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Isabel Alarcão

Professores Reflexivos em uma


escola reflexivo
Os capítulos referem ­ se a palestras, em
encontros sobre educação, relacionadas com
passagens da autora pelo Brasil, e por
recomendação da mesma, foi mantida a
ortografia vigente em Portugal.
Alunos Professores e Escola face à
Sociedade da Informação

A chamada ERA DA INFORMAÇÃO e também da


comunicação (ou Revolução da Informática), inundou a
sociedade com um volume virtualmente infinito de
informações de tal forma que tornou-se imprescindível a
democratização do acesso, sob a pena de
desenvolvermos mais uma forma de exclusão social: a
info - exclusão (ou exclusão digital).
Supondo superada a questão do acesso, na sociedade da
informação e comunicação é necessário o
desenvolvimento de competências para selecionar,
discernir e avaliar a informação disponível.
Nesse sentido a autora concorda com Morin: "só
o pensamento pode organizar o
conhecimento... o conhecimento pertinente é
aquele capaz de situar qualquer informação
no seu contexto".
Professora-Doutora em Educação pela Universidade
de Liverpool e catedrática na Universidade de
Aveiro, cuja obra emergiu das reflexões e
inquietações da autora quanto às tensões, num
mundo globalizado, entre o particular e o geral, o
local e o global.
"Questiono-me se será necessário aniquilar o
autêntico e o local para se viver o conforto ditado
pelos critérios globalizantes"; o que a levou a
divagar por "outras esferas": " ... dei comigo a
pensar nos alunos quando transitam de uma
escola para outra e, sobretudo de um ciclo de
estudos para outro subseqüente".
A percepção da crise educacional,
sociedade da informação e do
conhecimento, não pode ignorar
que a escola não mais detém o
monopólio do saber, e, portanto
o professor não é mais seu único
transmissor; assim como o aluno
não mais é um "receptáculo a
deixar-se rechear de conteúdos".
Cabe ao professor aceitar e situar-­se
nestas novas circunstâncias, pois
impõem-se aos alunos exigências mais
complexas, tais como, aprender a gerir
e a relacionar informações para poder
transformá-las no seu conhecimento.
"A escola tem que ser outra escola",
como organização, aberta a si mesma
e a comunidade.
Não há conhecimento sem aprendizagem.
A informação, se não organizada, não constitui
conhecimento, não é saber, não se traduz em
poder. "O conhecimento tornou­-se um bem
comum. A aprendizagem ao longo da vida, um
direito e uma necessidade".
As novas competências
No início dos anos 90, reunidos reitores de
universidades e conceituados empresários
europeus, para pensarem o papel da educação no
mundo atual, produziram um relatório que
chamou a atenção pela forma como abordava a
noção de competência, incluída não só
conhecimentos (fatos, conceitos e princípios), mas
capacidades (saber o que fazer e como),
experiência (capacidade de aprender com o
sucesso e com os erros), contatos (capacidades
sociais, influência) e valores (empenho,
responsabilidade).
O exercício da cidadania hoje, responsável e
participante requer tal sabedoria.
"O empowerment pessoal, ou seja, a construção
do poder pelo cidadão, não se resume na
obtenção de mais poder ou direitos, mas na
capacidade real de exercer esse poder na
construção de uma cidadania participativa".
Sem o saber que lhe permita aceder a informação
ao tempo em que tenha um pensamento
independente e crítico, o cidadão poderá ser
manipulado e info - excluído.
Para Perrenoud, por exemplo, competência é a
capacidade de mobilizar saberes para resolver
situações.
Não está, portanto contra o conhecimento,
compõe-se com ele. Esta noção, contudo, não é
utilitária, não se restringe as ações práticas de
natureza simples, outrossim, reconhece que,
segundo Perrenoud: “... a cultura humana...
está fundamentalmente ligada à ação, a uma
presença incerta e inquieta no mundo, ao
desejo de antecipar e dominar os
acontecimentos" .
• Ao fazer referência a subordinação da
educação à economia, a autora observa que,
proposta pelas circunstâncias do atual contexto
social, até as empresas reconhecem a
necessidade destas competências, como perfil
dos seus funcionários e da sua organização.
• Não se trata de importar para a educação esse
modelo de competência empresarial, mas da
impossibilidade de negar o imperativo social,
pois como setor da sociedade, a escola não
pode simplesmente dela isolar-se.
Alicerce da vivência cidadã: Compreender o
mundo, os outros, a si mesmo e as interações
entre esses vários componentes.
Através da compreensão nos preparamos para o
incerto, o difícil, a mudança; e, nesse processo
interativo, a capacidade continuada de
aprendizagem é fundamental.

"São hoje muitas as competências desejadas,


que assentam num conjunto de capacidades”.
Valoriza-se a curiosidade intelectual, a capacidade de utilizar
e recriar o conhecimento, de questionar e indagar, de ter
pensamento próprio, de desenvolver mecanismos de auto-
aprendizagem, além:

- Da capacidade de gerir a sua vida individual e em grupo,


- De se adaptar sem deixar de ter sua própria identidade,
- De se sentir responsável pelo seu desenvolvimento
constante,
- De lidar com situações que fujam à rotina,
- De decidir e assumir responsabilidades,
- De resolver problemas,
- De trabalhar em colaboração,de aceitar os outros.
- “Deseja-se ainda dos cidadãos que tenham
horizontes temporais e geográficos
alargados, não se limitando a ver seu
pequeno mundo, que tenham dos
acontecimentos uma visão sistêmica, que
sejam capazes de se comunicar e interagir, e
que desenvolvam a capacidade de auto-
conhecimento e auto-estima".
A competência para lidar com a informação na sociedade da aprendizagem

Desenvolvimento de fontes múltiplas


de informação: exige re-estruturações
na relação professor-aluno (o campo
de ação delineado pela tríade
professor, aluno, saber, mantém-se
porém, com o saber representando
um "Iink" para uma variedade de
fontes de informação).
Os alunos na sociedade da aprendizagem

• Num mundo globalizado, ser aluno é ser


eternamente "aprendente", aprendente ao longo
da vida, em interação constante com as
oportunidades que o mundo oferece.
• Se cabe ao professor orientá-Io nessa trajetória, é a
ele que cumpre perceber-se como participante
deste mundo.
• A aprendizagem é um modo de compreender
melhor o mundo a medida em que conseguimos
melhor utilizar seus recursos. "Subjaz a este modelo
uma abordagem construtivista, sócio-cultural".
• A sala de aula tem que deixar de ser um
espaço de transmissão de conhecimento e
passar a construção deste.
• Isso implica na mudança de organização
das aprendizagens que passam a centrar-
se no próprio aluno e provocam sua
capacidade de auto e hetero­-
aprendizagem.
"A capacidade de interagir com o conhecimento
de forma autônoma, flexível e criativa é a melhor
preparação para a vivência no nosso mundo
super complexo, incerto, sempre pronto a exigir
novos saberes, inspiradores de novas ações".
Os professores na sociedade da aprendizagem

Segundo Alarcão, se o professor já não é a única


fonte de informação, é certo que continua
imprescindível, na era da informação, é o
"timoneiro" na viagem em direção ao
conhecimento, contanto tenha que repensar o seu
papel neste processo.
Por exemplo: o desenvolvimento do espírito crítico
não ocorre através de monólogos expositivos, por
mais interessantes que possam ser, mas através do
diálogo, do confronto de idéias e de práticas, na
capacidade de ouvir o outro.
A escola na sociedade da aprendizagem

Numa reflexão generalizada a autora afirma que as


escolas hoje encontram-se inertes em sua
mesmice, sentido-se ultrapassadas e até "inúteis",
a espera de alguém que apareça para ressuscitá-las,
não percebendo que a transformação ocorre "por
dentro", com as pessoas que a constituem:
professores, alunos e funcionários, em interação
com a comunidade. Algumas escolas, que já
perceberam o fenômeno, tornaram-se escolas
reflexivas.
"A escola reflexiva não é telecomandada do exterior.
É autogerida, tem seu projeto próprio, construído
com a colaboração de seus membros. Sabe para
onde deve ir e avalia-se permanentemente na sua
caminhada. Contextualiza-se e interage com a
comunidade. Acredita nos seus professores, cuja
capacidade de reflexão e de ação sempre fomenta.
Envolve os alunos na construção de uma escola
cada vez melhor, mas não esquece pais e
comunidade. Considera-se uma instituição em
desenvolvimento e em aprendizagem. Pensa-se e
avalia­se. Constrói o conhecimento sobre si própria".
A Formação do Professor Reflexivo
A capacidade reflexiva é inata no ser humano,
mas necessita de contextos de liberdade e
responsabilidade que permitem o seu
desenvolvimento.
A experiência mostra que o diálogo e a expressão
assumem um papel fundamental, segundo a
autora, num triplo diálogo: consigo próprio, com
os outros e com a situação, de tal forma que
alcance um nível explicativo e crítico.
A noção de professor reflexivo baseia-se na
consciência da capacidade de pensamento e
reflexão que caracteriza o ser humano como
criativo e não como mero reprodutor de idéias
e práticas que lhe são exteriores.
Formação do professor hoje requer que todas as
atenções voltem-se para sua capacidade de
pensar autônoma e sistematicamente.
A autora se atem à metodologia da PESQUISA-
AÇÃO, constituída sobre valor formativo
advindo da reflexão sobre a experiência
profissional. Trata-se de um processo de
intervenção social cientificamente apoiada e
desenvolve-se segundo ciclos de planificação,
ação, observação, reflexão.
ESTRATÉGIAS
- A análise dos casos: são as expressões do pensamento
sobre uma situação concreta, revelam o que
professores e alunos fazem, pensam, sentem,
conhecem. Permitem desocultar situações complexas
e construir conhecimentos, ou tomar consciência do
que, de alguma forma já se sabia.
- As narrativas: "A escrita é um encontro conosco e com
mundo que nos cerca", revela o modo como
experienciamos o mundo. Podem incidir sobre o
próprio professor, os alunos, a escola etc., tudo o que
permita melhor compreender as finalidades e os
contextos educativos.
• - Portfólios: embora tenha migrado para a área
das artes, o conceito envolve um conjunto de
documentos e informações, organizados e
comentados sistematicamente, contextualizados
no tempo para revelar um determinado
percurso profissional. Na formação dos
professores, apesar do valor formativo, o
portfólio pouco tem sido utilizado.
• - Perguntas pedagógicas: o questionamento é o
motor do desenvolvimento da aprendizagem, a
partir dele tudo passa ser suscetível de um
melhor entendimento.
Contributos da supervisão pedagógica para a construção reflexiva do
conhecimento profissional dos professores

A autora analisa o papel do supervisor na


relação com professor e com os saberes, tendo
em vista o desenvolvimento do conhecimento
profissional dos professores.
Dimensões
- Conhecimento do conteúdo disciplinar: compreensão e
domínio da matéria a ensinar.
- Conhecimento pedagógico em geral: domínio dos
princípios pedagógicos comuns às várias disciplinas que é
manifestado na maneira como o professor organiza e gere
as atividades de sala de aula.
- Conhecimento do currículo: compreensão do conjunto de
disciplinas e não-disciplinas que integram a organização
das atividades formativas de um nível de ensino.
- Conhecimento do aluno e das suas características:
compreende o passado e seu presente; sua história de
aprendizagem, nível de desenvolvimento, sua atividade
sócio-cultural.
- Conhecimento dos contextos: a atividade docente se
desenvolve em diferentes contextos espaciais, e é uma
atividade psicossocial, temporal, com valor educativo.
- Conhecimento dos fins educativos: os contextos vão se
desdobrando pela mediação cultural, com fundamentos
históricos, psicossociais, culturais e políticos da educação
que são necessários para a contextualização da ação do
professor.
- Conhecimento de si mesmo: no que faz, pensa e diz:
Abrange o autoconhecimento, a dimensão metacoginitiva e
é fundamental ao desenvolvimento pessoal e profissional.
- Conhecimento da sua filiação profissional: baseia-se numa
comunidade profissional.
A supervisão pedagógica é vista como
supervisão curricular e assim sendo,
uma vertente formativa em relação
à escola e ao desenvolvimento da
aprendizagem.
A autora salienta seu conceito de supervisão
pedagógica dos professores como:
- Uma atividade que visa o desenvolvimento
profissional dos professores, sua ação no
exercício da profissão e inserção na vida escolar.
- Tem valor que transcende a vida da escola e da
educação.
- É atividade de natureza psicossocial, intra e
interpessoal em interação nos contextos
formativos.
- Interação entre pensamento e ação, com objetivo
de dar sentido ao vivido e ao conhecido.
- Desenvolvimento de capacidades, atitudes e
conhecimento para a competência profissional.
- Um gestor e animador de situações e recursos
intra e interpessoais, com vistas à formação.
- Gestor inclui capacidade humana, técnica-
profissional.
- Pressupõe pré-requisitos e formação
especializada.
Pergunta: Como o supervisor pedagógico pode ajudar a construir o
conhecimento pedagógico?

Resposta: Pela sua ação e atuação,


diálogo, monitoramento de situações
de aprendizagem, pelo que é, pelo
que faz, pelo que diz e pelo que
sabe.
Gerir uma Escola Reflexiva

Para Isabel Alarcão a escola é uma comunidade


viva, da qual participam vários atores sociais, e
cuja missão é educar.
Situada entre o macrocosmo da sociedade e o
microcosmo da sala de aula, estabelecendo a
interface entre a sociedade dos adultos e as
crianças e jovens em desenvolvimento.
A escola é mais que um ajuntamento de pessoas,
é um todo coeso e dinâmico que para exercer a
função de educar precisa de uma organização.
A escola que eu queria...
"Quero uma escola comunidade, dotada de pensamento e
vida próprios, contextualizada na cultura local e integrada
no contexto nacional e mais abrangente. Não quero, pois,
uma escola burocratizada que seja uma mera delegação
ministerial. Desejo assim uma escola que conceba, projete,
atue e reflita em vez de uma escola que apenas executa o
que os outros pensaram para ela. Uma escola que tenha
uma ambição estratégica por oposição a uma escola que
não tem visão e não sabe olhar-se no futuro. Não quero
uma escola que se lamente do insucesso como um estado e
frustrante fardo a carregar, mas uma escola que questione
o insucesso nas suas causas para relativamente a elas,
traçar planos de ação.....
Uma escola que reflita sobre os seus próprios
processos e as suas formas de atuar e funcionar,
uma escola que analise, desconstrua e refaça as
suas opções e sua ação curricular. Uma escola
que saiba criar suas próprias regras. Mas que,
ciente da sua autonomia responsável, saiba
prestar contas da sua atuação, justificar os seus
resultados e auto – avaliar - se para definir o seu
desenvolvimento. Em vez de uma escola que
apenas cumpre regras emanadas de outrem sem
que ninguém se avalie, nada, nem ninguém”.
Uma escola ...
... Que se alimente do saber, da produção e da reflexão dos
seus profissionais, os professores que, por isso mesmo, não
são meros assalariados.
... à qual não é necessário ditar a formação requerida, porque
ela própria conhece suas necessidades, cria seus contextos
de formação no seu desenvolvimento instrucional.
... onde tudo gira à volta de sua missão: educar as novas
gerações.
... que todos se orgulham: os alunos, os professores, os
funcionários, os pais, a comunidade envolvente.
“Isto quer dizer, uma escola onde os professores se sintam
felizes e úteis à sociedade e onde os alunos apreciem como
é bom crescer em saber”
Como cheguei ao conceito de Escola Reflexiva?

Definição da autora: "organização que


continuamente se pensa a si própria, na sua
missão social e na sua organização e se
confronta com o desenrolar da sua atividade
num processo heurístico simultaneamente
avaliativo e formativo"
A escola nunca está pronta, acabada, encontra-
se sempre em processo de construção.
Concebendo o currículo como o conjunto
de aprendizagens proporcionadas pela
escola e consideradas socialmente
necessárias num dado tempo e contexto,
a autora considera que a organização
escolar vem respeitando princípios tais
como "homogeneidade, segmentação,
seqüencialidade e conformalidade", que
não mais se adéquam a uma realidade
heterogênea e multifacetada.
Neste novo paradigma, a noção de grupo de
aprendizagem a reconstituir-se em função das
necessidades ou dos objetivos, deveria
substituir a de uma turma fixa, o que
obviamente implica outras formas de
organização da relação do aluno com os
professores, com as fontes de informação e com
o saber.
Postulados da Escola reflexiva:
• - ser capaz de liderar e mobilizar as pessoas;
• - saber agir em situação;
• - nortear-se pelo projeto de escola;
• - assegurar uma atuação sistemática;
• - assegurar a participação democrática;
• - pensar e escutar antes de decidir;
• - saber avaliar e deixar-se avaliar;
• - ser conseqüente;
• - ser capaz de ultrapassar dicotomias
• paralisantes;
• - decidir;
• - acreditar que todos e a própria escola se encontram num
processo de desenvolvimento e de aprendizagem.

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