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APONTAMENTOS DE DIREITO COMERCIAL I – MC

Direito Comercial – Notas Introdutórias


O direito comercial é definido ora como o direito privado especial do comércio ora como direito
dos comerciantes ou dos comerciantes e das empresas.
O direito comercial é direito privado. Integra uma área normativa dominada por vetores de
igualdade e liberdade: os diversos sujeitos apresentam-se sem poderes de autoridade e podem,
em princípio, desenvolver todas as atividades que a lei não proíba (contrariamente ao direito
público na qual nos deparamos com entidades, que em contrapartida, só podem agir quando
uma lei o permita.
O direito comercial, tal como o direito civil, previne intervenções arbitrárias do poder, e
assegura aos particulares, um plano de livre desenvolvimento das suas personalidades.
Além disso, a sua natureza privada é essencial para demarcar o direito comercial do direito do
comércio internacional e do direito público da distribuição dos bens.
A natureza privada do direito comercial, tal como sucede com o direito civil, revela-se apenas a
nível de sistema.

Um direito especial
O direito comercial é considerado especial (de forma a distinguir-se do direito civil – direito
comum). A relação de especialidade ocorre quando, perante um complexo normativo que se
dirija a uma generalidade de situações jurídicas, um segundo complexo, mais restrito, mas mais
intenso, contemple uma situação que, de outro modo, respeitaria ao primeiro, dispensando-lhe
um tratamento particularmente adequado.
A adequação pode resultar de normas diferenciadas que estabeleçam situações diversas ou de
regras complementadoras que precisem, num ou noutro sentido, soluções deixadas em aberto
pelo direito comum. Pode-se assim dizer que a especialidade é relativa e que se impõem
quando perante duas áreas normativas é possível estabelecer uma relação geral/especial
(ex: direito comercial é especial em relação ao direito civil ou ao direito bancário).
Permite também uma aplicação subsidiária do direito civil. Embora haja áreas comerciais
importantes que não têm, subjacente, qualquer regra civil (ex: títulos de crédito). As próprias
sociedades comerciais e os denominados grupos de sociedades apresentam regras que
transcendem o direito civil.
A especialidade, resulta assim de níveis regulares mais gerais e, sobretudo, da própria
materialidade das regras consideradas.

Direito do comércio ou dos comerciantes


O direito comercial é um direito do comércio/comerciantes. Tecnicamente, o comércio – que
engloba, em direito, a indústria, é a atividade lucrativa da produção, distribuição e venda de
bens. O termo “comércio” pode, com propriedade, aplicar-se a qualquer dos segmentos do
circuito que une produtores a consumidores finais e ainda às atividades conexas e
acessórias.
O direito do comércio pode ser:
o Objetivo
o Subjetivo

Qualquer ramo jurídico, para mais especial, pode ser sempre configurado num sistema
subjetivo: regulando o comércio, regulam-se os comerciantes.

Conclusões (prof. Ana Perestrelo de Oliveira):


o O direito comercial trata de atos de comércio. Quando nos referimos a atos podemos
falar em contratos.
o Saber se um ato é comercial é importante para sabermos se há solidariedade (esta
tem de ser plural). Encontramos tal afirmação no art.100º do CComercial (que é
contrário ao disposto no art.513º, CC).

Atos de Comércio
MC: conjunto das situações jurídicas comerciais que se regem pelas normas competentes de
direito mercantil.
Ao abrigo do art.1º (CComercial), a lei comercial rege os atos de comércio, explicitando o que
é um ato de comércio no art.2º (CComercial) no qual “serão considerados atos de comércio…
todos os contratos e obrigações dos comerciantes…”. Podem ser:
o Contratos Comerciais
o Atos Unilaterais
o Atos strictu sensu – aqueles que já não se analisassem em atuações humana, mas apenas
em eventualidades que se desencadeassem efeitos de direito (ex: endosso)
o Factos jurídicos strictu sensu (ex: abalroação de um navio)

Nota: uma obrigação não é um ato


Uma vez que foi fixado um alcance amplo para “atos” de comércio, o código no seu art.2º,
recorre a dois critérios distintos:
o Critério objetivo: atos especialmente regulados no Código
o Critério subjetivo: atos de comerciantes

Atos de Comércio Objetivos


São factos jurídicos voluntários (ou atos) previstos em lei comercial e análogos. A
comercialidade depende do ato em si, independentemente de quem os pratica. Estão
especialmente regulados em lei comercial. Ao abrigo do art.2º/1ª parte (CComercial) são atos de
comércio objetivo “todos aqueles que se acharem especialmente regulados neste Código…”
Ex: A professora (não comerciante) compra um computador a B com a intenção de revenda.
Presente no art. 463º (CComercial).
Analisando o preceito legal:
Atos comerciais em que a comercialidade deriva do ato em si
o “atos” = entendido amplamente pela doutrina como os factos e as situações jurídicas
que eles originem (contratos, atos unilaterais, atos não negociais, factos strictu sensu,
etc)

o “especialmente regulados” = obedecem a uma lógica diferente que é conexionável ao


direito comercial e por isso tem relação especial face ao direito civil
- Valorizações diferentes das da lei civil, obedecendo a uma lógica do direito
comercial (prende-se com a atividade comercial)
- Não significa que sejam todos os atos regulados em legislação comercial, mas
sim aqueles “especialmente” regulados – em desvio ao regime geral (que
resulta sempre de um juízo de pertença ao sistema especial)
 Tem que aflorar uma característica de especialidade (valoração feita
perante a correspondente regra civil)
 Atos concretamente caracterizados pelas notas caracterizadoras ou
requisitos previstos no CComercial.

o “neste código” = entendido como toda a legislação comercial. Contudo temos de


interpretar o preceito amplamente, sendo comerciais todos os atos regidos:
- Pelo CComercial
- Por diplomas que substituam normas do CComercial (ex: Leis Uniformes,
Código das Sociedades Comerciais…)
- Por normas extravagantes que se assumam como comerciais (ex: regime do
arrendamento comercial)

Teoria da Acessoriedade
A presente teoria não é uma realidade, pois não consta da lei. É sim uma teoria defendida por
Cunha Gonçalves segundo a qual a generalidade dos atos acessórios de atos de comércio são
comerciais.
A lógica da Teoria da Acessoriedade é que o Código tem um conjunto de regras que associa a
comercialidade à acessoriedade ao ato de comércio, logo tudo que é acessório é comercial.
Todas as regras que prevêem atos de comércio por acessoriedade, extrai-se o princípio geral e
este princípio seria aplicado (recorria-se assim à analogia iuris).

Críticas à Teoria da Acessoriedade (Prof. Ana Perestrelo de Oliveira)


o Insuficiente fundamentação (raciocínio da analogia iuris sem o reforço argumentativo
subjacente)
o Quebra da tipicidade (art.2º) pretende limitar os atos de comércio.

Podem-se considerar atos comerciais por analogia?


Tendo em conta atos não regulados legislativamente ou previstos em lei cujo carácter
(comercial ou outro) não é declarado (direta ou indiretamente):
NÃO - Guilherme Moreira, Fernando Olavo, devido a:
o Letra da lei – apenas os da legislação comercial (a letra não é concludente, pois não diz
“apenas”)
o Razão histórica - inspiração do CComércio espanhol (1885) em que afastou o preceito
espanhol que referia atos de natureza análoga, em linha de conta com os trabalhos
preparatórios (não se pode fazer interpretação subjetivista-histórica das leis)
o Certeza e Segurança Jurídica – dado o regime especial e as implicações dos atos de
comércio (valor da justiça ou razoabilidade sobreleva-se)
SIM – Menezes Cordeiro, Januário Costa Gomes, Coutinho de Abreu
Ex: contrato de agência (que é claramente comercial) pode ser a base que faz a analogia para o
contrato de concessão comercial.
Contudo, esta analogia, é para efeitos do regime dos atos já qualificados como comerciais
(não para qualificar como comercial). Isto porque o direito comercial tem lógica intrínseca em
que se aplica uma conjunção de interesses e valores (art.3º, CComercial – se as questões sobre
direitos e obrigações dos atos comerciais não puderem ser resolvidos pela Lei Comercial, pelo
seu espírito ou pela analogia são decididas pelo CC).

- O problema das “empresas” do art.230º, a questão da Analogia Iuris


A doutrina mais avançada tem-no admitido para os atos comerciais a partir de princípios
gerais tirados de normas gerais.
Estamos perante duas grandes linhas de interpretação:
o Empresa-atividade, que entende estarem em causa as atuações ou conjuntos de atos
enunciados (defendida por Coutinho de Abreu). Aqui o art.230º permitia enunciar
novos atos como objetivamente comerciais.
o Empresa-organização, que julga tratar-se das entidades singulares ou coletivas, que
desenvolvam depois as referenciadas atividades (defendida por Cunha Gonçalves). Aqui
no art.230º seriam referenciados comerciantes, autores de hipotéticos atos comerciais
(sentido subjetivo).
o Opiniões mista (defendida por OA): lei enuncia empresas comerciais (ex:
comerciantes), mas pela via de considerar comerciais as respetivas atividades.
Negócios sobre empresas comerciais são atos objetivamente comerciais, por analogia.
MC: perante um ato que não esteja especialmente regulado no CComercial, ou situação
equivalente, há que verificar se o seu regime é “comercial e especial”. Sendo a resposta
positiva, o ato é comercial.

QUALIFICAÇÃO DE ATOS DE COMÉRCIO POR ANALOGIA – COUTINHO DE ABREU

Questão
A enumeração implícita dos atos de comércio resultante do art.2º/1ª parte (CComercial) é
exemplificativa ou taxativa? Atos não regulados legislativamente, ou previstos em leis cujo
carácter (comercial ou outro) não é declarado (direta ou indiretamente) podem ser qualificados
comerciais por analogia com atos previstos em lei mercantil?
Este problema, que tem dividido a doutrina portuguesa, não se resolve recorrendo ao art.3º
(CComercial), cuja norma, admite o recurso à analogia para regular atos já qualificados
como comerciais. Porém a presente questão diz respeito a lacunas de regulação e não a
lacunas de qualificação.
Tese da Inadmissibilidade da qualificação de atos mercantis por analogia:
Defensores
Invocam três argumentos principais:
o Letra da Lei: “serão considerados atos de comércio todos aqueles que se acharem
especialmente regulados neste Código, e, além deles…”
É um enunciado que, além dos atos subjetivos de comércio, apenas permitiria como
atos comerciais os “especialmente regulados” em lei mercantil.
o Razão Histórica: A 1ªparte do art.2º (CComercial) foi inspirada no 2º parágrafo do art.2º
do Código Comercial Espanhol (“serán reputados atos de comercio los compreendidos
en este Codigo y cualesquiera otros de naturaleza análoga”) – e a parte final deste
parágrafo foi deliberadamente afastada da nossa lei.
o Certeza e Segurança Jurídica: Dado o regime especial e as implicações dos atos de
comércio, seria atentar contra o valor jurídico da segurança permitir a analogia na
determinação de atos mercantis.
Coutinho de Abreu: Não concorda, alegando que a letra do art.2º não é concludente. Ou seja,
não diz que, além dos subjetivos, são atos de comércio apenas os especialmente regulados em
lei comercial. Segundo, a conceção subjetivista-histórica da interpretação da lei está
cessada/perimida. O argumento da certeza jurídica já pesou muito mais do que agora (visto
que foi extinta a jurisdição mercantil) e, porque o valor da justiça ou razoabilidade há de
sobrelevar.

Para qualificar atos como comerciais, é legítimo, recorrer à analogia? Analogia Legis e/ou
Analogia Iuris?
O recurso à analogia legis não levantará grandes dúvidas. A questão levanta-se sim
relativamente à analogia iuris.
A analogia iuris, consiste, na aplicação de “princípios gerais” obtidos através de induções
lógico-generalizadoras de uma série de normas legais a casos omissos.
Ora, quem defenda a existência de um conceito unitário de ato de comércio irá defender o
recurso à analogia iuris. Porém não havendo um conceito unitário de ato comercial, não será
possível extrair (vários) “princípios gerais” de (vários) grupos de normas qualificadoras (por
razões idênticas ou similares) de diversos atos como atos de comércio – possibilitando o recurso
à analogia iuris?
Coutinho de Abreu, admite o recurso à analogia iuris nos seguintes casos:
o Empresas de Construção (art.230º/6, CComercial): Este artigo refere-se somente a
“casas”, contudo, não serão então comerciais as empresas construtoras de edifícios no
mais sentido amplos, bem como de outras obras (vias de comunicação, barragens,
molhes…?). A norma deve assim ser estendida analogicamente (analogia legis)
àquelas outras empresas de construção.

o Empresas de (prestação) de serviços: se as empresas de serviços não podem ser


qualificadas de comerciais pelo recurso à analogia legis (não há uma norma precisa que
considera comercial uma empresa que pudesse dizer-se análoga a alguma(s) daqueles –
art.10º/1/2, CC), já podem sê-lo pelo recurso à teleologia imanente ao sistema legal
mercantil, ao seu espírito, à analogia iuris (art.10º/3, CC).
O facto de a lei, quer no CComercial (arts.230º/2/3/4/5/7, 403º, ss) quer em diplomas
ulteriores, considerar comerciais muito variadas empresas de serviços conduz-nos a
esta conclusão no qual haverá assim um “princípio geral de direito” comercial
segundo o qual as empresas de serviços são, em regra, comerciais.
Os negócios sobre empresas comerciais são atos objetivamente comerciais.

o Contrato de Agência: contrato no qual uma das partes se obriga a promover por
conta da outra a celebração de contratos, de modo autónomo e estável e mediante
retribuição, podendo ser-lhe atribuída certa zona ou determinado círculo de clientes.

o Concessão Comercial: Contrato de carácter duradouro pelo qual o concedente se obriga


a vender (sucessivamente) bens por si produzidos ou distribuídos ao concessionário,
obrigando-se este a comprá-los e a promover, nas condições acordadas e em nome e por
conta própria, a respetiva revenda. O contrato de concessão material não se confunde
com o contrato de CV: aquele que têm carácter duradouro, é fonte da celebração de
vários e sucessivos contratos de CV, caracteriza-se por um conjunto de direitos e
obrigações mais complexo do que o do simples contrato de CV.
O contrato de concessão comercial consubstancia um ato de interposição nas
trocas, é pressuposto necessário de uma atividade de intermediação nas trocas. Por isso
se deve qualificar tal ato, com recurso à analogia iuris, como ato de comércio.

Conclusões (Prof. Ana Perestrelo de Oliveira)


O artigo 230º (CComercial) é o que mais gera discussão na matéria dos atos de comércio, pois
não se percebe bem o que é isto das empresas. A empresa é um conceito com sentidos
diversificados, a lei refere-se a empresas singulares ou coletivas logo a primeira intuição ao ler
o artigo é que tratamos de empresas no sentido subjetivo (empresa = comerciante).
O que é que regula o art.230º? Este qualifica pessoas como comerciantes ou atos como
comerciais?
o Interpretação subjetiva: qualifica como comerciantes. Pessoas singulares ou coletivas
que se propõe a realizar certa atividade (art.13º, CComercial).
Ex: art.230º/6, no fundo falamos de uma empreitada/empreiteiro. O contrato de empreitada é
comercial ou é o empreiteiro comerciante? Se excluirmos isso o que é que se diz à luz do
art.230º? Para esta interpretação a empresa que se dedica à empreitada é comerciante (logo não
referimos que é um ato de comércio subjetivo). É um ato de comércio do art.2º.
o Interpretação Intermédia (OA): qualifica comerciantes (é uma interpretação subjetiva)
porque a atividade que se dedica é comercial. A razão da interpretação é a
comercialização. O ato em si (ex: contrato de empreitada) é tido como um ato
comercial, mas sim a empreitada é que é qualificada como comercial. Em última análise
é uma análise subjetiva.
MC: O art.230º tem um elenco de atos (uma lista) que na resolução de casos práticos se o
encaixarmos numa das alíneas o ato é comercial e a pessoa é comerciante. Contudo,
necessitamos de recorrer ao art.13º (CComercial). Nesta interpretação, o contrato de empreitada
seria um ato de comércio objetivo, não precisando de passar à questão do comerciante
(art.230º/6). No fundo, MC, afirma que quando se diz empresas singulares ou coletivas
induzem a ideia que fossem pessoas singulares ou coletivas, mas quando o CComercial foi
feito, a PJ e a separação dos seus significados ainda não estava suficientemente assente. A
empresa é uma atividade.
Quando se afirma que se propuserem tem apenas uma definição objetiva das atividades. Mesmo
que na altura se definisse uma atividade (interpretação atualista – MC afirma que na altura
não tinham de ser pessoas singulares ou coletivas e o autor afirma que não é necessário
que haja nenhuma alteração).
Ex: contrato de agência.
A empreitada tem um conjunto de regras próprias, que mesmo não sendo praticada por
comerciantes tornar-se-ia num contrato de empreitada. Quando pensamos na empreitada,
pensamos que é praticada por um comerciante (o empreiteiro, uma empresa).
O art.230º abre as portas da comercialidade a outras atividades. Temos de ser habilidosos e
fazer a interpretação desta regra de forma atualista.

Atos de Comércio Subjetivos


Ao abrigo do art.2º/2ª parte (CComercial) são atos comerciais subjetivos factos jurídicos
voluntários (ou atos) dos comerciantes conexionáveis com o comércio em geral e de que
não resulte não estarem conexionados com o comércio dos seus sujeitos. São praticados, em
princípio, por comerciantes
Ex: o comerciante é casado e tem filhos. Vai em família a um concessionário automóvel para
comprar um carro. É um comerciante logo está preenchido o requisito de ato de comércio
subjetivo. Resulta do contexto em que o contrato está a ser celebrado (o facto deste torna
bastante evidente que não tem a ver com o comércio de facto…)
Análise do art.2º/2ªparte (CComercial) – atos comerciais em que a comercialidade deriva do
sujeito:
1). Comerciantes (art.13º/1, CComercial): “são comerciantes aquelas pessoas que, tendo
capacidade, praticam atos de comércio com carácter de profissionalidade”
- Capacidade (art.7º, CComercial): remete para as regras de capacidade do CC,
concretamente para o art.67º, no qual afirma que têm capacidade jurídica todas as
pessoas singulares ou coletivas (salvo disposição legal em contrário).
- Profissionalidade: no qual existem quatro critérios para determinar uma atividade
como profissional:
 Prática habitual/reiterada: o profissional do comércio – como qualquer
profissional – não se limita a praticar atos ocasionais ou isolados: realiza-os
em cadeia, articuladamente e em grande número, poderíamos admitir uma
profissão que, por natureza, implique poucas realizações finais (ex: construtor
de metropolitanos, mas a preparação dessas realizações implicaria sempre uma
sucessão indeterminada de múltiplos atos).
 Prática juridicamente autónoma (que atua em nome próprio e por sua conta -
ao contrário, p. ex, de alguém com contrato de trabalho)
 Atividade com prossecução de lucro: uma atuação profissional é sempre uma
atuação que visa angariar meios, isto é, que procura um lucro.
 Atividade exercida de forma tendencialmente exclusiva (MC)
 Embora o comerciante possa ter outras profissões, há limites e, por
isso, ninguém pode ter infinitas profissões. Contudo, a lei comercial
não exige a exclusividade de uma determinada profissão, permitindo
que o comerciante tenha mais do que uma, desde que a estas afete a
totalidade do seu património
São comerciantes as Sociedades Comerciais (art.13º/2, CComercial): aquelas que vêm
definidas como tal no art.1º (CSC) vigorando aqui o princípio da tipicidade, e que pratiquem
atos comerciais (isto porque existem sociedades civis de tipo comercial).
2). Atos, “contratos e obrigações dos comerciantes ”: devem ser entendidos como todo e
qualquer facto jurídico comercialmente relevante (ex: até RC de um comerciante pode ser
comercial e dai há consequências de regime – art.100º, solidariedade ou responsabilidade
parciária que depende do direito que se aplica)
3). Não serem “de natureza exclusivamente civil” – se for ato de natureza estritamente civil
não é comercial:
- Não têm a ver com a lógica comercial (do lucro e etc) e sim com outra realidade
(pessoal ou outra)
- Não se relaciona com a atividade comercial, mesmo que tenha reflexos patrimoniais
(ex: casamento)
 Doações: art. 6º (CSC) que legitima que se aplique o regime comercial, tendo
certas considerações em conta
- MC: atos que, no momento considerado, não sejam regulados pelo Direito
Comercial.
4). “se contrário do próprio ato não resultar”: se do próprio ato resultar a não ligação com o
comércio.
- Atos dos comerciantes que não forem de natureza exclusivamente civil serão
comerciais (presunção do artigo), se deles mesmo não resultar que não têm relação com
o exercício do comércio do comerciante que os pratica.
- Art.2º/2ªparte (CComercial): presunção (legal – art.349º, CC) de que os atos praticados
por comerciantes não comerciais
 Ex: dois comerciantes compram quadros a um artista de rua. A compra,
ainda que não seja para revenda (pois senão seria um ato de comércio
objetivo), é um ato de comércio subjetivo devido à presunção tendo
uma dívida solidária ao artista (porque é comercial, se fosse civil era
parciária)
 Como se ilide a presunção?
Resultado das circunstâncias: declarações feitas, documentos
apresentados, etc
Facto de a contraparte não ter como saber que a parte é
comerciante

Atos de Comércio: Bilaterais vs Unilaterais (Atos Mistos)


Na tradição comercial, fala-se em “atos”. Todavia é sabido que estes são, na sua grande maioria,
contratos (a razão radica na eventualidade de atos subjetivos de comércio).
Nessa eventualidade, quando um ato bilateral (contrato) seja comercial relativamente a uma
das partes (comerciante) e não comercial em relação à outra (não-comerciante) falamos em
“atos mistos”.
O direito comercial permite, numa especialidade não conhecida no direito civil, cindir um
contrato em dois atos, de modo a que opere como comercial, apenas para uma das partes.
Recorrendo ao art. 99º (CComercial), pode-se retirar o seguinte:
o As regras que pela sua natureza, forem aplicáveis apenas à parte comerciante,
funcionam em relação a ela. À outra parte, aplica-se o direito comum.
o Não sendo possível fazer essa destrinça, ambas as partes ficam sujeitas à lei
comercial.
Atos bilaterais vs Atos unilaterais:
- Atos Bilaterais: ambos os atos são comerciais (a comercialidade verifica-se em relação
a ambas as partes – sujeitos)
- Atos Unilaterais: apenas para um dos lados o ato é comercial (a comercialidade
verifica-se em relação a só uma das partes)
Ex: A professora (não comerciante) compra um computador a B com a intenção de
revenda. Esta CV tinha carácter comercial para a professora, mas para B não // 2
pessoas compram computador; responsabilidade é solidária pois a solidariedade aplica-
se em função daquele que é comerciante.

Atos de Comércio: Autónomos vs Acessórios


Não é nenhuma teoria (está presente na lei)
o Atos de Comércio autónomos/absolutos/por natureza : atos qualificados como
comerciais por si mesmo, independentemente da ligação a outros atos ou atividades
comerciais. A comercialidade resulta de si próprio.
Ex: CV mercantil (art.463º e ss, CComercial + Contra-Corrente – art.344º, CComercial)

o Atos de Comércio por acessoriedade/conexão/relativos : atos qualificados como


comerciais por terem uma especial ligação com outros atos objetivamente comerciais ou
com o próprio comércio. Estão ligados a outros atos de comércio, devem a
comercialidade à relação que estabelecem com outros atos de comércio.
Exs:
- Empréstimo (394º, CComercial): Se a coisa está a ser emprestada está destinada
ao comércio. É um ato de comércio por acessoriedade (nos casos práticos temos
de verificar se é ou não um ato de comércio)
- Mandato (231º, CComercial): se o ato que o mandatário praticar for comercial
este é comercial. Tem que se ver se aqueles atos que o mandatário realizar são
ou não comerciais
- Fiança (101º, CComercial): se a obrigação garantida for uma obrigação
comercial
- Penhor (397º, CComercial)
- Depósito (403º, CComercial)

Teoria do Ato Acessório


Atos de Comércio Formais vs. Substanciais Formais
o Formais: São esquemas negociais que, utilizáveis quer para a realização de operações
mercantis, quer para a realização de operações económicas, não são atos de comércio
nem se inserem na atividade comercial, mas estão especialmente regulados na lei
mercantil – dependem da sua inserção no universo comercial.
Ex: negócios cambiários (relativos às letras de câmbios) - previstos na lei mercantil,
portanto são atos de comércio, mas a causa para este negócio pode nada ter a ver com o
comércio e ser apenas um negócio civil

o Substanciais: opõe-se aos formais e a sua comercialidade é devido à sua substância


material e não ao facto de estarem previstos na lei comercial.

Conclusões (Prof. Ana Perestrelo de Oliveira)


Consequências da Qualificação
1). Solidariedade (art.100º, CComercial): não é aplicável se houver uma obrigação plural. Este
pressupõe apenas que a obrigação seja comercial (em si mesma). A obrigação em si mesma
tem de ser comercial (objetivamente ou subjetivamente).
Se a venda for comercial, mas a compra não for, a obrigação de pagamento do preço segue as
regras do art.513º (CC) e não a regra comercial. Apesar da letra da lei do art.99º (CComercial)
remeter para o contrário.
NOTA: Nos casos práticos devemos responder sem considerar que exista solidariedade (não
analisamos a venda se queremos saber se a compra é comercial). Deve questionar-se o problema
da solidariedade no final do caso.
2). Dívidas Comerciais dos cônjuges comerciantes (art.15º, CComercial): é preciso que haja
um comerciante e um ato de comércio. Dívidas comerciais dos cônjuges são contraídas no
exercício do comércio. No art.1691º (CC) a dívida é de ambos (com exceção se o regime de
bens seja o da separação de bens). As dívidas comerciais do cônjuge comerciante são dívidas
dos dois (ocorre a responsabilização do património comum dos cônjuges e se não for suficiente
os bens individuais do cônjuge – de cada um).
3). Taxa de Juro: A taxa de juro comercial é mais elevada que a taxa de juro civil. A ideia no
fundo é a proteção do comércio, é garantir que há uma compensação maior (taxa de juro
moratória/supletiva).
Art.102º/3/5 (CComercial):
- nº3: créditos das empresas comerciais (remete para a Portaria 277/2013). Esta Portaria
por sua vez remete para o aviso (14922/2023). A taxa de juro é de 11% e a portaria pode
mudar, porque a taxa de juro muda semestralmente.
- nº5: trata de uma transposição de uma diretiva europeia. Aplica-se aos casos presentes
no DL nº62/2013 (este DL veio tratar dos atrasos no pagamento das transações
comerciais).

CASOS PRÁTICOS – Transação comercial (entre empresas):


Sempre que houver transação comercial aplicar o art.102º (CComercial e DL 62/2013 e aviso
14/922).

Os Comerciantes
O Código Comercial principia, no seu art.1º, com uma profissão de fé objetivista: declara
reger atos de comércio, sejam ou não comerciantes as pessoas que neles intervenham. Porém, no
art.2º, prevê a especial categoria dos atos subjetivamente comerciais, isto é, daqueles que o
são por serem praticados por comerciantes ou por a estes respeitarem.
Toda a pessoa civilmente capaz de se obrigar pode praticar atos de comércio (art.7º,
CComercial). Mas nem todo o que pratica atos de comércio é comerciante.
A profissão do comércio é proibida a determinadas entidades referidas no art.14º
(CComercial), havendo ainda que contar com diversa legislação especial. A decisão de
considerar uma pessoa como comerciante tem relevo para a determinação dos atos de
comércio subjetivos. Segundo o art.18º (CComercial), os comerciantes são especialmente
obrigados:
- Adotar uma firma
- Ter inscrição mercantil
- Fazer inscrever no registo comercial os atos a ele sujeitos
- Dar balanço e a prestar contas

As obrigações dos comerciantes, apresentam-se muitas vezes, como encargos. A sua


inobservância pode não ter sanções diretas: apenas os impede de beneficiar plenamente do
estatuto mercantil. Todavia, somente caso a caso se torna possível fazer um juízo sobre a
natureza das “obrigações” dos comerciantes.

Qual é o momento em que as pessoas adquirem a qualidade de comerciantes?


O início da qualidade de comerciante determina-se pela prática do ato ou dos atos
reveladores do propósito e possibilidade de certo sujeito se dedicar ao exercício habitual de
uma atividade comercial.

O Comerciante Pessoa Singular


As pessoas singulares podem ser comerciantes: basta que tenham capacidade para praticar
atos de comércio e façam deste, profissão. A CRP garante a liberdade de trabalho (art.47º/1) e a
liberdade de empresa (art.61º/1). Infere-se daqui que a possibilidade de abraçar a profissão de
comerciante e, dentro do comércio, de escolher qualquer ramo ou domínio tem cobertura
constitucional.
Segundo o art. 13º/1 (CComercial), para se ser comerciante é necessário ter capacidade para
praticar atos de comércio. Suscita-se a seguinte querela doutrinária é necessário capacidade de
gozo ou capacidade de exercício?
o Capacidade de exercício: doutrinária maioritária defendida por Coutinho de Abreu,
Pupo Correia, Cunha Gonçalves e Pinto Coelho
o Capacidade de gozo: Mário de Figueiredo, Ferrer Correia e Pereira de Almeida.
o OA: o incapaz não poderia, por si, praticar atos de comércio e logo ser comerciante,
mas já poderia sê-lo quando os competentes atos fossem praticados por
representantes legais, devidamente autorizados.
O CComercial distingue entre a capacidade para praticar atos de comércio (art.7º) e os
requisitos para se ser comerciante (art.13º/1). O preceito do art.7º remete assim para a lei civil
na qual se inserem as regras sobre a capacidade de gozo e de exercício das pessoas singulares
e coletivas:
o As pessoas singulares têm capacidade de gozo pleno (art.67º, CC)
o As pessoas coletivas têm a capacidade de gozo necessário ou conveniente à prossecução
dos seus fins: arts.160º/1 e 6º/1 (CSC) – alguma doutrina interpreta estes preceitos,
alegando que está em causa o princípio da especialidade
Relativamente às pessoas singulares, os menores não têm, em princípio capacidade de
exercício (art.123º, CC): a incapacidade daí resultante é suprida pelo poder paternal e,
subsidiariamente, pela tutela do art.124º.
Quanto às pessoas coletivas, são as mesmas representadas pelos titulares dos competentes
órgãos: arts. 163º/1 (CC) e arts.192º/1, 252º/1, 408º, 431º/2 e 478º, todos do CSC. Falamos
assim em representação orgânica.
Aplica-se tudo isto, por força do art.7º, à prática de atos comerciais. Visto que o presente artigo
não alega “toda a pessoa capaz de se obrigar, pessoal e livremente” os incapazes obrigam-se
assim pelos seus representantes. As próprias pessoas coletivas, embora não sejam incapazes,
também são representadas para agir.
O art.7º remete assim para a lei civil quer quanto à capacidade de gozo, quer quanto à
capacidade de exercício e por via dessa regra há atos de comércio que são acessíveis a menores
(mesmo sem representação).
NOTA: Aos estrangeiros, a sua capacidade civil e comercial é determinada pela lei portuguesa

A situação dos menores


O art.7º, de acordo com a interpretação anteriormente proposta, determina a aplicação, no
direito comercial, das diversas regras civis: quer quanto à capacidade de gozo, quer quanto à
capacidade de exercício.
Tal orientação pode ser confirmada com recurso à situação dos menores:
o O art.123º (CC) retira aos menores (aparentemente) a capacidade de exercício.
Contudo no art.127º (CC) comportam-se algumas exceções.
o Segundo o pensamento do Prof. Gomes da Silva verifica-se que a incapacidade dos
menores, é, aparente e que as exceções são mais extensas do que a regra. Na verdade:
- Os negócios da vida corrente, do menor como do maior, são acessíveis a
todos: alimentação, vestuário, despesas mensais de uma casa de família, apenas
se exigirá que o menor o que está a fazer, o que é de apreensão imediata por
qualquer envolvido.
- O menor de dezasseis anos pode ser autorizado a exercer profissão, arte ou
ofício: nesta altura pode praticar não apenas os atos relativos à atividade em
causa, como ainda, administrar e dispor de bens assim adquiridos.
O regime dos atos praticados pelos menores são (meramente) anuláveis por via do art.125º
(CC) estes produzem os seus efeitos, podendo ser impugnados, apenas pelo representante do
menor ou pelo próprio menor e, mesmo então, com diversos condicionamentos. O menor pode,
pois, praticar inúmeros atos comerciais quer por serem da vida corrente, quer por
corresponderem a uma profissão que o menor tenha sido autorizado a exercer, quer, finalmente,
por porem em jogo apenas bens conseguidos no exercício dessa profissão.
A prática de atos comerciais por menores não vai instilar insegurança no meio mercantil?
MC: não há perigo, pois trata-se de negócios da vida corrente, normalmente pagos de imediato.
O menor autorizado a exercer a uma profissão tenderá a dar boa conta de si. Só por ironia
se poderia apresentar como perigosa a prática de atos comerciais por menores.
A lei faz depender de autorização a prática de certos atos comerciais ou com relevância
comercial, por parte dos menores (ex: art.1889º/1/a + art.1889º/1/c CC).
O esquema é também aplicável ao maior acompanhado, quando a sentença de
acompanhamento, nos termos do art.145º assim o disponha. Tudo o que envolva um
estabelecimento comercial tem uma dimensão especial: não é um ato comercial corrente (a lei
prevê aqui normas especiais).

A profissão de comerciante: proibições, incompatibilidades, inibições e impedimentos


O CComercial vem definir quem entende por comerciante através do art.13º. No seu nº2, fala-se
em sociedades pelo que cumpre relevar o nº1 do art.13º segundo o qual é comerciante a pessoa
que, tendo capacidade para praticar atos de comércio, faça deste profissão.
A profissão de comerciante está aberta a todas as pessoas (singulares). Só por exceção
surgem, depois, casos em que esta é vedada:
- Proibições gerais: resultam de normas que vedem a toda e qualquer pessoa singular
certo tipo de comércio. É exemplo o comércio bancário no qual todas as instituições de
crédito com sede em Portugal devem assumir a forma de sociedade anónima
(art.14º/1/b, RGIC). Sendo a prática não autorizada de comércio bancário reprimida
como crime.
Também a atividade seguradora em Portugal só pode ser exercida por sociedades
anónimas autorizadas. A proibição geral visa ordenar a estrutura comercial o país.

- Incompatibilidades: estas impedem certas pessoa singulares, colocadas em certas


posições ou envolvidas em determinadas situações jurídicas, de exercer o comércio
(ex: magistrados judiciais, magistrados do MP, militares, titulares de órgãos de
soberania, de outros cargos políticos e de altos cargos públicos ou equiparados).
As incompatibilidades atingem determinadas pessoas não por si, mas em função de
cargos que exerçam. Vedam qualquer exercício comercial e não podem ser afastadas
por nenhuma autorização (apenas com a cessação da ocorrência que lhe deu origem).

- Inibições: atingem seletivamente determinadas pessoas, por factos que elas hajam
perpetrado ou por situações nas quais se achem incursas.
A inibição é diversa da incompatibilidade, pois não está em causa o exercício de
nenhum cargo, mas uma ocorrência relativa, própria do inibido. Esta não
desaparece com a cessão do exercício de quaisquer funções (ao contrário da
incompatibilidade) mas, apenas, de acordo com certos mecanismos legais (pode ser
aplicada por um juiz).

- Impedimentos: estes adstringem as pessoas neles incursas a não praticar


determinado tipo de comércio, salvo autorização. É o que sucede com o gerente de
comércio (art.253º, CComercial).
O impedimento atinge a pessoa em virtude de um cargo, mas ao contrário da
incompatibilidade, não é geral e pode cessar com uma autorização.

O Comerciante Pessoa Coletiva


A sociedade comercial é definida, nessa qualidade, em função de “atos de comércio” (art.1º/2,
CSC). Os atos de comércio aqui visados só poderão ser atos objetivamente comerciais: os
restantes pressuporiam a prévia qualificação do seu autor como comerciante.
Ao abrigo do art.1º/3 (CSC), as sociedades que tenham por objeto a prática de atos de
comércio devem adotar uma das formas referidas no nº2:
- Sociedade por quotas
- Sociedade anónima
- Sociedade em comandita simples
- Sociedade em comandita por ações

Não pode haver sociedades comerciais “sob forma civil”. Resta concluir que todas as
sociedades que tenham por objeto a prática de atos comerciais assumem uma das formas
tipificadas no CSC e são comerciantes. A lei não exige, para a qualificação como “comercial”,
que o objeto social se reporte exclusiva ou, sequer, predominantemente, à prática de atos
comerciais. Estes poderão estar previstos apenas como parte do objeto social ou, até, como algo
de acessório.
As sociedades comerciais adquirem a personalidade no momento do registo definitivo do
ato constitutivo (art.5º, CSC). Tornam-se comerciantes nesse momento. Teoricamente pode,
pois, haver “comerciantes” que nunca tenham praticado qualquer ato comercial: a sua
comercialidade, prevista na lei, tem o sentido de uma aptidão de princípio para os praticar.
As sociedades que tenham por objeto, exclusivamente a prática de atos não-comerciais são
sociedades civis (podendo seguir o esquema dos artigos 980º e seg. do CC): são sociedades sob
forma civil/sociedades civis puras.
Estas podem por via do art.1º/4 (CSC) adotar um dos tipos legais de sociedades comerciais:
são as sociedades civis sob forma comercial. Embora civis, regem-se pela lei das sociedades
comerciais. Só não são operacionais para dar azo a atos subjetivamente comerciais –
art.13º/2/2ªparte.

Associações e Fundações
O exercício do comércio por parte de pessoas coletivas exige cautelas:
- Para defesa dos próprios envolvidos no substrato
- Funcionamento das pessoas coletivas em causa, para tutela dos terceiros que, com elas,
contratem e para defesa do próprio mercado.
Atualmente, para prosseguir tal objetivo, a fórmula mais conseguida são as sociedades
comerciais. Seria assim de esperar que todas as pessoas coletivas que se dedicassem ao
comércio incorressem em normas paralelas às do art.1º/3 (CSC): devessem assumir a forma de
sociedades comerciais, adotando um dos tipos previstos no CSC. Tal não acontece devido:
- Formação Fragmentária do Direito Privado : há esquemas de pessoas coletivas não
societárias que se dedicam com mais ou menos intensidade ao comércio e que, por
consignação na lei civil não obtêm a forma societária.
- Falta no Direito Comercial, de tipos de pessoas coletivas que correspondam aos
interesses geridos pelas associações e pelas fundações e concretamente: de um tipo
“comercial” igualitário do tipo “associação” e de um tipo “comercial” fundacional.
Há assim que admitir que as pessoas coletivas, concretamente as associações e fundações civis,
podem praticar atos de comércio objetivos e aplica-se assim o disposto no art.7º
(CComercial).

Contudo, poderão ser comerciantes?


Ao abrigo do art.13º/1 (CComercial), são comerciantes as pessoas que, tendo capacidade para
praticar atos de comércio, fazem deste profissão:
- Este preceito diz respeito apenas a pessoas singulares : tese defendida por Pupo
Correia, Ferrer Correia, etc
- Este preceito reporta-se também a pessoas coletivas : tese defendida por Oliveira
Ascensão e Coutinho de Abreu.
MC
Fazendo uma interpretação atualista e integrada da lei vigente, o CComercial no seu art.13º
apenas previu como comerciantes as pessoas singulares que, do comércio, façam profissão e
as sociedades. Logo deve entender-se que “profissão” tem intuitos lucrativos e seguramente os
terá a profissão comercial.
Ex: A Fundação Gulbenkian tem, como profissão, o ser comerciante, por ter atividades que a
financiam e por vender livros, é forçar as palavras e os valores. Não há qualquer vantagem em
dirigir o direito comercial às realidades da vida e aos valores em presença que são rejeitados
pelo direito civil.
Posto isto, não são comerciantes as associações e as fundações (civis). As primeiras não tem
por fim o lucro económico dos associados (art.157º, CC e art.182º/1/b, CC), do mesmo
diploma.
As segundas têm interesse social (art.157º, CC) não podendo ser reconhecidas se isso não
ocorrer (art.188º, CC). As cooperativas também não se podem considerar comerciantes, pois
ao abrigo do art.2º/1 (CCoop.) não têm fins lucrativos.
Embora as associações e as fundações não tem fim lucrativo, devem dispor de rendimento,
vivendo de donações ou desenvolvendo atividades lucrativas. Sendo assim pode a fundação
assumir uma empresa e dar-lhe uso e aplicar-se-á as normas comerciais até onde a materialidade
das situações o permita.
Ex: a paróquia que mantenha uma loja de santinhos e de velas não preenche, de todo, o art.13º/1
do CComercial.
Se o comércio desta atinja uma dimensão considerável este deve constituir-se como uma
sociedade autónoma passando assim a ser comerciante.

Pessoas Coletivas Públicas e Entidades de Solidariedade Social


O art.17º (CComercial), veda a “profissão” de comerciante às pessoas coletivas públicas de
base territorial (Estado, distrito, município e freguesia), pois estes não possuem a qualidade de
comerciantes.
O art.17º (CComercial) é também aplicável às misericórdias, asilos e restantes institutos de
benemerência e caridade. Atualmente estão também em causa as instituições particulares de
solidariedade social regulados pelo DL nº119/83.

Associações Desportivas e suas Federações


As associações desportivas ou clubes são pessoas coletivas de direito privado e tipo
associativo: não podem ter intuitos lucrativos (cuja regra é reforçada pelo art.26º da Lei
nº5/2007). O mesmo se aplica às federações desportivas, referidas no art.14º da lei
suprarreferida).
As associações desportivas não devem ser confundidas com as sociedades desportivas
(art.25º, Lei nº5/2007). As sociedade desportivas, que devem ter, na firma ou denominação
social, a sigla SAD, assumem a forma de sociedade anónima ou de sociedade unipessoal por
quotas (art.2º/1, DL nº10/2013).
A título subsidiário, é-lhes aplicável o direito das sociedades anónimas e por quotas (art.5º/1
do DL nº10/2013) onde são comerciantes.
Empresas Públicas
Estas são reguladas pelo art. nº260/76 e pelo DL nº558/99. Assumem a forma de sociedade de
responsabilidade limitada, nos termos da lei comercial (art.5º/1), sendo regidas pelo direito
privado, com especificidades (art.14º/1). Aplica-se assim o princípio da neutralidade
competitiva, estando sujeitas às regras gerais sobre concorrência. Estas são comerciantes.

Institutos Públicos e Associações Públicas


Os institutos públicos pertencem à administração descentralizada do Estado. De acordo
com o art.17º (CComercial) não podem ser comerciantes, embora possam praticar atos de
comércio.
O mesmo acontece com as associações públicas, que embora previstas por lei, têm base
associativa, assumindo determinados poderes de autoridade. A certas associações mais atingas
dava-se a designação de “ordens” (ex: Ordem dos Advogados ou Ordem dos Médicos). Estas
entidades não são comerciantes, podendo, todavia, praticar determinados atos de comércio
objetivos (ex: venda de livros).

Pessoas Semelhantes a Comerciantes


Falamos nos casos do mandatário comercial, gerentes, auxiliares ou caixeiros, comissários,
mediador, corretores, agente comercial, sócios de responsabilidade ilimitada, os farmacêuticos e
os artífices.
A “pessoa semelhante a comerciante” consiste numa entidade que não sendo comerciante
em si, suscita, não obstante, a aplicação de diversas regras do direito comercial. Três
critérios enformam as “pessoas semelhantes a comerciantes”, para além do facto de,
naturalmente, não se poderem considerar de imediato comerciantes por força do art.13º:
o São autónomas, no sentido de não se encontrarem ao serviço de outra entidade, por
via de um contrato de trabalho
o Praticam, em série, atos jurídicos com fins lucrativos
o Dispõem de uma organização mínima, ainda que rudimentar, figurativa de uma
empresa.
Esta figura flexibiliza a ideia de comerciante permitindo alargá-la de acordo com a evolução
dominante numa orientação particularmente importante em face de orientações
subjetivistas.

O mandatário comercial: os gerentes, auxiliares, caixeiros e comissários


Há mandato comercial quando alguma pessoa se encarrega de praticar um ou mais atos de
comércio por mandado de outrem (art.231º).
O mandato comercial é uma modalidade de mandato (arts.1157º e seg. do CC) – o qual, é por
seu turno, uma prestação de serviço (art.155º, CC). Nessa qualidade, implica o dever de
praticar atos jurídicos (art.231º, CComercial) – “um ou mais atos de comércio por conta do
mandante”. O mandato comercial envolve poderes de representação (ao contrário do civil
que pode, ou não, implicá-los).
Como modalidade de mandatário comercial surge o gerente de comércio (arts.248º e seg.). O
gerente tem mandato geral e trata e negoceia em nome do seu proponente (arts.249º e 250º,
CComercial). Também são mandatários os auxiliares (art.256º, CComercial) e os caixeiros
(art.259º, CComercial) em certos limites.
A comissão corresponde a um mandato comercial sem representação (art.266º,
CComercial).
A doutrina tem entendido negativamente que estas pessoas sejam comerciantes, pois
embora estas pratiquem atos comerciais, uma vez que o realizam através de regras da
representação, repercute-se na esfera do representado. Apenas o comissário, quando exerça
profissionalmente as suas funções seria o comerciante.

Profissionais Liberais
Os profissionais liberais não são considerados comerciantes. Na generalidade, estes dirigem
empresas de pequena, média ou até grande dimensão.
Ex: um escritório de advocacia ou um consultório médico colocam os seus serviços no mercado,
dispõem de uma organização de meios materiais e humanos para produzir os serviços e têm um
intuito lucrativo. Também os farmacêuticos fazem outro tanto, embora com a particularidade de,
mais do que serviços, venderem bens.
MC: são profissionais liberais os que trabalhem com autonomia no âmbito de profissões
enquadradas por ordens profissionais. Todavia admite-se graduações – encontramos
profissionais liberais que dirigem autênticas empresas, em moldes próximos do comerciais.
Aqui torna-se possível aplicar-se determinadas normas comerciais (tudo depende da natureza
da situação considerada).

Conclusões (Prof. Ana Perestrelo de Oliveira)


Há outras razões que justifiquem o porquê de os funcionários liberais não seja considerados
comerciantes:
- Relação com os clientes tem características de confiança pessoal (é uma relação
individualizada).
- Profissional liberal aplica um ramo de ciência/arte . O que os advogados recebem são os
honorários (a honra) não tem lucro.
Nota: os advogados não podem ter sociedades comerciais
Estas pessoas semelhantes a comerciantes são sujeitos que não praticam atos de comércio,
mas que tem algumas características que os aproximam dos comerciantes: exercício
profissional de funções (uma lógica de prática de séries de atos com fins lucrativos, com
autonomia e a existência de uma organização de meio). Estas pessoas não encaixam na figura de
comerciantes, mas tem uma prática autónoma próxima ao domínio da comercialidade.
Aqui enquadram-se os funcionários liberais (médicos, advogados, etc) e os mandatários
comerciais (os comerssários), gerentes.
Empresa e Estabelecimento

A Empresa
Conceito polissémico e com vários sentidos, podendo entender-se como objeto de direitos ou
sujeito dos mesmos. Ainda poder se como atividade.
A empresa surge assim como um conceito-quadro de grande extensão e particular
versatilidade:
o Sujeito: que atue nessa qualidade e suscetível de direitos e obrigações.
- Empresa-sujeito: conjunto de destinatários de normas comerciais
o Complexo de bens e direitos capaz de suportar a atuação dos interessados (objeto)
- Empresa-objeto: estabelecimento dotado de direção humana
o Atividade: levar a cabo uma empresa (expressão a cair em desuso)

O conceito surge em Portugal no Código de Ferreira Borges e é continuado no Código Veiga


Beirão (que tem um entendimento inicial subjetivista, sendo progressivamente objetivada (essa
objetivação do conceito de empresa iniciou-se com Ferrer Correia).
MC: O conceito de empresa é uma locução disponível para o legislador, sem se embaraçar
com uma técnica jurídica precisa, indicar destinatários para as suas normas,
designadamente as de natureza económica. E em paralelo documenta-se uma sua utilização
com o sentido de estabelecimento.
A noção de interesse não é dogmaticamente aproveitável no estado atual da Ciência do Direito
pelo que a empresa não se pode considerar um centro autónomo de interesses:
o Interesse (sentido subjetivo): relação de apetência entre o sujeito e as realidades que
ele considere aptas para satisfazer as suas necessidades ou os seus desejos.

o Interesse (sentido objetivo): relação entre o sujeito com necessidades e os bens aptos a
satisfazê-las.
Coutinho de Abreu: “são comerciais as empresas cujo objeto se traduza na realização de atos
(ou atividades) objetivamente mercantis”.

A empresa como noção-quadro


A comercialística de diversos quadrantes aceita hoje que a empresa não é nem uma pessoa
coletiva, nem um mero conjunto de elementos materiais. É sim um conjunto concatenado de
meios materiais e humanos, dotados de uma especial organização e de uma direção, de
modo a desenvolver uma atividade segundo regras de racionalidade económica.
Este comporta assim os seguintes elementos:
o Elemento humano: abrange aqueles que colaborem na empresa, desde os
trabalhadores até aos donos, passando por quadros, auxiliares e dirigentes. Em concreto,
isso poderá representar desde uma única pessoa a universos com milhares de
intervenientes.
o Elemento material: coisas corpóreas (móveis + imóveis) e coisas incorpóreas
(licenças, marcas, insígnias, clientela, aviamento, inter-relações com terceiros – outras
empresas) seja qual for a fórmula do seu aproveitamento e de bens incorpóreos.
o Elemento de organização: todos os elementos materiais ou humanos, não estão
meramente reunidos ou justapostos. Eles apresentam-se numa articulação
consequente, que permite depois desenvolver uma atividade produtiva.
o Elemento de direção: é um fator aglutinador dos meios envolvidos e da própria
organização. A empresa é algo que funciona, o que só é pensável mediante uma
estrutura que determine o contributo de cada uma das parcelas envolvidas.
Cada um destes elementos pode variar até ao infinito. Desde uma simplicidade infantil até
estruturas de maior complexidade até hoje alcançadas.
Ora, apenas um ordenamento jurídico mínimo permite a existência e o funcionamento de uma
empresa. Sem regras jurídicas não é possível, sequer, o aparecimento de vários fatores
essenciais à empresa; muito menos organizá-los; e sobretudo, dirigi-los.
A empresa é uma organização produtiva que exprime no seu seio a síntese entre os factos e
o direito. A noção de empresa, no direito português, é utilizada em duas aceções:
o Subjetiva: quando refere os direitos, os deveres ou os objetivos das empresa
- Todos os sujeitos produtivamente relevantes (pessoas singulares, sociedades
comerciais, civis, associações, cooperativas, entidades públicas…)
- É útil, pois evita ao legislador o ter de embrenhar-se em distinções e
qualificações de redução impossível e transfere, para o momento da aplicação
e à luz da lógica global do sistema, a função de determinar o preciso alcance
das normas envolvidas.

o Objetiva: quando dirige a certas pessoas regras de atuação para com as empresas
- Consiste nos deveres impostos aos responsáveis por todas as entidades acima
referidas (pessoas singulares – superiores e auxiliares)
- Permite ao legislador determinar medidas em relação às organizações
produtivas, sem ter de explicitar tratar-se de conjuntos articulados e dirigidos
de meios-humanos e materiais.
Concretização
A empresa é assim um conceito-quadro disponível para o legislador e para a prática
jurídica, sempre que caiba referir realidades produtivas sem pormenores técnicos. As grandes
linhas da sua concretização são:
1. Empresa-sujeito e a empresa-objeto
2. Direito das Empresas
3. Empresa como sublinguagem comunicativa
4. Empresa como conceito geral-concreto

O Estabelecimento Comercial
A empresa surge como um conceito-quadro de grande extensão e particular versatilidade.
No CComercial, o estabelecimento surge em duas aceções:
o Como armazém ou loja (arts.95º/2 e 263º, CComercial)
o Como conjunto de coisas materiais ou corpóreas (art.425º, CComercial)
A noção geral adotada de estabelecimento já não se encontra no CComercial, mas sim no
CC. É exemplo os seguintes artigos: 316º; 317º; 495º/2; 1559º; 1560º/1/a; 1682-A/1/b;
1938º/1/f; 1940º; 1962º/1.
O estabelecimento traduz-se num conjunto de coisas corpóreas e incorpóreas devidamente
organizado para a prática do comércio. Corresponde a uma ideia de empresa sem o elemento
humano e de direção.

Elementos do Estabelecimento
O estabelecimento comercial abrange elementos bastante variados. Em comum, têm apenas
o facto de se encontrarem interligados para a prática do comércio. Pode distinguir-se, no
estabelecimento:
o Ativo: compreende o conjunto de direitos e outras posições equiparáveis, afetas ao
exercício do comércio
o Passivo: corresponde às adstrições ou obrigações contraídas pelo comerciante, por
esse mesmo exercício
No respeitante ao ativo, o estabelecimento abrange:
o Coisas corpóreas:
- direitos relativos a imóveis (reais de gozo – como a propriedade/usufruto –
como os pessoais de gozo – direito ao arrendamento)
- direitos relativos móveis (mercadorias, matérias-primas, maquinaria, mobília e
instrumentos de trabalho ou auxiliares, escrituração, computadores, livros,
documentos, ficheiros e títulos de crédito)
- Ficam assim abrangidas, quaisquer coisas que, estando no comércio, sejam,
pelo comerciante, afetas a esse exercício

o Coisas incorpóreas:
- Obras literárias ou artísticas que se incluam no estabelecimento
- Inventos (patentes)
- Marcas
- Direito à firma ou nome do estabelecimento e outros aspetos que, embora à
partida não-patrimoniais, consintam, todavia, uma comercialidade limitada.
- Coisas incorpóreas (direitos a prestações provenientes de posições contratuais
– ex: contratos de trabalho, contratos de prestação de serviços, agência, franquia
e contratos relativos a bens vitais como água, eletricidade, gás, internet,
telefone)

o Aviamento e Clientela:
- Aviamento: corresponde à mais-valia que o Estabelecimento representa em
relação à soma dos elementos que o componham, isoladamente tomados
(aptidão funcional e produtiva do estabelecimento – para gerar lucro).
 Coutinho de Abreu: É um bem exterior ao processo produtivo e à respetiva
estrutura empresarial sustentadora
- Clientela: equivale ao conjunto, real ou potencial, de pessoas dispostas a
contratar com o estabelecimento considerado, nele adquirindo bens ou
serviços.
 Coutinho de Abreu: não é elemento (algo constituinte ou componente da
empresa) – não por não ser objeto de um direito real ou absoluto, nem objeto
autónomo de tutela jurídica, mas por não ser um meio ou instrumento
estrutural-funcionalmente inserido na organização produtiva que é a empresa,
sendo antes algo de consequente ao funcionamento da “máquina produtiva”.
O aviamento e a clientela não constituem, como tais, objeto de direitos subjetivos.
Correspondem a posições ativas e são objeto de regras de tutela que influenciam/podem
influenciar o valor do Estabelecimento e, sendo este transmitido, vão com ele.
Ex: indemnização de clientela prevista na hipótese de cessação do contrato de agência e
aplicável a outros negócios de distribuição.

Como é que se dá a inclusão no estabelecimento dos seguintes critérios?


O critério do estabelecimento assenta em duas ordens de fatores:
o Fator Funcional: verificação de como se organiza efetivamente um estabelecimento
e como é que ele funciona.
O estabelecimento existe enquanto tal precisamente por organizar as coisas
corpóreas, em conjunto com as incorpóreas, num todo coerente para conseguir
angariar clientela, e, daí, lucro.

o Fator Jurídico: devido à realidade que o Estabelecimento traduz, o direito concede


ao conjunto dos elementos referidos, um regime especial, inaplicável in solo (a cada
um dos elementos) e sim ao todo.
Além de direitos a coisas corpóreas, envolve posições contratuais (como o contrato de
trabalho e o direito ao arrendamento) e posições incorpóreas (como o direito à firma, à
marca e ao pedido do seu registo).
Também o aviamento e a clientela são valorados para efeitos de expropriação,
provando que existem e são tidos em conta pelo direito.

O Estabelecimento é a unidade jurídica objetiva – sendo classificado como uma coisa móvel.
O Estabelecimento comercial é uma unidade jurídica fundada em organização de meios que
constitui um instrumento de exercício relativamente estável e autónomo de uma atividade
comercial, em que há coexistência entre um direito de propriedade sobre o todo (o
Estabelecimento) e os direitos (de propriedade ou não) sobre as suas partes.
É estabelecimento a organização produtiva apta a funcionar, mas que ainda não entrou em
funcionamento – não possuindo clientela efetiva?
- Sim, se já se revelar (minimamente) apto para realizar um fim económico-
produtivo jurídico-comercialmente qualificado – apto para garantir clientela
que lhe permita ter aviamento.
- Já existe bem jurídico novo, uma organização produtiva não redutível a bens
meramente agregados.
- Possui já capacidade produtiva (e lucrativa, em geral), aptidão para
realizar o fim para que foi criado – há já aviamento (sendo que a clientela,
quando exista, é apenas uma das manifestações – ou índices – do aviamento de
um estabelecimento)
No caso de um incêndio que destrua o estabelecimento, ele ainda subsiste, pois, os bens que
restam (firma, contratos de trabalho, alguns bens, relações com clientes) exprimem a
permanência (em estado mais ou menos latente) de uma concreta organização produtiva
qualificável como estabelecimento.
- O Direito tutela a continuação desses elementos na esfera patrimonial do sujeito.

Além de negociável, o estabelecimento é um valor ou bem económico ou patrimonial,


transpessoal (i.e., cindível ou isolável da pessoa que o criou, ou da pessoa a quem pertença em
dado momento – como se demonstra pelos casos de transmissão definitiva), duradouro,
reconhecível e irredutível (algo que contradistingue os negócios como negócios sobre o
estabelecimento, e que se não confunde com outros bens – a ele ou não ligados).
Conclusões (Prof. Ana Perestrelo de Oliveira)
Aviamento
É aquilo que dá o significado a este conjunto de bens de coisas corpóreas e incorpóreas. É
uma mais valia do que resulta que aqueles bens são concatenados e integrados. O aviamento é a
aptidão do estabelecimento comercial.
Casos Práticos: há aviamento ou já se perdeu aviamento? = há/não, há estabelecimento
comercial
Estabelecimento Incompleto: quando lhe falta elementos. Mas se já existir aviamento, ou seja,
aptidão, já há estabelecimento comercial e é esta a diferença de se poder negociar ou não.
O aviamento é apontado como um elemento do estabelecimento, mas é aquilo que dá
coerência.
Clientela
É um produto do aviamento (quando há aviamento há clientela). O conceito de clientela difere
de autor para autor. Para MC o conceito é bastante amplo.

O Aviamento é o critério decisivo. É a aptidão que dá a essência do estabelecimento que depois


constrói a unidade essencial do estabelecimento

Nome e Insígnia do Estabelecimento: o logótipo (remissão) – PPV


O estabelecimento era identificado pelo nome e insígnia do estabelecimento. O nome e
insígnia do estabelecimento eram direitos privativos de propriedade industrial (melhor se lhe
deveria chamar propriedade comercial) e eram sujeitos a registo, beneficiando da respetiva
proteção. Nem sempre o nome do Estabelecimento era claramente distinguível da firma do
comerciante titular ou explorador do estabelecimento, mas noutros casos a distinção era muito
clara (p. ex; bares, restaurantes, etc).
Na última reforma do Código Da Propriedade Industrial, o nome de estabelecimento
desapareceu do texto da lei e foi substituído pelo logótipo (arts.304º - A e 304º -S). Esta
alteração é criticável, porquanto o nome do estabelecimento é uma expressão verbal, enquanto o
logótipo deveria ser uma imagem gráfica.
O Regime e a Natureza do Estabelecimento
A Negociação Unitária – O Trespasse
O ponto mais significativo do regime do estabelecimento é a possibilidade da sua negociação
unitária.
Em princípio, perante um conjunto de situações jurídicas distintas, funciona a regra da
especialidade: cada uma delas, para ser transmitida, vai exigir um negócio jurídico autónomo.
Estando em causa um acervo de bens e direitos, a lei e a prática consagradas admitem que a
transferência se faça unitariamente.
Trata-se de um aspeto que abrange não apenas as coisas corpóreas articuladas, suscetíveis de
negociação conjunta através das normas próprias das universalidades de facto (art.206º, CC) –
mas, também, todas as realidades envolvidas, incluindo o passivo.
Não deixa de haver transmissão unitária pelo facto de para a perfeita transferência de
alguns dos elementos envolvidos, se exigir o consentimento de terceiros. É o que vimos
suceder com o passivo, com os contratos de prestações recíprocas e é o que sucede, com a
própria firma.
O trespasse do estabelecimento que tudo englobe continua a fazer-se por um único negócio,
com todas as facilidades que isso envolve.
Perante a relativa indefinição legal e dada a exigência das tais autorizações, o trespasse clássico
tem vindo a perder terreno, a favor de esquemas societários. O comerciante que pretenda
fundar um estabelecimento constituirá uma sociedade comercial mais ou menos (des)
capitalizada, que irá encabeçar o acervo de bens e de deveres a inserir no estabelecimento.
Querendo alienar a sua posição, o comerciante em causa, muito simplesmente, transferirá
as suas posições sociais – quotas ou ações para o adquirente. Não há qualquer modificação a
nível do sujeito (formalmente).
O trespasse do estabelecimento, mormente para ter eficácia no ponto nevrálgico do
arrendamento, deve ser celebrado de forma escrita (de acordo com o DL nº64-A/2000, 22 de
abril). Deve tratar-se de um estabelecimento efetivo, isto é que compreenda todos os
elementos necessários para funcionar e que, além disso, opere em termos comerciais. O
art.1112º (CC) exprime essa ideia, não haverá trespasse:

O trespasse exige assim uma transmissão do estabelecimento no seu todo ou como


universalidade: é insuficiente aquela que incida sobre apenas ou alguns dos seus elementos. As
partes, ao abrigo da sua autonomia privada, poderão, do estabelecimento, retirar os
elementos que entenderem.
O trespasse não deixará de o ser até ao limite de o conjunto transmitido ficar de tal modo
descaracterizado que já não possa considerar-se um “estabelecimento” em condições de
funcionar.
Além da transmissão, o estabelecimento deve manter-se como tal, daí o não poder passar-
se a exercer, no local, comércio diferente. A lei especifica, a propósito da transmissão do
arrendamento, que o trespasse deve abarcar “instalações”, “utensílios”, “mercadorias” e “outros
elementos” (este último abrange os fatores incorpóreos, com relevo para diversos direitos de
crédito, nome, patentes e marcas).
Quando temos um trespasse de âmbito máximo, que englobe, o passivo, distinguimos os
efeitos internos dos externos:
o Internos: o trespassário adquirente fica adstrito, perante o trespassante, a pagar aos
terceiros o que este lhes devia
o Externos: o alienante só ficará liberto se os terceiros, nos termos aplicáveis à
assunção de dívidas e à cessão da posição contratual, o exonerarem ou derem
acordo bastante.
O “trespasse” é, apenas uma transmissão definitiva do estabelecimento. Só por si não nos diz
a que título, logo o trespasse pode operar por via de qualquer contrato, típico ou atípico,
que assuma eficácia transmissiva (CV, dação em pagamento, sociedade, doação ou outras
figuras diversas).
O regime de trespasse dependerá do contrato que, concretamente, estiver na sua base.
Releva aqui apenas o efeito transmissivo de um estabelecimento. Contudo, cumpre apontar
outras decorrências típicas do trespasse:
o Art.1112º/4 (CC): retomando o art.116º (RAU), atribui ao senhorio um direito de
preferência, na hipótese de trespasse por venda ou dação em cumprimento

o O trespassante poderá ficar investido num dever de não-concorrência em relação ao


trespassário
Tem assim aplicação, em tudo o que a lei comercial não prescreva diretamente, o regime
geral das preferências legais. Salvo situações de abuso de direito, a preferência não funciona
quando o estabelecimento seja usado para a realização de capital social.
A preferência do senhorio está instituída na RAU, com as seguintes finalidades:
- Permitir ao senhorio uma vantagem potencial, aquando da transmissão do
estabelecimento instalado no objeto da sua propriedade
- Facultar um certo controlo da sociedade civil sobre as simulações operadas no
tocante a trespasses
A preferência em causa ainda encontra guarida no art.1112º/4 (CC), ainda que a título
supletivo. O direito de preferência conferido ao senhorio não é um direito de resgate da coisa,
de modo a conseguir desmantelar o estabelecimento, só para rever o objeto da sua
propriedade. Trata-se de uma preferência na venda ou dação em cumprimento do
estabelecimento. O senhorio interessado não pode agir na hipótese de qualquer trespasse,
mas, apenas, na de venda ou dação.
Além disso, terá de adquirir todo o estabelecimento, mantendo-o em funções nas precisas
condições em que o faria o trespassário interessado. Resulta daí que a preferência do
senhorio só seja possível quando, este próprio, esteja em condições de, licitamente adquirir o
estabelecimento.
Ex: Tratando-se de uma farmácia, exige-se que o senhorio seja farmacêutico. Estando em jogo
um estabelecimento para o exercício de profissão liberal, o senhorio deverá ter as habilitações
necessárias para prosseguir essa exploração. Além disso, não cabe preferência no caso de
integração, com o estabelecimento, de quota social: em princípio não há aqui venda ou dação
em pagamento, ficando, todavia, ressalvada a hipótese de abuso de direito.
O dever de não concorrência do trespassante perante o trespassário, quando não seja
expressamente pactuado, poderá ser uma exigência da BF.
Ex: um comerciante conhecido angaria larga clientela. Trespassa, depois, por bom lucro, o seu
estabelecimento e vai, de seguida, abrir um novo estabelecimento semelhante, mesmo em
frente. É evidente que a clientela, que já o conhece, irá segui-lo: o trespassário adquire algo que,
sem clientela, pouco ou nada vale.
Impõem-se assim uma obrigação de não-concorrência, a qual apenas pode ser ponderada
caso a caso. A sua violação pode acarretar deveres de cessar a concorrência indevida e de
indemnizar o lesado, reconstruindo a situação que existiria se não fosse a violação perpetrada.

A cessão de exploração e a locação de estabelecimento


Na locação de estabelecimento (art.1109º, CC) há uma cedência temporária do
estabelecimento comercial.
Em rigor haveria que distinguir: a cessão de estabelecimento seria a transferência
temporária do estabelecimento, efetuada a qualquer título (incluindo o comodato). A
locação de estabelecimento implicaria a cessão titulada por um negócio decalcado da locação,
designadamente com uma obrigação periódica de pagamento de retribuição (tipo renda ou
aluguer).
O interesse da autonomização da cessão de exploração é o do próprio reconhecimento do
estabelecimento como objeto de negócios:
o Permitiria a cedência temporária do estabelecimento como um todo, sem
necessidade de negociar, uma a uma, todas as realidades que o componham e
viabilizando ainda o cômputo de elementos sem autonomia, como o aviamento e a
clientela.
o Possibilitaria atender à verdadeira realidade em jogo no estabelecimento, afastando
normas comuns aplicáveis a outras figuras contratuais, como por exemplo, o
arrendamento.
A possibilidade de, na locação do estabelecimento, afastar o regime restritivo do
arrendamento, obriga a uma delimitação mais cuidada dos seus contornos. À partida, pode
dizer-se que deve haver, como objeto do negócio, um estabelecimento comercial: é a presença
deste, com a sua lógica própria e os seus valores particulares, que conduziu à
autonomização prática e conceitual da figura.
Antunes Varela justifica a exclusão na então cessão de exploração, dos esquemas injuntivos
do arrendamento, acentuando:
- Inexistência das razões que justificam o protecionismo do inquilinato comercial ou
industrial
- O facto de, ao cedente, se dever a iniciativa da criação ou a manutenção do
estabelecimento, em cujo, património ele se integra e continua
- O facto de o cessionário não ter criado o estabelecimento, limitando-se a fruir o que
temporariamente lhe foi cedido
- Assimilação da cessão de exploração ao trespasse, caso tivesse aplicação o esquema
da renovação automática estabelecida para o arrendamento.
A cessão de exploração, mesmo na modalidade legalmente prevista da “locação de
estabelecimento”, é um negócio atípico. Cabe às partes desenvolver o regime que entendam
adotar.
A semelhança com o trespasse ocorre apenas pelo prisma do cedente: além disso, o regime
restritivo vigente para o arrendamento aproximação da pura transmissão do imóvel sem
que daí, se extraiam consequências dogmáticas.
O CC autonomizou a cessão de exploração precisamente pelo prisma da exclusão do
regime do arrendamento, no seu art. 1085º.

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O usufruto do estabelecimento
Sobre o estabelecimento comercial pode recair o direito de usufruto. Nessa altura e nos
termos gerais, o usufrutuário poderá aproveitar plenamente o estabelecimento, sem alterar
a sua forma ou substância – 1439ºCC.

O estabelecimento como objeto de garantia


Esta situação constitui sempre um minus em relação ao próprio trespasse. O estabelecimento
pode ser dado em penhor, pelo seu titular. Em regra, tratar-se-á de um penhor mercantil,
sendo, pois, suficiente, nos termos do artigo 398º uma entrega simbólica. O que tem aqui a
maior importância prática: o estabelecimento dado em garantia poderá continuar a
funcionar normalmente, numa situação fundamental para o bom decurso da operação.
O estabelecimento comercial pode ainda ser objeto de penhora. Trata-se de uma operação que
não afeta a relação locatícia que nele se inclua e que o atinge no seu conjunto.

A reivindicação e as defesas possessórias


O estabelecimento pode ser reivindicado. Embora se trate de uma ação primacialmente
dirigida a efetivar o direito de propriedade sobre os elementos corpóreos, os restantes fatores
acompanharão, de forma automática, os primeiros.
As ações possessórias assistem ao seu titular, mas o trespassário também poderá utilizá-las
para tornar efetiva a posse que tenha recebido por via contratual.
A natureza
O estabelecimento comercial é uma autêntica esfera jurídica e não apenas um património: inclui
ou pode incluir o passivo e toda uma série de posições contratuais recíprocas. Trata-se de
uma esfera jurídica afeta ao comércio ou a determinado exercício comercial. Tem a sua
natureza de esfera jurídica de afetação, sendo delimitada pelo seu titular em função do escopo
jurídico comercial em jogo.
É inaceitável qualquer opção que reconduza o estabelecimento comercial a conceitos mais
rígidos.

O estabelecimento individual de responsabilidade limitada (EIRL)


Constitui um desafio clássico ao direito comercial o apurar esquemas que, sem colocarem em
risco a segurança do comércio e a fidedignidade das transações, permitam limitar a
responsabilidade individual dos operadores. Quid iuris quando se tratasse de um comerciante
em nome individual, que não desejasse associar-se?
1ª via: admitir sociedades unipessoais, ou seja, com um único sócio. Pelas dívidas da sociedade
responderia apenas o património desta, assim conseguindo a procurada limitação.
O EIRL é um estabelecimento comercial colocado numa situação especial que permite a
responsabilidade limitada. Há traços do seu regime que refletem bem os progressos obtidos no
tratamento do tema: 21º/1, DL 248/86, de 25 de agosto.
Tal como o estabelecimento comercial, também o EIRL constitui uma esfera jurídica de
afetação: no fundo, este tenderia, à partida, a ser uma modalidade daquele. Não bastará
considerá-lo como um património autónomo, uma vez que também abrange o passivo.

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Conclusões (Prof. Ana Perestrelo de Oliveira)


o Trespasse de estabelecimento comercial : é a alienação do estabelecimento (não é a
venda, CV). É a titularidade do estabelecimento.
o Há por vezes interpretações que tentam generalizar estas exceções no sentido de dizer
que os interesses do comércio prevalecem sobre os interesses da contraparte com o
objetivo de dispensar as contrapartes nos contratos. É interessante para facilitar, a
transmissão, mas não está na lei e o art.424º é um princípio de confiança e o Direito
Comercial é um direito de confiança.
Para Ana Perestrelo, não dá para generalizar esta dispensa da contraparte, é
exemplo o contrato de franquia no qual sem aquele contrato não funciona nada.
O direito comercial é direito civil.
o Locação do estabelecimento: é uma subespécie, é uma cessão do estabelecimento.

Conclusões da aula do dia 13/10/2023 - Estabelecimento Comercial


Trespasse
Podem-se aproveitar alguns fornecedores, mas a essência da loja mudou-se, a manutenção do
aviamento é o critério para o trespasse.
Para haver estabelecimento comercial a ser transmitido, a propósito do contrato de
arrendamento, há uma regra no CC que tem implícita esta ideia. Falamos do art.1112º/2/a (CC)
que refere que não há trespasse do estabelecimento comercial se não for transmitido. Tem
que ser um estabelecimento como todo.
As instalações podem nem ser necessárias, mas um ponto fundamental é ver se se mantém o
aviamento. Depende das características do estabelecimento. O que é que é necessário para haver
trespasse?
Outra questão é a de eventual necessidade de consentimento de terceiros:
1). Posições Contratuais
Este inclui elementos corpóreos no qual se inclui contratos (de que é titular o trespassante –
contratos de fornecimento, trabalho, etc) quando há transmissão deste há ou não necessidade de
haver consentimento de terceiros?
Para haver transmissão da posição contratual, é necessário consentimento da contraparte
(art.424º, CC – IMP). A outra parte tem de consentir. Para a transmissão de posições
contratuais temos a aplicação do art.424º.
Contudo há casos em que a lei entende que o comércio jurídico e a sua fluidez recomendam a
dispensa deste consentimento (sacrificam o interesse da contraparte) em benefício do
comércio. Há casos em que a lei diz expressamente que, não obstante não é para aquelas
concretas transmissões necessário consentimento.
É exemplo disto, o art.1112º/1/a (CC) que diz que é possível a transmissão do arrendatário
sem consentimento do senhorio.
Regra geral: é necessário consentimento do senhorio (art.424º + 1038º, CC). Contudo quando
existe um trespasse, excecionalmente, não se exige o consentimento do senhorio.
Ex: Locação financeira (leasing) significa que houve um contrato em que essa entidade compra
o automóvel (por ex.) indicado por aquela pessoa e essa compra permite que se alugue em troca
de determinado período e no final da especificidade esta pessoa pode comprar.
No regime jurídico do leasing (DL 149/95) no art.11º tem uma remissão que remete para o
art.1112º/1/a (CC) que é uma atualização (do art.115º RAU).
Havendo aqui contratos de leasing, a propriedade transmite-se sem o consentimento da
empresa de leasing de modo a manter o estabelecimento comercial e não atrapalhar o
processo.
NOTA:
Há por vezes interpretações que tentam generalizar estas exceções no sentido de dizer que os
interesses do comércio prevalecem sobre os interesses da contraparte com o objetivo de
dispensar as contrapartes nos contratos. É interessante para facilitar, a transmissão, mas não
está na lei e o art.424º é um princípio de confiança e o Direito Comercial é um direito de
confiança.
Para Ana Perestrelo, não dá para generalizar esta dispensa da contraparte, é exemplo o
contrato de franquia no qual sem aquele contrato não funciona nada.
O direito comercial é direito civil.
2). Assunção das Dívidas
Quando falamos de assunção de dívidas, falamos de transmissão de dívidas. Havendo dívidas
há credores, logo o credor tem de consentir na transmissão da dívida ou não?
É possível dizer ao Carlos (credor) que em vez de me pedir o pagamento eu realizei um
trespasse do meu estabelecimento comercial a Bernardo e agora é ele o devedor?
Isto não é possível, pois é necessário consentimento do credor para haver uma transmissão
da dívida (e exonerando assim o devedor primitivo).
Coisa diferente é na relação entre as partes, se o credor não consentir continua a haver uma
assunção de dívida, mas que não desonera. Isto é possível, mas é um problema interno.
Na relações entre eles, vai se dirigir ao trespassário que assumiu a dívida perante este. Pode
ocorrer a transmissão da dívida com ou sem consentimento do credor. Perante o credor
este continua vinculado (se não houver o consentimento do credor).
3). Cessação de Créditos (art.577º, CC)
A (credor) tem créditos e não cobrou perante Y (devedor), portanto, pode manter os créditos ou
transmiti-lo. Mas pode transmiti-los sem o consentimento do seu devedor? Sim pode.
Para produzir efeitos perante este devedor tem de haver uma notificação, senão ele nem
sabe que está a ser transmitido o crédito. Aqui é necessário uma notificação de transmissão do
crédito (A transmite a B e deve avisar Y). Não é obrigatório, mas para ter eficácia externa é
necessária a notificação. Se não houver notificação só tem eficácia interna devendo A cobrar o
crédito e depois entregar a cobrança a B.
Muitas vezes não fica muito claro o que fica transmitido e o que é que não fica transmitido.
Havendo trespasse, na maior parte dos casos sabendo que se transmite ou se deixa de
transmitir é o problema de transmissão do contrato.
Sendo certo que para haver trespasse, ultrapassando esse mínimo, fica-se com o problema de
se houver alguma controvérsia entre as partes, houve alguma transmissão?
Temos que interpretar o contrato à luz do art.236º (CC). Muitas vezes as partes transmitem o
estabelecimento com todo o ativo e todo o passivo. Não transmitir dívidas não descaracteriza
nada, contudo, as partes podem querer que seja transmitido ou não.

Trespasse do Estabelecimento que funciona no prédio arrendado


A posição contratual de arrendatário transmite-se. O art.424º (CC) é aplicável e dentro do
regime do arrendamento há uma regra mais específica afirmando que é necessário o
consentimento do senhorio (art.1038º/f).
- Há trespasse (art.1112º/1/a, CC): foi transmitido com tudo o que deve.

- Há aviamento (art.1112º/2, CC): este artigo tem de ser bem interpretado


(teleologicamente) na qual transmite a ideia de que tem de se manter um aviamento
com as suas características. Há trespasse quando se mantém ou não o aviamento.
O senhorio está a ser sacrificado em prol do estabelecimento comercial. Se ele consentiu não
tem de haver consentimento, mas tem de haver uma comunicação ao senhorio conforme é o
nº3.
Art. 1112º/3 (CC): não é necessário consentimento, mas sim comunicação. O senhorio muitas
vezes não recebe a comunicação (mesmo que não haja consentimento deste). Por muito que haja
sacrifício não significa que seja importante, porque a própria lei admite resolução.
Continua a ser um facto ilícito. O legislador não tem dificuldade em aceitar o arrendamento. Se
não houver trespasse, significa que houve perda do aviamento, logo o art.1112º/1/a não se
aplica (não havendo o art.1112º para se proteger). Este exige o consentimento (art.1038º/f).
Nos casos práticos chamam trespasse, mas qualquer situação se perde o aviamento e não há
trespasse. O mais normal é que não há pedido de consentimento. Falhando o trespasse tinha de
ter havido consentimento. Há assim justa causa de resolução do contrato.
CASOS PRÁTICOS: Trespasse num prédio arrendado? – sim/não e depois aplicar

Obrigações dos Comerciantes


O CComercial estabelece, no art.18º, as obrigações especiais a que os comerciantes estão
sujeitos. Falamos de:
o Adotar uma firma
o Ter escrituração mercantil
o Inscrever no Registo Comercial os atos a ele sujeitos
o Dar balanço e prestar contas

A Firma
Complementada com o Registo Nacional de Pessoas Coletivas (DL 129/98)
A firma é originalmente o nome comercial: o nome que o comerciante utiliza no exercício do
seu comércio. O direito à firma, é hoje, distinto do direito ao nome. O direito ao nome acentua,
mau graúdo, a vertente da nacionalidade, enquanto que o direito à firma tende para um
direito a um bem imaterial.
Todavia as suas conexões são ainda evidentes para que a doutrina o considere como um direito
misto: um direito de personalidade reportado, também a bens imateriais patrimoniais. A
sua transmissibilidade é, assim, possível.
Quando implique o nome de uma pessoa, a firma torna-se transmissível, no essencial,
apenas com a autorização do visado.

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A FIRMA POR COUTINHO DE ABREU

Habitualmente diz-se que a firma é o nome comercial dos comerciantes, o sinal que os
individualiza ou identifica (é uma noção insuficiente). Com efeito, além de identificar
comerciantes, a firma individualiza alguns não-comerciantes:
o Sociedades civis de tipo comercial (art.37º, RNPC + arts. 1º, 4º e 9º/1/c, CSC)
o Agrupamento Complementar de Empresas com objetivo civil (têm firma tanto os ACE
comerciantes como os não comerciantes)
o Pode individualizar empresários individuais não comerciantes

Por outro lado, alguns comerciantes são identificados, não por uma firma, mas por uma
denominação.
Todos os comerciantes devem adotar firma ou denominação (art.18º/1, CComercial + arts do
ACE, EPE, AEIE e cooperativas). É das firmas e denominações dos comerciantes, dos sinais
distintivos dos comerciantes que trataremos.

A FIRMA POR PPV

Firma significa assinar, significa assinatura. A obrigação de adotar uma firma tem como
conteúdo o dever de o comerciante adotar uma assinatura especificamente destinada aos atos do
seu comércio.
Esta firma especificamente mercantil tem a vantagem de permitir distinguir os atos que o
comerciante assina nessa qualidade e no exercício do seu comércio daqueles que assina
fora de tal exercício. Assim, o comerciante, quando casa, não assina o assento de casamento
com a sua firma mercantil, mas já o faz quando compra ou vende as mercadorias do seu
comércio.
Esta é uma vantagem importante no que respeita à segurança jurídica, pois a imputação de
um ato ao património de um comerciante é muito facilitada no caso de uso de firma.
Atualmente, a firma desempenha a função de identificação do comerciante (é o seu nome
comercial). O conceito geral de firma comporta assim duas espécies:
o Firma-nome: é composta pelo nome do comerciante, completo ou abreviado (pode
ser ainda acrescido de uma referência indicativa do seu comércio – ex: António José da
Silva, Vinhos e Petiscos).
o Firma-denominação: é formada pela indicação do tipo de comércio exercido (Banco
de Poupança)

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O Regime da Firma
O regime da firma toma corpo através de alguns princípios tradicionais, que vieram a
encontrar consagração legislativa. Aparentemente o RNPC apenas indica dois princípios
reitores (princípio da verdade e o princípio da novidade – arts.32º e 33º, respetivamente) sendo
os restantes resultantes da doutrina.
Princípio da Autonomia Privada, com Limitações Genéricas
A escolha da firma cabe ao comerciante, tanto a decisão de assumir uma firma (que é
obrigatória para quem pretenda exercer o comércio) como a concreta composição da firma em
causa.
o Firmas pessoais (nome das pessoas singulares – art.38º, RNPC)
o Firmas materiais (reportam-se a objetos ou atividades que retratem a exploração
comercial a exercer por quem as use)
o Firmas de fantasia (não têm qualquer representação imediata)
o Firmas mistas (combinam elementos de pelo menos duas das anteriores)

As firmas estão limitadas pelo art.32º/4 (RNPC)


Princípio da Obrigatoriedade e da Normalização
Os comerciantes são obrigados a adotar a firma que seja reconhecível como tal (decorre
dos art. 6º a 10º + art.75º/1/b + art.54º, 55º, 56º e 57º).
o O incumprimento desta obrigação não envolve, por si só, a invalidade dos atos
comerciais que venham a ser praticados pelo faltoso
o A firma deve ter uma expressão verbal, suscetível de comunicação oral e escrita
(não podem ser adotados símbolos)
o As firmas das Sociedades Comerciais têm tratamento autónomo (art.37º, RNPC)
o As firmas das pessoas singulares têm tratamento no art.38º (RNPC)

Princípio da Verdade
A firma deve retratar a realidade a que se reporta (vertente positiva), ou, pelo menos, não
deve transmitir algo que não lhe corresponda (vertente negativa) – art.32º (RNPC).
- PPV: orienta a firma no sentido de não induzir em erro quanto ao seu titular e ao
respetivo comércio
Princípio da Estabilidade
Construído por via doutrinária, diz-nos que quando a firma está identificada com uma
empresa ou um estabelecimento, conserva-se e não pode ser alterada.
o Transferia-se a firma com a transferência do estabelecimento (art.44º, RNPC)
o O princípio da estabilidade entra em conflito com o da verdade, prevalecendo este
último (porque o direito português ainda está muito imbuído na ideia de firma como
“nome” – o que deveria ser repensado pois é um bem comercial)

Princípio da Novidade e da Exclusividade


Presente nos artigos 33º/1 e art, 35º/1 /RNPC) consistem em diversas facetas do mesmo vetor.
o Juízo de distintibilidade da firma recente face à antiga deve ser feito in concreto
perante o universo dos fatores ponderáveis (art.33º/2 e 33º/5)
o As diversas firmas e denominações devem ser novas, distintas e inconfundíveis
(reforçado pelo art.10º/2/3, CSC)
o Critério para aferir se uma firma-denominação é nova, relativamente a outra, é o
de se atender à grafia das palavras, efeito fonético das expressões, ao núcleo
caracterizante, à forma oficiosa dos signos, o público médio, de normal capacidade,
diligência e atenção
PPV: não permite a sua confusão com outra firma de outro comerciante.
Princípio da Unidade
O comerciante só pode girar sob uma única firma. O mesmo vigora tanto para o comerciante
singular como para as sociedades.
o Art.38º/1 (RNPC): predispõe-no para os comerciantes em nome individual e a
doutrina alarga esse princípio às sociedades.
Ex: uma firma para uma atividade de livraria e outra para a atividade de café? Não, o
art.38º fala em uma só firma
Coutinho de Abreu: o princípio admite uma exceção, ou seja, um comerciante (individual)
que exerça atividades mercantis no quadro de um e.i.r.l e fora dele terá duas firmas (art.40º/1,
RRNPC)
Princípio da Licitude (residual) – Coutinho de Abreu
As firmas e denominações não podem conter (art. 32º/4/b/c/d – RRNPC):
- “expressões proibidas por lei ou ofensivas da moral ou dos bons costumes”
- “expressões incompatíveis com o respeito pela liberdade de opção política, religiosa ou
ideológica”
- “expressões que desrespeitem ou se apropriem ilegitimamente de símbolos nacionais,
personalidades, épocas ou instituições cujo nome ou significado seja de salvaguardar
por razões históricas, patrióticas, científicas, institucionais, culturais ou outras
atendíveis”
Princípio da Capacidade Distintiva - Coutinho de Abreu
As firmas e as denominações, enquanto sinais distintivos de comerciantes, hão de ser
constituídas por forma a poderem desempenhar a função diferenciadora.

O Direito à Firma
O direito à firma, com todas as suas prerrogativas, depende do seu registo definitivo no
RNPC (art.35º/1)
- Para as pessoas coletivas é necessário um certificado de admissibilidade de firma
(art.45º/1, RNPC)
Todos os obrigados a ter firma devem requerer a inscrição, em virtude do princípio da
obrigatoriedade.
- Se não o fizerem, o art.12º/1 (RNPC) permite que esta seja feita oficiosamente.

Tem que se aferir se pode haver essa firma (no RNPC), que é sinal distintivo dos
comerciantes (há regras quanto à composição das firmas de diversas entidades que se
encontram reguladas no DL 129/98 - ex: art.36º)

Firma do Comerciante Individual (art.38º, RNPC)


A firma do comerciante individual (pessoa singular) tem de ser composta pelo seu nome
completo ou abreviado conforme seja necessário para a identificação da pessoa, não
podendo a abreviação reduzir-se a um só vocábulo (ver os nº2/3, do art.38º - RNPC)
- Art.39º (RNPC): não há dever de adotar uma firma, há essa possibilidade. Só há
exigência para os comerciantes não para outros empresários
- Art.40º (RNPC): estrutura que não é personalizada.
- Art. 44º (RNPC): tem as disposições centrais da firma (faz articulação do bem
incorpóreo que é o sinal distintivo do comerciante com a organização da própria
empresa).
Firmas das Sociedades Comerciais
- Firma das Sociedades em nome coletivo (art.117º, CSC) : a firma deve ser formada
com ou sem sigla pelo nome dos sócios
- Firma da Sociedade por quotas (art.200º, CSC) : a firma pode ter o nome dos sócios,
da atividade ou mista (exige é sempre o Lda.). O mesmo se aplica às sociedades
anónimas (exige S.A.).
 Contraposição firma-nome (ex: João Tiago, S.A.) e firma-denominação (ex:
sociedade reparadora de automóveis dos Olivais, S.A.)
 Sociedades Anónimas (art.275º/1, CSC – aplica-se semelhantemente)
- Firma das Sociedades em Comandita (art.467º, CSC)

O legislador passou a aceitar sociedades unipessoais olhando para a parte estrutural


(forma de sociedade) e não para a parte pessoal (quantos elementos lá estão)
- Mas antes não se aceitava e criou-se o E.I.R.L (admitindo uma firma para estes -
art.40º)

Tutela da Firma (art.62º, RNPC)


Titulares de firmas ou denominações não registadas não tem o direito à exclusividade
delas. No entanto gozam de alguns meios de proteção.
- Advém do Código da Propriedade Industrial. Utilização por 3º de firma que é conhecida
na praça, mas que não está registada, pode ser concorrência desleal.

Transmissão da Firma (Coutinho de Abreu)


A firma (nome do comerciante) pode ter valor comercial – pode negociar-se autonomamente
a firma? Pode ser vendida a simples nome comercial sobre o qual gira uma determinada
empresa? Não está condicionado à negociação do próprio estabelecimento ou empresa?
Sendo as firmas sinais distintivos de sujeitos, poderia pensar-se serem intransmissíveis. Não
é, todavia assim, normalmente a firma distingue não apenas o comerciante, mas também a(s)
respetiva(s) empresa(s), liga aquele a esta(s).
Enquanto coletor de clientela, a firma pode ter considerável valo económico, interessando a
outros sujeitos adquirir o tal coletor de clientela. Contudo a livre transmissibilidade de firmas
(sem a transmissão das respetivas empresas), daria azo a enganos no público – a clientela liga a
firma a certo sujeito e empresa).
Posto isto, a transmissão entre vivos da firma, obedece a três requisitos:
o A transmissão de uma firma tem de fazer-se com a de um estabelecimento comercial a
que esteja ligada. Devendo entender-se que a transmissão do estabelecimento (e da
firma) tanto pode ser feita a título definitivo (trespasse) como a título temporário
(locação, usufruto).
o É necessário o acordo das partes – devendo o consentimento do transmitente da
firma ser dado por escrito (normalmente no documento que enforma a transmissão do
estabelecimento). Quando o transmitente seja uma sociedade, cuja firma contenha
o nome do sócio (associado), além da autorização daquele, é ainda indispensável a
do titular do nome (art.44º/2).
o O adquirente deve aditar à sua própria firma menção de sucessão e a firma adquirida
(art.38º/2)
A transmissão da firma de comerciante individual pode também dar-se por mortis causa
(art.44º/3, RNPC). Não há razões para que semelhante regime se não aplique à transmissão de
denominações de entes coletivos comerciantes (e não-comerciantes) – art.43º/1.
Art. 44º/4 (DL 129/98): Transmissão da firma tem que ser juntamente com a do estabelecimento
comercial

Para a transmissão da firma é necessário a transmissão de um estabelecimento


comercial a que esteja ligada + acordo das partes, por escrito + menção de haver
nela sucedido

Natureza Jurídica do direito à firma ou denominação (Coutinho de Abreu)


Na doutrina europeia antiga, parece ter dominado a conceção do direito à firma
(denominação), enquanto modalidade ou espécie do direito ao nome, como direito de
personalidade. Esta é uma visão infundada, pois o direito ao nome (das pessoas singulares),
enquanto direito de personalidade (art.72º, CC) apresenta as características próprias desta
categoria de direitos (é intransmissível, vitalício e vocacionalmente perpétuo, não se extingue
pelo não uso, é essencialmente extrapatrimonial).
Ora, o direito à firma (ou à denominação) é transmissível, não é vitalício nem
vocacionalmente perpétuo, extinguindo-se em circunstância várias, inclusive durante a vida do
titular e por não uso, e é essencialmente patrimonial.
A doutrina alemã ainda considera o direito à firma como um direito de natureza mista: não
é puro direito de personalidade nem puro direito patrimonial, mas sim direito conjugando ambas
as feições.
Coutinho de Abreu, critica ver-se a firma como direito ao nome, pois essa é uma categoria
própria de direitos com certas características (intransmissível, vitalício, vocacionalmente
perpétuo, etc), próprias que não se aplicam às firmas. As firmas são bens imateriais (coisas
incorpóreas) passíveis de ser objeto de direitos reais, designadamente do direito de
propriedade.

Art.44: condiciona a firma à transmissão do estabelecimento (leva alguns autores a


entender que há direito de personalidade recortado de bens patrimoniais
imateriais)

Os Contratos e Operações Mercantis


Contrato de Consórcio
O Direito Português, através do DL nº231/81 (28 de julho), define o consórcio como:

O art.2º completa a definição legal com a enumeração daqueles fins:


PPV
Concetualmente, o consórcio é um contrato que se caracteriza pela associação e por certo
fim comum económico. Tipologicamente, o consórcio relaciona-se em série com outros tipos
associativos, como a sociedade comercial, a associação em participação e com o agrupamento
complementar de empresas.
MC
O consórcio, tomado como tipo contratual, pode ser comodamente ponderado com recurso à
explanação dos seus elementos. A definição legal requer, em primeiro lugar, duas ou mais
pessoas singulares ou coletivas. A pluralidade de sujeitos liga-se à natureza contratual da
figura.
Para além disso, a lei não põe limites máximos, tem apenas relevância por permitir concluir
que o consórcio desaparece quando se perca tal pluralidade, desde que, nos termos gerais
possa operar a confusão (art.868º, CC) e sem prejuízo de terceiros (art.871º/1, CC).
As pessoas em causa deverão exercer uma atividade económica. A lei visou acentuar a
natureza basicamente lucrativa e, daí, comercial. Parece, contudo, que não se colocam dúvidas
no tocante à possibilidade de, através da autonomia privada, se puder utilizar o consórcio
num sentido puramente civil: mas ele terá sempre teor oneroso, por oposição a gratuito.
As pessoas interessadas no contrato vão obrigar-se, pelo consórcio, a agir de forma
concentrada (organização comum). Trata-se de um ponto decisivo porquanto possibilita a
qualificação do consórcio com um contrato de organização – por oposição a contrato de
aquisição, de serviços, etc. As partes apresentam-se, nele, com interesses comuns e não
contrapostos. Este aspeto é determinante em todo o regime do contrato.
A concertação referida reporta-se ao desenvolvimento de certa atividade ou à efetivação de
certa contribuição. Ficam contornados os consórcios puramente passivos, em que uma das
partes se adstringiria, simplesmente, a não concorrer com a primeira. Esses elementos – a
atividade e/ou a contribuição – são devidos por cada um dos consorciados, sempre com
subordinação à ideia de “concatenação”.
Por determinação legal, os contratos de consórcio devem ser celebrados por escrito,
requerendo-se a escritura quando estejam envolvidos imóveis – art.3º. As partes têm larga
liberdade de estipulação – art.4º.
Esse preceito apenas ressalva as normas imperativas que ele próprio contenha: um
afloramento de um princípio geral. O consórcio não está sujeito ao registo comercial (o art.3º,
CRComercial não o inclui entre os factos a inscrever).
As alterações ao contrato, a adotar pela forma utilizada para a sua celebração inicial,
devem ser aprovadas por todos os contraentes, salvo quando o próprio contrato preveja outra
fórmula.

Consórcios internos e externos


O regime do tipo legal do consórcio estabelece uma dicotomia entre o consórcio interno e
externo. Segundo o art.5º (DL 231/81), temos:
o Consórcio Interno:
 as atividades ou os bens são fornecidos diretamente a um dos membros do
consórcio e só este estabelece relações com terceiros
 as atividades ou os bens são fornecidos diretamente a terceiros por cada um
dos membros do consórcio, sem que invoquem a qualidade de consorciados
nem a existência do consórcio
O consórcio interno é uma estrutura contratual apenas relevante internamente entre os
consorciados sem eficácia externa. A sua estrutura jurídica é mais fluída.
o Consórcio Externo: as atividades ou os bens são fornecidos diretamente a terceiros
por cada um dos consorciados com invocação dessa qualidade ou da existência do
consórcio.
O consórcio externo, a estrutura contratual do consórcio não se limita às relações internas
entre os consorciados e projeta-se extremamente ao relacionamento com terceiros. A sua
estrutura jurídica é mais densa, podendo ter um “conselho de orientação de fiscalização” e um
“chefe de consórcio”.
Qual o critério distintivo?
A questão reside no carácter oculto ou patente do consórcio. São consórcios internos aqueles
em que não é revelado a existência do consórcio e externos aqueles em que essa existência é
revelada.
A lei portuguesa, dado o peso da organização no domínio do consórcio, regulou a matéria:
- Conselho de orientação e fiscalização (art.7º): é composto por todos os consorciados e
tem funções internas e, salvo estipulação diversa, delibera por unanimidade. As
suas deliberações vinculam o chefe do consórcio.
- Chefe do Consórcio (art,12º) + funções internas deste (art.13º) + funções externas do
chefe de consórcio (art.14º)
- Proibição de fundos comuns (art.20º)

Os deveres dos consorciados, nas dimensões da proibição da concorrência e da


prestação de informações (art. 8º), surgindo ainda as regras no tocante à repartição dos
valores recebidos pela atividade nos consórcios internos e à participação em lucros e
perdas (art.18º). A denominação vem predisposta no art.15º e as relações com terceiros no
art.19º.
Todos estes preceitos tem em comum o serem supletivos, numa ocorrência que deverá ser
confirmada caso a caso, perante a própria lei e em face dos princípios gerais.
A denominação do consórcio externo tem regras. De acordo com o art. 15º/1 (DL
nº231/81), os seus membros podem juntar os seus nomes, firmas ou denominações
sociais, com o aditamento “consórcio de…”, sem prejuízo de apenas ser responsável
perante terceiros quem assine os contratos.
Quanto às posições dos contratantes, toda esta regulamentação é apenas um modelo que
a lei põe à disposição das partes. Ao abrigo do art.405º (CC), dispõem de plena liberdade
contratual: podem, designadamente, celebrar consórcios “atípicos”, acrescentar cláusulas
suas ao modelo legal ou afastar soluções legais supletivas.
Os Consórcios não tem Personalidade Jurídica (PPV)
Os consórcios não possuem PJ, estes têm natureza contratual. A responsabilidade civil é
dos consorciados a quem os atos ilícitos sejam imputáveis (art.19º/3). Também as receitas e
despesas lhes pertencem e são distribuídas de acordo com o que for convencionado no
contrato, embora a lei cuide de estabelecer regras supletivas (art.16º a 18º). Nas relações
com terceiros não se presume a solidariedade ativa ou passiva dos consorciados
(art.19º/1 e 2).
É proibido, por via do art. 20º, a constituição de fundos comuns de modo a dificultar a
institucionalização dos consórcios e evitar partilhas finais.
- PPV: não concorda afirmando que nada impede que os consorciados estipulem a
constituição destes fundos (de fundos de maneio ou de caixa) com a consequência
de apenas da qualificação do contrato como de consórcio de legalmente atípico).
Nada impediria que os consorciados, no âmbito da autonomia privada e da sua
liberdade económica constituíssem um fundo comum paralelo ou abrissem no
banco uma conta comum.

Problema da Repartição dos Ganhos e das Perdas (MC)


O consórcio não tem PJ, pelo que a contratação com terceiros é feita em nome de
algum ou alguns consorciados. A lei não prescreve nenhuma solidariedade, nem ativa nem
passiva e permite que as partes, ao abrigo da sua autonomia privada, o estabeleçam.
No âmbito das relações internas entre as partes, é viável que duas pessoas ajustem entre
si uma repartição de esforços ou de lucros, num negócio para o qual ambas tenham
contribuído.
o Essa repartição de lucros e de perdas nada tem a ver com o estabelecimento de
uma pessoa coletiva – não é a comunhão em lucros e em prejuízos que dá azo à
personalidade coletiva, para haver pessoa coletiva é determinante o reconhecimento
jurídico, o qual surge não pela comunhão em lucros e prejuízos, mas antes por uma
determinada organização formal.
o A contribuição das partes para certos objetivos pode sofrer prejuízos. Se a
contribuição for definida em percentagem, os prejuízos do consorciado serão uma
percentagem dos prejuízos totais.
Já os valores a receber de terceiro, que podem dar lugar a lucro, podem ser repartidos
entre as partes, nos termos do contrato de consórcio, e de acordo com uma distribuição
diferente (art.10º/2).
- Também não esgota a hipótese do chefe de consórcio ser remunerado.
- A organização pressuposta pelo consórcio, ainda que ténue, existe, pelo que é razoável
que as partes incorram numa quota de esforço e percebam uma quota de
vantagens.
Tudo isto é reforçado pelo princípio básico do art.4º/1 que dá ampla liberdade às partes para
acordarem os termos do contrato.

Proibição de fundos comuns (art.20º) não tem a ver com a repartição dos lucros
e perdas, visa apenas facilitar a definição das relações entre as partes
Termo do Consórcio
O consórcio dá lugar a uma situação jurídica duradoura, daí que se fixem esquemas de
cessação, sem os quais ela tenderia a eternizar-se no tempo.
Exoneração dos membros (art.9º)
Corresponde a posição potestativa que o consorciado tenha de pôr cobro nos seus
compromissos, excluindo-se do consórcio.
o Impossibilidade superveniente de realizar as suas obrigações , a qual é liberatória
(portanto absoluta, objetiva e definitiva)
o Comportamento de um consorciado que traduza a um incumprimento perante o outro
bem como uma impossibilidade em relação, também, a outro membro, sem que seja
possível utilizar o esquema de resolução.
Resolução do contrato (art.10º)
Consiste numa posição potestativa que o consorciado tenha de excluir os outros do
consórcio.
o A jurisprudência tem admitido que quando haja apenas dois elementos, a resolução
pode ser oral.
Extinção do consórcio (art.11º)

A Associação em Participação (PPV)


Previsto no DL nº231/81 (28 julho), que regula os contratos de associação em participação e
os contrato de consórcio.
O que a associação em participação tem como característico é a associação pelo comerciante
(associante ou sócio ostensivo) de uma outra pessoa (associado ou sócio oculto) ao seu
negócio, sendo partilhado entre ambos o correspondente resultado.
O associante atua em nome próprio e vincula-se pessoalmente sem menção do associado,
que se mantém oculto. O associado financia o negócio do associante, mas não o exerce, e
participa no respetivo lucro, se o houver.
Só participa nas perdas quando convencionado. A percentagem da participação é estipulada
entre ambos e, se não o for, presume-se proporcional os contributos de cada um forem
avaliados, ou de metade para cada um se houver avaliação.
Concluindo consiste numa organização muito elementar que liga uma pessoa a um
comerciante, conferindo-lhe determinados apoios para o desenvolvimento do seu comércio
e, em troca disso, recebe parte dos lucros que ele venha a obter.
- Toda a atuação é desenvolvida em nome e por conta do comerciante.

Associação em Participação vs Comandita


A divergência entre estas encontra-se na estrutura jurídica, que na primeira é simplesmente
contratual e parciária e na segunda societária, e na personificação da segunda que falta na
primeira. A associação em participação tem uma estrutura jurídica menos densa do que a
comandita, mas economicamente corresponde à mesma função.

Associação em Participação Comercial e Civil


Nos artigos 224º a 229º do CComercial, o contrato de “conta em participação” era qualificado
como um ato objetivamente comercial (art.2º/1ª parte, CComercial). Porém estes artigos foram
revogados por via do DL nº231/81, não obstando a qualificação do presente contrato.
Porém, a associação em participação tem um âmbito mais amplo e abrange, para além da
versão tipicamente mercantil, também uma versão civil.
A associação em participação comercial, aquela em que o associante é um comerciante e o
objeto é um ato ou uma atividade comercial, deve ser qualificada como objetivamente ou
subjetivamente mercantil por ser praticada pelo comerciante no exercício do comércio?
Ambas as qualificações são possíveis, pois esta é praticada pelo comerciante no exercício do
seu comércio (subjetiva) e a prática de atos objetivamente mercantis por comerciantes no
exercício do seu comércio é frequente e não põe em causa a sua qualificação como atos de
comércio objetivo.
PPV: Conclui pela qualificação como ato de comércio objetivo da associação em
participação, sempre que o associante seja um comerciante e o objeto um ou mais atos de
comércio ou uma atividade inserida no seu comércio. Fora destas circunstâncias, a
associação em participação deve ser qualificada como civil.

Natureza Parciária
A associação em participação é um negócio tipicamente parciário. É patrimonial, oneroso, e
a contrapartida da prestação do associado é uma parte do resultado do negócio . Tipicamente, o
associado participa, pois, no risco do negócio embora não participe na sua gestão. Pode
participar nos lucros e nas perdas, ou só nos lucros.
Quando a participação do associado é em dinheiro, quando este aporta capital ao negócio
do associante, a associação em participação desempenha uma função de financiamento. O
contrato aproxima-se então muito do chamado mútuo parciário, ou confunde-se mesmo com ele.
Semelhante à associação em participação é a associação à quota. A diferença deste contrato
em relação ao anterior está na posição do associante que é tipicamente o titular de uma
participação social que associa um outro àquela participação, mantendo-se a respetiva
titularidade apenas no associante e oculta a posição do associado.
Associações como esta podem ser contratadas, com base no princípio da autonomia privada,
em relação a praticamente todas as posições jurídicas no comércio (ex: posição do
empreiteiro, de transportador ou de editor).
Pluralidade de associados
Nada impede que seja contratada uma pluralidade de associados (art. 22º, DL nº231/81).
Neste caso, segundo o texto legal, não se presume a solidariedade entre eles, embora possa
ser convencionada.
Importa distinguir situações diversas consoante o associante celebra uma só associação com
uma pluralidade de associados ou uma pluralidade de associações, cada uma com um ou mais
associados:
No primeiro caso existe apenas um contrato com uma parte plural associada, já no segundo,
há uma pluralidade de contratos de associação em participação. Em concreto, só a
interpretação contratual pode permitir a distinção. Na falta de estipulação, as posições jurídicas
dos vários associados são independentes.

Forma
A associação em participação não carece de forma especial, salva a que for eventualmente
exigida para a entrada do associado (art.23º, DL nº231/81). Este regime é consentâneo com o
carácter tipicamente reservado da associação em participação, cuja existência é mantida fora
do conhecimento do mercado e de outras pessoas para além das partes.

Contribuição e participação do associado


A contribuição do associado é feita na maior parte dos casos em dinheiro, mas pode ser
constituída por outros bens, designadamente pelo uso de máquinas ou equipamentos, de um
estabelecimento, de bens incorpóreos (ex: patentes). A contribuição do associado é constituída
por bens, isto é, algo que tenha utilidade para o negócio ou para o comércio do associante.
CRITÉRIO: A ADEQUAÇÃO DO NEGÓCIO OU AO COMÉRCIO DO ASSOCIANTE
Ao abrigo do art.24º (DL nº231/81), a contribuição do associado deve ser patrimonial e tem
de ser avaliada em dinheiro. Esta avaliação deve, em princípio ter sido acordada ao tempo da
contratação e pode ser objeto de avaliação judicial quando haja desentendimento entre as partes
quanto o seu valor.
A lei diz ainda que a participação do associado pode ser dispensada quando este participe
nas perdas ou em caso de participação recíproca simultânea entre as mesmas partes.
A participação do associado é convencionada entre as partes. O art.25º (DL nº231/81) prevê
um regime supletivo aplicável apenas quando “regime diferente resultar de convenção
expressa ou das circunstâncias do contrato”.
PPV: vê dificuldades práticas da aplicação do regime supletivo. Não parece verosímil que as
partes contratem uma associação em participação sem convencionarem entre si, expressa ou
tacitamente, qual a participação do associado, ou que tal regime não resulte das circunstâncias
do contrato, designadamente, dos movimentos patrimoniais entre associante e associado ou das
respetivas contas ou contabilidades.
Dado o carácter informal e confidencial da associação, pode ocorrer que, em certos casos, se
não consiga provar qual a convenção das partes relativamente ao regime da participação.
Admite que em tais casos possa ser útil o regime de participação consagrado supletivamente
na lei.
Os critérios supletivos de determinação da participação do associado são, a proporção nas
respetivas contribuições (se avaliadas) e, na falta de avaliação, metade dos lucros ou das
perdas, podendo, todavia:
- “o interessado pedir judicialmente “uma redução que considere equitativa, atendendo às
circunstâncias do caso”
- A participação do associado nas perdas é limitada ao valor da sua contribuição
- A participação é calculada sobre os lucros ou perdas “pendentes à data de início ou do
termo do contrato” e reporta-se aos resultados do exercício apurados segundo os
critérios da lei, ou dos usos comerciais “tendo em atenção as circunstâncias da
empresa”
- Lucros a haver pelo associado num exercício são deduzidas as perdas apuradas em
exercícios anteriores “até ao limite da responsabilidade do associado”.
Este critério supletivo é complexo, por vezes vagos, previsivelmente gerador de conflitos e
revela um tropismo para as regras das sociedades. Perante elas, é do interesse do associante e
associado estipularem claramente os critérios de cálculo da participação do associado.

Participação do Associante
O associante está contratualmente vinculado a exercer a atividade à qual associam o
associado. Na associação em participação comercial, o associante é tipicamente um
empresário que exerce a sua empresa com o seu estabelecimento. É para este seu exercício
que associa o associado, que contribui com capital, com bens ou com outras utilidades.
Além do dever de satisfazer a participação do associado, o associante está ainda vinculado ao
dever de boa gestão, de diligência, de não concorrência e de informação no que respeita à
gestão do negócio ou da empresa objeto a que respeita a associação (art.26º, DL nº231/81).
A violação destes deveres pelo associante constitui uma justa causa de resolução do
contrato por parte do associado, cabendo-lhe ainda a indemnização dos correspondentes
prejuízos (art.30º, DL nº231/81).

Extinção da associação
A associação em participação extingue-se nos casos previstos do art.27º (DL nº231/81). Estes
casos correspondem ao esgotamento ou impossibilidade do objeto, pela confusão entre
associante e associado, por resolução do contrato, pela vontade dos sucessores em caso de morte
de um dos contraentes e pela extinção de um dos contraentes ou ainda pela falência ou
insolvência do associante.
O contrato de associação em participação extingue-se também por resolução (art.30º, DL
nº231/81). Embora a lei não o refira, também pode ser extinto por denúncia, mediante pré-
aviso, nos termos gerais, quando o contrato for celebrado sem prazo e não tenha por objeto um
negócio determinado e delimitado no tempo.

Prestação de Contas
Tem uma importância central, na associação em participação, a prestação de contas.
O associante tem o dever de prestar contas ao associado com o fim de lhe permitir
controlar a liquidação da sua participação (art.31º, DL nº 231/81). As contas devem ser
prestadas quando convencionado. Quando a associação tiver por objeto um negócio
determinado, as contas devem ser prestadas no seu termo. Quando o objeto for uma atuação
prolongada e de duração indeterminada, as contas costumam ser prestadas anualmente, no termo
do exercício fiscal.
PPV: não encontra razão para o art.31º/2/2ª parte e não encontra fundamento para a
imperatividade desta.
Quando não sejam prestadas ou haja divergências quanto às contas, as partes a têm à sua
disposição o processo especial de prestação de contas regulados pelos arts.941º e seg. do
CPC.
Natureza da Associação em Participação
Distingue-se do entendimento societário, pois a sociedade postula um exercício comum de
certa atividade económica (art.980º, CC) – o que falta na associação em participação.
o MC: a dogmática das sociedades comerciais é diferente. São lógicas distintas e as
sociedades, embora se prendam a uma ideia de organização voluntária, postulando
esquemas de adjunção muito mais vincados e muito diferentes.
No entanto, não há apenas uma troca de contributo pela participação nos lucros (noção
comutativa) – a lei postula uma pequena organização entre as partes.
Raúl Ventura + STJ = Associação em Participação é um contrato com elementos associativos =
Contrato de Organização
o MC: a associação em participação, por razões dogmáticas e sistemáticas, deve ser tida
como um “ato comercial objetivo”, inserindo-se e passando pelo Direito Comercial,
antes de apelar ao Civil.

Contratos de Distribuição
Os contratos de distribuição consistem nos circuitos económicos de distribuição dos bens,
desde o produtor e até ao consumidor final, são dobrados por esquemas jurídicos destinados a
legitimá-los, fixando os direitos e os deveres das partes envolvidas.
- Todas as relações e fases têm vicissitudes, pois existem muitos intervenientes pelo
meio (muitos distribuidores intermediários), havendo um processo de distribuição
mais complexo do que o normal.
O Código Comercial não tem autonomizado os diversos contratos de distribuição,
regulando-os em muitos figuras relativamente recentes (de inspiração norte-americanas). Logo,
as lacunas são colmatadas:
- Recorrendo à analogia, a partir das normas efetivamente existentes (normalmente
dedicadas ao contrato paradigmático da agência)
- Base em cláusulas contratuais gerais, devidamente sindicadas pela prática.

A comercialização dos bens e a sua distribuição na sociedade pode ser feita de forma:
o Distribuição Direta: o bem passa diretamente do produtor ao consumidor, ainda que
através de representantes, de comissários ou de mediadores

o Distribuição Indireta: o bem atravessa ainda várias fases passando do produtor ao


grossista, do grossista ao retalhista e do retalhista ao consumidor final. Esta pode
ser:
- Integrada: existe uma coordenação entre a produção e a comercialização, de tal
modo que o distribuidor é integrado em circuitos próprios do produtor,
sujeitando-se, eventualmente, às suas diretrizes.
- Não-Integrada: não há tal coordenação. Os distribuidores atuam sem
concertação com os produtores.
Nos contratos de distribuição indireta integrada pressupõe-se, em regra, a celebração entre os
interessados (designadamente entre produtor e distribuidores) de adequados instrumentos
contratuais:
- Quatro tipos de situações jurídicas possíveis:
 Agência (DL nº 178/86)
 Concessão: contrato atípico e inominado e que tem sido definido como aquele
no qual uma pessoa – concedente – reserva a outra – o concessionário – a
venda de um do seu produto, para revenda numa determinada circunscrição
 Franquia/franchising: o franqueador concede a outra, o franqueado a
utilização, dentro de certa área, cumulativamente ou não, de marcas, nomes,
insígnias comerciais, processos de fabrico e técnicas empresariais e comerciais
mediante contrapartidas
 livre organização de cadeias: não há instrumento contratual que estruture a
articulação entre produtor, distribuidores e retalhistas

- As partes, podem, no entanto, convencionar contratos atípicos de distribuição, mas,


haverá sempre um núcleo contratual bastante próximo da agência.

A Agência
Generalidades
O contrato de agência não é apenas um contrato de distribuição, mas sim um contrato de
representação comercial que passou a ser a referência para os outros contratos de
distribuição que não estão tipificados (concessão, franquia, etc).
Ao abrigo do art.1º (DL nº178/86), o contrato de agência, é o contrato pelo qual uma das partes
se obriga a promover por conta da outra a celebração de contratos, de modo autónomo e estável
e mediante retribuição, podendo ser-lhe atribuída certa zona ou determinado círculo de clientes.
- O contrato de agência surge ainda no mundo europeu, através da Diretiva nº
86/653/CEE, relativa à coordenação do Direitos dos EM’s sobre os agentes
comerciais uma vez que o agente é um veículo privilegiado para colocar as mercadorias
para além das fronteiras podendo ainda a agência bulir com questões de concorrência. A
diretriz tem ainda um cuidado especial em subordinar as partes à lealdade e à BF.
Do art.1º (DL nº178/86), temos como elementos fundamentais:
o Dever de promover, por conta de outrem, a celebração de contratos:

Obrigação do agente promover a celebração de contratos


Obrigação fundamental do agente de atividade material de prospeção de mercado e
angariação de clientes, o que antecede e prepara a conclusão dos contratos (onde o
agente já não intervém).
Visa a promoção da celebração de contratos, compreendendo um vasto e
diversificado leque de atos com o objetivo último de conquista ou desenvolvimento do
mercado.
 Função típica do agente de ser intermediário entre principal e clientes,
desenvolvendo toda uma complexa e multifacetada atividade material.
 Agente limita-se a fomentar a conclusão e preparação de contratos, mas
não lhe cabe a celebração desses contratos que promove (agente não tem
poderes para celebrar os contratos, a menos que lhos tenham sido dados)
 Não se confunde com o mandato, que envolve a prática de atos jurídicos.
Neste caso se puder praticar atos jurídicos, isso é uma simples atividade
acessória e complementar da obrigação fundamental de promover a celebração
do contrato.

Por conta de outra parte


Relação interna entre o agente e o principal, que é duradoura e surge por força do
contrato de agência. Distingue-se das relações com terceiros (como as que surgem no
processo de negociação conduzido pelo agente e os clientes)
 O agente atua sempre por conta do principal (efeitos dos atos que pratica
repercutem-se na esfera do principal, pois os atos destinam-se a ele)
 O agente é colaborador do principal e “representa-o” economicamente,
devendo, por conseguinte, de acordo com a sua função, cooperar com ele em
ordem à realização plena do fim contratual
 A agência surge como um contrato de gestão de interesses alheios
 O agente atua por conta e no interesse do principal (diferentemente da
concessão e da franquia onde atuam por conta própria)

o De modo autónomo e estável

Autonomia, onde não há uma subordinação jurídica (como à existente no contrato


de trabalho).
 Não é contrato de agência, quando, apesar de terem o título de agentes, forem
empregados, ligados ao principal por contrato de trabalho estando sob
autoridade e direção de uma entidade patronal (caso dos caixeiros-viajantes,
agentes de seguros, agentes de vendas, etc…)
 A autonomia do agente face ao principal não é absoluta, pois existem
orientações do principal ao agente, que tem de prestar contas da sua atividade
(estas obrigações não podem prejudicar a sua autonomia)
 MC: O agente deve acatar as instruções concretizadoras do
principal, e não as inovatórias
 As instruções não podem ter uma densidade tal que coloque
o agente na posição de empregado do principal

 Januário da Costa Gomes: não há subordinação ao principal, mas


pode haver dependência económica do agente face ao principal
(concretamente quando o agente é exclusivo).

Estabilidade
Há uma durabilidade na relação principal-agente. O principal exerce a sua atividade
de modo estável e contrata um agente não para uma operação isolada, mas antes para
um número indefinido de operações.
Os contraentes vinculam-se por certo período de tempo.
 António Pinto Monteiro: a estabilidade é compatível com a fixação
de prazos curtos, podendo mesmo limitar-se a eficácia do contrato
de agência a certos períodos ou épocas do ano (a atividade do agente
não se pode limitar à prática de um ato isolado, devendo ser uma
atividade com continuidade, dentro do período de tempo por que o
contrato foi celebrado).
Relação contratual duradoura que não se extingue por um ato de
cumprimento.

 Daí não se confundir com a mediação em que há contrato para certo ato concreto
terminando após este.

o Mediante retribuição
A agência tem de ser um contrato oneroso. A retribuição determina-se,
fundamentalmente com base no volume de negócios conseguido pelo agente,
assumindo um carácter variável, sob a forma de comissão ou percentagem (art.15º a
18º).
MC: A agência será, pois, uma prestação de serviço, mais particularmente uma
modalidade de mandato. O agente, terá (diferentemente do mandatário que possui uma
autonomia total) de acatar as instruções do principal (instruções concretizadoras e não
inovatórias). A agência é um contrato oneroso.

Forma
O contrato de agência parece não estar sujeito a qualquer forma. Contudo, o art.1º/1 atribui, a
cada parte, o direito de exigir da outra, um documento assinado com o conteúdo do
contrato (visando assim a proteção do agente) sob pena de nulidade do contrato por falta de
forma.
Logo, os contratos de agência assumem forma escrita e as cláusulas devem assumir a
forma escrita.

Agência – Representação ou não?


A agência pode ser celebrada com ou sem representação (art.2º/1):
o Agência com representação: presume-se que o agente está autorizado a cobrar os
créditos do principal (art.3º/2). Exige autorização escrita.
 Cobrança de Crédito: Consiste na necessidade de se reduzir a
escrito e por razões de transparência e segurança, clarificando a
relação entre o agente e principal, sendo isto uma vantagem para
ambos e para os clientes que passam a dispor de um meio simples
de comprovar os poderes do agente.
O art. 3º/1 comporta um presunção iuris tantum (sendo esta ilidível).
Cobranças não autorizadas caem no art.770º (CC) sem prejuízo do disposto presente no
art.3º/2).

o Agência sem representação:


1. O agente contrata em nome próprio devendo, depois, retransmitir para o
principal a posição adquirida
OU
2. O contrato é celebrado, pelo cuidado do agente, diretamente entre o
principal e o terceiro
Quando o contrato nada diga e não haja instruções do principal, pode o agente sem
representação optar por qualquer uma dessas duas vias.

Circunscrição Geográfica
Esta não é elemento essencial do contrato de agência e é opção dos contraentes. A
delimitação pode ser feita segundo o critério geográfico ou em função de um círculo de clientes
específicos (ou até a qualidade de clientes, quando se trata de grossistas, retalhistas, etc).
Esta delimitação pode ser associada a uma cláusula de exclusivo, nos termos do art.4º (DL
nº178/66) na qual o principal não deve, no círculo que caiba ao agente, contratar qualquer outro
agente, quando este possa exercer atividades em concorrência com o primeiro.

 No silêncio do contrato, o principal não está impedido de utilizar, ainda que dentro
da mesma zona ou círculo de clientes, outros agentes para o exercício de atividades
concorrentes
 No silêncio do contrato, o agente está impedido de exercer, por conta própria ou de
outrem, atividades concorrentes (direito exclusivo a favor do principal – direito do
principal não ter o seu agente a exercer funções concorrentes) não está dependente de
qualquer acordo
 Não há um direito de exclusivo recíproco: o agente beneficia do exclusivo perante o
principal quando há acordo escrito. O principal beneficia de que o agente se abstenha
de práticas concorrentes mesmo na omissão do contrato.
A qualidade de agente exclusivo não obsta a que o principal utilize outros agentes, desde
que se trate de ramo diverso daquele que foi confiado ao primeiro ou caso sejam utilizados
fora da zona ou do círculo de clientes do agente exclusivo.

 Isto implica que o agente, no silêncio das partes, pode exercer outras atividades e até
concorrentes, desde que o faça fora da zona ou do círculo de clientes que lhe foi
confiado.
Se for atuação esporádica e ocasional, em que os clientes propõem contrato diretamente ao
principal, este pode celebrar contratos, na zona reservada ao agente.
Subagentes
Ao abrigo do art. 5º (DL nº178/66), em paralelo com o disposto para o mandato (art. 1165º, CC)
o agente pode recorrer a auxiliares e a substitutos (subagentes). Esta ideia decorre da
autonomia (característica fundamental da agência).
- Agente disfruta da liberdade de ser ele próprio a determinar o conteúdo, modo e
tempo da sua atividade, bem como da sua organização
- MC: o contrato de agência como prestação autónoma de serviços implica uma
margem lata de concretização (vantagem de permitir ao agente procurar, nas
condições de mercado, as melhores soluções para a execução do que lhe compita).
Art.5º/2: O agente atua em face dos subagente como o seu principal.

Boa-Fé (art.6º, DL n178/66)


Referência ao fim contratual mostra ser intenção do legislador abranger toda a relação
contratual, cujo conteúdo interno será conformado pelo escopo concretamente
prosseguido pelos contraentes.

Posições das Partes


Obrigações do Agente (art.7º)
É ao agente, pelo seu conhecimento direito e pessoal do público consumidor, quem está em
condições ideias de prestar à empresa as indispensáveis informações sobre as possibilidades do
mercado, reações da clientela, estado da concorrência e etc.
- Deveres de esclarecimento e informação não estão dependentes do correspondente
pedido do principal (o agente é obrigado a prestá-los, por sua iniciativa sempre que as
circunstâncias o justifiquem, segundo um padrão de boa gestão).
- Tem especial relevância se o agente for autorizado a efetuar cobrança de créditos.

Para além do disposto no art. 7º, impedem sobre o agente:


o Obrigação de segredo (art.8º): se o agente não respeitar, mesmo após a cessação do
contrato, principal pode pedir indemnização nos quadros da responsabilidade pós-
contratual
o Obrigação de não concorrência (art.9º): se o prazo ultrapassa o estabelecido, pode
estar a violar-se o art.61º (CRP) do direito à livre iniciativa económica privada.
o Convenção del credere/dever de garantir, havendo acordo por escrito, o cumprimento
das obrigações de terceiro: o principal passa a dispor da ação contra o agente, que
fica, assim responsável pelo não cumprimento do contrato e/ou em caso de falta de
pagamento das prestações do cliente.
Exige sempre acordo das partes nos termos definidos pelo artigo.
o Dever de avisar de imediato o principal: de qualquer impossibilidade sua de cumprir
o contrato.
Direitos do Agente (art. 13º)
O presente artigo comporta uma enumeração exemplificativa de algumas obrigações típicas
do principal face ao agente e, correlativamente, direitos deste perante aquele.
Os direitos do agente são aqueles que possibilitam o exercício da atividade do agente e
regulam os aspetos do seu direito à retribuição.

Direito a Aviso (art.14º)


O direito de o agente ser avisado, e a correspondente obrigação do principal, se os
contratos promovidos pelo agente se situarem dentro dos valores com que a outra parte
podia razoavelmente contar, tendo em conta as circunstâncias ou o acordo entre ambos.
O principal não está obrigado a concluir todos os contratos que o agente promove, mas a
recusa sistemática sem fundamento pode acarretar prejuízos para o agente (reputação,
retribuição, etc).

Direito à Comissão (art.16º)


A comissão é normalmente constituída por determinado valor ou percentagem sobre o
volume de negócios obtido pelo agente, podendo cumular-se com qualquer importância fixa
acordada pelas partes.
O art.16º/1, estende o direito de comissão não só aos contratos promovidos pelo agente, mas
também aos contratos concluídos com clientes por ele angariados. Evita assim que o
principal se tente substituir ao agente, negociando ele próprio com os clientes para não pagar a
comissão.
Já o art.16º/2 não implica que sejam contratos por clientes por si angariados, basta que
pertençam à zona ou círculo exclusivo do agente.

Sucessão de agentes (art. 17º)


Quem tem direito à comissão no caso de um cliente angariado por A, ter mudado para a zona de
exclusividade de B, sendo o contrato com o principal celebrado após a mudança?
Segundo, António Pinto Monteiro, é o agente que angariou que tem direito à comissão (sem
prejuízo de certos casos pode haver repartição equitativa).

Exigibilidade do pagamento da comissão (art.18º)


O art.16º estabeleceu quais os contratos que conferem o direito à comissão, este artigo
determina quando é que adquire esse direito. Há assim uma proteção do principal contra
atuações menos ponderadas do agente na escolha dos clientes ou perante um eventual
desinteresse daquele após a celebração do contrato.

Falta de Cumprimento da Comissão (art.19º)


Se o contrato providenciado pelo agente não for cumprido por causa imputável ao
principal, mantém-se o direito daquele à comissão.
A proteção de terceiros
O contrato de agência visa celebrar negócios entre o principal e terceiros. Estes colocam-se,
porém, na situação de contratar não com o próprio dono do negócio, mas com o intermediário
(podendo encontrarem-se assim numa certa posição de vulnerabilidade).
A lei vem assim estabelecer diversos mecanismos para a proteção de terceiros (arts.21º a 23º,
DL nº 178/86):
o Art. 21º: o agente deve informar os interessados dos poderes que possui. Através de
letreiros e nos documentos que o identifiquem como agente, ele deve esclarecer se tem,
ou não, o poder de representação e se pode efetuar a cobrança de créditos.
O incumprimento desta regra torna-o responsável por todos os danos que venha a
ocasionar.

o Art.22º: quando não tenha poderes de representação, o agente ou contrata no


próprio nome, funcionando as regras do mandato sem representação, ou proporciona
uma contratação direta entre o principal e o terceiro.
Se porém contratar em nome próprio, caímos na representação sem poderes (art.268º/1,
CC + art. 22º/1, DL nº178/66):

 Art.22º/2: o negócio considera-se ratificado se o principal, tendo


conhecimento da sua celebração e do conteúdo essencial do mesmo
e estando o terceiro de BF, não lhe manifestar, no prazo de cinco dias
após aquele conhecimento, a sua oposição.
o Art.23º:
 Art.23º/1: estabelece uma hipótese muito particular de representação
aparente:
 Havendo representação s/poderes (quando o agente, sem
representação, contrate, não obstante, em nome do principal)
 Mas acreditando o terceiro de BF na existência deles
 Desde que essa confiança seja objetivamente justificada
 E tendo o principal contribuído para fundar essa confiança

O negócio é eficaz. A hipótese mais simples será a de o agente, com


conhecimento e sem reação do principal, se proclamar publicamente
seu representante.

 Art. 23º/2: relativo à cobrança de créditos por agente não autorizado

Cessação
A cessação do contrato de agência comporta cautelas especiais, uma vez que retrata um
momento de vulnerabilidade do agente. Encontra-se regulada nos artigos 24º a 36º (DL nº
178/86).
O art.25º, enumera as formas de cessação do contrato de agência:
o Acordo das partes ou distrate: O mútuo acordo é sempre possível, desde que
comporte a forma escrita (art.25º)

o Caducidade: tem a ver com a sobrevivência de um facto extintivo. O art. 26º enumera
o termo do prazo, a condição e a morte ou extinção do agente.
Na falta do prazo, o contrato tem-se como celebrado por tempo indeterminado
(art.27º/1). E por tempo indeterminado se tem por celebrado o contrato que, não
obstante o decurso do respetivo prazo, continue a ser executado pelas partes.

o Denúncia: é o ato unilateral, discricionário e recipiendo, que se destina a fazer


cessar um contrato de duração indeterminada. É, efetivamente, uma valoração geral
do ordenamento (a de que não pode haver vinculações perpétuas)

A denúncia deve ser comunicada à outra parte com determinada antecedência. Ao


abrigo do art.28º/1, a lei, fixa prazos crescentes, em consonância com a duração do
contrato:
- 1 mês, se o contrato durar menos de um ano
- 2 meses, se o contrato já tiver iniciado o seu 2º ano de vigência
- 3 meses, nos casos restantes

O termo do prazo deve coincidir com o último dia do mês – art. 28º/2 – salvo
estipulação em contrário.
Estes prazos têm um duplo alcance: são supletivos e mínimos. Funcionam sempre que
as partes nada digam e não podem, por elas, ser encurtados.

Art.28º/3: As partes podem sim, fixar prazos mais longos, o prazo a observar pelo
principal não pode ser inferior ao do agente (quando este último seja superior, deve o
primeiro alinhar autonomamente)

Art.28º/4: na hipótese de conversão de agência com prazo em agência de duração


indeterminada, por execução posterior das partes, o tempo decorrido desde o início.

 Denúncia sem pré-aviso (art.29º/1): é eficaz, mas obriga o


denunciante a indemnizar a outra parte pelos danos causados.
Ao abrigo do art.29º/2, sendo o agente prejudicado a indemnização é
substituída pela remuneração que, na base da média mensal do ano
precedente ou do próprio ano, quando o contrato neste haja
principiado, o agente iria auferir.

o Resolução: implica um ato recipiendo, assente em determinada justificação e que faça


cessar imediatamente o contrato de agência, tenha ele ou não prazo.
A resolução pode operar (art.30º):

 Resolução Subjetiva: se a outra parte faltar ao cumprimento das suas


obrigações quando pela sua gravidade ou reiteração não seja exigível a
subsistência do vínculo contratual (incumprimento culposo do sujeito)

 Resolução Objetiva: se ocorrerem circunstâncias que tornem impossível ou


prejudiquem gravemente o fim contratual, em termos que tornem inexigível
a sua manutenção, até ao prazo convencionado ou imposto para a denúncia
A resolução deve ser comunicada por escrito, com indicação das razões e no prazo de
um mês após o seu conhecimento (art.31º). Ultrapassado este prazo, caduca o direito
à resolução (deve assim o interessado recorrer à denúncia).

Independentemente do direito à resolução e mesmo que este caduque, a parte lesada


tem o direito a ser indemnizada pelos danos resultantes do incumprimento da
outra parte (art.32º/1).
Se a resolução operar por razões objetivas, a parte lesada terá o direito a uma
indemnização assente na equidade (art.32º/2).

A indemnização da Clientela
Conclusões da aula teórica lecionada pela Prof. Carolina Nagy Correia (08/11/2023)
A Indemnização da Clientela no Contrato de Agência
Temos o contrato de agência que termina e no qual o agente conseguiu, durante o contrato,
angariar muita clientela. O principal continua assim a ter benefícios pela clientela angariada
pelo agente, deve ser este repensado?
A indemnização encontra-se prevista no art.33º da Lei do Contrato de Agência. No art.33º
vem invocar sumariamente quais são os critérios que o agente possui após a cessação do
contrato. Trata-se de uma indemnização devida ao agente, sempre e após apenas da cessação
do contrato de agência seja por um lado qual for a formação de cessação do contrato de
agência ou nos termos do qual um contrato oneroso.
A forma de cessação de contrato e o tempo durante o qual existiu o contrato entre as
partes não interferem com a indemnização. Também não releva se já houve outra
indemnização por cessação do contrato.
A indemnização por clientela resulta dos benefícios que o principal continua a usufruir
devido ao trabalho exercido pelo agente em angariar clientela.
- Pinto Monteiro diz que a indemnização da clientela não é uma verdadeira
indemnização do direito civil, devendo chamar-se compensação. Não estamos
perante uma verdadeira indemnização porque ela não está dependente da prova de
danos (a indemnização do âmbito do direito civil está sempre dependente da existência
de danos, não havendo danos não há indemnização) sofridos pelo agente (reconhecido
pela jurisprudência – AC. 09/1979, p. ex).
Não estamos perante uma verdadeira indemnização, só contado para esta os
benefícios resultantes da vigência do contrato que durante este eram de benefício
comum (agente e principal ) e após a cessação do contrato os benefícios passam a ser
só do principal (devendo o agente ser compensado por tal).
É uma compensação que se aproxima mais do ESC (art.473º, CC), pois temos um
benefício que passa para o principal, mas que foi angariado pelo agente, devendo ser
este a possuir o benefício e não o principal, devendo assim este último compensar o
agente do benefício que obteve sem razão. Mesmo que o agente não possua danos
(podendo este ainda obter um dano proveniente de um lucro cessante) há sempre
benefício para o principal abrindo lugar a uma compensação.
A lei do contrato de agência advém de uma diretiva da EU 86/53 relativa à formação do
direito do EM sobre a indemnização. O art.17º deixa espaço aos EM’s para eles próprios
quererem adotar mais uma linha/ideia de compensação ou de indemnização propriamente dita
(há EM’s que adotam as duas).
- A doutrina alemã segue esta linha da compensação (e não da indemnização)
- A doutrina francesa tem uma componente recessarcitória (interesse ressarcível)
- A doutrina portuguesa aproxima-se mais do ESC
Existem determinados requisitos positivos e negativos para apurar a sua existência.
Relativamente aos requisitos:
Positivos:
o Art.33º: requisito que aparece no art.33º/1, só aplicamos a indemnização de
clientela quando cessar o contrato (independentemente da forma de cessação).
o Art.33º/1/a: O agente tem que ter angariado novos clientes para o principal ou pelo
menos ter aumentado substancialmente a clientela (aqueles clientes que já existiam
compraram mais no negócio).
- Pinto Monteiro: tenho um agente que tem uma base de clientes reconhecida no
início do contrato. Contudo estes clientes estavam descontentes com o
principal, sendo assim esta base de clientes pouco segura. Portanto o agente
esforçou-se muito e conseguiu que eles ficassem.
Pode assim haver espaço a indemnização neste caso, em que não houve novos
clientes nem expansão do negócio, apenas manteve os antigos?
O benefício aqui ser ter existido a manutenção de clientes, ao qual sem o
agente não teria sido possível mantê-los (art.33º/1/b). Nos termos do
art.33º/1/a consiste em mantê-los sem terem ido embora.
Não é necessário que se verifiquem de forma efetiva, bastando para o efeito que se verifique
que estes se podem vir a ocorrer. Quando cessa o contrato podemos não saber quais serão os
benefícios que o principal vai obter (art.33º/1/d).
Relativamente aos benefícios não é necessário que estes já se tenham concretizado,
bastando um juízo de prognose para a sua constituição. Não tem que ser o principal a obter
os benefícios diretamente (ex: o principal tem ao seu serviço outros agentes e por isso fá-lo
através de outro agente ou concessionário ou outro tipo de contrato de distribuição - Ou seja,
quando estamos a avaliar os benefícios olhamos numa perspetiva global, não só no contrato de
agência, podendo-se dar em outros tipos de contratos presentes).
Não há benefícios, após a cessação do contrato, se o principal alterar o negócio.
Negativos
É uma exceção à indemnização de clientela.
o Art.33º/1/c: no caso de o principal ter acordado com o agente que lhe vai continuar
a pagar, após o termo do contrato, um preço de garantia que o conduza à
adquirição de clientes (é convencional – cláusula de contrato de acordo). Sendo esta
uma indeminização convencional, o agente, não recebe mais outra indemnização pelos
benefícios que o principal tenha (só recebe a convencional).
O cálculo da indemnização da clientela, a quantia que será paga por convenção é muito
menor daquela que seria paga por norma (segundo a lei), o que interessa é que as
quantias pagas não sejam meramente simbólicas.
Renuncia antecipada de direitos: ex, o principal enganou o agente, colocando no contrato de
agência, afirmando que paga cinco euros p/mês após a cessação do contrato. Estes cinco
euros por mês não equivale ao benefício que o principal adquirirá com a adquirição de nova
clientela. O principal estabelece assim esta cláusula de forma a impedir o agente de
requerer uma indemnização pela via normal. No presente caso a cláusula seria nula.
o Cessação do contrato não poder ser imputável ao agente (art.33º/3): se a cessação do
contrato for imputável ao agente não há lugar a indemnização de clientela.
Esta tem disposição imperativa, nos contratos de agência pensa-se numa parte mais forte
(principal que possui mais poder) e uma parte mais fraca (agente). As normas imperativas
preveem proteger a parte mais fraca (não neste caso a proteção de terceiros).
Quanto à natureza injuntiva desta disposição, esta natureza imperativa é questionável
porque há vários casos em que não há parte mais fraca, no qual o distribuidor pode ter
certo poder, equacionando perante determinado caso e dados se entre o principal e o agente
continuar a tutela do agente distribuidor ser uma tutela bastante mais acrescida que o normal
haja no caso em concreta uma desvalorização monetária inferior.
Se o contrato tiver cessado por causas imputáveis ao agente, não há indemnização de
clientela (transposição do art.18º da diretiva).
Prazo para a indemnização (art.33º/4)
O prazo é de um 1 ano para o pagamento que implica o vencimento imediato e a entrada
em mora do principal. Intenta a ação judicial respetivamente.

Art.16º
Art.16º/1: não tem aplicação quando falamos de contratos concluídos após a cessação dos
contratos de agência angariados pelo agente. Esta cessação está incluída no âmbito de
indemnização da clientela.
Art.16º/3: o agente tem direito a determinadas comissões/garantias quando cabe a ele a
preparação/negociação dos contratos e a conclusão dos contratos deu-se apenas devido à
atividade do agente.
Contrapondo com o art.33º não se aplica o art.16º/1 quando esses contratos tenham sido
celebrados após a cessação do contrato de agência (aplicando-se as normas legais de
indemnização da clientela).
Art.34º
Segundo o presente artigo, o limite máximo de indemnização é de um ano (art.17º/2, diretiva
da EU) e o agente receberá em princípio o menor de dois valores (relativo à atividade ou
indemnização atual -?).
Quanto ao cálculo baseado na equidade é necessário ver qual a média auferida nos últimos
cinco anos. Será necessário ter em consideração quais os benefícios que o principal adquire
com a extinção do contrato. Se mantivesse o contrato o que é que se ganhava e quais são
efetivamente as perdas que o principal tem por não ter o contrato de agência em vigor.
É feito um juízo de prognose quer em conta às perdas e aos ganhos. Deve ser tomada em
conta a prognose da intervenção dos clientes (atividade dos clientes em relação à empresa, ou o
que quer que seja).
Tem que se ter em consideração e descontar os juros de antecipação do pagamento. É
descontado do valor a parte relativa à taxa negativa de juro derivada da antecipação.
ML vem adicionar outros critérios relevantes para a indemnização de clientela segundo a
equidade:
o Duração do contrato: a longa duração beneficia o agente, sendo um critério para
aumentar a compensação/remuneração do agente
o Infrações contratuais: podem ser tidas em conta para a indemnização
o Poupança de despesas do agente: se o agente se tenha deslocado pelo país para
angariar mais clientela, deve ser tido em conta que o principal pagou de antemão estas
despesas ao agente.
Estes critérios são relevantes para determinar o cálculo da indemnização.
Para ML são também considerados outros fatores como a publicidade que se fazia a favor
do agente, a força atrativa da marca usada pelo principal (ex: sociedade de advogados, onde
o advogado trabalha na VdA, os advogados daqui tentam angariar clientes para a VdA, mas
sendo a VdA, uma grande sociedade consegue angariar mais clientes pela sua marca e de forma
mais facilitada do que sociedades mais pequenas - Aqui a indemnização de clientela não deve
ser muito elevada, porque não houve tanto esforço).
Pinto Monteiro, questiona se o contrato cessar por razões imputáveis ao agente é uma coisa e
se cessar por iniciativa do agente (não por incumprimento seu), faz sentido haver indemnização
de clientela devido à iniciativa do agente?
Faz sentido, pois o facto de o agente querer sair de uma relação contratual não o deve
penalizar de receber uma indemnização porque ele adquiriu clientela na mesma. Essa ratio
continua a existir.

A Concessão
É um contrato atípico e inominado.
Segundo Pinto Monteiro, a concessão é um contrato-quadro em que o concedente se obriga
a vender ao concessionário, para este revender, determinadas quotas de bens, aceitando
certas obrigações (de respeito à organização, política comercial e assistência aos clientes) e
sujeitando-se a um certo controlo e fiscalização do concedente)
- Este contrato é juridicamente atípico e é no regime da agência que se
integram as suas lacunas, vendo caso a caso se há analogia de situações que
justifique a aplicação da sua aplicação
O contrato de concessão opera em áreas que exigem investimentos significativos e que o
produtor dos bens ou serviços a distribuir não queira ou não possa, ele próprio, efetuar.
Corresponde, tendencialmente, a esquemas destinados a distribuir produtos de elevado valor
(ex: veículos automóveis).
Na concessão, um produtor fixa, com um distribuidor (o concessionário) um quadro de
distribuição que se norteia pelos seguintes parâmetros:
o Comerciante (concessionário) insere-se na rede de distribuição do produtor
o Adquire o produto em jogo, junto do produtor e obriga-se a vendê-lo, em seu
próprio nome, na área do contrato
A concessão pode, depois, ser enriquecida com numerosas outras cláusulas.
Designadamente, o concessionário pode ficar adstrito a determinadas metas, à efetivação de
certos investimentos ou à utilização de marcas ou de insígnias que identifiquem o produto em
jogo.
A concessão é um contrato que estabelece relações duradouras, no âmbito das quais o
concessionário opera iure proprio (pode ainda operar como promessa genérica de aquisição e
de venda de produtos, com diversas prestações de facere em anexo). É um contrato-quadro, cujo
âmbito vão, depois e na execução, surgir outros contratos entre as duas partes.
O contrato de concessão, implica uma distribuição a nível internacional, sendo ainda nessa
circunstância, complementado com elementos internacionais privados.
Este contrato difere de outros contratos:
o Difere da agência (art.1º, DL 178/66): concessionário age por conta própria
o Difere do mandato (art.1157º, CC) : concessionário age por conta própria e
adstringe-se a atividades materiais e jurídicas
o Difere do contrato de trabalho (art. 1152º, CC)
o Difere da comissão (art.266º, CComercial) e da sociedade (art. 980º, CC)
o Difere do consórcio: concessionário e concedente não têm propriamente uma
atividade comum e antes se verifica que os beneficiários agem por si
o Difere da mediação: concessionário não se obriga a promover qualquer
aproximação e contrata ele próprio
o Difere da transmissão de saber fazer ( know how): uma pessoa transmite a outra a
Contrat
tecnologia ou, em geral, os conhecimentos aplicados necessários para concretizar
os
determinada tarefa, não patenteados (está presente na concessão)
Atípico
o Difere do contrato de franquia: dominado pela autorização para usar certas marcas
ou insígnias e para utilizar especiais esquemas de comercialização. A fiscalização do
franqueador é mais intensa do que a do concedente.
Como o contrato de concessão é atípico, ele muitas vezes inclui cláusulas próprias de
figuras “afins”, de tal modo que a distinção pode não ser linear e ser problemática.

Regime da Concessão

O contrato de concessão não tem base legal direta, sendo assim uma figura assente na
autonomia privada. À partida, trata-se de um contrato que não está sujeito a qualquer forma
solene. Pode ser meramente verbal ou pode resultar de condutas concludentes. O seu
regime resultará, da interpretação e da integração do texto que tenha sido subscrito pelas partes.

No que as partes tenham deixado em aberto, haverá que recorrer à analogia. O direito
comparado estabelece, neste domínio, o recurso ao regime da agência.
- Ora, relativamente ao regime português, quanto ao que não for estabelecido,
recorre-se analogicamente ao regime da Agência (conforme o disposto no
art.4º do Preâmbulo do DL 178/86) sendo este o instrumento fundamental
para acudir a lacunas que surjam em contratos de concessão

- Particularmente relevantes são as regras relativas à cessação do contrato, na


qual a norma ateniente à indemnização da clientela (art.33º, DL nº 178/66) é
aplicável ao contrato de concessão
Contudo têm de se verificar os pressupostos (não se aplica automaticamente e
tem de se ponderar os requisitos e a analogia).
No regime da concessão comercial deve ter-se em atenção as regras sobre as CCG, que são
aplicáveis:
o Aplica-se o regime da CCG entre empresários (para uniformizar os diversos
contratos de distribuição que celebrem)
o As CCG daí derivadas, sujeitam-se às regras jurídicas gerais e, em particular, ao
regime específico que para elas exista
o Mas há tendência na jurisprudência de dar a pequenas empresas um nível de proteção
próximo daquele que a lei dá aos consumidores

Especificidades
É possível detetar, no tocante ao regime e ao funcionamento prático da concessão, algumas
especificidades:
o A concessão postula uma relação de confiança (não se aplica assim o prazo
admonitório do art.808º/1/2ª parte, CC)
o O regime de exclusividade não é necessário e para existir tem de ser acordado. A
exclusividade não é, ainda e só por si, contrária às regras da concorrência, tão-pouco é
suficiente para provar a concessão
o A concessão pode envolver a formação profissional do pessoal do concessionário

A concessão, nos seus elementos úteis, deve ser provada por quem, dela se queira prevalecer.
Quanto à sua duração:
o Não havendo prazo, ela só pode ser denunciada com um pré-aviso sob pena de dar
azo a um dever de indemnizar

o Havendo culpa do concedente na cessação da concessão, pode este ser condenado a


retomar os stocks antes vendidos ao concessionário, não há, todavia, nenhum
fundamento jurídico para, em qualquer caso, limitar as indemnizações ao dano negativo
(pelo direito português, todos os danos devem ser sempre indemnizados) – HÁ
SEMPRE RETOMA DE STOCKS
- Quando o contrato é denunciado, o concessionário não pode fazer mais do
que está estipulado no contrato (que é a revenda de stocks), portanto fica com
produtos que não pode vender
 Pinto Monteiro: deve haver uma retoma de stocks (o concedente
readquire os stocks e paga o correspondente por eles. O valor da retoma
é que é mais discutido)

o A denúncia ilegal é eficaz, mas obriga a indemnizar


- Pinto Monteiro: pré-aviso no âmbito da concessão pode ser estendido e tem de
haver um ajuste, uma vez que nesta figura há uma maior investimento e mais
confiança

o A indemnização pode ser computada pelo interesse contratual positivo, precedendo


uma ponderação cuidadosa do caso concreto

Indemnização de Clientela1
Há uma transposição automática do regime da agência: a analogia teria de ser verificada. Já se
entendeu que a indemnização da clientela teria uma natureza social (isso obrigaria a verificar
se o concessionário se inseriu mesmo na organização do concedente e se ele é digno de tutela).
A compensação da clientela é uma compensação prevista pela clientela angariada, desde
que se verifiquem os demais pressupostos da lei e haja analogia. Havendo lei, não se aplicam as
regras do ESC.
Além da indemnização de clientela, a interrupção abruta de uma concessão pode obrigar à
retoma dos stocks, havendo danos não-patrimoniais.
Pode ainda impor-se uma indemnização por investimentos feitos pelo concessionário,
incluindo em formação profissional e que se venham a perder e caberá indemnizar pelas
maiores despesas (despedimentos coletivos, restituição de subsídios ao Estado e
incumprimentos ocasionados junto de fornecedores).

1
As normas sobre a indemnização de clientela, na agência, não tem aplicação automática (há
sempre que ponderar os requisitos e a analogia).
A Franquia (Franchising)
No contrato de franquia, uma pessoa (o franqueador) concede a outra (o franqueado) dentro
de uma certa área, cumulativamente ou não:
o Utilização de marcas, nomes ou insígnias comerciais
o Utilização de patentes, técnicas empresariais ou processos de fabrico
o Assistência, acompanhamento e determinados serviços
o Mercadorias e outros bens, para distribuição

Segundo Pinto Monteiro, franquiado é o comerciante que atua em nome e por conta
própria, estando adstrito ao plano delineado pelo franquiador e executa-o, surgindo aos
olhos do público, ao distribuir os bens com a imagem empresarial do franquiador.
A ideia de franquia andava inicialmente em torno do privilégio/liberdade, pois o franquiador
permite ao franquiado o acesso à área que, em princípio, lhe estariam vedadas (utilização
das marcas, nomes, insígnias, patentes e outras técnicas de que o franqueador tenha o
exclusivo). Mais tarde a franquia enriqueceu-se com elementos próprios de distribuição de
bens e serviços.
Esta surgiu nos EUA, e tornou-se um esquema próprio de expansão internacional de
empreendimentos. Tem sucesso devido:
o Às possibilidades abertas pela publicidade, no tocante à divulgação de marcas e
estilos de vida
o À mobilidade crescente dos consumidores, que facilita uma oferta uniforme de
bens
o Aumento dos rendimentos

Veio a tornar-se um contrato de distribuição implicando elementos próprios da agência e da


concessão (angariação de clientes e distribuição de bens e serviços, funcionando numa base
hierarquizada).
O contrato de franquia é um contrato atípico, totalmente dependente da autonomia
privada. Pode apresentar elementos próprios da agência ou da concessão, surgindo assim como
o mais variável e mais complexo dos contratos de distribuição.
Existem assim várias classificações:
o Franquia de Serviços: pela qual o franqueado oferece um serviço sob a insígnia/nome
comercial/marca do franqueador, conforme diretrizes deste (ex: Avis, Hertz)
o Franquia de Produção: o franqueado fabrica, segundo as indicações do franqueador,
produtos que ele vende sobre a marca deste (ex: Coca Cola, Pepsi)
o Franquia de Distribuição: o franqueado limita-se a vender certos produtos num
armazém, que usa a insígnia do franqueador (ex: Lojas Pronuptia)

Posição das Partes


A franquia vive dominada pela autonomia privada, logo só apenas pela interpretação de cada
contrato considerado se poderá verificar qual o seu alcance e quais os deveres que dele
resultam para as partes.
Na base da habitualidade, é possível apontar os deveres das partes que, em regra, tendem a
surgir:
Obrigações do Franqueador2
o Facultar ao franqueado o uso da marca, insígnia ou designação comercial, na
comercialização de produtos por este adquiridos ou fabricados
o Auxiliar o franqueado no lançamento e na manutenção de certa atividade
empresarial, munindo-o de conhecimentos técnicos ou produtos necessários
o Facultar ao franqueado técnicas ou processos produtivos de que o franqueador teria
o exclusivo
o Fornecer os bens ou serviços que, porventura, o franqueado deva distribuir

Direitos do Franqueador
o Retribuição da percentagem do produto das vendas
o Poderes de fiscalização quanto a especificações e qualidades do produto vendido sob a
sua marca
o Poderes de aprovação ou fiscalização no que toca a pontos de venda, a sua
configuração, etc
o Poderes no domínio da cessão da posição contratual e da renovação do contrato
o Receber a contrapartida dos bens ou serviços que forneça

Obrigações do Franqueado
o Pagamento de certas retribuições
o Lançamento e desenvolvimento da sua atividade dentro de certa circunscrição
o Manutenção da qualidade dos serviços ou produtos do franqueador
o Sigilo quanto a conhecimentos recebidos do franqueador
o Comparticipação em despesas de publicidade
o Certas cláusulas de não-concorrência

Direitos do Franqueado
o Uso da marca, insígnia ou nome comercial do franqueador
o Utilização de conhecimentos, técnicas, etc. do franqueador
o Auxílio do franqueador no lançamento, manutenção e desenvolvimento da sua
atividade, recebendo indicações
o Fornecimentos acordados

Embora economicamente subordinado, o franqueado é juridicamente autónomo, pelo que não


justificaria uma tutela de tipo laboral (tem a proteção dada pelo contrato de agência)
- Analogia da agência não se aplica tout court e tem de se ter em conta o que
está explicitado no preâmbulo e se as condições estão reunidas

2
Há ingerência do franquiador na atividade pois há um fornecimento de “know-how”,
assistência, métodos, planos de mercado, conhecimentos tecnológicos e etc
Cessação da Franquia
O contrato de franquia dá lugar a uma situação duradoura. Na sua cessação, há que observar
os quadros competentes, com relevo para a resolução (unilateral e justificada) e a denúncia
(unilateral e discricionária).
Pelo que o modelo de cessação aplicável é o da agência (com as adaptações necessárias). A
cessação não pode, pela natureza das coisas, ser retroativa.
Como especialidade, verifica-se que o franqueado fica numa patente subordinação
económica, sendo-lhe por vezes exigidos investimentos significativos, em nome de uma
situação que o franqueador poderá fazer cessar se o contrato lho permitir.
Ora os contratos de franquia são fixados unilateralmente pelos franqueadores que, muitas
vezes recorrem para o efeito a cláusulas contratuais gerais.
- Coloca-se assim aqui o problema da tutela do franqueado, no qual embora
economicamente subordinado, o franqueado é juridicamente autónomo:
não se justificaria, por isso, o recurso a uma tutela de tipo laboral.
Impor-se-ia, contudo, alguma proteção: a do contrato de agência. No entanto, a indemnização
de clientela só é aplicável na medida em que ela exista – muitas vezes a clientela é angariada
pelo franqueador, dado o peso da sua marca e publicidade; o franqueado pouco receberá por
isso o contrato de franquia deve ser conjugado com as orientações vindas do DUE e com as
regulações vindas do Direito da Concorrência.

Aspetos Práticos
A franquia coloca problemas de interpretação contratual pois esta deve ser feita numa
lógica empresarial, em termos de funcionamento, de modo a apreender-se a lógica de grupo
onde o franqueado pretende inserir-se.
- Pode também haver uma coordenada societária – essa natureza mista permite
fazer apelo aos mais diversos contratos, prevalecendo o sentido dado pelas
partes ao negócio.

Conclusões da Aula Teórica lecionada pelo Professor Diogo Coelho (10/11/2023)


Contrato de Concessão e de Franquia
Primeiro aplica-se aquilo que as partes indicam entre elas. Caso haja algum conflito aplica-se
analogicamente o DL 178/86.
Contrato de Concessão
As partes obrigam-se a num futuro celebrar múltiplos contratos para CV no futuro. Ou seja, o
concedente vende X produtos ao concessionário e este último obriga-se a pagar.
Integração na rede: O concessionário integra-se na rede social do concedente. Embora possua a
sua autonomia está sujeita à política social do concedente.
Ex: Pingo Doce e Continente fazem um contrato com fornecedores de carnes no qual este
obriga-se a vender X de carnes ao Pingo Doce/Continente que depois revende em seu uso. Será
um contrato de concessão? Não, pois falta a integração na rede, este é um mero contrato de
fornecimento (o Pingo Doce/Continente vende os produtos como quer, não estando sujeito às
obrigações de venda dos fornecedores).

Contrato de Franquia (Franchising)


O franquiado está completamente mergulhado na rede do franqueador. O franquiado aparece aos
olhos do público a imagem comercial do principal, ou seja, o franquiado comercializa o produto
com a imagem do principal (não acontece o mesmo nos stands de automóveis, pois contrata-se
com a Santogal e não com a BMW se não for um stand desta empresa).
Existe autonomia jurídica, mas o que se pretende é uma integração total do franquiado na
estrutura do franquiador (o franquiado aparece aos olhos do público como franquiador).
Ex: McDonalds do Campo Grande pertence ao Jacinta e filhos, Lda. Ora, nos contratos de
franquia há um conjunto muito restrito de regras que tem de ser cumpridas e aspetos como
receitas, etc, que tem de ser partilhados.
Cabe ao franquiado pagar o plus que é uma contrapartida económica ao franquiador pelas
receitas, formações, etc que o franquiador fornece. Claro que também cabe ainda ao franquiado
pagar o preço das carnes, bebidas, etc.
E em termos de regime jurídico?
É o que é acordado pelas partes, caso não haja consenso aplica-se analogicamente o DL relativo
à agência.

O tema da cessação do contrato


Os problemas jurídicos mais interessantes e mais recorrentes são a cessação do contrato de
concessão e franquia. Surge aqui a questão da denúncia do contrato.
Para a denúncia é preciso uma razão objetiva circundante do contrato que venha justificar a
cessação deste. Se não existe denúncia, nos contratos de duração indeterminada, era uma
relação perpétua (proibida pelo nosso sistema).
Os prazos aplicáveis para a concessão e franquia: é necessário pré-aviso para que a contraparte
não seja apanhada de surpresa e não sofra danos. Mas será que os um/dois/três meses do
contrato de agência são suficientes para os contratos de concessão e franquia?
Não, quando o franquiado vê o contrato concessado tem que reajustar a sua atividade a uma
nova cadeia. Logo o prazo do art.28º não é suficiente.
Quem é que fica com o risco de bens em stock, nos contratos de concessão?
Quando as partes acordam, é de acordo com o estipulado. Nos casos em que não há
acordo:
o 1ªvia (Pinto Monteiro): aplicação analógica a estes casos o art.239º (CC). Devem-se
ler as declarações do concessionário como estando sujeitas a uma condição resolutiva,
voltando assim o negócio para trás. Descobre-se, integrando a lacuna, uma condição
implícita resolutiva. O risco dos bens em stock fica na esfera do concedente.
Prof. Diogo Coelho: é contranatura, pois a lógica do contrato de concessão, a principal
vantagem para o principal é exonerarem-se do risco de comercialização ao mercado
(aos clientes) pois esse problema cabe ao distribuidor (lógica económica dos contratos
de concessão). Se entendermos que os bens em stock são um problema do concedente,
estava a fazer-se recair sobre este quando o contrato se extingue (o prof. não concorda).
Também não é claro o que se faz aos bens em stock, o que deve o concedente fazer?
Destruí-los?

Indemnização de Clientela
Concessão
Um acórdão de uniformização de jurisprudência, o concessionário tem direito à indemnização
de clientela (aplica-se analogicamente o art.33º, do DL do contrato de agência desde que
estejam preenchidos os pressupostos provando não só que o concessionário adquiriu clientela e
que o concedente beneficiou). Este acórdão de uniformização de jurisprudência não vincula,
mas admite recurso (condicionando assim os tribunais inferiores, exercendo um grande poder de
facto).
Em termos de prova dos requisitos, é mais complicada porque na agência é fácil, pois quem
celebra os contratos e quem sabe quem são os clientes é o principal (contrariamente aos
contratos de concessão).
Prof. Ferreira Pinto: tem uma decisão mais crítica da indemnização da clientela a favor do
concessionário. A remuneração do agente é ao negócio. Na concessão a remuneração do
concessionário é o lucro pelo que pagou pelo carro e o preço que ganhou dos clientes. Recusa
assim a aplicação analógica do art.33º do DL.
Franquia
Quanto à franquia, o franquiado não tem direito à indemnização de clientela. Pois o trabalho do
franquiado na clientela é menor (um Big Mac é igual em qualquer McDonalds).
Art.31º tem um prazo muito curtíssimo de caducidade para resolver o contrato e a indemnização
de clientela igual.

A ia (Manual ML)
A insolvência traduz a situação daquele que está impossibilitado de cumprir as suas
obrigações, normalmente por ausência da necessária liquidez em momento determinado, ou em
certos casos porque o total das suas responsabilidades excede os bens de que pode dispor para
as satisfazer.
- Encontra consagração legal no art.1º (CIRE)
- É um problema com que qualquer sociedade se tem de deparar uma vez que
permite o recurso ao crédito
A partir do momento em que se reconhece a legitimidade de diferir para o futuro o cumprimento
de obrigações, também se gera a possibilidade de esse cumprimento não vir efetivamente a
ser possível nesse momento futuro.

O Direito da Insolvência
O Direito da Insolvência abrange as consequências resultantes da impossibilidade do
cumprimento pelo devedor das suas obrigações:
o Situação do devedor
o Medidas de conservação e a liquidação do seu património
o Eventuais medidas de recuperação que venham a ser determinadas
o Determinação e a graduação dos direitos dos credores
o Satisfação (normalmente parcial) dos direitos dos credores

O Direito da Insolvência pode ser considerado como um complexo de normas jurídicas que
tutelam a situação do devedor insolvente e a satisfação dos direitos dos seus credores.
Abrange assim normas oriundas do direito comercial (devedores comerciais), direito civil (em
relação a outros devedores), DPC (relativo ao processo de insolvência), direito penal, direito
processual penal e direito internacional privado.
Segundo ML, é exagerado afirmar que falamos num ramo próprio do direito, este é sim direito
substantivo de natureza privada, constituindo um ramo próprio do direito da responsabilidade
patrimonial.
O Direito da Insolvência possui uma forte componente processual, dado que, por
necessidade de tutela dos direitos do devedor e dos credores envolvidos, é necessária a
intervenção do tribunal, coadjuvado pelos órgãos da insolvência.

O Processo da Insolvência
Existem as seguintes formulações do processo de Insolvência:
o Formulação restrita: consiste numa sequência ordenada de atos que se inicia com a
apresentação à insolvência (art.18º e 19º) ou o pedido da sua declaração (art.20º e
seg.) e se conclui com o pagamento aos credores (arts. 172º e seg.) ou com alguma
das outras causas de extinção do processo (art.230º/b/c/d/e)

o Formulação ampla: o processo abrange ainda as tramitações estruturalmente


autónomas que surgem na dependência do processo de insolvência, em
consequência da declaração de insolvência, como os embargos à sentença
declaratória de insolvência (art.40º e seg.), as ações apensas ao respetivo processo
(art.85º e seg.), a resolução em benefício da massa insolvente (art. 120º e seg.), a
verificação dos créditos (art.128º e seg.) e a restituição e separação de bens (art.141º e
seg.)
A que encontramos presente no regime da insolvência é a formulação ampla, ao qual o
Prof. Lebre de Freitas, tece uma crítica afirmando que esta formulação sofre de falta de
rigor dado que a unidade dum processo civil exige, ao mesmo tempo que a subordinação
dos atos nele praticados a uma finalidade global, também a sua inserção numa sequência
estruturalmente autónoma.
A insolvência, de acordo com os professores Castro Mendes e Jesus dos Santos, é uma ação
executiva visto que tem por fim a obtenção de providências adequadas à reparação
efetiva de direitos de crédito violados (art. 4º/3, CPC).
É uma execução com características especiais:
o Execução coletiva: o seu fim é a satisfação dos direitos de todos dos credores de
um devedor. O processo de insolvência visa o tratamento igualitário de todos os
credores do devedor (par conditio creditorum), visto que a crise económica do
devedor torna previsível que nem todos os credores verão satisfeito o seu
direito3.
o Execução genérica/total: abrange todo o património do devedor e não apenas os
bens necessários para fazer face a algum ou alguns créditos determinados.
Contudo, não implica necessariamente que se venha a verificar uma liquidação
integral do património do devedor.
Consiste numa forma de execução para pagamento de quantia certa
Concluindo, é assim um processo especial no qual o valor da causa para efeitos deste é
fixado pelo valor do ativo do devedor indicado na petição inicial, o qual é corrigido logo que
se verifique ser diferente do valor real (art.15º, CIRE).

A Situação de Insolvência
Ser insolvente significa ser incapaz de cumprir a suas obrigações, mas essa incapacidade tem
que ser certificada em determinado momento, através da declaração de insolvência.
Só que essa incapacidade de cumprimento pressupõe uma avaliação complexa que pode ser
realizada através de dois critérios principais:
o Critério do Fluxo de caixa ( cash flow): o devedor é insolvente logo que se torna
incapaz, por ausência de liquidez suficiente, de pagar as suas dívidas no momento
em que estas se vencem.
Para este critério, o facto de o seu ativo ser superior ao passivo é irrelevante, já que a
insolvência ocorre logo que se verifica a impossibilidade de pagar as dívidas que
surgem regularmente na sua atividade.
Trata-se de um critério simples, pois, excluindo os casos em que o devedor se encontra
de boa-fé em lítigio sobre as suas obrigações, o facto e não as pagar no momento do
vencimento indicia claramente a sua insolvência

o Critério do balanço ou do ativo patrimonial ( balance sheet ou asset): a insolvência


resulta do facto de os bens do devedor serem insuficientes para o cumprimento
integral das suas obrigações. A insolvência não é afastada pelo facto de o devedor
cumprir as obrigações que se vencem no giro normal da sua atividade, uma vez que o
que seria decisivo seria o facto de o conjunto dos seus bens não permitir satisfazer as
suas responsabilidades.
Este critério pressupõe uma apreciação jurisdicional mais complexa, pois os bens do
devedor nem sempre são de avaliação fácil (pode variar em função do preço ou da
alienação do estabelecimento como um todo, etc)

O critério da lei portuguesa

3
Através do processo de insolvência, efetua-se a reunião de todos os credores em assembleia,
para os quais se institui a administração do património do devedor através de um administrador
de insolvência que, sob a fiscalização do tribunal, procura obter a melhor valorização possível
desse património e proceder à sua repartição pelos credores em termos igualitários.

O processo de insolvência não depende, no entanto, da existência efetiva de uma pluralidade de


credores, uma vez que a lei não veda o recurso à insolvência no caso de existência apenas de um
único credor
Ao abrigo do art.3º/1 (CIRE), a insolvência é definida como a impossibilidade do
cumprimento das obrigações vencidas, tendo aqui assim presente o critério do fluxo de caixa.
Aqui a insolvência corresponde à impossibilidade do cumprimento pontual das obrigações e não
à mera insuficiência patrimonial, correspondente a uma situação líquida negativa.
A liquidação negativa não implica a insolvência do devedor se o recurso ao crédito lhe
permitir cumprir pontualmente as suas obrigações, assim como uma situação líquida
positiva não afastará a insolvência, se se verificar que a falta de crédito não permite ao devedor
superar a carência de liquidez para cumprir as suas obrigações.
Contudo, ao abrigo do art. 3º/2 (CIRE), a lei vem permitir a aplicação do critério do
balanço. Ora, a insuficiência patrimonial funciona como um critério acessório de definição de
insolvência aplicável apenas às pessoas coletivas e aos patrimónios autónomos por cujas dívidas
nenhuma pessoa singular responda pessoal e ilimitadamente, por forma direta ou indireta.
- ML: estas entidades não deixam de estar igualmente sujeitas ao critério geral da
insolvência explanada no art.3º/1, sendo o critério do art. 3º/2 uma alternativa em
ordem a facilitar o pedido de insolvência por parte dos credores destas entidades, que
podem ser afetados pela responsabilidade limitada dos seus sócios.
Assim, estas identidades podem ser declaradas insolventes em caso de o balanço
demonstrar a manifesta inferioridade do passivo em relação ao ativo,
independentemente da natureza do passivo ou do vencimento das obrigações.
O art.3º/3 (CIRE), apresenta-nos uma correção do critério: uma vez que os balanços
comerciais têm um significado limitado, para efeitos de insolvência, existe uma correção
do critério quando o ativo é superior ao passivo4, sendo avaliadas as seguintes regras:
- Inclusão no ativo e no passivo dos elementos identificáveis, mesmo que não
constantes do balanço, pelo seu justo valor
- No caso de o devedor ser titular da empresa, valorização da mesma segundo uma
perspetiva de continuidade ou liquidação, consoante o que se afigure mais provável
- Exclusão do passivo das dívidas que apenas hajam de ser pagas à custa dos fundos
distribuíveis ou do ativo restante depois de satisfeitos ou acautelados os direitos dos
demais credores
Insolvência iminente (art.3º/4º, CIRE)
À insolvência atual é ainda equiparada a insolvência iminente, no caso em que o devedor se
apresente à insolvência (art.3º/4, CIRE), permitindo-se assim que a apresentação do devedor se
verifique antes de preenchidos os pressupostos da declaração de insolvência.
Este critério tem especial relevância para afastar o requisito do vencimento das dívidas
constantes do art.3º/1 (CIRE), permitindo ao devedor apresentar-se à insolvência antes desse
vencimento sempre que um juízo de prognose permita fazer supor que nessa altura se verificará
uma impossibilidade de cumprimento. Depende do momento em que se verifica o futuro
vencimento das obrigações.

Sujeitos Passivos da Declaração de Insolvência


O elenco dos sujeitos passivos da insolvência consta do art.2º/1 (CIRE) do qual resulta o
elenco dos sujeitos passivos da insolvência. Este compreende tanto pessoas singulares e
4
Situações em que, apesar de não se verificar um passivo superior ao ativo, se está, ainda assim,
perante uma situação de insolvência
coletivas, como também outras entidades, normalmente designadas como pessoas rudimentares,
ou mesmo simples patrimónios autónomos.
Fala-se assim numa personalidade insolvencial, que não coincide necessariamente com a
personalidade jurídica (art. 66º, CC), nem com a personalidade judiciária em geral (art.5º e
ss. CPC), já que é relativa apenas à suscetibilidade de ser objeto de um processo de insolvência.

Sujeitos Passivos abrangidos pelo regime comum da Insolvência (art.2º/1, CIRE)


a) Quaisquer pessoas singulares ou coletivas
Pessoas Singulares
Podem ser sempre declaradas insolventes, independentemente de serem ou não já
economicamente independentes, ou mesmo terem plena capacidade jurídica.
A insolvência de pessoas singulares é, no entanto, sujeita a regras especiais, de que se
destaca a possibilidade de solicitar a exoneração do passivo restante (art. 235º e seg.). As
pessoas singulares à insolvência podem ou não ser empresários, sendo que a insolvência dos não
empresários ou titulares de pequenas empresas é sujeita igualmente a um regime especial
(art.249º e seg.):
- Se a pessoa singular for empresária, não há qualquer distinção entre o seu
património do devedor, incluindo o privado, responde pelas dívidas empresariais,
sendo consequentemente abrangido pela insolvência
Pessoas Coletivas
De acordo com o art.2º/1/a, este abrange as associações e as fundações, mas também as
sociedades comerciais (nome coletivo, quotas, anónimas, e em comandita) as sociedades civis
sob forma comercial e as cooperativas).
Em relação às pessoas coletivas, a declaração de insolvência acarreta normalmente a sua
dissolução, perdendo posteriormente estas a personalidade jurídica com o encerramento da
liquidação. No entanto, após a dissolução da pessoa coletiva, e enquanto não estiver
encerrada a liquidação, continua a ser possível a declaração de insolvência.

b). Herança Jacente


É a herança que já foi aberta, mas ainda não foi aceite nem declarada vaga para o Estado
(art.2046º, CC). A sua declaração de insolvência, em princípio, não será de interesse para os
herdeiros, que podem repudiar, mas pode ser requerida por qualquer credor da herança, de
modo a controlar a sua liquidação.
E se houver aceitação da herança insolvente?
o Prof. PSM (Pedro Sousa Macedo): Com a aceitação verifica-se a confusão entre as
esferas patrimoniais da herança e dos herdeiros, pelo que não faria sentido que o
processo continuasse contra a herança, que perde a sua autonomia, e consequente
personalidade judiciária (art. 6º do CPC), cabendo aos credores exercer o seu direito
contra o herdeiro, com as limitações decorrentes da separação de património

o Prof. ML: Mesmo após a aceitação da herança, mantém-se a possibilidade de


declarar a sua insolvência, dado que esta constitui um património autónomo sujeito
a administração do cabeça-de-casal até à sua liquidação e partilha (art. 2079º do
CC), e os patrimónios autónomos estão genericamente sujeitos a insolvência. O
herdeiro não pode ser sujeito a insolvência pelas dívidas da herança, atenta à limitação
da sua responsabilidade (art. 2071º)
c). As associações sem personalidade jurídica e as comissões especiais
As pessoas singulares que as compõem respondem ilimitadamente pelas dívidas que elas
contraírem, contudo como a sua responsabilidade é subsidiária, a declaração de insolvência
abrange diretamente estas entidades e apenas devidamente as pessoas singulares
d). As sociedades Civis
ML: Considera que são pessoas coletivas, estando sujeitas ao seu regime
e). As sociedades comerciais e as sociedades civis sob a forma comercial até à data do
registo definitivo do contrato pelo qual se constituem
ML: considera que são pessoas coletivas, estando sujeitas ao seu regime
f). As cooperativas, antes do registo da sua constituição
ML: considera que são pessoas coletivas, estando sujeitas ao seu regime
g). O estabelecimento individual de responsabilidade limitada
Sendo o estabelecimento individual de responsabilidade limitada sujeito passivo da
declaração de insolvência, não parece que a sua insolvência possa afetar automaticamente o
seu titular, porém, mesmo que ele tenha respeitado o princípio da separação patrimonial,
será, de algum modo, sempre afetado.
h). Quaisquer outros patrimónios autónomos
Em vez de o devedor ser objeto de um processo de insolvência geral, que abranja todo o
seu património, a insolvência é restrita a apenas uma parte, sujeita a um regime especial de
responsabilidade por dívidas, o que legitima que se fale em insolvência especial ou particular.

Massa Insolvente
O âmbito e a função da massa insolvente encontram-se definidos no art.46º (CIRE). Esta
abrange todo o património do devedor à data da declaração de insolvência, bem como os
bens e direitos que este adquira na pendência do processo, só sendo, no entanto, os bens
isentos de penhora integrados na massa insolvente se o devedor voluntariamente os integrar e a
impenhorabilidade não for absoluta.
Quanto à sua função, esta destina-se primordialmente à satisfação das dívidas da própria
massa insolvente (art.51º, CIRE) e apenas depois dos créditos sobre a insolvência.
Em relação aos bens e direitos que compõem a massa insolvente, estes correspondem em
princípio à totalidade do património do devedor à data da declaração da insolvência
(art.601º, CC). Contudo, esta compreende ainda os bens que o devedor for adquirindo na
pendência do processo e, bem assim, aqueles que forem sendo reintegrados no mesmo, através
do exercício pelo administrador de insolvência da resolução em benefício da massa (art. 120º e
seg. CIRE).
- Bens sujeitos a penhora: só são integrados na massa insolvente se o devedor
voluntariamente os integrar e a impenhorabilidade não for absoluta
Composição
Totalidade do património do devedor à data da declaração de insolvência
o Bens dos Responsáveis Legais pelas Dívidas : Apesar de a lei não o referir,
naturalmente que se deverão considerar integrados na massa insolvente os bens
dos responsáveis legais das dívidas do insolvente, ou seja, das pessoas que respondem
pessoal e ilimitadamente pela generalidade das suas dívidas, ainda que a título
subsidiário (art. 6º/2 do CIRE)

 Pessoas que se encontram nesta situação: Sócio único (art. 84º do CSC),
sócios em nome coletivo (art. 175º/1 do CSC), comanditos (art. 465º/1 do
CSC), gerentes e administradores de quaisquer sociedades quando, pela
inobservância culposa das disposições legais ou contratuais destinadas à sua
proteção, o património social se torne insuficiente para a satisfação dos créditos
(art. 78º/1 e 4º do CSC)

o Bens do Cônjuge: Se o insolvente for casado em regime de comunhão de bens ou


adquiridos, a massa insolvente compreende, não apenas os seus bens próprios, mas
também a sua meação nos bens comuns (art. 1696º do CC). Se o cônjuge insolvente
não for parte no processo, tem o direito de separar da massa insolvente os seus
bens próprios e a sua meação nos bens comuns (art. 141º/1b do CIRE) - esta
separação também pode ser ordenada pelo juiz (art. 141º/3 do CIRE).

o Bens adquiridos na pendência do processo (art. 120º do CIRE): Por exemplo, uma
herança que o devedor receba no decurso do processo pertence à massa insolvente,
não podendo o devedor proceder ao seu repúdio (art. 2062º do CC), pois tal
representaria um ato de disposição dos seus bens, que lhe é vedado, dado que tais
capacidades se transferem para o administrador de insolvência

o Bens Excluídos
 Nunca podem ser incluídos: Não entram na massa insolvente os bens
absoluta ou totalmente impenhoráveis (art. 822º do CPC) ou pertencentes ao
devedor, objeto de uma restrição de responsabilidade pelas suas obrigações (ex:
bens adquiridos em mandato de execução - art. 1184º CC)

 Podem eventualmente ser incluídos: Os bens relativa ou parcialmente


impenhoráveis (art. 823º e 824º do CC) apenas podem ser integrados se forem
voluntariamente apresentados pelo devedor (art. 46º/2 do CPC)

Classificação dos Créditos


Uma vez que na situação de insolvência se verifica necessariamente um desequilíbrio entre
o ativo e o passivo do insolvente, importa determinar, não apenas quais os bens e direitos que
integram o seu ativo (massa insolvente), mas também quais as obrigações que esse ativo pode
ser a vir chamado a satisfazer, ou seja, o passivo do insolvente.
O passivo do insolvente é naturalmente composto pelo conjunto de créditos que podem ser
exercidos contra o insolvente, pelo que em princípio a massa insolvente pode ter que vir a ter
que responder por todos eles.
Contudo, a lei estabelece que a massa insolvente deve primordialmente satisfazer aqueles
créditos que são consequência da própria situação de insolvência (dívidas da massa
insolvente – art.51º, CIRE) pelo que apenas depois de estes estarem satisfeitos, é que se
procede ao pagamento dos créditos cujo fundamento seja anterior à própria situação de
insolvência ou tenham sido adquiridos no decurso do processo (créditos sobre a insolvência
– art.46º e ss.).

A Dívida da Massa Insolvente


São consideradas dívidas da massa insolvente aquelas cujo fundamento reside na própria
situação de insolvência. O art.51º institui uma enumeração exemplificativa dessas dívidas, em
termos que justificam esclarecimento.
Nos termos do art.51º (CIRE) são consideradas como dívidas da insolvência (enumeração
exemplificativa):
o 51º/a (CIRE): custas do próprio processo de insolvência
o 51º/b (CIRE): remunerações do administrador da insolvência e as despesas deste e dos
membros da comissão de credores
o 51º/c (CIRE): dívidas emergentes de atos de administração, liquidação e partilha da
massa
o 51º/d (CIRE): dívidas resultantes da atuação do administrador de insolvência

 Em caso de insuficiência da massa insolvente para o seu pagamento, o


administrador é responsável pessoalmente por essas dívidas perante os
credores, podendo, no entanto, ilidir a sua responsabilidade, demonstrando que
a insuficiência da massa era imprevisível (art.59º/2, CIRE)

o 51º/e (CIRE): dívidas resultantes da atuação do administrador judicial provisório


o 51º/f (CIRE): dívidas resultantes de contrato-bilateral cujo cumprimento não seja
recusado pelo administrador da insolvência
o 51º/g (CIRE): dívidas resultantes de contrato-bilateral cujo objeto seja uma prestação
duradoura
o 51º/i (CIRE): dívidas que tenham por fonte o ESC da massa insolvente
o 51º/j (CIRE): Obrigação de prestar alimentos relativa ao posterior à data de declaração
da insolvência (de acordo com o art.93º)
Regime
o Prioridade: apresenta-se mais favorável ao pagamento, dado que o art.172º (CIRE)
determina que devem ser satisfeitas antes dos créditos sobre a insolvência, sendo pagas
na data do respetivo vencimento, independentemente do estado do processo

o Podem ser exigidas diretamente: como não estão sujeitas ao processo de verificação
e graduação dos créditos, não tem de ser reclamadas (art.128º e ss. CIRE). Podendo
os credores exigir diretamente o seu pagamento ao administrador da insolvência

Créditos sobre a Insolvência


São os créditos sobre o insolvente que tenham natureza patrimonial, ou sejam garantidos
por bens integrantes da massa insolvente, cujo fundamento seja anterior à declaração de
insolvência (art.47º/1, CIRE) e ainda aqueles cujos titulares mostrem tê-los adquirido no
decurso do processo (art.47º/3, CIRE).
Não podem, porém, esses créditos revestir a natureza de dívidas da massa insolvente
(art.51º, CIRE), uma vez que estas são sujeitas a um regime próprio, sendo satisfeitas
primeiramente (art.172º, CIRE).
A distinção entre as categorias de créditos da insolvência a que se refere o art.47º/4 (CIRE),
pode ser formulada pela fórmula seguinte5:

 Créditos Garantidos
 Créditos Privilegiados
 Créditos Comuns
 Créditos Subordinados
 Créditos Sob Condição

Quais devem ser os primeiros a pagar?


Devem ser pagos primeiramente os créditos da massa insolvente e só depois os créditos da
insolvência. Esta prioridade resulta do art.172º/1 (CIRE).

Os Órgãos da Insolvência6
Tribunal
Falamos no tribunal comum, uma vez que os tribunais do comércio só são competentes se o
devedor for uma sociedade comercial ou a massa insolvente integrar uma empresa (art.89º/1,
LOFTJ)
Competência Territorial: É primordialmente atribuída ao tribunal da sede ou do domicílio
do devedor ou do autor da herança à data da morte, consoante os casos (art.7º/1, CIRE) do
devedor ou do autor da herança à data da morte, consoante os casos (art.7º/1, CIRE), sendo
igualmente competente o tribunal do lugar em que o devedor tenha o centro dos seus
principais interesses (art.7º/2, CIRE)
Administrador da Insolvência
O administrador é escolhido pelo juiz (art.52º, CIRE), de entre os administradores inscritos
na lista oficial, devendo essa escolha ser efetuada por processo informático que assegure a
aleatoriedade da escolha e a igualdade de distribuição nos processos (art.13º/2, Lei 22/2013).
Comissão de Credores
A comissão é nomeada pelo juiz, podendo ser composta por 3 a 5 membros efetivos e 2
suplentes, sendo o presidente o maior credor e devendo a escolha dos restantes assegurar a
adequada representação das várias classes de credores, com exceção dos credores
subordinados (art.66º/1, CIRE).
Assembleia de Credores
A reunião de todos os credores numa assembleia justifica-se, face ao cariz coletivo da
execução do processo de insolvência, que implica a necessidade de coordenação das
pretensões dos diversos credores, através de deliberações em que cada credor vota com base no
montante dos seus créditos.

5
Ver Sebenta Luísa (págs. 33 a 37)
6
Ver Sebenta Luísa (págs. 38 a 43)
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Conclusões (Prof. Ana Perestrelo de Oliveira)
Órgãos da Insolvência
- Tribunal
- Administrador da Insolvência (art.52º e seg. CIRE): é uma pessoa profissional
que é escolhida pelo tribunal. Substitui-se ao devedor na administração do
património, na liquidação e partilha. É quem vai organizar tudo.
- Comissão de Credores: é um órgão que não é obrigatório, mas sim eventual que
reúne vários representantes das diversas classes de credores e tem um papel de
fiscalização e cooperação com o administrador
- Assembleia de Credores: é o órgão que reúne todos os credores, harmonizando
a pretensão de todos os credores.
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