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Prof. Luan Sampaio – Psicanalista. Mestre e Doutorando em Psicologia.

O caso Hans

Escrito em 1909 o caso


Um encontro de Freud do pequeno Hans, Ao publicar esse caso,
com a psicanálise de acometido por uma Freud tinha três
crianças. neurose infantil – histeria objetivos:
de angústia.

1- confirmação de suas
2- compreensão do 3- investigação da vida
teorias sobre a
quadro de fobia; psíquica das crianças.
sexualidade infantil.
A partir da análise de Hans propôs as teorias sexuais infantis, e gerou a escrita de dois textos: “O
esclarecimento sexual das crianças” (1907) e “Sobre as teorias sexuais infantis” (1908).

A especificidade da fobia articula três conceitos-chaves da teoria freudiana: a sexualidade infantil; o


complexo de Édipo, e o complexo de castração.

No texto “Três ensaios sobre a teoria da sexualidade” (1905), Freud já desenvolve os principais pontos da
sexualidade infantil atrelados ao conceito de pulsão, retirando a criança de seu lugar de inocência –
pequeno perverso-polimorfo.
Pai de Hans – discípulo de Freud – que narrou por cartas a vida sexual de seu filho.

Em uma dessas cartas, o pai comunicou o sintoma da fobia apresentado por Hans, que temia ser
mordido por um cavalo, recusando-se a sair de casa.

Relatou ainda suas atitudes exibicionistas, seu interesse pelos órgãos genitais.

Freud se propõe a orientar o pai através de correspondências.


Antes do aparecimento do sintoma de fobia, por volta dos 3 anos de idade, Hans achava-se bastante
interessado pela “coisinha de fazer pipi”.

Hans chegou a conclusão que todos os seres animados também tinham “faz pipi”, obtendo confirmação da
mãe de que também ela tinha um. Esse relato nos conduz ao tema da sexualidade infantil.

O caso Hans é exemplar em contemplar a “primazia do falo” – em que o Complexo de Édipo, o


investimento libidinal na zona genital e a questão da diferença dos sexos ocupam um lugar de destaque.
 No autoerotismo, a própria criança buscará
satisfação da pulsão através da manipulação de
determinadas partes excitáveis de seu corpo, que
na fase fálica é seu órgão genital: o pênis para o
menino e o clitóris para a menina – experiências
de cuidados exercidas pela mãe estimulam e
despertam as primeiras sensações prazerosas.
Duas situações antes do aparecimento do sintoma fóbico,
que demonstram o intenso apego de Hans à mãe e a
A origem do angústia de perdê-la.

sintoma A primeira referia-se a um sonho, quando tinha 4 anos e 9


meses, e acordou chorando: “quando estava dormindo,
pensei que você tinha ido embora e já não tinha alguém
que me acariciasse”.

Segunda situação, Hans foi a passeio com a babá e


começa a chorar na rua e pede para voltar para casa para
que a mãe o “mime”.
Nascimento de sua irmã
Hanna – quando Hans tinha 3 Sua hostilidade em relação a
anos e meio, houve uma ela manifestou-se no medo
intensificação e frustração de que ele tinha da banheira,
suas necessidades eróticas, e a expressão do seu desejo de
hostilidade proveniente dessa que a irmã morresse ao ser
situação expressou-se através banhada.
de fantasias.
 A fantasia de Hans, em que ele retira um cavalo da
estrebaria e o golpeia, também revela esses
impulsos sádicos da sexualidade infantil, o prazer de
bater na mãe por sua gravidez, por ter sido
destronado, despojado de seu lugar de
exclusividade, a partir da chegada de sua irmã.
 “Tomei um chicote e dei no cavalo até que ele caiu e
começou a fazer barulho com os pés”.
 Pai: em quem você realmente gostaria de bater? Na
mamãe, em Hanna ou em mim?”
 Hans: “Na mamãe”.
 Identificação com a mãe - Freud diz que, das
perdas ocasionadas pela vinda da irmãzinha,
Hans se compensou com a fantasia de que
também tinha filhos. Hans referia-se às amigas
como “minhas filhas” e, dar um filho a ela.
 Expressava o desejo em ser tocado pela mãe:
“por que não pega minha coisinha?”. A mãe:
“porque seria uma porcaria”.
 Nascimento de Hanna como estímulo para
Hans investigar a origem dos bebês.
 Aos 3 anos e meio, a mãe de Hans o ameaçou
diante de seu comportamento de masturbação,
dizendo que chamaria o Dr. A “para cortar fora
seu pipi”. Freud localizou aí o complexo de
castração.
 Surgiu em Hans a lembrança de uma cena da
advertência de um pai para a filha: “não ponha
o dedo no cavalo, pois ele pode morder”. A
expressão é semelhante à advertência usada
para inibir a masturbação: “não ponha o dedo
no pipi”.
 Freud fez suas considerações sobre o sintoma
fóbico de Hans dentro de um contexto edípico,
tendo suas hipóteses confirmadas por fantasias
relatadas pelo pequeno.
Leituras dos  Melanie Klein: Fantasias inconscientes e a
pulsão epistemofilica.
outros autores
sobre Hans  Jacques Lacan: A função paterna e o
complexo de castração.
 Não há uma única leitura de um caso. Este
surge da interpretação, que, por sua vez,

Uma (re)leitura depende da perspectiva teórica de que a lemos.


 Lacan retomou o legado freudiano e propôs
com Lacan um retorno aos textos de Freud que teve como
consequência o surgimento de uma nova
sobre Hans escola dentro da psicanálise.
 Não se trata de um retorno, mas de uma
releitura original.
Contextualizando Lacan...

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Em sua época, Lacan 1- o ideal de normalidade 2- as leituras 3- a psicanálise que
centra suas críticas aos associado à genitalidade; desenvolvimentistas propunha como finalidade
demais psicanalistas em pautadas num modelo da cura uma melhor
três pontos: evolutivo; adaptação do sujeito à
realidade externa.
 O psicanalista deve se submeter ao texto do analisando e a esse texto subordinar a interpretação – daí que os
arranjos significantes do paciente tenham um valor privilegiado. Não se deve tentar compreender de
imediato o que diz o paciente, mas ser guiado pela sequencia de letras.
 Quando pensamos em desvendar o sentido oculto de um sintoma, nos aproximamos da via da significação, o
que nos leva a procurar uma analogia formal ou figurativa ou um fragmento de discurso que permita decifrar
a cena (fantasia ics) que explicaria o sintoma. Esse caminho supõe que o ics está estruturado como uma
fantasia.
 Para Lacan, o objetivo da análise não é explicar o sintoma, mas descongelá-lo.
O cavalo no caso Hans

 Para que serve o cavalo? A ênfase está na preocupação do “para quê”, com a função que tem o cavalo, do
que com o porquê. O cavalo é um significante.
 Os cavalos arrastam carros, carros estão engatados aos cavalos, e que os carros carregam coisas.
 Num primeiro momento, Lacan diz que Hans se vê arrastado pela situação em que está com a mãe, como
por um carro.
 Fala de um jogo de engano jogado por Hans e sua mãe, no qual a criança brinca de ser o falo da mãe.
 Essa interpretação enfatiza o valor metafórico do carro, que representaria Hans engatado ao cavalo, que,
nesse momento, seria sua mãe.
 Ainda estamos na via da significação, contudo a ênfase não está na representação metafórica de cada um dos
sujeitos pensados isoladamente, mas na relação entre ambos, no “engate” de Hans à mãe.

 Lacan analisa uma série de fantasias.

 A saída que Hans procura é a “saída do Complexo de Édipo”


A função Diferentemente de Freud, Lacan
pensa que Hans não consegue
elaborar satisfatoriamente a
Faltou uma intervenção paterna que
permitisse a desidentificação de Hans
paterna castração, e, embora desapareça seu
medo de cavalos, persiste, no final da
análise, um resto de angústia.
com o falo materno.

Portanto, Hans está detido na


passagem da mãe para o pai. O O caso Hans serve ainda para Lacan
objeto fóbico o protege da angústia, distinguir a função paterna do pai (da
ao encobrir a falha na simbolização realidade externa).
da castração.

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