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B - Os actos de Comércio

 
5. Noção
Da leitura do art. 2º CCom emerge a ideia de que certos actos jurídicos, ou seja, certos
acontecimentos juridicamente relevantes são considerados como comerciais. No entanto, a
palavra “acto” deve ser tomada num sentido mais amplo de que o compreendido no seu
significado básico corrente – o da conduta humana –, pois aqui ela abrange:
a) Qualquer facto jurídico em sentido amplo, verificado na esfera das actividades mercantis e
ao qual sejam atribuídos efeitos jurídicos, designadamente:
- Factos jurídicos naturais ou involuntários;
- Factos jurídicos voluntários, isto é, actos jurídicos, quer lícitos, quer ilícitos;
- Negócios jurídicos voluntários, mormente de carácter bilateral ou contratos.
b) Tanto os factos jurídicos isolados ou ocasionais, que podem ser praticados, muitas vezes, por
comerciantes ou por não comerciantes, como os actos que fazem parte de uma actividade
comercial, ou seja, de uma massa, cadeia ou sucessão de actos jurídicos interligados pela
pertinência a uma mesma obrigação – e por visarem a prossecução de fins comuns, quer do fim
imediato ou objecto – exploração de um determinado tipo de negócio –, quer o fim mediato –
consecução de lucros.

6. Distinção entre actos e actividade mercantil


O corpo do art. 230º CCom, determina: “haver-se-ão por comerciais as empresas individuais ou
colectivas, que se propuserem:” seguindo-se uma série de números que referem diversas
espécies de actividades económicas.
As actividades das empresas enumeradas neste artigo estão classificadas como actos do
comércio objectivos.
O que em todo o caso ressalta evidente é que o art. 230º CCom, tem destacada importância
como norma qualificadora, quer pela relevância nele atribuída à empresa no plano conceitual,
que sobretudo por dele decorrer a sujeição ao Direito Comercial de todos os actos que se
enquadrem nas actividades das empresas em questão, mesmo que não tivessem se encarados
isoladamente.
Os actos praticados no exercício de uma das actividades abrangidas pelo art. 230º CCom, serão
sempre actos de comércio, por não terem “natureza essencialmente civil”[1] e por serem
praticados por um comerciante no âmbito com o seu comércio.
A actividade comercial é, um encadeado de actos interligados e duradouro, sendo o art. 230º
CCom, que, no conjunto de actos que a integram, nos permite valorar cada um deles em termos
jurídico-comerciais.
 
7. Conceito material da actividade comercial
Não há, na lei comercial, uma definição material unitária de acto de comércio. E por outro lado,
na medida em que o art. 2º CCom, considera comerciais, em regra, todos os actos do
comerciante no exercício da sua actividade, mais difícil parece encontrar um conceito que a
todos abrange, uma factualidade típica que englobe todos os actos na sua multiplicidade.
  
10. Actos de Comércio subjectivos e objectivos
São actos de comércio objectivos, os que são regulados na lei comercial, em razão do seu
conteúdo ou circunstâncias.
São actos de comércio subjectivos, aqueles que a lei atribui comercialidade pela circunstância
de serem tais actos conexos com a actividade comercial dos seus autores.

11. Actos de comércio absoluto e por conexão ou acessórios


Os actos de comércio absolutos ou por natureza são comerciais devido à sua natureza
intrínseca, que radica do próprio comércio, na vida mercantil. São actos gerados e tipificados
pelas necessidades da vida comercial.
Podem-se distinguir duas espécies de actos dentro desta categoria:
- Uns, – que são a maior parte – são actos absolutos em virtude de serem os actos
caracterizadores, típicos, essencialmente integrantes daquelas actividades que tornam o
objectivo material do Direito Comercial;
- Outros são actos absolutos em razão da sua forma, ou do objecto sobre o qual incidem.
Os actos de comércio por conexão ou acessórios são comerciais apenas em virtude da sua
especial ligação a um acto de comércio absoluto ou a uma actividade qualificada de comercial.

14. Actos de comércio causais e abstractos


Diz-se causal, todo o acto que a lei regula em ordem a preencher ou a realizar uma
determinada e específica causa-função jurídico-económica.
É abstracto, aquele que se revela adequado a preencher uma multiplicidade indeterminada de
causas funções, podendo a relação jurídica que dele resulta ter uma vida independente da
relação que lhe deu origem.

15. Actos bilateralmente comerciais ou puros e actos unilateralmente comerciais ou mistos


São bilaterais ou puros os actos que têm carácter comercial em relação às duas partes. E são
unilaterais ou mistos os actos que apenas são comerciais em relação a uma das partes, e civis
em relação à outra (art. 99º CCom).
 
Noção de comerciante

16. Noção de comerciante e a sua importância


O legislador não deu uma definição legal de comerciante, mas sim, indica quais sãos as
categorias legais de comerciantes (art. 13º CCom).
Tem-se segundo o entendimento tradicional do art. 13º CCom, por um lado os
comerciantes que são pessoas singulares – geralmente designados por comerciantes em
nome individual – e os comerciantes que são pessoas colectivas – as sociedades
comerciais.
No domínio do Direito Comercial, deve prevalecer, em geral, a noção de comerciante
que resulta do art. 13º CCom: comerciante é quem, enquadrando-se numa das duas
categorias do art. 13º CCom, seja titular de uma empresa que exerça uma das
actividades comerciais, tais como as qualificam o art. 230º CCom, e as demais
disposições no avulsas que caracterizam e englobam no Direito Comercial certas
actividades económicas.
A aquisição da qualidade de comerciante é sempre originária, não podendo transmitir-
se nem inter vivos, nem mortis causa.
Portanto, quem organizar ou adquirir uma empresa comercial terá de preencher, em si
mesmo, os requisitos necessários para obter de si a qualidade de comerciante.
O art. 13º/1 CCom, refere-se a pessoas. Em geral, entende-se que aquele n.º 1, só
abrange pessoas singulares: os chamados comerciantes em nome individual. Mas pode
questionar-se se ali se abrangerão também pessoas colectivas.
Há, três casos especiais quanto ao problema do art. 13º/1 CCom:
a) As sociedades civis em forma comercial: a solução tradicional, que sustenta que não
são comerciantes, foi posta em dúvida face ao art. 42º/1 DL 42645, de 14 de Novembro
de 1959, tal como pode sê-lo hoje perante o art. 3º CRC, que sujeita tais sociedades à
matrícula. Ora, a matricula no registo comercial é um acto apenas aplicável aos
comerciantes e às demais entidades expressamente mencionadas no CRC. As sociedades
civis em forma comercial não são, pois comerciantes, já que apenas estão sujeitas, por
equiparação, ao regime das sociedades comerciais, mas não lhes és genericamente
aplicável o regime dos comerciantes.
b) Empresas públicas: serão comerciantes, face ao art. 13º/1 CCom? E se o não forem,
deverão ser qualificadas como comerciantes, mercê do respectivo regime estatutário
geral (DL 260/76, de 8 de Março)? Em face destas duas normas, entre si conjugadas,
afigura-se que, se as empresas públicas não são rigorosamente qualificáveis como
comerciantes, no entanto estão pela lei a eles equiparadas, no que toca à capacidade
jurídica e às normas aplicáveis às suas actividades; e uma dessas normas será
precisamente, a 2ª parte do art. 2º CCom.
c) Agrupamentos Complementares de Empresas (ACE): pessoas colectivas cujo regime
jurídico consta da Lei 4/73, e do DL 430/73, de 25 de Agosto. O objectivo geral destes
agrupamentos consiste em melhorar as condições de exercício ou os resultados das
actividades económicas das pessoas (singulares ou colectivas) nelas agrupadas. Devem
pois, os ACE ter um escopo concreto, relacionado com as actividades agrupadas. E
podem ter um fim principal e fim ou fins acessórios. Mas os ACE não podem ter por fim
principal a realização e partilha de lucros, muito embora possam ter esse fim como
acessório, se o contrato constitutivo expressamente o autorizar. As ACE por princípio,
não são necessariamente comerciantes.
 
17. Os comerciantes em nome individual. A matrícula
O art. 13º/1 CCom, só abrange pessoas físicas: os usualmente denominados
comerciantes em nome individual.
Quando é que uma pessoas física se diz comerciante?
Em face do CRC, constata-se que a matrícula não é uma condição nem necessária, nem
suficiente, para a aquisição da qualidade de comerciante.
Não basta estar matriculado como comerciante mesmo sem matrícula. Esta não é,
portanto, condição nem suficiente nem necessária da aquisição da qualidade de
comerciante em nome individual.

18. Requisitos de acesso à qualidade de comerciante


a) Personalidade jurídica
Quanto a este requisito, não há aqui a considerar quaisquer especialidades face ao
regime geral do Direito Civil.
Assim, além de assumir a personalidade jurídica das pessoas singulares (art. 66º CC), a
lei comercial atribui-a às sociedades comerciais (art. 5º CSC) e às sociedades civis em
forma comercial (art. 1º/4 CSC).
b) Capacidade comercial
A capacidade jurídica constitui a medida dos direitos e obrigações de que uma pessoa é
susceptível de ser sujeito (art. 67º CC) e que a doutrina distingue entre a capacidade de
gozo e a capacidade de exercício. Dos arts. 14º/1 e 17º CCom, resultam restrições à
capacidade comercial sem fim lucrativo e de Direito Público.
Quanto à capacidade de exercício, deverá ter-se em conta o art. 7º CCom, que enuncia
dois princípios fundamentais: o da liberdade de comércio e o da coincidência entre a
capacidade civil e a capacidade comercial.
A plena capacidade comercial depende de uma pessoa – singular ou colectiva – ter
capacidade civil e não estar abrangida por alguma norma que estabeleça uma restrição
ao exercício do comércio.
Podem os menores e os demais incapazes ser comerciantes?
O art. 13º/1 CCom, ao exigir capacidade para a prática de actos de comércio, pretende
referir-se à capacidade jurídica de exercício, tanto mais que alude ao carácter
profissional do comércio, o que pressupõe uma prática habitual de actos geradores,
mediadores ou extintivos de direitos e obrigações.
Assim, parece que não pode conceber-se o exercício de uma profissão deste jaez por um
incapaz: o próprio conceito de profissão e, no caso, a circunstância de ela se traduzir
numa contínua e habitual prática de actos e negócios jurídicos, sendo, portanto,
absorvente e responsabilizante, afigura-se incompatível com a situação jurídica de
incapacidade.
A inclusão dos menores e interditos no art. 13º/1 CCom, deve entender-se cumgrano
salis quanto ao exercício profissional do comércio: considera-se que tal exercício será a
prática habitual de actos comerciais, não directa e pessoalmente pelos incapazes, mas
pelos seus representantes em nome e por conta daqueles. Isto, evidentemente, desde
que os representantes obtenham a autorização judicial eventualmente necessária, face
aos arts. 1889º e 1938º CC.
c) Exercício profissional do comércio
Pressupõe e concretiza-se através da prática de actos de comércio. Mas não qualquer
prática: só a prática em termos de profissão.
a) Não basta a prática de actos de comércio isolados ou ocasionais: para se adquirir a
qualidade de comerciante é indispensável a prática regular, habitual, sistemática, de
actos de comércio;
b) Não basta a prática, mesmo que habitual de quaisquer actos de comércio: nem todos
estes actos têm a mesma potencialidade de atribuir a quem os pratique a qualidade de
comerciante;
c) É indispensável para que haja profissionalidade que o indivíduo pratique os actos de
comércio de forma a exercer como modo de vida uma das actividades económicas que a
lei enquadra no âmbito do direito mercantil;
d) Deve entender-se como indispensável que a profissão de comerciante seja exercida de
modo pessoal, independente e autónomo, isto é, em nome próprio, sem subordinação a
outrem;
e) É indispensável que o comerciante organize factores de produção com vista à
produção das utilidades económicas resultantes de uma daquelas utilidades económicas
que a lei considera como comerciais.
Portanto, é comerciante quem possui e exerce uma empresa comercial: quem é titular de
uma organização daquelas que a lei qualifica como empresas comerciais para através
dela exercer uma actividade comercial.

19.  Situações duvidosas quanto à aquisição da qualidade de comerciante


O art. 14º e 17º CCom, pretende evitar um alargamento excessivo da categoria de
comerciante. O art. 14º/2 CCom, aplica-se aos acasos do art. 13º/1 CCom.
Quer as pessoas de fim desinteressado, quer as pessoas colectivas de fim interessado não
económico, não podem ser comerciantes.
Mandatário comercial, a doutrina entende que não são comerciantes, são sujeitos que a
título profissional executam um mandato comercial com representação.
Mandato mercantil, traduz-se na execução do mandato, pratica um conjunto de actos
(um ou mais) de comércio, realizados pelo mandatário comercial, produzem efeitos
jurídicos na esfera jurídica do mandante representado (art. 231º; 258º CCom).
a) Gerente (arts. 248º a 250º CCom)
Quem em nome e por conta de um comerciante trata do comércio desse comerciante, no
lugar onde esse comerciante tenha ou peça para actuar.
Tem um poder de representação (art. 249º CCom), é um poder geral e compreensivo de
todos os actos pertencentes e necessários ao exercício do comércio para que tenha sido
dado, não são comerciantes.
b) Auxiliares de comércio (art. 256º CCom)
São encarregados de um desempenho constante em nome e por conta dos comerciantes
de algum (s) dos ramos de tráfico.
c) Caixeiros (art. 257º CCom)
São empregados do comerciante, encarregados de funções várias. O poder de
representação do caixeiro (e dos auxiliares) é um poder de representação menor que dos
gerentes (arts. 258º e 259º CCom).
São classificados no Código Comercial como mandatários com representação. Os
poderes de representação podem resultar de outros negócios jurídicos sem ser o
contrato de mandato. Sendo subordinados, praticam actos de comércio, por nome e por
conta do empregador – para aquele negócio não são comerciantes.
d) Comissários (dos comerciantes) – art. 266º CCom, contratos de comissão, art. 268º
CCom)
Fica directamente obrigado com as pessoas com quem contratou como se o negócio
fosse seu.
O comissário pratica os actos para o comitente, repercutem-se na esfera jurídica do
comissário, fica o titular dos bens adquiridos. Há uma segunda negativa que regula a
relação que o comissário tem com o comitente. O comissário vai receber do comitente
além da sua remuneração (ordinária) um outro montante.
Se o comissário, praticar actos de forma comercial, faz do comércio profissão para
efeitos do art. 13º CCom, é irrelevante se ele os pratica para ele ou por conta de outrem
– ele é comerciante – fica obrigado pela prática dos seus actos.
e) Mediadores
Pessoa colectiva ou singular, que servem de elo de ligação entre diversos sujeitos
jurídicos, promove a celebração de negócios entre duas pessoas. Executam actos de
comércio, a sua actividade está incluída no art. 230º/3 CCom.
f) Agentes comerciais
Promove por conta de outrem a celebração de contratos. Operador independente
mediante retribuição. O essencial da sua actividade é a promoção do contrato, pode
celebrar também se tiver mandato para isso.

Obrigações dos comerciantes


 
20. Forma
O princípio da consensualidade ou liberdade de forma (art. 219º CC) é por vezes
aplicado de forma mais extensa no âmbito do direito comercial: aqui o intuito de
promover as relações mercantis, protegendo o crédito e a boa fé, leva a promover a
simplicidade da forma.

21. Solidariedade passiva


A solidariedade das obrigações não se presume: tem que resultar da lei ou da vontade
das partes (art. 513º CC), assim é, em direito comum, ou seja, quanto às obrigações
civis, nas quais, portanto, a regra é a conjunção.
Mas não é assim nas obrigações comerciais, nas quais, salvo estipulação em contrário,
os co-obrigados são solidários (art. 100º CCom), a menos que se trate de actos de
comércio unilaterais, nos quais não há solidariedade para os obrigados em relação aos
quais o acto não for comercial (art. 100º § único CCom). Este regime constitui a ressalva
constante da 2ª parte do art. 99º CCom, e tem por escopo o reforço do crédito, que
constitui um dos princípios inspiradores do Direito Comercial.
 
22. Responsabilidade dos bens dos cônjuges por dívidas comerciais
No actual regime dos efeitos do casamento sobre os direitos patrimoniais dos cônjuges,
prevalece o princípio da igualdade de direitos e deveres, a ambos pertencendo a
orientação da vida em comum e a direcção da família (art. 1671º CC). No tocante às
dívidas contraídas pelos cônjuges, aquele primeiro princípio tem como corolário, o
disposto no art. 1690º/1 CC: qualquer dos cônjuges tem legitimidade para contrair
dívidas sem o consentimento do outro.
No caso das dívidas contraídas no exercício do comércio pelo cônjuge comerciante, o
legislador inverteu o ónus da prova: de forma implícita, presume que elas foram
contraídas pelo comerciante em proveito comum do casal. E, portanto, estabelece que só
não será assim se for provado – em regra pelo cônjuge do comerciante ou
eventualmente por este – que as dívidas não foram contraídas em proveito comum do
casal.
A lei não se basta com o já apontado regime do art. 1691º/1-d CC, para a protecção dos
interesses dos credores dos comerciantes, a bem do próprio comércio. Vai mais além,
pois o art. 15º CCom, determina que: “as dívidas comerciais do cônjuge comerciante
presumem-se contraídas no exercício do seu comércio”.
O art. 15º CCom, apenas se aplica aos casos de dívidas comerciais – isto é, resultante de
actos de comércio de um comerciante casado.
Se um credor de um comerciante fizer prova de que a dívida é comercial e o devedor é
comerciante, presume-se que a dívida foi contraída por este no exercício do comércio e,
portanto, a dívida é da responsabilidade de ambos os cônjuges (arts. 1691º/1-a e 1695º
CC; art. 15º CCom).
Para afastar este regime é preciso que o cônjuge do comerciante ou mesmo este:
- Ilida a presunção do art. 15º CCom, provando que a dívida do comerciante, apesar de
ser comercial, não foi contraída no exercício da actividade comercial daquele;
- Ou, em todo o caso, ilida a presunção implícita no art. 1691º/1-d CC, provando que a
dívida não foi contraída em proveito comum do casal.

Obrigações especiais dos comerciantes


 
23. A firma
O comércio é executado sob uma designação nominativa, que constitui a firma. Há,
porém, no direito comparado duas concepções diversas de firma:
Para o conceito objectivo, a firma é um sinal distintivo do estabelecimento comercial.
Daí decorrem, como corolários, a possibilidade de tal designação ser composta
livremente e ser transmitida com o estabelecimento, independentemente de acordo
expresso.
Para o conceito subjectivo, a firma é um sinal distintivo do comerciante – o nome que
ele usa no exercício da sua empresa: é o nome comercial do comerciante. Daí que, em
relação ao comerciante individual, nesta concepção, a firma deva ser formada, a partir
do seu nome civil e, em princípio intransmissível.
O art. 18º CCom[2], está relacionado com o estatuto de comerciante. Considera-se a
firma o nome comercial do comerciante, sinal que os identifica ou individualiza também
o faz para alguns não comerciantes – sociedades civis não comerciais.
 
24. Constituição da firma
A firma consoante os casos, pode ser formada com o nome de uma ou mais pessoas
(firma-nome), com uma expressão relativa ao ramo de actividade, aditada ou não de
elementos de fantasia (firma-denominação ou simplesmente denominação), ou englobar
uns e outros desses elementos (firma mista).
Em todo o caso, ele será um sinal nominativo e nunca emblemático: sempre uma
expressão verbal, com exclusão de qualquer elemento figurativo.
Sinais distintivos das diversas pessoas colectivas:
a) Firmas dos comerciantes individuais (art. 38º/1 e 3 RNPC):
Tem de ser composta pelo seu nome completo ou abreviado para identificação, não
podendo colocar em regra a abreviação de um só vocábulo; pode ter expressões ou
siglas; pode aditar uma alcunha ou expressão alusiva à actividade comercial. O art. 40º
RNPC, estabelece o estabelecimento individual de responsabilidade limitada.
b) Sociedades comerciais
Poderão ter a alusão à actividade comercial (art. 177º/1 CSC). O art. 200º CSC, a firma
que as sociedades por cotas devem ser formadas com ou sem sigla, nome completo ou
abreviado de todos ou alguns dos sócios, tem de quer sempre o aditamento Lda.
Tem de dar a conhecer quanto possível o objecto da sociedade (art. 10º/3 CSC). Deve
aludir ao objecto social. Vale integralmente para as Sociedades Anónimas (art. 275º
CSA) e para as sociedades em comandita, a firma tem de ser composta pelo nome
completo ou abreviado por todos os sócios comanditados (art. 467º CSC).
 
25. Princípios gerais (informadores) da constituição de firmas
a) Princípio da verdade (art. 32º RNPC)
A firma deve corresponder à situação real do comerciante a quem pertence, não
podendo conter elementos susceptíveis de a falsear ou de provocar confusão, quer
quanto à identidade do comerciante em nome individual e ao objecto do seu comércio,
quer, no tocante às sociedades, quanto à identificação dos sócios, ao tipo e natureza da
sociedade, à (s) actividade (s) objecto do seu comércio e outros aspectos a ele relativos.
b) Princípio da distintividade ou capacidade distintiva
A firma deve possuir distintividade, esta não se limita a ser uma designação genérica.
O art. 32º/3 RNPC, exclui os vocábulos de uso corrente. Quanto às firmas dos
comerciantes individuais e às firmas nome, mistas das sociedades e dos ACE’s, são
compostos por nomes de pessoas ou pelos sócios dos associados, têm a capacidade
distintiva.
As firmas de denominação por quotas das Sociedades Anónimas, dos ACE’s, das
Empresas Públicas, das Cooperativas e dos AEIE, as denominações devem dar a
conhecer o respectivo objecto, sob pena de incapacidade distintiva, a referência ao
objecto não se basta com designações genéricas (como sociedade de seguros) nem com
vocábulos de uso corrente ou de proveniência.
c) Princípio da novidade (art. 33º RNPC)
Marca a prioridade da firma já registada ou licenciada procurando evitar surgir outra
firma com a mesma denominação da existente.
É aferida no âmbito da exclusividade, podendo haver firmas semelhantes se tiver âmbito
de exclusividade diferente, a racio legis, é não haver firmas iguais.
O juízo de confundabilidade (fundamentação de recurso) tem que ser de fundamentação
global, tem que atender aos elementos fundamentais da firma. É o nome da firma que o
juízo de valor tem-se de fundamentar.
d) Princípio da exclusividade (art. 35º RNPC)
A firma goza dum âmbito territorial de protecção, não é necessariamente o âmbito
nacional.
No comerciante individual, se ele usar o seu nome, o âmbito de protecção é
correspondente territorial da conservatória onde está registado (art. 38º/4 RNPC).
Se ele aditar ao nome uma expressão distintiva já pode ser reconhecida extensão em
todo o território nacional.
A firma das Sociedades Comerciais goza de um âmbito nacional de protecção (art. 37º/2
RNPC). Os arts. 39º e 40º RNPC, estendem a outros empresários individuais a
responsabilidade limitada as regras fundamentais relativas ao comerciante individual.
As associações e fundações, o âmbito de protecção se não for local tem protecção
nacional, se nos estatutos referir que é local, então só têm protecção local.
e) Princípio da unidade
O comerciante deve gerir a sua actividade sob uma única firma. O empresário individual
não pode usar mais do que uma firma (art. 38º/1 RNPC).
Este princípio tem de ser confrontado com o fenómeno da transmissão da firma, se
houver transmissão de firma, afecta os princípios que a lei refere?
Poria-se em causa o princípio da novidade se o alienante continuar a usar a firma
alienada. Pressupõe-se que o alienante perde a firma anterior, para continuar, tem que
formar uma nova firma – princípio da novidade.
O princípio da unidade é atingido se o alienante puder continuar a utilizar a firma
anterior? Resposta negativa, se alguém quiser adquirir a firma do alienante, deve criar
nova firma. Pode continuar a firma que tem, tendo que exercer simultaneamente a
exploração da firma adquirida. Só pode utilizar a firma do alienante se continuar a
explorar a firma do alienante (art. 38º/2 RNPC), não se permitindo a subsistência de
firmas independentes. A lei permite a transmissão da firma (art. 44º RNPC), mas para
isso à que preencher determinados requisitos:
* Transmissão tem que ocorrer em conexão com a transmissão do estabelecimento (art.
44º/4 RNPC);
* Acordo das partes nesse sentido (negócio entre vivos);
* A indicação tem que ser dada ao novo titular de que sucedeu ao antigo titular;
* A subsistência do estabelecimento adquirido, exigindo-se a indicação da transmissão
(art. 38º/2 RNPC).
Por transmissão “mortis causa” (art. 38º/2 RNPC), os sucessores também devem
continuar gerir o estabelecimento. A lei exige que haja/impõe uma conexão da firma ao
estabelecimento para que a continuidade na identificação não se torne enganosa.
Preocupação de defesa de terceiros, porque eles recebem a garantia de que se trata do
exercício do mesmo estabelecimento.

26. Formalização da firma


Depende do requisito, e só há direitos exclusivos, após o registo definitivo (art. 35º/1
RNPC).
O Estado em relação às firmas passou a ter uma tutela administrativa (essencialmente),
por isso é necessário que as pessoas tenham um certificado de admissibilidade de firma
ou de denominação. Em todo o processo administrativo necessário para a firma, este
certificado é o elemento estratégico essencial, em termos de direito para se poder iniciar
os trâmites necessários para a constituição de firma ou sociedade.
O certificado serve para atestar que os requisitos estão preenchidos, é deste certificado
que depende tudo, escritura pública, elementos destinados à constituição de pessoas
colectivas de responsabilidade limitada (art. 54º/1 RNPC).
A consequência da não existência do certificado é a nulidade (art. 55º RNPC), também a
modificação do objecto da sociedade obriga a um novo certificado (art. 54º/2 RNPC).
A firma está sempre ligada ao estabelecimento (tendência real); a firma liga-se ao
comerciante (tendência pessoal).
A firma surge à partida com o nome comercial, designação usada pelo comerciante no
exercício do seu comércio.
O estabelecimento comercial
 
27. Noção de estabelecimento comercial
Organização do empresário mercantil, conjunto de elementos do comerciante que estão
organizados pelo comerciante para exercer a sua actividade comercial, de produção ou
circulação de bens ou prestação de serviços. Pressupõe:
- Um titular: ele é um conjunto de meios predestinados por um empresário, titular de
um determinado direito sobre ele, para exercer a sua actividade;
- Um acervo patrimonial: engloba um conjunto de bens e direitos, das mais variadas
categorias e naturezas, que têm em comum a afectação à finalidade coerente a que o
comerciante os destina;
- Um conjunto de pessoas: pode reduzir-se à pessoa do empresário o seu suporte
humano, nas formas mais embrionárias da estrutura empresarial;
- É uma organização: os seus elementos não são meramente reunidos, mas sim entre si
conjugados, interrelacionados, hierarquizados, segundo as suas específicas naturezas e
funções específicas, para que do seu conjunto possa emergir um resultado global: a
actividade mercantil visada;
- Organização funcional: a sua estrutura e configuração e a sua identidade advêm-lhe de
um determinado objecto, que é uma actividade de um determinado ramo da economia.

28. Elementos do estabelecimento comercial


a) Elementos corpóreos
Nesta categoria devem considerar-se as mercadorias que são bens móveis destinados a
ser vendidos, compreendendo as matérias-primas, os produtos semi-acabados e os
produtos acabados.
Faz também parte do imóvel onde se situem as instalações, quando o seu dono seja o
comerciante, pois se o não for, apenas integrará o estabelecimento o direito ao
respectivo uso.
b) Elementos incorpóreos
Aqui deve-se considerar os direitos, resultantes de contrato ou outras fontes, que dizem
respeito à vida do estabelecimento: o direito ao arrendamento; direitos reais de gozo,
etc.
c) Clientela
O nosso ordenamento consagra o direito à clientela, direito do estabelecimento,
abrangendo a clientela certa e clientela potencial, pode ser deferido por acções de
concorrência desleal que tutelam elementos gerais da empresa.
d) O aviamento
A capacidade lucrativa da empresa, a aptidão para gerar lucros resultantes do conjunto
de factores nela reunidos. Exprime pois, uma capacidade lucrativa e esta confere ao
estabelecimento uma mais-valia em relação aos elementos patrimoniais que o integram,
a qual é tida em conta na determinação do montante do respectivo valor global.

29.  Negócios à volta do estabelecimento


A identidade jurídica do estabelecimento como, simultaneamente, universalidade de
direito e bem móvel incorpóreo, fornece uma base conceptual adequada para a
estruturação do regime jurídico dos negócios jurídicos que o tomam como um todo.
a) O trespasse
É uma figura jurídica que recobre uma pluralidade de modalidades e não um negócio
uniforme.
Diz-se trespasse todo e qualquer negócio jurídico pelo qual seja transmitido
definitivamente e inter vivos um estabelecimento comercial, como unidade. Ao
alienante chama-se trespassante, e ao adquirente trespassário.
Ficam porém, excluídos do âmbito do conceito os casos de transmissão mortis causa.
Mas o que é essencial, para que haja trespasse, é que o estabelecimento seja alienado
como um todo unitário, abrangendo a globalidade dos elementos que o integram (art.
115º/2-a RAU).
Pode, no entanto, algum ou alguns desses elementos ser especificamente dele retirados e
subtraídos à transmissão, que ainda assim haverá trespasse.
A regulamentação legal do trespasse é suficiente para o considerarmos assumido no
nosso direito como um negócio nominado (dentro da pluralidade de modalidades que
pode recobrir), ainda que tal regulamentação apenas diga respeito a aspectos parcelares
do instituto.
Trata-se pois, de um acto de comércio objectivo, pois está regulado em lei comercial
avulsa e em termos que se destinam a satisfazer necessidades específicas das actividades
e empresas comerciais.
O primeiro aspecto do regime do trespasse focado na lei é o da forma, já que o art. 115º
RAU e o art. 80º-m CNot, condicionam a validade deste negócio jurídico à sua
celebração por escritura pública, da qual evidentemente, devem constar todos os seus
elementos essenciais.
O segundo – art. 116º RAU – consiste no direito de preferência que é atribuído ao
senhorio do prédio arrendado no caso de trespasse por venda ou dação em
cumprimento do estabelecimento.
É evidente que só ocorre a hipótese da norma quando o estabelecimento se ache
instalado num imóvel arrendado. Mas, como o objecto do trespasse não é a relação
jurídica de arrendamento, e sim o estabelecimento como bem unitário, é óbvio que o
exercício do direito de preferência[3] pelo senhorio terá que ter o mesmo objectivo, ou
seja o estabelecimento, compreendendo todos os elementos que integram, tais como o
projectado trespasse os abrangeria.
Relativamente ao contrato de trabalho, o art. 37º/1 e 4 DL 49408 (LCT) determinam
que a posição contratual da entidade patronal se transmite para o novo empresário, não
apenas nos casos de alienação do estabelecimento, mas desde que ocorra qualquer acto
que implique a transferência da exploração do estabelecimento. Este preceito abrange,
pois, não só os casos de trespasse, mas também os de alienação por sucessão mortis
causa, cessação de exploração etc.
Relativamente às dívidas do comerciante inerentes ao estabelecimento, o adquirente do
estabelecimento responde pelos débitos derivados da respectiva exploração e anteriores
ao trespasse, sem que o alienante fique libertado, salvo se nisso consentirem os
credores. Consequentemente, haverá que respeitar, para que se transmitam as dívidas, a
exigência da concordância do credor de cada uma, como resulta do disposto na lei civil
quanto à transmissão de dívidas (arts. 595º e 596º CC) e quanto à novação subjectiva
por substituição do devedor (art. 858º CC).
Do trespasse faz nascer para o trespassante, independentemente de estipulação, a
obrigação de não concorrência (desleal) ao trespassário, isto é, de não exercer uma
actividade análoga, em condições de local, tempo e outras, que constituam uma forma
eficaz de retomar a clientela do estabelecimento alienado.
A violação deste dever constituirá concorrência ilícita, cuja sanção constituirá na
responsabilidade pela indemnização dos danos causados, bem como na aplicação de
uma sanção pecuniária compulsória ao violador, enquanto persista na conduta ilícita,
isto é, na exploração concorrencial (art. 829º-A CC).
b) Usufruto
Tem o estabelecimento por objecto, um direito real limitado de gozo constituído sobre
coisa alheia e também tem de ser realizado por escritura pública (arts. 1439 segs. CC).
O usufrutuário adquire o direito à exploração do estabelecimento, além dos poderes que
lhe são atribuídos de uso directo (exploração) do estabelecimento. Adquire também
poderes de utilização indirecta, contrariamente de alguém que tenha o mero direito de
uso, quem tenha usufruto pode locar também.

[1] Como diz a segunda parte do art. 2º CCom


[2] Obrigações especiais dos comerciantes
[3] Ao direito de preferência em questão aplicam-se também os arts. 416º a 418º e
1410º CC.

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