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HERMENEUTICA

LINHAS DE INTERPRETAÇÃO

Pf. EDUARDO SALES


CETAD MARINGÁ
Arco Hermenêutico VT – Pentateuco –
Instabilidade Social.
Vivencial
Histórica Relacional
Êxodo 6:13 Todavia o SENHOR falou a Moisés e a
Aarão, e deu-lhes mandamento para os filhos de
Moisés Israel, e para Faraó, rei do Egito, para que tirassem
os filhos de Israel da terra do Egito.
Autor Texto Receptor
Gênesis 31:34 Mas tinha tomado Raquel os ídolos,
Outras Religiões
e os tinha posto na albarda de um camelo, e
assentara-se sobre eles; e apalpou Labão toda a
tenda, e não os achou.
Mágico Não Histórica
Místico
Arco Hermenêutico: VT – Profetas e Sacerdotes
Estabilidade Social.
Vivencial
Histórica Social/Relacional
Isaias 1:11-17 - De que me serve a mim a multidão
de vossos sacrifícios, diz o SENHOR? Am 5; Os
Profetas
6:6; Ez 11:19; 37:26; Jr 7:1.

Autor Texto Receptor

Sacerdotes
Mágico/Litúrgico Não Histórica
Místico
Arco Hermenêutico: NT – Jesus como Centro Hermeneutico

Vivencial
Escatológico/Futuro
Ético
ESSÊNIOS Histórico/Social

FARIZEUS ZELOTAS
JESUS
Lei/Aliança Texto
CENTRO Receptor
Hermeneutico

SADUCEUS
Dogmático
Político
Messiânico/Passado
Religioso
Arco Hermenêutico: NT – Jesus como Centro Hermeneutico

Vivencial
Escatológico/Futuro
Ético
Histórico/Social

Mateus 12:6 Pois


Lei/Aliança eu vosTexto
digo que Receptor
está aqui quem
é maior do
que o templo.

Dogmático
SADUCEUS Político
Messiânico/Passado
Religioso
Arco Hermenêutico: NT – Jesus como Centro Hermeneutico

Vivencial
Escatológico/Futuro
Ético
Histórico/Social

FARIZEUS
Mt 3:7 E, vendo ele muitos
Lei/Aliança dos fariseusTexto
e dos saduceus Receptor
que vinham ao seu batismo,
dizia-lhes: Raça de víboras,
quem vos ensinou
a fugir da ira futura?

Dogmático
Político
Messiânico/Passado
Religioso
Arco Hermenêutico: NT – Jesus como Centro Hermeneutico

Vivencial
Escatológico/Futuro
Ético
ESSÊNIOS Histórico/Social

Mt 9:14; Mc 2:17
Lei/Aliança E Jesus, Texto
tendo ouvido Receptor
isto, disse-lhes:
Os sãos não necessitam
de médico, mas sim
os que estão doentes;

Dogmático
Político
Messiânico/Passado
Religioso
Arco Hermenêutico: NT – Jesus como Centro Hermeneutico

Vivencial
Escatológico/Futuro
Ético
Histórico/Social
ZELOTAS
Mt 5:5
Lei/Aliança bem-aventurados
Texto Receptor
os mansos,
porque eles herdarão
a terra;

Dogmático
Político
Messiânico/Passado
Religioso
Arco Hermenêutico: NT – Jesus como Centro Hermeneutico

Vivencial
Escatológico/Futuro
Ético
Histórico/Social

1Co 11:25 Este


Lei/Aliança Texto Receptor
cálice é o novo
testamento no
meu sangue;
Dogmático
Político
Messiânico/Passado
Religioso
Arco Hermenêutico: NT – Jesus como Centro Hermeneutico

Vivencial
Escatológico/Futuro
Ético
Histórico/Social

João 12:32
Lei/Aliança E eu, Quando
Texto for Receptor
levantado da terra,
todos atrairei
a mim.
Dogmático
Político
Messiânico/Passado
Religioso
Arco Hermenêutico: A Igreja e a Filosofia Grega

Vivencial
Racional / Alegórico
Escatológico/Futuro
Naturalista
Ético
Histórico/Social

Lei/Aliança
Mensagem Texto Receptor
dos deuses. JESUS
FILOSOFIA
CRISTO

O Cristianismo é a
Dogmático
verdadeira Filosofia; Político
Sobre-Naturalista
Messiânico/Passado
Jesus é o Logos; etc...
Religioso
Arco Hermenêutico: Católicos, Protestantes e Nova Herm.
Alegorismo/Dogma Católico

Dogmático Subjetividade

Clero Texto Leigo


FILOSOFIA

Objetividade Histórico
Científico
Literalismo/Sola Escriptura
Tomás de
Elementos da Interpretação: Hermenêutica Aquino orienta a
Católica
interpretação à “regra do
meio” de Aristóteles. A
Alegorismo/Dogma Católico
Bíblia e a Experiência devem
Dogmático ser usadosSubjetividade
como revelação. A
Interpretação é Dogmática e
Clérica. Está restrita a um
pequeno grupo e subjugada à
infalibilidade do Papa.
Clero FILOSOFIA
Texto O Dogma Católico é oLeigo
guia
Aristotélica de interpretação e a
interpretação dos Papas e dos
Pais da Igreja são o guia para
o entendimento.

Objetividade A Alegoria éHistórico


um dos
principais métodos de
Científico
Literalismo/Sola Escriptura
construir a interpretação.
Revoltados
Elementos da Interpretação: Hermenêutica com a
Católica
exploração das indulgências
Alegorismo/Dogma Católico
os reformadores criarão uma
nova hermenêutica guiada
Dogmático apenas pela escritura como
Subjetividade
única regra de Fé e Prática.
Abandonaram toda
interpretação dos papas, da
experiência e dos pais da
Clero FILOSOFIA
Texto igreja. Leigo
Platônica Continuaram a estrutura
dogmática. Seguiram
Agostinho e a filosofia
Platônica.

Objetividade Baniram a alegoria.


HistóricoSomente
a Bíblia tem autoridade para
Científico
Literalismo/Sola Escriptura
interpretar a Bíblia.
Com o Iluminismo
Elementos surgem
da Interpretação: Hermenêutica Católica
novas tendências. O
homem é libertado e as Alegorismo/Dogma Católico
ciências toma o lugar dos
dogmas. Surge a Nova
Dogmático Subjetividade
Hermenêutica, livre de
padrões clericais, objetivos
e dogmáticos. Novas
interpretações do mundo
como
Cleroa psicologia e a FILOSOFIA
Texto Leigo
filosofia existencialista
marcarão a tendência
Existencial
subjetiva. É a revolta do
leigo contra o clero. Toda
interpretação foca no
“Eu”. Essa hermenêutica
Objetividade Histórico
psicológica é muito usada Científico
por novas teologias. Literalismo/Sola Escriptura
Em conjunto com
Elementos a
da Interpretação: Hermenêutica Católica
hermenêutica psicológica e
lingüística surge a Alegorismo/Dogma Católico
hermenêutica histórica. A
história vem preencher um
Dogmático Subjetividade
grande vazio deixado
pelos protestantes e usar a
crítica histórica como
fonte de interpretação das
escrituras.
Clero Parte da FILOSOFIA
Texto Leigo
Filosofia Existencial.
Procura entender o Ser
Existencial
enquanto Ser existente.
Abandona os conceitos
hermeneuticos idealisticos
e platônicos e fundamenta
Objetividade Histórico
a interpretação a partir da Científico
existência. Literalismo/Sola Escriptura
Paul Ricoeur
Mundos
Hermeneuticos
Mundo de Dentro do Texto.
O Mundo de trás.
É o MundoOintencionado
Mundo pelo autor.
daautor.
Frente.
É o Mundo
Mundo do
de Dentro Realidade
Nem sempredesconhecido.
É o Direcionadora
Mundo é uma verdade.Não Masrealidade
éo
Do que
Textoaté o próprio autor
conteúdo
Realizada quepelo
o autor
autor intenta
de em textual.
forma nos
Muitas vezes desconhece. O mundo de trás
confrontar.
OÉmundo daOfrente
Mundo é oderesultado
dentro mostra
da relação:
o contexto social, cultura, eMundo subjetivo
Porque
Trás
que
Mundo a realidade
de trás, nem
mundo sempre
de é
dentroreal
e e que
minha leitura.
Levaram o autor a escrever o que Do ele Texto
escreveu
O mundoa não-realidade sou éeusempre
da frentesempre quem uma
crio. Não
Lembrando-se que o motivo daprecisa
escrita
Ter Realidade
existido, hermenêutica.
Deve estar ou ter
escondidofundamento
no mundo histórico.
do meio
O autor
Quando leio pode
minha usar
Mundo umFrente
recurso
capacidade
na de de
interpretação
De outro autor. Assim, o mundo de trás
Retórica
Alcança o não Do
irreal verdadeiro
e para em real.
transforma-o
Texto
Na realidade é o mundo da frente
Produzir algo em seus
De outro autor.
Leitores.
Histórico A Bíblia é o único
Literal Interprete de si mesma
Antioquia
Interpret. Plenário Verbal Não-Histórica A palavra
Antes do
homem
Karl Barth
Romanos
Escribas Kant David Strauss 1919
Iluminismo Histórico-Crítico G.Ebeling
Fariseus
Linguistica
Sentido Moral Eliminação do Bultmann
sobrenatural Desmitificar
Existencial

Ser-no-Mundo
Alexandria Homem antes
Espiritual Da palavra Cristo
Simbólico/Alegórica da Fé
Exercícios
• Quem é a luz do mundo Mt 5:14 ou Jo 9:5
• Como interpretar Mt 5:42 a luz de 1Tm 5:8
• O antigo testamento prescreve que podemos
odiar os inimigos, por que? Mt 5:43.
• Mt 8:12 –Inferno é um lugar de trevas ou há luz?
Mc 9:48 – Fogo não é luz?
• Se Jesus é filho de Deus por que chama a si
mesmo de filho do homem? Mt 8:20
• Os Mortos sepultem os próprios mortos. Não foi
grosseria da parte de Jesus Mt 8:22
Exercícios
• Jesus mentiu em Mt 10:23?
• Jesus veio para trazer paz ou guerra? Mt 10:34ss
• Jesus disse que João Batista era Elias
reencarnado? Mt 11:14
• Como entender Mt 12:1-5 com Mt 5:17?
• Por que Jesus instruiu que não dissessem ser Ele
o Cristo? Mt 16:20
• Já que Jesus era Deus por que admoestou o
jovem por tê-lo chamado de bom? Mt 19:16-30
• Seremos como anjos no céu, seres sem corpo
físico? Mt 22:20
Católicos – Escrituras e Experiência -Aristóteles

Alegorismo Simbólico - Alexandria

Pentecostais: Subjetivismo Bíblico Alegórico


NeoPentecostais: Subjetivismo Materialista
Bíblico Alegórico

Liberais - Met. Linguístico - Subjetividade


Neo-Ortodoxia – Método Dialético
Literalismo Histórico - Antioquia

Sola Escriptura – Reforma – Met. Histórico Gramatical


Liberais - Met. Histórico Crítico
Exercícios
Jesus prometeu dar qualquer coisa que pedirmos com
fé? Mc 11:23-24
Contradição de Jesus? Lc 9:50 x Lc 11:23.
Quem são os abençoados: que vêem Lc 10:23, que
não vêem Jo 20:29
Todos que buscam a Deus o acharão? Lc 13:24 e Jo
7:34
Salvação ou julgamento? Jo 3:17 e Jo 9:39
O testemunho de Jesus? Jo 5:31 e Jo 8:14
A Interpretação: Passos

(1) Identificar se é (2) Identificar 3) Identificar Centro


Literal ou Simbólico Continuidade e e idéias secundárias.
Aplicação.
Quase todas as Qual a idéia principal
questões se resumem a O texto é aplicável do autor e quais as
Literal ou simbólico. Hoje? idéias por inferência?
(5)
(4) (6)
Estude o Mundo
Estude o Mundo Estude o Mundo
dentro do Texto.
atrás do Texto. na Frente do Texto.
Contextos Literário,
Contextos: Político, Contexto Temporal.
Linguistico,Teológico
Cultural, Social e Impacto histórico do texto
e Hermeneutico
Religioso do autor e O objetivo do Texto.
do autor e receptor.
receptor. O que Qual a Intenção e
Qual a Intenção e
influenciou Teologia do
Teologia do
o Autor? Hermeneuta?
Autor?
Exercícios 2Co 5:14 - Pois o amor
(1) Identificar se é Literal
ou Simbólico de Cristo nos constrange,
___________________ porque julgamos assim:
se um morreu por todos,
(2) Identificar Continuidade logo todos morreram
e Aplicação.
____________________

3) Identificar Centro e idéias


secundárias.
____________________
2Co 5:14 - Pois o amor de Cristo nos constrange,
porque julgamos assim: se um morreu por todos,
logo todos morreram

(4) (5) (6)


Estude o Mundo Estude o Mundo Estude o Mundo
atrás do Texto. dentro do Texto. na Frente do Texto.
O que influenciou Qual a Intenção e Qual a Intenção e
o Autor? Teologia do Teologia do
___________________ Autor? Hermeneuta?
__________________ ______________________________________
_______________ _______________ _________________
_______ __________ _____________
Exercícios
Reconhecimento de métodos

Aliança - Gn 15 Poder At 1:8 e Rm 1:16 Ef 3:15


O coração de Faraó. Ex 14:4 O que Nicodemos queria Jo 3
A Glória de Deus Ex 33:18 Queres ficar são? Jo 5:4
Circuncidar Dt 30:6 Daí a Cesar – Mc 12:12-13 e Lc
Buscar Jr 29:13 23:2
Templo Mt 12:6 Consolados Mt 5:4
Pão da Vida Jo 6:35 Anjos Lc 12:8 e 15:10
A Porta Jo 10:7 Zaqueu -
• Mat 12:1 Naquele tempo passou Jesus pelas searas num dia de
sábado; e os seus discípulos, sentindo fome, começaram a colher
espigas, e a comer.
• Mat 12:2 Os fariseus, vendo isso, disseram-lhe: Eis que os teus
discípulos estão fazendo o que não é lícito fazer no sábado.
• Mat 12:3 Ele, porém, lhes disse: Acaso não lestes o que fez Davi,
quando teve fome, ele e seus companheiros?
• Mat 12:4 Como entrou na casa de Deus, e como eles comeram os
pães da proposição, que não lhe era lícito comer, nem a seus
companheiros, mas somente aos sacerdotes?
• Mat 12:5 Ou não lestes na lei que, aos sábados, os
sacerdotes no templo violam o sábado, e ficam sem
culpa?
• Mat 12:6 Digo-vos, porém, que aqui está o que é maior
do que o templo.
• Mat 12:7 Mas, se vós soubésseis o que significa: Misericórdia
quero, e não sacrifícios, não condenaríeis os inocentes.
• Mat 12:8 Porque o Filho do homem até do sábado é o Senhor.
Os Problemas Hermenêuticos
O Problema O Problema O Problema
Filosófico Filosófico Filosófico
Schleiermacher
Compreender o
pensamento ou
expressão a partir
do conjunto de um
contexto vital.
Compreensão
divinatória e
Compreensão
comparativa.
• Paul Ricoeur diria que a ‘boa interpretação’ deve começar pela
contextualização do
• autor e da obra, passando pela interpretação da coisa do texto,
tentando responder às
• questões: Quem fala? Para quem fala? Em que condições e por
quê? (Em que condições
• ocorre o processo de comunicação e interpretação), e, por fim,
Porque eu interpreto isso
• dessa maneira? (inclusão da subjetividade do intérprete e o
reconhecimento do caráter
• perspectivo e finito de toda interpretação). Os limites da
hermenêutica aparecem quando a
• interpretação dobra-se sobre si mesma. Portanto, a interpretação
não deve buscar a
• verdade, pois estará sempre restrita à visão de mundo do
intérprete, enquanto sujeito
• histórico e cultural. A interpretação deve buscar o sentido.
• A universalidade da hermenêutica fundamenta-se na capacidade
interpretativa do ser humano. A hermenêutica da linguagem
escrita, que consiste na arte de interpretar um texto específico está
limitada à visão de mundo do intérprete. A relação privilegiada da
hermenêutica com as questões de linguagem vem do caráter
polissêmico das palavras: “Este traço de nossas palavras de terem
mais de uma significação quando as consideramos fora de seu uso
em determinado contexto”. O contexto, por sua vez, seleciona e
determina o valor atual que adquirem as palavras numa “mensagem
determinada e veiculada por um locutor preciso a um ouvinte que
se encontra numa situação particular”. Essa seletibilidade do
contexto é a contrapartida da polissemia. A primeira tarefa da
interpretação é identificar a intenção de univocidade na recepção
das mensagens. “Consiste em reconhecer qual a mensagem
relativamente unívoca que o locutor construiu apoiado na base
polissêmica do léxico comum”
• Permitindo a possibilidade de múltiplos níveis de sentidos
coerentes, a hermenêutica visa determinar o sentido profundo.
Ricoeur distingue duas abordagens para chegar a este sentido:
uma desmitologizante, que recupera sentidos latentes de
símbolos sem destruí-los e uma desmitificante, que destrói os
símbolos mostrando que eles apresentam uma falsarealidade (à
maneira de Marx, Freud e Nietzsche). A primeira abordagem
trata os símbolos como uma janela dentro de uma realidade
sagrada que se tenta alcançar. Mas a segunda trata os mesmos
símbolos como uma falsa realidade cuja ilusão deve ser exposta
e dissipada, para que ocorra uma transformação de ponto de
vista—por exemplo, na descoberta de Freud das ilusões infantis
no pensamento adulto. Assim, existem duas tendências
aparentemente opostas, uma hermenêutica “revolucionária” e
uma “conservadora”. Pode-se dizer que a hermenêutica crítica de
Habermas cai na desmitificação revolucionária e a hermenêutica
filosófica de Gadamer cai no campo mais conservador da
desmitologização.
• “O ter-sido é problemático, na medida exata em que não é
observável, quer se trate do ter-sido acontecimento, quer se
trate do ter-sido do testemunho. A passadidade de uma
observação no passado não é ela própria observável, mas
memorável”.
• A história é uma ciência empírica, pois depende da
observação da experiência. Entretanto, como se tratam de
experiências localizadas no passado, essas observações não
possuem o mesmo grau de ‘objetividade’ das ciências
naturais. Segundo Ricoeur, asconstruções da história são
representações de um passado que já foi, mas que pretende
reconstruir objetivamente este passado. As narrativas
historiográficas não se referem diretamente ao passado, mas
o representam.
• A irrealidade também é um conceito ingênuo, que precisa de uma
revisão drástica, quando aplicado às projeções da ficção. Ricoeur
estabelece um paralelismo entre a função de representância do
conhecimento do passado e sua função correlata na ficção: a
significância. Ele argumenta que a ficção representa a vida
cotidiana. E, em relação às práticas cotidianas, a ficção tem uma
função revelante, ao revelar características dissimuladas, mas já
delineadas “no coração de nossa experiência práxica”; e uma outra
função transformante, no sentido que uma vida examinada é uma
vida mudada, diferente. Vale ressaltar que é somente pela
mediação da leitura que a obra de ficção obtém sua significância
completa—que estaria para a ficção assim como a representância
está para a história. Em vez de referência, ele recorre ao conceito
de aplicação, proveniente da tradição hermenêutica e reelaborado
por Gadamer em Verdade e Método. Para Gadamer, a aplicação é
uma parte orgânica de todo projeto hermenêutico. É um conceito
análogo ao de apropriação, desenvolvido por Ricoeur.
• A noção de mundo do texto, noção implicada na experiência temporal
fictícia, é, segundo Ricoeur, apenas metade do caminho rumo à
aplicação. Pois a obra literária transcende o texto na direção de um
mundo. O mundo do texto assinala a abertura do texto para o que está
fora dele, para o seu ‘outro’, na medida em que o mundo do texto
constitui uma “intenção absolutamente original, relativamente à
estrutura interna do texto”. Mesmo considerado à parte da leitura, o
mundo do texto continua sendo uma transcendência na imanência, um
excesso à espera de leitura, ou seja, o mundo do texto excede sua
estrutura textual. Porém, é somente no ato de leitura que o dinamismo
da configuração18 encerra o seu percurso (de modo análogo, só no
momento da recepção a comunicação completa o seu circuito). A
passagem da configuração para a refiguração pressupõe o confronto
do mundo do texto com o mundo do leitor. Essa intersecção entre os
dois mundos é uma intersecção entre o mundo configurado pelo texto
e o mundo “no interior do qual a experiência efetiva se desenrola e
desdobra sua temporalidade específica”, ou seja: o mundo do leitor.
Logo, a configuração só se torna refiguração na ação efetiva,
• A significância da obra de ficção procede dessa
intersecção. O fenômeno da leitura é o mediador
necessário da refiguração. O dinamismo interno da
configuração narrativa não é suficiente por si só. A
passagem da configuração à refiguração exige o
encontro entre o mundo fictício do texto e o mundo
real do leitor. A leitura desempenha o papel
estratégico na operação de refiguração. O leitor é o
mediador último entre configuração e refiguração.
Nesse sentido, o texto só existe no momento em que
é lido.
• Estão constituídas as bases para o que Ricoeur
chama de “dialética da leitura”. É do autor que parte
a estratégia de persuasão que tem como alvo o
leitor. É a essa estratégia de persuasão que o leitor
responde, acompanhando a configuração e
apropriando-se da proposta do mundo do texto.
Nesta dialética, segundo Ricoeur, três momentos
distintos, porém interligados, devem ser
considerados: 1) a estratégia fomentada pelo texto e
dirigida para o leitor; 2) a inscrição dessa estratégia
na configuração literária; 3) a resposta do leitor,
considerado como sujeito que lê ou como público
receptor.
• A primeira dialética da leitura evidencia-se no combate entre a
expectativa de uma configuração imediatamente legível e a estratégia
de frustração inscrita no texto que atribui ao leitor a tarefa quase
impossível de dar sentido a “lugares de indeterminação”que ofuscam
a legibilidade do texto.
• Eis a segunda dialética da leitura: uma alternância entre carência e
excesso de sentido. Múltiplos sentidos adormecidos na polifonia das
palavras são selecionados pelo leitor a partir de seu mundo.
• Na busca de coerência que atravessa o ato de leitura, se a obra parecer
ao leitor demasiado coerente, familiar, que ele passa a crer nela a
ponto de perder-se, a concretização transforma-se em ilusão.
Entretanto, se a busca de coerência fracassa, a obra permanece
estranha ao leitor. Na terceira dialética da leitura, então, a ‘boa
leitura’ seria aquela que, ao mesmo tempo, admite um certo grau de
ilusão e assume a polissemia da obra: “A distância certa da obra é
aquela em que a ilusão se torna alternadamente irresistível e
insustentável”.
• A leitura, para Ricoeur, não é o que o texto prescreve, é o que revela
a estrutura por meio da interpretação.
• Ricoeur fala de um pacto de leitura, em que a
confiabilidade do narrador está para a narrativa de ficção
bem como a prova documentária está para a historiografia.
O autor implicado possui poderes retóricos propiciados
pelo pacto de leitura—por exemplo: o poder de conhecer os
outros por dentro, fazer apreciações do caráter dos
personagens—a confiabilidade do narrador restringe a
liberdade e a reflexão por parte do leitor. Já a narrativa
impessoal, característica da modernidade, desorienta o
leitor e convida-o a refletir mais. Essa narrativa, segundo
Ricoeur, requer um novo tipo de leitor, um leitor que
responda: “A função da literatura mais corrosiva pode ser
contribuir para fazer aparecer um leitor de novo tipo, um
leitor ele próprio desconfiado, porque a leitura cessa de ser
uma viagem confiante, feita em companhia de um narrador
digno de confiança, e torna-se um combate com o autor
implicado, um combate que o reconduz a si mesmo”.
• A hermenêutica literária possui uma tripla tarefa:
compreender, explicar e aplicar: A primeira leitura
de uma obra, a compreensiva, caracteriza-se por
uma riqueza de sentidos, é a etapa da compreensão
perceptiva e das sugestões de sentido. A segunda
leitura, explicativa, possui um caráter seletivo e
distanciado. É a tematização, quando o leitor segue
as questões deixadas em aberto na primeira etapa. E
a terceira etapa, da aplicação, caracteriza-se pela
elucidação do horizonte histórico. A aplicação
resulta no discernimento de contornos morais—“a
obra ensina”.
• “O comunicado, em última instância, é, para além
do sentido de uma obra, o mundo que ela projeta e
que constitui seu horizonte”.
• A associação entre a história literária e a estética da
recepção dá origem à fenomenologia do ato de ler.
A fenomenologia desenvolvida por Ricoeur tem seu
ponto de partida no aspecto inacabado do texto
literário. O texto literário é inacabado por dois
motivos: primeiro, porque oferece diferentes “vistas
esquemáticas” que o leitor deve concretizar: “O
texto é como uma partitura musical, suscetível de
várias execuções”. O leitor também pratica uma
atividade figurante, pois ele se figura os
acontecimentos relatados pelo texto.

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