Contribuições para A Avaliação Psicossocial Da Norma Reguladora 33 (Nr-33)

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ARTIGOS DE REVISÃO

CONTRIBUIÇÕES PARA A AVALIAÇÃO PSICOSSOCIAL DA


NORMA REGULADORA 33 (NR-33)

Liliana Andolpho Magalhães Guimarães


Doutora em Saúde Mental pela Universidade Estadual de Campinas, Brasil.
Professora da Universidade Católica Dom Bosco, Brasil.
E-mail: lguimaraes@mpc.com.br

Daniela de Almeida Martins


Mestre em Psicologia pela Universidade Católica Dom Bosco, Brasil.
Psicóloga do Setor de Medicina e Segurança no trabalho da Universidade
Estadual de Campinas, Brasil.
E-mail: danimart@unicamp.br

Adriana Silva de Oliveira Botelho


Mestre em Psicologia pela Universidade Católica Dom Bosco, Brasil.
Professora do Centro Universitário Votuporanga, Brasil.
E-mail: adrianavmpm@hotmail.com

Resumo
Situado no campo da Saúde Mental do trabalhador, esse artigo visa apresentar contribuições para a
avaliação psicossocial no trabalho em espaço confinado, de acordo com a Norma Regulamentadora 33
(NR-33) (Portaria TEM nº 202/2006) editada e revisada periodicamente pelo Ministério do Trabalho e
Emprego no Brasil (MTE). A partir de uma revisão do que está proposto pela NR-33 em relação aos
fatores psicossociais do trabalho em espaços confinados, buscou-se identificar, na literatura científica
atual, proposições e modelos de atuação que possam contribuir para a caracterização e
contextualização da avaliação psicossocial na prática da saúde ocupacional nas empresas, e, em
especial, dos médicos do trabalho.
Palavras- Chave: Avaliação Psicossocial. Saúde Ocupacional. Segurança no Trabalho. Espaço Confinado.
NR-33.

CONTRIBUTIONS FOR PSYCHOSOCIAL EVALUATION OF REGULATORY STANDARD 33 (NR-33)

Abstract
Situated in the field of mental health and work, this article, this paper aims to provide input to
o
psychosocial assessment work, in confined spaces, according to Norm 33 (NR-33) (Portaria MTE n
202/2006). From a review of what is proposed by NR-33, edited and revised periodically by the Ministry
of Labor and Employment (MTE) of Brazil, in relation to psychosocial factors at work in confined spaces,
we sought to identify the current scientific literature, propositions and role models that can contribute to
the characterization and contextualization of psychosocial assessment in the practice of occupational
health in companies, and in particular to the work of occupational physicians.
Key words: Psychosocial Assessment. Occupational Health. Occupational Safety. Confined Space. NR33.

1 INTRODUÇÃO

Perspectivas em Gestão & Conhecimento, João Pessoa, v. 3, Número Especial, p. 57-66, out. 2013.
http://periodicos.ufpb.br/ojs2/index.php/pgc. ISSN: 2236-417X. Publicação sob Licença .
Liliana Andolpho Magalhães Guimarães; Daniela de Almeida Martins; Adriana Silva de Oliveira Botelho

Até 2006, o trabalho em espaços confinados havia sido abordado em cinco diferentes
Normas Regulamentadoras (NRs) – NR-10, NR-18, NR-29 e NR-31, direcionadas para setores
econômicos específicos, tais como o da indústria da construção, do trabalho portuário, do
trabalho na agricultura, dos serviços com eletricidade, entre outros (MINISTÉRIO DO
TRABALHO E EMPREGO - MTE, 2013, p.8).
Entretanto, como esse tipo de trabalho pode ser encontrado nas mais variadas
atividades econômicas, e ainda não havia uma diretriz que tratasse especificamente o tema de
uma forma detalhada e organizada, foi publicada em 2006 a NR-33, que buscou abordar
exclusivamente as questões relacionadas à Segurança e Saúde nos Trabalhos em Espaços
Confinados.
Esta norma está em vigor desde dezembro de 2006, portaria SIT nº 202.22, ainda não
sendo bem conhecida por muitas empresas, porém já vem gerando algumas autuações
causando preocupação aos gestores. As DRTs (Delegacia Regional do Trabalho) ainda não
possuem uma formatação específica para a apresentação da Avaliação Psicossocial, mas exige
a observação destes fatores e a assinatura de um psicólogo responsável registrado em seu
conselho.
Os riscos inerentes ao trabalho em ambientes confinados revelam alguns desafios para
a avaliação tradicionalmente realizada pelos médicos do trabalho nos exames ocupacionais,
em especial pelas condições extremas às quais os trabalhadores podem ser submetidos
durante sua atividade, exigindo respostas cognitivas e comportamentais coerentes, as quais,
muitas vezes, podem ser prejudicadas por estados mentais concorrentes.
Ao considerar essa peculiaridade do trabalho em espaços confinados, a NR-33
destacou a necessidade de se avaliar os riscos psicossociais do trabalho para a emissão do
Atestado de Saúde Ocupacional (ASO) de apto pelo médico do trabalho e colocou em
perspectiva a possibilidade de se utilizar, para tal, a avaliação psicológica. O Ministério do
Trabalho e Emprego, por meio da NR 33, exige que as empresas que possuem atividades em
ambientes confinados submetam seus trabalhadores à avaliação psicossocial.
Dessa forma, a avaliação psicossocial, com o objetivo de suprir esse disposto da NR-33,
busca obter informações a respeito do funcionário nos diversos contextos o qual está inserido.
Contempla questões relacionadas a sua saúde geral, satisfação com sua atividade laboral,
motivação, necessidades, vulnerabilidade ao stress no trabalho, organização do trabalho,
apoio familiar e social, entre outros, com a finalidade de investigar a estrutura psicossocial e as
expectativas dos funcionários. As entrevistas contemplam questionário de avaliação
psicossocial e testes psicológicos. Dessa forma, possibilita reconhecer fatores individuais e
organizacionais que podem afetar de forma positiva, ou negativa, a saúde das pessoas. Visa
identificar os riscos, avaliá-los e obter subsídios que contribuam de uma forma concreta para o
planejamento e desenvolvimento de ações voltadas às necessidades encontradas
Busca-se- nesse artigo apresentar os conceitos e as estratégias que estão sendo
utilizadas para o atendimento à Norma, discutindo os desafios apresentados e apresentando
recomendações.

2 A NORMA REGULAMENTADORA NR-33 – SEGURANÇA E SAÚDE NO TRABALHO EM


ESPAÇOS CONFINADOS

Todo trabalhador designado para atuar em espaços confinados, conforme o Programa


de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA), estabelecido pela Secretaria de Segurança e Saúde
do Trabalho, do Ministério do Trabalho, por meio da Norma Regulamentadora NR 9, Portaria
3214/78, que tem o objetivo de definir uma metodologia de ação para garantir a preservação
da saúde e integridade dos trabalhadores, face aos riscos existentes nos ambientes de trabalho
da empresa, deve ser submetido a exames médicos específicos para a função que irá

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desempenhar, incluindo os fatores psicossociais, desde que previsto no Programa de Controle


Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO) que é o conjunto dos procedimentos que devem ser
adotados pelas empresas com o objetivo de prevenir e diagnosticar precocemente os danos à
saúde decorrentes do trabalho, antes da emissão do respectivo Atestado de Saúde
Ocupacional (ASO). A NR-33 foi publicada em dezembro de 2006, tendo passado por uma
atualização em agosto de 2012. Ela visa
estabelecer os requisitos mínimos para identificação de espaços confinados
eo reconhecimento, avaliação, monitoramento e controle dos riscos
existentes, de forma a garantir permanentementea segurança e saúde dos
trabalhadores que interagem direta ou indiretamente nestes espaços”
(BRASIL, 2006, p. 7).
Ao comentar cada aspecto disposto na Norma, o Guia Técnico da NR-33 (MTE, 2013, p.
12), publicado em 2013, detalha que o objetivo dessa Norma é
garantir a entrada, o trabalho e a saída segura dos espaços confinados,
através da implantação de medidas de proteção, que devem ser
estabelecidas a partir dos riscos existentes no espaço confinado, antes da
entrada e dos riscos gerados na atividade a ser realizada.
Para a NR-33 (BRASIL, 2006, p. 4), espaço confinado é:

qualquer área ou ambiente não projetado para ocupação humana contínua,


que possua meios limitados de entrada e saída, cuja ventilação existente é
insuficiente para remover contaminantes ou onde possa existir a deficiência
ou enriquecimento de oxigênio.

Quanto à definição de espaço confinado, o Guia Técnico da NR-33 (MTE, 2013) alerta
para as seguintes características desse ambiente de trabalho:
 O espaço não é destinado para a ocupação humana contínua;
 As aberturas para entrada e saída são restritas ou parcialmente obstruídas de maneira a
impedir a livre circulação de trabalhadores;
 A movimentação no seu interior é muitas vezes difícil, podendo ocorrer oaprisionamento
do trabalhador devido à complexidade da geometria, como planosinclinados, paredes
convergentes, pisos lisos, seção reduzida e outras;
 A ventilação natural inexiste ou é deficiente;
 A ventilação existente é insuficiente para remover contaminantes (gases, vapores,poeiras,
névoas ou fumos);
 O percentual de oxigênio pode ser inferior ou superior aos limites legais;
 Poluentes tóxicos e inflamáveis e/ou explosivos podem ser encontrados no seuinterior;
 Fontes de energia potencialmente nocivas podem estar presentes;
 O risco de ocorrência de acidente de trabalho ou de intoxicação é elevado.
Cabe ressaltar que a NR-33, na sua proposição, apresenta-se como uma Norma
Regulamentadora voltada à Gestão de Segurança e Saúde. Para que essa gestão ocorra, a NR
destaca que ela deva ser planejada, programada, implementada e avaliada, incluindo, para tal,
medidas técnicas de prevenção, medidas administrativas e medidas pessoais, e também a
capacitação contínua do trabalhadorpara realizar atividades em espaços confinados.
Dentre as medidas pessoais mencionadas, a NR-33 (BRASIL, 2006) destaca a
importância de se ter uma atenção especial aos riscos psicossociais na realização de exames
médicos ocupacionais, sejam eles admissionais ou periódicos, para trabalhadores que irão
desempenhar atividades em espaços confinados:

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Todo trabalhador designado para trabalhos em espaços confinados deve


sersubmetido a exames médicos específicos para a função que irá
desempenhar, conforme estabelecem as NRs 7 e 31, incluindo os fatores de
riscos psicossociais, com a emissão dorespectivo Atestado de Saúde
Ocupacional (ASO) (BRASIL, 2006, p.4).

Nesse contexto, a realização de exames médicos ocupacionais específicos requer que o


médico esteja atento à existência de patologias, sejam elas físicas ou mentais, que possam
incapacitar o profissional para o trabalho em espaço confinado, ambiente este que pode estar
sujeito à formação de uma atmosfera de risco, quer pela presença de contaminantes tóxicos,
inflamáveis, pela redução do percentual de oxigênio ou pelo enriquecimento do mesmo.
Ao comentar o destaque dado na Norma referente à inclusão da avaliação dos riscos
psicossociais nos exames médicos ocupacionais, o Guia Técnico da NR-33 (MTE, 2013, p.32)
recomenda que deva ser dada uma especial atenção ao estado psicológico do trabalhador que
irá realizar atividades em espaço confinado, buscando identificar características
comportamentais e sinais de patologias mentais capazes de colocar em risco sua própria
integridade física e/ou de colegas.
Outra recomendação apontada pelo Guia destaca que
durante a anamnese, deva-se privilegiar a abordagem cuidadosa de
situações pessoais e familiares de impacto, como término de
relacionamento, morte de parentes próximos e situações de endividamento.
E, se necessário, pode ser solicitada a avaliação psicológica por profissional
especializado, o qual deverá emitir laudo que embase o médico examinador
na classificação de “apto” ou “inapto” para o trabalho (MTE, 2013, p. 32).

3 OS FATORES PSICOSSOCIAIS DO TRABALHO NA NR-33

A partir do desafio posto pela NR-33 aos profissionais da saúde ocupacional, cabe
buscar compreender o significado da inclusão dos aspectos psicossociais nas abordagensdos
riscos ocupacionais relacionados ao trabalho em espaço confinado.
A Organização Internacional do Trabalho (OIT) define que os Fatores Psicossociais do
Trabalho compreendem os aspectos do trabalho em si e do ambiente, tais como: o clima ou
cultura da organização; as funções laborais; as relações interpessoais no trabalho; a forma e o
conteúdo das tarefas (variedade, alcance, caráter repetitivo, significado) (SAUTER et al.,
1998).Além disso, compreendem também o ambiente externo à organização (e.g., situações
domésticas) e os aspectos do indivíduo (e.g., personalidade e atitudes).
Nesse contexto, o conceito de fatores psicossociais do trabalho introduz aspectos
subjetivos na gestão dos riscos ocupacionais, em contrapartida aos aspectos considerados
objetivos, com os quais os profissionais da segurança e da saúde ocupacional estão
naturalmente mais familiarizados.
A avaliação psicossocial analisa aspectos clínicos e laborais que compõe o perfil do
indivíduo. Deve ser realizada por psicólogos devidamente capacitados. Além de ser feita no
momento da contratação, a avaliação também deve ser feita periodicamente, pois o indivíduo
poderá apresentar algum distúrbio psíquico, o que, evidentemente, irá comprometer sua
atividade durante o período que estiver no ambiente confinado.
Numa reflexão sobre as implicações do conceito apresentado pela NR-33, Camargo e
Bandini (2009), em artigo publicado no Jornal da Associação Nacional de Medicina do Trabalho
(ANAMT), observam que, apesar de destacar a importância dos fatores de risco psicossocial no
exame de trabalhadores que irão desempenhar suas atividades em espaço confinado, a NR,
contudo, não discute o que seriam esses fatores. Tendo em vista a inexistência de uma maior

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especificidade sobre o assunto, os autores sugerem que o médico do trabalho esteja atento ao
trabalhador sujeito aos maiores riscos, utilizando-se, por exemplo, dos parâmetros da
Organização Internacional do Trabalho (OIT), que definiu esses fatores de maneira
determinante.
Para tal, Camargo e Bandini (2009) recomendam que a avaliação do médico do
trabalho siga a anamnese tradicional, voltada para as questões da saúde mental, buscando
identificar antecedentes de transtornos psíquicos que evidenciariam quadros de transtornos
mentais importantes para os riscos que envolvem o trabalho em espaço confinado. Eles
sugerem também a utilização de questionários ou inventários específicos para o rastreamento
de transtornos mentais, destacando o “Protocolo para a investigação do nexo causal dos
transtornos mentais relacionados ao trabalho”, que pode ser aplicado nos exames
ocupacionais de rotina.
Os autores acrescentam que, por meio desse protocolo, é possível analisar
fundamentalmente os aspectos relacionados aos riscos de natureza ocupacional, social e
psíquica, descritos a seguir:
a) Riscos de natureza ocupacional– deve-se analisar a implantação e o cumprimento do
PCMSO, PPRA e outras NRs; nas condições ambientais, a existência do tipo de risco-físico,
químico, ergonômico, entre outros. Além disso, são avaliadas também as atividades realizadas,
as fases de seu trabalho, o relacionamento com colegas e chefia, o grau de satisfação no
trabalho e os fatores psicossociais relacionados.
b) Riscos de natureza social – com base na CID-10, deve-se verificar a ocorrência de maus
tratos, separação dos pais, doenças graves, perdas afetivas, problemas de relacionamento
cônjuge/parceiro, suporte familiar inadequado, desajustamento/morte,divórcio/separação,
eventos de vida estressantes afetando a família; alvo de discriminação e perseguição.
c) Riscos de natureza psíquica – com base na avaliação clínica, busca-se caracterizar os
possíveis traços da personalidade pré-mórbida (histriônica, anancástica, instável, entre outros)
e também descrever a ocorrência de episódios atuais e anteriores de transtornos mentais.
Camargo e Bandini (2009), por fim, concluem que “é vital entender que o médico não
deve transferir a responsabilidade de concluir pela aptidão do trabalhador” para outros
especialistas, entretanto, recomendam que ele possa utilizar o apoio desses profissionais para
complementar sua avaliação, de acordo com a necessidade. Portanto, capacitar-se para o uso
dessas ferramentasseria fundamental para o médico do trabalho.
Numa abordagem mais crítica ao modelo preventivista e prescritivista de atuação dos
profissionais da saúde ocupacional, Ruiz e Araújo (2012), num artigo em que discutem a saúde,
a segurança e a subjetividade no trabalho, destacam a inclusão da avaliação dos “enigmáticos
riscos psicossociais” na NR-33, que inova, indo além das recomendações mais tradicionais, que
contemplam apenas aspectos objetivos (químicos, físicos e biológicos). Para os autores, essa
NR, mesmo seguindo a tradição normativa, introduz formalmente a questão do risco
psicossocial, o que abre um debate positivo em diversos aspectos, aproximando temas que
normalmente tendem a ser tratados de forma segmentada, o que pode estimular ações e
oportunidades de novos campos de pesquisas.
Entretanto, eles alertam que, apesar desse debate positivo, algumas linhas de
interpretação têm procurado atender objetivamente às novas exigências, sugerindo a adição
de avaliações psicológicas, ou de contexto social, ao tradicional exame médico ocupacional.
Assim, agregam-se novos especialistas a um modelo de saúde compartimentalizado, que
avaliariam estritamente o seu domínio específico, mantendo, dessa maneira, “a visão
fragmentada de saúde como objeto de especialistas e mantendo o foco da avaliação no
indivíduo ou no ambiente, subestimando a relação com o trabalho” (RUIZ; ARAÚJO, 2012, p.
12).

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4 A AVALIAÇÃO PSICOSSOCIAL

A Avaliação psicossocial é uma avaliação psicológica, uma função privativa do


Psicólogo e como tal se encontra definida na Lei 4119 de 27/08/62 (letra “a”, do parágrafo 1°
do artigo 13). Avaliação, em Psicologia, refere-se à coleta e interpretação de informações
psicológicas, resultantes de um conjunto de procedimentos confiáveis que permitam ao
Psicólogo julgar um comportamento. Aplica-se ao estudo de casos individuais ou de grupos ou
a situações e é feita em trabalhador que já atua ou que irá atuar em trabalhos em espaço
confinado, que gere um parecer que servirá de auxílio ao médico do trabalho no julgamento
de sua aptidão para esta função.
A Avaliação Psicossocial contempla a avaliação psicológica de aspectos
comportamentais, de personalidade e testes que avaliam a potencialidade do indivíduo em
relação a alguma característica pessoal, visando mapear a composição do perfil psicológico do
indivíduo para determinadas atividades laborais.
Por meio de métodos, técnicas e instrumentos científicos (CFP Resolução 002/2003),
existe uma demanda de empresas, no que tange à aplicação de Testes Psicológicos,
contribuindo de forma efetiva e estratégica nos processos de Gestão de Pessoas.
Batista et al. (2011) realizaram uma revisão sistemática da literatura da área da
avaliação psicológica no trabalho na base de dados PePSIC entre 2000 e 2009, utilizando as
palavras-chave "Psicologia do trabalho", "Psicologia organizacional" e "Avaliação psicológica".
A maioria dos artigos empíricos encontrados se concentrou em 2007, de autoria múltipla, com
temas relacionados à saúde do trabalhador e aspectos organizacionais. Somente um dos
instrumentos versava sobre um teste psicológico específico da área do trabalho, embora
tenham sido encontrados ao todo 14 instrumentos psicológicos.
Após essa classificação, os autores referidos àcima elencaram os testes psicológicos,
no total de 14, nos nove artigos que os utilizaram. Dentre esses instrumentos encontram-se
cinco que se referem a traços de personalidade EFEx, EFS, ESAFE, Teste Warteg e 16 PF; dois
relacionados ao estresse, EVENT e ISSL, três de inteligência, BPR-5, Rin e Teste V2.0, e por fim,
na área de empregabilidade, atenção ao cliente, avaliação ao cliente incógnito e avaliação de
desempenho, um de cada. Dos 14 testes utilizados, apenas cinco são aprovados pelo SATEPSI e
apenas um deles, a EVENT, está diretamente relacionada ao contexto do tribalho. Pode-se
observar que, nenhum deles aborda diretamente os fatores psicossociais de risco.
O Inventário sobre Trabalho e Riscos de adoecimento (ITRA) elaborado por Mendes e
Ferreira e Cruz (2007), do ponto de vista das autoras desse artigo, poderia ser uma escolha
robusta para subsidiar, entre outros instrumentos, a avaliação psicossocial do trabalho,
relacionada à NR33. O ITRA possui quatro escalas: (i) a Escala de Avaliação do Contexto de
Trabalho (EACT) e que afere dados sobre a organização do trabalho, s condições de trabalho e
das relações socioprofissionais; (ii) a Escala de Custo Humano no Trabalho (EACT) que avalia os
custos físico, afetivo e cognitivo; (iii) a Escala de Indicadores de Prazer e Sofrimento no
Trabalho (EIPST) que contempla aspectos ligados ao (a) Prazer: liberdade de expressão e
realização profissional e ao (b) Sofrimento: esgotamento profissional e falta de
reconhecimento e finalmente a (iv) a Escala de Danos Relacionados ao Trabalho danos físicos,
psicológicos e sociais (EDRT).
O cenário de diferentes tendências e abordagens sobre o papel do profissional da
saúde ocupacional nas questões que se relacionam aos fatores de risco psicossocial no
trabalho encontrar-se-á obviamente posições que visarão destacar mais o papel do médico do
trabalho, previsto pelas Normas Regulamentadoras no nosso país, e outras que buscarão
defender o espaço de atuação de outros especialistas, em conjunto.
A partir do disposto pelo Ministério do Trabalho, pela NR-33, trabalhadores que
exerçam suas atividades em espaço confinado devem realizar a Avaliação Psicossocial antes do

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início de suas atividades, como dito anteriormente. Esta avaliação busca investigar aspectos
psicológicos e sociais do indivíduo, a fim de proteger sua saúde e segurança no exercício de
seu trabalho.
A NR-33 formalmente atrela os “fatores de riscos psicossociais” ao exame médico
ocupacional, porém o faz demaneira aindaimprecisa, abrindo espaço para proposições
diversas. A pouca literatura produzida especificamente sobre o tema considerando o trabalho
em espaços confinados sugere que ainda há muito a ser construído nesse assunto.
Alguns protocolos estão sendo utilizados por profissionais da psicologia de maneira a
padronizar o que está sendo denominado como “Avaliação Psicossocial de Trabalhadores para
Atuação em Espaços Confinados”. O Serviço Social da Indústria (SESI) desenvolveu um modelo
para essa avaliação que propõe o seguinte roteiro de investigação:
a) Qualidade de vida.
b) Relacionamentos interpessoais: vida social/ trabalho.
c) Uso de Álcool e outras drogas.
d) Trajetória Profissional - Breve histórico das experiências profissionais anteriores.
e) Investigação de Transtornos e/ou sintomas relacionados à Saúde Mental.
f) Avaliação e Investigação do Self Reporting Questionnaire (SRQ-20)
g) Investigação de Sintomas de Depressão.
h) Investigação de Sintomas de Ansiedade.
i) Investigação de Transtorno Afetivo Bipolar.
j) Investigação de Fobias.
k) Agorafobia (Conforme o DSM IV).
l) Fobias Específicas.
m) Investigação de TOC (DSM VI - Características Diagnósticas).
n) Investigação de Psicose.
o) Funções do ego.
Como exemplo de outra abordagem, em um Congresso sobre atuação responsável
realizado pela Associação Brasileira de Indústria Química (ABIQUIM) em 2009, Erbs e Bellé
(2009) apresentaram o resultado de um trabalho em que buscaram implantar, numa empresa
química, uma metodologia de Avaliação Psicossocial para o trabalho em espaço confinado. Na
tentativa de responder como contribuir para fomentar processos de atenção aos riscos
psicossociais, as autoras desenvolveram as seguintes estratégias:
a) Elaboração de um Guia de fatores Psicossociais;
b) Elaboração de um folder explicativo;
c) Realização de palestras de sensibilização para os parceiros e lideranças;
d) Elaboração de um projeto de pesquisa sobre os fatorespsicossociais;
e) Elaboração, aplicação e análise de um questionário paradiagnóstico de fatores
psicossociais;
f) Monitoramento de sinais vitais;
g) Realização de atendimentos individuais aos colaboradores de empresaparceiras e
devoluções aos responsáveis;
h) Implantação da Avaliação Psicossocial no Exame Periódico.
Para as autoras, alguns riscos psicossociais encontrados no estudo justificariam um
acompanhamento mais sistemático durante a permanência do trabalhador no seu posto de
trabalho em espaços confinados, devendo-se, portanto, não restringir a preocupação com a
avaliação psicossocial somente no exame admissional. São eles:
 Diversidade cultural dos trabalhadores envolvidos;
 Diversidade de práticas e experiências das diferentes empresas;
 Seleção não criteriosa de colaboradores externos por partedas empresas parceiras

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(terceirizaçoes);
 Opção pelo trabalho em espaço confinado, unicamente por se tratar uma proposta
financeiramente atraente, sem levar em conta os riscos e responsabilidades;
 Despreparo dos vigias;
 Desvalorização da ocupação de vigia;
 Informações desencontradas;
 Pressão externa e interna para a execução e término das atividades programadas.
Por fim, as autoras mencionam ainda algumas medidas preventivas identificadas no
referido estudo, as quais denominam de “Fatores psicossociais positivos”, sendo eles:
 Sensibilização para os parceiros (terceirizados) sobre o Processo deAtenção Psicossocial;
 Possibilidade de atendimento psicológico;
 Espaço de escuta e pesquisa para os trabalhadorescolocarem suas percepções em relação
ao seu trabalho;
 Apoio na mediação de conflitos;
 Receptividade das intervenções realizadas em função doProcesso de Atenção Psicossocial.
Numa perspectiva diferente, Ueda e Silva (2013) apresentaram um relato de
experiência em que realizaram a avaliação psicossocial para atuação em espaços confinados.
Nele, as autoras referem que, para a realização da avaliação psicossocial para o trabalho em
espaço confinado numa empresa multinacional do segmento alimentício, foi necessário
conhecer o contexto psicossocial no qual a pessoa estava inserida, e identificar as variáveis
individuais e sociais que poderiam interferir em sua dinâmica de personalidade.
Para a avaliação psicossocial, as autoras elaboraram um procedimento realizado em
duas etapas: por meio de entrevista e observação, buscaram caracterizar os relacionamentos
interpessoais, a vida social/trabalhos e a trajetória profissional do avaliado; e para investigar
os transtornos e/ou sintomas relacionados à Saúde Mental, utilizaram-se do Self Reporting
Questionnaire- SRQ-20, da Escala Beck Bai - Inventário de Ansiedade e do BDI- Inventário de
Depressão de Beck. Ainda, avaliou-se a cognição (atenção e raciocínio) por meio do Teste de
R1 (Teste de Inteligência Não Verbal) e o TEACO-FF (atenção concentrada).
Segundo Erbs e Bellé (2009. p.28) os resultados apontaram que a avaliação
psicológica psicossocial é um “processo técnico-científico que assegura a coleta de dados para
uma descrição, uma explicação e a predição ou desempenho dos fenômenos estudados”.

5 DISCUSSÃO E CONSIDERAÇÕES FINAIS

A NR-33, ao introduzir a necessidade de se avaliar os fatores psicossociais no trabalho


em espaços confinados, de fato, apresentou uma demanda importante para a discussão da
avaliação dos aspectos subjetivos do trabalho na prática dos profissionais da saúde
ocupacional, e, em especial, dos médicos do trabalho.
A produção científica em relação à denominada Avaliação Psicossocial ainda não revela
de maneira sistemática os frutos dessa discussão, mas algumas experiências têm sido
compartilhadas em eventos das áreas envolvidas.
Em linhas gerais, as experiências relatadas buscaram elaborar estratégias e
roteiros/modelos para essa avaliação, realizadas por psicólogos, nos quais se evidenciam a
utilização de escalas e questionários que investigam a presença de sintomas indicativos de
transtornos mentais (Ansiedade, Depressão, TEPT, TOC, TAB, Fobias) e de instrumentos de
rastreamento de transtornos mentais em geral.
As abordagens propõem também investigar aspectos relacionados à qualidade de vida
em geral, aos relacionamentos interpessoais, relacionamentos sociais dentro e fora do
ambiente de trabalho, eventos de vida, e também a trajetória profissional e a motivação pela

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opção de trabalhar em espaço confinado.


A implantação da avaliação psicossocial deverá estar atrelada a uma estratégia de
sensibilização mais ampla e contextualizada, nas empresas, dos riscos envolvidos no trabalho
em ambiente confinado, o que facilitaria uma “cultura” de prevenção aos riscos inerentes a
esse tipo de trabalho, aumentando, consequentemente, a receptividade da atuação do
psicólogo no contexto ocupacional.
Entretanto, há muito que se avançar em relação ao assunto, pois o que se observa é
que o foco desses modelos de atuação se restringe a identificar, ou predizer, o risco potencial
de um trabalhador adoecer ou de se envolver numa condição de alto risco à sua saúde e
segurança no trabalho, em decorrência de fatores psíquicos, podendo colocar em risco
também seus colegas de trabalho.
Considerando que a Avaliação Psicossocial possibilita à indústria adotar medidas
preventivas em relação à Saúde Mental dos trabalhadores, auxiliando na diminuição dos riscos
de acidentes de trabalho, na redução dos índices de absenteísmo, presenteísmo e
afastamentos ocasionados por transtornos mentais (fatores que têm impacto no FAP),
recomenda-se que: a) as avaliações psicossociais devem ser realizadas por profissional
psicólogo que tenha conhecimento da psicologia da saúde ocupacional, psicologia clínica e
avaliação psicológica, com registro profissional no respectivo conselho.
Uma Avaliação Psicossocial com qualidade técnica deverá: (i) contemplar o trabalhador
em seus aspectos biopsicossociais; (ii) possuir critérios e instrumentos específicos de avaliação
dos transtornos mentais; (iii) levar em conta a relação interdisciplinar entre o Médico do
Trabalho, o psicólogo e o RH da empresa, para o êxito do trabalho, dado que essas áreas do
conhecimento são de interface e subsidiam uma à outra na avaliação do trabalhador como ser
indissociável.
Se as empresas considerarem que a Avaliação Psicossocial é um recurso consistente e
precisa, haverá uma relação custo-benefício altamente favorável para as mesmas, na
perspectiva jurídica e econômica.
Se a empresa garantir o sigilo das informações contidas no relatório emitido pelo
psicólogo, que será de uso exclusivo do médico, ou na impossibilidade deste, alguém indicado
por ele. Todo material resultante da avaliação deve ser guardado por cinco anos, porém, como
a Avaliação Psicossocial fica integrada aos arquivos ocupacionais o prazo é de 20 anos.
Acrescente-se que para a realização da Avaliação Psicossocial a empresa poderá utilizar
pessoal técnico interno ou contratar a prestação dos serviços especializados.
A literatura encontrada e os relatos compartilhados ainda não investiram em
discussões críticas para o tema, tais como a capacidade preditiva da avaliação psicossocial; a
aproximação e a articulação, na prática, entre os profissionais envolvidos (médico do trabalho
e psicólogo); o impacto da introdução da proposta de uma avaliação dos riscos psicossociais no
modelo biomédico de saúde, entre outros.

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Artigo recebido em 01/10/2013 e aceito para publicação em 18/10/2013

Perspectivas em Gestão & Conhecimento, João Pessoa, v. 3, Número Especial, p. 57-66, out. 2013

66
Revista Psicologia: Organizações & Trabalho (rPOT)
Psychology: Organizations and Work Journal
Revista Psicología: Organizaciones y Trabajo
ISSN 1984-6657 - https://doi.org/10.5935/rpot/2021.1.20373

Avaliações Psicossociais no Trabalho no Brasil: Estudo de Levantamento


sobre Variáveis, Modelos Teóricos, Instrumentos e Critérios Adotados

Valmir Dorn Vasconcelos1,*, Clarissa Marceli Trentini2

1
http://orcid.org/0000-0002-7036-8383 / Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Brasil
2
http://orcid.org/0000-0002-2607-7132 / Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Brasil

Resumo

O Brasil adotou avaliações psicossociais no trabalho (APT) compulsório para trabalhadores que atuam em altura e em espaços confinados. Entretanto, há
pouca orientação sobre como realizá-las com destreza e segurança. Diante disso, realizou-se estudo metodológico de levantamento quantitativo-qualitativo
com os médicos e psicólogos que praticam APT. Objetivou-se descrever e comparar características da prática profissional quanto às variáveis investigadas a
partir de modelos teóricos, instrumentos e critérios adotados. Participaram 63 psicólogos e 17 médicos, a maioria do sexo feminino, provenientes das regiões
Sul e Sudeste do Brasil. A APT foi compreendida a partir do rastreamento de transtornos mentais pela grande maioria dos participantes. Há ênfase de ambos
os profissionais para avaliação de uso de álcool e outras drogas (N = 96%), fobias, acidentes de trabalho, sono e estresse (N = 87,9-81,8%). Poucos profissio-
nais utilizam instrumentos voltados para aspectos do trabalho ou utilizam modelos teóricos para embasar sua APT. Psicólogos usam com maior frequência
testes de atenção, ferramentas expressivas de personalidade e raciocínio. Discute-se acerca da necessidade de ampliar a APT, investindo tanto na formação
destes profissionais quanto na aproximação de uma abordagem psicossocial, considerando fatores laborais em detrimento do uso do modelo biológico.

Palavras-chave: avaliação psicossocial, riscos ocupacionais, levantamento.

Psychosocial Assessment at Work in Brazil: A Survey Evaluaciones Psicosociales en el Trabajo en Brasil:


Study of Variables, Theoretical Models, Instruments, Estudio de Encuesta sobre Variables, Modelos
and Adopted Criteria Teóricos, Instrumentos y Criterios Adoptados

Abstract Resumen

Brasil ha adoptado evaluaciones psicosociales obligatorias en el trabajo


Brazil adopted mandatory psychosocial risk assessment at work (PRaT) (APT, em português) para trabajadores que laboran en altura y en es-
for workers who work at heights and in confined spaces, offering little pacios confinados. Sin embargo, con poca orientación sobre cómo re-
guidance on how to perform them. This study is a qualitative-quantitative alizarlos con destreza y seguranza. Por lo tanto, se realizó un estudio
survey applied to occupational physicians and psychologists who practice metodológico cuantitativo y cualitativo con médicos y psicólogos que
PRaT. This study aims to describe and compare professional characteristics practican APT. El objetivo fue describir y comparar las características de
regarding the variables investigated, theoretical models, instruments, and la práctica profesional cuanto las variables investigadas a través de mo-
adopted criteria. Sixty-three psychologists and 17 doctors participated, delos teóricos, instrumentos y criterios adoptados. Participaron 63 psi-
mostly female, from the South and Southeast of Brazil. The PRaT was cólogos y 17 médicos, la mayoría mujeres, provenientes de las regiones
understood as screening of mental disorders by most participants. There del Sur y Sudeste de Brasil. La APT fue entendida a través de un rastreo
is an emphasis on both professionals to assess the use of alcohol and other de trastornos mentales por la gran mayoría de los participantes. Ambos
drugs (N = 96%), phobias, work accidents, stress, and sleep (N = 87.9- profesionales hacen énfasis en la evaluación de uso del alcohol y otras
81.8%). Few professionals use instruments for assessing occupational drogas (N = 96%), fobias, accidentes laborales, trastornos del sueño y
hazards or use theoretical models in their PRaT. Psychologists often estrés (N = 87.9-81.8%). Pocos profesionales usan instrumentos enfo-
use attention tests, expressive personality tests, and rational thinking cados en aspectos del trabajo o utilizan modelos teóricos para apoyar su
instruments. We discuss the need to expand the PRaT by investing APT. Los psicólogos usan con mayor frecuencia testes de atención, her-
in undergraduate education as well as using a psychosocial approach ramientas expresivas de personalidad y raciocinio. Se discute la necesidad
to the detriment of the biological model, considering work factors. de expandir la APT, invirtiendo tanto en capacitación de estos profesio-
nales cuanto en la aproximación de un abordaje psicosocial, conside-
rando los factores en detrimento de la utilización del modelo biológico.

Keywords: psychosocial assessment, occupational risks, survey. Palabras clave: evaluación psicossocial, riesgos laborales, levantamiento.

Como citar esse artigo:


Submissão: 16/04/2020
Vasconcelos, V. D., & Trentini, C. M. (2021). Avaliações Psicossociais no Trabalho no
Primeira decisão editorial: 14/07/2020
Brasil: Estudo de Levantamento sobre Variáveis, Modelos Teóricos, Instrumentos e
Versão final: 05/08/2020
Critérios Adotados. Revista Psicologia: Organizações e Trabalho, 21(1), 1355-1366. https://doi.
Aceite: 27/08/2020
org/10.5935/rpot/2021.1.20373
1356 Revista Psicologia: Organizações & Trabalho, 21(1), 1355-1366.

Nos últimos trinta anos, em nível mundial, legislações espe- dade (Psicologia, Direito, Ciências Sociais). Tal situação exige um
cíficas nas áreas ocupacionais tornam obrigatória a avaliação de esforço interdisciplinar.
fatores de saúde mental relacionados ao trabalho (Metzler, von Sobre o tema risco, pesquisadoras como Bosi (2015) defen-
Groeling-Müller, & Bellingrath, 2019; Potter, O’Keeffe, Leka, dem que haja substituição deste termo pela concepção de “noci-
& Dollard, 2019; Weigl, Müller, Paramythelli, Angerer, & Petru, vidade”, que carrega a mesma ideia semântica, ao mesmo tempo
2016). Essas dimensões foram convencionalmente chamadas de que inclui a dimensão qualitativa da experiência de risco. Outros
fatores de risco psicossocial no trabalho pela Organização Inter- autores na área da Psicologia do Trabalho defendem que o foco
nacional do Trabalho, elencando sua avaliação e eliminação do ris- das avaliações deve se direcionar para fatores psicossociais em
co como um dos seus principais objetivos (International Labor detrimento dos fatores de risco psicossocial, considerando assim
Organization [ILO] & World Health Organization [WHO], 1984). tanto as dimensões protetivas quanto nocivas do trabalho (Efrom,
Esse investimento é importante, considerando que somente Vazquez, & Hutz, 2020)
em 2010, transtornos mentais, uso de álcool e doenças neurológi- Quanto ao termo psicossocial, esse não possui única defini-
cas ocasionaram o impacto financeiro de 2,5 a 5 trilhões de dóla- ção no campo da ciência. Paiva (2013) argumenta que raramente
res internacionalmente (Chisholm et al., 2016). Dados brasileiros são encontradas definições desse conceito em artigos. O domínio
previdenciários apontam, ainda, que 614.508 pessoas foram afas- psicossocial é usado, simultaneamente, para falar sobre: a) etapas
tadas do trabalho por fatores psicológicos no período de 2012 a do desenvolvimento humano (desenvolvimento psicossocial); b
2016. Entre elas, 8,62% tiveram nexo com trabalho reconhecido, readaptação de pessoas para uma nova condição de vida (reabilita-
totalizando a terceira maior causa de auxílios-doença concedidos ção psicossocial); c) uma anamnese que leva em conta o contexto
nesse período (Ministério da Fazenda, 2017) Adicionados a isso, de vida do paciente (avaliação psicossocial); d) para qualificar as
entre 2007 e 2013, registrou-se aumento de 126% do índice de relações indivíduo-grupo/sociedade (aspectos psicossociais); ou
concessão de afastamentos no trabalho (Viegas & Almeida, 2016). e) uma abordagem organizada para prestar atendimentos para
Neste caminho, para alguns grupos de profissionais que portadores de sofrimento mental, a atenção psicossocial- Centro
atuam em situação de risco, tornou-se obrigatória a avaliação de de Apoio Psicossocial- CAPS (Paiva, 2013).
aspectos psicossociais para o Atestado de Saúde Ocupacional Já o construto risco psicossocial empregado na área ocu-
(ASO), realizados em exames de admissão e periódicos. Este mar- pacional pode ser definido como sinônimo de estresse (Rick &
co legal está presente nas Normas Regulamentadoras do Trabalho Briner, 2000), como riscos para a saúde criados por meio de me-
(NR 35 e 33, que regulamentam, respectivamente, o trabalho em canismos sociais e psíquicos das condições de trabalho (Gollac &
altura - atividade realizada acima de 2m do piso de referência (Bra- Bodier, 2011); ou, ainda, por fatores que influenciam a satisfação
sil, 2012) - e tarefas em espaço confinado - trabalhos realizados em e o rendimento laboral, ligados tanto às condições do trabalho
ambientes não projetados para a ocupação humana, com meios quanto às capacidades, necessidades, cultura e condições de vida
limitados de saída e entrada, onde a oxigenação pode ser insufi- do trabalhador (Costa & Santos, 2013; Cox & Griffiths, 1995).
ciente ou que não há possibilidade de remoção de contaminantes Outras 21 definições para fatores psicossociais foram encontra-
(Brasil, 2006). Outros profissionais que trabalham em brigada de das na literatura de saúde do trabalhador, muito embora 8% dos
emergência de indústria de combustíveis também possuem avalia- artigos definam o conceito (Vazquez, Pianezolla, & Hutz, 2018).
ção compulsória (Rodrigues & Faiad, 2018). A definição operacional legislativa também é pouco clara do
Diante da obrigatoriedade legislativa a partir de 2006, criou- que é avaliação psicossocial. Contudo, é estabelecida a necessidade
-se um tipo de exame clínico, compulsório às atividades de risco: a de avaliar patologias que provocam mal súbito (epilepsia, fobia),
avaliação psicossocial no trabalho (APT). Embora esse termo seja incluindo fatores psicossociais relacionados ao trabalho (FRPT).
utilizado, na prática, em todos os estados brasileiros, por profissio- FRPT são definidos como “aquelas características do trabalho que
nais tanto de psicologia quanto da medicina; ele é demasiadamente funcionam como ‘estressores’, ou seja, implicam em grandes exi-
amplo, usado em mais de uma área do conhecimento e carece de gências no trabalho, combinadas com recursos insuficientes para
especificação conceitual. Ainda, falta detalhamento sobre como a o enfrentamento das mesmas” (Brasil, 2013, p. 21). O guia co-
APT deve ser realizada pelos profissionais e quais variáveis devem mentado da NR 35 estabelece recomendação de que essa avaliação
ser investigadas nas avaliações. seja feita na modalidade avaliação psicológica, ainda que essa não
Risco é um conceito adotado pelas NRs e compreendido seja a única maneira obrigatória de realizar avaliação psicossocial,
como a probabilidade de um perigo (hazard) ocupacional causar ficando a cargo do médico do trabalho decidir sobre os exames
prejuízo (Melnick & Everrit, 2008), ou ainda, como evento adver- mais adequados.
so com determinadas probabilidades objetivas de causar danos, Integrando as principais definições dos FRPT dos modelos
que pode ser estimado através de cálculos estatísticos por diversos teóricos e da base legislativas, a Avaliação Psicossocial no Trabalho
métodos (Guivant, 1998). Os riscos, nesta concepção, são catego- deve contemplar a interação dinâmica entre as características par-
ricamente quantitativos, tentando predizer eventos negativos, liga- ticulares dos avaliados com fatores ambientais, organizacionais,
dos ao paradigma hegemônico das ciências duras (Hard) da Enge- relacionais e extralaborais, considerando aspectos objetivos e sub-
nharia do Trabalho e Epidemiologia (Bosi, 2015; Guilam, 2004). jetivos do trabalho e as percepções internas de cada trabalhador.
Apesar da tradição “dura” (hard) da análise de riscos ocu- Ao mesmo tempo, deve explorar a indissociabilidade do indivíduo
pacionais, acredita-se que existe consenso de que a avaliação (de e de seu trabalho, não objetivando apenas avaliar características
risco) não é um processo exclusivamente matemático, pois todos individuais de vulnerabilidade ou apenas o potencial nocivo do
os “riscos” são afetados por fenômenos culturais. Além disso, a trabalho
autopercepção de riscos entre leigos e técnicos apresenta diferen- Resultados de revisões narrativas, bibliométricas e sistemáti-
ças. Fatos e valores frequentemente são confundidos quando nos cas sobre avaliação de risco psicossocial no Brasil têm apontado a
debruçamos sobre um tema de alto nível de incerteza (Guilam, predominância de pesquisas utilizando teorias de estresse no tra-
2004; Jasanoff, 1993) . Esse é o cenário em que é inserida a APT, balho (Jacinto & Tolfo, 2018; Rodrigues & Faiad, 2019; Vazquez
ligada a uma cultura objetiva e probabilística das ciências hard et al., 2018). Essas perspectivas são conhecidas como Job-demand
(Engenharia, Epidemiologia, Psicometria) e, ao mesmo tempo, à control - JDC (Karasek & Theorell, 1990; Johnson & Hall, 1998) e
cultura das ciências leves, que lidam com a incerteza e a subjetivi- Effort-reward Imbalance - ERI (Siegrist et al., 1990).
Vasconcelos, V. D., & Trentini, C. M. (2021). 1357

Para esses grupos teóricos, os riscos psicossociais provêm ainda que haja carência de instrumentos específicos e de estudos
da combinação de alta demanda de trabalho com a baixa latitude sobre esses aspectos com trabalhadores que atuam em altura ou
de decisão sobre a tarefa, mas também pela interpretação espaço confinado.
subjetiva de um desequilíbrio entre o esforço do trabalhador e a Apesar do recente aumento no número de publicações so-
recompensa fornecida (Silva, Wendt, & Argimon, 2017). Alguns bre APT no cenário brasileiro (Jacinto & Tolfo, 2018; Lima et al.,
instrumentos, embasados nessas duas perspectivas, possuem 2019; Luna & Gondim, 2019; Rodrigues & Faiad, 2018; Silva et
evidências de validade no Brasil. Entre eles, estão o Job Content al., 2017), estudos na área da psicologia ainda são poucos. É visto
Questionnaire (JCQ) , o Job Stress Scale (JSS), o Effort-Reward Imbalance que a maior parte dos estudos existentes são direcionados para tra-
Questionnaire (ERIQ) e três versões recentes do Copenhagen balhadores da saúde, e que existe pouca integração entres autores
Psychosocial Questionnaire- COPSOQ. Atualmente, o COPSOQ é que publicam na área (Rodrigues & Faiad, 2019).
visto como instrumento padrão-ouro de avaliações psicossociais Até o momento, não foram investigados os impactos que
do trabalho, por integrar dois modelos teóricos (ERI e JDC) e por essa produção tanto científica quanto teórica tem exercido nos
possuir mais de 22 adaptações em diversos países, possibilitando profissionais que praticam essa avaliação. Também não são co-
estudos comparativos (Lima, Parma, Cotrim, & Moro, 2019; Luna nhecidas informações a respeito do perfil de médicos e psicólo-
& Gondim, 2019; Silva et al., 2017). gos que atuam na área, ou dos trabalhadores avaliados; do uso de
Outas escalas de estresse não relacionadas as teorias de teorias, instrumentos, variáveis investigadas e critérios utilizados
estresse no trabalho são usadas em avaliações psicossociais. pelos avaliadores. Acredita-se que a maioria dos dados que possa
Dentre elas, citam-se a Escala Vulnerabilidade ao estresse no favorecer uma prática de avaliação psicossocial poderia ser acessa-
Trabalho (EVENT) e o Inventário Lipp de Sintomas de Estresse da através dos médicos e psicólogos que praticam essas avaliações.
– ISSL (Guimarães, Martins, & Botelho, 2013; Rodrigues & Faiad, Nessa perspectiva, foi desenvolvido um estudo de levantamento
2018). Ainda, é constatado o uso de instrumentos como Self- para mapear as práticas dos profissionais brasileiros.
Report Questionaire (SRQ-20), desenvolvido pela OMS para países A hipótese/expectativa inicial do estudo foi que as avaliações
emergentes, com o objetivo de avaliar transtornos mentais comuns realizadas não acompanham a literatura científica publicada sobre
não psicóticos (Guimarães, Martins, & Botelho, 2013). o tema. Para tanto, têm-se como objetivos secundários: (1) des-
Existem outras alternativas teóricas de investigação psicos- crever a avaliação dos profissionais que atuam na área (psicólogos
social, como a Psicodinâmica do trabalho, a ergonomia e outras e médicos); (2) comparar as diferenças e semelhanças dos crité-
teorias como a clínica da atividade e ergologia (Jacinto & Tolfo, rios, modelos, instrumentos e demais construtos avaliados entre
2017; Neffa, 2019). São modelos com inspiração em teorias his- as categorias profissionais; (3) verificar o quanto os profissionais
tórico-dialéticas e da psicanálise, nas quais o risco psicossocial é atendem a normativa e a produção da literatura científica; e (4) co-
compreendido como decorrente do não reconhecimento material, nhecer as principais demandas, opiniões e critérios adotados pelos
simbólico e imaginário do trabalhador, gerando dinâmicas de pra- médicos e psicólogos.
zer e sofrimento (Neffa, 2019).
Tradicionalmente, na maioria destes modelos teóricos, privi- Método
legia-se abordagens qualitativas. Entretanto, no Brasil, existe um
inventário elaborado com base nos construtos teóricos da psi- Trata-se de estudo transversal descritivo com amostragem
codinâmica, o Inventário de Trabalho e Riscos de Adoecimento por conveniência de levantamento quantitativo-qualitativo, cujo
(ITRA; Mendes & Ferreira, 2007). O ITRA é sugerido como pos- objetivo foi conhecer, sistematizar e levantar as práticas de avalia-
sível instrumento para compor essas avaliações (Guimarães et al., ção psicológica/psicossocial realizadas por profissionais de saúde
2013), mas que podem ser mais úteis em exames periódicos com do trabalhador. A pesquisa pode ser definida como multimétodo
pessoas que já estão atuando sobre riscos de altura e trabalho con- parcial concorrente (Creswell, 2014), pois faz uso de instrumen-
finado, uma vez que ela se aplica sobre situações atuais de trabalho to semi-estruturado que contém variáveis categóricas, ordinais e
(Rodrigues & Faiad, 2018). perguntas abertas, variáveis que são analisadas qualitativamente e
Os profissionais da área da saúde costumam enxergar a APT quantitativamente de maneira separadas (por isso o parcial). Argu-
como uma tarefa complexa e de difícil execução, principalmente menta-se que o método é apropriado na medida em que objetiva
por falta de conhecimento técnico de como realizá-la (Weigl et al., compreender o fenômeno considerando e refletindo a compreen-
2016). Ela geralmente é discutida como uma avaliação complicada, são dos participantes (Mareck, 2011) bem como é apropriado à
especialmente a à pouca definição internacional estabelecida pelos pergunta de pesquisa (Serapioni, 2000).
atuantes legislativos e executivo (Potter et al., 2019) do que é ava-
liação psicossocial e seus principais componentes. Participantes
Por conta disso, muitas empresas e profissionais optam por
simplificar essas avaliações em protocolos/checklists de APT para Médicos e Psicólogos brasileiros fizeram parte deste estudo,
aumentar a precisão da medida (Weigl et al., 2016). Entretanto, sendo 62 Psicólogos (Midade = 39,2, DP = 10,48) e 17 Médicos
boa parte desses protocolos carece de evidências de validade e fi- (Midade = 37,41, DP = 11), a maioria do sexo feminino (Tabela 1),
dedignidade (Metzler et al., 2019), especialmente importantes para com 86% dos participantes com raça autodeclarada branca e tem-
a qualidade de um instrumento. po de formação de 3 a 35 anos, sem diferenças significativas entre
Guimarães e colaboradoras (2013) relatam que profissionais as profissões para tempo de formação (M = 12,06, DP = 8,52).
brasileiros têm usado roteiros/modelos de escala e questioná- Todos os participantes passaram pelo critério de inclusão de ter
rios que investigam a presença de sintomas indicativos de trans- realizado, no mínimo, 10 avaliações.
tornos mentais (Ansiedade, Depressão, Transtorno de Estresse Em relação à escolaridade dos Médicos (Med): 23,8% pos-
Pós-Traumático, Transtorno Obsessivo-Compulsivo, Transtorno suem apenas graduação (n = 5), 38,1% possuem pós-graduação,
Bipolar, Fobias) e de instrumentos de rastreamento de transtor- 19% realizaram residência, 9,5% têm mestrado, e 4,8% têm dou-
nos mentais comuns. Rodrigues e Faiad (2018) levantaram que as torado. A maioria dos Med é especialista em Medicina do Traba-
avaliações são compostas de entrevista e investigação de aspec- lho (N = 11). Três também possuem especialidade em perícias
tos cognitivos, de personalidade e de condições de saúde mental; médicas judiciais, um em ergonomia e dois em outras áreas da
1358 Revista Psicologia: Organizações & Trabalho, 21(1), 1355-1366.

Tabela 1- Safe Work Australia, 2019) sobre o tema. O survey foi composto,
Dados Sociodemográficos da amostra estudada no total, de 48 itens com informações e questões específicas sobre
Psicólogo(a) Médico(a) Total a área de avaliação:
Variáveis
n = 62 n = 17 N =79 • Conhecimento sobre Avaliação Psicossocial e onde são re-
Idade alizadas,
M 39,31 37,41 38,88 • Informações sobre prática de avaliação psicossocial (mode-
Mín. 24 23 23 los teóricos, métodos de avaliação e variáveis investigadas);
Máx. 65 57 65
• Estresse no trabalho e fatores organizacionais;
• Uso de Instrumentos.
DP 10,48 11,01 10,55
• Dados sobre sua experiência profissional (motivos para
Sexo
inaptidão, tempo para realizar avaliações psicossociais, dificulda-
Feminino % 91,9 64,7 86,1
des em realizar avaliações, opiniões a respeito de instrumentos es-
Região pecíficos sobre o tema, sobre as avaliações psicossociais e aspectos
Sul % (n) 77,4 (n = 48) 70, 6 (n = 12) 75,9 (n = 60) indispensáveis para realizar avaliações psicossociais).
Sudeste % (n) 16,1 (n = 10) 29,4 (n = 5) 19 (n = 15) O levantamento foi dividido em duas formas (uma para mé-
Centro-Oeste dicos, outra para psicólogos), contendo questões semelhantes. As
4,8 (n = 3) 0 3,8 (n = 3)
% (n) duas formas diferenciaram-se somente nas perguntas sobre tes-
Nordeste % (n) 1 (n = 1) 0 1,3 ( n = 1) tes psicológicos de uso exclusivo aos psicólogos(as), extraídos da
Vínculo empregatício lista do Sistema de Avaliação de Teste Psicológico-SATEPSI. As
Estágio (n) 0 1 1 perguntas sobre fatores relacionados ao Estresse no Trabalho fo-
Carteira ram respondidos pelos profissionais que relataram avaliar fatores
Assinada - CLT 19 10 29 relacionados à organização do trabalho, estresse e demais fatores
a (n) ocupacionais como Dupla Jornada e Turno de trabalho em sua
Autônomo (n) 47 7 54 metodologia de avaliação.
Bolsa estudantil
3 1 4
(n) Procedimentos de Coleta de Dados e Cuidados Éticos
Aposentado (n) 3 0 3
Servidor público A pesquisa foi divulgada por redes sociais dos pesquisado-
4 2 6
(n) res e em grupos de profissionais de Psicologia e Medicina (Face-
Nota. a = Celetista, Cart book, Linkedin), além de em grupos de Whatsapp de Psicólogos
Medicina. e Médicos, durante o período de janeiro a março de 2019. Foram
Quanto aos Psicólogos (Psic.): 64,5% possuem pós-gradu- enviados, também, e-mails para as associações profissionais e lo-
ação (N = 40), 22,6 % estão com especialização em andamento, cais de formação que ministram cursos de Medicina do Trabalho,
19,4% possuem mestrado, 1,6% têm doutorado, 3,2% fizeram divulgando e esclarecendo os objetivos do levantamento on-line.
residência multiprofissional e 9,5% apenas completaram a gradu- O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Ins-
ação. Quanto à especialidade dos pós-graduados Psic., esses pro- tituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
fissionais declararam: especialistas em avaliação psicológica (n = (CAAE nº 03412118.8.0000.5334). Todos participaram de forma
8), ter MBA/Pós-Graduação em Psicologia organizacional, RH e voluntária, assinando o Termo de Consentimento Livre e Esclare-
Gestão de pessoas (n = 8); ter MBA/Pós-Graduação em Psico- cido (TCLE) disponibilizado no Survey.
logia Clínica em diversas abordagens (n = 8); e os demais, MBA/
Pós-Graduação em outras áreas não diretamente relacionadas ao Procedimentos de Análise dos Dados
trabalho (Psicologia da Saúde, Judiciário, Neuropsicologia, Trân-
sito, etc.). As variáveis foram analisadas com o uso do software SPSS 18
A maioria dos Med participantes trabalham na Região Sul (nRS utilizando alternativas não paramétricas para comparação de da-
= 12) e Sudeste (nSP = 7 SP). Resultado semelhante foi obtido en- dos. Para comparação das diferenças, foi utilizado o teste U de
tre os psicólogos, onde a maioria deles concentra-se na Região Sul Mann-Whitney. Testes exatos de Fischer foram utilizados para
(nRS = 42; nSC = 6, nPR = 1) , 15,9% na região Sudeste (nSP = 5; nRJ = associação quando o critério para o qui-quadrado-χ² não foi ob-
3; nMG = 8 1 , nES ), 4,8% no Centro-Oeste (nGO = 2; nDF = 1) e um servado (n < 5). As informações qualitativas das questões abertas
na região Nordeste (nSE= 1). Em relação à amostra de Psicólogos foram codificadas através da análise de conteúdo estruturada (Sal-
no Rio Grande do Sul, 46,2% trabalham na capital e/ou região danha, 2013) com o uso do software N-Vivo 12. Para fins de análise,
metropolitana. Por fim, mais da metade dos profissionais trabalha foi utilizada estrutura de categorias construídas a posteriori, com
como autônomo (ntotal = 54%). Na sequência, outros trabalham base nas semelhanças semânticas entre as respostas dos partici-
sob de vínculo Celetista -CLT. Apenas um Med estava em estágio pantes.
da residência.
Resultados
Instrumentos
Os locais mais frequentes onde são realizadas avaliações psi-
Foram aplicados dois instrumentos, um questionário com in- cossociais são empresas terceirizadas de saúde e segurança do tra-
formações sociodemográficas e o do levantamento . Trata-se de balho (59%), e na própria empresa que contrata trabalhadores que
um questionário on-line na plataforma SurveyMonkey elaborado trabalham em altura e em espaços confinados (43%). Alguns par-
a partir das revisões de literatura (Jacinto & Tolfo, 2017, 2018; Ro- ticipantes trabalham em consultorias de recursos humanos (nPsic =
drigues & Faiad, 2019; Vazquez et al., 2018) e guidelines (European 12) e em serviço eventual/ In company (nPsic = 15, nMed = 2). Salien-
Agency for Safety and Health at Work- EU-OSHA, 2012; Natio- ta-se também profissionais que realizam suas avaliações em apenas
nal Institute of Safety and Health at Work [INSHT- Spain], 2015; um local (N = 45), mas 42,3% atuam em dois ou mais lugares.
Vasconcelos, V. D., & Trentini, C. M. (2021). 1359

Figura 1. Tipo de atividades dos trabalhadores avaliados. Nota. Manut. = Manutenção em geral; Constr. = Construção Civil; LT = Linha Transmissões e Postes Elétricos; ALP = Alpinismo
Industrial/ Acesso com corda, Outros = Celulose, Empresa de Exportação, Pintura, Manutenção de máquinas e Portos

Quanto ao tipo de atividades a que os avaliados estão sub- ce. Ao se considerar a formação profissional, 62,5 % dos Med e
metidos (Figura 1), é observado que a maioria dos trabalhadores 63% dos Psi afirmaram conhecer as NRs.
atua em serviços de manutenção geral, construção civil, ar-condi-
cionado, caminhões, linhas de transmissão e alpinismo industrial. Avaliação Psicossocial, Modelos Teóricos, Métodos e Variá-
Alguns desses trabalhos podem envolver tanto trabalho em altura veis Investigadas
quanto em espaço confinado, porém, atividades que acontecem
exclusivamente em espaços confinados são menos relatadas (p. A definição operacional de avaliação psicossocial usada pelos
ex.: caixa d’agua, silos e elevadores). profissionais foi disponibilizada em uma pergunta aberta. Algu-
Quanto ao grau de escolaridade dos trabalhadores avaliados mas definições de APT são apresentadas a seguir:
para trabalhar em altura e em espaços confinados, observaram-se
proporções equivalentes de pessoas com até o ensino fundamental Avaliação clínica (...) com objetivo de mensurar riscos de que-
completo (45,6%) e de funcionários com ensino médio completo/ da/síncope/mal estar/ ou similares estando desempenhando
incompleto (45,6%). A maior parte das avaliações é com profissio- trabalho em altura (acima de 2m), espaço confinados, ou ou-
nais de ensino médio incompleto (27,8%); em seguida, com aque- tras atividades especiais que coloquem em risco a integridade
les que realizaram até sete anos de estudo (21,5%). de funcionário e de terceiros (Med 17, Sexo Masculino).
Os Psicólogos descreveram com maior frequência que senti-
ram necessidade de buscar conhecimentos por pós-graduação em É uma avaliação da Saúde mental do trabalhador com
comparação com os médicos (χ2 = 16,861, p < 0,001, Φ = -0,487). suas relações ocupacionais, interpessoais, e consigo pró-
Seis médicos relataram necessidade de buscar conhecimento, mas prio. A fim de orientar um acompanhamento se neces-
apenas três especificaram onde buscaram: “procurou de forma sário e prevenir riscos à saúde (Med 5, Sexo feminino).
autônoma” (Médico 8, 28 anos, RS ); “fez curso em congres-
so de 3- 4h” (Médico 15, 47 anos, R) ou que “não encontrou” Avaliação corresponde a obter informações sobre
(Médica.16, 54 anos, RS). Já em relação aos Psic. que procuraram estilo de vida, tomada de decisão, higiene do sono,
conhecimentos além da graduação, três relataram ter estudado de mensuração de construtos de personalidade, aten-
forma autônoma, por não existir cursos quando começaram; e 21 ção, memória e entre outros conforme a função
procuraram cursos de capacitação e apenas dois psicólogos tive- (Psic. 8, sexo feminino).
ram contato com avaliação psicossocial na graduação.
Foi observado que 47,9% dos profissionais de saúde traba-
lham com avaliação psicossocial no intervalo de um a um a três
anos; 32,4% trabalham entre 3 a 6 anos; e 16,9% atuam há 6 anos
ou mais com o tema. Quanto à compreensão sobre as NRs, dos
resultados válidos: 63,9% do total de participantes declararam que
tinham pleno conhecimento da legislação, 37,1% relatam que co-
nhecem parcialmente, e um profissional declarou que não conhe-
1360 Revista Psicologia: Organizações & Trabalho, 21(1), 1355-1366.

Uma avaliação que leve em conta três dimen- suas avaliações (n = 22, U = 941, p = 0,001, r = 0,37).
sões de fatores psicossociais como preconiza a Quanto à metodologia empregada na avaliação psicossocial
Organização Internacional do Trabalho (1- ca- pelos Med, os métodos mais usados são entrevista aberta (78,6%),
racterísticas individuais do trabalhador, 2- ca- checklists/protocolo estruturado criados pela empresa que tra-
racterísticas do trabalho em si e seu ambiente, balham (50%), e o exame do estado mental (42,9%). Já os Psic.
3- aspectos de vida social externos à organiza- costumam usar Entrevistas Semiestruturadas (73,1%) e estrutu-
ção (Psic. 29, Sexo Masculino). radas (38,5%) criadas por eles mesmos; entrevista aberta (38,5%),
. exame do estado mental (38,5%); e utilizam essas técnicas em
De modo geral, Médicos citaram de maneira mais frequen- conjunto com testes psicométricos (90,4%), projetivos (65,4%) e
te que APT são avaliações que investigam: transtornos e saúde expressivos (61,5%).
mental em um contexto social (n = 5); avaliação de caraterísticas Dois médicos e sete psicólogos relataram recorrer, também,
psicológicas (n = 4) e aspectos comportamentais relacionados à a instrumentos não exclusivos do psicólogo. Dois psicólogos ain-
segurança e à vida (n = 3), seguidas de questões como avaliação de da mencionam o emprego da técnica de grupo focal como parte
adaptabilidade, triagem ou pelo que diz a lei. Os Psic. arguiram que de suas avaliações psicossociais. Por fim, o teste exato de Fischer
a APT é uma ferramenta para avaliar aptidão para o trabalho (n indicou que médicos costumam utilizar mais checklists elaborados
= 13); avaliação de características psicológicas e condições cogni- pelas empresas nas quais trabalham (p = 0,002). Em contrapartida,
tivas, comportamentais e emocionais para trabalhar em risco (n = psicólogos relatam preferência por criar seus próprios roteiros de
12), mensurar situações de saúde mental e transtornos mentais (n entrevista (p < 0,01).
= 10) e a interação entre fatores individuais e respectivo contexto Ambos os profissionais direcionam a avaliação psicossocial
social (n = 7). (Ver Figura 2) para avaliar uso de álcool e outras drogas (N =
Considerando os modelos teóricos mais citados na literatu- 97%), o uso de medicações e fobias (N = 87,9%), a ocorrência
ra acadêmica (Jacinto & Tolfo, 2018; Rodrigues & Faiad, 2019; de acidentes de trabalho (N = 84,80%), a qualidade do sono (N =
Vazquez et al., 2018), 33% do total de profissionais declararam 83%), casos de depressão (N = 81,8%) e de estresse no trabalho
não utilizar uma teoria específica na avaliação psicossocial. Dos (N = 81,80%). Em relação aos fatores psicossociais no trabalho ,
que declararam utilizar modelos teóricos, foi observada a utiliza- 59,1% do total de participantes relatou avaliar informações sobre
ção de modelos nosológicos, como a Classificação Internacional organização do trabalho e metade dos participantes avaliam o tur-
das Doenças CID-10 e o Manual de Diagnóstico Estatísticos dos no em que o trabalhador atua. Entretanto, verificou-se que fatores
Transtornos Mentais- DSM-5 (observados em 42,4% dos parti- como dupla jornada, pausas e intervalos são menos avaliados pe-
cipantes); da psicodinâmica do trabalho (30,3%), da ergonomia los profissionais de saúde (27,3%).
(16,7%) e da clínica da atividade (10,6%). Destaca-se que esses são Os profissionais costumam investigar essas variáveis geral-
mais utilizados do que os modelos de estresse no trabalho, como mente por questões abertas (N = 39), por perguntas dicotômicas
Stress Suport Model -SWS , JDC/DCS e ERI (13%). Esses re- (27,3%) e através do uso de escalas Likert (13,5%). Foi observado

Tabela 2
Dados sobre o uso e conhecimento de modelos teóricos em avaliações psicossociais
Psicólogo(a) Médico(a) Total
Formação
Utilizam n (%) Conhecem n (%) Utilizam n (%) Conhecem n (%) Utilizam n (%) Conhecem n (%)
Não uso/ Não conhecem 6 (42,9) 5 (35,7) 16 (30,8) 11 (21,2) 22 (33,3) 16 (24,2)
Modelos Nosológicosa 5 (35,7) 5 (35,7) 23 (44,2) 34 (65,4) 28 (42,4) 39 (59,1)
SWSb 0 3 (21,4) 7 (13,5) 10 (19,2) 7 (10,6) 13 (19,7)
ERI c
0 0 0 2 (3,8) 0 2 (3)
DCSd 0 1 (7,1) 2 (3,8) 5 (9,6) 2 (3) 6 (9,1)
JD-Re 0 0 0 3(5,8) 0 3 (4,5)
Psicodinâmica do Trabalho 3 (21,4) 1 (7,1) 17 (32,7) 27 (51,9) 20 (30,3) 28 (42,4)
Ergonomia 2 (14,3) 2 (14,3) 9 (17,3) 19 (36,5) 11 (16,7) 21 (31,8)
Ergologia 0 0 0 2(3,8) 0 2(3)
Clínica da Atividade 3 (21,4) 4 (28,6) 4 (7,7) 7 (13,5) 7 (10,6) 11(16,7)
Outrof 2 (14,3) 2 (14,3) 7 (13,5) 2 (3,8) 9 (13,6) 4 (6,1)
Nota. a = CID 10, DSM5, etc... b = Stress/Support Model- Modelo de estresse apoio e Saúde mental; c = Effort Reward Imbalance- Desequilíbrio Esforço Recompensa; d = Job Demand-Con-
trol- Support- Modelo de Controle, Demanda e Suporte; e = Job Demand-resources model; f = Health behavior model (n = 1), Critérios previdenciários (n = 1), Metodologia desenvolvida
por Sebben (n = 1), avaliação psicológica e testes de triagem (n =5), um profissional citou que “nenhum deles se aplicam às demandas da avaliação psicossocial”.

sultados foram igualmente observados analisando o conhecimen- associação significativa entre questões abertas e maior compre-
to que os profissionais têm sobre modelos teóricos do trabalho, ensão dos trabalhadores (f = 11,130, p = 0,003, Φ = 0,416), indi-
independentemente de serem aproveitados por eles ou não. Os cando que profissionais de saúde que utilizam preferencialmente
modelos mais conhecidos foram: a Psicodinâmica, a Ergonomia e questões abertas acreditam que os funcionários avaliados enten-
a Clínica da atividade. Esses foram citados com maior frequência, dem melhor por essa metodologia (Ver Figura 3).
em comparação com SWS, DCS, ERI e JD-R (Tabela 2). Por fim, alguns participantes compreendem que as dificulda-
Não foram encontradas associações significativas entre apli- des na compreensão das perguntas das avaliações por parte dos
cação ou não utilização de modelos teóricos nas avalições por ca- trabalhadores avaliados se devem à baixa escolaridade; à baixa ha-
tegoria profissional (χ² = 0,658, p = 0,300). Aqueles profissionais bilidade com a língua portuguesa.; às dificuldades de compreensão
que embasam sua atuação em pelo menos um modelo teórico (n = de termos técnicos (p. ex.: “fobia”); à dificuldade de compreender
58) relatam maior conhecimento sobre modelos teóricos em APT, instrumentos, em geral; ao enredamento no tocante a responder
em comparação com aqueles que não aplicam modelo algum em aspectos subjetivos internos e pelo motivo de que não há instru-
Vasconcelos, V. D., & Trentini, C. M. (2021). 1361

Figura 2. Radar de dispersão das variáveis avaliadas pelos participantes

Figura 3. Relação entre o modo de avaliação e a compreensão dos trabalhadores.


1362 Revista Psicologia: Organizações & Trabalho, 21(1), 1355-1366.

mentos apropriados para o estrato profissional avaliado. que a Mediana de tempo disponível foi de 90 minutos (n válido =
40, M = 96,5 DP = 61,29; 10-240).
Uso de Instrumentos na Avaliação Psicossocial Os principais motivos para inaptidão ou restrição para o tra-
balho em altura alegados pelos médicos foram: presença de medo
Quando perguntado aos profissionais a respeito do uso dos (n = 7; presença de transtornos mentais (n = 4); uso de substân-
instrumentos mais citados nos artigos (Jacinto & Tolfo, 2018; cias ilícitas (n = 1); peso (n = 1); medicação (n = 1); condições
Rodrigues & Faiad, 2018), foi observado que 11 médicos e 19 não esclarecidas na entrevista (n = 1); e descontentamento com
psicólogos (N válido = 54) declararam não utilizar nenhum tes- a tarefa (n = 1). Os Psic. relataram com mais frequência estabele-
te para condições organizacionais. Os instrumentos para fatores cer inaptidão para o trabalho em altura por conta de dificuldades
de estresse ou transtornos mentais mais utilizados foram a escala observadas em testes de habilidades específicas (atenção baixa,
EVENT (nPsic = 16), o ISSL (nPsic = 12), e o SRQ-20 (nMed = 2, raciocínio) (n = 17); depressão (n = 16); fobia e uso de álcool e
nPsic= 5). outras drogas (n = 11); e por conta de instabilidade emocional e
Os menos utilizados são o ITRA, o COPSOQ, o JCQ, SWS agressividade (n = 7). Houve três menções pelos psicólogos sobre
e o JSS (3-1 menções). Um profissional citou o Working Conditions a preocupação com estresse e a dificuldade de coping observadas
and Control Questionnaire - WOCCQ (Rodrigues, 2018) e o Nordic no trabalhador avaliado.
Musculoskeletal Questionnaire - medida critério (Mesquita, Ribeiro, Os indicadores de estresse mais relatados pelos trabalhadores
& Moreira, 2010), que são instrumentos adaptados utilizados em avaliados, de acordo com os profissionais de saúde, foram difi-
pesquisa. Outros instrumentos citados são o Alcohol Use Disorders culdades com a carga e ritmo de trabalho, horário (conteúdo do
Identification Test (AUDIT), instrumento de rastreamento sobre uso trabalho), cultura organizacional e relações interpessoais (contex-
de álcool, e o Mini-exame do estado mental (N = 5). to do trabalho). Nesse cenário, os excessos de demandas laborais,
Os instrumentos mais conhecidos, independentemente se a pressão por prazos, trabalho em turnos adversos e problemas
usados ou não, foram o ISSL (nPsic= 27), a EVENT (nPsic = 23) e o nas relações interpessoais no trabalho são sinalizados pelos avalia-
SRQ-20 (nMed = 4, nPsic = 8). Já os menos lembrados foram instru- dores como os mais comuns observados. Pontos comuns a esses
mentos baseados na psicodinâmica do trabalho (ITRA) com seis foram observados em estudos em outras culturas em que os prin-
ocorrências, seguidos dos instrumentos de estresse do trabalho cipais riscos eram: trabalhar acima de 40 horas semanais, trabalho
(SWS, JCQ, JSS, COPSOQ) com 4-6 respostas. em turnos (noturno), horas extras não remuneradas, métodos de
Quanto ao uso de testes pelos psicólogos, houve frequência trabalho não participativos, baixa autonomia, impossibilidade de
maior de testes de atenção, em geral. Em sequência, o teste Beta- progressão na carreira e cargas de trabalho excessiva. Esses riscos
-III e o G36 foram os mais citados entre os testes de raciocínio. predisseram menores índices de satisfação laboral (Fernandes &
Quanto à personalidade, o teste psicométrico Inventario Fatorial Pereira, 2016)
de Personalidade -II (IFP-2) foi o mais usado, ainda que em menor Metade dos Med (50%) e boa parte dos Psic. (46,4%) ale-
proporção pelos psicólogos da amostra (Tabela 3). garam dificuldades na realização de avaliações psicossociais. Os
A maioria dos psicólogos relatou que utiliza esses instrumen- Med comentam que suas dificuldades são em relação à técnica
tos em função do que o teste avalia, sem especificar o motivo: diagnóstica de patologias de saúde mental (n = 1), entendimento
atenção (n = 24), raciocínio lógico (n = 9), personalidade (n = 12), do motivo do teste (n =1) e o teor das questões. As dificuldades
ansiedade, estresse, depressão e ansiedade. Cinco psicólogos argu- dos Psic. Relatadas estão relacionadas ao início da legislação e sua
mentaram, de maneiras diferentes, que usam testes psicológicos obrigatoriedade sem orientação c sobre como deve ser a prática
para “perceber a forma como o indivíduo se organiza logicamente de APT , dificuldade de entendimento do motivo do teste e pres-
para o trabalho de risco e como focaliza sua atenção para essas sões pelos empregadores para que seja atestada aptidão dos fun-
demandas...” (Psic. 6) , para avaliar “perfil psicológico”(Psic. 9) , cionários. Apesar desses fatores, 76,5% dos médicos e 59,7% dos
para mensurar “Conscienciosidade, Autocontrole, Otimismo, So- Psicólogos não precisaram se reportar ao Conselho profissional
cialização - dimensões indicadas na literatura como preditoras de ou Ministério do Trabalho sobre o seu procedimento de atuação.
comportamento seguro” (Psic. 29) , “capacidade para resolução Por fim, 83% dos Med e 87,8% dos Psic. consideram necessá-
de problemas ou que usam instrumentos cognitivos e expressivos rio o desenvolvimento de instrumentos específicos para Avaliação
para verificar a “forma como o indivíduo se organiza logicamente Psicossocial . Sete participantes acreditam que seja interessante
para o trabalho de risco e como focaliza sua atenção para essas criar instrumentos para APT, mas pouco útil, em decorrência da
demandas” (Psic. 23). existência de outros testes disponíveis; nove (incluindo três Med)
Na categoria de testes projetivos e expressivos, o instrumento preferem testes projetivos/expressivos dada a limitação de testes
mais utilizado foi o teste palográfico, seguido do Pirâmides colo- de auto relato em relação à simulação das respostas. Para os parti-
ridades de Pfister e do teste casa-árvore-pessoa- HTP (Tabela 3). cipantes, reiterando dados previamente levantados, essas possíveis
Aqueles que usam o teste palográfico afirmam que o utilizam para medidas devem conter informações sobre fobia, sinais e tratamen-
avaliação de personalidade, e também, buscando traços psicopato- tos de transtornos mentais, impulsividade, agressividade, controle,
lógicos de ajustamento, como controle emocional; impulsividade e suporte social relacionados ao estresse e habilidades de coping; mas
agressividade em pessoas de baixo letramento. Sinais de ansiedade, que também sejam compreensíveis e não passíveis de desejabilida-
indicativos de fobia, compulsões, indicadores de uso de álcool e de social por parte dos respondentes.
drogas, e respeito a normas e regras foram as variáveis menos
relatadas. Discussão

Experiência Profissional Boa parte dos Psic. e Med. participantes da pesquisa tem
compreendido a APT como uma técnica de rastreamento de
Considerando todas as variáveis contidas em uma avaliação transtornos mentais ou de análise de aptidão para o trabalho. As-
psicossocial, foi verificado que Med (n válido = 13) costumam pectos cognitivos como atenção, personalidade e raciocínio lógico
realizar avaliações no intervalo de cinco a 45 minutos (Mdn = 10, têm sido o foco dos psicólogos, usando instrumentos ainda sem
M = 23,46, DP = 33,50). Este intervalo é maior entre os Psic., em validade preditiva para o contexto utilizado, visto que há carência
Vasconcelos, V. D., & Trentini, C. M. (2021). 1363

Tabela 3
Uso de instrumentos psicológicos
Categoria dos
Instrumentos Frequência (n = 45)
Instrumentos
TEACO-FF - Atenção Concentrada 31,65%
TEADI - Atenção Dividida 31,65%
TEALT - Atenção Alternada 29,11%
BPA - Atenção concentrada, dividida e alternada 24,05%
AC - Atenção Concentrada 18,99%
Atenção AC-15 - Atenção Concentrada 12,66%
BGFM1 - Atenção difusa 5,06%
Testes de Atenção Dividida e Sustentada 6,33%
BFM-4 - Atenção concentrada 3,80%
TAS - Teste de Atenção Seletiva 2,53%
Teste de Trilhas Coloridas, BGFM2 (atenção concentrada) e Medida de prontidão mental* 1,27%
BETA-3 - Raciocínio Não verbal 16,46%
G-36 - Raciocínio Não verbal 10,13%
R1 Forma A - Raciocínio Não verbal Alfabetizados 6,33%
G-38 - Raciocínio Não verbal baixa escolaridade 5,06%
Raciocínio Lógico R1- Forma B Raciocínio Não verbal baixa escolaridade 3,80%
e competências
relacionadas BFM-3 - Raciocínio Lógico 2,53%
Neupsilin - Bateria neuropsicológica 2,53%
HTM - Testes de Habilidade para o Trabalho Mental - Raciocínio Verbal, Abstrato e Numérico 3,80%
Bateria TSP - Raciocínio e Memória 1,27%
Raven (todas as versões)*- Inteligência 1,27%
IFP-II - Inventário Fatorial de Personalidade 11,39%
BFP - Bateria Fatorial de Personalidade 5,06%
EPD - Escala de Pensamentos Depressivos 3,80%
QUATI- Escala tipológica de personalidade 3,80%
EsAvI-A e EsAvI-B - Avaliação de Impulsividade 6,33%
Staxi - Expresão da Raiva (traço estado) 6,33%
EATA - Tendência à agressividade 2,53%
Escalas de
personalidade, EFEx- e EFS - Escalas fatoriais de Extroversão e Socialização* 1,27%
agressividade, raiva e IHS-2 - Inventário de Habilidades Sociais 2,53%
comportamento
Humanguide 1,27%
Neo FFi-R-I - Escala Fatorial reduzida - Cinco Grandes Fatores 1,27%
Neo pI-r - Escala Cinco grandes fatores 1,27%
Método de Avaliação de Pessoas (MAPA) 1,27%
MBTI- 1,27%
EBADEP-A Escala Baptista de Depressão 1,27%
Escala de Suporte Laboral (ESUL) 1,27%
Figuras complexas de Rrey 3,80%
MVR - Memória visual de rostos 3,80%
Memória TEPIC-M - Teste Pictórico de Memória 3,80%
RAVLT- 2,53%
BGFM4 - Memória de reconhecimento, MVT- memória visual de trânsito e Teste dos cinco Dígitos* 1,27%
Palográfico 88,4%
Pfister 30,2%
Projetivos e
HTP 23,3%
Expressivos**
Zulliger - Z teste 4,7%
Rorscach Exner 2,3%
Nota. Instrumentos disponíveis no Sistema de Avaliação de Testes Psicológicos do Conselho federal de Psicologia (SATEPSI). 3 instrumentos não foram inclusos por serem testes
considerados desfavoráveis na data do levantamento * São observadas em um dos casos. ** Psicólogos que relataram usar testes projetivos e expressivos (n = 43)
de pesquisas com trabalhadores atuantes em altura/espaços confi- dimensões que envolvem comportamento seguro podem ser in-
nados (Rodrigues & Faiad, 2018). dicativos importantes como critérios para novos instrumentos ou
Resultados semelhantes são observados pelos Med, onde as para a APT.
variáveis avaliadas mais importantes são transtornos mentais e fo- Diante dos resultados do levantamento, é verificado que há
bias. Apesar disso, os participantes apontaram que fatores como dificuldade em parte dos participantes na compreensão do con-
agressividade, impulsividade, uso de substâncias, fobia, e outras ceito “Psicossocial”, esse definido como interação dinâmica en-
1364 Revista Psicologia: Organizações & Trabalho, 21(1), 1355-1366.

tre o trabalho e o indivíduo (EU-OSHA, 2012). Os resultados da estresse no trabalho, de perspectivas psicodinâmicas ou de ava-
pesquisa sugerem que há ênfase maior ao fenômeno psicológico liações de fatores de interação entre o indivíduo e seu ambiente
individual (psicodiagnóstico) em detrimento de fatores laborais, laboral. Isso porque, de um modo geral, há maior ênfase na avalia-
como se esse fosse dissociado da dimensão social (Paiva, 2013) ção de vulnerabilidades pessoais em detrimento de fatores organi-
do trabalho. Em última análise, a APT no Brasil, ainda, tem maior zacionais e da natureza da atividade. Ainda que essa tenha sido a
influência do modelo asilar e biológico do que de uma abordagem maneira possível diante da falta de clareza e especificação do con-
psicossocial (Oliveira & Caldana, 2016). ceito “psicossocial”, privilegiar fatores de risco individual esbarra
Seguindo as pistas de Costa-Rosa (2000), adotar um para- no que tem defendido a Organização Internacional do Trabalho
digma psicossocial implica em contrapor uma lógica centrada no e a Base legislativa das NRs (Brasil, 2013; ILO & WHO, 1984).
controle de sintomas e comportamentos, na passividade do tra-
balhador avaliado e no controle dos riscos. O modo psicossocial Limitações
não prescinde do diagnóstico ou da análise de fatores individuais,
mas privilegia a compreensão do sofrimento da pessoa real, do Este estudo, por sua característica descritiva e exploratória,
contexto de vida e de suas necessidades concretas psicológicas e apresenta limitações em relação às inferências das práticas de ava-
subjetivas (Costa, 2000; Oliveira & Caldana, 2016). liação psicossocial brasileira. Como os dados foram extraídos de
Essa ideia de modo psicossocial (Costa-Rosa, 2000) relacio- uma parcela pequena de médicos e psicólogos, a maioria deles atu-
na-se melhor com o objetivo internacional proposto pela ONU antes no Sul e Sudeste brasileiro, os dados devem ser considerados
sobre aa avaliação e eliminação dos fatores negativos no trabalho com cautela, não sendo possível generalizá-los.
(ILO & WHO, 1984). Facilita, também, prescindir de um modelo O método escolhido neste delineamento tratou dados
exclusivamente matemático e probabilístico da análise de risco e quantitativos e qualitativos de formas separadas (um utilizando
considerar a perspectiva qualitativa de nocividade; ou mesmo en- análise descritiva e inferencial, a outra por análise de conteúdo
fatizar aspectos psicossociais protetivos no trabalho (Bosi, 2015; a posteriori). Alguns autores argumentam que não há limitações
Efrom et al., 2020). metodológicas (embora existam ontológicas historicamente
Apesar da literatura acadêmica apontar para maior uso de situadas) no uso de técnicas qualitativas e quantitativas na mesma
modelos clássicos de estresse no trabalho na APT (Jacinto & Tol- pesquisa, contanto que o tipo de pergunta do estudo necessite de
fo, 2018; Rodrigues & Faiad, 2019; Vazquez et al., 2018), variáveis uma metodologia multimodal (Günther, 2006; Serapioni, 2000),.
relacionadas ao uso e conhecimento destas técnicas foram obser- Acredita-se que é o caso dos aspectos psicossociais do trabalho,
vados em uma minoria dos participantes. Existe, entretanto, maior por estar inseridas no contexto de ciências hard e de ciências soft.
conhecimento de modelos teóricos franceses, como a psicodinâ- Na parte quantitativa da pesquisa, testes de estatística inferen-
mica e ergonomia, diante de sua influência na formação de Med. e cial estão prejudicados pelo baixo número de participantes e pela
Psic. brasileiros (Codo, Soratto, & Menezes, 2004). medida categórica/qualitativa das variáveis investigadas.
Foi observada uma heterogeneidade de técnicas, que usu- Optou-se por uma alternativa de demonstre a frequência do
fruem de protocolos próprios dos profissionais ou das empresas, que os participantes relataram avaliar quanto à definição operacio-
ainda não testados empiricamente. A entrevista aberta foi apon- nal, variáveis investigadas e instrumentos utilizados.
tada como a técnica melhor compreendida pelos trabalhadores. Alternativas qualitativas de entrevista com os profissionais,
Essa escolha possibilita acessar a dimensão qualitativa dos possí- bem como análise de dados secundários referentes a essas ava-
veis aspectos nocivos do trabalho. liações psicossociais podem incrementar os resultados obtidos e
Nesse estudo, grande parte dos Med. não relatou utilizar ins- ampliar o escopo daquilo que foi investigado neste levantamento.
trumentos padronizados na sua prática clínica. Apenas dois médi-
cos utilizaram o SRQ-20. Essa diferença entre os Psic. e os Med. Considerações Finais
se deve, em parte, à característica da prática de avaliação psicológi-
ca e sua associação com instrumentos de medida, bem como boa Em síntese, os resultados apontaram que profissionais de
parte das variáveis investigadas como atenção e personalidade são ambas as áreas possuem pouco contato com artigos, modelos e
de uso exclusivo aos profissionais de psicologia. instrumentos de medida de avaliação psicossocial. Acredita-se
Mesmo assim, considerando características do uso de ins- que isso se dá em decorrência de ser uma prática emergente, não
trumentos entre os Psic., parte dos participantes formados em sendo ensinada durante a formação profissional. Outros estudos
psicologia (45%) não aplica instrumentos para avaliação de fato- apontaram a necessidade de evidências de validade das técnicas e
res laborais e estresse. Tal situação pode ser explicada pela baixa instrumentos disponíveis para o contexto de trabalho e de vali-
disponibilidade de testes específicos para essa avaliação (Lima et dade preditiva dos instrumentos atualmente utilizados (Jacinto &
al., 2019; Rodrigues & Faiad, 2018) como também pela recente Tolfo, 2018; Metzler et al., 2019; Rodrigues & Faiad, 2019).
autorização do Conselho Federal de Psicologia (2018) do uso de Dados relativos a essa pesquisa sinalizaram que a formação
instrumentos não psicológicos com indícios de validade e fidedig- acadêmica e de pós-graduação, no que tange à área de avaliação
nidade comprovados pela literatura. de riscos ocupacionais, necessitam de maiores incentivos quanto
Apesar de estarem entre os mais citados na literatura (Jacinto a novos estudos e aproximação destes à realidade dos trabalhado-
& Tolfo, 2018), instrumentos como ITRA, JSS e JCQ não foram res. Dada a abrangência do termo “psicossocial”, os profissionais
conhecidos ou aplicados pela maioria dos profissionais. Escalas têm optado por técnicas de rastreamento de transtornos mentais
como a EVENT e o ISSL foram as mais lembradas e utilizadas pe- e potenciais de risco individual em detrimento da interação entre
los psicólogos, resultado semelhante óbito por Rodrigues e Faiad o trabalhador e as dimensões de sua atividade. Embora atinja par-
(2018). É possível que esses resultados se devem ao uso comercial cialmente os critérios legislativos, deixam de investigar caracterís-
e exclusivo dos Psic das escalas a EVENT e o ISSL e de que os ticas do trabalho de uma maneira padronizada.
instrumentos de avaliação de estresse no trabalho são mais utiliza- Acredita-se que, anterior à prática e demanda dos profissio-
dos em pesquisas. nais pela construção de um instrumento, é necessária uma com-
Diferente da literatura e do que preconiza a legislação, poucos preensão dinâmica e mais clara do que são aspectos psicossociais
médicos e psicólogos aproximaram-se do conceito de FRPT, de do trabalho. Isso pode ser feito tanto por estratégias quantitativas
Vasconcelos, V. D., & Trentini, C. M. (2021). 1365

com modelos testados empiricamente que considerem a experiên- Jacinto, A., & Tolfo, S. da R. (2017). Riscos Psicossociais no Trabalho: Conceitos,
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Informações sobre os autores:

Valmir Dorn Vasconcelos


Instituto de Psicologia, Universidade Federal do Rio Grande do
Sul
Rua Ramiro Barcelos 2600, Sala 225, Floresta
90035-003 Porto Alegre, RS, Brasil
E-mail: valmirdornv@gmail.com

Clarissa Marceli Trentini


E-mail: clarissatrentini@terra.com.br
artigo original Escala Hamilton: estudo das características
psicométricas em uma amostra do sul do Brasil*
Hamilton Scale: study of the psychometric characteristics
in a sample from Southern Brazil*

Manoela Ávila Freire1, Vera Lúcia Marques de Figueiredo1, Alina Gomide2, Karen Jansen1,
Ricardo Azevedo da Silva1, Pedro Vieira da Silva Magalhães3, Flávio Pereira Kapczinski3

RESUMO

Objetivo: Investigar as características psicométricas de uma versão traduzida da escala, pro-


pondo uma Versão Revisada que atenda aos critérios de adaptação transcultural para o con-
texto brasileiro. Métodos: Este estudo incluiu 231 sujeitos – deprimidos (45,5%), bipolares
(7,8%) e saudáveis (46,7%) – que participaram de uma pesquisa epidemiológica no sul do
Brasil. A avaliação de transtornos mentais foi realizada por meio da Clinical Interview for DSM-IV
(SCID) e uma versão traduzida da Escala de Avaliação de Depressão de Hamilton (HAM-D),
que habitualmente vem sendo utilizada no país sem estudos de adaptação. Resultados:
Identificou-se o ponto de corte (9 pontos) para discriminar a presença ou não de sintomas
de depressão pela análise da curva ROC, resultando em uma sensibilidade e especificidade
de 90 e 91%, respectivamente. A validade interna foi investigada pela análise fatorial e consis-
tência dos itens. Dos 17 itens originais, apenas o item que avalia a “consciência do transtorno”
não apresentou carga fatorial satisfatória para avaliar depressão geral e foi eliminado; os 16
restantes agruparam-se em cinco dimensões, denominadas: Humor deprimido, Anorexia, In-
sônia, Somatização e Ansiedade, as quais, com exceção da última, mostraram homogeneida-
Palavras-chave de nos seus construtos (coeficientes alfa entre 0,66 e 0,78). Na análise de conteúdo dos itens,
Depressão, estudos de cinco especialistas sugeriram alterações redacionais em sete itens. Conclusão: O estudo
validação, sensibilidade, determina um ponto de corte diferente do original e evidencia características psicométricas
especificidade. favoráveis para a utilização da escala no Brasil.

ABSTRACT

Objective: To investigate the psychometric characteristics of a translated version of the


scale, proposing a reviewed version in order to attend the transcultural adaptation criteria.
Methods: This study included 231 subjects – depressed (45.5%), bipolar (7.8%), and healthy
(46.7%) – who participated of an epidemiological research in southern Brazil. The evaluation
of mental disorders was made through Clinical Interview for DSM-IV (SCID) and a translated
version of the Hamilton Scale (HAM-D), usually utilized in Brazil without adaptation studies.
Results: The ROC curve analysis identified the cutoff (9 points) to discriminate the presence
or absence of depression, resulting in a sensibility and specificity of 90 and 91%, respectively.

1 Universidade Católica de Pelotas (UCPel).


2 Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Recebido em 3 Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
14/7/2014
Aprovado em
29/10/2014 * Manuscrito desenvolvido como trabalho de conclusão de curso da autora principal, em 2013/1.

Endereço para correspondência: Vera Lúcia Marques de Figueiredo


Universidade Católica de Pelotas
DOI: 10.1590/0047-2085000000036 Rua Félix da Cunha, 412
96010-000 – Pelotas, RS, Brasil
E-mail: verafig@terra.com.br
282 Freire MA et al. artigo original

The internal validity was investigated by the factorial analysis and consistence of the items.
It was observed that all 17 original items, except “Consciousness”, presented psychometric
quality to evaluate general depression, and that there were five dimensions underling those
16 items: Depressed humor, Anorexia, Insomnia, Somatization, and Anxiety, and all of them,
Keywords excepting the last, showed homogeneity in their constructs (alpha coefficients between
Depression, validation 0.66 and 0.78). On content analysis, five specialists suggested editing changes in seven items.
studies, sensibility, Conclusion: This study determinates a different cutoff and psychometric evidences favou-
specificity. rable to the use of HAM-D in Brazil.

INTRODUÇÃO Não se encontram na literatura pontos de corte determi-


nados pelo autor da escala, aceitando-se, na prática clínica,
A Escala de Avaliação de Depressão de Hamilton (HAM-D), escores acima de 25 pontos como característicos de pacien-
criada por Max Hamilton et al.1, foi construída na década de tes gravemente deprimidos; escores entre 18 e 24 pontos,
1960 para ser utilizada exclusivamente em pacientes pre- pacientes moderadamente deprimidos; e escores entre 7 e
viamente diagnosticados com transtorno afetivo do tipo 17 pontos, pacientes com depressão leve5. Por outro lado,
depressivo. Em função da organização e da escolha de seus um estudo japonês11 com base em sete ensaios clínicos de-
itens, eles servem para identificar a gravidade dos sintomas terminou, a partir dos instrumentos HAM-D e Clinical Global
depressivos, e não sua existência1. A escala original ingle- Impression-Severity (SCID), uma interpretação diferente, em
sa era composta por 21 itens, mas o próprio autor sugeriu, que pontuações de 0 a 3 correspondem a pacientes nor-
posteriormente, que os quatro últimos itens (variação diur- mais; escores de 4 a 7, pacientes limítrofes; escores de 8 a
na, despersonalização/desrealização, sintomas paranoides e 15, pacientes ligeiramente doentes; pontuações de 16 a 26,
sintomas obsessivo-compulsivos) fossem retirados porque pacientes moderadamente doentes e escores ≥ 27, pacien-
eram menos frequentes e contribuíam para definir o tipo tes gravemente doentes. Em uma revisão com sete artigos10,
de depressão, e não sua intensidade2-4. Existe, também, uma identificou que os pontos de corte na HAM-D variaram de
versão com 24 itens, sendo desamparo, desesperança e des- 10 a 16, com média de 12,6/13,5. Considerando os estudos
valia os itens adicionais5. encontrados, pode-se concluir que não há consenso entre o
Há 50 anos, a HAM-D vem sendo considerada como “pa- valor do ponto de corte da escala HAM-D para diferenciar a
drão-ouro” de referência para estudos de validação de outras gravidade dos sintomas de depressão.
escalas1. Além disso, foi (e continua sendo) amplamente uti- Apesar de a HAM-D ser utilizada com muita frequência,
lizada em ensaios clínicos para testar a eficácia de determi- outras críticas foram, também, direcionadas ao instrumen-
nados antidepressivos2 devido à ênfase que dá aos sintomas to1-3. Duas delas estão relacionadas à falta de padronização
somáticos em oposição aos sintomas cognitivos ou afetivos, da escala com 17 itens e a falta de procedimentos de pon-
que se encontram em minoria6. Ela é amplamente sensível tuação precisa3. Além disso, no Brasil, os profissionais não
às mudanças vivenciadas por pacientes acometidos por de- contam com uma versão adaptada, mas apenas com versões
pressão grave5,7 e é eficiente em discriminar droga e placebo traduzidas1,3,4.
nestes estudos3,8,9. Por outro lado, há também várias críticas10 Originalmente, a escala de 17 itens foi analisada pelo pró-
sobre a escala, relacionadas a itens inadequados para avaliar prio autor, que identificou a presença de três fatores, prima-
a gravidade da depressão; baixos índices de confiabilidade; riamente nomeados como Depressão Geral, Agitação versus
alternativas de respostas impróprias e poucas evidências da Retardo e Insônia6,12. Em outro estudo4, ele encontrou quatro
multidimensionalidade da escala. fatores, os quais não foram nomeados e tais itens mostraram-
A versão da HAM-D mais utilizada é composta por 17 -se na sua maioria complexos, não caracterizando uma estru-
itens1. O tempo de aplicação varia em torno de 15 a 30 mi- tura satisfatória4. O’Brien e Glaudin13 identificaram a presença
nutos4. O autor sugeriu que a escala fosse administrada por de quatro fatores diferentes, denominando as dimensões
meio de entrevista, aplicada em parceria de dois clínicos como: “Queixas Somáticas”, “Anorexia”, “Distúrbios do Sono”
bem treinados e experientes: um para conduzir a entrevista e “Agitação/Retardo” e sugerindo a exclusão de alguns itens
e o outro para fazer perguntas adicionais ao final1. A dife- que não se mostraram consistentes para a avaliação. Já em
renciação das pontuações em 3 e 5 pontos nos itens foi ex- outra pesquisa14 os quatro fatores subjacentes aos itens da
plicada por Hamilton10, que acreditava que certos aspectos escala foram denominados como: “Ansiedade Somática/Fa-
seriam difíceis de serem mensurados, atribuindo, portanto, tor de Somatização”, “Ansiedade Psíquica”, “Depressivo Puro”
poucas opções de respostas, ao passo que o resultado de e “Fator de Anorexia”.
determinados itens contribuía mais para a pontuação total Um modelo de cinco fatores15 foi identificado, sendo
do que outros. quatro deles denominados como “Insônia”, “Ansiedade”,

J Bras Psiquiatr. 2014;63(4):281-9.


artigo original Características psicométricas da Escala HAM-D 283

“Melancolia” e “Sintomas Vegetativos”; o último não recebeu Estudo 1


nenhuma classificação. Nesse estudo, a consistência interna Amostra
da escala foi identificada com α = 0,72. Um modelo similar
também foi encontrado, sem apresentar o nome das cinco Os participantes foram selecionados a partir de um es-
dimensões16, entretanto, foi identificado um fator geral. tudo de base populacional21, que incluiu 1.560 jovens de 18
Ainda, encontrou-se na literatura a presença de seis di- a 27 anos, do município de Pelotas, RS. Destes, 93 supostos
mensões subjacentes aos 17 itens da HAM-D17. Um dos casos de transtorno bipolar foram pareados por sexo e ida-
trabalhos não apresentou a denominação de tais fatores, de para outros dois grupos: com depressão e controles po-
apesar de divulgar a carga fatorial dos itens e o coeficiente pulacionais, resultando em um total de 279 sujeitos para a
de consistência interna da escala (α = 0,75)17. Por outro lado, segunda fase. Na segunda fase, 48 sujeitos não foram locali-
quanto à dimensionalidade da escala9, foram identificados zados ou se recusaram a participar do estudo. Dessa forma, a
seis aspectos sobre os quais se agrupavam os itens: humor, escala HAM-D foi respondida por 231 sujeitos, dos quais 105
somáticos, motores, sociais, cognitivos e ansiedade1,9. Já em pontuaram positivamente os critérios de depressão da SCID
outra revisão10 que reuniu estudos de janeiro de 1980 até (critério externo) e 126 sujeitos sem nenhum transtorno ou
maio de 2003, foram identificados trabalhos que menciona- diagnóstico de mania, segundo os instrumentos utilizados.
ram a presença de análise fatorial e componentes principais,
Instrumentos
que se referiram à presença de dois a oito fatores, levando
os autores a concluírem que a escala não parece unidimen- Escala de Avaliação de Depressão de Hamilton1
sional, mas a multidimensionalidade desta também não fica O instrumento investiga como o paciente tem se sentido
evidente – ideia também compartilhada por Pancheri et al.14. nos últimos sete dias, incluindo o dia da aplicação. Foi em-
Bagby et al.10 analisaram 15 artigos que descreviam aná- pregada a versão traduzida da escala, que usualmente vem
lises fatoriais da escala HAM-D. Os estudos de confiabilidade sendo utilizada no país1. Ela é composta por 17 itens, os quais
apontaram coeficientes que variaram de 0,46 a 0,97 e outros podem ser pontuados numa escala Likert que varia entre 0
relataram estimativas ≥ 0,7010,15,17, sugerindo índices satisfa- a 2 ou 0 a 4, conforme a intensidade do sintoma. O total de
tórios. Quanto à validade de conteúdo, encontra-se na litera- pontos varia entre 0 e 52 pontos. Para ser constatada a pre-
tura a crítica de que a HAM-D não abrange todos os critérios sença de depressão, os escores devem somar, no mínimo, 8
diagnósticos presentes no DSM-IV, tais como anedonia, in- pontos, na versão original20.
decisão e sinais vegetativos18.
A escala HAM-D é amplamente utilizada no Brasil, tanto Structured Clinical Interview for Dsm-Iv (Scid)
em pesquisas quanto na prática clínica e, portanto, torna-se Este instrumento consiste em uma entrevista diagnóstica
necessário investigar as características psicométricas e se- semiestruturada criada a partir do DSM-IV. As respostas iden-
lecionar uma forma padronizada e adaptada para a sua ad- tificarão a presença ou não dos sintomas, sendo pontuadas
ministração19, uma vez que não se encontram informações de acordo com o julgamento do avaliador. Ela é composta
sobre o processo de tradução da versão brasileira. Testes e por 10 módulos, que podem ser utilizados de maneira com-
escalas apenas traduzidos não são confiáveis para mensurar a binada ou independente22. No estudo, foi utilizado o módu-
patologia da nova população20, tendo em vista que as carac- lo “A” para diagnosticar os episódios de humor (transtornos
terísticas psicométricas do instrumento podem ser diferentes. bipolar e depressivo maior). A tradução e a adaptação desta
O objetivo do estudo foi examinar as características psi- entrevista clínica para o idioma português apresentam, em
cométricas da versão tradicionalmente utilizada no Brasil da geral, boa confiabilidade para os transtornos de humor23.
escala HAM-D, determinando o ponto de corte adequado
para uma amostra de indivíduos, moradores de uma região Entrevista de Avaliação Socioeconômica
do sul do país. Investigou-se, também, a qualidade da tradu- A entrevista traz questões que se baseiam no instrumento
ção, buscando uma alternativa que atenda mais satisfatoria- da Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (ABEP) e
mente aos critérios de adaptação transcultural. identificam o acúmulo de bens materiais e a escolaridade do
chefe da família24. Essa classificação identifica as pessoas em
classes (A, B, C, D, ou E) a partir dos escores alcançados, na
MÉTODOS qual a letra “A” refere-se à classificação socioeconômica mais
alta e “E”, a mais baixa.
Para validação da escala HAM-D, foram desenvolvidos dois
estudos. O primeiro estudo visou determinar a sensibilida- Procedimentos para coleta de dados
de e a especificidade do instrumento num grupo clínico; o O treinamento dos avaliadores para a realização das entre-
segundo, realizar a análise de conteúdo de uma versão habi­ vistas clínicas (HAM-D e SCID) foi ministrado pela equipe do
tualmente utilizada no Brasil. Laboratório de Psiquiatria Molecular da Universidade Federal

J Bras Psiquiatr. 2014;63(4):281-9.


284 Freire MA et al. artigo original

do Rio Grande do Sul (UFRGS), em função da pesquisa base da; (B) Conteúdo adequado ou inadequado; (C) Sugestões
deste estudo. As entrevistadoras foram três psicólogas trei- para a nova redação do item.
nadas para realizar a entrevista de acordo com os critérios do
DSM-IV apresentados na SCID. A aplicação dos instrumentos Procedimentos para coleta de dados
foi feita pelas psicólogas, em forma de entrevista. As esca- O protocolo com o rol dos itens da escala HAM-D foi entre-
las foram administradas de forma individual, em uma sala gue aos peritos, que o preencheram de forma individual no
de atendimento do Hospital Universitário da Universidade próprio local de trabalho. Posteriormente, os dados foram
Católica de Pelotas (UCPel). Posteriormente, as informações registrados numa planilha eletrônica.
foram digitadas em um banco de dados.
Procedimentos para análise de dados
Procedimentos para análise de dados Para a análise de conteúdo dos itens, utilizou-se o percentual­
Os dados foram analisados, considerando os seguintes pro- de concordância entre avaliadores, detendo-se itens com
cedimentos: 80% de pareceres favoráveis27 quanto à tradução e ao con-
• Descrição das variáveis por meio de frequências e teúdo.
médias.
Procedimentos éticos
• Avaliação da distribuição dos escores por meio do
teste de Kolmogorov-Smirnov. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa
• Comparação dos resultados entre os grupos clínico/ da Universidade Católica de Pelotas (protocolo 2006/96). Os
controle pelo Teste U de Mann-Whitney. jovens e os profissionais receberam informações sobre os
• Determinação do ponto de corte da sensibilidade e objetivos da pesquisa e assinaram um “Termo de Consen-
especificidade pela curva ROC. timento Livre e Esclarecido”. Assegurou-se o direito à confi-
• Análise da validade interna por duas técnicas. A pri- dencialidade dos dados e o cuidado na utilização das infor-
meira foi a análise fatorial exploratória, utilizando-se mações nos trabalhos escritos. Os jovens que apresentaram
o método dos componentes principais com rotação sintomas relativos a algum transtorno mental na entrevista
Varimax, que considera as dimensões independen- clínica do estudo principal foram encaminhados para o am-
tes, conforme estudos da lituratura10,13; foram man- bulatório de psiquiatria da Universidade.
tidos os itens com carga fatorial ≥ 0,30. Utilizaram-
-se os procedimentos exploratórios considerando
a busca por dimensões subjacentes ao domínio RESULTADOS
avaliado pela escala; e por não haver expectativa, a
Os participantes do estudo eram, na maioria, mulheres
priori, de sua composição teórica25. A segunda, pela
(68,4%). Elas tinham em média 22,04 anos (dp = 2,18) e as
consistência interna (alfa de Cronbach), adotando-se
idades variaram entre 18 e 27 anos, com mediana de 23
o coeficiente 0,80 como razoável26.
anos. A escolaridade variou entre 1 e 18 anos de estudos,
• A validade de critério entre os resultados da HAM-D
sendo a média de 9,18 anos (dp = 3,14 anos) e mediana, 10
e da SCID – dicotomizados entre presença/ausência
anos. Quanto à classe social, a maior concentração de pes-
– foi analisada pela correlação de Spearman.
soas era da classe “C” (51,5%). De acordo com a SCID, 105
Estudo 2 jovens tiveram diagnóstico de depressão (45,5%), sendo 83
mulheres e 22 homens. Os demais apresentavam diagnós-
Amostra
tico de mania (4,8%), hipomania (3%) e sem transtorno de
Para a etapa da análise teórica dos itens da HAM-D, partici- humor (46,7%). Ao analisar as discrepâncias entre os escores
param cinco especialistas, sendo dois psicólogos e três psi- médios na HAM-D obtidos pelos pacientes depressivos, não
quiatras. Os profissionais tinham domínio no uso da escala e se encontraram diferenças significativas relacionadas a sexo,
na língua inglesa. nível socioeconômico e anos de escolaridade. O escore mé-
dio de pontos na HAM-D foi de 17 pontos (dp = 6,63). Os da-
Instrumentos dos sociodemográficos dos participantes deprimidos man-
Para analisar a qualidade da versão da escala HAM-D usada tiveram características similares aos da literatura, no que se
no Brasil, foi elaborado um protocolo para análise teórica dos refere à predominância do sexo feminino14-17 e à pontuação
itens, que consistia em um formulário impresso com instru- na escala HAM-D16; entretanto, diferenciou-se em relação à
ções para preenchimento e com os 17 itens originais trans- média de idade configurando um grupo mais jovem, uma
critos em inglês, juntamente com os itens da versão em por- vez que nos estudos descritos a média de idade dos sujeitos
tuguês, usualmente utilizada no Brasil. Ao lado, apareciam as variou entre 35 e 49 anos14-17. As características dos sujeitos
seguintes alternativas: (A) Tradução adequada ou inadequa- participantes do estudo aparecem descritas na tabela 1.

J Bras Psiquiatr. 2014;63(4):281-9.


artigo original Características psicométricas da Escala HAM-D 285

Tabela 1. Características sociodemográficas da amostra -positivo), existe 91% de chance de excluir sujeitos isentos
Características Frequência Porcentagem de doença, ou seja, 9% de chance de identificar como tendo
Sexo depressão sujeitos saudáveis (falso-negativo). Para a escolha
do ponto de corte, considerou-se pelo valor especificidade >
Feminino 158 68,4
sensibilidade porque, quando o teste é altamente específico,
Masculino 73 31,6
ele identifica com segurança os resultados falso-positivos28,29.
Idade
De 18 a 22 anos 125 54,1
De 23 a 27 anos 106 45,9
Escolaridade
De 1 a 4 anos 21 9
De 5 a 8 anos 54 23,4
De 9 a 12 anos 107 46,3
1,0
13 anos ou mais 18 7,8
Classe social
0,8
a+b 73 31,6
c 119 51,5

Sensibilidade
0,6
d+e 39 16,9

0,4
Determinação dos pontos de corte
O resultado do teste de Kolmogorov-Smirnov indicou que 0,2
os escores na HAM-D não apresentaram uma distribuição
normal (z = 2,5; p < 0,001). Por isso, para comparação das
0,0
pontuações na HAM-D entre os grupos clínico e controle 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0
classificados de acordo com a entrevista clínica (SCID), tendo 1- Especificidade
como referência a variável “depressão atual”, foi utilizado o Figura 1. Curva ROC dos pontos de corte da HAM-D.
teste de Mann-Whitney.
A pontuação média na HAM-D para o grupo que relatou
sintomas depressivos atuais foi de 16,51 (dp = 6,63) pontos Tabela 2. Pontos de corte, sensibilidade, especificidade, valores
e, para o grupo que não relatou sintomas depressivos atuais, preditivos positivos e negativos para a HAM-D
foi de 2,42 (dp = 4,15) pontos. A comparação realizada por Valor preditivo Valor preditivo
Pontos de corte Sensibilidade Especificidade
meio do teste U de Mann-Whitney indicou a presença de di- positivo negativo
ferença significativa entre os grupos (U = 466,50, z = 12,32, 4 0,99 0,75 0,76 0,99
5 0,98 0,79 0,80 0,98
p < 0,001).
6 0,95 0,83 0,83 0,95
A curva ROC foi utilizada para verificar a capacidade dos 7 0,93 0,85 0,84 0,94
escores da HAM-D e para discriminar os grupos em relação à 8 0,91 0,88 0,86 0,92
presença de sintomas depressivos atuais, quando compara- 9 0,90 0,91 0,89 0,91
dos com os obtidos na SCID. A área sob a curva foi igual a 0,97 10 0,88 0,94 0,93 0,90
(erro-padrão = 0,01, p < 0,001) com intervalo de confiança de 11 0,83 0,96 0,94 0,87
95% variando entre 0,94 e 0,99 (Figura 1). Esse resultado in- 12 0,77 0,97 0,95 0,97
dicou que a HAM-D apresentou uma capacidade adequada
para discriminar indivíduos com sintomas depressivos.
A tabela 2 apresenta os valores preditivos da HAM-D em Evidências de validade interna
diferentes pontos de corte que variaram entre 4 e 12 pontos Para examinar a unidimensionalidade da escala, utilizou-se
e os respectivos valores de sensibilidade e especificidade. o método da Análise dos Componentes Principais, a par-
Considerou-se o escore de 9 como ponto de corte satisfa- tir do qual foi identificado um fator geral composto por 16
tório, determinando no instrumento uma sensibilidade de itens, que explicam 19,63% da variância dos resultados. As
0,90 e especificidade de 0,91. Esse resultado significa 90% de cargas fatoriais dos itens variaram entre 0,32 (ansiedade psí-
chance de o teste identificar corretamente indivíduos que quica) e 0,78 (insônia tardia), sugerindo que os 16 itens ava-
têm depressão. De acordo com o diagnóstico médico, rea- liam depressão geral. Constatada a fatorabilidade da matriz
lizado por meio da entrevista diagnóstica SCID (verdadeiro- (Bartlett’s = 485,29; KMO = 0,69), identificou-se a presença de

J Bras Psiquiatr. 2014;63(4):281-9.


286 Freire MA et al. artigo original

cinco componentes que explicaram juntos 62,29% da variân- Análise de conteúdo


cia dos resultados, os quais mostraram associação entre eles. A validação do conteúdo da versão da escala utilizada no
Considerando que a escala HAM-D não apresenta um país com especialistas resultou em sugestões relativas à re-
único modelo multidimensional, com base em estudos dação. Dos 17 itens da escala, nove foram apontados com
da literatura13-16, os pesquisadores denominaram os cinco algum problema de tradução. Desses itens, três deles (hu-
componentes como: Humor deprimido (F1), Anorexia (F2), mor deprimido, insônia tardia e ansiedade psíquica) não tive-
Insônia (F3), Somatização (F4) e Ansiedade (F5), conforme a ram a concordância de 80% dos juízes no quesito “tradução
tabela 3. Observaram-se alguns itens complexos, optando- adequada”. Quanto à análise referente à pertinência da sua
-se para definir o fator representante, aquele em que o item representatividade ao construto depressão, todos os itens
apresentou maior carga, além da interpretabilidade teórica. foram considerados adequados por 80% ou mais dos juízes.
Entre eles, estão os itens “Trabalho e Atividades” (0,404 no Na tabela 4, aparecem as sugestões mais relevantes apresen-
F2), “Retardo” (-0,346 no F5), “Suicídio” (0,355 no F5) e “Sinto- tadas pelos especialistas.
mas somáticos em geral” (0,311 no F4).

Tabela 3. Estrutura fatorial da HAM-D


DISCUSSÃO
Fator
Itens
1 2 3 4 5 Os resultados obtidos com os pacientes depressivos carac-
1 Humor deprimido 0,782 terizaram a capacidade da HAM-D em detectar o transtorno,
2 Sentimentos de culpa 0,493 uma vez que eles apresentaram características significativa-
3 Suicídio 0,667 mente diferentes do grupo de controle. As análises para de-
terminar a sensibilidade e a especificidade do instrumento
4 Insônia inicial 0,715
tradicionalmente utilizado no Brasil, com o mesmo ponto de
5 Insônia intermediária 0,821
corte da versão original em inglês8, indicaram discrepância
6 Insônia tardia 0,859
entre os pontos de corte das versões em português9 e versão
7 Trabalho e atividades 0,491 original em inglês10. Em função da divergência dos pontos de
8 Retardo 0,780 corte, a escala pode estar produzindo escores equivocados,
9 Agitação 0,677 identificando casos falso-positivos ou verdadeiro-negativos.
10 Ansiedade psíquica 0,426 A análise da estrutura interna da escala HAM-D eviden-
11 Ansiedade somática 0,766 ciou que os itens avaliam o construto geral da depressão sob
12 Sintomas somáticos 0,731
cinco dimensões. Dessas cinco, apenas o fator 5 (Ansiedade)
gastrintestinais demonstrou menor confiabilidade para avaliar a depressão.
13 Sintomas somáticos em geral 0,751 Os dados mostraram resultados diferentes dos encontrados
14 Sintomas genitais 0,718
na literatura, que identificam entre três6,12 e seis1 dimensões
subjacentes. Quanto à consistência interna da escala como
15 Hipocondria 0,745
um todo, o índice encontrado foi similar aos observados na
16 A Perda de peso (segundo 0,815
paciente) literatura, referente às versões adaptadas15,17. Dos cinco fato-
res, quatro deles apresentaram coeficientes que podem ser
16 B Perda de peso (segundo 0,863
especialista) classificados como satisfatórios e muito bons, entretanto,
Número de itens 5 3 3 3 3 não é possível fazer alguma comparação com a versão ori-
% de variância 19,63 14,34 11,09 10,15 7,08
ginal por não haver dados relativos à homogeneidade da es-
cala10. No estudo, os baixos valores da fidedignidade podem
Consistência interna (α) 0,71 0,78 0,74 0,66 0,38
estar associados ao número reduzido da amostra e à pouca
variabilidade, uma vez que as análises foram realizadas ape-
Pela análise da consistência interna, os coeficientes de- nas entre os pacientes depressivos. Da mesma forma, os bai-
monstraram homogeneidade satisfatória entre os itens das xos índices nos fatores podem ser associados ao pequeno
quatro dimensões. Apenas o fator 5 (F5) demonstrou menor número de itens que constituiu cada dimensão27.
representatividade para o construto da depressão. A consis- Quanto à validade de critério, encontraram-se na lite-
tência interna da HAM-D, excluindo o item “Consciência”, foi ratura correlações da HAM-D com a Beck Depression Inven-
de 0,72. Para os fatores, a variação é de 0,38 a 0,78. A vali- tory – BDI (r = 0,48) e com a Clinical Global Impression – CGI
dade de critério foi estabelecida pela correlação dos escores ­(r = 0,56)17. No presente estudo, o grau de eficácia da escala
­obtidos na escala HAM-D e a presença ou não de depressão HAM-D, em predizer o desempenho dos indivíduos, foi de-
encontrada na escala SCID, identificando-se associação entre terminado pela técnica do diagnóstico psiquiátrico, utilizan-
os dois instrumentos (r = 0,81; p = 0,00). do-se a SCID.

J Bras Psiquiatr. 2014;63(4):281-9.


artigo original Características psicométricas da Escala HAM-D 287

Tabela 4. Itens da escala HAM-D e sugestões para a versão revisada


Item original Versão experimental Sugestão
1. Depressed mood 1. Humor deprimido (tristeza, desesperança, 1. Humor deprimido (tristeza, desesperança,
(sadness, hopeless, helpless, worthless) desamparo, inutilidade) desamparo, inutilidade)
0. Absent 0. Ausente 0. Ausente
1. These feeling states indicated only on questioning 1. Sentimentos relatados apenas ao ser inquirido 1. Sentimentos relatados apenas ao ser inquirido
2. These feeling states spontaneously reported verbally 2. Sentimentos relatados espontaneamente com palavras 2. Sentimentos relatados espontaneamente com palavras
3. Communicates feeling states nonverbally, i.e., through 3. Comunica os sentimentos não com palavras, isto é, com a 3. Comunica os sentimentos não com palavras, isto é, com a
facial expression, posture, voice and tendency to weep expressão facial, a postura, a voz e a tendência ao choro expressão facial, a postura, a voz e a tendência ao choro
4. Patient reports VIRTUALLY ONLY these feeling states in his 4. Sentimentos deduzidos da comunicação verbal e não 4. Sentimentos deduzidos da comunicação verbal e não
spontaneous verbal and nonverbal communication verbal do paciente verbal espontânea do paciente
4. Insomnia – Early 4. Insônia inicial 4. Insônia inicial
0. No difficulty falling asleep 0. Sem dificuldades para conciliar o sono 0. Sem dificuldades para iniciar o sono
1. Complains of occasional difficulty falling asleep i.e., more 1. Queixa-se de dificuldade ocasional para conciliar o sono, 1. Queixa-se de dificuldade ocasional para iniciar o sono, isto
than isto é, mais de meia hora é, mais de meia hora
½ hour 2. Queixa-se de dificuldade para conciliar o sono todas as 2. Queixa-se de dificuldade para iniciar o sono todas as noites
2. Complains of nightly difficulty falling asleep noites
6. Insomnia – Late 6. Insônia tardia 6. Insônia tardia
0. No difficulty 0. Sem dificuldades 0. Sem dificuldades
1. Waking in early hours of the morning but goes back to 1. Acorda de madrugada, mas volta a dormir 1. Acorda no início da manhã, mas volta a dormir
sleep 2. Incapaz de voltar a conciliar o sono se deixar a cama 2. Incapaz de voltar a conciliar o sono se deixar a cama
2. Unable to fall asleep again if gets out of bed
9. Agitation 9. Agitação 9. Agitação
0. None 0. Nenhuma 0. Nenhuma
1. Fidgetiness 1. Inquietude 1. Inquietude
2. Playing with hands, hair, etc. 2. Brinca com as mãos, com os cabelos etc. 2. Mexe com as mãos, com os cabelos etc.
3. Moving about, cant’t sit still 3. Mexe-se, não consegue sentar quieto 3. Mexe-se, não consegue sentar quieto
4. Hand wringing, nail biting, hair-pulling, biting of lips 4. Torce as mãos, rói as unhas, puxa os cabelos, morde os 4. Torce as mãos, rói as unhas, puxa os cabelos, morde os
lábios lábios
10. Anxiety – Psychic 10. Ansiedade psíquica 10. Ansiedade psíquica
0. No difficulty 0. Sem dificuldade 0. Sem dificuldade
1. Subjective tension and irritability 1. Tensão e irritabilidade subjetivas 1. Tensão e irritabilidade subjetivas
2. Worrying about minor matters 2. Preocupação com trivialidades 2. Preocupação com trivialidades
3. Apprehensive attitude apparent in face or speech 3. Atitude apreensiva aparente no rosto ou na fala 3. Atitude apreensiva aparente no rosto ou na fala
4. Fears expressed without questioning 4. Medos expressos sem serem inquiridos 4. Medos expressos sem serem questionados
15. Hypochondriasis 15. Hipocondria 15. Hipocondria
0. Not present 0. Ausente 0. Ausente
1. Self-absorption (bodily) 1. Auto-observação aumentada (com relação ao corpo) 1. Maior percepção de alterações sensoriais em seu corpo
2. Preoccupation with health 2. Preocupação com a saúde 2. Preocupação com a saúde
3. Frequent complaints, requests for help, etc. 3. Queixas frequentes, pedidos de ajuda etc. 3. Queixas frequentes, pedidos de ajuda etc.
4. Hypochondriacal delusions 4. Ideias delirantes hipocondríacas 4. Ideias delirantes hipocondríacas
16. Loss of weight 16. Perda de peso (marcar A ou B) 16. Perda de peso (marcar A ou B)
A. When Rating by History: A. Quando avaliada pela história clínica A. Quando avaliada pela história clínica
0. No weight loss 0. Sem perda de peso 0. Sem perda de peso
1. Probable weight loss associated with present illness 1. Provável perda de peso associada à moléstia atual 1. Provável perda de peso associada ao transtorno atual
2. Definite (according to patient) weight loss 2. Perda de peso definida (de acordo com o paciente) 2. Perda de peso definida (de acordo com o paciente)
B. On Weekly Ratings by Ward Psychiatrist, 3. Não avaliada 3. Não avaliada
When Actual B. Avaliada semanalmente pelo psiquiatra B. Avaliada semanalmente pelo psiquiatra
Changes are Measured: responsável, quando são medidas responsável, quando são medidas
0. Less than 1 lb. weight loss in week alterações reais de peso alterações reais de peso
1. Greater than 1 lb. weight loss in week 0. Menos de 0,5 kg de perda por semana 0. Menos de 0,5 kg de perda por semana
2. Greater than 2 lb. weight loss in week 1. Mais de 0,5 kg de perda por semana 1. Mais de 0,5 kg de perda por semana
2. Mais de 1 kg de perda por semana 2. Mais de 1 kg de perda por semana
3. Não avaliada 3. Não avaliada

Quanto à análise de conteúdo dos itens, apesar de não tação transcultural30. As sugestões dadas pelos especialistas
haver concordância significativa dos peritos para que as su- entrevistados foram pertinentes, no sentido de tornar a lin-
gestões fossem inseridas, diferenças em relação ao vocabu- guagem das perguntas e alternativas de respostas mais co-
lário foram apontadas. Por isso, identificou-se a necessidade loquiais e, consequentemente, facilitar o entendimento dos
de realizar alterações na redação de sete questões da versão pacientes.
da escala usualmente utilizada no Brasil. Logo, a análise de Entre as limitações do presente estudo, pode-se destacar
conteúdo evidenciou que a verificação do vocabulário de a impossibilidade de determinar a intensidade dos sintomas
acordo com o contexto é uma etapa importante da adap- depressivos, pois na pesquisa principal não foi utilizado ne-

J Bras Psiquiatr. 2014;63(4):281-9.


288 Freire MA et al. artigo original

nhum outro instrumento que verificasse a gravidade sin- 2. Williams JBW. Standardizing the Hamilton Depression Rating Scale: past, present, and
future. Eur Arch Psychiatry Clin Neurosci. 2001;251 Suppl. 2:II/6-12.
tomática para fins de comparação. Alguns estudos encon-
trados na literatura15,17 destacam a relevância de analisar os 3. Araújo RHS. Adaptação transcultural da GRID Hamilton Rating Scale for Depression (GRID-
HAMD) para o português brasileiro e avaliação do impacto de um treinamento sobre a
resultados da HAM-D segundo o sexo, o que não foi feito confiabilidade interavaliadores [dissertação]. Salvador (BA): Universidade Federal da Ba-
em função da pouca variabilidade da amostra clínica. Ainda hia, 2011.
se pode apontar a falta de variabilidade na idade dos parti- 4. Hamilton M. A rating scale for depression. J Neurol Neurosurg Psychiat. 1960;23(56):56-
cipantes, uma vez que o estudo objetivou a população de 62.
adultos jovens (18 – 27 anos). 5. Moreno RA, Moreno DH. Escalas de depressão de Montgomery & Asberg (MADRS) e de
Hamilton (HAM-D). Rev Psiquiatr Clin. 1998;25:262-72.
6. Shafer AB. Meta-analysis of the Factor Structures of Four Depression Questionnaires: Beck,
CES-D, Hamilton, and Zung. J Clin Psychol. 2006;62(1):123-46.
CONCLUsões 7. Parcias S, Rosário BP, Sakae T, Monte F, Guimarães ACA, Xavier AJ. Validação da versão em
português do Inventário de Depressão Maior. J Bras Psiquiatr. 2011;60(3):164-70.
A escala HAM-D é utilizada há 50 anos no Brasil, sem evidên-
8. Bech P. Rating scales in depression: limitations and pitfalls. Dialog Clin Neuroscience.
cias de validade para essa população e sem estudos de adap- 2006;8(2):207-15.
tação transcultural; considera-se uma adaptação ingênua, 9. Calil HM, Pires MNL. Aspectos gerais das escalas de avaliação de depressão. Rev Psiquiatr
dando ênfase apenas ao processo de tradução das questões Clin. 1998;25:240-4.
originais sem um estudo semântico da linguagem e, por 10. Bagby RM, Ryder AG, Schuller DR, Marshall MB. The Hamilton Depression Rating Scale: Has
essa razão, os resultados da presente pesquisa colaboraram the Gold Standard Become a Lead Weight? Am J Psychiatry. 2004;161:2163-77.
para fornecer subsídios sobre suas qualidades psicométricas 11. Furukawa TA, Akechi T, Azuma H, Okuyama T, Higuchi T. Evidence-based guidelines
da escala em uma amostra brasileira. Os resultados sugeri- for interpretation of the Hamilton Rating Scale for Depression. J Clin Psychopharmol.
2007;27(5):531-3.
ram que a escala apresenta qualidades promissoras, desde
12. Hamilton M. Development of a rating scale for primary depressive illness. British J Social
que algumas modificações sejam realizadas, com base nas Clin Psychol. 1967;6(4):278-96.
propostas do presente estudo. Recomendam-se outras pes- 13. O’Brien KP, Glaudin V. Factorial structure and factor reliability of the Hamilton Rating Scale
quisas para revisar as características psicométricas da escala for Depression. Acta Psychiatr Scand. 1988;78:113-20.
e validar a nova versão proposta. 14. Pancheri P, Picardi A, Pasquini M, Gaetano P, Biondi M. Psychopathological dimensions
of depression: a factor study of the 17-item Hamilton depression rating scale in unipolar
depressed outpatients. J Affect Disord. 2002;68:41-7.
15. Ramos-Brieva JA, Cordero-Villafafila A. A new validation of the Hamilton Rating Scale for
CONTRIBUIÇÕES INDIVIDUAIS Depression. J Psychiatr Res. 1988;22(1):21-8.
16. Gibbons RD, Clark DC, Kupfer DJ. Exactly what does the Hamilton Depression Rating Scale
Manoela Ávila Freire – Foi responsável pela análise e in-
measure? J Psychiatr Res. 1993;27(3):259-73.
terpretação dos dados, redação do artigo e aprovação da
17. Akdemir A, Türkçapar MH, Orsel SD, Demirergi N, Dag I, Ozbay MH. Reliability and valid-
versão final. ity of the Turkish version of the Hamilton Depression Rating Scale. Compr Psychiatry.
Vera Lúcia Marques de Figueiredo – Supervisora aca- 2001;42(2):161-5.
dêmica responsável pela elaboração do trabalho da autora 18. Furukawa TA. Assessment of mood: guides for clinicians. J Psychos Research. 2010;68:
principal. 581-9.
Alina Gomide – Foi responsável pela análise de dados 19. Marques AP, Santos AMB, Assumpção A, Matsutani LA, Lage LV, Pereira CAB. Validação
da Versão Brasileira do Fibromyalgia Impact Questionnaire (FIQ). Rev Bras Reumatol.
relativa à sensibilidade/especificidade do instrumento.
2006;46(1):24-31.
Karen Jansen, Ricardo Azevedo da Silva, Pedro Viei-
20. Guillemin F, Bombardier C, Beaton D. Cross-cultural adaptation of health-related
ra da Silva Magalhães e Flávio Pereira Kapczinski – Par- quality of life measures: literature review and proposed guidelines. J Clin Epidemiol.
ticiparam da elaboração do projeto, execução do estudo de 1993;46(12):1417-32.
campo e aprovação da versão final. 21. Jansen K. Transtornos de humor: prejuízos na qualidade de vida e no funcionamento de
jovens da cidade de Pelotas-RS. Universidade Católica de Pelotas. In press 2010.
22. Osório FL, Crippa JAS, Loureiro SR. Aspectos cognitivos do falar em público: validação de
uma escala de autoavaliação para universitários brasileiros. Rev Psiq Clín. 2012;39(2):48-
Conflitos de interesse 53.
23. Del-Ben CM, Rodrigues CR et al., 1996. In: Jansen K. Transtornos de humor: prejuízos na
Nenhum dos autores apresentou divergência de interesses qualidade de vida e no funcionamento de jovens da cidade de Pelotas-RS. Universidade
ao longo da elaboração do projeto e execução do trabalho. Católica de Pelotas. In press 2010.
24. ABEP – Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa. Disponível em: http://www.ibge.
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revisão dos 40 anos de sua utilização. Rev Fac Ciênc Méd. 2001;3(1):10-4. exame psicológico – TEP. São Paulo: Casa do Psicólogo. 2001.

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artigo original Características psicométricas da Escala HAM-D 289

27. Pasquali L. Testes referentes a construto: teoria e modelo de construção. In: Pasquali L. 29. Braga ACS. Curvas ROC: aspectos funcionais e aplicações [dissertação]. Universidade do
Instrumentação psicológica – fundamentos e prática. Porto Alegre: Artmed. 2010:165-98. Minho, 2010.
28. Flecther RH, Flechter SW, Wagner EH. Diagnóstico. In: Flecther RH, Flechter SW, Wagner 30. Jorge MR. Adaptação transcultural de instrumentos de pesquisa em saúde mental. Rev
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