inconstitucionalidade por
omissão.

Distinguimos a possibilidade de intervenções de vários tribunais, comuns e constitucional


que é o que se responsabiliza e tem a última palavra pelo que intervêm em todas as
modalidades, preventiva, omissão, sucessiva, abstrata e concreta. Contudo é importante
referir quais as posições terminológicas dos atos do Tribunal Constitucional perante as
diferentes modalidades de fiscalização que pratica.

Quando estamos perante uma fiscalização preventiva, requerida pelo Presidente da


República ou pelo Representante da República que têm dúvidas sobre a
constitucionalidade. O Tribunal Constitucional vai analisar a questão e depois pronuncia
se pela inconstitucionalidade ou não se pronuncia pela inconstitucionalidade.

Na fiscalização sucessiva abstrata, alguém pede ao tribunal que declare a


inconstitucionalidade de uma norma já vigente. Após aprecia a questão e declara a
inconstitucionalidade ou não.

Na fiscalização concreta como referido tudo nasce um caso concreto em julgamento e


depois o tribunal comum tomou uma decisão e a questão foi remetida para o Tribunal
Constitucional, que irá julgar da inconstitucionalidade da norma.

No caso da fiscalização por omissão se alguém (Presidente da República ou provedor)


requerer o Tribunal Constitucional vai verificar se há a omissão constitucional, se há um
órgão que não se a sua função.

Falamos normalmente em fiscalização da constitucionalidade, mas no que respeita a


fiscalização sucessiva abstrata e concreta tanto temos fiscalização da constitucionalidade
das normas como ilegalidade. Inconstitucionalidade ocorre uma violação da constituição
por parte de uma norma ordinária. Na ilegalidade ocorre uma violação de leis que
apresentam um valor reforçado por parte de uma lei ordinária.

Por vezes dá-se excessiva importância a esta distinção, mas no nosso sistema
constitucional esta distinção não tem grande relevância, referimo-nos à distinção entre os
tipos de inconstitucionalidade, orgânica, material ou formal. Apesar de ser bom conhecer
estas distinções o regime de fiscalização é sempre o mesmo independentemente da
inconstitucionalidade. Não aconselha a tentar fazer a distinção nos casos práticos. Na
inconstitucionalidade orgânica referimo-nos ao facto de um órgão ter aprovado uma
norma quando a constituição não lhe dá esse poder; ato praticado por um órgão quando
não tinha competência. A inconstitucionalidade formal ocorre quando não se respeitam
os procedimentos estabelecidos (exemplo: maiorais estabilidades para deliberação)
A inconstitucionalidade material diz respeito a uma desconformidade material entre a
norma ordinária e constitucional (exemplo: pessoa sofre tortura por tarte da autoridade
pública)

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 115


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

De onde surge a necessidade de fiscalização (em que se baseia)?

Abstrata Concreta
Olhar só para a norma independente da Na resolução num tribunal comum alguém
Conceito aplicação num caso concreto, pode ser suscita o problema da eventual
preventiva ou sucessiva inconstitucionalidade de uma norma
Tribunal não toma a iniciativa de fazer
Pode ser o juiz do caso ou uma das partes a
a fiscalização está sujeito à iniciativa de
Requerimento sugerir o requerimento para o Tribunal
outra entidade Presidente ou
Constitucional
Representante da República
Tribunal Constitucional irá julgar da
Terminologia
inconstitucionalidade da norma

Em que momento que realiza a fiscalização (ambas abstratas)?

Preventiva Sucessiva
Ocorre antes da promulgação de uma
Realizada depois da norma entrar em vigor,
normal, é feita para prevenir a entrada
Conceito depois de publicada no Diário da
em vigor de normas com o vício de
República.
inconstitucionalidade
Tribunal não toma a iniciativa de fazer Tribunal Constitucional Tribunal não toma
a fiscalização está sujeito à iniciativa de a iniciativa de fazer a fiscalização está
Requerimento
outra entidade Presidente ou sujeito à iniciativa de outra entidade
Representante da República Presidente ou Representante da República
Tribunal Constitucional vai pronunciar- Tribunal Constitucional e declara a
Terminologia
se pela inconstitucionalidade. inconstitucionalidade

Quantos órgãos interferem no processo de fiscalização?

Difusa Concentrada
Processo em que interferem diversos Processo que se mantêm apenas num
Conceito
tribunais, Comuns e Constitucional Tribunal, Constitucional
Apenas a fiscalização concreta pode ser Apenas a fiscalização preventiva e
Conclusões
difusa sucessiva podem ser concentradas

Qual a forma de violação da constituição que suscita a fiscalização?

Ação Omissão
Alguém praticou o ato relativamente ao
Quando os órgãos não fazem as suas
Conceito qual levantamos dúvidas de
funções
constitucionalidade
Tribunal Constitucional Tribunal não toma
a iniciativa de fazer a fiscalização está
Requerimento
sujeito à iniciativa de outra entidade
Presidente da República ou Provedor
Tribunal Constitucional vai verificar se há
Terminologia
a omissão constitucional

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 116


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Balanço Geral

Balanço geral do modelo que existe, pois iremos nas próximas aulas fazer uma apreciação
critica mais desenvolvida.

Verificamos a fiscalização da constitucionalidade em Portugal ela primeira vez a partir


de 1976 e depois com a criação do tribunal Constitucional em 1982, apesar de
anteriormente já se encontrar estipulada no papel não se verificava. Antes da criação do
Tribunal Constitucional era o conselho de revolução, a comissão de Constitucionalidade
e os Tribunais comuns responsáveis pela fiscalização.
A intervenção do Tribunal Constitucional tem sido globalmente positiva. No entendo há
muitos défices sobretudo na proteção dos direitos fundamentais dos cidadãos. Também
tem sido muito discutida a fiscalização prevenida, pois uma má atuação por parte do
Presidente da República pode retirar a intenção para que foi criado este tipo de
fiscalização, ou seja, evitar que normas inconstitucionais entrem em vigor e que o
legislador sabendo que há a possibilidade de a sujeitar inibe as maiorias politicas de
aprovarem normas inconstitucionais ficam com má imagem, pelo que tendem a não o
fazer.
Pode ser um instituto muito importante, contudo tudo depende da atuação do Presidente
da República.
Exemplos de má atuação:
Pacto do Presidente com o Governo para aprovar as medidas de autoridade dos
orçamentos em 2012.
Lei da procriação medicamente assistida em vigor durante 2 anos sendo que havia dúvidas
da constitucionalidade na altura da sua promulgação e o Presidente Marcelo optou apenas
por promulgar e depois veio a ser declarada inconstitucional gerando graves
consequências na vida das pessoas.

Fiscalização Preventiva Fiscalização Sucessiva

Verificação da Verificação da
inconstitucionalidade por ação inconstitucionalidade
por omissão

Fiscalização Concreta Fiscalização Abstrata

Fiscalização Difusa Fiscalização Concentrada

Esquema realizado com base no primeiro parágrafo da página 17 do livro do Professor Doutor Jorge Reis
Novais, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade, Avaliação critica.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 117


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 118


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Fiscalização preventiva
CRP: Artigo 278º e 279º LOTC: Artigo 57º a 61º

A leitura destes artigos esclarece tudo, contudo vamos referir os pontos de relevância.
Como já vimos ocorre antes da norma ser promulgada ou assinada, o Presidente da
República ou o Representante deste nas regiões autónomas pode suscitar a fiscalização e
o tribunal pronuncia-se. Nesta fiscalização só há de constitucionalidade não há de
ilegalidade.
Quando fala em normas referimo-nos apenas às contidas em atos legislativos, leis,
decretos-leis, decretos legislativos regionais ou internacionais. Caso normas de outros
atos suscitem duvidas não estão sujeitas a fiscalização preventiva.
Esta fiscalização está muito ligada ao poder de veto Presidente da república
Se o tribunal se pronuncia pela inconstitucionalidade daquela norma a consequência é
que o Presidente tem de vetar.

Quem tem a iniciativa de suscitar a fiscalização preventiva?


CRP: Artigo 278º/1 e 2
Em princípio só o Presidente da República e o Representante podem requer, importa
referir que está no seu exclusivo critério pedirem a fiscalização ou não, assim podem ter
dúvidas e optar por promulgar ou assinar sem chamar o Tribunal Constitucional ode ter
dúvidas ou certezas e não pedir a fiscalização
Exemplo: O atual Presidente, Professor Marcelo Rebelo de Sousa, quase nunca pede
fiscalização, pediu apenas uma vez. Por vezes já se pediu em sede sucessiva e declarou a
inconstitucionalidade, contudo ele não cometeu nada errado por não pedir a fiscalização
pois não é obrigado a tal.

Que prazo têm para fazer o pedir?


CRP: Artigo 278º/3
Têm 8 dias após receberem o documento para ser promulgado ou assinado.

O Tribunal constitucional tem um prazo para emitir a sua posição?


CRP: Artigo 278º/8
O tribunal tem um prazo para se pronunciar pela inconstitucionalidade de 25 dias.
Contudo neste prazo a entidade que pediu a fiscalização pode intervir caso se tarte de um
pedido de urgência, pedido ao Tribunal que decida num período mais curto.

CRP: Artigo 278º/4


Regime ligeiramente diferente para as leis orgânicas.
Neste caso pode também pedir a fiscalização tanto o Primeiro Ministro como o conjunto
de 1/5 dos deputados em efetividade de funções.
Para que não haja divergência entre a vontade da entidade responsável por promulgar a
lei e as restantes que podem requerer a fiscalização, o Presidente tem de esperar 8 dias
após receber o diploma para o poder promulgar. Tendo em vista dar às restantes entidades
a oportunidade de se manifestarem. Decorrido os 8 dias se ninguém suscitou a questão
pode promulgar, se se chamou o Tribunal aguarda-se a decisão deste.

Quais são os efeitos da pronúncia da decisão do Tribunal Constitucional?


CRP: Artigo 279º
Naturalmente se verificar a constitucionalidade da norma o Presidente pode promulgar.
Contudo se o Tribunal Constitucional se pronunciar pela inconstitucionalidade o
Presidente da República tem de vetar, não o podem promulgar mesmo que queriam, e
devolve ao órgão que o aprovou.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 119


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Este veto é designado por jurídico porque antes houve necessariamente uma pronúncia
de inconstitucionalidade por parte do Tribunal.
De seguida quando devolvido ao órgão que o elaborou este pode:
• Aceitar a inconstitucionalidade, ou seja, conforma-se com a decisão e esquecer a
elaboração daquele ao.
• Retira a norma ou alterar de forma a ficar conforme à justificação que deu o
tribunal Constitucional.
• Confirmar o diploma por 2/3 dos deputados presentes.

CRP: Artigo 279º/2


Está última possibilidade é algo estranha
Dá-se um conflito entre a Assembleia da República que elabora uma norma e o Tribunal
Constitucional que diz que tal norma é inconstitucional.
Geralmente a Assembleia da República cede mas a constituição prevê a hipótese da
Assembleia da República não querem retirar a norma e confirmar o diploma a por 2/3 dos
deputados presentes.
Como se resolve?
É o Presidente da República quem arbitra o conflito, se quiser promulga e coloca-se do
lado da Assembleia da República se não quiser não é obrigado e pode vetar seguindo a
opinião do Tribunal Constitucional.
Regente Jorge Reis Novais considera que não faz muito sentido, mas a constituição quis
abrir as opções. Nunca aconteceu e possivelmente nunca vai acontecer.

Fiscalização Sucessiva Abstrata


CRP: Artigo 281º e 282º

A norma está em vigor e a produzir efeitos e uma entidade considera que é


inconstitucional e requer a apreciação do Tribunal Constitucional, não importa o tempo
em que esta em vigor. Temos fiscalização de inconstitucionalidade e de ilegalidade, o
regime é o mesmo.

CRP: Artigo 281º/1 a)


O tribunal aprecia e declara com forma obrigatória geral.
Situação diferente do que ocorre na preventiva, significa que a norma desaparece da
ordem jurídica o que é a parte mais complexa dos efeitos da declaração

CRP: Artigo 281º/1b) c) e d)


Falam da ilegalidade

Que entidade podem requerer?


CRP: Artigo 281º/2
É preciso que a entidade esteja com bastantes certezas enão vá só “chatear”.

CRP: Artigo 281º/3


Este preceito gera muita confusão pois cria uma ligação com a fiscalização concreta.
Descreve a situação em que em fiscalização concreta foi chamada a julgar a
constitucionalidade e uma norma e considerou-se que era inconstitucional neste âmbito o
facto de o ter decidido não erradica a norma da ordem jurídica só vale para aquele caso
pelo que permanece em vigor na ordem jurídica portuguesa, o que Jorge Reis Novais acha
dificilmente compreensível. Pode acontecer que ela volte ao julgamento noutro caso
concreto e este a volte a julgar inconstitucional. Se isto acontecer em 3 casos concretos

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 120


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

aqui entra a declaração de inconstitucionalidade com força geral obrigatória, ou seja,


saímos da fiscalização concreta e dão-se os resultados da fiscalização sucessiva abstrata.

Que utilidade tem este preceito?


Vimos que qualquer norma pode ser requerida ao Tribunal Constitucional pelo que este
pode sempre declarar a inconstitucionalidade por fiscalização sucessiva.
É apenas uma questão de iniciativa.
Em regra geral, o Tribunal Constitucional está sujeito à iniciativa de alguém. Este artigo
é uma exceção as pessoas que podem requerer este tipo de fiscalização. Ou seja, os
próprios juízes podem tomar a iniciativa, após ter julgado uma norma inconstitucional
num caso concreto três vezes pode declará-la por iniciativa própria ou do ministério
publico a inconstitucionalidade segundo fiscalização abstrata sucessiva retirando esta do
ordenamento jurídico.

CRP: Artigo 282º


Efeitos da declaração de inconstitucionalidade
Mais complicado que a nota da força obrigatória geral

CRP: Artigo 282º/1


É erradicada, mas já produziu efeitos no passado, todos os efeitos que a norma produziu
ou vá a produzir são postos em causa, desaparecem, são erradicados.
Outra questão é a repristinação da norma revogada, ou seja, tínhamos em vigor a norma
A passados uns anos a norma B vem revogar a norma A. Se a B for considerada
inconstitucional a norma A volta a entrar em vigor, pois um dos efeitos da norma B foi a
revogação da norma inconstitucional.

Distinção de conceitos:
Inconstitucionalidade Originaria: a norma foi criada contrariando a constituição.
Inconstitucionalidade Superveniente: a norma foi constituída de acordo com a
constituição mas dá-se uma revisão Constitucional e uma norma Constitucional vem fazer
com que a ordinária passe a contraria a constituição.

CRP: Artigo 282º/2


No caso da superveniente os efeitos produzidos até à nova constituição mantêm-se pois
na altura eram constitucionais, só desaparecem a partir da data da entrada em vigor na
nova constituição.

Exemplo: Norma A de 1980 conforme à constituição, em 1982 dá-se a revisão


constitucional. Em 1985 a norma A é chamada ao Tribunal Constitucional que a vem a
verificar a sua inconstitucionalidade. Os efeitos produzidos entre 1980 e 1982 mantêm-
se, os efeitos produzidos após 1982 é que são erradicados.
Consideremos apenas a situação de inconstitucionalidade originária, pois a superveniente
ocorre muito raramente. Há algumas dificuldades quanto aos efeitos desta erradicação

CRP: Artigo 282º/3 1ªparte


Regra geral: caso julgado não é tocado
A ressalva dos casos julgados significa que situações idas a tribunal já com uma decisão
estabelecida, já julgados não são afetados pela declaração de inconstitucionalidade.
Assim todos os efeitos é como se não existissem menos os casos que os tribunais já
julgaram.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 121


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

CRP: Artigo 282º/3 2ªparte


Exceção: a não ser que o Tribunal Constitucional diga que vai ser tocado, contudo não o
pode dizer em qualquer caso julgado, apenas nos casos em que
Requisito para haver exceção: seja matéria sancionatória e tem que resulte num efeito
mais favorável para o arguido.

Caso a norma declara inconstitucional seja sancionatória e de conteúdo mais favorável ao


arguido aí diz este preceito que o Tribunal Constitucional pode decidir em contrário, ou
seja, os casos julgados podem ser afetados.

Nos números anteriores verificamos quais os efeitos da declaração de


inconstitucionalidade, a norma e os efeitos são erradicados, salvo os casos julgados
naquelas condições. Efeitos bastante significativos que podem provocar um enorme abalo
na ordem jurídica. Podem ter uma repercussão na vida jurídica, gerando situações de
insegurança jurídica.
Exemplo: Uma norma à 20 anos declarada inconstitucional, as consequências da na
ordem jurídica da anulação de todos os efeitos já produzidos é enorme.

CRP: Artigo 282º/4


Por razões de segurança jurídica ou de equidade ou interesse publico dá-se ao Tribunal a
possibilidade de modelação dos efeitos da sua decisão. Os efeitos são os que estudamos,
mas o Tribunal Constitucional pode dizer neste caso que os efeitos não vão ser tao
contundentes e determina quais as consequências que se dão, atenuando os efeitos da
inconstitucionalidade.
Esta qualidade não é muito comum num órgão de poder central, dá-se a possibilidade dela
fazer uma analise politica, constituindo uma exceção do caracter judicial do Tribunal,
pois este atua quase como se fosse um órgão politico.
Exemplo: vale daqui para a frente, mas os efeitos já produzidos vão permanecer
intocáveis, ou então alguns destes vão permanecer enquanto que outro faz sentido serem
anulados.

Mas quão mais restrito? Não há limites para tal?


Apenas nos efeitos passado ou pode também afetar efeitos futuros?
Havia a convicção de que apenas podiam ser modelados os efeitos anteriores, contudo
em 2012 verifica-se uma situação que nos vem mostrar o contrário.

Em 2012 na altura da última crise de natureza financeira era típico as leis de orçamento
conterem medidas de autoridade, como cortes nos salários e nas pensões. Discutia-se a
constitucionalidade disto pois o Estado garantia salários e pensões e a certa altura dizia
“vai ficar agora sem esta parte”. Entravam em vigo na altura, cavaco silva, sem que se
pedisse fiscalização preventiva da constitucionalidade e as leis entrava em vigor e após
isso havia entidades que descontentes com o facto do presidente não ter suscitado
requeriam fiscalização sucessiva. O tribunal ia decidir isto a meio do ano económico e
era colocado perante este dilema de em que efeitos podia mexer. Se declarasse a
inconstitucionalidade o estado dali para a frente perdia os cortes, tinha que pagar como
tinha prometida e tinha que pagar o que tava para trás. Isto iria gerar enormes dificuldade
financeiras ao Estado.
O Governo da altura contava que se a norma entrasse em vigor o Tribunal Constitucional
não terá coragem para criar esta confusão. Sendo que só era um plano favorável se o
Presidente da República não pedisse a fiscalização preventiva.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 122


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

O Tribunal Constitucional verificava que era inconstitucional, mas tinha que avaliar quais
as consequências que iria causar a declaração de inconstitucionalidade e decidir se fazia
a sua competência ou não.

Na altura o Tribunal decidiu recorrer a este nº4 do 282º dizendo algo inesperado, “declaro
a inconstitucionalidade destas normas, mas tendo em conta as razoes de interesse publico,
dado que esta declaração vai produzir consequências drásticas, nos declaramos
inconstitucionalidade, mas até ao fim do ano as normas permanecem em vigor”.
Foi uma decisão bastante criticada pois as pessoas consideravam que o tribunal apenas
podia modelar os efeitos passados de uma norma, questionavam-se como é que pode dizer
que é inconstitucional, mas mantê-la em vigor? O que esta críticas não viam é que tinha
um enorme efeito útil político, pois o Tribunal Constitucional tava a dizer ao governo que
era inconstitucional e estava a avisar, por isso no próximo orçamento não voltem a fazer
isto.
O Governo não aprendeu a lição e no ano seguinte no fundo fez a mesma coisa e o
Presidente da república continuou sem pedir a fiscalização e neste ano o Tribunal
declarou a fiscalização com os efeitos que a decisão devia ter tido.

Há duas situações no nosso ordenamento jurídico em que o Tribunal Constitucional


funciona como que com poderes políticos, com exceção à natureza judicial, são estas:
• Modelação dos efeitos de declaração de inconstitucionalidade
• Declaração com força obrigatória geral, após três casos julgados em concreto
Inconstitucionalidade por omissão
CRP: Artigo 283º LOTC: Artigos 67º e 68º

Há normas Constitucionais que necessitam de uma norma ordinária para se tornarem


exequíveis. O Tribunal Constitucional a pedido de uma das entidades mencionadas no
artigo verifica se o Legislador ficou parado quando devia ter legislado para fazer
exequíveis as normas constitucionais.
Exemplo: CRP: Artigo 40º Direito de Antena, “segundo critérios objetivos a definir por
lei”. A constituição garante tempo na radio e televisão, mas qual o critério para atribuir
estes tempos? Para esta norma ter uma efetividade plena é necessário que o legislador
defina os critérios.
Imaginemos que o legislador não o fazia, ai o Tribunal aprecia e verifica se à
incumprimento pelo legislador por não ter emitido as normas necessárias a dar
executabilidade ao artigo.
Só nestes casos se pode utilizar este tipo de fiscalização.
O Tribunal Constitucional não aprecia toda a omissão, ou seja, apenas quando uma norma
constitucional exige a existência de uma norma ordinária.
No caso de o Governo não ajudar as pessoas que após esta pandemia vão ficar em crise
não pode ser apreciado pelo Tribunal pois apesar de ser violar um dever de proteção por
parte do Governo a norma que define este mesmo dever não obriga a existência de uma
norma ordinária para o executar.
Isto enfraquece a força do Tribunal Constitucional neste domínio, pelo que a importância
pratica acaba por ser atenuada, pois só certo tipo de omissões é que são verificáveis e os
efeitos definidos não são tão contundentes.

CRP: Artigo 283º/2


Os efeitos são apenas dar conhecimento ao órgão. Significa que se os órgãos
permanecerem inativos o Tribunal não pode fazer mais nada.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 123


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

FISCALIZAÇÃO CONCRETA14

CRP: Artigo 204º


Nos casos que os tribunais estão a julgar os juízes não podem aplicar normas que
infrinjam a constituição, para tal o juiz tem que confrontar a norma ordinária com a
constituição, pelo que obrigatoriamente se está a realizar a fiscalização da
constitucionalidade. Logo, o juiz competente para decidir a causa é também competente,
qualquer que seja o tribunal que integre, para decidir previamente, por iniciativa própria
ou a pedido das partes, se a norma potencialmente aplicável é ou não inconstitucional.

Não podendo, nos termos do 204, aplicar normas inconstitucionais, ele fica obrigado a
decidir, expressa ou implicitamente, a referida questão de constitucionalidade, isto é, tem
de decidir se a norma em causa é ou não inconstitucional:

• Se considera que a norma é inconstitucional não a aplica, deve recusar a respectiva


aplicação;
• Se aplicou a norma na resolução de um feito é porque não a considerou
inconstitucional, independentemente das dúvidas;

Não é apenas feita difusamente, pelo que não fica por aqui. Destas decisões que os
Tribunais Comuns tomam há a possibilidade de recurso não apenas para os Tribunais
superiores, mas também para o Tribunal Constitucional, preenchidos certos requisitos.

Os juízes comuns de algum modo são igualmente juízes constitucionais, não só vão
apreciar as questões de inconstitucionalidade que lhe são colocadas, mas para além disso
também decidem estas questões, “esta norma a meu entender é inconstitucional pelo que
não a irei aplicar” ou o inverso.

A fiscalização não é um problema que tenha sido colocada a título pessoal ao juiz, ou
seja, ninguém se dirige a um tribunal pedindo ao juiz que julgue a constitucionalidade.
O que sucede é que surge a título incidental, ou seja, que enquanto os tribunais resolvem
um conflito, sobre qualquer matéria (penal, família...), alguém suscita o problema da
eventual inconstitucionalidade de uma norma. Tanto uma das parte como o juiz pode
suscitar a eventual inconstitucionalidade de uma norma.

Distingue-se de todas as outras pois a questão não tem de ser suscitada por uma entidade
pública, é requerida por um particular. Este particular só levanta a questão por considerar
que os seus direitos podem vir a ser lesados pela aplicação daquela norma, contudo a
quando a fiscalização por parte do juiz este afasta-se do interesse da parte privada
realizando apenas um confronto da normal ordinária com a constituição

A conjunção destes fatores leva, em termos quantitativos, a que a grande maioria dos
casos a que o Tribunal Constitucional se dedica partam de uma iniciativa de particulares,
que se traduz na fiscalização concreta. Tendo esta em termos práticos a maior relevância.
Exemplo: Num ano o Tribunal Constitucional pode ter 10/15 caso de fiscalização
preventiva, sucessiva e por omissão, e milhares (1500/1700) de casos de fiscalização
concreta.

14 Jorge Reis Novais, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade, Avaliação critica, AAFDL Editora,

2019 2ª edição, páginas 35 a 62

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 124


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Surge complexidade nesta fiscalização quando a Constituição tanto atribui competência


aos juízes comuns como lhe retira importância admitindo a possibilidade de recorrer ao
Tribunal Constitucional.

Diferentemente do que acontece nos outros países, os juízes comuns têm a competência
de decidir sobre a constitucionalidade das normas. Apesar de terem esta competência, a
Constituição prevê, preenchidos certos requisitos, o recurso desta decisão para o Tribunal
Constitucional. Portanto quem vai decidir em última análise é na esmagadora maioria das
situações o próprio Tribunal Constitucional.

O Tribunal constitucional não vai julgar o conflito, mas sim a questão de


constitucionalidade da norma e a decisão que tomar vale para aquele caso concreto pelo
que os juízes vão ter de o resolver de acordo com a decisão.
Contudo só vale para aquele caso concreto.

Pressuposto base para recorrer ao Tribunal Constitucional

CRP: Artigo 280º + LOTC: Artigos 70º, 72º e 80º


Elenco dos requisitos necessários de preencher para requerer a decisão do Tribunal
Constitucional

LOTC: Artigo 72º/2


Recorre-se para o Tribunal Constitucional de uma decisão de um juiz comum. Houve
previamente uma decisão, quem fica descontente ou o Ministério Público pode recorrer
para o tribunal superior, nomeadamente o Tribunal Constitucional. Este requerimento por
parte dos privados tem de ter realizado a tempo, ou seja, não podem aguardar que ocorra
todo o processo e só no fim da decisão irem recorrer para o Tribunal Constitucional.

• Necessidade de já ter sido suscitada a inconstitucionalidade a um juiz comum,


durante o processo a tempo, de este poder apreciar decidir sobre ela.
Exceção (decisões surpresa):
Pode se requere ao Tribunal Constitucional sem este requisito preenchido quando o
processo tenha decorrido e durante todo o tempo em termos objetivo nunca ficou a ideia
que o juiz da causa pudesse resolver o caso aplicando uma certa norma. Para as partes
que acompanharam o processo nunca se pensou que o juiz tivesse recorrido aquela
especifica norma ordinária.

• A norma fiscalizada tem de ser a ratio decidendi do caso concreto


Há situações em que se suscitar a inconstitucionalidade de uma norma e se pretende
recorre para o Tribunal Constitucional, mas o juiz comum considera que apesar da
inconstitucionalidade esta norma não invalida a decisão tomada, ou seja, caso não se
recorre-se e ela a decisão seria a mesma. Norma que não é a ratio decidendi daquele caso,
não é o fundamento de decisão.
Nestes casos não há nenhum interesse a que a questão vá para o Tribunal Constitucional,
porque o caso acabou por ser decidido com base noutras normas, o Tribunal considera
que não vale a pena fiscalizar normas que não vão ter interesse na resolução da norma.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 125


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Processos de recorrer ao Tribunal Constitucional

Da conjugação do artigo CRP: 280º com o artigo LOTC: 70º podem retirar-se algumas
conclusões que ajudam a esclarecer o regime de fiscalização concreta da
constitucionalidade (ou de legalidade) quanto ao regime de recursos:

O Juiz comum após requerida a fiscalização por uma parte independentemente do tempo
a que a norma está em vigor, da decisão de outros juízes sobre essa norma tem sempre
duas opções:

o Decisões de Recusa: “A norma é inconstitucional e por isso não a vou aplicar”


Tipo A dividido em 1 e 2

o Decisão de Aceitação: “A norma não é inconstitucional, pelo que a irei aplicar na


resolução do caso concreto” Tipo B dividido em 3 e 4)

As regras procedimentais do recurso ao Tribunal Constitucional desenvolvem-se de


forma diferente consoante a decisão do juiz comum considerar constitucional ou
inconstitucional a norma em avaliação.

Nos processos julgados em Tribunal, de acordo com as regras de processo, muitas vezes
à recurso de tribunais de primeira instância para tribunais superiores e estes realizam um
anova apreciação do caso.
Assim sendo quando nos referimos à natureza da decisão falamos da última tomada, não
do Tribunal de primeira instância. O que conta é a última decisão e essa última decisão
terá necessariamente uma decisão de recusa ou uma decisão de aplicação da norma.

Dentro de cada uma das possibilidades de decisão dos Tribunais Comuns temos duas sub-
hipoteses, pelo que no fundo temos quatro regimes distintos de recorrer.

A) Vamos analisar primeiro no caso dos juízes comuns considerarem a norma


inconstitucional e optarem por não a utilizar.
Esta decisão contém alguma gravidade pois a norma estava em vigor pelo que as pessoas
regiam a sua vida com base na premissa de tal norma gerando uma situação de grande
insegurança jurídica.
O tribunal de Tondela pode considerar inconstitucional mesmo quando todos os restantes
tribunais a estejam a aplicar. O que acontece é que um juíz comum, perante uma norma
aprovada por um órgão de soberania, promulgada pelo Presidente da República, aplicada
durante anos, diz que não a irá aplicar pois considera-a inconstitucional pelo que nunca
devia ter entrado em vigor.

A Constituição resolve isto da seguinte forma:


A norma em causa esta contida num ato verdadeiramente importante, como uma
convenção internacional, uma lei, um decreto-lei (regional) ou um decreto regulamentar?

Ou por sua vez é uma norma de menor relevância, consta de um despacho, de uma
portaria?

A resposta a estas questões vai determinar o processo a seguir.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 126


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

CRP: 280º/3
1)No caso de a norma constar num ato legislativo de maior importância à recurso para
Tribunal Constitucional mesmo que nenhuma das partes queria, o Ministério Publico é
obrigado a levar o caso a apreciação, tendo em vista ultrapassar a insegurança jurídica
que se gerou com a decisão do juiz.
Atos legislativos de maior importância: convenção internacional, ato legislativo,
decretos-leis ou decretos regulamentares.

2)No caso da norma contar numa ato legislativo de menor importância ninguém é
obrigado a requerer, pelo que se rege pelo principio do CRP: Artigo 280º/1 a)
Atos legislativos de menor importância: portarias, despachos, posturas municipais e
outras normas administrativas.
Recurso já não é obrigatório para o Ministério Publico, a parte afetada ou ministério
publico recorrem se quiserem pelo que, se nenhum deles recorrer, a questão nem sequer
chega ao TC.

A razão de ser desta distinção de regime é facilmente perceptível, estamos sempre perante
uma situação anómala, uma vez que há uma norma em vigor na ordem jurídica e há um
juiz que se recusa a aplicar por inconstitucionalidade, gera-se insegurança que requer que
se chame o Tribunal Constitucional.
Mas há uma diferença, que consiste na relevância jurídica e no peso dado aos diplomas,
no caos dos diplomas mais importantes o Ministério Publico é obrigado a recorrer.
Significa isso que vai ser o Tribunal Constitucional quem vai decidir a questão, mesmo
que nenhuma das partes recorra. Em termos práticos, o juiz comum recusou a aplicação
de uma norma em vigor, mas quem decide finalmente essa mesma questão, quem decide
se a norma é ou não inconstitucional, é o Tribunal Constitucional.
Já no segundo caso, sendo em principio a norma menos importante, apesar da insegurança
gerada, ela não é tao problemática como no primeiro caso, pelo que o recurso para o
Tribunal Constitucional fica na disponibilidade das partes e do Ministério Publico (que,
aqui, já não é obrigado a levar a questão ao Tribunal Constitucional);

B)Passando agora para a situação na qual o Juiz declare que a norma é constitucional
e aplica na resolução daquele caso concreto, consistindo numa decisão de aplicação, com
menor gravidade, pois estão a realizar o que é expectável (aplicar na resolução de caso as
normas em vigor).

CRP: Artigo 280º/1 b)


3)Neste plano de normalidade o regime de recurso é distinto, a não ser que estejamos
perante a situação em que o juiz aplica uma norma que anteriormente já tenha sido
julgada inconstitucional pelo Tribunal Constitucional em fiscalização concreta. Ou seja,
outro tribunal comum já recorreu esta norma ao Tribunal Constitucional que por sua vez
a tomou como inconstitucional, contudo como esta decisão apenas vale para o caso
concreto gera-se a dúvida entre os restantes juízes comuns sobre a possibilidade de
aplicabilidade daquela norma, gerando-se de novo uma insegurança jurídica.

CRP: Artigo 280º/5


Nestas situações o recurso é obrigatório por parte do Ministério Publico.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 127


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

CRP: Artigo 280º/4


4)No caso de se verificar a máxima normalidade, quando o juiz aplica uma norma em
vigor que nunca foi considerada inconstitucional.
Neste caso são maiores os obstáculos, requisitos, para se se possa requerer ao Tribunal
Constitucional, contudo a esmagadora maioria dos recursos se chegam ao tribunal
constitucional são relativos a este tipo de fiscalização concreta.
Tal acontece muitas das vezes apenas tendo em vista atrasar o processo. Quando, por
exemplo, o cliente necessita de pagar uma grande quantia de dinheiro o advogado sabendo
que vai perder a causa preocupa-se em preencher os requisitos (suscitando a
inconstitucionalidade de uma norma durante o processo, mesmo sando que tal norma é
constitucional) para posteriormente poder recorrer ao Tribunal Constitucional.
Jorge Reis Novais considera que não é para estes casos que o Tribunal Constitucional
deveria existir, contudo a falha no sistema permite-nos tomar estas ações.

Requisitos:

CRP: Artigo 280º/1 b)


É necessário já se ter sido suscitada no Tribunal Comum, durante o decurso do
julgamento, a fiscalização.
Excecionalmente o Tribunal Constitucional aceita que se possa recorrer ao Tribunal
Constitucional quando estejamos perante a aplicação de uma “norma surpresa” para
resolver o caso concreto.

CRP: Artigo 280º/4


Só a parte que suscitou o problema de constitucionalidade durante o processo é que pode
recorrer.

LOTC: Artigo 70º/2


Só se pode recorrer para o Tribunal Constitucional após esgotados todas as possibilidades
de recurso entre a hierarquia dos tribunais comuns.
Exemplo: Um caso a ser resolvido em primeira instância, suscitada a fiscalização o caso
é resolvido considerando-se a norma constitucional, não pode recorrer diretamente para
o Tribunal Constitucional, tem que esgotar os recursos para tribunais superiores comuns
previstos. O tribunal da relação considera a norma inconstitucional e diz que não se
poderia ter aplicado, aqui estamos perante uma decisão de recusa pelo que surge um novo
processo para recorrer ao tribunal constitucional, verifica-se qual a importância dos atos
em que se encontra a norma e prossegue-se.

Sintetizando:
Estamos perante uma decisão (a última) de aplicação de uma norma nunca antes julgada
inconstitucional. A aplicação dessa norma deve ser a razão para o caso ser decidido
daquela forma (ratio decidendi). A questão de constitucionalidade deve ter sido suscitada
durante o processo e a parte que referiu a constitucionalidade tem de ter esgotado todos
os recursos comuns.

A diferença do regime explica-se facilmente. O que se espera é que o Tribunal aplique


uma norma em vigor, pelo que a filtragem para o Tribunal Constitucional deverá ser
maior, de outro modo, o Tribunal Constitucional acabaria por resolver todos os processos.
Assim para se poder recorrer para o Tribunal Constitucional têm de estar esgotados os
recursos ordinários e, segundo, só pode recorrer a parte que tiver suscitado a
inconstitucionalidade durante o processo.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 128


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Já se a norma em causa foi anteriormente julgada inconstitucional (subtipo 3), surge uma
situação de insegurança motivada pelo facto de um juiz comum não seguir, aparentemente
a anterior orientação do Tribunal Constitucional que tinha anteriormente considerado
uma norma inconstitucional e, ainda assim, um juiz comum voltou a aplicá-la no
processo.
A insegurança assim gerada aconselha que a questão chegue novamente à apreciação do
Tribunal Constitucional, dado que, não obstante a sua anterior decisão de
inconstitucionalidade, um juiz comum decide continuar a aplicar a norma.

Efeitos jurídicos
LOTC: Artigo 80º

A decisão que o TC proferir em fiscalização da concreta faz caso julgado no processo e


aí se esgotam os efeitos da decisão. Assim, mesmo que o TC julgue a norma
inconstitucional, e qualquer que seja o fundamento da inconstitucionalidade, a decisão só
vale para o caso concreto em julgamento, pelo que a norma em causa permanece
plenamente em vigor.

Em fiscalização concreta, o TC é chamado a julgar a inconstitucionalidade da norma na


sua aplicação a um caso concreto e, consoante o sentido desse julgamento, se ele for
contrário à decisão que sobre a mesma questão tenha sido proferida pelo tribunal comum,
este fica obrigado a reformar a decisão anterior ou a obrigar reformar em conformidade
com o que tinha sido anteriormente decidido. Porém, a decisão do TC, qualquer que ela
seja, só faz caso julgado no respectivo processo, isto é, não afeta a subsistência e a
validade geral da norma na ordem jurídica.

Se o TC julgar uma norma inconstitucional, embora ela permaneça em vigor, qualquer


decisão judicial que a aplique será obrigatoriamente recorrida pelo Ministério Publico
para o TC. Em todo o caso, como não foi declarada a inconstitucionalidade com força
obrigatória geral, e até que o seja, permanecerá em vigor e a poder ser legitimamente
aplicada por outros juízes em outros processos e a ser observada pela Administração e
pelos particulares.

E, por ultimo, é importante reforçar que apesar do TC ter julgado uma norma
inconstitucional em fiscalização concreta, num processo, não significa nem nada garante,
que a decisão do TC sobre a inconstitucionalidade da norma se mantenha quando o TC
apreciar de novo a questão, em sede concreta ou abstracta.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 129


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Esquema síntese do processo de Fiscalização Concreta

No decorrer de um processo em tribunal ordinário, é suscitada, de forma incidental, a


questão de constitucionalidade (ou ilegalidade) de uma norma pelas partes ou
oficiosamente pelo tribunal (juiz). O Tribunal Comum avalia a norma e toma uma decisão
sobre aplicação ou recusa de aplicação da norma ao caso concreto, tal decisão suscita
diferentes processos.
Temos como pressupostos base para a recorrer ao Tribunal Constitucional:
• Ter sido suscitada a inconstitucionalidade a um juiz comum, durante o processo a
tempo, de este poder apreciar decidir sobre ela (não tem de ser na primeira
instância)
• A norma fiscalizada tem de ser a ratio decidendi do caso concreto

Natureza da decisão
(referimo-nos a última decisão tomada em caso de recurso)

Recusa Aplicação
CRP: 280º/1 a) CRP: 280º/1 b)

Qual o valor da norma? A norma alguma vez foi julgada inconstitucional?

Uma norma de Ato legislativo, Uma norma anteriormente


Convenção internacional ou julgada inconstitucional pelo TC
Decreto-regulamentar CRP: 280º/5 + LOTC: 72º/3
CRP: 280º/3 + LOTC: 72º/3 2ªparte (exceção:72º/4)
1ªparte (exceção:72º/4) Recurso obrigatória por parte do
Recurso obrigatória por parte do Ministério Público.
Ministério Público.

Uma norma nunca julgada


Uma norma de outro diploma inconstitucional pelo TC
Pode haver recurso das partes, o LOTC: 70º/1 b) e f)
Ministério Publico não tem As partes podem recorrer
obrigação de recorrer. preenchidos os seguintes
CRP: 280º/1 a) + LOTC: 72º/1 b) requisitos:
1) Pela parte que tenha requerido
a fiscalização no decorrer do
processo
CRP: 280º/4 + LOTC: 72º/2
2)Esgotados todos os recursos
ordinários
LOTC: 70º/2 e 4
3) No prazo de 10 dias após o fim
do processo
LOTC: 75º/1

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 130


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

MODELOS DE FISCALIZAÇÃO

Após a revolução e quando Portugal chegou à democracia, havia já dois modelos de


fiscalização da constitucionalidade bastantes estabilizados.

O modelo americano foi historicamente o primeiro e era, na altura, o mais solidamente


estabilizado. Assentava numa racionalidade jurídica inatacável, mas numa medida
substancial estava estreitamente ligado às características e natureza especifica de um
sistema de common law assente na força do precedente judicial.

Por sua vez, o mais recente criado modelo europeu, assentava na instituição de um órgão
exclusivamente responsável pela administração da justiça constitucional, a quem se
atribuía a garantia derradeira dos direitos fundamentais.

Enquanto que o modelo americano se desenvolve desde o século XIX pelos diferentes
estados da América latina e alguns poucos países europeus (entre os quais Portugal, sobre
a vigência da Constituição de 1911), o chamado modelo europeu desenvolve, sobretudo
a partir do seculo passado, uma enorme força junto dos novos Estados constitucionais que
integram as sucessivas vagas de democratização na Europa, África, Ásia e na América
Latina.

Modelo Americano15

A constituição passou a ser aplicada nos tribunais imediatamente após a sua criação como
norma jurídica. Contudo não detêm uma parte que atribua aos Tribunais o poder de
realizar a fiscalização ou que regule o processo da mesma. Não dizendo nada sobre isso
parece estranho como é que os juízes começaram a realizar a fiscalização, e não aplicando
normas em vigor em nome da constituição.
Neste modelo, todos os juízes, de todos os tribunais, são considerados juízes
constitucionais, no sentido de que conhecem e decidem questões de constitucionalidade.

O processo de fiscalização surgiu como uma tarefa normal dos juízes, que têm
competência em resolver casos de acordo com as leis em vigor. Para resolver um caso
concreto os juízes do Supremo Tribunal de Justiça viram-se perante uma situação
particular, pois podia aplicar não apenas uma norma ordinária, mas também uma norma
Constitucional que iam em sentido contrário quando à resolução do conflito.
A tarefa de resolução de conflito entre normas, sendo um ato jurídico, compete ao
Tribunal que resolverá a colisão seguindo critérios previstos, contudo não há apenas um
critério previsto: critério temporal, especialidade, hierarquia.
Havendo um conflito entre norma constitucional e norma ordinário os juízes aplicam a
norma superior, contudo para verificar se há um conflito e necessário que se confronte a
norma inferior com a norma constitucional e assim surge o juízo de fiscalização da
constitucionalidade das normas ordinárias.
Como é próprio da função judicial tal processo deve ser realizado por todos os juízes.

Em suma...
Quando tem uma questão jurídica para resolver e se confrontam com a aplicabilidade ao
caso de normas jurídicas opostas, eles têm uma decisão preliminar a tomar sobre qual a
norma que deve ser aplicada. E aí, todos os Estados de Direito têm normas ou critérios
15Jorge Reis Novais, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade, Avaliação critica, AAFDL Editora,
2019 2ª edição, páginas 64 a 66

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 131


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

jurídicos para a resolução do problema (por exemplo, norma posterior derroga norma
anterior ou norma especial prefere sobre norma geral).

Mas, entre esses critérios há também aquele segundo o qual norma superior ou
hierarquicamente superior prevalece sobre norma inferior.

Aquilo que acontece na relação entre norma jurídica constitucional e norma jurídica
infraconstitucional é essa relação de preferência, enquanto norma suprema de qualquer
Estado de Direito com Constituição em sentido formal, deve prevalecer sobre as normas
infraconstitucionais que eventualmente disponham contra ela ou tenham sido aprovadas
em infracção constitucional.

Assim, qualquer juiz, dentro dos parâmetros da função judicial, deve desaplicar a norma
ordinária inconstitucional, mas previamente, necessita de verificar se há desconformidade
da norma ordinária relativamente aos parâmetros constitucionais, ou seja, deve proceder
a uma fiscalização e decidir uma questão de constitucionalidade.

Todos os juízes comuns são igualmente juízes constitucionais, ou seja, necessitam de


realizar a fiscalização de uma norma para a aplicar na resolução de um caso concreto. Tal
sucede a título incidental a quando o julgamento de um caso concreto e não a título
principal, ou seja, questão de constitucionalidade surge como incidente no curso de um
processo tendente à resolução de uma lide e a fiscalização a que procede é uma
fiscalização concreta, nascida e orientada funcionalmente para a resolução de um caso
concreto

É uma fiscalização difusa, pois a decisão do Tribunal Comum está sujeita a recurso para
tribunal superiores e por fim para o Supremo Tribunal de Justiça. A última decisão
tomada sobre a inconstitucionalidade desta norma tem força obrigatória geral, pelo que,
além de se aplicar ao caso concreto é erradicada do ordenamento jurídico não podendo
voltar a ser aplicada. As questões que chegam ao Supremo Tribunal de Justiça são
filtradas ou pela competência discricionária de escolha ou por critérios materiais.

Apesar dos tribunais superiores e do Supremo Tribunal estarem só a decidir o recurso de


uma decisão de caso concreto, a posição que assumirem adquire força de precedente na
respectiva jurisdição, apesar de ser uma decisão tomada no caso concreto, dispõe de força
obrigatória geral e passa a ser seguida por todos os tribunais (na ausência de uma cultura
jurídica de reconhecimento do precedente por alguns países que adotaram este modelo,
foram instituídos outros mecanismos constitucionais que procuram alcançar efeitos
análogos, por exemplo, a súmula vinculante no Brasil).

Nestes termos, tornar-se-ia bastante recorrente uma questão de constitucionalidade


chegar ao Supremo Tribunal pelo que poderia resultar na disfuncionalidade de todo o
sistema.

Assim, a generalidade dos sistemas adotou mecanismos de selecção e filtragem de


questões de constitucionalidade que chegam à instância jurisdicional suprema.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 132


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Modelo Europeu16

Durante muito tempo praticamente até após a Segunda Guerra Mundial a constituição era
um poder político pelo que não era aplicada pelos Tribunais na resolução de casos
concretos, mas sim aplicada para organização do poder político. Não funcionava como
norma jurídica.

Detêm uma parte sobre a fiscalização, regulando o órgão competente e os diversos


processos.

A visão de separação de poderes que atribuísse a última palavra ao poder judicial foi
sempre rejeitada devido às conquistas realizadas com as revoluções liberais.
Considerava-se que a decisão estando atribuída aos juízes comuns geraria insegurança
jurídica, pelo que durante cerca de 150 anos não se realizou a fiscalização da
constitucionalidade. Contudo começou-se a desenvolver a possibilidade, no meio
académico, da criação de um órgão jurídico político para resolver exclusivamente estas
questões da constitucionalidade.

Após a segunda guerra mundial, quando a Europa tomou consciência dos arbítrios que
podiam ser realizados pelo parlamento começou a admitir e sentir a necessidade de criar
um órgão responsável por garantir os direitos e liberdades fundamentais que estão
estipulados nas Constituições.

Esta deixa de ser vista apenas como norma política e passar a ser considerada norma
jurídica suscetível de ser aplicada na resolução de casos concretos. Devido à rejeição do
modelo de governo de juízes que se encontrava na América surge a ideia de criar um
Tribunal constitucional.
Só muito tardiamente, entre as duas guerras, se desenvolveram, na Europa, sob a
influencia de Kelsen, alguma tímidas experiência de fiscalização da constitucionalidade
em torno da criação de um tribunal especializado situado à margem da ordem judicial
comum a quem cabia a administração da justiça constitucional.

O Tribunal Constitucional era, e é, responsável por garantir os direitos fundamentais e os


princípios materiais estruturantes das ordens de Estado de Direito, sendo que apenas a
este órgão compete tal função.
Neste sentido, quando juízes comuns se deparam com questões de constitucionalidade de
uma norma através do instituto do reenvio prejudicial leva a questão ao Tribunal
Constitucional que a decidirá com força obrigatória geral. Tal apreciação pode referir-se
a normas ou atos eventualmente inconstitucionais.

Os cidadãos quando considerem ter os seus direitos violados por ação ou omissão, após
o julgamento do seu caso concreto, podem recorrer ao Tribunal Constitucional desde que
preenchidos os requisitos, nomeadamente, apenas alguns direitos podem ser apreciados,
limites temporais para reação às violações e esgotamento dos recursos ordinários. Através
do recurso de amparo ou queixa constitucional.

Diferentemente do que ocorre no modelo americano, os juízes comuns, embora possam


conhecer das questões de constitucionalidade das normas ordinárias, não as decidem. Isto
16Jorge Reis Novais, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade, Avaliação critica, AAFDL Editora,
2019 2ª edição, páginas 66 a 69

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 133


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

é, se na resolução de um caso surge um problema relacionado com a duvidosa


constitucionalidade de uma norma ordinária, e o juiz da causa confirma a existência de
duvidas razoáveis sobre a sua conformidade constitucional, esse juiz suspende a instância
e remete a decisão da questão de constitucionalidade para o TC através do chamado
instituto do reenvio prejudicial.

Nessa altura, ao TC não cabe a apreciação ou decisão do caso concreto mas apenas a
decisão sobre a constitucionalidade da norma em causa que, sendo eventualmente
considerada inconstitucional, não só é consequentemente desaplicada do caso concreto
como é erradicada da ordem jurídica.

Por outro lado, a protecção dos direitos fundamentais contra quaisquer normas ou atos
violadores das garantias constitucionais dos cidadãos faz-se através dos institutos da
queixa constitucional ou do recurso de amparo, através dos quais os cidadãos, em geral
após esgotarem a via judicial comum, acendem directamente ao TC para garantia dos
direitos que consideram violados ou desconsiderados, por acção ou por omissão pelo
legislador, pela administração, pelos tribunais ou pelos outros particulares.

Porém, à semelhança do que acontece no modelo americano, também no modelo europeu


se procura assegurar a viabilidade de funcionamento eficaz do sistema e se procuram
prevenir eventuais bloqueios de funcionamento através do estabelecimento de alguns
filtros de acesso direto ao TC (reserva da possibilidade de acesso só para defesa de alguns
direitos fundamentais, instituição de limites temporais para a reacção contra eventuais
violações, o esgotamento dos recursos ordinários).

Quadro de comparação do processo de fiscalização concreta nos diferentes modelos:

Americano Europeu Português


Fiscalização de normas e Fiscalização de normas e Apenas fiscalização de
atos atos normas
Tratam-se as questões de Os juízes comuns não Todos os juízes julgam a
constitucionalidade que decidem questões de constitucionalidade de
surgem incidentalmente constitucionalidade normas, mas há recurso
como qualquer outra Todas as questões é o TC para o TC
questão Reenvio prejudicial, A decisão do TC não tem
Todos os juízes decidem quando recurso realizado força obrigatória geral
O recurso é o ordinário de durante o processo pelo Poucos requisitos para se
tribunais inferiores para juiz comum chegar ao TC, pois
superiores Recurso de amparo, qualquer
STJ tem decisão quando após o processo o inconstitucionalidade pode
vinculativa, efeitos cidadão sinta os seus ser requerida a qualquer
retroativos direitos violados momento pelo particular

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 134


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

REGIME PORTUGUÊS DE FISCALIZAÇÃO

Na opinião do Regente Jorge Reis Novais, as singularidades do sistema não acrescentam


quaisquer melhorias sensíveis relativamente ao que é proporcionado por qualquer
daqueles outros modelos e há desvantagens sérias e significativas que podem ser
imputadas às opções próprias e exclusivas do sistema português.

Origem17

Parte da doutrina entende que o sistema português apresenta características bastante


positivas por ser o resultado de uma confluência natural de duas ordens distintas, mas
convergentes:
• Manutenção do legado histórico do constitucionalismo português (manutenção da
conservação da fiscalização judicial difusa oriunda do modelo americano)
• Modernização introduzida pela inserção europeia da Constituição portuguesa (de
onde resultaria a criação do TC responsável pela fiscalização concentrada).
Dessa junção teria resultado a constitucionalidade que combinaria, de forma criativa,
tradição e modernidade.

Na opinião do Regente Jorge Reis Novais, a construção do sistema português tem uma
visão menos idílica, a dita singularidade do sistema português é explicada pelos acidentes
próprios do tempo conturbado em que a Constituição de 1976 foi preparada e aprovada.

Os traços essenciais do sistema de fiscalização têm as suas origens claramente marcadas


pelo conteúdo da segunda Plataforma de Acordo Constitucional (Fevereiro de 1976),
celebrada entre MFA e partidos.

Inicialmente, tudo apontava para a adoção do modelo europeu. Esse era o modelo
apontado pela maioria dos partidos nos diferentes projectos de constituição e o modelo
defendido pela maioria da doutrina, como foi igualmente esse o sentido da proposta que
o Conselho da Revolução apresentou aos partidos políticos.

Com efeito, aí se previa, em domínio de fiscalização concreta, a competência do Conselho


de Revolução para julgar as questões de constitucionalidade que, suscitadas nos tribunais
por via incidental ou principal, lhe chegariam através do reenvio prejudicial depois de
serem juridicamente preparadas pela Comissão Constitucional, a quem caberia a
elaboração dos projectos de acórdão.

No fundo, extintos o Conselho de Revolução e a Comissão Constitucional e substituídos


nestas funções por um Tribunal Constitucional teríamos aqui a instituição típica do
chamado reenvio prejudicial comum no modelo europeu.

Por outro lado, o TC não ficava limitado exclusivamente a fiscalização de normas, uma
vez que o recurso respeitava a quaisquer atos, pelo que, de algum modo, se configurava
embrionariamente o que poderia ser um posterior desenvolvimento de um recurso de
amparo.

17Jorge Reis Novais, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade, Avaliação critica, AAFDL Editora,
2019 2ª edição, páginas 69 a 75

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 135


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Não foi, no entanto, o que viria a ocorrer. De forma surpreendente (dada a convergência
de opiniões teóricas), houve, da parte do PPD, uma oposição a esta configuração, não por
razoes de opção estratégica, não por uma diferente visão do que deveria ser a justiça
constitucional, mas sustentada simplesmente no receio conjuntural de uma intervenção
excessiva do Conselho da Revolução neste domínio.

Com base nesse receio, a proposta do PPD orientou-se para a entrega das questões de
constitucionalidade aos próprios juízes dos tribunais comuns, ainda que com recurso para
um tribunal especial, mas só nos casos em que os juízes recusassem a aplicação de normas
em vigor com fundamento em inconstitucionalidade.

Acabou por ser este modelo adotado e que subsiste até hoje, substituindo-se apenas o
referido tribunal especial por uma Comissão Constitucional a que se seguiria,
naturalmente o TC (1982).

A base de adoção deste sistema foi simplesmente o receio imediatista e conjuntural de


uma intervenção excessiva dos militares por parte de um partido político que deu origem
ao sistema actual.

O conselho de revolução desapareceu, os militares retiraram-se, mas ficou um sistema de


fiscalização essencialmente inspirado e inventado pelo temor que a presença dos militares
provocara na época.

E foi dessa forma que se chegou no nosso sistema de fiscalização concreta a três
características principais:
• Os tribunais comuns, e só eles, decidem a título definitivo todas as questões de
eventual inconstitucionalidade de atos, incluindo todas as eventuais lesões aos
direitos fundamentais que resultem de acções, de decisões ou de omissões.
• Os tribunais comuns decidem aparentemente também as questões de
constitucionalidade respeitante a normas, mas só aparentemente porque a esse
decisão se segue praticamente sempre o recurso para o TC, por vezes mesmo
obrigatoriamente.
• O TC decide da inconstitucionalidade de normas, mas só de normas, ficando
absolutamente afastado da decisão de eventual inconstitucionalidade/violações
aos direitos fundamentais não resultantes de normas.

Em suma...
Como já desde 1911 se tinha adotado o sistema americano o legislador quis manter isso,
mas como se criaram os Tribunal Constitucional juntou-se essa nova ideia, com o objetivo
de juntar o melhor dos dois mundos. Contudo não foi assim que tal aconteceu, esta é uma
versão romanceada. Quando as questões, antes da aprovação da constituição de 1976,
foram discutidas o conselho da revolução tinha a última palavra de fiscalização, pelo que
consideravam que se devia adotar o modelo europeu. Contudo alguns partidos (PPV-
PSD) tiveram receio que como ainda não havia o Tribunal Constitucional tal método fosse
dar um poder excessivo ao conselho da revolução, pelo que surgiu uma contraproposta
com o modelo que atualmente verificamos. Assim o sistema surgiu de modo a retirar o
conselho da revolução das decisões, ficando estas como responsabilidade da comissão de
constitucionalidade e após 1982 do Tribunal Constitucional.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 136


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Caracteristicas Relevantes

Um balanço das características da nossa fiscalização concreta é necessário pois é um


sistema que não é comum a outros países. As outras modalidades de fiscalização são
semelhantes a muitos outros países. Veremos que Portugal tem muitas coisas especiais e
únicas em relação aos restantes países, pelo que é discutível quem esta certo e quem está
errado.

A fiscalização concreta é o único meio que os privados têm de defender os seus direitos
junto do Tribunal Constitucional. Nas outras fiscalizações apenas o podem fazer através
de requerimento às entidades que tem essa competência.
Contudo esta característica apenas distingue este modelo de fiscalização dos restantes
modelos nacionais.

Vamos em seguida expor as características que tornam este modelo de fiscalização


singular no mundo:

o Tribunal constitucional só aprecia a constitucionalidade de normas (não de


atos)18
O recurso de inconstitucionalidade para o TC não tem a ver com a decisão judicial, não
respeita a uma eventual violação de direitos constitucionais dos particulares ou da
Constituição por parte da sentença, mas incide exclusivamente sobre a eventual
inconstitucionalidade de normas em vigor: ou da norma ordinária cuja aplicação foi
recusada com fundamento em inconstitucionalidade ou da que foi aplicada apesar de se
ter suscitado a respectiva inconstitucionalidade durante o processo.

Consiste apenas na fiscalização de normas, respeita só a inconstitucionalidade de normas,


não de atos. Também é assim nas outras fiscalizações do nosso sistema, contudo é
especial pois nos restantes sistemas não é assim.

Nos outros sistemas, nomeadamente europeu e americano, caso a administração (polícia,


magistrado judicial) ofenda os nossos direitos através de um ato caso consideremos que
aquele ato contrarie a constituição podemos recorrer ao Tribunal Constitucional.

A constituição pode ser violada em muitas instâncias, não só por uma norma de aplicação
por parte do legislador, contudo no nosso país nenhum desses atos pode ser sujeito à
fiscalização de constitucionalidade por parte do Tribunal Constitucional.
Os particulares só podem proteger os seus interesses e direitos juntos do TC relativamente
a normas. Se a sua lesão de direitos decorrer, não da aplicação de normas, mas de atos,
de decisões ou de sentenças aí já não pode haver recurso para o TC independentemente
dos prejuízos sofridos e de uma eventual inconstitucionalidade.

Só uma parte dos atos potencialmente inconstitucionais, atos normativos, podem ser
apreciados pelo Tribunal Constitucional, deixando uma grande área de eventuais
inconstitucionalidades fora da avaliação do Tribunal Constitucional.

O que chega ao TC e vai ser objeto de juízo de constitucionalidade não é o problema da


eventual lesão de um interesse ou de um direito, por mais fundamentais que estes sejam
mas apenas e exclusivamente a questão da eventual inconstitucionalidade das normas.

18Jorge Reis Novais, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade, Avaliação critica, AAFDL Editora,
2019 2ª edição, páginas 51 a 54

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 137


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Por outro lado, em fiscalização concreta também não pode ser invocada a
inconstitucionalidade pela omissão de normas.
A omissão legislativa pode eventualmente ser invocada no plano da fiscalização abstrata
mas não no plano da fiscalização concreta da constitucionalidade. Esta incide sobre
normas, nunca sobre ausência ou falta delas.

Este é um aspeto que distingue o modelo de fiscalização dos tribunais portugueses dos
restantes tribunais europeus.

Quando estamos perante uma violação da constituição através de um ato praticado ou


omitido pela administração ou um particular este nunca poderá ser apreciado pelo
Tribunal Constitucional, que teoricamente foi criado para decidir todas as questões de
inconstitucionalidade.

Exemplo de Situação estranha que pode ocorrer devido a esta característica: Um Tribunal
condena alguém à pena de morte, estamos perante uma gravíssima

o Os tribunais comuns decidem questões de constitucionalidade de normas,


mas com recurso para o Tribunal Constitucional19
Todos os Tribunais e não apenas o Tribunal Constitucional decidem questões de
constitucionalidade, pois não só conhecem os problemas como os decidem.
Contudo permite que de todas estas decisões possam haver recurso para o Tribunal
Constitucional.

Tal característica é igualmente única no nosso pais e não podemos encontrar no sistema
Americano ou Europeu.

• Modelo Americano, todos os tribunais e só eles fazem a fiscalização da


constitucionalidade;
• Modelo Europeu, só o Tribunal Constitucional, e só ele, faz fiscalização da
constitucionalidade;
No sistema português podemos encontrar ambas as situações, ou seja, todos os tribunais
comuns têm o dever de fiscalizar as normas que aplicam na resolução de um caso
concreto, contudo da sua decisão há sempre a possibilidade de recorrer para o Tribunal
Constitucional.

As decisões que tomam sobre normas não são definitivas, sendo a última palavra é do
Tribunal Constitucional. Contudo os juízes comuns tomam decisões definitivas sobre a
constitucionalidade ou inconstitucionalidade de atos.
Exemplo: Julgando um polícia que torturou um preso para obter informações.

Singularidades decorrentes desta característica:


1) Em Portugal todos os tribunais decidem questões de constitucionalidade, porém,
quando está em causa a inconstitucionalidades dessas decisões há a possibilidade de
recorrer para o Tribunal Constitucional sempre que a decisão do juiz comum se tenha
traduzido em aplicação de normas com fundamento em inconstitucionalidade.

19Jorge Reis Novais, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade, Avaliação critica, AAFDL Editora,
2019 2ª edição, páginas 54 a 57

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 138


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Em algumas situações o recurso é, até mesmo, obrigatório (o Ministério Publico pode ser
obrigado a recorrer, mesmo que as partes não o façam), mas, em todas as outras, se a parte
interessada quiser recorrer pode sempre fazê-lo desde que acautele devidamente essa
possibilidade durante o processo, poderá sempre haver recurso desde que a parte
interessada suscite atempadamente uma questão de constitucionalidade e esgote
antecipadamente os recursos para os tribunais superiores se a eles houver lugar. . Portanto,
ao mesmo tempo o sistema português dá aos juízes comuns a possibilidade e
obrigatoriedade de decidirem questões de constitucionalidade de normas e garantir
simultaneamente a existência de recurso dessas decisões para o TC. Não obstante permitir
que todos os tribunais decidam, o nosso sistema assegura ao TC a decisão definitiva.

2)Tratando-se da eventual inconstitucionalidade de atos ou de decisões ou, ainda,


derivada da omissão de normas, o TC em caso algum poderá decidir essas questões, o
que significa que quaisquer decisões dos tribunais comuns sobre essas matérias de
constitucionalidade são definitivas, no sentido de ficarem excluídas de posterior controlo
por parte do TC. O TC fica completamente arredado da administração da justiça
constitucional nesses domínios; a competência é exclusiva dos tribunais comuns.;

3)Mesmo que o TC decida que a norma é inconstitucional, ela não pode, é certo, aplicar-
se no caso em julgamento, mas permanece em vigor na ordem jurídica, ou seja, pode
aplicar-se em todos os outros casos, no mesmo ou outros tribunais. No mesmo sentido,
se o TC considera que não há qualquer problema de constitucionalidade com a norma,
mesmo assim, noutros processos, o mesmo juiz ou outros juízes podem continuar a
recusar-se a aplicar a norma com fundamento na sua pretensa inconstitucionalidade.

o Qualquer tipo de inconstitucionalidade de normas pode a todo o momento


ser sujeita à fiscalização do Tribunal Constitucional20
Através do recurso, os particulares têm a possibilidade de fazer chegar e de verem
decididas pelo Tribunal Constitucional quaisquer questões referentes à
constitucionalidade e a todo o tempo, desde que se trate de questões referentes à
constitucionalidade de normas e sejam suscitadas durante um processo judicial em curso,
em primeira instância ou em recurso.

Pode ser suscitada qualquer tipo e natureza de inconstitucionalidade. Podemos ter uma
inconstitucionalidade porque se contraria uma norma de fundo Constitucional, ou pela
forma ou competência não ter sido respeitada. Podemos recorrer ao Tribunal
Constitucional perante qualquer tipo de inconstitucionalidade. A possibilidade de recorrer
e de ver a questão decidida pelo TC é independente da existência de quaisquer prejuízos
ou lesão relevantes da parte dos interessados, é independente do tipo de
inconstitucionalidade alegada, é independente do momento em que a eventual
inconstitucionalidade tiver sido cometida e é independente da relevância ou da
importância constitucional da questão.

Exemplo de Situação estranha que pode ocorrer devido a esta característica: Um


particular suscitar inconstitucionalidade pois uma norma que entrou em vigor em 1980
foi aprovada, mas os sindicatos que tinham o direito de ser ouvidos não foram, pelo que
estamos perante uma inconstitucionalidade formal. Esta inconstitucionalidade pode ter

20Jorge Reis Novais, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade, Avaliação critica, AAFDL Editora,
2019 2ª edição, páginas 57 a 59

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 139


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

ocorrido, contudo nestes 40 anos os sindicatos já foram ouvidos devido à aplicação da


norma em casos concretos ao longo dos anos.

Nos outros sistemas não temos isto, pelo que chegar ao tribunal Constitucional ou ao
Supremo Tribunal não é fácil, é preciso que haja uma inconstitucionalidade significativa.
No nosso sistema não temos requisitos severos para chegar ao Tribunal Constitucional,
pelo que os advogados tendem a usar este recurso quando tenham interesse em prolongar
o processo, sendo a fiscalização utilizada como instância dilatória.

o A decisão do Tribunal Constitucional não erradica a norma julgada


inconstitucional nem exclui a sua aplicabilidade noutros casos21
O Tribunal Constitucional decide em última análise podendo considerá-la
inconstitucional e ela continua em vigor, sendo apenas uma decisão para aquele caso
concreto.

Ou seja, a norma não pode ser aplicada naquele caso, mas, logo a seguir, no mesmo ou
noutros tribunais, pode continuar a ser aplicada, tudo depende do juízo, expresso ou
implícito, de constitucionalidade que sobre essa norma faça o juiz da causa.

O facto da decisão do Tribunal Constitucional não ser vinculativa, ou seja, só se aplicar


naquele caso concreto gera duas situações anómalas:
1) Tribunal Constitucional considera uma norma inconstitucional, mas esta pode vir a ser
aplicada por um juiz comum em qualquer outro caso
2) Tribunal Constitucional considera uma norma constitucional, contudo um juiz comum
pode recursar-se a aplicá-la considerando-a inconstitucional
Ambas estas situações geram grande insegurança jurídica para os cidadãos que não sabem
qual a posição que o juiz irá seguir.

Como é que havendo um órgão criado para fiscalizar a constitucionalidade de normas,


havendo possibilidade de recorrer a esse órgão quando esta toma uma decisão de
inconstitucionalidade nada aconteça na ordem jurídica, continuando a norma em vigor e
podendo ser aplicada?
O normal seria que quando a norma fosse julgada inconstitucional a decisão tivesse
efeitos não apenas naquele caso concreto, mas em toda a ordem jurídica. É isto que
acontece nos outros países.

No sistema Europeu quando o Tribunal Constitucional julga uma norma inconstitucional


esta é erradicada do ordenamento jurídico.
No caso do sistema Americano as decisões do Supremo Tribunal, devido à
obrigatoriedade dos tribunais inferiores seguirem as decisões dos tribunais superiores,
quando considere a norma inconstitucional esta é vinculativa para os demais tribunais.

Há quem defenda que (CRP: Artigo 281º/3) o facto de o Tribunal Constitucional poder
chamar a fiscalização sucessiva uma norma por este julgada três vezes inconstitucional
em sede de fiscalização concreta, tendo em vista erradicar a norma do ordenamento
jurídico, resolve o problema.
Contudo neste caso para que a norma seja erradicada temos que aguardar que esta seja
julgada três vezes inconstitucional num caso concreto (o que pode demorar) e ainda

21Jorge Reis Novais, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade, Avaliação critica, AAFDL Editora,
2019 2ª edição, páginas 59 a 63

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 140


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

esperar que os juízes do Tribunal Constitucional tenham a iniciativa de a fiscalizar em


sede sucessiva, além disso nada nos garante que quando fiscalizada em sede sucessiva o
Tribunal a vá julgar inconstitucional.
Este processo gera uma enorme insegurança jurídica.

Exemplo de Situação estranha que pode ocorrer devido a esta característica: Um


regulamento referente à PSP definia que quando um agente fosse acusado da prática de
um crime com certa gravidade deveria ser suspenso da atividade com quebra do salário.
Esta norma foi considerada inconstitucional num processo em sede de fiscalização
concreta, devido a ser uma infração ao princípio de presunção de inocência. Como não
foi erradicada do ordenamento jurídico veio a ser aplicada em outros processos, pelo que
chegou por mais quatros vezes ao Tribunal Constitucional, e em todas estas foi julgada
inconstitucional.
Assim, num período relativamente curto temos 5 julgamentos de inconstitucionalidade
da norma por parte do Tribunal Constitucional, pelo que alguns juízes a aplicavam e
outros não, gerando desigualdade. Esta insegurança jurídica só poderia ser resolvida caso
alguém no Tribunal Constitucional desencadeassem o processo de fiscalização sucessiva
abstrata, o que acabou por acontecer em 2017. Em fiscalização sucessiva abstrata o
Tribunal Constitucional declarou a norma constitucional, pois nada vincula o tribunal a
decidir de acordo com as decisões que anteriormente tomou em sede concreta.

A raiz dos males: a questão da última palavra22

Se estamos a falar de questões de constitucionalidade a última palavra, sendo que foi


criado um órgão específico para fiscalizar estas questões, deveria pertencer a este, ao
Tribunal Constitucional, encarregado de fazer a justiça constitucional com força
normativa.

É isto que encontramos no modelo Americano com o Supremo Tribunal e no Europeu


com o Tribunal Constitucional.

Em Portugal não é assim, pelo que nem sempre o Tribunal Constitucional tem a última
palavra sobre questões de constitucionalidade sobre direitos fundamentais.
Isto coloca em causa decisivamente, segundo o Regente Jorge Reis Novais o nosso
sistema de fiscalização.

O Tribunal Constitucional tem a última palavra quando está em causa a


constitucionalidade ou inconstitucionalidade de normas jurídicas. Se o que está em causa
é saber se aquela norma viola ou não os direitos fundamentais consagrados na
constituição a última palavra, em todos os tipos de fiscalização, é do Tribunal
Constitucional. Neste caso o nosso sistema é semelhante aos restantes modelos.

O nosso sistema distingue-se dos restantes quando não estamos perante normas, mas sim
atos de outra natureza. Um ato jurídico de um órgão administrativo, polícia, funcionário
administrativo, diretor da repartição das finanças tal como qualquer ato pode violar a
Constituição. Tal ato pode ainda surgiu entre particulares ou por parte de magistrados.

Não está em causa a inconstitucionalidade de uma norma, mas sim de um ato praticado
por um funcionário.
22Jorge Reis Novais, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade, Avaliação critica, AAFDL Editora,
2019 2ª edição, páginas 75 a 81

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 141


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Nestes casos a última palavra não é do Tribunal Constitucional, pois apenas é possível
recurso de normas (aplicadas ou não).

Exemplos: Polícia tortura alguém para extrair uma confissão.


Sanção atribuída pelo juiz excessiva face às circunstâncias do caso.
Difamação entre particulares.

Segundo o Regente Jorge Reis Novais tal isto é incompreensível e não compreende como
é que não foi alterado ainda nem corrigido.

Exemplo Académico: Um juiz condena uma pessoa à morte e havendo recursos para os
tribunais superiores mantinham a condenação. Se tal acontecesse seria uma grave
inconstitucionalidade (CRP: 24º/2), contudo em Portugal não se pode recorrer ao Tribunal
Constitucional. Não há uma norma inconstitucional, mas sim um ato.

Em contrapartida situações de uma norma em vigor à 40 anos, com matéria conforme a


constituição, contudo houve um problema interno que gerou uma inconstitucionalidade
formal e estas situações que na prática não irão afetar a vida jurídica e o julgamentos dos
casos podemos recorrer ao Tribunal Constitucional.

Uma questão decisiva de inconstitucionalidade de Direitos Fundamenais não pode ser


recorrida ao Tribunal Constitucional, contudo uma mera norma com
inconstitucionalidade formal pode.

Mas se o Tribunal Constitucional não tem a última palavra quem tem? Não há nenhum
outro órgão criado com o intuito de fiscalizar a constitucionalidade.

Se num conflito entre particulares for violado um direito fundamental a questão vai a
Tribunal e é julgada, quem tem a última palavra sobre esta questão é o Supremo Tribunal
de Justiça, devido à possibilidade de recurso. Assim é este que vai decidir a questão de
inconstitucionalidade de um ato que violou um Direito Fundamental.

Perante o conflito entre o Estado e um particular a decisão já não é do Supremo Tribunal


de Justiça, mas sim do Supremo Tribunal Administrativo.

Em nenhum dos casos há a possibilidade de recorrer para o Tribunal Constitucional, pois


estamos perante um ato possivelmente inconstitucional e não uma norma. Isto é
incompreensível e inadequado segundo o Regente Jorge Reis Novais.

Quem pode ter a última palavra sobre a inconstitucionalidade jurídica?

o Atos
Supremo Tribunal de Justiça (particulares)
Supremo Tribunal Administrativo (particular vs Estado)

o Normas
Tribunal Constitucional
Todos estes podem ter uma posição diferente quanto à questão de inconstitucionalidade
e todos estes podem realizar decisões definitivas.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 142


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Como pode isto funcionar bem? Como podemos ter segurança jurídica com tanta
possibilidade de diferentes decisões.

Com a criação do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, que surge num tratado
Europeu, pelo que todos os estados que a ratificaram ficam obrigados a cumprir os
direitos lá estipulados, surge a possibilidade de recorrer a este uma decisão sobre Direitos
Fundamentais.

Assim um caso concreto decidido no Supremo Tribunal de Justiça ou Supremo Tribunal


Administrativo não pode recorrer para o Tribunal Constitucional, contudo pode recorrer
ao Tribunal Europeu.

Tal possibilidade de recurso faz com que um cidadão português que vê o seu direito
violado na resolução de um caso concreto por um Tribunal português não possa recorrer
ao Tribunal português responsável pela fiscalização da constitucionalidade e tenha que se
dirigir ao Tribunal Europeu para zelar pelo seu direito.
E caso o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos dê razão ao cidadão, considerando que
o seu direito foi violado condena o Estado português a pagar uma indeminização por não
ter zelado e inclusive ter violado o direito do cidadão.

Regente Jorge Reis Novais considera que devia o Tribunal Constitucional ter a
possibilidade de se poder pronunciar nestas questões.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 143


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

ANÁLISE CRÍTICA DO SISTEMA DE FISCALIZAÇÃO

Apreciação critica do nosso sistema de fiscalização, contudo referimo-nos quase sempre


à fiscalização concreta pois é nesta modalidade que residem as maiores diferentes quanto
aos restantes modelos.
A adoção do sistema de fiscalização, ou seja, a atribuição a um órgão não eleito a
competência de anular as decisões dos órgãos políticos com legitimidade democrática é
dificilmente compreensível numa logica de um Estado Democrático. Podemos observar
aqui uma pressão perante as regras base da Democracia pois temos um órgão a colocar
em causa as decisões dos órgãos eleitos, que governam por maioria. Há sempre uma
grande discussão devido a esta dificuldade contra maioritária.

Num Estado de Direito para além da importância da regra da maioria temos o objetivo de
proteger os direitos fundamentais das pessoas incluindo contra as decisões da maioria. Os
direitos são garantias constitucionais que os cidadãos podem opor aos órgãos eleitos, às
maiorias democráticas. Tal justifica a supressão da regra da maioria com a criação de um
Tribunal responsável por fiscalizar os atos de órgãos legitimamente eleitos. Assim, se o
objetivo de um sistema de fiscalização é garantir os direitos fundamentais este será o
critério decisivo de avaliação dos sistemas. Pois se o sistema de fiscalização suprime as
regras democráticas tendo em vista proteger os direitos fundamentais é bom que o faça
de forma efetiva. Caso tal não aconteça estamos a diminuir o alcance de governação da
maioria sem atingir o fim que o justifica. Tudo isto seria relativamente simples de
entender, pois os Tribunais vão garantir os direitos fundamentais e, portanto, no fundo o
que têm que fazer é recorrer às normas constitucionais e ver se os atos contrariam ou não
os atos fundamentais. Estamos perante uma típica função dos tribunais, pelo que se estes
completarem livremente a sua função não há dificuldades pois estamos a assegurar a
supremacia das normas constitucionais perante as ordinárias. Porém não é tão simples,
pois basta observar as normas constitucionais que tutelam os direitos fundamentais para
perceber que aquilo que a Constituição diz sobre o conteúdo dos direitos fundamentais é
restritos (pouco). Normas como todos tem direito à vida, ou a vida humana é inviolável,
que surgem em todas as constituições, são preceitos vagos e devido a tal encontramos em
todos os Estados Democráticos questões como, a legalização da eutanásia ou do aborto.
Pois a Constituição não dá uma resposta imediata aos problemas fundamentais, deixa isso
para a contribuição da doutrina, da jurisprudência, gerando querelas constituições. Assim
a decisão destas questões vai ser tomada para valer pelo Tribunal Constitucional. Se são
quem tem a palavra decisiva quando às decisões sobre os direitos fundamentais,
questionamo-nos quem deve nomear os juízes.

Preceitos como “eu caso algum existira pena de morte” impede que esta questão seja
debatida em discussões políticas ou que a decisão seja tomada pelos juízes constitucionais
pois a Constituição deixou claro que a pena de morte em caso algum será a sentença
possível. Mas à aspetos de direitos fundamentais onde não encontramos esta
determinação constitucional por parte do legislador, e encontrámos normas muito gerias.
Tais normas podem ser positivas para o ordenamento jurídico pois permitem uma
evolução que surge naturalmente com as mutações ideológicas e sociais, responde à
adaptação da realidade.

Quando fazemos a avaliação critica podemos dizer que essencialmente o que está em
causa é a avaliação da forma como se protegem os direitos fundamentais dos cidadãos.
Assim o critério de avaliação e comparação de sistemas de fiscalização reside na
capacidade de estes protegerem os direitos fundamentais dos cidadãos. É melhor ou pior,
tem deficiências ou não, consoante assegurar e de que forma os direitos fundamentais.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 144


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

INSUFICIENTE PROTEÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

Neste sentido, tendo em vista garantir a proteção dos direitos fundamentais, o nosso
sistema de fiscalização é muito deficitário. Isto não é uma opinião unanima, nem da
generalidade, é a defendida pelo Regente Jorge Reis Novais.

Ausência de proteção no domínio das intervenções restritivas23

A raiz deste défice é o facto de apenas ser controlada a fiscalização de normas, ao


contrário do que acontece nos outros países.

Transpondo isto para o plano do Direitos Fundamentais, no fundo o nosso sistema


funciona com base na ideia de que as ameaças em torno dos Direitos Fundamentais dos
cidadãos proveem exclusivamente do legislador, da atuação normativa.

Pelo que só garante a proteção dos direitos contra normas.


Neste domínio temos uma proteção efetiva, pois tudo o que respeita normas o nosso
sistema garante uma proteção total. Podemos dizer até superior aos restantes sistemas,
que detêm requisitos mais difíceis de preencher para que se chegue com uma norma ao
Tribunal máximo responsável pela fiscalização. No nosso caso, como já vimos estes
requisitos não são tão difíceis de preencher, pelo que temos uma proteção efetiva quanto
a normas.

Contudo num Estado de Direito Democrático o principal risco não é a atuação do


legislador, não é a elaboração das leis que surge como propicia a violar os direitos dos
cidadãos, pois antes de entrar em vigor passa por diversos controlos elaborados por
diversos órgãos.
Razões pelas quais uma norma inconstitucional por violar os Direitos fundamentais não
entra frequentemente em vigor:
• Discussão pública e objeções: debate democrático-constitucionalista na arena
política, na imprensa e na opinião pública
• Atuação devida e atenta do Presidente da República, ao vetar ou enviar para o
Tribunal Constitucional (fiscalização preventiva)
• Possibilidade de fiscalização em sede sucessiva
• Reconhecimento ao legislador de uma ampla margem de decisão dentro das
molduras amplas constantes da Constituição
• Carácter cautelosamente genérico, normas com conceitos abertos que delimitam
apenas as margens orientadoras
É de facto possível que uma norma inconstitucional entre em vigor, contudo não é comum
pois a quando a apresentação da proposta ou projeto de lei na Assembleia a lei que possa
ser controversa é discutida entre os deputados, os jornais pronunciam-se sobre o assunto
e quando o Presidente está consciente da querela constitucional que a norma gerou, e tem
isso em consideração na decisão que toma.

O maior risco vem da aplicação das normas, surge em situações do dia a dia em que
entidades em contacto com a comunidade tem de tomar decisões para o caso concreto. É
nas situações de relacionamento com a administração (magistrado, órgão policiais etc)
que tende a ocorrer violação dos Direitos Fundamentais.

23Jorge Reis Novais, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade, Avaliação critica, AAFDL Editora,
2019 2ª edição, páginas 85 a 95

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 145


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Uma única norma vai ser aplicada ao longo da sua existência milhares de vezes pelo que
a probabilidade de ser aplicada inconstitucionalmente é grande.

Em suma, num Estado de Direito Democrático o maior risco de violação de direitos dos
cidadãos é na relação com a administração e não na elaboração da lei.

Contra lesões o cidadão tem a possibilidade de ir para os Tribunais, pois estamos perante
um verdadeiro Estado de Direito. Contudo caso alegue que lhe foi lesado um Direito
Fundamental, através de uma prática inconstitucional por parte da administração, e o
Tribunal não lhe dê razão o cidadão não pode ir para o tribunal Constitucional invocando
esta violação.
Para o cidadão poder recorrer ao Tribunal Constitucional tem de alegar que na resolução
do caso foi ou não foi aplicada uma norma que suscita duvidas de constitucionalidade.

Contudo como vimos a possibilidade de uma norma inconstitucional estar em vigor é


menor do que a situação em que uma norma constitucional é equivocamente aplicada por
parte de um magistrado ou de outra entidade administrativa, gerando uma situação de
violação dos direitos dos cidadãos por ação.
Exemplo: Aplicando uma sanção excessiva
Discriminação de um cidadão

Em suma, no âmbito dos Direitos Fundamentais, quanto a normas restritivas a proteção é


efetiva, pois há a possibilidade de recorrer ao Tribunal Constitucional (órgão criado
fiscalizar a constitucionalidade).
Quanto a atos, intervenções pontuais e concretas restritivas, devido à impossibilidade
jurídica de colocar ao Tribunal Constitucional a lesão de direitos através de decisões,
estamos perante uma proteção defeituosa dos nossos Direitos Fundamentais.

Só o nosso sistema de fiscalização é que é assim. Tanto no modelo Europeu como no


modelo Americano aquando a violação de um direito os cidadãos têm a possibilidade de
chegar com essa questão tanto ao Tribunal Constitucional como ao Supremo Tribunal de
Justiça.

O Regente Jorge Reis Novais não compreende o porque do funcionamento do nosso


sistema desta forma.

Os constitucionalistas que defendem que está tudo bem com o nosso sistema argumentam
em objeção ao que defendemos:
o Não é um facto que existem mais violações por atos normativos do que pela ação
do legislador
É verdade que não conseguimos comprovar por números estatístico reais, contudo é
natural que devido a haver mais atos individuais e concretos que atos legislativos haja
uma maior tendência para os Direitos Fundamentais serem atacado pela Administração
que pelo legislador.

Contudo olhando para os países que detêm além do Tribunal Constitucional o recurso de
amparo e o incidente prejudicial, verificamos que o recurso de amparo que tende a referir-
se a atos administrativos e decisões judiciais seca o meio alternativo de fiscalização
através do reenvio prejudicial que se prende com normas que violem os Direitos
Fundamentais.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 146


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

o Juízes comuns são responsáveis por garantir a preservação dos direitos


fundamentais. Ou seja, para quê ir para o Tribunal constitucional quando a
fiscalização pode ser realizada pelos Tribunais Comuns.
Mas sendo assim para quê que se criou o Tribunal Constitucional, se os Tribunais Comuns
podiam tratar as questões de constitucionalidade?

O legislador constituinte ao criar este órgão mostrou a sua desconfiança perante as


possíveis atuações dos juízes comuns, dizendo que as questões de constitucionalidade são
tão especiais que era necessário haver um tribunal responsável por garantir a
Constituição.

Ausência de proteção no domínio da responsabilidade civil extracontratual24

A Lei nº67/2007, de 31 de Dezembro, com alterações da Lei nº31/2008, de 17 de Julho


atribui ao Estado responsabilidade civil extracontratual por danos provocados, pela sua
atuação ilícita. Certamente por vezes estes atos podem corresponder a violações dos
Direitos Fundamentais.
A ação inconstitucional que cause danos e consequentemente o acione o regime de
responsabilidade civil extracontratual tende a ser de origem material. Ou seja,
corresponde a uma violação dos comandos normativos de proteção dos direitos
fundamentais.
Estas inconstitucionalidade pode emergir de qualquer função estadual, da administração,
da politico-legislativa e da jurisdicional.

É necessário que exista a violação do Direito para que essa atuação seja considerada ilícita
e possa dar lugar a responsabilidade civil, não basta que estejamos perante uma restrição
ou uma intervenção restritiva legitima.
Daí surge uma grande relevância no processo que determina se existe ou não uma
inconstitucionalidade e os órgãos competentes teriam que ser formados para tal.
As pesadas que recaem sobre o Estado são igualmente um motivo pelo qual a averiguação
da existência de uma efetiva inconstitucionalidade deve ser precisa.

No nosso sistema jurídico, é o juiz administrativo que, a título definitivo, ou seja, sem
possibilidade de recurso para o Tribunal Constitucional, decide a inconstitucionalidade
sempre que estiver em causa um ato não normativo, um ato regulamentar ou uma omissão.
Assim, quando nos encontramos no domínio de uma atuação eventualmente
inconstitucional que pode responsabilizar civilmente o Estado perante os cidadãos o
Tribunal Constitucional não pode ser chamado a intervir. Como sabemos este só pode
intervir caso sejam levadas a apreciar normas.

Para que tal fosse possível teríamos de na função politico-legislativa estar perante normas
regulamentares. No domínio da função jurisdicional o Tribunal Constitucional só pode
ser chamado a intervir quando os atos se prendam com a recusa ou a aplicação de normas.
No caso da função legislativa estamos sempre perante normas, assim se o juiz considera-
se que uma norma inconstitucional é o fator de responsabilização do Estado não se
poderia recorrer ao Tribunal Constitucional, contudo o legislador preveniu-se estatutindo
que para o efeito de fiscalização estes casos seriam análogos aos de aplicação ou recusa
de uma norma inconstitucional.

24Jorge Reis Novais, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade, Avaliação critica, AAFDL Editora,
2019 2ª edição, páginas 96 a 102

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 147


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Ausência de proteção por omissões da atuação estatal25

Na garantia dos direitos fundamentais estamos a falar da eventual lesão praticada através
de um ato, mas podemos ter o oposto, uma violação devido à falta de uma atuação.

Exemplo: Nesta crise a certa altura à cidadãos infetados que sabendo a administração que
aquela pessoa está infetada se contactar com outras pessoas pode contaminá-las
colocando em risco a vida dessas pessoas.
Concluísse que há aqui uma obrigação do Estado, dos poderes públicos de proteger a vida
e a saúde das pessoas não infetadas contra eventuais omissões. Não havendo norma que
resolva isto a autoridade policial tem a obrigação de proteger a saúde estas pessoas, se
não o fizerem estão a violar o direito à saúde e à vida constitucionalmente garantidos.

Estamos perante uma violação de um direito por omissão de um ato quando a autoridade
policial sendo notificada da existência de um indivíduo contaminado que coloca em risco
a vida dos demais nada faça para proteger estes.

O Estado tem o dever de respeitar, mas também de proteger. Estamos no domínio da


inconstitucionalidade por omissão, devido à inexistência de um ato que tutele os direitos.
Só quando se trata de falta de normas que garanta a execução dos direitos
constitucionalmente garantidos é que se pode recorrer ao Tribunal Constitucional através
da fiscalização por omissão. Todos os outros domínios estão fora da jurisdição do
Tribunal Constitucional.
No caso de existir um risco de violação de um direito e não ter sido praticado um ato por
parte da administração e do legislador que tivesse em vista impedir esta violação não se
pode chamar o Tribunal Constitucional.

Na fase inicial de vigência do sistema de fiscalização da constitucionalidade o processo


de inconstitucionalidade por omissão foi um tema controverso, contudo veio a perder a
sua relevância e a perder a sua utilidade. Tal deve-se:

• A necessidade de relevância da omissão no ato normativo para que seja


inconstitucional diminui os casos de eventual atuação do modelo

• A fiscalização sucessiva abstrata apenas pode ocorrer a requerimento de um


número reduzido de entidades

• Quando se verifique a existência de uma inconstitucionalidade por omissão o


Tribunal Constitucional nada pode fazer além de dar conhecimento do facto ao
órgão responsável por suprir a omissão
Contudo, recentemente tem-se verificado uma situação inversa, pelo que tem
rejuvenescido o interesse e a utilização do modelo de fiscalização por omissão, contudo
as hipóteses de desenvolvimento do instituto continuam limitadas e até desprovidas de
interesse real.

25Jorge Reis Novais, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade, Avaliação critica, AAFDL Editora,
2019 2ª edição, páginas 103 a 115

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 148


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Ausência de proteção nas relações entre privados26

CRP: Artigo 18º


Norma que só existe na Constituição Portuguesa e por nossa influência na Constituição
Angola e Cabo Verdiana.
Nas outras constituições a logica é que a Constituição é o limite à atuação dos poderes
públicos, tendo em vista proteger os direitos dos cidadãos fase as atuações dos poderes
públicos. Não se diz nada quando à vinculação das entidades privadas face aos preceitos
constitucionais, apenas a Constituição português refere tal preceito.
Nos conflitos entre particulares podemos dizer que por vezes os nossos direitos
fundamentais são agredidos por outros particulares
Exemplo: Um jornalista escreve um artigo num jornal onde difama outra pessoa, que pode
invocar a violação ao seu direito fundamental ao bom nome.
A nossa constituição preocupou-se em vincular as entidades privadas a respeitar os
direitos fundamentais.

O normal seria que se desse a possibilidade a um cidadão, que considera ter tido o seu
direito fundamental violado por parte de outro privado, se dirigir ao Tribunal
Constitucional quando os Tribunais Comuns não lhe dê razão. No entendo, o cidadão
português não tem essa faculdade, isto porque não se está a queixar da constitucionalidade
de nenhuma norma, o único problema é que o outro particular agrediu o seu direito e os
tribunais não lhe deram razão.

Mais uma vez isto não acontece assim nos restantes modelos de fiscalização. Modelos
com Constituições que não tem nenhuma norma que se preocupe em vincular os
particulares ao respeito dos direitos fundamentais, permitem que esta questão chega ao
Tribunal constitucional ou ao Supremo Tribunal de Justiça. E Portugal que teve a
preocupação de vincular os particulares ao respeito dos direitos fundamentais não dá a
estes a possibilidade de se dirigirem ao órgão máximo responsável pela fiscalização da
inconstitucionalidade.

Relação entre o Tribunal Comum, Tribunal Constitucional e Tribunal Europeu


dos Direitos Humanos27

Claro está que aquando questões de inconstitucionalidade por atos praticados ou omitidos
o particular não tem a possibilidade de recorrer ao Tribunal Constitucional português,
contudo pode levar o seu caso concreto ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos.
Os particulares que tenham recursos de levar a questão ao Tribunal Europeu dos Direitos
Humanos podem lutar pelo seu direito, os que não tem vêm o seu direito lesado apenas.

Regente Jorge Reis novais considera que é uma situação absurda que uma questão de
violação de um direito fundamental em Portugal não possa ser resolvida com os órgãos
nacionais e tenha de se recorrer a um Tribunal Comunitário. O Tribunal Europeu dos
Direitos Humanos tende a dar razão ao particular a quem foi lesado o direito, o que se
traduz numa indeminização devido pelo Estado aos cidadãos. Devido à violação de um
direito que se encontra consagrada na Constituição e na Convenção dos Direitos
Humanos.

26 Jorge Reis Novais, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade, Avaliação critica, AAFDL Editora,
2019 2ª edição, páginas 116 a 119
27 Jorge Reis Novais, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade, Avaliação critica, AAFDL Editora,

2019 2ª edição, páginas 120 a 130

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 149


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

AMPLIAÇÃO DO CAMPO DE ATUAÇÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL

Desde os primeiros anos que o Tribunal Constitucional tem consciência dos limites da
sua atuação. Assim a fraca proteção dos direitos fundamentais não se deve a um trabalho
insuficiente do Tribunal Constitucional, mas sim à estruturação do processo de
fiscalização português.
Não é previsível que ocorra uma alteração neste sistema. Houve em algumas revisões
constitucionais tentativas de mudança, mas nunca foi avante pois é uma matéria com a
qual os partidos políticos não se preocupam.

Tendo o Tribunal Constitucional conhecimento dos constrangimentos procurou levar as


possibilidades de proteção dos direitos e interesses dos cidadãos até ao limite comportável
pelo sistema. Nessa tentativa o Tribunal Constitucional resolveu de facto os problemas
ou veio criar problemas novos? O Regente Jorge Reis Novais considera que estamo
perante uma “utilização irracional e inapropriada que geraa desigualdades e insegurança
jurídica”.

Conceção funcional de norma28

O Tribunal Constitucional procurou atenuar as insuficiências do nosso sistema através do


conceito de normas para efeitos de fiscalização, adotando um conceito funcionalmente
adequado ao concreto sistema de fisalização instituído entre nós. Neste sentido
conseguiram que chegassem ao Tribunal Constitucional os conteúdos normativos
contidos nos enunciados normativos.

O Tribunal Constitucional, como vimos, só pode fiscalizar a inconstitucionalidade de


normas, mas a Constituição não diz em lado nenhum o que é normal.
O tribunal incide sobre esta indefinição de norma por parte da Constituição para conseguir
alargar a sua margem de atuação. Se o conceito de norma for estendido ao máximo vai se
alargar a possibilidade de defesa dos direitos das pessoas.

Uma coisa é norma no âmbito da função legislativa, independentemente desse conceito


de norma diz o Tribunal Constitucional que para o sistema de fiscalização o conceito a
adotar deve ser o adequado às funções da fiscalização, distinto do conceito de norma em
geral.

Assim, o que interessa é o conceito funcional para a norma, no fundo considera norma
todo o comando contido num ato legislativo, lei decreto etc, toda a permissão ou restrição
que aí estiver contida está sujeita a fiscalização.

Para além destas normas há outros comandos normativos em sentido material contidos
noutros atos, isto é, comandos normativos que não estão contidos em atos legislativos.
Regras de conduta de comportamento com carácter geral e abstrato independentemente
do diploma onde esteja o Tribunal Constitucional considera norma, dando-lhe uma
possibilidade acrescida de fiscalização.

Este sentido vai sendo ampliado ao longo dos anos.

28Jorge Reis Novais, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade, Avaliação critica, AAFDL Editora,
2019 2ª edição, páginas 134 a 136

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 150


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Enunciado Normativo e Norma29

O enunciado normativo ainda não é norma, passa a ser norma quando o jurista interpreta
as palavras da lei e retira desta um sentido normativo, um comando de conduta normativo,
imposição, permissão, restrição.

O Tribunal Constitucional assenta nesta distinção, portanto quando a Constituição diz que
o Tribunal Constitucional fiscaliza normas, não se confunde com o enunciado. Pelo que
o Tribunal Constitucional trabalha sobre as interpretações que realizamos aos enunciados.

Mais que esta diferença o Tribunal Constitucional retira o seguinte:


Quando perante um processo judicial o juiz aplica ou recusa uma norma fá-lo porque
interpretou um enunciado de certa maneia enquanto que outro juiz pode realiza a
interpretação de outra maneira. O Tribunal Constitucional aceita fiscalizar quaisquer
destas interpretações. Pelo que ele não aceita fiscalizar o enunciado, mas sim a norma,
para ver se o comando está ou não conforme à Constituição. Por sua vez, não apenas
normas, mas a interpretação de uma norma aplicada ou não a um caso.

Exemplo Académico: Enunciado: “os homens nascem livres e iguais”. Um juiz interpreta
este enunciado como sendo as pessoas de sexo masculino apenas, aceitando diferenças
entre homens e mulheres. Realizando outra interpretação percebemos que esta norma
extraída da interpretação do juiz viola o princípio de igualdade constitucionalmente
consagrado, pelo que podemos recorrer esta norma ao tribunal constitucional

Tal possibilidade aumenta o fluxo de casos que chegam ao Tribunal. Pois já não são só
as normas, mas também as normas que surgem da interpretação do juiz comum.

Controlar as interpretações erróneas30

O juiz pode se enganar quando interpreta o enunciado, extraindo uma norma não
comportada pelo próprio enunciado, por exemplo combinando enunciados obtendo uma
norma errada. Em princípio o Tribunal Constitucional deve controlar
inconstitucionalidade das normas em vigor, quando um juiz faz uma interpretação errónea
a norma não existe na ordem jurídica portuguesa, mas o Tribunal aceita fiscalizar esta
norma.

Aqui a situação é mais complicada pois é o juiz que inventa a norma, contudo se forem o
fundamento da decisão o Tribunal aceita que os particulares lhe façam chegar o controlo
daquela interpretação de uma norma que não está em vigor.
Contudo estes são so casos típicos em que se justifica o recusroso ordinário, pois o
tribunal superior poderia realizar uma interpretação diferente que não fosse errónea, e
deixamos a ficalização por parte do Tribunal Constitucional para normas que
efectivamente com a devida interpretação sejam inconstitucionais

Assim, o Tribunal Constitucional aceita recurso se for com alegação em


inconstitucionalidade orgânica e não aceita se for uma alegação da violação do principio
da separação de poderes ou do principio da proteção da confiança dos particulares.

29 Jorge Reis Novais, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade, Avaliação critica, AAFDL Editora,
2019 2ª edição, páginas 136 a 137
30 Jorge Reis Novais, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade, Avaliação critica, AAFDL Editora,

2019 2ª edição, páginas 137 a 138

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 151


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Normas Implícitas à decisão judicial (desaparece o conceito de ato)31

Alarga-se ainda mais o campo da ação de fiscalização possiblitando eu chegue a recurso


não só normas que resultam da direta, intencional e explicita interpretação judicial das
disposições vigentes, mas também normas que pudessem ser pressupostas ou deduzidas
imtelectualmente das decisões judiciais

Exemplo Académico: Condenação de um recluso à morte, violando a Constituição. Não


sabemos o porque desta decisão pode ter decidido porque lhe apeteceu, porque
considerava ser o mais justo.

O raciocínio do Tribunal Constitucional é o seguinte:


Se o juiz decidiu daquela maneira não o fez pelo livre arbítrio, fê-lo porque considerou
que à uma norma implícita que lhe permitia resolver daquela maneira o caso concreto.

Ou seja, uma norma que não foi expressamente invocada na fundamentação de decisão
judicial, contudo foi o pressuposto normativo que incorporou o pensamento do juiz e o
levou a resolver o caso concreto de forma inconctitucional.

Se existe esta norma que possa eventualmente levar a uma resolução errónea, o Tribunal
constitucional permite controlar a constitucionalidade da norma implícita que levou à
aplicação errada.
Assim sendo irá pegar no processo do juiz e avaliar a ou as normas que o fizeram tomar
essa decisão e considerá-las eventualmente inconstitucionais, obrigando o juiz a
reformular a sua decisão.

Na realidade não temos aqui uma norma, mas sim uma decisão judicial sem estar apoiada
em nenhuma norma, contudo para estender o seu campo de atuação a atos, nomeadamente
decisões judiciais que possam vir a ser inconstitucionais o Tribunal Constitucional cria a
fiscalização de normas implícitas desses a tos.

Este campo de atuação do Tribunal Constitucional suscita bastantes divergências

Exemplo: Conflito entre liberdade de expressão e direito à privacidade entre particulares.


Quando este conflito ocorre, e vai a tribunal, não há lei que dê uma resposta inequívoca
de resolução deste conflito. Pois a constituição e a lei de imprensa e o código apenas
dizem que são direitos a proteger. Mas como se resolve o conflito de forma concreta? O
que deve prevalecer? O juiz para resolver este conflito vai analisar as circunstâncias do
caso concreto vai ver qual o direito ou o interesse com mais peso. Se o juiz deu
prevalência a este interesse no caso concreto é porque existe uma norma implícita que
leva aquela resolução perante um caso concreto, que constrói uma decisão judicial sobre
forma de norma: “reunidas estas circunstâncias resolvemos assim, aplica-se isto”

Aqui não temos problema de inconstitucionalidades de normas, pois as normas que


consagram estes direitos não são inconstitucionais, pelo que estas decisões judiciais não
chegariam ao Tribunal Constitucional.

Mas isto altera-se com a criação do conceito das normas implícitas, por parte do órgão.
Surge uma dificuldade, pois isto pode ser feito para qualquer decisão, pois em qualquer
situação podemos reconstruir o pensamento que levou a tomar aquela decisão em forma
31Jorge Reis Novais, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade, Avaliação critica, AAFDL Editora,
2019 2ª edição, páginas 138 a 140

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 152


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

de norma: reunidas as circunstâncias A e B toma-se a decisão C, ou seja perante um caso


concreto generaliza-se a decisão para casos análogos.

Assim desaparece a distinção entre norma e ato pois nesta conceção é possível
transformar qualquer ato decisivo em norma, olhando para as inferências logicas que
levaram a entidade e tomar aquela decisão.

Exemplo: A assinatura de um diploma pode ser reconstruída tendo em conta o que levou
à assinatura construir uma norma.

O nosso sistema caracterizava-se e era diferentes dos demais devido à impossibilidade de


recorrer ao Tribunal Constitucional atos, sendo apenas possível realizar a fiscalização de
normas, contudo com este conceito de normas implícita que transforma qualquer ato
numa norma o que anula esta construção e permite que oc cidadãos acedam ao Tribunal
Constitucional para no fundo contestar decisões judiciais.

Sendo que a única coisa que é necessário é alegar que tais decisões judiciais constituem
a aplicação de uma norma:
• Expressa ou implícita: explicitamente assumida na fundamentação da sentença ou
apenas nela suposta
• Real ou virtual: vigente no ordenamento jurídico ou criada pelo juiz
• E que o sentido contrarie a Constituição

Pode o Tibunal Constitucional alargar assim os seus poderes? O regente Jorge Reis
Novais considera que não pois as coisas foram definidas pelo legislador na constituição
e é assim que devem ser seguidas, apesar de não concordar na integra com o sistema de
fiscalização. No texto constitucional norma e ato são coisas diferentes, pelo que o
Tribunal Constitucional não pode anular esta diferença.

Da forma como foi criado e como está instituído na Constituição o nosso sistema de
fiscalização tem como objeto de trabalho apenas normas, sendo o Tribunal Constitucional
apenas juiz do legislador e não das decisões dos juízes comuns.

Contudo com estas práticas introduzidas pelo tribunal Constitucional torna-se possível
julgar a constitucionalidade das interpretações ou criações feitas pelo juiz comum
extinguindo-se a fronteira entre fiscalização de normas e de decisões judiciais o que se
assemelha ao instituto de rercuso de amparo que encontramos no modelo Europeu.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 153


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CONSEQUÊNCIAS DESTE ALARGAMENTO32

Positivas Negativas
1) Possiblidade de recurso de decisões 1) Utilização não canónica da
judiciais claramente violadoras de fiscalização concreta: fins dilatórios
direitos fundamentasi que, de outra 2) Instaura imprecisão, casuísmo,
forma, seriam irrecorríveis para o diluição e incerteza nos critérios de
Tribunal Constitucional. admissibilidade dos recursos
2) Aumenta exponencialmente a 3) Insegurança jurídica num domínio
possibilidade de recurso que devia ser transfarente e preciso

Com este trajeto o Tribunal Constitucional resolveu alguns problemas permitindo o


acesso a ele de decisões que não chegariam lá, mas como tem que dizer que mantêm o
sistema constitucionalmente estipulado tudo fica ao sabor do que os juízes querem
decidir, pelo que por vezes aceitam a fiscalização de um ato alegando a existência de uma
norma implícita contudo nem sempre pelo que recursam processos alegando que não
fazem fiscalização de atos apenas de normas.

Dando origem a desigualdade, insegurança e algum arbítrio.

E infelizmente as desigualdades prendem-se muito com as condições financeiras de ter


possibilidade de pagar a um bom advogado.

Conseguir fazer com que o recurso de uma decisão por ato chegue ao Tribunal
Constitucional depende da habilidade dos advogados. Este recurso tem que ser feito neste
sentido: esta aqui uma norma que é inconstitucional, contudo não se trata de um artigo
concreto, mas sim de uma inferência logística do juiz, que teve em conta uma norma
implícita.

Ou seja, os juízes do Tribunal Constitucional são “picuinhas” na destinção que fazem


entre norma ou ato de decisão judicial, pelo que ao formular o processo de recurso é
necessário que se deixe explícito que não estamos a recorrer a decisão judicial mas sim
uma norma (virtual ou real, explicita ou implícita) insonctitucional que se encontra por
detrás da decisão judicial

Tal não devia acontecer num Estado Social Democrático de Direito pois os direitos dos
cidadãos deviam ser protegidos de igual forma, contudo o nosso sistema de fiscalização
dá azo a estas desigualdades, maioritariamente de escopo financeiro.

No sistema europeu por vezes nem é necessário advogado para chegar ao Tribunal
Constitucional, devido ao recurso de amparo.

32Jorge Reis Novais, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade, Avaliação critica, AAFDL Editora,
2019 2ª edição, páginas 141 a 145

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 154


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Risco de insegurança, decisionismo e desigualdade33

O nosso sitema encontra-se de facto instável, devido à contradição que comporta:


• Na Teoria: Recusa o recurso de amparo e para tal distingue entre norma e ato,
sendo que apenas a fiscalização de normas é passível de recurso ao Tribunal
Constitucional
• Na Prática: Alarga o conceito impreciso de norma para que no fundo seja possível
recorrer decisões judiciais
O facto da distinção entre norma e ato jurídico ser imprecisa dificulta a criação de critérios
objetivos de admissão dos recursos no Tribunal Constitucional o que, por sua vez, cria
desigualdades entre os cidadãos e possibilidade de verem as suas questões avaliadas pelo
Tibunal Constitucional.

Há uma impossibilidade objetiva de determinar uma fronteira entre decisão judicial e


interpretação normativa que levou à decisão do caso concreto, pelo que tudo depende da
forma como é exposto o processo e da vontade dos juízes constitucionais que o recebem.

Os juízes do Tribunal Constitucional têm consciência que no fundo o que está a ser
recorrido é a decisão judicial e não uma norma, contudo se o advogado da cusa souber
expor devidamente a situação o Tribunal Constitucional admite, tendo em vista alarga o
seu campo de atuação.

Procuraram estabelecer critériso mais precisos, frmes e tipificados para a admissão dos
recursos, contudo sem sucesso, pelo que encontramos domínios onde ocorrem
frequentemente oscilação na posição do Tribunal Constitucional:

o Decisões judiciais que recorrem à interpetação extensiva ou à analogia em


domínio de estrita tipicidade legal
Nesta situação resolve-se um caso concreto através da criação/aplicação de uma norma
por analogia ou interpretação extensiva num domínio onde devido aos princípios da
tipicidade e legalidade este procedimento hermenêutico não seria possível (fiscala e
penal).

Por vezes esta situação é admitida em recurso ao Tribunal Constitucional, contudo nem
sempre, pois depende da forma como a questão é apresentada:
• Há lugar a recurso: Fiscalização da constitucionalidade da norma judicialmente
apurada através desse procedimento
• Não há lugar a recurso: Fiscalização da constitucionalidade do ato jurídico de
interpretação
Compreende-se que haja possibilidade de recurso numa situação em que o juiz cria uma
norma para resolver o caso concreto. Contudo admitindo frequentemente tal situação o
Tribunal Constitucional passa a ser:
1) Juiz dos juízes: possibilidade de recurso de todas as decisões judiciais alegando uma
interpretação irrónea na aplicação de uma norma
2) Tribunal oficial com a última palavra na interpretação de todo o direito ordinário: pois
para justificar a sua decisão teria de indicar qual é a interpretação correta a realizar.

33Jorge Reis Novais, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade, Avaliação critica, AAFDL Editora,
2019 2ª edição, páginas 146 a 156

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 155


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

o Decisões judicias de concretização e de densificação de cláusulas gerais


Quando se aplica cláusula gerias e indeterminadas, como a boa fé, os bons costumes ou
o abuso de direito, há uma dificuldade, para efeitos de recurso ao Tribunal Constitucional,
em distinguir se estamos perante a norma ou se já nos econtramos no que é a aplicação
desta.

Por vezes esta situação é admitida em recurso ao Tribunal Constitucional, contudo nem
sempre, pois depende da forma como a questão é apresentada:
• Há lugar a recurso: Fiscalização da constitucionalidade da norma
• Não há lugar a recurso: Fiscalização da constitucionalidade do ato jurídico de
aplicação da norma
Admitindo frequentemente tal situação acontece que:
1) O Tribunal Constitucional passa a ter a última palavra no que toca à interpretação de
clausulas gerias presentes no Código Civil
2) Em vez de serem os tribunais comuns superiores passa a ter de ser o Tribunal a definir
quando estamos perante situações em que justifique a aplicação de tais perceitos, como
quando estamos perante uma situação de abuso de direito.

O Tribunal Constitucional apresenta34 o critério da “singularidade irrepetível” como o


meio de distinção das duas situações infra requeridas, contudo este não se mostra claro
nem eloquente, pois nada nos garante que por ocorrerem uma vez não se pode repetir.

o Insegurança e desigualdade na apreciação da admissibilidade de recursos


de decisões judiciais de concretização de normas jusfundamentais
Quando observamos a consagração dos direitos fundamentais percebemos que estes se
encontram em normas-princípio, ou seja, apresentam uma natureza de normas abertas.

Arguição de inconstitucionalidades orgânicas e formais em fiscalização concreta35

O mesmo sistema que coloca diversos entraves à defesa dos direitos fundamentais que
tenham sido gravemente violados por atos da administração permite que seja requeria a
fiscalização da inconstitucionalidade de:
1) Normas reais ou virtuais
2) Normas vigentes ou apenas supostas
Independemtente:
1) Natureza e gravidade da insocntitucionalidade
2) Efeitos por ela produzidos
3) Lesão de direitos
4) Interesse do particular em requerer
Levar uma norma ao Tribunal Constitucional arguindo a sua inconstitucionalidade
material é justificável:
• Dimensão Subjetiva: Foram lesados interesses particulares, que merecem tutela.

34 Tribunal Constitucional, Acordão nº193/2016, entre outros


35Jorge Reis Novais, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade, Avaliação critica, AAFDL Editora,
2019 2ª edição, páginas 157 a 164

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 156


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

• Dimensão Objetiva: Interesse da ordem jurídica na reconstituição de sua


integridade ferida com normas contrárias aos princípios materiais da constituição

Levar uma norma ao Tribunal Constitucional arguindo a sua inconstitucionalidade


orgânica ou formal já não é justificável, pois dificilmente uma violação do procedimento
legislativo (requisitos de competência, forma de aprovação) provoca danos nos direitos e
interesses de particulares, pois os os efeitos erróneos que provocou em princípio esgotam-
se após o processo.

• Dimensão Subjetiva: Dificilmente violam direitos dos particulares

• Dimensão Objetiva: Ordem juridia tem diversos controlos para que se evite a
publicação de uma norma inconstitucional, contudo mesmo que venha a ser
publicada rapidamente desaparece enquanto perturbação ou problema jurídico
carente de resolução

Apesar de “absurdo” é possiver recorrer ao Tribunal Constitucional a qualquer momento,


independemente das consequências geradas, a inconstitucionalidade orgânica ou formal
de uma norma, e supreendetemente estes sãos os casos que mais consomem a atividade
do Tribunal Constitucional.

A únicão explicação para a constituição de 1976 incorporar tal possibilidade prende-se


com o repudio que existia ao artigo 123º/2 da constituição de 1933

Artigo 123º
Nos feitos submetidos a julgamento não podem os tribunais aplicar normas que infrinjam
o disposto nesta Constituição ou ofendam os princípios nela consignados, cabendo-lhes,
para o efeito, apreciar a existência da inconstitucionalidade, salvo se o seu conhecimento
for da competência exclusiva da Assembleia Nacional, nos termos do nº2.
1. A lei poderá concentrar em algum ou alguns tribunais a competência para a apreciação
da inconstitucionalidade referida no corpo do artigo e conferir às decisões desses
tribunais força obrigatória geral.
2. A inconstitucionalidade orgânica ou formal da regra de direito constante de diplomas
promulgados pelo Presidente da República ou de normas constantes de tratados ou outros
actos internacionais só poderá ser apreciada pela Assembleia Nacional e por sua
iniciativa ou do Governo, determinando a mesma Assembleia os efeitos da
inconstitucionalidade, sem ofensa, porém, das situações criadas pelos casos julgados.

A constituição de 1976 reagiu contra esta norma, garantindo que não haveria distinção
entre os tipos de inconstitucionalidade, contudo a norma subsiste até à atualidade,
momento em que já não é justificável a sua existência.

Atualmente podemos encontrar um universo inabarcável de inconstitucionalidades


orgânicas, pelo que facilmente um advogado conhecedor descobre no caso concreto uma
norma que esteja ferida com uma inconstitucionalidade fromal que se reporta ao tempo
do seu processo legislativo.

Existe uma enorme insegurança jurídica quando se dá a um particular a possibilidade de


levar ao Tribunal Constitucional uma norma que está em vigor à 30 anos e não causou
até então nenhuma lesão de direitos, pelo que o particular não viu os seus interesses
lesados, apenar por se ter cometido uma gralha formal a quando a sua aprovação.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 157


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Utilização do sistema para fins inapropriados36

Em comparação com o modelo de fiscalização que encontramos na maior parte dos países
Europeus, que detêm o instituto de recurso de amparo ou reenvio prejudicial, o nosso
permite uma maior facilidade para os particulares chegarem ao Tribunal Constitucional:

Modelo Europeu Modelo Português


O cidadão só pode alegar O cidadão pode alegar a violação de
inconstitucionalidade pela violação de um qualquer norma conforme à Constituição.
conjunto, previamente delimitado, de
direitos fundamentais
O acesso do particular ao Tribunal O particular pode invocar qualquer tipo de
Constitucional depende da existência de inconstitucionalidade de norma aplicável
uma inconstitucionalidade que constitua no seu caso, independentemente desta
uma lesão atual do seu direito constituir ou não a causa do dano sofrido,
ou de haver ou não violação do direito
A inconstitucionalidade tem de ser A inconstitucionalidade alegada pode ter
praticada num tempo muito delimitado sido praticada em qualquer momento,
antes da apresentação da queixa desde que a norma esteja em vigor e seja
aplicada ao caso concreto.
O Tribunal Constitucional dispoõm de O Tribunal Constitucional não dispõe de
filtros que lhe permitem selecionar o qualquer possibilidade afim
acesso

Em oposição o sistema europeu permite o recurso de um espectro mais alargado de


situações de violação de Direitos Fundamentais, permitindo a fiscalização de ato e não só
de normas. Assim, os nossos cidadãos, teoricamente, apesar de poderem levar ao Tribunal
Constitucional qualquer norma, não vê as violações dos seus direitos fundamentais
devidamente julgadas.

Se o nosso sistema de fiscalização não é suficientemente apto para proteger os


particulares contra parte significativa das potenciais violações aos seus direitos
fundamentais, é suficientemente generoso para permitir aos particulares uma exploração
quase ilimitada de interesses privados sem relevância constitucioanl, caso sejam a parte
eventualmente interessada em eternizar o processo judicial.

Esta possibilidade torna ainda mais acessível quanto maior for o poderiro económico do
arguido, pois detem maior facilidade em utilizar o recurso como expediente dilatório e
instrumento incofessado para obtenção de fins menos nobres.

No nosso modelo vizinho tal não é possível pois temos de estar presente uma dúvida de
constitucionalidade séria e fundamentada:
1) Tem de ser arguida antes da decisão final
2) Subirá ao Tribunal Constitucional a título incidental e com suspensão da causa
3) Para tal o juiz comum necessita de considerar a dúvida pertinente

36Jorge Reis Novais, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade, Avaliação critica, AAFDL Editora,
2019 2ª edição, páginas 165 a 169

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 158


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

REFORMA DO SISTEMA

Percorremos o que pode ser considerado as insuficiências ou incoerências que incidem


sobretudo na fiscalização concreta e iremos fazer agora um balanço final.

Não está em causa aquilo que o Tribunal Constitucional e o sistema de fiscalização


português tem permitido em termos de estabilização do Estado Direito e garantia dos
Diretos Fundamentais. Isso tem sido realizado, mas a custo de um conjunto de
incoerências que tem distorcido e contribuindo para uma má imagem do Tribunal
Constitucional.

O cidadão comum tem a ideia que o recurso para o Tribunal Constitucional é feito para
escapar a sentença já tomas contra cidadãos mais poderosos ou fazer prolongar os
processos o que acaba por prejudicar aquilo que deve ser a imagem de um órgão decisivo
como este.

Quando comparamos o prestígio do Tribunal Constitucional Português com o Alemão


vemos que há uma enorme diferença. O Tribunal Constitucional da Alemanha é visto
como um órgão incontável tanto pelos cidadãos como pelos poderes públicos.
Em Portugal não existe esta visão sobre o Tribunal Constitucional, mas sim uma
perspetiva que desvaloriza o órgão e isto deve-se à insuficiências da fiscalização concreta.

NECESSIDADE DE REFORMA37

O objetivo primordial do Tribunal Constitucional é defender os cidadãos de eventuais


lesões aos seus direitos fundamentais, dando a estes a respetiva tutela constitucional.
Em grande medida o Tribunal Constitucional foi no processo de fiscalização concreta
desviado das suas funções naturais. O Tribunal Constitucional português, em parte
desempenha essa função, mas da forma como está estruturado este processo concreto de
fiscalização a proteção dos direitos fundamentais é insuficiente, devido:

o Impossiblidade de levar ao Tribunal Constitucional violações dos Direitos


Fundamentais através de atos ou omissões dos titulares do poder político, do
legislador, da administração e dos tribunais

o Possiblidade de levar ao Tribunal Constitucional qualquer tipo de alegação de


inconstitucionalidade, com ou sem relevância para a defesa dos interesses dos
particulares

Isto deixa uma grande parte de possíveis atentados aos Direitos Fundamentais fora da sua
jurisprudência e permite a utilização do recurso ao Tribunal Constitucional com fim
distintos dos pretendidos, nomeadamente o atraso do processo.

O nosso sistema permite a utilização do recurso como meio dilatório porque,


diferentemente do que acontece com os demais Tribunais Constitucionais, o nosso não

37Jorge Reis Novais, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade, Avaliação critica, AAFDL Editora,
2019 2ª edição, páginas 171 a 177

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 159


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

tem a possibilidade de fazer uma filtragem do tipo de recursos que apenas tem esta
finalidade, pois basta apenas que no decurso do processo se alegue por qualquer motivo
a inconstitucionalidade de uma norma para que exista o direito do particular fazer chegar
a questão ao Tribunal Constitucional.
O problema é que tal permite que o recurso ao Tribunal Constitucional seja possível sem
que se alegue nenhuma violação de um Direito Fundamental.

Como sabemos não é difícil invocar inconstitucionalidade, sobretudo orgânicas que


atualmente em nada afetam os direitos fundamentais dos cidadãos, pois tal
inconstitucionalidade deu-se apenas devido a uma falha formal no processo legislativo.
Exemplo: É frequente que sejam promulgados diplomas emanados do Governo que não
tenham tido uma autorização prévia da Assembleia da República, devido principalmente
à abertura da norma CRP: 165º c)

Estas atitude acabaram por ocupar a atividade de um órgão, que tem uma função nobre,
tutelar os Direitos Fundamentais dos cidadãos, com a resolução de casos que se prendem
com as mais diversas áreas do Direito, por ser encarado como um último recurso de
instância.

Devido à tradição que se foi criando e transmitindo entre os Juizes do Tribunal


Constitucional, em vez de através de uma combinação virtuosa de experiências e saberes
académicos se criar um órgão cuja jurisprudência se centra nos problemas
constitucionais, na garantia efectiva dos direitos fundamentais, o Tribunal Constitucional
tranforma-se num órgão constituído por especialista de vários ramos de Direito que
disputa com os tribunais superiores as ordens dos tribunais ordinários acabando por
elaborar jurisprudência em cada um dos ramos de direito sujeitos a julgamento.

Porquê é que nunca foi modificado?

Quando olhamos para a opinião dos constitucionalistas portugueses, a doutrina diverge


quanto à avaliação critica do nosso sistema. Esta críticas são tão evidentes, que se
houvesse vontade política para resolver o problema este já estaria resolvido. Além disto
como não conseguem uma opinião unânima dos constitucionalistas.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 160


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

PROPOSTA DE REFORMA38

Poderia permanecer tudo igual quanto à fiscalização preventiva e sucessiva abstrata, pois
não é em nada diferente do que acontece nos demais sistemas.

As alterações prendem-se essencialmente com o processo de fiscalização concreta, tendo


em vista suprir as deficiências, as insuficiências e as disfuncionalidades anterioremente
apresentadas.

Reconduzir a atividade à proteção dos direitos fundamentais dos cidadãos

Foi com este intuito que se criou os Tribunais Constitucionais, para proteger os cidadãos
e os seus direitos constitucionalmente tutelados de eventuais abusos por parte do poder
político. Isto, pois, num Estado de Direito é fundamental a proteção destes direitos.

Uma vez que temos um órgão, Tribunal Constitucional, seria racional adotar o sistema
que encontramos nos restantes países europeus. Neste caso todas as
inconstitucionalidades relevantes seriam suscetíveis de verificação adequada por parte do
Tribunal Constitucional. Este modelo é caracterizado por dois institutos: recurso de
amparo e reenvio prejudicial

Recurso de amparo/Queixa constitucional

Dá ao cidadão, independentemente dos seus conhecimentos jurídicos, a possibilidade de


caso veja os seus Direitos Fundamentais violados, por qualquer ordem político
(legislador, administração, magistrados) ou por outro particular, possa colocar a questão
ao órgão criado para garantir e defender os direitos e garantias constitucionais.

Assim este instituto vem suprir a insuficiência que se verifica no nosso sistema, a
impossiblidade de levar ao Tribunal Constitucional violações dos Direitos Fundamentais
através de atos ou omissões dos titulares do poder político, do legislador, da
administração e dos tribunais

Mas esta ampla possibilidade de recorrer ao Tribunal Constitucional não sob carrega a
atividade deste órgão devido aos filtros criados através de requisitos que são necessários
de preencher para que se chegue ao Tribunal Constitucional.

1) Esgotar o recurso do processo nos Tribunais Comuns e caso este não lhe dê razão e ele
continua a achar que o seu direito foi violado.
Contudo por vezes a agressão imediata não há tempo para o recurso, pelo que se pode
recorrer diretamente ao Tribunal Constitucional.

Exemplo: Aprovação de uma lei que provoca violações nos direitos fundamentais das
pessoas. Não se espera que primeiro as pessoas sofram os danos e só depois se coloca a
questão ao Tribunal Constitucional, nestes devido à violação ser tão evidente pode-se
recorrer diretamente ao Tribunal Constitucional.

38Jorge Reis Novais, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade, Avaliação critica, AAFDL Editora,
2019 2ª edição, páginas 178 a 188

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 161


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

2) Quando chegam estes casos ao Tribunal Constitucional, este irá filtrar e determinar
que queixas vale a pena serem avaliadas. Isto ocorre em todos os outros modelos de
fiscalização, menos em Portugal.

Não é praticável, tendo em conta como o Tribunal Constitucional funciona, que se


permita que em todos os casos de violação de Direitos possa chegar ao Tribunal
Constitucional.
É frequente nas revisões constitucionais se sugerir a introdução do recurso de amparo,
contudo mantendo quanto ao resto tudo na mesma não funcionaria, devido à subcarga de
atividade que iria sobre o Tribunal Constitucional. O recurso de amparo apenas faria
sentido caso todo o sistema de fiscalização concreta fosse reformulado.

Como objeção à adoção do recurso de amparo constitucionalistas portugueses


consideram que o que viria permitir (defesa dos direitos fundamentais dos cidadãos), nós
já conseguimos através da fiscalização concreta, através da extensão de campo de ação
que o Tribunal Constitucional faz.

Reenvio prejudicial

O que aconteceria com todas as situações, não de má fé, mas, sim os reais problemas de
constitucionalidade suscitados nos Tribunais Comuns caso fosse extinto o sistema de
fiscalização concreta e se adotasse o instituto do recurso de amparo? Os cidadãos não
perdem essa possibilidade devido ao instituto do reenvio prejudicial.

O modelo europeu está construído, ao contrário do nosso, de forma a que não haja a
possibilidade de atitudes dilatórias, de deixar os tribunais decidirem a questão e andar a
recorrer até chegar ao Tribunal Constitucional.

Assim, o que sucede no modelo Europeu é que o juiz comum/da causa aprecia o
argumento, ou seja, procurar qualificar o argumento de inconstitucionalidade como
pertinente ou não:
• Quando a inconstitucionalidade alegada não seja razoável o processo fica por ali
e não é tida em conta.
• Caso a dúvida seja séria é bom que seja esclarecida, e que seja esclarecida, não
depois de vários recursos quando chegue ao Tribunal Constitucional, mas sim
naquela fase do processo e assim esse juiz reenvie o processo ao Tribunal
Constitucional para que seja esclarecida a constitucionalidade da norma em causa.
Caso contrarie a norma desaparece da ordem jurídica, não podendo ser aplicada
em naquele nem em mais nenhum caso concreto.

Em suma, o que acontece é que quando surge uma inquietação quanto à


inconstitucionalidade de uma norma aplicável a um caso concreto, antes que haja uma
decisão final quanto ao veredicto do conflito, há um esclarecimento da parte do Tribunal
Constitucional sobre a norma em questão e dai se parte para a resolução do caso, com ou
sem a aplicação da norma, consoante a posição do Tribunal Constitucional.

Este instituto faz com que os particulares não têm interesse em alegar
inconstitucionalidades sem consistência alguma apenas para atrasar o processo.

São levantadas objeções quanto a esta forma de funcionamento ser aplicada em Portugal.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 162


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Nós temos uma história constitucional desde a Constituição republicana de 1911 onde
adotamos uma fiscalização difusa inspirada no modelo americano, dando aos juízes a
possibilidade de conhecerem e decidirem os problemas de constitucionalidade das
normas. Este sistema opõe-se ao que encontramos no modelo europeu através do instituto
do reenvio prejudicial, ou seja, na Europa o juiz da causa apenas toma conhecimento da
questão da inconstitucionalidade e caso considere relevante envia para o Tribunal
Constitucional que irá resolver a questão.

No sistema de fiscalização difusa adotado em 1911 todos os juízes comuns eram juízes
constitucionais. Assim, a nossa história constitucional inicia-se com a atribuição destes
poderes aos juízes comuns.
Na Constituição de Estado autocrático (1933), não houve dificuldade em manter, na letra
da constituição, o poder de decidir questões de inconstitucionalidade aos juízes comuns.
Verificamos assim que se começa a formar uma tradição o que faz com que se mantenha
o mesmo sistema na Constituição de 1976.
Esta história é distinta da história constitucional dos demais países europeus que atribui
um grande poder aos juízes comuns.
Assim como é que o Estado Democrático vai ao fim de mais de 1 século retirar aos juízes
comuns um poder que tem desde 1911.

À primeira vista o argumento histórico contra a adoção do reenvio prejudicial faz sentido,
contudo quando aprofundado não faz sentido.
Olhando para o sistema atual, parte-se do pressuposto que este poder atribuído aos juízes
é um poder sério, contudo não é bem assim pois é verdade que o juiz vai decidir, contudo
não terá a última palavra sob o problema. Assim não estamos perante um poder assim tão
significativo, correspondente a apenas uma primeira decisão precária que irá chegar
eventualmente ao Tribunal Constitucional, que terá a decisão final.
O regente Jorge Reis Novais considera que o poder atribuído aos demais juízes europeus
é mais significativo do que o poder dos juízes comuns portugueses.

Na realidade este poder existe de facto apenas nos livros, pelo que não pode ser
considerado uma tradição. De 1911 a 1976 os juízes não aplicavam este poder, devido à
ditadura (houve apenas 1 caso 1973). Pelo que a suposta tradição não vale como contra-
argumento.

Inconstitucionalidades orgânicas ou formais

No regime de fiscalização concreta a possibilidade de arguir inconstitucionalidade


formais ou orgânicas devia ser abolida a não ser que tal inconstitucionalidade fosse de
facto a razão de uma violação de direitos fundamentais.

Mesmo em sede sucessiva abstrata deveria ser estipulado um prazo razoável para a
possibilidade de invocar a inconstitucionalidade após a publicação da norma.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 163


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

ESTADO DE EXCEÇÃO CONSTITUCIONAL39

Numa situação comum do dia-a-dia num Estado de Direito a Constituição deve e tem de
ser observada por todos, incluindo os órgãos políticos. Em situação de normalidade os
órgãos pretendem desenvolver uma atividade e um tribunal diz que não podem pois é
inconstitucional, assim a constituição foi criada para limitar o poder publico tendo como
objetivo garantir os direitos dos cidadãos. Os políticos tendem a ficar constrangidos por
esta limitação.

No estado de regular funcionamento das coisas encontramos uma ilimitabilidade dos


direitos e liberdade, ou seja, em regra todos podem, exceto nos casos em que a
constituição determina que não há possibilidade de limitação devido à consagração de um
direito como regra, norma definitiva (pena de morte/tortura).
A limitação de um Direito constitucionalmente consagrado ocorre, em regra, quando haja
um conflito entre dois direitos de igual natureza, e seja necessário haver cedências.

A própria constituição prevê situações de exceção, nomeadamente o estado de sítio e de


emergência, pelo que não são situações à margem da Constituição.
Estado de sítio considera-se mais gravosa, decretada em situações de golpe de Estado,
quando é necessária uma intervenção radical dos órgãos públicos.
O estado de emergência tende a ser associado a situações de catástrofe natural.

Nestas situações os Direitos Fundamentais, constitucionalmente consagrados, podem ser


constrangidos/limitados pelo poder político, ao contrário do que acontece na
normalidade.

No fundo o artigo 19º regula as questões materiais e procedimentos sobre o Estado de


Emergência, ou seja, quando se pode suspender os Direitos, por quanto tempo
(CRP:19º/5) etc.
CRP: Artigo 19º
A constituição regula a própria situação de exceção constitucional, como se reflete no
normal funcionamento de exercício dos poderes.
Assim o preceito indica que nestas situações de exceção os órgãos políticos podem limitar
os Direitos Fundamentais, CRP: 19º/6 contudo nunca os que aqui se indica.

CRP: 19º/7
A lei a que se refere é uma lei ordinária designada, Lei do Estado de sítio e do Estado de
Emergência, que regula de forma mais aprofundada
CC: 164º e)
A lei tem o caracter de lei orgânica

O Presidente da República que tem uma função determinante, tendo a competência de


declarar o estado de exceção, contudo tem de ouvir o Governo e tem de ser autorizado
pela Assembleia da República, havendo uma intervenção complexa dos diversos órgãos
de soberania.

Assim em estado de normalidade pode ocorrer limitações de direitos fundamentais,


verificamos isso na atualidade, quando em estado de calamidade, onde existe um regular
39Tema que não costuma ser lecionado, contudo o Regente decidiu abordar devido à situação atual de Estado de
Emergência, devido à pandemia causada pelo Covid-19, que se vive em Portugal e no resto do Mundo.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 164


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

acolhimento da Constituição, o Governo mantém alguns direitos limitados. Assim


pergunta-se porque foi necessário decretar um estado de emergência em termos jurídicos?
Tem interesse se permitir realizar algumas coisas que em situação de normalidade não,
designadamente suspender os direitos e garantias que tenhas um caracter absoluto e
definitivos.

CRP: Artigo 27º/1


Diz respeito ao direito à liberdade pessoal. Contudo este pode ser limitado, e diariamente
somos constrangidos na nossa liberdade, como um sinal de trânsito ou a impossibilidade
de fumar num certo local.
CRP: 27º/2
Pode ser limitada, mas a privação total ou parcial da liberdade só em caso de sentença
judicial. Assim ninguém pode ser preso, detido ou confinado a um espaço físico limitado
na situação prevista.
CRP: 27º/3
Outras situações nas quais pode haver uma privação total de liberdade.

Aqui temos uma garantia de caracter absoluto.

Na situação que atravessamos toda a gente reconhece que pode ser necessário confinar
pessoas, sejam infetados ou não, impor um confinamento obrigatório, contudo a nossa
Constituição proíbe isto.
Houveram sugestões para que numa revisão constitucional se acrescentasse no nº3 a
possibilidade de doentes portadores de doença contagiosa.

Contudo era do interesse de todos que esta situação fosse contornada, assim apesar da
constituição dizer isto em estado de exceção constitucional é possível suspender estes
direitos, do confinamento domiciliar ou hospitalar obrigatório.

Aqui compreende-se qual a necessidade de decretar o Estado de Emergência, contudo


este direito não foi suspenso pelo Presidente da República.

Para o regente Jorge Reis Novais é de facto incompreensível, pois este seria o único
motivo que justificaria o Estado de Emergência, pois as demais limitações, como vemos,
podem ser, e estão a ser limitadas na regular aplicação da Constituição.
Contudo, este direito, devido a estar contido num preceito de caracter absoluto como é o
artigo 27º apenas poderia ser limitado ou suspenso numa situação de exceção.

Nos Açores e na Madeira, houve o confinamento obrigatório de toda a gente que chegasse
ás ilhas, o que é inconstitucional. Um cidadão levou este caso a tribunal e foi, como seria
de esperar, considerado inconstitucional. Não se compreende é como é que as entidades
publicas permaneciam impávido e serenos perante uma situação destas.

O governo ao impor o confinamento sem antes ter sido limitado o direito do artigo 27º
cometeu uma inconstitucionalidade, assim como o Presidente da República ao autorizar
o Governo a regular.

Outra inconstitucionalidade cometida pelo decreto do Estado de Emergência foi a


descriminação das pessoas pela sua idade, ou seja, o fator da idade pode ser relevante
para uma maior proteção de uma determinada faixa etária, contudo não pode ser relevante
nem determinante, nem a causa de uma mais agravada limitação dos direitos.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 165


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Assim vemos que mesmo em Estado de Emergência há inconstitucionalidade, pois a


Constituição ao prever estas exceções continua a vigorar e determina como devem ocorrer
as coisas.

Existe tanto inconstitucionalidade matérias, como as que foram anteriormente referidas,


contudo existe ainda a possibilidade de estarmos perante inconstitucionalidades
orgânicas, o que efetivamente.

O Governo assumiu-se como autoridade publica competente de excetuar a limitação, pelo


que aprovou um decreto simples onde fez todas as restrições e limitações aos direitos.

Segundo o regente Jorge Reis Novais nos direitos que foram limitados o Governo podia
ter atuado.
Pois o CRP: Artigo 165º apenas atribui exclusividade à Assembleia da República a
legislação de Direitos Fundamentais, contudo como foram suspensos, durante um período
de tempo não são considerados pelo que não produzem os efeitos jurídicos de direitos
fundamentais, pelo que não fazem parte do núcleo exclusivo da Assembleia da República.

Contudo não podia regular sobre os Direitos que não tinham sido limitados, ou seja, os
direitos estipulados no CRP: Artigo 27º. Estes seriam da reserva absoluta da Assembleia
da República, pelo que ao legislar sobre estes o Governo comete uma
inconstitucionalidade, neste caso, orgânica.

O Governo legislou por um decreto simples, contudo as matérias mais importantes devem
ser reguladas por ato legislativo, de um decreto-lei.
Surgindo deste inconstitucionalidade orgânica uma situação caricata: O presidente da
República ao considerar que seria o normal tal matéria ser regulada por um decreto-lei,
quando recebeu o documento promulgou-o, contudo perante um decreto simples apenas
necessita de o assinar, pelo que ratificou o sue ato no dia seguinte.

Jorge Reis novais considera que o Governo não fez um decreto-lei, pois nesse caso o
documento poderia ser chamado a fiscalizar pelo Assembleia da República e o Governo
pretendia assumir sozinho a elaboração do processo.

O mesmo tipo de inconstitucionalidade se verifica quando os Governo aprovaram todo


um conjunto de disposições sobre Direitos Fundamentais, por vezes através de
resoluções, contudo estes não tinham tal competência por estar matéria ser reservada aos
órgãos de soberania.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 166


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

CASOS PRÁTICOS

RESOLVIDOS

Caso Prático
Autorização Legislativa

A Assembleia da República aprova uma lei de autorização legislativa que entra


em vigor no dia 1 de Abril, fixando o prazo de 180 dias, prazo este que permite ao
Governo legislar numa matéria de reserva relativa da AR. Tendo sido fixado o prazo de
180 dias (6 meses) a autorização caducava no dia 1 de outubro.
No dia 10 de Setembro o Governo aprova o decreto-lei que enviou para ser
promulgado no dia 20 de Setembro.
O Presidente da República promulgou o diploma no dia 30 de outubro e vem a ser
publicado no Diário da República no dia 15 de novembro.
Quid Iuris?

Tendo a lei de autorização legislativa fixado um prazo para o Governo poder legislar em
matéria de reserva relativa, o que está em causa para a resolução do referido caso prático
é a data que se tem de ter em conta quanto à própria actividade legislativa e se ela se
encontra ou não dentro dos limites fixados pela AR.
Uma das indicações constantes da autorização foi a fixação do prazo, se o Governo
legislou num momento posterior surge o vicio de inconstitucionalidade orgânica porque
se apropriou de uma competência que é de reserva relativa da AR, para que o fizesse
dentro dos limites permitidos pela Constituição teria de fazê-lo dentro do prazo ou pedir
uma nova autorização.

O que acontece é que o Governo:


Aprova o decreto dentro do prazo
Envia o decreto dentro do prazo
Contudo:
Presidente da República promulgou o Decreto-Lei fora do prazo
Publicado fora do prazo
Quando está o ato legislativo concluído?

Hipóteses de Resolução:
O Governo tinha de cumprir as indicações e cumpriu, efetivamente, fez tudo o que lhe
era permitido fazer (aprovação e envio) dentro do prazo fixado pela AR, não infringiu
nenhuma indicação. Atendendo a esta perspetiva, é preciso ter em conta aquilo que é
Razoável Exigir do Governo. Ter-se-ia como data marcante o momento de aprovação em
Conselho de Ministros ou, ainda, o envio para promulgação. O inconveniente surge
porque não se sabe o que acontece nas reuniões e, por isso, há quem defenda que se deva
utilizar uma data que seja de conhecimento publico

Numa outra perspectiva, tem-se em conta o momento em que a lei passa a ser eficaz,
nomeadamente, o momento da sua publicação (art. 119). Esta posição não é muito
sustentada.

O que é necessário ter em conta é o momento em que a autorização foi utilizada, o


momento em que passou a existir um decreto-lei feito na utilização da autorização.
O Governo e a Assembleia no exercício da função legislativa aprovam decretos que são

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 167


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

enviados para o PR que os pode vetar ou promulgar como lei ou decreto-lei, quando é
publicado ganha eficácia mas quando é promulgado o decreto-lei passa a existir.
O Artigo 137 esclarece que “a falta de promulgação ou de assinatura do PR (...) implica
a sua inexistência jurídica”. Daqui se pode inferir que o primeiro ato que confere
existência jurídica ao ato é o da promulgação.
O PR recusa a promulgação como lei ou decreto-lei (art. 136).

Neste sentido, a data verdadeiramente relevante seria a de 30 de outubro porque é nesta


data que o decreto ganha existência jurídica e, consequentemente, foi promulgado fora
do prazo, logo, é inconstitucional.

Esta perspectiva tem um grande inconveniente, a promulgação e a existência jurídica


ficam dependentes do PR, tendo 40 dias para promulgar o PR pode alargar o prazo de
maneira a que o faça num momento em que a autorização já tenha caducado.

A hipótese com fundamentos mais sustentados e sólidos é a de ter em conta a data da


promulgação. Porquê?

Facilmente se explica a razão a partir da seguinte hipótese prática:


A AR autorizou o Governo a legislar em matéria de reserva relativa durante todo o ano
de 2017.
No dia 14 de março o Governo utilizou a autorização e enviou um decreto para ser
promulgado para o PR, o PR vetou o diploma no dia 15 do mesmo mês.
No dia 25 de abril o Governo fez as alterações no decreto e enviou novamente para ser
promulgado, no dia 27 o PR promulga.

Se considerarmos que o que se deve ter em conta é a data de envio para promulgação
então a lei promulgada seria inconstitucional, porque o artigo 165/3 esclarece que as
autorizações não podem ser utilizadas mais de uma vez, logo, na hipótese prática o
Governo teria utilizado a mesma autorização em dois momentos. Já considerássemos
apenas o momento da promulgação, a autorização só teria sido utilizada uma vez e não
haveria qualquer problema quanto à constitucionalidade do diploma.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 168


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Caso Prático
Autorização Legislativa

A Assembleia da República aprova uma lei de autorização legislativa que entra


em vigor no dia 1 de Abril, fixando o prazo de 180 dias. Tendo sido fixado o prazo de
180 dias (6 meses) a autorização caducava no dia 1 de outubro.
A Lei de Autorização Legislativa esclarecia que o objecto ou a matéria a regular
incidia sobre os maus tratos a animais domésticos.
No dia 10 de Setembro foi promulgado um diploma que criminalizava os maus
tratos a animais domésticos.
Depois, ainda no mês de Setembro, lançou um novo diploma que criminalizou os
espectáculos de tourada e aproveitou o segundo diploma para alterar o primeiro e
esclarecer, que em relação ao conceito de animal doméstico os crocodilos antes
considerados deixariam de o ser.
Quid Iuris?

O artigo 165/3 esclarece que as autorizações legislativas não podem ser utilizadas mais
de uma vez, sem prejuízo da sua execução parcelada.

O objecto da autorização pode ser muito amplo ou mais restrito, divisível ou não divisível,
parcelável ou não parcelável e, consoante os casos, será ou não possível regular com a
mesma autorização em momentos distintos.

Proposta:
▪ Podia ter feito os dois primeiros diplomas porque incidem sobre a matéria reservada à
Assembleia que pode ser, através de uma autorização, regulada pelo Governo através de
um decreto-lei e porque o artigo 165/3 permite uma execução parcelada:
Maus Tratos a Animais Domésticos;
Proibição das touradas
▪ Não podia ter alterado o conceito de animais domésticos, porque implica uma revogação
do primeiro diploma que já foi publicado e, nesse sentido estar-se-ia a violar o artigo
165/3 que esclarece que “as autorizações legislativas não podem ser utilizadas mais de
uma vez, sem prejuízo da sua execução parcelada.”

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 169


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Caso Prático
Processo Legislativo Parlamentar: Votações Lei Quadro

O Partido Democrático Socialista apresentou uma proposta de lei de criação do


município da Cidade Universitária, área que deixaria, assim, de integrar o município de
Lisboa.
A Proposta foi objeto de votação na generalidade, tendo sido aprovada por 100
votos a favor e 80 contra, tendo os restantes deputados optado pela abstenção.
A proposta foi submetida a discussão e votação na especialidade em comissão,
tendo sido aprovada pela maioria dos Deputados.
Após a votação final global, o Presidente da República concluiu que o diploma
não tinha sido aprovado, por não ter reunido a matéria necessária de dois terços dos
Deputados presentes.
Quid Iuris?

CRP: 164º/n
Competência por reserva absoluta da Assembleia a criação, extinção e modificação de
autarquias locais e respetivo regime, sem prejuízo dos poderes das regiões autónomas.

O primeiro elemento que pode levantar dúvidas é em relação à apresentação da proposta


de lei. O enunciado refere que foi o Partido Socialista a apresentar, não diz se o partido
tem ou não representação parlamentar.

CRP: 167º/1 e RAR:119º/1


Esclarece que só os deputados, os grupos parlamentares, os grupos de cidadãos e as
Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas têm competência para apresentar
proposta ou projeto (depende se a entidade que apresenta é interior ou exterior à AR).

Se o PS tiver assento parlamentar o processo continua e tem competência para o fazer,


caso não tenha representação parlamentar há, desde logo, inconstitucionalidade formal,
porque foi apresentado um projeto por um Partido, e os partidos não o podem fazer.

Outro problema que se pode levantar está relacionado com a instrução. CRP: 249º “a
criação ou a extinção de municípios, bem como a alteração da respetiva área, é efetuada
por lei, precedendo consulta dos órgão das autarquias abrangidas”. O enunciado nada diz
sobre esta questão. Se não foram ouvidos os órgãos das respetivas autarquias ocorre, mais
uma vez, inconstitucionalidade formal.

CRP: 116º/2 e RAR: 58º


O enunciado nada diz em relação ao quórum
Mas consegue-se deduzir que estavam presentes mais de 116 deputados, logo, não existe
qualquer problema a este respeito.

Em relação à matéria a regular, a Constituição não exige, no CRP: 168º uma maioria
qualificada
CRP: 116º/3
Maioria para as 3 fases de votação será a maioria simples (mais votos a favor do que votos
contra). Em relação à votação na generalidade, 100 deputados votaram a favor, 80 contra
e os restantes (50) optaram pela abstenção.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 170


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Quanto à votação na especialidade, mais uma vez, a CRP não exige uma maioria
qualificada, aplicar-se-á, portanto, o artigo 116º/3 e a maioria simples.

CRP: 168º/4
A matéria a regular tem de ser obrigatoriamente vota na especialidade em Plenário.

O enunciado diz que a proposta foi votada na especialidade em comissão, logo, ocorre
inconstitucionalidade formal, mesmo tendo existido uma maioria de votos a favor, a CRP
exigia a votação na especialidade em Plenário, o que não sucedeu.

Em relação à votação final global não é dito o número de votos, apenas diz que o
Parlamento concluiu que a proposta não foi aprovada porque era necessária maioria de
dois terços dos deputados presentes.
Mais uma vez, a CRP nada diz em relação à maioria exigida, logo aplicar-se-ia o artigo
116º/3, apenas seria exigida maioria simples.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 171


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Caso Prático
Processo Legislativo Parlamentar

Em 5 de Março do corrente ano, a Assembleia da República aprovou em votação


final global uma nova lei eleitoral para a eleição do Parlamento que, entre outras
alterações, criava um sistema misto, através da introdução de círculos eleitorais
uninominais, a par de um círculo nacional eleito de acordo com o princípio da
representação proporcional.
O projecto de lei aprovado, da iniciativa de um grupo de cidadãos eleitores, tinha
sido aprovado na generalidade e na especialidade por 116 votos a favor e os restantes 114
contra, tendo estado presentes no mesmo todos os Deputados em efetividade de funções.
Estando o PR no estrangeiro, o decreto foi promulgado pelo Presidente da
Assembleia da República.
O Governo recusou, contudo, a referenda ministerial.
Quid Iuris?
CRP: 164º a)
Reserva absoluta da Assembleia da República legislar sobre as eleições dos titulares dos
órgãos de soberania, logo, só a Assembleia da República tem competência para legislar
sobre a matéria especifica referida no enunciado.

Lei de Iniciativa dos Cidadãos: 6º


A iniciativa foi apresentada por um grupo de cidadãos, não especificando o número.
Exige que a iniciativa tem de ser proposta por um mínimo de 20000 cidadãos eleitores,
caso não existam existe ilegalidade por violação da Lei de Iniciativa dos Cidadãos e
inconstitucionalidade indirecta por violação do artigo 167º/1 quando manda atender aos
“termos e condições estabelecidos na lei”.

Sendo de iniciativa dos cidadãos, ao contrário do que está presente num enunciado, não
se fala em projecto de lei mas sim em proposta de lei, porque a iniciativa legislativa é
externa à AR.

CRP: 116º/2
Relativamente ao quórum, a CRP exige que estejam presentes 116 deputados (atendendo
aos 230 lugares) para que as decisões tomadas possam ser válidas. Estavam presentes os
230 deputados, logo, não existe qualquer problema neste âmbito.

CRP: 166º/2
Perante uma proposta de lei de lei orgânica.

CRP: 116º/3
Na votação na Generalidade não há qualquer imposição constitucional, para aprovação
da proposta, será necessária uma maioria simples.
O enunciado explicita que 116 deputados votaram a favor e 114 deputados contra a lei
foi aprovada (basta que hajam mais votos a favor do que votos contra).
Por exemplo se fossem 115 votos a favor e 115 votos contra a lei não seria aprovada na
generalidade e as etapas do procedimento legislativo terminariam por aqui.

CRP: 168º/4

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 172


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Obrigatoriamente votada na especialidade pelo Plenário, o enunciado não diz se foi no


Plenário ou em Comissão, mas, uma vez que 230 deputados votaram, obviamente, que a
votação ocorreu em Plenário, não existe nenhuma vicissitude quanto a este ponto.

Questão diferente é em relação à maioria exigida para aprovação.

CRP: 168º/6 d)
Disposições das leis que regulam a matéria respeitante às eleições dos titulares dos atos
(164º/a) carecem de ser aprovadas por maioria de dois terços dos deputados presentes,
desde que superior à maioria absoluta dos Deputados em efetividade de funções.
Ou seja, atendendo aos 230 lugares, a maioria absoluta dos deputados em efetividade de
funções equivale a 117 deputados (230/2 = 115; 115+1=116; 116+1=117)

A maioria de dois terços será calculada caso a caso, consoante os deputados presentes na
Assembleia, os votos a favor (maioria de dois terços), terão que ser sempre superiores a
117.
Em principio os 117 deputados não vão variar, só acontece se algum morrer ou se por
alguma razão cessar o mandato, nesse caso diminui o numero de deputados em
efetividade de funções, e, como consequência, vai reduzir, também, o número da maioria
dos deputados em efetividade de funções, porém esta redução é temporária porque o seu
lugar vai ser substituído (153º/2)

Neste caso concreto, visto que estavam presentes os 230 deputados a maioria exigida para
aprovação de algumas das normas na especialidade será de 154 deputados.

Necessário destacar que a imposição que é feita não é para todas as normas da lei mas
apenas para aquelas que dizem respeito ao artigo 164º/a, as restantes, visto que não há
exigência de uma maioria qualificada, serão aprovadas com maioria simples (art.116/3).

Logo, na votação em especialidade serão compreendidas duas maiorias, uma maioria de


dois terços dos deputados presentes, desde que superior à maioria absoluta dos deputados
em efetividade de funções (no caso, 154 deputados) e uma maioria simples ou relativa
(art. 116/3).

CRP: 168º/6 d)
Consequentemente, o enunciado refere que, na votação em especialidade, reuniram-se
116 votos a favor e 114 contra, nesse sentido, as disposições relativas ao artigo não foram
aprovadas, as restantes (todo o regime a que não se aplique a maioria qualificada) foram
aprovadas.

CRP: 168º/5
Quanto à votação final global, as leis orgânicas carecem de aprovação por maioria
absoluta dos deputados em efetividade de funções.
O enunciado não expressa o número exato, mas começa por dizer que a proposta foi
aprovada em votação final global.
Sem recurso a mais dados, resta dizer que para ser aprovada em votação final global
seriam necessários 116 votos (230/2+1=116, ou seja, a maioria absoluta dos deputados
em efetividade de funções).

Tendo em conta que que na especialidade e na generalidade foi aprovada por 116
deputados, não tendo necessariamente de ocorrer, supor-se-á que o mesmo aconteceu na
votação final global e, consequentemente, a lei foi aprovada.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 173


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

CRP: 132º
Para a designação de um presidente da república interino tem de haver um impedimento
efetivo (por exemplo, a morte). O Presidente da Assembleia da República não havia sido
designado presidente interino, logo, incorre inconstitucionalidade orgânica, visto que não
tem competência para praticar o ato da promulgação.

Imaginando que o Parlamento havia sido designado presidente interino haveria a


considerar que a competência para promulgar decorre do artigo 164º/b) que não se
encontra prevista no artigo 139º, logo, poderia promulgar.
O artigo 139º/1 enumera os atos que o PR interino não pode praticar, o 139º/2 enumera
os que pode praticar após a audição do Conselho de Estado.
Todos os demais pode fazer sem necessidade de audição. Não estando o artigo 134/b
(promulgação) em nenhum destes artigos, pode ser feito pelo presidente interino.

CRP: 134º b) e 140º/1


Ato de promulgação está sujeito a referenda ministerial.
Este instituto já vem da monarquia constitucional e destinava-se a controlar o monarca,
hoje em dia não faz sentido. A recusa não ocorre.
Se o Governo pudesse recusar a referenda isso teria repercussões ao nível do sistema de
Governo. No entanto, a CRP não proíbe. A solução consiste em admitir um costume
constitucional e reconhecer que a praxis constitucional impede a recusa da referenda.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 174


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Caso Prático

Em 9 de Março do corrente ano, a Assembleia da República aprovou alterações à


lei que regula a actividade da Entidade Reguladora da Comunicação Social, no sentido
de lhe disponibilizar meios mais eficazes de repressão de violações do princípio da
igualdade no tratamento jornalístico das candidaturas dos partidos políticos nos próximos
actos eleitorais.
O projecto de lei foi aprovado na generalidade e na especialidade por 116 votos a
favor e em votação final global por 176 votos a favor.
O Presidente da república recebeu o decreto para promulgação a 15 de Maio,
tendo-o devolvido à Assembleia da República no dia 20 do mesmo mês, com uma
mensagem fundamentada, na qual invoca a inoportunidade política do decreto em véspera
de eleições para o Parlamento Europeu.
A 31 de Maio, a Assembleia da República voltou a apreciar o diploma devolvido
pelo Presidente da República e deliberou no sentido da sua confirmação, por 117 votos a
favor e os restantes contra.
Quid iuris?

CRP: 39º
A matéria em relação à regulação da comunicação social
CRP: 39º/2 É a lei que tem competência para regular tal matéria e, pela extensão e áreas
abrangidas pelo 39º/1
CRP: 165º/1 b)
Pode e deve considerar-se que o que está em causa são direitos liberdades e garantias,
logo, esta matéria é de reserva relativa de competência legislativa da AR.

CRP: 167º/1
Em relação à iniciativa, o enunciado diz que se trata de um projecto de lei, por isso, teve
de ser apresentado por um deputado ou por um grupo parlamentar, é um projecto interno
à AR.

CRP: 167º/2
As reservas de iniciativa em relação aos deputados incidem sobre os estatutos político-
administrativos das regiões autónomas, sobre as leis eleitorais das regiões autónomas,
sobre a lei do orçamento, a lei das Grandes Opções do Plano e sobre a norma travão
Neste caso não há qualquer reserva, por isso, o/s deputado/s ou o grupo parlamentar tinha
competência para apresentar a iniciativa.

Quanto à instrução, não há qualquer parecer obrigatório nesta matéria.

CRP: 116º/2
O quórum exigido tem de ser a maioria do número legal dos seus membros, atendendo
aos 230 lugares, têm de estar presentes no mínimo 116 deputados (50%+1 deputado).
O enunciado nada nos diz quanto ao número de deputados que estavam presentes mas
pode-se concluir que tendo existido 116 votos a favor, o requisito do quórum estava
assegurado.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 175


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CRP: 168º/6 a)
O referido projecto de lei, carece de uma maioria de dois terços dos deputados presentes,
desde que superior à maioria absoluta dos deputados em efetividade de funções nas 3
votações (Generalidade, especialidade e votação final global).

Mesmo que o artigo não diga expressamente, esta conclusão é inferida tanto para o caso
da alínea a) como para o caso da alínea c). Estas duas alíneas referem-se à lei como um
todo, ou seja, todos os artigos do regime, na especialidade, terão de ser aprovadas por
uma maioria agravada de dois terços, logo, sendo abrangente do regime no seu todo, na
generalidade e na votação final global como também está em causa a totalidade do regime
é essa maioria que se vai aplicar.
Contudo, situação distinta ocorre para as alíneas b), d), e) e f). Neste caso, o preceito
constitucional só se refere a “disposições” e, não já, à totalidade dos artigos constituintes
do projecto, por essa ordem de ideias, a maioria qualificada de dois terços só será aplicada
na votação dessas disposições especificas, nas restantes, serão utilizadas ou a regra geral
(maioria simples, art.116) ou outra maioria exigida pela constituição.

No caso em apreço, tendo em conta que é necessário que existam, pelo menos 117 votos
a favor (“desde que superior à maioria absoluta dos deputados em efetividade de funções)
e considerando que na generalidade e na especialidade só existiram 116 votos a favor, o
projecto de lei não foi aprovado e as etapas do procedimento legislativo cessariam por
aqui.
Pressupondo que estariam presentes os 230 deputados, 2/3 corresponderia a 154
deputados. Ou seja, para o projecto ser aprovado teriam de ter votado a favor 154
deputados. Apesar de existir inconstitucionalidade formal (relativa a uma etapa do
procedimento), na votação final global o projecto de lei teria sido aprovado porque
reuniram-se 176 votos a favor, maioria esta que é superior aos 117 deputados e aos 2/3
dos deputados (154). Uma vez aprovado, o projecto passa a ser um decreto e enviado para
promulgação ao PR.

Quanto à promulgação é necessário ter em conta:


• O respeito pelo prazo;
• Envio de mensagem fundamentada;
• Fundamento em razões políticas (caso o faça com fundamento na
constitucionalidade, alguns autores consideram que foram usurpadas
competências do TC, contudo, a questão é controversa);
No caso em apreço, o prazo foi respeitado, a mensagem fundamentada foi enviada
juntamente com o veto e os fundamentos foram de natureza política (“invoca a
inoportunidade politica do decreto em véspera de eleições para o Parlamento Europeu”),
estão cumpridos todos os requisitos, não há qualquer inconstitucionalidade, seja orgânica,
seja formal.

CRP: 136º/2
O PR vetou e enviou o diploma para a AR, que o veio a confirmar por 117 votos, neste
caso, aplicar-se-ia a regra geral, ou seja, bastaria a confirmação do diploma por maioria
absoluta.
Porém, a doutrina diverge e a questão é discutível. Esta lacuna constitucional, esta falta
de regulação, através da interpretação pode apresentar duas soluções. Este problema, em

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 176


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qualquer caso prático do género tem de ser, sempre, reconhecido antes de se proceder à
tomada de uma das duas posições possíveis:
• Por um lado, como já referido se considerarmos que o artigo 136/2 é um regra
geral que abarca todas as matérias que não estão previstas no artigo 136/3 seria a
maioria absoluta a ser aplicada, independentemente da maioria exigida para
aprovar a proposta ou o projeto durante o procedimento legislativo (votação na
generalidade, votação na especialidade e votação final global)
• Por outro lado, é necessário ter em conta que a lógica da confirmação é garantir,
por um processo agravado, que é a vontade da AR que o diploma seja promulgado,
através deste processo agravado é possível superar a vontade do PR. Se fosse
aplicada uma maioria absoluta num caso do género estar-se-ia, não a reforçar, mas
a facilitar, porque passar-se-ia de uma maioria de dois terços para uma maioria
absoluta, logo, menos exigente. Num caso como este a maioria da doutrina
considera que, não dizendo a CRP nada, quando a maioria de aprovação nas
demais etapas procedimentais é superior à maioria absoluta (art.136/2), é essa
maioria de aprovação que vai ser utilizada, e, por consequência, no caso prático
em apreço, seria necessário uma maioria de 2/3 para o diploma ser confirmado.

Atendendo aos 230 lugares, dois terços equivalem a 154 deputados, como apenas
existiram 117 votos a favor, o diploma não foi confirmado, e, não vai ser promulgado.

Se se considera-se a primeira hipótese, recorrer-se-ia à maioria absoluta, ou seja, mais


uma vez atendendo aos 230 lugares na Assembleia, seriam necessários 116 votos a favor
e, no caso em análise, o diploma em análise seria confirmado e o PR “deverá promulgar
o diploma no prazo de oito dias a contar da sua receção”.

Na minha opinião, ainda que com muitas reservas, parece de preferir a primeira posição.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 177


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Caso Prático

O Governo apresentou à Assembleia da República, em Maio de 2013 uma


proposta de lei de autorização legislativa com o seguinte conteúdo:
“Artigo 1º- Fica o Governo autorizado a definir o regime sancionatório adequado
para punir os crimes contra o património, agravando fortemente as molduras penais, tendo
como objetivo reduzir a criminalidade deste tipo.
Artigo 2º - A autorização legislativa constante do presente diploma vigora até ao
fim de 2018.”
Um mês após a publicação de lei de autorização legislativa, o Governo aprovou
em Conselho de Ministros, um decreto utilizando a autorização legislativa parlamentar
sobre o regime sancionatório dos crimes contra o património mobiliário e um mês depois
legisla em relação aos crimes contra a pátria.
No entanto, a AR havia revogado a lei de autorização legislativa em Dezembro de
2013.
CRP: 165º o)
A matéria em questão incide sobre a definição dos crimes, penas, medidas de segurança
e respectivos pressupostos bem como processo criminal, é matéria de reserva relativa de
competência da AR.
Ou seja, recorrendo à terminologia utilizada perlo professor Blanco de Morais, é a AR
que tem a competência normal para legislar sobre aquela matéria especifica, porem pode
delegar a competência, sem prejuízo de a avocar a qualquer momento, ao Governo
ficando este com a possibilidade de elaborar decretos-leis na utilização dessa autorização
legislativa.

CRP: 167º/1 + 197º/1 d) + 200/1 c)


A proposta foi apresentada pelo Governo, fala-se por isso, numa proposta de lei. Não há
qualquer problema quanto à constitucionalidade do ato. O Governo tem competência para
o fazer e não existem quaisquer limites à iniciativa quanto ao específico ato em análise.
Quanto à apresentação da proposta, apesar de ela poder ser feita, também, por outros
órgãos e entidades não faz sentido que o seja. Uma vez que é o Governo que vai legislar
ao abrigo da lei de autorização legislativa, é ele que a deve apresentar.

CRP: 161 d)
A competência para aprovar uma lei de autorização legislativa pertence à AR, não existe
nenhuma maioria especial exigida, aplicar-se-á a regra geral do artigo 113/6 (maioria
simples).

Não existindo nenhuma referência às demais etapas do procedimento legislativo vamos


partir do pressuposto que tudo decorreu dentro dos moldes exigidos.

CRP: 165º/2
Esclarece que a lei de autorização legislativa deve definir:
• Objeto (equivale à alínea que se utiliza) – Matéria Criminal;
• Sentido (diferente do objetivo; o objetivo é o que se pretende atingir, o sentido é
a forma pela qual se pretende atingir o objetivo) – “Agravar Fortemente as
molduras penais”;
• Extensão – Crimes contra o património (dentro da totalidade de crimes, só estão
abarcados estes);
• Duração – “Até ao fim de 2018”.
Não existe qualquer problema em relação ao objecto, ao sentido e à extensão.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 178


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Em relação à duração, a doutrina diverge. Tendo em conta que a legislatura tem a duração
de 4 sessões legislativas, parte da doutrina considera que é inconstitucional o
prolongamento da autorização para além deste prazo (uma vez que caduca com o termino
da sessão legislativa 165º/4
Por outro lado, e tomo desde já, posição neste sentido, pode defender-se que não existe
qualquer problema de constitucionalidade, é irrelevante a extensão do prazo para além da
duração da sessão legislativa, uma vez que ele vai caducar com o termino da legislatura.
A AR não contrariou qualquer preceito constitucional. Não há inconstitucionalidade.

CRP: 198º/1 b)
Governo pode aprovar decretos-leis ao abrigo da autorização legislativa.
Dado ser um pressuposto normativo para a existência do ato, recorrendo ao artigo 112/3,
o decreto-lei autorizado tem de respeitar a lei de autorização legislativa na sua plenitude.
O património pode ser mobiliário e imobiliário, o Governo decidiu, um mês depois
legislar sobre o património mobiliário.
CRP: 165º/3
Não existe qualquer problema em parcelar/dividir o objecto e legislar em alturas
diferentes

CRP: 281º/2 + 112º/3


Relativamente aos crimes contra a pátria, encontram-se ainda dentro do objecto (matéria
criminal) mas vão além da extensão (matéria patrimonial), o Governo excedeu o âmbito
da autorização, falar-se-á, portanto em inconstitucionalidade orgânica (visto que legislou
em matéria que não é da sua competência, é da competência relativa da AR) e ilegalidade

Sempre que for excedido o âmbito da autorização (qualquer um dos requisitos) fala-se
em inconstitucionalidade orgânica (o Governo não tem competência para legislar em
matéria de reserva relativa de competência sem autorização), porém, está-se perante uma
cumulação de vícios, fala-se, também, em ilegalidade (violação de lei com valor
reforçado por força dos artigos 112/3 e 281/1, b)).

Recorrendo ao princípio do aproveitamento máximo do ato jurídico, deve aproveitar-se o


máximo que se poder do diploma, o decreto-lei só é inconstitucional na parte em que
viola a lei de autorização legislativa.

A AR pode revogar livremente a lei de autorização legislativa (avocar a competência a si


novamente), pode legislar também sobre a matéria. O valor reforçado é o da lei de
autorização.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 179


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Caso Prático

a) Em 2008, a Assembleia da República aprovou a Lei de bases da saúde, cujo


artigo 14º, nº1, alínea a), determina que “Os utentes têm direito a escolher, no âmbito do
sistema de saúde e na medida dos recursos existentes e de acordo com as regras de
organização, o serviço e agentes prestadores”.
Passados alguns meses, a mesma Assembleia da República decidiu desenvolver
estas bases, aprovando uma Lei de desenvolvimento sobre o regime das taxas
moderadoras.
No ano seguinte, o Governo aprovou uma Portaria sobre os direitos e deveres dos
utentes do Serviço Nacional de Saúde, que também desenvolve a Lei de bases em questão.
Nesse diploma, previa-se que os utentes eram obrigados a ficar com o médico que lhes
fosse atribuído e tinham necessariamente de ser seguidos no centro de saúde e hospital da
sua zona de referência.
Em 2013, na sequência de eleições legislativas, o recém-eleito Governo aprovou,
depois de lhe ter sido concedida a competente autorização legislativa, um Decreto-lei de
bases da saúde integralmente novo.
Quid Iuris?

b) Em 2012, a Assembleia da República aprovou a Lei de bases da pesca da


sardinha, que estabelecia, entre outras normas, que não poderia ser apanhada sardinha
com comprimento inferior a 110mm e que, em pesca de arrasto, só seria permitida a sua
apanha como captura acessória até 10% do total a bordo.
Na sequência deste acto, o Governo – invocando aquela lei como seu parâmetro –
aprovou um decreto-lei de desenvolvimento deste regime que reduziu o tamanho mínimo
da sardinha para 100mm e aumentou a percentagem de captura acessória permitida na
pesca de arrasto para 20%.
A Assembleia da República optou por revogar o decreto-lei de desenvolvimento.
Quid Iuris?

a)
CRP: 165/1 f)
Competência de reserva relativa da AR aprovar as bases do sistema de segurança social
e do serviço nacional de saúde.

As leis de bases contêm os grandes princípios, os princípios gerais de um regime (contêm


um conteúdo genérico).
• Liberdade de escolher;
• Limitado pelos recursos;
• De acordo com as regras;
Sempre que na regra de competência apareça “regime geral” só se aplica se for para todos
os casos, por exemplo, a alínea i) esclarece que é da competência de reserva relativa da
AR a “criação... do regime geral das taxas e demais contribuições...”, por isso não se
podia aplicar esta alínea no presente caso prático, atendendo que só estão em causa as
taxas moderadoras.

CRP: 161º c) + 198º/1 a) e c)


Um problema que pode surgir frequentemente é perceber quem tem competência para o
desenvolvimento de leis de bases.

• Há quem entenda que só o Governo pode desenvolver leis de bases;

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 180


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

• Há quem entenda que esta reserva do Governo incide sobre matérias


concorrenciais, em nome de uma ideia de divisão de tarefas entre o Parlamento e
o Governo.
• Há quem entenda que a reserva é tanto de matéria concorrencial como de matéria
reservada;
• Há quem entenda que tanto a AR como o G podem desenvolver;
Deve sempre explicar-se o problema e tomar uma posição.

Temos de saber qual o órgão com competência para desenvolver as leis de bases.

Um dos argumentos que pode ser utilizado é que o artigo 198/1/a) permite que o Governo
aprove matéria de área concorrencial, é área concorrencial, pode fazê-lo.

Por outro lado, o artigo 198/1/c) criaria uma reserva e só o Governo poderia desenvolver
leis de bases.

Porém, parte da doutrina e o TC vem dizer que não é criada qualquer reserva, a única
reserva que existe está no artigo 198/2.

Quanto ao caso, em relação ao desenvolvimento das leis de bases sobre as taxas


moderadoras, a doutrina diverge:
• Para o TC pode;
• Para o professor Jorge Miranda pode;
• Para o professor Blanco Morais não pode (inconstitucionalidade orgânica); Para
o professor Paulo Otero não pode (inconstitucionalidade orgânica).
Em relação ao desenvolvimento de uma lei de bases por uma portaria está inerente o vicio
de inconstitucionalidade formal.
O sentido útil do artigo 198/1/c) é de esclarecer e de impor que o desenvolvimento de
bases seja feito por decreto-lei.

CRP: 180º/2 a)
Mesmo que não existisse este problema, a portaria vem contrariar o previsto na lei de
bases, tendo em conta que por força do artigo 112/2 e 112/3 a lei de bases tem valor
reforçado face aos decretos-legislativos de desenvolvimento de lei de bases, surge, aqui,
o vicio da ilegalidade por violação de valor reforçado ou inconstitucionalidade indirecta

Continuando o caso prático, é nos dito que o Governo aprovou um Decreto-Lei de bases.
A questão que surge é: O Governo pode fazer isto?
• Em matéria concorrencial pode CRP:198º/1 a)
• Em matéria de reserva relativa pode, desde que tenha autorização legislativa para
tal CRP: 198º/1 b) + 165º/1 b)
No presente caso, a matéria em questão é de reserva relativa da AR (165/1/f), logo, se for
aprovada uma lei de autorização legislativa (foi) o Governo pode aprovar um decreto-lei
de desenvolvimento (mesmo que por força dos artigos 112/2 e 112/3 tenha de respeitar a
LAL).

Na resolução do caso, teriam de ser verificados todos os requisitos e o processo de


aprovação não só da lei de bases, como também, da LAL.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 181


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Foi aprovada um decreto-lei de bases o que significa que em termos de eficácia na relação
que é estabelecida com os outros atos legislativos:
• Os decretos-leis de desenvolvimento da antiga lei de bases que forem compatíveis
mantém-se em vigência;
• Se houver contrariedade, surge a ilegalidade (por violação de valor reforçado,
artigo 112/2 e 3 e artigo 280/2/a)), e a vigência cessa.
Quando se aprova uma nova lei de bases não se coloca em causa a vigência de todos os
decretos-leis de desenvolvimento aprovados ao abrigo do anterior regime, é necessário
que haja racionalidade e algum pragmatismo.

As leis de bases contém os grandes princípios e orientações e, por norma, representam


sectores importantes da sociedade, no caso, o serviço nacional de saúde. Se cada vez que
é aprovada uma nova lei de bases cessasse a vigência de todos os decretos-leis de
desenvolvimento de leis de bases, estar-se-ia a colocar em causa a própria segurança
jurídica (artigo 2o CRP – Estado de Direito Democrático).
Porém, se forem incompatíveis são tacitamente revogadas ou derrogadas por
incompatibilidade superveniente com a lei nova (incompatibilidade do objeto – é a norma
parâmetro, não pode ser desrespeitada).

b)
A competência consta do CRP: 161º c) (não é o 165/1/g), é matéria concorrencial.

O Governo pode desenvolver, todos os autores convergem com esta posição (artigo
198/1/c)), os professores Jorge Miranda e Paulo Otero entendem que a AR não podia
desenvolver, mas, de qualquer maneira, não é essa a questão que se coloca.

CRP: 198º/1 c) + 198º/3


O Governo autolimitou-se e decidiu legislar subordinado à lei de bases. Esta posição é a
adota pelo professor Blanco de Morais.

Ou seja, sendo matéria concorrencial existem duas hipóteses:


• Se não invocar a lei de bases o G pode legislar como quiser, não existe qualquer
vinculação ou subordinação, é competência do G, é matéria concorrencial, o G
quando aprova uma nova regulação revoga a lei de bases (a lei de bases está no
mesmo plano, só tem hierarquia superior face aos decretos-leis de
desenvolvimento) –todas as leis podem revogar todas as leis. Lei e decreto-lei
podem revogar-se mutuamente (artigo 112 – lei e decreto-lei têm igual valor); lex
posterior derroga lei anterior.
• Porém, se porventura o Governo invocar a lei de bases (artigo 198/3), escolhe
autolimitar-se e tem de a respeitar, como lei de valor reforçado que passa a ser.
Se invoca tem de respeitar. O artigo 198/3 acarreta um dever genérico de respeito.
O artigo 112/2 não distingue matéria de reserva e matéria concorrencial, logo, o
desenvolvimento de uma lei de bases tem de estar sempre subordinado.
Pode Revogar? Depende da posição que se adotar:
• AR não pode revogar (Paulo Otero e Jorge Miranda);
• AR pode revogar (TC, BM)
Se considerarmos que é matéria de reserva do G não o pode fazer. Se considerarmos que
é matéria concorrencial, pode.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 182


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Caso Prático

Em Janeiro de 2014, o Governo Regional da Região Autónoma dos Açores


apresentou à Assembleia da República uma proposta de alteração do Estatuto Político-
Administrativo da Região Autónoma dos Açores que incluía normas sobre as seguintes
três matérias:
a) O estatuto dos titulares dos órgãos de governo próprio da Região;
b) O regime das finanças regionais, no sentido de aprofundar a autonomia
financeira;
c) A criação do crime de fraude académica aplicável a todas as universidades
portuguesas, tanto públicas quanto privadas, portuguesas.

A Assembleia da República introduziu as seguintes alterações à proposta que lhe foi


submetida:
1)Alterou substancialmente a matéria da alínea b) no sentido de reduzir drasticamente o
nível de autonomia financeira regional, atento o nível de endividamento da parte da
Região Autónoma da Madeira;
2)Modificou a lista de matérias que integram o poder legislativo da Região Autónoma
dos Açores, reduzindo-a.
O decreto foi enviado para o Presidente da República, que o promulgou.
Quid Iuris?

Em Outubro de 2014, o Governo apresentou à Assembleia da República a sua proposta


de Lei de Orçamento de Estado (LOE). A proposta de LOE alterava:

1) O artigo 14º da Lei de Enquadramento do Orçamento de Estado;


2) O disposto no artigo 16.o dos Estatutos Político-Administrativos da Região Autónoma
da Madeira.

Uma vez aprovada na Assembleia da República por maioria simples e enviada para o
Presidente da República para promulgação, este vetou-a, por a considerar inconstitucional
por não ter sido precedida pela Lei das Grandes Opções do Plano.

Foi apresentada à AR uma proposta de alteração do EPARAA que abrangia 3 grandes


questões:
• Estatuto dos titulares dos órgãos de soberania;
• Regime das finanças regionais;
• Fraude académica;
CRP: 161º b)
A competência para aprovar alterações aos estatutos regionais pertence à AR

Recorrendo aos artigos 167/1 e 161/b) e 226 percebe-se que apesar da competência para
aprovação pertencer à AR, a competência para apresentação da iniciativa compete às
Assembleias Legislativas das regiões autónomas (“os projectos dos estatutos politico-
administrativos e de leis relativas à eleição dos deputados às Assembleias Legislativas
das regiões autónomas são elaborados por estas e enviados para discussão e aprovação à
Assembleia da república”, artigo 226/2 CRP).

Como a iniciativa foi do Governo regional, surge o vicio de inconstitucionalidade formal


(o vicio foi no processo e não tem a ver com a competência – aprovação -, não pode ser
inconstitucionalidade orgânica).

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 183


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

É uma proposta de lei (externa à AR), tem de ser da iniciativa da Assembleia Legislativa
Regional. A inércia por parte das regiões autónomas, muitas vezes, impede a revisão dos
estatutos, é necessário que haja iniciativa por parte das Assembleias Legislativas
Regionais.

O Estatuto concretiza a autonomia politico-administrativa das regiões, tem um valor


reforçado, qualquer norma o tem de respeitar, é a mais reforçada de todas as leis
reforçadas.

1ª Proposta – 231/7 – a própria constituição diz que a matéria tem de estar no estatuto,
faz sentido que seja objeto do estatuto.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 184


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SUGESTÕES PARA RESOLVER

Caso Prático

O governo apresentou na AR uma proposta de lei de autorização legislativa que


previa que o governo fosse autorizado a legislar sobre bases do sistema de proteção da
natureza e do património cultural até ao final de agosto. A proposta foi aprovada mas
apenas quanto à proteção da natureza. Tendo a lei de autorização sido publicada, o
Governo aprovou em junho de 2020, um decreto-lei que atribuía à Ministra da cultura
competência para autorizar filmagens comerciais em edifícios classificados, devendo
fazê-lo, dizia o decreto, com a observância dos princípios constantes na lei de bases em
vigor.
Na mesma altura, o Governo aprovou um decreto-lei sobre bases de proteção da
natureza que, todavia, foi vetado pelo PR. Tendo em conta as objeções do Presidente da
República, o Governo alterou profundamente o diploma em causa, em reunião do
Conselho de Ministros, de 15 de agosto, tendo enviado ao PR o decreto para ser
promulgado a 20 de agosto. O decreto foi promulgado a 2 de setembro, após o que foi
publicado e entrou em vigor.
A 2 janeiro 2020 o novo governo saído das eleições de dezembro apresentou a AR
um projeto lei autorizando o governo a criar em 90 dias, um novo imposto de
solidariedade, com uma taxa única de 10%, aplicável aos rendimentos oferidos desde
janeiro de 2010
O diploma aqui designado por lei A foi aprovado pela maioria simples dos
deputados efetivos na especialidade em comissão mas por maioria absoluta dos mesmo
em votação final global. Uma vez que foi requerida urgência pelo governo prescindiu se
da discussão na generalidade.
No dia 7 de maio do mesmo ano o governo ao abrigo da autorização constante da
lei A aprovou o decreto lei B o qual atribui ao imposto de solidariedade uma natureza
excecional e determinou que o mesmo incidiria apenas sobre funcionários públicos e
reformados da função publica.
No dia 12 de junho do mesmo ano foi publicado um decreto legislativo regional C
aprovado pela ALRMadeira que ao abrigo do poder tributário próprio da região se
propunha desenvolver para o âmbito territorial desta o que qualificou como “as normas
de enquadramento” constantes do decreto lei B, alterando a taxa de 10 para 5% e
isentando do mesmo os rabalhado res da função publica da autarquia locais da região.
Contudo no dia 1 d outubro 10 deputados requereram a apreciação parlamentar
deste diploma na assembleia da república e uma semana depois a AR aprovou a resolução
D que introduzia alterações à taxa.
No dia 15 de Dezembro de 2020 por iniciativa do representante da república da
RA da Madeira, o qual impugnou o Decreto legislativo regional C com fundamento em
inconstitucionalidade orgânica, o TC declarou a inconstitucionalidade com força
obrigatória geral do mesmo ato legislativo, com fundamento em vicio formal, mas
salvaguardou os efeito por ele produzidos anteriormente invocando especiais razões de
interesse nacional.
Simultaneamente o TC decidiu declarar tmb a inconstitucionalidade de um
regulamento regional que dava execução ao mesmo decreto legislativo

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 185


Direito Constitucional II | Regente Jorge Reis Novais

Caso Prático

Perante os resultados obtidos pelos atletas portugueses nas diferentes competições


internacionais, a AR concedeu em 20 de julho de 2019, uma autorização legislativa ao
Governo para que este elaborasse um DL de Bases do desporto incentivando a prática do
desporto desde os três anos de idade e viabilizando a conciliação da prática desportiva
com o aproveitamento escolar. No art. 18.º da referida lei previa-se também que as escolas
que não tivessem adequadas instalações desportivas seriam objeto de contraordenação
punível com coima até 200.000€.
Tendo sido objeto de votação final global com 100 votos a favor 15 contra e
nenhuma abstenção o diploma foi remetido para promulgação
Perante dúvidas sobre a constitucionalidade das contraordenações o Presidente da
República vetou o diploma devolvendo-o à Assembleia da República que o confirmou
por maioria dos deputados presentes.
O Ministro da educação o secretário de estado de juventude e o Ministro da saúde
aprovaram o respetivo decreto de lei autorizado, mas o Presidente da República requereu
a fiscalização preventiva do decreto o Tribunal Constitucional passados 30 dias ainda não
se pronunciou.
A escola básica de Tondela, de reduzida dimensão dado o número de aluno que a
frequenta não possui qualquer instalação desportiva. Tendo ouvido nas notícias qual seria
o teor do diploma, nomeadamente a previsão da referida contraordenação, o diretor da
escola apresentou um pedido de fiscalização sucessiva concreta no tribunal de comarca
de Tondela invocando a inconstitucionalidade do artigo 18º por violação da reserva de
lei.

Caso Prático nº4

Para estimular o mercado único digital europeu em 15 de março de 2020 a AR


aprovou com os votos a favor da maioria dos deputados efetivos, a lei A que autorizava
o governo a criar benefícios fiscais sobre as transações comerciais que envolvessem bit
coins.
Em junho o governo aprovou o decreto de lei B que criava um imposto especial
com uma taxa única de 25% sobre cada transação referida e 15 dias depois o decreto lei
C que estendia a mesma taxa a todos os negócios realizados através da internet.
Em janeiro de 2025 na sequência de enumeras queixas que lhe foram dirigidas o
provedor de justiça pediu ao Tc que se pronunciasse sobre a eventual
inconstitucionalidade do decreto lei b no prazo de 25 dias
Os juízos deram razão as dúvidas do provedor e declaram a inconstitucionalidade
dos decretos leis b e c com efeitos a partir de janeiro do ano seguinte.

Caso Pratico nº5

Em 19 junho 2018 a AR, na sequência de um projeto do governo, aprovou por maioria


absoluta dos deputados por maioria absoluta dos deputados em efetividade de funções a
lei A que punha fim a eleição direta das camaras municipais. Tendo recebido o decreto
para promulgação o PR vetou de imediato com fundamento na sua inconstitucionalidade.
Simultaneamente requereu a fiscalização da constitucionalidade da lei de revisão
constitucional x que no seu artigo 3 alterava o artigo 41º/4 no sentido de a religião católica
passar a gozar de um estatuto especial perante o estado.

Sofia Cunha FDUL 2019/2020 186

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