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Lei 10.

216: Tudo que você precisa saber


sobre a Lei da Reforma Psiquiátrica
Lei 10.216 de 2001: a reforma psiquiátrica e os direitos das pessoas
com transtornos mentais no Brasil
A lei 10.216 foi um projeto do então deputado federal pelo estado de Minas Gerais em
2001, Paulo Delgado, a respeito dos direitos das pessoas com transtornos mentais, que
acabaria ficando conhecida popularmente como lei da reforma psiquiátrica ou lei
antimanicomial.

A lei foi sancionada pelo então Presidente na época, Fernando Henrique Cardoso, em 6
de abril de 2001, após 12 anos de tramitação e debates dentro do Congresso Nacional.

Ela representa um grande avanço jurídico no que concerne aos direitos dos usuários e
de seus familiares em saúde mental. Tem como foco a saúde mental de base
comunitária e dispõe, fundamentalmente, sobre a proteção e os direitos das pessoas
com transtornos mentais.

Caso você queira saber mais sobre os direitos dos usuários, leia o manual de direitos e
deveres dos usuários e familiares em saúde mental e drogas.

A falta de conhecimento entorno da importância da lei 10.216 – a lei da reforma


psiquiátrica

A tese “O direito humano à saúde mental: compreensão dos profissionais da área”,


escrita por Emanuele Seicenti de Brito, mostrou que a Lei 10.216 de 2001 ainda seria
pouco conhecida por profissionais da área da saúde mental no Brasil.

A Lei 10.216/2001 fez-se importante, dentre diversos aspectos, porque garantiu vários
direitos aos pacientes com transtornos mentais, como a participação de sua família no
tratamento e sua proteção contra qualquer forma de abuso.

No entanto, conforme apontado pela pesquisa, dentre muitos profissionais de saúde


que atendem esses pacientes, poucos conheceriam bem sobre essa lei.

A doutora pretendia identificar a compreensão dos profissionais de saúde sobre os


direitos do paciente em saúde mental, e para isso entrevistou 33 profissionais de um
hospital psiquiátrico considerado de grande porte de uma cidade do interior do estado
de São Paulo.

Foram entrevistados auxiliares de enfermagem, técnicos de enfermagem, enfermeiros,


médicos, psicólogos, assistentes sociais e terapeutas ocupacionais, somando 33
profissionais ao todo.
Emanuele observou que 63,64% dos profissionais têm tempo de atuação na área entre
um mês e cinco anos, enquanto a lei já tem mais de uma década e conhecimentos a seu
respeito seriam bastante incipientes, ao menos em sua amostra.

Segundo ela, os três tipos de internação possíveis (voluntária, involuntária e


compulsória), por exemplo, também não seriam bem conhecidos por quem trabalhava
no hospital.

No estudo, ela verificou que os funcionários acreditavam que não existiria internação
involuntária, sendo ela o tipo de internação com o maior número de recorrência.

Tal falta de informações, vale ressaltar, teria despertado grande estranhamento e


curiosidade na autora, que esperava encontrar um quadro de conhecimento totalmente
diferente.

Para os profissionais, a internação involuntária seria, na verdade, aquilo que seria de


fato a internação compulsória, ou seja, uma internação determinada pela Justiça, por
exemplo.

Ainda seria constatado por ela que, entre os constituintes de sua amostra, uma
internação voluntária seria feita somente mediante a autorização da família como meio
para que se pudesse entrar no hospital; algo completamente equivocado.

Ministério Público

A lei 10.216/2001 também determina que qualquer internação involuntária e todo


registro de alta de um paciente, devem ser informados ao Ministério Público Estadual
em até 72 horas.

No entanto, a comunicação entre o hospital e o MP não existiria, e os funcionários


sequer sabiam de sua obrigatoriedade ou teriam sido orientados a seu respeito.

Para a autora, essa interação é importante, pois o Ministério Público foi inserido na
situação para que tivesse uma função reguladora e verificar se os direitos dos internos
estariam sendo cumpridos.

Segundo ela, “quando a lei passa a incluir o Ministério Público, ela quer não só garantir
o direito dos pacientes, como deixá-los cientes desses direitos”.

Os direitos das pessoas com transtornos mentais

O Art. 1º da Lei de Reforma Psiquiátrica afirma que os direitos e a proteção das pessoas
com transtorno mental são assegurados sem qualquer forma de discriminação quanto
à raça, cor, sexo, orientação sexual, religião, opção política, nacionalidade, idade,
família, recursos econômicos e ao grau de gravidade ou tempo de evolução de seu
transtorno, ou qualquer outro.
O parágrafo único do Art. 2º da Lei ressalta os direitos das pessoas com transtornos
mentais:

I – ter acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde, consentâneo às suas


necessidades;

II – ser tratada com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de beneficiar sua


saúde, visando alcançar sua recuperação pela inserção na família, no trabalho e na
comunidade;

III – ser protegida contra qualquer forma de abuso e exploração;

IV – ter garantia de sigilo nas informações prestadas;

V – ter direito à presença médica, em qualquer tempo, para esclarecer a necessidade ou


não de sua hospitalização involuntária;

VI – ter livre acesso aos meios de comunicação disponíveis;

VII – receber o maior número de informações a respeito de sua doença e de seu


tratamento;

VIII – ser tratada em ambiente terapêutico pelos meios menos invasivos possíveis;

IX – ser tratada, preferencialmente, em serviços comunitários de saúde mental.

Durante os atendimentos em saúde mental, de qualquer natureza, a pessoa e seus


familiares devem ser formalmente informados sobre estes direitos.

A lei ressalta a responsabilidade do Estado no desenvolvimento da política da saúde


mental, a assistência e a promoção de ações de saúde aos portadores de transtornos
mentais, com a devida participação da sociedade e da família (Art. 3º).

Reinserção Social como finalidade permanente do tratamento

A lei também orienta que o tratamento visará como finalidade permanente, à reinserção
social do paciente em seu meio, oferecendo assistência integral à pessoa com
transtornos mentais, por meio de uma equipe multidisciplinar.

Portanto, a internação psiquiátrica só será permitida quando os recursos extra-


hospitalares se mostrarem insuficientes (art. 4º).

Não são permitidas internações em instituições com características asilares, que não
assegurem aos pacientes os direitos enumerados pela lei (art. 4º, §3º).
A lei prevê três modalidades de internação
INTERNAÇÃO VOLUNTÁRIA:

Em relação à internação voluntária, a lei 10.216 de 2001 dispõe que somente será
voluntária se o paciente declarar por escrito que a aceita. Para isso, ele deve ser maior,
não ser civilmente interditado e deve estar psiquicamente orientado.

Nos serviços de saúde mental também se exige a presença de um responsável (BRITO,


2011), contudo, é importante advertir que legalmente não há a exigência de um
responsável quando se trata de internação voluntária de pessoa com transtorno mental
não civilmente interditada.

Quanto à capacidade psíquica, “o critério legal para definir capacidade tem como foco
o entendimento do paciente sobre sua doença e suas consequências, os vários
tratamentos disponíveis e seus riscos e benefícios, e a credibilidade das informações
para que seja tomada uma decisão por parte do indivíduo afetado pela doença que,
obviamente, requer alguma habilidade intelectual” (FORTES, 2010, p. 327).

Portanto, na internação voluntária, a pessoa com transtorno mental não tem sua
capacidade de tomar decisões afetadas pelo transtorno mental, não necessitando de
um responsável.

Em contraposição, se ele não estiver apto para decidir sobre sua saúde, a internação
será involuntária, havendo a exigência do responsável que tomará “em suas mãos as
deliberações sobre a vida dele, analogamente ao caso das pessoas interditadas”
(BARROS, SERAFIM, 2009).

INTERNAÇÃO INVOLUNTÁRIA:

Essa modalidade de internação, prevista na Lei 10.216, ocorre sem o consentimento do


usuário e em situações de emergência ou a pedido de familiar ou responsável legal, pois
as condições clínicas do paciente não permitem seu consentimento.

Vale ressaltar que o pedido do familiar ou responsável não é suficiente para que ocorra
a internação, sendo necessário que um médico, devidamente registrado no Conselho
Regional de Medicina do estado onde se localiza o estabelecimento, a autorize (BRASIL,
2001).

A internação involuntária poderá ocorrer em situações ordinárias ou de emergência.

No primeiro caso, deve ser solicitada uma autorização judicial prévia. Nas internações
de emergência, deve-se, no prazo de 72 horas, comunicar o caso ao Ministério Público
Estadual (BRASIL, 2001).

O responsável pela comunicação ao Ministério Público é o Diretor Clínico. A Portaria GM


n. 2.391/02 elaborou um modelo de formulário próprio, o Termo de Comunicação de
Internação Involuntária.
Das informações que devem estar contidas neste documento, destacam-se: o tipo de
internação (voluntária ou involuntária), o motivo e justificativa da internação e a
descrição dos motivos de discordância do usuário que está sendo internado (MS, 2002).

INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA

A Lei 10.216/2001 define a internação compulsória como“aquela determinada pela


justiça”. E que nesse tipo de internação, os juízes devem levar “em conta as condições
de segurança do estabelecimento, quanto à salvaguarda do paciente, dos demais
internados e funcionários” (BRASIL, 2001; BARROS, SERAFIM, 2009).

Um dos tipos de internação compulsória é a medida de segurança, que representa a


forma legal encontrada pela justiça para tratar de pessoas com transtornos mentais que
transgrediram as leis penais, ou seja, cometeram crimes (COHEN, 2006).

Essas pessoas não podem ser consideradas criminosas legalmente, pois devido ao
transtorno mental eram, ao tempo da ação criminosa, incapazes de entender o caráter
ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Como consequência, a elas é aplicada, em detrimento da pena, a medida de segurança


que pode ser: internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou, quando
da ausência desse, em outro estabelecimento adequado; ou sujeição a tratamento
ambulatorial (BRASIL, 2012). Em breve postaremos um texto sobre o tema da medida
de segurança.

Autora – Emanuele Seicenti de Brito: Mestra e Doutora em Enfermagem pela Escola de


Enfermagem de Ribeirão Preto – Centro Colaborador da OMS para o desenvolvimento
da pesquisas em enfermagem. Graduada em Direito.

Fonte do Texto: Blog Saúde e Direito

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